Curso de Direito
Rio de Janeiro
2016
MARCOS VINÍCIUS MIGON ARCHANJO
Rio de Janeiro
Campus West Shopping
2016
A INEFICÁCIA DAS FORÇAS DE SEGURANÇA PÚBLICA DO
ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RESUMO
A presente pesquisa tem como finalidade analisar como funciona o modelo de segurança
pública presente no Brasil, mais especificamente no estado do Rio de Janeiro. A principal
indagação é: Por qual motivo, mesmo com todos os esforços das forças policiais, não é
possível vermos uma diminuição nos índices de criminalidade e o aumento na sensação de
segurança? Com este intuito foi feita esta pesquisa bibliográfica para analisar como atuam as
duas polícias estaduais, expondo por quais motivos a grande maioria dos crimes não chegam
ao conhecimento das autoridades policiais e sequer são investigados. O objetivo deste
trabalho é demonstrar uma possível solução para este grave problema com a segurança
pública, sendo o ciclo completo de polícia um dos caminhos para que este objetivo seja
alcançado.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO
2
Polícia de Ciclo Completo. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Pol%C3%ADcia_de_ciclo_completo
Acesso em: 10 abril 2016
dever de investigar infrações penais, conforme a Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 (art. 144, IV, § 4º).
Desta maneira, sendo o fato tipificado como crime conhecido pela autoridade policial
através da notícia-crime, será verificado a procedência da informação prestada pelo
comunicante da ocorrência e posteriormente, concluindo a autoridade policial a existência de
elementos básicos para instaurar o inquérito policial, este o fará baixando a portaria que dá
início ao processo investigatório de apuração, colhendo provas e elementos para o
convencimento e promoção do Ministério Público, dono da ação penal.
Quando qualquer cidadão é vítima de um crime, a primeira coisa que vem em mente é
chamar a polícia. O grave problema que enfrentamos no Brasil é que a grande maioria da
população não sabe a diferença entre as polícias, muito menos saber quais são as atribuições
de cada uma. Vamos nos ater a atuação das duas policias do estado do Rio de Janeiro. Para
entender como elas funcionam, vamos analisar o caso concreto abaixo.
No cair da noite, um cidadão caminha tranquilamente pela rua a caminho de sua casa.
De repente ele é abordado por dois homens que chegam numa motocicleta. Em posse de uma
arma de fogo, um dos elementos desce da moto e ordena que o cidadão entregue todos os seus
pertences. Após isso o cidadão, ainda assustado, vê os homens se evadirem do local, sem nada
poder fazer. Ainda no local, este cidadão consegue ajuda de outras pessoas que ali passavam e
prontamente liga para a Polícia Militar, através do conhecido número 190, e informa sobre o
ocorrido.
No atual modelo de atuação das polícias e na melhor das hipóteses, o atendente do 190
irá solicitar informações sobre o local da ocorrência, características dos criminosos e do
veículo que utilizavam, informações estas que serão repassadas para as viaturas da Polícia
Militar que estiverem em patrulhamento pela área.
Por fim, o atendente irá fornecer o protocolo da ligação e informar que o cidadão deve
dirigir-se até a delegacia de Polícia Civil mais próxima para a lavratura do registro de
ocorrência. Chegando à delegacia de Polícia Civil, assim que chegar a sua vez de ser
atendido, o que em muitas delegacias pode demorar horas por conta da demanda, o cidadão
irá informar novamente todo o ocorrido para o policial civil que o atender.
Após ser ouvido, o cidadão irá assinar o termo onde constam as suas declarações e
levar consigo uma cópia do registro de ocorrência. Após o término do registro o delegado
responsável irá emitir um despacho, transferindo a responsabilidade do referido registro para
outro policial, solicitando que sejam feitas diligências para verificação da procedência da
informação e posteriormente decidirá pela instauração do inquérito policial ou irá suspender o
registro por falta de elementos mínimos para a persecução penal.
Agora vamos fazer algumas ponderações sobre o caso hipotético acima. Verificamos
que nesse primeiro momento não houve nenhum tipo de troca de informações entre a Polícia
Militar e a Polícia Civil. Se o cidadão dirige-se diretamente até a delegacia de Polícia Civil
sem ligar para a Polícia Militar, que é a polícia que está nas ruas em constante patrulhamento,
esta não teria conhecimento do ocorrido, logo, não irá deslocar nenhuma viatura para o local
para montar um cerco ou fazer uma profilaxia pela área a fim de localizar e prender os autores
do crime.
Da mesma maneira, se o cidadão não tivesse ido prontamente até a delegacia de
Polícia Civil logo após ter ligado para 190, esta também não teria conhecimento do ocorrido,
o que acontece muitas das vezes. Há vezes que o cidadão só vai até a delegacia registrar o fato
dias ou semanas depois do ocorrido, comprometendo gravemente as investigações.
Também há situações onde o cidadão que foi vitimado não comparece a delegacia de
Polícia para fazer o registro, fenômeno conhecido na criminologia como cifra negra3 (ou cifra
oculta), que ocorre quando os crimes praticados não chegam ao conhecimento das
autoridades.
Outro ponto importante é que mesmo no melhor dos cenários, onde o cidadão
prontamente informa o fato ocorrido ao 190 e comparece a delegacia para fazer o registro de
ocorrência, as diligências da investigação, que é competência da Polícia Civil, só serão feitas
3
O termo cifra negra (zona obscura, "dark number" ou "ciffre noir") refere-se à porcentagem de crimes não
solucionados ou punidos, à existência de um significativo número de infrações penais desconhecidas
"oficialmente".
dias depois, pois os plantões da maior parte das delegacias distritais, delegacias que atendem
ao público para registro de crimes comuns e ficam abertas 24 horas, não possui efetivo para
efetuar diligencias logo após tomar conhecimento do ocorrido, ou seja, mesmo na melhor das
situações a investigação só é iniciada dias após o ocorrido.
Normalmente estes tipos de registros são investigados em bloco, pois os autores deste
tipo de crime o praticam de forma reiterada, de modo que numa mesma noite duas ou mais
pessoas compareçam em sede policial para registrar um crime com o mesmo modus operandi
(maneira de agir). Muitas das vezes, por conta do local e cronologia entre a prática de um
crime e outro, é possível traçar com perfeição o percurso feito pelo autor do crime.
A grande verdade é que a maior parte dos crimes não são investigados pela Polícia
Civil, sendo prontamente suspensos logo após o término do registro até que novos elementos
probatórios apareçam. O que acontece na maior parte das vezes que um registro de ocorrência
de roubo de rua, como no exemplo acima, é solucionado, ocorre por conta de uma prisão em
fragrante, como diz Guaracy Mingardi.
[...] a maioria dos procedimentos instaurados tem a ver com prisões em flagrante
delito ou casos em que a autoria do crime é conhecida de imediato. Poucos casos são
investigados. Ou o crime chega resolvido na delegacia ou o procedimento acaba
quando da elaboração do Boletim de Ocorrência (BO). 4
4
MINGARDI, Guaracy. Política de segurança: os desafios de uma reforma. São Paulo: Perseu Abramo, 2013, p.
54.
Em 2009 a Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro - SESEG
criou o Sistema Integrado de Metas – SIM5. Seu principal objetivo é desencadear ações
integradas entre as Polícias Civil e Militar, além da prevenção e controle qualificado do crime
e estabelecer as metas para a redução da incidência dos Indicadores Estratégicos de
Criminalidade.
Através de um sistema baseado em Indicadores Estratégicos de Criminalidade, que
permite a criação de metas previamente estabelecidas de acordo com delitos escolhidos, a
SESEG monitora os resultados. Estes resultados são apurados mensalmente pelas Regiões
Integradas de Segurança Pública (RISPs) e Áreas Integradas de Segurança Pública (AISPs).
Após a análise, estas informações são transformadas em pontos que variam de acordo
com o alcance ou não da meta estabelecida para o mês vigente, em função de um peso
atribuído a cada indicador estratégico de criminalidade. As RISPs e AISPs que obtiverem
maior pontuação são premiadas.
Estes Indicadores Estratégicos de Criminalidade foram propostos pelo Governo do
Estado do Rio de Janeiro, após uma grande análise do fenômeno criminal. Tais indicadores
são compostos pelos crimes que, de forma geral, têm maior impacto na sensação de
insegurança da população, sendo eles: Letalidade Violenta (somatório do número de vítimas
de homicídios dolosos, lesões corporais seguida de morte, latrocínio e auto de resistência),
Roubo de Veículos, Roubo de Rua (somatório de incidências de roubo a transeunte, roubo em
coletivo e roubo de aparelho celular).
Cada Indicador Estratégico de Criminalidade do Estado possui uma meta a ser atingida
conjuntamente pela Polícia Civil e Polícia Militar, com o apoio da Secretaria de Segurança.
Essa meta ainda é desdobrada em metas individuais nas RISPs, AISPs e CISPs.
As metas são constituídas por três partes: objetivo a ser atingido, valor e prazo. E são
definidas periodicamente, mediante análises criteriosas de resultados históricos para
identificação de oportunidades reais de melhoria para o ciclo seguinte. Essas metas são
calculadas com base no percentual de redução de cada um dos indicadores monitorados pelo
sistema, aplicado sobre o desempenho do Estado, RISP e AISP, em igual período do ano
anterior.
Na teoria o SIM seria uma das saídas para estreitar a distância existente entre as duas
forças policiais, pois além das duas polícias cumprirem seu papel constitucional de prevenir e
diminuir a incidência dos crimes que mais incomodam a população, os policiais que integram
5
Sistema de Metas - SIM. Disponível em: http://www.rj.gov.br/web/seseg/exibeconteudo?article-id=1349686
Acesso em: 24 de abril de 2016.
as AISPs que conseguem bater a meta semestral recebem uma premiação, que poderia ser de
até R$13.500,00 reais para a AISP que ficasse em primeiro lugar.
Entretanto, o que verificasse é que o SIM virou uma verdadeira “caça ao tesouro”,
onde policiais passaram a fazer de tudo para sua AISP se mantivesse dentro da meta. Por
outro lado, quando a meta estoura, tudo volta ao normal. E para piorar, com a atual crise
financeira no estado do Rio de Janeiro, as premiações não são pagas desde o primeiro
semestre de 2015.6
4. 2.6 A - Estruturar os órgãos policiais federais e estaduais para que atuem em ciclo
completo de polícia, delimitando competências para cada instituição de acordo com
a gravidade do delito sem prejuízo de suas atribuições específicas. (868 VOTOS) 7
6
OLIVEIRA, Pamela. Pagamento do bônus por cumprimento de metas. Disponível em:
http://sospoliciaismilitares.blogspot.com.br/2015/10/bonus-por-cumprimento-de-metas.html Acesso em: 25
de abril de 2016.
7
Princípios e Diretrizes da 1ª CONASP. Disponível em: http://justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-
publica/conasp/atos-do-conselho/anexos-1/relatorio-gt-pricipios-e-diretrizes-da-1o-conferencia-nacional-de-
seguranca-publica.pdf Acesso em: 20 de abril de 2016.
Esta 1ª Conferência teve bastante representatividade, onde ficaram claro todos os
desejos e expectativas do povo no que diz respeito à estrutura do modelo de segurança pública
do nosso país. Entretanto, passados oito anos desde sua definição, nada mudou.
Podemos dizer que o início dessa discussão sobre o ciclo completo de polícia está de
certo modo ligado à complexidade da sociedade contemporânea, pois a forma atual de atuação
policial, onde temos duas “meias-polícias” estaduais, não atende aos anseios da sociedade já
faz algum tempo, propiciando este sentimento de insegurança.
E quando o cidadão precisa da polícia, ainda movido pela indignação por ter sido
vítima de algum tipo de crime, acaba sofrendo novamente para conseguir comunicar o fato a
quem tem o dever de preveni-lo e investigar.
Alguns especialistas dizem que o atual modelo bipartido tem como o objetivo a maior
eficiência por conta da especialização. Entretanto, o que vemos é uma espécie de disputa entre
as duas instituições, promovendo a morosidade e desperdício por conta da necessidade de
manter duas estruturas com modos de atuação diferentes e desordenados. Além disso, há uma
grande vaidade dentro das duas corporações.
A Polícia Civil acusa a Polícia Militar de usurpar sua função no que diz respeito à
atividade investigativa quando utiliza de seu Serviço Reservado (P2) para apurar crimes
praticados por policiais militares, onde muitas das vezes há participação de pessoas que não
fazem parte dos quadros da Polícia Militar.
Da mesma maneira, a Polícia Militar acusa a Polícia Civil de usurpar a sua função de
policiamento ostensivo por conta das unidades de operações especiais, como a Coordenadoria
de Recursos Especiais – CORE da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, por utilizarem
uniformes e armamentos típicos militares.
8
GUIMARÃES, L. A. B. Modelos de polícia: a polícia de proteção ao cidadão/comunidade. p. 8. Disponível em:
https://www.yumpu.com/pt/document/view/34927029/modelos-de-polacia-a-a-polacia-de-proteaao-ao-
cidadao Acesso em: 20 de abril de 2016.
Não estamos nem entrando no mérito da existência do Grupo de Atuação Especial de
Combate ao Crime Organizado – GAECO, do Ministério Público, onde as investigações são
feitas por promotores públicos com o auxílio de policiais militares adidos a esta instituição.
Um dos temas que tem sido amplamente discutido, havendo vários projetos de
emendas constitucionais versando sobre o assunto em andamento no legislativo, são com
relação unificação das polícias civil e militar.
Analisando o problema da falta de sinergia entre as instituições, parece ser uma ótima
solução, pois em tese teríamos uma polícia de ciclo completo. Ledo engano pensar assim, pois
como afirma Balestreri, não se cria uma nova polícia de uma hora para outra.
Podemos um dia ter uma polícia única? Podemos e seria até interessante. Mas isso,
no Brasil, precisa ser construído. Não é acabando com a Polícia Militar e passando
para a mão da civil que vai mudar, por decreto, qualquer coisa da cultura de ambas
instituições. 9
Outro tema que vem sendo muito debatido é com relação à desmilitarização das
polícias militares. A grande dúvida é saber como isso seria feito. Será que se policial militar
ganhasse um distintivo e, de um dia para o outro, deixasse de usar uma farda com patentes
militares seria o suficiente para melhorar sua atuação, atendendo ao clamor por segurança da
sociedade. É uma ideia extremamente leviana achar que essa simples mudança faria milhares
de policiais, alguns que integram a corporação antes mesmo da Constituição Federal 1988,
mudarem sua forma de agir.
E exatamente por não operarem pelo ciclo completo de polícia, iniciou-se esse
processo de concorrência entre as polícias, enfraquecendo as instituições por conta dessa
necessidade de ambas buscarem de forma individual a promoção de um serviço de segurança
pública mais efetivo. A utilização do ciclo completo de polícia viria a atender aos anseios da
9
BALESTRERI, R. B. Direitos Humanos: Coisa de Polícia – Passo fundo-RS, CAPEC, Paster Editora, 1998, p. 31.
Disponível em: http://www.ucamcesec.com.br/arquivos/coringa/DH_coisa_de_policia.pdf Acesso em: 20 de
abril de 2016.
sociedade, tornando possível que as forças policiais cumpram seus verdadeiros papeis
constitucionais de forma mais eficaz.
Mesmo com todo o clamor e desejo por parte sociedade em ter mudanças de modo a
ter uma segurança pública que atenda a população de forma célere e eficaz, melhorando a
qualidade de vida de todos, o implemento do ciclo completo de polícia, assim como outras
propostas, esbarra no interesse e vaidade de algumas classes.
No Rio de Janeiro, por exemplo, um Oficial da Polícia Militar ingressa nos quadros da
PMERJ através de concurso público a nível de ensino médio. Após três anos de CFO - Curso
de Formação de Oficiais na Academia de Polícia Militar Dom João VI10 (ou APM D. João VI,
antiga Escola de Formação de Oficiais - EsFO), ele sai como Aspirante a Oficial. Logo após o
estágio probatório, forma-se e recebe a patente de 2º Tenente, passando por 1º Tenente,
Capitão, Major, Tenente Coronel, até enfim chegar ao posto máximo da carreira, que é o de
Coronel.
Também no estado do Rio de Janeiro, um Inspetor de Polícia ou Oficial de Cartório
Policial (cargos distintos, mas que fazem a mesma coisa) ingressam nos quadros da Polícia
Civil através de concurso público onde se exige conhecimentos jurídicos e nível superior.
Após o respectivo curso de formação na Academia Estadual de Polícia Sylvio Terra –
ACADEPOL11, que possui uma carga horária de 840 horas, passa a integrar os quadros da
Polícia Civil na 6ª Classe do respectivo cargo. Durante a carreira, por merecimento ou
antiguidade, irá passando pelas outras classes, até chegar à primeira classe do cargo, onde
recebe o nome de Comissário de Polícia.
Dentro da Polícia Civil também existe o cargo de Delegado de Polícia, que, conforme
disposto na própria constituição, é uma carreira a parte que possui a prerrogativa de direção
da instituição, tendo seu provimento através de concurso público específico com exigência de
nível superior em Direito.
10
Academia de Polícia Militar Dom João VI. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Academia_de_Pol%C3%ADcia_Militar_Dom_Jo%C3%A3o_VI Acesso em: 20 de
abril de 2016.
11
Academia Estadual de Polícia Sylvio Terra - ACADEPOL. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Academia_Estadual_de_Pol%C3%ADcia_Silvio_Terra Acesso em: 20 de abril de
2016.
Não é muito difícil entender o imbróglio que gira em torno destas duas instituições,
pois numa possível fusão entre as polícias, como seria feito a redistribuição dos integrantes de
cada força? Um Coronel PM seria transformado em Delegado do dia para a noite ou seriam
equiparados aos Comissários de Polícia, perdendo assim o seu poder de direção sobre a tropa?
Além disso, seguindo o raciocínio do implemento do ciclo completo de polícia, muitos
delegados levantam a bandeira de que um Oficial PM não tem legitimidade e conhecimento
jurídico para apreciar um fato tipificado como crime e lavrar o respectivo registro.
E nem entramos na discussão sobre a lavratura de um Auto de Prisão em Flagrante -
APF. Em uma situação onde policiais militares capturassem um cidadão pela prática de um
crime em flagrante delito. Eles deveriam apresentar o fato a um Oficial PM? A lavratura do
APF seria feita pelo Oficial PM ou nestes casos o preso continuaria a ser conduzido até uma
delegacia para que um Delegado de Polícia apreciasse o fato?
Para um Delegado de Polícia isto seria o fim do mundo, mas no atual momento não
haveria problema algum no fato de um Oficial PM, com o conhecimento jurídico necessário,
decidir se um fato é passível ou não da lavratura do APF. Na verdade o Oficial PM faria todo
o procedimento cartorário necessário, assim como seria feito numa delegacia, e apresentaria o
preso na audiência de custódia em até 24 horas, onde um juiz decidiria pela manutenção da
prisão.
Ficando comprovado que a prisão foi arbitrária ou entendendo que o réu pode
responder em liberdade, o juiz relaxaria a prisão. Da mesma maneira, o magistrado poderia
decidir que os pressupostos para que a prisão seja mantida estão presentes e faria a
convolação da prisão em flagrante para prisão preventiva, como já ocorre no APF lavrado
pelos Delegados de Polícia.
Partindo dessa linha de raciocínio, começamos a imaginar que se um Oficial PM com
o conhecimento jurídico necessário poderia ser parte legítima para decidir pela lavratura do
APF, por qual motivo um Inspetor de Polícia ou Oficial de Cartório, que são cargos de nível
superior e possuem conhecimento jurídico para o mesmo em razão do cargo, não seriam parte
legítima para decidir pela lavratura do APF?
Conforme foi demonstrado, há muita coisa para ser analisada e modificada, mas por
conta da vaidade e interesses particulares de uma minoria, os processos que buscam melhorar
a qualidade do serviço de segurança pública prestado à população, atendendo assim aos
anseios e clamor por justiça, ficam prejudicados.
9. CONCLUSÃO
O Ciclo Completo de Polícia demonstra-se como uma saída, mas não uma solução
completa para o problema com a Segurança Pública em todo país. Não adianta termos duas
polícias de ciclo completo no estado atuando de forma concorrente e não integrada.
No atual modelo de segurança pública a Polícia Militar fica simplesmente rodando na
rua sem objetivos, pois não tem acesso as informações que ficam centralizadas com a Polícia
Civil. Por outro lado, a Polícia Civil que detém as informações fica “presa” dentro das
delegacias, pois a maior parte do efetivo fica empenhada para atender a população e efetuar os
registros de ocorrência.
É importante ressaltar que não adianta simplesmente aumentar o efetivo das polícias,
pois, no caso da Polícia Militar, só estaríamos aumentando o número de viaturas rodando
pelas ruas sem objetivo e no caso da Polícia Civil, só estaríamos aumentando a capacidade de
atendimento à população, gerando mais registros de ocorrência que, em sua grande maioria,
são prontamente suspensos.
O Poder Legislativo deverá estabelecer em lei a forma de atuação de cada polícia, de
modo que todas as informações adquiridas sejam compartilhadas e estejam disponíveis entre
elas, além de regulamentar quais tipos de crimes que a Polícia Militar estará legitimada para
investigar.
Considerando que a Polícia Militar é a polícia que está em constante patrulhamento
nas ruas e que, em quase todos os casos, é a polícia que tem o primeiro contato com as
ocorrências, ela deveria ter a competência de investigar os crimes mais comuns pelo fato
destes crimes necessitarem de uma atenção e início imediato das investigações, de modo a
elucidar e encontrar a autoria do fato.
Com a Polícia Militar atuando nos crimes mais comuns a Polícia Civil passaria a ser
uma polícia mais especializada, deixando de ser apenas o “Cartório da Polícia Militar”,
passando a atuar com mais afinco nas investigações de crimes mais complexos, cumprindo
assim o seu papel constitucional originário de polícia judiciária.
Caso fosse identificada a correlação da prática de um crime comum que está sendo
investigado pela Polícia Militar com um crime ou investigação de competência da Polícia
Civil, caberia ao Poder Legislativo deixar uma possibilidade na lei que viesse a regulamentar
a atuação da Polícia Militar de modo que a Polícia Civil, entendendo ser de sua competência,
pudesse avocar para si toda investigação, assim como existe a Lei 10.446/02 que dispõe os
casos em que a Polícia Federal pode proceder com as investigações que a princípio são de
competência das polícias estaduais.
Por fim, acredito que com o implemento do Ciclo Completo de Polícia as polícias
estaduais passariam a exercer de fato seus papeis constitucionais, podendo assim dar a
resposta que a sociedade tanto cobra. Desta maneira, a população voltaria a acreditar no
serviço prestado pela segurança pública do estado, pois atualmente as forças policiais estão
mais empenhadas em serviços administrativos e burocráticos do que nas atividades de
investigação e elucidação de crimes.
10. REFERÊNCIAS