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VALIDADE, VIGÊNCIA E EFICÁCIA

DA NORMA JURÍDICA
Prof. Msc. Renkel Aladim de Araújo
Validade da Norma

Norberto Bobbio sustenta que, para que uma norma seja válida ela deve ser valorosa (justa); nem
toda norma, portanto, é válida, porque nem toda a norma é justa.
Para Tércio Sampaio Ferraz Júnior a validade não deve ser condicionante, mas sim finalística, ou
seja, é preciso “saber se uma norma vale, finalisticamente, é preciso verificar se os fins foram
atingidos conforme os meios prescritos”, reconhecendo a relação íntima entre direito e moral.
Para Miguel Reale a validade de uma norma pode ser vista sob três aspectos: o da validade formal ou
técnico jurídica (vigência), o da validade social (eficácia ou efetividade) e o da validade ética
(fundamento).
Já Hans Kelsen sustenta a necessidade lógica de pressupor a existência de uma norma fundamental
que seria "a fonte comum da validade de todas as normas pertencentes a uma e mesma ordem
normativa. Assim, a norma fundamental ordenaria que todos se conduzam de acordo com as normas
positivas supremas do ordenamento e atribuiria validade a todas as normas decorrentes da
manifestação da vontade do criador dessas normas supremas.
Para Joseph Raz o fundamento de validade de um ordenamento jurídico se encontra na ultimate legal
rule, uma norma cuja existência efetiva pode ser provada pela observação da realidade social em
determinado local e momento.
Na mesma medida, H.L.A. Hart considera que a validade de um sistema jurídico decorre da existência
de uma regra jurídica, que estabelece quais comandos são válidos e portanto, são reconhecidos.
DÚVIDAS

1. em que momento, precisamente, uma norma passa a ser válida (e a


fazer parte do ordenamento)?
2. Quando ela não é mais válida (e não pode ser utilizada como
fundamento para peças processuais)?
3. Por outro lado, será que toda norma válida já pode ser utilizada pelo
jurista (será que ela já pode produzir efeitos)?
4. Será que uma norma que perdeu a validade nunca mais poderá ser
utilizada pelo jurista?
1. em que momento, precisamente, uma norma passa a ser válida (e a
fazer parte do ordenamento)?

Verificar se a autoridade que a criou possuía poder para criar normas jurídicas e
se escolheu o instrumento adequado para conduzir a norma criada ao
destinatário.
O poder de criar normas jurídicas será chamado de capacidade, quando se
tratar de pessoas físicas que agem em nome próprio, ou de competência,
quando se tratar de pessoas ou órgãos que agem em nome alheio.
Para que uma lei seja válida, é preciso que o órgão estatal possua competência
legislativa. O Congresso Nacional, por exemplo, é competente para criar leis
ordinárias e leis complementares; o Presidente da República não é competente
para criar leis, mas pode criar decretos, regulamentos e medidas provisórias.
Caso a norma jurídica seja criada por autoridade competente, utilizando o instrumento
correto e seguindo os procedimentos estabelecidos em normas jurídicas superiores,
preencherá os requisitos formais de validade.
O cuidado de analisar todas as normas jurídicas de mesma hierarquia ou superiores
publicadas após a norma jurídica cuja validade se investiga, deve existir, pois pode ser que
alguma outra norma mais recente tenha expressamente retirado a validade da norma
investigada (revogação). Caso a revogação expressa tenha ocorrido, a norma não será
válida.
Após, precisaremos analisar sua validade material, uma investigação mais meticulosa,
onde será analisado o conteúdo textual da norma para saber se não é contraditório com o
conteúdo de outras normas jurídicas superiores e/ou mais recentes.
Caso haja contradição com, haver uma incompatibilidade entre as normas, o que
impedirá a norma investigada de pertencer ao ordenamento jurídico.
CONCLUSÃO

Uma norma jurídica será válida se preencher os requisitos formais e materiais.


Formalmente, a validade depende de a autoridade possuir poder normativo e
exercer esse poder da forma estabelecida na Constituição e/ou nas
leis. Materialmente, a validade depende que a norma criada respeite os limites
do poder concedido ao seu emissor: ela não pode contrariar as normas criadas
pelas autoridades superiores.
2. Quando ela não é mais válida (e não pode ser utilizada como
fundamento para peças processuais)?
Como regra, uma vez que a norma jurídica se torna válida ela passa a ter vigência (pode produzir efeitos). No
caso das leis, há uma exigência especial derivada da LC 95/98, em seu artigo 8º: toda lei deve indicar, de modo
expresso, o início de sua vigência.
Uma LC pode iniciar sua vigência na data de sua publicação, desde que o indique em seu texto. Se houver a
necessidade de um prazo, após a publicação da lei, para que as pessoas tomem conhecimento de seu teor e
seus efeitos, poderá haver um “período de vacância”, indicado expressamente no texto (“esta lei entra em vigor
após transcorridos X dias de sua publicação oficial”).
O período de vacância, ou vacatio legis, é o lapso de dias entre a publicação da lei, quando ela se torna válida, e
o início da produção de seus efeitos.
Uma lei publicada no dia 10 de agosto, torna-se imediatamente válida. Precisaremos ler seus artigos para saber
quando se iniciará sua vigência.
O parágrafo 1º do art. 8º da LC 95/98 determina que o dia da publicação e o último dia da contagem entrem no
prazo, iniciando-se a vigência no dia seguinte.
A Lei de Introdução às Normas do Direito (LINDB), de 1942, estabelece, em seu artigo 1º, que
“salvo disposição em contrário, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias
depois de oficialmente publicada”. Ela dá a entender que uma lei pode não especificar o seu
período de vacância, que então será de 45 dias.
Entretanto, os termos da Lei Complementar 95, de 1998 (mais recente), são claros: “a
vigência da lei será indicada de forma expressa”. Isso torna inútil o prazo fixado pelo
supracitado artigo 1º.
Qual lei um juiz deve aplicar para julgar um conflito, durante o período de vacância: a nova lei
revogadora ou a lei que será revogada?
Revogar uma lei é um efeito produzido por uma nova lei. Durante o período de vacância, a lei
ainda não possui vigência. Se não é vigente, não pode produzir efeitos, entre os quais,
revogar a lei antiga. Então, durante o período de vacância, a lei antiga ainda é válida e
vigente; a lei nova, já é válida, mas não é vigente. Caso julgue um conflito nesse momento, o
juiz deve aplicar a lei antiga, pois ainda pode produzir efeitos.
CONCLUSÃO

Validade e vigência são coisas relacionadas, porém diferentes. Uma lei é válida simplesmente
porque pertence ao ordenamento jurídico. Uma lei é vigente se puder produzir seus efeitos,
limitando comportamentos e fundamentando decisões. Só uma lei válida pode ser vigente;
toda lei vigente é válida. Mas nem toda lei válida é, necessariamente, vigente, pois pode estar
em seu período de vacância.
3. Por outro lado, será que toda norma válida já pode ser utilizada pelo
jurista (será que ela já pode produzir efeitos)?
JÁ RESPONDIDO ANTERIORMENTE

4. Será que uma norma que perdeu a validade nunca mais poderá ser utilizada pelo jurista?
EFICÁCIA

Uma norma possui eficácia técnica se todos os requisitos estatais para sua produção concreta
de efeitos forem preenchidos. muitas vezes, a lei já é válida e vigente, mas, para produzir
efeitos, depende da criação, por parte do Estado, de outras normas que a regulamentem, ou
da criação de órgãos que viabilizem sua execução. Em tese, a lei já pode produzir efeitos; em
concreto, ainda não, pois depende da prática de atos pelo Estado, o quais ainda não foram
praticados.
Imaginemos uma lei que seja válida e vigente, proibindo o comércio de produtos digitais. Essa
lei especifica que determinado Ministério divulgará a relação de quais bens são produtos
digitais. Ora, até que o Ministro divulgue tal lista, a lei não poderá ser aplicada pelos
tribunais, pois falta um requisito técnico para sua eficácia. Também poderia ocorrer de a
mesma lei prever a criação de um órgão para fiscalizar o eventual comércio proibido e multar
os infratores. Enquanto o órgão não for criado, faltará outro requisito técnico para sua
eficácia, e os infratores não poderão ser multados.
EFICÁCIA

A eficácia fática refere-se a requisitos sociais para a produção de efeitos da norma jurídica.
Nesse caso, podemos constatar que a norma não pode produzir efeitos porque a sociedade,
por algum motivo, ainda não está preparada para ela. Pode ser que a norma se refira a
alguma tecnologia ainda não criada ou disseminada, ou ainda a alguma situação que não
existe na sociedade.
Podemos pensar em uma lei que estabeleça as condições para o teletransporte de seres
humanos. Enquanto tal modalidade de transporte não for desenvolvida, a lei poderá ser
considerada válida e vigente, mas não terá eficácia social, ainda que o Estado tenha tomado
todas as providências técnicas para sua eficácia.
EFICÁCIA

O significado social de eficácia é o mais usual. Uma norma válida e vigente pode preencher
todos os requisitos técnicos e fáticos de eficácia, porém, ainda assim, pode não produzir
qualquer efeito na sociedade. Diremos que uma norma possui eficácia social quando for
respeitada pelas pessoas e/ou for acatada pelas autoridades estatais. Por outro lado, a norma
será socialmente ineficaz quando for desrespeitada e os infratores não forem punidos.
Poderá ocorrer de 4 formas:
• A norma pode ser seguida espontaneamente pelas pessoas, seja porque o comportamento
é um costume, seja porque as pessoas conhecem a norma, concordam com ela e a
respeitam conscientemente. Um exemplo do primeiro caso é o costume das pessoas
andarem vestidas, que corresponde ao teor das leis; um exemplo do segundo caso é a
norma que determina que um veículo pare no sinal vermelho, respeitada pela maioria da
sociedade.
EFICÁCIA

• A norma pode ser conhecida pelas pessoas, que não concordam com ela, mas a respeitam
pelo medo de serem punidas. Um exemplo é o pagamento do imposto de renda: quase
nenhum contribuinte concorda com os valores a serem pagos, mas cumprem a lei por
medo da coação.
• A norma pode ser conhecida pelas pessoas, que não concordam com ela e, mesmo sendo
punidas, escolhem violá-la. Nesse caso, podemos citar a situação de empresas que sabem
que serão multadas em virtude de determinada prática, mas, ainda assim, não alteram seu
comportamento, pois o valor das multas é compensado pelos lucros.
• A norma pode ser violada porque as pessoas sequer sabem de sua existência ou porque
não concordam com seu teor e, mesmo com a violação, as autoridades não punem. Temos,
aqui, as normas que se transformaram em “letra morta” ou que caíram em “desuso”. Tais
normas são consideradas socialmente ineficazes. Um exemplo, é a norma que proíbe o
jogo do bicho: muitas pessoas exploram essa atividade e as autoridades não as punem.
Também os apostadores não costumam ser multados.
CONCLUSÃO

Uma norma pode ser válida e vigente mas não ter eficácia técnica, fática e/ou social, por
razões diversas conforme a modalidade de ineficácia. Por outro lado, uma norma pode ser
tecnicamente ineficaz, porém pode ser socialmente eficaz: tratar-se-ia de um caso no qual a
norma não foi regulamentada pelo Estado, mas, mesmo assim, as pessoas cumprem suas
determinações espontaneamente.
Dizer que essa norma é socialmente ineficaz não faz dela uma norma inválida, pois nenhuma
outra norma jurídica a retirou do ordenamento.
Validade significa que a norma é jurídica, pertence ao ordenamento; Vigência é a qualidade
da norma que indica a possibilidade de ela, em tese, produzir efeitos; Eficácia é a qualidade
da norma que indica a possibilidade concreta de seus efeitos ocorrerem;
VIGOR

Uma norma jurídica possui vigor quando pode obrigar as pessoas e as autoridades, impondo comportamentos. Quando a
norma válida se torna vigente, ela ganha vigor ou força para obrigar. Todavia, em algumas situações, mesmo que a norma
perca sua vigência e sua validade, ela ainda pode continuar a ter vigor.
Quando uma norma possui vigor sem ser vigente, diz-se que ocorre o fenômeno da ultratividade: a norma produz efeitos antes
ou depois de terminada sua vigência. Se uma norma produz efeitos para o passado, atingindo situações que ocorreram antes
de ela se tornar vigente, tais efeitos são considerados retroativos; se produz efeitos apenas durante sua vigência, atingindo
fatos presentes e futuros, então tais efeitos são considerados irretroativos. Como regra, as normas jurídicas são do segundo
gênero.
Um exemplo de situação na qual a norma perdeu a validade e a vigência, mas conservou o vigor, é o de uma relação contratual
celebrada sob a égide de uma lei revogada. As pessoas que celebraram o contrato devem obedecer as determinações da lei
que valia ao tempo de sua celebração, ainda que no presente esteja revogada. Entre as partes do contrato, portanto, a lei
inválida e sem vigência continua a ter vigor.
Outro exemplo pode ser mencionado: um juiz deverá julgar um ato jurídico conforme a lei que era válida e vigente no momento de sua
prática, ainda que essa lei, no presente, tenha sido revogada. Novamente, a lei conserva seu vigor, pois é obrigatória sua adoção pelo juiz.
validade ética ou ao fundamento valorativo ou à justiça de uma norma jurídica.

A questão não é propriamente se a norma pertence ou não ao ordenamento, mas se ela permite a concretização de valores consagrados
pelo mesmo, que levam a sociedade ao bem comum. Uma norma jurídica pode ser tecnicamente válida, vigente, eficaz e ter vigor, mas sua
utilização prática pode causar situações que a sociedade reputa injustas.
Contemporaneamente, os juristas tendem a desvalorizar o argumento que questiona a validade técnica de uma norma alegando que seja
injusta. Afirma-se que a justiça ou injustiça de uma norma é questão de ponto de vista, podendo variar conforme o ângulo observado.
Algumas vezes, por outro lado, a busca do fundamento valorativo pode modificar as práticas judiciais, transformando o direito existente.
Um exemplo é o caso de uma pessoa miserável que pratique o furto de um alimento, apenas para saciar a fome. Independentemente da
discussão cível do caso, o direito penal caminha para a adoção de uma argumentação que considera injusto condenar-se tal pessoa pela
prática do ato e puni-la na esfera criminal.
Apesar da prática, contudo, a norma penal que proíbe o furto continua válida sob o ponto de vista formal, pois não foi revogada por
qualquer outra norma jurídica.
validade ética ou ao fundamento valorativo ou à justiça de uma norma jurídica.

Ao falar em fundamento valorativo, é importante distinguir duas palavras: legitimidade e legalidade. Uma norma jurídica é legítima quando
possui validade ética, ou seja, corresponde aos anseios valorativos da sociedade, que concorda com ela. A legalidade, por seu lado, refere-se
à validade formal da norma, ao seu pertencimento ao ordenamento. Uma norma é válida, independentemente dos valores que consagra, se
pertence ao conjunto de normas jurídicas.
Quando reputamos um ato ou uma norma legal, estamos avaliando a validade formal e material do mesmo: a autoridade é competente, a
forma está correta, não há contradições com as demais normas jurídicas. Quando, porém, reputamos ilegítimo, consideramos que, mesmo
sendo legal, o ato é injusto.

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