A expressão “Educação Sexual” é usual e amplamente divulgada e partilhada,
tanto pela comunidade científica e técnica como pela Comunicação Social e pelo senso comum. Aparentemente, enquanto utilizadores dessa expressão, está é clara e tem como referente uma realidade indubitável: cada um de nós julga estar a partilhar com os outros um conceito semelhante e que, como tal, permite o entendimento. No entanto, quando indagamos se, efectivamente, estamos de acordo acerca do que se entende por Educação Sexual, é fácil apercebermo-nos de que a resposta nem sempre é afirmativa; há diferentes formas de a definir, tanto ao nível do conceito como das finalidades que se lhe atribuem. Por isso, julgamos ser imprescindível clarificar esse conceito, dado a sua centralidade quando se procura uma intervenção pedagogicamente orientada no domínio da sexualidade. É comum que a educação sexual seja encarada como a realização de actividades com carácter predominantemente informativo, versando temas relacionados com a saúde reprodutiva, ou seja, a anatomia e a fisiologia da reprodução humana, a contracepção, aos quais se associa, ainda, o tema das doenças de transmissão sexual. Ainda que não possamos pôr em causa a importância da aquisição de conhecimentos em tais domínios temáticos, é legítimo que a consideremos insuficiente como significado de “Educação Sexual” e, desde logo, debilmente promissora para a promoção de uma vivência positiva da sexualidade. A sexualidade, entendida no seu sentido mais lato e como realidade complexa, precisa de ser conceptualizada de forma holística, porque é multideterminada e multidimensional. Com efeito, a sexualidade engloba as dimensões biológica, psico- afectica, sociocultural, relacional e ética, ligadas e dependentes entre si. Da mesma forma, os educadores e os professores desempenham um papel fundamental no que se refere à Educação Sexual, pela intensidade das trocas afectivas com as crianças, pela sua proximidade no quotidiano e por serem, também, modelos de comportamento, pois, (…) “todo o educador transmite não apenas o que sabe, mas aquilo que pensa, aquilo que é e o mundo em que vive.” (Benavente, 1995;p.7). AS ORIGENS …
A ideia da necessidade da educação sexual é resultado de um movimento
cientifico, cívico e intelectual protagonizado por diversos movimentos e actores, com origem na primeira metade do século XX e que ganhou crescente reconhecimento público na segunda metade do século XX. Em primeiro lugar falaremos dos movimentos de reforma sexual. Pela primeira vez, estes movimentos propugnaram a necessidade de substituir as ideias conservadoras e negativas sobre a sexualidade e a ignorância motivada pelo tabu, que eram geradoras de recalcamentos e problemas, por uma mentalidade esclarecida e mais liberal sobre estas questões. Embora tivessem ainda, pouca ressonância social, estes movimentos desenvolveram-se durante toda a década de 20 e 30. No entanto, o nazismo e o desencadear da 2ª Guerra Mundial, interromperam estes movimentos. Falaremos agora, da saúde pública e do movimento de planeamento familiar que, numa perspectiva de combate às doenças sexualmente transmissíveis e de combate ao flagelo do aborto e das mortes maternas propunham o lançamento de programas preventivos de informação e educação e se juntavam à exigência da educação sexual. Finalmente, o desenvolvimento das ciências humanas e do estudo da sexualidade, gradualmente foram apresentando a sexualidade como uma componente da condição, do desenvolvimento e da vida humana e, por isso, defenderam a necessidade da sua afirmação e valorização. Psiquiatras, psicólogos, pediatras, sociólogos e pedagogos insistem na necessidade de não se deixarem as crianças na ignorância e de responder às suas perguntas nestes temas, para que os vivam de forma saudável e para que, no futuro, não venham a ter problemas devido ao desconhecimento da sexualidade. Desta forma, ao tabu foi sendo contraposta a ideia de falar de sexualidade, do esclarecimento, da educação sexual nos vários espaços de socialização das crianças e dos jovens, nomeadamente nas famílias e nas escolas. À informação sobre os factos ligados às diversas componentes da sexualidade devem-se agora juntar o debate sobre a diversidade dos valores e atitudes e o treino de competências várias, no sentido de promover cada vez mais uma capacidade de fazer escolhas conscientes e responsáveis nesta matéria. IMPLICAÇÕES PARA A ESCOLA…
A situação que actualmente se vive no domínio da sexualidade justificaria, a
implementação da educação sexual nas escolas, a realização de acções formais neste domínio, em contexto escolar, a partir do pré-escolar. Para melhora esta situação, será desejável que aumente a quantidade e qualidade da educação sexual disponibilizada às crianças e jovens, para que se reduzam ou eliminem os mitos e falsas crenças, bem como as imprecisões, responsáveis por situações de risco, nomeadamente o abuso sexual de menores e a gravidez na adolescência. Na maior parte dos casos, não existe falta de vontade de participar neste desafio, mas é a grande incapacidade de responder com segurança e qualidade a esta proposta. Assim, se por um lado ter a oportunidade de pôr na prática aquilo que durante anos foi considerado necessário, mas não formalmente permitido, parece aliciante e motivador, por outro, cria de algum modo uma sensação de incomodidade, pois não se pode adiar mais a intervenção, e é preciso accionar a nível individual e de grupo, toda a energia, conhecimentos e criatividade que a operacionalização de um programa deste tipo exige. Daí que a implementação de projectos de educação sexual inclua uma dimensão organizacional que implicará toda a escola.
A EDUCAÇÃO SEXUAL NA INFÂNCIA…
As questões relacionadas com a necessidade e a importância da educação sexual
em meio escolar são, hoje, bastante consensuais. Os maiores receios provêem, sobretudo de uma visão predominantemente biológica-reprodutiva da sexualidade, dissociada dos interesses e características próprios destas faixas etárias e à margem dos conteúdos desejáveis para os primeiros anos de escolaridade. Tendo em conta as características destas faixas etárias e a importância da articulação escola-família, é fundamental não perder de vista as necessidades e interesses dos alunos, naquilo que deverá ser o grande objectivo geral para a educação sexual nesta primeira etapa. Este objectivo geral concentra quatro áreas temáticas fundamentais a desenvolver no pré-escolar. De realçar que não se distinguem áreas temáticas priveligiadas para cada grupo de idades, assumindo o pressuposto que todos os temas podem ser trabalhados e devem repetir-se, adequando-os às várias idades e interesses das crianças, variando a sua complexidade e profundidade conceptual. Assim, as áreas temáticas fundamentais em educação sexual são as seguintes: O conhecimento e valorização do corpo, dando importância a todas as diferentes partes do corpo, sem excepção, realçando os aspectos positivos de cada pessoa e a promoção da auto-estima positiva; A identidade sexual, onde se inscrevem as questões relacionadas com o género e papel sexual confrontando os modelos socioculturais do masculino e feminino; As relações interpessoais, a valorização dos afectos e expressões de sentimentos que os ligam aos outros, procurando desenvolver competências sociais de integração e relacionamento positivo com os outros; A reprodução humana, a compreensão dos mecanismos da reprodução humana, nomeadamente a concepção, a gravidez e o parto.
Estas quatro temáticas operacionalizam-se num conjunto de objectivos para os
níveis do pré-escolar.
OBJECTIVOS DA EDUCAÇÃO SEXUAL PARA O PRÉ-ESCOLAR
Ao longo da frequência do ensino pré-escolar, é desejável que as crianças possam:
Aumentar e consolidar os conhecimentos sobre: As principais componentes do corpo humano e da sua originalidade em cada sexo; Os papeis sexuais e as necessidades excepções; Os mecanismos básicos da reprodução humana, compreendendo os elementos essenciais acerca da concepção, da gravidez e do parto; Os cuidados necessários ao recém-nascido; As diferentes relações de parentesco e de tipos de família; A adequação das várias formas de contacto físico nos diferentes contextos de sociabilidade. Desenvolver atitudes de: Aceitação das diferentes partes do corpo e da imagem corporal; Aceitação da sua identidade sexual; Relativização dos papéis de género; Valorização das relações afectivas com a família e com os amigos; Valorização das relações de cooperação e interajuda; Aceitação dos direitos dos outros em decidir sobre o seu próprio corpo.
Desenvolver competências para:
Expressar opiniões e sentimentos pessoais; Comunicar acerca de temas relacionados com a sexualidade; Cuidar, de modo tendencionalmente autónomo, da higiene do seu corpo; Actuar do modo assertivo nas diversas interacções sociais, envolvendo familiares, amigos, educadores colegas e desconhecidos; Adequar as várias formas e contacto físico aos diferentes contextos de sociabilidade;