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Publicada em março de 2009, tal condenação não seria diferente dos milhares de recursos
proferidos pelos tribunais no país, no tocante a contratação de um serviço e seu
inadimplemento, bem como os danos relativos à responsabilidade civil, se não fosse por uma
vertente peculiar sobre a responsabilidade civil.
Há 3 anos, em 13 de março de 2006, era publicada mais uma decisão proferida pelo Superior
Tribunal de Justiça acerca da responsabilidade civil. No caso, a 4ª Turma, sob relatoria do
ministro Fernando Gonçalves, condenou uma empresa responsável pela produção de um
programa televisivo de entretenimento a indenizar o autor que teve frustrada sua expectativa
de ganhar um prêmio de um milhão de reais, em razão da formulação imprecisa de uma
pergunta e resposta.
Casos tão distintos, com particularidades tão singulares, acabam por se aproximar em razão da
perda de uma oportunidade dos autores. Em ambos os casos, vê-se a aplicação da teoria da
perda de uma chance.
A perda de uma chance, ou perte d’une chance, trata-se de teoria difundida pelos tribunais
franceses ao aplicarem as regras da responsabilidade civil em casos envolvendo médicos.
Assim, a corte francesa considerou haver um erro de diagnóstico, que redundou em tratamento
inadequado. Entendeu-se, logo em sede de 1ª instância, que entre o erro do médico e as
graves consequências, a ser a invalidez do menor, não se podia estabelecer de modo preciso
um nexo de causalidade. A Corte de Cassação assentou que presunções suficientemente
graves, precisas e harmônicas podem conduzir à responsabilidade. Tal entendimento foi
acatado a partir da avaliação do fato de o médico haver perdido uma chance de agir de modo
diverso, condenando-o a uma indenização de 65.000 francos.
Diante de tal precedente, a doutrina estrangeira passou a reconhecer a teoria da perda de uma
chance como válida e existente. Na Itália, muitos foram os estudos e avanços da doutrina que
passou a reconhecer a possibilidade de se indenizar pela chance perdida, sempre que
pudessem ser consideradas atuais, sérias e reais as oportunidades de obtenção de uma certa
vantagem, que já existia no patrimônio da vítima no momento da lesão.
No que tange à indenização pela perda de uma chance é essencial que a oportunidade seja
plausível e não aponte uma simples quimera. Trata-se da probabilidade de que o evento
ocorresse, ou seja, não fosse a intervenção do agente, esta chance deveria ser séria e viável.
Assim, a chance deve ser considerável e não meramente eventual.
Assim como na França, a grande maioria dos julgados aplica a teoria em ações relativas à
prestação de serviços e métodos utilizados por médicos. Também encontramos com certa
regularidade juízes aplicando tal regra em ações envolvendo a atuação de advogados, onde,
embora tenham seus contratos pautados em uma obrigação de meio, acabam por perder um
prazo, deixando de interpor um recurso ou medida apta a garantir uma chance, uma
oportunidade mais concreta de sucesso em uma demanda, por exemplo.
Não obstante a aplicação da teoria da perda de uma chance ser comumente retratada nesses
dois casos, nos últimos três anos pudemos estudar a evolução da jurisprudência brasileira,
reconhecendo a existência da responsabilidade civil em decorrência da perda de uma
oportunidade, em outras pretensões de naturezas distintas.
Vejamos:
Para a maioria da doutrina, a perda da chance configura-se um dano material e autônomo, eis
que se baseia na perda da oportunidade de obter um lucro/vantagem ou evitar um dano. Esta
perda apenas ocorre porque um fato ilícito interrompe o curso normal dos acontecimentos
antes da concretização da oportunidade.
Sabido é que o dano patrimonial deve sempre ser atual e certo, de modo a se identificar com
clareza os danos emergentes e lucro cessantes no momento da indenização.
Na lição de Sérgio Cavalieri Filho, não se deve considerar a chance como a perda de um
resultado certo, haja vista a sua incerteza de realização. Deve-se, sim, pensar na chance como
a perda da possibilidade de alcançar um resultado ou evitar que este resultado se concretize.
Para a configuração do dano motivado na aplicação da perda de uma chance, há que se fazer
a distinção entre o resultado perdido e a possibilidade de consegui-lo.
Neste sentido, para que seja configurada a responsabilidade civil fundada na teoria, a chance
perdida reparável deverá caracterizar um prejuízo material ou imaterial resultante de um fato
consumado, não hipotético.