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Outro pensador que vai ser destacado no IHGB será Von Martius, por elaborar
um método para a escrita da história do Brasil. Seus argumentos, assim como
os de Varnhagen, terão suas teses contestadas por historiadores mais
modernos, exatamente por trazer características da dominação portuguesa
como fundamentais para a formação da identidade da nação brasileira, além de
formular uma ideia que o historiador deve elabora uma história de um Brasil
unido, patriótico, centralizado. E é esse tipo de história que Varnhagem tentou
fazer.
Como toda tese elaborada, a obra de Varnhagem vai ter críticos que o avalia
positivo e outros negativamente. Para J.H. Rodrigues, A. Canabrava e P.M.
Campos, Varnhagem foi um grande historiador que se propôs e elaborou uma
obra com vasto cunho de informações sobre a colonização brasileira. Para o
IHGB, segundo o texto, esse autor era visto com reservas.
O autor José Carlos Reis faz uma justificativa à obra de Varnhagem, suscitando-
a no espaço e no tempo: o personagem era descendente direto de Portugal, vivia
em uma sociedade escravista, pertencia à oligarquia brasileira: então, sua obra
vai está embutida com todas essas características peculiares a classe que ele
representava.
A natureza que o português descrevia tinha muito verde e apenas isso , ele
desprezava e não valorizava por que não tinha abundância em minerais
preciosos A obra de Varnhagen é escrita num estilo enfadonho e monótono,
opaco e distante. Nele, busca-se todo o tempo a ocultação dos conflitos, dos
dramas e dos crimes de nosso passado. "Nessas linhas, sangue é palavra
proibida", como diria um poeta.
O suposto patriotismo do autor é unilateral e engajado: o Brasil defendido com
unhas e dentes é o da aristocracia branca e da família real. Sua teoria da
miscigenação racial comprova e defende um suposto branqueamento total da
população, o extermínio de índios e negros enquanto expressão fenotípica.
Logo, seu postulado é o da supremacia branca sobre os demais, sob o manto de
democracia.
Varnhagen defende que a independência política da nova nação brasileira não
pode significar o abandono do legado colonial e sim o aprofundamento dos
vínculos do Brasil (atrasado e bárbaro) com Portugal (racional e progressista).
Nosso futuro deve ser nosso passado aprimorado, aperfeiçoado: um Brasil
português erigido pelas aristocracias brancas e fomentado pela Coroa, que
agora já não é mais externa e sim interna. Aliás, é só por esse motivo que
Varnhagen defende e aceita como salutar o processo de independência: porque
ele fôra efetivado por um príncipe lusitano, pela Casa de Bragança. A
emancipação não veio contra a realeza mas sim pelas mãos dela própria. Agora
o Brasil era português, imperial e além de tudo independente! Caso as coisas
não se dessem dessa forma certamente reinaria em nossas terras o caos, a
fragmentação do território e o obscurantismo.
O olhar de Varnhagen sobre a história do Brasil é o olhar do estrangeiro, do
conquistador, do colonizador. Aos vencedores cabem todos os louros, aos
derrotados, silêncio. Inclusive a própria vitória militar é já indício de
superioridade, ela apenas confirma o já sabido. Para ele, os portugueses detêm
todos os elementos necessários para a edificação aqui de uma nação grandiosa
e bem sucedida, não havendo portanto motivos para resistências e rupturas.
História Geral do Brasil reforça os estereótipos sobre a fauna e a flora brasileiras,
aprofundando a descrição da Carta de Pero Vaz de Caminha no ato da chegada
dos invasores.
Segundo Varnhagen, nesse Éden os nativos são dignos de epítetos como
"gentes vagabundas" (outro estereótipo), "bestas falsas e infiéis, inconstantes,
ingratas, desconfiadas, impiedosas, despudoradas, imorais, insensíveis,
indecorosas e entrecortadas por guerras, festas e pajelanças." Poderá o futuro
e promissor Brasil ter nessa "alcatéia de selvagens" seu passado, seus pilares,
suas raízes? Jamais!, responde Varnhagen.
O presente e o futuro do país assentam-se ambos num outro passado bem
distinto, naquele que veio de fora para pôr fim à barbárie. A missão árdua,
evangelizadora e civilizatória legada por Deus aos portugueses seria justamente
a de dissipar o mal desta terra, levando "a palavra" e a cultura branca aos gentios
pagãos e antropófagos. As origens aborígines e primitivas precisam e devem ser
apagadas, para o bem da nação. O rei, a lei, a cruz, a paz e a instrução trouxeram
prosperidade às essas glebas, nos integraram, ainda que fosse necessário em
algumas circunstâncias o uso da espada.
Na verdade, afirma Varnhagen, foram os índios que atacaram os brancos
primeiro, comendo dois tripulantes dum navio que desembarcaram no Cabo de
São Roque em 1501: "Assim, a primeira ruptura e agressão entre os da terra e
os futuros colonizadores não partiu destes, os quais foram vítimas de traição e a
deixaram impunes." Foi nessa mesma expedição que o "cristão D. Nuno Manuel
batizou a costa brasileira com um calendário cristão nas mãos": Bahia de Todos
os Santos, Salvador, São Sebastião do Rio de Janeiro, São Vicente, Angra dos
Reis... Esculpiu-se no litoral brasileiro o perfil do império lusitano.
No que diz respeito ao desaparecimento avassalador de povos autóctones,
Varnhagen diz que não houve genocídio ou extermínio. Os mesmos foram
desaparecendo em virtude dos sucessivos cruzamentos, já que as índias tinham
declarada preferência pelos brancos, mais limpos, decentes e viris.
Com relação aos negros, História Geral do Brasil apresenta poucos comentários.
Varnhagen se diz "obrigado a consagrar algumas linhas a essa gente de braço
vigoroso".
Afirma ele que os africanos vindos como escravos fizeram muito mal ao país,
com seus "costumes pervertidos, seus hábitos indecorosos e despudorados,
seus abusos, vestuários, comidas e bebidas inadequados." Melhor destino
teríamos se utilizássemos a escravidão indígena ao invés da africana. Foi isso
que garantiu, por exemplo, o sucesso das missões jesuíticas, afirma. Nesse
aspecto, os jesuítas prestaram um desfavor à colonização pois com sua
pseudofilantropia impediram que os bandeirantes caçassem e escravizassem
índios. Tivemos então que importar os negros e seus males.
Varnhagen defendia ainda que o índio escravizado pelo português vivia melhor
que em estado de natureza (anarquia absoluta), assim como o negro cativo
estava melhor aqui que na longínqua e rústica África.
Foi durante o período da ocupação holandesa à região nordeste que Varnhagen
assinala que houve a verdadeira consolidação dos laços fraternos entre brancos,
índios e negros. A união das três raças para combater o inimigo comum
representou uma experiência ímpar em nossa história. Nesse embate contra os
infiéis holandeses, reafirmaram-se dois aspectos para Varnhagen: a sina
vitoriosa portuguesa e a opção de silvícolas e africanos pela colonização lusitana
cristã.
As rebeliões e conflitos da colônia contra a metrópole, Varnhagen os qualifica de
"impensados, ingratos e injustos." Lisboa sempre quis o melhor para o Brasil,
mesmo quando errou. Ele chamou o movimento conhecido como Inconfidência
Mineira (1789) de "planos aéreos de insurreição". É ele quem elege Tiradentes
como sendo o único rebelde de fato: "figura antipática, feia, espantada e
ambiciosa, que tinha se dado mal no exército e na mineração... A forca lhe deu
a fama que jamais tivera em sua vida medíocre".
Varnhagen achou mais apropriado ainda o sufocamento da chamada
Conjuração Baiana (1798), "um arremedo do horror da Revolução Francesa."
Era mais descabida e inadequada que a conspiração de Minas pois liderada por
brutos e incultos. Seus líderes foram severa e justamente punidos.