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Documento assinado via Token digitalmente por PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA RAQUEL ELIAS FERREIRA DODGE, em 01/08/2018 15:26.

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA

Nº 1156/2018 – LJ/PGR
Sistema Único nº 200690/2018

HABEAS CORPUS Nº 157.627/PR - Eletrônico


PACIENTE: Aldemir Bendine
IMPETRANTE: Alberto Zacharias Toron e Outro(o/s)
RELATOR: Ministro Edson Fachin

Excelentíssimo Senhor Ministro Relator,


Egrégia Segunda Turma,

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. UTILIZAÇÃO


DO HABEAS CORPUS COMO SUCEDÂNEO
RECURSAL. INADMISSIBILIDADE. INADEQUAÇÃO

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DA VIA ELEITA PARA DISCUSSÃO DE QUESTÕES
MERAMENTE PROCESSUAIS, NÃO AFETAS AO
DIREITO DE LOCOMOÇÃO. NULIDADE
PROCESSUAL. ORDEM DE APRESENTAÇÃO DAS
ALEGAÇÕES FINAIS. ART. 403 DO CPP. PRAZO
COMUM. INEXISTÊNCIA DE DISTINÇÃO ENTRE
RÉUS COLABORADORES DA JUSTIÇA E NÃO
COLABORADORES. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO
CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.
INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO
DE PREJUÍZO. DENEGAÇÃO DA ORDEM.
1. O entendimento pacificado do Supremo Tribunal Federal é
no sentido de que o objeto da tutela em habeas corpus é a
liberdade de locomoção quando ameaçada por ilegalidade ou
abuso de poder (CF, art. 5º, LXVIII), não cabendo sua
utilização para examinar questões que dizem respeito à
instrução do processo e sem qualquer repercussão na liberdade
de locomoção do réu.
2. Inexiste ilegalidade na decisão que indefere pedido de defesa
para apresentação de alegações finais após os demais corréus,
por serem eles colaboradores da Justiça, porquanto o art. 403
do Código de Processo Penal estabelece prazo comum aos
corréus, sem distinção.
3. Na esteira do princípio pas de nullité sans grief, aplicável às
nulidades absolutas e relativas, a declaração de nulidade
reclama efetiva demonstração do prejuízo sofrido, nos termos
do art. 563 do CPP, o que não ficou demonstrado pelos
impetrantes na espécie.
- Parecer pelo não conhecimento do writ ou, no mérito, pela
denegação da ordem buscada.

Gabinete da Procuradora-Geral da República


Brasília / DF
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA

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I

Trata-se de habeas corpus1, com pedido liminar, impetrado em benefício de


ALDEMIR BENDINE, apontando como autoridade coatora a Quinta Turma do Superior
Tribunal de Justiça que negou provimento a agravo regimental interposto pelo paciente,
mantendo, assim, a decisão que julgou prejudicado o Habeas Corpus nº 437.855/PR.

Consta dos autos que o paciente foi denunciado, em conjunto com ANDRÉ
GUSTAVO VIEIRA DA SILVA, ÂNTÔNIO CARLOS VIEIRA DA SILVA JÚNIOR, ÁLVARO JOSÉ GALLIEZ NOVIS,
FERNANDO LUIZ AYRES DA CUNHA e MARCELO BAHIA ODEBRECHT, pela prática dos crimes de
corrupção, lavagem de dinheiro, pertinência à organização criminosa e obstrução à
investigação de organização criminosa, por ter, na condição de Presidente da Petrobrás,
solicitado e recebido do Grupo Odebrecht vantagem indevida de R$ 3.000.000,00 (três
milhões de reais), entre junho e julho de 2015.2

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Encerrada a instrução processual, a defesa do paciente requereu que o prazo para
a apresentação de suas alegações finais não fosse comum mas sucessivo ao concedido às
defesas dos demais corréus/colaboradores MARCELO BAHIA ODEBRECHT, FERNANDO LUIZ AYRES DA
CUNHA SANTOS REIS e ÁLVARO JOSÉ GALLIEZ NOVIS, e do acusado confesso ANDRÉ GUSTAVO VIEIRA
DA SILVA. Ponderou, para tanto, que a abertura de prazo comum impossibilitaria o paciente de
rebater toda a carga acusatória que pudesse pesar contra si, na medida em que a atuação dos
colaboradores assemelhar-se-ia a de um assistente de acusação.

O pedido foi indeferido, por ausência de previsão legal, tendo o Magistrado


Singular consignado que “a lei estabelece prazo comum para a apresentação de alegações
finais ainda que as defesas não sejam convergentes e não cabe à Justiça estabelecer
hierarquia entre acusados, todos com igual proteção da lei”.3

Impetrado habeas corpus4 perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o


Desembargador Relator indeferiu, liminarmente, o writ.

A defesa interpôs, então, agravo regimental, que foi improvido pelo Tribunal de
origem.5

1 Fl. 1/19
2 Ação Penal nº 5035263-15.2017.4.04.7000/PR, da 13ª Vara Federal de Curitiba (fls. 348/349).
3 Fls. 447/448.
4 Habeas Corpus nº 5004551-56.2018.4.04.0000.
5 Fl. 292.

HC nº 157.627/PR 2
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Contra tal acórdão, a defesa impetrou, no Superior Tribunal de Justiça, o
Habeas Corpus nº. 437.855/PR, buscando o reconhecimento do direito de ALDEMIR BENDINE
apresentar suas alegações finais após os corréus/colaboradores.

O Ministro Relator julgou o writ prejudicado, entendendo que, aliado ao fato


de não se verificar qualquer irregularidade que pudesse macular o feito de nulidade, a
pretensão da defesa tornou-se esvaída com a superveniência da sentença penal
condenatória.6

Ainda insatisfeito, ALDEMIR BENDINE interpôs agravo regimental, que foi,


todavia, improvido pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, com a manutenção
da decisão agravada, consoante se vê do aresto adiante sintetizado:7

PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO QUE NÃO


CONHECEU DO HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO.
AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. DECISÃO SINGULAR
PROFERIDA POR RELATOR. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. OFENSA AO

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PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. INOCORRÊNCIA. NULIDADE. NÃO
CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. RECURSO DESPROVIDO.
I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma
do col. Pretório Excelso, firmou orientação no sentido de não admitir a impetração de
habeas corpus em substituição ao recurso adequado, situação que implica o não
conhecimento, ressalvados casos excepcionais em que, configurada flagrante
ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal, seja recomendável a concessão da
ordem de ofício, o que não se vislumbra no caso.
II - O artigo 34, inciso XVIII, alínea "a", do Regimento Interno deste Superior
Tribunal de Justiça, autoriza o Relator a decidir o habeas corpus prejudicado, como
ocorre na hipótese dos autos, não se configurando, portanto, ofensa ao princípio da
colegialidade. Precedentes.
III - Assim, não há ilegalidade no julgamento monocrático do mandamus, sendo certo
que a possibilidade de interposição de agravo regimental contra a respectiva decisão,
exatamente como ocorre na espécie, permite que a matéria seja apreciada pela Turma,
afastando o vício suscitado pelo Agravante.
IV - In casu, os fatos narrados se viram adequadamente identificados no curso da
ação penal, sobretudo nos interrogatórios, tendo o paciente, desde o início da
persecução, até o seu desenrolar final, amplo acesso aos elementos de cognição, não
havendo, em hipótese alguma, que se falar em cerceamento de defesa ou mesmo que
se vislumbrar prejuízo ou ilegalidade.
V - Faz pacífico o entendimento dos Tribunais Superiores, no sentido de que a
superveniência da sentença penal condenatória torna esvaída a análise da nulidade
aqui pleiteada, isso porque, como ressaltado, o exercício do contraditório e da ampla
defesa foi viabilizado em sua exaustão durante a instrução criminal, tendo-se por
prejudicada a pretensão deduzida.
Agravo Regimental desprovido.

6Fls. 292 a 301.


7Fls. 333 a 343.
HC nº 157.627/PR 3
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Na presente impetração, a defesa de ALDEMIR BENDINE reitera a argumentação
aventada perante o Superior Tribunal de Justiça, no sentido de ser ilegal a abertura de prazo
comum para apresentar alegações finais por todos os corréus, sejam eles colaboradores ou
não. Sustentam os impetrantes que “há constrangimento ilegal porque as garantias
constitucionais do contraditório e da ampla defesa asseguram o direito de o acusado se
contrapor a todas as cargas acusatórias” e que as manifestações dos coacusados
colaboradores têm nítido teor acusatório.

Prestadas as informações de praxe (fls. 535/655), vieram os autos à


Procuradoria-Geral da República, para manifestação.

II

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II.a) Preliminar: ausência de hipótese de cabimento do presente Habeas Corpus. Não
conhecimento.

O habeas corpus é o remédio instituído pelo poder constituinte originário para


garantia do direito à liberdade de locomoção previsto no artigo 5º, inciso XV, da
Constituição Federal, sendo cabível sempre que este for violado ou se encontrar ameaçado
de violação por ilegalidade ou abuso de poder, nos termos do inciso LXVIII do citado
dispositivo constitucional.

Sua utilização, como cediço, deve pressupor a existência de ameaça de


violência ou concreta violação ao direito ambulatório do indivíduo, por ato ilegal ou
abusivo, sem o que estará caracterizada a inadequação da via eleita para a prestação
jurisdicional requerida.

No caso dos autos, a ação constitucional foi utilizada para suspender o curso
da ação penal, sob o escopo de garantia dos princípios do contraditório e da ampla defesa,
buscando, sem motivação plausível, o afastamento de normativa processual expressa que
estabelece prazo comum aos réus para oferecer memoriais escritos. Todavia, é certo que, do
ato originariamente apontado como coator e pela moldura fática apresentada por meio do
acórdão combatido, não se positiva qualquer ilegalidade no compasso procedimental e nem
mesmo risco ao direito de ir e vir do paciente.

HC nº 157.627/PR 4
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Denota-se, na verdade, que o mandamus está sendo utilizado, no presente caso,
com a finalidade de se enfrentar, de modo precoce, questões de índole meramente
processual, cuja discussão tem lugar no curso do própria ação penal ou mesmo em sede
recursal. Aliás, como bem destacado no acórdão proferido em 2ª instância, “tem chamado
a atenção, em especial no âmbito das ações penais que guardam relação com a
denominada 'Operação Lava-Jato', a frequente utilização do habeas corpus” para debater
matérias absolutamente estranhas ao incidente, que dizem respeito à instrução do processo
e sem qualquer repercussão na liberdade de locomoção, comportamento que não pode ser
tolerado pelos Tribunais Superiores Pátrios, muito menos por essa Suprema Corte.

Nesse sentido, confira-se os seguintes precedentes dessa Suprema Corte:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL


PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
INADMISSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
PARA JULGAR HABEAS CORPUS: CF, ART. 102, I, D E I. ROL TAXATIVO.

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MATÉRIA DE DIREITO ESTRITO. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA:
PARADOXO. ORGANICIDADE DO DIREITO. PETIÇÃO INEPTA. DEFICIÊNCIA
NA INSTRUÇÃO. INEXISTÊNCIA DE TERATOLOGIA, ABUSO DE PODER OU
FLAGRANTE ILEGALIDADE. PLEITO PELA EXCLUSÃO DO ROL DOS
CULPADOS. IRRESIGNAÇÃO EM FACE DO VALOR DA MULTA.
INEXISTÊNCIA DE ATO CONCRETO, ATUAL OU IMINENTE DE AMEAÇA OU
RESTRIÇÃO ILEGAL DO DIREITO DE LOCOMOÇÃO, OBJETO ÚNICO DA
TUTELA EM SEDE DE HABEAS CORPUS (ART. 5º, LXVIII, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL). IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO HABEAS CORPUS COMO
SUCEDÂNEO DE RECURSO OU REVISÃO CRIMINAL. AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A liberdade de locomoção, bem jurídico
tutelado pelo Habeas Corpus, tem como pressupostos constitucionais a efetiva
vulneração ou ameaça, em razão de ilegalidade ou abuso de poder desse direito,
restando inviável sua utilização nas hipóteses de ausência demonstração objetiva
e concreta da ameaça ou constrição ilegítima ao direito de liberdade de
locomoção do paciente. Precedentes: HC 133.753 AgR, Tribunal Pleno, Rel. Min.
Cármen Lúcia, DJe 28/06/2016, HC 131.164, Primeira Turma, Rel. Min. Edson
Fachin, DJe 14/09/2016, HC 129.822-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia,
DJE de 20/10/2015 e RHC 124.715-AgR, Primeira Turma, Rel. Roberto Barroso, DJe
de 19/05/2015. 2. In casu, o recorrente impetrou writ no intuito de rever decisões
proferidas nos autos dos HC’s 168.915 e 193.390, que tramitaram junto ao Superior
Tribunal de Justiça, as quais transitaram em julgado respectivamente, em 28/07/2015
e 04/02/2015, sendo objeto a anulação de decisão proferida pelo juízo de execução
criminal originário. 3. A competência originária do Supremo Tribunal Federal para
conhecer e julgar habeas corpus está definida, exaustivamente, no artigo 102, inciso I,
alíneas d e i, da Constituição da República, sendo certo que o paciente não está
arrolado em qualquer das hipóteses sujeitas à jurisdição desta Corte. 4. O habeas
corpus não pode ser manejado como sucedâneo de recurso ou de revisão criminal. 5.
Agravo regimental desprovido. (STF, HC 151281 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX,
Primeira Turma, julgado em 04/04/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-073
DIVULG 16-04-2018 PUBLIC 17-04-2018).

HC nº 157.627/PR 5
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RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. FURTO
QUALIFICADO. RESPOSTA À ACUSAÇÃO. RECEBIMENTO DE DENÚNCIA.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. DECISÃO
SUSCINTA QUE REFUTOU ADEQUADAMENTE TODAS AS TESES
DEFENSIVAS. RECURSO IMPROVIDO. 1. O juízo de primeiro grau, ainda que de
forma concisa, registrou a presença dos requisitos viabilizadores da ação penal,
postergando as questões referentes à análise probatória para o momento adequado (=
fase instrutória), não havendo falar, por isso, em nulidade da decisão por ausência de
fundamentação. 2. Ademais, não se pode afirmar que a decisão que rejeitou as
questões suscitadas na resposta à acusação (CPP, art. 396-A) implique
constrangimento ilegal ao direito de locomoção do paciente. A defesa terá toda a
instrução criminal, com observância ao princípio do contraditório, para sustentar suas
teses e produzir provas de suas alegações, as quais serão devidamente examinadas
com maior profundidade no momento processual adequado. 3. Recurso ordinário
improvido. (STF, RHC 120267, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda
Turma, julgado em 18/03/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-065 DIVULG 01-
04-2014 PUBLIC 02-04-2014).

O presente habeas corpus, portanto, carece dos elementos necessários e


suficientes para seu conhecimento.

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II.b) Mérito: acerto da decisão atacada

Caso superada a preliminar de mérito do não conhecimento, o que se admite


somente a título argumentativo - e até para ratificar a ausência de flagrante ilegalidade ou
teratologia na decisão objurgada - , cumpre consignar o acerto do acórdão atacado,
sobretudo porque a pretensão do paciente não encontra guarida na legislação.

Em breve síntese, o inconformismo do paciente, ao buscar ver reconhecida


mácula processual decorrente de cerceamento de defesa, resulta do indeferimento do
pedido de abertura de prazo sucessivo à defesa do paciente para apresentar alegações finais,
tendo em vista que, na condição de colaboradores, os corréus assumem papel de acusação
na ação penal.

Para a exata compreensão da controvérsia, traz-se à baila os seguintes trechos


da decisão proferida na instância de piso:

“2. Peticionou, ainda, a Defesa de Aldemir Bendine requerendo que o prazo para a
apresentação de suas alegações finais não seja comum e sim posterior ao concedido às
Defesas dos colaboradores, Marcelo Bahia Odebrecht, Fernando Luiz Ayres da Cunha
Santos Reis e Álvaro José Galliez Novis, e do acusado confesso André Gustavo Vieira
da Silva.
Alega, para tanto, que a figura do colaborador assemelhar-se-ia mais a de um
acusador do que a de um acusado.

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Assim, seria uma espécie de Assistente de Acusação. O requerimento não tem
previsão legal, forma ou figura em Juízo.
O acusado colaborador não se despe de sua condição de acusado no processo. Apenas
optou, com legitimidade, por defender-se com a pretensão de colaborar com a Justiça.
Acolher o requerimento da Defesa de Aldemir Bendine seria o equivalente a
estabelecer uma hierarquia entre os acusados, distinguindo-os entre colaboradores e
não colaboradores, com a concessão de privilégios aos últimos por não terem
colaborado.
A lei estabelece prazo comum para a apresentação de alegações finais, ainda que as
defesas não sejam convergentes e não cabe à Justiça estabelecer hierarquia entre
acusados, todos com igual proteção da lei.
Assim, indefiro o pedido por manifesta contrariedade à lei'.

No mesmo diapasão, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região afastou a


nulidade aventada pela defesa, destacando a carência de fundamento legal da pretensão
defensiva, alicerçando-se, para tanto, na seguinte motivação:

(…)

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2. Com efeito, o prazo de alegações finais do art. 403 do Código de Processo Penal é
comum e a pretensão carece de fundamento legal. A tese de que os colaboradores
assumem papel de órgão de acusação não se sustenta, haja vista que a lei não faz
qualquer distinção entre eles.
Os colaboradores assumem idêntica posição que os demais e não se haveria, em nome
de suposta violação ao contraditório, cometer-se outra consubstanciada na
obrigatoriedade de apresentação de razões em caráter preliminar. Tanto é assim os
colaboradores foram igualmente denunciados e a proposta redução de pena lançada
nas razões finais ministeriais, decorre de previsão legal que beneficia aquele que se
dispõe a colaborar com a apuração da verdade, ainda que sem acordo formal.
Fato é que os contornos da lide foram traçados na denúncia e na instrução, inclusive
em depoimentos de corréus com a participação da defesa do paciente. E, nesses
exatos termos, resta assegurado o contraditório e a ampla defesa.
Assim, não se trata, como a defesa afirma, de 'elementar interpretação sistemática do
ordenamento jurídico leva, sem grande esforço, que a regra constitucional do
contraditório e, também da ampla defesa não podem ser sobrepujadas pelo vazio
normativo'.
Embora tentadora a tese, de vazio normativo não se está a falar. Trata-se de opção do
legislador ordinário, a quem legitimamente compete, por força da mesma
Constituição Federal, fixar os ritos processuais adequados. O devido processo legal
constitucional tem como norte a Carta Política, mas não sobrevive isoladamente sem
observância da lei adjetiva, que é o instrumento legal que lhe dá contornos.
De resto, este Tribunal, na mesma linha das Cortes Superior, não tem descuidado para
os casos em que seja aconselhável a intervenção pontual, nos casos em que se discute
inépcia da denúncia, por exemplo, ou mesmo a produção de determinadas provas, mas
sempre em caráter excepcional diante de flagrante ilegalidade, o que não é o caso dos
autos em que, ao revés, há mera aplicação da normativa processual.

Das decisões acima transcritas, verifica-se que a questão foi devidamente


enfrentada nas instâncias ordinárias, não consubstanciando o ato apontado como coator
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qualquer constrangimento ilegal, como acertadamente destacado pelo Superior Tribunal de
Justiça no acórdão objurgado.

Em verdade, o ato acoimado de ilegal ou gerador de mácula processual


consiste, nada mais, do que a mera – e, frise, correta – aplicação da norma processual
prevista no art. 403, §3º, do Código de Processo Penal, cuja incidência somente poderia ser
afastada diante de exceção expressamente prevista em lei, o que não é o caso.

Deveras, a regra legal inserta no art. 403, §3º, do Código de Processo Penal
pela Lei nº 11.719/2008 é clara no sentido de que, constatada a complexidade do caso em
julgamento ou a significativa quantidade de acusados, o juiz pode converter os debates
orais em memoriais escritos, dando-se às partes – acusação e defesa – prazos sucessivos de
5 dias para apresentá-los.

Na hipótese de pluralidade de réus, é amplamente sabido, e há muito aplicado

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na praxe jurídica, que o prazo para oferecimento das alegações finais é comum a todos os
acusados, inclusive nas hipóteses em que diferentes réus são patrocinados por um mesmo
procurador, ainda que as defesas não sejam convergentes. Nesse sentido, confira-se os
seguintes precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA.


AÇÃO PENAL COM VÁRIOS RÉUS. ALEGAÇÕES FINAIS. PRAZO COMUM.
CARGA DOS AUTOS. PEDIDO INDEFERIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA.
INOCORRÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO VIOLADO.
RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Não se verifica direito líquido e certo violado a ensejar a concessão da ordem,
notadamente porque o indeferimento da pretensão de obtenção de carga dos autos
deu-se de forma devidamente fundamentada, levando-se em consideração as
peculiaridades do caso concreto e de acordo com as disposições legais pertinentes.
2. Decisão mantida por seus próprios fundamentos.
3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRg no RMS 43.235/PR, Rel.
Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em
03/09/2013, DJe 17/09/2013).

PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS.


OFERECIMENTO DE ALEGAÇÕES FINAIS. PEDIDO DE VISTA DOS AUTOS
FORA DO CARTÓRIO. DIFERENTES PATRONOS CONSTITUÍDOS PELOS
RÉUS. PRAZO COMUM. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA.
I - Na dicção do art. 40, § 2º do Código de Processo Civil (redação original), de
aplicação subsidiária ao processo penal, sendo comum às partes o prazo, apenas em
conjunto ou mediante prévio ajuste poderão os procuradores retirar os autos do
cartório, circunstância não observada na espécie.
II - Destarte, não consubstancia cerceamento de defesa a r. decisão que, face a
inexistência de acordo entre os defensores, indefere pedido de vista dos autos fora de
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cartório para apresentação das alegações finais (Precedente) mas, não obstante,
disponibiliza ao patrono do recorrente o acesso aos autos em cartório e a obtenção de
cópias do processo.
Recurso desprovido. (STJ, RHC 26.911/MG, Rel. Ministro FELIX FISCHER,
QUINTA TURMA, julgado em 18/03/2010, DJe 03/05/2010).

As normas de regência da questão em debate, sejam do CPP, sejam da Lei nº


12.850/13, não fazem qualquer diferenciação entre corréus colaboradores da Justiça e
aqueles não colaboradores; ambos integram, em igualdades de condições, o polo passivo da
relação processual, submetendo-se, portanto, aos mesmos prazos processuais.

Nesse ponto, conforme adequadamente asseverado no acórdão combatido,


“acolher o requerimento da Defesa de Aldemir Bendine seria o equivalente a estabelecer
uma hierarquia entre os acusados, distinguindo-os entre colaboradores e não
colaboradores, com a não concessão de privilégios aos últimos por não terem
colaborado”.

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A tese de que os colaboradores assumem papel semelhante a de assistente de
acusação, além de ser, no mínimo, criativa, esbarra no impedimento previsto no art. 270 do
CPP, que assim dispõe: “O co-réu [sic] no mesmo processo não poderá intervir como
assistente do Ministério Público.” Vê-se, aqui, que o legislador ordinário vedou,
expressamente, a possibilidade de que alguém figure, na mesma ação penal, a posição de
acusado e acusador, fazendo cair por terra a argumentação defensiva.

Dessa forma, não cabia outro proceder ao Juiz processante senão abrir vista às
defesas, em prazo comum, para apresentação de alegações finais. Portanto, não há falar em
cerceamento de defesa.

Ao lado da carência de fundamento legal, a pretensão dos impetrantes vai de


encontro ao princípio do “pas de nullité sans grief”, porquanto não houve demonstração de
efetivo prejuízo para a defesa decorrente da decisão impugnada.

Ao que se extrai do presente in folio, o paciente tinha conhecimento dos fatos


contra si atribuídos e pôde, ao longo da instrução, inclusive em depoimentos de corréus,
exercer, de forma ampla e satisfatória, seu direito de defesa, o que veda a declaração de
nulidade, nos termos previstos no art. 563 do Código de Processo Penal.

Com efeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido


de que a demonstração de prejuízo, “a teor do art. 563 do CPP, é essencial à alegação de
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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA

Documento assinado via Token digitalmente por PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA RAQUEL ELIAS FERREIRA DODGE, em 01/08/2018 15:26. Para verificar a assinatura acesse
nulidade, seja ela relativa ou absoluta, eis que […] o âmbito normativo do dogma
fundamental da disciplina das nulidades - pas de nullité sans grief - compreende as
nulidades absolutas” (HC 85.155/SP, Rel.ª Min.ª Ellen Gracie).

Da mesma maneira, em seu art. 566, estatui o Código de Processo Penal que
não será declarada nulidade que não houver influído na apuração da verdade substancial ou
na decisão da causa.

No particular, mostra-se pertinente a consideração feita pelo STJ, no sentido de


que “os fatos narrados se viram adequadamente identificados no curso da ação penal,
sobretudo nos interrogatórios, tendo o paciente, desde o início da persecução, até o seu
desenrolar final, amplo acesso aos elementos de cognição, desde sua gênese, não
havendo, em hipótese alguma, que se falar em cerceamento de defesa ou mesmo que se
vislumbrar prejuízo ou ilegalidade.”

http://www.transparencia.mpf.mp.br/validacaodocumento. Chave 44AB28D5.9470C85D.998B603F.0995ED89


Nesse contexto, não se vislumbra qualquer irregularidade na decisão singular
que indeferiu o pedido de concessão de prazo sucessivo ao paciente para apresentar
alegações finais após os demais corréus, seja porque devidamente fundamentada em
consonância com a sistemática processual vigente, seja porque não representou efetivo
cerceamento de defesa, não havendo, portanto, constrangimento ilegal a ser sanado na
presente via.

III

Em face do exposto, a Procuradora-Geral da República manifesta-se pelo não


conhecimento do mandamus ou, no mérito, pela denegação da ordem aqui buscada.

Brasília, 27 de julho de 2018.

Raquel Elias Ferreira Dodge


Procuradora-Geral da República

HC nº 157.627/PR 10

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