O autor desta obra declara que não a escreveu com intenção de que
saísse a público; mas, unicamente para por meio dela instruir certas
pessoas, que se quiseram servir dele para este ministério; e por isso
ficou tão sucinta: e como lhe faltou o tempo, e por outra parte
considerou que facilmente não poderia no Tratado do Tropos, e das
Figuras, propor melhores exemplares na Língua Portuguesa do que
aqueles que se acham no espelho da Eloquência, que já corre
impresso; atendendo à utilidade dos seus Discípulos, os transcrevo
quase do mesmo modo com que se acham no dito Original: e porque
este Livro é raro, para que todos se possam aproveitar deles, consente
se imprimam juntamente com este Ensaio; o qual sai a luz por ter
mostrado a experiência a grande utilidade que dele tiraram aquelas
pessoas para quem foi escrito.
ENSAIO DE RETÓRICA
1
Intituciones Livro 2 Cap. 15
2
De Inv.I. I.
com verdade, com graça e com eficácia. A de Cicero; porque sem
conhecer os defeitos que podem cometer-se na Oração, e as
perfeições que esta deve ter, e isto por uma longa observação, não
ser fácil dizer sem erro: e estas observações juntas é que formam
a Arte a que chamamos Retórica, como logo diremos. A última
explicação, enfim, também é boa, e clara; porque na substância
vem a dizer isto mesmo.
3
Ibid
para mau fim desta Arte; porque certamente não há cousa tão
santa de que não tenham abusado ou usado mal os homens.
4
Ibid. supra
Acerca da origem da Retórica é admirável a sentença de
Quintiliano. Diz que a natureza dera princípio ao dizer; e ao dizer
bem, e com arte, a observação. O que explica bem claramente
com o exemplo da Medicina. Assim como os homens, das
observações que fizeram sobre quais eram as cousas que faziam
bem ou mal à saúde, formaram a Medicina; do mesmo modo,
observando o que era próprio ou improprio para persuadir,
também destas observações formaram a Retórica.
Pelo que diz ordem à pessoa que persuade, ou lhe pode valer
de muito a razão, ou a autoridade, ou ambas estas cousas. A
autoridade funda-se no nascimento, na virtude, na ciência, no
poder, na reputação, e na fortuna, que é isto mesmo. A razão
consiste na justiça da causa, e na força dos argumentos. Quem
tiver autoridade, necessita menos da razão; e mais, quem não a
tiver. Donde se infere que somente se devem alegar, para
persuadir, as sentenças e os exemplos de pessoas nas quais
concorram as referidas qualidades.