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Goiânia - Goiás
Fevereiro de 2004
Universidade Católica de Goiás
Vice Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Psicologia
Mestrado em Psicologia
Goiânia - Goiás
Fevereiro de 2004
i
FOLHA DE AVALIAÇÃO
____________________________________ _________________
Profº. Dr. Rodolfo Petrelli Nota ou Grau
Universidade Católica de Goiás
Presidente
____________________________________ _________________
Profº. Dr. Nivaldo dos Santos Nota ou Grau
Universidade Federal de Goiás
Membro
____________________________________ _________________
Profº. Dr. Saturnino Pasquero Ramon Nota ou Grau
Universidade Católica de Goiás
Membro
____________________________________ _________________
Profª. Drª. Vanúzia Leal Andrade Peres Nota ou Grau
Universidade Católica de Goiás
Suplente
Goiânia - Goiás
Fevereiro de 2004
ii
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus. Mestre dos mestres por excelência que me conduz com a sabedoria
A Wermerson Rodrigues, esposo amado e pai dedicado, que, com a presença, incentivo e
Ao meu irmão José Carlos, que, com apoio constante, possibilitou a consolidação de
À minha irmã Sirley, pelo incentivo e também colaboração, que me permitiram dedicar na
Aos professores e aos meus queridos alunos da Universidade Católica de Goiás, que, por
Aos Drs. Nivaldo dos Santos, Saturnino Pesquero e Vanúzia Leal, participantes da banca
SUMÁRIO
Folha de Avaliação........................................................................................................................i
Dedicatória..................................................................................................................................ii
Agradecimentos .........................................................................................................................iii
Epígrafe .......................................................................................................................................v
Sumário ......................................................................................................................................vi
Resumo ......................................................................................................................................ix
Abstrac ........................................................................................................................................x
Introdução ...................................................................................................................................1
Capítulo I - A Violência na Sociedade Contemporânea Brasileira .............................................5
1.1. Significados de Violência ...............................................................................................11
1.2. Matrizes da Violência .....................................................................................................16
Capítulo II - A Tutela Jurídico-Penal da Vida Humana.............................................................23
2.1. Teoria do Crime ..............................................................................................................24
2.1.1. Conceito criminológico e jurídico de crime.............................................................24
2.1.2. Elementos Constitutivos do Crime..........................................................................26
2.1.3. Imputabilidade Penal ..............................................................................................29
Capítulo III - O Delito de Homicídio ..........................................................................................32
3.1. O Homicídio através dos tempos - Um breve relato.........................................................32
3.2. O Homicídio no Sistema Jurídico Penal Brasileiro..........................................................34
3.3. Conceito de Homicídio ..................................................................................................36
3.4. Objetividade Jurídica do Homicídio ...............................................................................38
3.5. Tipo Penal no Homicídio ................................................................................................39
3.6. Sujeitos do Homicídio....................................................................................................40
3.7. Momento Consumativo do Homicídio............................................................................42
3.8. A Tentativa no Crime de Homicídio ................................................................................43
3.9. Formas de Homicídio .....................................................................................................44
3.9.1. Homicídio Simples .................................................................................................44
3.9.2. Homicídio Privilegiado ..........................................................................................44
3.9.3. Homicídio Qualificado ...........................................................................................46
3.9.4. Homicídio Culposo .............................................................................................. 47
vii
RESUMO
Este estudo tem o objetivo de investigar a violência humana no crime de homicídio, cometido sob
os estados emotivos ou passionais, situando-se em uma vertente que apreende o crime como
fenômeno real, humano. Ao enfrentar o tema, a sustentação recai na tese que os estados
emocionais ou passionais não podem ser utilizados como componentes para justificar o
homicídio, diminuir ou atenuar a pena, senão para explicá-lo. A emoção e a paixão somente
podem elidir a imputabilidade penal quando derivadas de patologias do psiquismo humano, que
impedem a capacidade de entender e querer do agente. No crime passional, os aspectos afetivo e
cognitivo da consciência mantêm-se íntegros, faltando ao homicida o domínio ético sobre suas
decisões. Também se sustenta que a paixão que mata não deriva do sentimento de amor ou de
honra íntima, mas de instinto homicida. Portanto, o criminoso passional é imputável e
responsável pelas conseqüências jurídicas do crime. O estudo de caso explora a relação sujeito-
objeto-mundo, sob perspectivas psicológica, psiquiátrica, psicopatológica e jurídico-penal,
razão pela qual este estudo focaliza a aplicação do método fenomenológico no diagnóstico dos
sujeitos pesquisados. A análise de resultados assinala a necessidade de aprofundar a compreensão
da experiência e dos fatos homicidas considerados passionais, para provocar uma ruptura do
pragmatismo dogmático do sistema jurídico penal no processo de seu diagnóstico, imputação,
imputabilidade e penalização.
ABSTRACT
This study has the objective to investigate human violence, such as homicide, committed under
emotional or passionate states, that holds crime as a human characteristic. Throughout this theme,
the thesis states that crimes committed under these emotional states cannot be used to justify
homicide, or to lower penal sentences, but to explain them. Emotion and passion can only
eliminate penal sentences when derived from psychological pathologies that incapacitate the
understanding and wanting of the person. Crimes of passion have an integrated cognitive
conscience and affection, failing the murderer only the ethical control over his decisions. The
thesis also states that passion that kills doesn't derive from love or honor, but from a homocidal
instinct. However, the passional murderer is responsible for the legal consequences of the crime.
The case study explores the subject object world relationship, under various perspectives: such
as psychological and psychiatric points of view, being the reason why this study focuses on the
fenomenological method of diagnosing the subjects researched. The analysis of the results shows
the need to better comprehend the facts and experiences of passionate homicide, to create a
rupture in the legal penal system, in its process, diagnosis and penal sentences.
O delito de matar sempre foi uma questão de difícil enfrentamento para a humanidade.
Aquele que mata o próprio semelhante, que pratica a conduta considerada como a máxima
expressão da agressividade intra-específica, que não se priva de expressar no nível mais grave a
própria crueldade, move, desde os primórdios da existência humana, os mais diversos enredos de
comportamento homicida, de refletir sua etiologia, colocando-se aos diversos campos das
E, nessa dimensão, o sistema jurídico penal que sanciona a norma proibitiva do delito de
matar, de lesão ao bem jurídico, caracteriza-se, paradoxalmente, como uma ciência pragmática,
ciência penal e, mais especializadamente, àqueles conexos com o mundo emotivo e passional.
em que grassa a violenta emoção, não existe prejuízo nas dimensões neuro-psicológica e
ao aspecto ético da consciência. Portanto, o ator de crime passional deve ser punível, logo
imputável, apesar da atenuante ou da redução de pena prevista no Código Penal. Durante o estado
de violenta emoção, não falta ao agente a noção do ato cometido, o conhecimento das regras e
normas e a necessidade de se comportar de acordo com elas; falta ao agente o domínio ético sobre
suas próprias decisões. Isso sugere a necessidade de uma avaliação criteriosa de cada caso, ao se
De outro, que a paixão que mata não deriva do sentimento de amor ou de honra. O estado
de paixão no momento do crime não obedece a um sentimento de amor ou de honra íntima, senão
à falta de controle emocional, de natureza neurótica, diante da frustração que lhe provoca seu
parceiro, ao ferir a sua auto-imagem, auto-afirmação e exercício de poder. A paixão que decorre
do amor leva o ser humano a transcender seu primitivismo cultural e ético, não induz ao
homicídio. Portanto, não pode ser usada como fator de redução, de atenuação de pena ou para
O homicídio passional será sempre crime e de qualquer forma uma aberração psicológica
e ética, não justificada por nenhuma lesada honorabilidade. Não existe emoção, paixão ou honra
capaz de justificá-lo.
O crime passional é um resíduo de um direito primitivo, arcaico, que fere a isonomia entre
homens e mulheres, legitimando a posse do outro como objeto sexual, gerando a violência.
atenuação de pena, na sua quase totalidade, desvelam, em uma análise mais profunda, uma mente
O estado emocional e passional como fator de redução ou de atenuação de pena deve ser
Como assevera Durkheim (1999, pp. 66-69), o crime é o fenômeno que apresenta, da
forma mais irrefutável, todos os sintomas da normalidade, sendo, pois, necessário e útil,
verdadeiro “fator de saúde pública, uma parte integrante de toda sociedade sadia”. Portanto, é
sua punibilidade.
exaustivas.
Paradoxalmente, qualquer motivo pode levar uma pessoa a agir ou não de determinada
forma, ainda que sua conduta seja reprimida pela sociedade. Na verdade, toda ação responde a
uma lógica interna, orientada para a satisfação de uma necessidade humana, seja ela qual for.
culpabilidade.
delito de matar em sua modalidade passional, sob uma perspectiva criminológica e dogmática,
examinando o crime sob o ponto de vista jurídico e psicológico, para concluir pela
preocupações da sociedade brasileira contemporânea. Episódios violentos são cada vez mais
freqüentes, gerando medo e insegurança no cotidiano dos grandes centros urbanos do país. Como
esclarece Zaluar (1997), a violência está em toda parte, não tem atores sociais permanentes e
sociedade, faz a agressão criminal mais freqüente e violenta, configurando-se fato universal e o
modo pelos quais diferentes grupos sociais se manifestam e resolvem seus conflitos nas relações
sociais e intersubjetivas.
escravos. E, uma vez expropriados de suas terras e tradições, foram aculturados, massacrados e
mortos. Políticas que ainda se fazem sentir nos dias atuais. Expostos à cultura de massa e sob a
conflitos intra e intergrupos; remanescendo a perda de suas terras, agora sob um processo de
espoliação e guerra guarnecidas pelo império da lei. Embora a Constituição Federal vigente tenha
foram, por meio do tráfico, trazidos para o território brasileiro para a exploração da sua força de
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trabalho. Em regime de trabalho forçado, eram castigados, submetidos a maus tratos e penas, cuja
atores bem definidos. Não foram poucos os conflitos sociais com luta aberta, produzindo mortos
e vítimas, em geral; mencionam-se, por exemplo, Guerra dos Farrapos, a Balaiada, a Cabanagem,
cotidiano do país.
urbanização não conduziram o país ao compasso das nações civilizadas. Ao longo de mais de
cem anos de vida republicana, a violência manteve atravessando todo o tecido social, enraizando-
proprietárias, sendo reprimidas as dissidências políticas e movimentos sociais, tal qual no regime
minaram o Estado de Direito. Como bem acentua Adorno (1996), a consolidação da moderna
burguesia industrial não conseguiu por fim ao autoritarismo. Os governos instituíram um sistema
de autoritarismo e repressão que articulava forças militares policiais e forças paramilitares como
a OBAN e os esquadrões da morte. Esse sistema foi responsável pela censura, prisões arbitrárias,
da sociedade brasileira persistiram violados. Radicada nas estruturas sociais e enraizada nos
continuar sendo o principal recurso usado para a resolução de conflitos decorrentes das
diferenças de etnia, de classe, de gênero e de geração. O Estado Social foi a instituição política
Faria citado por Streck (1999), assevera existir nesse momento um movimento de
globalização econômica que, com seus novos centros de produção normativa e seus mecanismos
auto-regulatórios, erodem alguns dos princípios básicos forjados pelo Estado Liberal (como o
centrípeto, resultante das pressões, demandas e lutas protagonizadas por setores sociais
de miserabilidade econômico-financeira.
Buarque, citado por Streck (1999, p. 458), ao tratar da questão, faz a seguinte ponderação:
8
Com uma indústria que só dispõe de mercado se a renda for concentrada para viabilizar a
demanda; uma agricultura eficiente, mas voltada para a exportação, em um país onde 380
mil crianças morrem de fome a cada ano; megalópoles que são incapazes de oferecer os
serviços para os quais elas deveriam existir; estrutura de transporte urbano nos moldes
dos países ricos, mas que condena, por falta de dinheiro, milhões de pessoas a
imenso poder econômico, mas ele não consegue resolver os problemas da qualidade de
Adorno e Cardia (1999, pp. 75-76), investigando a questão, levantam a hipótese de que:
(...) as violações dos direitos humanos são um dos elementos básicos que minam a
básicas para a democracia, sobretudo as encarregadas de velar pela aplicação das leis e
Sob esse prisma, a cidadania restrita seria parte constitutiva de uma cultura marcada pela
direito, e de uma sistemática pela normalização da violência, traços que singularizam as relações
Para Saul (1999, pp. 120-121), esses efeitos políticos têm fundamentos na economia
clandestinos, na qual se pode arrolar o crime organizado como parte importante desse processo de
(...) a existência de uma relação estreita entre miséria e violência, uma vez que a extensão
implementadas no período anterior. Por outro, o Estado não tem capacidade de desenvolver uma
infra-estrutura que atenda a demanda crescente e cada vez mais fragmentada, e muito menos de
índice de desemprego e a marginalização, sobretudo dos trabalhadores periféricos, que, uma vez
excluídos do mercado de trabalho legitimado, são incluídos no mercado de trabalho por vias
ilegítimas: o mercado de drogas. Como acentua Zaluar (1990, pp. 54-67) : “a saída criminosa é a
causas, que não se explicaria apenas a partir de variáveis estruturais, como a pobreza, o
sua pesquisa, constata que a exposição direta ou indireta à violência não tem gerado uma cultura
de violência, mas que existe uma combinação de atitudes, valores e comportamentos que
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dependendo do contexto nos quais ocorrem. O crescimento da violência não se deve a um tipo
específico de cultura ou subcultura da violência, tampouco que essa cultura ou subcultura seja
Necessário, portanto, conceber a violência sob uma perspectiva não linear, vendo-a sob o
ângulo daquilo que Da Matta (1982, pp. 15-16) chamou de categoria social. A violência tem uma
universalidade e uma abrangência que não admite a pesquisa de suas origens e causas:
ao exame das ligações entre, por exemplo, o crime e a norma, desvio e regra, conflito e
crime e castigo, violência e concórdia, não são mais etapas relacionadas exclusivamente a
formas de propriedade, a leis do mercado ou forma de governo, mas soa também modos
pelos quais tudo isso se revela de modo concreto aos nossos olhos.
Não basta falar do mundo social em termos apenas das necessidades funcionais; será
preciso examinar a sociedade a partir dos seus valores, ideologias e configurações institucionais,
considerar tanto a polissemia do termo quanto a sua subjetividade no tempo e no espaço, segundo
Segundo Michaud (1999, p. 4), o termo violência vem do latim violentia, que significa,
caráter violento ou feroz, força. “O verbo violare significa tratar com violência, profanar,
transgredir, com uma insistência na infração e no ultraje”, observando que esses termos remetem
a vis, que significa a força em ação, o recurso de um corpo para exercer sua força, portanto a
Assim, a noção de violência compreende a idéia de força como potência natural, vital,
cujo exercício de um indivíduo ou grupo contra outro indivíduo ou grupo (ou também contra si
mesmo), visando a ferir, destruir e eliminar faz o caráter violento. A vis por si mesma é virtude e,
(...) uma ação contrária à ordem natural. É violência tudo que se opõe à Natureza, às suas
leis, aos seus processos, às suas configurações sistêmicas, macro e micros sistêmicos, aos
grandes e pequenos Habitats, que amparam e desvelam a vida. É violência tudo que
(...) a violência é, assim, de natureza interior e exterior, ela é brutal e refinada, ela é
outro, ela leva à confusão. De fato, sua riqueza incita a pensar que ela está em todos os
cotidiana e mantida pela mídia, que a difunde, garantindo a vontade de sua audiência.
Entretanto, o dano somente pode ser tomado como violação em função de normas definidas,
apreendidos de forma legítima por cada sociedade. Assim como existe diversidade de normas
regulamentadoras das sociedades, também existe diversidade de violência, que se manifesta nas
A violência não se manifesta isoladamente; por trás de cada ato violento existe, sempre
uma rede de outras violências, que não raras vezes são de origem familiar, social ou institucional.
Introjetada no tecido social, em maior ou menor grau, é reproduzida pelos agressores e, inclusive,
os extremismos políticos está a crise política, social, econômica, cultural e ética que atravessa a
sociedade contemporânea e que coloca sob suspeita as virtudes dos processos de modernização
Por mais que tentemos, é difícil conceber o universo em termos de concórdia; pelo
contrário, nós nos defrontamos em todo lugar com as evidências de conflito. Amor e ódio,
parece ser o coração dinâmico do mundo. O homem percorre a agitada gama de sua vida
através dos riscos de doença e acidente, de feras e bactérias, do poder maligno das forças
da natureza e das mãos vingativas de seus semelhantes. Contra essas inumeráveis forças
de destruição, a longa e fina linha de defesa proporcionada pela inteligência científica luta
mesquinha destrutividade da vida. Instinto de vida e de morte (Freud). “Criar e destruir, construir
Minninger, pp. 20-21). O homem, conforme afirma Fromm (1987), além de destruir o seu
Mas, além da crueldade, a violência pode ser pensada na vertente de agressividade, que é
Segundo Lacan (1998, pp. 105-112), a agressividade se manifesta numa experiência que
identificação que nós chamamos narcísica e que determina a estrutura formal do Eu do homem e o
Já, consoante Melanie Klein citado por Winnicott (1999), a agressão é inata e coexistente
com o amor. Para a autora, é a elaboração do impulso destrutivo no mundo interior da criança
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Winnicott (1999), por sua vez, define a agressão como uma reação à frustração, como
ao brincar e ao uso de símbolos como forma de conter a destrutividade interna. Constatou que
uma característica da criança anti-social é o fato de não haver na sua personalidade nenhuma área
para brincar: este é substituído pela atuação. Segundo o autor, a privação ou perda no momento do
criança, que podem levá-la a um comportamento anti-social, curável somente com o passar do
tempo.
motora violenta e destruidora. Em todo comportamento, seja ele negativo, positivo, simbólico ou
A agressão nem sempre objetiva a destruição, a transgressão de normas, mas pode denotar
Nesse sentido, posiciona com propriedade Gibbon citado por Storr (1970):
partes valiosas e essenciais do esforço humano; sem a parte agressiva e ativa da sua
natureza, o homem seria muito menos capaz de dirigir o curso da sua vida ou de
influenciar o mundo que o cerca. O homem jamais poderia ter atingido sua atual
dominância, nem mesmo sobrevivido como espécie, a menos que possuísse um grande
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A agressão como faculdade vital essencial é tão inerente à existência humana como os
órgãos que a constituem. É inata ao homem, mas não é sua condição exclusiva. O que é exclusivo
do ser humano, à vista da sua racionalidade, é a violência, não a agressão, que é própria,
biologicamente, de todo ser vivente. Assim, toda violência é agressão, mas nem toda agressão é
violência. Isso impõe uma distinção rigorosa entre ambas. A agressão é impulso natural do
Pereira (1975, p. 29), “o conceito de violência ganha significado realmente apenas à luz do
humano”.
Por isso, não é viável pensá-la como fenômeno singular. Não existe violência, existem,
sim, violências, cujas raízes e significações são múltiplas, e cuja identificação é complexa. A
violência não pode ser sistematicamente identificada pelos condicionantes sociais e territoriais,
que explicariam sua existência. Associá-la a espaços específicos de maior incidência, à pobreza,
desigualdade, marginalidade, segregação espacial, etc. pode levar a desvendar apenas uma parte,
formas ou sentidos que a violência assume em seu processo de concretização. Sob este
sua dimensão de crueldade e destrutividade, uma das questões mais freqüentemente colocadas é
a das suas razões ou causas, sendo comum a utilização de várias categorias explicativas.
Enfatizam-se, por exemplo, a teoria instintivista, que explica a agressão humana a partir da
origem animal do homem (Darwin, 1859; McDougall, 1932; Freud, 1933; Lorenz, 1966;
Tinbergen 1965, citados por Fromm, 1987); as abordagens biológicas, teorias assentadas nos
que interpreta o homem destrutivo como um tipo atávico, isto é, um indivíduo no qual haveria
teorias psicodinâmicas que tentam explicar a agressão humana como reação a frustrações, abuso
e falta de amor na infância; o behaviorismo (Watson, 1914; Skinner, 1971, citados por Fromm,
pelo reforço a se comportar de um certo modo. Com efeito, a questão é bastante complexa, e
implica estudar o fenômeno, de modo a dar conta dos fatores que determinam a sua manifestação
formulações quanto à natureza do homem que habita a era globalizada: homo sapiens ou homo
demens?
Sabe-se que o homem foi a primeira espécie da história natural a ter alcançado a
capacidade de se erradicar, mas, nesse processo, vem destruindo toda a vida no planeta, de modo
manifestados nas mais diferentes localidades do mundo, tem colocado em risco a evolução da
espécie no planeta.
Essa tendência tem proliferado de forma não-mitigada neste século. Historicamente, mais
povos foram mortos nos últimos cem anos do que existiram desde o alvorecer da humanidade até
o último século. Milhões de homens e mulheres são mortos em todo o mundo pelas mais
diferentes razões ou causas: guerras religiosas e étnicas, guerras entre gangues, narcotráfico,
motivos torpes ou banais. Basta uma alteração do ânimo natural do homem, uma adição de
subjugando a inteligência e a racionalidade humana. O homo ferox subjuga o homo sapiens, numa
progresso científico e tecnológico como no último século e meados deste: rompemos o código do
da indústria, do comércio e dos meios de comunicação. Nunca o sistema jurídico foi tão
amparado por leis. Mas, em geral, estes conhecimentos estão sendo usados a serviço de emoções
e impulsos primitivos.
Um número considerável de recursos financeiros tem sido gasto com aparatos bélicos e
outros arsenais para destruição da vida e hegemonia entre os povos. Apesar da proteção jurídica, a
resolução de conflitos tem escapado ao Estado, voltando-se para o âmbito privado. Os cidadãos
deixa de obedecer a uma série de valores e normas ditadas pelos padrões sociais e culturais para
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A sede insaciável de poder tem levado a humanidade à autodestruição, seja por motivos
Decorre, por conseguinte, que o homo não pode ser tomado na sua acepção sapiens
apenas. O homo é também ferox. Aplicando o poder de sua inteligência, com requinte de
crueldade destrói e elimina a vida humana. Como bem pondera Petrelli (2003), é primitivo
porque
(...) projeta nos outros a sua própria imagem e não colhe a si mesmo nos outros; vê e trata o
outro como um rival, que deve ser expulso, agredido, morto, sacrificado; ... é primitivo o
homo sapiens engravatado que mora nos tantos World Trade Centers, e nos corredores dos
palácios, donos das leis, das armas, do ouro, das alquimias e das letras que usa destes
natureza. Nenhum outro animal tem prazer positivo no exercício da crueldade contra outro da sua
espécie. Nos demais animais, a agressão visa basicamente à preservação ao invés da destruição.
Fromm (1987), examinando a questão, adota a tese de que no ser humano coabitam duas
compartilha com todos os animais e, embora não seja inata, coloca-se a serviço de seus interesses
vitais e da espécie; e uma agressão “maligna”, isto é, a crueldade e a destrutividade, que o difere
(instintos) - respostas às suas necessidades fisiológicas - são substituídas pelo caráter, no qual se
que se diferem conforme as paixões que o dominem e as condições sociais que o circundam.
19
programado para a defesa de seus interesses vitais, apresenta um potencial agressivo mais intenso
do que os demais animais. O homem pode ser levado pelos seus impulsos a matar, a torturar, sem
qualquer razão ou objetivo e a sentir um prazer intenso em proceder dessa forma. Fenômeno que
somente se explica nas condições específicas da existência humana. Sistematiza Fromm (1987,
biologicamente como nos outros animais, tem seus fundamentos em regras sociais, que definem
para cada homem o critério de legitimidade de seus direitos. Essas regras incorporadas à sua
realização. Não existe um limite natural aos desejos do homem, portanto, ultrapassa sempre e
de qualidade de vida, frustradas pelas situações reais e concretas que inviabilizam a realização e
satisfação, gera no ser humano um estado de morbidez. A necessidade de poder perverte a sua
obstáculo que se lhe depara não é físico, mas moral, isto é, social”. Portanto, é preciso educá-lo a
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partir da sua moralidade. Somente a consciência do homem regulada pela sociedade poderá
encontrar os meios de o restabelecer, de fixar o limite para além do qual suas paixões não devem
se manifestar.
Para Merton (1970, pp. 236-237), a situação anômica não se limita nas características do
indivíduo, mas nas posições que ocupa no sistema social, e situa as fontes de tensão na estrutura
profissionais, nos criminosos comuns. O terceiro tipo é o ritualista, próprio dos burocratas,
tipologia é a rebeldia, na qual se nega lealdade a um sistema cultural e social julgado injusto, e se
procura reconstruir o sistema social a partir de novos objetivos e meios. “A anomia é, então,
concebida como uma ruptura na estrutura cultural, ocorrendo, particularmente, quando há uma
disjunção aguda entre as normas e metas culturais e as capacidades socialmente estruturadas dos
desobediência às leis. Para tanto, formula a concepção de “um processo de interação, dentro do
lo”.
No entanto, qualquer que sejam as razões que aportam o caráter anômico do homem, o
controle da sua paixão para matar, destruir e eliminar a vida é medida imperativa.
Mas, como exercitar esse controle se domina em nossa cultura o homo demens? Se o homo
sapiens é pervertido pelo homo demens para destruição? Se o homo que se julga sapiens perdeu
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Boff (1998, p. 32), ao cuidar da questão, acena com rápida consideração de que:
(...) o ser humano, na sua aventura evolucionária, foi se afastando lentamente de sua casa
comum, a Terra. Foi quebrando os laços de coexistência com os demais seres, seus
elementos da natureza. Tal atitude introduziu a quebra da re-ligação de todos com todos.
Eis o pecado de origem de nossa crise civilizacional que está chegando nos dias de hoje ao
seu paroxismo.
toda a história, o homem tem sido atormentado pela ignorância sobre sua própria natureza
e tem preenchido a lacuna com fantasias utópicas sobre o que ele quer ser, em vez de
enfrentar a realidade do que ele é... Existe tanta coisa que não sabemos, tanta coisa que
poderíamos descobrir. Para que o homem sobreviva, precisamos saber o máximo possível
muitas maneiras, uma espécie insatisfatória, mas, seja o que for, temos de conviver com
ele.
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O homem é um ser inteligente, dotado de uma consciência intencional, livre para opções e
decisões. Não é cruel e destrutivo por instinto, mas por intencionalidade. É preciso entendê-lo,
constitucional do Brasil (art. 1º), instituiu o Estado Democrático de Direito, de onde emanam os
humana.
dignidade humana. Há, portanto, um liame direto entre Estado-indivíduo, sob a égide da
segurança jurídica, que reclama a organização do Estado pelas vias do direito, sob a garantia
constitucional.
República Federativa do Brasil, constituído em Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, III),
controle social.
Em proteção à vida humana, a norma penal submete a todos ao império da lei, impondo
uma necessidade de definição legal da conduta delitiva e prévia cominação legal da pena (Código
Desse modo, para que o fato seja considerado crime, necessita de uma subsunção formal.
Cabe à norma penal descrever os tipos penais incriminadores das condutas delitivas. Somente
pelos fatos definidos como delituosos, e naquelas penas previamente fixadas, pode alguém ser
processado e condenado.
atividade normativa que cria a lei que institucionaliza o procedimento, define o tipo penal e o
executa.
24
Na definição legal, crime é a infração a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção,
quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa (Lei de Introdução
ao Código Penal - Dec. Lei n. 3.914/41, art. 1º). E lei são normas transmitidas de geração a
geração, que penalizam o infrator pela prática de ato criminoso com multa, prisão, reclusão ou
com a figura de pecado, objetivando manter a ordem e o tecido social dentro de padrões
A lei penal delimita a conduta lesiva ao bem jurídico e prescreve a conseqüência para o
seu agente.
criminoso compreende tanto elementos objetivos quanto subjetivos. Os primeiros dizem respeito
(Maranhão, 1995).
sociológicas.
criminosos, afirmando, em sua teoria, que o verdadeiro delinqüente é nato, nasce semelhante ao
louco moral, que tem uma base epilética, com taras degenerativas, designando-o como um genus
criminoso; não se preocupou com o crime em si. A tarefa de estudar o crime à luz da
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criminologia foi empreendida por Garofalo (1997), que elaborou a concepção do delito natural,
Defende a teoria, segundo a qual, os criminosos são portadores de uma anomalia moral e
psíquica.
Ferri (1996), o sistematizador da Sociologia Criminal, define o crime como uma ação
Os criminosos natos se distinguem pela falta congênita do senso moral e pela imprevidência das
conseqüências de suas ações. De acordo com o autor, o criminoso nato manifesta insensibilidade
perante o sofrimento e os danos causados à vítima, nenhuma repugnância ou remorso pelo delito
progressiva do senso moral e das circunstâncias menos favoráveis à sua existência. Todos os
criminosos apresentam uma normal força impulsiva para a prática de atos criminosos,
perturbação física transitória mais ou menos violenta, que pode desencadear tipos intermediários
de criminosos.
Mas, como pondera Brandão (2003), a investigação do crime perpetrada por Garofalo e
Ferri, parte de uma realidade fenomênica, divergente do conceito jurídico. Muitos crimes
definidos por Garofalo ou são movidos por motivos egoístas ou anti-sociais como quer Ferri. O
crime incurso no art. 242 do Código Penal, por exemplo, incrimina a conduta de registro de filho
alheio como próprio, mas que praticado por motivo de reconhecida nobreza, ensejaria a mudança
da pena de reclusão para detenção com diminuição ou supressão da pena. O homicídio motivado
26
por relevante valor social ou moral, como, por exemplo, a eutanásia, é um crime em que a pena
o crime sob prismas diferenciados. Enquanto a criminologia busca investigá-lo à luz do saber
empírico, o Direito Penal busca explicá-lo segundo o saber normativo (Brandão, 2003).
O conceito de crime à luz das normas jurídicas pressupõe ênfase ao preceito (conceito
E, bem jurídico, como valor objetivo que a norma penal visa a proteger. No conceito formal,
conduta delitiva deve estar adequada ao tipo penal. Essa adequação é denominada tipicidade. A
tipicidade é, pois, definida como a adequação da ação humana ao modelo descrito na lei.
eqüidistante entre a legalidade e a antijuridicidade. Desse modo, somente se pode imputar pena a
uma conduta se esta estiver tipificada na lei. Esse o princípio esculpido pela Constituição Federal
(Brasil, 1988), art. 5º, XXXIX e normatizado pelo do Código Penal Brasileiro, art. 1º, segundo o
qual, “não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”.
Desse modo, crime e pena só podem existir onde houver lei que obedeça, na sua formulação, aos
trâmites determinados pela Constituição e pela lei penal. É a denominada reserva absoluta da lei,
o que exclui a possibilidade de criação de tipos penais por outras fontes do Direito. Além disso, a
lei deve ser anterior quanto ao crime e prévia, no que diz respeito à cominação da pena, isto é,
antes que ela surja, não há fato que receba a qualificação delituosa, nem previsão punitiva
27
lei defina o crime e a pena. A lei penal delimita a conduta lesiva ao bem jurídico e prescreve a
descrito, explicitando, com marcos precisos, a conduta criminosa que não pode servir de
parâmetro para situações fáticas próximas ou assemelhadas. Por meio de tipos penais, descreve
O crime na sua tipificação legal pode ser culposo ou doloso. O crime culposo é aquele em
que o agente não age com vontade expressa, sendo o crime resultado de negligência, imprudência
ou imperícia. O crime é doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo.
ser definida como uma contradição da conduta humana com a norma penal. Enquanto elemento
do crime, a antijuridicidade encerra um juízo de valor, que atribui à ação humana a qualidade de
imputabilidade penal.
relativamente às exigências de tutela da norma penal e aos valores. São os valores que definem o
Destarte, não é suficiente que o sujeito agente tenha, com consciência e vontade,
bem, o interesse tutelado pela norma. Todo crime é um fato típico e culpável voltado para um bem
jurídico tutelado pela norma. A antijuridicidade é, portanto, um elemento do crime que faz
convergir para si todas as demais categorias do delito. Sua inferência independe da valoração do
Mas, a antijuridicidade não pode ser sustentada na sua concepção formal apenas. Nela
28
antijuridicidade é também a contradição do fato com o interesse tutelado pela norma jurídica. À
antijuridicidade material preexiste o Direito. Sem a sua formalização, não é possível infundir a
Litz citado por Brandão (2003), assenta tese de que o direito visa à defesa dos bens
jurídicos mediante a coação imposta pela norma. A ordem jurídica mediante a força submete a
vontade individual à vontade coletiva. Essa coação é exercida pelo Estado por meio da força, pelo
restabelecimento do status quo ante e pela imposição da pena como castigo à desobediência. Essa
última forma consiste na missão do Direito Penal: defesa dos bens jurídicos por meio de ameaça e
porque é uma conduta contrária aos interesses vitais da sociedade. Daí, asseverar Reale Júnior
Entretanto, para que o fato constitua crime não é suficiente que seja típico e antijurídico, é
necessário que esteja revestido de culpabilidade. Elemento de juízo do autor da ação. Como
explica Brandão (2003), existem condutas típicas e antijurídicas que nem sempre constituem
crime. Matar alguém é uma ação típica e antijurídica disposta no art. 121 do Código Penal
Brasileiro - CPB, porém se o fato é praticado por um menor de idade (CPB, art. 27), não se
definidor da imputabilidade penal. Mas acrescenta que, toda a base da culpabilidade apóia-se na
consciência da antijuridicidade. Para que o fato seja culpável é preciso que seu agente tenha
conhecimento da antijuridicidade material da sua ação, isto é, que sua conduta seja juridicamente
proibida.
29
maturidade e sanidade mental que confere ao agente a capacidade de entender o caráter ilícito do
Ponte (2001, p. 26) esclarece que a imputabilidade pode ser definida como a capacidade
de entender e querer o ato delituoso; para ser imputável o agente precisa compreender as
meio estranho)”. Adverte, entretanto, que a imputabilidade não pode ser entendida em si mesma
no processo de responsabilização do criminoso, senão adaptada à sua própria história de vida, que
O legislador penal, por sua vez, não definiu o que é a imputabilidade. Decidiu-se por
definir as condições nas quais é impossível o seu reconhecimento: “é isento de pena o agente que,
por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação
Optou o ordenamento jurídico penal brasileiro pelo critério biopsíquico, que exige a
verificação, no agente, de determinados coeficientes mentais anormais, de que resulte para ele
mórbidas à saúde mental, como, por exemplo, a esquizofrenia paranóide, a psicose maníaco-
inimputáveis os menores de 18 (dezoito) anos (Código Penal Brasileiro, art. 27), os retardados
mentais.
Aqueles que, por força de perturbação de saúde mental ou desenvolvimento mental incompleto
A lei penal situa a perturbação mental em um patamar menos grave que a doença mental,
fato ou da determinação conforme esse entendimento, não reconhecendo nos seus atos qualquer
responsabilidade penal.
O art. 28 do Código Penal exclui a inimputabilidade penal aos crimes praticados por
emoção, paixão e embriaguez. Mas, atribui isenção ou atenuação da pena ao agente que, na
hipótese de embriaguez, não dispunha ao tempo da ação ou omissão de capacidade para entender
o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Reconhece a lei
penal que o agente sob estado de emoção e paixão dispõe de juízo de realidade e volição, sendo
imputável penalmente.
predispõe a si próprio como instrumento do seu projeto criminoso. Embriaga-se para cometer o
31
pelo ilícito penal. Na embriaguez voluntária, a ingestão de bebida alcoólica visa à ebriez. Na
embriaguez culposa, embora o agente não pretenda embriagar-se, por imprudência, negligência
capacidade para de entender o ato ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse
embriaguez completa resultante de caso fortuito ou de força maior, por exclusão da capacidade de
culpabilidade.
O DELITO DE HOMICÍDIO
Sofra com o corpo. (Shakespeare, “King Lear”, Ato II, Cena IV).
A morte e a sua incriminação legal dominam o mundo desde os mais remotos tempos.
começar por uma pequena observação, à margem do texto, argumentando que, para serem
contemporaneidade. E, reporto-me aqui à forma como Foucault (1977, p. 32) aborda a história,
os fatos pretéritos e presentes, comentando a atualidade das revoltas nas prisões em todo o
mundo: “É desta prisão, com todos os investimentos políticos do corpo que ela reúne em sua
arquitetura fechada, que eu gostaria de fazer a história do passado nos termos do presente. Sim, se
entendermos com isso fazer a história do presente”. Nesse prisma, Foucault parece fazer menção
à forma anacrônica de nossos procedimentos usuais e habituais de reconstruir a história, nos quais
iluminar os caminhos do próprio curso histórico, num eterno retorno às origens. Assim, não existe
lugar para a atualidade presente, o novo, o inesperado, o que muda e o que é mudado, mas uma
eterna repetição do mesmo e, por essa via, a explicação é uma espécie de profecia que se auto
realiza. Não existem fatos objetivos, porém construções históricas e culturais imersas em um
regime de verdade e de poder, que constroem nossa contemporaneidade. Desse modo, cumpre
a atualidade das “demandas”, das contenções, das prevenções contemporâneas por ordem
social.
É nestes termos que se pretende trazer para o debate um fato contemporâneo: o crime de
seus rudimentos podem ser buscados nos primórdios das mais antigas civilizações. Nos tempos
bíblicos, o homicídio era punido com a pena de morte. Está no Gênesis, cap. IV, v. 8, a morte de
Abel pelo seu irmão, Caim. Vigorava com toda plenitude, a lei de Talião: "oculum pro oculo,
dentem pro dente manum pro manu, pedem pro pede, adustionem pro adustione, vulnus pro
Nas antigas civilizações o homicídio era considerado a mais grave das infrações à ordem
geral, por ferir, ao mesmo tempo, o homem e Estado. Ao homem pela violenta destruição da vida
Em Atenas, a princípio, a punição pelo homicídio, não obedecia ao mesmo rigor oriental.
Era concedido facultativamente ao homicida exilar-se, ficando a aplicação da pena de morte para
Os romanos, desde a mais remota época, puniam o homicídio com extremo suplício. A
partir da Lex Cornelia, a pena de homicídio passou a variar de acordo com as condições pessoais
positi; a decapitatio, para os que secundum gradu sunt honestiore;s e a vivicrematio para os
humiliores. Para o homicídio praticado contra os servos não incidia a pena de morte, uma vez que
era considerado uma coisa e, portanto, não podia ser sujeito passivo do homicídio. Somente com
Justiniano, nos seus libri terribiles, foi restabelecida a indistinta aplicação da pena de morte aos
No primitivo direito germânico, o homicídio não tinha caráter de crime público; assim,
34
era reparado pela vingança privada. Além disso, cumpria ao criminoso a prestação pecuniária,
que se transformou mais tarde em multa, cabendo parte dela ao Estado, como preço da paz, e a
outra parte, aos familiares da vítima, como forma de reparação da vida destruída. Distinguia-se
entre o homicídio com perfídia, clandestino e o homicídio simples, sob a forma de homicídio
perdeu o caráter de ofensa privada, exasperando-se a pena, que passou a ser, de regra, a de morte.
homicídio “Qualquer pessoa que matar outra ou mandar matar, morra por ela” (Liv. 5, tít. 35). O
Código do Império (Lei de 16 de dezembro de 1830) e o Código Penal da República (Dec. N. 847,
pena de morte, no grau máximo. Sendo o homicídio classificado por ambos os códigos, em
simples e qualificado, na forma que especifica, cominando pena carcerária, variável de seis a
trinta anos.
O Código Penal Brasileiro vigente (Dec. n. 2.848 de 7 de dezembro de 1940, alterado pela
Lei n. 7.209 de 11 de julho de 1984) segue idêntica orientação quanto à previsão do homicídio.
Considera homicídio “matar alguém” (art. 121), distinguindo-o em simples e qualificado, doloso
Especial os crimes contra a pessoa em seis capítulos: I Dos crimes contra a vida; II Das
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lesões corporais; III - Da periclitação da vida e da saúde; IV - Da rixa; V - Dos crimes contra a
No primeiro capítulo, referentes aos crimes contra a vida, são definidos os delitos de
O homicídio se encontra tipificado no art. 121 do Código Penal, nos seguintes termos:
Homicídio simples
Parágrafo 1º. Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou
Homicídio qualificado
III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou
Homicídio culposo
Aumento da pena
imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para
Exprime no sentido penal a destruição da vida humana por outrem, por ação ou omissão, dolo ou
O homicídio é, por excelência, o crime mais grave entre os crimes contra a pessoa,
por atentar contra a vida. Como dizia Impallomeni citado por Hungria (1942, p. 24):
(...) todos os direitos partem do direito de viver, pelo que, numa ordem lógica,
o primeiro dos bens é o bem da vida. O homicídio tem a primazia entre os crimes mais
graves, pois é o atentado contra a fonte mesma da ordem e segurança geral, sabendo-se
que todos os bens públicos e privados, todas as instituições se fundam sobre o respeito à
homicídio, do latim homicidiu, como a morte de uma pessoa praticada por outrem; assassínio.
homicídio deriva:
ação que possa causar a morte de um homem. Assim, no sentido penal, homicídio exprime
a destruição da vida de um ente humano, provocada por ato voluntário (ação ou omissão)
Carmignani, citado por Hungria (1942, p. 25), define o homicídio como a morte
Hungria (1942, p. 25) acoima de pleonástica essa definição, uma vez que o sujeito
ativo do crime é sempre o homem e todo crime tem por pressuposto a injustiça. Assim, propõe
uma outra antiga definição: “violenta eliminação da vida de um homem”. Entretanto, prefere a
fórmula de Carmignani, por entender que é a idéia exata do definido, pois tanto é eliminação ou
destruição da vida humana o crime de homicídio quanto a morte de um homem ocasionada por
um animal, ou praticada por alguém em legitima defesa (ato lícito) ou casualmente (fato
penalmente indiferente).
destruição da vida de um homem praticada por outro”. A injustiça e violência não integram o tipo
respeito à culpabilidade. Ademais, o sujeito pode causar a morte da vítima sem emprego de
violência.
provocada por outro homem”. Essa conceituação tem o alcance exato do tipo penal descrito no
art. 121 do Código Penal: “matar alguém” e se apresenta suficiente para distinguir o homicídio
das demais figuras típicas de crimes contra a vida como o infanticídio, o aborto e o suicídio.
O homicídio tem por objeto jurídico a proteção da vida humana extra-uterina. A vida
intra-uterina é incriminada pelo aborto (art. 124 a 128). A deliberada destruição da própria vida é
incriminada pelo suicídio (art.122). A ocisão do neonato pela própria mãe sob estado puerperal é
No ensinamento de Manzini, citado por Noronha (1990, p. 14), “no sentido do art.
121, vida é o estado em que se encontra um ser humano animado, normal ou anormais que sejam
O Estado, em proteção aos “entes” pelos quais tem interesse, expressa uma norma
jurídica, punindo a sua violação com uma pena, o que faz com sejam considerados bens jurídicos
penalmente tutelados.
462), “a relação de disponibilidade de um indivíduo com um objeto, protegida pelo Estado, que
Desse modo, o “ente” que a ordem jurídica tutela contra condutas que o afetam não é a
coisa em si mesma, mas a relação de disponibilidade do titular com a coisa. O que equivale dizer
Quando uma conduta impede ou perturba a disposição de certos objetos, afeta também o
bem jurídico, e algumas destas condutas estão proibidas pela norma que gera o tipo penal.
No crime o objeto jurídico é o interesse tutelado pela lei penal. A norma jurídica ínsita no
art. 121 do Código Penal proíbe “matar alguém”. Logo, o homicídio tem por objeto jurídico a
proteção da vida humana extra-uterina. Protege a vida do ser humano nascido com vida.
Destarte, se no sentido de uso a vida é o mais disponível dos bens jurídicos, porque é
consumida de acordo com o interesse do seu titular, não é facultado ao homem destruir a vida de
outrem, uma vez que a norma jurídica que incrimina o homicídio proíbe essa conduta.
O homicídio não é, porém, o único tipo penal com essa finalidade. Todos os tipos
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penais previstos no título “Dos crimes contra a vida” objetivam a tutela da vida humana. Assim,
uterina. Com a incriminação prevista no art. 122, tutela-se a vida da pessoa humana contra a
Em suma, quando a norma penal tipifica os crimes contra a vida, tutela um bem jurídico,
O tipo penal consiste na descrição abstrata da conduta humana feita pela lei penal e
correspondente a um fato criminoso. O tipo é, portanto, um modelo criado pela lei, que descreve o
crime com todos os seus elementos e a conduta necessária à sua caracterização (Capez, 2003).
No homicídio a conduta típica é matar alguém, isto é, destruir ou eliminar a vida humana,
O homicídio é, portanto, um crime de ação livre, uma vez que o tipo não descreve forma
de atuação específica da conduta delitiva. Desse modo, o agente pode praticar o crime por
qualquer meio, direto (por ação direta contra a vitima: disparo de arma de fogo, golpe de arma
branca, envenenamento, transmissão de vírus letais), indireto (coação ao suicídio, açular um cão
contra a pessoa que se quer matar), por meios morais ou psíquicos (o agente utiliza o estado de
medo ou de emoção súbita para alcançar o seu objetivo), por omissão (abstenção do dever
jurídico de agir).
Também não exige do agente finalidade especial para o aperfeiçoamento da figura típica.
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Para o homicídio doloso, por exemplo, basta a vontade de matar (animus necandi ou occidendi),
uma qualificadora (Art. 121, parágrafo 2º) ou uma causa de diminuição da pena (art. 121,
nexo causal nos crimes materiais e da tipicidade. Portanto, não basta a subsunção formal da ação
ou omissão para operar o fato típico, é necessário que a conduta do agente seja dolosa ou culposa.
Sem dolo e culpa não existe fato típico, logo, não há crime. O elemento subjetivo do homicídio é o
dolo ou a culpa.
O homicídio tem por elemento subjetivo o dolo quando o agente quis (dolo direto) ou
assumiu o risco de produzir (dolo eventual) o resultado morte; a culpa quando a morte é
O tipo penal, portanto, tem uma parte objetiva , consistente na correspondência externa
entre o que foi feito e o que está descrito na lei, e uma parte subjetiva, que é o dolo e a culpa.
O homicídio é um crime comum que pode ser praticado por qualquer pessoa contra
outra pessoa, com conduta e resultado definido. Com a edição da Lei n. 8.930/94, porém, o
homicídio passa a ser considerado hediondo quando cometido em atividade típica de grupo de
O sujeito ativo do homicídio é a pessoa que pratica a figura típica descrita na lei,
representada por uma ação positiva ou omissiva. A definição abrange não somente aquele que
conduta do agente.
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Desse modo, qualquer pessoa pode ser sujeito ativo ou passivo do homicídio.A
dificuldade reside, porém, em se definir quando se inicia a vida humana extra-uterina. Capez
(2003) entende que a interpretação do início do nascimento pode levar à caracterização de delitos
praticado contra a vida intra-uterina, teremos o aborto; se durante o parto pela mãe, teremos o
infanticídio pelo privilégio; se praticado por agente que não goza do privilégio, teremos o
homicídio.
vivo nascido de mulher' l' uomo vivo, qualquer que seja sua condição de vida, de saúde, ou
de posição social, raça, religião, nacionalidade, estado civil, idade, convicção política ou
estrangeiro, branco ou amarelo, silvícola ou civilizado toda criatura humana, com vida,
pode ser sujeito passivo do homicídio, pois a qualquer ser humano é reconhecido o direito
homicídio não é possível”. Parte, portanto, do pressuposto que o sujeito passivo do homicídio é
aquele que nasce com vida. Por pessoa humana entende o ente nascido de mulher com vida.
com vida. O feto não é pessoa. Se não nasce com vida, não adquire personalidade, não se
torna sujeito, não pode ser vítima de homicídio. Feto e pessoa são realidades distintas que
o código penal trata de forma distinta. Existem tipos penais diferentes para incriminar a
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uterina está subsumido no tipo penal do infanticídio, do qual somente a mãe sob
influência do estado puerperal pode ser sujeito ativo. Fora da hipótese de infanticídio, a
Por sua vez, Bitencourt (2001, p. 31-32) define o sujeito passivo do homicídio
como “qualquer ser vivo, nascido de mulher, isto é, o ser humano nascido com vida”. Entretanto,
define o começo da vida com o início do parto, com o rompimento do suco amniótico. Parte do
entendimento que “a simples destruição da vida biológica do feto, no início do parto, já constitui o
crime de homicídio”.
passivo como “o ser humano com vida”. Porém, entende que “o delito de homicídio tem como
limite mínimo o começo do nascimento, marcado pelo início das contrações expulsivas. Nas
hipóteses em que o nascimento não se produz espontaneamente, pelas contrações uterinas, como
início da operação, ou seja, pela realização da incisão abdominal... Basta, para a caracterização
homicídio ainda depende de uma definição pela lei penal. Contudo, como bem assevera Santos
(2003), não se pode admitir o entendimento de que o homicídio protege a vida humana em todas
as suas fases. A vida intra-uterina é protegida pelo tipo penal do aborto. Matar o ser nascente
configura o tipo penal do infanticídio quando o agente é a própria mãe. Por conseguinte, a
proteção tipificada no homicídio apresenta uma lacuna, uma vez que abrange a vida humana
é um crime material e se consuma com a morte da vítima. Trata-se de crime instantâneo de efeito
permanente porque, uma vez consumado, não se pode reverter o seu efeito.
(paralisação das funções cerebrais) e a morte biológica (deterioração celular). Em regra, a morte é
O crime é tentado quando o agente inicia a sua execução e não o consuma por motivos
No homicídio, a tentativa ocorre quando o agente quer matar outrem, inicia a execução,
Para a tentativa exige a lei penal o começo da execução, isto é, não admite que se
estenda o conceito aos atos simplesmente preparatórios. Somente se pode falar em crime tentado
Segundo Capez (2003), sendo o homicídio um crime material admite tentativa, que
ocorrerá quando, iniciada a sua execução, este não se consumar por circunstâncias alheias à
vontade do agente. Para tanto, o crime percorre quatro etapas (iter criminis) até a sua integral
realização:
início da execução, mas que ainda não começou a realizar o verbo constante da definição
legal (núcleo do tipo); c) execução aqui o bem jurídico começa a ser atacado. Nessa fase,
o agente inicia a realização do verbo do tipo e o crime já se torna punível, ao contrário das
Dessa distinção, conclui-se que o conceito de tentativa não se estende aos atos
preparatórios, porque exige o início da execução. Os atos preparatórios não resultam em perigo
de dano ao bem jurídico penalmente protegido; logo, não há crime. Somente há início de
execução quando o sujeito começa a praticar o verbo do tipo, ou seja, “matar alguém”, primeiro
(art. 121, caput), homicídio privilegiado (parágrafo 1º). Homicídio qualificado (parágrafo 2º) e
O homicídio simples é a figura típica descrita no caput do art. 121 do CP. Constitui o tipo
básico fundamental do crime, é o que contém os componentes essenciais do crime (Capez, 2003).
O art. 121, parágrafo 1º do Código Penal define o homicídio privilegiado como o fato de o
sujeito cometer o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio
virtude de circunstâncias subjetivas especiais que caracterizam o tipo penal. Conforme Capez
homicídio por relevante valor social ou moral, previstos no art. 65, III, a, do Código Penal. O
motivo social diz respeito ao interesse coletivo. Nessa modalidade, o agente pratica o crime
impulsionado pela satisfação de um anseio social. Essa motivação constitui causa de atenuação
da pena. O motivo de relevante valor moral é aquele aprovado pela moralidade média.
Corresponde aos interesses individuais, entre eles, a legítima defesa da honra, o homicídio
emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima. Entende-se por violenta emoção aquela
homicídio. Para a incidência do privilégio, exige a lei que o agente esteja sob o domínio de
violenta emoção. Aquele que reage com frieza a uma provocação não terá direito à diminuição da
pena. Segundo Capez (2003), somente a emoção derivada de uma injustiça e imediata à
estado emocional recalcado, que se transforma em outros sentimentos, como o ódio, a vingança.
Destaca ainda o autor que essa circunstância privilegiadora difere da atenuante genérica
prevista no art. 65, III, c, do Código Penal, uma vez que, nesta última, não exige a lei que o agente
esteja dominado por violenta emoção, mas sob a sua influência e, tampouco, se impõe a
imediatidade entre provocação e reação. Portanto, nas hipóteses em que afastado o privilégio por
não estar o agente sob o domínio de violenta emoção ou pela falta de imediatidade da
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pena.
Assim, embora a emoção não constitua dirimente da punibilidade (art. 28, I, do Código
Penal), pode funcionar como circunstância especial de diminuição da pena ou como atenuante
qualificam o homicídio podem coexistir, desde que não sejam incompatíveis entre si. As
circunstâncias privilegiadoras que são sempre subjetivas podem coexistir com as circunstâncias
circunstâncias previstas no parágrafo 2º, do art. 121 do Código Penal. Trata-se de causa especial
de aumento da pena. No homicídio qualificado, a lei acrescenta ao tipo penal básico um evento
mais grave que o previsto no tipo simples, cominando ao fato pena mais severa.
circunstâncias agravantes (CP, art. 61), nas suas formas qualificadas, para efeito de majoração da
pena. Dizem respeito aos motivos determinantes do crime e aos meios e modos de execução, que
demonstram maior periculosidade ou perversidade do agente, tornando o fato mais grave do que
o do homicídio simples.
promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe”. Nessa modalidade o agente pratica o crime
ignóbil, desprezível, vil , imoral, que denota a depravação espiritual do sujeito e suscita repulsa
geral; “II motivo fútil”. O motivo fútil também é uma qualificadora subjetiva que se refere aos
47
motivos. Considera-se fútil o crime praticado por motivo frívolo, mesquinho, insignificante,
desproporcional, do ponto de vista do homem médio; “III emprego de veneno, fogo, explosivo,
asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum”. Essa é
uma qualificadora objetiva, porque diz respeito à forma de execução do crime. Nessas hipóteses,
a conduta do agente demonstra certa periculosidade, crueldade que dificultam a defesa da vítima
que possibilitem a prática do homicídio com maior segurança, valendo, para tanto, da boa fé ou
respeito à motivação do crime. São circunstâncias que configurariam, a rigor, motivo torpe.
Assim, se para o homicídio simples a exigência é apenas a vontade de matar alguém para a
caracterização do tipo, a forma qualificada do crime exige além da vontade de matar, que o dolo
seja praticado por motivações que denotam alto grau de lesividade social do agente.
crime é considerado hediondo, nos termos do art. 1º da Lei n. 8.072/90. Como hediondos estão
medicinais.
Embora a lei não defina a culpa, registra o homicídio culposo no art. 121, parágrafo 3º do
Código Penal, limitando suas modalidades no art. 18 do mesmo Codex, quais sejam: a
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Como assevera Capez (2003), na conduta dolosa o agente por ação ou omissão dirigida a
uma finalidade ilícita quer ou assume o risco da produção do crime. Na conduta culposa o agente
dirige uma ação voluntária para finalidade lícita, mas, em decorrência da inobservância do
cuidado objetivo devido, produz um resultado ilícito não pretendido pelo autor.
É modalidade de homicídio que admite as figuras típicas simples (art. 121, parágrafo 3º)
e qualificada (art. 121, parágrafo 4º). Existe homicídio culposo qualificado se o crime resulta de
imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar
prisão em flagrante. Nessa hipótese a pena de detenção prevista para o delito (1 a 3 anos) pode ser
de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária, o juiz poderá deixar de aplicar a
pena (art. 121, parágrafo 5º). Trata-se de causa extintiva de punibilidade restrita aos casos
CRIMINOSO
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Falem de mim como sou. Não amenizem nada. Tampouco aumentem a culpa.
Portanto, devem falar daquele... que não soube amar e amou demais. Daquele que era
pouco ciumento... mas que fora iludido e influenciado ao extremo. Daquele cuja mão é
como a do índio que... joga fora a pérola mais valiosa que tudo da tribo. Daquele cujos
olhos dominados.... embora não acostumados à melancolia... vertem lágrimas tão rápido
quanto as árvores árabes... vertem a sua resina medicinal. Mais uma coisa. Devem dizer
também... que uma vez em Alepo... um turco perverso com turbante derrotou um
veneziano... e difamou o Estado. O cão circuncidado peguei pelo pescoço... e o derrotei ...
Assim. Aqui fostes beijada e morta por mim. Só me resta uma coisa: suicidar-me... para
Na acepção mais comum, o crime passional é aquele causado por paixão. Em linguagem
amoroso e sexual.
Nos termos do Código Penal vigente, o homicídio praticado por paixão não exclui a
imputabilidade penal (art. 28, I), sendo reputado hediondo se for considerado homicídio
qualificado (Lei n. 8.072/90, art. 1º). É crime excepcionalmente inimputável quando for reflexo
desenvolvimento mental incompleto ou retardado (art. 26). O estado passional poderá ainda ser
emoção, provocada por ato injusto da vítima (art. 65, III, c e 121, parágrafo 1º).
sobre incapacidade parcial, total e única. Preferiu considerar os estados patológicos totais, de um
atenuação da punibilidade aos segundos (art. 26), sem prejuízo da aplicação da medida de
segurança.
A posição acolhida pelo Código Penal em relação à emoção e à paixão reconhecem que os
estados emocionais e passionais são atividades comuns ao psiquismo humano normal, sendo
detectáveis em qualquer pessoa com capacidade de controlar a própria afetividade. Supõe-se que,
sob violenta emoção ou paixão, não falta ao agente noção do ato cometido. O que se encontra
prejudicado é a opção de agir eticamente, ou seja, o domínio sobre as suas próprias decisões.
Sobre a aferição dos aspectos afetivos, emoção e paixão, Bitencourt (2003, p. 319)
Esses estados emocionais não eliminam a censurabilidade da conduta (art. 28, I, do CP);
poderão, apenas, diminuí-la, com a correspondente redução de pena, desde que satisfeitos
qualquer outro crime (atenuante), desse estado emocional, que deve ser violento, sob o
passionalismo. O crime passional não foi considerado inimputável, como ocorrera com o Código
Penal da Primeira República que acolheu entre as causas de exclusão da criminalidade “os que se
crime” (art. 27, parágrafo 4º). Apenas reconheceu a exclusão da responsabilidade no caso de
autêntica alienação ou grave deficiência mental, e atribuiu influência minorativa da pena sob
determinadas condições.
cuja origem não se perquire. Se o agente comete um delito sob efeito de um surto psicótico
derivado de um trauma emocional, o ato ilícito deve ser analisado à luz da inimputabilidade ou da
Sob a posição adotada pelo Código Penal, parece adequada a acepção proposta por
Linhares (1978); a lei penal não forneceu elementos para se estabelecer um conceito teórico
arbítrio do magistrado aferir se o crime foi cometido por anormalidade da função psíquica ou por
Segundo Anibal Bruno (1967), a lei penal reduziu à doença mental todas as hipóteses de
(art. 26), não distingue o mentalmente são do insano mental. A lei fala em perturbação da saúde
mental e não em doença mental. E, parafraseando Roque de Brito Alves (1998), afirma que,
embora toda doença mental implique em perturbação da saúde mental, nem sempre este estado de
sinais de perturbação de saúde mental, mas não são doentes mentais. E, substanciado em
Cerezo Mir (1982), atenta que a redução de capacidade de entendimento dos fronteiriços
pode ter origem tanto natural, quanto de ação positiva de medicamentos. Os semi-imputáveis são
52
individual e coletivo do homem. Já dizia Empédocles, citado por Silveira (1955), que duas
grandes forças potencializam o Universo: o amor e o ódio, fenômenos esses máximos das
sempre a unidade psicossomática básica do ser humano. E citando Mira y López (1964),
equilíbrio existencial.
afetividade, a que estão ligadas certas variações somáticas ou modificações particulares das
Para Oliveira (1962), a emoção é um estado afetivo atual, que produz imprevista e
psíquicos.
São emoções todas as impressões agradáveis ou penosas. A emoção pode ter como fator
etiológico a ira, o medo, a alegria, a ansiedade, o prazer erótico, a vergonha ou tantos outros
sentimentos instintivos, egoísticos, afetivos, sociais e, também, os mais elevados, isto é, os ético-
sociais.
Contudo, os homens não reagem do mesmo modo em uma situação convergida ao mesmo
intensidade, assumindo, assim, os caracteres de afetos patológicos. O amor sexual, por exemplo,
reflexão, torna-se, então, uma paixão. Os efeitos da emoção transcendem a normalidade para o
afeto patológico.
Silveira (1955, p. 1394) citando Dupré, adverte que “os efeitos da emoção se traduzem
por desordens, as mais variadas, determinadas, na sua natureza, sua evolução e sua gravidade,
finalístico. Desse modo, a paixão estará na razão direta da potência emotiva, como esta, à sua vez,
Como distingue Kant citado por Silveira (1955, p. 1453), “a emoção é a água que rompe
com violência o dique e desde logo se espraia; a paixão é a torrente que escava o seu leito, ali se
no tempo, alimentando-se nas suas próprias entranhas. Perdura como um sentimento profundo e
representações. De conseqüência,
uma série de estados diversos e amiúde opostos e contraditórios, que se vão somando e
reunindo, por efeito do seu motivo, até à sua cristalização definitiva, à semelhança das
águas dos regatos, que formam os rios, com as suas adições sucessivas.
porém, não se confundem. As emoções constituem o tecido da vida psíquica cotidiana do homem.
Caracteriza-se pela transitoriedade da perturbação afetiva, por isso permanece nos confins da
desordem rara da vida psíquica do homem, sem, entretanto, constituir demência. No homicídio
cometido por paixão, o criminoso evoca os motivos, delibera, decide e executa, por isso, não
anula a responsabilidade.
ora impulsiona o instinto de conservação, ora desencadeia o brusco e imediato revide da defesa.
Emoção contínua ou repetida “cifra-se na ruminação da impressão, que lhe deu lugar,
emocional.
A emoção contida é a que o sujeito controla, sufoca, recalca, subjuga no momento da sua
A emoção retardada “é a que surge, após o fato desencadeador, por evocação da memória
conseqüências do fato.
56
Silveira (1962) observa que tanto a emoção contida quanto a retardada, subjugada, podem
fazer nascer um sentimento que com elas se relacionam e se ligam. Nesse caso, a paixão pode ser
subsistente ao agravo ou à afronta. Nesse instante, pode surgir a emoção, e, com ela, o sentimento,
e, com este, o estado passional. Acresce que a emoção retardada pode ser tão violenta como
qualquer outra, podendo nascer tanto do contraste da situação atual com a situação passada,
Inúmeras são as classificações das paixões pelos adeptos da Escola Clássica. Mas dentre
elas destaca-se a feita por Carrara, que as classifica em dois grupos: cegas e raciocinantes. As
Situam-se entre elas o amor, o ciúme, a vingança, a cobiça. As paixões raciocinantes (paixão do
A Escola Positiva não escalona as paixões pela sua intensidade, tem como critério a sua
são:
(...) 'as que tendem a desagregar as condições normais da vida humana, individual e
As paixões sociais são 'as que normalmente têm a função de desfavorecer e cimentar a
vida social e fraterna, e, somente por uma aberração momentânea, acompanhada ou não
O Código Penal exclui da inimputabilidade a emoção (art. 28, I). Mas, dispõe de outra
parte cuidar-se de situação atenuante de alguns delitos e causa de diminuição de pena, quando
caracterizada por um estado emocional, de ânimo e do sentimento muito excitado, isto é , quando
o crime ocorre sob a influência de uma violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima. (art.
Art. 65 São circunstâncias que sempre atenuam a pena: ... III ter o agente: ... c) cometido
superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima; art.
121 Matar alguém: Pena reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos. Parágrafo 1º Se o agente
comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio
de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a
A posição da lei penal é, pois, bem definida. Não é qualquer emoção que atenua ou
diminui a pena. Somente a emoção definida como violenta e sob adequada proporcionalidade
entre o fato injusto provocador e a ação ilícita desencadeada tem a prioridade atenuante ou de
tempo da ação, do caráter ilícito do fato. Interessa, portanto, definir se a violenta emoção seria um
fato capaz de determinar que o agente não era condutor do seu comportamento, mas submetido ao
racionalidade.
(...) a emoção pode ter um efeito paralisante, tanto para o pensamento como para a ação.
A emoção intensa cria um vácuo no espírito; não encontramos mais o que dizer ou fazer;
58
não podemos mais pensar, já não vemos com clareza na situação concreta, não
(resquício animal do homem primitivo). O homem em estado emocional não teria a capacidade
A ciência do século XX, embora tenha devolvido a emoção ao cérebro, relegou-a aos
Contrário a essa posição, Dória (1997) afirma que a dimensão emocional não impede o
volição.
Nesse sentido Silveira (1955) já assentava que a emoção comum, que não ultrapassa o
inexistente o ato inibitório da vontade. Os estados emocionais ordinários não se dessubjugam dos
estado emocional normal, pois que, sendo patológico, o agente se exime da punibilidade, por
Esclarece Hungria (1942) que a lei, ao prescrever que a emoção não exclui a
que não chega a ser um doente mental. O indivíduo emocionado jamais adquire personalidade
Goleman (2001), em seu estudo sobre a inteligência emocional, parte do princípio de que
59
a mente emocional é muito mais rápida que a racional, agindo sem reflexão analítica. Para o
Psicólogo, as ações desencadeadas pela mente emocional carregam uma forte sensação de
certeza e somente após a reação ou no seu curso o indivíduo é capaz de refletir sobre a sua atitude.
A constatação de que é necessário agir tem que ser imediata e não pode atingir um nível de
consciência. O indivíduo dominado pela emoção baseia-se nas primeiras impressões e reage ao
panorama global ou aos seus aspectos mais conflitantes. Capta tudo num relance, reage
(...) em termos técnicos, o auge da emoção dura um momento breve segundos, e não
minutos, horas ou dias. Para que as emoções permaneçam em nós por mais tempo, o
gatilho tem de ser mantido, ou seja, o sentimento tem que ser continuamente evocado.
uma forma contida. Os estados de espírito estabelecem um afeto, mas não formam
percepções de maneira tão forte como ocorre no calor da emoção. (Ekman, pp. 306-307).
Esclarece, em outras linhas, que o indivíduo que está à mercê dos impulsos não tem
emoção. Em geral, os passionais não praticam o crime sob o domínio da emoção. O homicida
passional é movido pela paixão. Esse sentimento não provoca reação automática, momentânea ,
passageira e abrupta. Como esclarece Eluf (2003), a paixão que mata é crônica e obsessiva; no
momento do crime, a ação é fria, com emprego de recurso que impossibilita a defesa da vítima e
grande maioria das vezes, não existe provocação injusta da vítima, apenas vontade de romper
com o relacionamento ou recusa de reconciliação; situações que não podem ser consideradas
como provocação.
60
Por outro lado, mesmo existindo provocação da vítima, se o crime é premeditado, não se
Conforme adverte Hungria (1942, p. 126), “aquele que, embora injustamente provocado,
reage a sangue frio, como se estivesse praticando uma ação normal, revela que não sentiu a
injustiça, e comete o crime por mera perversidade, pela só vanglória de não levar desaforo para
casa”.
se configure a violenta emoção, é necessário que este estado emocional domine o agente, o que
significa que, sob o estado de violenta emoção, este perde o seu autodomínio, seu controle,
Entretanto, não é isso que normalmente ocorre. O agente tem consciência da ilicitude da sua ação
e capacidade de prever o resultado dela, conhece a vítima, sabe exatamente o que quer fazer com
ela e qual procedimento deve ser adotado para atingir a sua finalidade. Em geral, é empregada
O delito passional existe desde os mais remotos tempos. A história registra com
freqüência episódios criminais passionais. As “mortes por amor”, em defesa da honra íntima
sempre foram motivações utilizadas para justificar o assassinato e para minorar as conseqüências
Consoante acentua Eluf (2003), tanto se abordou sobre o tema nas mais diferentes formas
de comunicação e, às vezes, de forma tão adocicada que se criou uma aura de perdão em torno do
criminoso.
apresentam como heróis de amor triunfante, ou vítimas de paixões cegas (Linhares, 1978).
A morte por amor, por não suportar a perda do objeto de desejo ou para lavar a honra
ultrajada, foi por séculos tomada como uma conduta nobre e justificada.
No Brasil-Colônia, a lei permitia ao homem traído matar a sua mulher e o seu amante. E,
embora tenha o Código Penal do Império eliminado essa regra, o Código Penal da República
entendeu que o estado emocional decorrente do adultério era causa de exclusão de punibilidade
Código Penal de 1940, ainda em vigor, substituiu a excludente de ilicitude por uma nova
homicídio cometido por motivo de relevante valor social ou moral e aquele sob domínio de
homem sobre a mulher que lhe autorizava matá-la na hipótese de adultério, não sendo a alteração
promovida pelo Código aceita passivamente pelos criminalistas, que insistiram na absolvição do
criminoso passional. A concepção de que a infidelidade conjugal da mulher era uma afronta aos
direitos do marido e um insulto à sua reputação, aliado ao desejo dos criminalistas de absolvição,
encontrou eco nos sentimentos do júri popular, que passou a conceber com benevolência o
criminoso passional. O julgamento pelo júri popular, como leigo que é, não era feito com base na
Assim, surgiu a tese de legítima defesa da honra e da dignidade para absolver o marido ou
amante vingativo. E isso era possível porque a pena a ser aplicada equivalia à pena do homicídio
culposo. No exercício da legítima defesa, a lei prevê um excesso culposo, que, na hipótese de réu
primário, como geralmente ocorre nessa modalidade de crime, a pena não excedia a dois anos, o
que permitia a aplicação do sursis (suspensão condicional da pena). Com a aplicação da medida,
62
o acusado não era submetido ao regime de reclusão e, em dois anos, estava livre e sem ônus com a
justiça.
Releva notar, ainda, que geralmente o conselho de sentença, por expressa disposição legal, era
Entretanto, como pondera Eluf (2003), essa tendência vem sendo gradativamente
refutada pelas decisões judiciais. Os tribunais do País têm afastado a tese da legítima defesa da
honra. A honra passou a ser concebida como bem pessoal e intransferível. Desse modo, eventual
conduta reprovável por parte de um dos cônjuges não afeta o outro. Qualquer dos cônjuges é
A “honra”, como salienta Eluf (2003, p. 164), foi usada em sentido deturpado, refere-se
respeitabilidade social. Uma vez traído pela mulher, o marido precisaria 'lavar sua honra',
matando-os. Mostraria, então, à sociedade que sua reputação não havia sido atingida
Os motivos que levam ao crime passional não guardam consonância com o sentimento de
honra, tampouco com o sentimento de amor; têm a ver com sentimentos de destrutividade e de
crueldade.
A paixão que mata não deriva do amor, decorre do sentimento de ódio, de vingança, de
Eluf, citando Itagiba (2003), afirma que o amor que assassina transpira animalidade,
posse, do despique do amante preterido, do ciúme ofendido na vaidade, do ódio, a que chama de
honra.
A paixão que decorre do amor dá sentido à vida e transcende uma existência banal; leva a
e à crueldade (Fromm,1987).
A paixão normal não produz crime. É um sentimento comum aos seres humanos, que se
acha na própria raiz da existência humana e visa a dar um sentido à sua vida.
Rabinowicz citado por Eluf (2003, p. 114), ao comentar sobre o crime passional, observa
Curioso sentimento o que nos leva a destruir o objeto de nossa paixão! Mas não devemos
possessivo, egoísta, capaz de gerar ciúmes violentos, que normalmente levam a graves
Consoante explica Linhares (1978), o ciúme não deriva do amor senão do autoritarismo
do objeto de desejo. Acentua, portanto, motivos endógenos e exógenos. Uma ameaça potencial
de dor, ódio, vingança, raiva, cólera, que podem conduzir à destruição e, especialmente, à
autodestruição.
Asúa, citado por Linhares (1978, pp. 188-189), esclarece que as relações amorosas, em
geral, são marcadas por formas exacerbadas de poder sobre o objeto amado:
No fundo, queda latente uma grande quantidade de ambição pessoal, de vaidade e desejo
de domínio; cada amante é ciumento e faz valer certo direito de posse sobre a amada, que
em realidade não possui. Cada olhada para outro rival encontra uma ferida em seu
outro de todos os seus erros e infidelidade para, assim, dominá-lo e humilhá-lo. A isso são
desejo de vencê-lo para, assim, reafirmar-se a própria vontade do poder. Deixando de lado
o ciúme paranóico, pode-se dizer que os principais fatores dos ciúmes são a cólera, o
mesmo, surgindo o crime dessa terrível combinação, cujos componentes estão ínsitos em
65
toda conduta ciumenta, ainda que uns predominem mais que outros.
O ciúme não resulta de um amor exaltado, mas de um sentimento, no qual estão em jogo o
orgulho, a resolução da posse exclusiva, o despeito por uma inferioridade física ou moral.
amante tomado pelo ciúme pode tornar-se extremamente violento e cruel, a ponto de encontrar
satisfação no sofrimento da pessoa amada. Como acrescenta Roque de Brito Alves (1984, p. 19),
“o ciumento considera a pessoa amada mais como 'objeto' que verdadeiramente como 'pessoa' no
exato significado desta palavra. Esta interpretação é característica do delinqüente por ciúme”.
Em outra passagem, adverte que o ciúme não é uma 'prova de amor', em verdade, é a sua distorção
ou deformação.
Eluf (2003) observa que no ser humano o instinto de sobrevivência obriga a um egoísmo
O homicida passional possui uma necessidade de dominar seu objeto de desejo sem
limites e sua repulsa pela traição não se restringe ao significado imprimido à relação amorosa,
(...) a Escola Positiva exaltou o delinqüente por amor e foi o bastante para que por
passional fosse tido todo matador de mulher. A verdade é que, via de regra, esses
assassinos são péssimos indivíduos: maus esposos e piores pais. Vivem sua vida sem a
menor preocupação para com aqueles por quem deveriam zelar, descuram de tudo, e, um
ver preterido por outro. É o medo do ridículo eis a verdadeira mola do crime. Esse
reconhecimento e auto-estima que julga ter perdido com a traição do ser amado, mediante
Entretanto, a paixão que mata não é amor. “Quem ama não mata!”. O relacionamento
violenta emoção, a defesa da honra, mas será que estes aspectos da afetividade podem ser
responsabilizados pelos atos cruéis que normalmente são praticados por esses criminosos? Esses
Assim é que o termo distúrbio (transtorno) será empregado, para descrever o conjunto de traços
Ponti (1999), ao buscar definir o conceito de personalidade, esclarece que está contido
nele tanto o temperamento quanto o caráter. O primeiro é potencialidade inata que se transforma
adquiridas que regulam as relações do sujeito com as condições do meio, e, quando este
67
nessa dimensão psíquica que o ser humano encontra estímulos para todas as suas vivências.
sofrimentos e interferências com funções pessoais. Desvio ou conflito sozinho, sem disfunção
caráter.
O termo transtorno de personalidade foi cunhado por Schneider citado por Dalgalarrondo
(2000, p. 165), que a definiu como personalidade psicopática, que, pelas suas características,
68
“sofre e faz sofrer a sociedade, assim como não aprende com a experiência”.
De acordo com a classificação de transtornos mentais da OMS, a CID 10, citada por
seguintes características:
outros, etc.
de longa duração e não limitado ao episódio de uma doença mental associada (como,
social do indivíduo, não sendo restrito apenas a um tipo de reação ou a uma área do
psiquismo.
lesão cerebral).
69
etc.). Entretanto, salienta a CID-10, tal sofrimento pode se tornar aparente para o
ocupacional (no trabalho, estudos, etc.) e social (com familiares, amigos, colegas de
Internacional das Doenças (ICD 10) e o DSM, proposto pela Associação Americana de
Esses distúrbios foram definidos no DSM III-R citado por Sica (2003, pp. 30-31)
como:
(...) modos constantes de perceber , relacionar-se e pensar nos confrontos com o ambiente
comportamento social.
enquadramento que toma por base o fato de estes pertencerem ou não a áreas psicopatológicas
sendo explorados, prejudicados, enganados pelos outros de alguma forma e, por causa disso,
questionam sempre a fidelidade e a lealdade das pessoas à sua volta; não fazem confidências, pois
temem que possam ser usadas contra si; são irascíveis, sarcásticos, irônicos, chantagistas
emocionais e guardam rancor por longos períodos; não fazem auto-análise, uma vez que são
isolamento social.
esquizóide não mantém laços afetivos com as pessoas, mantém-se afastado; apresenta aparente
auto-referimento.
manter relações sociais e íntimas, não tem amigo íntimo ou confidente, além dos parentes de
O portador deste distúrbio tem tendência a uma particular reação a situações externas,
mostra emotividade exagerada, porém, superficial, pueril e lábil; freqüentemente considera suas
relações mais íntimas do que na verdade são; comunica-se com os outros por erotização; sente
incapacidade de conformar-se às normas sociais que, desde a adolescência, se revela sob forma
distúrbio é quase sempre detectada na infância enquanto alteração da conduta à qual se associa
um amplo comprometimento do fator social. Essa situação prolonga-se no tempo sem que a
pessoa tenha consciência da doença; a diagnose geralmente não é feita antes dos 18 anos (Sica,
2003).
pessoas que freqüentemente estão com problemas e em conflito com a autoridade e a disciplina,
72
e, embora inteligentes, não aprendem com a experiência ou castigo, e não conservam lealdade
irresponsáveis, impulsivas, com baixa tolerância à frustração e mau julgamento, embora sejam
seus prazeres imediatos; vivem no presente; não suportam a rotina. Têm necessidade de “ser
alguém” e “ter o melhor”, mas utilizam meio inadequado para isso. Gozam de habilidade para
impressionar e explorar os outros, e para fazer sofrer aqueles com quem se relacionam.
conformar-se às normas sociais. Transgridem facilmente as leis e sentem desprezo pelos que as
volição, eles tem consciência do que fazem e conhecem a ilicitude da sua conduta, mas se sentem
superiores às leis.
de cometerem atos brutais, abomináveis, embora se apresentem quase sempre de maneira amável
e de fácil contato.
Os psicopatas são instáveis e se irritam com facilidade, não sendo possível prever o seu
A afetividade dessas pessoas é perturbada, seus estados afetivos, embora intensos, não
são duradouros. A culpa, apesar de existir, não é assumida, sempre buscam justificativas no alheio
aumentado.
73
Esse quadro se manifesta muito cedo em sua história de vida. A infância é marcada por
Geralmente são advindos de lares conflituosos, onde não foram desejados pelos pais, ou
são filhos ilegítimos. A etiologia do distúrbio pode também estar ligada a problemas genéticos,
por abuso e dependência de substância química, psicoses, síndromes mentais orgânicas e retardo,
criminoso.
onipotência, com fantasias de sucesso, poder, fascínio, beleza e amor ideal ilimitados. Acha-se
especial e único, exigindo admiração excessiva para si mesmo. Tende a ser explorador nas
relações intersubjetivas, buscando vantagens sobre as pessoas para atingir seus objetivos
Sica (2003), citando a definição do DSM IV, descreve a síndrome como “uma modalidade
invasiva de instabilidade das relações interpessoais, da auto-imagem e do humor, bem como uma
pronunciada impulsividade que surge na primeira idade adulta e se faz presente em vários
Para satisfazer a diagnose descrita pelo DSM IV, segundo a autora, são necessárias ao
(...) sujeitos com comportamento tendente a evitar um abandono real ou imaginário que
74
na mesma esteira, sua afetividade, vez que seu humor é altamente reativo. São sujeitos
consciência de seu papel e de desempenhá-lo; embora presentes ligações com o mundo real, a
total ausência de percepção da própria identidade induz o paciente borderline a perseguir metas
portador do distúrbio tem baixa tolerância às frustrações, o que pode levá-lo quer a situações em
egocentrismo, quer a agir antes de avaliar as conseqüências de seus gestos. Tem um padrão
inflexível , preocupado excessivamente com detalhes, perdendo de vista o objetivo final da ação e
não a concluindo por buscar um padrão muito elevado na execução. Em geral, é avarento. Tem
dúvidas excessivas sobre suas prioridades e hierarquia a ser empregada para a execução de
tarefas, que nunca são delegadas a terceiros, a menos que estes se sujeitem a realizá-las
75
exatamente à sua maneira de fazer as coisas. É indeciso quanto aos valores morais e às escolhas
existenciais. Adere excessivamente às convenções sociais. Sua rigidez impede ou anula o prazer
inferior aos outros. Acha-se incapaz de tomar decisões e de alterar a própria existência. Tem
do abandono. Permitem que outras pessoas tomem as decisões importantes em sua vida pessoal e
posicionamento das pessoas por medo de reprovação e perda de apoio; não fazem tarefas
sozinhas; sentem desespero quando seus relacionamentos terminam, buscando uma substituição
imediata; fazem qualquer atividade em troca de ajuda e suporte. Aparentemente, esses sujeitos
têm atitudes articuladas e satisfatórias, vez que vivem o conflito em um plano pessoal e não
relacional.
debilitadas, sem alegria ou felicidade; sentem-se desajustadas e com pouco valor; apresentam
excesso de criticidade e indisposição consigo próprias e com os outros; têm predisposição para
METODOLOGIA
Phainomenon (fenômeno) significa aquilo que se mostra por si mesmo. Logos é entendido aqui
como estudo descritivo. Dessa maneira, fenomenologia significa estudo descritivo daquilo que
Husserl, apud Holanda (2001) propõe a partir dessa terminologia uma fenomenologia
fenomenologia é, então, entendida como uma ciência descritiva da realidade, eidética e empírica
concreta; é eidética e empírica por ser uma reflexão sobre as generalidades e tipicidade da
vivência, e por identificar, pela sua descrição, as essências pré-existentes. A coisa-mesma é aqui
experiência comum, pela reflexão, pelas significações da realidade e do mundo para o sujeito ator
mundo, uma vez que toda consciência tende para o mundo, assim como não existe objeto em si
independente de uma consciência que o perceba. O objeto é sempre para um sujeito que lhe
Por esse prisma, não é possível pensar no mundo, ou no homem, sem uma inter-relação.
78
experiências vivenciadas e aos significados que lhe são atribuídos pelo sujeito. Essa visão de
multiplicidade unificada por uma ordem, cujo sentido é a correspondência intencional à situação
existencial”.
Nesse sentido, o homem é concebido numa perspectiva dialética, que se realiza pela
intencionalidade. Não existe uma dicotomização entre “homem interior” e “mundo exterior”, a
de que o mundo não é pura exterioridade e o sujeito não é pura interioridade, mas a saída
recursos para abordar o fenômeno, aquilo que se manifesta por si mesmo, na totalidade da sua
essência.
Para tanto, Husserl (1965) propõe uma orientação objetiva para as coisas em si
mesmas, como se apresentam à intuição. Os fenômenos devem ser estudados na forma como se
manifestam à consciência, numa descrição intuitiva, seja como seu objeto ou como atos
intelectivos, volitivos, ou afetivos. Segundo Husserl,o único caminho para atingir a essência das
Para o autor, é somente pela fenomenologia que se pode alcançar uma objetividade
com o solo poiético do sentido, “com o não formulado que sustenta a formulação, com o implícito
que prepara a explicitação. Ela quer destacar as condições de inteligibilidade do próprio objeto da
investigação científica” (De Bruyne, Herman & De Shoutheete, 1977, citados por Holanda,
2001, p. 40).
pôr entre parêntese ou suspender daí também a sua designação de époché todos os dados,
convenções etc. a que se referem os atos, para volver aos atos mesmos. A redução
primeira, passa-se, mercê de uma técnica de variações livres das notas caracterizadoras,
mundo natural e todos os domínios que lhe estão ligados, como, por exemplo, o mundo
dos seres matemáticos, para alcançar o terreno firme da consciência pura em que o seu
por isso, significativas, entre fatos, para se chegar à compreensão singular e do conjunto de fatos.
Essa relação deve ser registrada como se desvela à consciência; num processamento objetivo que
distorções por interpretações subjetivas. Nesse sentido, afirma ter a fenomenologia uma
dimensão ética que é parte integrante do itinerário metodológico de redução proposto por
Husserl, para o qual distingue três momentos: redução teorética, eidética e transcendental.
pertencentes ao sujeito que investiga, por de meio de disciplina e ascese. A essa postura chama de
empatia, que é entrar no mundo interior do outro, na experiência do outro para colher princípios e
memórias, fragmentos da memória, palavras ditas, negadas e não ditas pelo silêncio, que se fixam
fenomenólogo deve, através de sua ascese, saber diferenciar a essência do objeto percebido,
de um phatos universal: ódio, instinto de morte, inveja, ciúme, cobiça, inferioridade, impotência,
81
importância desse momento é a descoberta desse universal, das essências, porque a humanidade,
inventamos a roda, ela nos foi dada pela inteligência antecedente e quando estamos frente a uma
roda sabemos pela tradição como foi feita e para que serve”. Esse momento de redução eidética é
fruto de uma análise de suspensão de todas as variáveis intervenientes para colher as constantes
do fato. As leis, por exemplo, não se produzem, se descobrem operantes nos fenômenos físicos,
Elas têm uma função prática nos processos do conhecimento humano, a função de
descobrindo, também, aos poucos a ordem, as leis da própria realidade. Nesse sentido, as
realidade; como tais devem ser usadas, e, como todo instrumento, submetidas à validação.
fato. Esse momento pode produzir novos eidos, universais e teorias sobre o fenômeno, uma vez
uma nova razão explicativa ou compreensiva do caso que se projeta como universal e, nesse
instrumento de pesquisa.
5.2. Procedimentos
Para a consecução deste trabalho, optou-se pelo estudo de caso realizado através do
singularidade.
modalidade de crime ao longo dos tempos e também pelas peculiaridades dos homicídios
83
narrados, uma vez que cada um deles leva a uma solução diversa em tema de punibilidade,
Código Penal.
exigidos para a aplicação do teste. De início, foi feita a aplicação padrão e, depois, feito o
inquérito tradicional. Neste, as pranchas foram apresentadas novamente aos sujeitos para que
atribuíssem um título e manifestassem um sentimento causado por cada uma. Cada encontro teve
uma duração aproximada de duas horas. A entrevista se processou na forma não padronizada,
com duração de duas horas. Somente o sujeito do Caso A foi entrevistado. O sujeito do Caso B,
embora tenha se submetido ao teste projetivo e se disponibilizado para a entrevista, não chegou a
ser entrevistado porque nas diversas vezes em que foi proposta a aplicação do instrumento,
sempre alegava estar sem condições emocionais para fazê-lo; sendo a sua história de vida
duração média de vinte horas. Inicialmente, foram selecionados os documentos, com posterior
84
5.3. Instrumentos
Caso A, sua percepção de si mesmo no mundo, intencionalidade, percepção dos fatos que se lhe
que permitiu uma avaliação geral dos casos em estudo (qualificação geral, denúncia, inquérito
da personalidade.
Arzeno (1995) acentua que o Rorschach é uma prática bem delimitada com aplicação
tanto no âmbito clínico, como também em outras áreas do conhecimento, dentre elas a forense, a
trabalhista, a educacional.
Segundo Vaz (1997), o Rorschach, embora seja um instrumento projetivo, permite avaliar
e qualitativas.
condições efetivas e emocionais; fornece-nos condições para vermos como está a pessoa
Santiago (1998), ao avaliar a prática do Rorschach, acentua que o instrumento não deve
ser utilizado somente como uma conclusão diagnóstica, mas também como uma intervenção que
possibilite a pessoa, uma vez dimensionada suas dificuldades, compreender como se relaciona
consigo, com o mundo e os objetos, bem como de se perceber como campo de possibilidades.
Por esse prisma, o diagnóstico é processual, busca a maneira de ser do sujeito no contexto
em que vive, em um dado momento. Desse modo, nem sempre será detectada uma patologia, a
personalidade pode ser normal, não exigindo intervenção ou terapia. O diagnóstico permite
identificar em que ponto desse processo se encontra o sujeito, detectando áreas de bloqueio ou de
válido para o sistema jurídico, na medida em que permite diagnosticar o criminoso em seus
responsabilidade de seus atos, o reconhecimento das normas e das regras sociais, para um
mesma;
psicológicas e morais;
delírios;
sociedade, do sistema. Em causa não está apenas a história antecedente do sujeito, a sua razão, as
representações de si e do mundo, mas a história presente, o impacto dele como sujeito com a
Para Petrelli (2003), a desvantagem dos testes que detectam níveis e modalidades de
agressividade é deixar tudo a cargo do sujeito, agravando a sua posição e isentando o sistema
indutor. A agressividade não é percebida no tempo e no espaço. O sujeito não é percebido num
passada, mas nas suas interações presentes com um sistema penal e carcerário violento,
do sujeito, mas Rorschach com o sistema jurídico penal. O sujeito reage a situações presentes e
não antecedentes, sendo necessário, portanto, integrar os dados Rorschach com os dados da
uma personalidade livre de contextos presentes, mas dentro de um contexto violento, frio e
impiedoso.
nova, delicada e arriscada situação de vida como reeducando do que para um serviço com
Participaram deste estudo dois (2) atores de crime de homicídio passional, em situação de
Os casos selecionados para compor este estudo foram definidos a partir de conclusões
passional.
89
atribuídas ao homicídio passional pelo sistema jurídico penal brasileiro e também pelas
peculiaridades dos crimes narrados, uma vez que cada um deles leva a uma solução penal
“curativa” diversa em dois atores distintos, permitindo, pois, um estudo comparado claro e direto
Assim, por meio do estudo dos casos tratados a seguir, pretende-se ilustrar as várias
facetas da personalidade dos sujeitos pesquisados, deixando entrever como não há conexão
aspectos, no mais das vezes, podem estar na raiz da criminogênese e na criminodinâmica dos
5.5.1. Caso A
Em 27 de dezembro de 1996, A.C.C., aos 40 anos de idade, matou sua ex-esposa, movido
pelo ciúme e pela impossibilidade de obter seu objeto de desejo. Foi processado, julgado e
segundo.
Em entrevista disse que seus pais são casados há 65 anos, que sempre manteve um
relacionamento melhor com a mãe, em razão de o pai ser muito fechado. Afirma que a família é
muito unida, apontando como único problema o ciúme que sente pela irmã, a ponto de segui-la
O relacionamento com as pessoas fora descrito como normal, sempre foi uma criança
com muitos amigos, assim como as formas de divertimento e de uso do tempo livre. Na escola,
Casou-se com a vítima aos 19 anos, em razão de a mesma ter ficado grávida. Argumenta
que, por vários anos, o matrimônio transcorreu em boa harmonia. Entretanto, quando a vítima
passou a trabalhar fora do lar, as brigas começaram, em razão das suas companhias que, em geral,
eram formadas por amigas solteiras ou separadas. Quanto aos filhos, alegou que o
relacionamento foi bom antes do homicídio e que nunca mais os viu depois do fato.
vítima foram casados por quase vinte anos, sendo a sua vida conjugal bastante tumultuada e
marcada por constantes desentendimentos e discussões, por ser A.C.C. muito ciumento e
possessivo. Essa situação perdurou até o mês de março de 1996, quando a vítima saiu do
apartamento em que moravam, levando consigo os filhos do casal, passando a residir na casa de
seus pais. A.C.C., inconformado pelo abandono da esposa, passou a visitá-la diariamente,
assediando-a e pressionando-a para que retornasse para a residência de ambos. Não suportando a
insistência de A.C.C., a vítima voltou a morar na mesma residência com ele, por causa dos filhos,
sexual. No início, A.C.C. aceitou as condições impostas pela vítima, tanto que vieram a se separar
Entretanto, passado algum tempo passou a exigir que a vítima mantivesse relações
sexuais com ele, tentando retomar o relacionamento conjugal, o que foi terminantemente
recusado por ela. O fato despertou a sua ira, e ele, a partir de então, começou a acusar a vitima de
manter relacionamento amoroso com outros homens, a ponto de contratar um detetive particular
para segui-la, mas sem nada provar. Mais tarde, a vítima iniciou um relacionamento amoroso
91
com seu instrutor de auto-escola, mantendo relações sexuais esporádicas. A.C.C., desconfiado
que a vítima estava mantendo relacionamento amoroso com outro homem, adquiriu um revólver
cemitério, onde lhe disse que preferia matá-la a ter que se separar dela e que, em breve, ela iria
morar no cemitério de vez, ocasião em que ainda a agrediu fisicamente, demonstrando clara
Na data do crime, a vítima solicitou a seu filho que a levasse ao Flamboyant Shopping
Center. A.C.C., que acabava de chegar a sua casa de táxi, passou a seguir a vítima, a certa
distância. A vítima se dirigiu até o estacionamento daquele centro de compras, onde era
Poucos minutos depois, A.C.C. pulou o muro do motel e, encontrando o quarto da vítima,
interpelou sobre o que estava acontecendo. Em seguida, calmamente, pediu que P.J.F. se retirasse
do local, para que pudesse resolver sua situação com a vítima. Ali permaneceram tempo razoável,
período tomaram cerveja, A.C.C. fumou alguns cigarros e, em momento algum, discutiu ou fez
ameaças à vítima, dissimulando sua real intenção de matá-la, logo após deixarem o quarto de
motel. A.C.C. e a vítima se dirigiram à portaria, para acertar a conta, ocasião em que ambos se
mostravam aparentemente calmos. Saíram do motel a pé, caminhando pela rua e, minutos depois,
distanciando-se cerca de um metro da vítima, que caminhava à sua frente, sem nada dizer sacou o
revólver que trazia consigo e, sem lhe dar qualquer chance de defesa, alvejou-a covardemente
Interrogado em juízo acerca dos acontecimentos no dia do crime, A.C.C. recordou-se com
claro que o fato delitivo decorreu da rejeição da vítima em manter com ele um relacionamento
92
“palhaço”, “veado”, dizendo que nunca foi homem, que não gostava mais dele, solicitando que se
afastasse de sua vida, que seu amante “era mais gostoso”, momento em que foi empurrado e
agredido pela vítima com um tapa no rosto; a partir de então não viu mais nada, perdeu a cabeça e
a matou.
psicodiagnóstico que atribuiu como causa do homicídio surto psicótico isolado e a de homicídio
privilegiado por perturbação mental, provocada por violenta paixão, seguida de injusta
provocação da vítima.
O laudo apresentado por A.C.C foi contraposto por perícia judicial que afastou o
A acusação repeliu a tese de homicídio privilegiado, aduzindo que o criminoso agiu com
frieza e premeditação para executar a vítima de forma covarde e com recursos que
impossibilitaram a sua defesa e a descoberta do crime. Pediu a sua condenação nos termos do art.
privilégio. O réu foi condenado nas sanções do art. 121, parágrafo 2º, IV, a 14 (quatorze) anos e
Interposto recurso ao Tribunal de Justiça de Goiás, a sentença foi mantida por seus
fundamentos.
aplicação do teste, apresentou baixa produtividade, porém suas respostas foram de boa qualidade,
dentro dos parâmetros de normalidade exigidos pelo teste. A.C.C. se desvelou em Rorschach
93
com uma descrição pormenorizada de detalhes, do que emerge, entre outras coisas, uma
estrutura cognitiva íntegra, capaz de identificar, elaborar e sintetizar fatos e eventos da realidade,
O teste revela também uma pessoa extremamente rígida, formal, a ponto de perder a
afetivo.
Não apresenta indicativos de ter sofrido traumas que resultassem em marcas profundas,
Possui energia de vida, intencionalidade em pôr em prática seus projetos. Boas estruturas
cognitivas para lidar com auto-imagem, mas sua construção afetiva é carregada de valores
do mal que fez. Tem medo de enfrentar um juízo sobre si mesmo. Existem setores da experiência
inexplorados, que não quer explorar e que, se explorados, impediriam o crime passional.
Nota-se, então, uma inversão de valores, bem como uma dificuldade de lidar com
aspectos de sua afetividade, com suas emoções. Consegue se manter bem, desde que esteja sob
Apresenta uma visão não integral da sexualidade. Não integra de forma satisfatória a
autêntico. Apresenta uma dimensão libidinosa racionalizada, determinada, o que revela controle,
94
posse sobre o objeto de desejo, o corpo da mulher, sua genitalidade, a sua sensualidade. Não
valoriza a mulher pela sua inteligência e qualidades. A mulher é para ele um objeto da libido.
Desvela uma atenção seletiva e uma desatenção sobre a integralidade da mulher. Aspectos
estruturais importantes de uma situação são omitidos. Este apego a determinadas dimensões
pode explicar, em parte, o delito. O crime passional ocorre quando o indivíduo desconsidera
prática do crime passional. Se A.C.C. tivesse pensado em todas as conseqüências, talvez não
A.C.C. reduziu a mulher à sua genitalidade. Ele não a via como um ser humano, que tem
mulher, desrespeitando suas outras exigências. Transformou a mulher em objeto sexual. Não
valorizava a mulher por outras características e qualidades. E, ao lhe ser negado o objeto de
5.5.1.1. Conclusões
projeto, um plano de vida, uma ordem técnica perversa, que aqui não se vê. O crime passional se
No caso, a capacidade de entender e de dirigir suas ações no momento dos fatos, não
estava comprometida. A.C.C. agiu com racionalidade intencional, controle, deliberação, frieza e
decidiu e executou a vítima, com emprego de recurso que impossibilitou sua defesa. Portanto,
não praticou o crime sob o domínio de violenta emoção. A paixão que moveu o crime decorreu do
sentimento de ódio, vingança, possessividade, ciúme e frustração pela perda do seu objeto de
desejo. Ao reagir a sangue frio, como se estivesse praticando uma ação normal, demonstrou que
não sentiu a provocação da vítima, que não houve mácula à sua honra interior. Mesmo porque os
motivos que levam ao crime passional não guardam relação com o sentimento de honra. A
violenta emoção somente configura o privilégio se a reação do agente ocorrer logo em seguida à
preparado para matar, afasta o privilégio. Por outro lado, o desejo de rompimento do
5.5.2. Caso B
vítima, C.S.L., em um bar na Av. T- 63, Setor Nova Suíça, Goiânia - GO, foi ao seu encontro,
assustou-a e, em seguida, passou a desferir-lhe vários golpes de faca, provocando-lhe lesões que
J.P.G e C.S.L. eram amasiados e estavam separados por ele haver agredido fisicamente a
sobrinha da vítima que morava com eles. Após a agressão, a vítima teria falado a J.P.G. que ele não
amava os seus filhos, dizendo que não era o pai biológico, solicitando que fosse embora de sua
Após a separação, encontrou com a vítima e se ofereceu para voltar a morar com ela,
mesmo sabendo que o traía. A vítima não aceitou a proposta. Ante a rejeição, e a partir de então,
passou a andar armado com uma faca do tipo peixeira, com o escopo de vingar-se da vítima.
No dia do delito, J.P.G. passava perto de um bar quando avistou a vítima e foi ao seu
encontro para uma nova tentativa de reconciliação, mas foi humilhado por ela. A vítima teria dito
que não queria se reconciliar, que tinha nojo dele, solicitando que se afastasse de sua vida. Houve
uma calorosa discussão e, em seguida , J.P.G. passou a desferir-lhe golpes de faca e, vendo-a
J.P.G. foi condenado nas sanções do art. 121, “caput”, do Código Penal, a dez anos e dois
Baixo, Município de Ouvidor-GO, utilizando uma corda, asfixiou a sua primeira esposa
97
Consta, na denúncia, que J.P.G. e a vítima saíram juntos da fazenda onde moravam,
montados em um cavalo e que ao retornarem cometeu o delito. Logo após, foi visto sozinho se
comportando de maneira estranha, próximo ao local onde havia deixado o corpo da vítima.
pelo cavalo que os transportava e que a asfixia teria sido provocada por uma “gravata” para evitar
a queda.
vítima, que evidenciaram tratar-se de asfixia mecânica. Ainda as testemunhas que estiveram no
local, logo após o crime, confirmaram a existência de sinais de luta nas imediações de uma grota
onde a vítima foi enforcada. Somam-se aos fatos as brigas anteriores do casal, a suspeita de
traição por parte da vítima, o medo que a mesma tinha do criminoso nos dias antes do crime,
A tese de homicídio culposo defendida pela defesa foi afastada. J.P.G. foi condenado pelo
crime a treze anos, sete meses e treze dias de reclusão, em regime fechado, nos termos do art. 121,
parágrafo 2º, III (4ª figura), c/c o art. 61, II, “e” (última figura) e art. 64, do Código Penal.
J.P.G. foi preso em 8 de maio de 1997 na Casa de Prisão Provisória e transferido para o
1999, onde ficou recolhido até 10 de agosto de 2001, quando foi deferido o pedido de progressão
de maneira ordenada. Demonstrou ser dotado de memória precisa sobre fatos passados e
98
presentes. Foi capaz de lembrar todo o acontecido nos dois eventos criminosos, não apenas como
uma sucessão de fatos, mas também fornecendo uma descrição de suas motivações, esforçando-
se em esclarecer os estados de ânimo que o haviam levado aos delitos. Desde o primeiro encontro,
admitiu ter matado as vítimas. Na prática, a versão dos fatos, coincide com aquela que forneceu
junto com os pais e os irmãos. De uma família de nove irmãos, era o mais novo. Enfatizava
seus familiares. Iniciou seus estudos aos dez anos, concluiu apenas até a 3ª série do primário,
em família.
Aos 22 anos de idade, conheceu G.M.A.P (a primeira esposa), com quem se casou e teve 2
filhos. Por ser apegado aos seus pais continuou a residir próximo deles. Três anos após, seu pai
vendeu a fazenda e o reeducando resolveu continuar vivendo ali com a sua família por três anos.
Constatando que a esposa o estava traindo com o gerente da fazenda, mudaram-se para outra
cidade.
Em 1989, após ter cometido o crime, foi morar com seus pais, quando, então, conheceu
C.S.L (sua amásia), com quem namorou dois meses e, logo em seguida, passaram a viver juntos.
Ela era divorciada e tinha dois filhos que moravam com a avó.
J.P.G. e C.S.L. mudaram-se para Goiânia, em busca de uma vida melhor. Alega que
durante seis meses viveram em harmonia, depois a vítima começou a traí-lo com um primo. Em
consistente em observação clínica e teste gráfico: H.T.P e Teste das Cores de Lüscher, da qual
emergiram algumas considerações. Durante os testes, J.P.G. mostrou causar impressão favorável
99
modo a poder verificar se estava obtendo o êxito esperado e como os outros estavam reagindo;
isto o fazia sentir que estava controlando a situação. Para esse fim, utilizou tática inteligente.
remediá-la; irado e descontente, em razão de pôr em dúvida sua capacidade de alcançar suas
metas, mostra-se frustrado quase a ponto de chegar à depressão nervosa. Quer escapar, sentir-se
feitas aos seus próprios recursos. Esta sensação de incapacidade leva-o à agitação e intensa
angústia, fazendo-o fugir para um mundo ilusório, onde as coisas estejam mais ao seu gosto. Isso
procura transpor a lacuna que o separa das outras pessoas. É impulsivo e irritável. Seus desejos e
as ações a ele relacionadas são de suma importância, dando pouca atenção às suas conseqüências.
Egocêntrico, ofende-se com facilidade, o que o deixa bastante isolado em suas ligações.
Existe uma megalomania, um sentimento incoerente de plus valia. Em razão disso, quer
se defender, o que justifica qualquer ato criminoso, que, depois, é interpretado como legítima
defesa. Cria um imaginário, uma honorabilidade de perfectibilidade, que, uma vez desfeitos pela
honra.
Segundo Petrelli (2003), a única atenuante neste caso poderia ser um resíduo de uma
por outro lado, na execução dos dois homicídios, houve um planejamento, que manifesta
mecanismos psíquicos em longo prazo (como carregar uma peixeira, planejar uma saída a
do sexo feminino denuncia ser acometido por uma fobia genital feminina primária, provocada
inconscientes da personalidade.
obter o respeito inerente a qualquer cidadão. Deseja aproveitar-se de toda oportunidade possível,
sem ter que se sujeitar a limitações ou restrições. Desejo de controlar o próprio destino.
Rorschach, do qual emergiu uma potencialidade muito baixa, que indica patologias. E, embora
apresente uma estrutura cognitiva preservada, tem uma visão desvitalizada, fragmentada do ser
humano. Para ele não existem pessoas, mas segmentos, órgãos, partes e se gratifica com isso. Há
perda de humanidade, pobreza filogenética, cultural, ética. É um ser primitivo, destruidor, com
permanente periculosidade. Portanto, não poderia ser agraciado com a medida de progressão do
J.P.G. não reconhece a alteridade, o outro, a si mesmo, o que dificulta estabelecer uma
desenvolveu satisfatoriamente a sua afetividade. Não percebe o outro, não o reconhece como
os seus projetos, falta de motivação, sentimento de inferioridade, um bloqueio vital. Isso pode
forte.
Não apresenta uma sexualidade bem integrada e estruturada. Tem dificuldades para
Tem boa noção das normas e das regras sociais, mas as transgride a serviço de suas
satisfações pessoais. É uma pessoa que aplica a inteligência para realizar as suas fantasias
perversas, imaturas.
5.5.2.1. Conclusões
realidade, da discricionariedade do bem e do mal são utilizadas a serviço das suas paixões, dos
J.P.G. não matou ambas as vítimas em estado emocional e passional, tampouco por acidente.
Matou suas mulheres por ser um perverso, um degradado ético. É um criminoso sujeito a
cometer crime não somente em função de paixões, mas por qualquer provocação. É um assassino
que mata por matar. Uma vez posta em jogo a vingança, a cupidez insaciável, a vaidade ferida, os
seus instintos cruéis de homem primitivo afloram e o despojam do pudor e da compaixão. Matar
torna-se uma imperiosa necessidade que não mais pode dominar. É um primitivo ético e cultural.
É um sujeito que tem controle sobre a realidade, mas dispõe de mecanismos a médio e a longo
cognitivo do bem e do mal, mas que não detém, não contém, não inibe o primitivismo ético. Tais
condições não configuram enfermidade orgânica, mas ética, justificando a afirmação de Kurt
Schneider (1954) de que a psicopatia se torna o grande escândalo para a Psiquiatria, definindo-a
102
como síndrome da ausência ética, administrada por sua própria lógica. Portanto, é imputável, do
entender e de querer.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
103
CONSIDERAÇÕES FINAIS
manifestadas pelos mais variáveis fundamentos, todas, entretanto, mutatis mutandi, calcadas no
Basta uma alteração no psiquismo, provida por estados afetivos, distúrbios psicóticos,
Essa tendência revela que a agressão destrutiva é um potencial humano enraizado nas
de como os seres humanos desenvolvem a percepção do eu e do outro, bem como do que sentem
por eles mesmos e pelos outros. Adentrar as suas razões explicativas, correlações, situações
humana. Por esse prisma, o crime deve ser enfocado como fenômeno real, humano. E, como tal,
pode ter uma motivação etiológica, causal e fatorial diversa, que deve ser apreendida e avaliada
único, como cada pessoa, com sua história, é particular; portanto, não pode ser avaliado de forma
sistemática, esquemática, despida da sua relação com a realidade. Como bem asseverou Thoreau
(1986, p. 175), “o mais sábio dos homens não se dedica a pregar doutrinas; ele não tem uma visão
esquematizada; ao olhar para o céu não vê as vigas do telhado nem as teias das aranhas. Ele
não podem ser usados como componentes para aplicação do privilégio disposto no art. 121,
104
parágrafo 1º do Código Penal ou como atenuante genérica (art. 65, III, c) ou como circunstância
especial de diminuição da pena (art. 28, I), senão para explicar o delito.
O homicida passional não mata por amor, por honra ou por acometimento de um estado
justifica a violência. O homicida passional considera o objeto de amor como objeto de posse,
expressivo de relações que não atingiram a maturidade do eu e tu, mas que ficaram nos níveis
primários do eu isso (Martin Buber, 1957), nos quais o parceiro potencialmente tu é reificado,
não guardam relação adequada à previsão legal. No homicídio passional, o sujeito mantém
operacionalização do crime mantém-se vigil e atento, dá-se conta da situação, tem noção do
vontade de acordo com o direito (imputabilidade), compreender a ilicitude de sua conduta e agir
Nos dois casos estudados, houve sempre uma motivação, uma debilidade, mas que não se
de pena; revelaram a uma análise mais atenta mentes homicidas, sem comprometimento da
dos fatos homicidas considerados passionais. A teoria da violenta emoção como fator de
diminuição ou de atenuação da pena no crime de homicídio deve ser aplicada in extremis, a fim
de se evitar que sua utilização legitime o homicídio passional, dando cobertura a uma
intencionalidade homicida.
médicos, psiquiátricos, psicológicos, cujas informações não sejam utilizadas apenas para
enquanto homem, para caminhos recuperativos, por meio de penas alternativas, finalizadas, não
para a punição simplesmente, mas para a sua reintegração à vida, à sociedade. Aplicando aos
criminosos projetos desburocratizantes, que realmente criem situações reeducativas, para que o
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