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UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL


CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO
ESTÁGIO EM ARQUITETURA E URBANISMO

ELIS LOUISE CUCHINIR OLEAS

LEI DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA EM CAXIAS DO SUL:


O CASO DO LOTEAMENTO REOLON

CAXIAS DO SUL
2018
2

ELIS LOUISE CUCHINIR OLEAS

ASSISTÊNCIA TÉCNICA EM CAXIAS DO SUL:


O CASO DO BAIRRO REOLON

Trabalho apresentado como parte dos


requisitos para aprovação na disciplina de
Estágio em Arquitetura e Urbanismo,
necessária para a graduação do curso de
Arquitetura e Urbanismo.

Orientador(a): Prof.ª Patrícia Pohlmann

Supervisor(a): Terezinha de Oliveira


Buchebuan

Campo de Estágio: TaliesEM – Escritório


Modelo de Arquitetura e Urbanismo

CAXIAS DO SUL
2018
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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Demandas lei de assistência técnica gratuita ...................................... 14


Figura 2 – Organograma lei de assistência técnica gratuita .................................. 15
Figura 3 – Assistência técnica nos estados brasileiros ......................................... 16
figura 4 – Postos da codhab em Brasília - DF ...................................................... 22
Figura 5 – Largo das palmeiras ............................................................................ 24
figura 6 – Praça do ipê ........................................................................................ 24
Figura 7 – Projeto assentamento 20 de novembro ............................................... 25
figura 8 – Passo a passo do processo .................................................................. 15
Figura 9 – Sociedade Barracão ............................................................................. 26
figura 10 – Projeto reurbanização sociedade Barracão........................................ 26
Figura 11 – Localização do município de Caxias do sul ....................................... 29
figura 12 – Evolução de assentamentos subnormais ......................................... 30
Figura 13 – Localização loteamento Reolon ......................................................... 32
figura 14 – Acessos loteamento Reolon ............................................................... 33
Figura 15 – Sobrados no bairro Reolon ............................................................... 34
figura 16 – Evolução do loteamento .................................................................... 35
Figura 17 – Mapa de limites territoriais ................................................................. 36
figura 18 – Mapa de cheios e vazios .................................................................... 37
Figura 19 – Mapa de usos .................................................................................... 38
figura 20 – Alturas ............................................................................................... 39
Figura 21 – Pavimentação vias ............................................................................ 40
figura 22 – Pavimentação calçadas..................................................................... 41
Figura 23 – Zoneamento ....................................................................................... 42
figura 24 – Mapa de remoções de residências ..................................................... 45
Figura 25 – Espaço sagrado reolon - “pinheiros” ................................................ 46
figura 26 – Igreja e salão da comunidade Reolon ............................................... 47
Figura 27 - Potencialidades e fragilidades do bairro ............................................ 47
figura 28 – Elementos do espaço de acordo com Santos (1988) ........................ 49
Figura 29 – Matriz com elementos e indicação de diretrizes para um termo de
referência ....................................................................................... 51
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LISTA DE TABELAS

TABELA 1 – Relação dos casos de ATHIS no Brasil ................................................ 17


TABELA 2 – Leis complementares e recursos utilizados .......................................... 19
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LISTA DE ABREVIATURAS OU SIGLAS

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística


PMCS Prefeitura Municipal de Caxias do Sul
SMH Secretaria Municipal da Habitação
TR Termo de Referência
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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 8
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .................................................................................. 11
2.1 LEI DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA GRATUITA..................................................... 11
2.1.1 Legislação sobre a Lei de Assistência Técnica Gratuita – Lei 11888/08 .......... 13
2.1.2 Casos de aplicação da Lei 11888/08 ............................................................... 16
3 O LUGAR ............................................................................................................... 29
3.1 A CIDADE DE CAXIAS DO SUL ......................................................................... 29
3.2 O LOTEAMENTO REOLON ................................................................................ 32
3.2.1 ASPECTOS MORFOLÓGICOS ....................................................................... 35
3.3 ANÁLISE DO PLANO DIRETOR ......................................................................... 41
4 APLICAÇÃO DE OFICINAS - DIAGNÓSTICOS ................................................... 45
5 DIRETRIZES PARA O TERMO DE REFERÊNCIA ............................................... 48
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 53
7.1 RECOMENDAÇÕES PARA TRABALHOS FUTUROS ....................................... 53
8 REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 54
8 APÊNDICES .......................................................................................................... 56
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RESUMO

O presente trabalho objetiva analisar a Lei 11.888/2008, Lei da


Assistência Técnica Pública e Gratuita, que predispõe sobre o acesso a serviços
técnicos de arquitetura e de engenharia para famílias com renda de até 3
salários mínimos. Entendendo-a como ferramenta primordial para o direito
social à moradia previsto no artigo 6º da Constituição Federal, espera-se a
partir desta análise, definir diretrizes para a elaboração de um Termo de
Referência para projeto de urbanização visando a aplicação da Lei de
Assistência Técnica na cidade de Caxias do Sul, Rio Grande do Sul. A
pesquisa resgata inicialmente o processo de habitação social no Brasil, bem
como o histórico de ações de governo na tentativa de minimizar o déficit
habitacional, identificando ações relacionadas à urbanização realizadas. Em
seguida, é realizada uma análise de casos referencias que aplicaram a Lei
11888/08 na dimensão urbanística, para identificar as formas de aplicação e as
ferramentas utilizadas no processo. A pesquisa faz um recorte do objeto de
estudo no Loteamento Reolon, na cidade de Caxias do Sul, que servirá de base para
a elaboração do Termo de Referência.

Palavras-chave: Assistência Técnica Gratuita; Lei 11888/08; Reolon; Caxias do Sul.


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1 INTRODUÇÃO

Segundo dados do IBGE, no ano de 2010, o município de Caxias do


Sul possuía cerca de 435.564 habitantes, chegando a uma população
estimada de 483.377 habitantes em 2017, e aproximadamente mais de 40 mil
famílias vivendo em situações de irregularidade. (PREFEITURA MUNICIPAL
DE CAXIAS DO SUL, 2018). Estas situações são geradas principalmente pelo
mercado de valorização de terra que exclui as famílias com menor renda do
processo, obrigando-as a ocupar as áreas que “sobram” na cidade. Estas
áreas são chamadas de ocupações, vilas ou favelas.
Para tratar o problema das irregularidades, o Poder Público tem
optado por realizar remoções e deslocamentos de famílias e comunidades
inteiras para novos loteamentos, localizadas em terra mais barata e
geralmente na periferia da cidade. Porém, estas novas localizações
geralmente não possuem acesso aos serviços básicos necessários para a
vida em sociedade como assistência médica, emprego, educação e lazer.
Este deslocamento das famílias desestrutura a organização social e o senso
de comunidade, tão raro, porém ainda presente dentro dessas sociedades
marginalizadas. É um equívoco construir grandes conjuntos habitacionais e
deslocar comunidades inteiras onde uma reforma, ampliação ou melhoria do
entorno seriam suficientes.
Sancionada em 2008, a Lei 11888/08 traz o subsídio público para
que arquitetos, engenheiros, escritórios modelos de arquitetura e urbanismo
possam atender, com Assistência Técnica gratuita, cada família ou grupo de
famílias.
Dentro deste contexto, a pesquisa de estágio surge através de uma
demanda do TaliesEM - Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo da
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Universidade de Caxias do Sul, que tem como interesse firmar parcerias com
o Poder Público e demais entidades para a aplicação da Lei no Município. O
trabalho tem como objetivo a elaboração de um documento que apontará
diretrizes que subsidiarão a elaboração de Termo de Referência para
contratação de execução de projetos urbanísticos, tendo como base a Lei de
Assistência Técnica nº 11.888/2008. Os objetivos específicos são: mapear
quais munícipios já aplicaram a lei de Assistência Técnica no Brasil através e
identificar os instrumentos relacionados à urbanização aplicados; analisar o
Plano Diretor para identificar as zonas de interesse específico e social no
bairro Reolon; realizar oficinas/entrevistas com os moradores para definir
diretrizes de requalificação do bairro; analisar os resultados.
Com a realização do trabalho o TaliesEM - Escritório Modelo de
Arquitetura e Urbanismo poderá desenvolver ferramentas necessárias para
atuar como ponte entre Universidade, Poder Público e Comunidade. A
aplicação da lei também influenciaria na formação profissional dos arquitetos
e urbanistas, pois prevê que acadêmicos em fase final de graduação sob
supervisão de profissional legalmente habilitado possam atuar junto às
comunidades, contribuindo para sua capacitação e explorando um novo
campo de atuação. Resgata ainda o papel social da arquitetura, na promoção
de uma sociedade mais justa e igualitária.
Para o Poder Público, o trabalho auxilia indicando ferramentas
possíveis para a aplicação da lei. Destaca-se ainda que, as diretrizes
definidas para o Termo de Referência, resultado final da pesquisa, pretende
auxiliar na elaboração de um termo de referência agilizando o processo de
contratação de empresas por licitação.

As comunidades serão as principais beneficiadas pois, o termo de


referência auxiliará nos processos burocráticos para a melhoria dos espaços
privados e públicos. A lei ainda prevê que as moradias sejam construídas de
forma colaborativa com os moradores, fortalecendo a sensação de
pertencimento, vínculo com a comunidade e contribuindo para o aumento da
autonomia entre eles. Ao participarem ativamente do processo os moradores
compreenderão o espaço como sendo seu, sentindo-se responsáveis
cuidando-o e fiscalizando-o.
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Quanto aos procedimentos metodológicos, a pesquisa é organizada


nas seguintes etapas: pesquisa bibliográfica sobre o tema (Lei 11888/08) -
histórico sobre Assistência Técnica no Brasil; mapeamento dos Munícipios que
já aplicaram a lei de Assistência Técnica no Brasil e identificar os instrumentos
relacionados à urbanização utilizados; pesquisa e análise de
casos/referenciais; Visitas à campo e entrevista com as famílias para mapear
fragilidades do bairro; sistematização dos dados e análise de resultados.
Quanto à abordagem, a pesquisa é qualitativa, pois busca aprofundar-se no
tema e estudar uma realidade que não pode ser quantificada. Quanto à
natureza, é aplicada, através da realização de entrevistas e oficinas com a
comunidade. Em relação aos objetivos é exploratória por envolver a
sistematização dos dados provenientes da aplicação das atividades e a análise
dos resultados.
11

2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

O objetivo desse capítulo é explorar os principais conceitos


relacionados ao tema para construir a base teórica necessária para uma
melhor compreensão da Lei de Assistência Técnica Pública e Gratuita e sua
aplicação em alguns municípios brasileiros, bem como destacar a relação do
sujeito com seu espaço autoconstruído através dos conceitos do autor Nikos
Salingaros.

2.1 LEI DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA GRATUITA

O processo de industrialização trouxe grandes problemas de habitação.


A população, vinda do campo, geralmente habitava vilas ao redor das fábricas
sem infraestrutura adequada. Surgem as favelas, cortiços e vilas operárias com
o intuito de aproximar-se dos centros e dos focos de indústria. Segundo Rolnik
(1997) a história da habitação popular brasileira é marcada pela autoprodução
e autogestão resultando, muitas vezes, ao mau emprego de materiais de
construção, desperdício e falta de qualidade das habitações e do entorno.

Logo após esse período de expansão da indústria, surgem as primeiras


políticas públicas na tentativa de conter essa problemática, porém sem efeito
satisfatório, pois eram políticas higienistas, que removiam habitações e cortiços
na busca pela modernização e salubridade (GONÇALVES; SANTOS, 2010).

Por volta de 1937, inicia-se a produção de conjuntos habitacionais em


larga escala, feitos pelo Estado, cujo marco foi a criação, das carteiras prediais
dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs). Os Institutos exerceram um
papel de extrema importância na produção de habitações de interesse social
no Brasil, representando o aumento da atuação estatal na construção e
financiamento de moradias e contribuindo para amenizar o déficit habitacional
no país, concebendo entre os anos de atuação (1937-1964) aproximadamente
125.000 unidades habitacionais.

Por volta de 1964 e 1966, com a extinção dos IAPIs criou-se o Banco
Nacional de Habitação que absorveu suas atribuições e que, apesar da enorme
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quantidade de produção, deixou a desejar em termos qualitativos (MEDEIROS,


2007 apud GONÇALVES; SANTOS, 2010).

Em 1976 surge a proposta da Assistência Técnica à Moradia


Econômica, em Porto Alegre, o Programa ATME, coordenado pelos arquitetos:
Clovis Ilgenfritz da Silva, Newton Burmeister, Carlos Maximiliano Fayet e
Claudio Casaccia e os advogados Manuel André da Rocha e Madalena Borges.

Em 1980, em São Paulo, alguns movimentos sociais desenvolveram


atividades de Assistência Técnica Coletiva em regime de autogestão. Essa
iniciativa, com o financiamento público, expandiu-se por todo o país.

A partir do final de 1990 surgem leis municipais que garantiam a


assistência Técnica para projetos e execuções habitacionais em cidades como
Porto Alegre, Campo Grande, São Paulo, Vitória.

Ao final de 1990 a comunidade acadêmica também começa a se


mobilizar em prol da Assistência Técnica e neste momento surge o Escritório
Modelo de Arquitetura e Urbanismo através da FeNEA - Federação Nacional
dos Estudantes de Arquitetura e Urbanismo do Brasil – como uma extensão
universitária focada em atender famílias de baixa renda. Em 2000 a moradia
torna-se direito social do cidadão, garantida pela Constituição Federal.

Em 2001 é aprovado o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/01), criando o


instrumento de Assistência Técnica e Jurídica para atender às parcelas menos
favorecidas da sociedade.

Em 2005, foi criado o Sistema Nacional de Habitação de Interesse


Social, o SNHIS, através da lei 11.124/05 com o objetivo de implementar
subsídios advindos do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social. Como
consequência surgem, em municípios de todo o país, os Planos Locais de
Habitação de Interesse Social. Também surge, neste momento, o programa
habitacional do Governo Federal, o Minha Casa, Minha Vida.
13

Em dezembro de 2008 é sancionada, pelo então presidente da


República, Luiz Inácio Lula da Silva, a Lei 11888 que cria a Assistência Técnica
Pública e Gratuita às famílias de baixa renda. (REVISTA PROJETAR, 2009)

2.1.1 Legislação sobre a Lei de Assistência Técnica Gratuita – Lei 11888/08

A lei de Assistência Técnica assegura às famílias de baixa renda a


assistência técnica pública e gratuita para famílias de até três salários mínimos,
tanto no meio rural quanto urbano, como parte integrante do direito social à
moradia previsto na Constituição Federal. Além da moradia, a qualificação do
espaço e inserção urbana adequada também são objetivos da lei.

O artigo 2º aborda alguns objetivos da lei como: otimização e


qualificação da moradia bem como seu entorno; formalização dos processos
junto à prefeitura; planejamento para evitar ocupações futuras em áreas de
risco e de interesse ambiental e qualificação do lugar e inserção urbana
adequada.

O artigo 3º aponta que, além do Fundo Nacional de Habitação de


Interesse Social, é necessário o apoio financeiro da União aos Estados e aos
Municípios. Ainda destaca que os serviços podem ser oferecidos diretamente
às famílias ou à grupos organizados e devem ser priorizadas iniciativas sob
regime de mutirão e os casos em zonas de interesse social. As famílias
beneficiadas devem ser selecionadas pelos conselhos municipais, como o
Conselho da Habitação.

Já o artigo 4º da Lei trata que os serviços devem ser prestados por


profissionais de Arquitetura e Urbanismo e Engenheiros, sendo eles:
funcionários públicos, profissionais de ONG’S, profissionais vinculados às
Universidades através de Escritórios Modelos e Escritórios Públicos,
profissionais liberais ou representantes de pessoas jurídicas. A seleção desses
profissionais é feita através de entidades como sindicatos, associações de
arquitetos que fazem convênios com os Estados e Municípios. Destaca-se que
a Anotação de Reponsabilidade Técnica deve ser primordial.
14

A lei 11888/08 ainda prevê em seu artigo 5º que as entidades de


profissionais e Universidades podem atuar na qualificação dos profissionais por
meio de capacitação, residência ou extensão universitária nas áreas de
arquitetura e urbanismo ou engenharia.

Observa-se na figura 1, as demandas que cada agente pode atuar


(iniciativa privada, poder público e universidades). O Escritório Modelo
(universidade), por exemplo, pode atuar na produção e melhoria de moradias;
Assessoria para promoção de justiça e inclusão nas cidades de forma efetiva e
Regularização Fundiária, Infraestrutura de espaços públicos de forma parcial:

Figura 1 – demandas lei de assistência técnica gratuita

FONTE: Adaptado de CAU/SC (2018).

O Parágrafo Único ressalta a importância da pesquisa e


desenvolvimento de novas tecnologias bem como o desenvolvimento de
metodologias que incluam a participação da comunidade nas tomadas de
decisões de forma democrática.

Passados 10 anos da promulgação da lei ainda é necessário que haja


maior divulgação e esclarecimentos acerca de sua aplicação e maior
organização das prefeituras e dos profissionais de arquitetura e engenharia.
15

Para que a aplicação da Lei ocorra é necessário que a mesma seja


custeada com recursos de fundos federais direcionados à habitação de
interesse social, recursos públicos orçamentários ou por meio de iniciativas
privadas.

Com base na figura 2, observa-se que para que a lei possa ser
efetivamente aplicada é necessário firmar convênios e parcerias com diferentes
atores: Governo Federal articulado com Ministério das Cidades e que promova
o repasse de recursos; prefeitura que promova o cadastramento dos
beneficiários, bem como a articulação entre estes e as entidades (IAB,
Escritórios Modelos de Arquitetura e Urbanismo, ONG’s); profissional
habilitado, cadastrado a alguma entidade.

Figura 2 – Organograma lei de assistência técnica gratuita

FONTE: Elaborado pela autora a partir de Camacho (2016).

Muitos municípios ainda ignoram as verbas disponíveis no Fundo


Nacional de Habitação e Interesse Social (FNHIS), dificultando ainda mais a
aplicação da lei. Aponta-se também carências do poder público em gerenciar
16

os recursos públicos para habitação de interesse social e a importância do


trabalho técnico na orientação destas ações.

2.1.2 Casos de aplicação da Lei 11888/08

Em uma análise sobre os casos de aplicação da Lei de Assistência


Técnica Gratuita no Brasil, apresentados na Figura 3, observa-se uma maior
concentração na região Sul, sudeste e centro-oeste, principalmente nos
estados: Rio Grande do Sul e São Paulo, em contraposição à região nordeste
onde os casos são mais pontuais.

Figura 3 – Assistência técnica nos estados brasileiros

FONTE: Santos (2014)

Na tabela 1, foram listados os casos de aplicação da Lei identificados


em cada estado. São variadas formas de atuação desde extensões
universitárias, assessorias, ONGS e iniciativas públicas e privadas. Destaca-se
que a implementação da Lei nestes estados só foi possível graças aos arranjos
institucionais e parcerias firmadas entre os diversos atores ( públicos e
privados).
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Tabela 1 - Relação dos casos de ATHIS no brasil


Região Norte
Estado Casos de Aplicação da ATHIS
Amazonas Extensão Universitária em Habitação popular – UFAM
Prosamim – Programa Sócio Ambiental dos Igarapés de
Manaus – SUHAB – Secretaria de Habitação do Estado do
Amazonas
Pará Assessoria Social em Habitação – Associação dos Sem Teto
de São Félix do Xingú
Habitação em áreas alagadas – Prefeitura Municipal de São
Sebastião da Boa Vista

Região Nordeste
Estado Casos de Aplicação da ATHIS
Bahia Escritório Público de Arquitetura da Universidade de Salvador
Escritório Público da Prefeitura de Salvador
Residência em Arquitetura e Urbanismo e Engenharia -
RAU+E/UFBA
Pernambuco Programa de melhoria Habitacional ProHabite – Visão Mundial
Programa Parceria nos Morros – Empresa de Urbanização de
Recife
Projeto Beira Rio – Prefeitura de Recife
Rio Grande do Norte Programa Nossa Casa – CREA/RN e UFRN
Ceará Projeto de Microurbanização no Bom Sucesso em Castelinho –
CearaH – ONG

Região Centro-Oeste
Estado Casos de Aplicação da ATHIS
Distrito Federal Programa Casa da Gente - FINATEC
União que Constrói – CONAG – Conselho Administrativo e
Participativo do Guará
Assistência Técnica à Habitação – EGL - Engenharia
CODHAB – Companhia de Desenv. Habitacional
Mato Grosso do Sul Construindo Legal - EMHA – Empresa Municipal de Habitação
Programa Casa Solidária – Universidade Federal do Mato
Grosso do Sul

Região Sudeste
Estado Casos de Aplicação da ATHIS
Minas Gerais Arquiteto da Família – Projeto de Extensão da FUMEC
Casa Legal – Projeto de Extensão da Universidade Federal de
Viçosa
Programa Crédito Solidário – executado por CJ Arquitetos
Associados
Projeto Calço – Programa de Extensão do Centro Universitário
do Leste de Minas Gerais
Projeto Técnico Solidário – Projeto de Extensão da
Universidade Federal de Viçosa
Projeto Piloto de Arquitetura Pública – Secretaria Municipal
Adjunta de Regularização Urbana
Teto para Todos – Prime Solidária, Organização da Sociedade
Civil
18

Região Sudeste
Estado Casos de Aplicação da ATHIS
Rio de Janeiro Mediação na Laje – Instituição Viva Rio
Melhorias Habitacionais na Favela Santa Marta – Secretaria de
Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano do Rio de Janeiro
Programa de aperfeiçoamento Profissional – Instituto dos
Arquitetos do Brasil - RJ
Projeto El Paso – Associação Habitat para a Humanidade
Parabá do Sul
Programa de Subsídio Habitacional – Sindicato dos Arquitetos
do Rio de Janeiro
São Paulo Reabilitação de edifício em área central – Integra –
Cooperativa de trabalho interdisciplinar
PROSANEAR – Convênio UGP PAT
PROSANEAR/SNSA/UMC
Projeto Casa Assistência Técnica – Universidade São
Francisco
Programa Municipal de Habitação por autogestão – CAAP –
Centro de Assessoria a autogestão popular
Projeto Inovarural – Escola de Engenharia de São Carlos

Região Sul
Estado Casos de Aplicação da ATHIS
Paraná Assistência Técnica em Campo Mourão – Instituto de
Planejamento Urbano de Curitiba - IPPUC
Habitar Brasil BID – Projeto Xanpinhal – Companhia de
Habitação Popular de Curitiba
Habitar Rural – Cooperativa Central de Crédito Rural com
interação solidária
Projeto Casa Ecológica – Amacidade Associação de
Desenvolvimento Comunitário da Defesa da Cidadania e do
Meio Ambiente
Santa Catarina Mutirão Habitacional – Arquiteto autonômo
Projeto Unocidadania – Universidade Regional de Chapecó –
UnoChapecó
Vila Amizade – Empresa IPM – automação e Consultoria ltda
Rio Grande do Sul Assistência Técnica à Moradia Social – Universidade Federal
de Pelotas
Autoconstrução gerenciada pela Prefeitura – Empresa
Irribarem Empreendimentos
Assentamento 20 de Novembro

FONTE: Elaboradora pela autora a partir de Santos (2014).

Na tabela 2 foram listadas as Leis complementares à Assistência


Técnica e Gratuita existentes em alguns municípios brasileiros e que viabilizam
a implantação da mesma. Foram identificadas diversas formas de obtenção de
recursos para a aplicação da Lei (fundo municipal, recursos orçamentários).
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Tabela 2 – leis complementares e recursos utilizados


Lei de ATHIS Beneficiários Atribuições Financiamento
Projetos e execução
FNHIS –
Baixa renda de até 03 para Produção e
8.287/2012 Fundo
SM Reforma de Moradia;
Salvador/BA Municipal -
Regularização da
convênios
edificação e fundiária;
Baixa Renda sem Recursos do
especificar renda / Projetos e execução Fundo de
12.215/2009 a ser identificado para Produção e Incentivo à
Ribeirão pelo Reforma de moradia; Construção de
Preto/SP Conselho Municipal Regularização da Moradia
de edificação e fundiária; popular –
Habitação FN/MORAR
8583/2011 Baixa Renda até 05 Projetos e execução
Florianópolis/SC SM para Produção e
Não indica –
Reforma de Moradia;
apenas convênios
Regularização
edificação e fundiária;
Baixa Renda até 03
SM Projetos e execução Recursos do
5.485/2015 com recursos para Produção e FNHIS –
Distrito federais e distritais e Reforma de Moradia; dotações
Federal/BRB até 05 SM Regularização orçamentárias
com recursos do edificação e fundiária; e fundos gerais
Distrito Federal

Projetos e execução Recursos do Fundo


Produção e Reforma Municipal de HIS –
8.960/2012 Baixa renda até 03
de Moradia; Orçamentários –
Belém/PA SM
Regularização privados em
edificação e fundiária; convênios

Não identifica.
2.572/2001 Vincula às Regularização Recursos
Tubarão/SC moradias com até edificação e fundiária; orçamentários
60m²

Baixa renda até 03 Projetos e execução


SM com moradia para Produção e
194/2011
de até 60m² e com Reforma de Moradia; Não indicado
Suzano/SP
direito a um Regularização
atendimento. edificação e fundiária;
Baixa renda com
Produção e Reforma
faixa salarial não
13.433/2002 de Moradia;
dentificada. Não indicado
São Paulo/SP Regularização
Prioridade para
edificação e fundiária
mutirão.
Fonte: CAU/SC (2018).
Para viabilizar a aplicação da Lei é necessário que haja alguns
financiamentos e/ou subsídios que podem variar de acordo com o arranjo
institucional envolvido.
Com base nessas informações destacam-se alguns casos que podem
servir de referência para a presente pesquisa.
No Rio Grande do Sul, o Município de Pelotas é pioneiro na implantação
da Lei de Assistência Técnica desenvolvendo tanto projetos arquitetônicos
quanto urbanísticos. Isso foi possível através de uma parceria entre a
Universidade Federal de Pelotas e a Prefeitura Municipal. Destaca-se também
o Projeto Morar Sustentável do SAERGS (Sindicato dos Arquitetos do Rio
Grande do Sul), tendo como caso recente o Assentamento 20 de Novembro,
em Porto Alegre.
Um caso de grande sucesso da aplicação da Lei pelo poder público e
que merece destaque é o da CODHAB - Companhia de desenvolvimento
Habitacional do Distrito Federal – sendo pioneira na implantação da Lei
11888/08 no Brasil e atuando desde 2015. Este caso será estudando no
capítulo seguinte, pois sua forma de organização e atuação pode servir de
referência para uma possível aplicação no município de Caxias do Sul.

2.1.1.1 O Caso CODHAB

A companhia de desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal


(CODHAB)1 é pioneira na implementação da Lei 11888/08 – Lei de Assistência
Técnica – no Brasil, atuando desde abril de 2015. A empresa pública possui
dez escritórios de Assistência Técnica distribuídos nas regiões mais carentes
de Brasília (Figura 4): quatro atendem pelo “Projeto na Medida” que prestam
serviços às famílias de forma individualizada e seis focados na reurbanização e
requalificação de espaços públicos.

_______________
1
A Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal (CODHAB/DF) está vinculada à
Secretaria de Estado de Gestão do Território e Habitação (SEGETH), é uma empresa pública integrante da
Administração Indireta do Governo do Distrito Federal.
21

Figura 4 – Postos da assistência técnica da codhab em Brasília – DF

FONTE: CODHAB-DF (2018).

O “Projeto na Medida” oferece serviços de arquitetura para solucionar


problemas de salubridade e segurança no interior das residências. Para ter
acesso à assistência técnica o morador deve se inscrever e acompanhar todo o
procedimento no próprio posto, que também contrata a mão de obra e compra
o material de construção, com um teto de R$ 13.500 por família.

Além dos serviços nas residências os dez escritórios desenvolvem


ações urbanas de melhoria nas ruas, parques e áreas públicas das
comunidades (Figuras 5 e 6), sendo seis deles dedicados exclusivamente a
isso. As intervenções ocorrem por meio de mutirões comunitários, conforme
prevê a lei.

Estando dentro das comunidades os postos conseguem identificar as


fragilidades das comunidades e suas reais necessidades, auxiliar em conflitos
fundiários e ocupações irregulares em áreas de proteção ambiental, bem como
ter conhecimento sobre as desocupações necessárias para o processo de
urbanização.
22

Figura 5 – Largo das palmeiras

FONTE: CODHAB-DF (2018).

LEGENDA: Largo das Palmeiras, no Sol Nascente - DF antes e depois de revitalização

Figura 6 – Praça do ipê

FONTE: CODHAB-DF (2018).

LEGENDA: Praça do ipê, em Buritizinho – DF, antes e depois de um mutirão.

Além disso, a CODHAB ainda conta com ações urbanas, em formato


de mutirões participativos, que acontecem nos seguintes eixos: revitalização de
fachadas, galeria de arte urbana, mobiliário urbano com material reciclado,
arborização urbana e plantio de hortas e jardins (CODHAB, 2018). Sobre os
trabalhos de assistência técnica desenvolvidos Gilson Paranhos, presidente da
CODHAB aponta que:

“Já foram 50 mutirões de renovação urbana e 12 concursos públicos


de Arquitetura para projetos de unidades habitacionais coletivas, edifícios de
uso misto, Unidade Básica de Saúde, Centro de Ensino Infantil, Centro de
Ensino Fundamental e habitações de interesse social” (PARANHOS, 2018).

A CODHAB, apesar de ser um caso distinto de atuação, é um exemplo


a ser seguido por todos os municípios brasileiros. Sua forma de organização e
distribuição dos postos de atendimento possibilita que cada comunidade tenha
23

acesso facilitado ao profissional de arquitetura e permite que o arquiteto tenha


pleno conhecimento da área de intervenção, reconhecendo suas fraquezas e
potencialidades, e podendo, assim, atuar de forma mais efetiva.

2.1.1.2 O Caso do Assentamento 20 de Novembro em Porto Alegre

Originalmente, em 1955, a edificação, localizada na Rua Barros Cassal,


em Porto Alegre seria destinada a um hospital para os funcionários da extinta
Rede Ferroviária Federal, mas o projeto foi abandonado. O prédio ficou vazio
por aproximadamente 50 anos, até que em 2013 foi ocupado pelo
Assentamento 20 de Novembro, tornando-se o lar de diversas famílias de baixa
renda. Em março de 2016 a ocupação recebeu a concessão do direito de uso
do imóvel e foi criada a Cooperativa de Trabalho e Habitação 20 de Novembro
(sem fins lucrativos).
Figura 7 – Projeto assentamento 20 de novembro

FONTE: CAU/BR (2018).

A proposta de reforma faz parte do projeto Morar sustentável do


SAERGS (Sindicato dos Arquitetos do Rio Grande do Sul) que foi selecionado
pelo edital de patrocínios do programa de Assistência Técnica para Habitação
de Interesse Social (ATHIS) do Conselho de Arquitetura e Urbanismo
(CAU/RS).
O patrocínio do CAU é apenas para os projetos, para viabilizar a obra a
mesma está sendo financiada pelo Programa Minha Casa Minha Vida
Entidades. Este programa foi criado em 2009 para viabilizar moradias para
famílias organizadas em cooperativas habitacionais, associações, e demais
entidades privadas sem fins lucrativos (Contemplando famílias de renda
mensal bruta de até R$1.600,00).
24

O Projeto é gerenciado pela Cooperativa De Trabalho e Habitação 20 de


Novembro, Movimento Nacional De Luta Pela Moradia e Confederação
Nacional de Associações de Moradores e os moradores trabalham em mutirão.
Na figura 8 podemos observar como ocorreu o passo a passo para que a
aplicação Lei pudesse ser feita nesse caso.

Figura 8 – passo a passo do processo

FONTE: TALIESEM (2018).

2.1.1.3 O Caso da Reurbanização Sociedade Barracão

Um caso recente da aplicação da Lei 11888/08 ocorreu em Curitiba, no


bairro Boqueirão, em uma área conhecida por Sociedade Barracão (Figura 9).
Atualmente, 12 famílias de catadores de material reciclável moram no terreno
de 1.443 m², onde funcionava uma antiga fábrica de máquinas e de peças
industriais. O projeto de reurbanização da área foi feito por um Coletivo da
Cidade e ocorreu com a participação dos moradores. Já foram demarcados 12
lotes e houve abertura de uma rua interna. Ainda está previsto o calçamento do
entorno em concreto vazado e a plantação de árvores frutíferas (Figura 10). A
mão de obra será dos próprios moradores, de parceiros do projeto e dos
profissionais do Coletivo. A falta de recursos para a execução levou a equipe a
procurar financiamentos coletivos. O Coletivo também prestará a assistência
técnica e gratuita com projetos para construção e reforma das residências.
25

Figura 9 – Sociedade barracão

FONTE: GAZETA DO POVO (2018)

Figura 10 – Projeto reurbanização sociedade barracão

FONTE: CAU/BR (2018)

Este projeto servirá de referencial para a pesquisa, pois possui


características de arranjos produtivos locais (reciclagem) parecidas com o
loteamento em estudo (comunidade de catadores).
26

2.2 HABITAÇÃO SOCIALMENTE ORGANIZADA

Para entender as sociedades faz-se necessário compreender a relação


do indivíduo com seu meio e como isso influencia sua forma de organização.

De acordo com Nikos Salingaros (2010), o modelo de cima-para-baixo


(governos construindo cidades) ignora a complexidade física e social do tecido
urbano e não age de forma efetiva na resolução dos problemas sociais. A
“habitação social” é usualmente entendida como um projeto para os pobres,
construída e financiada pelos governos ou organizações não governamentais
que ignora as reais necessidades da população, como o acesso facilitado à
equipamentos urbanos (hospitais, escolas, UBS), bem como ignora as
necessidades individuais (localização da moradia, arranjos da comunidade).

Salingaros (2010) busca soluções para melhorias no processo de


desenvolvimento urbano das habitações de interesse social, através de uma
metodologia que valoriza a forma dos moradores de fazer cidade (ao construir
suas residências e seu entorno). Caracteriza como um processo de projeto no
sentido de baixo-para-baixo pois é conduzido por e a partir da comunidade.
Para o autor, trabalhar de forma interligada, com foco nos espaços e suas
complexidades e aplicando métodos de produção habitacional que abranjam o
conhecimento da comunidade, garante o bom desempenho do lugar
(Salingaros, 2010). Ele julga importante que os indivíduos experenciem o
processo de desenho e construção como seu processo e busca, com isso,
estabelecer conexões e engajamento. O autor propõe técnicas para que tudo
seja feito de forma conjunta com a população, em uma troca de experiências,
que torna o processo de projetar mais humano, orgânico e menos engessado.
Neste trabalho, entende-se que tal abordagem pode ser conduzida tanto pelo
governo quanto por instituições, como as universidades, desde que o processo
de projeto permita o engajamento da comunidade.
27

Ainda segundo Salingaros (2010), o tecido urbano orgânico é uma


extensão da biologia humana: cheio de vida, porém pobre e insalubre;
enquanto a construção planejada é a imposição artificial do homem sobre a
natureza e é limpo e eficiente, porém estéril. Esta analogia explica a
preocupação dos governos em impedir que a periferia avence e ocupe outras
áreas da cidade. Pois, segundo o autor, a favela não planejada e
autoconstruída é vista pela administração pública como uma representação da
falta de progresso que deve ser combatida.

No geral, os governos desconsideram as vantagens econômicas da


existência das favelas: mesmo com todas os problemas e defeitos, elas
oferecem uma demonstração instrutiva espontânea de um processo
econômico, rápido e eficiente de abrigar pessoas.

A sua geometria orgânica é boa, no entanto, é este aspecto que é


mais rejeitado. Ele não se adapta à estereotipada (e cientificamente
fora de moda) imagem daquilo com que um tecido urbano progressivo
deveria se parecer – organizado, uniforme, retangular, modular e
estéril. A geometria orgânica da favela está ligada ao ato ilegal de
invadir e com a falta de lei generalizada (SALINGAROS, 2010. p.
195).

E ele ainda acrescenta que, se quisermos construir tecidos urbanos


vivos é necessário que este preconceito seja abandonado, pois as favelas têm
um mecanismo de auto cura único e que é raro para a maioria dos esquemas
de habitação social desenvolvidos pela administração pública.

Para Salingaros a geometria urbana deve ser usada de forma a impedir


o isolamento social. Deve-se projetar e construir tecidos urbanos complexos e
de usos mistos, e garantir que eles adaptem-se aos tecidos já existentes. A
habitação social e a habitação geral devem fazer parte de um processo
saudável de urbanismo, onde há mistura de tipologias, usos e classes.

O autor ainda destaca os “espaços sagrados”, ou seja, espaços que


possuem grande valor para a comunidade, sejam por fatos históricos ocorridos
ou por características presentes que o transformam em um local de encontro e
valoração. Estes podem ser tantos espaço fechados (bares, igrejas, salões,
etc) quanto espaços abertos (praças, parques, etc).
28

O presente trabalho, buscar definir diretrizes para criar um processo de


projeto no sentido de baixo-para-cima possibilitando o engajamento da
comunidade no projeto de melhorias de seu bairro. Para isso foram realizadas
entrevistas com os moradores conforme Apêndice A.

2.2 ESPAÇO E MÉTODO – OS ELEMENTOS DO ESPAÇO : ENUMERAÇÕES


E FUNÇÕES

Para Santos (1988) um espaço compõe-se dos seguintes


elementos: os homens, as firmas, as instituições, o chamado meio ecológico e
as infraestruturas.
Os homens são elementos do espaço, seja como fornecedores do
trabalho ou candidatos a isso, jovens, desempregados ou não empregados
(Santos, 1988).
Segundo Santos (1988) mesmo os homens que não participam
diretamente da produção apenas por estarem presentes no lugar geram certo
tipo de demanda de trabalho pra outros.
A demanda de cada indivíduo na sociedade é respondida em parte pelas
firmas e em parte pelas instituições. As firmas são responsáveis pela produção
de bens, serviços e ideias. Já as instituições produzem normas, ordens e
legitimações (Santos, 1988).
O meio ecológico é o conjunto de complexos territoriais que constituem a
base física do trabalho humano. Infraestruturas são o trabalho humano
materializado e geografizado na forma de elementos como casas, plantações,
caminhos, etc. (Santos, 1988).
29

3 O LUGAR
Nesse capítulo pretende-se obter um aprofundamento quanto ao objeto
de estudo. Para tal, busca-se entender a evolução e o desenvolvimento do
Loteamento Reolon e também fazer uma análise de suas características
morfológicas. Através dessa pesquisa foi possível também perceber quais as
potencialidades e as fragilidades do bairro. Nesse conjunto de informações é
que se percebem alguns elementos que subsidiarão a elaboração do Termo de
Referência.

3.1 A CIDADE DE CAXIAS DO SUL

Para uma melhor compreensão da área, inicia-se com um breve relato


sobre o município de Caxias do Sul localizado na porção Nordeste do estado
do Rio Grande do Sul, na Serra Gaúcha (Figura 11). Possui uma área territorial
de 1652,30 KM² e uma população estimada em 483.377 habitantes (IBGE,
2010).

Figura 11 – Localização do município de caxias do sul

FONTE: Elaborado pela autora (2018)

Caxias do Sul teve suas primeiras ocupações em 1872 e 1875 com a


chegada dos imigrantes alemães e italianos, nessa época pertencia ao
30

município de São Sebastião do Caí (KORMANN; WIGGERS, 2010) e tinha


como principal atividade econômica a agricultura. Consolida-se como cidade
em 1910, inicialmente com o nome de Vila de Santa Tereza, com
aproximadamente 3.700 habitantes.

Em 1920, o Código de Posturas proibia a construção de prédios de


madeira na área urbana de Caxias do Sul (MACHADO, 2001). A partir disto,
nota-se o início da separação de classes por faixa de renda no município: a
população com menor poder aquisitivo vê-se obrigada a ocupar as periferias,
onde não havia tantas exigências para a construção de moradias.
Paralelamente a isso, ocorre a expansão da economia através das indústrias
caxienses, levando um grande fluxo de pessoas para a cidade. Essa população
recém-chegada direciona-se também para as periferias, (KORMANN;
WIGGERS, apud GIRON, 1977) dando origem aos primeiros assentamentos
autoproduzidos. Em 1940, a construção da BR-116 ligando Caxias do Sul ao
restante do país agravou ainda mais a situação. A figura 12 demonstra o
crescimento dos assentamentos subnormais no município nos períodos entre e
2010. Nota-se a concentração de invasões nas periferias da cidade.

Figura 12 – Evolução de assentamentos subnormais em Caxias do Sul

1968 1988

1998 2010

FONTE: KORMANN; WIGGERS (2010)


31

A primeira manifestação de políticas de habitação de interesse social


na cidade ocorre em 1947 com o FUNCAP – Fundo da Casa Popular, que tinha
como objetivo subsidiar os funcionários do munícipio a adquirir suas moradias.
Em 1970 a lei do FUNCAP é ampliada e passa a abranger a população com
até 3 salários mínimos.

Em 2010 surge o Plano Local de Habitação de interesse Social –


PLHIS – lançado pela Prefeitura em Parceria com a Universidade de Caxias do
Sul com o intuito de fazer um diagnóstico sobre a habitação em Caxias do Sul
e habilitar o município para que participasse de programas do Governo Federal
voltado à habitação. (CAXIAS DO SUL, 2010)

De acordo com PLHIS de Caxias do Sul (2010) atualmente, o


município conta com os seguintes financiamentos do setor habitacional :

a) Habitar Brasil: visa a intervenção em assentamentos subnormais;

b) Urbanização, Regularização e Integração de Assentamentos


Precários;

c) Pró-Municípios: financia obras de infraestrutura urbana, a elaboração


de Planos Diretores, a produção ou aquisição de Unidade Habitacional,
a urbanização de assentamento precários, entre outros;

d) Habitação de Interesse Social: financia a produção ou aquisição de


moradia para famílias com renda de até 3 SM e permite financiamento
de requalificação urbana em conjunto;

e) Programa Carta de Crédito do FGTS - Operações Coletivas: consiste


na oferta de uma linha de crédito e parceria com entidades
organizadoras para facilitar o acesso à moradia, visando a população de
até 2 SM, tanto para construção quanto para aquisição;
32

f) Pró-Moradia: financiamento de ações educativas e de mobilização


social na gestão de HIS;

g) Minha Casa, Minha Vida: financiamento da construção de unidades


habitacionais, operacionalizado em Caxias do Sul como Programa
Caxias, Minha Casa.

Estes programas de financiamento podem ser acessados na viabilização


dos projetos de urbanização, assim como uma forma de financiamento das
residências após a área ser urbanizada/regularizada.

3.2 O LOTEAMENTO REOLON

O Reolon é um loteamento popular no Bairro Santa Catarina em Caxias


do Sul, financiado pelo FUNCAP, no ano de 1991. O Loteamento, está
localizado entre o segundo e o terceiro anéis perimetrais e é atravessado pelo
Arroio Tega, que permeia a cidade de leste à oeste (Figura 13).

Figura 13 – Localização loteamento reolon

FONTE: Elaborado pela autora a partir de Geocaxias (2018)


33

O Reolon está localizado em uma área baixa, e a morfologia urbana da


região (topografia e massas vegetais) cria barreiras que o segregam do
restante da cidade.
Mesmo segregada, a área possui conexões facilitadas com importantes
eixos viários do município, como a Av. Rubens Bento Alves e o primeiro anel
perimetral. O principal acesso ao Reolon se dá pela Rua Luiz Covolan, que o
conecta facilmente com a área urbana (Figura 14).

Figura 14 – Acessos loteamento Reolon

FONTE: Elaborado pela autora a partir de Geocaxias (2018)

De acordo com Censo do IBGE (2010) parte da área caracteriza-se


como como um aglomerado subnormal. A população é de 321 habitantes,
desses, 156 mulheres e 165 homens, residindo em 80 habitações,
majoritariamente são de etnia branca e parda. A maior parte (85%) é
alfabetizada (273 pessoas).
As primeiras ocupações deram-se por famílias oriundas de diversos
bairros e até mesmo de outros municípios da região e foram assentadas
provisoriamente, de forma precária, nas margens do arroio Tega. Mais tarde,
34

organizaram-se e, juntamente com a Secretaria de Habitação, construíram


suas próprias residências em regime de mutirão, desocupando as margens do
arroio. Posteriormente a área foi novamente ocupada por famílias que residem
no local até hoje.

A partir de 1995, inicia-se a construção do Loteamento Reolon Popular


II. As primeiras famílias, que ao terem seus terrenos desapropriados para a
abertura de uma rua no bairro Cruzeiro, foram reassentadas nesta área. Neste
período foram construídos 88 sobrados. Em 1997 são entregues mais 300
sobrados que apresentavam diversos problemas (Figura 15)

Figura 15 – sobrados no bairro reolon

FONTE: Acervo da EMEM Machado de Assis

Observa-se, em uma análise realizada sobre as imagens de satélite


(Figura16), que em 1979 a área localizada ao nordeste da imagem já
começava a ser ocupada. A partir de 1998 percebe-se um grande
crescimento populacional.
35

Figura 16 – Evolução do loteamento

FONTE: Adaptado de Geocaxias (2018)

3.2.1 ASPECTOS MORFOLÓGICOS

Com o intuito de compreender o local quanto sua estrutura física, foram


realizados levantamentos a partir de imagens áreas do Google Earth,
GeoCaxias, banco de dados municipal e acervos acadêmicos. A partir disso,
realizou-se a representação gráfica de mapas específicos do local.
36

Para essa análise definiu-se o recorte de acordo com os limites físicos


topográficos e a partir de relatos da comunidade local. (FIGURA 17).

Figura 17 – mapa de limites territoriais

Fonte: Elaborado pela autora a partir de Geocaxias (2018)

3.2.1.1 Cheios e vazios

Em uma análise dos cheios e vazios (Figura 18) observa-se, ao sul, um


ordenamento das edificações. As manchas cheias são características das
casas geminadas construídas pelo poder público na fase II. Segundo
Salingaros (2010) o ordenamento do tecido urbano proposto nos modelos de
“cima-para-baixo” sugere uma forma de controle do espaço por meio dos
governos. Já a desordem das edificações ao norte são características das
edificações autoproduzidas na fase I do loteamento. Estas são representações
de geometrias “inimigas do progresso” para os governos (Salingaros 2010).
Para Salingaros o crescimento orgânico das favelas deve ser valorizado, pois o
mesmo repara o tecido urbano em um processo natural, ausente dos projetos
geometricamente rígidos de habitação.
37

Figura 18 – mapa de cheios e vazios

Fonte: Elaborado pela autora a partir de Prefeitura Municipal de Caxias do Sul

Observa-se ainda, de acordo com a Figura 18, que a região possui áreas
ainda desocupadas em seu entorno e principalmente na área linear
demarcando o Arroio Tega. As edificações segregadas à oeste sugerem uma
possível expansão do loteamento. Se não são refreados pela lei e por
intervenção direta, as ocupações avançam sobre as terras públicas e privadas
numa competição entre grupos pelo mesmo espaço disponível (SALINGAROS,
2010).

3.2.1.2 Mapa de Usos

Observa-se, na Figura 19, que a área possui como uso predominante o


residencial, com pouco comércio, sendo muitos deles localizados nas próprias
residências e não foi identificada nenhuma indústria próxima ao local. A
reciclagem destaca-se como principal fonte de renda. Há a presença de duas
recicladoras conveniadas com o município: a Clean Reolon e a União de
Catadores; além destas, foram identificadas uma recicladora particular situada
de forma ilegal em área verde e diversas menores espalhadas pelo bairro. Em
frente a União de Catadores, localiza-se o Aterro Sanitário São Giácomo,
atualmente em desuso.
38

Há um núcleo institucional formado pelo Centro de Referência em


Atendimento Social – CRAS Oeste, a Casa Brasil, a Escola Municipal de Ensino
Fundamental Machado de Assis, uma Unidade Básica de Saúde, o Centro
Comunitário Vale da Esperança e o CASE – Centro de Atendimento
Socioeducativo para jovens infratores.

Figura 19 – mapa de usos

1- CASE – Centro de Atendimento Socioeducativo


2- CRAS – Centro de Referência em Assistência Social e Casa Brasil
3- Recicladora Clean
4- Ginásio de Esportes da Escola de Ensino Fundamental Machado de Assis
5- Escola de Ensino Fundamental Machado de Assis
6- Escola de Educação Infantil Reolon
7- União dos Catadores Reolon
8- Aterro São Giácomo
9- Recicladora Ilegal

Fonte: Elaborado pela autora a partir de Prefeitura Municipal de Caxias do Sul

Segundo Salingaros (2010), a mistura de tipologias, usos e classes é um


processo saudável do urbanismo e deve ser incentivado. Nesse sentido, a
39

criação de alguns comércios locais e a valorização da principal atividade


econômica (reciclagem) são algumas diretrizes indicadas para a elaboração do
Termo de Referência.

3.2.1.3 Alturas

Foram identificadas edificações de um, dois e três pavimentos (Figura


20). Observa-se predominância de edificações de um pavimento (cor amarela)
na porção norte e de dois pavimentos na porção sul (cor laranja).

Figura 20 – alturas

Fonte: Rettore (2017)

Segundo Salingaros (2010) a essa mistura de tipologias deve ser


incentivada e ao criar novas tipologias estas devem adaptar-se às existentes.
Em um ambiente saudável todas às necessidades e todos todos os tipos de
pessoas são atendidas.

3.2.1.4 Mapa de pavimentação

Na Figura 22, estão mapeados o estado de conservação das vias da


área de estudo, classificando-as em: ausência de pavimentação, ruas
revestidas com paralelepípedos e ruas asfaltadas. Observa-se que, ao norte
(Reolon fase I) as ruas são predominantemente asfaltadas. Já na porção sul
(Reolon fase II, Lot. das Castanheiras e Lot. Vale Verde, Lot. Colina dos
40

Plátanos) a predominância é de ruas com paralelepípedo, porém ainda há


alguns locais com ausência de pavimentação.

Figura 21 – pavimentação vias

Fonte: Elaborado pela autora a partir de Prefeitura Municipal de Caxias do Sul

Na figura 23, as calçadas foram mapeadas e separadas em três


categorias principais: (i) Calçadas I – mistas, trechos com pavimentações
diferentes, recuo adequado; (ii) Calçadas II - mistas, trechos com
pavimentações diferentes, recuo inadequado; (iii) Ausência de calçadas.
41

Figura 22 – pavimentação calçadas

Fonte: Elaborado pela autora a partir de Prefeitura Municipal de Caxias do Sul

De acordo com o mapeamento, observa-se que a área possui


pavimentação inadequada, como um todo, possuindo alguns trechos com
calçadas muito estreitas e outros com ausência das mesmas, dificultando o
deslocamento a pé.
A partir destes levantamentos é possível identificar algumas diretrizes
que nortearão na indicação das diretrizes para a elaboração do Termo de
Referência.

3.3 ANÁLISE DO PLANO DIRETOR

A presente análise busca identificar se há existência de ZEIS no


Loteamento, prioritárias na aplicação da Lei 11888/08, fazendo uma análise do
Zoneamento que incide sobre a área (Figura 23).
42

Figura 23 – Zoneamento

Fonte: Elaborado pela autora a partir de Prefeitura Municipal de Caxias do Sul

O Reolon é composto por seis zonas segundo o Plano Diretor Municipal:


A Zona Residencial 3 – ZR3 é a predominante, que destina espaços urbanos
adequados à densificação, permitindo o uso residencial e as atividades
complementares à habitação, como comércio e serviços. A Zona Residencial 4
– ZR4 apresenta as mesmas características da ZR3 e permite o parcelamento
de interesse social, pela iniciativa privada.
A ZI – Zona Industrial é destinada, preferencialmente a
empreendimentos de grande porte, dando subsídios às atividades industriais,
43

de transportes, comerciais e de serviços. A ZC3 – Zona Central 3, são zonas


de corredor comercial, integrando os principais eixos de crescimento da cidade,
caracterizando áreas de expansão do centro tradicional, como corredores de
serviços e de transportes, tendo como base os sistemas de circulação (Plano
Diretor Municipal).
A ZOC – Zona de Ocupação Controlada e ZOC 1 corresponde à áreas
de proteção ambiental e com grandes declividades, sujeitas a riscos
geotécnicos, matas ou formações vegetais nativas, corpos de água ou
drenagens naturais, nas quais se pretende a garantia de preservação e
manutenção de suas características, mediante o estabelecimento de
parâmetros de uso e ocupação do solo compatíveis com a proteção ambiental
(Plano Diretor Municipal, 2010). A ZOC 1 tem seus requisitos de ocupação do
solo ainda mais controlados, principalmente por constituir leitos de corpos
d’agua.
Grande parte da área é regularizada, porém ainda há incidência de
ocupações irregulares (Figura 24) , como é o caso do setor inserido na ZOC 1
e classificada, segundo a Prefeitura Municipal, como um assentamento
subnormal. Algumas residências desta área já foram removidas para o
alargamento da Rua Luiz Covolan (Figura 26), juntamente com outras 19
famílias que estão sendo removidas de uma área verde (Figura 27), situada na
porção norte do loteamento, e serão destinadas ao condomínio Rota Nova,
próximo à RS 453.
44

Figura 24 – mapa de remoções de residências

Fonte: Elaborado pela autora a partir de Prefeitura Municipal de Caxias do Sul


45

4 APLICAÇÃO DE OFICINAS - DIAGNÓSTICOS

4.1. CAMINHADA – ENTREVISTAS

Foi realizada uma caminhada com os moradores pelo bairro. Neste


momento fizeram-se alguns questionamentos (Anexo 01) com o objetivo de
identificar lugares que eles consideram como sagrados (SALINGAROS, 2010).
Para Salingaros (2010) as pessoas podem se conectar às plantas e às outras
pessoas em espaços urbanos que são projetados de forma apropriada. Estes
locais são então responsáveis pela coesão societal da vizinhança.

Conforme Anexo 01, chegou-se à conclusão de que o local identificado


pelos moradores com “Pinheiros” (Figura 25) é o mais importante ponto de
encontro da comunidade, onde realizam-se reuniões, almoços, jogos, algumas
missas, entre outras atividades de interação. De acordo Com Salingaros
(2010) e com base nas entrevistas, este local possui características de
“Sagrado”, ou seja de grande valor emocional para o bairro. Este local tem
grande valor histórico para a comunidade, e é caracterizado pela presença de
araucárias no canteiro central da rua Francisco Spiandorelo. Em frente ao
canteiro está localizado o Bar Barreta ou Bar do “Cabeça” como é mais
conhecido pela população local, e também onde historicamente se localizava o
primeiro orelhão e a principal parada de ônibus do Loteamento, levando as
pessoas a formarem filas em torno do bar e dos “Pinheiros”. A presença da
parada principal de ônibus na Rua Francisco Spiandorelo tornou-a prioridade
no asfaltamento da primeira via do Reolon (Figura 27).

FIGURA 25 – ESPAÇO SAGRADO REOLON - “PINHEIROS”

FONTE: Google Maps (2018)


46

A partir dos questionamentos também pode-se identificar que a falta de um


espaço físico, como uma associação de moradores, dificulta as reuniões para
discutir assuntos relacionados à comunidade. Atualmente, reúnem-se nas
casas ou no salão da Igreja (Figura 26)

FIGURA 26 – IGREJA E SALÃO DA COMUNIDADE REOLON

FONTE: Google Maps (2018)

4.3. MAPA SÍNTESE DE POTENCIALIDADES E FRAGILIDADES DO


REOLON

Em uma etapa de encontro seguinte, o grupo de estudos do TaliesEM -


Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo realizou-se uma oficina tendo
como base um mapa do loteamento, onde solicitou-se aos moradores que
mapeassem fragilidades e potencialidades do local, sob a ótica de percepção
deles.
47

FIGURA 27 – MAPA SÍNTESE- POTENCIALIDADES E FRAGILIDADES DO BAIRRO

FONTE: Elaborada pela autora a partir de oficina realizada pelo TaliesEM (2018)

De acordo com a figura 27 observa-se que o lixo é um dos grandes


problemas recorrentes da região, apesar de os moradores relatarem que a
coleta ocorre 3 vezes na semana. Segundo os relatos a causa é a falta de
cuidado da população local, que despeja grandes quantidades de lixo nas
encostas do arroio. Algumas áreas também foram marcadas como inseguras e
de interesse/intervenção, com destaque para o local sagrado (Salingaros,
2010) – “Pinheiros”, localizado em frente ao mercado do “Cabeça” (Figura 27).
A partir das fragilidades e potencialidades identificadas nas oficinas e
nos levantamentos dos aspectos morfológicos do loteamento Reolon, pode-se
identificar possíveis diretrizes para a elaboração do Termo de Referência.
48

5 INDICAÇÃO DE DIRETRIZES PARA O TERMO DE REFERÊNCIA

Com o objetivo de organizar os elementos para o TR (Termo de


Referência) e a fim de contemplar a sustentabilidade em todas as suas
instâncias (ambiental, cultural, social e econômica) tomou-se como base os
elementos do espaço (SANTOS, 1988), aqui representados em forma de
diagrama circular (figura 28), para indicar que seus itens interagem entre si,
podendo um item ser contemplado em mais de um elemento (por exemplo:
incentivo à comércio local pode enquadrar-se tanto em firmas, quanto
instituições e homens).

Figura 28 – Elementos do espaço de acordo com santos (1988)

FONTE: Elaborado pela autora (2018)

Abaixo a indicação de diretrizes para a elaboração de um TR específico


para o loteamento Reolon:

a. Homens – Aplicação do regime de mutirão, como previsto na Lei


11888/08 para que os moradores sintam-se parte do processo;
49

Horta comunitária para unir a comunidade; fortalecimento para o


acesso aos locais de trabalho;

b. Firmas – Com base também em Salingaros (2010) que aponta a


diversidade de usos para um tecido urbano mais saudável,
propõe-se a criação de pequenos comércios locais; criação de um
novo galpão para a recicladora; valorização e potencialização da
atividade econômica de reciclagem;

c. Instituições – Criação de um espaço físico para a associação de


moradores; pintura e acabamento da Igreja e salão de festas da
comunidade;

d. Meio ecológico – Gestão de resíduos sólidos; valorização do


espaço sagrado conhecido pelos moradores como “Pinheiros”;
indicação de estudo hidrológico sobre o rio Tega; indicação de
estudo geológico para áreas de encosta;

e. Infraestruturas – Prever contenções nos locais indicados;


criar novos espaços abertos e valorização dos existentes; prever
pavimentação adequada; prever melhoria de moradias;

A partir disto, parte-se para a indicação de diretrizes para um TR que


abrangesse todos os projetos de urbanização com vistas à Lei 11888/08.
50

Figura 29 – Matriz com elementos e indicação de diretrizes para um Termo de


Referência

FONTE: Elaborado pela autora (2018)

Em seguida, elaborou-se um quadro (quadro 1) que indica a estrutura do


Termo de Referência genérico a partir desses elementos e das diretrizes
levantadas.
51

QUADRO 1 – ESTRUTURA DE UM TERMO DE REFERÊNCIA

DIAGNÓSTICO DA ÁREA

1.1 Estudos pertinentes para identificação de aspectos morfológicos;


1.2 Estudos pertinentes para identificação de aspectos ambientais (hidrológico
e geotécnico e outros);
1.2 Levantamento de fragilidades e potencialidades do local (urbanização e
edificações/moradias);
1.3 Diagnóstico com base na percepção da comunidade sobre o espaço
(envolvimento de assistentes sociais no processo e aplicação de metodologias
participativas);

2. GERENCIAMENTO DO PROCESSO DE TOMADA DE DECISÕES COM A


PARTICIPAÇÃO DA POPULAÇÃO (NO SENTIDO DE BAIXO PARA CIMA);

2.1 Definição de critérios para intervenção e padrões de urbanização e


melhorias habitacionais;
2.2 Discussão do processo de Regularização Fundiária e definição de
estratégias para viabilizar a segurança jurídica;
2.3 Organização do processo para projeto e execução visando a aplicação do
regime de mutirão;

3. PLANOS E PROJETOS

2.1 Plano urbanístico definido a partir dos itens 1 e 2;


2.2 Projeto Executivo e detalhamento, incluindo Planta Técnica. Este deverá
prever elementos como:
2.2.1 Criação de novos espaços abertos e valorização dos existentes;
2.1.2 Observação de áreas de preservação permanente;
2.1.3 Solução de mobiliários urbanos adequados;
2.1.4 Gestão de resíduos sólidos;
2.1.5 Condições adequadas de circulação (prever acessibilidade);
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2.1.6 Remoções em áreas de risco;


2.1.7 Para a criação de novas tipologias prever: equipamentos adequados
para a comunidade; Homogeneidade entre tipologias e usos;
2.2 Projetos complementares pertinentes (luminotécnico, drenagens,
pavimentação, contenções, etc)

FONTE: Elaborado pela autora (2018)

Nesta etapa do trabalho reconheceu-se a dificuldade em estabelecer um


TR genérico, podendo inclusive não ser possível, indica-se nesse caso, um
estudo mais aprofundado sobre o tema.
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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante o desenvolvimento do trabalho foram observadas algumas


fragilidades com relação à Lei, bem como alguns pontos positivos para o
Município de Caxias do Sul, são elas:

a) carência na divulgação da Lei . A mesma precisa ser fomentada e


divulgada como um importante instrumento da política habitacional e
urbanística;
b) para Lei 11888/08 possa ser implantada de maneira mais efetiva há a
necessidade de parcerias e convênios entre diversos atores (Poder
público, privado, universidades);
c) escassez de recursos públicos dificulta a implementação. Necessidade
de definição de novas alternativas de financiamento;
d) sustentabilidade deve ser aplicada em todas as suas instâncias (Social,
econômica, ambiental e cultural  Homens, Firmas, Instituições, Meio-
ecológico e Infraestrutura);
e) algumas mobilizações estão ocorrendo em Caxias do Sul com o objetivo
de estudar estratégias de implantação da Lei no Município. Reuniões e
um recente Seminário sobre o tema (IAB, CAU, Prefeitura Municipal,
Universidade de Caxias do Sul – TaliesEM ). Com isso se identifica uma
possibilidade de aplicação do estudo;
f) na Indicação de diretrizes observou-se uma limitação ao tentar definir
elementos genéricos, pois cada caso é peculiar e exige contemplar esta
particularidade no escopo da contratação;
g) o estudo de um caso específico mostrou-se pertinente no sentido de
detalhar os possíveis elementos existentes em uma área vulnerável.

6.1 RECOMENDAÇÕES PARA TRABALHOS FUTUROS

Observou-se a necessidade de definir um plano no Município para que a


Lei seja efetivamente aplicada. Necessidade de consolidação de políticas
públicas, através de plano de ação (Plano Estratégico de Implementação).
54

7 REFERÊNCIAS

BONDUKI, Nabil. Origens da habitação social no Brasil: arquitetura


moderna, lei do inquilinato e difusão da casa própria. São Paulo: Estação
Liberdade, 1998.

BRASIL. Lei nº 11.888, de 24 de Dezembro de 2008, Assegura às famílias


de baixa renda Assistência Técnica Pública e Gratuita para o projeto e a
construção de habitação de interesse social e altera a Lei no 11.124, de 16
de junho de 2005. Brasília, 24 de dezembro de 2008.
Disponível<http://www.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.
action?id=258240.htm>. Acesso em 15 de maio de 2018.

CAMACHO, Nádia de Oliveira. A utilização da Lei nº 11.888/2008 - Lei de


Assistência Técnica Pública e Gratuita - no Programa Minha Casa Minha
Vida: limites e possibilidades na pós-ocupação das unidades
habitacionais. Tese de Mestrado. Juiz de Fora, 2016

CODHAB. Manual Ações Urbanas Comunitárias. Brasílias, 2016.


PARANHOS Gilson. Codhab, uma experiência. Brasília, 2015

GONÇALVES, Thaís Sales; SANTOS, Jakeline Silva dos. Assistência Técnica


como política pública: o caso do Escritório Público de Salvador. III
Encontro da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Arquitetura e Urbanismo arquitetura, cidade e projeto: uma construção coletiva.
São Paulo, 2014.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. IBGE Cidades. Rio de


Janeiro: IBGE; 2010. Disponível em:
<http://cidades.ibge.gov.br/v4/brasil/rs/caxias-do-sul/panorama>. Acesso em:
Maio, 2018.

INSTITUTO DE ARQUITETOS DO BRASIL. Manual para implantação


técnica e gratuita a famílias de baixa renda para projeto e construção de
habitação de interesse social. Rio Grande do Sul, tecnodata educacional.
2010.

SALINGAROS, nikos A. et al. Habitação socialmente organizada, uma nova


abordagem à estrutura urbana I: design capaz de estabelecer posse
emocional. Revista Brasileira de Gestão urbana v. 2, n. 2. Curitiba, 2010.

SALÍNGAROS, nikos A. et al. Habitação socialmente organizada, uma nova


abordagem à estrutura urbana II: soluções práticas para que os projetos
funcionem. Revista Brasileira de Gestão urbana v. 3, n. 1. Curitiba, 2011.
SALINGAROS, nikos A. et al. Habitação socialmente organizada, uma nova
abordagem à estrutura urbana III: alguns problemas que enfrentamos.
Revista Brasileira de Gestão urbana v. 3, n. 2. Curitiba, 2011.
55

SANTOS, Jakeline Silva dos. Assistência Técnica Pública e Gratuita: Um


estudo de aplicação para municípios paraibanos. João Pessoa, 2014.
SANTOS, Milton. Espaço e Método. São Paulo, 1988. Capítulo 1: Espaço e
seus elementos: Questões de Método. (p. 4 -5).

RETORE,Manuela. Requalificação urbano-ambiental do Reolon . Trabalho


de conclusão do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Caxias
do Sul UCS: Caxias do Sul, 2017.

ROSSI, Gabriela Schramm. Proposta de qualificação das áreas abertas do


CRAS Reolon. Relatório de conclusão da disciplina de Estágio em Arquitetura
e Urbanismo do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Caxias
do Sul UCS: Caxias do Sul, 2017.
56

8 APENDICES

APENDICE A – ENTREVISTA COM OS MORADORES


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APENDICE A

QUESTIONÁRIO FEITO COM OS MORADORES PARA IDENTIFICAÇÃO DE


LUGARES SAGRADOS

1- Qual local faz você se sentir confortável dentro do bairro?


R:Os Pinheiros, é um local que o pessoal gosta bastante e cuida.

2- Qual local faz você se sentir desconfortável?


R:Tem algumas áreas na encosta do Rio Tega que alguns usuários de
drogas frequentam. Lá é um local bastante inseguro

3- Onde geralmente vocês se reúnem pra discutir assuntos sobre o bairro?


Na associação de moradores/casa de alguém?
R: Não existe um espaço físico para a associação de moradores,
normalmente nos encontramos na casa de alguém.

4- E pra conversar/tomar chimarrão/jogar carta? Tem algum


bar/padaria/praça?
R: Nos Pinheiros. Tem o Bar do cabeça na frente. O pessoal instalou
uma mesa ali. E também fazem churrasco às vezes.

5- Onde aconteceram atividades marcantes no passado?


6- R: Seria também nos Pinheiros, na frente no Bar do Cabeça tinha o
primeiro orelhão do bairro, formavam filas enormes. Ali também havia a
parade de ônibus da Visate.

7- O bairro tem igrejas ? Tem um número grande de moradores que


participa? Você acredita que ela ajuda a unir a comunidade?
R: Tem uma Igreja católica mas é bem pouco frequentada.
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8- Onde as crianças costumam brincar?


Na rua. Existe um parquinho mas as crianças não frequentam pois se
tornou insegura devido aos usuários de drogas no local.

9- A falta de espaços públicos/praças prejudica a união/fortalecimento da


comunidade?
R: Sim, bastante.

10- Se vocês pudessem criar um lugar/lugares com árvores, onde vocês o


fariam?
R:Nos pinheiros, melhoraria o ambiente de lá.

11- Existe algum lugar no bairro onde vocês consideram sagrado pois
sentem uma conexão com a natureza ou espiritualidade forte?
R: Nos Pinheiros.

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