Você está na página 1de 182

GT 4: CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Este GT contempla trabalhos empíricos e teóricos sobre as seguintes questões: C&T e


desenvolvimento;

Tecnociência e capitalismo no século XXI; C&T na América Latina; C&T no Brasil; Inovação no
Brasil; Políticas Públicas de C&T e desenvolvimento territorial/local/regional; CT&I na visão
(neo)schumpeteriana; C&T segundo os estudos inspirados na Rede Sócio-Técnica; C&T e a
atualidade do Pensamento Latino-Americano de Ciência Tecnologia e Sociedade [PLACTS];
C&T e diversidades socioculturais; C&T e meio ambiente; Relações Universidade-Empresa;
Possibilidades e limites das Tecnologias Sociais.

Coordenação: Paula Casagrande Marimon (UDESC – SUL); Ana Cristina de Almeida Fernandes
(UFPE – NE); Rafael Dias (UNICAMP – SE).

1
SUMÁRIO

4 Como a educação não formal incorpora o auto-registro audiovisual no ensino e


popularização da ciência?

Raquel da Silva Santos

14 A Importância dos PCTs para o Desenvolvimento Local e Territorial: A


Experiência do Parque Tecnológico da Paraíba

Elis Regina Neves BARREIRO


Ângela Maria Cavalcanti RAMALHO

26 Pós-Graduação e Desenvolvimento: Uma Análise da Visão Contida no PNPG


Brasileiro

Cidoval Morais de SOUSA


Georgia Simonelly Lima NASCIMENTO

38 O Uso do Novo Paradigma Ambiental nas Ações do Marketing Ecológico: Um


Estudo de Caso de Uma Fábrica de Calçados na Cidade de Campina Grande-PB

José Austerliano RODRIGUES


Allice Montenegro LIMA

50 A contribuição das políticas de Ciência & Tecnologia e Inovação na dinâmica da


acumulação de capital no Brasil

Ester Cristina Bevian GRAF


Tatiane Thaís LASTA
Daniel Rodrigo STRELOW

62 Diversidade de abordagens na produção científica das ciências humanas e


sociais: uma breve revisão de literatura

Antônio Pereira Cardoso da Silva Filho


Thiago Lima Mathias
Cidoval Morais de Sousa
Ângela Maria Cavalcante Ramalho

74 Território e os Programas de Pós-graduação com Mestrado e Doutorado na


Área de Planejamento Urbano e Regional no Brasil
Christiane Fabíola MOMM
Marcos Antônio MATTEDI

2
86 Potencial Tecnológico da Universidade Pública e Sua Contribuição Para o
Desenvolvimento Regional e Local
Felipe Augusto Lopes Carvalho
Janiel Célio Dos Santos
Romário Lustosa De Oliveira
Elizabete Cristina Sousa Araújo
Simone Silva Dos Santos Lopes

98 O Setor de Tecnologia da Informação e Comunicação no Conjunto da Economia


Brasileira

Danillo Alves de OLIVEIRA


Ângela Cristina Trevisan FELIPPI
Cidonea Machado DEPONTI
Carlos Eduardo Ruschel ANES

110 Estratégias Locais de Desenvolvimento e Incubadoras de Empresas de Base


Tecnológica no Brasil

Maria Alice Lahorgue

123 Cisternas: Uma Tecnologia Social em Prol do Desenvolvimento

Maysa Porto FARIAS


Hermes Alves de ALMEIDA

135 Técnicas e Tecnologias no Contexto da Educação do Campo: análises sobre os


espaços e objetos técnicos na Pedagogia da Alternância

Giovanna Pezarico
Gilson Leandro Queluz
Maria de Lourdes Bernartt

147 Transmissão de Tecnologias Socioambientais para as Comunidades visando o


Desenvolvimento Sustentável

Wellington Marchi PAES


Maria Cristina CRISPIM

159 Inovação em empresas catarinenses: uma exceção no cenário nacional

Franklin Carlos Zummach


Ivo Marcos Theis

171 AS DETERMINAÇÕES E DESAFIOS DA PESQUISA: REGISTRO DAS IES DA


REGIÃO DO VALE MÉDIO IGUAÇU E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL

GUMBOWSKY, ARGOS
SIQUEIRA, EDITE

3
Como a educação não formal incorpora o auto-registro audiovisual no
ensino e popularização da ciência?1

GT4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional

Raquel da Silva Santos – Instituto Nacional do Semiárido (Insa)

Resumo

O presente artigo apresenta em linhas gerais alguns dos pressupostos que


norteiam o projeto piloto Semiárido em Tela realizado em Nova Palmeira –PB
pelo Instituto Nacional do Semiárido (Insa). O objetivo principal do projeto é
transmitir e re-pensar a ciência através da formação em auto-registro
audiovisual. Através do estudo sobre popularização da ciência e metodologias
participativas tentou investigar como a utilização de ferramentas da
comunicação colaboram no ensino e aprendizagem da ciência e na promoção
de um re-conhecimento sobre um semiárido de riquezas e saberes em espaços
não formais de educação.

Palavras-chave

Popularização da Ciência & Tecnologia; Semiárido; Educação; Cinema

Texto do trabalho

O cinema foi inventado em 1895 na França pelos irmãos Lumière para fins
científicos, a partir da criação do cinematógrafo, com intuito de estudar a
formação de uma imagem. No Brasil, ele foi trazido por Affonso Segretto em
1898. As primeiras imagens projetadas tanto em Paris como no Rio de Janeiro
eram o cotidiano dos meios de transporte: na Europa a chegada do trem em
uma estação, aqui os navios se atracando no Porto. O cinema nessa época era
fonte de divulgação cultural da sociedade. A maioria dos realizadores do início

1
Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES,
Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014

4
do século XX era fotógrafo que se convertera em cinegrafista. E a
predominância nas décadas de 10 e 20 no Brasil era uma produção intitulada
de cinema natural, com a produção de documentários e cine-jornais. Desta
forma, as câmeras cinematográficas foram incorporadas ao material de
trabalho de antropólogos que viajavam pelo país para registrar e documentar
produções indígenas.

O documentário é um gênero do cinema que possibilita a quem produz registrar


leituras de realidades a partir de um olhar subjetivo. Em 1936, o governo
federal cria o Instituto Nacional do Cinema Educativo (INCE) onde são
produzidos séries de documentários rurais, de fauna e flora, de instituições e
de cerimônias oficiais, mas predominam os filmes científicos. Desde sua
invenção, o cinema está atrelado à ciência. Ciência entendida como conjunto
de saber adquirido que tem como finalidade explicar a realidade de forma
objetiva. A partir dos estudos de ilusão de ótica, luz e formação da imagem
invertida através da captura do olho humano é que se origina o cinema e este
se torna também importante instrumento de registro para a pesquisa científica.
As imagens são entendidas nesse contexto não apenas como espelhos de uma
dada mentalidade, mas como constituintes de dado imaginário e produtoras
dessa realidade social como enfatiza Bohnsack:

Nesta diferença (entre o desenvolvimento de uma compreensão através da


imagem em oposição a uma compreensão sobre a imagem) estão implícitas
hipóteses sobre a ação e a compreensão cotidiana que estendem-se às teorias
da ação, do conhecimento, da percepção e dos signos. Que nós
compreendemos o cotidiano através de imagens significa que nosso mundo,
nossa realidade social (gesellschaftliche Wirklichkeit) não é apenas
representada de forma imagética, mas também constituída ou produzida dessa
forma. (BOHNSACK, 2005. p. 3)

As imagens carregadas de símbolos e intenções são apresentadas diariamente


pelos meios de comunicação de massa e influenciam fortemente o imaginário
da população, interferindo em seus modos de pensar e agir. Quando se pensa

5
em semiárido, por exemplo, uma das primeiras imagens que vem ao
pensamento da maioria das pessoas é de uma região pobre e seca. Essa
característica está não somente ligada a construção imagética que a grande
mídia até hoje insiste divulgar, mas as políticas públicas voltadas à região.
Desde a criação do Departamento Nacional de Combate às Secas (DNOCS)
em 1945. Somente na década de 80 a partir das ações dos movimentos sociais
é que se inicia um novo olhar sobre o semiárido: o da convivência.

“Fatores como temperaturas elevadas, fracas amplitudes térmicas anuais,


solos pedregosos, curto período de chuvas e alto índice de evaporação das
águas, especialmente de açudes, barreiros e locais irrigados definem o
semiárido. No entanto, essas características não impedem a sobrevivência de
pessoas nessa região. A possibilidade de convivência com as secas é
condicionada por fatores sociais e políticos, cuja importância é pelo menos
igual, senão maior do que as condições climáticas” (REVISTA DE
ARTICULAÇÃO DO SEMIÁRIDO PARAIBANO – junho de 2001).

O cinema documentário, mais precisamente o auto registro audiovisual


documental, entendido como ferramenta para se ler e produzir realidades sobre
esse semiárido e o seu entrelaçamento com a ciência conceituada como um
conjunto de saberes que analisados e sistematizados permitem fazer leituras
desse contexto social econômico e político é o ponto de partida para o projeto
Semiárido em Tela apresentado neste artigo. O Semiárido em Tela foi um
projeto piloto, uma parceria entre o Instituto Nacional do Semiárido (Insa) e o
Cine Mandacaru, que ocorreu no período de agosto a novembro de 2013, no
município de Nova Palmeira, região do semiárido da Paraíba.

O diálogo entre o projeto Cine Mandacaru e o Insa teve início em fevereiro do


mesmo ano, em um momento importante para se colocar em prática as
concepções de popularização da ciência e tecnologia (C&T) que permeiam o
discurso e as ações do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI)
desde o lançamento do Livro Branco: Ciência, Tecnologia e Inovação (MCT;

6
2002)2. Na publicação algumas diretrizes para atingir os objetivos de
popularização da ciência e tecnologia são apontadas, dentre elas a educação
para a sociedade do conhecimento a partir do desenvolvimento de ações
específicas no âmbito da educação não formal e do ensino das ciências:

Induzir um ambiente favorável a um aprendizado permanente, difundir a cultura


cientifica e tecnológica na sociedade, incentivar o envolvimento dos meios de
comunicação na cobertura dos assuntos de CT&I; contribuir para modernizar e
aperfeiçoar o ensino das ciências; promover e apoiar a implantação de museus
e exposições da C&T (MCT, 2002, p.67)

A popularização da ciência e tecnologia é entendida para além de uma ação de


difusão da informação cientifica ou tradução da pesquisa em ciência e está
relacionada a uma perspectiva dinâmica análoga às relações e construções
sociais, como esclarece Lozano:

O que se entende por popularização da ciência e da tecnologia em um espaço


e um tempo determinado se encontra influenciado pela concepção que se tem
da ciência e da tecnologia pelas relações entre elas e a sociedade no seu
conjunto. Com essa perspectiva popularização da ciência e da tecnologia
aparece como um campo dinâmico, cujos conceitos, definições, objetivos,
estratégias e públicos são redefinidos de maneira constante (LOZANO, 2005b,
p.48).

A partir do entendimento conceitual iremos apresentar nesse artigo o resumo


do Projeto Semiárido em Tela em Nova Palmeira e demonstrar como o uso de
ferramentas tecnológicas comunicativas é importante para o ensino e
aprendizagem da ciência em espaços não formais e por que não dizer formais
de educação.

Semiárido em Tela

Atualmente, com o avanço e o fácil acesso às tecnologias novos sujeitos do


discurso surgem e utilizam o vídeo para se autodocumentar, produzir reflexões

2
Livro Branco é resultado da II Conferência Nacional de C&TI realizada em setembro de 2001 que
aproxima o debate entre ciência, tecnologia e sociedade.

7
e experiências singulares (BENTES, 2007). Em uma rápida pesquisa pelo
google, podemos encontrar inúmeros vídeos com este formato. Os grupos que
mais produzem tais vídeos são crianças e jovens que crescem em uma
sociedade cada vez mais tecnológica e imagética, mesmo àqueles inseridos
em zonas rurais também estão conectados em decorrência de programas
sociais de inclusão digital. A partir desse contexto, o projeto Semiárido em Tela
incorporou o auto-registro audiovisual documental em oficinas de formação
com objetivo de popularizar a ciência para um público que até então o Insa não
conseguia dialogar e construir uma imagem do Semiárido a partir da reflexão
sobre a prática de uma política de convivência e não de combate a seca.

Foram realizadas 35 oficinas com a metodologia de pesquisa ação onde a


construção de conceitos e técnicas audiovisuais foram construídas em conjunto
com os participantes, e a partir do conhecimento adquirido foram produzidas
por eles curtas-metragens sobre a região, a comunidade e o Projeto Plantas
Medicinais da Caatinga. A pesquisa-ação é então vista como principal
contribuição para a dinâmica de tomada de decisão no processo do Projeto
Semiárido em Tela. Ou seja, nesse processo há um reconhecimento do papel
ativo de cada um dos participantes durante as oficinas:

Para que uma ação seja realizável, não basta a vontade subjetiva de alguns
indivíduos. A ação proposta tem de corresponder as exigências da situação.
Tais exigências são conhecidas por meio da observação, da análise da
situação e por meio de uma ação das possibilidades. A ação é baseada em
descrição objetiva mas subjetivamente é assumida pelo conjunto dos
participantes que se comprometem na sua efetiva realização (THIOLLENT,
2011, p.108)

Além da pesquisa ação, as práticas realizadas tiveram como referência a


educomunicação que buscou possibilidades de intervenção social no sentido
de transformar a realidade de acordo com a vontade e as possibilidades do
próprio grupo. Procuramos vivenciar através da produção coletiva audiovisual

8
quais eram os entendimentos e desejos dos participantes em relação à sua
comunidade e a região onde estão inseridos:

“A questão da educomunicação busca ressignificar os movimentos


comunicativos inspirados na linguagem do mercado de produção de bens
culturais, mas que vão se resolver no âmbito da educação como uma das
formas de reprodução de organização de poder da comunidade, como um lugar
de cidadania, aquele índice do qual emergem novas esteticidades e eticidades
(modos de perceber e estar no mundo). (SHAUN, 2002. p 15)”

As oficinas do Projeto Semiárido em Tela iniciaram em três etapas, conforme


detalhado abaixo: 1) Articulação com autoridades e entidades locais e
regionais/Mobilização dos participantes. 2) Realização das oficinas,
subdivididas em módulos: Módulo I – Introdução ao fazer ciência e ao cinema:
Neste primeiro momento construímos com os participantes as definições de
ciência, semiárido e cinema. A ideia era compreender como os jovens e
educadores entendiam os termos e a relação que tais termos tinham com o
cotidiano de cada um deles.

Exposição dos desenhos feitos a partir do tema: Desenho feito por uma das educadoras a partir do
“Convivência com o semiárido” e discussão sobre tema “Convivência com o semiárido”.
a leitura que os moradores do semiárido tem
sobre sua própria região.

Módulo II – Pesquisa e Roteiro: Quais as histórias podem tornar filmes e por


que é importante contar tais histórias. Os participantes neste módulo aprendem
a investigar e aprofundar sobre determinado assunto para subsidiar a escrita
de um roteiro/guia para a produção do documentário. No caso das educadoras

9
da comunidade quilombola Serra do Abreu houve uma solicitação por parte
delas para que a construção do roteiro fosse feito com e na própria
comunidade.

“Acho que temos que conversar com seu Aécio, pois ele sabe de toda a história
sobre os escravos até chegar aos dias atuais. Podemos iniciar nosso filme com
os negros que fugiam pra cá, depois com o reconhecimento pela Fundação
Palmares”, (Vera Lúcia dos Santos Dantas, aluna do Projeto Semiárido em
Tela, setembro 2013). “E temos que contar como conseguimos dinheiro através
da venda de nossas panelas de barro. Vamos mostrar como se faz uma panela
de barro e como a dona Maria aprendeu com a dona Tetinha e hoje ela passa
para a Solange”, complementou Diana. “Eu poderia mostrar minhas plantações
também e de como conseguimos plantar mesmo no período seco”, (dona
Josefa da Silveira Santos, aluna do Projeto Semiárido em Tela).

Roda para a construção do roteiro do curta- Roteiro sendo construído em conjunto com toda
metragem documental da comunidade a comunidade.
remanescente quilombola Serra do Abreu, Nova
Palmeira –PB.

Módulo III – Produção de curta-metragem: todos os participantes com os


roteiros em mãos iniciaram a série de filmagens sobre os temas levantados por
eles. Cada um deles a partir de afinidade e interesse escolheu o que fazer
durante as filmagens: direção, fotografia, operador de boom, e produção.
Módulo IV – Edição e Finalização que consistiu na montagem e edição dos

10
curtas-metragens. A montagem foi feita pelos participantes após a finalização
das filmagens.

Cena sendo gravada do filme sobre a Filmagens do curta sobre os artesãos de Nova
comunidade remanescente quilombola Serra do Palmeira-PB que utilizam como matéria prima as
Abreu. madeiras da caatinga.

3) Após finalização dos curtas-metragens foi realizada a 1ª Mostra de Cinema


de Nova Palmeira. Os jovens e educadores apresentaram os resultados de
suas produções para toda a população de Nova Palmeira e aprenderam a
montar um evento de cinema em praça pública já que toda a organização foi
feita pelos participantes.

Mais de 400 pessoas estiveram presentes na Moradores assistem aos filmes produzidos
Mostra Semiárido em Tela em Nova Palmeira- pelos alunos do Projeto Semiárido em Tela.
PB.

11
Conclusão

O Projeto promoveu uma interação entre ciência, cultura e a arte, com maior
aproximação da Ciência e Tecnologia ao cotidiano das pessoas e valorizando
os aspectos culturais e humanísticos da ciência. Os curtas-metragens
produzidos recontam histórias dos moradores e sua convivência com a seca e
cultura local. Desde seu Adonias que em certa época criou o cinema no
município, abrindo às portas de sua casa para exibir filmes nacionais e
estrangeiros até as tecnologias sociais que foram construídas na comunidade
quilombola Serra do Abreu e colaboraram no desenvolvimento da comunidade,
passando pelo Projeto Plantas Medicinais e apresentando a importância do
cultivo e produção de remédios com as espécies da caatinga.

As educadoras participantes puderam aprender sobre alternativas de trabalho


didático-pedagógico com a ciência através do cinema, utilizando não somente
de exibições de filmes de fora, mas também e principalmente dos vídeos
produzidos por eles mesmos. Isso possibilitou o despertar pela curiosidade
científica e o envolvimento de um maior número de pessoas, em atividades,
debates e discussões acerca da ciência. Para os jovens e educadoras foram
ainda compartilhados além de ciência e cinema, posturas e diálogos nas
relações sociais. Muitos encontros foram perpassados por conversas sobre o
respeito ao tempo de cada um seja na criação ou na execução de determinada
atividade, também trocamos experiências e brincadeiras com o corpo como
elemento importante quando desenvolvemos processos educacionais.

Além desses resultados qualitativos, o Projeto Semiárido em Tela também


promoveu uma mostra de cinema com um público estimado em mais de 400
pessoas. Um momento de apresentação das atividades do Insa, de
aproximação da educação cientifica à população através da exibição dos sete

12
filmes de curtas metragens3 produzidos pelos jovens e educadores, e
principalmente possibilitou o acesso da população às linguagens artísticas da
sua própria cultura.

Referências bibliográficas

BENTES, I. Redes Colaborativas e Precariado Produtivo. In: Caminhos para


uma Comunicação Democrática. São Paulo: Le Monde Diplomatique e Instituto
Paulo Freire, 2007.

BOHNSACK, R. Métodos qualitativos de interpretação de imagens e o método


documentário de interpretação. In: IV Fórum de Investigação Qualitativa – IQ
2005. Juiz de Fora, 2005.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.


São Paulo: Paz e Terra, 2011.

LOZANO, M. Programas y experiencias em popularización de la ciência y la


tecnologia: Panorámica desde los países del convenio Andrés Bello. Bogotá:
CAB, 2005b, 267 p.

NAVAS, A.M. Concepções de popularização da ciência e da tecnologia no


discurso político: impactos nos museus de ciências. 2008. 126 p. Dissertção
(Mestrado). Faculdade de Educação, Univsersidade de São Paulo, 2008.

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Livro Branco:


Ciência, Tecnologia e Inovação. Brasília. CT Brasil. 80 p. 2008.

SCHAUN, A. Educomunicação: reflexões e princípios. Rio de Janeiro: Mauad,


2002.

THIOLLENT, M. Metodologia da pesquisa-ação – 18. ed. São Paulo: Cortez,


2011.

3 Os vídeos produzidos pelos participantes estão disponíveis no endereço:


https://www.youtube.com/channel/UCatcJ0-UqtrJTYsdR-sCeCA

13
GT 4: CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

A Importância dos PCTs para o Desenvolvimento Local e Territorial: A


1
Experiência do Parque Tecnológico da Paraíba

Elis Regina Neves BARREIRO2


Ângela Maria Cavalcanti RAMALHO3
Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande, PB.

Resumo

Ambientes de inovação implantados em países desenvolvidos e em


desenvolvimento para dinamizar economias regionais e nacionais, os Parques
Científicos e Tecnológicos, através da relação Governo-Universidade-Empresa,
podem desempenhar o papel de impulsionador do desenvolvimento cientifico e
tecnológico local e territorial, tornando as localidades mais competitivas,
gerando empregos de qualidade e bem-estar social. O objetivo deste artigo é
analisar a relevância dos PCTs para o desenvolvimento local e territorial e
apresentar a experiência do Parque Tecnológico da Paraíba, demonstrando o
estabelecimento de empresas inovadoras e de parcerias públicas e privadas.

Palavras-chave: Parques Científicos e Tecnológicos; Arranjos institucionais;


Desenvolvimento local e territorial.

Abstract

Innovation environment deployed in already developed and developing


countries to boost regional and national economies, the Scientific and
Technological Parks, through the relation Government-University-Industry can
play the role of catalyst of scientific development and technological local and
territorial, making localities more competitive, creating quality jobs and social
welfare. The objective of this paper is to analyze the relevance of PCTs to local
and regional development and present the experience of the Paraíba
Technology Park, demonstrating the establishment of innovative public and
private partnerships.

Key-words: Science and Technology Parks; Institutional arrangements; Local


and territorial development.

1
Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES,
Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014.
2
Mestranda do PPGDR/UEPB, e-mail: lisbarreiro@hotmail.com
3
Professora do PPGDR/UEPB, e-mail: angelaramalho@oi.com.br

14
1. Introdução

Os Parques Científicos e Tecnológicos (PCTs) são amplamente discutidos na


literatura mundial como sendo de grande importância para o desenvolvimento
territorial, para a integração econômica e criação de inovações tecnológicas,
além da geração de produtos com maior valor agregado, o que resulta em um
encadeamento industrial e por resultância um aumento da competitividade das
regiões.
São ambientes de inovação implantados em países desenvolvidos e em
desenvolvimento para dinamizar economias regionais e nacionais, agregando-
lhes conteúdo de conhecimento. Com isso, essas economias tornam-se mais
competitivas no cenário internacional e geram empregos e bem-estar social.
Desse modo, o objetivo deste artigo é analisar a relevância dos PCTs para o
desenvolvimento local e territorial, bem como, apresentar a experiência do
Parque Tecnológico da Paraíba, a partir das relações Governo-Universidade-
Empresa, como impulsionador do desenvolvimento científico e tecnológico
local. Para atingir tal propósito, utilizou-se a pesquisa bibliográfica e
documental.
Busca-se, portanto, com base na análise da trajetória do PaqTcPB e nos
resultados alcançados pela pesquisa, demonstrar o estabelecimento de
empresas inovadoras e de parcerias públicas e privadas, no período de 2011-
2013.

2. Discussão da literatura

Reconhecidos instrumentos indutores dos processos de inovação tecnológica,


caracterizados pela integração de múltiplos atores e instituições público-
privadas, os Parques Científicos e Tecnológicos (PCTs) constituem locais
privilegiados, compostos por infraestruturas físicas e organizacionais de
articulação, em que se combinam os conhecimentos científico-tecnológicos

15
(universidades), aplicados (empresas/mercado), organizacionais
(práticas/relacionamentos).
De acordo com Vedovelo; Judeci; Maculan (2006), a literatura internacional
vem tratando Parque Tecnológico como um instrumento de promoção a
diversos objetivos econômicos e políticos, servindo como mecanismos de
desenvolvimento local e territorial.

Cumprindo funções de suporte à integração entre agentes


sociais similares (pequenas e grandes empresas) ou distintos
(universidade e indústria), aos parques tecnológicos vem
também sendo imputado o papel de ser um mecanismo de
desenvolvimento regional/local de estímulo à maior
competitividade e performance empresarial, gerando
crescimento e desenvolvimento econômicos (Idem, 2006,
p.104).

Assim sendo, as experiências pioneiras de implantação de Parques Científicos


e Tecnológicos ocorreram entre fins dos anos 1940 e início dos 1960, na
Universidade Stanford, Califórnia, com o Parque de Pesquisa Stanford
Research Park, hoje conhecida como Vale do Silício e a Rout 128, na região de
Boston, Massachusetts, onde estão localizadas o Massachusetts Institute of
Technology (MIT) e a Harvard University.
Evidencia-se que as experiências norte-americanas contribuíram
significativamente para implantação de PCTs na Europa, em 1970, tais como,
Sophia-Antipolis na França e Cambridge na Inglaterra (VEDOVELLO; JUDECI;
MACULAN, 2006).
A conjuntura do pós-guerra foi um fator que influenciou e determinou o avanço
das iniciativas de PCTs. Os países economicamente abatidos passaram a
acreditar no processo de inovação, fomentando maior sinergia entre centros de
conhecimento e pesquisa e as empresas, dando início a políticas públicas, em
níveis nacional, regional e local, como forma de induzir a revitalização de
regiões.
Depois do surgimento nos Estados Unidos, o modelo expandiu-se pelo mundo.
No início dos anos 1970 até 1980, na Europa e Japão, em 1980, na Ásia e

16
Pacífico e em 1990 no resto do mundo industrializado. Deste modo, esta
iniciativa marca de forma revolucionária a ciência, tecnologia e inovação como
diferencial competitivo para a sociedade industrialmente avançada.
No Brasil, especificamente, eles surgiram nos anos 1980, através da iniciativa
do então presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq), Lynaldo Cavalcanti de Albuquerque. Foi criado através do
Programa de Implantação de Parques de Tecnologia. Os primeiros projetos
foram implantados em Campina Grande-PB, Joinvile-SC, Manaus-AM,
Petrópoles-RJ, Santa Maria–RS e São Carlos-SP. As experiências geraram
mudanças nas concepções das lideranças acadêmicas e científicas no país,
que passaram a potencializar a interface universidades, centros de pesquisa e
os segmentos da indústria.
Nesta fase inicial, foram estabelecidas diversas políticas de fortalecimento da
inovação tecnológica nos níveis local, regional e nacional, com ênfase na
relação entre empresas e universidades, estimulando a implantação dos
Parques Científicos e Tecnológicos (PCT).
Essa institucionalização de políticas públicas de incentivo a criação e expansão
de PCT em escala internacional (Estados Unidos, Europa, Ásia e América
Latina) resulta em várias experimentações e adaptações que ampliam e
modificam o conceito de PCT com relação ao seu sentido original. Assim,
constata-se a inexistência de um único conceito, um modelo padrão que possa
ser aplicado a todas as iniciativas, gerando, inclusive, dificuldade em
estabelecer indicadores de desempenho para avaliar tais experiências.
Apesar das dificuldades conceituais, segundo a International Association of
Science Parks – lASP (2014), um Parque Científico e Tecnológico pode ser
definido como uma estrutura organizacional que tem como objetivo principal
incrementar a riqueza da comunidade onde estão inseridos, promovendo a
inovação e competitividade das empresas. Além disso, gere e estimula o fluxo
de conhecimento e tecnologia entre universidades, instituições de pesquisa,

17
empresas e mercado, promovendo a criação de empresas inovadoras, através
dos mecanismos de incubação de empresas e spin-off 4.
Já para a Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos
Inovadores – ANPROTEC (2013), os PCTs constituem um complexo produtivo
industrial e de serviços de base científico-tecnológica. Desta forma, eles atuam
como indutores da cultura da inovação, da competitividade e da capacitação
empresarial e têm como fundamento a transferência de conhecimento e
tecnologia, com o objetivo de possibilitar o aumento da produção de riqueza de
uma determinada região.
Sendo assim, as abordagens de PCT não são consensuais, porém,
apresentam características convergentes, tais como, reforço da infraestrutura
local e o enriquecimento do capital social e institucional, dando maior
visibilidade, atratividade e trabalho em rede para fomentar a aplicação de
estratégias mais amplas no campo da pesquisa e do desenvolvimento e do
conhecimento (GIUGLIANI; SELIG; SANTOS, 2012).
Além disso, os distintos modelos de PCTs estão enraizados no conceito da
Triple Helix (hélice tríplice). “Em qualquer análise que se possa tecer sobre os
distintos modelos de PCTs existentes hoje, é possível detectar a presença do
5
trinômio das hélices definidas por Etzkowitz e Leydersdorff – governo,
universidade e indústria” (MIRANDA; BEVILACQUA, 2011, p. 83). A Triple
Helix é um modelo alternativo para explicar o atual sistema de pesquisa no
contexto social, no qual a universidade pode exercer um importante papel na
inovação. É visto como um modelo analítico que agrega uma variedade de
arranjos institucionais e modelos políticos para explicar suas dinâmicas.
Desta forma, a relação Governo-Universidade-Indústria é comparada com
modelos alternativos para explicar o atual sistema de investigação em seus

4
As spin-offs, de forma geral, podem ser entendidas como empresas juridicamente constituídas que
tiveram como principal fator de criação o aproveitamento de uma oportunidade de negócios gerada pelos
resultados finais ou parciais de uma pesquisa acadêmica, ou seja, criação de empresas baseadas em
tecnologias desenvolvidas no interior das universidades. Cf. AZEVEDO, Gustavo Carrer I. Spin-Offs
Acadêmicas e a Inovação: Estudos de caso da USP e UFSCar. Curitiba, 2011.
5
ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from National Systems and "Mode
2" to a Triple Helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, Issue 2, p.109-123,
2000.

18
contextos sociais. Comunicações e negociações entre parceiros institucionais
podem gerar um sobreposição que reorganiza cada vez mais os arranjos de
base. O conjunto institucional pode ser considerado como mecanismo de
execução de políticas públicas que visam o desenvolvimento tecnológico.
Este conceito evidencia que os arranjos institucionais entre universidades,
empresas e governo desempenham um papel fundamental para inovação e,
consequente, para o desenvolvimento econômico e tecnológico em níveis
nacional, regional e local, baseados no conhecimento. Segundo Etzkowitz e
Leydersdorff (2000), diferentes resoluções possíveis das relações entre as
esferas institucionais da universidade, indústria e governo podem ajudar a
gerar estratégias alternativas para o crescimento econômico e transformação
social.
Giugliani (2012) ratifica que as organizações PCTs visam fomentar o
desenvolvimento econômico e tecnológico, baseados no conhecimento e
inovação, a partir sinergia governo-universidade-indústria. Há, neste sentido, a
necessidade de parceria entre o setor governamental, o setor privado (onde
ocorre a transformação do conhecimento em riqueza) e a academia (com o
objetivo de formar recursos humanos e gerar conhecimento) para formulação
de políticas de inovação bem-sucedidas.
A partir dos enfoques elucidados, parte-se da premissa de que o Parque
Científico e Tecnológico se constitui em uma matriz de projetos no território, a
partir de instâncias e dinâmicas em que se combinam articulação
interinstitucional e participação social, a partir de uma lógica sistêmica de
construção social que tem alavancado o desenvolvimento local sustentável.

3. Metodologia

Este trabalho é ressultante da revisão de literatura sobre Parques Científicos e


Tecnológicos e análise documental de relatórios elaborados pela Fundação
Parque Tecnológico da Paraíba e Incubadora Tecnológica de Campina Grande.

19
A pesquisa bibliográfica teve a finalidade de explicitar os pressupostos teóricos,
conceitos e ideias que norteiam à temática. Ou seja, a construção da
fundamentação teórica. Neste sentido, foram utilizados livros, teses, artigos,
revistas e outros documentos para construção de uma base de dados. Além
disso, esta metodologia possibilitou identificar, descrever e entender a
organização e as principais características dos Parques Científicos e
Tecnológicos.
A pesquisa documental foi realizada através da análise de relatórios, projetos,
convênios, contratos e acordos de cooperação arquivados na Fundação
Parque Tecnológico da Paraíba – PaqTcPB ou publicados em meios
eletrônicos. Este procedimento possibilitou identificar as parcerias e as
empresas criadas em torno deste arranjo e verificar os resultados destas
iniciativas.
Assim, as discussões apresentadas neste trabalho têm origem no arcabouço
teórico sobre Parques Científicos e Tecnológicos, aliado à pesquisa
documental realizada no PaqTcPB e na ITCG.

4. Análise dos Resultados

4.1 O Parque Tecnológico da Paraíba

O Parque Tecnológico da Paraíba – PaqTcPB foi criado em 21 de dezembro de


1984, um dos quatro primeiros parques tecnológicos do país. Atua como
promotor do empreendedorismo inovador no Estado da Paraíba, apoiando a
criação e crescimento de empresas de base tecnológica e de
empreendimentos sociais, através da apropriação dos conhecimentos e
tecnologias geradas nas Instituições de P&D e da inserção de produtos,
serviços e processos no mercado, inclusive no exterior, contribuindo para o
desenvolvimento do país (PaqTcPB, 2013).
A sua implantação, na cidade de Campina Grande, teve como influência
significativa a existência das duas universidades públicas, uma federal e uma

20
estadual. É possível perceber que o Parque Tecnológico incentiva e apoia a
criação de empresas de base tecnológica e à difusão de informação
tecnológica na região, configurando-se assim como uma das principais
instituições articuladoras do desenvolvimento tecnológico local, através da
aproximação entre a universidade e a empresa.
Nesta perspectiva, cabe destacar o papel da Incubadora Tecnológica de
Campina Grande – ITCG, criada em 1986, que constitui uma das unidades de
negócios do PaqTcPB. Ela apoia empreendimentos inovadores nascentes com
ênfase na geração e consolidação dos mesmos, bem como, na sua
capacitação e inserção no mercado.
Assim, a ITCG faz parte do Programa de Incubação de Empresas do Parque
Tecnológico, que tem como missão ações para o desenvolvimento de novos
empreendimentos nascentes inovadores através de suporte técnico e gerencial
no âmbito empresarial, buscando o crescimento sustentável e o
amadurecimento dessas empresas como forma de promover o
empreendedorismo inovador local e territorial.

4.2 As empresas incubadas

Segundo dados apresentados pelo PaqTcPB, atualmente, são 18 empresas


residentes incubadas, 19 empresas incubadas virtualmente, 82 empresas
associadas e 98 empresas beneficiadas pelo PRIME6. Além disso, com a ideia
de apoiar outras incubadoras localizadas em outros municípios do Estado, foi
criada a REPARI, a Rede Paraíba de Parques e Incubadoras que apoia outras
seis incubadoras em operação, garantindo o compartilhamento de
conhecimentos e de ações para desenvolvimento de novos produtos e acesso
ao mercado.

6
O PRIME (Primeira Empresa Inovadora) é um programa da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP)
que entrou em operação no inicio de 2009. Seu objetivo é criar condições financeiras favoráveis para que
um conjunto significativo de empresas nascentes de alto valor agregado possa consolidar com sucesso a
fase inicial de desenvolvimento dos seus empreendimentos (FINEP, 2014)

21
A análise dos dados apresentados pela Incubadora Tecnológica de Campina
Grande demonstra que, desde 1986 até 2014, foram incubadas 93
empreendimentos, dentre eles, empresas de tecnologias da informação e
comunicação, eletroeletrônica, biotecnologia, petróleo e gás natural,
biocombustíveis, agroindústria, tecnologias ambientais e design.
A pesquisa mostra que das empresas incubadas até hoje, residentes e
virtualmente, aproximadamente 48% encontram-se ativas, conforme gráfico 1,
a seguir.

Gráfico 1: Empresas do Programa de Incubação.

31%
48% ATIVAS

14% INATIVAS
7%
FECHADAS
NÃO ENCONTRADAS

FONTE: PaqTcPB, 2013. Elaborado pelas autoras.

Face ao exposto, observa-se que do número de empresas incubadas e


graduadas ao longo de aproximadamente três décadas de atividade da
Incubadora Tecnológica de Campina Grande-PB menos da metade continuam
funcionando. E que um elevado percentual delas, em torno de 31%, é
considerado como “não encontradas”, porque perderam o relacionamento com
a instituição.

4.3 As parcerias institucionais: contratos, convênios e acordos de


cooperação.

22
A pesquisa dos contratos, convênio e acordos de cooperação firmados entre
2011-2013, possibilitou a identificação dos principais parceiros/atores
(universidades, institutos de pesquisa, empresas, agentes financeiros, governo
e agências de desenvolvimento) envolvidos nos arranjos institucionais do
PaqTcPB.
Com base nesta análise, o gráfico 2, a seguir, apresenta a evolução dos
números de convênios, contratos e acordos estabelecidos entre o PaqTcPB e
as instituições públicas e privadas parceiras.

Gráfico 2: Parcerias Públicas e Privadas.

60

50 Instituições Públicas
(Universidades, Institutos de
40 Pesquisa, Agentes
Financeiros, Governo e
30 Agência de
Desenvolvimento)
20 Instituições Privadas
(Empresas)
10

0
1 2 3
2011 2012 2013

FONTE: PaqTcPB, 2013. Elaborado pelas autoras.

É possível perceber que neste arranjo institucional a presença e os


investimentos públicos são expressivos em relação aos privados. Em 2013,
este cenário tendeu a ficar mais equilibrado, devido a estabelecimento de
convênios com grandes empresas de eletroeletrônicos e produtos de
informática, inclusive multinacionais.
Além disso, evidencia-se a presença da Universidade Federal de Campina
Grande como a instituição parceira de maior atuação na hibridização
interorganizacional do Parque Tecnológico da Paraíba. Em números, ela

23
aparece como executora ou co-executora de aproximadamente 55% dos
projetos desenvolvidos, no período de 2011-2013.

5. Considerações

Notadamente, os Parques Científicos e Tecnológicos, no contexto dos arranjos


institucionais, possuem a capacidade de acelerar o crescimento econômico e o
desenvolvimento local/territorial, através da criação de tecnologia e inovação.
Desta forma, com a articulação e ação conjunta com os centros de pesquisa,
universidades e empresas, eles potencializam a criação de recursos humanos
de alto nível, favorecendo a maximização da criatividade e atividades
inovativas e, com isso, elevam a competitividade local e territorial.
Nesta perspectiva, é possível observar que o PaqTcPB tornou-se uma peça
fundamental no fomento à Ciência e Tecnologia no Estado e para a criação de
empresas inovadoras. Além disso, apoiado nas sinergias das relações entre o
Governo, a Universidade e Empresa, tornou-se uma alternativa viável para
promoção do desenvolvimento científico e tecnológico local e territorial.
No entanto, seria necessário um estudo mais profundo que tivesse como foco a
geração de empregos, o estabelecimento de novas empresas, interação entre
as universidades e as empresas localizadas no parque e o favorecimento da
difusão de tecnologias inovadoras.
Assim, com mais indicadores de desempenho seria possível avaliar melhor os
impactos do empreendimento PaqTcPB no desenvolvimento das localidades e
regiões onde se insere.

Referências

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE ENTIDADES PROMOTORAS DE


EMPREENDIMENTOS INOVADORES (ANPROTEC) - http://anprotec.org.br/site/pt/a-
anprotec/. Acesso em: 10 de outubro de 2013.

AZEVEDO, Gustavo Carrer I. Spin-Offs Acadêmicas e a Inovação: Estudos de


caso da USP e UFSCar. Curitiba, 2011. Disponível em

24
http://coletanea.sebraesp.com.br/index.php/sebraesp/article/view/16/110. Acesso em:
15 de fevereiro de 2014.

ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from National


Systems and "Mode 2" to a Triple Helix of university-industry-government
relations. Research Policy, v. 29, Issue 2, p.109-123, 2000.

FINACIADORA DE ESTUDOS E PROJETOS – FINEP. Disponível em:


http://www.finep.gov.br/pagina.asp?pag=programas_prime. Acesso em: 25 de
fevereiro de 2014.

FUNDAÇÃO PARQUE TECNOLÓGICO DA PARAÍBA (PaqTcPB). Disponível em:


http://www.paqtc.org.br/. Acesso em: 08 de novembro de 2013.

GIUGLIANI, Eduardo. Modelo de Governança para Parques Científicos e


Tecnológicos no Brasil (Tese). Florianópolis, 2011.

GIUGLIANI, Eduardo; SELIG, Paulo Maurício; SANTOS, Neri dos. Modelo de


Governança para Parques Científicos e Tecnológicos: análise e contexto. Foz do
Iguaçu, 2012.

INTERNATIONAL ASSOCIATION OF SCIENCE PARKS. Pesquisa geral no site.


Disponível em: http://www.iasp.ws/knowledge-bites. Acesso em: 08 de abril de 2014.

MIRANDA, Paulo C. Goulart de; BEVILACQUA, Andréa Francomano. Parques


Científicos e Tecnológicos. In: Ciência, Tecnologia e Inovação para um Brasil
competitivo. São Paulo: SBPS, 2011.

VEDOVELLO, Conceição Aparecida; JUDICE, Valéria Maria Martins; MACULAN,


Anne-Marie Dalaunay. Revisão crítica às abordagens de Parques Tecnológicas:
alternativas interpretativas às experiências brasileiras recentes. Revista de
Administração e Inovação – RAI, São Paulo, v.3, n.2, p.103-118, 2006.

25
GT 4 – CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Pós-Graduação e Desenvolvimento: Uma Análise da Visão Contida no


PNPG Brasileiro1

Cidoval Morais de SOUSA2


Georgia Simonelly Lima NASCIMENTO3

Resumo

O objetivo central deste artigo é agendar uma discussão sobre a relação entre
desenvolvimento e pós-graduação, a partir das estratégias de desenvolvimento
sugeridas nos Planos Nacionais de Pós-Graduação (PNPG´s). Os planos
fazem parte da política científica e tecnológica brasileira e tiveram sua primeira
versão publicada em 1975. A ideia de que o avanço da ciência e tecnologia é
um meio para superar o subdesenvolvimento e alcançar o progresso encontra-
se presente na política adotada nos cinco documentos analisados.

Palavras-chave: Pós-Graduação; Desenvolvimento; PNPG.

Introdução

O Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG) faz parte da política científica


e tecnológica brasileira e, segundo a Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (CAPES), é o documento que sintetiza as diretrizes
que norteiam as políticas públicas em nível de mestrado e doutorado. Sua
principal finalidade é fazer um diagnóstico dessa modalidade de ensino e
pesquisa. Com base nas informações levantadas, são propostas diretrizes e
metas que guiarão o sistema de pós-graduação por um período determinado.

1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES,


Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014.
2 Doutor em Geociências pela UNICAMP. Professor e pesquisador da Universidade Estadual da Paraíba

(UEPB) vinculado aos Programas de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e Ensino de Ciências


e Matemática. Diretor da Editora da Universidade Estadual da Paraíba (EDUEPB). E-mail:
cidoval@gmail.com.
3 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional (UEPB). MBA em Marketing

e Comunicação com o Mercado. Graduada em Comunicação Social (UEPB). Bolsista CAPES. E-mail:
georgia_simonelly@hotmail.com.

26
O objetivo central deste artigo é mostrar como se apresenta a relação entre
desenvolvimento e pós-graduação, assim como explicitar as estratégias de
desenvolvimento sugeridas através da implantação do PNPG.
A história da pós-graduação no Brasil tem origem nos anos 30 com a
criação das primeiras universidades, conforme destaca Balbachevsky (2005),
no entanto, foi apenas em 1965 que o Ministério da Educação regulamentou os
primeiros cursos.
A partir de 1948, com a criação da Sociedade Brasileira para o Progresso
da Ciência (SBPC), a política científica e tecnológica do país se torna mais
sistemática. Nesse momento, como afirmam Moser e Theis (2010), a ciência
era vista como meio para superar o subdesenvolvimento e alcançar o
progresso. As políticas implantadas a partir da década de 1950 têm base nesse
pressuposto.
Um elemento que teve bastante influencia na propagação dessa ideia foi o
relatório “Science The Endless Frontier”, produzido em 1945 por Vannevar
Bush, então diretor do Escritório de Pesquisa Científica e Desenvolvimento dos
Estados Unidos. Bush (1945) defende que o avanço da ciência permitiria
padrões de vida mais elevados, aumento do número de empregos, levaria à
prevenção ou cura de doenças, assim como também à preservação dos
recursos naturais.
Esses seriam alguns dos benefícios apontados no documento, contudo,
para atingi-los seria preciso um fluxo contínuo e substancial de novos
conhecimentos. Essa visão foi bastante propagada na época, servindo como
base para as políticas de ciência e tecnologia (C&T) adotadas por gestores em
diversos países. Segundo Dias (2010), o relatório
continha alguns dos aspectos que viriam a compor a visão
tradicional acerca da relação entre ciência, tecnologia e
desenvolvimento nas décadas posteriores. Em particular, a
noção de que não poderia haver progresso sem o avanço
científico e tecnológico (DIAS, 2010, p. 72).

A relação existente entre pós-graduação e desenvolvimento não é


facilmente percebida de forma direta. Porém uma maneira de observá-la é,

27
tomando por base a visão citada por Dias (2010), enxergando a pós-graduação
como uma extensão da ciência.

O desenvolvimento e sua relação com o progresso da C&T

Tomando por base a visão tradicional, o desenvolvimento pode ser


compreendido como sinônimo de crescimento econômico, admitindo-se, dessa
forma, a ideia de que a industrialização, o avanço tecnológico e a
modernização seriam capazes de elevar o padrão de vida da sociedade.
No entanto, essa abordagem passou a ser revista a partir da década de
1990, quando o debate centrou-se no desenvolvimento humano. Nesta
conjuntura, aspectos qualitativos ganharam espaço em detrimento dos
quantitativos. Como mostra Veiga (2008), a visão tradicional passou a ser
contestada depois que o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD) lançou o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH),
levando em conta fatores não econômicos.
Amartya Sen (2000) defende que desenvolvimento é a expansão das
liberdades substantivas. O autor admite que o crescimento pode contribuir para
expandir a liberdade humana, mas depende de outras influências, como
oportunidades econômicas, liberdades políticas, poderes sociais, boa saúde,
educação básica, participação nas decisões públicas, entre outras.
De maneira análoga, Sachs (1995) propõe formular uma teoria integrada
de desenvolvimento visto como “processo social e cujo centro seja o homem e
todos os homens” (p. 39). Para reavaliar a temática, o autor propõe que o
economicismo4 seja superado; entendendo que o desenvolvimento deve ter
uma finalidade social. Assim, defende-se que o desenvolvimento deve ser
encarado a partir de uma concepção ampla e plural, deixando de lado a ideia
de progresso e adotando-se uma postura mais humana, na qual as decisões
sejam centradas nas pessoas, ao invés de focar na geração de riquezas.

4
“O economicismo se traduz pela aceitação explícita ou implícita da teoria da percolação (trickle down
theory), segundo a qual é a economia que está no comando” (SACHS, 1995).

28
No entendimento de Veiga (2008), o crescimento toma rumos
heterogêneos na estrutura social, podendo contribuir tanto de forma positiva
quanto negativa.
O desenvolvimento depende da maneira como os recursos
gerados pelo crescimento econômico são utilizados – se para
fabricar armas ou para produzir alimentos, se para construir
palácios ou para disponibilizar água potável (VEIGA, 2006, p.
85).

Antes de buscar relacionar diretamente ciência com desenvolvimento,


faz-se necessário abordar de forma suscinta o primeiro tema. A ciência, como
um fenômeno cultural, tem impactado fortemente nossa vida cotidiana. Esta
afirmação de French (2007) ilustra de forma significativa o lugar que essa
forma de conhecimento tem ocupado em todos os tipos de atividade humana.
Conforme o autor coloca, além dos benefícios práticos – como a cura de
doenças através do desenvolvimento da teoria genética ou do uso de células-
tronco, por exemplo – existe o modo profundo como a ciência e seus produtos
formou e mudou a visão vigente de mundo, sendo percebida em grande
medida através de dois extremos: como verdade absoluta ou como vilã.
Seguindo o segundo viés, o sociólogo Simon Schwartzman (1997)
aborda a “demonização da ciência”, não somente pelo seu poder de destruição
através das bombas atômicas e das armas químicas, mas também
responsabiliza a ciência e a tecnologia moderna por “destruir o meio ambiente,
gerar desemprego, danificar a saúde e controlar a sociedade através de seus
computadores, burocracias e instituições educacionais”.
Para Sachs (1995), “o nosso domínio da ciência e tecnologia continua
bastante imperfeito”. Ele afirma que o progresso científico e técnico não
cumpriu as promessas de um bem-estar generalizado para o conjunto da
humanidade, defendendo que nosso poder tecnológico seria suficiente para
oferecer aos homens um conforto material razoável, mas o que observamos é
o acirramento das desigualdades.
Esse panorama caracteriza o cerne da noção de “maldesenvolvimento”
ou “desenvolvimento desequilibrado”, caracterizado quando o processo de

29
desenvolvimento não permite progressos nos campos econômico, social e
ecológico ao mesmo tempo, que para Sachs (1995) seria o ideal.
Uma das maneiras de perceber a materialização dessas assimetrias no
que se refere as atividades de C&T é através da sua distribuição desigual, que
segundo Moser e Theis (2010) revelam uma tendência de acompanhar a
acumulação do capital, fazendo a propagação da base técnica do centro e
reforçando sua capacitação técnico-científica.
Os autores chamam atenção para o fato de que o modelo de
desenvolvimento dos países subdesenvolvidos foi implementado com base no
modelo dos países desenvolvidos, considerando o papel da tecnologia a partir
do conceito de desenvolvimento na evolução destes últimos. Deste modo,
como enfatizam Moser e Theis (2010), a tecnologia seria desenvolvida em um
processo independente dos desejos humanos e dos fatores externos
resultando em um processo fechado e neutro.
Em decorrência dessa forma de pensar a tecnologia os
sistemas de P&D5 criados para os países
subdesenvolvidos foram baseados nesses critérios para
promover a industrialização. Os objetivos explícitos
desses planos eram, em primeiro lugar, interagir com o
sistema produtivo – principalmente industrial – para
satisfazer as demandas do mercado internacional e, em
segundo lugar, gerar inovações para competir nesse
mercado internacional (MOSER e THEIS, 2010).

De acordo com Sachs (1995) uma forma de colocar a C&T a serviço do


desenvolvimento social é
não sujeitar a pesquisa nos países do Sul aos modos
dominantes nos laboratórios do Norte e não aguardar
passivamente a transferência das tecnologias idealizadas sob
outras latitudes e em outros contextos [...] O fortalecimento da
capacidade local em matéria de ciência, tecnologia e formação
de executivos altamente qualificados constitui ponto fundamental
das estratégias de desenvolvimento baseadas na aptidão de
elementos nativos para pensarem de maneira autonôma e por
em execução os projetos nacionais (SACHS, 1995, p. 52).

5
Pesquisa e Desenvolvimento (P&D).

30
Diante do exposto, a chave para alcançar o caminho no qual a ciência
possa servir ao desenvolvimento é apostar em um modelo que valorize a
competência local, considerando o homem e sua própria cultura, minimizando a
importância exclusiva dos aspectos econômicos.

A visão de desenvolvimento contida no PNPG

Os trabalhos para a elaboração do 1⁰ Plano Nacional de Pós-


Graduação (PNPG) tiveram início em 1973, durante a gestão do presidente
Ernesto Geisel, quando por iniciativa da Secretaria-Geral do Ministério da
Educação e Cultura foi criado o Conselho Nacional de Pós-Graduação,
instituído através do Decreto n. 73.411/1974. O documento é a expressão
dos trabalhos iniciais do conselho, que foi constituído para propor as
medidas introdutórias que definiriam a política de pós-graduação do país.
O I PNPG foi elaborado para guiar as decisões entre 1975 e 1979. Do ponto
de vista estratégico e operacional, este plano foi integrado com as políticas
estabelecidas no II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND 1975-1979) e no
Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PBDCT). Seu
objetivo era fazer “evoluir o sistema universitário brasileiro para uma nova
etapa, na qual as atividades de pós-graduação tinham uma importância
estratégica crescente”.
Dadas as limitações de extensão deste artigo, somente alguns aspectos
que se relacionam diretamente com a ideia de desenvolvimento serão tratados.
Um aspecto fruto de atenção no I PNPG diz respeito aos problemas sociais e
técnicos do país, onde coexistiam (e ainda hoje coexistem) vários estágios de
desenvolvimento. O que poderia ser suprido, segundo a avaliação da época,
com a importação de conhecimentos e serviços, ao mesmo tempo em que
haveria um estímulo da produção científica própria e regular.
Como metas do primeiro plano destacam-se duas: (1) utilizar os meios e
instrumentos de ensino e pesquisa, para transformação efetiva das condições
materiais e culturais da sociedade, no sentido de seu crescimento social e

31
econômico, (2) formar, treinar e qualificar os recursos humanos de nível
superior em volume e diversificação adequados para o sistema produtivo
nacional e para o próprio sistema educacional (I PNPG, 1974).
A distribuição regional também era alvo dessa política, existia a intenção de
procurar manter uma relação de proporcionalidade em cada região
geoeducacional com objetivo de evitar o acirramento das disparidades
regionais, o que até hoje não foi conseguido, como podemos observar na
tabela 1 (abaixo), na qual ainda se observa uma excessiva concentração de
cursos no Sudeste.
Tabela 1: Cursos reconhecidos pela CAPES

Fonte: CAPES, 2014.

Desde 1975 foram elaborados 5 PNPGs, a princípio, os 4 primeiros tinham


duração de cinco anos, o que muda no último que ganha o dobro de tempo,
entre 2011 e 2020. Foi durante o governo do presidente João Figueiredo, em
1982, que o II PNPG foi publicado. Novamente, as diretrizes deste documento
harmonizam-se com as orientações do III PND (1980/85) e do III PBDCT.
Duas grandes conquistas dos 2 primeiros planos foram o aumento da
absorção de pessoal em regime de tempo integral e dedicação exclusiva nas
instituições federais de ensino superior e a implantação do Programa
Institucional de Capacitação de Docentes. Outro avanço relevante foi a

32
implantação e a consolidação do Sistema de Acompanhamento e Avaliação da
Pós-Graduação, sob a responsabilidade da CAPES.
O PNPG 1982-1985 aborda de forma mais direta a utilização do
conhecimento como forma de interagir com o setor produtivo, o que já é um
indício do que posterioremente seria chamado de modelo da tríplice hélice –
caracterizado pela parceria entre Universidade, Estado e empresas. No trecho
a seguir essa ideia fica clara.

Especificamente, as funções da pós-graduação se dividem entre


a formação de docentes pesquisadores para a esfera
acadêmica; a capacitação e o treinamento de pesquisadores e
profissionais destinados a aumentar o potencial interno de
geração, difusão e utilização de conhecimentos científicos no
processo produtivo de bens e serviços e a formação de recursos
humanos para o desenvolvimento cultural do País (II PNPG,
1982).

Outra passagem que merece destaque no 2 ⁰documento, diz respeito


à natureza do conhecimento a ser produzido e reproduzido. A recomendação
é que o estágio de desenvolvimento sócio-econômico que o país requer,
oriente o perfil da demanda em termos de mercado de trabalho e capacitação.
A institucionalização da pós-graduação, objetivo comum dos primeiros
planos, continuou presente no III PNPG, uma vez que apesar do progresso
alcançado, ainda não havia sido concluída. Além disso, a ampliação das
atividades de pesquisa – elemento indissociável da pós-graduação –
configurou como meta importante dessa política. O III plano foi publicado
durante o mandato do presidente José Sarney e do Ministro da Educação,
Jorge Bornhausen, em 1986.
Apesar dos indícios presentes nos planos anteriores, o PNPG 1986-
1989 é o primeiro documento a abordar pontualmente o papel da produção e
criação do conhecimento gerado na pós-graduação no processo de
desenvolvimento nacional. O III PNPG apresenta três objetivos gerais, nos
quais destaca-se o terceiro: “integração da pós-graduação no sistema de
Ciência e Tecnologia, inclusive com o setor produtivo” (III PNPG, 1986).

33
Entre as diretrizes gerais, se estabelece que o estímulo e apoio as
atividades de investigação científica e tecnológica são parte essencial do
Sistema de C&T, que garante a pesquisa básica como suporte para o
desenvolvimento tecnológico, destaca-se ainda a importância de consolidar a
pós-graduação, garantindo sua qualidade, “para assegurar sua função como
instrumento de desenvolvimento científico, tecnológico, social, econômico e
cultural”. Como estratégia sugerida no tocante a essa temática, a proposta foi
envolver os órgãos de desenvolvimento regional nos programas de
desenvolvimento científico e de formação de recursos humanos, buscando
articular a academia com o planejamento estatal. Este plano expressava uma
tendência vigente àquela época: a conquista da autonomia nacional.
O IV PNPG começou a ser elaborado em 1996, quando foi formulada
uma pauta para sua realização, mas apesar das diversas redações
preliminares, nenhuma chegou a se constituir como documento público.
Somente publicado em 2004, já no governo Lula, o IV PNPG “incorpora
o princípio de que o sistema educacional é fator estratégico no processo de
desenvolvimento sócio-econômico e cultural da sociedade brasileira”. Assim,
caberia à pós-graduação produzir profissionais aptos para contribuir com o
processo de modernização do país.
No balanço apresentado neste documento considerou-se que a pós-
graduação é uma das mais bem sucedidas realizações do sistema de ensino
do país, ressaltando-se que o seu desenvolvimento foi produto de uma
deliberada política indutiva, conduzida e apoiada pelas instituições públicas
com o engajamento da comunidade acadêmica.
Uma novidade deste plano, é que pela primeira vez foi realizada uma
consulta com interlocutores da comunidade científica e acadêmica, convidados
a enviar sugestões. Para concretizar a participação desses atores, foram
realizadas audiências com os Fóruns Regionais de Pós-Graduação, cobrindo
as cinco regiões do país.
O desenvolvimento da pesquisa e a integração com o sistema de C&T
eram as ênfases principais do IV plano, desse modo, as atividades de pesquisa

34
científica, tecnológica e inovação deveriam ser responsáveis pela inserção
competitiva do Brasil no mercado mundial.
A ênfase em setores estratégicos também aparece, sugerindo que a
política industrial fortaleça “os programas espacial e de energia, a criação de
programas de exploração do mar e da biodiversidade, assim como o efetivo
desenvolvimento da região amazônica como instrumento de integração
nacional” (IV PNPG, 2005).
Por fim, com um horizonte temporal mais vasto foi publicado o V PNPG,
editado pela CAPES em 2010, no final do segundo mandato do presidente
Lula. Um fato novo foi a introdução das diretrizes e políticas do ensino de pós-
graduação ao Plano Nacional de Educação (PNE). A exemplo do plano
anterior, também foram ouvidos diferentes segmentos da comunidade
acadêmica e da própria sociedade, além de especialistas de diversas áreas do
conhecimento e do ensino, que elaboraram estudos e sugestões.
Podemos destacar o aparecimento do modelo da tríplice hélice que
surge explicitamente no V PNPG. Dividido em dois volumes, este plano faz
uma síntese geral dos anteriores e detalha minuciosamente a discussão dos
problemas apontados de forma superficial nos demais. Novamente, a visão do
sistema de pós-graduação como fator propulsor do desenvolvimento
econômico e social está fortemente presente.

Os resultados da pesquisa, ao serem aplicados, levam a


tecnologias e a procedimentos, podendo ser usados no setor
público e no sistema privado, e fazendo do conhecimento e da
tecnologia uma poderosa ferramenta do desenvolvimento
econômico e social. Neste quadro a parceria entre a
Universidade, o Estado e as empresas dará lugar ao chamado
modelo da tríplice hélice. Este modelo levará a colocar no centro
do Plano, ou melhor, na sua base, aquilo que poderá ser
chamado de Agenda Nacional de Pesquisa (V PNPG, 2011, p.
18).

Em nível conceitual, a principal novidade do novo Plano é a adoção de


uma visão sistêmica em seus diagnósticos, diretrizes e propostas. O combate
às assimetrias é um tema importante, cuja complexidade visa uma ação

35
conjunta dos diversos órgãos envolvidos. A novidade em relação a essa
proposta é o foco nas mesorregiões.

Considerações finais

A criação do PNPG representou um esforço no sentido de estabelecer


uma política nacional voltada exclusivamente para a pós-graduação, uma vez
que é neste nível que a maior parte da produção científica do país é
desenvolvida. Observa-se ainda que suas propostas e diretrizes seguem a
questão central das políticas de C&T adotadas no Brasil a partir da década de
1970, quando o governo buscou articular o desenvolvimento científico e
tecnológico como uma estratégia mais ampla de desenvolvimento econômico e
social.
Fica bastante evidente que a percepção de desenvolvimento presente
no PNPG volta-se para integrar as atividades da pós-graduação ao sistema
empresarial, buscando a inovação e a utilização da tecnologia para ganhar
competitividade no mercado internacional, valorizando a ciência pela sua força
produtiva, ou seja, pelo seu valor mercadológico.

Referências

BALBACHESVKY, E. A pós-graduação no Brasil: novos desafios para uma política


bem-sucedida. Publisher: portais.ufg.br. Publication Date: 2005.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Conselho Nacional de Pós-Graduação.


Plano Nacional de Pós-Graduação – PNPG 1975-1979 – Brasília, DF: 1974.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Coordenação de Aperfeiçoamento de


Pessoal de Nível Superior. Plano Nacional de Pós-Graduação – PNPG 1982-1985 / –
Brasília, DF: CAPES, 1982.

BRASIL. Ministério da Educação. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de


Nível Superior. Plano Nacional de Pós-Graduação – PNPG 1986-1989 – Brasília, DF:
CAPES, 1986.

36
BRASIL. Ministério da Educação. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior. Plano Nacional de Pós-Graduação – PNPG 2005-2010 – Brasília, DF:
CAPES, 2004.

BRASIL. Ministério da Educação. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de


Nível Superior. Plano Nacional de Pós-Graduação – PNPG 2011-2020 – Brasília, DF:
CAPES, 2010.

BUSH, V. Science: The Endless Frontier. EUA: 1945. Disponível em:


http://www.inovacao.unicamp.br/report/Sciencetheendlessfrontier.pdf. Acessado em:
02 abr. 2014.

DIAS, R. B. A agenda da política científica e tecnológica brasileira: uma perspectiva


histórica. In: DAGNINO, R. (org.). Estudos Sociais da Ciência & Tecnologia e Política
de Ciência e Tecnologia: alternativas para uma nova América Latina. Campina
Grande: EDUEPB, 2010.

FRENCH, S. Ciência: conceitos-chave em filosofia. Trad. A. Klaudat. Porto Alegre:


Artmed, 2009.

MOSER, A.; THEIS, I. Ciência, tecnologia e desigualdades no Brasil no período


recente. IV EEC - Encontro de Economia Catarinense. Criciúma, SC, 2010.

SACHS, I. Em busca de novas estratégias de desenvolvimento. Estudos avançados


[online]. 1995, vol. 9, n. 25, p. 29-63. ISSN 0103-4014.

SCHWARTZMAN, S. Os paradoxos da Ciência e da Tecnologia. In: Ciência Hoje e


incorporado em Michael Gibbons, Camille Limoges, Helga Nowotny, Simon
Schwartzman, Peter Scott e Martin Trow, The New Production of Knowledge - The
dynamics of science and research in contemporary societies, London, Thousand Oaks
e New Delhi, Sage Publications, 1994. Incluído em A Redescoberta da Cultura, São
Paulo, EDUSP, 1997.

SEN, A. Desenvolvimento como liberdade. Tradução Laura Teixeira Motta; Revisão


técnica Ricardo Doniselli Mendes. – São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

VEIGA, J. E. Neodesenvolvimentismo: quinze anos de gestação. São Paulo em


Perspectiva, São Paulo, Fundação Seade, v. 20, n. 3, p. 83-94, jul./set. 2006.

VEIGA, José Eli da. Desenvolvimento sustentável: o desafio do século XXI. 3.ed. Rio
de Janeiro: Garamond, 2008.

37
GT4 - CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

O Uso do Novo Paradigma Ambiental nas Ações do Marketing Ecológico:


Um Estudo de Caso de Uma Fábrica de Calçados na Cidade de Campina
Grande-PB1

José Austerliano RODRIGUES2


Allice Montenegro LIMA3
Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande, PB

RESUMO

O presente estudo tem como objetivo verificar as ações do marketing


ecológico, com base no uso das dimensões do Novo Paradigma Ambiental em
uma fábrica de calçados na cidade de Campina Grande-PB. O método de
pesquisa escolhido para o presente estudo foi o descritivo de caráter
exploratório. O sujeito da pesquisa foi o técnico do Setor de Segurança, Saúde
e Meio Ambiente desta fábrica. A entrevista foi realizada durante o mês de
maio de 2013 por meio de um questionário, composto de dezessete questões,
com perguntas fechadas. Foi possível observar que a fábrica aparenta possuir
leve tendência a estar alinhada com as dimensões do Novo Paradigma
Ambiental na condução de suas ações ambientais.

Palavras–Chave: Marketing Ecológico; Dimensões; Novo Paradigma


Ambiental; Fábrica de Calçados; Campina Grande-PB.

1. INTRODUÇÃO

Segundo Dias (2009), com o surgimento da sociedade industrial, houve


crescimento e concentração da população em áreas urbanas, que passaram a
ocupar espaços em detrimento do ambiente natural, e as terras e florestas
foram convertidas em mercadoria para atender à intensificação da produção e
do consumo. Esse processo foi baseado na exploração do trabalho humano e
no alto consumo de matérias-primas e fontes de energia não renováveis, que
ao longo do processo produtivo geravam resíduos poluentes que

1
Trabalho apresentado no GT4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES, Campina Grande
(PB), de 13 a 15 de agosto de 2014
2
Doutorando em PUR,DINTER/IPPUR/UFRJ-UEPB. email: austerlianorodrigues@bol.com.br
3
Graduanda em Administração pela UEPB. email: allicemontenegrolima@gmail.com
contaminavam o ar, o solo e as águas num volume sem procedentes. E é
nesse sentido que podemos afirmar que o modelo de desenvolvimento
resultante da Revolução Industrial é o responsável pela atual crise ecológica.
Ademais, com a importância da temática ambiental, a gestão ambiental
precisa ser administrada diariamente, com atenção especial sem comprometer
os cuidados dispensados aos recursos humanos, consumo de matérias-primas
e fonte de energia da organização; já que as empresas que dominam os
problemas ambientais têm melhores condições de crescer e sobreviver em um
ambiente de mercado competitivo.
Segundo Dias (2009), o marketing nesse contexto, principalmente
durante a segunda metade do século XX, foi visto como "vilão", pois seu
aspecto mais visível era a indução ao maior consumo possível de mercadorias,
prestando desse modo, um precioso serviço às empresas, mas que, no
entanto, desconsiderava os efeitos na sociedade como um todo. O fato é que o
crescimento do consumo, sem responsabilidade ambiental, intensificou a
exploração predatória dos recursos naturais e gerando resíduos poluentes de
todo tipo, que foram produzidos tanto no processo produtivo, como pelo
descarte de produto e suas embalagens.
O propósito da escolha da fábrica de calçados para o presente estudo
deve-se ao fato da existência do setor de Segurança, Saúde e Meio Ambiente,
que possibilitou a verificação das ações do marketing com base nas dimensões
do Novo Paradigma Ambiental (NPA).
Diante das preocupações ambientais, algumas questões precisam ser
respondidas no tocante as ações do marketing ecológico da fábrica de
calçados pesquisada, e suas interações entre homem e a natureza. Neste
contexto, questiona-se: até que ponto as ações do marketing ecológico estão
alinhadas com as dimensões do NPA? O presente estudo tem como objetivo
verificar as ações do marketing ecológico, com base no uso das dimensões do
Novo Paradigma Ambiental em uma fábrica de calçados na cidade de Campina
Grande-PB.
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1 Meio Ambiente

“Existem três estruturas da filosofia ambiental e conceitos


relacionados representam as primeiras escolas de
pensamentos quanto ao relacionamento homem-natureza. O
paradigma social dominante não é uma perspectiva
“ambientalista” per se, mas representa a visão tradicional de
mundo da sociedade industrializada, o status quo contra o qual
são comparadas outras perspectivas ambientalistas. A
perspectiva do ambientalista radical representa a visão de
mundo daqueles que defendem a mudança transformacional. A
perspectiva do ambientalista renovado representa aqueles que
ocupam a área intermediária na filosofia e na prática ambiental
(CLEGG, 2007, p.365)”.

Na moderna sociedade industrial, o Paradigma Social Dominante (PSD)


representa uma aderência aos princípios e objetivos econômicos neoclássicos
(crescimento econômico e lucro), com os fatores naturais tratados ou como
externalidades ou como recursos exploráveis infinitamente. Se existem
problemas ambientais observáveis, estes podem facilmente (ou eventualmente)
serem resolvidos por meio do progresso científico e tecnológico (Daly e Cobb,
1994; Hawken, 1994 e Milbrath,1989 apud CLEGG, 2007, p.366). O PSD está
mais intimamente associado às sociedades capitalistas ocidentais, nas quais
imperam os princípios de “livre mercado” e de propriedade privada. Contudo,
os sistemas econômicos fechados, informados pela filosofia marxista, também
estão incluídos nessa perspectiva.
O “Novo Paradigma Ambiental” (NPA) surgiu em contraste com o
Paradigma Social Dominante, que é um conceito baseado em uma visão social,
antropocêntrica e ortodoxa, que tem por base as condições sociais e
econômicas que emergiram da revolução industrial. O NPA representa uma
visão ecológica das relações do ser humano com seu entorno, que constitui um
sistema de crenças que pode predispor ou manter determinadas crenças,
atitudes e condutas a respeito de temas específicos do meio ambiente (DIAS,
2009, p. 105). De acordo com Milbrath (1986, p. 100 apud Dias, 2009, p.105),
diante de um grupo de crenças próprias do “Paradigma Social Dominante”,
surge um conjunto alternativo de crenças representando pelo o “Novo
Paradigma Ambiental”, como uma nova forma de conceber a organização da
realidade que paulatinamente pode ser incorporada no sistema social,
mostrados no Quadro 2.1.

Novo Paradigma Ambiental Paradigma Social Dominante


Alta valorização da natureza Baixa valorização da natureza
a. A natureza por si mesma – amor pela natureza. a. Natureza para produzir bens.
b. Relações totais entre os humanos e a natureza. b. Dominação humana da natureza.
c. Proteção ambiental acima do desenvolvimento c. Crescimento econômico acima da proteção
econômico. ambiental.

Compaixão generalizada para com Compaixão somente pelos mais próximos


a. Outras espécies. a. Exploração de outras espécies para atender às
b. Outros povos. necessidades humanas.
c. Outras gerações. b. Desinteresse por outros povos.
c. Interesse somente por esta geração.
Plano e atuação cuidadosa para evitar riscos Aceitar riscos para maximizar o bem-estar
a. Ciência e tecnologia nem sempre são boas. a. Ciência e Tecnologia são benefícios para a
b. Deter o desenvolvimento do poder nuclear. humanidade.
c. Desenvolvimento e utilização de tecnologia b. Desenvolvimento rápido do poder nuclear.
branda. c. Impulsionar tecnologia dura.
d. Regulação governamental para proteger a d. Desvalorização da regulação governamental de
natureza. proteção da natureza.

Limites ao crescimento Nenhum limite ao crescimento


a. Escassez de recursos. a. Não-escassez de recursos.
b. Explosão demográfica. b. Nenhum problema de população.
c. Conservação. c. Produção e consumo.

Necessidade de sociedade completamente nova Sociedade atual correta


a. Os humanos prejudicam seriamente a natureza a. Os humanos não prejudicam seriamente a
e a si mesmos. natureza.
b. Abertura e participação. b. Hierarquia e eficácia.
c. Ênfase nos bens públicos. c. Ênfase no mercado.
d. Cooperação. d. Competição.
e. Pós-materialismo. e. Materialismo.
f. Estilos simples de vida. f. Estilos completos e estáveis de vida.
g. Ênfase na satisfação no trabalho. g. Ênfase no trabalho para atender necessidades
econômicas.
Nova política Velha política
a. Consultiva e participativa. a. Determinada por especialistas.
b. Partidária de discutir sobre relação de ser b. Partidária de discutir sobre a gestão da
humano com a natureza. economia.
c. Desejo de usar a ação direta. c. Oposição à ação direta.
d. Realizar a previsão e o planejamento. d. Realizar o controle pelo mercado.

Fonte: Milbrath (1986, p.100) apud González (2002).


Quadro 2.1: Contraste entre os paradigmas.

2.2 O Conceito do marketing Ecológico

“Na óptica do comportamento do consumidor, os anos 60


podem ser descritos como a época do despertar da
consciência ecológica, os anos 70 como o início da ação e os
anos 80 como um período de responsabilidade, marcado pelo
aumento dramático da consciência ecológica no mundo. A
década de 90 impõe-se como a era do poder do mercado.
(MAKOWER, 1993, apud AFONSO, 2010)”.

O marketing ecológico (ou ambiental ou verde ou ecomarketing ou


marketing sustentável) é de interesse não só de entidades ambientalistas;
algumas com atuação em âmbito mundial ao defender do equilíbrio ecológico
ao social, mas também de empresas que começam apoiar e desenvolver
atividades que procuram ou eliminar causas de degradação social e ecológica
e, como isso, melhorar a qualidade de vida das pessoas. É evidente que a
preocupação das empresas não é apenas em relação ao planeta e com a
sociedade, mas predominantemente com a imagem da organização (Zenone,
2006, p. 159). Então, o termo marketing ecológico não se refere apenas às
questões ecológicas, mas devem-se incluir as questões comunitárias, políticas,
culturais, religiosas, entre outras (ZENONE, 2006, p. 160).
Para Polonsky (1994 apud DIAS, 2009, p. 74), o marketing ecológico
“consiste de todas as atividades designadas para gerar e facilitar qualquer
troca com o objetivo de satisfazer os desejos ou necessidades humanas, desde
que a satisfação dessas necessidades e desejos ocorra, com um mínimo de
impacto prejudicial sobre o meio ambiente”.O conceito tradicional do marketing,
baseado no Paradigma Social Dominante, não contempla ações que evitam o
declínio ambiental, isso exige novos enfoques do marketing por parte dos
profissionais da área (Kilbourne, 2008). Portanto, o próprio conceito do
marketing verde (ou green marketing) tem suas limitações para alcançar uma
verdadeira cidadania ecológica.

2.3 O Conceito de Cidadania Ecológica

É reconhecido que o conceito de cidadania mudou e ainda está


mudando. Por essa razão, existem inúmeras e conflitantes interpretações na
noção de cidadania, embora seja frequentemente entendida em termos de um
conjunto de direitos e obrigações (Janoski, 1998). Em muitos países, por
exemplo, existem alguns direitos políticos fundamentais e obrigações
normalmente associados à cidadania - voto, deliberação ou a participação no
processo político, bem como o acesso ou o direito à prestação de informações.
Então, como melhorar a cidadania e as práticas políticas previstas no núcleo
político de direitos e obrigações?
Assim, o conceito de cidadania varia e vem mudando historicamente,
colocando desafios para a sociedade contemporânea. Os diversos
entendimentos do termo cidadania exigem uma ampla gama de debates e
discussões filosóficas, sociológicas e da teoria política. Numa visão estreita,
cidadania consiste de um compacto de direitos legais, proteções e deveres
entre o governo e os membros individuais da sociedade. Em um sentido amplo,
a cidadania representa um quadro universal de direitos - civis, sociais e
políticos. Segundo Janoski (1998), a cidadania ativa e passiva inclui direitos e
obrigações. Em suma, não existe nenhuma definição universal de cidadania,
considerada como um conceito com várias definições. A cidadania é "um
conceito peculiar e escorregadio com uma longa história” (RILEY, 1992, p.180).
Ao lidar com o conceito de cidadania vale à pena mencionar as duas
tradições diferentes no debate atual sobre cidadania: a tradição liberal e a
tradição republicana. A tradição liberal caracteriza a política como um
"mercado" de natureza privada, alegando que os cidadãos agem com base em
interesses (HOLFORD e EDIRISINGHA, 2000, p.7). Cidadania corporativa e do
consumidor são baseadas na tradição liberal que considera a transferência do
conceito de cidadão para os agentes do mercado. Por outro lado, a tradição
republicana (ou comunitária) considera a política pública de natureza não
“mercadológica”. "Atores políticos não são concebidas como consumidores,
mas como participantes na discussão pública. A política é entendida a sendo
uma atividade aberta e pública, distinta das escolhas isoladas e privadas de
partes interessadas” (WIKLUND, 2005, p. 704).
A cidadania ecológica, também conhecida como cidadania ambiental,
emergiu no debate acadêmico, promovendo valores ecológicos. Assim, a
cidadania ecológica tenta explorar os limites das existentes formas de
cidadania, na tentativa de unir ecologia com a justiça social. Neste sentido, ser
cidadão significa respeitar e cuidar do ambiente em que vivemos. No mundo
moderno, a poluição do ar, da água, a devastação das florestas, a extinção de
espécies animais e vegetais são problemas cada vez mais sérios.
3. MÉTODO DE PESQUISA

A realização do estudo envolveu pesquisa descritiva de caráter


exploratório. O sujeito da pesquisa foi o técnico do setor de Segurança, Saúde
e Meio Ambiente de uma fábrica de calçados na cidade de Campina Grande –
PB. Os dados coletados foram informatizados em um banco de dados
eletrônicos compatível com software Microsoft Excel 2010. Foi realizada
análise quantitativa, utilizando-se análise de freqüência absoluta, percentuais
com múltiplas respostas e de escolha (MATTAR, 2011).
Para a pesquisa de campo, realizada no período de maio de 2013, foi
utilizado um questionário semi-estruturado, composto de dezessete questões,
com perguntas fechadas, baseadas e agrupadas nas seis dimensões do Novo
Paradigma Ambiental: alta valorização da natureza, compaixão generalizada,
plano e atuação cuidadosa para evitar riscos, limites ao crescimento,
necessidade de sociedade completamente nova e nova política, de modo a
levantar informações quantitativas, utilizando-se a escala de Likert (“concordo”,
“discordo” e “neutro”) (MATTAR, 2011, p. 111). As questões elaboradas,
divididas em suas respectivas dimensões, juntamente com suas justificativas
metodológicas estão descritas no Quadro 3.1, abaixo.

Dimensão 1 - Alta valorização da natureza


Questão Importância metodológica
Q01. A fábrica adota alguma política de proteção Através desta variável, procurou-se identificar se é
ambiental? adotada alguma política de proteção ambiental.
Q02. A fábrica possui proteção ambiental acima do Com esta variável, procurou-se identificar se há
desenvolvimento econômico? proteção ambiental e desenvolvimento econômico.
Q03. A fábrica desenvolve o seu planejamento Com esta variável, procurou-se identificar se é
econômico levando em consideração às exigências levado em consideração o seu planejamento
econômicas e ecológicas do país? econômico e as exigências ecológicas do país.
Dimensão 2 - Compaixão generalizada
Questão Importância metodológica
Q04. A fábrica possui algum trabalho voltado para Através desta variável, procurou-se identificar se há
a valorização das espécies? algum trabalho voltado à valorização das espécies.
Q05. A fábrica possui parcerias com alguma ONG Através desta variável, procurou-se identificar se há
de proteção ambiental? parceria com alguma ONG de proteção ambiental.
Dimensão 3 - Compaixão generalizada
Questão Importância metodológica
Q06. A fábrica investe ou desenvolve tecnologias Através desta variável, procurou-se identificar se
sustentáveis no processo produtivo? são realizados investimentos tecnológicos e
sustentáveis no processo produtivo.
Q07. A fábrica é certificada por algum órgão de Através desta variável, procurou-se identificar se a
regulamentação ambiental? fábrica possui certificado de regulamentação
ambiental.
Dimensão 4 - Limites ao crescimento
Questão Importância metodológica
Q08. A fábrica investe ou realiza pesquisas com Através desta variável, procurou-se identificar
base em fontes ecológicas de matéria-prima? investimentos ou pesquisas com base em fontes
ecológicas de matéria-prima.
Q09. A fábrica leva em consideração o crescimento Através desta variável, procurou-se identificar se é
populacional em função da produção indústria? considera o crescimento populacional em função
da produção industrial.
Dimensão 5 - Necessidade de sociedade completamente nova
Questão Importância metodológica
Q10. Há alguma preocupação ou ação que Através desta variável, procurou-se identificar a
desenvolva uma sociedade de consumo existência de ações que desenvolvam uma
ecologicamente consciente por parte da sua sociedade de consumo ecologicamente consciente.
fábrica?
Q11. A fábrica atende às exigências da cidadania Através desta variável, procurou-se identificar se é
ecológica? atendida ás exigências da cidadania ecológica.
Q12. Os colaboradores têm consciência sobre as Através desta variável, procurou-se identificar se os
ações ecológicas praticadas pela fábrica? colaboradores têm consciência sobre as ações
ecológicas praticada.
Q13. A fábrica minimiza os impactos gerados pelo Através desta variável, procurou-se identificar se
seu processo produtivo? são minimizados os impactos gerados pelo
processo produtivo.
Q14. A política da fábrica está condizente com as Através desta variável, procurou-se identificar se a
diretrizes governamentais? política adotada está condizente com as diretrizes
governamentais.
Dimensão 6 - Nova política
Questão Importância metodológica
Q15. O planejamento estratégico da fábrica Através desta variável, procurou-se identificar se o
contempla cidadania ecológica? planejamento estratégico contempla cidadania
ecológica.
Q16. A alguma política interna de discussão sobre Através desta variável, procurou-se identificar se há
a relação fábrica-natureza? política interna e discussão sobre a relação fábrica-
natureza.
Q17. Há alguma participação do fornecedor, fábrica Através desta variável, procurou-se identificar se há
e consumidor no processo produtivo? participação do fornecedor, fábrica e consumidor
no processo produtivo.
Fonte: Pesquisa Direta, maio 2014.
Quadro 3.1: Questões da pesquisa e justificativa metodológica.

4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Nesta análise, procurou-se verificar como está sendo utilizadas as ações


do marketing ecológico, com base no uso das dimensões do Novo Paradigma
Ambiental de uma fábrica de calçados; através das respostas do técnico do
setor de Segurança, Saúde e Meio Ambiente. Conforme as dezessete questões
aplicadas, observam-se as ações ambientais mais utilizadas, como mostram os
resultados resumidos no Quadro 4.1

Perfil das respostas


Questão
Concordo Neutro Discordo
Q01 X
Q02 X
Q03 X
Q04 X
Q05 X
Q06 X
Q07 X
Q08 X
Q09 X
Q10 X
Q11 X
Q12 X
Q13 X
Q14 X
Q15 X
Q16 X
Q17 X
Fonte: Pesquisa Direta, maio 2014.
Quadro 4.1: Respostas das questões relativas ao Novo Paradigma Ambiental.
Pode-se observar no Gráfico 4.1, a percepção geral do técnico do setor
se Segurança, Saúde e Meio Ambiente sobre as ações do marketing ecológico,
com base no uso das dimensões do NPA. Das dezessete questões analisadas,
apenas nove estão relacionadas com o que a fábrica faz para que as
dimensões do Novo Paradigma (NPA) atenda suas necessidades. Estas
questões foram divididas em três aspectos, no primeiro aspecto analisado –
nível de concordância – as questões Q01, Q03, Q06, Q08, Q10, Q11, Q12,
Q13 e Q14. No segundo aspecto analisado – nível de neutralidade – as
questões Q02, Q04, Q05, Q07, Q09, Q15, Q16 e Q17, estão relacionadas com
o que ela pode fazer para que as dimensões do NPA atendam as suas
necessidades (oito questões).
Estas questões revelam que há uma percepção clara por parte do
entrevistado de que a fábrica têm diversas necessidades a serem atendidas,
para que o NPA seja usado efetivamente. O terceiro aspecto – nível de
discordância – não apresentou respostas que possibilitassem obtenção de
resultados. Os resultados foram quantificados e agrupados nos três aspectos, e
demonstrados na forma de percentual no Gráfico 4.1.

Proporção das repostas


0%

Concordância
47%
Neutralidade
53%
Discordância

Fonte: Pesquisa Direta, maio 2014.


Gráfico 4.1: Proporção das respostas quanto à adequação das ações do marketing ecológico, com
base no uso das dimensões do Novo Paradigma Ambiental em uma fábrica de calçados na cidade
de Campina Grande- PB.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com as tendências apontadas no tocante a situação da
fábrica encontrada pela pesquisa, no que diz respeito às ações do marketing
ecológico com base no uso das dimensões do NPA na condução da prática
ambiental, aparenta haver uma leve tendência da fábrica a estar alinhada com
as dimensões do Novo Paradigma Ambiental (NPA), na condução das suas
ações ambientais, representada pelo percentual de 53% de nível de
concordância. Esse fato pode indicar que a fábrica tende a refletir de maneira
positiva nos seus sistemas de crenças ambientais como crenças sociais, a
relação entre o ser humano e a natureza, que variam desde uma preocupação
antropocêntrica, até uma ecocêntrica. A postura antropocêntrica coloca o ser
humano como referência central, e a visão ecocêntrica considera que todo ser
vivo tem seu valor inerente.
O Paradigma Social Dominante se baseia na perspectiva
antropocêntrica de que o ser humano é o centro da vida e, por isso, o
considera um ser único, excepcional; pelo contrário, sob os postulados do Novo
Paradigma Ambiental, ou visão ecocêntrica, considera-se que os seres
humanos seriam somente mais um, parte do conjunto ecológico (DIAS, 2009).
A análise do segundo maior percentual foi de 47% de neutralidade, revelou que
o entrevistado tem uma percepção realista das necessidades das ações do
marketing ecológico, com base no uso das dimensões no Novo Paradigma
Ambiental, ou seja, o alto percentual de neutralidade, em relação ao de
concordância, indica que ainda pode haver ações do marketing ecológico a ser
implementadas, afim de que estejam em conformidade total com o uso das
dimensões do NPA.
Por fim, o menor percentual – discordância, com 0% das respostas –
pode indicar que a fábrica está em posição favorável para a construção de
ações ecológicas com base no uso das dimensões do NPA, já que questões de
discordância representariam limitações nas ações do marketing ecológico com
base nas dimensões do NPA praticadas pela fábrica.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AFONSO, A. C. B. O consumidor verde: perfil e comportamento de compra. 2010.


Dissertação (Mestrado em Marketing) - Instituto Superior de Economia e Gestão de
Lisboa, Universidade Técnica de Lisboa, Lisboa, Portugal, 2010.

CLEGG, S. R. et al. Handbook de estudos organizacionais: modelos de análise e


novas questões em estudos organizacionais. 1 ed. São Paulo: Atlas, 2007.

DIAS, R. Marketing ambiental: ética, responsabilidade social e competitividade nos


negócios. São Paulo: Atlas, 2009.

GONZÁLEZ LÓPEZ, A. La preocupación por la calidad del médio ambiente. Un


modelo cognitivo sobre La conducta ecológica. 2002. Tese (Doutorado) –
Departamento de Psicologia Social, Universidade Complutense de Madrid, Madrid,
Espanha, 2002.

HOLFORD, H.; EDIRISINGHA, P. Citizenship and governance education in


Europe: a critical review of the literature. School of Educational Studies, University of
Surrey, UK. November, 2000.

JANOSKI, T. Citizenship and civil society. Cambridge: Cambridge University Press,


1998.

KILBOURNE, W. E.; CARLSON, L. The dominant social paradigm, consumption,


and environment attitudes: can macromarketing education help? Journal of
Macromarketing, 28 (2): 106-121, Jun., 2008.

MATTAR, F. N. Pesquisa do marketing.Edição Compacta. São Paulo: Atlas, 2011.

RILEY, D. Citizenship and the Welfare State. In: Allan, J., Braham, P. Lewis, P (Eds).
Political and Economic Forms of Modernity. Cambridge: Polity Press, 1992.

WIKLUND, H. A Habermasian analysis of the deliberative democratic potential of


ICT-enabled services in Swedish municipalkities. New Media & Society, 7 (5): 701-723,
2005.

ZENONE, L C. Marketing social. São Paulo: Thomson Larning, 2006


GT4 - CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

A contribuição das políticas de Ciência & Tecnologia e Inovação na


dinâmica da acumulação de capital no Brasil1

Ester Cristina Bevian GRAF2


Tatiane Thaís LASTA3
Daniel Rodrigo STRELOW 4

Resumo: O objetivo deste artigo foi problematizar a implementação das políticas de


C&T e Inovação no Brasil, na tentativa de evidenciar o papel que vem exercendo no
processo de acumulação de capital. Evidenciou-se que tais políticas contribuem para o
desenvolvimento geográfico desigual acompanhando o processo de acumulação de
capital pela concentração de investimentos nas regiões desenvolvidas. O capital
privado brasileiro não inova, mas sim importa máquinas e equipamentos de países
centrais. Tal prática não possibilita o desenvolvimento socioeconômico, mas sim, um
maior nível de acumulação de capital e o agravamento das disparidades. Propõe-se um
novo modelo de C&T e Inovação, capaz de reduzir as desigualdades. É onde surge a
Tecnologia Social, uma alternativa à Tecnologia Convencional, hegemônica no Brasil.

Palavras - chave: Ciência, Tecnologia e Inovação; Desenvolvimento Geográfico


Desigual; Acumulação de Capital.

1 INTRODUÇÃO

Tem-se observado mudanças positivas em alguns indicadores sociais no Brasil,


principalmente no último decênio. Não obstante, é preciso atentar ao fato de que a

1
Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, tecnologia e desenvolvimento regional. II SEDRES, Campina
Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014.
2
Graduanda em Psicologia, Bolsista de Iniciação Científica pela FURB, membro do Núcleo de Pesquisa
em Desenvolvimento Regional, e-mail: estergraf@gmail.com
3
Economista, mestranda em Desenvolvimento Regional pela FURB, membro do Núcleo de Pesquisas
em Desenvolvimento Regional, e-mail: tatilasta@gmail.com.
4
Economista, mestrando em Desenvolvimento Regional pela FURB, membro do Núcleo de Pesquisas
em Desenvolvimento Regional, e-mail: danistrelow@gmail.com.
desigualdade continua, seja nas regiões, ora ganhadoras, ora perdedoras, ou nas
gritantes assimetrias entre as classes sociais. De fato, não há como analisar o
desenvolvimento capitalista brasileiro sem a marca do desenvolvimento desigual, muito
menos, sem perceber as idas e vindas da acumulação primitiva permanente, que
assume variadas formas no decorrer da história (BRANDÃO, 2010).
Historicamente, as atividades científicas e tecnológicas também cumprem uma
tendência de distribuição desigual no território brasileiro, acompanhando a acumulação
do capital e sua expansão. O que se pretende neste artigo é problematizar a
implementação das políticas de Ciência & Tecnologia e Inovação no Brasil no período
pós Constituição de 88 até o período recente, na tentativa de evidenciar o papel que
vem exercendo no processo de acumulação de capital no Brasil. Para isso, se utilizou
os aportes teóricos de Marx (acumulação primitiva) e Harvey (desenvolvimento
geográfico desigual), além de indicadores do estado de inovação no Brasil, como os da
PINTEC/IBGE.
Este artigo está dividido em quatro seções. Após esta introdutória, segue
pequeno debate conceitual. Na terceira seção problematiza-se a política de ciência,
tecnologia e Inovação no Brasil. Por fim, são apresentadas considerações finais.

2 ALGUNS CONCEITOS IMPORTANTES

Neste primeiro capítulo, cabe uma pequena discussão do marco teórico, que vai
desde o desenvolvimento geográfico desigual, até o processo de acumulação primitiva
de capital. Estes que são elementos importantes de nossa análise.
O processo de “acumulação primitiva" precede mesmo o processo de
acumulação capitalista, não sendo, desta forma, resultado de sua produção, mas seu
ponto de partida, ou seja, está na gênese do modelo em questão. No contexto da
economia política, compara-se ao “pecado original” na teologia. A base de todo este
processo é a expropriação/separação dos meios de produção dos próprios
trabalhadores. E este ato de expropriação não foi resultado do acaso, da “mão invisível”
ou de métodos pacíficos. Pelo contrário. Todos os métodos que permitiram a
acumulação primitiva, base do modo de produção capitalista, são resultado de ações
cuja violência é característica comum e marcante (MARX, 1984).
Em suma, são todos os processos que serviram de base para a ascensão e
consolidação da classe capitalista, advinda das antigas ruínas feudais. “Se o dinheiro
[...] ‘vem ao mundo com manchas naturais de sangue sobre uma de suas faces’, então
o capital nasce escorrendo por todos os poros sangue e sujeira da cabeça aos pés”
(MARX, 1984, p.292).
O economista Carlos Brandão (2010) também nos ajuda a entender o processo
de acumulação de capital, sustentando a continuidade deste e afirmando que tem
caráter permanente ao longo da história do capitalismo, não meramente circunstancial.
Em sua análise, centrada no Brasil, evidencia que a ocupação do território brasileiro e o
modelo de desenvolvimento em que está alicerçado esteve e está a serviço da
acumulação primitiva de capital. O modelo de desenvolvimento e crescimento
econômico brasileiro esteve submetido à lógica de acumulação de capital nas mãos de
alguns poucos. Evidentemente, o formato de uso (predatório e extensivo) e de
ocupação do espaço territorial seguiram esta lógica. Suas características nada mais são
do que a materialização do que intitula de acumulação primitiva permanente.
De fato, não há como analisar a realidade brasileira, urbana e rural, sem que se
leve em consideração que o desenvolvimento capitalista brasileiro vem sendo marcado
por um desenvolvimento desigual. E mais do que isso, é preciso atentar ao fato de que
esta desigualdade continua, seja nas regiões, ora ganhadores, ora perdedoras, ou nas
gritantes assimetrias entre as classes sociais. Em suma, não há como analisar o
desenvolvimento brasileiro sem se perceber as idas e vindas da acumulação primitiva,
que assume variadas formas no decorrer da história (BRANDÃO, 2010).
Um dos fenômenos causados pela dispersão do capital no espaço é que se
denomina por desenvolvimento geográfico desigual. De acordo com Lowy (1995) a
noção de desenvolvimento desigual surge com os estudos de Lênin e adquire maior
importância nos estudos de Trotsky, que passa a utilizar a expressão desenvolvimento
desigual e combinado. A Teoria do desenvolvimento geográfico desigual é mais recente
e busca abordar a espacialidade do desenvolvimento desigual, ou seja, “a natureza
especificamente geográfica da desigualdade socioeconômica entre as regiões e os
países” (THEIS, 2009, p. 244-245).
De acordo com Harvey (2004) é a acumulação do capital, com bases no livre
mercado que produz as diferenciações geográficas em termos de riqueza e poder. De
forma que a acumulação de capital sempre foi uma questão geográfica. Assim, o
desenvolvimento geográfico desigual é tanto o produto quanto a premissa geográfica do
desenvolvimento capitalista. Como produto, o padrão é altamente visível na paisagem
do capitalismo, tal como a diferença entre espaços desenvolvidos e subdesenvolvidos
em diferentes escalas: o mundo desenvolvido e o subdesenvolvido, as regiões
desenvolvidas e as regiões em declínio, os subúrbios e o centro da cidade. Como
premissa da expansão capitalista, o desenvolvimento desigual [...] é a desigualdade
social estampada na paisagem geográfica e é simultaneamente a exploração daquela
desigualdade geográfica para certos fins sociais determinados (SMITH, 1988, p. 221).
Para se compreender o desenvolvimento geográfico desigual basta observar a
prática de ocupação dos espaços no território, o capital busca o que o se chama de
ajuste espacial. Portanto, ignoram-se espaços e regiões não promissores indo à busca
de espaços e regiões promissoras para se instalar motivado por um conjunto de fatores
como: fácil maximização de lucros, exército reserva, facilidades de transportes e
escoamento de produção. Esse processo de acumulação capitalista do espaço resulta
em regiões perdedoras e regiões ganhadoras. Com essa expressão se traduz
claramente que: enquanto regiões crescem a altas taxas, concentram os maiores
investimentos por parte do Estado (são detentoras de ciência e tecnologia,
investimento, universidades), outras experimentam estagnação, recebem migalhas do
poder público, populações pobres vivendo a mercê de direitos. Essas diferenças entre
ricos e pobres, entre uma região desenvolvida e uma região sub desenvolvida cresce
no território, produzindo uma paisagem que não encontra melhor nome do que
desenvolvimento geográfico desigual (HARVEY, 2006; SMITH, 1988).

3 AS POLÍTICAS DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO NO BRASIL


O modelo de tecnologia produzido e consumido nos países subdesenvolvidos é
a tecnologia convencional (TC), que possui as seguintes características: poupa mais
mão de obra do que o necessário, a ponto de cada nova onda de tecnologia otimizar
ainda mais a produção; implica uma desvantagem competitiva aos pequenos em
relação aos grandes empresários, de modo que os primeiros não tem recursos
necessários para acompanhar os segundos; e por fim; é insustentável ambientalmente,
já que não leva em consideração impactos ambientais (DAGNINO, 2010).
E é justamente a tecnologia que toma conta das ações empreendidas pelo setor
público brasileiro. Uma tecnologia voltada para a grande empresa e que reforça o que
se configura como dualidade capitalista, ou seja, submissão de trabalhadores aos
donos dos meios de produção, regiões ricas a regiões mais pobres, países periféricos
aos países do centro, e mais do que isso: consolida as "assimetrias de poder dentro
das relações sociais e políticas" e a constante degradação da democracia (NOVAIS,
DIAS, 2009, p.18).
O discurso dominante quer fazer enxergar as políticas de Ciência, Tecnologia e
Inovação como propulsoras do desenvolvimento socioeconômico, sustentando a
máxima de que um maior desenvolvimento científico levaria a um maior
desenvolvimento econômico e, por conseqüência, social do país. Todavia, alguns
dados parecem revelar o contrário. Justamente, este é intento da demonstração abaixo:
primeiramente são trazidos dados do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação
(MCTI) e posteriormente, dados da última PINTEC.

3.1 C&T e inovação e o desenvolvimento geográfico desigual

Os investimentos em C&T e Inovação vêm experimentando crescimento ao


longo dos anos. Para se ter uma ideia, entre 2000 e 2012 o crescimento foi de 383%.
Passou-se de 15 bilhões em 2000 para 76,5 bilhões em 2012. O que representava
1,34% de investimentos em relação ao total do PIB passou a ser 1,74%. Não é claro a
distinção entre investimentos de empresas privadas e estatais, de modo a concluir que
o setor público tem maior presença no montante de investimentos do período, verificado
na presença das estatais (MCTI, 2014).
Regionalmente, o aumento também ocorreu, mas seguiu a tendência histórica
de distribuição desigual sobre o território brasileiro. De acordo com os dados do MCTI
(2014), ficou claro que há um maior montante de investimentos concentrado nas
regiões “mais desenvolvidas”, ou seja, Sudeste e Sul. Estas, por sinal, concentram mais
pólos industriais. Enquanto na região Norte foram investidos 595,1 mi em 2012, na
região Sudeste esse investimento chega a 9.524,4 mi no mesmo período. Vale dizer
que a soma de todas as regiões (Sul, Centro-oeste, Norte e Nordeste) não se chega ao
total investido na região Sudeste, que deteve 70% de todo investimento em C&T e
Inovação no ano de 2012.
Os documentos oficiais e planos sustentam que os investimentos em C&T e
Inovação promovem o desenvolvimento regional, econômico e social. Se de fato isso se
aplicasse, não dever-se-ia aplicar um maior volume de investimentos em regiões como
o Norte e Nordeste, que concentram maiores índices de pobreza e desigualdades e a
menor fatia do PIB? Ainda mais, porque se desconsidera as especificidades/realidades
que se diferem e muito em cada uma das regiões brasileiras? Não se pode aplicar o
mesmo modelo de C&T e Inovação a que se aplica no Sudeste igualmente no
Nordeste.
O que se evidencia é que tais disparidades regionais são fomentadas pelo
próprio Estado, através das políticas distantes dos problemas sociais locais. Podemos
dizer que não há uma devida atenção as particularidades de cada região. Segue tal
desigualdade outra característica desse processo, a saber, que a base técnica das
regiões mais desenvolvidas tendeu a se propagar para os espaços menos
desenvolvidos, levando a estes a cópia do modelo de desenvolvimento do centro,
desconsiderando as particularidades de cada lugar. E mesmo um aumento dos
dispêndios em C&T e Inovação nas regiões periféricas não seria suficiente para
transformar a paisagem das desigualdades regionais (THEIS; MOSER, 2012).
Não restam dúvidas de que o território vem sendo usado a partir de seus
acréscimos de ciência e tecnologia, mas não para promover desenvolvimento social
(BARROS, 1999, 2000; SANTOS; SILVEIRA, 2001). A realidade analisada demonstrou
que o desenvolvimento científico e tecnológico não tem contribuído para a redução
dessas desigualdades, pois devido as características estruturais do
subdesenvolvimento brasileiro, tendem a concentrar o capital nas regiões mais
desenvolvidas economicamente. Essa concentração aparece na centralização dos
diferentes atores em pólos que integram pesquisa, empresas e uma localização
favorável. O presente cenário de Ciência, Tecnologia e Inovação vigente no país
contribui para agravar as disparidades regionais. Esta concentração do
desenvolvimento científico e tecnológico nas regiões centrais do país contribui e é
resultado do desenvolvimento geográfico desigual (THEIS e MOSER, 2012).

3.2 C&T e inovação e a acumulação de capital

Os dados sobre a dispersão da atividade inovativa no território brasileiro


confluem às mesmas conclusões da seção acima. A maioria das empresas inovadoras
concentra-se no Sudeste, mais especificamente em São Paulo. Do total destas
(100.496), 54,15 %, ou seja, 54.418 localizam-se nesta região. Vale destacar que é a
região com maior PIB (IBGE/PINTEC, 2008).
Além disso, do total dos dispêndios das empresas inovadoras (R$ 43.727.462),
73,23 % (R$ 32.020.170) corresponde à região Sudeste. Isso demonstra uma grande
concentração regional dos investimentos privados em inovação, especificamente.
Evidencia-se assim que o aumentos das inovações não contribuiu para a redução das
desigualdades, pelo contrário: seguindo a lógica da cadeia linear da inovação, o efeito
tem sido o contrário, ou seja, de fomentar as desigualdades inter-regionais
historicamente herdadas. Além é claro, de seguirem a linha de acumulação de capital.
Outro dado que pode ser utilizado para mensurar o aumento das inovações em
um determinado país são os pedidos e concessões de patentes. De acordo com estes,
houve significativo aumento do registro de patentes brasileiras no período de 1997 a
2011: cerca de 256,10%. Apesar de significativo em termos percentuais, o número
ainda é irrisório: passou-se de 67 concessões em 1997 para 254 em 2011. Ainda mais
se comparado ao registro de outros países, à exemplo, EUA com 82 mil apenas no ano
de 2009, e como, Taiwan com 6.642 patentes em 2009. O Brasil aparece com 148
concessões no mesmo ano, o que demonstra não ser uma economia inovadora frente
ao cenário internacional (MCTI; USPTO5, 2012).
Nesse contexto, se reforça a distância entre ciência e tecnologia, mesmo diante
dos esforços para a passagem da pesquisa básica para a pesquisa aplicada apontados
na PCT desde a década de 1990. Esse descompasso entre ciência e tecnologia pode
ser explicado pela forma como se deu a constituição do desenvolvimento científico e
tecnológico em países desenvolvidos e subdesenvolvidos. No caso dos países centrais
os investimentos em C&T e Inovação permitiram que o desenvolvimento tecnológico
acompanhasse o científico, enquanto, no caso dos países periféricos o
desenvolvimento científico se sobrepõe ao tecnológico.
Ficou nítido que, apesar do esforço do governo brasileiro em patrocinar a
inovação, o setor privado não parece muito propenso a inovar. Através de estudos
sobre a Pintec, Theis (2012) revela que do universo total das empresas em 2000,
apenas 1,7% eram inovadoras, entre 2003 a 2005 houve queda nesta taxa, para 1,6% e
chegando a 2,3% em 2008. O autor avalia neste crescimento a diminuição do número
total de empresas, afirmando que o crescimento das empresas inovadoras é de 17%
entre 2000 a 2003, 13% entre 2003 a 2005 e apenas 12% entre 2005 a 2008.
Outro fator importante a considerar é o tipo de inovação que o empresariado
brasileiro pratica. A atividade inovativa considerada hoje no Brasil pela PINTEC (cabe
atentar que no Brasil para uma empresa ser considerada “inovadora” basta que ela
adquira algum novo equipamento) tem forte predomínio de aquisição de máquinas e
equipamentos de outros países, ou seja, compreende fortemente certa dependência
tecnológica de países do centro. O aumento dessa atividade foi 108,14% entre os anos
2000 e 2008. Atividades de Pesquisa & Desenvolvimento são praticamente
insignificantes no país (IBGE/PINTEC, 2008).
Este é mais um indicador de que o capital privado brasileiro timidamente inova.
Se “inova”, o faz importando C&T de países centrais. E este processo não possibilita o
desenvolvimento socioeconômico, mas sim, um maior nível de acumulação de capital e
logicamente, o agravamento das disparidades no território. Cabe perguntar, por que o

5
United State Patent and Trademark Office http://www.uspto.gov/web/offices/ac/ido/oeip/taf/cst_all.htm
empresariado brasileiro não inova já que o governo brasileiro tem se mostrado bastante
generoso em patrocinar a “inovação”?
O problema da inovação no Brasil não é a falta de dinheiro. O que se evidencia
como gargalo é o próprio empresariado brasileiro. Além disso, Dagnino e Bagatolli
(2009) trazem a luz mais algumas reflexões que possibilitam responder a esta questão.
Contrariamente à premissa Schumpeteriana que explica a dinâmica inovativa pela
concorrência intercapitalista na corrida do “ganha – ganha” do mercado, os empresários
de países periféricos (como é caso brasileiro) não inovam por que no processo de
produção, na relação com os trabalhadores não é necessário "progresso tecnológico" a
fim de garantir a mais valia (nos países avançados garante o que se chama mais valia
relativa). Ao longo dos anos as políticas nacionais concentradoras possibilitaram a
deterioração continuada do salário real e conseqüentemente "à instauração de uma
forma de extração da mais-valia (absoluta) que prescinde da inovação" (DAGNINO;
BAGATOLLI, 2009, p. 169).
Ficam ainda alguns questionamentos: seria uma desculpa a necessidade em
aumentar os investimentos neste modelo de C&T e inovação para que se tenha uma
transferência fácil de dinheiro público ao setor privado, facilitando assim as coisas para
a acumulação de capital? Bem - estar social e desenvolvimento socioeconômico
seriam apenas termos bonitos para enfeitar os planos e documentos oficiais e tornar
eficaz o discurso dominante? Seria preciso um trabalho mais minucioso para dar conta
de todos estes questionamentos.
O que se evidencia é o papel fundamental da tecnologia e da mudança
tecnológica na economia capitalista. A busca incessante por inovações tecnológicas,
para obter super - lucros está intimamente vinculada ao processo de produção e
reprodução do capital (MARX, 1984, p.254). Vale destacar ainda que “os enfoques
convencionais da inovação não oferecem alternativas adequadas (em termos de
políticas científico-tecnológicas e territoriais) para o processo de inovação voltado ao
desenvolvimento de formações sócio-espaciais periféricas”. As linhas que vem
contrapor estas correntes clássicas e neoclássicas afirmam que a inovação tecnológica
não se propaga a todas as firmas e convém a acumulação de capital por parte do
empresariado (RATTNER, 1980, p. 27).
Evidencia-se ainda que se faz mais do que necessário reorientar os amplos
volumes de recursos que o setor público está disposto a gastar com a inovação em
tecnologias alternativas. É necessário repensar o modelo de Ciência, Tecnologia e
Inovação que se faz no Brasil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tema proposto neste artigo foram as Políticas de Ciência, tecnologia e


Inovação e sua relação com o processo de acumulação de capital no Brasil. Ficou
evidente que as políticas de C&T e Inovação contribuem para o desenvolvimento
geográfico desigual acompanhando o processo de acumulação de capital pela
concentração de investimentos nas regiões desenvolvidas. Os dados revelam ainda
que o capital privado brasileiro não inova, mas sim importa máquinas e equipamentos
de países centrais. Logicamente, tal prática não possibilita o desenvolvimento
socioeconômico, mas sim, o contrário: um maior nível de acumulação de capital e o
agravamento das disparidades
Faz-se necessário repensar o modelo de desenvolvimento e de C&T e
Inovação brasileiro. O que se sugere é um modelo democrático, alternativo onde o
grande objetivo não seja a maximização do lucro, do “incremento da conta corrente” do
capital privado e sim o atendimento das reais necessidades de nossos territórios e
populações marginalizadas, que como sabemos, são muitas. Como afirmam Dagnino e
Thomas (1999) isso só será possível a medida em que o processo de democratização
política de lugar ao processo de democratização econômica.
O que se propõe é justamente um modelo que leve em consideração a melhora
da qualidade de vida dos indivíduos, que promova uma redistribuição das rendas
geradas e acumuladas durante os séculos, ou seja, um desenvolvimento que seja
capaz de reduzir as desigualdades regionais, e mais do que isso, que seja democrático.
Que além de desenvolver para as pessoas, seja democrático e participativo para
desenvolver com as pessoas. E isto requer que se respeite o ambiente físico (o meio
ambiente!) e a cultura dos lugares onde tais pessoas vivem. Evidentemente, esse
“desenvolver” não significa "levar mais modernidade", "mais bens industrializados" para
as regiões "subdesenvolvidas", mas despertar nas pessoas a energia (que elas têm)
para decidirem, elas mesmas e serem protagonistas do "desenvolvimento" - isto é, a
qualidade de vida - que querem para elas.
É aí que surge a Tecnologia Social, uma alternativa à Tecnologia Convencional,
hegemônica no Brasil. Preocupa-se com um enfoque tecnológico voltado a “inclusão
social” e se orienta para a produção coletiva, pautando nas realidades das sociedades
locais, buscando respostas dos próprios sujeitos aos seus problemas. (DIAS, NOVAES,
2009, p.19). São muitos os exemplos no Brasil afora. Pequenos, mas que partem da
realidade do povo, onde as comunidades, os atores, constroem o processo de mudança
por meio de seu modo de vida.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROS, Fernando Antônio Ferreira de. Os desequilíbrios regionais da produção técnico-


científica. São Paulo em Perspectiva, 14 (3), p. 12-19, 2000.

. Confrontos e contrastes regionais da ciência e tecnologia no Brasil. Brasília, D.F.:


Ed. da UnB : Paralelo 15, 1999

BRANDÃO, Carlos. Acumulação primitiva permanente e desenvolvimento capitalista no Brasil


contemporâneo. ALMEIRA, Alfredo Wagner Berno de [et al.] In: Capitalismo globalizado e
recursos territoriais: fronteiras da acumulação no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro:
Lamparina, 2010, p.39-69.

BRASIL. Ministério da Ciência e Tecnologia. Indicadores. Disponível em:


<http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/29140.htm>l. Acesso em: 22 de maio de 2014.

DAGNINO. Renato; BAGATTOLLI. Carolina. Como transformar a Tecnologia Social em Política


Pública? Tecnologia Social ferramenta para construir outra sociedade. Dagnino. Renato
Orgs. Colaboradores Bagattolli, Carolina ...[et al.] . -- Campinas, SP.: IG/UNICAMP, 2009.

DAGNINO. Renato. Tecnologia Social ferramenta para construir outra sociedade. -


Campinas, SP.: IG/UNICAMP, 2009.

FONSECA. Rodrigo; SERAFIM. Milena. A Tecnologia Social e seus arranjos institucionais In:
Tecnologia Social ferramenta para construir outra sociedade. Dagnino. Renato Orgs.
Colaboradores Bagattolli, Carolina ...[et al.] . -- Campinas, SP.: IG/UNICAMP, 2009.

HARVEY, David. Espaços de esperança. Trad. A. U. Sobral; M. S. Gonçalves. São Paulo:


Loyola, 2004.
IBGE. Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de Inovação
Tecnológica 2008. Disponível em:
<http://www.pintec.ibge.gov.br/downloads/PUBLICACAO/Publicacao%20PINTEC%202008.pdf>
. Rio de Janeiro. IBGE 2010.

LÖWY, Michael. A teoria do desenvolvimento desigual e combinado. Outubro, p. 73-80,


1995.

MARX, Karl. O capital: critica da economia política. São Paulo: Abril Cultural, 1984. 1v. Toma
2 (Os economistas). Tradução de: Das Kapital: Kritik der politischen Okonomie.

NOVAES. Henrique; DIAS. Rafael. Contribuições ao Marco Analítico-Conceitual da Tecnologia


Social. In: Tecnologia Social ferramenta para construir outra sociedade. Dagnino. Renato
Orgs. Colaboradores Bagattolli, Carolina ...[et al.] . -- Campinas,SP.: IG/UNICAMP, 2009.

SANTOS, M.; SILVEIRA, M. L. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. Rio
de Janeiro; São Paulo: Record, 2001.

SMITH, Neil. Desenvolvimento desigual: natureza, capital e a produção de espaço. Rio de


Janeiro: Ed. Bertrand Brasil, 1988.

THEIS, Ivo. Ciência & tecnologia e desenvolvimento geográfico desigual no Brasil.


REDES, v. 14, n. 1, p. 62-81, jan./abr. 2009.

.A Economia da Inovação Imperfeita.In: Jornadas Latinoamericanas de Estudios


Sociales de La Ciencua y La Tecnologia. 2012.p.1-19.

THEIS, Ivo Marcos; BUTZKE, Luciana. O paradoxo da geografia no capitalismo


mundializado: revisitando a lei do desenvolvimento desigual e combinado. In: Anais do 6º
Colóquio Internacional Marx e Engels. GT 4 - Economia e política no capitalismo
contemporâneo. 2009.

THEIS, Ivo Marcos; MOSER, Ana Cláudia. Desenvolvimento geográfico desigual e


Desenvolvimento científico e tecnológico: desigualdades regionais no investimento em
c&t no Brasil. In: Anais da IX Jornadas Latinoamericanas de Estudios Sociales de la Ciencia y
la Tecnología. 5 -8 junho, 2012. México.

THEIS Ivo Marcos; MOSER, Ana Cláudia; GONÇALVES Vânia Eloiza. Assimetrias do
desenvolvimento brasileiro recente: ciência, tecnologia e desigualdades sócio-espaciais.
In: Anais do V Encontro de Economia Catarina.

THEIS, Ivo Marcos. A economia política da inovação imperfeita. In: Anais do seminário
internacional RII Belo Horizonte Brasil 01-05 de outubro de 2012.
Diversidade de abordagens na produção científica das ciências humanas
e sociais: uma breve revisão de literatura1

Antônio Pereira Cardoso da Silva Filho2


Thiago Lima Mathias3
Cidoval Morais de Sousa4
Ângela Maria Cavalcante Ramalho5
Universidade Estadual da Paraíba

Resumo

As heranças do paradigma disjuntivo estruturado no século XIX, culminam em


formas variadas de enfrentamento ao pensamento interdisciplinar capaz de
caminhar por diferentes perspectivas. Assim, buscou-se analisar a diversidade
de abordagens na produção dos trabalhos científicos das ciências humanas e
sociais. Dando viabilidade a pesquisa realizou-se um levantamento referencial,
utilizando-se a análise de conteúdo para a compilação dessas informações.
Percebe-se que os temas identificados correspondem, dentro outros, à saúde
coletiva e pesquisa qualitativa. Os trabalhos analisados incidem discursos que
demonstram uma tendência à projeção de fatores multidisciplinares que já
constitui uma realidade complexa vivenciada no meio científico.

Palavras-chave: Ciência; Abordagens do conhecimento; Pesquisas científicas.

Introdução

A interdependência e complexização dos fatores socioambientais no


território culminam em diversas discussões em torno do reconhecimento de que
os aspectos humanos e físicos do espaço assumem conotações indissociáveis.
Assim, a tendência à especialidade nos campos científicos é analisada como um
dos fatores que contribui para própria fragmentação do saber, uma vez que
resulta na captação e desenvolvimento de conhecimentos da realidade os quais
tendem a se produzir em ambientes em que é rarefeito o diálogo
inter/transdisciplinar (MORIN, 2005).

1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, tecnologia e desenvolvimento regional


2 Mestrando do PPGDR/UEPB. E-mail: tonycardoso.geo@hotmail.com
3 Mestrando do PPGDR/UEPB. E-mail: geouepb@yahoo.com.br
4 Professor Dr. do PPGDR/UEPB. E-mail: cidoval@gmail.com
5 Professora Dra. do PPGDR/UEPB. E-mail: angelamcramalho@gmail.com

62
De acordo com Jonas (2006), que parte de uma concepção ética do
pensamento, as diferentes abordagens e alternativas científicas devem abarcar
distintas concepções de manutenção tanto dos meios naturais, quanto das
relações espaciais que influenciam e sofrem influência da natureza. Neste viés,
essa perspectiva dicotômica da estruturação do pensamento científico evidencia
discursos diferenciados no que tange ao papel da ciência na sociedade,
sobretudo, quando se remete a compreensão da complexidade da realidade e à
manutenção e desenvolvimento de técnicas que se estruturam em torno das lutas
entre os interesses sociais envolvidos. A tecnociência, indicada por vários
estudiosos como uma forma de conhecimento atrelada aos interesses capitalistas,
pode ser um exemplo destas questões.
Ziman (2003) em uma análise pautada essencialmente na relação entre
ciência e sociedade, afirma a agregação de uma parte da estrutura social que no
geral, assegura que o papel social da ciência é altamente suspeito e ambíguo e
possui um encontro com o público verdadeiramente limitado. Segundo este autor,
a dimensão política da produção e articulação da ciência, tornou-se um fator
relevante na vida coletiva, sendo influenciada por diversos poderes públicos, que
lhe atribuem diversos papeis sociais. O lugar da ciência na sociedade é
determinado pelas forças que permeiam as relações entre autores e instituições
que a produzem, caracterizados por diferentes intencionalidades e funções.
Um outro aspecto relativo a esta discussão, é o papel instrumental da
ciência, o qual, por um lado determina a ação dos produtores e por outro propicia
a formação de atitudes dos indivíduos que a consomem em debates públicos.
Nestes, por sua vez, encontra-se níveis diferenciados de disponibilização e
acesso ao conhecimento científico acerca de temas de interesse público em geral,
tais como, saúde, educação, fontes de energia, conservação dos recursos
ambientais e alimentares.
Considerando as implicações destes processos em áreas distintas do
conhecimento científico e da vida social, Leff (2003) e Capra (1982), com base em

63
uma perspectiva ambiental, afirmam a necessidade do diálogo entre os diferentes
campos dos saberes, uma vez que os fatores ambientais resultam e
simultaneamente são resultados da auto-organização social e da ecologização do
pensamento.
Soares et. al., (2010), por sua vez, defendem a diversidade de recursos
teórico-metodológicos na produção cientifica das ciências humanas e sociais,
uma vez que existe uma preocupação efetiva com questões relativas ao avanço
das disciplinas e ao modo como o conhecimento se estrutura nessas áreas
específicas.
Em uma análise dos aspectos característicos da produção científica em
ciências da saúde, Canesqui (2012) também aponta a existência de inovações
teórico-metodológicas relacionadas à integração de abordagens
transdisciplinares, assim como à diversidade de elementos de interesse dos
pesquisadores. Daí emergem acepções acerca do objeto e do sujeito, da ciência
e da consciência, da ideologia e da ética, as quais assumem papel substancial na
consolidação de um pensamento multilateral e multidimensional.
Defende-se aqui como pressuposto a ser adotado na produção do
conhecimento científico sobre aspectos da vida cotidiana, a agregação da
necessidade de discutir a interdependência das diversas abordagens disponíveis,
uma vez que a monoabordagem significaria necessariamente a simplificação de
situações complexas, enquanto a própria complexidade reuniria todos os
aspectos da realidade. Trata-se de pensar o homem e os cenários que ele produz
e nos quais é produzido não apenas como algo biologicamente constituído, porém
formado por uma consciência resultante de um contexto histórico, cultural e
ambiental (MORIN, 2005).
Diante desta perspectiva, Canesqui (2012) aponta discussões metodológicas
em torno da combinação de métodos qualitativos e quantitativos nas ciências
humanas de modo geral, como também o aprofundamento em torno das
discussões voltadas à necessidade de levar em consideração a teoria da
complexidade. O pensamento complexo, de acordo com Morin (2005), é
constituído por tecidos heterogêneos inseparavelmente associados, uma vez que

64
a agregação isolada desses tecidos constituiria um modelo simplificador de
pensamento.
O modelo proposto da complexidade proposto por Morin (2005) pauta-se na
concepção do pensamento como um conjunto de práticas que capacitem os
cientistas e os consumidores do que eles produzem para lidar e negociar com o
real, posicionando-se de forma adversa ao modelo que busca o controle e
domínio do real através de abordagens simplificadoras, disjuntivas, e portanto,
incompletas.
É pensando a corrente da complexidade e as correntes que a combatem,
que discutimos aqui o perfil das pesquisas desenvolvidas atualmente na área das
ciências humanas, interação do processo de produção científica no território e sua
interface com o desenvolvimento coletivo.
Dentre as questões que nortearam nossa pesquisa, a partir da qual
produzimos este artigo, destacamos as seguintes: Como se configura as
abordagens cientificas na produção das ciências humanas e sociais? Qual a
relação entre estes estudos e as necessidades sociais coletivas?

Procedimentos teórico-metodológico

Quando nos propomos a estudar as linhas mais gerais da produção


científica nas ciências humanas e sociais disponibilizada na internet em Língua
Portuguesa, contruímos de forma não aleatória, um corpus ao qual aplicamos
os procedimentos da metodologia da análise de conteúdo.
Assim, através da busca no Google Acadêmico de três palavras chaves:
meio ambiente, sociedade e tecnologia, foram coletados os cinco primeiros
artigos listados para cada palavra na ferramenta de busca do site acima citado,
totalizando quinze documentos analisados (SOARES et. al, 2002; TAUCHEN &
BRANDLI, 2006; SILVA ET al, 2013; SOUZA, 2009; JACOBI, 2003; ORTH, 2010;
SOUZA & CAVALARI, 2009; LEITE & GALIAZZI, 2013; ABERS & KECK, 2008;
NAVARRO & CARDOSO, 2005; OLIVEIRA & GIROLETTI, 2013; PASSOS et. AL,

65
2013; TAVARES et. al, 2011; PACHECO & KERN, 2003; STRAPSSON & JOB,
2006).
Com relação à análise de conteúdo dos textos, foram elencados itens de
observação para indicar a presença e o nível de interação entre ciências e suas
abordagens indicado em cada trabalho analisado, sendo desenvolvido um quadro
síntese para a organização e apresentação destas informações nos níveis em que
elas se apresentaram. De acordo com Pereira (2011), na análise de conteúdo
podem-se destacar três níveis de representatividade do item ou categoria
observadas. O alto nível corresponde a uma intensa representatividade do item
avaliado, o nível elementar corresponde à existência mínima de interações dos
aspectos em avaliação e, por fim, a ausência é quando determinado aspecto não
é observado no corpus analisado.
Os itens/categorias que considerados mais indicados para a observação
foram os seguintes: A afiliação dos autores a áreas distintas do conhecimento
científico; O uso de pesquisa qualitativa; O uso de pesquisa quantitativa; A
realização de trabalho de campo; A caracterização da ciência produzida
enquanto não instrumental e tecnociência; A produção de contribuições
relativas ao desenvolvimento.
A utilização de autores de diferentes áreas do conhecimento se relaciona
com à identificação de trabalhos que atendam à inspiração da matriz da
complexidade, que envolve um esforço de integração das diversas áreas de
estudo. O uso das técnicas de pesquisa qualitativa e quantitativa ou
qualiquantittiva também indicam em que medida se adota o pluriperspectivismo
em termos metodológicos. A utilização do trabalho de campo, de acordo com
Thiollent (1994), trata-se da estruturação de uma perspectiva de análise que
busque um conhecimento mais concreto e real da problemática, se posicionado
de forma a compreender as especificidades e situações do local. Nesta
perspectiva, assumindo posicionamento contrário a pesquisa de gabinete, o
trabalho de campo vincula-se a análise de aspectos concretos da realidade
empírica.

66
Com relação a ciência não instrumental, aborda-se a ideia da relevância
social do conhecimento cientifico produzido em interface com as estratégias de
produção do que se concebe como desenvolvimento social. Já no que se refere a
tecnociência, a vinculação do processo científico com a promoção de interesses
econômicos, configura um instrumento de alcance a habilidades com fins de
ampliação competitiva e mercadológica.
Por fim, no que tange às contribuições para o desenvolvimento das
pesquisas, compreende-se os procedimentos que podem ser aplicados pelas
variadas instâncias a partir dos estudos analisados para favorecer o equilíbrio do
crescimento econômico, a preservação do meio ambiente e a melhoria da
qualidade de vida das populações.

Resultados e discussão

Foram observados que os trabalhos analisados correspondem a pesquisas


desenvolvidas por estudiosos da área da saúde coletiva, ciência ambiental,
ciências humanas, ciências da informação e gestão industrial. Observa-se
inicialmente que se trata de estudos diferenciados em que são estudadas
problemáticas relacionadas a sujeitos, objetos e condições naturais sociais.
A perspectiva de análise de conteúdos utilizada foi contituída a partir das
indicações de Franco (2005), que sugere considerar não apenas os aspectos
linguísticos, mas também a produção de inferências acerca de dados verbais
e/ou simbólicos. Assim, segundo a autora, este tipo de análise enfatiza uma
concepção crítica e dinâmica da linguagem, sendo esta, por sua vez,
considerada como uma construção real que reflete o dinamismo existente entre
o pensamento e a ação.
Partindo deste pressuposto, os tipos de comparações dos conteúdos podem
ser multivariados, a depender da intencionalidade do pesquisador. Sendo assim,
compreende-se claramente que a viabilização das análises dos documentos
selecionados corresponde necessariamente a uma atividade intelectual de
abstração (FRANCO, 2005).

67
Esta análise constou não apenas na identificação da observação das
ocorrências de cada um dos aspectos avaliados em cada trabalho avaliado, mas
também da discussão teórica voltada ao reconhecimento da existência ou
importância dos mesmos no cenário científico do qual os trabalhos fazem parte.
Assim, as palavras-chave aqui empregadas, implicam em especificidades
diferenciadas quanto a cada aspecto do qual se optou para efetivação da análise
cujos resultados aqui apresentamos.
Logo, a esquematização das informações trabalhadas no decorrer deste
trabalho constitui-se como um desafio organizacional, de modo que, buscando
minimizar as dificuldades correspondentes a este processo, relacionaram-se os
itens analisados com todos os trabalhos científicos correspondentes a cada
palavra chave utilizada durante o período de exame do corpus de artigos (Quadro
01).
Quadro 01: Análise de conteúdo dos trabalhos avaliados

Artigos Científicos
Itens analisados Meio ambiente Sociedade Tecnologia
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15
Autores de áreas distintas
conhecimento científico
Pesquisa qualitativa
Pesquisa quantitativa
Trabalho de campo
Ciência não instrumental
Tecnociência
Sugestões
desenvolvimento

Auto nível
Nível elementar
Ausência

Observou-se nos artigos que com relação a primeira palavra chave (meio
ambiente), houve uma alta representatividade de autores de áreas distintas do
conhecimento científico em nível elementar. Já a pesquisa qualitativa teve
representação em quatro dos cinco artigos analisados, sendo concebida em nível
alto e elementar, a pesquisa quantitativa incidiu apenas em um documento.

68
O trabalho de campo não foi constatado em nenhum dos artigos descritos,
bem como a verificação de uma interpretação alinhada à tecnociência para esta
palavra-chave. Quanto à associação destes trabalhos as características da
ciência não instrumental, observou-se a sua totalidade alinhada a uma
perspectiva social, sendo apresentada, em três dos cinco documentos analisados,
algumas sugestões relativas à promoção do desenvolvimento.
Com relação à segunda palavra-chave (sociedade), no que tange à
presença de autores de áreas distintas, bem como a pesquisa qualitativa,
observou-se grande representatividade, variando entre níveis altos e elementares.
A pesquisa quantitativa incidiu em dois documentos, enquanto o trabalho de
campo não foi observado e a tecnociência indicada em um trabalho. A pesquisa
qualitativa e sugestões para o desenvolvimento aplicado à temática surgiram em
três documentos. Os aspectos relativos à ciência não instrumental foi visualizado
em todos os artigos desse subcampo, variando entre o nível alto e elementar.
Finalmente, através da terceira palavra-chave (tecnologia), foi averiguada
uma alta representatividade de todos os elementos. A pesquisa quantitativa e
sugestões de desenvolvimento foram os únicos aspectos constatados em todas
as publicações analisadas. A pesquisa qualitativa e o trabalho de campo
possuíram quatro ocorrências. Dois dos trabalhos estudados apresentaram
aspectos da tecnociência na sua constituição, enquanto três estão associados a
um papel não instrumental do conhecimento.
Diante da apreciação desta pequena amostra não aleatória, compreende-se
que a presença dos itens analisados correspondem a vieses expressivos da
existência da interdisciplinaridade aplicada aos artigos avaliados e, em alguns
casos, o seu aproveitamento social. Considerando a produção de conhecimentos
generalizáveis e descrições mais aprofundadas de vários objetos de investigação,
afirma-se que a projeção de interesses multilaterais já se constitui como uma
realidade complexa indicada nesta pesquisa.
Por fim, considerando, sobretudo, os aspectos da ética e da
responsabilidade que emergem em meio a essa metamorfose, ressaltam-se a
indissociabilidade dos aspectos quantitativos e qualitativos, científicos e

69
empíricos, reais e abstratos. Podemos otimizar que vivenciamos um período de
transformações e evoluções complexas das quais deve-se lançar novos e
constantes questionamentos que atendam ao processo de construção do
conhecimento acerca da objetividade e subjetividade do real, no qual a ciência é
uma das bases fundamentais.
Nesta perspectiva, este contexto trata de análises diferenciadas quanto aos
objetivos e procedimentos teórico-metodológicos analisados. Deste modo, a
produção científica da qual se efetivou os procedimentos metodológicos,
assumem denotações científicas que se instituem desde pesquisas unicamente
bibliográficas, até estudos empíricos e de percepção.

Considerações finais

O desenvolvimento de perspectivas que estendam diálogos com os


contextos reais de produção científica assume relevância considerável, haja vista
que o reconhecimento das tendências seguidas pelos autores através de
aspectos característicos, é norteador para compreender como ocorre o processo
de construção do próprio conhecimento científico e seu reflexo na sociedade.
Trata-se de uma análise de baixa possibilidade de generalização,
contribuindo, no entanto, para formulação de novas questões e hipóteses de
pesquisa, como por exemplo, quais as principais áreas do conhecimento científico
dentro das ciências humanas e sociais apresentam maior resistência à difusão do
pensamento complexo? Quais as implicações desta situação na progressão do
conhecimento científico? Como estes conhecimentos podem ser vinculados a
uma reflexão em termos mais holísticos do que apenas economicistas?

Referências

ABERS, Rebecca Neaera; KECK, Margareth E. Representando a


diversidade: Estado, sociedade e "relações fecundas" nos conselhos gestores.
CADERNO CRH, Salvador, v. 21, n. 52, p. 99-112, Jan./Abr. 2008.

70
CANESQUI, Ana Maria. Produção Científica das Ciências Sociais e Humanas em
Saúde e Alguns Significados. Saúde Soc. São Paulo, v.21, n.1, 2012. 15-23p.
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação: a ciência, a sociedade e a cultura
emergente. São Paulo, SP: Cultrix, 1982. 445p.
FRANCO, Maria Laura Puglisi Barbosa. Análise de Conteúdo. Brasília, 2º
edição: Liber Livro Editora, 2005. 79p.
JACOBI, Pedro Roberto. Espaços públicos e práticas participantes na gestão do
meio ambiente no Brasil. Sociedade e Estado, Brasília, v. 18, n. 1/2, p. 137-154,
jan./dez. 2003.
JONAS, Hans. O princípio da responsabilidade: ensaio de uma ética para a
civilização. Rio de Janeiro: Contraponto: Ed. PUC, 2006. 354f.
LEITE, Eliane da Silveira Meirelles. GALIAZZI, Maria do Carmo. Crianças,
consumo e educação ambiental: Problematizações na sociedade contemporânea.
Rev. Eletrônica Mestrado em Educação Ambiental. v. 30, n.2, p. 204 - 223,
jul./dez. 2013.
LEFF, Henrique. A complexidade ambiental. Tradução de Eliete Wolff. São
Paulo: Cortez, 2003.

MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa


qualitativa em saúde. 5. ed. São Paulo/ Rio de Janeiro: HUCITEC/ ABRASCO.
1998. 254p.
MORIN. Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Tradução do francês:
Eliane Lisboa. Porto Alegre: Sulina, 2005. 120 p.
MORIN. Edgar. Ciência com consciência. Tradução de Maria D. Alexandre e
Maria Alice Sampaio Dória. Ed. Revista e modificada pelo autor – 8ºed. – Rio de
Janeiro: Bretrand Brasil, 2005. 350p.
NAVARRO, Marli B. M. de Albuquerque; CARDOSO, Telma Abdalla de
Oliveira. Percepção de risco e cognição: reflexão sobre a sociedade de risco.
Ciências e Cognição, 2005. V. 6. Rio de Janeiro.

71
OLIVEIRA, Maria Rosário de. GiIROLETTI, Domingos Antônio. A transferência
de tecnologia da UFMG para uma empresa privada: Processo e resultados.
Anais do II SINGEP e I S2IS – São Paulo – SP – Brasil – 07 e 08/11/2013.
ORTH, Miguel Alfredo. As políticas educacionais a distância em uma sociedade
globalizada. Revista Educação em Questão, Natal, v. 37, n. 23, p. 76-98,
jan./abr. 2010.
PACHECO, Roberto. KERN, Vinícius. Arquitetura conceitual e resultados da
integração de sistemas de informação e gestão da ciência e tecnologia.
DataGramaZero - Revista de Ciência da Informação - v.4 n.2 abr/03.
PASSOS, Francisco Uchoa. ARAÚJO FILHO, Frederico Wergne de Castro.
Travassos, Xisto Lucas. Desenvolvimento de uma metodologia de integração
da tecnologia rfid para a cadeia de suprimentos das empresas montadoras de
microcomputadores no pólo de informática de ilhéus/BA. Revista Gestão
Industrial. V. 09, N. 03: P. 571-592. 2013.
PEREIRA, Martha Priscila Bezerra. Competências e práticas sociais de
promoção e vigilância a saúde na cidade do Recife: O agente de saúde em
foco. São Paulo: Scortecci, 2011. 351 p.
SILVA, Antonelli Santos; GUERRA, Charles Albert; OLIVEIRA, Daniela
Barbosa de; OLIVEIRA, Karine Beraldo. A representação social sobre meio
ambiente na leitura técnica do plano diretor de Palmas – TO. Interface, Edição
número 06, maio de 2013.
SOARES, Glaucio Ary Dillon; SOUZA, Cíntia Pinheiro Ribeiro de; MOURA,
Tatiana Whately de. Colaboração na produção científica na Ciência Política e
na Sociologia brasileiras. Revista Sociedade e Estado – v. 25 n. 3. 2010. 525-
538p.
Soares, Sérgio R. A., Bernardes, Ricardo S. and Cordeiro Netto, Oscar de
M. Relações entre saneamento, saúde pública e meio ambiente: elementos para
formulação de um modelo de planejamento em saneamento. Cad. Saúde
Pública, Dez 2002, vol.18, no.6, p.1713-1724.

72
SOUZA, Maria Adélia Aparecida de. Meio ambiente e desenvolvimento
sustentável: As metáforas do capitalismo. Cronos, Natal-RN, v. 10, n. 2, p. 101-
117, jul./dez. 2009.
SOUZA, Heluane Aparecida Lemos de. CAVALARI, Rosa Maria Freiteiro. As
concepções de natureza e de relação sociedade-natureza no pensamento de
Monteiro Lobato. Rev. eletrônica Mestrado em Educação Ambiental. v. 23,
julho a dezembro de 2009.
STRAPASSON, Alexandre Betinardi. JOB, Luís Carlos Mavignier de Araújo.
Etanol, meio ambiente e tecnologia reflexões sobre a experiência brasileira.
Revista Política Agrícola. Ano XV – Nº 3 – Jul./Ago./Set. 2006.
TAVARES, Luís César Viera. BASSOI, Manoel Carlos. MIRANDA, Luiz Carlos.
Pretes, Cássio Egidio Cavenaghi. Transferência de tecnologia para cultivares de
trigo no estado do paraná. Revista Brasileira de Sementes, vol. 33, nº 1 p. 021 -
027, 2011.
TAUCHEN, Joel; BRANDLI, Luciana Londero. A gestão ambiental em instituições
de ensino superior: modelo para implantação em campus universitário. Gest.
Prod. São Carlos, v. 13, n. 3, 2006.
THIOLLENT, Michel. Metodologia da pesquisa-ação. 6. Ed.– São Paulo: Cortez,
1994. 107 p.
ZIMAN, John. Ciencia y Sociedad Civil. Rev. iberoam. cienc. tecnol. soc., Set
2003, vol.1, no.1, p.177-188.

73
GT4- Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional

Território e os Programas de Pós-graduação com Mestrado e Doutorado na


Área de Planejamento Urbano e Regional no Brasil1

Christiane Fabíola MOMM2


Marcos Antônio MATTEDI3
Universidade Regional de Blumenau – FURB

RESUMO
Os territórios são a expressão de uma ordem social e as fronteiras que delimitam o
público e o privado podem ser estabelecidas de muitas formas: politicamente,
economicamente, culturalmente, etc. O território pode assumir uma variedade de
formas. Uma das formas menos conhecidas e pesquisadas diz respeito às fronteiras
estabelecidas pela ciência e, em particular, pela pesquisa científica. Como se pode
dividir um país considerando os programas de pós-graduação? Pautado em
pesquisa exploratória, bibliográfica e documental, analisa-se a configuração
territorial dos programas com mestrado e doutorado em Planejamento Urbano e
Regional (PUR) no Brasil. Conclui que os programas estão concentrados no sul do
país; há assimetrias em relação à produção de conhecimento científico e ao
território, pois não há programas de mestrado com doutorado na área de PUR no
norte e centro-oeste do Brasil.
PALAVRAS-CHAVE: Desenvolvimento Regional; Doutorado; Mestrado;
Planejamento Urbano e Regional; Território.

INTRODUÇÃO
O mundo está cada vez mais territorializado, e um aspecto que demonstra
essa territorialização pode ser identificado quando as pessoas se defrontam com
informações sobre o que é ou não permitido ou proibido, ou ainda, com placas de
“somente pessoal autorizado” ou “proibida entrada”. Storey (2012, p.1), descreve
que “todos os dias avisos e advertências refletem tentativas para impor formas de
poder (através de regras e regulações) sobre porções do espaço geográfico”. Costa
(2006) descreve que o território é usualmente focalizado em quatro dimensões,
quais sejam: a política, a cultural, a econômica e a “natural”. Um território pode ser

1
Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES, Campina
Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014.
2
Doutoranda em Desenvolvimento Regional na Universidade Regional de Blumenau – FURB, Blumenau – SC.
Bolsista CAPES. christifabi@gmail.com
3
Doutor em Ciências Sociais e Pós- Doutor no Centre de Sociologie de L’innovation-ENMP/Paris. Professor
Titular no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade Regional de Blumenau –
FURB, Blumenau – SC.mattediblu@gmail.com
reconhecido pelas características relacionadas ao meio ambiente (naturais) ou por
sua cultura (identidade de uma determinada comunidade).
Nesse contexto, observa-se que há uma ciência que estuda principalmente a
intervenção humana no território, a ciência regional (BENKO, 1999, p.2). Essa
ciência possui influências de campos de estudo como a economia, a geografia, a
sociologia, a antropologia, as ciências políticas, o urbanismo, que se tornaram
perceptíveis em função das proposições para avaliar questões que, dentre outros
aspectos, contemplavam a sociedade (ser humano), o território, o planejamento, as
políticas públicas, o ambiente, a economia, as desigualdades regionais, locais, os
recursos sustentáveis. Dessa forma, a ciência regional apresenta uma variedade de
domínios que podem ser analisados sob a ótica dessa ciência. De acordo com
Benko (1999), é possível realizar análises a partir do agrupamento em quatro
grandes temáticas: localização das atividades econômicas, organização e
estruturação do espaço, interações espaciais e desenvolvimento regional.
Assim, a ciência regional possibilita estudar, não só o desenvolvimento
regional, mas também, possibilita desenvolver estudos não só sobre a sociedade e
outras temáticas já elencadas, mas sobre o território.Na percepção de Delaney
(2005, p. 12) o “Território, por sua vez, informa aspectos chaves das identidades
coletivas e individuais. Ele molda e é moldado pelo coletivo social e pela
autoconsciência”. Além disso, o conceito de território pode ser definido como: “o
espaço econômico socialmente construído, dotado não apenas de recursos naturais
de sua geografia física, mas também da história construída pelos homens que nele
habitam, através de convenções de valores e regras...” (MARINI; SILVA, 2011, p.
110). Esses valores e regras podem condicionar ações e direcionar decisões.
Nesse sentido, estudos sobre o território, bem como, sobre o
desenvolvimento no território, são objeto das análises da comunidade científica.No
que se refere ao Desenvolvimento Regional no Brasil, o conhecimento científico
produzido está vinculado à atuação da comunidade científica alocada no território,
nos programas de pós-graduação stricto sensu. O processo de desenvolvimento do
campo de estudo resulta como consequência da produção do conhecimento na área
e, no Brasil, os programas de pós-graduação stricto sensu desenvolvem e

2
contribuem para a construção do conhecimento. No entanto, essa comunidade
científica encontra-se dispersa pelo território brasileiro e a formação de massa crítica
em torno de uma determinada área pode não ocorrer de forma equitativa.
Assim, o objetivo principal do trabalho é analisar a configuração territorial dos
programas de pós-graduação em Desenvolvimento Regional no Brasil, a partir dos
programas que possuem, além do mestrado, também o curso de doutorado na área.
O trabalho está pautado em pesquisa exploratória, bibliográfica e documental e está
estruturado a partir dessa introdução, seguida das seções “A Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior e a pós-graduação no Brasil: um
breve histórico, Programas de Pós-graduação na área de Planejamento Urbano e
Regional no Brasil”, Metodologia e conclui com as Considerações.

2 A COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NÍVEL


SUPERIOR E A PÓS-GRADUAÇÃO NO BRASIL: UM BREVE HISTÓRICO
No território brasileiro a história da pós-graduação, em âmbito stricto sensu,
data do ano de 1951, quando foi criada a “Campanha Nacional de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior”, hoje conhecida como CAPES – Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pelo decreto de nº 29.741, que
objetivava “assegurar a existência de pessoal especializado em quantidade e
qualidade suficientes para atender às necessidades de empreendimento que
visavam ao desenvolvimento do país” (BRASIL, 2013). É no ano de 1965 que a pós-
graduação tem cursos classificados, sendo 27 cursos em nível de mestrado e 11 em
nível de doutorado, totalizando 38 cursos no país.
Após o parecer 977 de 1965 (regulamentação da pós-graduação), no plano
educacional há destaque para a política de ensino superior, ciência e tecnologia,
tendo em vista que a CAPES (BRASIL, 2013) “ganha novas atribuições e meios
orçamentários para multiplicar suas ações e intervir na qualificação do corpo
docente das universidades brasileiras”. Assim, a CAPES passou a ter papel de
destaque na formulação da nova política para a pós-graduação. No ano de 1981, a
CAPES, passa a ser responsável pelo Plano Nacional de Pós-graduação Stricto
Sensu e pelo Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia no país, enfocando a

3
elaboração, avaliação, acompanhamento e coordenação de atividades vinculadas ao
ensino superior (BRASIL, 2013). No entanto, o primeiro plano nacional de pós-
graduação refere-se ao período de 1975-1980.
No ano de 1990, após um período conturbado, em função de sua extinção
(período do Governo Collor) e intensa mobilização da comunidade científica e do
Ministério da Educação, a CAPES é recriada. Em 1995, com o novo governo, a
CAPES passa por uma reformulação e se torna responsável pelo acompanhamento
e avaliação de cursos de pós-graduação stricto sensu do território brasileiro. É nesse
período que o sistema de pós-graduação ultrapassa a marca de 1000 cursos de
mestrado e 600 cursos de doutorado, envolvendo 60 mil alunos. Atualmente, a
CAPES, é responsável também pela formação inicial e continuada dos professores
da educação básica no país (BRASIL, 2013).
Esses cursos de pós-graduação permitem a formação de massa crítica nas
áreas de conhecimento e ao mesmo tempo promovem a produção do conhecimento
científico. Para Velho (2011, p. 137), o conhecimento científico só pode ser
produzido por cientistas especificamente treinados para produzir conhecimento
objetivo. Ressalta-se ainda que, para Velho (2011, p. 137), “a ciência é vista como a
base, a origem da tecnologia”. Nesse sentido, ciência e tecnologia podem ser
‘motores’ para o progresso, Gouveia (2009) destaca que a competitividade de um
dado território, está cada vez mais relacionada com o conhecimento de seus ativos
humanos e com a capacidade de produção do conhecimento.
Verificou-se junto às informações disponibilizadas pela CAPES, que o Brasil
possui na grande área das Ciências Sociais Aplicadas, a área de avaliação do
Planejamento Urbano e Regional (área em que se insere o desenvolvimento
regional), 32 cursos de pós-graduação stricto sensu na área de Planejamento
Urbano e Regional. Parte da produção do conhecimento científico em
Desenvolvimento Regional é desenvolvida em programas de pós-graduação stricto
sensu que estão concentrados, em sua maioria, nos estados do litoral do Brasil e
outros programas de pós-graduação que se encontram em regiões do interior do
país. Gouveia (2009, p.14) ainda menciona a importância das instituições de ensino
superior tendo em vista que

4
transformam-se em elementos cruciais da equação da competitividade e
da capacidade de atrair investimento de uma dada região, desde que
conscientes do seu papel de não transmissores de conhecimento
“importado”, mas sim produtores de conhecimento local e que seja
reconhecido como uma centralidade, mesmo fora dos limites do território
onde estão inseridas.
Destaca-se que para Rolim e Serra (2009, p. 85) “as universidades sempre
deram contribuições para o desenvolvimento das nações. Entretanto, a preocupação
com o papel que elas desempenham no desenvolvimento das regiões em que estão
inseridas é recente”. Para os autores,
a educação superior vem sendo identificada como o principal motor para
o desenvolvimento econômico, cultural e social dos países e,
principalmente, das regiões. De fato, a dimensão regional passa a ter
uma importância capital na medida em que o ambiente regional/local é
tão importante quanto à situação macroeconômica nacional na
determinação da habilidade das empresas em competir numa economia
globalizada, ou seja, a disponibilidade dos atributos regionais/locais
(conhecimento, habilidades, etc.) (...), o que faz das universidades que
estão umbilicalmente ligadas às suas regiões...(ROLIM; SERRA, 2009,
p. 87).
Diante do exposto, a seguir serão apresentados os programas de pós-
graduação em Desenvolvimento Regional que integram a área de avaliação de
Planejamento Urbano e Regional/Demografia conforme o disposto pela CAPES.

3 PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO NA ÁREA DE PLANEJAMENTO


URBANO E REGIONAL NO BRASIL
ACAPES, recomenda e reconhece 32 programas de pós-graduação stricto
sensu na área de Planejamento Urbano e Regional (BRASIL, 2013). O histórico dos
programas de pós-graduação na área de Planejamento Urbano e Regional inicia a
partir da década de 1970, em Porto Alegre, no Rio de Janeiro, no Recife, Brasília e
São Paulo. Esses primeiros cursos estavam vinculados à área da Arquitetura e
Urbanismo e somente a partir da década de 1980 os programas de pós-graduação
foram agregados à área da demografia em função da criação de um mestrado e
doutorado nessa área. Na década de 1990 foram criados 11 mestrados acadêmicos
e surgiram 4 doutorados vinculados aos programas mais antigos. Atualmente, os
programas de pós-graduação em Planejamento Urbano e Regional possuem
estrutura pautada nas orientações e avaliações da CAPES considerando dentre
outros aspectos, a área de concentração, conforme poderá ser observado a seguir:
5
Quadro 1 – Programas de Pós-graduação recomendados e reconhecidos pelas CAPES na área de Planejamento Urbano e Regional (PUR)

IES (Universidade) Cidade/UF Nome do Programa M/D Início Áreas de Concentração


Universidade Federal do Rio Grande do Sul- Porto Alegre/RS Planejamento Urbano e M/D 1970 • Planejamento urbano e regional e os
UFRGS Regional processos sociais
2004 • Sistemas de suporte à decisão em
planejamento e desenho urbano

IPPUR - Instituto de Pesquisa e Planejamento Rio de Janeiro/RJ Planejamento urbano e M/D 1971 • Planejamento Urbano e Regional
Urbano e Regional na Universidade Federal regional 1993
do Rio de Janeiro - UFRJ
Universidade Federal de Pernambuco - UFPE Recife/PE Desenvolvimento urbano M/D 1975 • Desenvolvimento Urbano
1999
Universidade de Santa Cruz do Sul – Santa Cruz do Sul/ RS Desenvolvimento regional M/D 1994 • Desenvolvimento regional
UNISC/RS 2005
Universidade Salvador –UNIFACS Salvador /BA Desenvolvimento regional e M/D 1999 • Processos urbanos e regionais do
urbano 2006 desenvolvimento
• Desenvolvimento e políticas regionais
• Desenvolvimento, políticas urbanas e redes
de cidades
• Turismo e Desenvolvimento
• Circuitos Internac. e Locais do Turismo
Universidade Regional de Blumenau – Blumenau/SC Desenvolvimento regional M/D 2000 • Desenvolvimento regional sustentável
FURB/SC 2012
Universidade do Oeste do Paraná – Toledo/PR Desenv. regional e M/D 2002 • Desenvolvimento regional e do agronegócio
UNIOESTE agronegócio
Pontifícia Universidade Católica do Paraná - Curitiba/PR Gestão urbana M/D 2003 • Planejamento Urbano e
PUC/PR 2009 Regional/Demografia
Universidade Católica de Salvador – UCSAL Salvador/BA Planej. territorial e M/D 2005 • Territorialização e Desenvolvimento Social
desenvolvimento social 2012
Universidade Federal do ABC - UFABC Santo André/SP Planej. e gestão do território M/D 2011 • Planejamento e Gestão do Território
2012
Fonte: CAPES, 2014.

6
É possível verificar que dos programas de pós-graduação que possuem
mestrado e doutorado na área, cinco programas estão localizados na região
Sul, três na região Nordeste e dois na região Sudeste. Pode ser válido refletir
sobre essa configuração territorial e observar um aspecto apontado ainda no
primeiro Plano Nacional de Pós-graduação (1975-1980) uma vez que, “com a
concentração geográfica verificada, tem ocorrido um indesejável processo de
migração pós-universitária em um único sentido predominante - do interior para
as áreas das grandes capitais -...” (BRASIL, 1975, p. 11). Além disso,
retomando o histórico dos programas de pós-graduação na área de
Planejamento Urbano e Regional é possível visualizar que os primeiros
programas se localizaram em metrópoles, dispersos nas regiões sul do país,
sudeste e nordeste.

4 METODOLOGIA
Para atender o objetivo proposto, foi realizado um estudo exploratório
pautado em pesquisa bibliográfica e documental. Foi consultada a base de
dados da CAPES, considerando-se a lista dos cursos recomendados e
reconhecidos na grande área de Ciências Sociais Aplicadas, área de escopo
de Planejamento Urbano e Regional/Demografia enfocando os programas de
mestrado e doutorado na área no Brasil, bem como, documentos de área e
Planos Nacionais de Pós-Graduação. Quanto à configuração territorial dos
programas de pós-graduação com mestrado e doutorado na área, esta se
apresenta conforme a figura 1 a seguir:

80
Figura 1 – Programas de Pós-Graduação com Doutorado em Desenvolvimento Regional
Fonte: Extraído do sítio do IBGE (2014).

Diante da figura 1, observa-se que há uma concentração de programas


de pós-graduação com mestrado e doutorado na área de Planejamento Urbano
e Regional. Na região sul do país estão alocados (5 programas), seguido da
região nordeste (3 programas) e região sudeste (2 programas). Todos fazem
parte da faixa litorânea do território nacional. Desses, cinco enfocam o
Desenvolvimento, quatro enfocam o Planejamento e um enfoca a Gestão
Urbana (conforme exposto no quadro 2), ambos com temáticas pouco distintas
mas com preocupação similar: promover a discussão acerca dos elementos
que integram a área. No entanto, são 14 áreas de concentração4 em 10
programas de pós-graduação que estudam o planejamento urbano e regional
(cinco áreas de concentração), desenvolvimento (seis áreas de concentração),

4
Ver Quadro 1 - Programas de Pós-graduação recomendados e reconhecidos pelas CAPES na área de
Planejamento Urbano e Regional/Demografia.

81
territorialização (uma área de concentração), turismo (duas áreas de
concentração) e processos urbanos (uma área de concentração).
Pode-se inferir que 10 programas de pós-graduação (mestrado e
doutorado) concentrados especialmente na região sul do país dificilmente
poderão investigar as realidades existentes no território nacional. Esse aspecto
pode gerar assimetrias não só quanto à questão da formação de massa crítica
para atuar, mas também, acerca da produção do conhecimento científico, das
pesquisas sobre as dimensões retratadas por Costa (2006), bem como, das
problemáticas do próprio território (dentre outros) conforme retratado por Marini
e Silva (2011) e Delaney (2005).
A percepção acerca de assimetrias quanto à Pós-Graduação está
retratada no PNPG 2011-2020, onde é citado que “programas foram
idealizados para ampliar o número de docentes doutores e o número de cursos
de mestrado e doutorado nas regiões Norte, Centro Oeste e Nordeste,
reconhecidamente possuidoras das maiores carências de recursos humanos”
(BRASIL, 2011, p.285). No caso da área de Planejamento Urbano e Regional
evidencia-se que as regiões Norte e Centro-Oeste não possuem nenhum
programa de pós-graduação (mestrado e com doutorado) que possa
desenvolver pesquisas e auxiliar na compreensão dos fenômenos relativos ao
Desenvolvimento Regional, Planejamento Urbano e Regional, Território e afins.
Diante disso, percebe-se que se faz necessário atentar para a questão
das assimetrias, que é notória, em virtude de que a própria discussão acerca
do Desenvolvimento Regional (Programas de Pós-Graduação em
Planejamento Urbano e Regional) e das temáticas do campo de estudo não
estarem sendo exploradas em sua totalidade.
Outra questão a ser analisada, decorre do fato de que de acordo com
Abramovay (2006, p. 1-2) “territórios não se definem por limites físicos e sim
pela maneira como se produz, em seu interior, a interação social” e quanto à
configuração territorial, para Delaney (2005, p. 12), “Configurações territoriais
não são artefatos simplesmente culturais. Eles são conquistas políticas”..

82
Assim, destaca-se que a análise sobre a configuração territorial dos programas
de pós-graduação (mestrado e doutorado) na área de Planejamento Urbano e
Regional pode culminar na ênfase das assimetrias em relação à formação de
massa crítica, desenvolvimento do conhecimento científico e dos fenômenos
que ocorrem no próprio território.

5 CONSIDERAÇÕES
A partir da análise realizada nesse trabalho observou-se que muito
embora estejam elencados pela CAPES 32 programas de pós-graduação
stricto sensu, somente 10 programas possuem mestrado e doutorado na área.
A formação de massa crítica para atuar na área concentra-se na região sul
(cinco programas com mestrado e doutorado), sudeste (dois programas) e
nordeste (três programas com mestrado e doutorado) do país. A alocação
destes programas no território brasileiro configura-se na faixa litorânea.
O debate acerca das problemáticas inerentes à área precisam ocorrer
em todo o território de forma que a configuração territorial não seja um
empecilho, mas sim, um motivo para gerar reflexões, que auxiliem na
compreensão ou proposições sobre planejamento urbano e regional no Brasil.
Além disso, as regiões Norte e Centro-Oeste, hoje, não possuem programas de
pós-graduação stricto sensu com mestrado e doutorado, o que evidencia a
questão da assimetria relatada nesse estudo. Assim, que tipo de território está
sendo construído nessas regiões? E as interações sociais como se
desenvolvem? Outras reflexões surgem relacionadas às constatações do
presente estudo, mas, percebe-se que a configuração territorial atual pode
privilegiar alguns em detrimento de outros.

REFERÊNCIAS

ABRAMOVAY, R. Para uma teoria dos estudos territoriais. In: VIEIRA, P. F. et


al. Desenvolvimento territorial sustentável no Brasil. Florianópolis: APED:
SECCO, 2010.

83
BENKO, G. A ciência regional. Oeiras: Celta Editora, 1999.

BRASIL. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES.


Relação de cursos recomendados e reconhecidos. Disponível em: <
http://conteudoweb.capes.gov.br/conteudoweb/ProjetoRelacaoCursosServlet?acao=pe
squisarIes&codigoArea=60500000&descricaoArea=&descricaoAreaConhecimento=PL
ANEJAMENTO+URBANO+E+REGIONAL&descricaoAreaAvaliacao=PLANEJAMENT
O+URBANO+E+REGIONAL+%2F+DEMOGRAFIA> Acesso em: 20 mar 2014.

DELANEY, D. Territory: a short introduction. Oxford – UK: Blackwell publishing, 2005.

COSTA, R. H. da. O mito da desterritorialização: do ‘fim dos territórios’ à


multiterritorialidade. 2ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006.

GOUVEIA, L. B. A necessidade de capacitar conhecimento para o território.


Revista e-ciência, T-Media, Portugal, out. 2009, pp 13-14. Disponível em: <
http://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=3&ved=
0CC4QFjAC&url=http%3A%2F%2Fciteseerx.ist.psu.edu%2Fviewdoc%2Fdownl
oad%3Fdoi%3D10.1.1.161.1375%26rep%3Drep1%26type%3Dpdf&ei=kqlrUNy
NIIXo9AS1t4C4BA&usg=AFQjCNHRIpziCAxtXEey7Zn1xy5lM5eUHQ>. Acesso
em 03 jun 2013.

MARINI, M. J.; SILVA, C. L. Desenvolvimento Regional e Arranjos Produtivos


Locais: Uma abordagem sob a ótica interdisciplinar. Revista Brasileira de
Gestão e Desenvolvimento Regional, v. 8, n. 2, p. 107-129, mai./ago. 2012.

PONTIFÍCIA Universidade Católica do Paraná - PUC/PR. Programa de Pós-


Graduação em Gestão Urbana. Disponível em: <
http://www.pucpr.br/posgraduacao/gestaourbana/> Acesso em: 09 jun 2013.

ROLIM, C. ; SERRA, M. Ensino superior e desenvolvimento regional: avaliação


do impacto econômico de longo-prazo. Associação Brasileira de Estudos
Regionais e Urbanos. 2009, p. 85-106. Disponível em:
<http://www.revistaaber.com.br/index.php/aber/article/viewFile/26/30> Acesso
em: 02 maio 2013.

STOREY, D. Territories: the claiming of space. 2 ed. New York: Routledge, 2012.

UNIVERSIDADE Federal de Pernambuco – UFPE. Programa de Pós-


Graduação em Desenvolvimento Urbano. Disponível em:<
http://www.ufpe.br/mdu/index.php> . Acesso em: 08 jun 2013.

UNIVERSIDADE Federal do ABC – UFABC. Programa de Pós-Graduação em


Planejamento e Gestão do Território. Disponível em: <
https://sites.google.com/site/pospgt/sobre-o-curso> Acesso em: 09 jun 2013.
84
UNIVERSIDADE Católica de Salvador – UCSAL. Programa de pós-graduação
em planejamento territorial e desenvolvimento social. Disponível em:
<http://www.ucsal.br/> Acesso em: 07 jun 2013.

UNIVERSIDADE do Oeste do Paraná – UNIOESTE. Programa de pós-


graduação em Desenvolvimento Regional e Agronegócio. Disponível em: <
http://www.unioeste.br/pos/agronegocio/> Acesso em: 07 jun 2013.

UNIVERSIDADE Regional de Blumenau – FURB/SC. Programa de Pós-


Graduação em Desenvolvimento Regional. Disponível em: <
http://www.furb.br/web/1847/cursos/mestrado/desenvolvimento-
regional/apresentacao>. Acesso em: 08 jun 2013.

UNIVERSIDADE de Santa Cruz do Sul – UNISC / RS. Programa de Pós-


Graduação em Desenvolvimento Regional. Disponível em: <
http://www.unisc.br/portal/pt/cursos/mestrado/mestrado-e-doutorado-em-
desenvolvimento-regional/apresentacao.html> Acesso em: 09 jun 2013.

UNIVERSIDADE Federal do Rio Grande do Sul –UFRGS. Programa de Pós-


Graduação em Planejamento Urbano e Regional. Disponível em: <
http://www.ufrgs.br/propur/ > Acesso em: 09 jun 2013.

UNIVERSIDADE Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Instituto de Pesquisa e


Planejamento Urbano e Regional – IPPUR. Disponível em:
<http://www.ippur.ufrj.br/> Acesso em: 18 maio 2013.

VELHO, L. Conceitos de Ciência e a Política Científica, Tecnológica e de


Inovação. Sociologias, Porto Alegre, v. 13, n. 26, 2011 . Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-
45222011000100006&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 17 mar 2013.

85
GT4- CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Potencial Tecnológico da Universidade Pública e Sua Contribuição Para o


Desenvolvimento Regional e Local¹

Felipe Augusto Lopes Carvalho²;


Janiel Célio Dos Santos²;
Romário Lustosa De Oliveira²;
Elizabete Cristina Sousa Araújo³;
Simone Silva Dos Santos Lopes 4
Núcleo de Inovação e Transferência Tecnológica – NITT/UEPB

RESUMO
As universidades produzem diversas tecnologias resultantes de suas pesquisas
que podem atender às demandas sociais e auxiliam o desenvolvimento
nacional. A Universidade Estadual da Paraíba – UEPB vem aumentando o
número de pesquisas nas várias áreas do conhecimento, bem como a sua
capacidade de gerar produtos inovadores. Prospectar o potencial inovador das
pesquisas realizadas na UEPB representa um compromisso institucional com o
desenvolvimento econômico, tecnológico e social da região, além de incentivar
a cultura da inovação no ambiente da universidade. O objetivo deste trabalho é
apresentar o mapeamento tecnológico realizado nas pesquisas desenvolvidas
no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da UEPB, visando avaliar o
potencial e capacidade que as suas pesquisas têm de gerar inovação, novos
produtos e processos aptos a contribuir com o desenvolvimento tecnológico
regional.

PALAVRAS-CHAVE: Inovação Tecnológica; Universidade; Desenvolvimento


Regional; Mapeamento tecnológico

¹ Trabalho apresentado no GT 4 – CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL – II


SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014
² Graduando na Universidade Estadual da Paraíba
³ Técnico Administrativo do Núcleo de Inovação e Transferência Tecnológica – NITT/UEPB
4
Coordenadora da Pesquisa – Professora do Departamento de Biologia- CCBS/UEPB. E-mail:
sisilsantos@gmail.com
INTRODUÇÃO

O desenvolvimento de um país está alicerçado sob a coluna do conhecimento,


expresso no conhecimento científico, e na produção tecnológica. A produção
tecnológica é caracterizada pela geração de produtos e de processos
tecnológicos, com o intuito de contribuir na solução de problemas práticos, o
que pode ser comumente chamado de inovação.

Segundo o site Inventta, o conceito de inovação é bastante variado,


dependendo, principalmente, da sua aplicação. De forma sucinta, a inovação
ocorre quando se cria ou se descobre uma nova utilidade, com um valor
comercial para uma ou mais invenções, sempre em resposta às necessidades
sociais e comerciais por novas ideias, tecnologias, processos, infraestruturas,
compromissos, problemas ou possibilidades.

Pode- se dizer que no processo de inovação tecnológica de um país, três


atores têm papel preponderante, estando nos vértices do famoso “triângulo de
Sábato”: a iniciativa privada, com as Empresas; a iniciativa pública, com o
Governo; e as Universidades, incluindo as instituições públicas e as privadas.
Cada um possui um papel importante no processo de inovação, e a integração
e cooperação desses três componentes constitui um desafio para qualquer
país que almeja uma posição de destaque em sua produção tecnológica.

Historicamente, no Brasil, a pesquisa científica ficou adstrita ao universo


acadêmico, enquanto a produção tecnológica era vista como um tema alheio
ao interesse das salas de aula e laboratório das universidades, ficando
concentrada nas empresas.

Nesse sentido, Edwin Mansfield (1996), pesquisando as fontes de ideias para


inovação tecnológica no estudo Contribuições da nova tecnologia para a
economia, descobriu que menos de 10% dos novos produtos ou processos
introduzidos por empresas dos Estados Unidos tiveram contribuição essencial
e imediata de pesquisas acadêmicas: “A maioria dos novos produtos ou
processos que não poderiam ter sido desenvolvidos sem o apoio de pesquisa
acadêmica não foram inventados em universidades”, reitera Mansfield.

No Brasil, a realidade é bem diferente da americana. Enquanto nos EUA as


empresas investem massivamente em pesquisa e desenvolvimento, a
realidade brasileira ainda se firma na ideia que apenas a universidade deve
investir em Pesquisa, conforme aduz Cruz (2006): “O entendimento de que a
pesquisa aplicada e o desenvolvimento necessários à criação de inovação
tecnológica e competitividade deve ocorrer na empresa é um conceito ainda
incipiente no Brasil. Acontece que, como a quase totalidade da atividade de
pesquisa que ocorre no Brasil se dá em ambiente acadêmico, o senso comum
tende à conclusão de que seria normal apenas universidades fazerem
Pesquisa e Desenvolvimento.”

Embora ocupe um lugar de destaque em termos de produção científico-literária,


o Brasil ainda encontra-se engatinhando no que diz respeito à inovação
tecnológica advinda de pesquisas realizadas nas universidades, reflexo da falta
de uma interação empresa-universidade. Segundo Cruz (2006), o Brasil
construiu uma base acadêmica forte, mas ainda não conseguiu inserir a
pesquisa na indústria, sendo esta a raiz das dificuldades em se converter
conhecimento em desenvolvimento.

Com o passar do tempo, começou a ser percebida a necessidade de unir a


protagonista na produção de conhecimento científico, as universidades, e o
setor empresarial, aquele capaz de transformar esse conhecimento em riqueza,
sob a fiscalização e incentivos do governo.

Neste cenário de mudanças culturais para o avanço da inovação tecnológica


do país, começa a ser difundida a ideia de “Universidade Empreendedora”,
uma atualização para o modelo tradicional das universidades, configurando-se
agora como aquela que desenvolve um sistema interno que compreende a
comercialização do conhecimento gerado nas pesquisas e inclui, não apenas
estruturas, tais como os escritórios de transferência de tecnologia (que auxiliam
nas relações entre as empresas e a academia), mas também incentivos para o
ajuste de linhas de estudo e a alocação de orçamentos de pesquisa para a
demanda dos setores público e privado. Este modelo acadêmico visa ressaltar
o potencial econômico de seus esforços de pesquisa, e considera que, para as
empresas, a academia pode ser uma fonte de novidades científicas e rupturas
tecnológicas para alimentar seu processo de inovação (PARREIRAS, apud
SILVEIRA, 2005).

Sem dúvidas, a universidade constitui um dos ambientes com a maior


incidência de produção tecnológica, aliando o conhecimento científico,
adquirido com as pesquisas executadas, ao desenvolvimento social e
econômico, quando os frutos das pesquisas resultam em produtos e processos
que atendem as necessidades sociais. De acordo com Fava-de-Moraes “a
pesquisa básica executada ‘espontaneamente’ pela Universidade ainda é
comprovadamente a maior fonte de resultados aplicáveis do que a pesquisa
dita ‘encomendada’ por empresa”.

O levantamento do potencial tecnológico de uma universidade permite a


identificação do seu retrato tecnológico, ou seja, a identificação das áreas de
maiores produções e consequentemente contribuição para o desenvolvimento
regional e o local, por meio da transferência do conhecimento gerado
internamente para a sociedade.

O CASO DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA

No Brasil, as Instituições de Ciência e Tecnologia – ICTs produzem diversas


tecnologias resultantes de suas pesquisas que, de alguma maneira,
solucionam problemas científicos e tecnológicos com a finalidade de
desenvolvimento nacional.

A Universidade Estadual da Paraíba – UEPB, a cada ano, vem aumentando o


número de pesquisas nas várias áreas do conhecimento, bem como a sua
capacidade de gerar produtos inovadores. Em breve, poderá estar mais bem
posicionada nas pesquisas e rankings sobre as ICT geradoras de inovação
tecnológica do País.
A UEPB possui oito campi distribuídos pelo estado, num total de 17 programas
de pós-graduações, 46 cursos de graduação e 2 de nível técnico, sendo
estruturada em 12 centros de estudos. Seguindo a tendência tecno-científica
atual, a UEPB se insere nos trilhos do desenvolvimento nacional como uma
ICT dotada de grande potencial inovador, especialmente com a implantação do
Núcleo de Inovação e Transferência Tecnológica – NITT, responsável pela
gestão da propriedade intelectual e pela transferência de tecnologias da
instituição.

A inclusão das atividades da inovação na agenda da UEPB, mediada pelas


atividades do seu Núcleo de Inovação e Transferência Tecnológica - NITT,
representa o compromisso institucional de se inserir no arranjo nacional da
política de inovação, contribuindo, também, com soluções inovadoras para
superação dos problemas regionais, através da possibilidade da transferência
dessas tecnologias para a sociedade.

O objetivo deste trabalho é expor o mapeamento realizado pelo NITT das


pesquisas desenvolvidas em um dos Centros da Universidade Estadual da
Paraíba, o Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS), especificamente
nos cursos de Farmácia, Ciências Biológicas e Odontologia, visando avaliar o
potencial e capacidade que as pesquisas têm de gerar inovação,
desenvolvendo produtos e processos inovadores aptos a contribuir com o
desenvolvimento tecnológico regional; identificar as pesquisas cujos resultados
são passíveis de proteção com base nas leis de propriedade industrial; avaliar
e fomentar a interação universidade-empresa; além de identificar e divulgar o
perfil tecnológico da UEPB com base nas pesquisas desenvolvidas com
potencial tecnológico.

METODOLOGIA

A metodologia empregada no mapeamento envolveu cinco etapas


interdependentes:
1 – Análise, por área, de todas as pesquisas cadastradas nos programas
institucionais de pesquisa e pós- graduação;

2 – Identificação dos pesquisadores e grupos de pesquisas que desenvolvem


projetos com potencial inovador no CCBS;

3- Aplicação de questionários aos pesquisadores e grupos de pesquisas da


UEPB vinculados aos programas institucionais de iniciação científica, visando
obter informações referentes às pesquisas desenvolvidas na instituição;

4- Classificação das pesquisas para identificação dos tipos de proteção mais


adequado para cada produto ou processo desenvolvido em cada pesquisa;

5 – Criação de um banco de dados com todo acervo tecnológico do CCBS da


UEPB, que vise contribuir com o desenvolvimento local e regional, por meio da
divulgação das ofertas que possam contribuir com a demanda da sociedade;

Resultados e Discussões

Seguindo a proposta metodológica do projeto, foram aplicados questionários


aos pesquisadores do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS)
ligados aos programas institucionais de pesquisa, como Programa Institucional
de Iniciação Científica (PIBIC) e Pós-graduação, com o intuito de obter
informações acerca do potencial inovador das pesquisas desenvolvidas na
UEPB. No total, foram analisados 54 projetos de pesquisa, sendo 12 do curso
de Ciências Biológicas, 21 de Farmácia e 21 de Odontologia.

Dentre os 12 projetos do curso de Ciências Biológicas, 2 apresentam potencial


inovador, visando à obtenção de um processo na área da ecologia. Ambos
estão associados ao desenvolvimento de sistemas de tratamento de águas de
abastecimento. Tendo em vista que a Paraíba, especialmente o semiárido
paraibano, traz em sua história sequelas das secas que ano após ano afligem a
população, garantir a segurança hídrica e a qualidade do abastecimento de
água é um objetivo que permeia a atuação dos governantes em todas as
épocas. Dessa forma, não restam dúvidas que o desenvolvimento de um
processo que venha a inserir no mercado inovações no tratamento de águas de
abastecimento representa uma enorme contribuição ao desenvolvimento
tecnológico e social.

Dos 21 projetos analisados do curso de Farmácia, 17 foram avaliados como


possuidores de potencial inovador, dentre os quais 11 para a introdução de
produtos no mercado, envolvendo medicamentos potencialmente
comercializados com empresas de farmacologia bioquímica e molecular; e 6
voltados ao desenvolvimento de processos farmacêuticos.

O mercado farmacêutico movimenta anualmente R$ 28 bilhões e a tendência é


de expansão. O Brasil tem cerca de 540 indústrias farmacêuticas cadastradas,
configurando-se como o nono maior mercado de fármacos e medicamentos do
mundo, segundo dados do Portal Brasil (2014). Um grande investimento em
pesquisa é realizado pelas indústrias farmacêuticas, atendendo às demandas
em escala global por inovações nessa área. A pesquisa realizada nas
universidades, tomando por paradigma os resultados obtidos na UEPB,
representa um forte aliado no desenvolvimento de novos produtos e processos
farmacêuticos, impulsionando o desenvolvimento tecnológico regional. Dotados
de alto valor comercial, quando esses produtos e processos são introduzidos
ou aperfeiçoados no ambiente produtivo, contribuem também com o
desenvolvimento social, disponibilizando à sociedade fármacos outrora
inexistentes ou restritos aos laboratórios universitários, e em grande parte com
valores mais acessíveis para a população.

Foram analisadas 21 pesquisas do curso de Odontologia. Destas, verificou-se


que 2 são dotadas de potencial inovador. Uma delas está voltada ao
desenvolvimento de produtos farmacêuticos aplicados na clínica odontológica;
e a outra relacionada ao desenvolvimento de um processo aplicável em clínicas
odontológicas. A UEPB dispõe atualmente de uma clínica-escola que atende a
população local, além de inúmeros projetos de extensão que oferecem serviços
odontológicos gratuitamente à comunidade. As pesquisas com potencial
inovador na área odontológica resultam em melhorias no atendimento a
população já beneficiada, além do potencial mercadológico que certamente
pode resultar no desenvolvimento regional, alcançando um número
indeterminado de pessoas.

A partir dos resultados obtidos no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde


(CCBS/UEPB), do total de 54 pesquisas analisadas, 21 apresentam potencial
inovador, representando cerca de 39%, divididos entre os cursos de Ciências
Biológicas, Farmácia e Odontologia, conforme demonstrados na tabela abaixo
(Tabela 1).

Tabela 1. Pesquisas com potencial inovador por curso

Ciências
Farmácia Odontologia
Biológicas

Pesquisas analisadas 17 21 21

Pesquisas com potencial inovador 2 17 2

Porcentagem das pesquisas com


12% 81% 1%
potencial inovador
Farmacologia
Clínica
Áreas Ecologia Bioquímica e
Odontológica
molecular
Fonte: autoria própria, 2014

De acordo com NELSON (1993), um Sistema Nacional de Inovação (SNI) pode


ser definido como uma rede de instituições públicas e privadas que interagem
para promover o desenvolvimento científico e tecnológico de um país. Nesse
Sistema, interagem as universidades, escolas técnicas, institutos de pesquisa,
agências governamentais de fomento, empresas de consultoria, empresas
industriais, associações empresariais e agências reguladoras. Quanto maior a
integração dos agentes de um SNI, mais desenvolvido será o país.

Durante a análise dos resultados, percebeu-se que muitas pesquisas são


desenvolvidas com a colaboração de outras instituições, a grande maioria
universidades públicas. Essas instituições estão descritas na tabela abaixo.
(Tabela 2)

Tabela 2. Instituições colaboradoras das pesquisas por curso

Curso Instituições colaboradoras *


Ciências Biológicas UFPB, UFPE
Farmácia UFPB, UFPE, FIOCRUZ/BA, UFCG, USP,
CETENE, INSA
Odontologia UFCG, UFMG, UFRN, UPE-FOP, HOSPITAL
NAPOLEÃO LAUREANO, UNICAMP
Fonte: autoria própria, 2014

Como se percebe, a maioria das instituições que desenvolvem pesquisas


em conjunto com a UEPB são igualmente universidades públicas. No que se
pese a importância destas parcerias para o crescimento da inovação
tecnológica do país, não se pode deixar de reconhecer a pouca participação de
empresas no desenvolvimento de pesquisas inovadoras, ratificando as
dificuldades apontadas por Cruz (2006) no tocante à necessidade de
implementação de esforços conjuntos, por parte das empresas e
universidades, em Pesquisa & Desenvolvimento.

Conforme visto, cerca de 39% das pesquisas analisadas no CCBS/UEPB


apresentam potencial inovador, podendo resultar em produtos e processos
industrializáveis, aptos a contribuir com o desenvolvimento tecnológico e social.

*Instituições colaboradoras:
UFPB: Universidade Federal da Paraíba
UFPE: Universidade Federal de Pernambuco
FIOCRUZ/BA – Centro de Pesquisa Gonçalo Moniz
UFCG: Universidade Federal de Campina Grande
USP: Universidade de São Paulo
CETENE: Centro de Tecnologias Estratégicas do Nordeste
INSA: Instituto Nacional do Semiárido
UFMG: Universidade Federal de Minas Gerais
UFRN: Universidade Federal do Rio Grande do Norte
UPE-FOP: Faculdade de Odontologia de Pernambuco
UNICAMP: Universidade Estadual de Campinas
Apesar do desconhecimento por parte dos pesquisadores da importância e a
viabilidade tecnológica de sua pesquisas, observa-se que o potencial retratado
pelo UEPB tem buscado atender a demanda local, solucionando problemas
que afetam a população como a questão da água e saúde bucal da população.

Indubitavelmente, o setor empresarial é aquele capaz de transformar o


conhecimento científico em riqueza, quando os pesquisadores comercializam
suas tecnologias com as empresas. Entretanto, a falta de interação
universidade-empresa reside no fato de que, até o momento, em nenhuma das
pesquisas analisadas existe o contato com alguma empresa interessada nos
produtos ou processos advindos das pesquisas.

De acordo com estes resultados, pode-se afirmar, de modo empírico e


superficial, que a Lei de Inovação (10.973/04) não está produzindo os efeitos
desejados quando da sua promulgação, pois a Lei enfatiza em diversos
dispositivos a interação universidade-empresa, como ao facultar às ICT’s a
possibilidade de celebrar contratos de transferência de tecnologia e de
licenciamento para outorga de direito de uso ou de exploração de criação por
ela desenvolvida às empresas, ou a possibilidade de a universidade
compartilhar de seus laboratórios e demais instalações com as empresas
interessadas, mediante acordo ou parceria.

Conclusões

Em primeiro lugar, pode-se concluir que, a partir dos resultados obtidos


tomando por paradigma a Universidade Estadual da Paraíba, a universidade
pública é um grande instrumento para o desenvolvimento tecnológico de uma
nação, pois desenvolve inúmeras pesquisas cujos resultados podem acarretar
em produtos e processos aptos a ingressarem no mercado, atendendo às
demandas sociais, contribuindo assim para o desenvolvimento local e regional.

O Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS) da UEPB apresenta um


perfil tecnológico voltado às áreas de ecologia, especificamente relacionado a
sistemas de tratamento de água; e o desenvolvimento de medicamentos
utilizando biomateriais e moléculas bioativas, com aplicação também em
clínicas odontológicas. Dessa forma, há de se reconhecer o papel da UEPB
como catalisadora do desenvolvimento tecnológico e social, caminhando a
passos largos para uma posição de destaque no arranjo nacional da política de
inovação.

Entretanto, apesar do potencial tecnológico que a UEPB apresenta, percebe-se


que a interação universidade-empresa ainda é bastante precária, inviabilizando
a introdução de produtos e processos inovadores para a sociedade. Dessa
forma, conclui-se também pela necessidade de se fomentar a interação
universidade-empresa, visando o aprimoramento das relações de
comercialização de tecnologias advindas de pesquisas desenvolvidas na
Universidade para atender a demanda local e regional.

Referências Bibliográficas:

BERNARDES, J.; Desafios das Universidades Empreendedoras: Universidade


Tradicional X Universidade Corporativa. Fortaleza, CE, 2006. Disponível em: <
http://www.abepro.org.br/biblioteca/ENEGEP2006_TR470319_8126.pdf>. Acesso em
maio de 2014

BRASIL. Lei n. 10973, de 2 de dezembro de 2004. Dispõe sobre incentivos à


inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
2006/2004/lei/l10.973.htm> Acesso em março de 2014

CRUZ, C.; A Universidade, a Empresa e a Pesquisa. Disponível em:


http://www.ifi.unicamp.br/~brito/artigos/univ-empr-pesq-rev102003b.pdf Acesso em
maio de 2014

FAVA-DE-MORAES, F. Universidade, inovação e impacto socioeconômico. São


Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 14, n. 3, 2000. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
88392000000300003&lng=pt&nrm=iso>.
MANSFIELD, E.; Contributions of new technology to the economy, em
Technology, R&D and the Economy, ed. Bruce Smith e Claude Barfield. P. 125 The
Brookings Institutions, Washington, DC, 1996.

PARREIRAS, Viviane Masseran Antunes. Processos de transferência de


conhecimento e interações entre universidades e empresas: o caso da PUC-Rio.
2010. 88p. Dissertação de Mestrado em Engenharia de Produção – Universidade
Federal do Rio de Janeiro/COPPE, Rio de Janeiro, 2010

Portal Brasil. Saiba mais sobre a indústria farmacêutica do País. Disponível


em:<www.brasil.gov.br/ciencia-e-tecnologia/2010/12/industria-farmaceutica> Acesso
em 07/07/2014
GT4 - CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

O Setor de Tecnologia da Informação e Comunicação no Conjunto da


Economia Brasileira1

Danillo Alves de OLIVEIRA2


Ângela Cristina Trevisan FELIPPI3
Cidonea Machado DEPONTI4
Carlos Eduardo Ruschel ANES5

RESUMO

O processo de globalização ocorrido nas últimas três décadas do século XX,


ocasionou profundas transformações nos âmbitos, político, econômico,
científico e tecnológico em escala global, especialmente nos meios de
produção, onde a busca por competitividade levou as empresas e corporações
a buscarem a máxima eficiência produtiva, tendo como foco a redução dos
custos de produção e aumento da produtividade. Entretanto, tal fato somente
poderia ser alcançado com adoção de recursos tecnológicos nos diversos
segmentos que compõem as economias. O objeto deste estudo consistiu em
analisar e discutir o comportamento do setor de Tecnologia da Informação e
Comunicação - TIC no Brasil a partir do período compreendido entre 2003 a
2006, tendo como referência os segmentos da indústria, comércio e serviços,
evidenciando assim a importância do setor de TIC para o conjunto da economia
nacional, nos níveis de geração de emprego e renda, e composição da balança
comercial, sendo demonstrado que o segmento que mais absorveu TIC foi o de
serviços, entretanto o que apresentou maiores índices de crescimento foi o
comércio. Com relação às importações e exportações, ficou visível o
predomínio da dependência tecnológica.

PALAVRAS-CHAVE: Competitividade, Produtividade, Setores Econômicos,


Tecnologia.

1 Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento


2 Doutorando em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC
(danillocomp@hotmail.com).
3. Professora do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade

de Santa Cruz do Sul – UNISC (angelafe@unisc.br).


4. Professora do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade

de Santa Cruz do Sul – UNISC (cidonea@yahoo.com.br).


5. Doutorando em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC

(carlos.anes@uffs.edu.br).

98
INTRODUÇÃO

A busca pela eficiência produtiva e competitiva destacada em plena era


estabelecida pelo processo de globalização, levou as empresas, em especial, a
partir da segunda metade da década de 1970, a redesenhar seus processos
produtivos, cujo foco incidiu-se, principalmente, sobre a redução dos custos de
produção, do aumento da capacidade produtiva e do ganho de competitividade.
Entretanto, essa condição somente seria alcançada a partir de um
processo pautado na utilização de tecnologias, efetivadas através do uso de
sistemas computacionais, essencialmente propiciados pelo desenvolvimento da
microeletrônica, da inteligência dos softwares e pela organização e expansão
das redes de telecomunicação, reestruturando desta forma o modelo dos
processos produtivos, permitindo assim a inserção de mecanismos de
automação que alavancasse ganhos de produção em escala.
Desta forma, os investimentos em tecnologia seriam imprescindíveis, e a
adoção de tais mecanismos tornou-se estratégico para obtenção de
competitividade frente aos mercados interno e externo, ao tempo em que a
informação assumia uma importância ainda maior na estrutura organizacional e
produtiva das empresas, onde até então, a acumulação de riqueza estruturava-
se quase que unicamente na produção de bens tangíveis.
Para o conjunto da economia brasileira, esta condição não é contrária, e,
portanto, a investigação do complexo de elementos que estruturam a dinâmica
dos agregados econômicos contidos no setor de TIC no país, tal como, sua
observância no comportamento da economia nacional, faz-se importante para a
compreensão dos aspectos que influenciam as variáveis econômicas, como,
número de empresas de TIC, número de pessoal ocupado, salários e
composição da balança comercial.
Este estudo consiste em analisar as variáveis econômicas acerca do
setor de TIC no Brasil, buscando evidenciar dentre os setores da indústria,
comércio e serviços, o valor econômico adicionado por este segmento nos
níveis de geração de empregos, renda e pela participação nas importações e
exportações, mediante os produtos e serviços ofertados por este segmento no
mercado brasileiro.
Os dados aqui constantes foram coletados a partir da pesquisa
divulgada pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística em 2009.
Este trabalho contempla o levantamento de dados do setor de Tecnologia da
Informação e Comunicação entre os anos de 2003 e 2006. Apesar dos dados
não serem de um período tão recente, torna-se relevante enfatizar que até o
presente momento, esta é a atual pesquisa levantada pelo IBGE, que relaciona
os agregados econômicos da economia, ao setor de TIC.
Para análise da evolução dos resultados será utilizada a taxa geométrica
de crescimento TGC, que consiste em verificar o comportamento do agregado
em relação ao tempo, utilizando o valor inicial e o valor final ou ajustando a
uma regressão.

99
DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO

A busca contínua pelo crescimento econômico, diversas tecnologias


foram desenvolvidas e aprimoradas no decorrer do século XIX e início do
século XX, até se chegar à era da informática, nas proximidades da década de
1940, quando surge o primeiro computador programável, que naquele instante,
não tinha fins comerciais apenas militares, cabendo aqui ressaltar, que a
utilização para fins comerciais somente ocorreu a partir do final da década de
1950. Entretanto, até meados da década de 1970 a computação era dominada
pelos chamados computadores de grande porte ou mainframes, que restringia
o seu uso ao governo e as grandes corporações. A popularização dos
computadores tem início a partir do final desta última década, propiciada
através do surgimento do microcomputador e a sua massificação nas décadas
seguintes.
Castells (2005, p.91), relata que a década de 1970 influenciou de forma
significativa o contexto estrutural das inovações que ali emergiram, e, por
sequência, desenvolveram-se nas décadas seguintes, modo pelo qual,
tornaram-se determinantes na forma como a tecnologia estabeleceu sua
interação com a sociedade, especialmente a partir do século XXI.
E nesta perspectiva do surgimento de novas tecnologias e inovações, a
utilização de computadores no desenvolvimento das atividades produtivas
expandiu-se rapidamente e chegou à indústria ainda nas décadas de 1970 e
1980, causando, em primeira instância, profundas transformações nos modelos
de produção e, seguidamente, nas formas de negócios, permitindo automação
dos processos industriais, e, por consequência redução de custos e ganho de
produtividade em escala. Neste sentido, Fusfeld (2003), salientou a importância
do crescimento econômico a partir do contexto tecnológico.

O crescimento econômico também estimulou rápidos avanços


tecnológicos. Computadores e controles eletrônicos tornaram possível a
automação em larga escala, particularmente na manufatura e na
administração de empresas. À medida que o capital foi substituindo o
trabalho em escala crescente, a natureza do trabalho e da força de
trabalho começou a mudar. Novos tipos de ocupações altamente
qualificadas apareceram, tais como programadores e operadores de
computadores, e novas qualificações foram exigidas da gerência. [...]
(FUSFELD, 2003, p.227).

Neste novo cenário, contextualizado e contemplado pelas mudanças de


ordem tecnológica, concatenadas a um complexo de elementos como, o
desenvolvimento, expansão e popularização gradativa do uso dos
computadores, dos softwares, e dos meios de comunicação e a internet, foram
importantes fatores que despertaram para o uso das tecnologias da informação
e comunicação (TIC) para diversos fins, incluindo, o industrial, comercial e
serviços, fato, essencialmente acontecido a partir da segunda metade da
década de 1990, contudo, massivamente difundido nas primeiras décadas de
2000.

100
Para Cardoso (2001, p.39), “O desenvolvimento das capacidades
tecnológicas dos sistemas de informação, durante os vários ciclos de
investimentos em informática, produziu a cada momento novas modalidades de
organização empresarial [...]”.

As mudanças tecnológicas nas indústrias de computadores e de


telecomunicação têm aumentado as economias de escala e de escopo,
ocasionando um profundo impacto no funcionamento das empresas. A
tecnologia tem auxiliado na habilidade de manipular um grande volume
de transações num custo unitário médio decrescente, de apoiar
operações geograficamente dispersas por intermédio do processamento
distribuído e de oferecer novos produtos e canais de distribuição
(ALBERTIN 2001, p.43-44).

Nesta direção, Castells (2005, p.119) atenta para o surgimento de uma


nova economia em âmbito global nas décadas remanescentes do século XX,
cujo alicerce, estabeleceu-se fundado na “[...] conexão histórica entre a base
de informações/conhecimentos da economia, seu alcance global, sua forma de
organização, em rede e a revolução da tecnologia da informação que cria um
novo sistema econômico distinto”.
Cardoso (2001) reforça que a utilização dos recursos tecnológicos na
atualidade não está unicamente vinculada às questões que se referem ao
contexto da produtividade e da competitividade, mas que sim, tornou-se um
elemento decisivo para as empresas que queiram inserir-se e estabelecer-se
nos novos mercados, especialmente aos que estão convergidos e estruturados
por meio do comércio eletrônico, através da Internet.
Ainda de acordo com Cardoso (2001, p.40), nesta circunstância que
compreende o campo da adoção das tecnologias da informação e
comunicação nos negócios, o que está em curso é a convergência de três
principais elementos que caminham de forma conjunta dentro deste processo
“[...] os negócios, a Internet e os sistemas de informação – estabelece novos
esquemas de comunicação que visam a substituir antigos dispositivos, hoje
insuficientes para atender novas necessidades de um mercado crescente e
integrado, onde a informação está cada vez mais disponível e onde as
mudanças ocorrem em ritmo muito mais acelerado”.
E para concluir o debate teórico acerca da evolução das tecnologias da
informação e comunicação, torna-se relevante enfatizar a importância que o
conhecimento e a informação exerceram e ainda exercem sobre o processo de
determinação e desenvolvimento do conjunto das atividades econômicas
desempenhada pelas sociedades ao longo do progresso humano, que em
consonância com Rosenberg & Birdzell (1986); Mokyr (1990), citado por
Castells (2005, p.119), “Sem dúvida a informação e o conhecimento sempre
foram elementos cruciais no crescimento da economia, e a evolução da
tecnologia determinou em grande parte a capacidade produtiva da sociedade e
os padrões de vida, bem como formas sociais de organização econômica”.

101
O SETOR DE TIC NO BRASIL

O emprego nos setores econômicos

O emprego é um agregado macroeconômico importante em qualquer


economia do mundo, pois está diretamente vinculado à renda do trabalhador.
Na Tabela 1, são apresentados os dados que se referem ao número de
empresas pertencentes ao setor de TIC no período compreendido 2003 e 2006.

TABELA 1 – Número de empresas no setor de TIC e variação anual de


crescimento

Ano Número de empresas Variação anual (%)


2003 55.597 -
2004 55.667 0,13%
2005 58.359 4,84%
2006 65.754 12,67%
Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor.

O setor de TIC tem apresentado crescimento considerável no número de


empresas, passando de 55.597 em 2003 para 65.754 em 2006 no número de
estabelecimentos, que representa um aumento de 18,3% no período, e uma
taxa de crescimento de 5,5% ao ano. Comparando os dados de crescimento
em número de empresas deste segmento com o da indústria nacional, no
mesmo período, nota-se que o setor de TIC tem proporcionado maior
contribuição, sendo que a quantidade de estabelecimentos industriais variou
11,9% a uma taxa de 3,6% anualmente, conforme mostra a Tabela 2.

TABELA 2 – Número de empresas no setor da indústria e variação anual de


crescimento.

Ano Número de empresas Variação anual (%)


2003 138.612 -
2004 143.979 3,87%
2005 147.414 2,39%
2006 155.056 5,18%
Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor.

Essa elevação no número de empresas tem impactado o número de


pessoal ocupado, mostrando que as empresas de TIC contribuem para o
aumento do nível de empregos no país, conforme dados na Figura 1.

102
Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor.
FIGURA 1 – Número de pessoal ocupado nas empresas de TIC e taxa de
crescimento, em % ao ano, no período de 2003 a 2006.

Pode-se constatar no gráfico acima, que houve um aumento significativo


no número de pessoas ocupadas, passando de 478.446 em 2003 para 673.024
em 2006, que correspondeu à variação no período de 40,7%, com uma taxa de
crescimento de 11,2% ao ano.
Outro dado importante a ser observado refere-se à comparação do
número total de pessoal ocupado do setor de TIC em relação aos demais
setores econômicos, permitindo assim evidenciar o percentual de participação
deste setor no nível de emprego na economia brasileira. Neste caso é
importante salientar que os dados dos demais setores econômicos são
representados pela junção dos segmentados da indústria, comércio e serviço,
conforme demonstrado na Tabela 3.

TABELA 3 – Número total de pessoal ocupado do setor de TIC em relação ao


total dos demais setores econômicos – indústria, comércio e
serviço, no período de 2003 a 2006.

Setores econômicos e Total de pessoal ocupado


TIC 2003 2004 2005 2006
Setor TIC (A) 478.446 542.005 593.654 673.024
Demais setores 18.333.651 19.685.344 20.847.579 22.527.924
econômicos (B)
Participação (A/B) - % 2,61 2,75 2,85 2,98
Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor.

Com base nos dados da tabela acima, nota-se que o número de pessoal
ocupado no setor de TIC apresentou um crescimento em percentual, frente aos
demais setores econômicos, evoluindo sua participação em 2003 de 2,61% do
total de pessoal ocupado para 2,99% em 2006, a uma taxa de crescimento do
percentual de 4,39% ao ano (Figura 2).

103
Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor.
FIGURA 2 – Evolução da participação do setor de TIC em relação aos demais
setores econômicos, no período de 2003 a 2006.

O número de pessoal ocupado pelo setor de TIC também pode ser


fragmentado individualmente nos setores da indústria, comércio e serviço,
possibilitando a observação do percentual de postos de trabalho em relação a
cada um destes setores econômicos. Estes dados são apresentados nas
Tabelas 4, 5 e 6.

TABELA 4 – Participação de pessoal ocupado do setor de TIC no segmento da


indústria.

Total de pessoal ocupado


Setores econômicos
2003 2004 2005 2006
Indústria 5.971.280 6.386.190 6.430.682 6.776.736
TIC 126.416 147.028 153.343 172.370
Setor TIC (%) 2,12 2,30 2,38 2,54
Variação anual (%) - 16,30 4,30 12,41
Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor.

TABELA 5 - Número de pessoal ocupado do setor de TIC no segmento de


comércio.

Total de pessoal ocupado


Setores econômicos
2003 2004 2005 2006
Comércio 5.965.861 6.360.723 6.915.768 7.599.505
TIC 13.071 14.531 18.172 22.003
Setor TIC (%) 0,22 0,23 0,26 0,29
Variação anual (%) - 11,17 25,06 21,08
Fonte: IBGE (2009), adaptada pelo autor.

104
TABELA 6 – Número de pessoal ocupado do setor de TIC no segmento de
serviços.

Total de pessoal ocupado


Setores econômicos
2003 2004 2005 2006
Serviços 6.396.510 6.938.431 7.501.129 8.151.683
TIC 338.959 380.446 422.139 478.651
Setor TIC (%) 5,30 5,48 5,63 5,87
Variação anual (%) - 12,24 10,96 13,39
Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor.

Analisando os dados das três últimas tabelas apresentadas pode-se


extrair uma série de informações econômicas de relevância ao setor de TIC. Na
primeira identificou-se que dentre os setores da indústria, comércio e serviços o
segmento que possuem menor participação em números de pessoas ocupadas
do setor de TIC é o comércio. Entretanto, analisando a variação de crescimento
no período, observa-se que foi o segmento que apresentou a maior variação de
crescimento, chegando a 68,33% e a uma taxa de crescimento 17,86% ao ano.
Com base na análise dos números, conclui-se que no período verificado o
comércio é o setor que mais cresceu em número de pessoas ocupadas.
É importante ressaltar que o setor de comércio nos últimos anos vem
passando por fase de adaptação nas relações entre consumidores e
fornecedores em função do crescimento do comércio eletrônico, ou seja, as
vendas de produtos e serviços pela internet. Nesse tipo de transação tornou-se
comum o pagamento por meio eletrônico, através do uso dos cartões de crédito
e débito em substituição ao papel moeda, fazendo-se necessário maior
investimento em tecnologia por parte desse segmento, de modo que venha a
dar suporte e segurança a esse novo modelo de negócio que se estabelece,
justificando maior número de contratações.
Dentre os setores citados o que apresentou uma menor variação no
período foi o segmento da indústria com 36,35% de crescimento no período e a
uma taxa 9,72% ao ano. Quanto ao setor de serviços, pode-se observar que é
o segmento que absorve a maior quantidade de pessoal de TIC, comparando
aos setores da indústria e comércio, e possui a segunda maior taxa de
crescimento no período com 41,21% a uma taxa 11,39% ao ano.
A Figura 3A ilustra a comparação da taxa de crescimento ao ano do
número de pessoas ocupadas do setor de TIC dentro dos segmentos da
indústria, comércio e serviços, evidenciando o alto crescimento do comércio em
relação aos demais setores.
É possível avaliar de forma gráfica a variação de crescimento no período
do número de pessoas ocupadas, entre os setores da indústria, comércio e
serviço, conforme apresentado na Figura 3B.

105
(A) (B)
Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor.

FIGURA 3 – (A) Comparação do TGC entre os setores da indústria, comércio e


serviço no período de 2003 a 2006.
(B) Variação do número de pessoal ocupadas do setor de TIC em
relação aos segmentos da indústria, comércio e serviço no
período de 2003 a 2006

Outra informação relevante que também pode ser demonstrada e


corresponde à distribuição percentual do total de pessoas ocupadas do setor
de TIC em 2006 nos segmentos da indústria, comércio e serviços (Figura 4).

Fonte: IBGE (2009).


FIGURA 4 – Percentual de pessoas ocupadas do setor de TIC em 2006.

A renda dos setores econômicos

O setor de TIC é caracterizado pela absorção de mão de obra com maior


qualificação técnica e por consequência com remuneração salarial maior que a
média de mercado, gerando desta forma outro agregado econômico de
importância para a economia, a renda per capta. Segundo IBGE (2009), o
salário médio mensal pago pelo setor de TIC em 2006 equivalia à R$ 2.025,18,
enquanto a média da economia geral no mesmo período correspondia R$
937,48, uma variação de 116,02% a mais para os ocupados no setor de TIC.
Entretanto é importante enfatizar que mesmo tendo o salário médio
mensal mais alto em relação aos demais setores econômicos, o segmento de
TIC apresentou redução do nível salarial, enquanto os demais segmentos da
indústria, comércio e serviços, apresentaram crescimento, conforme ilustrado
na Tabela 7.

106
TABELA 7 – Variação salarial do setor de TIC em relação aos segmentos.

Nível salarial (R$ per capita) Variação


Setores Econômicos 2003 2004 2005 2006 (%)
TIC 2.056,85 2.042,28 2.025,69 2.025,18 - 1,54
Indústria 1.232,69 1.247,24 1.302,32 1.337,93 8,54
Comércio 549,24 569,52 595,30 623,72 13,56
Serviços 845,13 849,54 862,85 897,09 6,15
Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor.

Na tabela observa-se a variação salarial dos setores de TIC, indústria,


comércio e serviços, com destaque para o segmento do comércio que atingiu
uma variação de 13,56% entre 2003 e 2006, representando um crescimento
anual de 4,26%, sendo seguidos pelos segmentos da indústria e serviços com
variação de 8,54% e 6,15% e com taxa de crescimento anual de 2,89% e
1,95%, respectivamente.
Já no segmento de TIC observa-se uma variação de 1,54% no período,
com salário médio de R$2.056,85 em 2003 reduzindo para 2.025,18 em 2006,
correspondendo a um decréscimo de 0,50% ao ano. O decréscimo de renda do
setor de TIC ocorreu em função do subsetor de telecomunicação que passou
por um processo de ajuste nas contratações, sendo neste período absorvido
um número maior de pessoas, porém com nível salarial menor IBGE (2009).

A participação dos produtos de TIC nas importações e exportações

Outro agregado econômico que pode ser analisado corresponde à


participação do setor de TIC nas importações e exportações brasileira no
período compreendido entre 2003 e 2006. A Tabela 11 mostra a participação
do setor de TIC nas exportações brasileira.

TABELA 11 – Participação dos produtos de TIC nas exportações brasileira no


período de 2003 a 2006.

Total Exportação (A) % 100 100 100 100


Total TIC (B) % 3,2 2,3 3,4 3,2
Equipamentos de telecomunicação 1,8 1,2 2,4 2,3
Computadores e equipamentos
relacionados 0,3 0,3 0,3 0,3
Componentes eletrônicos 0,5 0,4 0,3 0,2
Equipamentos de áudio e vídeo 0,3 0,3 0,1 0,1
Outros bens de TIC 0,2 0,2 0,2 0,3
Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor.

Conforme demonstrado na Tabela 11, não houve variação do percentual


total das exportações brasileiras de produtos de TIC no período, porém

107
observa-se que os equipamentos de telecomunicação são responsáveis pela
maior parte de produtos de TIC exportados e neste segmento verifica-se uma
variação do percentual de partição no período saindo de 1,8% para 2,3%,
correspondendo a uma variação de 27,78% no período e a uma taxa de
crescimento de 14,29% ao ano.
Já nas importações observa-se um cenário diferente das exportações,
sendo denotada uma dependência do Brasil de tecnologia externa e tal fato é
demonstrado através do crescimento das importações de produtos de TIC.
Na Tabela 12 são analisados os dados com referência ao total das
importações e comparadas com o total de importações do setor de TIC.

TABELA 12 – Participação dos produtos de TIC nas importações brasileira no


período de 2003 a 2006.

Total importação (A) % 100 100 100 100


Total TIC (B) % 12,5 13,4 14,1 14,3
Equipamentos de telecomunicação 1,2 1,4 1,5 1,3
Computadores e equipamentos
relacionados 2,4 2,3 2,5 2,8
Componentes eletrônicos 6,2 6,9 7,2 7,3
Equipamentos de áudio e vídeo 0,7 0,9 1,1 1,2
Outros bens de TIC 1,9 1,9 1,8 1,7
Fonte: IBGE (2009), adaptado pelo autor.

Com base nos dados da Tabela 12, verifica-se que houve um


crescimento das importações de produtos do setor de TIC no período, saindo
de 12,5% do total das importações para 14,3%, representando uma variação
de 14,40% no período.
Dentre os produtos os que tiveram maior crescimento no percentual de
importação foram os componentes eletrônicos com 17,74% e computadores e
equipamentos relacionados com 16,67% de variação no período analisado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na análise dos dados, constatou-se uma alta taxa de crescimento do


número de empresas de TIC no período, que por consequência influenciou de
forma direta no número de pessoal ocupado do setor, cuja variação
demonstrada foi inclusive superior ao aumento de número de empresas. Ainda
com relação ao número de ocupados, o setor de TIC aumentou sua
participação percentual no total de empregos gerados nos setores econômicos
avaliados. Tal fato evidencia a expansão do setor de TIC dentro dos segmentos
da indústria, comércio e serviço.
Concomitantemente, o estudo contemplou a análise dos dados de
pessoal empregado de forma fragmentada dentro de cada segmento
econômico, ficando constatado que o setor de serviços é o segmento que mais
emprega pessoal de TIC, sendo seguido pela indústria e por último o comércio.

108
Entretanto, ao comparar os dados, notou-se que apesar do setor de comércio
possuir a menor representatividade em números de ocupados, foi o segmento
que mais evoluiu no número de empregos gerados no período, ficando em
segundo lugar o setor de serviços e por último a indústria.
Com relação à análise dos dados sobre a renda, verificou-se que o setor
de TIC possui a maior média salarial ou “renda per capta” entre os demais
segmentos econômicos comparados. Essa diferença de renda pode ser
justificada em função do tipo de mão de obra empregada nesse setor, sendo
exigida maior qualificação técnica o que, por consequência, exige maior tempo
de escolaridade. Todavia, é importante salientar que mesmo tendo o maior
nível de renda, o setor de TIC apresentou um pequeno decréscimo nas
remunerações, enquanto os demais segmentos da economia obtiveram
crescimento no período avaliado, destacando-se novamente o setor de
comércio que teve a maior variação salarial em relação à indústria e serviços
respectivamente. O decréscimo da renda de TIC é justificado em função do
maior número de contratações do subsetor de telecomunicações, entretanto
com remunerações menores.
Quanto aos dados de importação e exportação fica claro que o Brasil
ainda é dependente de importação de tecnologia. No período observado,
observou-se que o percentual de exportações de produtos de TIC se manteve
no mesmo patamar, enquanto as importações apresentaram crescimento.
E por fim, foi possível observar que o comércio, apesar da sua pequena
representatividade frente ao setor de TIC brasileiro, demonstrou ser o
segmento com maiores índices de crescimento no período verificado, sendo
esta informação, justificada pela hipótese que compreende a mudança de
comportamento da relação consumidor e fornecedor, ocasionada pelo
crescimento do comércio eletrônico de produtos e serviços, incentivando desta
forma os investimentos em TIC pelo comércio.

REFERÊNCIAS

ALBERTIN, Alberto Luiz. Valor Estratégico dos Projetos de Tecnologia da Informação.


RAE – Revista de administração de empresas, São Paulo, v.41, n.3, p.42-50, jul./set.
2001.

CARDOSO, Claudio. Cadeias Cooperativas nos Negócios Eletrônicos. In: Lemos,


André; Palacios, Marcos (Org.). As janelas do Ciberespaço. Porto Alegre: Editora
Sulina, 2001. p.39-50.

CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede. 8.ed. São Paulo: Terra e Paz, 2005.
698p.

FUSFELD, Daniel Ronald. A Era do economista. São Paulo: Saraiva, 2001. 356p.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. O setor de Tecnologia da


Informação e Comunicação no Brasil 2003 – 2006. Rio de Janeiro: Diretoria de
Pesquisas, 2009.

109
GT4 CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Estratégias Locais de Desenvolvimento e Incubadoras de Empresas de


Base Tecnológica no Brasil1

Maria Alice Lahorgue


Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Resumo

Existem no mundo cerca de 7.000 incubadoras de empresas. No Brasil, elas


são 384, distribuídas em todo o território nacional, tendo fortes elos com as
localidades onde estão implantadas. Este artigo investiga, a partir da
percepção de gerentes de incubadoras brasileiras, quais os limites dos
governos municipais para um maior protagonismo em relação à inovação. Para
isso foi utilizado um questionário baseado no conceito de recursos territoriais.
Foram entrevistados 14 gerentes de incubadoras localizadas em todas as
grandes regiões do país, com exceção do Centro-Oeste. Os resultados
mostram que ações de incentivo e de reestruturação dos governos municipais
serão necessárias para sua integração ao sistema nacional de inovação.

Palavras-chave

Incubadoras de empresas; recursos territoriais; sistemas de inovação; sistemas


locais de inovação.

INTRODUÇÃO

As incubadoras de empresas já têm mais de 50 anos de história. Considera-se


que a primeira incubadora de empresas tenha surgido nos Estados Unidos, na
cidade de Batavia, estado de Nova Iorque. Em 1959, foi criado o Batavia
Industrial Center, aproveitando as instalações de uma fábrica de máquinas e
implementos agrícolas que havia fechado as portas. Esse empreendimento
propôs-se a abrigar várias pequenas empresas ao mesmo tempo, mediante a
subdivisão dos pavilhões (HACKETT, DILTS, 2004). Um desses

1
Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional - II
SEDRES, Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014.

110
empreendimentos era uma incubadora de pintos, dando origem à designação
que se popularizou nos anos seguintes.
No Brasil, na década de 1980, o Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico – CNPq implantou o primeiro Programa de Parques
Tecnológicos no país, baseado em estudos realizados em incubadoras e
parques científicos britânicos e americanos. Essa iniciativa desencadeou o
surgimento de incubadoras de empresas, pois o país não tinha ainda massa
crítica para a implantação de parques tecnológicos, o que veio a acontecer
mais recentemente.
Inicialmente, as incubadoras estavam focadas apenas em setores tecnológicos,
de informática, biotecnologia e automação industrial e tinham como propósito a
criação de empresas que pudessem levar ao mercado novas ideias e
tendências tecnológicas. Atualmente, além do objetivo inicial, elas têm o
propósito de contribuir para o desenvolvimento local e setorial.
De maneira geral, as incubadoras de empresas são caracterizadas por serem
organizações que oferecem um conjunto de elementos facilitadores do
desenvolvimento de empresas emergentes: espaço físico, consultoria e
capacitação, acesso a financiamento, acesso a redes de negócios, acesso a
tecnologia (LAHORGUE, 2004, ZEDTWITZ, GRIMALDI, 2006). As diferenças
serão encontradas nas combinações feitas desses elementos pelas
incubadoras para cumprir com suas funções.
Buscando organizar melhor o setor no Brasil, vários passos já foram dados,
além da inserção das incubadoras nos diferentes planos de desenvolvimento,
entre eles: criação do PNI, promovendo a integração entre os principais atores
do sistema, implantação do SAPI (Sistema de Acompanhamento de Parques e
Incubadoras) no Portal Inovação, oportunizando o acesso às informações e
indicadores de desempenho das incubadoras e das empresas incubadas de
forma padronizada, e a introdução do CERNE (Centro de Referência para
Apoio a Novos Empreendimentos), que se constitui num sistema de qualidade
promovido pela Anprotec , sua idealizadora, e pelo Sebrae , que o colocou no
centro de sua ação de apoio às incubadoras.

111
Dessa evolução aparecem duas fortes tendências: a primeira é a adaptação
das incubadoras às necessidades locais de desenvolvimento, espelhada na
diferenciação ocorrida; a segunda é traduzida pela sua inserção nas políticas
públicas. Essa segunda tendência ainda se manifesta mais fortemente no
âmbito federal, que detém os principais programas de apoio, sejam públicos,
como CNPq ou Finep, sejam parapúblicos, como o Sebrae Nacional. Dessa
forma, parece existir um relativo vácuo entre a ação local das incubadoras, que
é incentivada pelo CERNE, e as políticas públicas a elas direcionadas. No que
se refere às políticas municipais, esse descompasso pode dificultar o
atingimento por parte das incubadoras de objetivos de contribuição ao
desenvolvimento local, diminuindo seu impacto.
Este artigo investiga como os gerentes de incubadoras no país percebem a
capacidade institucional, social e econômica local para planejar o
desenvolvimento, dando indicações sobre os maiores gargalos e as principais
potencialidades a serem consideradas para o preenchimento da lacuna ora
observada.
Além dessa seção introdutória e das conclusões, o artigo está organizado em
três seções. A primeira trata da visão da literatura sobre a interação entre
incubadoras, ambiente local e sistema de inovação. O método é apresentado
na próxima, que é seguida pela análise dos resultados obtidos.

INCUBADORAS DE EMPRESAS E AMBIENTE LOCAL

Existem cerca de 7.000 incubadoras de empresas no mundo, segundo estimativa atual


da National Business Incubation Association (NBIA). Elas têm muitos pontos comuns,
independentemente de sua localização: disponibilização de espaço cedido mediante
taxa de uso a pequenas empresas emergentes, oferecimento de serviços básicos
(limpeza, secretaria) e de serviços de capacitação e apoio (consultorias em gestão,
comercialização, desenvolvimento), objetivos de criação de empregos e dinamização
da economia, ausência de fins lucrativos na maioria dos casos, entre outros. Esses
elementos comuns indicam a existência de um padrão mínimo do que se conceitua
como uma incubadora de empresas, favorecido pela relativa juventude de sua

112
existência e pela disseminação de sua criação mediante políticas públicas de caráter
nacional e, mesmo, multilateral.
As incubadoras de empresas tiveram um impulso forte e espraiado a partir da crise
dos anos 1980, quando as ideias de desenvolvimento nacional começaram a serem
revistas face ao esfacelamento da produção fordista, à rápida introdução das novas
tecnologias em todos os âmbitos do cotidiano (produção, relações interpessoais,
comunicações e assim por diante) e ao novo papel das pequenas e médias empresas
na criação de empregos e renda. Com efeito, as estatísticas nacionais mostram um
crescimento acelerado das incubadoras na década de 1990, como instrumentos de
superação da crise e de alteração cultural, especialmente nos países onde o
empreender não havia ainda se tornado uma alternativa de mesma qualidade que o
“empregar-se” (LAHORGUE et al., 2012).
A aceleração da implantação de incubadoras de empresas foi o resultado de políticas
públicas de fomento. Isso aconteceu na Coréia do Sul, França, Alemanha, Estados
Unidos, Canadá, Brasil e em tantos outros países onde o financiamento público, seja
ele direto ou por meio dos editais das agências de fomento ao desenvolvimento e à
inovação, ainda é a principal fonte de receitas das incubadoras de empresas.
O envolvimento dos governos centrais indica que as incubadoras de empresas fazem
parte dos sistemas nacionais de inovação (SNI), funcionando tanto no oferecimento de
estruturas físicas quanto no apoio imaterial aos negócios emergentes, com
consultorias e acesso a redes, especialmente voltados às micro e pequenas empresas
de base tecnológica.
A partir de uma definição estreita, incluindo somente organizações e instituições
envolvidas na busca e exploração do conhecimento (como os departamentos de P&D,
os institutos tecnológicos e as universidades), o conceito de SNI ampliou-se para
agregar todas as partes e aspectos da estrutura econômica e da formatação
institucional que afetam o aprendizado, a busca e a exploração: sistema produtivo, o
sistema de mercado e o sistema de financiamento (LUNDVALL, 2010).
Globalização, liberalização, desmaterialização e revolução tecnológica são elementos
que estão na base das transformações dos SNI. Essas transformações tiveram início
com a turbulência provocada pela primeira crise do petróleo (1973), sendo reforçada
pela introdução de novas tecnologias, especialmente as tecnologias de comunicação e
informação.

113
“A evolução sistêmica teve profunda influência nas políticas industriais, tecnológicas e
econômicas no passado, e terá mais ainda no futuro” (GALLI, TEUBAL, 2011, p. 343).
A razão dessa crescente influência pode ser encontrada na igualmente crescente
importância da coordenação não-mercantil. Esse movimento resulta do caráter
sistêmico da inovação e do fato que as economias estão cada vez mais integradas,
sem que o mercado consiga exercer sua coordenação.
De acordo com Galli e Teubal (2011), os sistemas nacionais apresentam as seguintes
tendências fortes:
• Papel-crítico na aproximação entre organizações de todos os tipo em situações
onde o mercado ainda não existe;
• Criação de infraestruturas, voltadas para o mercado, para auxiliar as empresas
individuais, especialmente PMEs, a enfrentar os desafios do alargamento das opções
tecnológicas;
• Importância das infraestrututras para prover informação e consultorias para
áreas como saúde, educação, cultura, lazer, entre outras;
• Crescente complexidade.
O SNI face à complexidade atual se transforma. Nesse processo, a questão política é
das mais importantes. Seu tratamento separado das infraestruturas tem, pelo menos,
duas justificativas: a primeira é a crescente necessidade de coordenação não-
mercantil e a segunda é a própria complexidade da tomada de decisão, com o
envolvimento de atores de diferentes escalas. Entretanto, essa nova feição encontra
obstáculos na ação dos governos, que, como lembra Lundvall (2010), dão o ritmo de
desenvolvimento dos SNI. Se os governos centrais muitas vezes não estão
capacitados para realizar a coordenação entre os diferentes elementos do sistema de
inovação, essa situação se agudiza no caso dos governos locais.
Em pesquisa recente (LAHORGUE et al, 2012), foi possível observar o caráter
localista das incubadoras de empresas no Brasil. Essa pesquisa utilizou um survey
com 60 incubadoras respondentes e entrevistas com 24 gerentes de incubadoras,
localizadas em todas as regiões brasileiras.
De acordo com essa pesquisa, as empresas e os empreendimentos graduados
localizam-se majoritariamente no mesmo município da incubadora de origem,
confirmando o caráter local dos processos de incubação e resultados de pesquisas
anteriores.

114
Os empreendimentos das incubadoras são captados majoritariamente na microrregião
de sua localização. A cidade aparece em segundo lugar, sendo que 5% das
incubadoras captam seus projetos em algumas áreas da cidade. Configura-se assim
uma atuação claramente microrregional, o que corrobora os resultados referentes à
localização dos empreendimentos graduados.
Ainda segundo a mesma fonte, as incubadoras mantêm alianças estratégicas
prioritariamente com universidades, seguidas pelo Sebrae e outras organizações
empresariariais. É interessante notar que, mesmos que as incubadoras declarem
majoritariamente sua preocupação com o desenvolvimento local, entre os três níveis
de governo, é exatamente o local que aparece com o menor número de citações
quando se trata das alianças estratégicas. Isso pode ser efeito dos programas de
fomento nos âmbitos estadual e federal, mais ativos na busca do desenvolvimento
tecnológico.
Tendo em vista esses resultados, caberia investigar quais as capacitações e os
recursos locais para o desenvolvimento, privilegiando o ponto de vista dos gerentes
das incubadoras, que são os atores de interface entre os produtores de conhecimento,
os elaboradores de políticas públicas e o setor produtivo. O interesse nessa
abordagem tem origem no conceito de recursos territoriais e de território. Como
Courlet (2008, p.87 ) observa:
(...)o território é visto como « produtor » de memória local e, ao mesmo tempo,
como « criador » de um « código genético local », no qual se tecem recursos e
valores que se constroem no passado, mas cuja valorização permite dar
sentido às ações e aos projetos do presente e do futuro. A territorialidade que
decorre dessa concepção do território é uma territorialidade ativa (em oposição
à territorialidade passiva como estratégia de controle do espaço por separação
e exclusão), isto é, a capacidade de valorizar o mais vasto conjunto possível de
recursos e de atores, mediante estratégias de endogeneização visando à
autonomia local.

A competitividade local está fortemente articulada às capacidades e aos recursos


locais, que não se restringem aos recursos materiais, mas que englobam recursos
cognitivos e simbólicos (DORMOIS, 2007)

MÉTODO

Para a coleta dos dados necessários para aferir a percepção dos gerentes das
incubadoras de empresas sobre o ambiente local, foram selecionadas 14

115
incubadoras2, todas, exceto três, localizadas em capitais estaduais. Os critérios
de escolha foram os seguintes: idade da incubadora, distribuição inter-regional
e intrarregional, reputação de qualidade dos serviços prestados. A coleta foi
feita com o auxílio de formulário estruturado e realizada presencialmente, entre
os meses de maio e julho de 2013, tendo como respondentes os gerentes das
incubadoras. A coleta foi distribuída por todas as grandes regiões brasileiras,
com exceção do Centro-Oeste.
A metodologia usada neste exercício foi desenvolvida na França para apoio ao
“diagnóstico local de recursos” (LORTHIOIS, 1997), tendo sido adaptada para a
realidade latino-americana.
A metodologia aborda três dimensões locais: institucional, da sociedade local e
econômica. Procura mostrar a situação de um território em relação a essas
dimensões, utilizando para tanto diferentes condições e critérios:
•Condições são circunstâncias, situações ou fatos cuja existência é
indispensável para a viabilidade do desenvolvimento local, quaisquer
que sejam os territórios, setores ou tipos de programas.
•Cada condição é caracterizada por um conjunto de critérios.
O Quadro 1 mostra as condições e critérios por cada dimensão analisada.

DIMENSÃO CONDIÇÃO CRITÉRIOS


Vontade política
Capacidade da administração
Capacidade de análise e de previsão
pública local para conduzir
Capacidade estratégica
processos de mudança
Memória
Capacidade de cooperação
Institucional Avaliação dos parceiros Poder de decisão
Elos fortes e capilarização
Infraestrutura de apoio
Estruturas e corpo técnico para o Articulação entre os instrumentos de
acompanhamento de projetos desenvolvimento
Órgão específico para o desenvolvimento

2
A amostra foi de conveniência, buscando diversidade em termos de desempenho conhecido das
incubadoras, mas privilegiando aquelas com maior idade, significando um histórico possível de interações
com a sociedade local.

116
Pessoal permanente dedicado à promoção do
desenvolvimento
Capacidade coletiva de reação e de solidariedade
Estabilidade da população
Identidade local
Existência de organização para participação e
qualidade desta
Existência de soluções inovadoras desenhadas e
Grau de empreendedorismo da implementadas pela comunidade
comunidade local Independência em relação aos recursos públicos
Sociedade local Existência de cultura empreendedora
Existência de redes de interação e qualidade
destas
Potencial e organização da Existência de estruturas formais
comunidade local para o Capacidade de poupança
desenvolvimento Adequação da mão-de-obra em qualidade e
quantidade
Atividade empreendedora
Existência de articulações fortes entre as
empresas de uma mesma cadeia de valor
Crescimento acima da média do estado ou do
país
Características do setor produtivo Oferta de empregos
local Capacidade de inovação
Serviços às empresas
Quantidade de empresas com políticas de
inclusão, respeito ambiental, ação comunitária,
entre outras
Capacitação técnica
Econômica
Capacidade de C&T
Grau de preservação do ambiente natural
Importância do patrimônio cultural
Potencial turístico
Potencial existente e que pode Disponibilidade de terrenos e espaços
ser mobilizado construídos a preços adequados para a
localização das atividades econômicas
Qualidade da infraestrutura viária, de
saneamento, de comunicações
Grau de liberdade local em relação às
localizações das infraestruturas e atividades

Quadro 1 – Dimensões, condições e critérios

117
As questões do questionário utilizaram uma escala de Likert, de 1 a 5 e os
resultados foram calculados de acordo com a seguinte ponderação: 1 = 0; 2 =
1; 3 = 2; 4 = 3; e 5 = 4.

ANÁLISE DOS RESULTADOS

Em relação à dimensão Institucional e setor público, os critérios mais salientes


são os de “vontade política” e “existência de órgão específico para o
desenvolvimento”. O discurso e a formalização da função de promoção do
desenvolvimento não são, na opinião dos entrevistados, acompanhados de
capacitação adequada para a condução dos processos de mudança e
acompanhamento de projetos. No primeiro caso, chama a atenção a baixa
capacidade de memória e de análise e prospectiva, indicando que há tendência
à falta de continuidade em face de alternâncias no poder municipal e à baixa
qualidade dos planos e políticas públicas.
Em relação aos parceiros, os respondentes têm uma opinião positiva, mas não
otimista, pois avaliam que a capacidade de cooperação é apenas média,
apesar de serem estabelecidos elos fortes e haver capitalização dentro das
organizações parceiras. Ao mesmo tempo, é interessante observar que os
representantes dessas organizações nas parcerias têm poder de decisão
relativamente alto, o que auxilia a tomada de decisão mais rápida e
consequente para os projetos desenvolvidos.
As incubadoras pesquisadas estão localizadas em cidades de médio e grande
portes. Esse fato explica a estabilidade da população, que não é afetada por
movimentos sazonais de estudantes e de outros tipos de flutuação. É
interessante observar que, apesar da existência relativamente baixa de
organização para processos participativos, na opinião dos respondentes, a
capacidade coletiva de reação e solidariedade é alta. Isso pode significar que
processos de participação popular têm grande possibilidade de sucesso de
implantação.

118
Ainda na dimensão da Sociedade Local, coerentemente com os resultados
anteriores, a comunidade tem implementado soluções inovadoras por conta
própria. O empreendedorismo das comunidades é considerado alto pelos
pesquisados, mas sua autonomia em relação a recursos públicos é baixa,
indicando limites à implantação independente de projetos de seu interesse.
Na condição “Potencial e organização da comunidade para o
desenvolvimento”, observa-se a existência de estruturas formais, como
cooperativas e associações, que parecem funcionar bem em rede. Esses
seriam elementos a agregar em favor do aprofundamento e consolidação de
processos participativos de decisão. No pertinente à atividade empreendedora,
a opinião dos gerentes é bastante favorável, já que a média se aproxima de
4,0. Entretanto, essa característica empreendedora não é acompanhada pela
capacidade de poupança local ou pela adequação da mão-de-obra em
qualidade e quantidade, colocando uma dúvida sobre sua sustentabilidade.
O setor produtivo local tem dois pontos fortes que são a articulação entre
empresas de uma mesma cadeia ou APL e a capacidade de oferta de
empregos. Abaixo, mas bastante próximo, de 4,0, ou seja, de uma situação
considerada muito boa, aparecem o crescimento do setor produtivo, a
capacidade de inovação, a disponibilização de serviços às empresas e a
existência de empresas com praticas inclusivas ou sustentáveis. Esse
panorama mostra uma percepção positiva dos gerentes em relação ao setor
produtivo de suas localidades.
Quando se analisam os resultados sobre o “Potencial existente”, podem-se
classificar os critérios utilizados em três grupos: no primeiro, estão aqueles
melhor situados na percepção dos pesquisados. São eles: capacitação técnica,
capacidade em C&T e potencial turístico. Os dois primeiros têm evidente
interesse para o desenvolvimento das incubadoras e dos sistemas de
inovação, enquanto que o último apresenta potencial de atratividade à la
Florida . No segundo grupo, estão a preservação do ambiente natural e a
importância do patrimônio natural, que complementam o potencial turístico. O
terceiro grupo traz os pontos fracos do potencial a ser mobilizado. São três

119
pontos ligados à infraestrutura: disponibilidade de terrenos adequados para a
localização das empresas, a qualidade das infraestruturas viárias, de energia e
de comunicação e a autonomia local sobre seu próprio plano diretor.

CONCLUSÃO

No conjunto das três dimensões analisadas, ressaltam comunidades


empreendedoras e solidárias, mas que não possuem mecanismos adequados
de participação nas decisões. O setor produtivo tem, segundo a opinião dos
pesquisados, desempenho muito bom, mas sua sustentabilidade encontra
obstáculos na falta de mão-de-obra adequada e na carência de infraestruturas.
Os governos dessas localidades mostram vontade política, mas não
conseguiram ainda estruturar e capacitar o serviço público para as funções de
planejar e acompanhar projetos de desenvolvimento.
É interessante notar que alguns dos respondentes tiveram dificuldade em
responder às questões colocadas, demonstrando baixo conhecimento dos
atores locais. Durante a aplicação do formulário, além do gerente, participaram
outros membros da equipe da administração da incubadora. Para algumas
respostas, houve discussão entre os participantes para chegar a um consenso,
indicando que as questões colocadas não parecem fazer parte do debate
interno das equipes.
Incubadoras de empresas constituem importantes mecanismos de apoio à
inovação e ao desenvolvimento local e regional. Entretanto, ainda há uma
tendência a analisá-los de forma independente e desconectada das estratégias
de desenvolvimento. A adequação desses mecanismos para a criação e
consolidação de empresas emergentes está confirmada pela experiência
internacional, onde se destacam os programas dos governos nacionais de sua
promoção e fomento, como visto acima.
A construção de pontes de política e de estratégias entre as incubadoras de
empresas e os governos locais aparece como necessidade e oportunidade
para o desenvolvimento local e regional. Nesse sentido, não há como não

120
integrá-las na consolidação dos sistemas locais e regionais de inovação,
conjuntamente com as instituições de ensino e pesquisa e os setores públicos
e privados.
Ações que fomentassem a inserção clara da inovação nas políticas de
desenvolvimento local e regional, mediante planos abrangentes e articulados
entre si, seriam promotoras do reconhecimento dos sistemas locais e regionais
de inovação e sua consolidação. Na ausência dessas ações, em face dos
resultados obtidos nessa pesquisa, os governos municipais dificilmente se
capacitarão para integrarem efetivamente o sistema nacional de inovação e
aproveitarem as oportunidades abertas pela infraestrutura científico-tecnológica
local. Em contrapartida, as incubadoras tenderão a atender demandas das
escalas estadual e federal, que continuarão responsáveis pelas diretrizes-
chave referentes à inovação e por parte substancial do financiamento do setor,
colocando em xeque os objetivos de sua transformação em plataformas de
desenvolvimento local, que estão expressos em políticas e programas
nacionais, como o CERNE, por exemplo.

121
REFERENCIAS

ANPROTEC. Aventura do possível. Brasília: Anprotec, 2007.


CORÉIA DO SUL. Promoting business and technology incubation for improved
competitiveness of small and medium-sized industries through application of modern
and efficient technologies in the Republic of Korea. Korea: Seul, 2002
COURLET, C. L’économie territoriale. Grenoble : PUG, 2008.
DORMOIS, R. Pour une analyse dynamique des ressources dans la conduite de
l’action publique. in GUMUCHIAN, H., PECQUEUR, B. (ed.). La ressource territoriale.
Paris : Economica, 2007.
EBN. BIC Observatory in 2011.Disponívelemwww.ebn.br
GALLI, R., TEUBAL, M. Paradigmatic shifts in NSI. in EDQUIST, C. (ed.). Systems of
innovation. Londres: Routledge, 2011
HACKETT, S., DILTS, D. A systematic review of business incubation research. Journal
of Technology Transfer. 29. 55-82. 2004
INFODEV. Mixed-use incubator handbook: a start-up guide for incubator developers.
2009. Disponível em www.infodev.org.
LAHORGUE, M. A. et al. Estudo, análise e proposições sobre as incubadoras de
empresas no Brasil. Relatório Técnico. Convênio de Cooperação Técnica MCTI e
ANPROTEC. 2012.
LAHORGUE, M. A.et al. Pólos, parques e incubadoras. Brasília: Anprotec / Sebrae,
2004
LORTHIOIS, J. Le diagnostic local de ressources. Lusigny-sur-Ouche : Éd. W, 1997.
LUNDVALL, B-A (ed.). National systems of innovation. Londres: Anthem Press, 2010.
PARK, S. Business incubators and entrepreneurship in Korea: analyzing historical
development and current situation. Far Eastern Studies.Vol. 7.Maio 2008. pp. 65-81.
PETROU, A., LIARGOVAS, P., DASKALOPOULOU, I. Entrepreneurship incubators
and economic growth. Nova Iorque: Nova Science, 2010.
ZEDTWITZ, M., GRIMALDI, R. Are service profiles incubator-specific? Results from an
empirical investigation in Italy. Journal of Technology Transfer. 31. 459-465. 2006

122
GT4- CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Cisternas: Uma Tecnologia Social em Prol do Desenvolvimento1

Maysa Porto FARIAS2


Hermes Alves de ALMEIDA 3

Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande, PB

RESUMO

A chuva é o elemento vital para vida e precursor em qualquer esfera de


desenvolvimento, a sua elevada variabilidade associada á falta de gerenciamento
dos recursos hídricos, em especial no semiárido nordestino, tem limitado o
desenvolvimento regional e local. Entretanto a Captação de água da chuva e o
armazenamento correto da água tratada na cisterna, permite resolver, o principio
fundamental da permanência das famílias nos seus locais de origem, promovendo o
desenvolvimento local. Utilizaram-se alguns dados socioeconômicos e pluviais,
cedidos por diversos órgãos públicos oficiais. Os principais resultados mostraram
que o regime pluvial das localidades analisadas é extremamente irregular,
dificultando o principal setor econômico. No entanto, deve-se conhecer o regime
pluvial e o dimensionamento correto dos volumes da cisterna e os da necessidade
de consumo de água para cada família.

Palavras-chave: Água; tecnologia social; Desenvolvimento.

Introdução

A água é um elemento indispensável à vida e, por isso, constitui num dos


maiores problemas sociais do mundo. Embora, a disponibilidade de água potável
não vem aumentando na mesma proporção que o crescimento populacional. Essa
condição se agrava ainda mais na zona rural do semiárido paraibano, onde a falta
de água potável e a desnutrição alimentar são fatores que mais afetam a população
rurícola. Essas questões são amplamente discutidas há muito tempo, mas ainda não

1
Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento
2
Mestranda do PPGDR/UEPB, email: maysaportofarias@hotmail.com
3
Professor Doutor do Curso Geografia e do PPGDR da UEPB. email: hermes_almeida@uol.com.br

123
se conseguiu acabar nem com a fome nem tão pouco com a sede.
A precipitação pluvial é o elemento do clima com maior variabilidade espacial
e temporal, cujas características, no semiárido paraibano, associam-se à
irregularidade na quantidade e em distribuição. Mesmo na curta estação chuvosa,
que perdura por cerca dois a quatro meses, os totais de chuvas são extremamente
irregulares em quantidade e em distribuição, quando se compara um local com
outro. Essa condição tem limitado o abastecimento de água, até para fins potáveis, e
o uso da água para atividades de desenvolvimento rural local. Por isso, a
insegurança hídrica contribui não somente pela fragilidade ambiental da caatinga,
mas com o subdesenvolvimento e os elevados índices de pobreza.
O semiárido nordestino contempla uma extensa região do país, cujas
peculiaridades requerem adoções de medidas e de alternativas para manter o
homem do campo no seu habitat, sem degradar o ambiente e permitir a convivência
harmônica com o ambiente, tendo-se na captação da água da chuva a única e/ou a
principal alternativa para a vivência nessa região.
De acordo com Brito et al. (2007) a cisterna domiciliar é uma tecnologia
milenar e pode responder aos parâmetros de qualidade e quantidade da água para
beber das famílias de comunidades, onde haja limitação de recursos hídricos, desde
que sejam seguidos os critérios de dimensionamento, armazenamento e manejo da
água coletada da chuva. Neste contexto, houve a necessidade de um estudo
estatístico que permitisse estabelecer o potencial de captação de água da chuva nas
localidades mais secas do cariri da Paraíba através da cisterna como tecnologia
social e alternativa para o desenvolvimento, sendo essas determinações os objetivos
principais deste trabalho.

Metodologia

Localização da área de estudo


A área de abrangência deste trabalho correspondeu especificamente a duas
localidades que compõem a microrregião do Cariri Oriental do Estado da Paraíba,
como mostra a Figura 1.

124
Utilizaram-se séries pluviais de oito localidades que compõem a microrregião
do cariri da Paraíba apenas para caracterização do regime pluvial. Os dados foram
cedidos pela Agência Executiva de Gestão das Águas do Estado da Paraíba
(AESA), período: 1962-2012, em seguida foram escolhidas duas localidades mais
secas: Cabaceiras e Riacho de Santo Antonio da referida microrregião, para as
análises comparativas e socioeconômicas. Os dados de chuvas, nas diferentes
escalas de espaço e tempo, foram analisados mediantes critérios da estatística
climatológica e das distribuições estatísticas de frequências, de medidas de
tendência central (média e mediana) e de dispersão (desvio padrão).
Foram estabelecidos os regimes pluviais que possibilitaram estimar os VPCs
anuais e em seguida adotado seis cenários com totais anuais de chuvas, referentes
à mediana, o ano mais seco e o mais chuvoso e aos níveis de 25, 50 e 75 % de
probabilidade. Adotando-se vários tamanhos de áreas de captação (60, 80, 100 e
200m2). Para efeito deste estudo, compararam-se as principais características
hídricas das localidades mais secas, enfatizando o volume potencial de captação de
água e as suas relações socioeconômicas. Analisaram-se também os tipos de
cisternas, os dados populacionais e socioeconômicos (fecundidade, renda, setores
econômicos, escolaridade, dentre outros.) extraídos diretamente do banco de dados
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), Ministério de

125
Desenvolvimento social (MDS), do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(IPEA),Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Articulação do
Semiárido Brasileiro (ASA) e da Organização das Nações Unidas(ONU).

Resultados e Discussões

A partir dos dados socioeconômicos e hídricos obtidos através de órgãos


oficiais do governo, aplicaram-se análises estatísticas descrevendo-se as principais
características das duas localidades mais secas, ambas inseridas na microrregião do
Cariri Oriental paraibano, Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio, respectivamente.
Na tabela 1, observa-se a localidade de Cabaceiras com 56 e 49,5% da
população residentes na zona rural e masculina, respectivamente. Já, a localidade
de Riacho de Santo Antônio apenas 31% da população são residentes na zona rural.

Tabela 1- Dados populacionais para as localidades Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio.

Dados populacionais Cabaceiras Riacho de S. Antônio


População (censo-2010) 5.035 hab 1722 hab

Área da unidade territorial 401,74 92,0


(km²)
Densidade demográfica 12,53 18,72
(hab/km²)
População residente 2.493 871,0
masculina
População residente 2.542 851,0
feminina
2.217 1.186
População Urbana
2.818 536
População Rural
Fonte: Tabela adaptada por Farias (2014) e dados extraídos no (IBGE- cidades).

De acordo com as publicações do Programa das Nações Unidas para o


Desenvolvimento (Pnud) houve um decréscimo na taxa de fecundidade (filhos por

126
mulher),consequentemente o número de residentes por domicílio diminuíram. Em
1991, 2000 e 2010 a taxa de fecundidade era de 5, 3 e 2 filhos, respectivamente,
para a localidade de Cabaceiras. Enquanto que para a localidade de R. de S.
Antônio esses valores ainda eram um pouco maiores de 7, 4 e 3, respectivamente,
para (1991, 2000 e 2010).
Considerando a renda como fonte de remuneração mensal familiar,
destacam-se na (Figura 2) uma evolução na renda per capta em ambas as
localidades registrando os maiores valores em 2010(R$ 283 e 275,00 reais). No
entanto ressalta-se que as maiorias das famílias ainda sobrevivem apenas com
auxílios e/ou políticas publicas advindas do governo, a exemplo o Programa
assistencialista Bolsa Família que transferi renda do Governo Federal as famílias
pobres (com renda per capta de até R$ 154,00 reais). Para o Ministério do
Desenvolvimento Social e Cobate á fome (MDS) o valor do auxílio recebido pode
variar a partir de R$ 35,00 a 325, 00 reais, na localidade de Cabaceiras e R. de S.
Antônio são beneficiadas 764 e 268 famílias, respectivamente.

Figura 2- Renda per capta para as localidades Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio.

Cabaceiras R. de Santo Antônio


300

250
Renda(R$)

200

150

100

50

0
1991 2000 2010

Fonte: Elaborada pela autora, dados extraídos do (Pnud).

Esse baixo nível de renda da população esta associado ao baixo nível de


escolaridade, comprometendo o desenvolvimento econômico e social local.

127
Segundo os dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) para
a localidade de Cabaceiras entre 2000 e 2010, a taxa de atividade da população de
18 anos ou mais (ou seja, o percentual dessa população que era economicamente
ativa) passou de 54,75% em 2000 para 55,64% em 2010. Ao mesmo tempo, sua
taxa de desocupação (ou seja, o percentual da população economicamente ativa
que estava desocupada) passou de 9,74% em 2000 para 7,15% em 2010. Dos
55,64% referente a população ativa, 48,49% se encontrava ocupada e apenas 26,
25% com ensino médio completo.Já, para a localidade de R. de S. Antônio o quadro
é pouco melhor em 2010, dos 67,46% ativos apenas 5,28% estavam desocupados.
Em relação a atividade profissional, destaca-se na (Fígura 3) o setor
agropecuário com a principal ocorrência( 41,29 e 39, 60%) para Cabaceiras e R. de
S. Antônio, respectivamente, e, as menores frequências para ambas as localidades
ressalta-se a Indútria extrativa seguida pelos setores públicos.

Figura 3- Frequência Relativa das principais atividades econômicas para as


localidades de Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio.

Cabaceiras Riacho de Santo Antônio


45
40
35
30
25
FR(%)

20
15
10
5
0

Fonte: Elaborada pela autora, dados extraídos do (IPEA).

Sintetizando-se os dados apresentados e classificando-os nos diferentes


Setores econômicos observa-se ainda na (Fígura 3) que o Setor Terciário registra-
se ocorrência acima de 40% em ambas as localidades, no entanto o Setor Primário
continua sendo o mais representativo, embora sabe-se que a grande vulnerabilidade
128
deste setor remete-se principalmente ao clima, especificamente em relação a baixa
disponibilidade de água no semiárido nordestino que gera insegurança hídrica e
alimentar, comprometendo o abastecimento humano, animal, a agricultura e,
consequentemente, o desenvolvimento social e econômico.
Em relação à disponibilidade hídrica, a cisterna surge como a principal
alternativa para captar a água da chuva, pois aumentando a oferta da água melhora
a qualidade de vida da população, permitindo a fixação da família no seu local de
origem.
Segundo a definição publicada pela Articulação do Semiárido Brasileiro
(ASA) a Tecnologia social compreende produtos, técnicas ou metodologias
reaplicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade e que representem
efetivas soluções de transformação social.
As tecnologias sociais são simples, baratas e de domínio popular. Existem
vários tipos de implementações para captar água da chuva, destacam-se alguns
tipos: cisterna-calçadão, cisterna-enxurrada, cisternas de placas, cisternas de
plástico/PVC (polietileno), barragem subterrânea, barreiro-trincheira, barraginha,
tanque de pedra, dentre outros.
Comumente no semiárido paraibano a maioria das captações da água da
chuva são realizadas especialmente pelas cisternas (placas, plástico e calçadão),
entretanto a cisterna de calçadão possui uma especificidade, pois ela depende da
declividade do terreno. Já as cisternas de placa e de plástico de uma maneira geral,
água da chuva que escorre do telhado da casa é captada pelas calhas e cai direto
na cisterna, onde é armazenada.
De acordo com as publicações do Ministério de Desenvolvimento Social e
combate á fome (MDS, 2014) na Paraíba já forma construídas 25.488 cisternas que
estão distribuídas em vários municípios paraibanos, identifica-se na (Figura 4) que a
localidade de Cabaceiras foi contemplada com 278 cisternas ao decorrer de três
anos (2011-2013) e a localidade de R. de Santo Antônio apenas com 47,1%
comparando-se ao total das cisternas implementadas em Cabaceiras.

129
Figura 4- Quantidade de cisternas construídas para armazenar água da chuva para
as Localidades de Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio.
Cabaceiras R. De Santo Antônio
300

250

200
Nº de cisternas

150

100

50

0
2011 2012 2013 Total

Fonte: Elaborada pela autora, dados extraídos do (MDS).

Diante disto, há necessidade de um estudo que permita estabelecer as


características pluviais da microrregião do Cariri Oriental paraibano, a fim de estimar
o Volume Potencial de Captação (VPC) em diferentes cenários para as duas
localidades analisadas.
O comportamento do regime pluvial da microrregião do Cariri Oriental é
mostrado na (Figura 5). Observa-se que as médias aritméticas mensais estão
sempre associadas a uma elevada dispersão, mostradas através dos respectivos
desvios padrão da média, nota-se que a precipitação pluvial mensal é irregularmente
distribuída, ou seja, de agosto a fevereiro os desvios padrão são superiores a
própria média aritmética. Em qualquer mês do ano as médias aritméticas são
sempre maiores que as medianas e, portanto, a distribuição de probabilidade é
assimétrica e o coeficiente de assimetria é positivo. Para esse tipo de distribuição, a
média não é o valor mais provável de ocorrer e, por isso, deve-se usar a mediana, o
que concorda com os resultados encontrados por Almeida & Gomes (2011) e
Almeida (2012).
Observa-se (Figura 5) que o período mais chuvoso inicia em fevereiro-março
e dura até abril- maio. Essas sequências mostram a estação chuvosa da
microrregião do Cariri Oriental, no entanto quando se analisa isoladamente todas as
130
localidades da microrregião os inícios, durações e quantidade, podem diferenciar,
demonstrando-se que a chuva é extremamente irregular, há uma predominância que
estação chuvosa dure por dois a quatro meses, caracterizando o semiárido
nordestino. O mês de abril registra o maior valor médio (86,7 mm) e o total
acumulado da estação chuvosa, contabiliza-se 50% do total médio anual e o mais
seco é o mês de novembro.

Figura 5- Médias mensais das médias, medianas e desvio padrão da precipitação


pluvial da microrregião do Cariri paraibano, médias do período: 1962/2012.
média mediana DP

100,0 100,0
90,0 90,0
80,0 80,0
70,0 70,0
60,0 60,0
50,0 50,0
40,0 40,0
30,0 30,0
20,0 20,0
10,0 10,0
0,0 0,0
jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez

Fonte: Elaborada pela autora, dados extraídos da (AESA).

Com objetivo de garantir água em quantidade suficiente para o consumo


(beber, cozinhar e higiene pessoal) das famílias que tem como única fonte hídrica no
período de estiagem as cisternas, foram calculados com base na taxa de
fecundidade (dois filhos) acrescentando-se os pais, totalizando-se quatro pessoas
por domicílio. De acordo com os dados divulgados pela Organização das Nações
Unidas (ONU) o consumo médio por pessoa equivale a 20L/dia. Os principais
resultados identificou que para cada pessoa nessas duas localidades analisadas são
necessários 4,2m3 ou (4.200L) de água para suportar os 210 dias (sete meses) sem
chuva.
No entanto, a maioria das cisternas rurais e principalmente aquelas
construídas pelo Governo Federal e outras Instituições possuem uma capacidade

131
para armazenar apenas 16m3 de água que neste cenário observa-se(Tabela 2),
torna-se insuficiente para atender a demanda do número médio de pessoas durante
o período de estiagem.

Tabela 2-Volume de água necessário (VNEC) para as localidades Cabaceiras e Riacho


de Santo Antônio.
Nº de pessoas/domicílio Litros m3
4 16800 16,8

6 25200 25,2

8 33600 33,6

42000 42,0
10

Sumarizando-se as Figuras 6 e 7, nota-se que apenas os cenários


correspondente aos valores mínimos para as diferentes áreas de captação são
insuficientes para suprir a demanda hídrica familiar, entretando esses valores
mínimos não ocorrem com frequência, com probabilidade de apenas 1,92 e 1,96%
de chances de ocorrer. Ainda com valores baixos em ambas as localidades destaca-
se o cenário com a probabilidade de 25% que equivale ao primeiro quartil, ou seja,
esse valor acontece uma vez a cada quatro anos, contudo observa-se também que
quando aumentam-se as áreas de captação, especificamente acima de 80m2,
consequetemente os valores superam consideravelmente 16m3 de água.
Analisando-se o volume potencial dos cenários medianos, ainda nas mesmas
fíguras, nota-se que em todas as áreas de captação conseguem obter o VPC
suficiente para família com até quatro pessoas/por domicílio. Destaca-se que o VPC
mediano com a área de captação de 200m2 correspondente a cisterna de calcadão,
conseguindo captar 58,5 e 55,4m3 de água para as localidades de Cabaceiras e R.
de S. Antônio, respectivamente, superando a capacidade da própria citerna(52m3) e
garantindo o abastecimento hídrico para família de até 14 pessoas.

132
Figura 6- Potenciais de captação de água de chuvas(VPC) mediante aos seis cenário
pré- estabelecidos.
60m² 80m² 100m² 200m²
140

120 Cabaceiras

100
VPC(m³)

80

60

40

20

0
mediana máximo mínimo 0,25 0,5 0,75

Figura 7- Potenciais de captação de água de chuvas(VPC) mediante aos seis cenário


pré- estabelecidos.
60m² 80m² 100m² 200m²
140

120 R. de S. Antônio

100

80
VPC(m³)

60

40

20

0
mediana máximo mínimo 0,25 0,5 0,75

CONCLUSÃO

Os dados socioeconômicos apresentaram índices crescentes ao decorrer dos


anos analisados, no entanto o baixo nível de renda da população, associado ao

133
baixo nível de escolaridade, compromete significadamente o desenvolvimento
econômico e social local.
O regime pluvial da microrregião do Cariri Oriental é extremamente irregular,
dificultando o principal setor econômico (Agropecuário). Os modelos de distribuição
de chuvas são assimétricos. A curta estação chuvosa dura cerca de três a quatro
meses, mas difere em quantidade e em distribuição.
As duas localidades Cabaceiras e Riacho de Santo Antônio, respectivamente,
possuem um potencial mediano de captação de água de chuva de 390 e 369L/m2 e
a área de captação mínima necessária, para armazenar 16 mil litros de água, varia
em função da localidade, sendo de 55 e 58 m2, respectivamente. A priori deve-se
conhecer o regime pluvial e a quantidade de água necessária para atender a
demanda hídrica específica de cada família e o tipo de cisterna correspondente
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, H. A. de. Climate, water and sustainable development in the semi-arid of
northeastern Brazil. In: Sustainable water management in the tropics and subtropics and
case studies in Brazil, Unikaseel, Alemanha, v.3, p.271-298, 2012

ALMEIDA, H. A. de, GOMES, M. V. A. Potencial para a captação de água da chuva:


alternativa de abastecimento de água nas escolas públicas de Cuité, PB. In: Congresso
Brasileiro de Agrometeorologia, 17, Guarapari, ES, 2011, Anais..., Guarapari: CD-R.

BRITO, L. T. L., SILVA, A. S., PORTO, E. R., AMORIM, M. C. C., LEITE, W. M. Cisternas
domiciliares: água para consumo humano. Potencial de captação de água de chuva no
semi-árido brasileiro. Petrolina, PE: Embrapa Semi-árido, 2007, Cap.4, p.81-101.

IBGE – Instituto de Geografia e Estatísticas. Cidades@. Disponível em :


<http:://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/home.php >, Acessado em : 20 jun. 2014.

IPEA- Instituto de pesquisa Econômica Aplicada. Dados econômicos por município.


Disponível em: <http://www.ipeadata. gov.br/ > , Acessado em : 15 mai. 2014.

MDS - Ministério do Desenvolvimento Social e Cobate á fome. Observatório da Seca.


Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/observatoriodaseca/construcao-cisternas.html >,
Acessado em: 16 mai. 2014.

PNUD- Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Atlas do Desenvolvimento


Humano no Brasil 2013. Disponível em: < http://www.pnud.org.br/>, Acessado em : 02 jul.
2014.

134
GT 4 – CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Técnicas e Tecnologias no Contexto da Educação do Campo: análises
sobre os espaços e objetos técnicos na Pedagogia da Alternância1

Giovanna Pezarico2
Gilson Leandro Queluz3
Maria de Lourdes Bernartt4
Universidade Tecnológica do Paraná – Câmpus Pato Branco e Curitiba

Resumo
O presente estudo está inserido na temática Tecnologia e Sociedade. É a partir
desta temática, que de modo mais específico, buscou-se esmiuçar as relações
entre Tecnologia, Educação e Trabalho no contexto da Educação do Campo,
tendo por mediação, a Pedagogia da Alternância. O estudo tem como objetivo
principal analisar processos de apropriação técnica no contexto da Pedagogia
da Alternância, a partir das interações entre espaços técnicos e objetos,
vivenciadas em algumas Casas Familiares Rurais – CFR´s e Casa Familiar do
Mar - CFM, localizadas na região Sul do Brasil, durante os anos de 2010 a
2013.

Palavras-Chave
Técnicas; Tecnologias; Educação do Campo; Espaços e objetos; Pedagogia da
Alternância.

Introdução
O presente estudo está inserido na temática Tecnologia e Sociedade. É a
partir desta temática, que de modo mais específico, buscou-se esmiuçar as
relações entre Tecnologia, Educação e Trabalho no contexto da Educação do
Campo, tendo por mediação, a Pedagogia da Alternância. O estudo tem como
objetivo principal analisar processos de apropriação técnica no contexto da
Pedagogia da Alternância, a partir das interações entre espaços técnicos e
objetos, vivenciadas em algumas Casas Familiares Rurais – CFR´s e Casa
Familiar do Mar - CFM, localizadas na região Sul do Brasil, durante os anos de

1
Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento – II SEDRES, Campina Grande
(PB), de 13 a 15 de agosto de 2014.
2
Docente do Curso de Administração da UTFPR. Pesquisadora do CEPAD – Centro de Pesquisa e Apoio
ao Desenvolvimento Regional – Câmpus Pato Branco.
3
Docente do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia – PPGTE – UTFPR – Câmpus Curitiba.
4
Docente do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional. Pesquisadora do CEPAD-
Centro de Pesquisa e Apoio ao Desenvolvimento Regional – UTFPR – Câmpus Pato Branco.

135
2010 a 2013. É importante considerar que o estudo parte da premissa teórico-
metodológica que considera a tecnologia como uma prática social e histórica. É
no espaço da sociedade que a tecnologia surge de modo a constituir-se como
relação social, e, portanto, com a faculdade de transformar as relações sociais
no contexto histórico, refutando assim o determinismo tecnológico. Isso
permitiu compreender a tecnologia como uma linguagem que estaria a
provocar relações sociais. É a partir desta reflexão inicial, que se pode
examinar a noção de tecnologia que permeia este estudo por meio de uma
perspectiva crítica. Destaca-se, além disso, as singularidades em torno da
construção, elaboração e apropriação dos objetos e espaços, cujos significados
ou re(significações), códigos técnicos ou designs são atravessados por
interações que se dão em espaços-tempos de tensões, contradições e
resistências, e que dialogam permanentemente com as questões da técnica e
da tecnologia.

1 A técnica e a tecnologia no contexto da Pedagogia da Alternância


Analisar a Pedagogia da Alternância demanda, inicialmente, considerar as
implicações das Casas Familiares Rurais originadas no interior da França. As
primeiras Maisons Familiales Rurales – MFR´s surgiram em meio a profundas
transformações e tensões no espaço rural francês. O evento da criação da
primeira MFR ocorreu em Lauzun, no ano de 1937, no bojo de longas
discussões e reflexões no meio camponês francês que se estendiam desde a
década de 1920 (GARCIA-MARIRRODRIGA, 2010). O cenário que brevemente
ilustra o contexto do rural francês em relação aos seus movimentos de
resistência a processos educativos pensados e implantados para o contexto
urbano também representava um processo de resistência aos processos
técnicos engendrados àquela lógica. Esta perspectiva permite também
compreender a recusa em torno do conhecimento técnico dissociado das
singularidades inerentes às ruralidades e aos seus processos produtivos. Por
este raciocínio, a tecnologia, nosso objeto de análise em específico, também
passa a dialogar com este contexto e constituir-se como um elemento

136
importante para a compreensão e análise da construção de relações sociais,
favoráveis ou não, para o processo de produção e reprodução da vida no
campo. É por meio de elementos imbricados que se torna possível
compreender assim, a Pedagogia da Alternância como um processo também
de resistência e empoderamento no mundo rural. Para além, permite-nos
visualizar a fase embrionária deste movimento, afirma Begnami (2003) como a
produção resultante de um longo e sofrido processo histórico de movimentos
sociais, particulares ao meio rural, cujas raízes possuíam matizes inspiradores
democráticos e cristãos. É a partir dos múltiplos elementos componentes desta
bricolagem, que podemos avançar sobre a primeira experiência em torno da
criação da MFR de Lauzun, na década de 1930, que desencadearia na
expansão dos movimentos de formação por alternância posteriormente e que
chegariam ao Sudoeste do Paraná no final da década de 1980.
Contudo, para estabelecermos as relações pretendidas, entre a
Pedagogia da Alternância e as construções em torno da técnica e da
tecnologia, recorremos a Dussel (1984), quando afirma que para que a
tecnologia sirva ao homem e não a um sistema de exploração do homem, se
devem contemplar muitos condicionantes estruturais concretos, históricos que
não são propriamente tecnológicos. Assim, em termos de tecnologia, Silva
(1999) ao analisá-la no âmbito da agricultura familiar admite-a como uma
relação social e não um conjunto de “coisas”, tais como máquinas, os adubos
químicos, as sementes, etc. A tecnologia é o conjunto dos conhecimentos
aplicados a um determinado processo produtivo que afeta diretamente o
funcionamento das economias camponesas, sendo muitas vezes responsável
por transformações profundas tanto em nível interno da unidade produtiva
como em nível de suas relações com a sociedade capitalista, bem como em
diálogo com os processos de formação. Assim, analisar tais especificidades
demanda resgatar os motes principais que cercam a organização produtiva
inerente ao contexto rural, especificamente da agricultura familiar e da
racionalidade camponesa: a reprodução das relações sociais e a manutenção
das condições da vida e da família, diretamente e da comunidade.

137
Logo, o desenvolvimento da técnica nessa perspectiva dialoga com as
condições de estrutura da exploração natural, que se compõem da intensidade
do cultivo e formas organizativas proporcionais à medida de extensão da terra
utilizável, do tamanho da família trabalhadora e da extensão de suas
necessidades, bem com dos laços que estabelece com o espaço, enfim, como
seu projeto. Além disso, a relação entre natureza e técnica no âmbito rural é
bastante distinta da perspectiva da indústria convencional. As relações
estabelecidas pelo espaço-tempo, terra e tempo necessário para o cultivo e a
perspectiva de consumo preciso são fundamentais para pensar um processo
de desenvolvimento técnico repleto de requisitos específicos. Logo, o
desenvolvimento do aparato técnico arranja-se de modo a responder, por um
lado, às exigências agronômicas (os potenciais cultivos em virtude das
condições climáticas e das condições do solo), mas também às necessidades
da família (vestuário, ampliação da dieta). Este contexto reforça a perspectiva
de Veira Pinto, ao enfatizar que a essência da tecnologia é a mediação
dialética entre o ser e o meio, numa correlação recíproca. Em se tratando do
trabalho no campo, parece evidenciada a hipótese de que o mundo se
apresenta ao existente humano como campo de ações possíveis, que se
revelam mediante ações específicas sobre os objetos dispostos ao redor do
homem, que podem tornar-se utensílios e que permite investigar a cultura
daqueles que tem acesso imediato à realidade (VEIRA PINTO, 2005). Diante
deste cenário, se verificam cada vez mais a pertinência e relevância de
iniciativas como os movimentos familiares de formação rural, como por
exemplo, as Casas Familiares Rurais e a Pedagogia da Alternância como
elementos de um sistema técnico voltado para reprodução de relações sociais
desta natureza. Estas circunstâncias dialogam diretamente com o sistema
técnico e suas apropriações, na medida em que o desenvolvimento técnico
auxiliou na imposição de limites efetivos produzindo o esgotamento das
possibilidades de reprodução social frente ao latifúndio e à intensificação da
produção agrícola.

138
2 Objetos e Espaços Técnicos: interações no contexto da Pedagogia da
Alternância
Ao avançar das leituras, realizações dos estágios de vivências,
observações e entrevistas junto às Casas Familiares Rurais e do Mar, nas
quais emergiram uma diversidade de objetos e discursos, práticas e
percepções, ora convergentes, ora contraditórias, por vezes fundamentadas,
outras vezes empíricas, as relações entre técnica e tecnologia no âmbito da
Pedagogia da Alternância, impuseram a responsabilidade e o
comprometimento teórico que implicou na preocupação permanente daquilo
que Álvaro Vieira Pinto (2005) definiria como concepções ingênuas sobre
tecnologia. Nestes termos, julgou-se prudente iniciar as discussões em torno
das técnicas e da tecnologia no âmbito da Pedagogia da Alternância, tendo
como ponto de partida o horizonte proposto pelo autor, a partir do seguinte
questionamento: “que papel desempenha a técnica no processo de produção
material da existência do homem por ele mesmo?” (VIEIRA PINTO, 2005, p.
155). É por meio de tal questionamento que as decisões metodológicas em
torno da materialidade e o simbólico presente nos objetos e espaços técnicos
no âmbito da Pedagogia da Alternância parecem encontrar ressonância. Tendo
em vista suas propostas e dinâmicas singulares, emerge daí a produção
material como manifestação da cultura ou da formação social no contexto do
laboratório terra e do laboratório mar. O constructo acima evidencia o apego ou
a ênfase à técnica como elemento que transcende a perspectiva de mediação,
na medida em que as noções de fabrico, de uso e ao produzir materialmente
seus bens (artefatos, objetos) extrapola a satisfação de necessidades
concretas para produzir também cultura, implicando na tecitura de relações
sociais fluídas. Assume-se assim, a perspectiva que no presente estudo, os
objetos naturais e artificiais (que em alguns momentos sequer podem ser
percebidos com tal distinção) encontram-se imbricados a processos biográficos
complexos. Neste sentido, cabe resgatar a relação entre objeto e biografia
(APPADURAI, 2008). Isso significa dizer, que apesar dos objetos e espaços
técnicos estarem no horizonte de análise do estudo, as aproximações

139
permitidas durante os estágios de vivências propiciaram outras abordagens e
ressignificações sobre os mesmos, principalmente justificadas pelas suas
riquezas, enquanto possibilidades e desafios de análise. É a partir de
concepções como estas que os objetos e espaços técnicos puderam ser
percebidos e, principalmente, permitiram o estabelecimento de relações,
tensionamentos, contradições, resistências e cooptações no âmbito da
Pedagogia da Alternância, considerando, porém, que estes não podem ser
colocados em primeiro plano, e principalmente, desvinculados dos sujeitos de
suas criações, usos e manipulações. Ou seja, assim, como a tecnologia não
pode ser compreendida como determinante da vida social, os objetos e
espaços técnicos por si só, também não tem este condão. Mas em oposição a
esta racionalidade, para o estudo presente, assumem a condição de elementos
presentes no contexto da cultura material e simbólica destas relações. Por tais
razões, e com a compreensão da incompletude permanente na análise de tais
circunstâncias, a trajetória do estudo conduziu-o de modo a estabelecer três
recortes analíticos acerca dos objetos e espaços técnicos em diálogo com as
técnicas e tecnologias, no âmbito das Casas Familiares Rurais e do Mar,
vinculadas à Pedagogia da Alternância. O primeiro recorte evidenciou as
relações estabelecidas entre os processos de construção, uso e manipulação
de objetos, compreendidos, como artefatos em diálogo com a arte, o
artesanato, o trabalho e o lazer e as relações engendradas a todas estas
dimensões. O segundo recorte, e talvez, o último ponto de análise consolidado
em termos de síntese, diz respeito à perspectiva assumida pelas próprias
Casas Familiares Rurais e do Mar como “objetos” e “espaços técnicos”
revestidos de materialidade cultural e simbólica.

2.1 Os objetos: lazer, trabalho e arte

Apurar o olhar no sentido de estabelecer relações a partir da biografia dos


objetos no contexto da Pedagogia da Alternância implicou, por certo, na
observância do que Gimonet (2009) elucidava acerca do ambiente. Mais do

140
que isso, da necessidade de ampliar a perspectiva para além dos objetos
vinculados diretamente aos processos de apropriação técnica, mas também à
diversidade dos espaços e dos tempos de formação (pilares para a formação
em alternância). Neste primeiro momento, considera-se relevante iniciar as
principais análises em torno dos objetos verificados junto às Casas Familiares,
a partir das dinâmicas percebidas e dedicados ao lazer e ao brincar e que
repercutiram para o encontro de objetos elaborados pela intencionalidade de
constituírem-se como brinquedos, por exemplo. Neste sentido, ainda que não
mencionado nas falas dos sujeitos da pesquisa, foi inevitável deparar e
perceber a Casa Familiar, inserida no laboratório terra ou mar, como um
cenário profícuo para interações mais amplas, do qual o lazer também se
consistira em perspectiva formativa de valores, princípios e convivência
comunitária. Além disso, há que se evidenciar, que as próprias dinâmicas
atinentes à alternância, principalmente, no que diz respeito à permanência dos
jovens em formação durante a alternância, terminam por estabelecer lógicas
distintas da escola tradicional, próprias desta modalidade de formação. Neste
sentido, o lazer, o brincar, compreendidos como atividades lúdicas, recreativas
e interativas fomentadas no âmbito das Casas Familiares analisadas podem
ser considerados como processos inseridos numa rede de relações que
visariam superar a tradicional triangulação entre professor-saberes-estudante,
ambientada na sala de aula, exclusivamente. Para além deste enfoque, há que
se mencionar o brinquedo como objeto efetivo de representações, e neste
caso, de imbricações com o laboratório terra ou mar. Assim, a função do
brinquedo ao introduzir e compor o espaço da brincadeira, não
necessariamente demandando de uso preciso, possibilita também o desviar os
objetos de suas funções para tornar-se brinquedo, e mesmo fabricar os
objetos-brinquedos. Trata-se de fornecer imagens e representações. No que
diz respeito às concepções em torno da elaboração de artefatos destinados a
compor o mobiliário da casa ou de objetos produzidos com a intencionalidade
de uso para o trabalho. Todavia, este a priori não pode ser analisado sem
considerar as experiências vivenciadas no âmbito da Pedagogia da Alternância

141
que dialogam com as perspectivas teóricas de recusa à neutralidade da
tecnologia. Isso significa dizer que a partir do tema gerador vinculado às
questões ambientais, presentes nos planos de formação da maior parte das
Casas Familiares Rurais e do Mar que compuseram o lócus da pesquisa,
residem também posturas políticas que conduzem os modos de elaboração e
apropriação técnica. Neste sentido, destacam-se os conteúdos voltados ao
manejo das propriedades sob a perspectiva agroecológica, a introdução de
técnicas de cultivo de produtos orgânicos, a homeopatia como forma de
tratamento dos rebanhos e as preocupações em torno da manutenção da vida.
Ante o exposto, é possível considerar que os objetos naturais ou artificiais
inseridos no contexto da Pedagogia da Alternância são também atravessados
por relações atreladas a designs e códigos técnicos que lhe imprimem
singularidades, principalmente, no que diz respeito ao processo de construções
relacionais engendradas não apenas ao trabalho, mas à vida social e
principalmente familiar.

2.2 A Casa Familiar Rural e do Mar: objeto-espaço e tempo

Os estágios de vivência, conduzidos a partir da condição de visitante


permitiram estabelecer indícios consistentes no sentido de considerar as Casas
Familiares Rurais e a Casa Familiar do Mar, no âmbito da Pedagogia da
Alternância, para além de sua dimensão enquanto espaço técnico, mas próprio
objeto construído nas dinâmicas complexas que nela se concretizam
materialmente e simbolicamente a partir dos sujeitos individuais e coletivos que
delas são participantes. Foi no assentamento das ideias, no amadurecimento
teórico que uma compreensão mais ampla, acerca dos feixes de relações
estabelecidas, que se considerou que tal nomenclatura desempenharia papel
mais contundente do que apenas mera formalidade. Deste modo, a perspectiva
assumida pela “Casa Familiar”, foi a de objeto-espaço, mimetizada a partir dos
aspectos que por ela são tomadas, ora como objeto material e simbólico de
valores, família, escola, aprendizagem, convivência e interação comunitária,
enfim, de cultura. Neste sentido, nos apoiamos também na concepção de que a

142
Casa Familiar é também espaço que se “confunde com a própria ordem social
de modo que, sem entender a sociedade com suas redes de relações sociais
ou valores, não se pode interpretar como o espaço é concebido” (DAMATTA,
1997, p. 30). A partir das manifestações, é possível perceber as singularidades
assumidas pela relação tempo-espaço, distinta do ambiente escolar tradicional,
mas que é estabelecida entre a Casa Familiar Rural ou do Mar e seus sujeitos
a partir das peculiaridades de suas dinâmicas formativas, das concepções de
diversidades de espaços e tempos, e de outras gramáticas e construções
sociais. As dinâmicas verificadas e explicitadas nos depoimentos dos sujeitos
de pesquisa estão também relacionadas ao quotidiano da Casa Familiar Rural
ou do Mar, por meio da realização coletiva das atividades domésticas, tais
como a limpeza e arrumação da casa, preparação das refeições, pequenos
consertos elétricos e serviços de manutenção, por exemplo. É importante
reforçar neste cenário a abordagem também do trabalho como princípio
educativo, mas também como construção de relações que perpassam as
questões de gênero e construção de papeis familiares, muito enfatizados no
âmbito da Pedagogia da Alternância.
Outro aspecto que merece análise é a relação decorrente dos processos
de aprendizagem que ocorrem no espaço da Casa Familiar Rural e o modo
como são apropriados no contexto familiar, que contemplam desde saberes
sobre alimentos e receitas a medicamentos fitoterápicos e cuidados com a
saúde. Apesar das intenções iniciais deste estudo estabelecer como foco
aspectos biográficos em torno das interações e objetos no âmbito das Casas
Familiares Rurais e do Mar, na medida em que os estágios de vivência foram
sendo realizados, uma categoria analítica tornou-se cada vez evidente: os
espaços técnicos. Neste sentido, é importante salientar que em se tratando da
temática, ora em discussão, não se pode estabelecer hierarquias entre objetos
e espaços técnicos, tendo em vista que as interrelações construídas pelos
sujeitos da Pedagogia da Alternância não apenas demandam de ambos, mas
integram um complexo processo de imbricação, no qual tempo-espaço, sujeito-
objeto, espaço-objeto podem ser interpretados como um continuum.

143
Logo, se resgata a concepção de laboratório, representado principalmente
pela terra e pelo mar, como os espaços privilegiados para a discussão
intencionada, principalmente pela sua diversidade em termos de
heterogeneidade não apenas de suas características naturais, mas também
pelos modos pelos quais os objetos – naturais ou artificiais – deles se ocupam
e das interações estabelecidas entre os sujeitos para além de processos de
mediação, mas de permanente construção da cultura, material e simbólica,
permeados pela técnica e pela tecnologia. Primeiramente, há que se considerar
que os espaços técnicos no âmbito da Pedagogia da Alternância, apesar de
muitas vezes em termos de localização estarem vinculados ao objeto-espaço
Casa Familiar, produzem ações concretas e simbólicas com implicações,
principalmente de reprodução e apropriação técnica no âmbito da propriedade
familiar ou da comunidade pesqueira. Ademais, é salutar evidenciar a
importância assumida pelos espaços destinados à experimentação num
caminho de dupla via entre os aprimoramentos realizados nas Casas
Familiares Rurais, assim como do Mar, que terminam por serem inseridas nas
propriedades e vice-versa. Análise fundamental neste contexto, se refere aos
espaços técnicos como dimensões de difusão e construção de técnicas e
códigos técnicos elaborados em condições singulares, estabelecidas em
diálogo com o local e com os sujeitos que dele participam. Destaca-se neste
sentido, o espaço técnico composto pelo pinheiral existente em uma das Casas
Familiares Rurais visitadas, utilizado para difusão de saberes e elaboração de
técnicas destinadas à formação de jovens e famílias que possuem no
extrativismo do pinhão suas principais atuações junto às propriedades,
juntamente como a erva-mate. Mais do que isso, significa interpretar o espaço
técnico da horta ou do pinheiral numa conjuntura mais ampla relacionada às
racionalidades dos sujeitos que neles desenvolvem atos poiéticos que
dialogam com códigos técnicos amparados em tradições, concepções e modos
de divisão do trabalho, papeis de gênero, construídos socialmente, relações de
poder estabelecidos entre pais e jovens, mas também pelas opções pelo uso
de técnicas específicas, que perpassam também pelas opções políticas

144
orientadoras das tecnologias selecionadas. Além disso, se as dinâmicas que se
desenvolvem a partir da Pedagogia da Alternância no contexto das Casas
Familiares Rurais possuem laços estreitos junto aos espaços técnicos, em se
tratando da Casa Familiar do Mar analisada, as perspectivas assumidas para
os mesmos possuem igual relevância, contudo com as suas singularidades.

Considerações Finais
Como consideração tem-se como ponto de partida a perspectiva
assumida pela Casa Familiar como um objeto técnico em diálogo com os
instrumentos e diretrizes pedagógicas inerentes à Pedagogia da Alternância.
Compreender a Casa Familiar como objeto-espaço significa tomá-la como
construção biográfica concreta, material que efetivamente se ressignifica em
espaço, mas também como objeto simbólico de um sistema pedagógico
atravessado por relações de afeto, de poderes, de interações que se
estabelecem entre seus sujeitos e pelo trabalho como princípio pedagógico. Há
que se considerar ainda, a relevância da Casa Familiar como objeto que está
dialogando permanentemente com a técnica e com a tecnologia, na medida em
que suas dinâmicas, seus funcionamentos, seu projeto e seu design terminam
por incorporar ou estabelecer códigos técnicos engendrados ao seu contexto.
Daí novamente a necessidade de reforçar a Casa Familiar como objeto-espaço
no âmbito da Pedagogia da Alternância, tendo em vista a diversidade de
projetos e designs verificados nas casas visitadas, bem como das dinâmicas de
ensino-aprendizagem (imagens, materiais, ambientes) que buscam construir a
partir da Casas Familiar sentido para os conteúdos em discussão. Neste
sentido, destacam-se as percepções em torno dos espaços técnicos
primeiramente assumidos como dimensões de difusão e construção de
técnicas e códigos que possuem vinculações com os aspectos locais, seja da
propriedade familiar, das configurações da comunidade pesqueira. No entanto,
mais do que ambiente de difusão, o espaço técnico pode ser considerado como
um tempo singular no âmbito da Pedagogia da Alternância por significar
também espaço para a construção de relações sociais, da construção, reforço

145
ou desconstrução de tradições e de saberes. Destaca-se neste enfoque a
importância assumida durante o estudo, pelas hortas, como espaço de
construção de autonomias, apropriação de técnicas, construção de papeis,
inclusive para além da dimensão tecnológica. Do mesmo modo, os pinheirais
nas comunidades no qual o extrativismo ainda carrega importância
considerável no que diz respeito às possibilidades do campo. E em se tratando
de espaço técnico, o mar para a comunidade pesquisa, laboratório por
excelência, somente pôde ser analisado a partir da premissa de se constituir
como lócus privilegiado para a interação não apenas de seus sujeitos, nas
relações com a natureza, mas nestas por meio dos objetos naturais e artificiais
que o compõem.

Referências Bibliográficas
APPADURAI, A. Mercadorias e a política de valor. In: A vida social das
coisas. Niterói: EDUFF, 2008.

BEGNAMI, J. B. Formação pedagógica de monitores das escolas famílias


agrícolas e alternâncias: um estudo intensivo dos processos formativos
de cinco monitores. 2003. Dissertação (Mestrado)- Universidade Nova de
Lisboa/Universidade François Rabelais/UNEFAB. Brasília. 2003.

DAMATTA, G. A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e a morte no Brasil.


Rio de Janeiro: Rocco, 1997.

DUSSEL, E. Tecnología y necesidades básicas. In: Filosofia de la


producción. Bogotá: Nueva America, 1984, In: http://www.ifil.org/dussel/.

GARCÍA-MARIRRODRIGA, R.; CALVÓ, P. P. Formação em alternância e


desenvolvimento local: o movimento educativo dos CEFFAS no mundo.
Belo Horizonte: O Lutador, 2010.

GIMONET, J.C. Lograr y comprender la Pedagogía de la Alternancia.


Guatemala: AIMFR, 2009.

SILVA, J. G. Tecnologia & Agricultura Familiar. Porto Alegre: UFRGS, 1999.

VIEIRA PINTO, A. O conceito de tecnologia. V.1, Rio de Janeiro:


Contraponto, 2005.

146
GT4- CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Transmissão de Tecnologias Socioambientais para as Comunidades


visando o Desenvolvimento Sustentável1

Wellington Marchi PAES²


Maria Cristina CRISPIM³

² Mestrando do PRODEMA - Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento


e Ambiente da Universidade Federal da Paraiba, e-mail: tonbio@hotmail.com

³ Professora Associada da UFPB/PRODEMA, e-mail: ccrispim@dse.ufpb.br

Resumo
Desenvolvimento sustentável deve ser pensado em ações conjuntas entre
pesquisadores e atores, transmitidas e divulgadas, para que cada localidade
possa aplicar os conhecimentos de forma contextualizada. Sendo assim, a
apropriação pelas comunidades de tecnologias que visem o DS é essencial,
nesse processo de evolução conjunta. As Tecnologias Socioambientais são
transdisciplinares e multidimensionais, promovendo uma interação entre as
ciências sociais e naturais e entre o conhecimento científico e os outros
diversos saberes. Este trabalho visou levar a diferentes comunidades da
Paraíba, conhecimentos que lhes proporcionassem melhor qualidade de vida,
através do desenvolvimento de TSA, baseadas em técnicas de Permacultura,
com atividades de hortas agroecológicas, de reuso de resíduos sólidos e da
gestão de efluentes residenciais com a implementação de fossas ecológicas,
todas as ações realizadas e apreendidas pelos moradores locais.

Palavras-chave: Biotecnologias; Desenvolvimento Sustentável; Permacultura;


Saneamento Ecológico; Tecnologias Socioambientais

1. Introdução
As comunidades humanas estão distanciando-se da relação e dos
conhecimentos que os antepassados tinham com o ambiente, em nome da
“civilização e progresso”. Nos grupos étnicos ou tradicionais, conhecimentos
milenares vão sendo substituídos por atitudes de desperdício, baseadas no
consumo exacerbado, cada vez mais divulgados por uma mídia alienante
subsidiada pelo capitalismo inescrupuloso.

1Trabalho apresentado no GT 4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES,


Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014.

147
O desenvolvimento sustentável busca criar condições de associar o
crescimento econômico com a manutenção da qualidade ambiental, de forma a
proporcionar uma melhor qualidade da vida. Quando se pensa em
desenvolvimento sustentável, tem-se de pensar em ações conjuntas entre
pesquisadores e atores, que possam ser transmitidas e divulgadas, para que
cada localidade, urbana ou rural, aplique tais conhecimentos de forma
contextualizada e as divulgue dentro das suas relações pessoais.
De acordo com Novaes e Dias (2009), as Tecnologias Sociais (TS)
surgem como uma crítica aos métodos da tecnologia convencional (TC) e um
dos seus objetivos é justamente transformar a tendência excludente imposta
pela tecnologia capitalista, apontando para uma produção coletiva e não
mercadológica.
Furtado (2003, p.31), ressaltou que é imprescindível desenvolver
tecnologias que desempenhem um papel direto ou indireto no aprimoramento
da qualidade ambiental, portanto, que sejam ecoeficientes “com especial
destaque para o uso de recursos (matérias primas, água e energia)” além da
minimização da geração de resíduos e efluentes, sendo denominadas de
Tecnologias Ambientais (TA).
As Tecnologias Socioambientais (TSA), estão na interface que labuta e
abrange as TS e TA, dessa forma, são transdisciplinares e multidimensionais,
promovendo uma interação entre as ciências sociais e naturais, assim como,
entre o conhecimento científico com outras diversas formas de sabedoria,
como a tradicional e popular, a filosófica, a artística, a espiritual, entre outras
(ANDRADE, et al., 2012). Podem ser compreendidas como um conjunto de
técnicas ou metodologias transformadoras, desenvolvidas em interação com as
pessoas e comunidades e apropriadas por elas, voltados para as resoluções de
problemas das populações mais carentes em aspectos fundamentais, que
promovam a melhoria das condições de vida, bem como propiciem melhor
qualidade ambiental (RODRIGUES; BARBIERI, 2008).
Nesse sentido, “um passo importante e muito comum é aliar a pesquisa
e a extensão universitária com as práticas populares. Várias tecnologias, ao

148
serem analisadas nesse âmbito, passam a ter status de solução recomendada
pela academia” (LASSANCE JR.; PEDREIRA, 2004, p.74).
Técnicas permaculturais são alternativas que vêm sendo desenvolvidas
no intuito de produzir uma cultura permanente, que reintegra o ser humano ao
ambiente, levando em consideração diversos fatores que estão auxiliando a
degradar a vida e a natureza, com métodos para o melhor aproveitamento da
energia disponível, minimização dos desperdícios, manutenção da fertilidade
do solo, saneamento ecológico, entre outros (MOLLISON; SLAY, 1994).
Este trabalho, visou aproximar a Universidade de comunidades rurais e
periurbanas, com o desenvolvimento de algumas TSA, baseadas em técnicas
de Permacultura, proporcionando aos moradores locais conhecimentos e
métodos para alavancar melhor qualidade de vida, através da Ecopedagogia e
atividades de hortas agroecológicas, da reutilização de resíduos sólidos e
produção artística e da gestão dos efluentes domésticos com implantação de
fossas ecológicas. Os projetos foram desenvolvidos em diferentes
comunidades da região metropolitana de João Pessoa, na Paraíba.
2. Ecopedagogia e horta agroecológica
De acordo com Leff (2007), é na construção da racionalidade ambiental,
desconstrutora da racionalidade capitalista, que se forma o saber ambiental.
Nesse sentido, busca-se uma cultura emancipatória à hegemônica deturpação
natural, formalizando, o que Capra (2005) chama de Ecoalfabetização, um
sistema de educação voltado para a vida sustentável, que utiliza os princípios
básicos da ecologia, propondo uma pedagogia centrada na compreensão da
vida, com uma experiência no mundo real, empregando o espírito de
participação e integração à natureza. Segundo o autor, a horta é um ambiente
de aprendizagem rico e multissensorial, perfeito para experimentar o
pensamento sistêmico e os princípios da ecologia em atuação. Pois, há nos
vegetais a doação celestial à evolução universal dos organismos vivos no
planeta e isso inclui a espécie humana.
O projeto de Permacultura na Escola, realizou-se no primeiro semestre
de 2011, com dois grupos de alunos da Escola Municipal de Ensino

149
Fundamental de Nova Vida – EMEFNV, no Viveiro de mudas do Assentamento
de Nova Vida, que é um assentamento de reforma agrária do MST, pertencente
ao município de Pitimbu, na Região Metropolitana de João Pessoa na Paraíba.
Os encontros aconteceram uma vez por semana no período matutino, em
horários distintos. Uma das turmas, com cerca de vinte alunos que estudavam
no 1°ano no período matutino, a maioria com 06 anos idade, foram
acompanhados pela professora durante as atividades. O outro grupo foi de
alunos que frequentavam a escola no período vespertino, do 2° ao 5° ano, com
idades entre 07 e 13 anos, com uma média de quinze alunos por aula.
Na perspectiva de “plantar a semente” no coração dessas crianças e
jovens, para a preservação de seus ambientes, fomentando o desenvolvimento
de uma sustentabilidade socioambiental e instituindo o cuidado com a mãe
Terra e suas vidas, desenvolveu-se um trabalho cooperativo entre os
participantes. Para isso foram empregadas técnicas permaculturais, as quais
visam à criação de sistemas ecologicamente corretos e economicamente
viáveis, que supram suas próprias necessidades e sejam sustentáveis no longo
prazo (MOLLISON; SLAY, 1994).
O trabalho em todos os encontros dividiu-se em duas etapas, uma
expositiva de sensibilização e aprendizagem no interior de uma das salas no
Viveiro de mudas, valendo-se de dinâmicas interativas e jogos pedagógicos. A
segunda parte de atividades práticas, relacionadas com o cultivo e manejo de
espécimes vegetais, utilizadas como alimento humano, e desenvolvidas na
área externa do Viveiro de mudas.
Durante as atividades práticas, foram elaborados e construídos dois
canteiros circulares no formato de “buraco de fechadura” pelas crianças em
Nova Vida. Depois de demarcados os canteiros, um deles foi delimitado com
cerca de 130 garrafas plásticas do tipo Pet de 2 litros, recolhidas pelos alunos,
expostos na Figura 01a,b. A Figura 01c, apresenta o canteiro buraco de
fechadura finalizado, com a cobertura vegetal e o desenvolvimento de alguns
espécimes vegetais transplantadas pelas crianças de Nova Vida dentro das
atividades permaculturais desenvolvidas no local.

150
Figura 01. a) Demarcação do canteiro pelas crianças da escola; b) Trabalho cooperativo dos
alunos no canteiro; c) O canteiro buraco de fechadura confeccionado com garrafas plásticas
pelos alunos da EMEFNV no Viveiro de mudas do Assentamento Nova Vida em Pitimbu, PB.

Fotos: Wellington Paes (2011).


Considerou-se frente ao trabalho realizado com as crianças da escola e
do relato de alguns pais, a necessidade de atividades que pudessem inserir
valores educacionais diferenciados e complementares à educação formal, na
perspectiva da Ecopedagogia, para uma melhor percepção, interação e gestão
de seus ambientes. Desta forma, desenvolver o interesse e desenvoltura pela
cultura de subsistência, no intuito de promover a sensibilização para a
sustentabilidade socioeconômica e ambiental de suma importância na atual
conjuntura das sociedades humanas e prepará-las adequadamente para a vida
que se abre, resgatando o amor, a solidariedade e a criatividade na melhoria da
qualidade das vidas da comunidade, foi fundamental.

151
3. Reuso de materiais para a produção artística
A Comunidade Quilombola de Ipiranga situa-se no distrito de Gurugi,
município do Conde na Paraíba. O município do Conde está localizado na Mata
Paraibana, 13 km ao sul da capital e junto à Bayeux, Santa Rita e Cabedelo
forma a Grande João Pessoa. O projeto em Ipiranga ocorreu no segundo
semestre de 2012, com cerca de sete pessoas de três famílias na comunidade
quilombola. Os encontros ocorreram uma vez por semana, geralmente no
período noturno, turno mais conveniente para as participantes devido às suas
atividades diárias. Devido à ineficiência do serviço de coleta de lixo municipal
no distrito de Gurugi, onde localiza-se a comunidade de Ipiranga, moradores
locais costumam incinerar os resíduos sólidos domésticos.
A incineração dos resíduos sólidos é uma prática tradicional e comum
em comunidades rurais modernas e em toda essa região da Paraíba. Porém,
ao reunir os resíduos naturais dos quintais com o lixo doméstico, que não mais
é composto apenas por resíduos orgânicos, como no início das civilizações,
contendo diversos tipos de materiais agregados e que quando cremados
liberam substâncias nocivas à saúde ambiental e humana. Como exemplo
temos a dioxina, que é uma das substâncias mais tóxicas produzidas pela ação
humana, sendo liberada para atmosfera com a combustão de todos os tipos de
plásticos, entre outros materiais componentes do lixo doméstico4.
Deste modo, apresentaram-se alternativas às pessoas da comunidade
de Ipiranga para que elas solucionassem essa questão dentro da comunidade,
transformando problemas em soluções. Com a reutilização dos materiais,
promove-se o desenvolvimento criativo, artístico e cognitivo, diminui a
disposição dos resíduos no ambiente quilombola e, ainda, pode-se incrementar
a renda familiar com a minimização do consumo e a venda dos produtos. Neste
trabalho, visou-se a reutilização de alguns resíduos, no sentido de discutir e
experimentar as infinitas possibilidades artísticas para a transformação dos
materiais, proporcionando nova utilidade para os descartados e seu retorno ao

4
A HISTÓRIA DAS COISAS. Produção de Anne Leopard. 2007. Disponível em:
<http://www.youtube.com/watch?v=7qFiGMSnNjw> Acesso em: 15 ago. 2013.

152
ciclo produtivo.
Nesse sentido, foram promovidas rodas de conversa com as pessoas da
comunidade que participaram da ação, enfatizando o Repensar atitudes e
valores, em que os cidadãos passam a assumir efetivamente o seu papel na
coletividade e na preservação de seu ambiente, com a Redução na geração de
resíduos, a Reciclagem e a Reutilização dos materiais descartados, como
medidas de minimizar os impactos ambientais, buscando a formação de
multiplicadores numa perspectiva da prática desses 4R’s.
Desenvolveram-se algumas oficinas para a reutilização dos resíduos
sólidos da comunidade e produção artística com essas pessoas, como a
confecção de vassouras, pufes e borboletas de garrafas plásticas descartadas
e a produção de mandalas de fios Olho de Deus, com reuso de palitos de
madeira e outros resíduos, apresentados na Figura 02.
Figura 02. a) Uma das vassouras de garrafas Pet confeccionadas nas oficinas de arte com
reuso de resíduos sólidos; b) O pufe construído e encapado por uma das participantes dos
trabalhos; c) A produção de borboletas de Pet das oficinas; d) As Mandalas de Fios “Olho de
Deus” produzidas nas oficinas de reuso de materiais realizadas na comunidade quilombola de
Ipiranga no municipio do Conde, Paraíba.

Fotos: Wellington Paes (2012).

153
A reutilização dos materiais é uma forma de redução de consumo e de
descarte de resíduos, pois consiste em utilizar o mesmo produto de outras
maneiras, ao invés de descartá-lo no ambiente, prolongando a sua vida útil e
isto depende da criatividade do gerador, podendo-se confeccionar diversos
artigos numa perspectiva de economia criativa. A Economia Criativa é uma
abordagem holística e multidisciplinar, que labuta com as interfaces entre a
economia, a cultura e a tecnologia, resultantes de uma mudança gradual de
paradigma na promoção do desenvolvimento sustentável (DUISENBERG apud
LIMA, 2012).
4. Saneamento ecológico em comunidades
O saneamento ecológico é uma abordagem sistêmica, que representa
uma mudança na forma de pensamento e de atuação das pessoas em relação
aos esgotos domésticos, reconhecendo a necessidade e os benefícios da
promoção da saúde e o bem-estar humano e ambiental. O saneamento
proporciona a proteção e conservação das águas e solos, ao mesmo tempo em
que promove o fluxo circular, com a recuperação e reciclagem de nutrientes
para a produção de alimentos e ornamentação local (ESREY; ANDERSSON,
2001).
Segundo Alsén e Jensen (2004), o saneamento ecológico é
fundamentado na separação dos esgotos domésticos na fonte, divididos em
águas cinzas (águas de pias, chuveiros, lavanderia e limpezas em geral) e
águas negras (águas com fezes e urina dos banheiros), o que facilita soluções
mais sustentáveis para os efluentes residenciais do que os sistemas
convencionais. A admissão do conceito de separação na fonte, permite o
tratamento adequado dos distintos tipos de esgotos domésticos, que
necessitam de tratamentos diferenciados de acordo com suas características,
“esta é a chave de soluções técnicas para o reuso eficiente da água, energia e
nutriente” dos efluentes (GALBIATI, 2009, p. 02).
Neste sentido, de acordo com Diniz (2012), as alternativas tecnológicas
da Permacultura têm muito a contribuir, pois além da simplificação e eficiência
no tratamento dos efluentes domiciliares segregados, em seus princípios

154
agregam-se os valores ambientais e humanos, dessa forma, as águas são
reutilizadas, os dejetos viram adubo e os ambientes tornam-se mais belos e
agradáveis com a produção de alimentos saudáveis e nutritivos, como bananas
e mamões, entre outros, além de evitar o aumento da eutrofização, impedindo
que esses nutrientes alcancem os corpos d’águas. Por outro lado, os sistemas
de saneamento ecológicos podem ser construídos em locais em que o
saneamento básico municipal não está presente, auxiliando na contenção da
poluição difusa, grande responsável pela contaminação de solos e águas.
De fácil construção e manejo, o Círculo de Bananeiras (CB) é um
elemento fundamental na habitação urbana ou rural, por cumprir mais de uma
função importante: tratar a água residual localmente; compostar os resíduos
orgânicos dos quintais e os materiais lenhosos, evitando a queimada desses; e
a produção de alimentos, podendo ser associado a várias outras espécies
vegetais, tudo num círculo de dois metros de diâmetro (CASTAGNA, s/d.).
O Tanque de Evapotranspiração (TEvap) é um sistema de tratamento de
esgoto e reaproveitamento dos nutrientes de águas negras, provenientes do
vaso sanitário, para a produção de flores e frutas. Consiste em um sistema de
filtros e com plantas na superfície, em seu interior ocorre decomposição
anaeróbia da matéria orgânica, a mineralização e absorção das águas e dos
nutrientes pelas raízes, estes incorporando-se à biomassa das plantas e a
água sendo eliminada por evapotranspiração (PAULO; BERNARDES, 2009).
Este trabalho foi desenvolvido com os moradores nas comunidades do
Vale do Gramame e do Condomínio Amizade em João Pessoa na Paraíba, no
decorrer do ano de 2013. Os trabalhos foram realizados em forma de mutirão,
com o auxílio de voluntários, jovens e crianças. Nessas localidades,
desenvolveram-se oficinas práticas de técnicas permaculturais de saneamento
ambiental ecológico, com a construção de cinco CB experimentais em três
residências da região do Vale do Gramame, para o tratamento e
aproveitamento das águas residuárias das residências e dos resíduos
orgânicos de lenta decomposição dos quintais, para a produção de alimentos e
composição paisagística local (Figura 03a,b). Essas, também, são as finalidades

155
do TEvap, construído no Condomínio Amizade para o tratamento e
aproveitamento de efluentes domiciliares, no qual, ainda, promoveu-se a
reutilização de resíduos sólidos humanos dispersos no ambiente, como pneus
e entulhos da construção civil, apresentados na Figura 03c,d,e,f.
Figura 03. A eficiência das Tecnologias Socioambientais implementadas em João Pessoa,
Paraíba: a) Destino dos efluentes do banheiro em uma das residências trabalhadas no Vale do
Gramame antes da implementação da TSA, as águas cinzas seguiam no buraco com balde;
b) O Círculo de Bananeiras implantado, com o plantio das mudas ao redor da fossa repleta de
matéria orgânica de lenta decomposição e a cobertura do canteiro, para o aproveitamento das
águas cinzas deste local na propriedade; c) A situação do local no Condomínio Amizade antes
da implantação do Tanque de Evapotranspiração com os esgotos correndo a céu aberto;
b) O local após a implantação do TEvap; c) Produção de melões com a água tratada do
sistema ecológico; d) Melhorias na composição da paisagem no Condomínio Amizade.

Fotos: Wellington Paes (a,b,c: 2013; d,e,f: 2014).

156
Com esses sistemas, os esgotos domiciliares, que na maioria do país
contaminam águas e solos, são tratados localmente e aproveitados para a
produção de alimentos e paisagismo, diminuindo o escoamento de esgotos
para os rios. Assim, com a implantação das TSA de saneamento ecológico
nessas comunidades, minimizaram-se a contaminação humana e ambiental
cessando com a exposição de esgotos a céu aberto nesses ambientes, dessa
forma, contribuindo com a melhoria na qualidade de vida das pessoas na
periferia da capital paraibana. Outro resultado importante foi a reaplicação das
técnicas apreendidas pelos moradores locais em três das quatro localidades
trabalhadas, com a construção de mais dois CB no Vale do Gramame e um
TEvap no Condomínio Amizade.
Todas essas tecnologias foram bem aceitas pelas comunidades e
devem ser divulgadas para outras, para que possam gerenciar melhor o
saneamento básico, tanto os resíduos sólidos, quanto os líquidos.
Para finalizar, pode-se considerar que com as ações desenvolvidas
neste trabalho, viu-se a possibilidade de melhorias socioambientais de
comunidades a partir da efetivação de atividades práticas conjuntas entre
pesquisadores e sociedade, no intuito da capacitação das pessoas para a
promoção da qualidade da vida e salubridade ambiental. Isso foi possível com
a implementação de técnicas simples e eficazes de saneamento ambiental
ecológico, reuso de materiais e hortas agroecológicas, para a minimização da
degradação e contaminação do ambiente por atividades humanas, contribuindo
para o desenvolvimento sustentável regional.
Referências
ALSÉN, K.W.; JENSSEN, P. (Eds.). Ecological Sanitation: for Mankind and Nature.
Aas: Norwegian University of Life Sciences, 2004.

ANDRADE, M. O. et al. Gestão e desenvolvimento socioambiental na Paraíba através


das pesquisas do Prodema. In: ANDRADE, M. O.; LIMA, G. F. C. (Org.). Gestão e
desenvolvimento socioambiental na Paraíba: concepções e práticas. João Pessoa:
Editora da UFPB, v. 1, 2012. p. 11-46.

CAPRA, F. Alfabetização ecológica: a educação das crianças para um mundo

157
sustentável. São Paulo: Pensamento e Cultrix, 2005.

CASTAGNA, G. Construção de círculo de bananeiras. Disponível em:


<http://www.ipcp.org.br/References/seAlimentando/Composteiras/CARTILHA%20circul
o%20de%20bananeiras.pdf> Acesso em: 20 maio 2012.

DINIZ L. T. Municípios podem diversificar saneamento básico nos mananciais com


alternativas tecnológicas. ISA - Instituto socioambiental, 2012. Disponível em:
<http://site-antigo.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=2742>. Acesso em: 13 out. 2013.

ESREY, S. A.; ANDERSSON, I. Ecological Sanitation-Closing the loop. RUAF,


Resource Centre on Urban Agriculture and Forestry, n. 3, p. 1-3, 2001.

FURTADO, J. S. 2003. Gestão com responsabilidade socioambiental. Ferramentas e


tecnologias. São Paulo: Produção Limpa, 2003. Disponível em:
<http://www.gerenciamento.ufba.br/Downloads/Desenvolvimento%20sustent%C3%A1
vel%20e%20comunidade.pdf>. Acesso em: 17 jan. 2014.

GALBIATI, A. F. Tratamento domiciliar de águas negras através de tanque de


evapotranspiração. 2009. 38 f. Dissertação (Mestrado em Tecnologias Ambientais) -
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Centro de Ciências Exatas e
Tecnologia. Campo Grande, 2009.

LASSANCE JR., A. E.; PEDREIRA, J. S. Tecnologias sociais e políticas públicas. In:


LASSANCE JR., A. E. et al. Tecnologia social: uma estratégia para o desenvolvimento.
Rio de Janeiro: Fundação Banco do Brasil, 2004. p. 65-81.

LEFF, E. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. 5.


ed. Petrópolis: Vozes, 2007.

LIMA, P. Por uma Economia Criativa, divertida e sustentável. In: FONSECA, A. C. et


al. Economia criativa: um conjunto de visões (recurso eletrônico). São Paulo:
Fundação Telefônica, 2012.

MOLLISON, B.; SLAY, R. M. Introdução à permacultura. Tradução de André Luis


Jaeger Soares. 2. ed. Brasília: MA/SDR/PNFC, 1994.

NOVAES, H.; DIAS, R. Contribuições ao Marco Analítico Conceitual da TS. In:


DAGNINO, R. (org.). Tecnologia Social: ferramenta para construir outra sociedade.
Campinas: IG/UNICAMP, 2009. p. 17-53.

PAULO, P. L.; BERNARDES, F. S. Estudo de tanque de evapotranspiração para o


tratamento domiciliar de águas negras. Coordenadoria de Pesquisa: UFMS. Campo
Grande, 2009. Disponível em:
<http://sustentavelnapratica.net/arquivos/estudo_fossa_evapotrasnpiracao.pdf>
Acesso em: 20 mai. 2012.

RODRIGUES, I.; BARBIERI, J. C. A emergência da tecnologia social: revisitando o


movimento da tecnologia apropriada como estratégia de desenvolvimento sustentável.
Revista de Administração Pública. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, v. 42, n.
6, 2008. p. 1069-1094.

158
GT4 - CIÊNCIA, TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO
REGIONAL
Inovação em empresas catarinenses: uma exceção no cenário nacional1

Franklin Carlos Zummach2


Ivo Marcos Theis3
Universidade Regional de Blumenau, Blumenau, SC

Resumo
Este artigo abarca a temática da inovação em empresas catarinenses. Parte-se
da hipótese de que Santa Catarina aparenta ser uma exceção dentro do
cenário nacional pouco propício à inovação. Diante do exposto, a problemática
da pesquisa pode ser expressa através da seguinte pergunta: Qual a situação
das empresas catarinenses em termos de inovação? Com base na
problemática proposta, o objetivo geral é analisar a inovação em empresas
catarinenses. Apoia-se, para tal, em dados oficiais oriundos das cinco edições
da Pesquisa de Inovação - PINTEC, realizada pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística. A análise de dados comparativa com médias nacionais
revela que a suposta condição diferenciada em termos de inovação não se
confirma, sendo que as empresas catarinenses apresentam, inclusive, várias
desvantagens, o que acaba por desmistificar o caráter inovador de Santa
Catarina. Neste sentido, sugere-se que a Política Catarinense de Ciência,
Tecnologia e Inovação seja reorientada, tirando foco da inovação empresarial e
voltando mais atenção às necessidades sociais e ao desenvolvimento regional.

Palavras-chave: Inovação; Santa Catarina; Empresas catarinenses; PINTEC.

Introdução

Inovação é uma palavra recorrente em nossas vidas. Ela parece ser um


fenômeno inerente ao ser humano. É difícil imaginar o mundo atual sem as
inovações científicas e tecnológicas ocorridas no passado. Ainda assim, a

1
Trabalho apresentado no GT4 – Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Regional – II SEDRES,
Campina Grande (PB), de 13 a 15 de agosto de 2014.
2
Estudante de Graduação em Ciências Econômicas da FURB e integrante do Núcleo de Pesquisas em
Desenvolvimento Regional. Email: franklinzummach@gmail.com
3
Economista, doutor em Geografia pela Universität Tübingen, professor e pesquisador da FURB, e
coordenador do Núcleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional. Email: theis@furb.br

159
importância da inovação nem sempre foi tão grande como é atualmente
(FAGERBERG, 2005). Neste sentido, no Brasil, falar em inovação tornou-se
algo comum apenas recentemente. De fato, o debate sobre inovação vem
ganhando corpo não somente nas esferas governamental e acadêmica, mas
também, no meio empresarial. Todavia, enquanto no cenário internacional,
sobretudo nos países desenvolvidos, a inovação é, há muitos anos,
preocupação perceptível das empresas, observa-se um consenso de que a
realidade brasileira está bem distante da ideal. Diversos autores vêm
chamando a atenção para o fato das empresas situadas no território brasileiro
pouco inovarem. De fato, análises comparativas internacionais com base em
indicadores de inovação revelam que o desempenho do Brasil deixa muito a
desejar. Dentro desse contexto, o estado de Santa Catarina aparenta, num
primeiro momento, ser uma exceção. Situado na macrorregião Sul do Brasil,
Santa Catarina é tida, por muitos, como uma experiência socioeconômica
diferenciada. Algumas evidências corroboram com tal inferência: o dinamismo
e a diversificação de sua indústria, a presença de vários polos tecnológicos e o
suposto perfil empreendedor de sua população.
Diante do exposto, a problemática de pesquisa deste trabalho pode ser
expressa através pergunta: Qual a situação das empresas catarinenses em
termos de inovação? Com base na problemática proposta, o objetivo geral é
analisar a inovação em empresas catarinenses. Apoia-se, para tal, em dados
oficiais oriundos da Pesquisa de Inovação – PINTEC, realizada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.
Como em toda pesquisa científica, este estudo faz uso de métodos científicos.
A seguir, estão descritos os componentes metodológicos empregados. Quando
ao método de abordagem, o método dialético mostra-se como ideal para
permitir o alcance dos objetivos propostos, pois, pressupõe-se que o estudo da
inovação em empresas catarinenses deve ser compreendido em meio a um
contexto social, político e econômico. No que diz respeito ao método de
procedimento, são utilizados vários métodos concomitantemente, no entanto,
um deles merece especial atenção, o método estatístico. Considerando-se à

160
técnica de pesquisa, esta é caracterizada por dois tipos: a pesquisa
bibliográfica e a pesquisa documental. Apesar de estar apoiada em dados
estatísticos, a pesquisa é classificada, além de quantitativa, como qualitativa.
Temporalmente, os dados coletados e posteriormente analisados concentram-
se no período de 1998 a 2011, contemplando, assim, o universo temporal dos
cinco triênios (1998-2000; 2001-2003; 2003-2005; 2006-2008 e 2009-2011)
analisados nas cinco edições da PINTEC/IBGE. Espacialmente, a pesquisa
está delimitada ao território catarinense e, com o propósito de comparar o seu
desempenho, é considerado também o território brasileiro. Os dados abrangem
a totalidade de empresas industriais com dez ou mais pessoas ocupadas,
localizadas nestes dois recortes espaciais.

Inovação em empresas catarinenses: alguns indicadores

Esta seção é dedicada à apresentação e análise de dados relativos à dinâmica


inovativa catarinense, com base em dados oriundos da PINTEC. Para isso, são
feitas comparações com dados nacionais. Os indicadores selecionados estão
relacionados aos resultados inovativos (taxa de inovação), ao esforço
empreendido para inovar (dispêndios e recursos humanos) e aos problemas e
obstáculos (razões da não implementação).

Taxa de inovação

Um dos resultados inovativos mais comuns é a taxa de inovação, que consiste


no quociente da divisão entre o número de empresas inovadoras e a
quantidade total. A Tabela 1 apresenta a quantidade de empresas que
implementaram inovações de produto e/ou processo dentre a quantidade total
de empresas consideradas pela PINTEC no respectivo período. A partir desses
dados, tem-se a taxa de inovação.

161
Tabela 1 - Empresas que implementaram inovações de produto e/ou processo,
1998-2011
Que
implementaram
Quantidade Taxa de inovação
Indústrias Período inovações de
Total (%)
produto e/ou
processo
1998-2000 72.005 22.698 31,52%
2001-2003 84.262 28.036 33,27%
Brasil
2003-2005 91.055 30.377 33,36%
2006-2008 100.496 38.299 38,11%
2009-2011 116.632 41.470 35,56%
1998-2000 5.268 2.046 38,84%
2001-2003 6.915 2.480 35,86%
Santa Catarina 2003-2005 7.585 2.648 34,91%
2006-2008 8.472 3.209 37,88%
2009-2011 10.275 3.555 34,60%
Fonte: Elaboração própria com base em IBGE (2002; 2005; 2007; 2010; 2013).

A tabela evidencia que o Brasil apresenta, ao longo dos períodos, um aumento


gradativo do número de empresas inovadoras, passando de 22.698 empresas
em 1998-2000 para 41.470 em 2009-2011, o que corresponde a 82,70%. Esse
aumento é percentualmente superior ao da quantidade total de empresas
consideradas pela PINTEC, que passou de 72.005 para 116.632 (61,98%).
Logo, há um crescimento da taxa de inovação ao longo dos períodos,
passando de 31,52% em 1998-2000 para 35,56% em 2009-2011, o que
representa 12,82% em termos relativos. Contudo, observa-se que a taxa de
inovação, que sofreu variações positivas até 2006-2008, teve variação negativa
no último período (2009-2011), já que passou de 38,11% para 35,56%, uma
diminuição, em termos relativos, de 6,69%. Em Santa Catarina, nota-se
igualmente um aumento do número de empresas que implementaram
inovações ao longo dos períodos, passando de 2.046 em 1998-2000 para
3.555 em 2009-2011. Porém, ao se analisar a evolução percentual em relação
ao total de empresas investigadas, percebe-se uma queda de 2,47% da taxa
de inovação (de 38,84% para 34,60%) no mesmo período. Ou seja, as
empresas catarinenses eram mais inovadoras no primeiro triênio (1998-2000)
da PINTEC do que no último (2009-2011).

162
No comparativo entre Brasil e Santa Catarina, os dados revelam que o número
de empresas catarinenses que implementaram inovações de produto e/ou
processo é superior, em valores relativos, ao Brasil nas três primeiras edições
da PINTEC. Portanto, entre 1998-2000 e 2003-2005, a taxa de inovação das
empresas catarinenses estava acima da nacional. Contudo, nas duas últimas
edições da PINTEC (2006-2008 e 2009-2011) Santa Catarina fica abaixo da
média nacional, pois a taxa de inovação das empresas catarinenses é inferior à
taxa das empresas brasileiras: 37,88% contra 38,11% em 2006-2008 e 34,60%
contra 35,56% em 2009-2011.

Dispêndios

Os dispêndios relacionados às atividades inovativas é um dos indicadores mais


comuns para analisar o esforço empreendido pelas empresas para inovar.

Tabela 2 - Empresas, total e as que realizaram dispêndios nas atividades


internas de Pesquisa e Desenvolvimento, 1998-2011
Dispêndios realizados nas atividades inovativas pelas
Total de empresas que implementaram inovações
empresas que Atividades internas de
Indústrias Período Dispêndios totais
implementaram P&D
inovações Número de Número de
% %
empresas empresas
1998-2000 22.698 19.165 84,43% 7.412 32,65%
2001-2003 28.036 20.599 73,47% 4.941 17,62%
Brasil 2003-2005 30.377 19.951 65,68% 5.046 16,61%
2006-2008 38.299 30.645 80,02% 4.268 11,14%
2009-2011 41.470 32.616 78,65% 5.876 14,17%
1998-2000 2.046 1.712 83,68% 654 31,96%
2001-2003 2.480 1.917 77,30% 480 19,35%
Santa
2003-2005 2.648 1.666 62,92% 354 13,37%
Catarina
2006-2008 3.209 2.710 84,45% 407 12,68%
2009-2011 3.555 2.732 76,85% 497 13,98%
Fonte: Elaboração própria com base em IBGE (2002; 2005; 2007; 2010; 2013).

Durante os cinco triênios, das empresas brasileiras que implementaram


inovações, 76,44% realizaram dispêndios em atividades inovativas e 17,12%
realizaram dispêndios especificamente em atividades internas de P&D. Nas
empresas catarinenses inovadoras, os percentuais foram praticamente

163
similares: 77,03% para atividades inovativas e 17,16% para atividades internas
de P&D.
Os dados mostram variações no que diz respeito a quem mais investiu, em
termos relativos, em atividades inovativas. As mesmas variações ocorrem em
relação aos dispêndios em atividades internas de P&D. Verifica-se em cada
triênio que a indústria que mais investiu em atividades inovativas também teve
o maior percentual em dispêndios em atividades inovativas.
Ademais, nota-se, conforme a Tabela 2, que em ambas as indústrias há
redução do percentual de empresas que investiram em atividades inovativas.
No Brasil, o percentual de 84,43% em 1998-2000 passou para 78,65% em
2009-2011, enquanto que em Santa Catarina, o valor de 83,68% em 1998-2000
passou para 76,85% em 2009-2011. Já nos dispêndios em atividades internas
de P&D, há redução não apenas relativa, mas também absoluta de empresas
que realizaram dispêndios em atividades de P&D. No Brasil, o número de
empresas que investiram em P&D passou de 7.412 em 1998-2000 para apenas
5.876 em 2009-2011 e o percentual sobre o montante de empresas de 32,65%
em 1998-2000 passou para 14,17% em 2009-2011. Em Santa Catarina, as 654
empresas em 1998-2000 diminuíram para 497 em 2009-2011, à medida que o
percentual de 31,96% em 1998-2000 passou para apenas 13,98% em 2009-
2011. A redução do número de empresas que realizaram dispêndios em P&D
indica uma concentração cada vez maior de P&D em menos empresas.

Tabela 3 - Número de empresas com dispêndios de acordo com as atividades


inovativas desenvolvidas, 2000-2011
Atividades Indústrias
inovativas Brasil Santa Catarina
desenvolvidas Período Período
2000 2003 2005 2008 2011 2000 2003 2005 2008 2011
Atividades
7.412 4.941 5.046 4.268 5.876 654 480 354 407 497
internas de P&D

Aquisição externa
1.668 1.202 1.227 1.422 1.834 194 117 54 86 181
de P&D
Aquisição de
outros
2.914 2.053 2.300 3.681 3.699 347 332 137 245 235
conhecimentos
externos

164
Aquisição de Não Não Não Não
3.565 8.307 10.336 255 645 1.194
software dispon. dispon. dispon. dispon.
Aquisição de
máquinas e 15.540 16.250 15.680 24.252 26.379 1404 1.500 1.435 2.128 2.301
equipamentos

Treinamento 6.855 5.657 5.217 11.825 9.328 713 527 482 793 652

Introdução das
inovações
5.723 5.181 5.889 9.672 8.242 441 622 464 910 754
tecnológicas no
mercado
Projeto industrial
e outras
8.145 8.590 6.842 10.080 8.360 670 881 460 844 640
preparações
técnicas

Total 19.165 20.599 19.951 30.645 32.616 1.712 1.917 1.666 2.710 2.732

Fonte: Elaboração própria com base em IBGE (2002; 2005; 2007; 2010; 2013).

A Tabela 3 contabiliza o número de empresas que realizaram dispêndios em


atividades inovativas, distribuídas em oito categorias: atividades internas de
P&D; aquisição externa de P&D; aquisição de outros conhecimentos externos;
aquisição de software; aquisição de máquinas e equipamentos; treinamento;
introdução das inovações tecnológicas no mercado; e projeto industrial e outras
preparações técnicas para a produção e distribuição.
Nas empresas brasileiras, a aquisição de máquinas e equipamentos aparece,
nos cinco triênios, como sendo a atividade inovativa na qual o maior número de
empresas realizou dispêndios: 81,09% em 2000; 78,89% em 2003; 78,59% em
2005; 79,14% em 2008; e 80,88% em 2011. Em Santa Catarina, do mesmo
modo que nas empresas brasileiras, a atividade inovativa na qual mais
empresas realizaram dispêndios foi a aquisição de máquinas e equipamentos:
82,01% em 2000; 78,25% em 2003; 86,13% em 2005; 78,52% em 2008; e
84,22% em 2011.
Desse modo, constata-se que, tanto para as empresas brasileiras quanto
catarinenses, a atividade inovativa predominante é a aquisição de máquinas e
equipamentos.

165
Recursos humanos

Dados relativos aos recursos humanos ocupados nas atividades inovativas


também são relevantes para analisar o esforço das empresas catarinenses
para inovar. A próxima tabela relaciona o nível de qualificação dos recursos
humanos das atividades internas de P&D das empresas brasileiras e
catarinenses que implementaram inovações.

Tabela 4 - Pessoas ocupadas nas atividades internas de P&D das empresas


que implementaram inovações, por nível de qualificação, 2000-2008
Pessoas ocupadas nas atividades internas de P&D das empresas que
implementaram inovações, por nível de qualificação
Indústrias Período
Nível superior Nível médio ou fundamental
Total
Pós-graduados Graduados / Outros
2000 41.467 2.953 17.161 21.353
2003 38.523 3.121 18.674 16.728
Brasil 2005 47.628 4.330 23.269 20.029
2008 48.096 4.398 24.860 18.838
2011 71.351 5.733 42.024 23.594
2000 2.742 143 1.120 1.479
2003 2.945 189 1.133 1.623
Santa
2005 3.637 333 1.553 1.751
Catarina
2008 3.562 208 1.608 1.746
2011 5.128 372 2.419 2.337
Fonte: Elaboração própria com base em IBGE (2002; 2005; 2007; 2010; 2013).

Inicialmente, cabe destacar que, em ambas as indústrias, houve um aumento


significativo do número total de pessoas ocupadas nas atividades internas de
P&D ao longo dos períodos, sobretudo, no último. O total de pessoas ocupadas
nas indústrias brasileiras cresceu em 72,07% de 2000 para 2011, enquanto
que nas indústrias catarinenses o crescimento foi ainda maior: 87,02%.
Constata-se também que, desde os dados da primeira PINTEC, o pessoal
ocupado nas atividades internas de P&D das empresas brasileiras inovadoras
tem, de forma predominante, nível superior, correspondendo a 48,51% em
2000; 56,58% em 2003; 57,95% em 2005; 60,83% em 2008; e 66,93% em
2011, do pessoal total ocupado em atividades internas de P&D. No entanto,
deste pessoal de nível superior, os números relacionados aos pós-graduados
são bastante inferiores aos apenas graduados: representam 14,68% em 2000;

166
14,32% em 2003; 15,69% em 2005; 15,03% em 2008; e 12,00% em 2011, do
total de pessoal ocupado de nível superior. O que, por sua vez, representa
7,12% em 2000; 8,10% em 2003; 9,09% em 2005; 9,14% em 2008; e 8,03%
em 2011, do montante total de pessoas ocupadas em atividades internas de
P&D nas empresas brasileiras que implementaram inovações. Em Santa
Catarina, a realidade não é diferente. O pessoal ocupado nas atividades
internas de P&D das empresas catarinenses inovadoras desde os dados da
primeira PINTEC tem, predominantemente, nível superior: 46,06% em 2000;
44,89% em 2003; 51,86% em 2005; 50,98% em 2008; e 50,43% em 2011,
Dentre o pessoal de nível superior, os pós-graduados correspondem a 11,32%
em 2000; 14,30% em 2003; 17,66% em 2005; 11,45% em 2008; e 13,33% em
2011. Em relação ao montante total, os pós-graduados são 5,22% em 2000;
6,42% em 2003; 9,16% em 2005; 5,84% em 2008; e 7,25% em 2011 – valores,
em geral, inferiores às empresas brasileiras.
Através desses dados, é possível concluir que, apesar do crescimento do
número de pessoas ocupadas em atividades internas de P&D e do pessoal de
nível superior corresponder a mais da metade do pessoal ocupado, as
empresas brasileiras e catarinenses vem investindo pouco em recursos
humanos com maiores qualificações, ou seja, pós-graduados.

Razões da não implementação de inovações

A tabela abaixo aponta as razões da não implementação das empresas que


não implementaram e nem desenvolveram inovações. Os entraves para não
inovar estão dispostos em três opções: inovações prévias, condições de
mercado4 e outros fatores impeditivos.5

4
A PINTEC dá uma explicação bastante vaga do que vem a ser as condições de mercado: “[...] uma
deficiência de demanda (agregada e/ou setorial) ou uma estrutura de oferta (concorrencial ou capacidade
instalada) que desestimulou a inovação” (IBGE, 2013, p. 25).
5
Diz respeito ao conjunto das seguintes razões para não implementação de inovações: riscos
econômicos excessivos; elevados custos de inovação; escassez de fontes apropriadas de financiamento;
rigidez organizacional; falta de pessoal qualificado; falta de informação sobre tecnologia; falta de
informação sobre mercados; escassas possibilidades de cooperação com outras empresas/instituições;

167
Tabela 5 – Empresas que não implementaram inovações e sem projetos, com
indicação das razões porque não desenvolveram nem implementaram
inovações, 1998-2011
Empresas que não implementaram inovações e sem projetos
Razões da não implementação
Indústrias Período Inovações Condições de Outros fatores
Total
prévias mercado impeditivos
Nº % Nº % Nº %
1998-2000 46.182 5.365 11,62% 25.698 55,65% 15.119 32,74%
2001-2003 53.911 5.984 11,10% 35.253 65,39% 12.674 23,51%
Brasil 2003-2005 58.621 6.619 11,29% 41.080 70,08% 10.923 18,63%
2006-2008 59.586 9.329 15,66% 33.127 55,60% 17.130 28,75%
2009-2011 72.419 9.799 13,53% 47.905 66,15% 14.714 20,32%
1998-2000 2.953 412 13,95% 1.370 46,39% 1.172 39,69%
2001-2003 4.279 472 11,03% 2.625 61,35% 1.182 27,62%
Santa
2003-2005 4.724 672 14,23% 3.253 68,86% 799 16,91%
Catarina
2006-2008 5.056 878 17,37% 2.914 57,63% 1.263 24,98%
2009-2011 6.594 963 14,61% 4.287 65,02% 1.343 20,37%
Fonte: Elaboração própria com base em IBGE (2002; 2005; 2007; 2010; 2013).

A partir dos dados, tanto nacionais quanto catarinenses, é possível verificar


que, em todos os triênios das cinco pesquisas PINTEC, as condições de
mercado são de longe a principal razão para a não implementação de
inovações, sendo que outros fatores impeditivos ficam em segunda ordem e
inovações prévias em último lugar. Nota-se, assim, que entraves normalmente
ditos como principais impeditivos da inovação (aqueles que fazem parte do
conjunto “outros fatores impeditivos”), não são os motivos primordiais.

Considerações finais

Esta pesquisa abarcou o tema da inovação em empresas catarinenses. O


problema da pesquisa foi dado pela seguinte pergunta: Qual a situação das
empresas catarinenses em termos de inovação? Partiu-se da hipótese de que,
embora o Brasil estivesse em condição desfavorável internacionalmente em se
tratando de inovação, Santa Catarina aparentava, num primeiro momento, ser
exceção no cenário nacional. Para testar a hipótese, o objetivo do trabalho foi
analisar a inovação ema empresas catarinenses.

dificuldade para se adequar a padrões, normas e regulamentações; fraca resposta dos consumidores
quanto a novos produtos; escassez de serviços técnicos externos adequados; e centralização da
atividade inovativa em outra empresa do grupo.

168
Embora parcialmente, o trabalho atingiu o objetivo proposto. Considera-se que
os indicadores apoiados na análise histórica (1998-2011) são suficientes para
terem permitido uma série de considerações a fim de explicar a dinâmica da
inovação nas empresas situadas no território catarinense. Os principais
resultados obtidos e as principais inferências a partir deles seguem abaixo.
Em relação à taxa de inovação catarinense, os dados não se mostraram
animadores. As empresas catarinenses eram mais inovadoras no primeiro
triênio contemplado pela PINTEC (1998-2000) do que no triênio mais recente
(2008-2011), além de a análise comparativa ter evidenciado que as empresas
catarinenses se tornaram menos inovadoras do que as brasileiras nos dois
últimos triênios.
No que tange aos dispêndios efetuados pelas empresas catarinenses em
atividades inovativas, os dados possibilitaram constatar que a maior parte delas
investiu na compra de máquinas e equipamentos. Viu-se, ademais, que o
número de empresas que investiram em atividades internas de P&D foi
decrescendo.
Quanto aos recursos humanos, detectou-se que as empresas catarinenses
apresentaram investimentos baixos em profissionais de maior qualificação,
aqueles com pós-graduação, para realizar atividades internas de P&D.
As comparações das empresas de Santa Catarina com as do Brasil dão
suporte para afirmar que a indústria catarinense não representa uma exceção
em termos de inovação no cenário nacional. Pelo contrário, alguns indicadores
aqui apresentados revelam uma desvantagem catarinense.
Afinal, então, o que explica a baixa propensão a inovar das empresas
catarinenses? É pertinente resgatar que os dados da PINTEC tornaram nítido
que a aversão à inovação está associada fundamentalmente às condições de
mercado. Logo, ao que tudo indica, o que acontece, assim como nas empresas
brasileiras, é uma opção racional e puramente mercadológica para as
empresas catarinenses não inovarem. Portanto, inovação aparenta ficar
unicamente no discurso. Obviamente não se pode desconsiderar que existem

169
várias empresas inovadoras atuando em Santa Catarina. No entanto, elas
coexistem simultaneamente com uma imensa maioria de não inovadoras.
As considerações e inferências feitas acima desmistificam o caráter
supostamente inovador das empresas localizadas em solo catarinense. Assim,
a hipótese de que se partiu na realização da pesquisa não se confirmou como
verdadeira. Os resultados aqui obtidos negam a situação privilegiada das
empresas dentro do cenário nacional e colocam em xeque a, até então,
inegável importância da inovação para a competitividade empresarial
catarinense. Neste sentido, sugere-se que a Política Catarinense de Ciência,
Tecnologia e Inovação seja reorientada, tirando foco da inovação empresarial e
voltando mais atenção às necessidades sociais e ao desenvolvimento regional.

Referências

FAGERBERG, Jan. Innovation: a guide to the literature. In: FAGERBERG, Jan;


MOWERY, David; NELSON, Richard. The Oxford handbook of innovation. Oxford:
Oxford University Press, 2005. p. 1-26.

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de inovação 2000. Rio


de Janeiro: IBGE, 2002.

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de inovação 2003. Rio


de Janeiro: IBGE, 2005.

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de inovação 2005. Rio


de Janeiro: IBGE, 2007.

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de inovação 2008. Rio


de Janeiro: IBGE, 2010.

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de inovação 2011. Rio


de Janeiro: IBGE, 2013.

170
AS DETERMINAÇÕES E DESAFIOS DA PESQUISA: REGISTRO DAS IES
DA REGIÃO DO VALE MÉDIO IGUAÇU E O DESENVOLVIMENTO
REGIONAL

GUMBOWSKY, ARGOS1
SIQUEIRA, EDITE2

RESUMO

O estudo teve como objetivo geral analisar, junto ao instrumento de planeja-


mento das instituições de educação superior (PDI) da região do Vale Médio Igu-
açu, a concepção da pesquisa, visando o crescimento institucional e o desenvol-
vimento regional. A pesquisa caracteriza-se como exploratória (levantamento bi-
bliográfico e pesquisa documental) e de campo. Desenvolveu-se nos municípios
de União da Vitória (PR) e Porto União (SC). Constatou-se que não existe uma
política institucionalizada. Somente a UnC possui grupos de pesquisa registra-
dos no CNPq. Verificou-se que a prática da transferência de tecnologia não
ocorre na região pelas IES pesquisadas.

Palavras-chave: Desenvolvimento Regional. Pesquisa. Plano de Desenvolvi-


mento Institucional (PDI). Educação Superior

6.INTRODUÇÃO

As mudanças que marcaram o Século XX promoveram desafios significa- tivos


em relação à formação humana e universitária. Entre elas, destaca-se a
pesquisa. Aos poucos, vai-se apagando aquela noção herdada de pesquisa e de
ciência, com procedimentos experimentais, realizadas em laboratórios, e vê-se
emergir o conceito de pesquisa como modo de transformar a realidade de forma
crítica e consciente, interagindo, criando condições, buscando soluções para os
mais diversos problemas da sociedade, e, principalmente, inovando. A prática
da pesquisa articulada ao ensino e à extensão possibilita a formação de profis-
sionais capazes de atuar científica e tecnicamente nos diferentes contextos da
sociedade contemporânea, teorizando e produzindo conhecimentos sobre essa

1 Doutor em Educação, docente do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da


Universidade do Contestado (UnC). g.argos@brturbo.com.br
2 Graduada em Pedagogia – Habilitação em Orientação Educacional e Especialista em Psico-

pegadogia pela FAFIUV. Especialista em Metodologia da Ação Docente, pela UNIUV-União da


Vitória. Mestre em Desenvolvimento Regional, pela UnC. edisiq@yahoo.com.br
171
prática.
O Relatório da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e
Cultura (Unesco) sobre Ciência, documento publicado a cada cinco anos, de-
dica um capítulo especial ao Brasil, em que elogia o crescimento do número de
publicações, que dobrou em cinco anos (2005 – 2009), mas ressalva que o país
ainda não aposta como deveria em inovação, em parte porque a iniciativa pri-
vada não investe o suficiente nas universidades (Unesco, 2010). Apesar das di-
ficuldades da realização de pesquisas científicas no Brasil, também cresceu a
quantidade de bolsas de iniciação científica concedidas por instituições de en-
sino superior, públicas e privadas.
Este relato tem como temática central a análise da concepção e dos de- safios
da pesquisa no Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) das Institui- ções
de Ensino Superior (IES) da Região do Vale Médio Iguaçu, como fator pro-
pulsor do crescimento institucional e do desenvolvimento regional.

7.MATERIAIS E MÉTODOS

A pesquisa caracterizou-se como exploratória. Em relação ao método, op- tou-


se pela pesquisa qualitativa. Para o desenvolvimento da pesquisa explorató- ria,
realizou-se levantamento bibliográfico para contextualizar teoricamente o ob-
jeto de estudo.
Também foi realizada uma pesquisa documental, buscando analisar os
documentos institucionais das IES da Região do Médio Iguaçu, com o propósito
de conhecer sua estrutura e desenvolvimento, procurando analisar como essas
instituições abordam a pesquisa e qual sua relação com as empresas locais e
regionais. As informações foram tratadas por meio de uma análise qualitativa,
buscando relatar as diferenças e semelhanças existentes entre as IES, sua me-
todologia, missão, objetivos e a forma com que se posicionam em relação à pes-
quisa e transferência de tecnologia.
A pesquisa desenvolveu-se nos municípios de União da Vitória (PR) e
Porto União (SC), onde estão localizadas as Instituições de Ensino Superior

172
(IES): Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras (FAFI), Centro Univer-
sitário de União da Vitória (UNIUV) e Universidade do Contestado (UnC) – Nú-
cleo Universitário de Porto União
O universo da investigação constitui-se de 37 professores com titulação
de mestrado ou doutorado e 6 gestores de IES. Buscou-se conhecer o posicio-
namento dos empresários e representantes de entidades de classe sobre a in-
serção das IES, situadas na região do Vale Médio Iguaçu, na sociedade regional
através da pesquisa. Foram entrevistados gestores de 7 empresas e 9 represen-
tantes de entidades de classe, totalizando 16 entrevistados. Para a coleta dos
dados optou-se por questionário semiestruturado, constituído por perguntas fe-
chadas, utilizando-se a escala de Likert.

8.ENSINO SUPERIOR NA REGIÃO DO MÉDIO VALE DO IGUAÇU

De acordo com o Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e


Social – Ipardes (2006), a região Vale Médio Iguaçu é composta pelos seguintes
municípios: União da Vitória, Bituruna, General Carneiro, Mallet, Paula Freitas,
Paulo Frontin, Cruz Machado e Porto Vitória, no Paraná, e em Santa Catarina,
pelo município de Porto União.
A economia da região, historicamente, caracterizou-se pela instalação de
indústrias madeireiras, devido à existência de extensas florestas naturais de
Araucárias, atividade que perdura até os dias atuais, sendo possível encontrar
grandes complexos industriais do ramo da madeira, tais como laminação e com-
pensados, serrarias, tacos, casas pré-fabricadas, móveis e papel.
A Região do Vale Médio Iguaçu, de acordo com o último censo do IBGE
(2010), possui uma população de 163.157 pessoas, entre elas, 19,3% são jovens
com idade entre 17 e 24 anos, faixa etária em que a maioria ingressa no ensino
superior. Por meio desta pesquisa verificou-se que mais de 3.000 jovens encon-
tram-se matriculados nas IES da Região, o que corresponde a 9,6% da popula-
ção de jovens. Dessa forma, constata-se que mais de 28.000 jovens (mais de
90%) encontram-se fora dos bancos universitários ou estudando em outras regi-
ões.

173
O desenvolvimento do ensino superior está intimamente ligado ao desen-
volvimento regional, porém, para vincular a relevância do ensino superior para o
desenvolvimento regional, faz-se necessário, inicialmente, a compreensão do
que é desenvolvimento regional e como ele acontece.
De acordo com Boisier (1999), o conceito de desenvolvimento regional tem
suas raízes na economia neoclássica, fundamentada no pós-guerra, inicial-
mente, associado ao crescimento, mensurado pelo PIB, como pode ser obser-
vado na afirmação de Echevérnia, espanhol, considerado o pai da Sociologia
latino-americana do desenvolvimento:
El desarrollo económico es un proceso continuado cuyo mecanismo
esencial consiste en la aplicación reiterada del excedente en nuevas
inversiones, y que tiene, como resultado la expansión asimismo ince-
sante de la unidad productiva de que se trate. Esta unidad puede ser
desde luego una sociedade entera...3(citado por BOISIER, 1999, p.2).

A partir da década de 1970, vários estudiosos apontaram as diferenças


entre desenvolvimento e crescimento, sendo o desenvolvimento caracterizado
pelo aumento ou redução da pobreza, desemprego e desigualdade e o cresci-
mento pela geração de riquezas.
O processo de desenvolvimento regional se produz pela utilização efici- ente
do potencial econômico local, o que é facilitado pelo bom funcionamento das
instituições e por eficientes políticas públicas, que promovam as mudanças
estruturais necessárias para mudar a visão da região, de mero suporte físico dos
objetos, atividades e processos econômicos, para uma agente de transformação
social. A economia de cada região está vinculada ao sistema de relações eco-
nômicas do país, em função de sua especificidade territorial, e de sua identidade
econômica, política, social e cultural (VAZQUEZ-BARQUERO, 2000). Boisier
(1999) traz duas dimensões do desenvolvimento, o humano e o social, ficando
clara a ideia de que não existe desenvolvimento de uma região, se as pessoas
que dela fazem parte não se desenvolverem da mesma maneira. Portanto, para

3
"O desenvolvimento econômico é um processo contínuo, cujo mecanismo é essencial a aplicação repetida
do excedente em novos investimentos, o que também resultou na expansão incessante da unidade de
produção em questão. Esta unidade pode ser, naturalmente, uma Sociedade inteira [...] " (tradução nossa)

174
que uma região desenvolva-se, não basta agregar capital social, na mesma pro-
porção existe a necessidade do capital humano e intelectual.
Nesse sentido, pode-se encontrar na educação um forte argumento de
favorecimento ao desenvolvimento regional, não apenas para a formação de
mão de obra e geração de emprego, mas também na criação de processos que
conduzam à inovação e à busca de alternativas de diversificação de produtos e
processos. Dessa maneira, os sistemas produtivos dinâmicos introduzidos nas
regiões podem criar em seu entorno relações formais e informações entre atores
públicos e privados, com objetivo de gerar e disseminar conhecimento tecnoló-
gico. Partindo desse pressuposto, as Instituições de Ensino Superior figuram
como elemento chave no processo de desenvolvimento das regiões.

8.1 AS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR DA REGIÃO VALE MÉDIO


IGUAÇU

• ldade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras - FAFI

Na década de 1950, União da Vitória estava entre as maiores e mais prós- peras
cidades do Estado; era o mais importante município do sul e do sudoeste do
Paraná, exercendo influência social e cultural sobre toda a região. Nessa con-
juntura, começou a ser pensada a possibilidade de criação de curso superior na
cidade. Em 22 de dezembro de 1956, foi criada a Faculdade Estadual de Filoso-
fia, Ciências e Letras (Fafi), no entanto, a primeira aula inaugural deu-se três
anos depois (28/03/1960), sendo pioneira no ensino superior, fora da capital,
oferecendo ensino público e gratuito. Iniciou suas atividades com os cursos de
História e Pedagogia. Os cursos de Geografia e Letras foram criados em 1967
e, mais tarde, em 2003, foram criados os cursos de Ciências Biológicas e Quí-
mica. Desde 1986, a Fafi promove cursos de pós-graduação lato sensu em suas
áreas de conhecimento.
Com objetivo de avançar na criação de cursos para União da Vitória, além de
aperfeiçoamento de docentes e expansão física da instituição, no ano de
2013, ocorreu a fusão da Fafi com a Universidade Estadual do Paraná (Unespar),

175
criada por meio da Lei Estadual nº17.590, de 12 de junho de 2013, com sede no
município de Paranavaí.

• Fundação Municipal Centro Universitário da Cidade de União da Vitória


(Uniuv)
Em 12 de setembro de 1974, o Parecer nº. 086/74, do Conselho Estadual de
Educação do Paraná (CEE/PR) foi favorável à criação da Fundação Facul-
dade Municipal de Administração e Ciências Econômicas de União da Vitória
(FACE), hoje Uniuv, cujo projeto inicial partiu da iniciativa de lideranças locais,
interessadas em trazer para a região cursos na área do comércio, haja vista que
até então somente havia cursos oferecidos voltados à formação docente. Em 19
de setembro de 1974, o prefeito municipal promulgou a Lei Municipal nº. 974/74,
instituindo a Face, incluindo no texto dessa lei a dotação à Instituição de recursos
financeiros necessários à instalação e funcionamento regular.
Iniciou suas atividades com os cursos de Administração e Ciências Eco-
nômicas, ampliou o seu perfil na área de Ciências Empresariais em 1994, com a
implantação do curso de Ciências Contábeis, diversificando a sua atuação.
Em 2006, pelo Decreto Estadual nº. 7226, de 19 de setembro de 2006, a
Fundação Municipal Faculdade da Cidade de União da Vitória (Face) foi trans-
formada em Fundação Municipal Centro Universitário de União da Vitória
(Uniuv).

• versidade do Contestado (UnC)


A Universidade do Contestado (UnC), teve seu projeto de criação iniciado em
março de 1990, aglutinando cinco Instituições Isoladas de Ensino Superior
(Funploc, Funorte, Feauc, Fearpe e Feplac) com área de abrangência de 52 mu-
nicípios e a maior extensão territorial de Santa Catarina. A implantação ocorreu
a partir de 1992. Constituiu-se como instituição de caráter regional e comunitário,
de fins públicos, filantrópicos e científico-culturais. O reconhecimento da Univer-
sidade do Contestado ocorreu com a aprovação pelo Conselho Estadual de Edu-
cação de Santa Catarina do Parecer no 246 em 21 de outubro de 1997. Pelo

176
Decreto Estadual nº1.106, de 6 de agosto de 2012, a UnC teve a renovação do
credenciamento por meio de avaliação institucional externa. Portanto, a Univer-
sidade do Contestado (UnC) é uma instituição de Educação Superior vinculada
ao Sistema Estadual de Santa Catarina, mantida por uma Fundação de origem
pública e de natureza do direito privado (PDI, UnC, 2010). Desde 2006, a UnC
oferece pós-graduação stricto sensu, em Desenvolvimento Regional.

9.RESULTADOS E DISSCUSSÃO

A pesquisa no Ensino Superior oferecido pelas IES da Região do Vale


Médio Iguaçu está limitada ao tipo da instituição a que o professor está vinculado
(universidade, centro universitário e faculdades integradas). Efetivamente, as
IES, independente de sua configuração acadêmica, precisam ter vocação para
a pesquisa, não basta o desejo de formar pesquisadores, faz-se necessário um
planejamento institucional, baseado em políticas voltadas para esse fim. Na do-
cência, consideram-se os anos de ensino e a formação para a transmissão dos
conhecimentos, a adesão a novas práticas de ensino, as alterações curriculares
adaptadas às novas realidades e as inovações de pesquisas nas áreas, as con-
dições de materiais de trabalho (laboratórios e bibliotecas). Já na pesquisa, a
preparação do pesquisador envolve a coleta de dados, a decisão sobre qual me-
todologia utilizará, os experimentos e verificações, os ensaios e os erros, o que
faz com que, muitas vezes, o pesquisador necessite reiniciar a pesquisa devido
à necessidade de recursos materiais e de pessoal para o progresso da pesquisa
(CHAUÍ, 2001). Todos esses entraves fazem com que, muitas vezes, as IES op-
tem apenas pelo ensino, por não comportarem (física e financeira) tamanho in-
vestimento.
Além da vocação para a pesquisa como fator primordial para o seu de-
senvolvimento, também pode-se citar o fator ‘cultura de pesquisa’, que, como
afirma Franco (1997, p.41) “[...] tem ligação com o nível educacional geral de um
povo, e como foi formada a massa crítica para valorizar e demandar as transpo-
sições da ciência para a vida cotidiana”. Neste sentido, a cultura de pesquisa

177
está relacionada às parcerias e associações possíveis de se realizarem na soci-
edade em que a IES está inserida, como uma troca, em que as organizações
apresentam seus problemas e as IES, por meio dos grupos de pesquisas, bus-
cam soluções. Essas parcerias geram subsídios para novas pesquisas, for-
mando um ciclo.
Constatou-se que a pesquisa existente nas IES da região é pouco expres- siva,
senão inexistente, e está limitada ao tipo da instituição à qual o professor está
vinculado. Isto é, na Uniuv, em que a pesquisa não é obrigatória, essa te-
mática é tratada de forma superficial, embora a proposta apresentada no PDI
seja consistente; na Fafi, que passa por um momento de transição, de Faculdade
Isolada para Universidade, observa-se certa discrepância entre gestores e pro-
fessores e mesmo entre professores, em que gestores acreditam no ótimo de-
senvolvimento da pesquisa, enquanto professores acreditam na necessidade de
estruturação; na UnC, até então única IES que efetivamente necessita do desen-
volvimento da pesquisa, por exigência legal, apresenta um quadro mais avan-
çado, com professores mais satisfeitos com o desenvolvimento da pesquisa que
seus gestores.
Dessa forma, retoma-se uma afirmativa lançada anteriormente, de que as IES
precisam ter vocação para a pesquisa, não basta que os professores finali-
zem seus cursos de pós-graduação, desenvolvam as pesquisas para finalização
de suas dissertações ou teses, se, ao retornarem às suas instituições de origem,
essa prática não se efetive, e seja pouco motivada. Em todas as IES existem
professores com dedicação exclusiva, os quais, teoricamente, deveriam dedicar
percentual de seu tempo à sala de aula e outra para o desenvolvimento de pes-
quisas. Verificou-se que, muitas vezes, esse tempo é utilizado com atividades
administrativas, além da docência.
Quanto à qualidade do desenvolvimento da pesquisa na IES a maioria
acredita ser regular, porém, apareceram respostas como excelente e péssima,
o que leva a crer que, se existente, o desenvolvimento e os resultados das pes-
quisas não estão sendo bem divulgados em seu meio. A pouca comunicação
interna foi sentida em todas as IES da Região. Pode-se citar como exemplo a

178
questão levantada sobre a existência de intercâmbios e convênios para pesquisa
(transferência de tecnologia) com instituições nacionais/internacionais. A res-
posta esperada seria sim, para a existência e não, para a não existência, porém
as respostas foram variadas dentro da mesma IES.
Pode-se afirmar que não existe uma política institucionalizada no que diz
respeito ao desenvolvimento da pesquisa e, dessa forma, observa-se preocupa-
ção em relação à qualidade e à continuidade das pesquisas desenvolvidas.
Quanto a articulação entre ensino, pesquisa e extensão, as respostas mais en-
contradas foram ‘frequentemente’ e ‘poucas vezes’, o que denota que o princípio
da indissociabilidade na tríade (ensino, pesquisa e extensão) não tem ocorrido
de forma articulada. Isso compromete a formação acadêmica completa, efeti-
vando conhecimentos de forma prática e interagindo com a sociedade.
Constatou-se que a pesquisa desenvolve-se na modalidade de iniciação
científica na Região do Vale Médio Iguaçu, com exceção daquelas realizadas no
programa de pós-graduação stricto sensu da UnC, cujo locus está sediado no
município de Canoinhas, pouco impactando na sua extensão no Núcleo Univer-
sitário de Porto União.
No que se refere ao incentivo e motivação das IES, por meio de bolsas de
fomento à pesquisa, notou-se a falta de comunicação nas IES, principalmente
na Uniuv, que não apresenta uma política consolidada. Na Fafi, as bolsas de
pesquisa são oferecidas por meio de concessão de tempo integral e dedicação
exclusiva (TIDE), em que o professor precisa aprovar projeto para ser benefici-
ado e também com bolsas de iniciação científica para discentes vinculados a
projetos de pesquisa docente ou próprios. A UnC é beneficiada pelo governo do
estado de Santa Catarina que concede bolsas de estudo e de pesquisa para
alunos economicamente carentes.
Observa-se que, em termos gerais, as IES costumam investir na qualifica-
ção dos docentes, algumas com mais frequência, como a Uniuv e a UnC; já na
Fafi, pelo relato, tanto dos gestores quanto dos professores, esse investimento
é menos acentuado, porém, é preciso considerar que na Fafi o ingresso na car-
reira docente é condicionado à titulação de mestre ou doutor, dessa forma os

179
incentivos para a qualificação são menos expressivos.
Foi constatada falta de incentivo para a formação de grupos de pesquisa.
Observou-se que a maioria dos entrevistados participa de grupos em outras IES.
Somente a UnC possui grupos registrados no CNPq.
Quanto ao posicionamento dos empresários e representantes de entida-
des de classe sobre a inserção das IES na sociedade regional por meio da pes-
quisa, os mesmos mostraram-se mais satisfeitos que os representantes das en-
tidades de classe, embora as IES não participem efetivamente na resolução de
problemas nas empresas. Elas preparam profissionais para o mercado de traba-
lho, qualificam mão de obra, que nem sempre é absorvida ou valorizada por esse
mercado.
Tanto empresários quanto representantes de entidades de classe esperam
maior participação das IES, que estas encontrem soluções para os seus proble-
mas, embora tenham relatado que poucas vezes procuraram as IES propondo
parcerias.
Verificou-se que os entrevistados acreditam que as IES da região contri-
buem de forma positiva ao crescimento social e cultural dos indivíduos e também
para o desenvolvimento da sustentabilidade ambiental, atendendo a uma neces-
sidade mundial.
Quando questionados sobre a importância das IES para o desenvolvi-
mento regional, acreditam que sim, elas colaboram, porém, poderia existir um
melhor relacionamento entre as IES, empresas e entidades de classe, pois acre-
dita-se que a cooperação entre esses segmentos pode ser importante para o
desenvolvimento da região, possibilitando um estreitamento com a sociedade.
Pode, ainda, fazer com que as IES captem as necessidades reais, e possibilitem
que seus professores e alunos compreendam a dimensão do compromisso com
o desenvolvimento do país.

180
10. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora os gestores parecessem mais otimistas, os docentes foram bem


realistas quando das afirmações relativas à falta de motivação, incentivo e su-
porte para a pesquisa e formação de grupos. Também foi constatada falha na
comunicação interna das IES, pois, em muitos momentos, mostraram um dis-
curso desconexo entre gestores e docentes. Por meio desta investigação, verifi-
cou-se que a pesquisa nas IES da região do Vale Médio Iguaçu é incipiente,
quando não inexistente. Embora figure de forma estruturada nos PDIs das IES,
essa prática está longe de ser a ideal, e de atender aos anseios dos docentes e
às necessidades das empresas, no que se refere à transferência de tecnologia.
Constatou-se que existe uma necessidade latente de aproximar as IES e o setor
produtivo, criando pontes, buscando benefícios mútuos, em que as IES se forta-
leçam, obtendo mais reconhecimento, legitimidade, confiança e recursos para
desenvolvimento de pesquisas, além de atraírem mais talentos e competência.
No contexto do desenvolvimento regional, as IES devem figurar como ge-
radoras de novos conhecimentos, por meio de pesquisas. Nas regiões onde elas
são mais atuantes, são consideradas peças-chave para o desenvolvimento, in-
clusive em se tratando de mobilidade social. Dessa forma, é inegável o fato de
que nas regiões onde existem Instituições de Ensino Superior instaladas e atu-
antes, o desenvolvimento torna-se evidente e inevitável, assim como a geração
de capital social/intelectual e a capacidade de associar-se e de organizar-se.
Assim, conclui-se que existe a necessidade urgente de que as IES da Re- gião
do Vale Médio Iguaçu busquem seu lugar, de fato, como gestoras, gerado- ras
e disseminadoras do conhecimento sistematizado e aplicável; que encontrem
meios de cooperação entre elas e a sociedade que as cerca, efetivando suas
práticas com base nos preceitos da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão, consolidando-se, e, a partir de seu crescimento e amadurecimento,
proporcionarem, de fato, o desenvolvimento da região.

181
5 REFERÊNCIAS

CHAUÍ, M. S. Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas. 9.ed. São


Paulo: Cortez, 2001

DEMO, P. Pesquisa: princípio científico e educativo. 5.ed. São Paulo: Cortez, 1997.

FACULDADE ESTADUAL DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS - FAFI. Plano de


Desenvolvimento Institucional (PDI). União da Vitória, PR: Uniuv, 2012.

FRANCO, M.E.D. (org.) Universidade, pesquisa e inovação: o Rio grande do Sul


em perspectiva. Porto Alegre: Ediopucrs, 1997.

FUNDAÇÃO MUNICIPAL CENTRO UNIVERSITARIO DA CIDADE DE UNIÇÃO DA


VITÓRIA – Uniuv. Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI). União da Vitória,
PR: Uniuv, 2012.

LONGHI, S.M. Nova geografia de investigação. In: FRANCO, M.E.D.P.; LONGHI,


S.M.; RAMOS, M.G. (orgs). Universidade e pesquisa: espaços de produção do co-
nhecimento. Pelotas,RS: UFPEL, 2009.

MARCONI, M.A.; LAKATOS, E.M. Técnicas de pesquisa. 5.ed. São Paulo: Atlas,
2002.

MARTINS, Gilberto de Andrade; THEÓPHILO, Carlos Renato. Metodologia da inves-


tigação científica para ciências sociais aplicadas. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2009.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria de Educação Superior. Plano de Desenvol-
vimento Institucional – PDI: diretrizes para elaboração. 2004. Disponível em:
<http://www.cpd.ufv.br/cpa/doc/pdi_sapiens.pdf> Acesso em 16 nov. 2011

SAMPIERI, R. H.; COLLADO, C. F.; LUCIO, P. B. Metodologia de pesquisa. 3.ed.


São Paulo: McGraw Hill, 2006.

UNESCO. Relatório UNESCO sobre ciência 2010: o atual status da ciência em torno
do mundo. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/ima-
ges/0018/001898/189883por.pdf> Acesso em: 28 out. 2011.

UNIVERSIDADE DO CONTESTADO - UnC. Plano de Desenvolvimento Institucio-


nal (PDI). Canoinhas,SC: UnC, 2011.

182

Você também pode gostar