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————EEEE—————— lio, ou pare dele, nao pode ser repred ©2010, A autora zide por dualquet meio sem asiorzayaa escrit por0. Editor uRMG | eo Edit aes; Matiel Maria Esther MtBa ‘As ironas os ordam: calegbes, iments ¢ encciopedias fiecionais | Mirla Esther Macel, - Selo Hotzonte : E | FM. 2008. 160 p.~ (invengéo} Indu bistogrta } BN 978-85 7041-78 / 1 Enseiosbrasietes. 2. Artes. | Thu. li Sis. cop: 8869.4 cDu:824 / Eaboradapela 1 1-Sotor dT sca Bbloteca riersln da UENG Assistéreia editoriat Eliane Sousa eFuciida Macedo Superisora de preparagio e revisio: Sonia Que! Preparagio de ariginsis: Aline Sobrera evisto de proves: Mariana Pithon e Tetiana Chanooa Proieto aréfigo: Paulo Schmiat Formatagae: Lintz Marello Cape: Eduarco Feireie Produgho arafica: Waren Matilac Para Celio de Castro, Editor UFMG Ay, Presidente Antonio Carles, 6.62? Campus Pampuiha - Ala direita da Biblioteca Centre! — 31270.801 ~ Belo Horizonte/MG— Bresi Jel: 66.31 9403-4650 | Fax: +5631 2409-4768 oven-edlitora.ufng.br ‘editora@uting.br Do inclassificavel e das classificagies: © que nao esta erdensdo de un protiserie 0 ents de do detivnamnorte famente define Georges Pees Ordens provisorias Segundo os dicionstios, a palavra inclasifideel significa 0 que iio pode ser inserido dentro de uma classe ou categoria, 0 que no pode ser definido nem qualificado com precisao, Guarda, por isso, tuma afinidade intefaszea com a palavra grega atopor, que, além de apontar para aquilo ou aquele que nfo se fixa em um lugar ou em. tum discutso, caracteriza também © que ¢ estranho, extrordinério, inopartuno.! Roland Barthes, no livo Fiagmentes de wm dscarso umoroto, vale-se da palavia atepas para designar precisamence'“o inclasificivel, de uma originalidade sempre imprevista’. Para ento, ele explora 0 duplo sentido da palavra topos: lugar e discurso. Pela forca do prefixo de privagio a (a), atopos seria, portanto, nto apenas 0 que nfo se confina em um lugar, mas também o que “resiste& descricio, A definigio, & linguagem que € maya, classificagio dos Nomes (dos Enros)".? Ea isso ainda acrescenea ia de queo atoposé sempre 0 inqualificével, por ser muito dificil ov impossivel fil dete, sobre ee ave emgrege signion nto agen “gs, tego" gare do 0°p0 i lsers0 9707050, 9-26. O raze de ete, Bate to non pare designar o “tera co go. ov sa, ce perda, ave descorfota,tarvasiaras bases do CO inchssificavel poderia também ser associadoa idea de ubiqui- dade. Isso porque muitas vezes chamames de inclassifiefvel Aquilo que é passivel de ser inserido {mesmo que provisoriamiente) em virios lugares a0 mesmo tempo, dada adiversidade muitas vezes contradi- {ria de seus reagos. Nesse caso, todas as categorias em que poderia ser insetido sio insuficientes pata acomod-lo, Em cada uma cle mance sun incémoda diferenga, sua explicit altericade, E, nesse sentido, por transitar em varios po, iio se deixa aprisionar em nenhum Mas o inclassificivel no deixaria aberta a possibilidade de ategorias que incluam suas diferengas, uma vez que 0s préprios sistemas taxondmicos nd argumentar que, se existe o inclassificvel, & porque os sistemas de classificasio dispontvcis ¢ legitimados sao insuficientes ¢ nio dio conta de acomodar a complexa diversidade e multiplicidade do mundo. Isso porque eles obedecem sobretuclo 20s prineipios da semelhanga. Coma afirmou Michel Foucaultem Aspalavnes as cosas, “a histéria da ordem das coisas seria « hisi6ria do Mesmo ~ daguilo que, para uma cultura, é a0 mesmo tempo disperso e aparentado, a set, portanto, distinguido por marcas e recolhido em identidades’.” Em oueras palavias, coda taxonomia requer o principio da menor diferenga possivel entre as coisas para se sustentar. Entretanto, & sgragas a0 que resiste &s leis da taxonomia, ou seja, a diferenga, que tas sistemes esto sempre em proceso de teformulacio, revelando su insuficiéncia ¢ precariedade. Georges Perec, em Penser / claser, desenvolve uma instigante teorizagio nio-convencional dos sistemas de classificagao, evi- denciando “a quio tentador & 0 afi de distrisuir o mundo inceiro segundo determinados cédigos capazes de reger © conjunto dos fendmenos, embora saibamos que lamentavelmente nfo funciona, nunca funcionou, nunca funcionara’.* Ele reconhece 0 fascinio do ato de classificar so mesmo tempo em que proclama a instabilidade serem criadas nov. sio definitivos? Podemos » FOUCAULT As patos 0s oa, PEREC. Penser/ 2 de ctajoes ern inguassrangers los ctitétios classificatérios, Mas admitir tal instabilidade, segundo indo impediré que sigamos durante muito tempo classficando os nimais pelo seu niimero impar de dedos ou por seus chifies oes” Ou seja, verhos como acomndar. agrupar, eatalegar. clasificar dispor dividis, disaribuir, enuameras,eriguesay, ordenar eic. nuncadkixario de sex imperatives para nossa necessidade de fisarasordens que nos permitam sabreviver a0 caos da muhiplicidade e da diversidade. Pode-se dizer que, c conhecimentos em um sistema completo ¢ suficiente, com proposites de acender os parimetzos cientificos ou burocséticos de uma dada stituigio ou de um campo disciplinar, as categorias ordenadores sio, por naturcea, excludentes, seletivas¢ hiersrquicas. Classificar & antes de tudo, escolher uma entre outras ordenecSes logicamente possiveis, Ou, para usar aqui as palavras do corde de Bulfon,® € buscar uma ordem na qual entra necessariamen’e a arbitriio. ji que a nacureza € demasiado rica ¢ diversa para ajustarse a quadeos rigidos. Assim, as categorias duram apenas até que, pela fora das excegbes, das diferencas ¢ das descobertas, tenham que ser revistes| ce modificadas a partir de novos critérios ¢ divisées. Logo que uma cordem se impée, ela tende a caducar, como bem demonstrou Perec Isso grasas, sobrecudo, ao que é inclassificével Sob esse prisma, cabe ainda mencionar uma outra passagem do livro de Petes, em que 0 autor fe un las pata acomodar 9s seres, 28 coisas € os wventévio de possfveis crtéies taxondmicos (alguns bastante absurdos) para a organizacio de sua biblioceca.’ Assoviando esse tipo de ordenagae a uma especie de “tentasio da buroczacia individual’, Perec liste categoriza diferentes rmodos de disposigao dos livros nas escantes, Uma de suas constavagies Ede que, na pritica, toda biblioteca se organiza a purtir de uma com- binacio de todos esses modos, O que, entretanto, nao garante uma clasifcagio satisfaréria de todos os volumes, visto que, segundoele “era FEREC. Parser caster 0.60. * BUFFON rare. grdle et partouidre,ctsto sorPCMBO Da cassicacio 2295 dos saber. p27 tomo de trés-quastos dos livros nunca foram realmente clasificados”, sein porque sio dificeis de ordenar, seja por que sio impossiveis de classificat’ Hii que se criar, assim, uma nova categoria para eles: a do st cetera. Uma categoria, aids, jf usacla por Borges no famoso ensaia (0 idioma analitico de John Wilkins’, no qual 0 escritor argentino, para mostrar as ambiguidedes, as redundlncias. as arbitrariedades e as deficincias do sistema linguistico wilkiano, descreve uma apécrifa encielapédia chinesa que classifica as animais do. mundo em doze categorias insolitas, ordenadas no exquem do abecedatio, em que 0 «f setore se insere precisamente na categoria L.? O fata de o et cetera borgiano vir, nio no final da lista, como seria previsivel, mas antes das duas altimas earegorias, garance-the inevitvelmente um estaruro maissélido dentro do coajunto, oque gera ainda mais esteanhamento no leitor ¢ rompe com a previsibilidade dda prdpria Idgica classificatéria dos sistemas convencionais. Daf as perguntas: seria esse er cereneo ropos por exceléncia do inclassificdvel ¢, par extensio, a categoria que falta a todas os sistemas taxondmicos em geral? Ao combinar, em um mesmo espago discursivo, as regras de classificagio com as leis paréiicas da fiegio, Borges n0 estaria evidenciando a impossibilidide de uma clasiticagzo do univers ou do conhecimento que nao seja arbitréria, proviséria e conjecural, uma ver que todo recenseamento/ordenagia tende, em seus limites, a revelar o carter do que é naturalmente inconteolavel e il (Cabe mencionar aqui,a culo de exemplo dessa insuficié faio de o prdprio Lincw® ~ que estabcleceu, na segunda metade do sfculo 18, nfo apenas as bases da taxonomia moderna como também rodo um sistema bindmico de nomenclatura nocampo da Histéria Natural ter repeticamente revisadoe ampliado. 0 seu Systema natuere, de 1735, a ponto de seus contemporaneos recla- marem da “volatlidade” de seu modelo, o qual mudava a cada edigo, diante da prolifera diversidadedo mundo animal ¢, consequentemente, "PERE. Ponser elssr, BORGES. nas con 1p 16 da descoberta de novas diferengas zooldgicas que no se adequavam is, categorias jé definidas." Poderfamos ainda lembrar 0 frison que a descoberta do cornirorsinco em 1799, na Australia, causout nas meios cientificos da Gri-Bretanha, precisamente em um momento em que a taxonomia gozava de um enoime prestigio e se amparava rigorosamente nas leis, da racionalidade triunfante. Predominaya, entao, 0 que Foucault chamou de “tempo classficad”, de ‘devir quadsiculado”, em que a instauragdo de arquivos, a reorganizacio das bibliotecas € 0 «sta belecimento dos eatilogos, dos muscus ¢ dos zooldgicos impunham, ‘mais que uma nova sensibilidade ao tempo e A maneira de se lidar com wdo um sepertério de saberes acumuladosaolongo dos séeulos. Considerado um puzzling animal, 0 ornitortinco provocou a perplexidade dos naturalists do tempo, por ser uxt hbrido de mais ‘ou menos 50 em, sem pescoso, com patas dotadas de membranas, cauda semelhante 4 de um castor, bico de pato, membros posteriores dotados de esporses venenosos, além de ter um corpo achatado € coberto por um pelo marrom-escuro. Fice na agua e ld se alimenta. ‘As Fémeas sio oviparas, mas amamentam seus filhotesatravés de ma- rnilos internos. Como descreveu um navuralista do tempo, Thomas, Bewick, “o ornitorsince é um animal sui genetis:ee parece possuir trés ° Poderfamos nanurezas:ado peixe, ado passaraea do quadripede” acrescentar que ele é um animal aiépico por exceléncia, sub todos os sentidos da palavra atypos: inclasifcivel, estranho, extraordinario, original einconveniente. Um desafio, portanto, av cinone zooldgico, aos sistemas de classificagio. Harriet Rivo conta que o omnitorrineo foi primelramente descrito como .um mamifero, o que desencadeou um intenso debate taxor 10, The Petypus ard the Marmot, 0.18. Poderes ses, cose Aritétolas ‘considerco © primar a orderar 98 coshecinentos em gps e série. segundo rncibios peteneamerteostive's| esse mobliade das etagrias assifeattioa DENIEK A genes history of qvodhupede, cade par AITKO. Tho Payee nos cfrculos cientifices. Dissecado por anatomistas, chegou @ ser inserido ma classe dos anfibios, embora houvesse quem nele visse uma “surpreendente uniso das distingées caracteristicas de todas as classes". Unio esta que, séculos depois, continuaria estimu- lando © peasimento ¢ 2 imaginagio de estudiosos da exoromia, coma, por exemplo, Umberto Feo, que, em 1997, elegen 0 animal como 0 “heréi” de seu livro Kant ¢o ornitorrinco, chegancdo mestno a argumentar que, zo contrétio do que se pensava, 0 omitorrinco nfo to de um amilgama de todos os animais, mas todos os outros animais sto feitos a partic de uma parte do omnitorrinco. E pergunta: Como paderfamas colocar junto o bico e as patas espalmadas como pélo e cauda de castor, ou a iddia de castor com aquela de tum animal oviparo, como poderiamos ver um passaro ld onde aparecia um quadripede, e um quadruipede onde aparecia um pasate?! Uma classificagio, nesse caso, s6 é possivel por aproximagio, E € nesse sentido, como mostra Eco, que, na austncia de critérios suficientes de elassificagio, a definigio de um fenémeno desconhe- cido acaba por se dar pela aproximagio analégica. © que nos leva a afiomar que onde falha a classificagio advém a imaginagao. Na falta de ctitérios para se definir com precisio um objeto estranho, hé que sc inventar novas formas — scjam clas metaféricas ou nfo — para que le possa ser descrito ¢ especificado. Sob esse prisma, os relatos fantisticos «los cronistas curopeus sobre 2 fauna do chamaco Mundo Novo se oferecem como modelos exemplares. Neles, as imagens monstruesas dos animais tropicais 2ndo estavam contaminadas apenas pelas reminiscéncias dos textos fantéscicos dos antigos bestiérios medievais, mas advinham também ¢ sobretude ce uma insuficiéncia epistemolégica. Nio havia ainda, RIO. The Pstusand te Mermaia, 9 3 Rive manciona larbém > inaret» ve no século 16, un sistema de classificagao que pudesse oferecer os subsidios cientificos necessétios para que a alteridade radical dos animais atino-americanos puidesse ser nomeada, descrita e caxegorizada racionalmente, Como explicou Foucault, 0s conhecimentos da época cram constituidos de um amalgama inscivel entre “saber racional, nogoes detivades de préticas de magia c de toda uma heranga cul cujos poderes de autoridade a redescoberta de textos antigos multiplicado”."* Se, por um lado, j4 se configurava a soberana racionalidade na qual o mundo moderno ocidental passaria a se reconhecer, por outto, tal rucionalidade ainda nao abdicava do gosto pelo extraardinstio e do respeita pelo saber antigo. E nesse sentido que as primeiras tentativas de esquadrinhamento do reino animal fetes por naruralistas da Renascenga eram um com- posito dedescricoes precisas e imprecisas, de classficagGes arbiurias, citagoes,fabulas, relatos mitoldgicos, absecvagies possivcis c impos- is sobre a utilidade dos animais tanto para os experimencos da rmedicina quanto para as peiticas de magia. Uma mistura que podetia set definida, no rastto de Umberto Eco, como de competéncis enci- clopélica, Mas a enciclopeédia, neste caso, compreendida enquanto um espesso ¢ intrincado conjunto de referencias oriundas de vétios campos disciplinares, supostamente capaz de abarcar ¢ exaurie toda a espécie de informagées, fatos, detalhes ¢ cutiosidades ilativas eo mundo fisico, Isso porque o registro de conhecimentos no periodo renascentista s# norteava, sobretudo, pele principio da exaustividade, propiciando o surgimento de um modelo enciclopédico marcado pela abundancia excessive e cadtica de matetiais yas € a €oi95, p48 Pombo: "Amsoradgs0en osteamessepuints th reagraphiu et postu 20 208 7.98 traler ones” POMBO, Fr ura hs noclepensp 202, O exercicio enciclopédico A prdtice enciclopédica sempre esteve intsinsecamente ligada 2 prética taxondimica. Os primeivos pen classificar os setes, as coisas ¢ os conhecimentos foram também os sores que se dedicaram a primeizos enciclopedistas do mundo ocidental.” Ao mesmno tempo cin que buscaram recolher em um mesmo tapos todos os canheci mentos disponiveis sobre 0 mundo, tentaram ordenar, em campos « categorias, todo esse conjunto fazendo jus ideia de enciclopédia enquante citculo (ok7..00) perfeito (ev) do conheci- mento ou da educasio (no.1Se1«,). Isso nio quer dizer que, no mundo antigo ¢ medieval, otermo enciclopédia jd existisse para designar essa idcia, visto que a palavra foi usada pela primeira vez.no século 16 € sa partirdo século 17 adquirin o sentido que hoje lhe atribufmos.”* AichguantS price: (pactines, que 6eactelapedinel i: Ocidente remonta antiguidade clissica, mais especificamente & obra de Aristételes (ainda que se fale também de Espeusipo, sobrinho de Platie), tendo tido nessa época fins sodretudo educativos. Ji no mundo romano, como explica a estudiosa partuguest Olga Pombo, o trabalho enciclopédico toma forma de compilasao e balango dos comhecimentos de uma época em processo de decadéncia, Varrio « principalmente, Plinio, © Velho, destacaram-se como os nomes medulares do periodo, ea Historia naturals de Plinio pode ser con- siderada a grande enciclopéilia do mundo antige, cujo propésivo aber principal era registrar ¢ clasificar exanstivamente “toda espécie taser entgas. Coma tim Phiipp lem. 8 a Yaeo8 Sis teats cureormes de informagdes, fatos, detalher e curiosidades telativas a9 mundo idade esta que também se dé a ver no mundo medicyal € que s¢ prolonga, como vimos, no Renascimento ¢ na ppassagem pars a época barenca Jano ambito da modemidade, a nogao de enciclopédiaafirmou- -se, como se sabe, a partir do trabalho coletiva dos enciclopedistas franceses.” célebre Encyclopédie o metodo esceuturaclo por Francis Bacon na forma de uma drvore bifurcada” Publicada em 28 volumes (17 de texto € 11 de pranchas) entre os anos de 1751 € 1772, sob a cocrdenacio de Diderot e d'Membert, a Enyclpedie tinha como fungio veunir ‘no mais breve espago possivel ma mirfade de conhecimentos nos campos da histéria, das cléncias, da filosofia ¢ das artes, a partir de trés divisdes ou propriedades de conhecimento humano: a meméria, a razdo e a imaginagio. A ideia era criar, a partir dessas proptiedades, Interessante que, no famoso “Discurso preliminar” que abre o primeira volume dz enciclopéctia, o proprio d'Alembert cenhaadmitido as limitagé dos saberes lisico”.” Exau * que tomaram como referéncia para a composigio da de seu projeto, reconhecenda que 0 sistems universal “uma espécie de labirinto, um caminho tortuoso’ POMeO Per umanstors da cea de encicloped,p. 126 Ds protegensstas ce sl empracndment foram 0s Hitsoles Dens Oisert @ Jean-Jacques Reusseau, 0 matemétco Jean éAlembert e o clantsta Laus de “aveourt, O gun 3s de Georges Lous Lele do Button, flenra Borna: do Condilac. Anna Robart Jacques Tugat & Marqus 40 Cotdeet, darts outros Una ineressrtaPistiri romances do prac compesigte ds Ercycloodda fi pubsleada por Ppp Blom, om 2004 cob Eneyciop sho: to Turrah of Reason nan Unreasonable Age, © Frais Bacon (15-1626) construisum ambiciso projet encilopece sob owe ‘nsiuato magna, 0 quel Mache ae comoletar Dente desea piso cece rganuny, 81820, cbs fundameral para edeservahomento dss 5 @ dl flosois moderas, en queo autor expe se opurhanspameracatloyeade a esos ros, do fet D'ALEMBERT Ravmnay Occurs syoopea. p DO INELASSFICAVEL E DES CLASSFICAQDES @ que © modelo mais propicio para a organizagio do sistema geral dle todo esse conhecimento seria 6 do mapa multidimensional. Nas suas palaveas: [Assimn, pode-se imaginar tantos sistemas diferentes do conheci- ‘mento humano como mapes-miindi de diferentes projegoes, ¢ cada um desses sistemas poderd, ademais, cr alguma vantagem particulir que nio cém os outros. Mas 0 filésofo pondera, por outro lado, que a desordem labirfntica “desfiguracia, ou pelo menos aniquilaria de todo uma drvore enciclopédica na qual s quisesse representé-la", Daf ser necessitio, segundo ele, “dara cada parte uma extensio conveniente, insistirsobreo essencial, negligenciaras mimticias ¢evitar um defeivo assaz comum que consiste em dar peso dquilo que sé precisa de uma palavra, provar © que ninguém concesta, comentar o qui é claro Sob esse prisma, a Enyelopédie x6 poderia se concretizar como uma versio reduzida, uma traclugio limitada ~e definida pordeterminadas regras de razoabilidade ~ do sistema lab mundo, Ou seja, era recomend redundancias ¢ conter excessos, mesmo que isso significasse uma redusao das possibilidades do projeto enciclopedista enquanco uma {ntico de saberes sobre © vel discriminar, selecionar, sup ‘combinacéria aberta e extensivz. De qualqucr manecita, a enciclopédia vdvel, dentro dosparimetros da modernidade do século 18, nfo podia ser sendo essa versio reduzida do mapa multidimensional dos saberes, dadas as exigéncias dle racio- nalidade no processo de oxganizagio do conhecimento. Além disso, © objetivo da Fngelopédie nio era apenas compor um inventitio de informagées ¢ eferéncias, mas também definir um mécodo coeso para reunirdados ¢ principiosainda a serem descobertos, de formaa compor tum ve:dadeito sistema unificado de eonecimentos, © DALENBERT Pliniary Oxcourse tote Eneytovosi, p47 2» DALENBERT Relininary Qscouse 0 the Encycoved, p47 Se esse modelo enciclopédica predominou 20 longo de toda aera moderna,” pores dizer que hoje ele no mais condiz com a ordem contextnal do mundo contemporineo, come bem atestou Italo Calvino ao adotar,em sua conferéncia sobre a multiplicidade, uma ontra noo de enciclopédia: a de um conjunto aberto, configurado cemo uma rede de conexées entre fatos, pessoas e coisas do mundo, na qual no peasivel “uma coualdade que nfo seja porencial, conjetural, tnultiplice’* O que seria, segundo ele, a marca dos romarces enci- clopédicos modernos, a exemplo de Bourand e Pécwher, de Flaubert, O homem sem gualidades, de Robect Musil, £ de Jumes Joyce, dentre outros. Pode-se dizer que Umberto Eco foi um dos primsi ‘mensionar essa nogio de enciclopédia enquanto combinatéria regica por uma *semiose ilirsirada” e comparivel a um labirinto exten- sivel 20 infinito, Para ele, no cabe mais tomé-la como um sistema que encerra de mado univoce ¢ suficiente um universe ondenado, mas sim como um modelo capaz de fornecer regras. “em geral undo algumn critétio provisério de ordem’, se busque dar sentido a um munda desordenado ou cujos critérios de ordem nos escapam, Um madelo que nao se presta, como o do diciond ines © Foonegens Wake, fos a redi- anfopes’, para que, “s io, 4 impossivel fungio de “hierarquizar de modo sinico propricclades, os semas’, o incontrolivel daquill que buses € incontroverso as marcas semanticas, mas incorpora o préprio forma mapear e catalogar.* fe, cxro.oqueroneou conece port thea, nasaperas sets pnsipose conetasfunkement dade opines, ua cBnvie das Cénea, 0 Daf que, coma dispositive eaxondmico, aenciclopédia, sob tal acepgao, se oferega como o maisadequdo para uma era inclassiicivel coma 2 do presente, na qual as fronteiras encre culeuras, aguas, genes, ares € campos disciplinares se entiecruzam, abrindo-se cada ver maisao hibrido, ao hererogéneo, Uma eraem que rapider vam © desestabiliearn © a multiplicidade de informagies desautos cxplicitamemte a prSpria ideia de classificagao, demandando uma reconfigurasio do conhecimenco a partir de uma perspectiva mais aberta, dialégica ¢ até mesmo paradoxal. Como se tndo, hoje, estivesse sob o signo inquierante do inclasifctvel, do omirorrinco. Assim, sob 0 impacto desi nova ordem (ou desordem) contemporinea, a enciclopédia abancona as pretensées de ser 0 inventério completo de todas os saberes sobre as coisas do mundo paca ser um espago mével de articulagzo, combi assumindo um carter menos totalizante que cartogrifico € instaurando uma ciiculagao livre e descentrada das conhecimentos. Como afirma Olga Pombo, & visio universalista do. projero moderno de enciclopédia, sucede pois "um modelo de conhecimento {que funciona por blocos, por Fragmentos, fundado nas nogies de ulriplicidades, bifurcagdes, mediagdes,irradiagbese derivas’.* Nao 2 eoa esse modelo tem instigado a imaginagio de artista, escritores «€ te6ricos contemporiineos Mém dos autores citados por Calvino (ele préprio um esctivor encictopédico), Jorge Luis Borges, Georges Perec, thu Bispo do Rositio e Haroldo de Campos foram outros que ctiacam ~ cada um 4 sta maneira ~enciclopédias imaginérias na forma de “inventétios do mundo”, gakixias, bibliocecas labirinticas, planetas ficticios e lies monstruoses, Para nie mencionar o cineasta Peter Greenaway, que ago invensio, redimensionou seu trabalho enciclopédico a partir do uso estensivo clas novas tecnologias, estruturando-o enguanco uma combinatsria de arquivos que se espalham ¢ entrecruzam em diferentes espacos POMBO. 13a 6 heotece. Ope mmididticos. E, nesse sentido, amalgamou as nogées de enciclopédia chipertexto, fizendo jus assertiva de Olga Pombo, segundo a qual a “rede” ou a “rede das redes” nfo deixa ser. hoje, “a po-enciagio uiltima da ida de enciclopédia’.” Colegdes, listas, inventarios ete. Além do impulso enciclopédico, virias outras experiéncias ctiativas com as classificagées atravessam a literatura ¢ as arces contemporineas, Interessados nos jogos taxondmices atentesds ironias| da ordem, néo sie poucos os autores que tém recortido também a coleoses, lisas, catélogos € inventétios poéticos para a composicao de suas obras. Hé, inclusive, os que rectsam a monumentalidade da ordem enciclopédica em prol de espacos menos entities, e por vezes mais fntimos, para a recolha de saberes sobre as coisas, como € 6 caso exemplar de Carlos Drummond de Andrade, poeta afeito 20 gesto inventariante, mas que privilegia 2 colecio em detrimento da “maiquina do mundo” cepresentada pela enciclopédia No que tange especificamente 2 ideia de colegio, pode-se dizer que dla no deixa de manter com a nogio de enciclopédia uma relago ao mesmo tempo de afinidade e contraposicZo, Sea enciclo- pédia abre-se a0 inconcrolivel ¢ trasborda os limites de sua prépria ordem, a colecio se constitui gracas aos limites de sua circunscrigao. Se a enciclopédia tend ao infinito, na colegio, come aponca Susan Stewart, “a ameaga do infinito sempre encontra a articulagao dos limites" Isso porque a colegio tem a fungi inerente de desafiar © cos ou, como diria Walter Benjamin, em “O colecionador”, cempreende a luta contra a dispersio”,” visto que o colecionador, a0 ‘Coptdlis ehipertexto. oreo.» n tonging. 0.158, regiserar/eatalogar as coisas, etira-as do estado dispersivo em que se encontram no mundo as recontextualiza nam outro espago, regido por leis peéprias Sabe-se que a histéria do ato de colecionar &a narrativa de como fs seres humanos se apropriam, na esfera particular, dos sistemas de classifica actimuloaté a ordenagio simétrica, de feigto estética, 0 colecionismo €amplo e complexo. Tendo se associado, nos séculas anteriores, 10 exercicio enciclopédico, vide o “surto colecionaclor” renascentista que So que herdaram. Podendo tomar distintas funcies, desde resultou na proliferagso das heterdclitos ‘armérios de curiosidade”, cleesteve ainda atrelado, enquanto cepositétio de raridades e objetos de arte, 4 ideia de prestigia social e econdmica, 0 que propiciou, inclusive, o surgimenco dos museus no mundo moderno, E-riesmo quando tomado como pritica individual, acomodado nos limites da intimidade, o geste colecionador nao é ficil de ser abordado em sua complexidade, visto que pode ser tomado tanto como pulsio patoldgica, fetiche, quanto como exercicio afetivo efou estético.” Enquanto recursa taxondmico, 2 colegio tende a criar sua préprias regras ¢ prineipios, de acordo comasinquictaybese obsessies do colecionador, sobrerudo quando o valor aetivo ou estéico pre- domina. Neste caso, ela é, como afirmou Susan Stewart, “uma forma dearte como jogo”. jf que sua funcio deixa de ser “a restauragao de um concexto de origem pata ser a ctiagao de um novo contexto”, por tum processo de deslocamento.™ A colecao estd, portanto, rida por prinetpias maisespacias que temporais, podendo se circunserever & caixa, 20 élbum, a0 armétio © A scrialidade das gavetas, num jogo de dentro e fora, exposigio & ocaltamento. Gracas a sua potencialidade de recolher as coisas e salvécles da dispersio através do deslocamente, sla assume inclusive uma funcio de arquivo, de dimensio memorialistica, convertendo-se numa espécie de antidoco contra © esquecimento ou, come bem a nates fo steeds, num vis be A tata ca clagio dos STEWART, On Longing ‘exert Pri Blom no cefiniu Philipp Blom, em “um ceatro da meméria, uma draratizagio ceuuma reie-en-scene de passados pessoris e coletives, de ume infancia relembrada e da lembranga apésa morte” F aque se pode ver tanto, rma poesia de Borges ¢ de Drummond quanto nos filmes de cineasta Eduardo Coutinho ¢ nas asvemblages do artisea Arthur Bispo do Rosério, como tentazei mostrar nos capitulos seguintes. A lista, por sua vee, € 0 principio constitutive do inventirio e do caidlogo, alé dado o caréter serial que a atravessa, podendo ainda ser considerada © ponto de pactida para a configurasao da ordem enciclopédica ‘Como recurso classificatdrio, a lista foi uma das primeiras formas de mancer um estreito parentesco com a coles0, de escrira de que se tern noricia nas civiizagées alfabetizadas, usada rio apenas para dar um espago seguro ¢ duradouro aos comes de pessoas e caisss, como também pata arquivar acontecimentos, sit goes, atividades, objetos, animais e pertences em geral. O que nao significa que ela nao renha existido cambérn nas culeuras omis. Jean, Pierre Vernant trata disso, 20 mencionar os catélogos que cpatecem ros poemas épicos, todos com extensas enumeragoes de deuses, povos, pessoas, coisas ¢ lugares, as quais constiruem ‘arquivos de uma sociedade sem escrita, arquivos puramente lendirios, que nfo ccorresponddem nem 3s exigencias administrarivas, nem a.m desejo Jorificasto real, nem a uma preocupagio hiscérica’.** Ou sea, eSlogos integeatam oralidade, com um papel importante para a formagao cle uma escrita am os catélegos genealdgicas da Teogonia tadigio perpetuada pelos poctas da pré-alfabéeiea, como ate cde Hesfodo, os inventarios de navios ea lista de nereidas da Mads de Homero ~enumeragées oriundas da tradigo oral. Mesmo na prosa do Antigo Testamento, as lisas proliferam através das extensas relagbes cias, uibos, lugases, propriecades ete de nomes prdprios, descent As lists se afitmaram coma dispositive da escrita primeiramente nna forma de longas tras feicas de madeira, pedra, argila, pedacos de pano ou qualquer outro material sélido. Dentre as suss Fungi estavam desde a simples nomeagio das coisas até um levantamento aais ealbado delas. Como explica Jack Goodly, listas admin fanerdrias, literdrias, religiosas¢ lexicais proliferaram em diferentes culeuras antigas, ¢ algumas jf funcionavam como provodicionsrios lopédias embriondrias, voltando-se para o vasto campo de observagées astronémicas, climéticas, medicinais. Outras, de cardeer lidieo ou diditico, j consistiam no levancamento de nomes de pessoas cou coisas comegados com uma decerminada letra do alfabeto, Enfim, quando casas listas erm reunidas em um mesmo espago, elas se tomavam arquivos institucionalizados™ Pode-se dizer quea lisca assenta no jogo entre descontinuidade e continuidade. Fla pode set lida em diferentes diregées, € 0s itens que a compcem podem ser ordenados segundo varios critérios de classificagio, como 0 numérico, 0 alfabético, © sonore € 0 hierérquico, Se a continuidade se inscreve na ordem sequencial, a descontinuidade se dé na falta de um fluso discursive, na falta de conectivos entre os itens. Por ser um recurso de classiticacto, 20 mpre exclai outros, dispondo ~ em certos incluir alguns itens, elas «sos 0s elementos em ordem hierdrquica, na qual os do cope sio considerados superiores aes inferiores.”” Ademais, sua flexibilidade permice a insergio e subsragio de elementos na relagio que a cons- tiruiu, sem que isso prejudique sua estrutura, Seus limites sio méveis, sem deixarem de obedecer uma exigéncia de comeso e de fim. 20 litera, a fungio butocrética que a lista ad quiria a0 longo dos tempos é minada pelo fico de clase desviar da ordem hierirquice para entrar na esfera do arbitnitio, do subjetivo c do conjecural, E 0 que evideneiam, por exemplo, as listas de Sei Shonagon, escritora japonesa do século 10, que estruturou a maior partede seu didtio, conhecide come O fre decabeceina, em listas de coisas agradivels, desagradiveis, entediantes, magnificas, iritantes, Ne esfera da cr num total de 164. Autores mais recentes, come Wale Whitman, James Joyce € Jorge Luis Borges também fizeram da lista artficios instigantes de expressio postico-narcativa levando as potencialidades caxondmicas desse recurso &s tiltimas consequéncias. Enciclopédias, colegdes, listas € inventitios $40, poranto, obseante indissocidveis e se entrelagam de mancirs intrfnsec suas diferenges enquanto procedimentos de classificagto. Se a lista significa uma relagio de aomes de pessoas e coisas, cizcunserevendo- -se predominantemente & esfera da palavra, da inscrigao simbolica, inventitio é mais gendrico, por ebranger tanto os nomes quanto as coisas, constituindo uma espécie de levantamento exaustivo dos itens que incegram um dado conjunto ou accrvo. Jéa colegio & uma forma mais especifca de ajuntamento, por incluir iteas que mancém necessariamente uma reagio entre si, dado queso objews da mesma nature ou de caracteristicasafins. Q inventério pode inchuirlisas € colegées. Colegdes ¢ inventdries podem ser transcritos em listas, adquitinde formas de catalagos, cadastios e ichrios. Listas podem compor uma colecao de palavras. Ea enciclopédia € o cerrit6rio por exceléncis desse conjunto de dispositivos taxondmicos. Tados cles, de cardter mével eintercambisve, indiciam a diversidade de formas com que buscamos organizar a ordem desondenada da vida, EHONAGON, The Plow Bok

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