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I Encontro Internacional TIC e Educação

Estilos de Liderança em
Comunidades de Prática Online
MARIA IVONE GASPAR, MÁRIO SANTOS
Universidade Aberta
migaspar@univ-ab.pt, mjasantos@ymail.com

RESUMO: Neste artigo sintetizam-se as impressões distinção entre estes dois conceitos e respectiva
preliminares duma investigação educacional ainda caracterização. Terminado este enquadramento
em curso, num contexto de Ensino a Distância na teórico, passaremos à contextualização da
modalidade online, na qual se estudam alguns Comunidade de Prática Online utilizada no
aspectos relacionados com o papel da liderança em
estudo, descrevendo sumariamente a
Comunidades de Prática Online, para tentar
determinar a existência de padrões ao nível da metodologia utilizada no estudo, assim como as
quantidade e qualidade das interacções obtidas, de observações efectuadas e a análise preliminar
forma a correlacioná-los com os vários estilos de dos dados obtidos na mesma. Por último, serão
liderança. tecidas algumas considerações finais.
Palavras-chave: Colaboração, Comunicação,
Comunidades de prática online
Comunidades de Prática Online, Estilos de
Liderança, Interacção Lave e Wenger (1991) definem
ABSTRACT: This article includes the preliminary Comunidade de Prática como "um conjunto de
comments of an educational research, still ongoing, relações entre pessoas, actividade e mundo,
in a context of Online Distance Learning, with the estendido no tempo e em ligação com outras
purpose of studying some aspects related with the Comunidades de Prática (…), [que] implica a
role of leadership at Online Communities of participação num sistema de actividades,
Practice, trying to determine the existence of acerca das quais os participantes partilham
patterns regarding the quantity and quality levels of percepções relativamente ao que fazem e ao
the observed interactions, in order to correlate them que isso representa nas suas vidas e para as
with the several leadership styles.
suas comunidades" (p. 98).
Keywords: Collaboration, Communication,
Interaction, Leadership Styles, Online Communities Etienne Wenger (1998) caracteriza as
of Practice Comunidades de Prática através de três
dimensões: natureza, modo de funcionamento e
finalidade. Quanto à sua natureza, têm uma
ESTILOS DE LIDERANÇA EM COMUNIDADES actividade conjunta, contínua e
DE PRÁTICA ONLINE conscientemente alimentada e renegociada
Este artigo sintetiza as primeiras pelos seus membros. Quanto ao modo de
impressões relativas aos estádios iniciais duma funcionamento, verifica-se que a sua actividade
investigação educacional ainda em curso, cujo se mantém devido ao empenhamento de todas
propósito é o estudo de aspectos relacionados as partes envolvidas, acabando por estabelecer
com o papel da liderança em Comunidades de elos de ligação, construindo uma identidade
Prática Online, em particular aqueles que dizem social. Quanto à sua finalidade, visam o
respeito aos estilos de liderança que nelas se desenvolvimento de um reportório de recursos
podem observar. comuns também partilhados, progressivamente
desenvolvidos pelos indivíduos que constituem
Para o efeito, começaremos por efectuar essa comunidade e que, de modo activo, nela
uma breve fundamentação teórica relativamente participam.
ao conceito de Comunidade de Prática Online, a
que se seguirá uma abordagem sumária aos Uma Comunidade de Prática pode ser uma
tipos e estilos de liderança, orientada para a “comunidade que aprende”, na medida em que

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não se trata apenas de um agregado de pessoas processo de desenvolvimento, emergirá alguma


definido por algumas características, mas forma de liderança. Esta ocorrência coloca
também de um conjunto de pessoas que desafios acrescidos no caso de Comunidades de
aprendem, constroem e fazem a gestão do Prática Virtuais ou Online, face à separação
conhecimento (Wenger, 1998), acabando por física entre os seus membros, já que muitas das
desenvolver uma identidade própria. No habituais e tradicionais competências de
entanto, a natureza da aprendizagem que se liderança aplicadas em equipas presenciais,
pode desenvolver numa Comunidade de Prática podem vir a revelar-se insuficientes para
é informal, através de uma acção de natureza motivar, coordenar e desenvolver pessoas em
não estruturada e cujos objectivos emergem contexto online.
casuisticamente, estando sujeitos a uma
A liderança assenta, em grande medida, na
renegociação contínua entre os respectivos
comunicação e no pressuposto de que saber
membros, ao contrário1 daquilo que se passa
liderar é ter a aptidão para influenciar os outros
numa Comunidade de Aprendizagem
a atingir um objectivo comum, conseguindo o
(aprendizagem formal, acção estruturada e
seu envolvimento no processo de resolução de
objectivos previamente definidos, visando a sua
problemas e tomada de decisão. A mestria de
prossecução).
liderar está na capacidade do líder em conseguir
À medida que uma Comunidade de Prática a adesão da sua comunidade a esse processo de
se desenvolve (FIGURA I), é fundamental que envolvimento.
exista2: (i) partilha de interesses, de informação
É frequente o uso indistinto das expressões
e de conhecimentos; (ii) definição e
tipos de liderança e estilos de liderança, mas na
consciencialização dos objectivos que
realidade são conceitos diferentes.
prosseguem; (iii) atitude dialógica; (iv)
Relativamente aos tipos de liderança, existem,
sentimento de pertença à comunidade e (v)
essencialmente, dois: a liderança transaccional e
identificação, através do compromisso mútuo.
a liderança transformacional. A primeira é um
Figura I. Fases do ciclo de vida de uma Comunidade
processo de influência baseado na troca, em que
de Prática ao longo do tempo (Wenger et al, o líder recorre à recompensa do mérito e da
2002:69) qualidade do desempenho dos seus
colaboradores, enquanto a segunda se baseia na
inspiração dos membros da equipa, em termos
de empenhamento e de confiança, e em que o
líder dá o exemplo e adopta uma liderança
visionária e respeitadora, conseguindo que os
interesses da equipa como um todo se tornem
mais importantes que os interesses individuais
de cada um dos seus membros.
Já quanto aos estilos de liderança, por
exemplo, Goleman et al (2003) refere seis
Uma Comunidade de Prática receberá a estilos básicos de liderança: visionário
designação de “virtual” ou “online” sempre que (authoritative), conselheiro (coaching),
os seus membros utilizem sistemas de relacional (affiliative), democrático
informação para partilhar informação entre si, (democratic), pressionador ou coercivo
independentemente de poderem estar dispersos (coercive) e dirigista (pacesetting).
em termos de localização física. Para Blanchard (2007), cada estilo de
liderança resulta de uma combinação entre
Tipos e estilos de liderança comportamento de direcção "directive
Tal como acontece na vida de outros behaviour" e comportamento de apoio
grupos, no seu processo de evolução rumo à "supportive behaviour". O primeiro
equipa, é normal assumir que também nas corresponde a dizer claramente às pessoas o que
Comunidades de Prática, a certo ponto do seu fazer, como fazer, onde fazer, quando fazer e
supervisionar de perto a sua performance,
1
Ainda que a Comunidade de Prática se possa constituir
enquanto o segundo corresponde a ouvir as
como um “estágio" ou uma “antecâmara” para a pessoas, dar-lhes apoio e encorajá-las no seu
Comunidade de Aprendizagem. esforço, permitindo-lhes e convidando ao seu
2
Tal como acontece na Comunidade de Aprendizagem.

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envolvimento na resolução de problemas e na entre os membros da Comunidade de Prática


tomada de decisões. De acordo com estas Online traduzir-se-ão num maior envolvimento
combinações surge uma outra classificação com dos mesmos, materializado através de práticas
quatro estilos de liderança (FIGURA II): direcção colaborativas e, consequentemente, na criação
(directing), coaching, apoio (supporting) e de condições mais favoráveis ao sucesso da
delegação (delegating). comunidade, em termos da sua performance.

Figura II. Estilos de Liderança, segundo Blanchard


Face às diferenças verificadas entre os
(adaptado de Blanchard, 2007) vários estilos de liderança, não será descabido
assumir que nem todos promoverão de igual
modo a interacção entre os membros da
Comunidade de Prática Online.
Enquadrados por estes pressupostos, o
presente estudo seleccionou como universo-
alvo uma turma de Mestrado com 23 alunos, em
regime de Ensino a Distância Online e
utilizando uma plataforma de e-Learning
(MOODLE) como interface no seu processo de
comunicação assíncrona.
Ao longo dum semestre, monitorizaram-se
as actividades de grupo desses alunos, em
grupos sem líderes, chefes ou coordenadores
previamente nomeados pela docente da
Unidade Curricular e que mantiveram a sua
constituição durante o período pelo qual durou
a observação.
Não existe um estilo de liderança sobre o
qual se possa afirmar que é o mais adequado ou A observação registou5 todas as
o melhor e, por isso, o bom líder é aquele que comunicações efectuadas pelos vários alunos
sabe adaptar, em permanência, o seu estilo de nos fóruns de mensagens, incluindo o emissor e
liderança à situação, às pessoas que lidera e ao o receptor de cada uma, determinando assim os
estádio de evolução da sua comunidade, sem mais e os menos participativos, assim como os
perder de vista os objectivos a atingir pela “fluxos de comunicação” mais ou menos
comunidade e sem renegar a sua própria frequentes, correspondentes, respectivamente, a
personalidade. De acordo com esta abordagem, níveis maiores ou menores de interacção.
correspondente à preconizada pelo modelo de
Liderança Situacional segundo Hersey & Observações efectuadas e análise preliminar
Blanchard3, é possível que diferentes estilos de dos dados obtidos
liderança possam ser igualmente eficazes. Efectuada a recolha dos dados, começou
por se efectuar uma análise quantitativa dos
Metodologia utilizada no estudo mesmos6, relativamente a cada uma das quatro
Com base na fundamentação teórica Comunidades de Prática Online,
antecedente, pensamos poder afirmar, com um correspondentes aos Grupos com designação de
razoável grau de confiança, que, na vida duma A a D, convertendo a informação numérica em
Comunidade de Prática Online, a liderança flow charts traduzindo todos os fluxos de
acaba por ocorrer de forma natural, mais ou comunicação registados, em termos de origem,
menos explícita, revelando-se essencial para o destino e quantidade, resultando num conjunto
sucesso das suas actividades. O estilo de de gráficos (FIGURAS III, IV, V E VI) que
liderança adoptado por quem lidera terá efeito materializam o nível de interacção em cada
ao nível da participação dos membros da comunidade, assim como os respectivos
comunidade4 nas suas actividades. Em intervenientes.
princípio, níveis mais elevados de interacção

3 5
http://www.businessballs.com/tuckmanformingstormingn Quantitativa e qualitativamente.
6
ormingperforming.htm. Nesta fase do estudo, ainda não se completou a análise
4
Medida através do nível de interacção verificado. qualitativa (de conteúdo) das mensagens registadas.

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Como se pode verificar pelas diferentes Figura VI. Gráfico de Interacção do Grupo D
configurações e “pesos” das interacções
obtidas, será razoável admitir que tal decorre de
diferentes graus de envolvimento dos membros
de cada uma das várias Comunidades de Prática
Online e que isso é uma função dos diferentes
estilos de liderança adoptados em cada uma.

Figura III. Gráfico de Interacção do Grupo A

A fase seguinte do estudo passará por


interpretar estes gráficos de interacção com
recurso à informação qualitativa (análise de
conteúdo) recolhida, para, em conjunto com a
informação quantitativa, determinar a
existência, em cada Comunidade de Prática
Online, de padrões de interacção que possam
ser associados a um ou mais estilos de
Figura IV. Gráfico de Interacção do Grupo B liderança. Por outro lado, ir-se-á tentar perceber
se, ao longo da vida da comunidade, existiu ou
não alternância na liderança e se o estilo de
liderança de cada líder se manteve
independentemente das situações e da evolução
da comunidade ou, se pelo contrário, se ajustou
a estas variáveis.

Considerações finais
O líder duma Comunidade de Prática
Online deverá estar preparado para usar vários
"chapéus", bem como adoptar algumas das
seguintes práticas: (i) quando necessário,
reajustar a orientação seguida pela comunidade
e respectivos níveis de energia; (ii) concentrar-
se na performance e nos resultados em vez dos
Figura V. Gráfico de Interacção do Grupo C processos para o obter; (iii) encorajar os
membros da comunidade a partilhar as suas
ideias e sugestões; (iv) assegurar que todos os
membros da comunidade estão identificados
com as tarefas a executar e com os prazos de
execução; (v) partilhar a liderança, quando
apropriado, apesar de manter o controlo global;
(vi) fazer o trabalho de bastidores necessário
para assegurar que a comunidade terá todos os
recursos necessários para o seu desempenho;
(vii) manter regularidade nos contactos com os
elementos da comunidade, para se certificar
acerca dos seus contributos e performance,
assim como para avaliar emocionalmente o
modo se sente cada um dos seus membros.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BLANCHARD, K. (2007). Um nível superior
de liderança. Lisboa: Actual Editora.
GOLEMAN, D. (2000). "Leadership That Gets
Results", in Harvard Business Review,
March-April 2000. Boston: Harvard
Business School. pp. 76-91.
GOLEMAN, D.; BOYATZIS, R.; McKEE, A.
(2003). Os Novos Líderes: A Inteligência
Emocional nas Organizações (2.ª Edição).
Lisboa: Gradiva. pp. 75-102.
LAVE, J. & WENGER, E. (1991). Situated
learning: legitimate peripheral
participation. New York: Cambridge
University Press.
WENGER, E. (1998). Communities of practice:
learning, meaning, and identity. New
York: Cambridge University Press.
WENGER, E.; McDERMOTT, R.; SNYDER,
W. (2002). Cultivating Communities of
Practice. Boston: Harvard Business School
Press.

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