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Tomaz Tadeu da Silva DOCUMENTOS de IDENTIDADE itroducéo as t dew da Silva 999 by Tomaz Tad CAPA . go sobre as pinturas “The teacher (sub a)” « ‘onseca, COMPOSE "T aduzidas com autorizacdo da artista, Jorre Aner rane’ de Marlene uN mini van den Boogerd, Barbara Bloor, a aa publicado pela editora Phaidon, CAO ELETRONICA ntos Ataide iposic' EDITORA' Waldénia Alvarenga Sa! REVISAO. . Roberto Arreguy Maia Silva, Tomaz Tadeu da _ Documentos de identidade ; uma introdugio as teorias do curriculo / Tomaz Tadeu da Silva. - 2. ed., 7* reimp. ~ Belo Horizonte: Auténtica, 2004, sss6d 156p. ISBN 85-86583-44-8 |. Educacao 2. Curriculos escolares. |. Titulo CDU 37 371.214.1 2004 Todos os direitos reservados pela Auténtica Editora. 0 poderd ser reproduzida, seja por meios mecinicos, sem a autorizagio prévia da editora Nenhuma parte desta publ eletrénicos, seja via cOpia xerografi AUTENTICA EDITORA Rua Sto Bartolomeu, 160 — Nova Floresta — Belo Horizonte/MG 31140-290 — PABX: (55 31) 3423 3022 www.autenticaeditora.com.br e-mail: autentica@autenticaeditora.com.br Sumario 1. INTRODUGAO Be et ee cor Il, DAS TEORIAS TRADICIONAIS AS TEORIAS CRITICAS DN EUROS erie Mel ga at MER Col Or oleic Onde a critica comeca: ideologia, reprodusio, resisténcia fore R ee teh alent ee eC Cote eeu es eR aa up aclaates Dee Oe a Ree © curriculo como construcio social: a “nova sociologia da educacao” lore ene te OR eae ote eee te Ret Real cor Ill. AS TEORIAS POS-CRITICAS Diferenca e identidade: o curriculo multiculturalista [epee ee eee Cue O curriculo como narrativa étnica e racial eee eM e e og nn ee een ee ere ee eR Rao Ue arene St Os Estudos Culturais e 0 curriculo eee ee nc) Waste) Cnet Ce CE ae eC font eae ee OR meter aa Sa Pag eet Teele ge) yal 4 37 coy Et) 57 Cy 7\ 77 ch ci oad it) ian fe iy) LE Ried ee) eT) Quem escondeu o fr Embora nao constitua propriamente uma teoria, a nocdo de “curriculo ocul- to” exerceu uma forte e estranha atra- géo em quase todas as Perspectivas criticas iniciais sobre curriculo. A nocio de curriculo oculto estava implicita, por exemplo, na analise que Bowles e Gintis fizeram da escola capitalista americana. Aqui, através do “principio da correspon- déncia”, eram as relagdes sociais na esco- la, mais do que seu contetido explicito, que eram responsaveis pela socializagao de criangas e jovens nas normas e atitu- des necessarias para uma boa adaptagao as exigéncias do trabalho capitalista. Mes- mo que nao diretamente relacionada 4 escola, a nocao de ideologia desenvolvida por Althusser na segunda parte de seu famoso ensaio, A ideologia € 0S aparelhos ideolgicos de estado, apontava, de certa forma, para uma nogao que tinha caracte- tisticas similares As que eram atribuidas a0 “curriculo oculto”. Como lembramos, Althusser fornecia uma definicao ee a Ologia que destacava sua dimenséo pratt a, material. A ideologia, ness definicao, 7 i | urriculo oculto? expressava-se mais através de rituais, ges- tos e praticas corporais do que através de manifestacdes verbais. “Aprendia-se” a ideologia através dessas praticas: uma de- finigiio que se aproxima bastante da defi- nigéo de curriculo oculto. Na teorizacio de Bernstein, por exemplo, é através da estrutura do curriculo e da pedagogia que se aprendem os cédigos de classe. Mas & claro que 0 conceito de curriculo oculto se estendeu para muito além desses exem- plos, sendo utilizado por praticamente toda perspectiva critica de curriculo em seu periodo inicial. Apesar dessa utilizagdo critica, 0 con- ceito tem sua origem no campo mais con- servador da sociologia funcionalista. ° conceito foi talvez utilizado pela primeira vez por Philip Jackson, em 1968, no livro Life in classrooms. Nas palavras de Jackson, “os grandes grupos, a utilizagao do elogio e do poder que se combinam para dar um sabor distinto 4 vida de sala de aula coletivamente formam um curriculo ocul- to, que cada estudante (e cada professor) deve dominar se quiser se dar bem na escola”. Caberia a Robert Dreeben, num livro intitulado On what is learned in scho- ol, ampliar e desenvolver essa definicao funcionalista de “curriculo oculto”. Esses autores funcionalistas ja destacavam a determinacio estrutural do curriculo oculto. Eram as caracteristicas estrutu- rais da sala de aula e da situagdo de ensi- no, mais do que o seu contetido explicito, que “ensinavam” certas coisas: as relagdes de autoridade, a organizacio espacial, a distribuigao do tempo, os padrées de re- compensa e castigo. O que iria distinguir a utilizacao funcio- nalista do conceito daquela feita pelas pers- pectivas criticas seria, essencialmente, a desejabilidade ou nio dos comportamen- tos que eram ensinados, de forma implici- ta, através do curriculo oculto. Nessa visio, 0s comportamentos assim ensinados eram funcionalmente necessarios para o bom fun- cionamento da sociedade e, portanto, de- sejaveis. Na analise de Dreeben, por exemplo, a escola, através do tratamento impessoal que, em contraste com a familia, ela proporciona, ensina a nocdo de univer- salismo necessaria ao perfeito funciona- mento das sociedades “avangadas”. Em direc3o contraria, nas analises criticas, as atitudes e comportamentos transmitidos 78 através do curriculo Ocul sio vig, como. indesejaveis, Como uma distoresy dos genuinos objetivos da educacio, ma medida em que moldam as criangas @ io vens para se adaptar as injustas estryy,, ras da sociedade capitalista. O exempig mais claro é talvez 0 da analise de Bowles e Gintis. Aqui, a escola, através da cor. respondéncia entre as relag6es sociais que ela enfatiza e as relag6es sociais predo. minantes no local de trabalho, ensina as criangas e jovens das classes subordina- das como se conformar as exigéncias de seu papel subalterno nas relacées sociais de producio. Mas o que 6, afinal, © curriculo ocut to? O curriculo oculto € constituido por todos aqueles aspectos do ambiente es- colar que, sem fazer parte do currriculo Oficial, explicito, contribuem, de forma cita, para aprendizagens sociais rele- vantes. Precisamos especificar melhor, Pols, quais sio esses aspectos e quais si0 essas_aprendizagens. Em outras palavras, precisamos saber “o que” se aprende no curricula oculto e através di = i os", Para a perspectiva eri ea a nue ae aprende no. cutticulo seu ae mentalmente atitudes ¢- -So_funda- valores e orientaces. comportamentos, ~~. que permiitem que impli 5 e jovens se justem nte aS estruturas rian 01 mais Cm e as pau. "e antidemocraticas e, p: crane F jesejavels. da sociedade _capitalista " oucras coisas, © curriculo oculto em geral, 0 conformismo, Aa giencia. © individualismo. Em particular, as criangas das classes operarias apren- dem as atitudes proprias ao seu papel de subordinagao, enquanto as criangas das classes proprietarias aprendem os tracos sociais apropriados ao seu papel de dominagao. Numa _perspectiva mais ampla, aprendem-se. através do curri= la forma ensinas culo oculto, atitudes e valores propri- os de outras. ‘esferas sociais, como, por exemplo, aqueles ligados a nacionalida- de. Mais recentemente, nas analises que consideram também as dimensoes do género, da sexualidade ou da raga, aprende-se, no curriculo oculto, como ser homem ou mulher, como ser hete- rossexual ou homossexual, bem come a identificagio com uma determinada faga ou etnia. que, no Agora, quais so os elementos ra essaS ambiente escolar, contribuem Pa aprendizagens? Como ja vimos: é consti f ‘ontes do curriculo oculto 1S uma das. 19 Pel: as relacd Cte a Se administracio e os tun & alunos. entre 3 alunos, A cos fede. entre alunos e € outro dos componen ee od arava desea entes estruturais aprendem cerns « iangas e jovens Clais: © espaco rigid ieee ermeron Aa sala de aula ee organizado da nal ensina certas coi- Sas; © espaco frouxamente estruturado aa sala de aula mais aberta ensina outro tipo de coisas. Algo similar ocorre com 0 ensino do tempo, através do qual se aprende a pontualidade, o controle do tempo, a divisio do tempo em unidades discretas, um tempo para cada tarefa etc. O curriculo oculto ensina, ainda, através d is, regras, regulamentos, normas: ‘Aprende-se também através das diversas divisées e categorizacoes explicitas ou implicitas proprias da experiéncia esco- lar; entre os mais “capazes” € OS menos entre meninos € meninas, en- tre um. curriculo académico e um curri- culo profissional. & importante saber 0 que curriculo oculto quando um. Na teorizacao critica, riculo oculto implica, como ibilidade de termos um “capazes”s Finalmente, fazer com um encontrarmos momento de iuminac’o & Me Mennificamos uma dete! min ee consetindo oculto, A ideia € au" to perm Iguma coisa sa consciénc. 5 im desocultar 0 curr” cacia reside Pre que culo ada nesse conce' conscientes de a eseava oculta para nos: toda consiste, ¢aro. ¢' culo oculto. Parte de sua efi r.O csamente nessa sua natureza OCU i x esta implicito na nogao de curricl ae to éa ideia de que se conseguirmos culta-lo, ele se tornara menos eficaz, ele deixara de ter os efeitos que tem pela Unica razio de ser oculto. Supostamente 6 essa consciéncia que vai permitir alguma possibilidade de mudanga. Tornar-se COns- ignifica, de al- wR So ciente do curricula oc guma forma, desarma-lo. Reever WS 6. Obviamente, o conceito de “curricu- lo oculto” cumpriu um papel importante no desenvolvimento de uma perspectiva critica sobre o curriculo. Ele expressa uma operacao fundamental da analise so- ciolégica, que consiste em descrever os procesos sociais que moldam nossa sub- jetividade como 4 sas costas, zem nono. vonhe in into consciente. Ele condensa ne eve G40 socioldgica perma lems nente com os “invisiveis”, Com os processos Proce, rorgstso ocultos NA COMPreens. q i 5 1c tomos da vida cotidiang. 5) mum qu . ie Me, valvez, precisamente sua ay. % reside aa i tra, “curriculo oculto” Anocio de Consting, assim, UM instrumento analitico de ragio na opacidade da vida cog net 7 a da sala de aula, Ele COMO Que tornayg entinamente transparente aquilo cn normalmente a como. Opacg “yoild, agora eu vejo...”. Nesse Sentide, conceito continua sendo importante, ape. sar do predominio de um pés-estruturs lismo que enfatiza mais a “visibibilidagy- do texto e do discurso que a “invisibi, dade” das relagdes sociais. O conceito tornou-se, entretanto, crescentemente desgastado, 0 que, talver, c.cesPlique seu declinio na analise educacio. ‘nal critica. Houve provavelmente uma certa trivializagao do conceito. Algumas analises limitavam-se a “cacar” instancias do curriculo oculto por toda parte, num esforco de catalogacdo, esquecendo-se de suas conexdes com processos e relacies sociais mais amplos. Por outro lado, aidéia de “curriculo oculto” estava associada + um estruturalismo que iria ser progress" vamente questionado pelas perspectiss criticas. Se as caracteristicas estruw™ 80 qocurriculo oculto eram tao determ tes, na0 haveria Muito a fazer para a forma-lo. O participio pasado ugculto” — que adjetivava a palavra “¢ ur. culo” indicava que © ato de oculta. era resultado de uma aco impessoal, cat ora, estrucural. Ninguém, precisamen. te era responsavel por ter escondido 5 curriculo oculto. O que tinha constitui- do sua forga acabara por decretar seu en- fraquecimento como um conceito importante da teorizacao critica sobre curriculo. Finalmente, numa era neolibe- ral de afirmagao explicita da subjetivida- de e dos valores do capitalismo, nao existe mais muita coisa oculta no curriculo. Com aascensao neoliberal, 0 curriculo tornou- se assumidamente _capitalista. Leituras SANTOME, Jurjo T. EI curriculum oculto. M Morata, 1995. SILVA, Tomaz T. da. “A economia culo oculto”. In Tomaz T. da Silva ducagdo. Porte ladrid: politica do curr 0 que produz € 0 que reproduz em Alegre: Artes Médicas, 1992.

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