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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ


FACULDADE CEARENSE
CURSO DE TURISMO

KAMYLLA BARBOZA EVARISTO

AS ATIVIDADES DE LAZER NA FORTALEZA BELLE ÉPOQUE

FORTALEZA
2012
1

KAMYLLA BARBOZA EVARISTO

AS ATIVIDADES DE LAZER NA FORTALEZA BELLE ÉPOQUE

Monografia submetida a aprovação da


Coordenação do Curso de Turismo do
Centro de Ensino Superior Faculdade
Cearense, como requisito parcial para
obtenção do grau de Graduação.

Orientadora: Profª Ms. Alyne Virino Ricarte

Fortaleza
2012
2

FICHA CATALOGRÁFICA
3

KAMYLLA BARBOZA EVARISTO

AS ATIVIDADES DE LAZER NA FORTALEZA BELLE ÉPOQUE

Monografia como pré-requisito para


obtenção do título de Bacharelado em
Turismo, outorgado pela Faculdade
Cearense – FaC, tendo sido aprovada pela
banca examinadora composta pelos
professores.
Data de aprovação:___/___/___

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________________
Profª Ms. Alyne Virino Ricarte (orientadora)

________________________________________________________
Profª Ms. Ariane Queiroz (examinadora)

________________________________________________________
Prof. Esp. Mansueto Brilhante (examinador)
4

Aqueles que estão comigo

desde sempre nesta

jornada chamada vida!

A Deus.

A minha mãe (Regina),


5

A meu pai (Roberto).

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar acima de tudo e de todos a Deus por me presentear


com a vida e por me abençoar com tão grandes oportunidades. Sem Ele nada disso
seria possível de acontecer.

A minha mãe, Regina, que é a melhor mãe do mundo, por acreditar em


mim e por me incentivar sempre, por nunca deixar que eu desistisse. Por financiar os
meus estudos e por ter me dado a oportunidade de ter uma boa educação.

Ao meu pai, Sr. Roberto Evaristo, por também ser o melhor pai do mundo,
por ter financiado os meus estudos e por ter me ensinado valores que aprendi para
toda a vida.

A minha irmã, Bebete, por ter me ajudado a encontrar material para as


minhas pesquisas e por ter ido comigo na biblioteca da UFC quando eu fui buscar
referências para começar o trabalho.

A minha orientadora Profª Ms. Alyne Virino, que aceitou tão gentilmente
me orientar, por ter ministrado tão bem essa disciplina apaixonante que é História do
Ceará e por isso me fez ficar mais encantada ainda por esse recorte da história de
Fortaleza, chamado: Fortaleza Belle Époque. Pela dedicação com que me instruiu a
fazer um bom trabalho e por ter aceitado fazer parte deste projeto.

Ao Prof. Nirez e ao Prof. Osmar Onofre, por terem sido tão pacientes
comigo e terem me recebido tão bem quando eu fui procurá-los para pedir
explicações sobre o meu tema.

Aos funcionários da Biblioteca Menezes Pimentel e do Museu do Ceará


pelas indicações dos livros.

Ao coordenador do curso de Turismo, Prof. Mansueto Brilhante por ter me


indicado o Prof. Cleiton que colaborou muito com as referências deste trabalho.

Ao Prof. Cleiton que me recebeu tão bem na Escola Paulo VI, e me deu
ótimas referências e ótimas dicas sobre o tema.

A Profª Ariane Queiroz, por ter sido tão atenciosa comigo e me responder
sempre que eu tinha dúvidas de como formatar o trabalho.
6

A todas as pessoas que contribuíram de alguma forma, para a realização


deste trabalho.

“Eu prefiro ser essa metamorfose

ambulante do que ter aquela velha

opinião formada sobre tudo.”

(Raul Seixas)

“Escolha um trabalho que você ame

e não terás que trabalhar

um único dia em sua vida.”

(Confúcio)
7

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo investigar quais as principais


atividades de lazer em Fortaleza no período denominado Belle Époque, para tanto
se utilizou de uma natureza básica de pesquisa, com procedimentos técnicos
voltados à pesquisa bibliográfica e pesquisas secundárias que foram baseadas em
autores que transmitem pensamentos e relatos sobre Fortaleza neste contexto
histórico. Através desta pesquisa procura-se repassar a perspectiva de lazer naquele
período para os fortalezenses e o que mudou na cidade com a construção de novos
equipamentos inspirados na Europa que era a referência de modelo de primeiro
mundo.

Palavras chave: Belle Époque. Lazer. Fortaleza


8

ABSTRACT

The present study aims to investigate the main leisure activities in


Fortaleza called Belle Epoque, was used for both basic nature of a search, with
technical producers aimed at secondary research and literature that were based on
authors that convey thoughts and reports about Fortaleza in this historical context.
Through this research seeks to pass on the prospect of leisure for fortalezenses in
that period and what has changed in the city with the construction of new facilities
inspired by Europe that was the reference model of the first world.

Keywords: Belle Epoque. Leisure. Fortaleza.


9

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 10
2 O LAZER 12
2.1 O Conceito de Lazer 12
2.2 Histórico do Lazer na Europa 14
2.2.1Histórico do Lazer no Brasil 15
2.3 As Atividades de Lazer 17
2.3.1 A Classificação das Atividades de Lazer 18
3 A BELLE ÉPOQUE 20
3.1 O que foi a Belle Époque 20
3.1.1 A Belle Époque Tropical no Rio de Janeiro 21
3.1.2 A Modernização e a “Civilização” do Rio de Janeiro 21
3.2 A Belle Époque contagia Fortaleza 27
4 AS ATIVIDADES DE LAZER NA FORTALEZA BELLE ÉPOQUE 34
4.1 O Passeio Público 34
4.2 As praças, os cafés e os bondes 38
4.3 A chegada da fotografia e o surgimento do
cinema em Fortaleza 44
4.4 Os clubes e o glamour dos carnavais 46
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 49
REFERÊNCIAS 51
10

1 INTRODUÇÃO

Ao longo do tempo o mundo observa as transformações que ocorrem no


espaço, na sociedade e na cultura dos povos. Neste momento a construção
historiográfica entra em cena para que esses acontecimentos possam ser
imortalizados através de documentos, livros, pinturas rupestres, obras de arte, entre
outros. São exatamente estas transformações que explicam o mundo de hoje.

O presente trabalho que tem como tema: As Atividades de Lazer na


Fortaleza Belle Époque procura fazer uma abordagem das principais atividades de
lazer em Fortaleza neste período denominado Belle Époque, isso porque no final do
século XIX e início do XX uma série de equipamentos e espaços destinados ao lazer
foram construídos nos principais logradouros de Fortaleza.

O recorte da época Belle Époque foi escolhido porque é neste momento


que a capital cearense começa a tomar impulso e progredir até tornar-se a
metrópole que é hoje.

A natureza desta pesquisa se propôs como básica, sem aplicação prática


e sim com construções mais universais de ideias. E nos procedimentos técnicos
baseia-se nas pesquisas bibliográficas, material já publicado, constituído
principalmente de livros, artigos de periódicos e atualmente com material
disponibilizado na Internet.

O trabalho está dividido em cinco capítulos em que serão abordados os


temas de Lazer, Belle Époque e As Atividades de Lazer na Belle Époque de
Fortaleza e subdividido em tópicos que explicarão melhor sobre os assuntos a serem
trabalhados.

O segundo capítulo trará os conceitos de lazer na visão de alguns autores


especializados neste tema, apresentará o histórico do lazer na Europa e no Brasil,
além de conceituar atividades de lazer e classificá-las para que as mesmas sejam
relacionadas com o assunto da Belle Époque no quarto capítulo.

O terceiro capítulo explicará ao leitor o que é este período chamado de


Belle Époque, como o Brasil viveu este momento que foi palco de profundas
11

mudanças na sociedade e em seu modo de viver e como Fortaleza foi envolvida por
este momento a ponto de quase perder sua identidade para a cultura francesa. Além
disso, será feito um comparativo entre a então capital do Brasil, Rio de Janeiro e a
cidade de Fortaleza.

Por último o quarto capítulo apresentará a relação da Belle Époque com


as atividades lazer, desde os equipamentos construídos exclusivamente para estes
belos tempos, como: o Passeio Público, os cafés, a remodelação de outros já
existentes como as praças, a mobilidade urbana que servia de apoio para o
deslocamento dos habitantes para as áreas de lazer, distantes, as extasiantes
novidades vindas da Europa aportando na cidade, como é o caso da fotografia, do
cinema e dos luxuosos bailes de carnavais nos clubes construídos para a alta
sociedade fortalezense.
12

2 O LAZER

Neste capítulo serão apresentados os conceitos de lazer, o histórico do


lazer na Europa e no Brasil, as atividades de lazer e as características das
atividades de lazer.

Desde os tempos mais remotos o homem sempre teve a necessidade de


ter um tempo reservado a si mesmo para descanso ou para executar atividades que
trouxessem a sensação de bem estar, pois:

Alguns autores consideram que se os homens sempre trabalharam, também


paravam de trabalhar, existindo assim um tempo de não-trabalho, e que
esse tempo seria ocupado por atividades de lazer, mesmo nas sociedades
chamadas “tradicionais”. (MARCELLINO, 2006, p. 54).

A seguir o tópico apresentará alguns conceitos da palavra lazer até obter-


se a atual definição desta palavra.

2.1 O Conceito de Lazer

O lazer por muitas vezes pode ter sido confundido com ócio, pois tanto o
lazer como o ócio possuem conceitos próximos, são um tempo livre que todos os
trabalhadores têm direito, com a diferença que no lazer o individuo pratica alguma
atividade de seu interesse e o ócio poderia ser simplesmente não fazer nada.
(AQUINO; MARTINS, 2007).
Os primeiros conceitos da palavra lazer surgiram por volta da metade do
século XIX e naquele período, “o lazer foi entendido apenas como um tempo
disponível depois das ocupações, como pode ser constatado no Dictionnaire de la
langue Française, elaborado por Maximilien Littré no decorrer dos anos 1860”
(GOMES; MELLO, 2003 p.25).
Neste caso este conceito poderia estar indiretamente se referindo ao ócio
e não especificamente ao lazer como se conhece hoje.
13

Entretanto, há aqueles autores que afirmam que somente depois das


conquistas dos direitos dos trabalhadores foi possível fazer a diferenciação entre
ócio, lazer e trabalho

O ócio é tão antigo quanto o trabalho, porém, somente após a Revolução


Industrial, com o surgimento do chamado tempo livre, que representa uma
conquista da classe operária frente à exploração do capital, é que foi
evidenciado, ocorrendo a nítida separação entre tempo-espaço de trabalho
(produção) e lazer (atividades contrárias ao trabalho) enquanto tempo para
as atividades que se voltam para a reposição física e mental (AQUINO;
MARTINS, 2007, p. 485).

Segundo Gomes e Mello (2003) somente em 1930 a palavra lazer ganhou


um novo significado, pois o Dictionnaire de Claude Augé definiu o lazer como:
“distrações, ocupações às quais o indivíduo poderia se entregar de espontânea
vontade, durante o tempo não ocupado pelo trabalho” (GOMES; MELLO, 2003,
p.25).
Mas foi o sociólogo Dumazedier (1962) quem deu um novo contexto a
palavra lazer, sendo até hoje uma das definições mais aceitas,

o lazer é um conjunto de ocupações às quais o individuo pode se dedicar


prazerosamente, seja para relaxar, divertir-se ou alargar seu conhecimento
e sua participação social espontânea, o livre exercício de sua capacidade
criativa, após ter-se desembaraçado de suas obrigações de trabalho,
familiares e sociais (DUMAZEDIER, 1962, p.29 apud TASCHNER 2000).

No entanto a palavra lazer ainda ganha novas conotações e vem sendo


alvo de muitas críticas por estar associada também ao consumo o que pode causar
uma falsa impressão de seu real conceito nas pessoas, de acordo com Marcellino
(2006), por ser associada a experiências individuais que são vividas dentro da
chamada sociedade de consumo, ou seja, cada dia mais o consumismo vêm
ganhando significado de lazer entre as pessoas que preferem ir ao shopping, por
exemplo, fazer compras para se distrair ao invés de procurarem ocupação com
atividades realmente significativas e prazerosas.

Outra definição para a palavra lazer é a do jornalista brasileiro Camargo


(2006) em seu livro “O que é Lazer?” afirma que:

O lazer é um tempo precioso para o exercício do conhecimento e satisfação


da curiosidade intelectual, em todos os campos, seja através da
14

conversação aparentemente banal com os amigos, seja através dos meios


de difusão eletrônica, seja através da consulta especializada (CAMARGO,
2006, p. 25).

Há ainda outro conceito para a palavra, segundo Cavalcanti ,o lazer seria:

uma construção ideológica, sob a qual o antilazer se aproveita para penetrar


mais eficazmente no mundo de vida das pessoas, com o objetivo de mantê-
las perfeitamente integradas na sociedade industrial e urbana: ou, no dizer
de Pascal, como “o ruído que nos desvia de pensar na nossa condição e
nos diverte” ( CAVALCANTI apud MARCELLINO, 2006, p. 16).

O que se pode afirmar é que até os dias de hoje ainda existem muitos
conceitos que associam o lazer sempre a algum passatempo ou outras atividades
lúdicas, pelo fato de não só a maioria da população confundir ou vincular o lazer “às
atividades recreativas, ou a eventos de massa” (MARCELLINO, 2006, p. 13), mas
também devido a divulgações midiáticas ou de instituições publicas promotoras dos
eventos.
O conceito de lazer é algo muito recente surgiu em meados do século XX
e como foi dito antes desde muito tempo o homem sempre teve necessidade de ter
um tempo livre para praticar suas atividades e este tempo foi “roubado” dos
trabalhadores no período que antecedeu a virada do século, na Revolução Industrial
mais especificamente quando a carga horaria de trabalho chegava ao extremo das
16 horas diárias (CAMARGO, 2006) sem direito a férias, fins de semana ou a
remuneração por horas extras.
O tópico seguinte trará a reflexão de como surgiu os primeiros indícios do
direito ao lazer.

2.2 Histórico do Lazer na Europa

No primeiro tópico falou-se sobre alguns dos conceitos de lazer mais


aceitos pelos principais autores, agora será abordado o histórico do lazer pela
Europa e no Brasil e a necessidade do lazer, principalmente nas sociedades
industriais do final do século XIX que por muito tempo foram privadas dos benefícios
do lazer.
15

Os primeiros indícios sobre a questão do lazer começaram a surgir no


final do século XIX como afirma Marcellino “a partir do advento da chamada
“sociedade industrial”” (MARCELLINO, 2006, p.3). Neste interim os operários tinham
uma jornada de trabalho de 5000 horas por ano como afirma Camargo (2006), ou
seja, trabalhavam de domingo a domingo sem nenhum tempo para a família e
“trabalhava-se até a morte, geralmente prematura”. (CAMARGO, 2006 p.38).
“É na Europa motivado pelas condições de trabalho industrial [...] que
surge o primeiro “manifesto” a favor do lazer dos operários, o clássico O Direito à
Preguiça, do militante socialista Lafargue, publicado em 1880” (MARCELLINO, 2006,
p.3).
Seguindo ainda esta afirmativa, Lafargue não entendia que “os operários
fossem tão tolos, a ponto de lutarem pelo direito ao trabalho, em vez de lutarem
diretamente, sem subterfúgios, pelo direito aos mesmos privilégios de lazer dos
patrões” (CAMARGO, 2006, p.39).

Diante de todo este cenário observou-se no inicio da industrialização que:

Quando o desenvolvimento industrial começou a atingir as cidades, não


havia distinção entre áreas habitacionais, áreas de lazer e áreas industriais.
Neste tipo de cidade industrial, o panorama urbanístico se apresenta
homogêneo, isto é, a medida que as pessoas vão chegando em busca de
trabalho (...) instalam-se no perímetro adjacente ou próximo a elas (BACAL,
2003, p.76).

Podendo entender-se que neste período os trabalhadores viviam


exclusivamente para o trabalho como se não existisse nada mais importante em
suas vidas, em outras palavras, não tinham como pensar em nada além do trabalho.
Nó tópico seguinte será exposto o histórico do lazer pelo Brasil.

2.2.1 Histórico do Lazer no Brasil

No Brasil diferente da Europa os estudos do lazer estão mais


relacionados ao processo de urbanização do que ao modelo industrial europeu e de
outros lugares. “Pelo menos cinquenta anos separam o desenvolvimento dos
estudos sobre o lazer na Europa e no Brasil” (MARCELLINO, 2006, p.4).
16

Isto se deve ao fato de que “esta é uma preocupação recente dos


pesquisadores e pensadores brasileiros” (MARCELLINO, 2006, p.4), por este motivo
os “clássicos” direcionados ao tema só “foram traduzidos e publicados no Brasil no
final da década de 60” (MARCELLINO, 2006 p.5).
Esta afirmação pode ser confirmada em obras e espaços públicos
destinados ao lazer dos habitantes, construídas no final do século XIX que é
exatamente o período que predomina o processo de urbanização, no caso de
Fortaleza, por exemplo, o Passeio Público de Fortaleza foi uma das principais
construções da cidade totalmente voltada para o lazer dos habitantes,

O Passeio tornou-se de pronto a principal área de lazer e sociabilidade, até


que despontassem outras tentadoras opções a partir do século XX, como o
Theatro José de Alencar (1910) e os cines Majestic e Moderno (1917 e
1921) respectivamente. (PONTE, 2010, p.37).

Antes deste período, as pessoas pareciam não se preocupar com a


prática de atividades lúdicas ao ar livre ou saíam de casa com frequência para
passeio, aliás, sair de casa era um comportamento raro, principalmente nas classes
mais abastadas, este comportamento chamou a atenção de alguns autores porque:

o fato de inexistir nas elites e classe médias do Rio de Janeiro, até o meado,
do século XIX, o hábito de sair de casa, a não ser pela frequência
socialmente obrigatória à missa dominical. A intenção das classes
dominantes era bastante clara nesse aspecto: deixar evidente sua profunda
diferença em relação aqueles que, desprovidos de qualquer nobreza,
necessitavam trabalhar com base no esforço muscular. Tal atitude deixa
profundas marcas nos espaços públicos de nossas cidades: durante a maior
parte do tempo estes seriam povoados quase que exclusivamente pelas
massas de negros escravos em sua pesada labuta cotidiana [...].
(DELGADO DE CARVALHO apud DE JESUS 1999 p. 22).

Este é um exemplo do cotidiano dos habitantes do Rio de Janeiro, o que


também não era muito diferente do restante do Brasil, mas alguns anos depois com
o processo de urbanização e remodelação dos espaços públicos, esta situação
começa a mudar e até mesmo o banho de mar que antes só era recomendado por
prescrição médica para tratar problemas dermatológicos para passou a ganhar
popularidade entre os cariocas, como afirma Araújo (1995), neste período o banho
de mar passa a ganhar uma nova conotação, isto porque o banho de mar se difundiu
para fins terapêuticos e assim, “iniciou-se um processo de apropriação da praia
como local de lazer. Em 1896, uma crônica na imprensa alertava para a excitação e
17

alegria dos banhistas que começavam a frequentar diariamente a praia por prazer”
(ARAÚJO, apud DE JESUS 1999 p. 27).
No Brasil, principalmente no Rio de Janeiro percebeu-se que o lazer aos
poucos foi adotado pela sociedade em um período bem recente, praticamente no
inicio do século XX, pois representava a modernização a qual o país estava sendo
inserido.
A seguir uma idéia do que pode ser considerada como atividade de lazer.

2.3 As Atividades de Lazer

As atividades de lazer variam de acordo com o tempo e com a preferência


de cada individuo já que com a modernidade novos equipamentos são sempre
apresentados à sociedade com o intuito de entretê-las.
Segundo Camargo (2006) as atividades de lazer devem transmitir ao
individuo a sensação de prazer e a escolha destas atividades é feita de acordo com
as preferências pessoais de cada um na busca deste prazer. O autor afirma que
“[um] bate-bola entre amigos numa rua ou numa praia é uma atividade de lazer. [...]
Da mesma forma, lazer é assistir uma palestra de um escritor ou sobre um tema que
se aprecie” (CAMARGO, 2006, p.9).
Este é um conceito bem apropriado e original, pois é exatamente isto que
as atividades de lazer devem oferecer, prazer e realização ao individuo,

as atividades de lazer devem procurar atender as pessoas no seu todo.


Mas para tanto, é necessário que essa mesmas pessoas conheçam os
conteúdos que satisfaçam os vários interesses, sejam estimuladas a
participar e recebam um mínimo de orientação que lhes permitam opção.
Em outras palavras, a escolha, a opção, está diretamente ligada ao
conhecimento das alternativas que o lazer oferece. Por esse motivo é
importante a distinção das áreas abrangidas pelos conteúdos de lazer.
( MARCELLINO, 2006, p. 17).

O que o autor quer dizer é que o lazer deve ser segmentado para atender
as diferentes expectativas e preferencias do público alvo, mas também para que
possa ser compreendido pela sociedade, pois esta é uma problemática que ainda
perdura e que autor faz questão de ressaltar

No entanto o que se verifica é que as pessoas geralmente restringem suas


atividades de lazer a um campo especifico de interesses. E geralmente o
18

fazem não por opção, mas por não terem tomado contato com outros
conteúdos. (MARCELLINO, 2006, p. 19).

Esta é uma observação interessante de como as pessoas tendem a


seguir o que está na moda ou seguir a regra que a sociedade dita ao invés de
procurar satisfazer seus próprios interesses sem se preocuparem com o que os
outros vão pensar.
Marcellino ainda afirma que os “conteúdos do lazer podem ser os mais
variados e para que uma atividade possa ser entendida como lazer é necessário que
atenda a alguns valores ligados aos aspectos tempo e atitude [...]” (MARCELLINO,
2006, p13).
O próximo tópico apresentará a classificação das atividades de lazer e
alguns exemplos do que pode se considerar como tais atividades.

2.3.1 A Classificação das Atividades de Lazer

Encontrar uma definição para a palavra lazer foi um esforço que perdurou
por algum tempo, embora até hoje esta palavra ainda seja confundida com a
recreação, por exemplo, mas com este conceito foi possível classificar as atividades
para que pudesse facilitar a sua compreensão.
“A classificação das atividades de lazer mais aceitas é a que distingue
seis áreas fundamentais: os interesses artísticos, os intelectuais, os físicos, os
manuais, os turísticos e os sociais” (MARCELLINO, 2006, p. 18), que por sinal é a
mesma classificação aceita pelo sociólogo Dumazedier, com exceção dos interesses
turísticos, isto significa que o autor segue a mesma linha de pensamento do
sociólogo, embora Camargo afirme que “esta não é uma classificação perfeita e que
também seria necessário acrescentar os interesses turísticos” (CAMARGO, 2006,
p.18). Camargo ainda afirma que “a classificação das atividades de lazer é muito
controvertida, tal o numero de soluções propostas” (CAMARGO, 2006, p.16), isto
significa que esta classificação não é algo tão simples como se pensa porque,

Se para algumas pessoas o futebol, a pescaria, a jardinagem constituem


atividades de lazer, certamente isso não se verifica, em todas as
19

oportunidades, para o jogador profissional, o pescador que depende da sua


produção, ou para o jardineiro.
Além disso, aquilo que pode ser altamente prazeroso para determinada
pessoa, não raro significa tédio ou desconforto para outro indivíduo.
Assim as circunstancias que cercam o desenvolvimento dos vários
conteúdos são básicas para a caracterização das atividades
(MARCELLINO, 2006, p.8).

Resumindo, a classificação da atividade de lazer depende do contexto


que está sendo observado, pois o profissional pode até considerar seu trabalho
como lazer, mas isto ainda é motivo de muitas controvérsias porque de acordo com
o conceito o lazer não pode ser associado ao trabalho, pois o lazer é exatamente o
tempo disponível depois do trabalho que é utilizado para a pratica de alguma
atividade, assim o jogador de futebol, por exemplo, não pode considerar em campo
como se estivesse em uma brincadeira, embora esta é uma alternativa que pode ser
considerada em alguns momentos de tensão durante o jogo, que pode fazer o
jogador esquecer um pouco que está trabalhando e encarar a partida como se fosse
uma brincadeira, mas isto só por alguns momentos porque logo ele vai lembrar que
tem um trabalho a cumprir e uma responsabilidade muito maior.
Enfim, este capítulo abordou o conceito de lazer para que possa ser
compreendido como o lazer foi inserido na sociedade e nos capítulos seguintes,
possa ser entendido como a sociedade cearense de Fortaleza encarava o lazer e
quais os tipos de atividades as pessoas praticavam.
No próximo capitulo serão apresentados os conceitos de Belle Époque na
Europa e como esta contagiou a cidade de Fortaleza, também procurar-se-á abordar
como se comportava a sociedade cearense de Fortaleza no final do século XIX, seu
cotidiano, as principais transformações na cidade para que depois se compreenda
sua relação com as atividades de lazer.
20

3 A BELLE ÉPOQUE

Este capítulo abordará o período denominado Belle Époque, e como este


“movimento” influenciou a sociedade cearense de Fortaleza, o capítulo ainda
apresentará o cotidiano dos habitantes de Fortaleza no final do século XIX e na
transição para o século XX.

3.1 O que foi a Belle Époque?

Muito se houve falar na expressão Belle Époque em artigos, revistas ou


livros, mas nem todas as pessoas sabem explicar o que foi realmente este período
denominado Belle Époque, a expressão Belle Époque vem do francês e significa
belos tempos, e foi assim chamada para designar este período que ocorreu
significativas mudanças e melhorias tecnológicas.

A Belle Époque é o período caracterizado pela expressão de grande


entusiasmo vinda do triunfo das conquistas materiais e tecnológicas, como a
luz elétrica e o telefone, entre outras invenções, nas últimas décadas do
século XIX e primeiras do XX (FOLLIS, 2004, p.2).

O que se sabe também é que durante a Belle Époque inúmeros


acontecimentos marcam o período num “curto” espaço de tempo, pois ao longo da
história fatos que demorariam séculos para acontecerem surgiram numa média de
quarenta anos, além disso:
O surgimento vertiginoso, naquele período, de máquinas e inovações
fantásticas como o automóvel, o cinema, o telefone, a eletricidade e o avião,
causou furor e culto entusiástico à ciência e ao progresso. Trata-se, portanto
de uma época de intensas transformações que afetaram a economia e a
política e alteraram de maneira profunda os modelos de viver, perceber e
sentir (PONTE, 2009, p.69)

Apesar da expressão Belle Époque ser usada para designar esses


acontecimentos extasiantes, para a época esses belos tempos não foram tão belos
assim, pelo menos no Brasil e para a camada mais pobre da população:
21

“A época, portanto, só foi bela para as elites e parcelas das camadas


sociais médias; para os pobres ela foi sinônimo de vigilância policial, controle de
hábitos e confinamento de corpos” (PONTE, 2009, p.69).

A França era vista como um modelo de primeiro mundo e foi a principal


influência europeia para os outros países, inclusive o Brasil, não demorou muito para
que o restante do mundo também se engajasse nessa onda de afrancesamento, por
esse motivo a inserção do Brasil neste período foi visto como símbolo de
modernização e urbanização das principais capitais do país, incluindo Rio de Janeiro
como será visto no próximo tópico.

3.1.1 A Belle Époque Tropical no Rio de Janeiro

No final do século XIX a então capital do Brasil, Rio de Janeiro passa a


assistir grandes transformações em sua paisagem, nos hábitos e cotidianos da
sociedade, o processo de remodelação e “civilização” começa a tomar impulso e aos
poucos a modernização toma de conta da capital inserindo o Rio de Janeiro na Belle
Époque (CRESPO 2005).
De acordo com o autor Gilmar de Jesus os esportes também contribuíram
para a inserção do Rio de Janeiro na Belle Époque, porque

ao iluminar determinados momentos e lugares do processo de


esportivização da sociedade carioca no inicio do século, estamos
contribuído para uma compreensão mais ampla do que significou, no plano
de estruturas da vida cotidiana, nossa inserção na Belle Époque. (DE
JESUS, 1999, p. 34).

A Belle Époque brasileira é marcada por tantos inúmeros acontecimentos


e também pelo progresso que houve na capital brasileira, que é o marco inicial da
Belle Époque no restante do país.

3.1.2 A Modernização e a “Civilização” do Rio de Janeiro

Como capital do até então, Império, é no Rio de Janeiro que começam a


ser notadas as primeiras medidas modernizadoras do país
22

Ponto de encontro de diplomatas estrangeiros e negociantes, o Rio de


Janeiro passou por importantes mudanças urbanísticas a partir da segunda
metade do século XIX, Em 1854,por exemplo, suas ruas ganharam
iluminação a gás e serviço de bondes puxados a burro. Nos anos seguintes,
iniciou-se o calçamento das zonas nobres e, em diversos pontos, foram
construídos esgotos. Novos bairros surgiram e avenidas e ruas foram
projetadas. [...] Mas essas melhorias não beneficiaram as camadas mais
baixas da sociedade. Os pobres, que viviam na periferia, passaram a alugar
cômodos nos antigos casarões da região central – que foram transformados
em cortiços – para ficar perto de seus locais de trabalho (CHALHOUB apud
GISLANE; REINALDO 2008, p.347).

Pouco tempo depois o cotidiano da cidade começa a ganhar ares


franceses e logo em seguida a influência francesa toma de conta da vida dos
cariocas no final do século XIX como pode ser visto na figura abaixo (Figura 1), as
pessoas vestiam-se como os franceses e adotaram hábitos franceses como símbolo
deste progresso que a cidade estava vivendo.

Figura 1: Cotidiano da Sociedade Carioca na Belle Époque


Fonte:http://monamiemadit.blogspot.com.br/2011/07/belle-epoque.html

Uma das principais obras construídas neste período foi a construção da


Avenida Central, de acordo com Boaventura (2011), esta inspirada nos modelos e
nas reformas europeias.
Em “apenas um ano e meio a Avenida Central estendia-se por quase 2
quilômetros, com 33 metros de largura” (NEEDEL apud BOAVENTURA 2011, p.
117).
Com a chegada de Rodrigues Alves a Presidência da República em 1902
e tendo como prefeito Pereira Passos o processo de remodelação da capital se
intensifica cada vez mais, neste período também foi ampliado o cais do porto, as
23

ruas foram alargadas, dando origem aos boulevards e foram construídos a Biblioteca
Nacional e o Teatro Municipal (GISLANE; REINALDO, 2008).
Segundo o autor Jeffrey Needel, “a Avenida Central é a melhor expressão
da belle époque carioca. Uma magnífica paisagem urbana que passou a embelezar
a capital cosmopolita da Republica. Era um verdadeiro monumento ao progresso do
país” (NEEDEL apud BOAVENTURA, 2011, p. 117).
Abaixo na imagem (Figura 2) observa-se a Avenida Central no ano de
1909:

Figura 2: Vista da Avenida Central (atualmente Avenida Rio Branco) no Rio de Janeiro em 1909.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Avenida_Rio_Branco_(Rio_de_Janeiro)

Para o autor Boaventura, essas “reformas do prefeito Pereira Passos,


mudaram o uso do espaço publico” (BOAVENTURA, 2011, p.117), isso porque as
ruas passaram a ser movimentadas pelas elites e classe média que antes quase não
tinham o hábito de sair de casa, além disso, a influência francesa tomara de conta
da capital e podia-se notar o afrancesamento em todos os lugares, na avenida
Central por exemplo, como afirma o autor Needel (1993), [o] “novo boulevard tropical
transformou-se no espaço principal para o consumo de artigos importados em lojas
luxuosas e elegantes, para exibir vestidos confeccionados nas mais belas fazendas
francesas à moda francesa ou inglesa” (NEEDEL apud BOAVENTURA, 2011, p.
117).
24

Um exemplo de como a moda e da cultura francesa influenciaram este


período pode ser visto na novela da Rede Globo de Televisão, Lado a Lado, o que
se observa é um desfile de roupas e artigos de luxo totalmente inspirados nos
modelos franceses por parte das elites, que de acordo com Bety Orsini:

desenvolve-se uma maneira nova de estar na urbe, e o vestuário refletia


“isso”, mais do que “ser” moderno, era fundamental “parecer’ moderno,
mesmo que isso significasse usar roupas e sapatos desconfortável. [...]
A imagem masculina estava vinculada ao trabalho profissional; portanto, as
roupas masculinas deveriam transmitir idéias de sobriedade e dinamismo.
Não importava que já fizesse aquele calor que todos conhecemos. (ORSINI,
2011).

Na figura abaixo (Figura 3) observa-se claramente essa tendência em


seguir a moda europeia, o elenco da novela Lado a Lado com as vestimentas
predominantes na alta sociedade dos tempos da Belle Époque, nas mulheres
predominam as rendas francesas e inglesas e o uso dos chapéus enquanto que nos
homens como ressaltou a autora Orsini o costume era usar roupas com cores
sóbrias que transmitissem a idéia de seriedade e respeito.

Figura 3: Elenco da novela Lado a Lado com vestimentas típicas da Belle Époque.
Fonte: http://www.linkatual.com/lado-lado-elenco.html

Entretanto nem tudo era belo, harmonioso ou organizado como parece. O


lado feio da Belle époque existiu e foi sinônimo de repressão e muita vigilância para
25

os pobres, como afirma a autora Danielle Crespo que essas reformas modificaram
“bruscamente a vida da população pobre e interferiram diretamente em atividades de
trabalho lazer e sobrevivência; foram responsáveis por uma repressão sufocante que
visava enquadrar toda aquela plebe na agora “civilizada” cidade do Rio de Janeiro”
(CRESPO, 2005, p. 5).
Um exemplo desta repressão pode ser visto na novela Lado a Lado, a
libertação dos escravos tinha ocorrido em 1888, início da Belle Époque no Rio de
Janeiro e mesmo assim os negros ainda eram vitimas de preconceito e da
perseguição dos brancos, estes últimos os viam como sujos e maltrapilhos que
precisavam ser eliminados das novas paisagens que estavam sendo construídas
para embelezar a cidade.
Uma das principais medidas de embelezamento da cidade foi a demolição
dos cortiços que em sua maioria eram habitados por negros, ex-escravos e a
camada mais pobre da população, com essa medida do governo, essas pessoas
foram obrigadas a migrarem para os morros dando origem as favelas existentes até
hoje.
Essa medida denominada Bota - abaixo pelo prefeito Pereira Passos,
tinha como objetivo expulsar os pobres do perímetro central da cidade que agora era
utilizado para a circulação das elites e classe média, e procuravam eliminar qualquer
vestígio de provincianismo que os negros ainda representavam, nesse momento os
jornais circulavam a seguinte manchete: “O Rio civiliza-se”. (GISLANE; REINALDO,
2008, 391).
A intenção do governo também era acabar com as epidemias de febre
amarela, varíola e peste bubônica que assolava a cidade, pois a falta de
saneamento e de higiene na cidade eram as responsáveis por disseminar esta
doenças que assolou grande parte da população, segundo a autora Glória Kok “o
ano de 1891ficou marcado por ter ocorrido o mais violento surto de epidemias da
história da cidade” (KOK apud BOAVENTURA, 2011, p. 115), e a taxa de
mortalidade “chegou a 52/1000 habitantes” (BOAVENTURA, 2011, p.115).
Como principal medida de combate as doenças o governo propôs
medidas como caça aos ratos e colocava nas ruas os chamados caça mosquitos
que pulverizavam veneno para matar o mosquito transmissor da febre amarela.
(GISLANE; REINALDO, 2008).
26

Foi neste cenário catastrófico que o médico sanitarista Oswaldo Cruz


propôs uma campanha de vacinação publica e “juntamente com o prefeito Pereira
Passos combateu as epidemias com sucesso” (NEEDEL apud BOAVENTURA,
2011, p.116) e em 1904 o governo aprovou a lei que tornava obrigatória a vacina
contra a varíola, provocando a revolta da população, episódio este que ficou
marcado como a Revolta da Vacina:

Em consequência de mais essa atitude autoritária em prol da higienização


da Capital Federal, a cidade se transformou no palco de um sangrento
episódio que teve o apoio tanto de descendentes de africanos, que
acreditavam na cura pelos rituais religiosos, quanto das elites, que
questionavam a eficácia da vacina. A multidão lutou contra a vacina, o
governo e a polícia (PORTO e PONTE, apud BOAVENTURA 2011, p.116).

Outro movimento que também marca a Belle Époque foi a Revolta da


Chibata ocorrida em 1910 este movimento foi liderado por João Candido marinheiro
que protestava contra os abusos e os maltratos e principalmente o castigo da
chibata impostos pela tripulação quando estes desobedeciam alguma norma.
(GRANATO apud GISLANE; REINALDO, 2008).
Este episódio pôde ser assistido na novela Lado a Lado e observou-se
que a maioria dos marinheiros eram negros ou descendentes e provavelmente por
este motivo os castigos eram tão severos, além de ter tido uma resistência por parte
do governo em aceitar as condições impostas pelos marujos.
Na ilustração abaixo (Figura 4) uma cena de Lado a Lado retrata o
momento em que os representantes do governo negociam com os marinheiros sobre
as reivindicações por melhores condições de trabalho, esta cena acontece no
convés do navio, este convés na verdade é uma réplica do navio.
27

Figura 4: Cena de Lado a Lado em que os marinheiros estão no convés do navio negociando com
representantes do governo por melhores condições de trabalho.
Fonte:http://tvg.globo.com/novelas/lado-a-lado/por-tras-das-cameras

Enfim, este tópico apresentou um pouco da realidade da Belle Époque


brasileira, que de bela só tinha mesmo o nome, tudo não passava de uma espécie
de mascaramento que escondia a verdadeira realidade por trás de todo este
glamour.
No próximo tópico veremos como foi a Belle Époque em Fortaleza e se
houve diferença em relação a então capital do Brasil.

3.2 A Belle Époque contagia Fortaleza

Este tópico explicará um pouco sobre a inserção de Fortaleza na Belle


Époque e que motivos levaram a capital a aderir a tão grandes transformações e ao
processo de remodelação nos moldes de Paris.
Na segunda metade do século XIX Fortaleza finalmente se consolida
como uma das cidades mais desenvolvidas do Ceará e principal centro urbano
econômico do Ceará (PONTE, 2010) e neste cenário de transformações a capital
também é inserida na Belle Époque.
Segundo o autor Sebastião Ponte, “No que concerne a Fortaleza essa
pretensão remodeladora desenvolve-se a partir de 1860, impulsionada pelo aumento
da exportação algodoeira verificada à época” (PONTE, 2007, p.163). Isso porque os
28

Estados Unidos estavam em plena Guerra da Secessão e a “demanda de algodão


norte americano foi suspensa temporariamente para Europa, aumentando a procura
pelo algodão cearense” (PONTE, 2007, p.163). “Fortaleza era no final do século 19,
o principal centro urbano do Ceará e um dos oito primeiros do Brasil” (PONTE, 2009,
p.70).
A partir de então Fortaleza entra num processo de reforma urbanística e
de “civilização”, e civilização naquele momento representava modernidade e
progresso como afirma o historiador Paulino Nogueira que Fortaleza mais parecia
uma “fênix renascida, cheia de mocidade e encantos” (NOGUEIRA, apud PONTE,
2007, p.45), pois agora tinha:

Passeio Público, praças arborizadas, templos majestosos, edifícios


elegantes, tantas e tantas ruas alinhadas, calçamento, iluminação a gás,
linhas de bondes, carros de aluguel, hotéis, quiosques, clubes prado,
corrida de touros, a cavalo eà bicicleta, quermesses bazar e demais
novidades (NOGUEIRA, apud, PONTE, 2010, p.45).

A cidade agora estava “irreconhecível, diferente do que se conhecia há


pelo menos 50 anos atrás”, pelo menos foi o que afirmou Kidder (apud CORDEIRO,
2007, p.136) em sua visita á capital do Ceará depois das reformas urbanas,
Fortaleza antes era uma “cidade muito pequena,... de ruas tortuosas e casa
ordinárias, apresentava um aspecto desagradável ao passageiro que a via...”
(KIDDER, apud CORDEIRO, 2007, p.136).
Segundo Kidder, agora a cidade tinha um "progresso espantoso, já [era]
uma grande e bela cidade, tinha magníficos edifícios, quartel militar, casa de
caridade uma grande cadeia e uma catedral magnifica” (KIDDER apud CORDEIRO,
2007, p.136).
,
O autor Sebastião Ponte afirmou em se livro Fortaleza Belle Époque que
“tais reformas visavam alinhar os centros urbanos locais aos padrões de civilização e
progresso disseminados pelas metrópoles europeias” (PONTE, 2010, p.17).
Seguindo ainda esta afirmativa Ponte revela ainda que:

Em Fortaleza, o movimento de remodelação urbana impulsionou-se com o


Mercado de Ferro (1897), o “arfomoseamento” das principais praças (1902-
3) e a construção do requintado Theatro José de Alencar (1910). A onda
remodeladora acabou por conferir à zona central da cidade um harmonioso
conjunto urbano, complementado com a edificação de mansões, prédios
29

públicos e dois grandes cinemas – em sua maioria, construções marcadas


pelo ecletismo arquitetônico, estilo então em voga no País (PONTE, 2010,
p. 20).

Para dá inicio a essas novas reformas urbanas em 1875 o arquiteto


Adolfo Hebster é contratado para desenhar a nova planta da cidade de Fortaleza
seguindo o modelo em traçado xadrez elaborado por Silva Paulet em 1818 e
inspirado no modelo do barão de Haussman 1 feito anteriormente em Paris e
conforme o autor Ponte (2010):

Apesar de não ser um projeto inteiramente original, [...], tratava-se de um


estudo decisivo para a capital dali para frente, pois ampliava-lhe o traçado
para além de seus limites de então e conferia-lhe 3 boulevards(as atuais
avenidas do Imperador, Duque de Caxias e D. Manoel) margeando o
perímetro central. A finalidade de tais avenidas era, num futuro breve,
facilitar o escoamento do movimento urbano, [...]. Por seu lado, o principal
objetivo da nova Planta era disciplinar a expansão de Fortaleza, o que, de
fato, consegue, pelo menos até 1930. (PONTE, 2010, p.27).

Na figura abaixo (Figura 5) observa-se o desenho em xadrez de Adolf


Hebster da planta de Fortaleza:

Figura 5: Planta Topográfica de Fortaleza desenhada por Adolf Hebster em 1875.


Fonte:http://fortalezaemfotos.blogspot.com.br

1 Barão de Eugéne Haussman foi o engenheiro responsável pela reforma na cidade de Paris, dando-
lhe a feição atual. Com as obras de Haussman, Paris assumiu a modernidade e elas influenciaram as
reformas urbanísticas de muitas cidades brasileiras. ORIÁ, Ricardo. In: SOUZA, Simone de. Uma Nova
História do Ceará, 2007, p.438.
30

Seguindo este pensamento o governo propôs medidas saneadoras e


higienistas, além de adotar um código de posturas que determinava normas e
hábitos que deveriam ser adotados pelos fortalezenses, tudo isso inspirado no
modelo europeu.
Aliás, o enxadrezamento da cidade era uma das medidas higienistas que
segundo Silva e Filho (2004), expressavam a necessidade de amplos logradouros
que facilitassem a circulação das correntes de ventos, pois o ar contaminado era
considerado como o principal disseminador das mais terríveis doenças epidêmicas.
Como principais medidas saneadoras houve a construção dos espaços
destinados ao lazer que serão vistos no capítulo seguinte, assim como houve a
construção de asilos, cemitérios afastados da cidade, para se evitar a contaminação
do ar e o afastamento dos mais pobres do perímetro central. (PONTE, 2007).
Mas mesmo com tantas medidas “preventivas” a população não podia
prever que o surto de varíola e outras doenças dizimariam boa parte dos habitantes
da cidade, por conta das contaminações pelo precário sistema de esgoto, aliás, na
verdade nem existia sistema de esgotos, segundo Ponte (2007) o que existiam eram
as fossas domésticas nos quintais das casas, e quando enchiam essas fossas eram
esvaziadas pelos “quimoeiros” conhecidos assim por transportarem os dejetos em
depósitos chamados quimoas, estas figuras eram responsáveis também pela
disseminação de doenças pois quase sempre estavam bêbados e deixavam cair
parte dos dejetos pela cidade, espalhando o mal cheiro e contaminado o ar, além
disso, tudo era despejado no mar. (PONTE, 2007).
Em 1865 e 1870 entra em cena um novo código de posturas de Fortaleza,
estes tinham por objetivo prever normas disciplinares a população e impor medidas
saneadoras, principalmente aos mais pobres, que era vistos como os agentes
insalubres da cidade.
Segundo Silva e Filho, o código de 1870 era um ”instrumento de disciplina
e permite vislumbrar os efeitos limitados da remodelação espacial no controle das
condutas” (SILVA E FILHO, 2004, p.107).
Algumas medidas que o código impôs foram mencionadas por Campos,
no código de 1865, além de mencionar “alinhamento, limpeza, desempachamento
das ruas, praças”, traz também disciplinarização de “os curtumes, salgadeiras,
31

estabelecimento de fabricas, depósitos, manufacturas, e tudo quanto possa alterar a


salubridade pública”. (CAMPOS apud COSTA, 2002 p.67).
Além disso, o código de 1870 trazia um artigo com o título: “Medidas
Preventivas”, que mencionava sobre “bulhas, vozerias obscenidades e ofensas a
moral” (CAMPOS apud SILVA E FILHO, 2004, p.108) e proibias as pessoas de se
banharem a luz do dia na lagoa do Garrote ou no Pajeú, por exemplo, ou outros
lugares expostos sob pena de punição. (CAMPOS apud SILVA E FILHO, 2004).

De fato, afastar os pobres era o principal objetivo das elites, pois estas os
viam como:
ignorantes, sujos doentes e perigosos e por isso os discriminava. Os ricos
achavam que a população pobre enfeava o embelezamento e a
modernização que estavam realizando em Fortaleza para o próprio bem
estar, lazer e cultura.
Aos pobres era dificultado o acesso aos melhoramentos implementados nas
cidades naquele período. (SOUZA; PONTE; LOPES, 2007, p.80).

É exatamente neste cenário que o afrancesamento invade totalmente a


cidade e muda completamente o cotidiano de seus habitantes

Como outras cidades que se desejavam civilizadas, Fortaleza tinha Paris


como referencia de modernidade. Assim, a capital foi arrebatada por uma
febre de afrancesamento. Ser moderno era acompanhar as modas vindas
de Paris, usar expressões em francês, abrir lojas com nomes franceses [...].
(PONTE, 2009, p.76)

Era comum que as pessoas usassem expressões em francês para se


cumprimentarem, as lojas tinham nomes franceses, as roupas eram totalmente
inspiradas na moda francesa.
Conforme Ponte (2010), um fato curioso chama a atenção para esta onda
de afrancesamento na cidade, havia no centro da cidade um quiosque de vender
garapa de cana de açúcar, seu dono era conhecido como Bembém Garapeira
famoso por sua irreverencia e humor, com o afrancesamento da cidade por todos os
lados, de tanto ouvir falar na França Bembém resolveu ir até lá e conferir de pertinho
o porque todo aquele alvoroço em Fortaleza, juntou dinheiro e viajou até Paris, o
relato mais famoso da viagem de Bembém foi feitor por Otacílio Azevedo e diz o
seguinte:
32

Bembém foi e voltou radiante. Lamentava apenas ter ido tarde, não
podendo assistir à decapitação de Maria Antonieta... “Aquilo é que é cidade!
Dizia entusiasmado – No hotel ode me hospedei todo mundo falando fui
obrigado a escrever meu nome. Como a língua era outra, escrevi:’ BienBien’
e, mais embaixo: ‘Garapiére’. E completava: ‘Olhe, lá eu só andava com um
homem chamado Cicerone, que sabia português como eu. Terra adiantada
aquela: todo mundo falando francês, até mesmo os carregadores
Chapeados, as mulheres do povo e as crianças! ‘Bembém não se cansava
de falar da França e completava declarando que lá, a única palavra que
ouvira em português fora ‘mercibocu’... A conselho de um intelectual
‘perverso’, mandou imprimir um cartão para distribuir com amigos e
fregueses: BIEN – BIEN – GARAPIÉRE – Fortaleza – Ceará. (AZEVEDO
apud PONTE, 2010, p.156).

Embora fosse uma figura sarcástica Bembém logo percebeu que


Fortaleza embora adotasse hábitos, e tudo mais que estivesse relacionada a França,
estava longe de parecer com Paris sua capital, embora uma fala de Bembém chame
atenção pelo fato de que expressões francesas eram tão comuns naquele período e
de tanto serem ouvidas pelas elites que passeavam pelas praças e ruas da cidade,
que chegaram em certo momento a ser confundidas com o português.

Enfim, tanto Fortaleza como Rio de Janeiro viveram seus momentos de


glamour no inicio do século XX, auge da Belle Époque no Brasil, as duas capitais
tem tanto em comum que as vezes chega ao ponto de confundir qual das duas está
sendo retratada, ou se tratava de um padrão adotado por ambas.
No Rio de Janeiro o aformoseamento e embelezamento dos logradouros
fez com que o governo tomasse como medida o já mencionado Bota- Abaixo,
expulsando os pobres dos cortiços que em seguida foram demolidos esta medida foi
vista como símbolo de civilização, e em todos os cantos circulava a manchete “o Rio
civiliza-se”, este fato em Fortaleza é semelhante com as construções dos Asilos da
Mendicidade e da Parangaba, para abrigar mendigos, refugiados, loucos e outras
figuras que representassem insalubridade a cidade e pudessem afastá-los do
perímetro central (PONTE, 2010), que agora estava reservado ao desfrute das elites
que começavam a criar o hábito de sair de casa. Com isso pretendia-se manter os
pobres sob o olhar vigilante da repressão, e de acordo com Ponte (2010), em 1925
era publicado um artigo na revista Jandaia com o título “Fortaleza civiliza-se”.

As duas cidades por terem climas quentes também foram cenários para o
desfile de trajes que foram criados para serem usados na Europa, mas mesmo tendo
33

que encarar o calor, a elite o fazia com classe não importando o desconforto que
sentiam.
Tanto Rio como Fortaleza possuíam Passeio Público, embora na fala de
José Pereira um dos personagens de A Normalista, o dos cariocas não se
comparava ao da capital cearense em beleza, e afirmava: “O Passeio Público? dizia
ele; o Passeio Público é um dos mais belos do Brasil e a coisa mais bem feita que o
Ceará possui. Que vista, [..] Nem o Passeio Público do Rio de Janeiro!”.(CAMINHA,
1997, p.89).
Outro fato bem semelhante foi os surtos da epidemia de varíola que
contaminaram as cidades, no Rio de Janeiro chegou-se ao impressionante índice de
52/1000 mortes enquanto que Fortaleza o surto gigantesco da doença chegou a
enterrar mais de 1000 pessoas em um dia, ocorrência que ficou conhecida como dia
dos mil mortos.
A semelhança entre as duas capitais é tanta que fica até difícil encontrar
algo a que as diferencie, a não ser pelo fato de o Rio de Janeiro ser a capital do
Brasil.
Mas, embora fosse capital Fortaleza destacou-se por decretar a vacina
obrigatória contra a varíola em 1892, fato que só ocorreria 12 anos depois no Rio de
Janeiro e que provocou a Revolta da Vacina.
A conclusão que se chega é que tanto Rio de Janeiro quanto Fortaleza
tiveram suas semelhanças e diferenças em relação ao período, mas fica claro que
as semelhanças entre as duas cidades são bem maiores quando compara-se as
capitais.
No próximo capitulo serão mencionadas as principais atividades de lazer
durante a Belle Époque e os equipamentos construídos em Fortaleza destinados a
pratica dessas atividades.
34

4 AS ATIVIDADES DE LAZER NA FORTALEZA BELLE ÉPOQUE

Este será o último capítulo do trabalho e abordará o principal foco do


trabalho que são as atividades de lazer na Fortaleza Belle époque, quais as
principais formas de lazer e atividades praticadas pelos habitantes e se estas de fato
foram influenciadas pela Belle Époque ou não.

4.1 O Passeio Público

A Belle Époque mudou o cotidiano e os hábitos dos fortalezenses no final


do século XIX e isso representou um novo modo de lazer inspirados também nos
modelos europeus, mais especificamente Paris que era a capital modelo.
35

Em 1880, de acordo com Ponte (2007), é inaugurado o Passeio Público


na então denominada Praça dos Mártires,

O Passeio Público, por sua vez, surgiu para satisfazer o desejo por uma
área exclusiva de lazer público que Fortaleza carecia e outras grandes
cidades brasileiras já possuíam. Deveria ser um espaço florido, arejado,
reservado apenas para fruição daqueles “belos tempos”[...]. (PONTE, 2007,
p.170).

Neste momento, o Passeio Público torna-se “obrigatório no cotidiano da


vida fortalezense” (CORDEIRO, 2007, p.138). Isso porque foi um equipamento
construído para representar este período e o afrancesamento da cidade, nas
palavras de Sebastião Ponte, “um éden a servir de passarela para o desfile de
elegantes e palco para o exercício de uma sociabilidade europeizada”. (PONTE,
2009, p.73)
Como afirma o autor Silva e Filho em seu livro Fortaleza imagens da
cidade, o Passeio Público representava “indícios da influência europeia nas formas
de lazer e interação social de Fortaleza”. (SILVA E FILHO, 2004, p. 96).

Ainda seguindo esta afirmativa, de acordo com Ponte (2010):

Localizado no perímetro central e com ampla vista para o mar, o Passeio


tornou-se de pronto a principal área de lazer e sociabilidade, até que
despontassem outras tentadoras opções a partir do século XX, como o
Theatro José de Alencar (1910) e os cine Majestic e Moderno (1917 e 1921,
respectivamente). (PONTE, 2010, p.37).

De fato o logradouro era a principal referencia de lazer da cidade


naqueles anos, afirmação que pode ser confirmada pelo autor Oliveira Paiva, que
faz referencias ao lazer no romance A Afilhada mencionando as “novenas na
Prainha e a ida ao Passeio Público” (OLIVEIRA PAIVA apud CORDEIRO, 2007,
p.138).
Naqueles últimos anos do século XIX, a cidade tinha ganhado a
iluminação a gás, sinônimo de progresso e modernização que nas palavras de
Raimundo Menezes até “os mais letrados achavam que aquilo era um enorme surto
de progresso para a nossa capital, que marchava, a passos largos, na retaguarda
das grandes cidades do país” [...]. (MENEZES apud, SILVA E FILHO, 2004, p.90).
36

Chama-se atenção para o fato de a iluminação a gás ter sido de grande


importância para iluminar os principais logradouros da cidade, principalmente o
passeio, pois, segundo Silva e Filho, grande foi a “importância da iluminação a gás
na paisagem de Fortaleza, especialmente nas alamedas do Passeio Público,
considerado a mais elegante área de lazer urbano do período”. (SILVA E FILHO,
2004, p. 96).
A influência do passeio público pode ser percebida no romance A
Normalista de Adolfo Caminha, o autor faz algumas menções do logradouro e numa
delas ele afirma:
Toda uma geração nascente, ávida de emoções, cansada d’uma vida
sedentária e monótona, ia espairecer no Passeio Público aos domingos e
quintas – feiras, gratuitamente, sem ter que pagar dez tostões por uma
entrada, como no teatro e no circo. [...].
Apenas quem não tivesse dois vinténs estava proibido de sentar-se, porque
nesses dias, as cadeiras eram alugadas, havia assinaturas baratas.
(CAMINHA, 1997, p.89).

O autor Sebastião Ponte também faz menção a esta particularidade do


passeio, quando afirma que este era uma:

Atração imperdível às quintas e domingos, o Passeio lotava-se de gente


elegante para mostrar as últimas modas chegadas do dernierbateau (último
navio) vindo da Europa. A banda municipal embalava os namoros, os flertes
e o borboletear de um lado para o outro dos passantes.(PONTE, 2007,p.
170).

A propósito, “tamanha era a influência do Passeio Público no lazer da


cidade, que logo cedo se tornou um dos mais conhecidos cartões postais de
Fortaleza” (SILVA E FILHO, 2004, p.97).
Foi no Passeio, de acordo com Ponte (2007) que se desenvolveram
atividades como o footing (passeio a pé), o meeting (encontro entre pessoas) e flert
(flerte, paquera), aliás não só estas atividades mas também as “atividades esportivas
tinham prática assegurada nas dependências do logradouro, especialmente a
patinação (graças à construção de uma pista adequada, o skating- rink) e corridas
de bicicletas”. (SILVA E FILHO, 2004, 97).

No entanto, apesar de o Passeio Público representar o ponto de encontro


da sociedade de Fortaleza e local para prática de suas atividades de lazer, o
logradouro deixava claro que havia ali uma separação entre classes, como afirma
37

Ponte (2007), que o Passeio possuía três planos, sendo que o primeiro plano, “o
mais embelezado ficou como palco para deleite das elites, enquanto o segundo e o
terceiro (menos aformoseados) foram ocupados, respectivamente pelas camadas
médias e populares”. (PONTE, 2007, p.171).

Ainda de acordo com a afirmativa acima

Embora destinado ao lazer, o Passeio mantinha normas que disciplinavam


seus frequentadores, como a exigência de belos trajes e boas maneiras.
Sua própria constituição espacial significa um permanente exercício de
discriminação simbólica, pois as diferentes classes sociais ocupavam planos
separados no jardim. (SILVA E FILHO, 2004, p. 97).

Esta divisão do Passeio se dava por meio das alamedas, denominadas


avenidas, eram elas: Caio Prado, Carapinima e Mororó. A primeira, Avenida Caio
Prado, ficava de frente para o mar, era o lado das elites, já a Avenida Carapinima
ficava de frente para a Santa Casa enquanto que ultima era “mais próxima do
calçamento da Rua João Moreira” (ADERALDO apud SILVA E FILHO, 2004, p.98).

No romance A Normalista o autor chama a atenção para esta divisão das


avenidas em alguns trechos do livro e também descreve um pouco do cotidiano das
três. Um destes trechos diz o seguinte em relação a Avenida Caio Prado:

A avenida Caio Prado tinha o aspecto fantástico d’um terraço oriental onde
passeassem princesas e odaliscas sob um céu de prata polido, com sua
filas de combustores azuis, encarnados e verdes, com suas esfinges...
Senhoras de braço dado, em toillettes garridas, iam e vinham no
macadame, arrastando os pés, ao compasso da música, conversando alto,
entrechocando-se, numa promiscuidade interessante de cores, que tinham
reflexos vivos ao luar. D’um lado ed’outro da avenida estendiam-se duas
alas de cadeiras ocupadas por gente de ambos os sexos, na maior parte
curiosos que assistiam tranquilamente ao vaivém continuo dos passeantes.
(CAMINHA, 1997, p.86).

Abaixo uma imagem da Avenida Caio Prado localizada no primeiro plano


do Passeio Público (Figura 6).
38

Figura 6: Cartão Postal de Fortaleza representado pela Avenida Caio Prado


Fonte: Arquivo Nirez

Quanto a Avenida Carapinima o autor faz a seguinte descrição:

E dirigiram-se para a avenida Carapini, ensombrada pelos castanheiros, que


formavam uma como abobada compacta de ramagens através da qual o
luar coava-se aqui e ali, pelas clareiras.
Puseram-se por ali a esperar, em pé defronte dos gnomos de louça, à beira
dos reservatórios d’água onde cruzavam gansos e marrequinhas vadias que
grasnavam alegremente inundadas de luar ou, caminhando devagar, iam
contando os minutos, enquanto a música, no coreto, executava trechos
alegres de operetas em voga. (CAMINHA, 1997, p.88).

Já a última alameda, denominada Avenida Mororó o autor confirma que


esta era destinada as camadas mais populares:

Na Mororó, mais larga que as outras, havia uma promiscuidade franca de


raparigas de todas as classes: criadinhas morenas e rechonchudas, com os
seus vestidos brancos de ver a Deus, de avental, conduzindo crianças,
filhas de famílias pobres em trajes domingueiros, muito alegres na sua
encantadora obscuridade; mulheres de vida livre sacudindo os quadris
descarnados, com ademanes característicos, perseguidas por uma troça de
sujeitos pulhas que se punham a lhes dizer gracinhas insulsas. (CAMINHA,
1997, p. 88).

Enfim, apesar de toda esta segregação de classes o Passeio foi durante


muito tempo o logradouro referencia do lazer e sociabilidade de todas as classes até
39

os anos 30 como afirma Ponte (2007), até que começou a sofrer concorrência de
outras atrações como o cinema, os clubes e os banhos de mar.

Mas é impossível deixar de reconhecer a importância que este logradouro


teve por muitos anos na capital e que este foi símbolo da Belle Époque, construído
exclusivamente para representar este período.

A seguir o tópico retratará a remodelação das principais praças da cidade,


a construção dos cafés e a chegada dos bondes.

4.2 As praças, os cafés e os bondes

A transição do século XIX para o século XX trouxe consigo mais


inovações e equipamentos de lazer para a cidade, embora alguns já existissem
como é o caso do Passeio Público, mas além dele a capital dispunha de:

praças remodeladas, jardins públicos, ruas alinhadas com bondes,


transeuntes, sobrados e estabelecimentos comerciais, Passeio Público e
Parque da Liberdade e seus elegantes frequentadores, Estação Central
Ferroviária, mansões e fachadas art noveu, cafés, templos, escolas, portos,
praias, lagos, etc. (PONTE, 2010, p.141).

Em outras palavras, um conjunto de equipamentos que representavam o


lazer e cotidiano dos habitantes. Dentre estas inovações estavam a remodelação
das três principais praças da cidade – a do Ferreira, Marquês de Herval (atual José
de Alencar) e a da Sé, segundo Ponte (2007) entre os anos de 1902 e 1903,
receberam amplos e vistosos jardins com gradil, “recheados de estatuas de
inspiração clássica, canteiros de flores e plantas ornamentais, coretos, longos
bancos, chafarizes e vasos importados” (PONTE, 2007, p.180).

O autor faz uma menção de como ficaram as três praças depois de sua
remodelação comparando-as como réplicas do Passeio Público:

Para se ter uma idéia, os jardins eram como réplicas em menor proporção
do Passeio Público encravadas, no centro daquelas praças. Isto é: além do
próprio Passeio Público, a cidade agora tinha, em seus três principais
logradouros, ilhas paradisíacas e seguras, onde os citadinos mais distintos
40

pudessem se sentir como se estivessem em Paris, enquanto assistiam ao


espetáculo do movimento urbano desenrolar-se em torno. (PONTE, 2007,
p.181).

Segundo o historiador Ponte, a remodelação das praças teve também


como intuito não só o embelezamento da cidade, mas criar um espaço de utilização
pública onde a população, principalmente as crianças e os jovens pudessem praticar
exercícios e atividades esportivas ao ar livre. (PONTE, 2010).

Isto se devia ao fato de que naquele momento a pratica de esportes


estava começando a ser adotada pela sociedade e esta prática representava a
saúde que as medidas saneadoras tanto buscavam alcançar.

Abaixo (Figura 7) uma ilustração do Jardim 7 de Setembro, este


localizado na Praça do Ferreira era rodeado por grades, muito arborizado e florido
(PONTE 2010), um lugar construído para a prática de atividades ao ar livre ou para
passeios ao entardecer.

Figura 7: Jardim 7 de Setembro localizado na Praça do Ferreira.


Fonte: Arquivo Nirez

A Praça do Ferreira, um dos logradouros referenciais da cidade até os


dias de hoje era “a principal área do comércio local” (BARBOSA; SOUSA; XAVIER;
DELANO, 2006, p136), conhecida também como o “coração da cidade” nas palavras
do autor Sebastião Ponte, foi palco para a construção dos quatro cafés mais
elegantes da cidade – O Java (Figura 8), o Comércio o Elegante e o Iracema, todos
construídos em estilo chalet francês, localizados nos quatro cantos da praça.
(PONTE, 2007).
41

Figura 8: Quiosque do Café Java.


Fonte: Arquivo Nirez

Foi no Café Java, o preferido da boemia e dos intelectuais jovens como


afirma Ponte (2007), que surgiu a idéia da criação de uma agremiação literária,
conhecida como Padaria Espiritual, que se destacou pela sua inovação e
irreverência. Este local foi ponto de encontro dos escritores Antônio Sales que foi o
fundador da agremiação, Adolfo Caminha e Rodolfo Teófilo. (CORDEIRO, 2007).

Segundo Ponte “Boêmios e janotas deviam sentir-se como que em Paris


enquanto sentavam nas mesas ao ar livre desses cafés e contemplavam fascinados
o belo jardim no centro da praça” (PONTE, 2009, p.75).

Nas figuras abaixo (Figuras 9 e 10), imagens dos quiosques do Café


Comércio e do Café Iracema respectivamente.
42

Figura 9: Quiosque do Café Comércio (localizado na Praça do Ferreira).


Fonte: Arquivo Nirez

Figura 10: Quiosque do Café Iracema (localizado na Praça do Ferreira).


Fonte: Arquivo Nirez

Nas palavras de Adolfo Caminha, no romance A Normalista o autor faz a


seguinte afirmação:
[O]s cafés conviveram romântica e harmoniosamente com o pouco e lento
movimento de cabriolets e bondes puxados a burro em torno da Praça, mas
já não se coadunavam com o agitado séquito de pedestres, automóveis,
bondes elétricos e caminhões dos frenéticos anos 20. (PONTE, 2010, p.65).

Era nas praças que a sociedade se reunia para encontros nos bancos, um
bate papo com os amigos e conhecidos, para admirar as vitrines das lojas que por
43

sua vez tinham nomes franceses ou pelo simples fato de passar o tempo e imaginar-
se na Europa.

Se a Praça do Ferreira passou por reformas no inicio do século XX, o


mesmo ocorreu com a então Praça Marques de Herval, atualmente Praça José de
Alencar, conforme afirma Silva e Filho (2004):

Em 1903, a praça é reformada na gestão do intendente municipal Guilherme


Rocha, e ganha um belo jardim ornado de bancos, vasos, colunas,
estatuaria, iluminação a gás e um coreto. Como preito ao chefe da
oligarquia local, passa a chamar-se Jardim Nogueira Acioly. (SILVA E
FILHO, 2004, p. 54).

Em seguida, alguns anos depois entra em cena na reformada Praça


Marques de Herval (Ponte, 2010) um novo equipamento que proporcionou encanto e
impressionou a população, o Theatro José de Alencar.
O Theatro era a “maior obra arquitetônica de Fortaleza de então e densa
de significados artísticos e culturais” (PONTE, 2010, p.49). Era considerado um dos
mais belos do país, sua estrutura toda metálica em estilo art noveau, ficou a cargo
da empresa escocesa Walter McFarlane & Co., o teatro representava progresso e
era símbolo da modernidade que se instalara na capital, até os oposicionistas do
então presidente do Ceará, Nogueira Accioly, “tiveram que reconhecer a a beleza da
nova casa de espetáculos [...]”. (PONTE, 2007, p.181).
Na ilustração abaixo (Figura 11) pode contemplar-se a beleza do Theatro
José de Alencar.

Figura 11: Theatro José de Alencar.


Fonte: http://mesquita.blog.br/memoria-teatro-jose-de-alencar
44

Estes logradouros tiveram um grande papel na representação daqueles


belos tempos, porém quando este período entra em decadência na década de 20,
na gestão do prefeito Godofredo Maciel, os jardins e os cafés tiveram que ser
demolidos para que as ruas pudessem ser ampliadas e o espaço urbano
remodelado novamente para dá passagem aos automóveis e demais equipamentos.
Este tópico também se direcionará aos bondes porque estes foram
equipamentos necessários para a mobilidade urbana, não serviram somente para
deslocar as pessoas ao seu local de trabalho ou estudos, mas foram de extrema
importância para o lazer dos habitantes, pois como alguns logradouros ficavam
distantes uns dos outros, estes equipamentos vieram atender estas necessidades de
deslocamento.
Os primeiros bondes chegaram a Fortaleza nos anos 80 do século XIX,
estes eram a tração animal e de acordo com Ponte (2007), “adviram para suprir a
necessidade de um meio de transporte coletivo para uma cidade que crescia
espacial e populacionalmente”. (PONTE, 2007, p.169).
No romance A normalista menciona-se um pouco dessa rotina dos
bondes para a população, no trecho: “Seguiram para a Praça do Ferreira a tomar o
bonde de Pelotas. [...] As portas da Maison Moderne famílias esperavam os bondes
em pé [...]” (CAMINHA, 1997 p. 135).
Nesta época os bondes transportavam em média 25 pessoas e chegavam
a fazer um percurso do centro até o estádio Presidente Vargas, tempos depois com
a chegada da eletricidade em 1913, surgiram os primeiros bondes elétricos, mais
velozes e substituindo os burros que andavam devagar e sujavam as ruas durante o
trajeto. (BARBOSA; SOUSA; XAVIER; DELANO, 2006).

Nas imagens a seguir podem ser vistos os primeiros bondes (Figura 12)
que chegaram à cidade eram puxados por burros, mas não faziam grandes
percursos, anos depois com o progresso e a modernização se instalando na cidade
foram inaugurados os primeiros bondes elétricos (Figura 13).
45

Figura 12: Bondes puxados por burros. Figura 13: Bondes elétricos
Fonte:Arquivo Nirez Fonte: Arquivo Nirez

No próximo tópico a fotografia aparece como uma novidade totalmente


encantadora e ser fotografado naquele momento era uma das atividades de lazer
mais apreciadas pela população, além disso, o cinema aparece como o outra
novidade extasiante na cidade.

4.3 A chegada da fotografia e o surgimento do cinema em Fortaleza

Num determinado momento da história surge um equipamento que iria


mudar de vez a forma de imortalizar momentos, pessoas ou objetos: a máquina
fotográfica. Neste cenário, Fortaleza não poderia ter ficado de fora e logo a cidade
ficou em êxtase com mais esta novidade, foi o que percebeu o autor Eduardo
Campos, quando afirma que Fortaleza naquele período era uma:

Comunidade maníaca por retratos; estão dependurados pelas paredes –


bisavôs, avós, os próprios donos da casa e até os primeiros filhos, e quando
não há mais espaço para essa exposição, em que se percebe certo sabor
nobiliárquico, sobram as figuras reveladas em postais para os álbuns, ou
simplesmente vão parar nas caixas de sapatos, amotoados, tal a
quantidade de efígies sentimentalmente permutadas entre os da mesma
família com o “abraço da prima querida” ou “com beijos da tua madrinha”,
etc., etc. (CAMPOS, 1984, p. 57).

Neste interim e com o afrancesamento da cidade em voga, entram em


cena dois fotógrafos que ficaram mais famosos não pelo seu trabalho, mas por
outro fato curioso, eram eles: Moura e Eurico Bandeira, mais tarde passando a se
chamar Moura Quineau e Eurico Bandiére, tudo isso porque tinham o intuito de atrair
clientes da alta sociedade e como tudo que era francês era considerado de
46

qualidade, os fotógrafos não pensaram duas vezes em afrancesar seus respectivos


nomes. (PONTE, 2007).
Em seguida entram em cena, dois equipamentos que fizeram a cabeça
dos fortalezenses, “o fonógrafo, a máquina que falava, cantava, ria e tocava música”
(PONTE, 2010, p.40) e o kinetoscópio, considerado o precursor do cinema,
apresentava fotografias em movimento (PONTE, 2010).

O cinema foi uma das atividades de lazer mais requisitadas pela


população, que buscava diversão e que ao mesmo tempo era outro marco da
modernização da cidade.

Em 1917 é inaugurado em Fortaleza o Cine Teatro Majestic, construído


pelo comerciante Dr. Plácido de Carvalho, além de filmes também se apresentavam
peças teatrais, este era um cinema popular e localizava-se na Praça do Ferreira
(JUCÁ, 2007, p. 199).
O cinema surgiu como uma nova opção de atividade lazer para os
habitantes de Fortaleza como afirma o historiador Soriano, quando diz que o cinema
“deu grande impulso ao progresso da cidade, não só no que tange, à sua
construção, toda de ferro, a exemplo do mercado [...], como ainda ao costume que
criou de fazer com que as famílias passassem a sair de suas casas” (SORIANO
apud PONTE, 2010, p.61).
Para concorrer com o Majestic, em 1921 é inaugurado o cine Moderno
sendo que estes dois foram em parte responsáveis pelo escoamento da população
do Passeio Público, como já mencionado anteriormente.
Enfim, este tópico procurou trazer algumas explicações sobre como a
fotografia era uma atividade contagiante na cidade, nos dias de hoje pode ser
considerado algo comum, mas naqueles tempos com certeza, era motivo de
diversão e entretenimento para as pessoas, além disso, o surgimento do cinema na
cidade, atraiu as atenções de um público que procurava novas atividades de lazer e
fez com que uma parte da população desviasse sua atenção da principal referência
de lazer na cidade, o Passeio Público.
O próximo tópico irá retratar os clubes e os bailes de carnavais, as últimas
opções de lazer e atividades a serem apresentadas no capítulo.
47

4.4 Os clubes e o glamour dos carnavais

Muito se falou em praças, cafés e outros logradouros de grande


importância para a prática de atividades de lazer ao ar livre, mas outros
equipamentos foram também construídos para atender a necessidade do lazer diga-
se “privado”, os clubes.
Os clubes foram construídos para reunir pessoas em festas e solenidades
familiares, mas o detalhe é que estes não atendiam a população geral, mas sim
reunia a sociedade burguesa, em 1896 duas dessas entidades foram inauguradas
em Fortaleza, eram elas: a Associação Comercial do Ceará e o Clube Cearense,
“ambas compostas por estrangeiros e os mais ilustres cearenses” (PONTE, 2010,
p.146).
De acordo com Ponte (2010), antes do clube Cearense houve um esboço
do clube, chamada de Recreação Familiar Cearense, segundo Abreu, a Recreação
era “uma organização destinada a reunir, uma vez por mês, as famílias de Fortaleza,
aproximando-as para a sua cultura social, no apuro e na elegância de gente bem
educada”. (ABREU apud PONTE, 2010, p.147).

Ainda mencionando a Recreação, o autor Ponte afirma que:

Inaugurava-se, portanto aquilo que depois outros segmentos intelectuais e


profissionais intensificaram através do entusiasmo progressista-
regenerador que marcou a passagem do século XIX para o século XX: o
mundanismo civilizatório em Fortaleza. Essa inauguração ascendeu mesmo
a chama da necessidade urgente de lazer e sociabilidade urbanos na então
acanhada capital cearense [...]. (PONTE, 2010, p. 147).

O clube cearense reunia a sociedade elitista, e lá ocorriam bailes de


carnavais, danças, reuniões recreativas, matinées, torneio de bilhar entre outras
atividades. (CAMPOS, 1984) Para concorrer com o Cearense, em 1884 inaugura-se
o clube Iracema nome dado em referencia ao romance de José de Alencar, o clube
surgia para “revigorar o lazer e a civilidade da Capital” (PONTE, 2010, p.148), já que
seus membros era uma elite jovial menos nobiliárquica (PONTE, 2010).
48

Estes clubes serviram para o deleite das elites em suas atividades de


lazer, mas principalmente foram cenários dos ilustres bailes de carnavais, nos quais
a rivalidade de ambos ficava mais explicita.

O fato acima mencionado foi confirmado em 1896, como afirma Barbosa:

Duas sociedades carnavalescas distinguiram-se e ficaram famosas pelo


luxo e animação expostos no carnaval de 1896, os “Dragões de Averno” e
os “Conspiradores Infernais”, que se formaram nos recintos dos mais
luxuosos clubes da cidade, a primeira no clube “Cearense” e a segunda no
clube “Iracema”. Essas duas sociedades, segundo comentário de João
Nogueira, “(...) deixaram fama pelo luxo que ostentavam, no carnaval de
1896”. As grandes sociedades carnavalescas inspiravam-se nos carnavais
venezianos. (BARBOSA, 2007, p.14).

Aliás, os carnavais foram umas das principais atividades de lazer dos


clubes, nas palavras de Ponte (2010), “antes uma festividade predominantemente
popular e anárquica, o carnaval acabou se transformando, a um só tempo num lazer
comedido [...] e em acontecimento de extravagante luxo” (PONTE, 2010, p.151).

Mas os carnavais daquele período não se limitavam somente aos clubes,


já existia também o carnaval de rua da população, era o chamado “entrudo”, que era
uma espécie de brincadeiras de mal gosto, conforme Barbosa, “jogava-se água com
cuias, canecos e chiringas. Fora a água, atirava-se, alvaiade, pós de sapato[...] nos
transeuntes que passavam em baixo de janelas ou pelas ruas da cidade”
(BARBOSA, 2007, p.15).
Mesmo nos carnavais de rua era possível encontrar a mesma divisão que
se fazia no passeio público, por exemplo, a Avenida 7 de Setembro, localizada na
Praça do Ferreira, “era reservada somente paras as elites durante o carnaval”
(PONTE, 2010, p.120).

Neste contesto entram em cena novamente as sociedades carnavalescas,


isso porque:

Os desfiles das sociedades carnavalescas diferenciavam-se bastante das


brincadeiras do entrudo. A participação em tais cortejos era bastante
restrita. Somente os segmentos abonados podiam desfilar nas sociedades
carnavalescas, porque era preciso gastar com dispendiosas fantasias e
despesas da organização. (BARBOSA, 2007, p.15),
49

Neste momento, a sociedade burguesa fortalezense na Belle Époque


procurava ao máximo distinguir-se das camadas populares ostentando luxo em meio
a uma cidade que apresentava todos os tipos de problemas sociais, mas que
procuravam escondê-los por trás das mascaras carnavalescas.
Enfim, este capítulo procurou apresentar as mais diversas formas de lazer e
atividades realizadas pelos habitantes de Fortaleza no final do século XIX e inicio do
século XX, mas não é somente isto que se observa ao longo deste trabalho,
Fortaleza possui uma história riquíssima, e um gigantesco acervo cultural, recurso
este que não é valorizado pela sua população e nem conhecido pela maioria dos
turistas que a visitam todos os anos. A Belle Époque representa uma época em que
a capital cearense ganha destaque e finalmente passa a ser reconhecida.
50

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando iniciamos as pesquisas para a elaboração deste trabalho, não


imaginamos que iriamos nos deparar com tantas informações e tantos
acontecimentos importantes sobre a nossa capital, embora que tenhamos delimitado
à discussão sobre as atividades lazer.
Elaborar um trabalho sobre o lazer na Belle Époque foi de extrema
relevância para entender este período em nossa sociedade e suas contribuições
culturais e históricas para a população.
Quando nos deparamos com logradouros como a Praça do Ferreira,
imaginemos a magnitude que deveria ser as construções ali realizadas como os
cafés, por exemplo, Java sendo o mais famoso por ter sido o local onde se reunia a
boemia para uma conversa entre amigos, jogar cartas e ainda por ter sido o local
onde nasceu a Padaria Espiritual.
Os jardins localizados nas praças, locais que serviam para a prática de
esportes, passeios a bicicletas, piqueniques, ou seja, estas construções foram
erguidas exclusivamente para a prática das atividades de lazer, mas também para
representar estes belos tempos que a cidade aparentemente estava vivendo, isso
porque, não é possível ignorar que a maioria destas construções não eram
destinadas a todas as camadas da população, mas, para as elites que eram a
minoria na cidade e desejavam portanto que os ignorantes e os mais pobres fossem
afastados do perímetro central.
Enfim, este trabalho atingiu seu objetivo principal que é estabelecer a
relação da Belle Époque com as atividades de lazer dos habitantes da cidade de
Fortaleza, então, sendo assim se pode afirmar que os equipamentos direcionados
para a prática de atividades de lazer, foram construídos exclusivamente para este
período, e que as atividades praticadas neste período como o footing, o meeting, e
os bailes luxuosos de carnavais em estilo venezianos, também foram
completamente influenciados por este.
E junto com tudo isso, veio também a infraestrutura de apoio que a
cidade aos poucos recebeu, como no caso dos bondes, que eram utilizados para
51

ajudar no deslocamento das pessoas, não só para o trabalho como para que estas
pudessem chegar até os logradouros destinados ao lazer, já que Fortaleza crescia a
cada dia mais fora do perímetro central.
Boa parte destas idealizações realizadas na cidade foi exclusivamente
para representar o momento que Fortaleza estava vivendo, isso porque quando a
Belle Époque chega ao fim em meados dos anos 20 uma das primeiras medidas
tomadas pelo então prefeito Godofredo Maciel foi as demolições dos cafés e dos
jardins localizados na Praça do Ferreira, dando inicio a um novo ciclo na história de
Fortaleza.
Portanto fica claro que a Belle Époque foi um momento que proporcionou
grandes mudanças nos hábitos, nas vestimentas e principalmente no lazer da
população.
52

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