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CANTOS PRÉ-NATAL: ALQUIMIA SONORA PARA GESTANTES

Janaina Trasel Martins1

Resumo: Este estudo trata sobre o canto pré-natal: os benefícios da música e do canto durante a
gestação; a audição do feto no ventre e a escuta da gestante do seu corpo. Será relatada a
experiência prática das aulas de canto pré-natal realizadas no projeto “Cantos de Gaia: alquimias
sonoras”, vinculado ao Grupo de Pesquisa “Poéticas da Voz e do Corpo na Arte”, da Universidade
Federal de Santa Catarina. Os objetivos das aulas de canto pré-natal são: ampliar a consciência da
sabedoria corporal da mulher, permitir que seu corpo cante e que seja cantado, promover a
expressão dos sentimentos da gestante, enviar vibrações sonoras afetivas para o bebê no ventre,
proporcionar um espaço de partilha entre gestantes, trabalhar o empoderamento do corpo feminino
para o parto e para o pós-parto. Em um círculo de mulheres gestantes e cantantes realizamos
alquimias sonoras convidando o corpo feminino a vibrar harmonias.

Palavras-chave: Canto pré-natal. Consciência. Gestação. Maternidade. Feminismo.

Os encontros de canto pré-natal fazem parte das atividades de extensão do projeto “Cantos
de Gaia: alquimias sonoras2”, vinculado ao Grupo de Pesquisa Poéticas da Voz, da Universidade
Federal de Santa Catarina. O projeto “Cantos de Gaia” realiza desde 2015 atividades voltadas para
as mulheres, cujas ações entrelaçam corpo, saúde, música e arte. Dentre as atividades, desde 2016
são realizados encontros de canto pré-natal periodicamente. Em geral a cada encontro há a presença
de um grupo de mulheres com variadas idades gestacionais, entre 8 a 37 semanas de gestação. Nas
práticas de canto pré-natal trabalhamos com músicas para o corpo feminino e para o bebê no ventre.
Nessa comunicação darei o foco sobre o ato de cantar como uma forma de trabalhar o
empoderamento da mulher, especificamente a consciência da gestante sobre o seu corpo, e a
comunicação afetiva entre gestante e o bebê no ventre.
Considerando que a corporeidade feminina se constitui de entrelaces entre as dimensões
biológica e a cultural, individual e social, abre-se a pergunta: como ocorrem esses entrelaces na
contemporaneidade em relação aos modos de gestar, parir e maternar? Há atualmente movimentos
femininos em relação ao parto ativo e à maternidade consciente que tem como objetivo despertar a
consciência da mulher sobre o seu próprio corpo, a fim de empodera-la durante a gestação e durante
o trabalho de parto. Ocorre que muitas mulheres reclamam que no trabalho de parto em hospitais
sofrem intervenções desnecessárias que não respeitam o tempo do bebê nascer, como a cesariana
agendada ou desnecessária, sofrem tratamentos repressores como a proibição de soltar a voz durante

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Professora do Curso de Artes Cênicas da UFSC, Florianópolis, Brasil.
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www.cantosdegaia.com

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o trabalho de parto, a proibição de se movimentar livremente durante o trabalho de parto, a
obrigação de ficar em uma posição durante o trabalho de parto, sofrem por não terem sido
informadas sobre um procedimento a ser realizado no seu corpo, sofrem por serem tratadas de
acordo com um protocolo de rotinas médicas sem respeitar as reais necessidades do seu corpo,
sofrem agressão verbal, sofrem pela retirada do bebê do seu colo ao nascer, ao invés de colocar e
deixar o bebê recém-nascido imediatamente em contato com o ventre da mãe (caso seja um parto
com bom apgar, que o bebê esteja bem), entre outras situações denominadas de ‘violência
obstétrica’. Tais intervenções médicas, quando necessárias são imprescindíveis, o problema é
quando são desnecessárias e são feitas por rotina e sem a comunicação atenciosa e respeitosa a
individualidade de cada mulher.
O psicoterapeuta David Boadella, no livro “Correntes da Vida” alerta sobre a importância
dos modos de nascer, considerando que o nascimento pode determinar algumas das mais profundas
características da personalidade do ser que está chegando na Terra. De forma que o nascimento
deve ser realizado em um ambiente envolto de amorosidade e respeito ao corpo feminino e ao corpo
do bebê. “Se o parto irá ou não se tornar um trauma, vai depender muito das condições do momento
e da atitude dos participantes (BOADELLA, 1992, p.43).
Com esses fatos, como as mulheres constroem seu corpo a partir das condições
socialmente dadas, em relação à gestação, parto, puerpério e maternidade? o quanto as forças
exteriores do que a sociedade espera das mulheres moldam as suas forças interiores? Que recepções
estão sendo dadas aos bebês que estão chegando ao mundo? Será que se mudarmos os modos
‘violentos’ de nascer teremos uma sociedade mais pacífica?
Essas perguntas abrem esse artigo para levantar reflexões, mas não é nosso objetivo
responde-las aqui, e sim instigar a reflexão sobre questões que envolvem o empoderamento da
mulher a respeito do seu próprio corpo na gestação. Ocorre que a cultura muita vezes pode provocar
o esmagamento da natureza instintiva da mulher e consequentemente a desconexão com os ciclos
corporais naturais. E é essa conexão com a natureza, com a sabedoria corporal e a intuição materna
que buscamos resgatar nas mulheres. Assim, os encontros de canto pré-natal tem entre seus
objetivos trabalhar a consciência corporal da gestante e empodera-la nesse momento tão especial
que é o de gestar um ser, e propiciar através do ato de cantar um espaço de conexão com o corpo,
de comunicação afetiva com o bebê no ventre.
Clarissa Pinkola, no livro “Mulheres que correm com os lobos” inspirada na psicologia
arquetípica de Jung, propõe a imagem da “mulher selvagem” a fim de convidar a mulher à conexão

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com a sua natureza instintiva, que vai além das domesticações e das repressões das culturas. De
acordo com Pinkola (1999), o termo ‘selvagem’ utilizado por ela não é no sentido de algo fora de
controle, mas no sentido de viver uma conectada com os próprios ciclos da natureza. Ela denomina
'mulher selvagem' porque sente que essas palavras abrem uma porta da psique profunda da mulher,
independente da cultura: "quando as mulheres ouvem essas palavras, uma lembrança muito antiga é
acionada, voltando a ter vida. Trata-se da lembrança do feminino selvagem, que pode ter sido
soterrado pelo excesso de domesticação, proscrito pela cultura que nos cerca ou simplesmente não
ser mais compreendido” (PINKOLA, 1999, p.9). Constata Clarissa Pinkola que essa dimensão da
‘mulher selvagem’ é ativada em muitos momentos na vida cíclica feminina e cita alguns desses
momentos como na gravidez, no parto e na amamentação. A ativista na área do parto humanizado,
Janet Balaskas, fala também no seu livro “Parto Ativo” sobre essa natureza instintiva feminina “é
fundamental que o parto seja compreendido, primeiramente, como um processo fisiológico
instintivo, que é essencialmente mamífero” (BALASKAS, 2015, p.21). Ela convoca as mulheres a
uma revolução feminina em que as mulheres recuperem e reassumam o poder do parto: “a verdade é
que o seu corpo sabe parir, e seu bebê sabe nascer. Nós mulheres, compartilhamos este
conhecimento instintivo com outras espécies de mamíferos, e tem sido assim ao longo de milhares
de anos de história e evolução” (BALASKAS, 2015, p. 26). Ela orienta as mulheres a assumirem o
comando da sua experiência de parto com profissionais que tenham sensibilidade, e convoca as
gestantes a confiar no seu corpo e nos seus instintos. Trata-se de na gestação se preparar para estar
em contato com os instintos primitivos do corpo, confiando na sabedoria do processo fisiológico de
gestar e parir.
O empoderamento da mulher é um dos objetivos que são trabalhados nas práticas vocais
com as gestantes no projeto “Cantos de Gaia”, em que propomos transformações sociais a partir do
despertar da consciência corporal da mulher. Trata-se de por meio do ato de cantar dar suporte à
gestante com relação às transformações que surgem no corpo físico, emocional, mental, ancorando
a força interna da mulher.

Empoderamento feminino através do canto

As práticas de canto pré-natal do projeto “Cantos de Gaia” envolvem exercícios vocais para
a mulher se conectar com o corpo, ampliando a percepção sobre si e sobre o bebê no ventre.
Durante a gestação o corpo feminino passa por muitos processos de mudanças físicas e emocionais.

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Os encontros de canto pré-natal são um momento para a gestante mergulhar em si mesma e se
conectar com os novos ritmos do corpo, trabalhando através da voz os sentimentos e sensações
relacionados à gestação.
Nos encontros de canto pré-natal, cantamos músicas com letras relacionadas aos ciclos da
vida da mulher e aos ciclos da natureza e também realizamos improvisações vocais para que a
mulher se conecte com a força feminina do poder de criação. Cantamos canções pequenas e
repetimos-las várias vezes, mergulhando em uma jornada interior de envio consciente de vibrações
amorosas para o bebê no ventre. O ato de cantar transforma-se, então, em uma chave para a escuta
da força vibracional da voz materna nos corpos, o da própria mulher e o do bebê no ventre. Nesse
estado de presença, em que todo o ser da mulher está voltado para a comunicação afetiva com o
bebê, eis que a intuição aflora e aumenta percepção da sabedoria própria do corpo, da observação da
natureza da vida. A intuição é um poder da consciência, de uma consciência do corpo que vai além
de imposições culturais. Conectar-se com a intuição materna é um empoderamento feminino, em
que nos abrimos para a escuta da voz interior.
O ato de cantar focada na irradiação de vibrações positivas para o bebê no ventre convida o
corpo a conectar-se na sua totalidade afetiva, cognitiva, intuitiva e promove um nivel de consciência
que silencia a mente discursiva e controladora que quer entender e se preparar para o trabalho de
parto. É no ato de entrega de todo o ser ao momento do canto que abrem-se as escutas sobre a vida
que está sendo gerada no corpo feminino. Esse ato de estar presente que a concentração no canto
promove já vai trabalhando a mulher para a escuta do seu corpo no momento do parto, permitindo
que a sabedoria da natureza do corpo feminino entre em ação. Pois conforme Janet Balaskas
observa nas suas experiências com o trabalho de parto:
De uma certa maneira você precisa perder o controle, acreditar e se render ao processo
inerente que acontece no seu interior, sem se dar conta, e que vai culminar com o parto.
Precisa desligar sua mente, deixar de lado tudo aquilo que sabe e simplesmente deixar
acontecer. É um momento de se voltar para dentro de sim mesma, de abandonar-se ao
desconhecido, não pensar no que está para acontecer, viver apenas o momento e deixar os
ritmos involuntários do seu corpo tomar o controle (BALASKAS, 2015, p. 194).

Vocalizar na hora do parto pode inclusive diminuir as dores, conforme constata Balaskas:
“quando as contrações se tornarem muito fortes emita sons como gemer, grunhir, sibilar, cantar.
Não tente coibir essa necessidade que é perfeitamente natural e pode até ajudar a diminuir as dores”
(BALASKAS, 2015, p. 204). Ela observa que:
Quando a mulher tem liberdade para se expressar livremente, uma expiração enorme abre o
caminho do nascimento: o diafragma se eleva; o músculo psoas e a pélvis institivamente se

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inclinam para a frente; o assoalho pélvico se eleva e fica mais plano, enquanto o caminho
do nascimento se abre para liberar o bebê (BALASKAS, 2015, p. 95).

De modo que as práticas de vocalização envolvem uma preparação do corpo da gestante


para o parto, tanto física quanto emocionalmente e também é uma forma de enviar vibrações de
amor para o bebê no ventre e no nascimento.

Comunicação afetiva durante o ato de cantar

Nos encontros de canto pré-natal o objetivo vai além do ato de cantar afinada com técnica
vocal, mas envolve afinar-se a si e ao bebê no ventre, afinar a escuta do corpo, afinar os sentimentos
que se envia para o bebê.
E o bebê no ventre, o que escuta? O médico otorrinolaringologista francês Alfred Tomatis
realizou o estudo da audição fetal no plano de sua gênese e da evolução estrutural. Seus estudos
anatomo-fisiológicos indicam que a partir do quarto mês e meio de vida intrauterina o feto é capaz
de reagir aos sons que lhe são dirigidos. Nessa idade o ouvido está normalmente constituído. “A
partir do quarto mês e meio de vida intrauterina o pavilhão auditivo do feto parece pronto a receber,
amplificar e modelar as mensagens sonoras que todo o ambiente ruidoso e vivo dirige ao feto”
(TOMATIS, 1987, p.98). Focarei aqui na importância da voz da mãe para o bebê no ventre.
Sobre “a vida sônica do feto mergulhado no seu banho uterino”, Alfred Tomatis constata
que o feto “ouve a vida através da voz da mãe” e que “durante a vida intrauterina, o próprio embrião
já começa a captar e armazenar informações” (TOMATIS, 1987, p. 13). Ele ressalta sobre a
“comunicação sônica existente entre a mãe e o feto” e sobre o “modo de comunicação que se
estabelece entre a mãe e o ser que traz dentro de si. Desta intimidade nascerão tanto a mãe como a
criança” (TOMATIS, 1987, p.60;61). Aponta que “é evidente que a carga afetiva que passa da mãe
para a criança que nela habita brota de todos os lados, sendo seguramente a voz materna o vetor
principal” (TOMATIS, 1987, p.61). Constata que:

“O amor materno manifesta-se de diversas maneiras, e muito especialmente, através da voz


da mãe que a criança distingue na sua modulação primeira. E não se cansará de exercitar o
seu aparelho auditivo, a sua flauta coclear para atingir essa zona de frequências privilegiada
onde se revela o barulho da vida” (TOMATIS, 1987, p.155).

Ressaltando essa força vibratória da voz materna na comunicação afetiva com o bebê no
ventre, Tomatis orienta a gestante para o desenvolvimento dessa consciência criativa:

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“É por demais evidente que esta transmissão de vida através da voz materna só se pode
realizar na medida em que a mãe, investida da sua maternidade, impregnada dessa
plenitude, consciente do seu compromisso, puder manifestar a sua alegria de viver, o seu
bem-estar. [...] Por isso, a preparação da mãe grávida tem uma importância considerável
para ela vir a ser o que deve ser, doadora de vida e de amor. A sua voz será então o suporte
material dessa mensagem essencial que ela dirigirá à criança durante toda a gravidez”
(TOMATIS, 1987, p.158).

Tomatis constata que a voz maternal vibra no feto para além do conteúdo semântico e
verbal, é “núcleo vibratório de amor”, afetos que se manifestam no timbre, na cadência, no ritmo,
ativando uma “ligação energética que o amor parece desencadear por intermédio da voz materna”
(TOMATIS, 1987, p.160), cujas influências sonoras são impressas no feto:

“A voz materna constitui, indubitavelmente, a <massa sonora> sobre a qual se vai moldar a
linguagem. A mãe exprime o seu vivido, os seus sentimentos e, em particular, o seu amor
materno através de um material acústico bem específico percebido de uma forma singular
pelo feto” (TOMATIS, 1987, p.157).

Tais sonoridades escutadas pelo bebê no ventre influenciarão a aquisição da linguagem


falada, como constata: “existe realmente um entrar em ressonância de uma aptidão inata que
começa a vibrar aos acentos da mãe que fala ao feto. É sobre este impulso primeiro que a posterior
estrutura verbalizante do filho do homem em gestação encontra as primeiras modulações”
(TOMATIS, 1987, p.151).
Com todos esses pressupostos, podemos observar os benefícios das aulas de canto pré-
natal para as gestantes, para que a mulher foque a atenção na presença do bebê dentro do corpo e
tome consciência da comunicação afetiva, pensamentos e sentimentos, que irradia para o bebê.
O bebê no ventre se relaciona com o estado emocional da mãe. As emoções estão ligadas
com a atividade hormonal, e ter momentos de relaxamento, de amor, de prazer, faz liberar
hormônios como ocitocina, que são hormônios que são liberados no parto. Conforme observa Janet
Balaskas, durante a gestação e o parto, o corpo produz hormônios como as endorfinas (analgésicos
naturais que relaxam e aliviam as dores) e a ocitocina (que desencadeia as ondas uterinas, as
contrações e o processo de parto) – ambos hormônios ligados à emoção (BALASKAS, 2015,
p.196). E conforme constata Balaskas: “emitir sons ajuda a produzir hormônios semelhantes às
endorfinas que agem como analgésicos internos naturais e ajudam na alteração do nível de
consciência” (BALASKAS, 2015, p. 204). Dessa forma, a partir de uma perspectiva hormonal,
cantar durante a gestação pode aumentar a secreção de endorfinas e dos ‘hormônios do amor’ que
ajudarão a mulher a se conectar com o bebê na gestação e a abaixar os níveis de hormônios de
estresse na vida cotidiana. Assim, os encontros de canto pré-natal são um momento de cuidar de si,

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um ritual de conexão consigo mesma, com o seu corpo, com o seu ventre, com o seu filho - um
momento de relaxamento, de ampliação da percepção e sensibilidade corpórea, em profundidade,
deixando de lado as correrias da vida diária e ampliando a consciência da presença do bebê dentro
do corpo.

Princípios das alquimias sonoras

A seguir relatarei brevemente alguns dos princípios que são trabalhados nas práticas vocais
com as gestantes:
Cantar com Intenção – A voz toca o corpo, afeta em afetos. A voz carrega as frequências
vibratórias que irão compor as palavras com sentimentos. A qualidade do som produzida pela
gestante toca o bebê no ventre. Cantar com intenção significa trabalhar a consciência criativa do
potencial afetivo da voz materna, compondo frequências vibracionais para o ambiente intrauterino,
aliada a uma escuta atenta da interatividade desses sons com o bebê no ventre. Jonathan Goldman
(2008) considera o som como uma onda que carrega as frequências vibratórias das intenções. As
intenções envolvem a qualidade vibratória dos pensamentos, visualizações, sentimentos. Quando
emitimos uma sonoridade com intenção a força criativa da ação sonora é mais potente.
Respiração – A respiração é uma chave para conectar a parturiente no momento do parto
Janet Balaskas constata sobre a importância da respiração no trabalho de parto:
Concentrar-se na respiração inativa a mente, interrompe o diálogo interno que normalmente
ocupa o nosso pensamento, e aproxima você de você mesma e do seu bebê. Cada trabalho
de parto tem seu próprio ritmo. A concentração nos ritmos da sua respiração vai permitir
que você entre em ressonância com este ritmo, instintivamente, e que se renda às forças
vitais que atuam dentro de seu corpo (BALASKAS, 2015, p. 174).

As práticas de respiração são associadas ao trabalho com a vocalização, convidando a


gestação a se conectar com a sabedoria do corpo.
Ressonância Vocal – As práticas de ressonância da voz no corpo convida a gestante para
despertar a consciência sobre o potencial do fluxo sonoro de percorrer o corpo. A ressonância da
voz ocorre quando as frequências vibratórias, transformadas em som pelas pregas vocais, ao fluírem
seus harmônicos pelo corpo, encontram compatibilidade em determinada região. Essas práticas são
importantes, pois ocorre que durante o trabalho de parto, muitas gestantes sentem vontade de gritar
nos momentos de contrações uterinas e com esse treino de vocalizar sentindo o som se expandir
para o corpo todo, nos momentos das ondas uterinas, a parturiente pode vocalizar sem gerar
esforços musculares inadequados tais como o aprisionamento da voz na garganta, mas deixando os

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harmônicos sonoros se expandirem e massagear o corpo todo. Nas práticas de ressonância vocal, o
trabalho com as vogais são também realizados junto a movimentos pélvicos, com o intuito de
convidar a mulher a tomar a consciência deste local do corpo que será ativado no momento do
parto. Leboyer observou no trabalho vocal com as gestantes que:
A mulher que em seus exercícios preparatórios pratica cantar e falar as vogais o mais
perfeitamente possível, irá trabalhar intensamente com os lábios e com a boca, o que
também - misteriosamente, mas, sem dúvida - tem um efeito definitivo sobre o colo do
útero, que se alarga de forma supremamente harmônica e suave sob a influência dos
exercícios, no mínimo fazendo as contrações serem menos doloridas (LEBOYER, 2009, p.
85) (tradução nossa).3

Massagem sonora – Essa prática de massagem sonora é baseada nos estudos das terapias
sonoras (healing sounds). Ted Andrews (1996) relembra que os sábios antigos ensinavam que o
ritmo, a melodia e a harmonia têm o poder de provocar mudanças no organismo. Complementa este
autor que a voz é uma linguagem vibratória capaz de movimentar processos em nossas células, bem
como nos levar á estados de consciência ampliados. O médico norte-americano Mitchel Gaynor diz
que:
As ondas sonoras podem sincronizar o organismo humano - fazendo com que vibremos em
ressonância com estas ondas - por meio de uma variedade de maneiras que estão
interligadas. Em determinado nível, o assim chamado encadeamento sônico pode alterar o
nosso estado de energia, produzindo mudanças fisiológicas que, muitas vezes são bastante
sutis. Num outro nível, o encadeamento sônico pode influenciar-nos emocionalmente, o
que, por sua vez, pode nos afetar num nível celular (GAYNOR, 1999, p. 61).

Ao vocalizar durante a gestação e durante o parto, com consciência das ressonâncias da voz
no corpo, a mulher promove uma massagem sonora em seu próprio corpo e no corpo do bebê no
ventre. Para as massagens sonoras utilizamos também, além da voz, instrumentos musicais tais
quais: harpa, kântele, kalimba, tambores xamânicos, chocalhos, carrilhões. As musicalidades
criadas têm como intuito dar um banho de vibrações sonoras na gestante a fim de promover
harmonias internas.

Considerações finais
Entre os benefícios do canto na gestação destacam-se:

3
No original: “The woman who practices singing and speaking the vowels as perfectly as possible in her preparatory
exercises will be led to work very intensively with her lips and mouth, which also – mysteriously but unquestionably -
has a definitive effect on the cervix, which widens in a supremely harmonic and smooth manner under the influence of
the exercises, at the very least making the contractions less painful” (LEBOYER, 2009, p. 85).

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 Cantar para o bebê no ventre amplia a percepção da mulher sobre o seu corpo, ativa a
consciência corporal dos ritmos do corpo na gestação, aprimorando a escuta aos movimentos da
vida dentro do corpo; ampliando a percepção sobre si e sobre o bebê no ventre;
 Cantar desperta processos internos: através dos sons as gestantes são convidadas a uma escuta
ativa da constante interação entre as sonoridades e as percepções corpóreas;
 Cantar trabalha a expressão e a harmonização dos sentimentos da gestante, dando suporte às
transformações que surgem no corpo físico, emocional, mental, ancorando a força interna da
mulher.
 Cantar faz a mulher se conectar com o instante presente; um momento de pausar as correrias da
vida e se conectar com o bebê enviando conscientemente vibrações positivas para ele;
 Cantar faz liberar os hormônios ocitocina e endorfina, trazendo boas sensações para o bebê no
ventre;
 A voz materna tem uma qualidade amorosa que toca o bebê no ventre com vibrações afetivas; as
sonoridades escutadas pelo bebê no ventre influenciarão a aquisição da linguagem falada;
 Cantar desperta o empoderamento da mulher, ao tomar consciência do seu corpo, ao soltar a voz
e expressar e harmonizar os sentimentos advindos da gestação.

Referências

ANDREWS, Ted. Sons sagrados. São Paulo: Mandarim, 1996.


BOADELLA, David. Correntes da Vida: uma introdução à biossíntese. 2ed. São Paulo: Summus
Editorial,
BALASKAS, Janet. Parto Ativo: guia prático para o parto natural. 3ed. São Paulo: Ground, 2015.
GAYNOR, Mitchell. Sons que curam. São Paulo: Cultrix, 1999.
GOLDMAN, Jonathan. The 7 secrets of sound healing. USA: Hay house, 2008.
LEBOYER, Frédérick. The art of giving birth, with chanting, breathing and movement. USA:
Healing Arts Press, 2009.
PINKOLA, Clarissa. Mulheres que correm com os lobos: mitos e histórias do arquétipo da mulher
selvagem. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.
TOMATIS, Alfred. A noite uterina. Lisboa, Instituto Piaget, 1987.

Prenatal Singing: pregnant sound alchemy

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Abstract: This study will focus on prenatal singing: on the benefits of music and singing during
pregnancy; on the baby's hearing in the womb and on the listening of the pregnant woman to her
body. Will be related the practical experience with the prenatal singing classes, that are part of the
of the project "Gaia Chants: sound alchemy", linked to the research group “Poetics of voice and
body in the art”, from the Federal University of Santa Catarina. The goals of the prenatal classes
are: to expand the body awareness of the woman, to allow her pregnant body to sing and to be sang,
to promote a space to the expression of the pregnant woman's feelings, to send harmonious sounds
vibrations to the baby in the womb, to provide a space for sharing among pregnant women, to work
on the female empowerment for the childbirth and postnatal care. In a circle of pregnant and singers
women we make sound alchemy inviting the female body to vibrate harmonies.
Keywords: Prenatal singing. Consciousness. Pregnancy. Maternity. Feminism.

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