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ESPORTIVA
PROFESSOR
Dr. Rui Resende
NEAD
Núcleo de Educação a Distância
Av. Guedner, 1610, Bloco 4
Jd. Aclimação - Cep 87050-900 Maringá - Paraná
www.unicesumar.edu.br | 0800 600 6360
DIREÇÃO UNICESUMAR
Reitor Wilson de Matos Silva, Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho, Pró-Reitor Executivo de EAD William Victor
Kendrick de Matos Silva, Pró-Reitor de Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin, Presidente da Mantenedora Cláudio
Ferdinandi.
2
Wilson Matos da Silva
Reitor da Unicesumar
Em um mundo global e dinâmico, nós trabalhamos IGC 4 em 7 anos consecutivos. Estamos entre os 10
com princípios éticos e profissionalismo, não maiores grupos educacionais do Brasil.
somente para oferecer uma educação de qualidade, A rapidez do mundo moderno exige dos educadores
mas, acima de tudo, para gerar uma conversão soluções inteligentes para as necessidades de todos.
integral das pessoas ao conhecimento. Baseamo- Para continuar relevante, a instituição de educação
nos em 4 pilares: intelectual, profissional, emocional precisa ter pelo menos três virtudes: inovação,
e espiritual. coragem e compromisso com a qualidade. Por
Iniciamos a Unicesumar em 1990, com dois cursos de isso, desenvolvemos, para os cursos de Engenharia,
graduação e 180 alunos. Hoje, temos mais de 100 mil metodologias ativas, as quais visam reunir o melhor
estudantes espalhados em todo o Brasil: nos quatro do ensino presencial e a distância.
campi presenciais (Maringá, Curitiba, Ponta Grossa Tudo isso para honrarmos a nossa missão que é
e Londrina) e em mais de 300 polos EAD no país, promover a educação de qualidade nas diferentes áreas
com dezenas de cursos de graduação e pós-graduação. do conhecimento, formando profissionais cidadãos
Produzimos e revisamos 500 livros e distribuímos mais que contribuam para o desenvolvimento de uma
de 500 mil exemplares por ano. Somos reconhecidos sociedade justa e solidária.
pelo MEC como uma instituição de excelência, com Vamos juntos!
boas-vindas
Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está aplicando conceitos teóricos em situação de realidade,
iniciando um processo de transformação, pois quando de maneira a inseri-lo no mercado de trabalho. Ou seja,
investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou estes materiais têm como principal objetivo “provocar
profissional, nos transformamos e, consequentemente, uma aproximação entre você e o conteúdo”, desta
transformamos também a sociedade na qual estamos forma possibilita o desenvolvimento da autonomia
inseridos. De que forma o fazemos? Criando em busca dos conhecimentos necessários para a sua
oportunidades e/ou estabelecendo mudanças capazes formação pessoal e profissional.
de alcançar um nível de desenvolvimento compatível Portanto, nossa distância nesse processo de crescimento
com os desafios que surgem no mundo contemporâneo. e construção do conhecimento deve ser apenas
O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de geográfica. Utilize os diversos recursos pedagógicos
Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita.
este processo, pois conforme Freire (1981): “Ninguém Ou seja, acesse regularmente o Studeo, que é o seu
educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos
se educam entre si, mediatizados pelo mundo”. fóruns e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe
Os materiais produzidos oferecem linguagem das discussões. Além disso, lembre-se que existe
dialógica e encontram-se integrados à proposta uma equipe de professores e tutores que se encontra
pedagógica, contribuindo no processo educacional, disponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em
complementando sua formação profissional, seu processo de aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar
desenvolvendo competências e habilidades, e com tranquilidade e segurança sua trajetória acadêmica.
autor
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Professor Dr. Rui Resende
UNIDADE I UNIDADE IV
ESPORTE NA ESCOLA EVOLUÇÃO POSITIVA ATRAVÉS DO ESPORTE
14 Contextos da Educação Física 106 Treino de Jovens Atletas para uma Evolução
Positiva por Meio do Esporte
18 O Esporte como Conteúdo de Ensino nas
Aulas de Educação Física 110 Impacto do Esporte nas Competências de
Vida
22 Modelos de Ensino do Esporte – TGfU
114 Desenvolvimento Positivo por Meio do Es-
28 Modelos de Educação Esportiva – Sport
porte: Papel dos Treinadores
Education
120 Desenvolvimento Positivo por Meio do Es-
31 Considerações finais
porte: Papel da Família
36 Referências
126 Considerações finais
38 Gabarito
132 Referências
135 Gabarito
UNIDADE II
O DESPORTO NO SÉCULO XXI
UNIDADE V
44 Caracterização do Esporte no Século XXI
PREPARAR E PLANEJAR A INTERVENÇÃO DO TREINADOR
48 Esporte Potenciador da Saúde das Populações
140 Filosofia do Treinador
52 Os Clubes Esportivos Modernos
146 Planificação Anual Periodização
58 Contexto Histórico da Intervenção do Treinador
152 Plano Semanal Microciclo
62 Considerações finais
158 Unidade de Treino
68 Referências
162 Considerações finais
69 Gabarito
167 Referências
167 Gabarito
UNIDADE III
CONHECIMENTOS E COMPETÊNCIAS DO TREINADOR 168 Conclusão geral
74 Conhecimentos do Treinador
78 Competências do Treinador
82 Domínios de Desenvolvimento dos Atletas
86 Caracterização do Esporte Juvenil
92 Considerações finais
98 Referências
100 Gabarito
ESPORTE NA ESCOLA
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta
unidade:
• Contextos da Educação Física
• O esporte como conteúdo de ensino nas aulas de Educação
Física
• Modelos de ensino do esporte - TGfU
• Modelos de educação esportiva - Sport Education
Objetivos de Aprendizagem
• Reconhecer os contextos e a evolução da Educação Física.
• Identificar as razões pelas quais o esporte constitui matéria
curricular da Educação Física.
• Verificar os conteúdos da proposta de modelo de ensino
do esporte – TGfU.
• Estudar os conteúdos da proposta de modelo de ensino do
esporte – Sport Education.
unidade
I
INTRODUÇÃO
O
livro Iniciação Esportiva inicia-se por uma abordagem à Edu-
cação Física (EF). A razão pela qual se faz esta incursão ganha
pertinência pelo fato de o sistema educacional brasileiro ter
como incumbência, na sua matriz curricular, lecionar o es-
porte. Justifica-se, então, enquadrar historicamente a evolução desta dis-
ciplina relacionando-a com o esporte, pois ainda são evidentes as tensões
subjacentes à sua abordagem nos espaços escolar e não escolar.
A pertinência advém de que, por meio da EF, o esporte chega a toda a
população como conteúdo de ensino. Constitui um processo pedagógico
que, se devidamente enquadrado, possibilitará a valorização dos alunos
do ponto de vista humanista, fomentando a sua opção por um estilo de
vida ativo quando eles saírem do sistema de ensino. Legitima-se o ensino
do esporte pelo seu valor intrínseco, pois implica orientação e compro-
metimento, apela ao esforço, à persistência e à resiliência, para além da
competência e do resultado. Contudo, os métodos de ensino tradicionais
têm sido questionados quanto à sua eficácia.
As principais criticas provêm do fomento à exclusão pela elitização da
participação e de não corresponder aos anseios dos alunos por se funda-
mentar no ensino das técnicas em detrimento do jogo.
Os modelos de ensino do esporte ilustram novas possibilidades de
ensino e também têm o propósito de oferecer novas ferramentas didáti-
cas aos educadores no intuito de melhorar a sua intervenção pedagógica.
O modelo do ensino do jogo para a sua compreensão deu novos sig-
nificados pedagógicos ao ensino do esporte, inspirado em uma visão
construtivista centrada no aluno. O ensino estratégico e tático com a uti-
lização de jogos reduzidos e a transferibilidade entre modalidades afins
constitui o cerne da sua filosofia. O modelo de educação esportiva consti-
tui uma abordagem profundamente diferenciadora pela noção de ensinar
o esporte em todos as suas competências. Assim, o aluno deverá passar
por todos os papéis e atribuições que perpassam a competição esportiva.
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Contextos da
Educação Física
Para quem tem como vocação, ou interesse, vir a O termo EF é usado para identificar a área cur-
ensinar conteúdos relacionados com a atividade fí- ricular correspondente aos anos de escolaridade das
sica e esportiva, deve ter alguma consciência sobre crianças e dos jovens, tendo como propósito desen-
as determinantes que precederam a sua atualidade volver competências e habilidades em diferentes
e a forma como ela, por meio da EF, é abordada no atividades motoras (RESENDE; LIMA, 2016). Deve
meio educativo. constituir-se como a base de um conhecimento da
Vamos, então, dedicar alguma atenção às ra- atividade física e esportiva, fomentando nos alunos
zões que levaram à incorporação do esporte nos a procura por um estilo de vida ativo, de forma que
currículos da EF. Contudo, antes de abordarmos o este venha a repercutir no futuro enquanto adultos.
esporte na escola, importa observarmos um pouco Aliás, é interessante salientar que as percepções fí-
a EF, que é a disciplina que assume o ensino formal sicas formadas durante a adolescência são, muitas
do esporte na escola. vezes, determinantes no comprometimento com os
14
EDUCAÇÃO FÍSICA
níveis de atividade física subsequentes. Neste senti- Tendo em conta a saúde pública e a cultura espor-
do, os contributos que a EF pode providenciar e pro- tiva, a EF deve constituir-se como uma defesa na
mover no aluno são inúmeros: o respeito pelo corpo, promoção de um estilo de vida saudável. Para isto,
o seu e o dos outros; melhoria da autoestima e da é determinante que as atividades aí propostas refor-
autoconfiança; desenvolvimento de competências cem os sentimentos de competência, estimulando a
sociais e cognitivas que, por sua vez, podem refle- realização da atividade física de forma prazerosa.
tir-se em um melhor desempenho acadêmico, como A EF escolar brasileira possui uma trajetória que
muitos estudos apontam (PERALTA et al., 2014). principia em 1851 (com a reforma Couto Ferraz),
Não se pode deixar de referir, porém, que, devi- inicialmente denominada Ginástica, com a sua inclu-
do a inabilidades várias, a EF pode provocar “alergia” são no rol de disciplinas operacionalizadas na esco-
à atividade física e esportiva por parte dos jovens e, la e com o propósito da prática de exercícios físicos.
assim, condicionar a sua adesão, no futuro, ao pro- Somente em 1882, com Rui Barbosa e a sua reforma
clamado e desejado estilo de vida saudável. Este as- do ensino primário, secundário e superior, é que se
pecto não deve ser escamoteado, pois a simples prá- atribui importância à ginástica como elemento indis-
tica da EF, com todas as virtudes que se enunciam pensável para a formação integral da juventude. Des-
e lhe reconhecem, podem não ser suficientes para de então, vem agregando elementos históricos, mar-
alcançar os objetivos a que ela se propõe. Neste con- cos sociais com conflitos e conquistas, por exemplo,
texto, o professor e profissional de EF é um ator de a sua consolidação enquanto área de conhecimento.
importância crucial, pois o seu empenho na forma Sofreu, desde a sua inclusão, influências das institui-
como leciona fará toda a diferença na perceção que ções onde era lecionada, nomeadamente de caráter
o aluno terá sobre a importância da atividade física militar e médico (MARTINS; PAIXÃO, 2014).
para toda a sua vida. Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Na-
cional, ou LDB (BRASIL, 1996), a EF é componente
curricular obrigatório para a Educação Básica (Edu-
cação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Mé-
dio). As diretrizes curriculares reforçam a ideia de
se estabelecer o desenvolvimento pleno e gradual do
aluno, preparando-o para a cidadania em articula-
ção com todos os componentes curriculares, privile-
giando o desenvolvimento humano.
A forma como a EF se apresenta atualmente di-
fere das razões que a fizeram surgir na generalidade
dos sistemas educativos contemporâneos. Conside-
rando o Brasil, inicialmente (1889-1930), sob uma
ótica médica e higienista, os governantes passaram
Figura 1 – As aulas de Educação Física em 1916, exercícios de postura e
equilíbrio só com mulheres
a prestar mais atenção à saúde dos habitantes nas ci-
Fonte: Wikipédia (2015, on-line)1. dades. Pretendia-se a formação de indivíduos fortes,
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INICIAÇÃO ESPORTIVA
saudáveis e propensos à aderência às atividades boas perior a 40% (HARDMAN, 2008). Estes dados re-
em detrimento de maus hábitos. Curiosamente, as- forçam a importância que deve ser dada ao ensino
siste-se, atualmente, a uma preocupação semelhante desta matéria em contexto escolar.
com o combate à obesidade e ao sedentarismo. Pos- Não pretendendo aflorar os contornos políticos
teriormente (1930-1945), tal preocupação veio com que levam à discussão da importância desta hegemo-
uma perspectiva militarista, a qual se pretendia que nia, consideramos, contudo, que o esporte deve ter um
os jovens estivessem fisicamente aptos e, assim, me- lugar importante na formação das crianças e dos jo-
lhor preparados para as obrigações militares. Em se- vens. Os jogos esportivos “são atraentes pela dinâmica
guida, veio um período considerado pedagogicista que exploram e as disputas que desencadeiam, enal-
(1945-1965), em que a EF era proposta como forma- tecendo o incerto (pela presença de um adversário),
ção do indivíduo. A EF competitivista (1964-1985), a tomada de decisão e a inevitável solidariedade para
uma visão do regime militar de então, enaltece os es- a conquista de um objetivo comum” (RESENDE; SÁ;
portes com competições oficiais e o culto do atleta- LIMA, 2017, p. 12). De acordo com os autores citados,
-herói. Esta fase, em que existe uma apropriação da o esporte tem a possibilidade de transportar mais-va-
EF pelo regime, ainda condiciona, em grande me- lias pedagógicas para o espaço educativo, potenciado-
dida, a forma como o esporte é visto hoje no Brasil. ras de um desenvolvimento positivo dos jovens.
Apesar de tudo, o esporte, nos dias atuais, surge Os resultados positivos da participação esportiva
como parte integral do programa curricular da EF. na inclusão social, na saúde mental e física e na apa-
Acrescentamos que o vigor com que o faz advém dos rente melhoria cognitiva e acadêmica dos jovens (BAI-
desenvolvimentos sociais das últimas décadas, que LEY, 2005) deve constituir um forte argumento para
promoveram o esporte à escala mundial, transfor- perspectivar um ensino esportivo de qualidade. A pró-
mando-o em um produto extremamente midiático e pria ONU (2003), enaltece o esporte como inclusivo e
com grande impacto comercial. promotor da cidadania, contribuindo para a economia
Tal como já referimos, a inclusão do esporte e fomentando um ambiente limpo e saudável.
nas aulas de EF ainda é considerado controverso
por muitos, por via do peso político e ideológico SAIBA MAIS
que contempla (MARTINS; PAIXÃO, 2014). Com
efeito, a tentativa de reproduzir, na escola, o espor-
A EF, no Brasil, passou por momentos muito
te-espetáculo, ou servir-se da escola como viveiro de conturbados pela apropriação e pela carga
futuros alunos “atletas”, enfatizando a competição, a ideológica que lhe foi associada. A este pro-
vitória e, como consequência, a exclusão dos menos pósito e acerca da História brasileira da EF,
sugerimos a leitura do artigo “A História da
habilidosos, levou a sua base componente educativa Educação Física Escolar no Brasil”. Para saber
e formadora ao enfraquecimento. mais, acesse: <http://www.efdeportes.com/
A inserção do esporte na escola constitui uma efd124/a-historia-da-educacao-fisica-esco-
lar-no-brasil.htm>.
realidade hegemônica no Brasil (FERREIRA; LU-
CENA, 2006), mas também no mundo, com um Fonte: o autor.
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EDUCAÇÃO FÍSICA
17
INICIAÇÃO ESPORTIVA
A EF é uma área curricular que se preocupa com o para aprender”. Centra-se no ensino de habilidades
desenvolvimento dos alunos em termos de compe- que envolvem a participação física, com o conhe-
tência física e autoconfiança, de forma a usar estas cimento do próprio corpo e a sua capacidade de
habilidades em um leque alargado de atividades. movimento. Contudo, tem igualmente incluído, no
Deve preocupar-se, em consequência, em ensinar seu âmago, valores educacionais, como habilidades
os alunos a “aprender a mover-se” e a “mover-se sociais e éticas.
18
EDUCAÇÃO FÍSICA
A legitimação do ensino do esporte, na escola A questão de como ensinar os jogos esportivos consti-
e fora dela, advém do seu próprio valor enquanto tui um assunto controverso e tem sido objeto de grande
potencial de desenvolvimento do ser humano, por curiosidade acadêmica. As novas correntes pedagógi-
meio de uma prática que, apesar de lúdica e praze- cas sustentadas nas teorias da aprendizagem cognitiva
rosa, exige o cumprimento de regras pré-estabele- e construtivista, assim como a teoria da aprendizagem
cidas e, por isto, implica organização. Desta forma, situada, são consideradas inovadoras no ensino dos
ensinar um jogo esportivo implica a orientação e esportes (ROBLES et al., 2013) e têm dado destaque
o comprometimento com um objetivo, exigindo ao conceito de modelo em detrimento do método.
esforço e persistência, qualidade de desempenho Os modelos curriculares são desenvolvidos para
e resultado. Estas virtudes levam ao espaço educa- ajudar os alunos a participar de uma forma equitativa,
tivo mais-valias pedagógicas que sustentam a sua desafiando o seu raciocínio para além da replicação de
importância curricular. técnicas ou de habilidades. A este propósito, Metzeler
O ensino dos esportes na escola, todavia, por (2005) refere que o modelo:
meio dos métodos tradicionais e analítico, tem sido • Fornece um plano global e uma abordagem
objeto de críticas por não corresponder nem às ex- coerentes para ensinar e aprender.
pectativas dos alunos, nem aos objetivos que perse- • Clarifica as prioridades nos diferentes domí-
gue. O foco de um ensino centrado em um método nios de aprendizagem e de suas interações.
de aquisição das técnicas específicas de cada um dos • Fornece uma ideia central para o ensino.
esportes, desligada do contexto real do jogo, impli- • Permite ao professor e aos alunos entenderem
o que está acontecendo e o que virá a seguir.
ca uma escassa aquisição de competência por parte
• Fornece uma estrutura teórica unificada.
dos alunos em resolver as situações reais que o jogo
• Apoia-se na investigação.
levanta. Isto, aliado à exaltação de uma mestria téc-
• Fornece uma linguagem técnica aos professores.
nica, traz desmotivação aos alunos pela falta de sen-
• Permite que a relação entre instrução e apren-
tido que leva à sua aprendizagem do jogo.
dizagem seja verificável.
• Permite uma avaliação mais válida da
aprendizagem.
• Facilita a tomada de decisão do professor den-
tro de uma estrutura de trabalho conhecida.
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INICIAÇÃO ESPORTIVA
da colocação do aluno em uma situação de jogo de en- gos tempos de espera para entrar em atividade. Este
frentamento do adversário, ele é estimulado a encon- tipo de abordagem implica o professor assumir uma
trar as melhores soluções para resolver os problemas intervenção que, para além da liberdade de deixar
que o jogo induz. Assim, o aluno alcança um nível de jogar, ajude o aluno a encontrar soluções, comuni-
compreensão consciente e age intencionalmente sobre cando de forma positiva e estimuladora uma reação
a tática do jogo (GRAÇA; MESQUITA, 2007). à prestação do aluno.
A prática de jogos reduzidos oferece, igualmente, Neste contexto, e de acordo com Tani (2002), as
a vantagem de permitir aos professores integrar o en- principais caraterísticas do esporte enquanto con-
sino de modalidades similares, pois a transferibilidade teúdo da EF devem:
entre elas é possível. Como exemplo, podemos citar: • Ser objetiva no que diz respeito ao rendimen-
to, implicando consideração pelas diferenças
[...] o popular jogo dos ‘10 passes’ em que se pre- individuais, nomeadamente, as caraterísticas
tende que uma equipa mantenha a posse de bola, físicas, psicológicas, sociais e culturais dos
ou a ‘bola ao capitão’, em que o objetivo, para além alunos. Deve também ter em consideração as
de manter a posse de bola, é efetuar uma progres- diferenças individuais quanto às expectativas
são no terreno de jogo tendo como objetivo fazer individuais, às aspirações e aos valores.
com que ela chegue a um colega de equipa que • Estabelecer metas de desempenho realistas,
está num espaço circunscrito no término do cam-
evitando, por um lado, a superestimulação e,
po adversário (RESENDE et al., 2017, p. 12).
por outro, a subestimulação.
• Deve visar a aprendizagem e, com isso, o co-
nhecimento esportivo.
• Necessita ter como preocupação abranger to-
dos os alunos, independentemente do sexo,
do seu nível de desenvolvimento motor e das
suas capacidades físicas.
• O processo deve ser objeto de avaliação, per-
mitindo fornecer indicações objetivas sobre o
progresso do aluno.
• Deve ter como alicerce que a sua dissemina-
ção constitui um patrimônio cultural da hu-
manidade.
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EDUCAÇÃO FÍSICA
21
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Modelos de Ensino
do Esporte – TGfU
22
EDUCAÇÃO FÍSICA
Materializando os conceitos expostos, apresentamos Desta forma, sugere-se que, quando os professores
duas propostas de modelos de ensino do esporte que ajudam as crianças e os jovens a “entender” o jogo
têm sido alvo de bom acolhimento a nível interna- e reduzem a importância do ensino das técnicas de
cional, com destaque para os países anglo-saxôni- forma isolada, o divertimento e a satisfação com o
cos. O interesse da sua importância para o ensino jogo são abertos a todos, independentemente da sua
do esporte na escola, e na EF em particular, é o que habilidade.
pretende fazer a adesão ao esporte ser muito mais
significativa. Esses modelos têm igualmente desper- MODELO DE JOGO PARA A SUA COMPRE-
tado a curiosidade da comunidade científica, a qual ENSÃO – TGfU
tem produzido material empírico (fruto de pesqui-
sas com recurso a diferentes metodologias e em di- O modelo do ensino dos jogos para a sua compre-
ferentes sistemas de ensino) que dá sustento e incen- ensão (Teaching Games for Understanding - TGfU),
tiva a sua aplicação. proposto por Bunker e Thorpe (1982), teve um forte
São modelos cujo objetivo é empregar metodo- impacto na forma como se começou a encarar o en-
logias pedagógicas mais democráticas, providen- sino das modalidades esportivas. A um ensino tra-
ciando aos alunos experiências esportivas que real- dicional que iniciava a aprendizagem do jogo pelo
mente lhes permitam aprender a jogar bem e, com domínio das técnicas, os autores propuseram uma
isso, ter maior desfrute com a sua prática. Neste sen- forma de ensinar na qual o próprio jogo fosse a sua
tido, o conhecimento do jogo refere-se não somen- essência. Desta forma, promovia-se uma participa-
te à capacidade para executar habilidades motoras ção mais igualitária entre os estudantes, desafiando
complexas, mas também às decisões apropriadas do o entendimento do esporte para além das execuções
uso dessas habilidades no contexto do jogo. técnicas e habilidades respectivas.
Ambos os modelos rompem com as abordagens
mais tradicionais ao nível dos conteúdos, dos méto-
dos e das estratégias de ensino. Reconfiguram os pa-
péis e a responsabilidades de quem ensina e de quem
aprende, estabelecendo novos cenários de contextos
de instrução e aprendizagem.
23
INICIAÇÃO ESPORTIVA
O ensino centrado no aluno, no qual este modelo Os seis passos para o ensino do TGfU pro-
se apoia, pretende proporcionar sucesso em uma postos por Bunker e Thorpe (1982) são os
grande variedade de jogos, explorando as técni- seguintes:
cas e táticas que lhes são comuns, como “o passar 1. Jogo.
e desmarcar”, “encontrar espaços vazios” ou “abrir 2. Apreciação do jogo.
linhas de passe”. Assim, o professor ou o treinador 3. Consciência tática.
centra o seu foco no ensinar a jogar ao invés de en- 4. Tomada de decisão.
sinar as técnicas específicas de cada modalidade. 5. Habilidade de execução.
Os alunos devem executar estratégias apropriadas 6. Performance em competição.
à complexidade do jogo e empregar tempo satisfa-
tório para jogar.
Quando se apresenta um jogo aos alunos, este deve
O foco pedagógico é uma abordagem que: ser adequado à sua idade e ao seu nível de experiên-
cia. Na prática, o professor desenha cenários de jogo
1. Representa jogos complexos de forma
em forma de puzzles (quebra-cabeça) que necessi-
simplificada.
tam ser resolvidos e que representam aquilo que o
2. Modifica os princípios de jogo de forma
a diminuir as suas exigências. aluno normalmente encontra no jogo.
3. Exagera procedimentos no sentido de A apreciação do jogo envolve o conhecimento
salientar determinados aspectos do das suas regras, que podem ser adaptadas em fun-
jogo que são importantes para a sua ção dos constrangimentos situacionais. A compre-
compreensão. ensão tática implica o aluno na consciencialização
dos problemas táticos que o jogo aporta e preconiza
o entendimento das táticas mais elementares. A to-
Uma das primeiras preocupações é evitar que o jogo mada de decisão incita o aluno a resolver questões
se torne uma obsessão, desta forma, colocando aos (o que fazer? Como fazer), atribuindo, desta forma,
alunos questões como: o que fazer? Quando fazer? E significado ao uso da técnica, em função dos pro-
não apenas como fazer? blemas táticos suscitados pelas ocorrências do jogo.
O contexto do jogo tem precedência sobre o en- A habilidade de execução procura dotar os alunos
sino das técnicas, assim, a escolha da forma do jogo de um maior domínio e também de uma maior efi-
é crucial e será determinante que este o qual foi se- cácia na execução das técnicas. Todas as fases ante-
lecionado não faça recurso de técnicas que impeçam riores se reúnem para se corporizar na consolidação
a sua realização. Consequentemente, deve permitir do jogo. O ciclo voltará a repetir-se, implicando o
aos alunos enfrentar de forma inteligente as situa- desenvolvimento de procedimentos cognitivos e
ções colocadas, interpretá-las, identificar uma possi- técnicos cada vez mais complexos, até atingir o jogo
bilidade de solução e, consequentemente, agir inten- formal. Contudo, é importante salientar que, apesar
cionalmente de acordo com os objetivos. do propósito ser o ensino em direção ao domínio do
24
EDUCAÇÃO FÍSICA
jogo formal, se este não for alcançado, não diminui debol possui um princípio similar à desmarcação no
em nada a importância das aprendizagens obtidas basquetebol.
pelos alunos no decorrer de todo o processo. O segundo princípio consiste na representação
do jogo (Game representation), no qual os professo-
res criam um desenvolvimento apropriado por meio
de cenários de jogo que proporcionem como usar
uma determinada habilidade ou solução tática den-
tro do jogo. Como exemplo, podemos ilustrar com o
jogo dos dez passes, já mencionado anteriormente.
O objetivo será a manutenção da posse de bola e
impedir que o adversário a conquiste.
O terceiro princípio, designado de exagero
(Exaggeration), implica que os professores defi-
nam um objetivo específico tendo como ponto de
partida o jogo formal, concebendo um outro jogo
que procure exagerar o conceito específico que es-
colheram anteriormente. Recorrendo novamente
ao jogo dos dez passes, coloca-se um constran-
gimento ao jogo, em que se penaliza com perda
de posse de bola se houver um passe devolvido a
quem lhe passou.
O último princípio, complexidade tática (Tacti-
cal complexity), assenta-se na premissa de que existe
um desenvolvimento progressivo de soluções táticas
que inclui as habilidades com bola e respectivos mo-
vimentos. Mais uma vez, por meio do mesmo jogo,
solicitar (até com ajuda de uma pontuação) formas
diferenciadas de passar a bola.
Estes passos metodológicos anteriormente referen- O modelo de ensino do jogo, para a sua com-
ciados estão subordinados a quatro princípios peda- preensão, não deve ser reduzido ao ensino de uma
gógicos. competência cognitiva ou tática, pois tem grande
O primeiro, chamado de amostragem (Sam- potencial de confirmar a humanidade da EF e do es-
pling), evidencia como a compreensão das soluções porte por meio das formas em que destaca a intera-
táticas, regras e habilidades permite a transferibili- ção humana e as dimensões afetivas dos jogos.
dade entre jogos similares ou da mesma categoria. A operacionalização do ensino desse modelo,
Significa que, por exemplo, a desmarcação no han- segundo Almond (2015), envolve:
25
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Entender o jogo:
• As regras do jogo e a forma como o podem influenciar.
• Estratégia, táticas e princípios de jogo.
• Os princípios de jogo dentro de uma partida reconhecendo a sua relevância
em situações específicas.
• Como trabalhar em equipe e para a equipe – fomentando a responsabilida-
de coletiva.
• Por que jogar desta forma ou daquela.
• Onde os próprios colegas estão e para onde eles são suscetíveis de se
movimentar.
• A forma e o fluxo do jogo.
• O papel e a responsabilidades individuais:
• No ataque e na defesa.
• Quando não tem a posse da bola.
Na sua essência, jogar pressupõe esforçar-se pela obtenção da vitória, o professor deve re-
fletir sobre a melhor estratégia para desenvolver o aluno neste particular.
26
EDUCAÇÃO FÍSICA
REFLITA
27
INICIAÇÃO ESPORTIVA
De uma forma completamente distinta de pensar o enriquecedoras para ambos os sexos no contexto da
ensino do esporte na escola, e sugerindo uma abor- EF, e constitui-se como uma alternativa ao ensino de
dagem inovadora desse ensino, o modelo que se unidades didáticas de curta duração compostas por
apresenta a seguir pretende ampliar a aprendizagem multiatividades.
do esporte a todos os fatores que o envolvem. A importância desse modelo é reconhecida pela
comunidade internacional que investiga a área da EF
MODELO DE EDUCAÇÃO DESPORTIVA e tem sido alvo de pesquisas incidindo, por um lado,
(SPORT EDUCATION) na forma como se pode implementá-lo e, por outro,
sobre os resultados da sua aplicação. O grande obje-
O modelo curricular e de instrução de educação tivo “será reconhecer que o esporte é uma forma de
desportiva proposto por Siedentop (1994) foi ela- jogo e, que numa sociedade onde formas superiores
borado para providenciar experiências desportivas de atividade lúdica são perseguidas vigorosamente
28
EDUCAÇÃO FÍSICA
por todas as pessoas, a sociedade é mais madura” A importância que a competição tem como ele-
(CURTNER-SMITH; SOFO, 2004, p. 347). Desta mento central da experiência esportiva exige crité-
forma, tem como fim mais específico gerar pessoas rios cuidadosos na criação das equipes e pretende
com competência esportiva, literadas e entusiásticas. fazer uma clara distinção entre o treinar (preparar
• Uma pessoa competente no esporte é aque- para a competição) e o competir.
la que possui habilidade, entende e executa a
estratégia de jogo de forma a participar com
sucesso no jogo.
• Uma pessoa com conhecimento esportivo é
aquela que entende os valores e tradições do
esporte, assim como os seus rituais e regras,
além de ser capaz de distinguir uma boa de
uma pobre realização.
• Um esportista entusiasta é aquele que partici-
pa de forma a melhorar, preservar e proteger
a cultura desportiva.
29
INICIAÇÃO ESPORTIVA
efetiva no jogo. Neste sentido, a esse modelo é im- dade no grupo, um espírito consolidado nos obje-
portante corresponderem formas de jogo adequadas tivos comuns de alunos que se ajudam mutuamente
às capacidades dos alunos, motivando e mobilizan- para o alcançar. Naturalmente que, se tratando de
do a sua participação de forma relevante. um grupo e, ainda, formado por jovens, serão de-
sencadeados tensões e conflitos. Estes devem ser
tratados por meio do diálogo e, para a sua resolu-
O objetivo do modelo de educação espor- ção, deve contribuir o saber do professor que, com
tiva é: o seu empenho e a sua boa influência, fará resultar
• Melhorar a capacidade de jogo por o processo.
meio do progresso das habilidades es-
pecíficas, da leitura de jogo e da conse- SAIBA MAIS
quente tomada de decisão.
• Melhorar as capacidades físicas e psi-
cológicas. Em um interessante artigo, Deenihan,
McPhain e Young (2011) pesquisam sobre
• Fomentar a autonomia, a liderança como ensinar os professores estagiários
e a partilha de responsabilidades na a implementar o modelo de educação es-
organização da experiência esportiva portiva na escola. Por meio de diferentes
(isto obtido por meio de uma trans- estratégias metodológicas de investigação,
ferência progressiva da organização os autores deparam-se com as dificuldades
que os professores estagiários revelam em
para os alunos).
adotar esta estratégia de ensino do esporte,
o que leva os pesquisadores a proporem
intervenções para melhorar esta aprendiza-
gem. Para saber mais, acesse: < https://www.
Um dos pontos fundamentais que o modelo de researchgate.net/publication/232220050_’Li-
educação esportiva propõe é uma aprendizagem ving_the_curriculum’_Integrating_sport_edu-
cooperativa por meio da constituição de pequenos cation_into_a_Physical_Education_Teacher_
Education_programme>.
grupos heterogêneos e que tenham uma grande
duração. Este é um ponto fundamental para que o Fonte: o autor.
30
considerações finais
31
atividades de estudo
A qualificação profissional é uma exigência premente outro constitui um dos elementos mais decisivos deste
na atualidade, nomeadamente naquela em que se si- universo representacional, pois todo o ato de comuni-
tua o ato educativo, sendo pertinente, por isso, apurar car, na sua interação, supõe uma representação de si
qual a opinião que os destinatários da formação fazem e uma representação do outro. As representações, isto
do agente formador. O qualitativo de bom professor ou é, o que pensa cada interveniente sobre a situação que
o perfil do professor ideal é, porventura, impossível de vivencia, apesar de subjetivas, estão na base da mo-
atingir, mas que deve ser continuamente perseguido. tivação, da orientação e da tomada de decisões pes-
A consciência desta dificuldade evidencia o propósito soais, bem como traduzem e condicionam os modos
deste trabalho, em que se pretende inquirir os alunos como os indivíduos se relacionam entre si. “O modo
sobre a ocorrência de um conjunto de comportamen- como cada professor enfrenta uma situação didática
tos a serem observados em um bom professor de EF. depende muito da sua individualidade psicológica, a
Desta forma, alimenta-se a discussão sobre esta temá- partir da qual interpreta e lhe atribui significados, e
tica, procurando contribuir para valorizar a função do- dos momentos de decisão em que se enquadra” (PA-
cente por meio do maior conhecimento. CHECO, 1995, p. 51).
Sendo um conceito central em Psicologia Social, as re- O aluno, na representação que possui do professor, de
presentações sociais combinam a nossa capacidade acordo com Gouveia-Pereira (2008), tem a expetativa
de perceber, inferir e compreender, de forma a dar de que a escola e os seus professores orientarão o seu
um sentido às coisas, ou para explicar uma situação a relacionamento com os vários interlocutores, que ga-
alguém (MOSCOVICI, 2004). Assim, podemos conhecer rantam o respeito e o cumprimento das regras e dos
como o conceito é percebido pelos intervenientes na deveres estabelecidos, assegurem todo o apoio neces-
relação pedagógica. Como os alunos conceitualizam o sário ao seu bem-estar e sejam intervenientes ativos na
conceito, qual a representação mental que eles fazem resolução justa dos conflitos de interesse que possam
dos professores. De acordo com Shimamoto (2004), as ocorrer.
representações sociais de professores oferecem parâ- Com o evoluir das representações formadas pelos alu-
metros que possibilitam o entendimento das perce- nos sobre os seus professores, os fatores afetivos vão
ções que os indivíduos constroem sobre a realidade, assumindo um papel importante. Entre esses fatores,
como também o da influência das representações no destacam-se a disponibilidade que o professor revela,
pensamento e nas condutas humanas, o que constitui o respeito e o afeto que transmite e a capacidade de
uma das vias de compreensão do trabalho pedagógi- se mostrar acolhedor e positivo. O peso desses fatores
co realizado em sala de aula. A representação que os será tanto maior quanto mais baixo for o nível de es-
atores presentes na relação educativa formam um do colaridade.
33
LEITURA
COMPLEMENTAR
Segundo um estudo realizado por Wallon (1995), o papel Caraterísticas do bom professor de EF
do professor na vida do aluno é essencial. Para os alu- No plano da nossa área de estudo, como nos recorda
nos, esse papel é representado como o de uma pessoa Cunha (2007), o professor de EF possui bases científi-
formada e habilitada, com afetos contemplados aos alu- cas que permitem que haja um desenvolvimento motor
nos, podendo ambos interagir dentro de uma transmis- correto do aluno, proporcionando o gosto pela aprendi-
são emocional. zagem das atividades físicas, tendo em conta a saúde e
Caraterísticas de um bom professor as suas limitações. Das suas competências devem fazer
Segundo Hashweh (2005), o professor deverá ter uma parte, além dos conhecimentos científicos, as habilida-
boa bagagem de conhecimentos didáticos e pedagógicos des e atitudes relacionadas ao meio em que ele intervirá
e ter uma grande variedade de caminhos pedagógicos (NASCIMENTO, 1999).
no seu ensino, para, assim, ele poder adaptar-se às mais De acordo com Pitta (1999), são quatro as dimensões
variadas situações que possa encontrar. Pitta (1999) tam- fundamentais do bom professor: I) A dimensão motivado-
bém refere que os professores deverão possuir compe- ra, que capacita o professor a motivar os alunos, possi-
tências científico-pedagógicas para ter a segurança e o bilitando-lhes uma adequada aprendizagem e os meios
desembaraço para as situações que decorrem do exer- necessários para evoluir e enfrentar os desafios da vida,
cício das suas funções durante as práticas pedagógicas. II) A dimensão relacional, que tem a ver com o bom clima
Perrenoud (2000) considera que, para ensinar, o profes- de uma sala de aula, III) A dimensão ética do bom profes-
sor deverá ter dez competências bem desenvolvidas, as sor, que contribui para a formação do caráter e dos valo-
quais poderão ser sujeitas a alterações em consonância res dos seus alunos, indispensáveis ao desenvolvimento
com a sociedade ao desenvolver a sua atividade. Essas da sua maturidade e à sua inserção na vida social, IV) A
competências são: I) Organizar e dirigir situações de dimensão construtiva, aquela que se reflete na admiração
aprendizagem, II) Administrar a progressão das apren- que os alunos têm pelo seu professor, pela sua habili-
dizagens; III) Conceber e fazer evoluir os dispositivos de dade para os ensinar, a sua clareza e a forma como os
diferenciação, IV) Envolver os alunos nas suas aprendiza- orienta nas suas tarefas. Reflete também a sua forma de
gens e no seu trabalho, V) Trabalhar em equipe, VI) Parti- ser imparcial, como controla a turma, o afeto que trans-
cipar na administração da escola, VII) Informar e envolver mite aos alunos, a sua paciência, o seu bom humor e a
os pais, VIII) Utilizar novas tecnologias, IV) Enfrentar os sua justiça.
deveres e os dilemas éticos da profissão, X) Administrar Fonte: Resende et al. (2014).
a sua própria formação contínua.
34
material complementar
Esporte Escolar
Maristela da Silva Sousa
Editora: Ícone
Sinopse: a Educação Física realmente vinculada aos rituais pedagógicos da escola
precisa passar por uma nova fase de crítica e de reformulações. Portanto, o pre-
sente trabalho encaminha-se para este propósito também. Ele não permanece
apenas na crítica ao esporte e à Educação Física do ponto de vista pedagógico,
mas se propõe a abrir uma ampla discussão em torno das questões epistemológi-
cas mais abrangentes que fundamentam a prática da Educação Física e, em espe-
cial, o ensino dos esportes. Por fim, para não ficar apenas no plano da crítica e do
debate teórico-metodológico das questões gerais da Educação Física brasileira, o
trabalho propõe-se, ainda, a apresentar o que é denominado, por sua autora, de
possibilidade superadora no plano da cultura corporal.
35
referências
ONU. United Nations Organization. Sport for development and peace: Towards
achieving the millennium development goals. Report from the United Nations
Inter-Agency Task Force on Sport for Development and Peace. New York: United
Nations, 2003. Disponível em: <https://www.sportanddev.org/sites/default/files/
downloads/16__sport_for_dev_towards_millenium_goals.pdf>. Acesso em: 17
set. 2018.
PERALTA, M. et al. A relação entre a educação física e o rendimento académico
dos adolescentes: Uma revisão sistemática. Revista de Psicologia da Criança e do
Adolescente, v. 5, n. 2, p. 129-137, 2014.
RESENDE, R. et al. Exercício profissional do treinador desportivo: Do conheci-
mento a uma competência eficaz. Journal of Sport Pedagogy & Reseacrh, v. 3, n.
1, p. 42-58, 2017.
RESENDE, R.; LIMA, R. Relação professor de educação física e alunos: Teoria,
investigação e intervenção. In: BARTHOLOMEU, D. et al. (Ed.). Relações inter-
pessoais: concepções e contextos de intervenção e avaliação. São Paulo: Vetor,
2016. p.133-153.
RESENDE, R.; PÓVOAS, S.; MOREIRA, J.; ALBUQUERQUE, A. representa-
ção dos alunos sobre o que pensam ser um bom professor de Educação Física.
In: ALBUQUERQUE, A.; PINHEIRO, C.; RESENDE, R. (Ed.). A formação em
Educação Física e desporto: perspetivas internacionais, tendências atuais. Maia:
ISMAI, 2014. p. 183-198.
RESENDE, R.; SÁ, P.; LIMA, R. Ensino dos jogos desportivos coletivos: Professo-
res experientes vs professores estagiários. Journal of Sport Pedagogy & Research,
v. 3, n. 2, p. 11-19, 2017.
ROBLES, M. A. et al. Fundamentos pedagógicos de la enseñanza comprensiva
del deporte: Una revisión de la literatura. Revista Cultura, Ciencia y Deporte, v.
8, p. 137-146, 2013.
SIEDENTOP, D. Sport Education: Quality PE through positive sport experien-
ces. Champaign: Human Kinetics, 1994.
TANI, G. Esporte, educação e qualidade de vida. In: MOREIRA, W. W.; SIMÕES,
R. (Orgs.). Esporte como fator de qualidade de vida. Piracicaba: UNIMEP, 2002.
p. 103-116.
Referência on-line:
1
em:<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Women%27s_physical_edu-
cation_exhibition_in_Herron_Gymnasium_1916_(3191469988).jpg>. Acesso
em: 17 set. 2018.
37
gabarito
1. B.
2. A.
3. E.
4. B.
5. C.
38
UNIDADE
II
O DESPORTO NO SÉCULO XXI
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta
unidade:
• Caracterização do esporte no século XXI
• Esporte potenciador da saúde das populações
• Os clubes esportivos modernos
• Contexto histórico da intervenção do treinador
Objetivos de Aprendizagem
• Identificar a relevância do esporte na sociedade
contemporânea.
• Verificar as potencialidades do esporte como fomentador
de um estilo de vida saudável.
• Caracterizar e perspectivar o clube esportivo moderno.
• Considerar a evolução da profissão de treinador.
unidade
II
INTRODUÇÃO
A
importância do impacto do esporte no contexto social atual é
dúbia. As multidões que acorrem aos espetáculos esportivos
e a repercussão que estes eventos têm nos órgãos de comuni-
cação social fazem parte da nossa vivência diária. Com esta
consciência, um profissional do esporte deverá saber identificar a área
onde vai desenvolver a sua atividade e projetar a sua evolução, não só no
contexto brasileiro, como mundial. Por outro lado, desenvolvem-se no-
vas áreas de intervenção do esporte, nomeadamente enquanto atividade
potenciadora de fomentar a saúde das populações.
Neste sentido, será exigida uma transfiguração dos clubes esportivos
de forma a adequarem os seus serviços a uma nova geração de frequenta-
dores. Estes atletas poderão ser de rendimento, mas também poderão ser
de participação, sendo que a convivência e a coexistência entre ambos os
projetos esportivos terão que ser bem definidos e de acordo com os valo-
res do clube. Ao modernizar-se, o clube tenderá a oferecer serviços com
qualidade cada vez maior, e os recursos humanos farão toda a diferença.
Esta evolução necessitará de uma resposta profissional de todas as es-
truturas do clube, implicando, como consequência, a formação adequada
dos seus agentes. Os novos clientes poderão ser crianças, jovens ou adul-
tos, visando a diversas formas de rendimento esportivo, e o treinador terá
de exercer a sua competência de forma eficaz em todos os projetos que for
chamado a liderar. Tendo em conta o percurso profissional do treinador
e a forma como se projeta a sua atuação futura, importa reconhecer o
caminho percorrido até então.
De uma atividade pouco reconhecida até a importante função social
que desempenhará, enunciam-se interessantes desafios à carreira profis-
sional do treinador. Esta demanda requererá uma maior solidez de co-
nhecimentos por forma a exercer com competência as diferentes funções
que vier a ser convidado a exercer.
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Caracterização do Esporte
no Século XXI
A.RICARDO / Shutterstock.com
Iniciamos esta matéria com o propósito de enqua- apesar do esporte de rendimento ser seguido apai-
drarmos o esporte na sociedade atual e perspecti- xonadamente por cada vez mais pessoas, não existe
vando como se desenvolverá no futuro. A ideia será um reflexo desta paixão no incremento do número
refletir melhor sobre a forma como se deve prepa- de praticantes esportivos.
rar o profissional do esporte para ele atuar com Tomando o exemplo do Brasil, quantas pessoas
competência. praticam esporte e de que maneira o fazem? O Mi-
O esporte tem sido um instrumento para a in- nistério do Esporte (BRASIL, 2015) encomendou
dústria que, por meio da sua utilização, obtém uma pesquisa denominada de Diagnóstico Nacional
grandes proveitos impulsionando as economias na- do Esporte (Diesporte) em que traçou, por um lado,
cionais. Para este feito, com o apoio dos órgãos de o perfil do praticante de esporte ou de atividade físi-
comunicação social, promovem-se espetáculos es- ca e, por outro lado, o sedentário (indivíduo que não
portivos e originam-se novas estrelas mediáticas que faz atividade física ou esporte). Os resultados indi-
alcançam grande repercussão mundial. Contudo, cam que 45,9% dos brasileiros (67 milhões) são se-
44
EDUCAÇÃO FÍSICA
dentários, sendo que as mulheres representam uma pulação, enquanto os outros 28,5% se declaram pra-
maior percentagem, com 50,4%, enquanto os ho- ticantes de atividade física. Caraterizando um pouco
mens estão em 41,2%. Os sedentários são em menor melhor, verifica-se que os homens (35,9%) praticam
número na faixa etária mais jovem, mas progridem mais esportes que atividades físicas (22,9%), e que
com a idade. Em relação a países como Argentina esta tendência se inverte quando consideramos as
(68,3%) e Portugal (53%), verificamos que a taxa de mulheres, com somente 15,6% praticando esporte e
sedentarismo do Brasil é bem inferior. É ligeiramen- 34% relatando que faz atividade física.
te menor que a da Itália (48%) e ligeiramente maior É estimulante para essa matéria constatar que o
que a dos Estados Unidos (40%). A população de se- caminho pelo qual o brasileiro inicia a sua prática
dentários é muito inferior em países como Espanha esportiva é, maioritariamente (48%), na escola, com
(35%), Uruguai (34,1%), Canadá (33,9%), França a orientação de um professor, e se inicia entre os 6
(22%) e Inglaterra (17%). Será importante notar, no e 14 anos. A modalidade esportiva mais praticada é,
relatório referido, que a faixa de idade dos brasileiros sem surpresa, o futebol (59,9%). sendo seguida do
na qual se regista um maior abandono do esporte ou voleibol (9,7%). Os autores do estudo registraram,
da atividade física se dá entre os 16 e 24 anos, indi- ainda, que 90,3% dos entrevistados não recebem
cando, igualmente, que 90% dos abandonos surge até qualquer tipo de orientação quando fazem atividade
os 34 anos. É interessante constatar, no mesmo rela- esportiva, e que 92,4% não têm qualquer filiação a
tório, que os praticantes esportivos são 25,6% da po- uma instituição para efetuar a prática esportiva.
45
INICIAÇÃO ESPORTIVA
A gestão esportiva profissional trouxe novas estra- sentido, ao fomentar um estilo de vida saudável e
tégias de marketing, planos de negócios e expansão promover os valores que lhe são próprios, o esporte
dos esportes para novos mercados. O crescimen- suscita um ser humano melhor. Carece, por isto, de
to do rádio e da televisão fez com que o esporte se se considerá-lo como uma atividade educativa e for-
tornasse parte do dia a dia das pessoas. As estrelas mativa, em que o intuito será criar um cidadão com
esportivas passaram a fazer parte dos tabloides e das um estilo de vida ativa.
televisões, vendendo produtos diversos, tornando- Desta forma, ao olhar paro o fenômeno espor-
-se parte da realidade mundana e roubando o prota- tivo, deveremos ter consciência do seu alcance e de
gonismo que, no século passado, pertencia às estre- sua amplitude. A atividade física e a competição es-
las de cinema. tão no âmago das definições de esporte.
Assim, quando a globalidade dos indivíduos re- De acordo com Resende (2016), uma organi-
flete sobre o esporte ou a atividade física, não lhe zação internacional denominada SportAccord, que
ocorre o que ela pode fazer como praticante, mas aglomera federações esportivas internacionais, além
sim, os resultados esportivos do seu clube, das gran- de outras organizações, define esporte como uma
des competições em que o seu país está envolvido ou atividade que:
as medalhas obtidas nas Olimpíadas. Por outro lado, • Deve incluir um elemento de competição;
essa globalidade associa ao esporte as personagens • Não deve recair em qualquer elemento de
mais relevantes e as marcas que a elas estão relacio- ‘sorte’;
nadas (SPRACKLEN, 2015). • Não deve apresentar risco para a saúde ou se-
Refletindo sobre aquilo que pode ser o esporte gurança dos seus praticantes;
no futuro, não podemos deixar de considerá-lo e • Não pode de nenhuma forma ser prejudicial
para qualquer criatura viva e;
aceitá-lo como um espetáculo no qual as regras do
• Não deve depender de equipamentos provi-
mercado econômico ditarão as suas leis. Contudo, o
denciados por um só fornecedor
esporte pode desempenhar uma importante função
social, pois oferece oportunidades para melhorar o Ainda segundo o mesmo autor, além dessas caracte-
autoconhecimento e a autovalorização, reforçando, rísticas, o esporte se situa como:
desta forma, a própria identidade e, com isso, a da • Principalmente físico;
comunidade onde ele está inserido. • Principalmente mental;
Para além das sensações descritas anteriormen- • Principalmente motorizado;
te, o esporte pode constituir uma importante forma • Principalmente coordenativo;
de promoção da saúde, combatendo aquilo que já • Principalmente suportado por animais
se chama de doença do século: a obesidade. Neste
46
EDUCAÇÃO FÍSICA
SAIBA MAIS
Fonte: o autor.
47
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Esporte Potenciador
da Saúde das Populações
No futuro, espera-se que o esporte continue a se evi- precoces, assinala que os esportistas têm uma maior
denciar nas diferentes comunidades, tanto sob a sua disposição para hábitos alimentares mais saudáveis,
forma mais popular, por meio do esporte-espetácu- para manter um peso menor, e uma diminuição da
lo, quanto em uma perspectiva mais global, em que sedução pelo fumo ou pelas drogas. Possuem, igual-
faixas maiores da população desfrutarão das suas mente, menor tendência para expressar sentimentos
potencialidades. O reconhecimento de que as impli- de desânimo e de aborrecimento ou tédio (MU-
cações da prática do esporte poderão ser benéficas, LHOLLAND, 2008).
tendo reflexos positivos sociais, implicará a promo- A investigação tem contribuído para a solidi-
ção e a maximização da sua prática. ficação da opinião de que a atividade física e es-
As razões pelas quais é importante promo- portiva praticada pelos jovens e pelos adolescentes
ver o esporte, sobretudo nas faixas etárias mais tem um forte tributo na promoção da saúde públi-
48
EDUCAÇÃO FÍSICA
ca. Acresce esta importância, em termos de bene- Tal como já apontamos, o esporte de alto rendi-
fícios, quando a participação esportiva é realizada mento não é a única forma pela qual devemos
de uma forma consistente (TELAMA, 2009). Por observar e considerar a atividade esportiva. Con-
isto a importância de a participação esportiva ser siderando o espectro da participação esportiva,
integrada em um programa esportivo, desenvol- protagonizado pelo ICCE (International Council
vendo-se de forma significativa e persistente ao for Coach Education) e pela ASOIF (Association
longo do tempo. Aliás, reforçando a ideia ante- of Summer Olympic International Federations) em
rior, Kjonniksen, Fjortoft e Wold (2010), em uma 2012, duas organizações internacionais que fo-
pesquisa com 630 participantes, verificaram uma mentam o esporte, o estudam e o promovem, pro-
relação positiva entre a participação esportiva or- curando qualificá-lo pela melhor preparação dos
ganizada e o desenvolvimento de atividade física treinadores, identificamos dois tipos diferentes de
em idades adultas. Ou seja, a prática esportiva em participação esportiva, o que também foi eviden-
idades mais jovens antevê o envolvimento com a ciado por Resende (2016) e que podemos observar
atividade física quando se é mais velho, sendo con- na citação a seguir, assim como na Figura 1.
sistente defender a formação esportiva como um • O esporte de participação que envolve
instrumento para a promoção de hábitos de saúde crianças, jovens adolescentes e adultos e tem
no presente e para o futuro. como objetivo resultados auto referenciados
Salienta-se a evidência de que o esporte promo- como o entretenimento, o desenvolvimento
ve, para além das competências esportivas, compe- de habilidades e o vínculo com um estilo de
vida saudável.
tências de vida (aspecto que trataremos com maior
• O esporte de rendimento que engloba atletas
relevância) o que, naturalmente, faz com que o trei-
emergentes, atletas de performance e atletas
nador deva investir nesta ideia. Aliando o conheci-
de elite
mento que ele possui dos atletas e das suas neces-
sidades, o treinador poderá incrementar de forma
muito positiva as aptidões desses atletas para a vida
(WHITLEY; WRIGHT; GOULD, 2016), considera-
-se que as competências de vida oriundas por meio
do esporte podem ser transferidas para outras rea-
lidades. Para isto, o treinador terá de agir de uma
forma consciente, enfatizando a aquisição de habi-
lidades transversais aos diferentes domínios em que Figura 1 - Espectro da participação esportiva
ele está envolvido e, assim, dotando os atletas de Fonte: ICCE e ASOIF (2012).
49
INICIAÇÃO ESPORTIVA
50
EDUCAÇÃO FÍSICA
51
INICIAÇÃO ESPORTIVA
A modernização dos clubes esportivos será uma re- ção esportiva. Aliás, assiste-se à emergência
alidade no panorama de uma sociedade plural, de- de um grande número de ‘escolinhas’ e ‘aca-
demias’ esportivas, com vínculos aos clubes
senvolvida e a serviço das populações.
esportivos tradicionais ou a atuarem de forma
autónoma (RESENDE, 2016, p. 38).
O campo de intervenção dos clubes esportivos
(inspirado no livre associativismo) está-se a
Este novo cenário esportivo provoca profundas
alterar pois, de locais onde os jovens ingres-
savam para jogar, numa perspetiva de proxi- alterações na adesão ao esporte, pois os atletas co-
midade e oportunidade, de onde emergiam os meçaram a se constituir como clientes, exigindo
mais aptos para voos mais desafiantes, estão, a prestação de um serviço melhor. Consideramos
para fazer face às despesas, a transformar-se que a procura do esporte pelas crianças e pelos jo-
em empresas para sobreviver. Desta forma,
vens nasce de uma vontade intrínseca de praticar,
apesar de essencialmente motivados para o
esporte de rendimento, os clubes passaram e com forte apoio dos pais, que valorizam muito
igualmente a prestar um serviço de participa- esta atividade.
52
EDUCAÇÃO FÍSICA
Todavia, de tolerado pela família, invocando ficados, e bem equipado em termos materiais e
que nestas idades a ocupação pelo esporte era de instalações. Neste contexto, e tendo como re-
boa, estimulava o corpo e desviava os jovens
ferência as academias e a sua enorme expansão
de ‘más companhias’, a ser praticado antes de
adotar as responsabilidades de adulto, pas- – o Brasil tem o maior número de academias do
sou a constituir uma necessidade educativa mundo, cerca de 20 mil, contando com 3,6 mi-
que transcende a mera prática. Desta forma, lhões de usuários (ANDREAZZI et al., 2016) –, os
a qualidade do serviço prestado passa a ser
melhores exemplos reúnem um conjunto de va-
equacionado sob perspetivas substancialmente
distintas das que eram observadas no passado, lias que são muito apelativas, a saber (RESENDE,
exigindo melhores condições materiais e um 2016, p. 39):
acompanhamento pedagógico de qualidade • Um ambiente atraente;
(RESENDE, 2016, p. 39). • Atividades diversificadas;
• Autonomia de horários;
Com esta nova postura, o treinador esportivo • Profissionais qualificados e profundamente
será forçado a adaptar-se e a preparar-se de forma diligentes;
condizente. • Avaliações e aconselhamentos pessoais ao ní-
Constituindo-se como empresa, o clube es- vel da prescrição do exercício e de nutrição;
portivo, apesar de estar configurado para o espor- • Constante renovação de atividades;
te de rendimento, terá que se reinventar, alargan- • Acompanhamento personalizado se desejado
pelo cliente;
do o seu campo de recrutamento para o esporte
• Possibilidade de um retorno à calma sofisti-
de participação, fornecendo um serviço reputado
cada, como é o SPA.
com treinadores profissionais altamente quali-
53
INICIAÇÃO ESPORTIVA
54
EDUCAÇÃO FÍSICA
De acordo com Resende (2016, p. 40): o filho está bem acompanhado, desfrutando de uma
formação holística, em um ambiente seguro, e com
[...] a oferta do clube deverá incluir o desporto o propósito de um desenvolvimento de maneira po-
de participação e o de performance contem-
sitiva. Desta forma, os pais terão de ser considerados
plando níveis de rendimento/competição dife-
renciados e, por via dessas diferenças, estraté- como parceiros essenciais na dinâmica do clube e no
gias de intervenção adequadas aos objetivos de projeto esportivo do seu filho. Por isso, se torna de-
cada uma das realidades. A título de exemplo, terminante fundamentar devidamente o que se pre-
duas equipas de infantojuvenil, em que uma tende deles para que o desenvolvimento do seu filho
treina duas vezes por semana e a outra quatro
ocorra de forma integral. Uma sã convivência entre
vezes, aos quais se acrescentam as competições
(habitualmente ao fim de semana). O tipo de todos os parceiros fará emergir uma dinâmica so-
exigência colocado na qualidade do treino e da cial no clube, o que conduzirá a melhores resultados
qualificação do treinador deverão ser idênticos, educacionais e esportivos.
ou seja, o objetivo continua a ser competir e pre-
A política de exclusão, tantas vezes observadas
parar-se para essa competição, contudo, o tem-
po de treino é distinto e, obviamente, o tipo de nas rotinas dos clubes, deve ser evitada. Ao invés
investimento pessoal dos atletas também é dife- disto, os clubes devem apostar claramente em estra-
rente. A seriedade com que se encara o processo tégias de integração no processo esportivo dos seus
deverá ser de todo similar, considerando os ob-
filhos, com normas e procedimentos bem claros a
jetivos diferenciados. Se os projetos esportivos
das diferentes realidades estiverem claramente aceitos por estes.
definidos, a coexistência é benéfica, devendo
existir sempre a possibilidade de transversalida- O treinador, como responsável máximo pelo
de entre projetos, pelo aumento ou diminuição processo esportivo, deverá proporcionar infor-
do investimento pessoal do atleta. mação aos pais, de forma a que estes possam
constatar a evolução do seu filho, a exemplo
da escola que o faz através do boletim de re-
Este processo faz apelo a uma seriedade profissional sultados escolares. Sugere-se a criação de uma
na intervenção com os jovens a qual, por sua vez, ficha do atleta, da qual resultará a informação
a ser enviada aos pais com a periodicidade
não se compadece com leviandades. Está em risco
mais adequada à atividade desenvolvida, mas
o abandono prematuro da atividade esportiva por não inferior a duas vezes por época esportiva.
parte dos jovens e este pode ser combatido por uma A qualidade desta informação e a forma como
visão que não tenha como única direção o esporte é veiculada, diferencia a qualidade do serviço
que é prestado no clube, assim como o empe-
de rendimento, em que se investe, progressivamente,
nho que o treinador revela na forma como se
mais tempo, ou se desiste. preocupa com a evolução do atleta (RESENDE,
Reforçamos que a todos deve ser dada a opor- 2016, p. 41).
tunidade de praticar esporte de acordo com as suas
motivações e a possibilidade de tempo ou de talento Entre as competências dos treinadores, evidencia-
demonstrado. Para alcançar este objetivo, o serviço -se a necessidade de uma boa relação com os pais
a ser prestado pelos clubes deverá ser melhorado, as- dos seus atletas e um comprometimento com o seu
segurando aos pais e encarregados da educação que desenvolvimento, em total sintonia e cumplicidade.
55
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Considerando que o esporte está longe de se esgotar Considerando o perfil deste segmento etário, o trei-
nos mais jovens: nador deverá considerar outras vertentes para a sua
atuação, nomeadamente, a de promotor de eventos
[...] no caso do esporte de participação para de aspecto social, valorizando formas de confrater-
adultos, o tipo de acompanhamento e rigor
nização, reforçando, desta forma, o sentimento de
deverá ser similar, com o treinador a adaptar
as exigências do processo de treino através de pertença e o valor da vida na sua plenitude.
uma forma negociada com os atletas. Por ven- Acreditamos que envolvendo os clubes, os diri-
tura, neste caso, a ficha do atleta deverá consti- gentes, os treinadores, os pais e os atletas, será evi-
tuir um acompanhamento do estado do atleta, denciada uma forma positiva de encarar o esporte e
monitorizando a sua saúde e servindo de ‘ala-
reforçará a sua importância na esfera social.
vanca’ motivacional para uma prestação espor-
tiva consentânea com os objetivos estabelecidos
entre si e o treinador (RESENDE, 2016, p. 41). Os treinadores que encarem o esporte com uma
responsabilidade que ultrapassa o próprio es-
porte, encetam uma via para o exercício profis-
O uso dos novos meios de controle do esforço, pos- sional de uma forma progressista, muito mais
sibilitados pelas aplicações informáticas, podem ser ampla e cujos contributos sociais consideramos
um auxiliar fundamental na promoção da motiva- ser de forte relevância (RESENDE, 2016, p. 42).
ção para uma regularidade da prática esportiva.
Para fazer face às intenções enunciadas anterior-
mente, as competências do treinador, figura nuclear
de todo o processo, deverão emergir de amplos co-
nhecimentos, de forma que ele exerça profissional-
mente a sua atividade de maneira eficaz.
REFLITA
56
EDUCAÇÃO FÍSICA
57
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Contexto Histórico da
Intervenção do Treinador
emka74 / Shutterstock.com
58
EDUCAÇÃO FÍSICA
do esporte moderno foi fundamental para a ressur- mais às classes trabalhadoras, em que os esportes
reição, em 1896, dos Jogos Olímpicos como ativida- mais populares eram o pedestrianismo e o boxe.
de elitista e amadora. Apesar de existir um componente de classe para
No século XX, o esporte tornou-se moderno, esta diferenciação, existia uma distinção mais prá-
uma vez que ele não se distinguia mais da indústria tica, pois, nos primeiros esportes, existia a ideia de
do entretenimento. O esporte de elevada perfor- refinamento das habilidades (técnica), enquanto os
mance tornou-se altamente profissional, com cres- esportes plebeus estavam mais focados nos atributos
centes investimentos pelas empresas privadas e pe- físicos daqueles que os praticavam.
las nações. Ser um atleta profissional ou treinador A partir do momento em que o esporte ganhou
passou a ser uma opção alternativa de carreira para expressão, todos os grupos sociais envolvidos em
os jovens. Infelizmente, o esporte de participação foi atividades com competição e cujo resultado era de-
marginalizado nas políticas governamentais e nas terminado pela atividade física, estratégia, ou opor-
organizações desportivas. tunidade tinham Coaches. Para isso, era necessária
uma adequada preparação, desde especialistas em
TREINADOR: UM PERFIL EM DIREÇÃO À esgrima ou professores de equitação, treinadores de
PROFISSIONALIZAÇÃO luta livre e mestres de armas. Todos estes reuniam
informação e depois empregavam métodos verbais e
A figura do treinador surge de forma pouco respei- visuais para transmitir a sua experiência aos atletas.
tada, pois quando se começa a popularizar o espor- O seu conhecimento acumulado, combinado com
te (na Inglaterra, no auge da Revolução Industrial), o seu crescente empreendedorismo, providenciou a
o esporte não era considerado conteúdo de ensino plataforma na qual os indivíduos desenvolveram a
(DURING, 1994). De acordo com o autor citado, os arte do treino no século XVIII e seguintes, refletin-
pedagogos ingleses indicavam que a passagem das do-se na preparação competitiva e no aumento do
regras do jogo para as regras da vida era tão mais efi- número de profissionais envolvidos.
ciente quanto mais discreta fosse a interferência do Paralelamente, uma cultura de apostas incen-
adulto. Neste sentido, o esporte serviria para edu- tivou meios de subsistência, pois aristocratas co-
car de forma cívica e moral por si só e, por isto, não locavam treinadores profissionais para preparar os
carecia de professores. “seus” atletas. Como em todas as eras, os treinadores
O termo Coach, do qual decorre a palavra “trei- não trabalhavam sem constrangimentos em relação
nador”, surgiu, inicialmente, na Inglaterra, referin- ao seu comportamento. Era-lhes requerido seguir
do-se à carruagem (Coche), mas também se tornou regras impostas pelos seus empregadores que, por
uma expressão coloquial que se referia a um tutor sua vez, avaliavam as suas credenciais antecipada-
privado no início do século XIX. É interessante real- mente à sua contratação e monitorizavam-os de for-
çar que, quando o Coaching começou a ser associa- ma muito próxima durante o período de treino. O
do com o esporte, foi sobretudo nas modalidades de treinador teria que agir com inteligência e firmeza,
classe social mais elevada, como o remo ou o cricket. liderar por meio do exemplo e relatar com sinceri-
A nomenclatura Trainer era uma designação afeita dade os progressos obtidos.
59
INICIAÇÃO ESPORTIVA
60
EDUCAÇÃO FÍSICA
contribuíram para elevar a performance dos espor- Com a crescente exigência competitiva e os
tistas. Esta fase da evolução do esporte denomina-se montantes econômicos envolvidos, a direção do
de período científico (TUBINO, 1987), ou de siste- processo de treino de alto rendimento é liderado
matização (MANSO, VALDIVIESO; CABALLERO, por um treinador que reúne uma equipe de espe-
1996), em que se multiplicam laboratórios de pes- cialistas sob as suas ordens. Podemos enumerar
quisa científica nas áreas biológicas e se promovem como exemplo: os assistentes diretos do treinador
novas concepções de treino. em campo, depois, os que colaboram de forma mais
Seguindo esta evolução científica, sobressai a indireta, como o médico e o fisioterapeuta, ou o es-
formação de treinadores em uma base nacional, tatístico e o scouter (técnico cuja missão é observar
colocando estes profissionais como personagens a equipe adversária), entre outros profissionais que
centrais no processo de treino, essencialmente nos cuidam para que nada falte aos atletas na busca da
países do Leste Europeu. Consequentemente, esta sua melhor performance.
alteração valorizou a função da liderança do pro- Como consequência, a preparação para ser trei-
cesso de treino do ponto de vista social e também nador de elevado rendimento, um líder de um pro-
enquanto profissão. cesso de treino, exige o domínio de conhecimentos
Ao reconhecer a importância da qualificação que lhe permitam “digerir” todo o manancial de
de treinadores em relação à promoção do esporte, informação que os seus colaboradores lhe trazem
criou-se programas de formação especializada des- para, assim, tomar as decisões mais adequadas.
tes agentes. Como consequência, exercer a profissão
de treinador é uma ocupação respeitada nesses paí-
ses (WOODMAN, 1993).
O desenvolvimento da Educação Física (EF)
como uma disciplina acadêmica a partir dos anos 70
deu um impulso à qualidade de treino, particular-
mente no que se refere à área da Pedagogia. A este
propósito, Lyle (2002) referindo-se um relatório do
English Sport Council, de 1997, assinala que 13% dos
treinadores em atividade eram oriundos do ensino.
Este autor acrescenta, ainda, que a grande maioria
de professores de EF eram treinadores após cumpri-
rem as suas obrigações profissionais nas escolas.
A partir dos anos 80, houve uma alteração gra-
dual e de grande importância entre a lógica política
e a lógica do mercado. A representação do clube e
do país enquanto embaixadores políticos do seu re-
gime, foi substituída pela representação de grandes
multinacionais (PISANO, 2003).
61
considerações finais
O
enquadramento do esporte na sociedade deste século reveste-se de
uma grande relevância, pois permite ao profissional do esporte equa-
cionar e projetar de forma adequada a sua intervenção. Com a preo-
cupação subjacente de fazer com que o esporte contribua para melho-
rar a saúde das populações, nomeadamente por meio do fomento de um estilo de
vida saudável, os clubes esportivos terão que se reinventar.
Esses clubes terão de deixar de dispor somente de um caminho único que leva
ao alto rendimento (fomentando a exclusão pela seleção dos mais habilidosos),
para prestar um serviço mais eclético, envolvendo um maior grupo de cidadãos
que desejam praticar esporte. Deverão modernizar-se, profissionalizar todas as
suas estruturas e aparelhar-se bem, diversificando a sua oferta. Surgirão diferen-
tes formas da participação esportiva que necessitarão, por sua vez, de treinadores
qualificados, os quais respondam com competência a esta procura.
O perfil profissional do treinador, que vem alterando-se pelas demandas cada
vez mais complexas e específicas, verá a sua oferta diversificar-se, implicando
uma gama de conhecimentos e de competências mais sólidas. Não será mais
possível ao treinador somente saber do esporte em concreto. Ele terá que domi-
nar um conjunto de conhecimentos diversificados, alicerçados nas ciências que
suportam a atividade esportiva (ciências biológicas, ciências humanas e sociais)
para, com a intervenção pedagógica adequada, estimular uma aprendizagem só-
lida do atleta, seja este de participação (criança, jovem, adulto) ou de rendimento
(jovem ou adulto).
Neste sentido, o treinador terá que dar respostas às crescentes exigências que
lhe são colocadas, demonstrando uma capacitação e uma mestria reveladora dos
desafios que enfrentará. Somente deste modo ele poderá reivindicar e exigir a
consideração merecida pela sua atividade profissional.
62
atividades de estudo
1. Considerando a relevância do esporte para além 4. Imagine que um clube esportivo terá de enfren-
dos resultados das competições, o esporte é, tar novos desafios em sua atividade. Em relação
atualmente, uma atividade econômica de: à modernização desse clube, assinale a alterna-
a) Fraca relevância nacional. tiva correta.
63
LEITURA
COMPLEMENTAR
64
LEITURA
COMPLEMENTAR
65
material complementar
66
material complementar
História do Desporto
Thierry Terret
Editora: Publicações Europa-América
Sinopse: o desporto, tal como o conhecemos hoje, com as suas regras e técnicas,
as suas práticas e praticantes, as suas representações e instituições, os seus re-
cordes e valores, encontra a sua gênese na Inglaterra em plena Revolução Indus-
trial do século XVIII. As práticas mais antigas estavam ligadas a funções militares,
educativas ou sagradas, e não podem ser ligadas às lógicas desportivas contem-
porâneas, que oscilam entre tradição, peso do mercado e tramas políticas. Desde
as public schools até Zinedine Zidane, esta obra reconstitui a história do desporto
e mostra como o estudo daquilo que constitui uma verdadeira cultura de massas
oferece um dos melhores espelhos da nossa sociedade.
67
referências
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68
gabarito
1. B;
2. A;
3. E;
4. B;
5. B;
69
CONHECIMENTOS E COMPETÊNCIAS
DO TREINADOR
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta
unidade:
• Conhecimentos do treinador
• Competências do treinador
• Domínios de desenvolvimento dos atletas
• Caraterização do esporte juvenil
Objetivos de Aprendizagem
• Identificar os diferentes tipos de conhecimentos do
treinador.
• Estudar as competências necessárias para o treinador
desempenhar a sua atividade.
• Nomear e reconhecer os diferentes domínios de
desenvolvimentos dos atletas.
• Caracterizar o esporte juvenil.
unidade
III
INTRODUÇÃO
P
ara desempenhar com qualidade qualquer atividade profissional,
é necessário possuir um conjunto de conhecimentos que permi-
tam atuar com competência. No caso do treino esportivo, ainda
recentemente se considerava suficiente o domínio do conteúdo
específico da modalidade para ser treinador. Nomeadamente, ter sido um
atleta preconizava requisitos suficientes para exercer a atividade.
Os problemas e as situações com os quais o treinador se depara, con-
tudo, são muito mais abrangentes que aquelas contidas no esporte por si
só. Carece o treinador de adquirir um conjunto de conhecimentos para
lidar com o processo de treino de forma a promover os que nele estão
envolvidos. A sua instrução não tem uma via única e pode ser obtida de
diversas formas. Importante será que as formações obtidas ao longo da
sua carreira mobilizem a sua capacidade de pensar, decidir e refletir a sua
prática de forma contínua.
Consequentemente, para promover a eficácia da sua atividade, o trei-
nador deverá desenvolver conhecimentos de nível profissional, interpes-
soal e intrapessoal. Os conhecimentos sustentam o exercício competen-
te da atividade, transformando o saber em saber-fazer. Treinadores de
sucesso evidenciam perfis de atuação caracteristicamente comuns, dos
quais destacamos uma permanente vontade de aprender, encontrar no-
vas soluções para os problemas que enfrentam, reavaliando, por meio de
uma autorreflexão permanente, a sua atividade.
A ação do treinador deve resultar nas aprendizagens dos atletas, a sua
atuação deve ter uma base pedagógica que permita o melhor desenvolvi-
mento desses atletas de acordo com os valores inerentes ao esporte. Exem-
plos práticos de qualidades de treinadores de jovens eficientes são propostas
por meio de características de treino. A caraterização do esporte juvenil ga-
nha pertinência no sentido em que este abarca uma faixa etária com diferen-
ças substanciais entre si, as quais, por sua vez, ocorrem em um curto período
de tempo, e para as quais o treinador deve estar devidamente preparado.
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Conhecimentos do
Treinador
O que é preciso para ser treinador? Como fazer para A complexidade e a responsabilidade do trei-
ser um bom treinador? Medir a qualidade deste pro- nador não se extinguem no domínio e no conheci-
fissional pelos resultados esportivos alcançados é mento específico da modalidade (nos seus aspectos
uma visão muito redutora da sua atividade, apesar técnicos, táticos e estratégicos), pois a generalidade
de ser esta a forma mais veiculada ao senso comum. das solicitações as quais ele é sujeito extravasa, em
Exploraremos a razão pela qual consideramos que o muito, este tipo de competência. O treinador assu-
treinador necessita de amplos conhecimentos para me múltiplos papéis, entre os quais o de líder, amigo
desempenhar com sucesso a sua atividade. e confidente e, por vezes, de pai ou de mãe.
74
EDUCAÇÃO FÍSICA
Esta unidade pretende elucidar sobre a comple- tecnologias. Para alcançar este objetivo, o treinador
xidade que envolve a atuação do treinador e que, terá de envolver-se em ações de formação de cará-
por consequência, exige um leque grande de conhe- ter formal, não formal e informal. A seguir, serão
cimentos, os quais devem despontar a partir de uma definidos estes conceitos.
pessoa culta. A razão pela qual chamamos a atenção Formação regular é aquela que decorre em um
para a palavra “culto” advém do fato de se requerer contexto cuja aprendizagem ocorre em ambientes
que um treinador concentre em si muito mais que institucionalizados, como os cursos de ensino supe-
o conhecimento e o domínio específicos de um es- rior relacionados à Educação Física e às Ciências do
porte. Ele deverá ter uma profunda consciência do Esporte, e programas convencionais de certificação
mundo que o rodeia e promover os valores sociais e de treinadores, que são ofertados por organizações
culturais, incentivando a participação cívica de to- governamentais ligadas ao esporte.
dos os envolvidos. • Aprendizagem não formal acontece pelo en-
Questiona-se, então, quais tipos de conheci- gajamento em atividades sistematicamente or-
mentos serão necessários para o treinador exercer ganizadas, ocorridas fora do ambiente formal.
Os locais onde estas ações se desenvolvem são
com competência e eficácia a sua função. Como já
variados, e as atividades, geralmente, são di-
afirmamos, a atividade do treinador é complexa e recionadas a grupos específicos. As conferên-
apela a um domínio de matérias que extravasam o cias, workshops, seminários e cursos de curta
âmbito do treino, dos atletas ou da competição. Im- duração oferecidos pelas federações são alguns
plica saber como colocar em prática uma atividade exemplos deste contexto de aprendizagem.
desportiva (ou um processo de treino), mas, igual- • A aprendizagem informal resulta de um pro-
mente, possuir uma compreensão crítica de como o cesso contínuo de formação que se prolonga
conhecimento deve ser relacionado com a prática de durante toda a vida. Ocorre por meio da intera-
ção com outros treinadores pelas experiências
forma adequada.
profissionais vivenciadas diariamente, das re-
Consequentemente, o treinador necessita de- flexões sobre a própria atividade, entre outros.
senvolver competências que vão ao encontro do
contexto em que ele atuará e de acordo com as ne- A atividade do treinador é sustentada por um con-
cessidades dos atletas. Ao ampliar a sua experiên- junto de conhecimentos e competências que se rela-
cia, ele precisa alargar o seu leque de conhecimen- cionam especificamente com o domínio da sua área
tos, suportados nas diferentes ciências que apoiam de intervenção, mas requer igualmente o envolvi-
o esporte, como são as ciências biológicas, as ciên- mento com os outros atores do cenário esportivo.
cias sociais e as metodologias de treino, nas quais Mobiliza, por isto, a capacidade de pensar, decidir e
se inserem com cada vez mais premência as novas refletir sobre a sua prática.
75
INICIAÇÃO ESPORTIVA
CONHECIMENTO PROFISSIONAL
Concretamente, quais serão, então, as habilidades a É um conhecimento que engloba o conteúdo espe-
serem desenvolvidas pelo treinador como forma de cífico do processo de treino e a forma como o trei-
ser eficaz na execução da sua tarefa? nador vai processar o ensino e a aprendizagem das
Sentimos, por isto, a necessidade de definir efi- habilidades esportivas. Estes conhecimentos podem
cácia, e recorremos à definição de Côté e Gilbert considerar:
(2009, p. 316) que indicam ser “a aplicação consis- • As áreas específicas do esporte, como a téc-
tente de conhecimento profissional integrado, inter- nica e a tática, os diferentes regulamentos e
pessoal e intrapessoal para melhorar os atletas” na regras das modalidades, as instalações e os
equipamentos.
sua competência, confiança, caráter e conexão com
• Os atletas, nomeadamente por meio do co-
os outros em contextos específicos de treinamento.
nhecimento sobre as suas capacidades, res-
Os autores consideram que a eficácia de um treina- pectivos estágios de desenvolvimento e a sua
dor depende de três fatores: motivação.
• Do conhecimento do treinador. • As ciências do esporte: as áreas biológicas,
• Dos resultados dos atletas. sociais e pedagógicas, como a fisiologia e a
• Dos diferentes contextos onde os treinadores medicina, ou a sociologia e a psicologia, ou a
tipicamente trabalham. didática e a gestão esportiva.
• O domínio da comunicação, tanto na sua
Definimos, em seguida, o que os autores entendem oralidade como na sua escrita, a matemática,
o uso da tecnologia.
por conhecimento profissional, interpessoal e intra-
pessoal (RESENDE; GILBERT, 2015, p. 28).
76
EDUCAÇÃO FÍSICA
Este conhecimento incide na forma como são esta- Inerente a este conhecimento, está a autoconsciên-
belecidas as relações dentro do ambiente esportivo. cia do treinador e a sua capacidade autorreflexiva.
Podem ser consideradas as seguintes áreas, de acor- Neste conhecimento, podem ser observadas as se-
do com Resende e Castro (2015): guintes áreas:
• O contexto social, onde o treinador deve in- • Filosofia pessoal, identidade, valores e
tegrar a macro e a microcultura do treino crenças do treinador, além do seu estilo de
esportivo; o domínio ético e a segurança da liderança.
participação esportiva por parte dos atletas; • A aprendizagem ao longo da vida, que exi-
a relação com a família e com as pessoas que ge do treinador competência na aprendiza-
mais diretamente acompanham os atletas; a gem, autonomia e responsabilidade. O trei-
afinidade com os colegas treinadores; a rela- nador deve desenvolver uma mentalidade
ção com os agentes esportivos como árbitros, adequada, a autorreflexão de forma contí-
dirigentes e com as entidades como os clubes nua e consistente, a capacidade de síntese
e as federações; a relação com os meios de co- crítica, a promoção da inovação e a criação
municação social. de conhecimento.
• A forma como se estabelece o relaciona-
mento através da comunicação; fomentar
Considerando a noção de eficácia expressa anterior-
a empatia e simpatia; ser um bom ouvinte
e questionar de forma pertinente; ter uma mente, as áreas de conhecimento descritas deverão
conduta pessoal apropriada; gerir e formar constar no repertório do treinador, de forma a po-
adequadamente o grupo como um todo e os der aplicá-las de forma crítica e com consistência
atletas individualmente. enquanto decorre a sua intervenção.
• O conhecimento da metodologia do treino
inclui-se no conhecimento interpessoal pois REFLITA
enfatiza-se que o treino, pelo desenvolvi-
mento que potência, se efetiva no contexto
da relação pedagógica estabelecida entre o Um exercício sobre a eficácia de um treinador
treinador e o atleta. Neste contexto, emergem é pensar em um desses profissionais que você
as seguintes áreas: metodologia e teoria da já teve a oportunidade de encontrar. Quais as
suas três melhores qualidades? E três delas
aprendizagem; planeamento, organização e
que menos lhe agradaram? Ao registrar por
concretização; criação de um clima positivo escrito estes aspectos, você estará refletindo
de aprendizagem; observar, avaliar e propor- sobre a forma como os seus futuros atletas
cionar um feedback adequado; explicar e de- o recordarão.
monstrar, instruir de forma apropriada
77
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Competências do
Treinador
A competência, no seu sentido mais lato, significa ser arbitragem, dentre outras), o treinador desenvol-
capaz de aglomerar um conjunto de conhecimentos ve a competência para saber como desempenhar
diversificados, desde os teóricos até os práticos, de a função. A competência emerge como fruto do
forma a corresponder à realização de uma tarefa com domínio dos conhecimentos adquiridos e tende
qualidade. Neste sentido, competência traduz-se pela a reconstruir-se de forma permanente com a ex-
qualificação de uma pessoa que expressa grande auto- periência adquirida, em função da reflexão que
ridade em um determinado assunto. advém dessa mesma experiência. Acredita-se que
Por meio do domínio de conhecimentos gerais a reflexão resulta da forma como se colocou em
(ciências que apoiam o processo de treino, como a prática o processo de treino e dos contextos reais
fisiologia ou biomecânica nas ciências biológicas, vivenciados, transformando, assim, experiências
ou a psicologia ou a pedagogia nas ciências so- em melhores competências e, consequentemente,
ciais) e específicos da modalidade (técnica, tática, em autonomia profissional.
78
EDUCAÇÃO FÍSICA
O International Council for Coaching Excellence (ICCE, 2013, p. 16) refere e elenca as com-
petências que o treinador necessita para a sua atuação, estabelecendo um conjunto
de funções primárias que confluem em habilidades específicas (competências).
79
INICIAÇÃO ESPORTIVA
80
EDUCAÇÃO FÍSICA
A um nível prático, o treinador considera os atletas atletas (idade, sexo, nível de desenvolvimento, en-
como pessoas ao questionar-se sobre: tre outros), do ambiente sociocultural e das condi-
• Quais são as alternativas para transmitir a ções materiais que ele usufrui. Naturalmente, não
minha mensagem? existem situações de treino iguais, pois todas as so-
• Qual informação transmito pela minha pos- luções deverão ser específicas e de acordo com o co-
tura e pelo o que eu visto? nhecimento desenvolvido pelo treinador.
• A minha experiência como atleta influencia a
minha atuação e as minhas expectativas?
• O meu comportamento reforça estereótipos?
• Quais são os feedbacks sobre a perfor-
mance e os feedbacks comportamentais? E
quem os tem?
• O tipo de feedback reforça a aprendizagem?
• Recorro de forma suficiente à tecnologia
disponível?
81
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Domínios de Desenvolvimento
dos Atletas
Os conhecimentos adquiridos pelos treinadores de- gada, com ênfase na manutenção de um estilo de
vem resultar nas aprendizagens dos atletas. Neste vida saudável.
sentido, é importante operacionalizar a sua inter- A forma qualificada como o treinador comuni-
venção a partir de uma base de atuação pedagógica ca, explica e demonstra é decisiva para o processo de
que, por sua vez, permita o melhor desenvolvimen- aprendizagem e motivadora do seu sucesso. Signifi-
to do atleta de acordo com os valores inerentes ao cando, por isto, que se o treinador conceber empe-
esporte. A ação do treinador em relação aos atletas nhamentos de prática que promovam a motivação
procura proporcionar-lhes autonomia, e tem como para a aprendizagem, o atleta reforça a sua aptidão e
meta a construção de uma carreira atlética prolon- o seu comprometimento com a atividade.
82
EDUCAÇÃO FÍSICA
O treino intenciona desenvolver os atletas em texto esportivo específico. Será importante consi-
quatro domínios (4Cs – competência, confiança, derar que esta proposta se insere na perspectiva de
conexão e caráter) (ERICKSON; GILBERT, 2013). desenvolvimento positivo do jovem enquanto pra-
Contudo, o treinador deverá estar consciente de que ticante esportivo e enquanto ser humano. Segue o
este desenvolvimento se circunscreve em um con- Quadro sobre os quatro domínios (4Cs):
Por competência, entende-se as caraterísticas específicas do esporte no que diz respeito às téc-
nicas e táticas respectivas, a aptidão para a performance e a capacidade em melhorar os índices
de saúde, assim como a obtenção de hábitos de treino saudáveis.
• A competência técnica refere-se à capacidade de o atleta realizar as tarefas necessárias para
alcançar o sucesso esportivo.
Competência • A competência tática incide na habilidade das ações e decisões que os atletas efetuam duran-
te a competição para obter vantagem sobre os seus oponentes (tomada de decisão, leitura
de jogo e estratégia).
• As qualidades funcionais, conjuntamente com a aptidão física, são as competências que pos-
sibilitam ao atleta manifestar a capacidade esportiva específica (velocidade, agilidade e endu-
rance).
Confiança é a percepção que um atleta possui acerca do seu valor pessoal em termos globais e
esportivos, nomeadamente por meio da sua autoestima e autoeficácia. Para esta característica,
é determinante ser equacionada na qualidade da participação esportiva. Nesta particularidade,
Confiança
o tempo (continuidade) despendido, assim como a intensidade pelo número de anos em que
o atleta esteve comprometido com uma determinada atividade, é determinante para avaliar os
efeitos positivos que o esporte pode ter na formação pessoal do atleta como pessoa.
Conexão constitui-se das obrigações positivas e das relações sociais que os atletas criam com as
pessoas, dentro e fora do esporte. Constitui-se das medidas de qualidade criadas, assim como
Conexão
do grau de interação com os pares, treinadores, dirigentes e outros envolvidos no ambiente
esportivo.
Caráter engloba o respeito com o esporte e com os outros (conceito de moralidade), a integri-
dade, a responsabilidade e a empatia genericamente estabelecida. O caráter, no esporte, está
Caráter
tipicamente relacionado com os comportamentos sociais e a prevenção de comportamentos
antissociais.
Fonte: Resende e Gilbert (2015, p. 29).
Os três últimos domínios constituem medidas psi- Tendo em conta o desenvolvimento holístico
cossociais que revelam a importância para a cons- do jovem atleta e respectiva contextualização
onde se desenrola a prática esportiva, o trei-
trução de um atleta, sustentando a relevância que
nador deve estar consciente dos diferentes ti-
deve ser atribuída à sua compreensão para um trei- pos de participação esportiva que se podem
no mais eficaz. deparar aos jovens. Aqui, surge uma nova
83
INICIAÇÃO ESPORTIVA
forma de estar no esporte e que implica uma No Quadro 2, estão expostas as características que
posição substancialmente diferente da vivida um treinador de jovens deve ter para ser eficaz. Rela-
no meio esportivo até recentemente. Identi-
ciona-se à busca pelo melhor desempenho esportivo
ficam-se dois tipos de participação esporti-
va. Uma em que os atletas procuram como com os resultados psicossociais positivos dos seus
resultado da sua prática o divertimento, o atletas (ERICKSON; GILBERT, 2013). Os autores
desenvolvimento de habilidades e envolver- referenciam que os treinadores que fomentam a au-
-se num estilo de vida saudável. Outra, que tonomia parecem ter uma melhor resposta por parte
abrange o esporte de performance, em que o
desenvolvimento de capacidades atléticas e a
das crianças e jovens, pois estes profissionais promo-
sua colocação em evidência surgem através vem uma atmosfera de conhecimento por meio do
da competição (RESENDE; GILBERT, 2015, esforço pessoal em vez de procurar evitar a incom-
p. 29). petência (o erro, o fracasso ou a derrota).
84
EDUCAÇÃO FÍSICA
SAIBA MAIS
Fonte: o autor.
85
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Caracterização do
Esporte Juvenil
86
EDUCAÇÃO FÍSICA
A cultura juvenil, pelo menos no mundo desenvol- da criança no mundo esportivo, sustentando a sua
vido, expressa-se de forma muito idêntica, sendo participação tanto material como financeiramen-
que a maneira como os jovens gastam o seu tempo, te (GOMES, 2010). Sobre esta matéria, Smoll et al.
entre as tarefas escolares e as folgas, é muito similar. (2011) alertam que os familiares influenciam a inte-
A partilha de gostos e a forma como eles utilizam o gração social por meio do esporte, mas também têm
seu próprio dinheiro, a moda, as preferências musi- um impacto profundo nas consequências psicoló-
cais e, por inerência, o esporte, têm características gicas que daí resultam. Considera-se, por isto, mais
muito semelhantes. A esta generalização, que in- importante que estas experiências sejam positivas e
fluencia de modo determinante o estilo de vida des- fomentadoras de uma atitude perante a vida, atitude
ses jovens, não são imunes os avanços tecnológicos esta que seja, acima de tudo, saudável. No extremo
e a sua globalização, fazendo com que esta parte da contrário, Gomes (2011) aponta exemplos negativos
população manifeste um crescente desinteresse pela de pais que colocam expectativas elevadas na per-
leitura (ZUZANEK, 2005). formance esportiva dos filhos, fomentando níveis de
O ambiente esportivo deve ser encarado, quando pressão tão elevados que podem tornar a experiên-
se equaciona os tempos atuais, como uma microrre- cia esportiva desagradável e indesejável e, por isto,
produção da sociedade, onde a volatilidade de pro- levando ao seu abandono de uma forma precoce.
cessos é uma caraterística, e a capacidade para a per- Reforçando esta perspectiva, Ross, Mallett e
severança e a concentração em uma tarefa decaiu, na Parkes (2015), em uma investigação qualitativa
exata proporção em que a velocidade de aquisição com treinadores de jovens australianos e a sua in-
de informação aumentou. Contudo, o esporte pode teração com os pais, referem, consideravelmente, a
constituir-se como um local onde a sociedade pode mais interações negativas do que positivas. Alguns
reproduzir e facilitar, por meio de uma intervenção participantes reportaram, ainda, esforços na for-
adequada, uma preparação para a vida. mação dos pais, observando que estas abordagens
Considerando os apontamentos prévios, não de- foram inadequadas ou infrutíferas. Este será even-
vemos esquecer que as crianças e jovens, apesar das tualmente um tema ao qual a investigação deverá
idades relativamente próximas, não têm gostos e in- dar maior atenção, no sentido de propor progra-
teresses coincidentes. Uma criança com 7 anos tem mas de formação dos pais quando envolvidos no
motivações bem divergentes de um pré-adolescente esporte dos seus filhos.
de 13 anos, ou seja, a intervenção pelo esporte deve Para além da família (agente primário), a es-
ter em forte consideração as diferentes idades das cola (agente secundário), fundamental na adesão
crianças e dos jovens, assim como os seus estágios e permanência no esporte, possui, na generalida-
de desenvolvimento. de dos currículos, a disciplina de Educação Físi-
Refletindo sobre como se processa a adesão ao ca. Esta tem como importante função promover o
esporte, verificamos a importância da família como conhecimento esportivo e possibilitar o primeiro
agente primário. Ela atribui importância às ativida- contato com este meio. Neste contexto, pode ser
des físicas e, consequentemente, apoia o ingresso determinante a forma empenhada com a qual
87
INICIAÇÃO ESPORTIVA
o professor de Educação Física leva à prática e lização do esporte tem nos jovens, nomeadamente
constrói a sua atividade, o relacionamento que os feitos e vitórias das suas equipes de eleição em
estabelece com os alunos e o entusiasmo que ele geral, e dos seus ídolos em particular. Esse impacto
lhes provoca para que continuem a praticar es- sai, ainda, reforçado com as agressivas estratégias de
porte (RESENDE et al., 2014). Os mesmos autores marketing que estão associadas a estes eventos. Con-
afirmam que, além de influenciar positivamente tudo, naquilo que estamos analisando, para a ade-
os alunos para aderir à prática esportiva, o pro- são esportiva por parte dos jovens, é questionável o
fessor de Educação Física, muitas vezes, estabe- impacto destas realizações. A este propósito, Green
lece e promove contatos entre a escola e o clube (2010), após considerar diversas pesquisas, enuncia
esportivo, seja este escolar ou federado. O meio que o impacto dos ídolos esportivos na adesão es-
onde se insere a criança e o jovem poderá con- portiva dos jovens é “muitas vezes mal-entendida e
ter fortes estímulos para potencializar a adesão ao frequentemente exagerada” (GREEN, 2010, p. 157).
esporte. A identidade social dos grupos aos quais Ao considerar e caracterizar o esporte juvenil,
se associa o jovem, quando este inicia a sua ex- é fundamental refletir sobre a importância que a
ploração do mundo para além do círculo familiar família mais próxima do atleta atribui à sua fre-
mais próximo, é determinante para a construção quência, assim como o tipo de ajuda que esta lhe
da sua personalidade. Neste sentido, os interesses presta. Esta preocupação tem, como base, o desejo
comuns poderão catalisar a aderência e a perma- de incrementar a prática esportiva das crianças e
nência no meio esportivo, pois, para os jovens, a dos jovens. Desta forma, deve-se ponderar que a
participação esportiva é motivadora e facilitadora harmonia familiar é frequentemente perturbada
de relações sociais (GREEN, 2010). pelos horários da participação esportiva, tanto nos
Apesar de não constituir um objetivo do presen- treinos quanto nas competições, e uma necessária
te trabalho, não há de se descuidar da importância envolvência e corresponsabilização da família são
que, aqueles que se configuram como líderes entre cruciais para o êxito dos programas esportivos.
os jovens, têm na forma como estes enfrentam a par- Neste sentido, os projetos da área devem procu-
ticipação esportiva (PRICE; WEISS, 2011). rar integrar todo um processo que se desencadeia,
Ao promover e incentivar a prática esportiva, habitualmente, pela mão de um adulto, e que se
providenciando instalações e materiais, a interven- prolonga até a sua fidelização e autonomia. As in-
ção política visa a promover a atividade física e o vestigações sugerem que este processo é, em inú-
esporte, aceitando e compreendendo o importante meras vezes, preenchido de insucessos e frustra-
benefício social que ela mesma pode retirar deste ções, tendo, como resultado, o abandono precoce
investimento. da atividade esportiva. Será então de grande im-
As experiências prematuras e bem-sucedidas portância considerar, em cada contexto particular,
com o esporte parecem influenciar as tendências de o início da atividade esportiva pela criança, pois,
ocupação do tempo livre por parte dos jovens. No quando jovem, a sua experiência é uma mais-valia
seguimento destas considerações, será interessante para uma vida ativa em longo prazo (RESENDE;
considerar qual o tipo de impacto que a mercanti- GILBERT, 2015).
88
EDUCAÇÃO FÍSICA
Neste sentido, teremos que considerar e reconsi- rendimento esportivo deve ser respeitado para quem
derar a oferta esportiva, não olhando para a sua ini- o almeja, mas não deve constituir a única finalidade.
ciação como uma via de sentido único para o ren- Projetar um programa esportivo constitui um
dimento ou a elevada performance. Poucos são os desafio, e esse programa deve considerar as fases de
atletas que alcançam o elevado rendimento e, por desenvolvimento das crianças e dos jovens, assim
isto, a participação esportiva deve contemplar na sua como o contexto no qual ele se implementará. De
gênese e, como consequência, na sua prática, um con- acordo com Resende e Gilbert (2015), entre os 5 e
junto de valores adequados a esta realidade. Apoian- 8 anos, a estruturação do esporte deve ser pouco
do este comentário, Muir et al. (2011) referem-se à formal, não existindo a necessidade da existência de
existência de dois tipos de abordagem ao processo equipes formais. O grande objetivo é entusiasmar
de treino que envolve as crianças e os jovens, sendo a participação esportiva, a fruição da atividade e o
que em nenhum deles são equacionadas as suas ne- estabelecimento de relações sociais. Nesta faixa etá-
cessidades de desenvolvimento em longo prazo. Um ria, a forma como os pais e os treinadores encaram o
é o esporte de elevado rendimento reproduzido pelos esporte é determinante para a forma como os jovens
adultos (em que, muitas vezes, ocorre uma especiali- se julgam quando estão em atividade. Neste sentido,
zação precoce e uma seleção de atletas com base na as suas expectativas devem concentrar-se no esfor-
sua performance atual, sem considerar as suas poten- ço desenvolvido e na envolvência com a atividade,
cialidades de desenvolvimento), a outra é aquela que tendo como objetivo maior a diversão por meio da
somente pretende a ocupação ativa das crianças e dos aprendizagem de novas habilidades.
jovens. Contudo, a crítica feita a estas organizações é
que, apesar das atividades serem esportivas e com um O MODELO DE DESENVOLVIMENTO DE
espírito lúdico, carecem de uma estrutura e de uma PARTICIPAÇÃO ESPORTIVA (DEVELOP-
organização que fomentam uma aprendizagem con- MENTAL MODEL OF SPORT PARTICIPA-
sistente. Destas duas situações derivam, no primei- TION – DMSP)
ro caso, programas demasiado exigentes ao nível de
volume de treinos, de competições e de pressão para Côté et al. (2007) indicam que o desenvolvimento
vencer. Na situação considerada mais de lazer, a prá- esportivo se inicia por uma adesão ao esporte (sam-
tica, quando tão livre e pouco exigente, dificilmente pling years), em que as atividades lúdicas, por meio
faz ocorrer o desenvolvimento, sobressaindo apenas do esporte e em vários deles, são prioritárias. A se-
os naturalmente mais dotados (MUIR et al., 2011). guir, vêm os anos de especialização esportiva (spe-
Considerando os pressupostos anteriores, de- cializing years), seguidos pelos anos de investimento
fendemos uma ideia mais moderna e de acordo com esportivo (investment years). Simultaneamente a es-
aquilo que deve ser o pressuposto do esporte para tas duas fases, os autores referem que, quem procura
todos. Ou seja, uma atividade social que deve pro- o esporte de participação, eleva a percentagem de
mover o desenvolvimento físico e a fruição pela ati- jogo em detrimento do tempo dedicado à prática
vidade física para todos os jovens, de acordo com as deliberada, focando-se, com igual importância, nas
suas necessidades e objetivos. Claro que o desejo de atividades cujo foco são o fitness e a saúde.
89
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Hancock e Côté (2014), concretizando o mo- • Os anos de especialização (12-16 anos) de-
delo referenciado (DMSP), aconselham a prática vem incluir um equilíbrio entre o jogo e o
esportiva de crianças e jovens: treino, diminuindo o número de esportes,
• Entre os 6-12 anos, a importância maior deve iniciando-se a diferenciação em níveis com-
ser o jogo, propondo uma percentagem de petitivos. Neste contexto, e apesar do diver-
80% para as atividades de jogo e 20% para a timento e do prazer que advêm da prática
prática deliberada. Desta forma, as crianças esportiva, emerge a especificidade esportiva
experienciam diferentes esportes, reduzindo como uma característica determinante.
a seleção, fomentando equipas pequenas, au-
mentando o tempo de jogo e incentivando o
esporte como forma de prazer e excitamento.
90
EDUCAÇÃO FÍSICA
91
considerações finais
A
unidade sobre os conhecimentos e as competências do treinador pre-
tendeu tornar evidente a complexidade da sua atuação. Respondendo
as questões do que é necessário para ser treinador e como fazer para
ser um bom profissional, constatamos que os seus procedimentos te-
rão de se sustentar em conhecimentos sólidos e abrangentes, de forma que de-
sempenhe a sua atividade com competência, certificando-se que os seus atletas
se desenvolvam de forma holística, independentemente do nível de participação
esportiva na qual estejam. Competências como ter uma visão estratégica da sua
atividade, construir relações e conduzir práticas são exemplos de atributos rela-
cionados à liderança de um processo de treino.
Ressaltamos a importância de uma formação continuada independentemen-
te da sua origem, salientando a importância do treinador colocar, de forma conti-
nuada, a sua atividade em equação para, por via da autorreflexão, inovar na reso-
lução dos problemas que ele enfrenta cotidianamente. Neste sentido, o treinador
pode colocar a si mesmo questões de nível técnico, prático e crítico, de forma a
melhorar e adequar as suas ações. Assim, ele torna-se um fomentador de novos
conhecimentos que, concomitantemente, lhe proporcionam uma maior experti-
se, à medida que adquire experiência. A atividade do treinador, para se revestir de
sucesso, deve se sustentar em ações pedagógicas que fomentam a aprendizagem,
a despeito do nível de participação esportiva dos atletas.
Neste sentido, o treinador deverá desenvolver os atletas ao nível da sua com-
petência (medida de performance), confiança, conexão e caráter (medidas psicos-
sociais). No processo esportivo, as crianças e os jovens devem ser considerados
de forma distinta, pois os seus interesses, gostos, preferências e vontades, para
além de se alterarem rapidamente em função do desenvolvimento tecnológico,
podem ser pouco coincidentes por causa das diferenças de idade. O treinador
terá, por isto, de fomentar o processo de treino adequado para cada situação em
particular.
92
atividades de estudo
1. O cargo de treinador é uma função exigente. a) Tem no seu currículo um maior número de
Neste sentido, pode-se afirmar que o treinador vitórias do que de derrotas.
é bom quando: b) Define e aplica uma visão estratégica ade-
a) Tem formação universitária na área do es- quada ao seu contexto de prática.
porte.
c) Consegue transformar possíveis derrotas
b) Possui conhecimentos gerais e específicos em vitórias.
adequados à sua prática.
d) Elabora táticas e estratégias inovadoras.
c) Exerce uma liderança firme e autoritária.
e) Utiliza a sua experiência como atleta.
d) Foi um excelente atleta.
4. Umas das características de um treinador com-
e) Foi árbitro.
petente é usar o exercício da reflexão para apri-
2. Para estar apto a liderar um processo de treino, morar o desempenho da sua atividade. Assim, a
o treinador necessita de amplos conhecimentos reflexão do treinador pode se efetuar:
profissionais. Em relação aos conhecimentos a) Após a derrota em um jogo.
mais relevantes, analise as afirmativas. b) Ao nível das condições oferecidas aos atle-
I - Dominar as áreas específicas do esporte. tas.
II - Conhecer as capacidades dos atletas. c) Ao nível das condições monetárias propos-
III - Saber medicina, psicologia e sociologia. tas para a sua renovação.
93
LEITURA
COMPLEMENTAR
Leia, agora, um trecho selecionado de um artigo subme- Para que jovens esportistas aprendam de forma eficaz
tido para publicação na Revista Iberoamericana de Psi- e possam transferir habilidades desenvolvidas por meio
cología del Ejercicio y el Deporte, com o título “Desen- do esporte para a vida cotidiana, é necessário que o en-
volvimento positivo de jovens através do esporte: Dos sino dessas habilidades aconteça de forma intencional,
pressupostos ao papel do treinador esportivo”. Os au- o que exige treinadores competentes e capazes de defi-
tores são Carlos Ewerton Palheta, Eduardo Leal Goulart nir estratégias específicas para o alcance desse objetivo
Nunes, Rui Resende e Michel Milistetd. (PETITPAS; CORNELIUS; VAN RAALTE; JONES, 2005; SAN-
TOS et al., 2016). Camiré et al. (2011) apresentam cinco
O PAPEL DO TREINADOR NO estratégias que podem auxiliar treinadores no DPJ: (I)
No cenário esportivo, o treinador assume papel de des- relacionamentos significativos com os jovens alunos, (III)
taque devido à sua responsabilidade em promover a compartilhar responsabilidades com os próprios alunos,
evolução dos esportistas, desenvolvendo as suas habi- para que estes sejam responsáveis pelo seu próprio pro-
lidades em busca de resultados positivos em diferentes cesso de desenvolvimento, (IV) ensinar como transferir
níveis, da participação esportiva ao alto rendimento, as habilidades de vida para o dia a dia, (V) fazê-los prati-
seja em contextos que utilizem o esporte como ferra- car habilidades de vida.
menta de integração ou naqueles que visam o desem- Desenvolver uma filosofia de treinamento exige a ca-
penho competitivo. Levando em consideração as carac- pacidade de reflexão dos treinadores para que possam
terísticas do fenômeno esporte que permitem o DPJ, o definir quais os princípios fundamentais que orientam a
treinador contribui com a saúde, bem-estar, educação sua prática pedagógica, para depois apresentar de for-
e formação da cidadania de praticantes esportivos de ma refinada a sua filosofia aos alunos, pais e treinado-
diferentes idades (MILISTETD; RAMOS; MESQUITA; NAS- res auxiliares (COLLINS; GOULD; LAUER; CHUNG, 2009).
CIMENTO, 2015). Sugere-se que esta filosofia deva assentar numa edu-
Para que esteja alinhado aos objetivos do DPJ, se torna cação para a autonomia e responsabilização, pois um
imprescindível ao treinador reconhecer o seu papel den- atleta consciente do processo em que está envolvido
tro do processo (SANTOS et al., 2016), assumindo a res- é potencialmente mais apto e competente (RESENDE;
ponsabilidade de favorecer o desenvolvimento de habili- SÁ; BARBOSA; GOMES, 2017). O grande desafio a este
dades que contribuam com a formação pessoal e social processo se concentra na possibilidade de os outros
de jovens alunos, contemplando-os com os benefícios indivíduos envolvidos terem concepções de valores dis-
que a prática esportiva pode oferecer em sua totalidade tintas às concepções do treinador (COLLINS et al., 2009;
94
LEITURA
COMPLEMENTAR
A tentativa do treinador esportivo de construir rela- des em relação ao grupo, também podem ser estratégias
cionamentos significativos, fornecer feedback positivo adotadas pelo treinador. Estas ações promovem a capa-
constantemente e utilizar o elogio em vez de comporta- cidade de reconhecer que as suas ações influenciam as
mentos que acarretem punição, pode promover maiores ações de seus companheiros e proporcionam a experi-
níveis de autoestima nos jovens, aumentando a chance ência em lidar com a habilidade de liderança, tornando-
de continuidade da prática esportiva e alcance dos ob- -os aptos à responsabilidade partilhada (CAMIRÉ et al.,
jetivos do DPJ (SMOLL; CUMMING; SMITH, 2011). Outra 2011; SMOLL et al., 2011; VOELKER; GOULD; CRAWFORD,
estratégia adotada por treinadores para estabelecer re- 2011; RESENDE; GILBERT, 2015).
lação positiva com jovens esportistas pode ser a organi- Dessa forma, os treinadores acabam por demonstrar
zação de atividades fora do contexto esportivo e discus- que habilidades desenvolvidas por meio do esporte são
sões com temas específicos sobre os objetivos de cada úteis dentro e além do ambiente de prática esportiva
um com a prática esportiva (CAMIRÉ et al., 2011). Per- (HOLT; NEELY, 2011). Apresentar exemplos e situações
cebe-se que, para essa estratégia ser eficaz, o treinador do dia a dia em que essas habilidades podem ser trans-
deve conquistar a credibilidade de seus alunos, em que feridas, incentivam os jovens em adquirir confiança para
um resultado positivo pode favorecer o início de outra utilizá-las em situações cotidianas (TURNNIDGE; CÔTÉ;
estratégia, que é tornar os alunos responsáveis por parte HANCOCK, 2014). Uma das estratégias pode ser o traba-
de seu processo de desenvolvimento, favorecendo, as- lho voluntário, permitindo que desenvolvam a compai-
sim, a sua autonomia. xão e a capacidade de planejamento de uma atividade
Para promover responsabilidade e autonomia em jovens voluntária (MARTINEK; SHILLING; JOHNSON, 2001; CAMI-
alunos, treinadores podem desenvolver contratos de RÉ et al., 2011; VOELKER et al., 2011).
aprendizagem, fazendo com que os seus alunos definam Assim, perante a elevada responsabilidade do treinador
metas de curto e longo prazo dentro de seu processo esportivo no DPJ por meio do esporte, o seu desafio pas-
de aprendizagem e desenvolvimento pessoal. Posterior- sa a ser reconhecer o seu papel no processo, o que exige
mente, utilizando uma comunicação adequada, o trei- conhecimento dos pressupostos como características
nador deve encorajar e guiar no alcance dessas metas, que fundamentam a abordagem, para, assim, definir as
tornando-os auto avaliativos e capazes de participar na estratégias que contribuirão com a formação pessoal e
definição das responsabilidades de tomada de decisão social de jovens (RESENDE; CASTRO, 2015).
sobre sua prática (CAMIRÉ et al., 2011; GOULD; CARSON, Fonte: Palheta et al. (2016).
2008; HORN, 2008). Fazer com que determinados alunos
participem de decisões que afetem as atividades coleti-
vas, como nomear capitães com maiores responsabilida-
95
material complementar
96
material complementar
97
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98
referências
99
gabarito
1. B.
2. E.
3. B.
4. D.
5. A.
100
UNIDADE
IV
EVOLUÇÃO POSITIVA ATRAVÉS
DO ESPORTE
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta
unidade:
• Treino de jovens atletas para uma evolução positiva por
meio do esporte
• Impacto do esporte nas competências de vida
• Desenvolvimento positivo por meio do esporte: papel dos
treinadores
• Desenvolvimento positivo por meio do esporte: papel da
família
Objetivos de Aprendizagem
• Identificar a forma de usar o esporte para desenvolver
competências de vida dos atletas.
• Verificar o contributo que o esporte pode ter nas
competências de vida.
• Reconhecer o papel dos treinadores no desenvolvimento
positivo dos jovens.
• Reconhecer o papel da família no desenvolvimento positivo
dos jovens.
unidade
IV
INTRODUÇÃO
O
esporte tem um impacto cada vez maior na sociedade, no-
meadamente pelo número exponencial de adesão dos jovens.
Tendo em consideração que os alicerces para uma vida ativa
no futuro são criados durante a infância e a juventude, a prá-
tica esportiva deve, então, se tornar uma experiência frutífera. É também
fundamental que o esporte faça as crianças e os jovens adquirirem com-
petências que se prolonguem para as outras facetas da intervenção social.
Não se pode, contudo, esperar que somente pela prática esportiva es-
sas competências sejam adquiridas, é necessário ter consciência da sua
importância e trabalhá-las de forma intencional para que, assim, os jo-
vens desenvolvam, de uma forma saudável e construtiva, todo o potencial
que detêm. O desenvolvimento positivo dos atletas depende da forma
como o esporte está organizado e da configuração das relações entre as
pessoas envolvidas. O treinador é uma pedra angular neste processo, uma
vez que, ao materializar um processo de treino, o objetivo será desenvol-
ver o atleta de forma holística. Ao assegurar que os jovens mantenham o
seu envolvimento esportivo, por razões intrínsecas, contribui-se para que
sejam boas as razões da sua permanência no esporte.
Neste contexto, também o treinador deve, introspectivamente, inda-
gar como ele deverá ser, como deve se comportar e que tipo de atitudes
ele deve tomar conscientemente para cumprir a sua missão. Como a tare-
fa de desenvolver os jovens não se compadece de ações isoladas, o apoio
da família é crucial. Neste sentido, os pais dos atletas deverão cooperar
no desenvolvimento esportivo dos jovens de forma solidária com o trei-
nador. Para isso, eles terão que ser informados adequadamente do projeto
esportivo e do que se espera deles de forma concreta.
Sugere-se que o treinador crie uma ficha do atleta e que, da infor-
mação recolhida, retire os dados que achar mais conveniente para dar
conhecimento aos pais. Esta ação evidencia competência e empenho no
desenvolvimento dos filhos/atletas.
INICIAÇÃO ESPORTIVA
Sempre foi característica do esporte reivindicar para permitam encarar a vida de uma forma saudável por
si valores importantes na formação do indivíduo meio de um estilo de vida ativo, e de se incorpora-
como um todo e não somente do atleta. Inserido rem de forma cívica e atuante na sociedade.
em um contexto de intervenção no esporte, o de- Apoiando esta intervenção, investigações empí-
senvolvimento positivo dos jovens tem sido apon- ricas têm evidenciado que o esporte eleva a autoesti-
tado como uma excelente possibilidade para contri- ma, a autoconfiança e o aproveitamento acadêmico
buir com uma transição bem-sucedida para a vida (CÔTÉ et al., 2010). Realçando, no entanto, que sub-
adulta (DIAS, 2011). A aquisição de competências sistem dúvidas no meio acadêmico sobre o esporte
essenciais por parte dos jovens para enfrentar com ser um meio de desenvolvimento de competências
sucesso os desafios da sociedade atual deve, por isto, de vida (GOULD; WESTFALL, 2014). Aliás, estes
constituir um grande objetivo do esporte. Neste sen- autores alertam, baseando-se em investigações sobre
tido, ele deve consistir em um espaço educativo por a repercussão do esporte nos jovens, que a ativida-
excelência, dotando os jovens de atributos que lhes de esportiva não é somente associada ao desenvol-
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EDUCAÇÃO FÍSICA
vimento de competências de vida positivas e pode, A inserção social adquirida pela cooperação e
igualmente, ser fruto de consequências negativas. pelo respeito aos outros, pela autoridade, nomeada-
Os programas esportivos podem (e talvez de- mente pelos árbitros e juízes, constitui outro fator
vam) ser desenhados de forma a privilegiar o de- determinante pelo qual o esporte pode trazer be-
senvolvimento positivo dos jovens, aproveitando o nefícios aos jovens. Fazer novos amigos e conhe-
clima intrinsecamente motivante promovido pela cidos, construindo uma rede social em contínuo
prática esportiva e pelo potencial que a competição desenvolvimento, promove as competências sociais
traz. A energia com que a competição é vivenciada (SMOL; CUMMING; SMITH, 2011; CARRERES-
pelos jovens deve ser aproveitada para este fim. Ali- -PONSODA et al., 2012). A este propósito, Rutten et
ás, esta intervenção é tão mais pertinente, pois é nes- al. (2011) efetuaram um estudo com 439 jovens de
te período da vida onde ocorrem, tendencialmente, idades entre 14 e 17 anos, envolvidos em 67 equipes
mais riscos associados a problemas comportamen- esportivas, e confirmaram que a existência de am-
tais (GREEN, 2010) pelo excesso de sedentarismo, bientes morais positivos está associada a comporta-
com reflexos no aumento do sobrepeso ou da obe- mentos pró-sociais no contexto esportivo.
sidade, abuso do consumo do álcool e do tabaco e a
experimentação de drogas. Reforçando os benefícios
alcançados pela prática esportiva, Malina (2011) in-
dica melhorias ao nível da saúde em geral, da apti-
dão física, da regulação cardiovascular, da compo-
sição corporal e, consequentemente, da redução de
fatores de risco metabólico. A par destes benefícios,
o autor afirma que o esporte está relacionado com
o menor envolvimento por parte dos jovens em cri-
minalidade, gravidez indesejada, condutas sexuais
de risco e ideias de suicídio. Para que o esporte seja
efetivo na aquisição destas mais-valias, ele necessita
provocar estímulos que vão de moderados a inten-
sos (AAHPERD, 2013), pois uma atividade dema- O envolvimento com o esporte também tem sido
siado ligeira não produzirá os efeitos enunciados correlacionado com melhorias cognitivas (aumento
anteriormente. da capacidade de atenção e do trabalho da memó-
Em suma, os benefícios provocados pelo esporte ria), resultados acadêmicos superiores ao nível das
podem ser físicos, mas também de caráter psicoló- classificações obtidas, maior gosto pela escola e, con-
gico, como a elevação dos níveis de autoconfiança, sequentemente, redução de absentismo e de abando-
o desenvolvimento de competências de liderança e no precoce dos estudos (TRUDEAU; SHEPHARD,
de iniciativa, o desenvolvimento de hábitos de auto- 2008; JONKER; ELFERINK-GEMSER; VISSCHER,
disciplina, perseverança e resiliência na procura de 2009; ZENHA; RESENDE; GOMES, 2009; SINGH;
atingir objetivos previamente definidos. UIJTDEWILLIGEN; TWISK, 2012).
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INICIAÇÃO ESPORTIVA
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EDUCAÇÃO FÍSICA
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INICIAÇÃO ESPORTIVA
Com o intuito de construir uma sociedade mais sua aprendizagem de como ser positivas. Neste sen-
harmoniosa e significativa para todos, o desenvol- tido, se o objetivo for que as crianças, os jovens e os
vimento positivo do ser humano deve ser encara- adultos aprendam a encarar a vida de forma positi-
do como um objetivo pelo qual todos devemos nos va, então será necessário ensinar como fazê-lo.
empenhar. Esta filosofia de bem-estar e de forma- Para ensinar as competências de vida positi-
ção tem total pertinência no desenvolvimento dos vas por meio do esporte, de acordo com o Lerner,
jovens. Como diz Orlick (2014), as pessoas que, de Dowling e Anderson (2003), é necessário que os jo-
alguma forma, expressam sentimentos negativos, o vens se empenhem moral e comportamentalmente
fazem porque, em algum momento, fracassaram na nesta construção social, constituindo-se como agen-
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EDUCAÇÃO FÍSICA
tes autônomos neste esforço. Esta perspectiva refor- Especificamente, as competências de vida no
ça-se no sentido de que o desenvolvimento positivo contexto esportivo são vistas como:
dos jovens propõe que todos eles têm uma grande
capacidade para se desenvolver de forma bem-suce- Os ativos internos pessoais, características e
competências, como estabelecer objetivos, con-
dida, construtiva e saudável (LERNER et al., 2005).
trole emocional, autoestima e um trabalho duro
É neste sentido que a construção de programas e ético que pode ser facilitado ou desenvolvido
que visem o desenvolvimento positivo de jovens se no esporte, podendo ser transferido para ou-
apoia substancialmente no talento, nos interesses tros envolvimentos não esportivos (GOULD;
e no potencial que se evidencia nestas idades. As CARSON, 2008, p. 60).
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INICIAÇÃO ESPORTIVA
Na continuação do exposto anteriormente, a como fim único do esporte, os jovens podem desa-
AAHPERD (2013) reafirma que a forma como o proveitar excelentes oportunidades para desenvol-
esporte está organizado, o envolvimento das pesso- ver habilidades únicas por meio da prática esporti-
as (pares, pais e treinadores), a importância que o va, desfrutar do que a competição permite, além de
jovem atribui ao esporte e como isto o integra em crescer social e emocionalmente. Tal como muitos
outras atividades da sua vida, determinam o alcance responsáveis têm alertado, a implementação de su-
dos resultados positivos da participação esportiva. cesso terá que ser vinculado a políticas que atribuam
ao esforço em vencer a maior virtude no êxito pesso-
al e coletivo, criando um forte princípio para a cria-
ção de um favorável clima motivacional (SMOLL;
CUMMING; SMITH, 2011).
É de acordo com estas preocupações que
decorre o objetivo de formação do jovem esportista.
O treinador precisa estar consciente sobre a forma
como o esporte é encarado atualmente, quais são as
necessidades dos jovens e com quem eles se identifi-
cam, e ter também consciência que, entre a criança e
o jovem adulto, estas perceções se alteram substan-
cialmente. Não será fácil este entendimento, pois ele
é fortemente dependente do contexto e da própria
atualidade, contudo, será fundamental o treinador
se preparar adequadamente para estes tipos de fenô-
menos, porque eles impactarão de forma decisiva a
sua atuação. A consciência de que um ensino/treino
dirigido para a promoção da autonomia, com um
forte apoio social, uma visão inspiradora para o fu-
turo e a partilha das tomadas de decisão estimula-
Uma situação determinante na ponderação da orga- rá os jovens a ficarem mais aptos a experimentar o
nização destas atividades é a noção de sucesso no bem-estar pela aquisição de pensamentos, emoções
esporte. É comum os meios que relatam o esporte, e comportamentos mais adaptados à sua realidade
nomeadamente os meios informativos (mídias), (QUESTED; DUDA, 2011).
confundirem sucesso com vitória. Será fundamental Será com base nesta orientação que o treinador
os responsáveis pela formação esportiva tornarem- deverá desenvolver o atleta jovem de uma forma
-se empreendedores e substituírem, ou mesmo, eli- holística. O holismo constitui-se em uma doutrina
minarem a filosofia de “o ganhar não é tudo; ganhar que proclama o todo não ser a mera soma das par-
é a única coisa que interessa”. Colocando a vitória tes, aglomerando, no seu conjunto, propriedades
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EDUCAÇÃO FÍSICA
que carecem aos elementos de uma forma indivi- • A criação de um ambiente de afeto é verda-
dual (particularmente no ser vivo). Esta realida- deiramente importante para desenvolver a
de aplica-se ao ambiente esportivo onde o jovem confiança com os atletas e fundamental no
desenvolvimento de competências de vida.
evolui. Um treinador que assimila a importância
• O adágio “eles não querem saber o que tu sa-
do desenvolvimento dos jovens de forma holística
bes enquanto não souberem quem és”, com
revela a capacidade de integrar diferentes tipos de toda a certeza, é adequado para quando se
conhecimento, compreendendo os que se referem ensina competências de vida.
aos aspetos pessoais, emocionais, psicológicos, cul- • A possibilidade de os jovens testarem e de-
turais e de identidade social. Consequentemente, monstrarem as suas competências por meio
encara o processo de treino de uma forma assimi- da interação com os pares, treinadores e to-
lada e integral, levando em conta que este é muito dos os que estão envolvidos no esporte, faci-
mais do que a soma das partes. lita excelentes oportunidades para favorecer
competências de vida.
A investigação efetuada por Gould, Carson e
Blanton (2013) sugere que o ensino de competên- Enfatizando os desafios que o treinador enfrenta,
cias de vida por meio do esporte evidencia os se- concordamos com Cordovil (2005), que afirma se-
guintes aspectos: rem especiais os treinadores de jovens, pois estão
• Uma ligação estreita entre a participação es- disponíveis para trabalhar em longo prazo, trans-
portiva e o desenvolvimento de competências mitindo valores que não são os dominantes, porque
de vida. trabalham com grupos heterogêneos e em constante
• Os treinadores têm consciência de que é im- mutação, onde o reconhecimento profissional é ain-
portante desenvolver as competências de
da muito escasso.
vida dos jovens.
• Identificaram competências-chave para o REFLITA
desenvolvimento dos atletas, como a respon-
sabilidade, a motivação/estabelecimento de
objetivos e a comunicação como as mais im- Gould, Voelker e Griffes (2013) estudaram
portantes. uma abordagem para ensinar a liderança
por meio do esporte. A liderança pode ser
• As filosofias que priorizam a participação es- definida como um indivíduo que motiva, ins-
portiva parecem estar relacionadas com os pira e incentiva um grupo de pessoas para
treinadores mais eficazes no ensino das com- atingir um objetivo comum. Treinadores que
petências de vida. comunicam para seus atletas os papéis e as
responsabilidades de ser um líder eficaz têm
• Neste caso, estas competências são intencio-
mais chances de serem bem-sucedidos. Você
nalmente ensinadas de forma direta e indire- concorda?
ta.
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INICIAÇÃO ESPORTIVA
Desenvolvimento Positivo
por Meio do Esporte:
Papel dos Treinadores
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EDUCAÇÃO FÍSICA
me uma importância essencial no desenvolvimento porte. A ética e a moral que o esporte pode trazer não
positivo dos jovens (BECKER, 2009). Considera-se, sucedem das suas regras específicas, mas da sua natu-
assim, que o desenvolvimento de competências de reza intrínseca, e esta é, desde o começo, profunda-
vida por meio do esporte é determinado pela forma mente influenciada pelo treinador pelo exemplo que
como o treinador concebe um ambiente que fomen- este dá (HARDMAN; JONES; JONES, 2010).
te esse progresso (GOULD; CARSON, 2008).
A competência do treinador expressa-se de múl-
tiplas formas, mas tem a sua maior exaltação na
forma como ele ensina e como faz os jovens apren-
derem as técnicas do esporte e melhorarem a sua ca-
pacidade tática, estratégica e de tomada de decisão.
Por outro lado, também é definidora a forma como
são capazes de, conjuntamente, definir e atingir os
objetivos ao nível de performance.
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INICIAÇÃO ESPORTIVA
Ao considerar a atividade como treinador, sugere- empenho demonstrado por ele para que os jovens se
-se que este coloque a si mesmo três questões, as quais desenvolvam como pessoas e atletas (RESENDE et al.,
nortearão a sua atuação como treinador de jovens: 2014), reportando as características de índole social
1. Que tipo de pessoa vou ser? como mais determinantes do que as exclusivamente
2. Como devo me comportar e agir? específicas e mais técnicas da modalidade esportiva
3. Quais devem ser os objetivos do processo de em causa. Sobressai-se a noção de que os treinadores
treino em que estou inserido? com maior eficácia são, igualmente, bons professores,
pois serão incapazes de ensinar se não tornarem com-
A resposta a essas questões, por parte do treinador, preensível aquilo que pretendem que os atletas apren-
facilita ganhar consciência em relação a como se dam, com objetivos desafiadores, mas alcançáveis.
comportar no momento de incorporar a “pele” de um A instrução, a par do suporte que dá às realiza-
treinador de jovens. Implica a sua personalidade e a ções dos atletas e à ausência de punições, constitui
forma como esta se manifesta nas diferentes situações uma característica de um treinador eficaz (ERICK-
do contexto esportivo enquanto líder de um proces- SON; GILBERT, 2013). Estes autores referem que
so de treino e competição. O treinador também não o treinador deve incorporar, no seu cotidiano com
deve diminuir a importância relativa a como a sua os atletas, o elogio aos esforços destes e a instrução
personalidade será vista, apreciada e avaliada pelos por meio de feedbacks positivos. Partilhar com os
atletas, dirigentes, família e todo o entorno que ro- atletas o processo de decisão, levando conta as suas
deia o fenômeno esportivo. Por isto, o treinador en- perspectivas e providenciando argumentos coeren-
contra argumentos para “trabalhar” o efeito que o seu tes para as suas decisões. Estas atitudes ajudam a im-
caráter, temperamento e valores traz à função. plementar e a desenvolver a autonomia dos atletas.
Reforça-se que o empenho nos valores e princí- Um ambiente de aprendizagem favorável poten-
pios que devem pertencer ao esporte constituem uma cia uma definição clara de objetivos e permite a ava-
pedra angular na personalidade do treinador, forne- liação da performance com base na aprendizagem e
cendo-lhe as bases para fazer face às pressões que re- nos esforços realizados.
sultam do processo de treino e, mais vigorosamente, Os treinadores com maior relevância na aquisi-
da competição. Estas pressões, que podem surgir de ção de competências de vida dos atletas são aqueles
inúmeros lugares e pessoas, também podem abalar que se caracterizam por evidenciar filosofias de
as convicções e comprometer os princípios. O com- treino de sua preferência e são proativos no desen-
portamento do treinador tem sido reconhecido como volvimento destas competências de forma explícita,
crítico na forma como os atletas encaram o esporte, preocupando-se permanentemente com as transfe-
pelas performances que alcançam e pela coesão de rências dessas competências para outros ambientes.
grupo que demonstram (ARTHUR et al., 2011). Destacam o esportivismo, fomentam relações fortes
Outra forma de olhar para o treinador é pelo pon- com os seus atletas, focam em delinear objetivos,
to de vista dos alunos. Aqui, uma das caraterísticas traçam estratégias competitivas concordantes com o
mais salientadas pelos atletas/alunos para, qualitati- contexto esportivo em que estão inseridos e consi-
vamente, considerarem um treinador bom, resulta do deram as suas caraterísticas sociodemográficas.
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INICIAÇÃO ESPORTIVA
Desenvolvimento Positivo
por Meio do Esporte:
Papel da Família
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EDUCAÇÃO FÍSICA
Os pais e a família são cruciais na educação e, conse- ência técnica e menos reações negativas por parte dos
quentemente, no desenvolvimento dos filhos. Con- pais dos atletas que estão nos níveis iniciais de forma-
frontados com as exigências cada vez mais bem in- ção e maior apoio dos pais dos atletas que não têm re-
formadas e críticas dos pais (família) em relação às provações escolares. No estudo dos pais, verificaram
atividades onde são inseridos os filhos, os locais da que os pais dos atletas do sexo masculino evidenciam
prática esportiva necessitam contemplar o esporte maior apoio e influência técnica; os pais dos atletas
de participação de forma que o único objetivo do que praticam modalidades esportivas individuais as-
clube não seja determinado e decalcado pelo esporte sumiram maior apoio e orientação motivacional para
de rendimento. o divertimento e menos reações negativas; e os pais
Os pais que, na maioria das situações, promo- com menor formação escolar demonstraram menos
vem a experiência esportiva dos filhos, fomentam e apoio e influência técnica, maior orientação para os
animam a continuação desta prática, muitas vezes, resultados e para as reações negativas.
com apoio material e financeiro e a disponibilidade Este tipo de pesquisa permite ao treinador ga-
para acompanhar (GOMES, 2010). nhar consciência em relação às diferenças dos pais
A presença dos pais é importante para a boa in- e às respectivas influências nos comportamentos
tegração e a socialização esportiva dos filhos, pro- dos filhos e, assim, permitir esse treinador agir por
videnciando bem-estar psicológico e índices eleva- antecipação. A família é crucial para um desenvol-
dos de satisfação com a prática esportiva. Contudo, vimento positivo dos jovens por meio do esporte,
também podem ser exemplos contraproducentes procurando que este contribua para o pleno desen-
quando têm expetativas demasiado elevadas quanto volvimento físico, mental e social. Desta forma, os
ao rendimento esportivos dos seus filhos, colocando pais são pilares fundamentais na iniciação e promo-
uma pressão tão alta que podem tornar a experiên- ção do esporte, constituindo-se como elos facilita-
cia esportiva aversiva e indesejável (GOMES, 2011). dores deste processo, pelo entusiasmo e pela dedica-
Smoll, Cumming e Smith (2011) indicam que a ção que podem evidenciar. Assim, faz todo o sentido
pesquisa evidenciou a influência da família na so- que a instituição que recebe o jovem estabeleça uma
cialização esportiva das crianças e tem um impacto relação de elevada confiança com os pais dos atletas.
profundo nas consequências psicológicas que daí Nesta relação. o primeiro contato, habitualmente, é
decorrem. Neste sentido, os autores indicam que as pelo treinador, profissional responsável pela integra-
crianças e os jovens têm o direito de não querer par- ção e pelo acompanhamento do jovem, fomentando
ticipar e, desta forma, impor o esporte pode produ- a sua inclusão e promovendo a atividade a ser desen-
zir os efeitos contrários aos desejados. volvida no seio do clube esportivo.
Gomes e Zão (2007), em uma pesquisa em que Gomes (2011) propõe que a postura do treinador
estudaram a relação entre a influência parental e a em relação aos pais menos vinculados e interessados
motivação no esporte, com recurso a dois instrumen- com a prática esportiva dos filhos será a de fomen-
tos relativos aos pais e aos atletas, constataram que, tar e encorajar o seu envolvimento, entusiasmando a
em relação aos atletas, existe maior apoio parental nas sua participação em atividades que enaltecem a sua
modalidades de caráter individual; maior apoio, influ- utilidade e relevância para o projeto esportivo com
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INICIAÇÃO ESPORTIVA
O treinador pode, ainda, ser o mentor de eventos so- Esta ficha, da qual se sugere um exemplo (ver Figura
ciais que promovam afinidades entre atletas, família, 1) poderá registrar diferentes tipos de informação.
treinadores e dirigentes. Realizações que vão além Temos consciência que a construção de uma ficha
do treino e da competição, fomentam o sentimento deverá ser pessoal (do treinador ou do clube) e terá
de pertença e constituem uma oportunidade impor- que ser adaptada ao contexto específico no qual se
tante para que as pessoas se conheçam e ganhem la- desenvolve o trabalho, assim como à modalidade es-
ços de empatia. portiva. Contudo, propõe-se que essa ficha:
A qualidade da atividade do treinador pode • Contenha uma informação pessoal básica
ser incrementada e valorizada pelos pais dos atle- (quem desejar ser um pouco mais profundo
tas por meio da criação de uma ficha do atleta. Ela poderá caracterizar mais a filiação com, por
exemplo, a idade dos pais e a sua ocupação
reunirá a informação pessoal do atleta, resulta sua
profissional).
atividade esportiva, e deverá ser enviada aos pais
• Dados biométricos, em que se pode registar
em, pelo menos, duas vezes por época esportiva. O de forma muito fácil a evolução física (com
serviço prestado pelo clube poderá constituir um o peso, a altura e a envergadura), o cálculo
diferenciador positivo, e demonstra o empenho que do IMC que dá uma indicação se o atleta está
o treinador coloca em ação para que a evolução do dentro da Zona Saudável de acordo com a
atleta decorra da melhor forma possível. OMS (Organização Mundial da Saúde). Os
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