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I.

INTRODUÇÃO

O Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, disposto nos


artigos 948, 949 e 950 do Código de Processo Civil é o meio conferido a
qualquer pessoa, mediante a análise precípua de um caso concreto, de
impugnar os efeitos de leis ou atos normativos que se tornem ofensivos a
direito seu, por serem tais normas violadoras de norma constitucional.

Para que se percorra por esse tema, é necessário que sejam


ressaltados e relembrados alguns conceitos básicos da ciência jurídica. Um
deles diz respeito à hierarquia das normas no direito e, especificadamente
no direito brasileiro. Trata-se da divisão piramidal das normas, utilizando-
se da classificação instituída pelo jurista austríaco Hans Kelsen.

A Pirâmide Kelseniana, consagra que as leis, atos normativos,


decretos e etc. estão submetidos e subordinados às normas constitucionais
e, em assim sendo, dependem da conformidade com as mesmas para serem
criadas e operarem seus efeitos. Além disso, insta destacar que as normas
infraconstitucionais, desde seu nascedouro, têm presunção de serem
constitucionais.

Pirâmide Kelseniana
Quando lei ou ato normativo é ofensivo ou não se adequa à norma
constitucional, diz-se que se está diante de uma inconstitucionalidade. Para
que não se estenda em demasia, aqui será dividida a inconstitucionalidade
por dois vieses: a inconstitucionalidade ser formal ou material

A inconstitucionalidade é formal quando diz respeito ao


procedimento com que foi introduzida ao universo jurídico. Por exemplo,
se no processo de criação de uma lei não for atendido o requisito de
quórum, a lei restará inconstitucional, haja vista ser contrário à
organização do processo legislativo presente na Constituição Federal.

Tem-se a inconstitucionalidade material quando o próprio


conteúdo da norma é ofensivo à Constituição. Por exemplo, a existência de
lei que não permita e penalize a manifestação política em redes sociais. Tal
norma se compreenderia inconstitucional por ferir matéria constitucional
no que diz respeito à liberdade de expressão.

Para analisar a validade de lei ou ato normativo pela


conformidade ou não com a Constituição, o Direito Constitucional
prescreve o mecanismo chamado controle de constitucionalidade. Esse
instituto pode ser instrumentalizado de duas formas: por meio de um
controle concentrado ou por meio de um controle difuso ou incidental.

O controle concentrado é feito de forma direta ao Supremo


Tribunal Federal - STF, por meio das ações diretas (de
inconstitucionalidade, por omissão, declaratória de constitucionalidade e
etc.) onde a análise da constitucionalidade ou inconstitucionalidade da
ação ou da omissão será suscitada. Os legitimados para propor essas ações
são restritamente indicados no artigo 103 da Constituição Federal do
Brasil. Os efeitos da decisão do STF são para todos e

O controle difuso é feito no caso concreto e a declaração de


inconstitucionalidade ou constitucionalidade opera seus efeitos, em regra,
entre as partes. Pode ser feito por qualquer juiz singular ou por tribunal e
suscitado por qualquer parte, pelo Ministério Público, partes interessadas
e de ofício, pelo juiz.

É por esse viés, o do controle difuso de constitucionalidade, que


se passa a analisar o Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade.

II. O INCIDENTE DE ARGUIÇÃO DE


INCONSTITUCIONALIDADE

Para facilidade de leitura, chamar-se-á aqui o Incidente de


Arguição de Inconstitucionalidade de IAI. A cabeça do artigo 948 do
Código de Processo Civil de 2015 aduz sobre ele:

“Art. 948. Arguida, em controle difuso, a inconstitucionalidade de lei


ou de ato normativo do poder público, o relator, após ouvir o Ministério
Público e as partes, submeterá a questão à turma ou à câmara à qual
competir o conhecimento do processo.”

O caput do artigo 948 é clarividente quanto ao encaminhamento


do caso ao segundo grau de jurisdição. O mesmo deve ser feito em grau de
recurso. O órgão fracionário ao qual foi submetido o caso analisará, de
primeira, após a suscitação do incidente, a admissibilidade do mesmo. Não
sendo admitido, prosseguir-se-á com o julgamento.

II.1. A CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. (ART. 97,


CF)

O IAI é o instrumento pelo qual se operacionaliza o instituto da


cláusula de reserva de plenário, ou full bench, disposto no art. 97, CF que prediz:

“Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos
membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.”

Nesse toar, o inciso II do artigo 949 prescreve:


“Art. 949. Se a arguição for:

II - acolhida, a questão será submetida ao plenário do tribunal ou ao seu órgão


especial, onde houver”

Pela análise do texto da Lei Maior, bem como a do diploma Processual


Civil pátrio, observa-se que a regra é que a declaração de inconstitucionalidade
da lei ou ato normativo emanado do poder público, deve ser feita pela maioria
absoluta dos membros de determinado tribunal, seja pelo plenário ou órgão
especial, afastando-se a possibilidade de declaração por entendimento de órgão
fracionário e, menos anda monocraticamente.

A respeito disso, magistrou Fredie Didier:

“Reconhecida, pelo tribunal, a inconstitucionalidade de lei ou ato


normativo do Poder Público sem a obediência à cláusula de
reserva de plenário prevista no art. 97 da Constituição Federal,
cabe a interposição de recurso extraordinário, no qual se deve
alegar como violado esse dispositivo constitucional. Antes,
porém, se faz necessária a oposição de embargos de declaração,
destinados a suprir a omissão quanto à aplicação do referido art.
97. No julgamento dos referidos embargos, o tribunal poderá,
suprindo a omissão, anular o acórdão para atender a exigência
constitucional, remetendo o caso ao plenário ou órgão especial.”
Entretanto, quando da introdução deste texto, foi dito que o juiz
singular em primeiro grau também pode declarar a inconstitucionalidade. Seria
o juízo de piso, hierarquicamente superior a um desembargador ou a órgão
fracionário do tribunal?

Sabe-se que a resposta para tal questionamento é negativa. Entretanto,


no que cabe à declaração de inconstitucionalidade devemos analisar da seguinte
forma: um desembargador ou um órgão fracionário, entendem por todo o
tribunal em segundo grau de jurisdição? A resposta deve ser que não. Passemos
a analisar o juiz em primeiro grau. Este representa sozinho, para aquele caso, o
estado juiz e a jurisdição? A resposta deve ser positiva.

Ou seja, o Tribunal, por ser um órgão colegiado, precisa de todos os


seus membros, ou de um órgão especial para representá-lo no todo. E em assim
sendo, necessita que mais da metade de seus membros se posicione favorável ou
contrário a determinado tema, neste caso a inconstitucionalidade, para que esse
seja o entendimento do Tribunal.
O juízo de piso, singularmente, pode dar a palavra final sobre
determinado tema e, assim, declarar sozinho a inconstitucionalidade por
representar a jurisdição em primeiro grau. Não havendo recurso do que o
magistrado decidiu, a lei será inconstitucional para aquele caso.

II.2 A SÚMULA VINCULANTE Nº 10.

Em 2008 foi editada súmula vinculante pelo STF no que diz respeito
ao afastamento de lei, sem declaração de inconstitucionalidade, que não respeite
a regra da cláusula de reserva de plenário. Diz a súmula:

“Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de


órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua
incidência, no todo ou em parte.”

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