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Junguiana

v.35-1, p.5-19

Ecologia da alma: a natureza na


obra científica de Carl Gustav Jung

Alisson José Oliveira Duarte*

Resumo
Ao estudar a obra de Carl Gustav Jung, bem Palavras-chave
como seu percurso biográfico, é notável a qual- Ecologia humana,
quer pesquisador que a natureza representou C. G. Jung,
natureza.
inspiração no processo de constituição de sua
cosmovisão científica e pessoal. Nesse sentido,
buscou-se, com esta pesquisa, apontar a rele-
vância da natureza para a formulação da psico-
logia analítica, resgatando, nas obras completas
do autor (34 volumes) citações em que o termo
“natureza” foi utilizado para sustentar conceitos
de sua teoria. Os achados (137 parágrafos) apon-
tam que o autor concebia o funcionamento psí-
quico de maneira análoga ao funcionamento dos
sistemas naturais. „

* Psicólogo, especialista em psicanálise clínica e mestre em educa-


ção pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM, Uberaba
(Minas Gerais).
E-mail: <alisson-duarte@hotmail.com>.

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da Sociedade
da Sociedade
Brasileira
Brasileira
de Psicologia
de Psicologia
Analítica,
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Ecologia da alma: a natureza na obra científica de Carl Gustav Jung

1. Introdução uma combinação única” de seus elementos uni-


O estudo da obra de Carl Gustav Jung nos versais (JUNG, 2011, v. 7/2, par. 267).
permite observar a peculiaridade de um autor que É importante lembrar que a trajetória científi-
utilizou, em sua teoria, inúmeras observações da ca de Jung foi fortemente marcada pelo roman-
natureza para fundamentar tendências do psi- tismo de Goethe e sua profunda contemplação
quismo humano. Diversas passagens de seus es- do meio natural. Para Goethe, nenhum cientista
critos teóricos e biográficos revelam o caráter pode alcançar as verdades da natureza desinte-
“ecológico” de sua obra. Jung mantinha profun- grando-se dela, aplicando abstrações frias para
do respeito pela natureza e conexão com ela e compreendê-la ou registrando o mundo exterior
falou intensamente, em sua obra, sobre a neces- de maneira mecanicista (TARNAS, 2000).
sidade do homem de se reencontrar com a origi- Para Pinheiro (1997), a psicologia deve parti-
nalidade primária de seu próprio ser: cipar das discussões e lançar propostas para a
crise ambiental. Isso porque, segundo ele, não
[...] a pura natureza está dentro de vós. E se existem problemas isoladamente ambientais,
conhecerdes a pura natureza, que é vosso ver- mas humano-ambientais. Nesse sentido, esta
dadeiro ser, liberto de todo egoísmo perverso, pesquisa também procura fomentar a busca por
então conhecereis a Deus; pois a divindade está respostas de como a psicologia analítica pode
oculta dentro da pura natureza, tal como a noz contribuir para o entendimento da ecologia na
no envoltório da casca. (JUNG, 2011, v. 16/2, interioridade do homem, promovendo sua reco-
par. 508). nexão com o meio e um profundo sentimento de
ética e integração com a vida.
De acordo com o autor, “não devemos suge- A crise ambiental reflete o estado da psique
rir à natureza o que fazer, se quisermos obser- humana. Tudo o que pertence à realidade exter-
var seu comportamento espontâneo” (JUNG, na ocupa em nós um lugar interno: o sol, a lua, a
2011, v. 7/2, p. 10). Ele defendia a livre expres- água, as plantas, os animais, tudo vive em nós,
são do psiquismo e o rompimento com tudo na forma de arquétipos que povoam nosso mun-
aquilo que condiciona e aliena o comportamen- do intrapsíquico por meio de imagens, símbo-
to natural. Em outra passagem, afirmou que “a los e valores.
vida natural é o solo em que se nutre a alma” Em uma entrevista realizada por McGuire e
(JUNG, 2011, v. 8/2, par. 800). E sobre o incons- Hull (1997, p. 189), Jung descreveu a ligação en-
ciente, declarou: “o inconsciente é natureza que tre o homem e o meio ambiente a partir dos se-
nunca se engana: só nós nos enganamos” (JUNG, guintes termos:
2011, v. 5, par. 95).
Por meio da natureza, Jung fundamentou o Todos nós precisamos de alimento para a psi-
caráter individual e coletivo da mente humana. que, é impossível encontrar esse alimento nas
Para ele, o homem, em sua jornada de autoco- habitações urbanas, sem uma única mancha
nhecimento, se torna completo na medida em de verde ou árvore em flor; necessitamos de
que consegue manter o equilíbrio entre nature- um relacionamento com a natureza; precisamos
za coletiva e natureza individual, ou seja, “a sin- projetar-nos nas coisas que nos cercam; o meu
gularidade de um indivíduo não deve ser com- eu não está confinado no corpo; estende-se a
preendida como uma estranheza de sua subs- todas as coisas que fiz e a todas as coisas à
tância ou de suas componentes, mas sim como minha volta, sem estas coisas não seria eu

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mesmo, não seria um ser humano. Tudo que me sistema natural. “Se tivermos a natureza como
rodeia é parte de mim. guia, nunca trilharemos caminhos errados” (JUNG,
2011, v. 10/3, par. 34). A esse respeito, o autor
A cisão vivida por nós pode ser atestada ob- introduziu em sua teoria o conceito de persona,
servando-se a maneira pela qual separamos o que definia como um princípio de adaptação que
espaço interno do espaço externo. O mundo pró- tem por objetivo ocultar a verdadeira natureza
prio é o que importa: corpo, casa e família. As do indivíduo – uma espécie de máscara, funda-
ruas, avenidas, rios, praias, animais e plantas mental para a adaptação social, bem como para
são vivenciados como se não fossem da nossa a constituição do processo cultural.
alçada, como se ninguém fosse por eles respon-
sável e como se não fossem extensão de nós Como é sabido o processo cultural consiste na
mesmos. repressão progressiva do que há de animal no
De acordo com Jung (2011, v. 8/2, par. 702), homem: é um processo de domesticação que
“a melhor maneira de compreender o inconscien- não pode ser levado a efeito sem que se insurja
te é considerá-lo como um órgão natural dotado a natureza animal sedenta de liberdade. (JUNG,
de uma energia criadora específica”. Diferente de 2011, v. 7/1, par. 17).
Sigmund Freud, Jung não admitia o inconsciente
apenas como um reservatório de conteúdos re- De acordo com Jung, a neurose surge com o
primidos pela moralidade social. Pelo contrá- processo de domesticação social. Para ele, “o
rio, ressaltava a capacidade dinâmica do incons- neurótico é apenas um caso específico de pes-
ciente de criar conteúdos e o concebia como soa humana tentando conciliar dentro de si na-
base natural de todos os conteúdos arcaicos da tureza e cultura” (JUNG, 2011, v. 7/1, par. 16). No
humanidade (sentimentos, instintos, imagens entanto, o autor reconhecia a necessidade do
e mitos). homem de viver em sociedade; não prezava o
Para ele, “a natureza reflete tudo que existe isolamento social nem a completa massificação,
em nosso inconsciente” (JUNG, 2011, v. 5, par. sugerindo que o processo de individuação ou de
170), como se o funcionamento do sistema psí- realização da totalidade do ser acontecesse como
quico humano fosse diretamente equivalente ou consequência do equilíbrio entre seus aspectos
idêntico ao funcionamento ecológico (dinâmico, naturais e sociais. Ou seja, procura-se, e com cer-
potencial, sistêmico, homeostático, criador e teza sempre se há de procurar, o caminho do meio,
destruidor). um ponto em que os opostos se unam.
Em uma de suas passagens mais significa-
tivas, o autor chegou a afirmar que sua obra (a É certo que a psicanálise pode tornar conscien-
psicologia analítica) visa, acima de tudo, “rom- te os instintos animais do homem, mas não,
per com as muralhas que nos separam da natu- como alguns interpretam, para deixá-los entre-
reza que há em nós” (JUNG, 2011, v. 8/2, par. 739). gues a uma liberdade sem freio e sim para inte-
O autor afirmou, ao longo de toda a sua pesqui- grá-los num todo harmonioso. (JUNG, 2011, v. 7/1,
sa científica, a necessidade do homem de se par. 28).
realizar, assim como uma semente se realiza tor-
nando-se árvore. A esse processo, que consiste Em diversas passagens de sua obra, ressal-
no ato de tornar-se si mesmo, ele deu o nome tou que o mal é parte da natureza humana e que,
de individuação. portanto, não se pode anulá-lo: ele sempre irá
Para Jung, o psiquismo segue um curso na- ressurgir como parte integrante da personalida-
tural e, se esse fluxo é inibido, o sistema psíqui- de. O autor advertia que a única saída para esse
co entra em desequilíbrio, como qualquer outro sentimento é a integração do mal nos processos

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da personalidade, por meio do autoconhecimen- Para Jung, as neuroses têm o propósito de


to. Isso não sugere nem incentiva a identificação levar o indivíduo a sua natureza real: isto é, “só
com essa tendência, o que seria inadequado e aquilo que somos realmente tem o poder de nos
envolveria o indivíduo em crueldade e em um com- curar” (JUNG, 2011, v. 7/2, par. 258). Nesse sen-
portamento antissocial. tido, a psicoterapia não era vista apenas como
A imagem do mal é figurada no psiquismo um processo de eliminação de sintomas, mas
humano por meio do arquétipo que Jung chamou sim um direcionamento do paciente a uma reno-
de sombra. Esse arquétipo aponta para a neces- vação de atitude frente à própria vida.
sidade, como requisito fundamental no processo
de individuação, de se integrar a personalidade. O paciente deve ser capaz, não só de reconhecer
a causa e a origem de sua neurose, mas também
As pessoas quando educadas para enxergar cla- de enxergar a meta a ser atingida. A parte doente
ramente o lado sombrio de sua própria natureza não pode ser simplesmente eliminada, como se
aprendem ao mesmo tempo a compreender e fosse um corpo estranho, sem risco de destruir
amar seus semelhantes. Pois somos facilmen- ao mesmo tempo algo de especial que deveria
te levados a transferir para nossos semelhantes continuar vivo. Nossa tarefa não é destruir, mas
a falta de respeito e violência que praticamos cercar de cuidados e alimentar o broto que quer
contra nossa própria natureza. (JUNG, 2011, v. crescer até tornar-se finalmente capaz de desen-
7/1, par. 28). volver o seu papel dentro da totalidade da alma.
(JUNG, 2011, v. 16/2, par. 293).
No livro A prática da psicoterapia, Jung res-
saltou que um bom psicoterapeuta deve desen- De acordo com o autor, o psicoterapeuta, du-
volver a habilidade de reconhecer as pistas da rante o atendimento de seu paciente, deve estar
natureza interior de seus pacientes, como um atento às imagens que surgem espontaneamen-
guia no processo de realização da totalidade do te por meio da arte e, sobretudo, dos sonhos, que,
ser. Acerca do comportamento ético do psicote- para ele, representam uma manifestação da mais
rapeuta diante de seu cliente, afirmava: pura natureza humana. Aliás, os sonhos são, em
sua concepção, “uma tentativa de trazer de vol-
No desenvolvimento psicológico é importante ta nossa mente original” (JUNG, 2011, v. 18/1,
que o psicoterapeuta deixe imperar a natureza e par. 591).
que evite na medida do possível influenciar o Ao longo da obra de Jung (2011), é possível
paciente com seus próprios pressupostos filo- identificar, ainda, inúmeras passagens alegóri-
sóficos. (JUNG, 2011, v. 16/1, par. 42). cas nas quais o autor comparava os fenômenos
naturais aos processos inconscientes e matura-
Embora Jung concebesse que o funcionamen- cionais dos seres humanos.
to e as bases arquetípicas do psiquismo fossem Mediante as inúmeras passagens que reve-
as mesmas para todos os indivíduos, considera- lam o caráter ecológico da obra de Jung, bem
va de fundamental importância que as pessoas como sua relevância para a constituição da psi-
fossem, durante a psicoterapia, reconhecidas den- cologia moderna, consideramos importante uma
tro de sua singularidade potencial para a reali- releitura de sua teoria, tomando como ponto de
zação e diferenciação do ser. Nesse sentido, o partida o valor e a função da natureza para a cons-
comportamento de neutralidade do psicotera- tituição de seu trabalho científico.
peuta, prezado pelo autor, visava acima de tudo Afinal, somos parte da natureza e guardamos
preservar, ou não deturpar, os germes da origi- os traços arquetípicos de nossa ancestralidade.
nalidade de seus pacientes. O abandono de nossas raízes naturais significa

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uma cisão de nós mesmos e talvez essa disso- Foi por meio desse sentimento de “paren-
ciação, do homem com o meio e com sua própria tesco com todas as coisas” que Jung identificou
natureza, esteja à frente dos principais problemas na natureza fundamentos lógicos para explicar
ecológicos da atualidade. os fenômenos da psique humana e, consequen-
temente, de sua própria natureza interior.
2. Resultados e discussão dos dados Com o propósito de analisar esses fundamen-
Antes de apresentar os resultados desta pes- tos ecológicos largamente utilizados por Jung
quisa, acerca da função da natureza na teoria (2011) em sua obra científica, buscamos localizar
analítica de C. G. Jung, é importante vislumbrar nos Índices Gerais de sua Obra Completa, dividi-
minimamente a história de vida desse autor e da e organizada em parágrafos rigorosamente
os fatos que influenciaram a formulação de sua enumerados, as principais passagens em que o
teoria psicoecológica. De acordo com Von Franz autor revelou o caráter ecológico de sua teoria.
(1992), fiel colaboradora do autor, o interesse Lembramos que, devido às inúmeras citações, este
de Jung pela natureza iniciou-se logo em sua pri- trabalho oferecerá somente uma amostra limita-
meira infância, influenciado pelas tendências da do conjunto de citações que evidenciam o teor
pagãs de sua mãe. ecosófico do pensamento junguiano.
Por meio dos quadros subsequentes, apre-
A natureza foi sua maior paixão, e Jung, tal como sentamos os conceitos da teoria analítica mais
sua mãe, sentiu-se, desde o começo da juven- citados e fundamentados pelo autor, por meio de
tude, parcialmente enraizado num profundo e referências e alusões ecológicas.
invisível solo, em alguma coisa vinculada aos
animais, às árvores, às montanhas, às campi-
nas e à água corrente. Esse amor opôs à tradi- CONCEITO
ção cristã do mundo do seu pai. (VON FRANZ, Dinâmica psíquica
1992, p. 29).
CITAÇÕES
Jung, durante toda a sua vida, amou a natu- Nossa psique é uma parte da natureza e seu
reza em suas mais diversas manifestações. Ja- mistério é igualmente insondável. Não pode-
mais se cansou da beleza dos lagos, dos ani- mos definir “natureza” e “psique”, podemos
mais, montanhas e florestas. A natureza foi de apenas constatar o que atualmente entende-
substancial importância no processo de cons- mos por elas. (JUNG, 2011, v. 18/1, par. 439).
tituição de sua personalidade, de suas concep-
ções científicas e de sua maneira de ver a vida A psique não é um fenômeno da vontade,
como um todo, havendo tocantes alusões acer- mas natureza que se deixa modificar com
ca da natureza espalhadas em suas obras (VON arte, ciência e paciência em alguns pontos,
FRANZ, 1992). Já ancião, falando das limitações mas não se deixa transformar num artifício,
da idade, declarou: sem profundo dano ao ser humano. O ho-
mem pode transformar-se num animal doen-
Mesmo assim há muita coisa que me preenche: te, mas não em um ser ideal imaginado.
plantas, animais, nuvens, o dia e a noite, e o (JUNG, 2011, v. 10/3, par. 831).
eterno que há no homem. Quanto mais acentua
a incerteza em relação a mim mesmo, mais au- A natureza é um contínuo, e muito provavel-
menta meu sentimento de parentesco com todas mente a nossa psique também o é. (JUNG,
as coisas. (JUNG, 1987, p. 310). 2011, v. 18/1, par. 181).

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Jung sugeria que o funcionamento psíquico é morais. Carrega em si o potencial criador e des-
instintivamente equivalente ao funcionamento truidor, o bem e o mal, e, sendo pura natureza,
dos sistemas naturais. E, como qualquer outro jamais fantasia seus receios e anseios (ao con-
sistema natural, o psiquismo é natureza que não trário da concepção freudiana, que via no incons-
se deixa deturpar sem que isso resulte em adoe- ciente uma tendência defensiva à negação dos
cimento psíquico. conteúdos geradores de ansiedade).
O autor salientava que sua psicologia concebe
o homem tanto em seu estado natural como em
seu estado modificado pela cultura, advertindo que CONCEITO
o homem deve ser interpretado e compreendido Arquétipos
levando-se em consideração a sua totalidade.
CITAÇÕES
O arquétipo é natureza pura, não deturpada
CONCEITO e é a natureza que faz com que o homem pro-
Inconsciente coletivo nuncie palavras e execute ações de cujo sen-
tido ele não tem consciência, e tanto não tem,
CITAÇÕES que ele já nem pensa mais nelas. (JUNG,
O inconsciente coletivo tem correspondên- 2011, v. 8/2, par. 412).
cia com nosso meio ambiente natural, e no
qual se encontra projetado constantemen- Quer o homem compreenda ou não o mundo
te. (JUNG, 2011, v. 10/4, par. 667). dos arquétipos, deverá permanecer conscien-
te do mesmo, pois nele o homem ainda é
O fundo da psique é natureza e natureza é natureza e está conectado com suas raízes.
vida criadora. É verdade que a própria natu- (JUNG, 2011, v. 9/1, par. 174).
reza derruba o que construiu, mas vai recons-
truir de novo. (JUNG, 2011, v. 10/3, par. 187). Os arquétipos são de certa forma os funda-
mentos da psique consciente ocultos na pro-
Nosso real conhecimento do inconsciente fundidade ou, usando outra comparação
mostra que ele é um fenômeno natural, e que, com suas raízes afundadas não só na terra,
tanto quanto a própria natureza, é no mínimo em sentido estrito, mas no mundo em geral.
neutro. Ele abrange todos os aspectos da na- [...] Propriamente falando, são a parte etonica
tureza humana: luz e escuridão, beleza e da psique, se assim podemos falar, aquela
feiura, bem e mal, o profundo e o superficial. parte através da qual a psique está vincula-
(JUNG, 2011, v. 18/1, par. 607). da à natureza. (JUNG, 2011, v. 10/3, par. 53).

Para Jung, o inconsciente coletivo é uma es- Os arquétipos, para Jung, tratam de conteúdos
trutura psíquica que já vem com a criança desde psíquicos arcaicos herdados filogeneticamente de
o seu nascimento, repleta de conteúdos arcai- nossos ancestrais; são reflexo das mesmas ex-
cos, próprios da natureza humana; em outros periências, inúmeras vezes repetidas e vivenciadas
termos, é um órgão natural sujeito às mesmas por nossos antepassados desde as primeiras eras
leis que regem o meio ambiente e no qual se da evolução genética da espécie humana. Por essa
encontra constantemente projetado. razão, o arquétipo é equivalente ao instinto e re-
O inconsciente, assim como a própria nature- flete em todos os sentidos os padrões de compor-
za, é um sistema neutro e destituído de valores tamento da natureza humana.

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O autor deixava claro que, no mundo dos ar- A neurose não é, para ele, somente um con-
quétipos, o homem ainda se encontra conectado junto de sintomas (negativos) que deve ser sim-
com sua natureza profunda. E, assim como a na- plesmente eliminado, mas um mecanismo que
tureza é arcaica e ao mesmo tempo criadora, Jung visa, acima de tudo, levar o indivíduo ao seu
ressalta que os arquétipos não são apenas es- processo de individuação e autoconhecimento.
truturas ultrapassadas, mas fonte de energia cria- Aliás, a neurose é, para ele, uma tentativa de au-
dora na arte, na ciência e nas melhores ideias de tocura da natureza.
nosso tempo – e que são também responsáveis
pelas bases da psique consciente.
CONCEITO
Opostos
CONCEITO
Neurose CITAÇÕES
A própria natureza procura o antagônico e
CITAÇÕES dele tira a harmonia e não do idêntico. (JUNG,
O excesso de animalidade deforma o homem 2011, v. 6, par. 443).
cultural; o excesso de cultura cria animais
doentes. (JUNG, 2011, v. 7/1, par. 32). O problema dos opostos como princípio ine-
rente à natureza humana constitui uma eta-
Quando o homem perde algumas de suas pa a mais no desenvolvimento do nosso pro-
funções naturais, isto é, quando esta se vê cesso de autoconhecimento. (JUNG, 2011,
excluída de sua atividade consciente e in- v. 7/1, par. 88).
tencional, ocorre um distúrbio geral, neuro-
tização. (JUNG, 2011, v. 10/1, par. 544). A ciência termina nas fronteiras da lógica, o
que não ocorre com a natureza, que flores-
O significado de uma neurose é impulsionar ce onde teoria alguma jamais penetrou. A
o indivíduo para a personalidade total, o que venerabilis natura (venerável natureza) não
inclui o reconhecimento e responsabilida- para no antagonismo, mas serve-se do mes-
de pela totalidade do ser, pelos bons e maus mo para formar um novo nascimento. (JUNG,
aspectos, pelas funções inferiores. (JUNG, 2011, v. 16/2, par. 524).
2011, v. 18/1, par. 367).

Para Jung, a neurose advém do conflito entre Para o autor, a resolução do conflito entre
natureza e cultura – o sistema psíquico entra em opostos (forças, valores e sentimentos antagô-
um estado de adoecimento quando o indivíduo nicos) é requisito fundamental no processo de
nega, reprime ou desconhece aspectos de sua realização da totalidade do ser. O autor obser-
própria natureza. Ele descrevia o indivíduo neuró- vou esse conflito, que ele também chamou de
tico como unilateral, demonstrando que, quando enantiodromia, nos fenômenos e processos na-
enfatizamos demasiadamente um lado de nossa turais. Salientava que, assim como ocorre na
personalidade em detrimento do outro, instala-se natureza, a psique humana tende naturalmente
o conflito. Assim, como todo sistema natural de- a buscar uma terceira saída aceitável, quando
pende de sua totalidade para funcionar perfeita- duas forças opostas chocam-se entre si.
mente, o autor considerava a neurose uma disso-
ciação que impede a perfeita dinâmica psíquica.

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Ele acreditava que o homem moderno, para


CONCEITO o seu próprio bem, deve manter-se conectado
Instinto às suas bases instintivas e às suas raízes natu-
rais, a fim de integrá-las em um todo harmonio-
CITAÇÕES so. Essa seria uma atitude de autoconhecimento
Quanto mais civilizado, mais consciente e
e de (auto)respeito perante a complexidade do
complicado for o homem, tanto menos ele
ser, que não é somente cultural, mas também
será capaz de obedecer aos instintos. As
natural.
complicadas situações de sua vida e as in-
fluências do meio ambiente se fazem sentir
de maneira tão forte, que abafam a débil voz CONCEITO
da natureza. (JUNG, 2011, v. 9/2, par. 40). Persona

A separação de sua natureza instintiva leva CITAÇÕES


o homem civilizado ao conflito inevitável A persona é um complicado sistema de rela-
entre consciência e inconsciente, entre espí- ção entre a consciência individual e a socie-
rito e natureza, fé e saber, ou seja, a cisão de dade; é uma espécie de máscara destinada,
sua própria natureza que, num dado momen- por um lado, a produzir um determinado efei-
to, torna-se patológica, uma vez que a cons- to sobre os outros e por outro lado a ocultar
ciência não é mais capaz de negligenciar ou a verdadeira natureza do indivíduo. (JUNG,
reprimir a natureza instintiva. (JUNG, 2011, 2011, v. 7/2, par. 305).
v. 10/1, par. 558).

Quando o instinto animal é varrido do cons-


Jung concebia a persona como uma função
ciente por meio da repressão, pode aconte-
natural, destinada à adaptação social do indiví-
cer que irrompa espontaneamente com toda
duo, e responsável pelo processo de alienação
força, de forma desordenada e incontrolável.
cultural. Seu símbolo é a máscara e, etimologi-
(JUNG, 2011, v. 10/3, par. 31).
camente, está ligada ao termo “personagem”. Por
meio da persona, os seres humanos desempe-
nham funções e papéis sociais em seus grupos.
Jung declarou diversas vezes, em sua obra, o Mas, de acordo com o autor, ao mesmo tempo
quanto os instintos humanos vêm sendo afeta- em que a persona oferece o suporte fundamental
dos pelo processo cultural. No entanto, convém para o homem viver em sociedade, igualmente
destacar que ele não era contrário à formação das representa um obstáculo em seu processo de to-
sociedades e reconhecia sua inegável importân- talização do ser ou de sua verdadeira identida-
cia para a vida coletiva da humanidade. Suas con- de. Afinal, a persona tende a ocultar a real nature-
siderações tão somente denunciavam os prejuí- za do indivíduo para que ele seja aceito no meio
zos trazidos pelo processo cultural quando esse em que se inter-relaciona.
pretende reprimir completamente a base instinti-
va da humanidade. Para o autor, não há repres-
CONCEITO
são dos instintos sem graves consequências, tan-
Individuação
to para o indivíduo (que se torna infeliz e neuró-
tico) como para a própria sociedade (que pode
CITAÇÕES
sofrer, nos momentos mais inesperados, a ação
O sentido e a meta do processo de indivi-
desordenada e violenta de indivíduos e massas).

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duação são a realização da personalidade CONCEITO


originária, presente no germe embrionário, Sombra
em todos os seus aspectos. É o estabeleci-
mento e o desabrochar da totalidade origi- CITAÇÕES
nária potencial. (JUNG, 2011, v. 7/1, par. 186). A moral ascética do cristianismo quer livrar-
-nos disso [da sombra] e assim nos expõe ao
O processo da individuação natural produz risco de perturbar o mais profundo de nossa
uma consciência do que seja a comunidade natureza animal. (JUNG, 2011, v. 7/1, par. 35).
humana, porque traz justamente à consciên-
cia o inconsciente, que é o que une todos os Se entendermos, então, que o mal habita a
homens e é comum a todos os homens. A natureza humana independente da nossa
individuação é o “tornar-se um” consigo mes- vontade e que ele não pode ser evitado, o
mo, e ao mesmo tempo com a humanidade mal entra na cena psicológica como o lado
toda. (JUNG, 2011, v. 16/1, par. 227). oposto e inevitável do bem. (JUNG, 2011, v.
10/1, par. 573).
Devo lembrar o fato psicológico de que, en-
quanto podemos constatar, a individuação De qualquer forma não faremos justiça nem
é um fenômeno natural [...]. Ela não é uma à nossa natureza em geral, nem à nossa na-
invenção do homem, mas é a própria nature- tureza humana se negarmos a imensidade
za que produz sua imagem arquetípica. do mal e do sofrimento, desviando nossos
(JUNG, 2011, v. 18/2, par. 1641). olhares do aspecto cruel da criação. O mal
deveria ser reconhecido como tal e não ser
atribuído à pecabilidade do homem. (JUNG,
2011, v. 18/2, par. 1654).

O autor concebia que todos os seres da na- Jung apontava a sombra e o mal como uma
tureza, independente de espécie, buscam a rea- função natural da psique humana. E, como toda
lização de seu potencial no meio em que vivem. função natural, Jung considerava salutar que a som-
Assim como a semente almeja tornar-se árvore bra fosse integrada à consciência e não elimina-
e, assim como o dia se totaliza com a noite, o da ou reprimida pela força da moralidade social.
homem busca a sua própria realização. Para atin- Negar a sombra é como negar uma parte vital
gir essa meta, Jung ressaltava que o indivíduo da personalidade. Essa atitude seria, ao ver de
deve conciliar natureza e cultura, integrar a som- Jung, um desrespeito diante da totalidade do ser.
bra à personalidade consciente do eu e desfazer A natureza só pode ser entendida em sua com-
todos os pares de opostos vigentes em sua vida plexidade e a partir do que realmente é. Nesse
psíquica. sentido, o autor destacava que a conscientização
O autor, no entanto, advertia que individuação da sombra é fundamental para que o indivíduo
não deve ser confundida com individualismo. deixe de projetar em seus semelhantes a anti-
Para ele, o individualista nega suas origens e patia e a falta de respeito que tem para consigo
suas raízes e vive em um mundo ilusório, no qual mesmo.
se acredita independente de seu próximo – fato No processo de individuação, a integração da
patológico, que ignora o verdadeiro sentido do sombra aos processos da consciência é, de acor-
processo de individuação. do com o autor, uma necessidade primordial.

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Em outros termos, a aceitação da sombra con-


siste na aceitação incondicional da própria na- CONCEITO
tureza, independentemente de suas flores ou de Religião
seus espinhos.
CITAÇÃO
O homem não consegue extirpar de todo
CONCEITO suas convicções religiosas, porque a ativi-
Sonhos dade religiosa repousa numa tendência ins-
tintiva e pertence às funções específicas do
CITAÇÕES homem. É possível retirar-lhe os deuses, mas
Muitas vezes, a natureza é obscura, sem somente para lhe oferecer outros. (JUNG,
transparência, mas ela não usa de artima- 2011, v. 10/1, par. 544).
nhas, como o homem. Por isso devemos acre-
ditar que o sonho é exatamente o que deve
Jung via a espiritualidade/religiosidade como
ser, nem mais, nem menos. (JUNG, 2011, v.
uma tendência natural e instintiva do homem, não
7/1, par. 162).
sendo possível anulá-la (como, por exemplo, pelo
ateísmo), por se tratar de uma função psicológica
Os sonhos são imparciais, não sujeitos ao
filogeneticamente herdada da humanidade. Para
arbítrio da consciência, produtos espontâ-
ele, não é possível tirar os deuses dos homens,
neos da psique inconsciente. São pura na-
mas apenas substituí-los por meio de outros, aos
tureza e, portanto, de uma verdade genuína
quais o indivíduo possa transferir a mesma quan-
e natural; são mais próprios do que qual-
tidade de fé; por exemplo, à ciência.
quer outra coisa. (JUNG, 2011, v. 10/3, par. 317).

O sonho é, portanto, um produto natural e CONCEITO


altamente objetivo da psique, do qual pode- A prática da psicoterapia
mos esperar indicações ou pelo menos pis-
tas de certas tendências básicas do processo CITAÇÃO
psíquico. (JUNG, 2011, v. 7/2, par. 210). A tarefa mais nobre da psicoterapia no pre-
sente momento é continuar firmemente a
serviço do desenvolvimento do indivíduo.
Jung era imperativo ao se referir aos sonhos Procedendo desta forma, o nosso esforço
como uma função natural da psique humana. De estará acompanhando a tendência da natu-
acordo com ele, a razão dos sonhos seria uma reza, isto é, estaremos fazendo com que de-
tentativa de trazer de volta à consciência nossa sabroche em cada indivíduo a vida na maior
mente original. plenitude possível, pois o sentido da vida
Diferente de Freud, Jung concebia os sonhos só se cumpre no indivíduo, não no pássaro
dentro de um fundo espontâneo e natural, en- empoleirado dentro de uma gaiola dourada.
quanto Freud os concebia cheios de nuanças, (JUNG, 2011, v. 16/1, par. 229).
máscaras e mecanismos de defesa. Jung chegou
a afirmar que os sonhos são o hálito da nature- Em psicoterapia, considero até aconselhável
za e que sua linguagem rica em símbolos arque- que o médico não tenha objetivos demasia-
típicos carrega a verdade sobre a natureza dos do precisos, pois dificilmente ele vai saber
indivíduos. mais do que a própria natureza ou a vontade
de viver do paciente. As grandes decisões da

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vida humana estão, em regra, muito mais su- de outono da vida não é mero palavrório sen-
jeitas aos instintos e a outros misteriosos timental, mas expressão de verdades psico-
fatores inconscientes do que à vontade cons- lógicas. (JUNG, 2011, v. 8/2, par. 780).
ciente, ao bom-senso, por mais bem-inten-
cionados que sejam. (JUNG, 2011, v. 16/1, Árvore nenhuma cresce em direção ao céu,
par. 81). se suas raízes também não se estenderem
até o inferno. (JUNG, 2011, v. 9/2, par. 78).
Com um resultado terapêutico satisfatório,
provavelmente pode dar-se o caso por en- Por mais que joguemos fora a natureza por
cerrado. Se assim não for, a terapia não terá meio da força, ela sempre retorna. (JUNG,
outro recurso a não ser orientar-se pelos da- 2011, v. 10/1, par. 514).
dos irracionais do doente. Neste caso, a na-
tureza nos servirá de guia e a função do mé- Falta contato com natureza que cresce, vive e
dico será muito mais desenvolver os germes respira. A pessoa sabe o que é um coelho ou
criativos existentes dentro do paciente do que uma vaca através de livros ilustrados, enci-
propriamente tratá-lo. (JUNG, 2011, v. 16/1, clopédias ou televisão. E pensa que conhe-
par. 82). ce realmente, mas fica admirada quando
mais tarde descobre que o estábulo fede,
pois isso não estava na enciclopédia. (JUNG,
Jung considerava a psicoterapia um espaço
2011, v. 10/3, par. 882).
em que o psicoterapeuta deve utilizar-se da ex-
pressão espontânea da natureza de seu pacien-
te como guia de seu processo de individuação.
Para ele, cada indivíduo cresce e se desenvolve A obra de Jung (2011) está repleta de alusões
ao seu tempo e à sua maneira. Em se tratando e alegorias acerca da natureza. O autor conse-
de prática psicoterapêutica, prezava o compor- guia, com muita poética, traçar paralelos entre a
tamento ético e a postura de neutralidade como natureza e os processos psicológicos dos seres
meio de garantir que a originalidade do paciente humanos. Para o autor, assim como existia uma
não seja afetada ou deturpada pela natureza do ecologia exterior, havia também uma ecologia
psicólogo. Caso contrário, a meta da individuação interior. Ele entendia a natureza como a única
perderia o seu sentido e, alegoricamente, o psi- fonte de manifestação da verdade, ou a mais pró-
coterapeuta ocasionaria uma espécie de agres- xima da realidade.
são à natureza de seu paciente. Muito antes dos atuais enfrentamentos eco-
lógicos, Jung já falava sobre a necessidade de o
homem se reconectar com a natureza, criticando
CONCEITO insistentemente a atitude de desconexão entre
Alusões diversas o homem e seu meio.
Sua concepção era de que nada no mundo
CITAÇÃO estava separado da natureza e que tudo se espe-
A alma do mundo é uma força natural, res- lhava e refletia no funcionamento natural. Assim
ponsável por todos os fenômenos da vida e como observava a primavera no meio externo,
da psique. (JUNG, 2011, v. 8/2, par. 393). observava a infância no homem; assim como
admirava o outono, admirava os processos psi-
Há alguma coisa semelhante ao sol dentro cológicos da meia-idade, como fenômenos dire-
de nós, e falar em manhã de primavera, tarde tamente análogos. Em tais comparações, ele não

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via somente um ato romântico, mas alusões de tureza”, entre as quais se destacam 137 parágra-
profunda verdade empírica. fos nos quais o autor utiliza o termo “natureza” e
De modo geral, ao longo dos 34 volumes que suas variações para ilustrar, justificar e fundamen-
compõem a obra completa de C. G. Jung, é possí- tar diversos conceitos de sua teoria, assim como
vel encontrar centenas de citações da palavra “na- podemos constatar no quadro a seguir.

Obras analisadas Parágrafo(s) Citações por obra

I – Estudos psiquiátricos
II – Estudos experimentais
III – Psicogênese das doenças mentais 584 1
IV – Freud e a psicanálise
V – Símbolos da transformação 95; 107-114; 170 (no rodapé 84) 3
VI – Tipos psicológicos 132; 790 2
VII/1 – Psicologia do inconsciente 16; 17; 28; 29-30; 32; 35; 34; 41; 50; 16
88; 93; 96; 114; 146-149; 162; 186
VII/2 – O eu e o inconsciente 305; página 10 2
VIII/2 – A natureza da psique 339; 392-393; 412; 702; 739; 10
750-751; 780; 787; 795; 800
VIII/3 – Sincronicidade
IX/1 – Os arquétipos e o inconsciente 172; 174; 195; 234; 289; 714 6
coletivo
IX/2 – Aion: Estudos sobre o 40; 78; 220; 244 4
simbolismo do si-mesmo
X/1 – Presente e futuro 514; 544; 547-548; 560; 562; 6
572-573
X/2 – Aspectos do drama 431 1
contemporâneo
X/3 – Civilização em transição 24; 31; 32; 34; 44; 53; 134; 187; 210; 13
317; 361; 831; 882
X/4 – Um mito moderno sobre 616; 667; 673 3
coisas vistas no céu
XI/1 – Psicologia e religião 105; 130 2
XI/2 – Interpretação psicológica 261 1
do dogma da trindade
XI/3 – O símbolo da transformação
na missa

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Obras analisadas Parágrafo(s) Citações por obra


XI/4 – Resposta a Jó
XI/5 – Psicologia e religião oriental 867-868; 895; 941 3
XI/6 – Escritos diversos
XII – Psicologia e alquimia 40; 214; 331 3
XIII – Estudos alquímicos 119; 130-131; 148; 184; 196; 198; 8
229; 267
XIV/1 – Mysterium coniunctionis 83; 101; 127 3
XIV/2 – Mysterium coniunctionis 6 (no rodapé 21); 58; 65; 158; 358; 7
365; 402
XV – O espírito na arte e na ciência 41; 120 2
XVI/1 – A prática da psicoterapia 42; 81-82; 130; 227 4
XVI/2 – Ab-reação, análise dos sonhos 293; 344-345; 412; 469; 508; 524 6
e transferência
XVII – O desenvolvimento da 160; 289; 290; 292-293; 320; 7
personalidade 335; 338

XVIII/1 – A vida simbólica 38; 178; 181; 367; 368; 375; 439; 473; 15
474; 585-586; 591; 598; 602-603;
607; 742

XVIII/2 – A vida simbólica 1198; 1360; 1365; 1366-1367; 1368; 9


1488; 1586; 1641; 1654

Os achados evidenciam o caráter ecológico em profunda interação com seu meio e que bus-
da obra de C. G. Jung, que, na atualidade, pode ca realizar sua totalidade, como todo sistema
ser de grande utilidade, não somente para o avan- natural.
ço da ciência psicológica, mas também com os Sua obra reflete o pensamento de um homem
atuais enfrentamentos ecológicos. Afinal, por que esteve profundamente ligado aos mistérios
meio da psicologia profunda de Jung, percebe-se da vida, da natureza e da psique como um todo.
que a realidade interna dos seres humanos está Muitas vezes incompreendido e tachado de mís-
estreitamente fundamentada sobre as bases e tico e romântico, Jung tem um trabalho científico
leis que regem a realidade cíclica da natureza e que revela, pelo contrário, grande sensibilidade
ligada a elas. para captar, muito antes dos atuais enfrenta-
mentos ecológicos, um pensamento de integra-
3. Considerações finais ção entre o homem e a natureza. A essência des-
Jung enfatizou intensamente, em sua obra, se pensamento é o que atualmente se preza nos
a desconexão do homem com a natureza e, con- modernos movimentos ecológicos que ainda ali-
sequentemente, consigo mesmo. Já no sécu- mentam a utopia de um mundo povoado por
lo passado, tratou o homem como um sistema humanos capazes de respeitar o meio natural, à

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medida que reconhecem a profundidade de sua dúvida, foi um exímio ecologista da interioridade
própria natureza. humana, buscando desvelar as obscuridades da
A natureza é como um espelho no qual nos psique e defendendo, do início ao fim de sua
vemos: somos um pouco da abelha, do cão, do vida, o livre desabrochar das potencialidades do
macaco, da árvore, da víbora e da ameba; somos homem, motivando-o a trilhar os caminhos do
um pouco de todos os seres e todos os seres processo de individuação e da totalidade do ser,
são um pouco de nós. Conectar-se a ela e à es- sem, no entanto, distanciar-se de suas origens
sência de todos os seres é também uma forma coletivas.
de nos integrar com nossa própria totalidade. A obra científica de Jung configura, pelo que
Cuidar da natureza e contemplá-la não são so- pudemos ver ao longo deste trabalho, uma es-
mente atos românticos, mas uma forma de nos pécie de ecologia humana, em que o autor colo-
cuidar, de nos contemplar e de reconhecer os ca os seres humanos como parte integrante de
nossos próprios mistérios. A crítica de Jung era seu meio natural, não como o animal-humano
exatamente em torno da atitude de desconexão dominante da natureza, mas como apenas mais
do homem, iniciada desde os primórdios do cris- um ser reinado por forças inconscientes mais
tianismo. Já em seu tempo, percebia que faltava fortes do que ele mesmo.
contato direto das pessoas com a natureza. Por motivos razoáveis, sugerimos que o au-
A profunda conexão de Jung com a natureza tor seja reconhecido como o pioneiro da eco-
e o modo com que tratava a psicologia nos le- psicologia, ecologia humana e, até mesmo, como
vam à reflexão de seu objetivo maior, que era um dos primeiros pensadores ecosóficos da
formar não apenas psicoterapeutas ou conhe- modernidade. „
cedores técnicos da mente humana, mas eco-
logistas da alma. Ele mesmo, sem qualquer Recebido em: 6/3/2017 Revisão: 24/5/2017

Abstract

Ecology of the soul: the nature in the scientific work of Carl Gustav Jung
To study the work and biography of Carl volumes of Jung’s complete work the quotations
Gustav Jung is to realize how inspiring nature was in which the term “nature” is used to support
to the development of his scientific and personal concepts of his theory. The 137 paragraphs that
worldview. Therefore this paper examines the were found demonstrate the author conceived
relevance of nature to the formulation of analyti- psychic functioning was analogous to the func-
cal psychology theories. It searches through 34 tioning of all natural systems. „

Keywords: human ecology, C. G. Jung, nature.

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Resumen

Ecología del alma: la naturaleza en el trabajo científico de Carl Gustav Jung


Al estudiar el trabajo científico de Carl Gustav en las obras completas del autor, que se compone
Jung, así como su ruta biográfica, es perceptible de 34 volúmenes, las citas donde utilizó el término
para cualquier investigador que la naturaleza “naturaleza” para sostener conceptos en su teo-
representó la inspiración en el proceso de cons- ría. Los hallazgos, compuestos por 137 párrafos,
trucción de su cosmovisión científica y personal. muestran que el autor concebía el funcionamiento
Por lo tanto, se buscó, por medio de esta inves- psíquico equivalente al funcionamiento de los
tigación, la relevancia de la naturaleza para la sistemas naturales. „
formulación de la psicología analítica. Se rescató

Palabras clave: ecología humana, C. G Jung, naturaleza.

Referências bibliográficas
JUNG, C. G. Memórias, sonhos e reflexões. 1. ed. Rio de Janeiro: PINHEIRO, J. Q. Psicologia ambiental: a busca de um ambiente
Nova Fronteira, 1987. melhor. Estudos de Psicologia, Natal, RN, v. 2, n. 2, p. 377-398,
1997.
JUNG, C. G. Obras completas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.
TARNAS, R. A epopeia do pensamento ocidental. 3. ed. Rio de
MCGUIRE, W.; HULL, R. F. C. C. G. Jung: entrevistas e encontros..
Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.
1. ed. São Paulo: Cultrix, 1997.
VON FRANZ, M.-L. C. G. Jung: seu mito em nossa época. 2. ed.
São Paulo: Cultrix, 1992.

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