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O homem e sua missão 6

“Ninguém é profeta em sua terra.”

Se do exame analítico dos fatores psíquicos e do estudo de alguns ca-


racteres peculiares da personalidade pudéssemos extrair um conceito
lógico da vida, seríamos tentados a reduzir todo o confuso contingente
humano a alguns tipos fundamentais, que despontam periodicamente na
história do pensamento e da ação, para continuar uma obra já iniciada no
tempo, realizar um sonho secular ou sacudir um mundo adormecido nos
crepúsculos alternados da consciência humana.
Um estudo comparado desse gênero, conduzido com espírito isento de
preocupações escolásticas ou religiosas, constituiria certamente o melhor
corolário científico à doutrina, tão antiga quanto combatida, da reencar-
nação.
Substituem-se os elementos do corpo e se renovam as células, porém
persiste um centro vital, e com certeza também uma célula-mãe que o
procria e reconstitui, e perdura o caráter da atividade psíquica, o timbre
fundamental do indivíduo que responde diversamente conforme a diver-
sidade do ambiente de relação, mas que é sempre coerente consigo mes-
mo no seu ininterrupto vir a ser. No fluxo e refluxo da vida, o homem
esquece e se olvida, mas a sua história fica impressa nos extratos mais
profundos do seu ser, nas dobras mais recônditas do seu organismo vital,
e se revela veladamente como instinto, lei fatal de causalidade, a repre-
sentar aquilo a que os teosofistas chamam “carma”, a estabelecer a iden-
tidade substancial do indivíduo além dos limites da memória.
Com semelhante procedimento se está agora reconstruindo a História.
As tradições dos antigos enfraqueceram a memória dos pósteros e se
ampliaram com o horizonte fantástico da lenda. Horríveis cataclismos,
fragmentando a unidade primordial, deixaram na recordação das gentes
um sulco de terror, e os grupos isolados e dispersos perderam os exatos
contornos da realidade.
Assim deve suceder ao indivíduo nas crises parciais da vida e naquela
catástrofe final que se chama morte.
Hoje em dia a história do mundo e do homem não mais se atém quase
que exclusivamente à memória dos povos, mas se deduz do estudo das
estratificações telúricas, do patrimônio linguístico, dos resíduos contem-

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