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70 Introdução
No Brasil, entre as fruteiras de clima temperado, a ameixeira é a que
menos prosperou, devido à falta de cultivares com boa adaptação
climática, problemas fitossanitários e produção de frutas com baixa
qualidade. Entretanto, consomem-se anualmente no País cerca de 50.000
toneladas, sendo 30% desse total importado, principalmente, do Chile e
da Argentina (MADAIL, 2003).
É uma das frutíferas que mais se difundiu pelo mundo, sendo cultivada
em várias condições climáticas, em virtude das várias espécies existentes
e do resultado de hibridações ocorridas ao longo do desenvolvimento da
cultura. Pode-se dizer que a ameixeira espalha-se por todo o Hemisfério
Norte, com exceção de zonas onde o elevado calor dos trópicos ou o
extremo frio da Zona Polar são obstáculos ao seu desenvolvimento. É
uma das frutíferas de cultivo mais antigo no Brasil, não se sabendo ao
certo quando foi introduzida. Entre as regiões produtoras brasileiras,
destacam-se principalmente os Estados do Rio Grande do Sul, Santa
Catarina, Paraná, São Paulo e sul de Minas Gerais. Como espécie típica
Pelotas, RS
de clima temperado, a maioria das cultivares é exigente em frio no
Outubro, 2008 período de repouso.
Bonifácio H. Nakasu As cultivares do grupo das japonesas podem ser cultivadas em regiões
Eng. Agrôn., PhD.
Pesquisador aposentado de clima mais ameno. As tradicionalmente conhecidas como ‘Santa
Embrapa Clima Temperado Rosa’, ‘Satsuma’, ‘Methley’ e ‘América’, exigem cerca de 500 a 600 horas
96001-970 - Pelotas, RS
(boni@cpact.embrapa.br)
de acúmulo de temperatura menor ou igual a 7.2ºC; ‘Ozark Premier’ e
‘Burbank’, entre 500 e 700h; e ‘Eldorado’ e ‘Blackambar’, mais de 700h.
José F. Martins Pereira Cultivares, como ‘Carmesi’, ‘Kelsey Paulista’, (Instituto Agronômico de
Eng. Agrôn. MSc., Embrapa
Clima Temperado Campinas – IAC, SP) ‘Amarelinha’ (Figura 1) e ‘Pluma 7’ (Embrapa Clima
Cx. Postal 403 Temperado – RS) necessitam de menos de 300h (RIGITANO e OJIMA,
96001-970 - Pelotas, RS
(jfmp@cpact.embrapa.br) 1973, OJIMA et al., 1978; NAKASU et al., 2002). Esta espécie apresenta
frutas de diversos tamanhos e formas, com película fina, adstringente e
com pouca pruína, com várias colorações entre amarela e vermelha, mas
raramente azulada. A polpa é firme, amarela, vermelha ou roxa, fibrosa,
doce e aromática.
por agentes infecciosos, levam a perdas dos anos e tornando-a mais suscetível a
consideráveis de produtividade e qualidade outras doenças, podendo estimular a floração
na cultura da ameixeira, podendo variar em precoce. Em anos muito úmidos e quentes,
cerca de 20 até 100%, segundo a variedade durante o período de desenvolvimento das
e a virulência do isolado ou patógeno plantas, pode incidir com grande intensidade.
envolvido. Para o desenvolvimento de Esse fungo provoca lesões nas folhas, que
um sistema de produção e distribuição de podem ser abundantes e visíveis, de coloração
material básico certificadamente sadio, países amarelo-ferruginosa.
onde a fruticultura tem longa tradição, há
muito estabeleceram normas para limpeza e A escaldadura, causada por Xylella fastidiosa,
distribuição de material propagativo, que pode Wells et al., é fatal, tanto que na década de
ser obtido por seleção e checagem, cultura 1970, quase dizimou os pomares de ameixeira
de meristemas, termoterapia e indexação, desde o Sul do Rio Grande do Sul até o
sendo mantido sadio com a utilização de Paraná. Esta doença pode ter sido introduzida
normas rígidas e específicas que objetivam da Argentina, já que havia sido constatada
prevenir contaminações futuras. Esse material naquele país durante a década de 50 (FRENCH
básico é confinado, de forma a impedir, e KITAJIMA, 1978; FRENCH e FELICIANO,
principalmente, a recontaminação através 1982; RASEIRA et al. 1992). Primeiramente,
de vetores. A perspectiva de disponibilização todos os pomares antigos em produção na
de material propagativo, com identidade serra gaúcha e em São José dos Pinhais,
genética e alto padrão fitossanitário, deverá próximo a Curitiba/PR, onde se encontravam
constituir-se no marco inicial de incentivo as maiores concentrações de ameixeiras,
ao programa de certificação de mudas de foram rapidamente sendo infectados e em
ameixeira. Paralelamente, deverá ocorrer dois ou três anos, grande parte das plantas
incentivo a adoção de normas e padrões morreu. Em seguida, plantações novas
de produção que refletirão diretamente também começaram a desenvolver sintomas
sobre a comercialização nacional de frutas, e nem chegaram a produzir frutas. Nos
melhorando a qualidade do produto colocado levantamentos realizados, foi constatada a
à disposição dos consumidores e reduzindo existência de cultivares com diferentes graus
importações. Há evidências experimentais do de infestação. Em plantações de ‘Santa Rosa’,
efeito negativo dos patógenos na eficácia de em dois ou três anos, todas as plantas eram
fertilizantes, desenvolvimento das mudas e infectadas e morriam. Na Serra Gaúcha numa
na suscetibilidade a doenças fúngicas, o que plantação de ‘Santa Rosa´, ‘Santa Rita´ e
leva ao desperdício de insumos, aumento ‘Methley´, enquanto todas as plantas das duas
de custo de produção e comprometimento primeiras morreram, as da última ficaram
do meio ambiente. Bacterioses e viroses sem sequer apresentar sintomas. Como as
causam perdas de qualidade e tamanho e, se medidas de controle não eram eficientes, a
disseminadas, podem comprometer pomares única alternativa até que se desenvolvesse
inteiros e a própria atividade econômica. cultivares resistentes, era utilizar plantas
matrizes livres da doença. A então UEPAE
A bacteriose causada por Xanthomonas de Cascata, hoje Embrapa Clima Temperado,
campestris pv. pruni (Smith) Dye, provoca iniciou um trabalho intenso de limpeza
manchas necróticas nas folhas, ramos e clonal através de termoterapia e cultura de
frutas. As frutas com manchas de bacteriose meristemas. Em 1982 algumas das principais
perdem valor comercial, podendo a planta cultivares foram obtidas e indexadas
morrer quando a incidência nos ramos for utilizando testes imunológicos. Também
muito severa. É um problema limitante do em 1982, foi introduzida uma centena de
Rio Grande do Sul ao Paraná, mas de pouca cultivares, das quais algumas foram indicadas
importância em São Paulo e Minas Gerais. para produção comercial, como é o caso de
Nestes Estados, por sua vez, a ferrugem ‘Reubennel´ e ‘Harry Pickstone´, da África do
causada por Tranzschelia pruni-spinosae Sul, e de ‘Santa Rosa’ e ´América’, dos Estados
(Pers.) Diet, pode ser comprometedora Unidos. Nesse período, intensos trabalhos
(CAMPO DALL ´ORTO et al., 1979; MARTINS foram desenvolvidos pela Embrapa Clima
e RASEIRA, 1996). Provoca o desfolhamento Temperado, IAPAR e Epagri, com a consultoria
precoce da planta, debilitando-a ao longo do Dr. William French, da Universidade
6 Ameixeira: Histórico e Perspectivas de Cultivo
fitossanitário. Estas atividades visam a promoção das frutas nos mercados interno e
implantação de programa de certificação de externo, incremento à produção integrada de
mudas matrizes de ameixeira. Este trabalho frutas e a capacitação do setor frutícola.
foi inicialmente estruturado por meio de
convênio firmado entre o Ministério da É de se esperar que em médio prazo ocorram
Agricultura, Pecuária e Abastecimento e grandes mudanças no cultivo da ameixeira,
o Conselho Nacional de Desenvolvimento considerando-se que as Normas Técnicas
Cientifico e Tecnológico – CNPq, com ações Gerais para a Produção Integrada de Frutas
definidas para a implantação do Programa (NTGPIF), com relação à legislação vigente
de Desenvolvimento da Fruticultura. A sobre mudas, indica como obrigatório
característica principal deste trabalho “utilizar material sadio, adaptado à região,
conjunto foi a mobilização de especialistas com registro de procedência credenciada e
da comunidade técnico-científica multi- com certificado fitossanitário” e, refere-se
institucional, empresários e associações de como proibido “utilizar material propagativo
produtores de frutas. As ações prioritárias sem o devido registro de procedência e
estão relacionadas ao desenvolvimento sem o certificado fitossanitário, assim como
tecnológico, produção de mudas certificadas transitar portando material propagativo sem a
(implantação de viveiros de plantas matrizes), competente autorização” (NAKA, 2002)
Foto: Luiz Antonio Suita de Castro
Seria correto dizer que no Brasil a ameixeira pois ainda é necessário melhorar alguns dos
apresenta boas perspectivas de investimento, procedimentos recomendados e conhecer os
principalmente porque o mercado mostra-se fatores que realmente impedem a expansão
ocioso, a cultura possui alta rusticidade, boa da cultura. Não é lógico que ocorram
conservação de frutos e grande variabilidade expressivas importações anuais de ameixa,
de cultivares, o que a torna uma fruteira provenientes de países que dividem suas
de boa aceitação pelos agricultores. Para o terras com o Brasil, e que se paguem altos
mercado consumidor, suas características preços por uma fruta que muitas vezes não
nutricionais influem favoravelmente. Além chega à mesa do consumidor em condições
do sabor agradável, as ameixas são fontes adequadas. Há necessidade de monitorar o
de nutrientes, fibras e energia, visto que seus sistema de produção da cultura da ameixeira,
elementos são facilmente absorvíveis pelo indicando prioridades de pesquisa e
organismo humano. Entretanto, constata-se desenvolvimento, de forma a assegurar aos
insegurança do produtor em atuar neste setor, produtores mais uma opção de renda.
8 Ameixeira: Histórico e Perspectivas de Cultivo
A ameixa européia (P. domestica) apresenta usada, seguida por ‘Stanley’ e ‘President’
características e exigências de cultivo bastante (VENDRUSCOLO, 2003). Por outro lado, pode-
diferentes da ameixa japonesa (P. salicina), se observar que a região serrana, localizada
principalmente em relação às necessidades ao nordeste do Estado do Rio Grande do Sul,
climáticas e direcionamento da produção, tem condições para produção de ameixas
a primeira é utilizada principalmente para européias. A existência de tecnologia
consumo “in natura” enquanto que a segunda adequada e matéria-prima nacional poderão
pode também ser destinada à industrialização. acarretar redução das importações, que
O Brasil não produz ameixa européia, importa atualmente é de 100%, e tornar o produto
toda a ameixa seca consumida. mais acessível ao mercado consumidor
interno.
Na região produtora de maçãs de Vacaria e
São Joaquim, alguns agricultores começam a As perspectivas de desenvolvimento da
investir na produção de ameixa européia com ameixa européia no Brasil são boas, desde
as cultivares D’Agen (Fig. 03) e Stanley (Fig. que a pesquisa venha a adaptar e desenvolver
04). D´Agen é altamente produtiva, com frutas tecnologias que incrementem o cultivo,
de tamanho médio, forma elíptica, epiderme o que possibilitará abastecer o mercado
roxa-clara, pruinosa e atrativa e polpa interno com matéria prima para obtenção de
amarela, massuda, doce e de sabor agradável ameixa desidratada. Esta cultura, devido às
para consumo in natura ou industrialização. suas características, permite disponibilizar
‘Stanley´ também é muito produtiva, com ao consumidor frutas produzidas de acordo
frutas de tamanho médio, elíptico-oblongas, com a política mundial de obtenção de
epiderme 100% azulada, pruinosa e muito alimentos altamente nutritivos, obtidos com
atrativa e polpa amarelo-esverdeada, firme, custo reduzido, pouca mão-de-obra e alta
massuda e sabor regular, sendo mais indicada rentabilidade. O fruticultor está atento às
para produção de ameixa desidratada. inovações solicitadas pelo consumidor. A
ameixa européia entra como alternativa aos
No Brasil, para esta espécie, praticamente produtores que desenvolvem agricultura de
nada tem sido realizado, ficando atrelada aos base familiar, não significando que grandes
conhecimentos existentes para as culturas do produtores não possam vir a fomentar o
pessegueiro e da ameixeira japonesa. Este processo industrial. É uma espécie que
procedimento manteve esta espécie restrita poderá ter grande repercussão sócio-
aos pátios e quintais nas regiões mais frias econômica para a Região Sul do Brasil,
do Sul do País, embora apresente grande principalmente nos Estados do Rio Grande do
potencial de produção, como ocorre a nível Sul e Santa Catarina. Viabilizando a pequena
mundial. Dentre os produtos derivados desta propriedade rural, poderá atuar na fixação
fruta, a ameixa seca é o mais consumido, com do homem ao campo, melhorando sua
produção mundial de 250.000 toneladas/ano. situação sócioeconômica. As características
O Brasil importa cerca de 10.000 toneladas inovadoras dos frutos desta espécie, tanto
anuais. Nos locais, onde é tradicionalmente na forma (ovóide a elíptica), nas cores
produzida, seus frutos são destinados ao (azul, rósea, púrpura), assim como o sabor
consumo in natura, apenas o excedente é excelente e o alto teor de açúcares são
submetido à secagem. No Brasil, a falta de fatores que atraem o consumidor. A alta
tradição do processamento por secagem rusticidade a campo, praticamente sem a
e consumo in natura, são entraves para a interferência dos problemas que existem no
exploração desta fruta, que é considerada cultivo da ameixeira japonesa (necessidade
como mais saborosa e nutritiva que a ameixa de polinização cruzada e patógenos de alta
japonesa. A industrialização dos frutos é agressividade), o baixo custo de produção
um fator que está merecendo atenção nos e o mercado ocioso são fatores atrativos ao
trabalhos desenvolvidos. Testes realizados produtor.
na Embrapa Clima Temperado mostraram
que é possível à produção de ameixas secas,
com qualidade equivalente ou superior
ao produto importado. A cv. D’Agen, com
alta concentração de açúcares, é a mais
Ameixeira: Histórico e Perspectivas de Cultivo 9
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