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METALURGIA – INSPETOR DE EQUIPAMENTOS

1. ESTRUTURA CRISTALINA DOS METAIS

1.1. Ligações Interatômicas


1.1.1. O modelo atômico

A intuição da existência de partículas indivisíveis que constituem todas as coisas foi relatada pelo
filósofo grego Demócrito em aproximadamente 540 a.C.
Demócrito afirmou que estas partículas, que denominou átomos, sempre tinham existido, não podiam
ser destruídas e assumiam tamanhos e formas diferentes, mas eram feitas do mesmo material básico.
As diversas substâncias que percebemos seriam decorrentes da forma como os átomos se ligam entre
si. Além disso, segundo Demócrito, os átomos de substâncias sólidas também vibravam ou pulsavam
os átomos da fumaça ou do fogo movimentavam-se livremente, colidindo uns com os outros.
Estes conceitos filosóficos chegaram até nós indiretamente, através das criticas de Aristóteles, que
considerava a idéia do átomo como errada.
As opiniões de Aristóteles sobre questões científicas eram consideradas por todos como definitivas,
portanto, não se discutiu mais o assunto por cerca de 2000 anos.
A prova de que a matéria não era continua, isto é, capaz de ser dividida infinitamente, e sim composta
por partículas, foi obtida pelo químico inglês John Dalton, que no início do século XIX provou que os
elementos eram sempre encontrados nas substâncias em proporções simples, originando o conceito de
fórmula química.

Com o estudo da eletrólise por Michael Faraday, na década de 1830, descobriu-se que os átomos se
constituíram de partículas de carga elétrica negativa e de carga elétrica positiva.
O estudo com materiais radioativos ou excitados com corrente elétrica levou à descoberta da radiação
β , constituída de partículas de carga negativa com massa muito pequena. Estas partículas foram
denominadas de elétrons e sua descoberta por J.J. Thomson ocorreu em 1897.

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Thomson criou um modelo atômico, apresentado na Figura 1.1, onde numa massa de material de
carga positiva estavam encravados os elétrons, como passas em um bolo.

FIGURA 1.1 - O modelo atômico de Thomson

Este modelo foi rapidamente superado em função da experiência de Ernest Rutherford e Ernest
Mardsen realizada em 1911, que se constituía no bombardeio de uma finíssima folha de ouro com
partículas alfa, de carga positiva. Caso o modelo de Thomson fosse verdadeiro, as partículas alfa se
dispersariam pouco ao atravessar a folha de ouro.

Como indicado na figura 1.2 o resultado obtido foi diferente do esperado, levando ao estabelecimento
do modelo atômico apresentado na figura 1.3.

FIGURA 1.2 - Resultado esperado e real da experiência de Rutherford e Marsden

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FIGURA 1.3 - Modelo atômico de Rutherford onde o átomo é visto como um sistema solar em
miniatura, com elétrons girando em tomo do núcleo, de carga positiva.
O modelo atômico de Rutherford, de elétrons girando em tomo do núcleo de carga positiva, não era
compatível com os conhecimentos de eletricidade e de magnetismo já disponíveis na época, que
previam que, devido à atração entre cargas opostas, os elétrons, de carga negativa, perderiam energia
gradualmente e percorreriam uma espiral em direção ao núcleo, de carga positiva. Nesta perda de
energia, os elétrons emitiriam uma radiação eletromagnética de espectro contínuo, isto é, um arco-íris
de luz. Segundo este modelo, toda a matéria seria instável e entraria imediatamente em colapso.
Como isto não é verdade, tornava-se necessária uma reformulação desta teoria do modelo atômico.
Em 1912 o físico dinamarquês Niels Bohr propôs que os elétrons deveriam girar somente a
determinadas distâncias do núcleo. Os elétrons irradiariam energia ao saltar de uma órbita de maior
energia, situada mais próxima do núcleo, para outra de menor energia. No deslocamento no sentido
contrário os elétrons absorveriam energia. Este modelo explicava as linhas espectrais que associavam
a cada elemento emissões de energia em determinados comprimentos de onda e não segundo um
espectro contínuo.
O modelo de Bohr funcionava precariamente em átomos com número de elétrons maior que o do
sódio e não explicava com exatidão as linhas espectrais. Bohr e Arnold Sommerfeld aperfeiçoaram o
modelo original incluindo órbitas elípticas e com diversos plano de inclinação.

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Assim a órbita de um elétron seria definida pelos números quânticos n(número da órbita), l (forma da
órbita e m (inclinação da órbita)). Posteriormente foi introduzido o quarto número quântico por
Wolfgang Pauli, referente ao movimento de rotação do elétron em torno de si mesmo. Este número
quântico s corresponde ao “spin” do elétron.
Em 1924, Pauli estabeleceu o princípio da exclusão, segundo o qual, se um elétron possui um
determinado conjunto de números quânticos n, 1, m e s, então, nenhum outro elétron daquele átomo
poderá ter o mesmo conjunto de números quânticos.
Na figura 1.4 apresentam-se os átomos de hidrogênio, hélio e sódio, conforme este modelo.

FIGURA 1.4 – Constituição dos átomos de hidrogênio, hélio e sódio. De acordo com o princípio da
exclusão de Pauli, na mesma órbita só poderá haver dois elétrons se estes possuírem spins opostos.
A quantidade de energia liberada como fóton (partícula ou onda de luz) pode ser calculada pela
expressão:

Onde:
E é a energia do fóton
-
h é a constante de Planck (h = 6.63 x 10 34J.s)
c é a velocidade da luz (c = 3 x 108 m/s)

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λ é o comprimento de onda
‫ ע‬é a frequência

O modelo de Bohr – Sommerfeld foi posteriormente aperfeiçoado..


1.2. Configuração de mínima energia

A Tabela 1.2 apresenta a tabela periódica dos elementos, indicando, entre outras informações, seu
número atômico e massa atômica (massa, em gramas, correspondente a 6,02 x 1023 átomos do
elemento).
Os gases nobres (hélio, neônio, argônio, criptônio, xenônio e radônio) possuem um arranjo muito
estável de oito elétrons na última camada (dois elétrons no caso do hélio), correspondendo a um baixo
nível de energia.
Os outros elementos, para adquirir a configuração altamente estável de oito elétrons no nível mais
externo, devem:
a) receber elétrons
b) perder elétrons
c) compartilhar elétrons
Estes três processos produzem fortes ligações entre os átomos, conhecidas como ligação iônica,
ligação covalente e ligação metálica. Outro tipo de ligação, mais fraca, é a ligação de Van der Waals.
A estabilidade das ligações atômicas deve-se à existência de um valor mínimo de energia,
correspondente a uma certa distância interatômicas, onde ocorre um balanço entre as forças de atração
e de repulsão. A natureza das forças de atração entre os átomos depende do tipo de ligação atômica.
As forças de repulsão crescem à medida que os átomos aproximam suas camadas de elétrons mais
externas, que se repelem por serem ambas de carga negativa.
A figura 1.6 ilustra este tipo de interação considerando-se a temperatura igual a 0ok. Diminuindo-se a
distância entre átomos inicialmente afastados tem-se a princípio uma força resultante de atração, uma
situação de equilíbrio e, em seguida, o predomínio das forças de repulsão.

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FIGURA 1.6 – Relação entre a força (a) ou a energia de ligação (b) com a distância entre os centros
de dois átomos.

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TABELA 1.2 – Tabela periódica dos elementos. Para cada elemento tem-se o número atômico e a
massa atômica (carbono = 12,000).

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A energia de ligação E relaciona-se com a força resultante F pela expressão:

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Com o aumento da temperatura, os átomos adquirem maior energia cinética, vibrando e variando a
distância a em torno de a’. Caso a energia cinética seja superior em valor absoluto a E ∞ – E min a
ligação é rompida, levando ao estado gasoso.
Além do efeito da temperatura, a distância interatômica depende do tipo de átomo, do seu estado de
ionização, dos átomos vizinhos e da existência de solicitação externa, como esforços mecânicos,
campo elétrico ou forças magnéticas.
A existência de uma distância de equilíbrio entre os átomos permitiu o desenvolvimento do modelo
atômico de esferas rígidas que, mesmo não sendo rigorosamente correto, é conveniente para explicar
o comportamento dos materiais onde as ligações entre os átomos não são direcionadas, como é o caso
da ligação iônica e da ligação metálica.

1.1.3. Ligação iônica

A ligação iônica é estabelecida entre um cátion (elemento que cede elétrons com facilidade) e um
anion (elemento com grande afinidade pelos elétrons).

Devido à sua configuração eletrônica, os metais tendem a ceder os seus elétrons mais externos
formando íons de carga positiva (cátions). Os elementos com o último nível quase completo recebem
os elétrons, formando íons de carga negativa (anions).

A atração entre íons de cargas positivas e negativas produz a chamada ligação iônica, evidentemente
só possível entre átomos de elementos diferentes.

A figura 1.7 apresenta a formação de uma molécula de cloreto de sódio através da ligação iônica entre
o cloro e o sódio.

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FIGURA 1.7 – Exemplo de ligação iônica: a) o sódio cede um elétron para o cloro; b) os íons, de
cargas opostas, atraem-se.
Na realidade, como existem vários íons de sódio e cloro presentes, cada íon coordena-se com seus
vizinhos formando uma estrutura ordenada como por exemplo, o cristal de cloreto de sódio
apresentado na figura 1.8.

FIGURA 1.8 – Esquema de coordenação dos íons Na+ e Cl- formando, por ligação iônica, uma
estrutura cristalina.

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As substâncias formadas por ligação iônica apresentam normalmente alta dureza, boa clivagem, alto
ponto de fusão e baixo coeficiente de expansão térmica. No estado líquido conduzem corrente elétrica
pela movimentação dos íons.

1.1.4. Ligação Covalente

Na ligação covalente os átomos compartilham seus elétrons das órbitas mais externas, formando pares
de elétrons (com spins opostos) que pertencem aos dois átomos. Na figura 1.9, a ligação covalente é
exemplificada pela formação da molécula de hidrogênio.

O intercâmbio oscilatório do par de elétrons entre os dois átomos, pertencendo ora a um, ora a outro,
gera uma atração eletrostática, pois momentaneamente os átomos tomam-se ionizados.
Um mesmo átomo pode participar de mais de uma ligação covalente. De um modo geral, o número de
ligações será igual ao número de elétrons necessários para completar o último nível. No caso da
molécula de água, por exemplo o átomo de oxigênio compartilha 2 pares de elétrons com 2 átomos de
hidrogênio, como indicado na figura 1.10. As ligações covalentes são direcionadas espacialmente, em
função do número e tipo dos elétrons envolvidos. No caso da água as 2 ligações formam entre si um
ângulo de 105°.

FIGURA 1.10
(a) Distribuição de elétrons no último nível e estabelecimento de 2 ligações covalentes nas moléculas
de água

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(b) Esquema tridimensional da molécula de água

1.1.5. Ligação Metálica

O primeiro modelo da ligação metálica foi proposto por Drude e Lorentz entre 1900 e 1905,
constituindo a teoria dos "elétrons livres". Neste modelo simplificado, porém suficiente para explicar
muitas propriedades dos metais, os átomos do metal perdem seus elétrons do último nível. Os íons de
carga positiva assim gerados formam um arranjo regular e os elétrons livres, que não se encontram
ligados a nenhum átomo em particular, circulam entre esses íons, obedecendo às leis dos gases.
A força de atração é conseqüência da interação entre os íons positivos e os elétrons livres, que são
compartilhados por todos os átomos.
Os elétrons livres explicam a elevada condutividade elétrica dos metais, pois as únicas resistências à
movimentação da corrente elétrica são as colisões com os outros elétrons. A condutividade térmica
dos metais advém da movimentação elevada dos elétrons, carregando energia térmica das regiões de
temperatura mais elevada para regiões de temperatura mais baixa.
Como os elétrons absorvem energia de fótons com freqüência na faixa da radiação luminosa, tem-se
que os metais são opacos (para espessuras acima de algumas centenas de átomos).
As propriedades mecânicas dos metais, como, por exemplo sua deformação plástica, estão associadas
ao arranjo cristalino.

1.2. Sistemas cristalinos


1.2.1. Reticulados espaciais

Os metais formam estruturas cristalinas algumas vezes perceptíveis a olho nu. Na figura 1.12 diversos
cristais (grãos) de latão podem ser observados.

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FIGURA 1.12 - Maçaneta de porta de latão onde a estrutura cristalina foi evidenciada pela ação
corrosiva do suor.
Cristais são conjuntos de átomos ordenados segundo uma configuração periódica em três dimensões.

Os sistemas cristalinos contêm os reticulados espaciais conhecidos como redes de Bravais. Através de
apenas 14 reticulados espaciais é possível descrever todos os cristais que podem ocorrer na natureza.

Na figura 1.14 estão apresentadas as células unitárias convencionais de cada rede espacial. Através da
sua repetição no espaço reproduz-se todo o reticulado espacial.
Note-se que qualquer ponto destes reticulados espaciais apresenta a mesma vizinhança, isto é, os
outros pontos à sua volta situam-se na mesma posição relativa.
O conceito de reticulado ou rede espacial é geométrico, As estruturas cristalinas materiais são
constituídas pela repetição de um modelo atômico ou base, sobre cada ponto da rede espacial.

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FIGURA 1.14 – Reticulados espaciais

1.2.2. Estrutura cristalina cúbica simples (CS)

Nenhum metal cristaliza-se segundo a rede cúbica simples, pois esta estrutura é muito aberta e a
ligação metálica atua no sentido de mais aproximar os átomos, formando malhas mais compactas.
A célula unitária da rede cristalizada cúbica simples está indicada na figura 1.15, onde cada átomo
ocupa o vértice de um cubo cuja aresta (a) é igual a 2 raios atômicos (r).

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O número de coordenação desta estrutura é igual a 6, isto é, cada átomo possui 6 átomos vizinhos.

FIGURA 1: 15 - Estrutura cristalina cúbica simples

1.2.3. Estrutura cristalina cúbica de corpo centrado (CCC)


A estrutura cristalina cúbica de corpo centrado (CCC) apresenta um átomo em cada vértice da célula
unitária e um átomo no centro, como indicado na figura 1.16.

FIGURA 1.16 - Estrutura cristalina cúbica de corpo centrado.

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O número de coordenação da estrutura cúbica de corpo centrado é igual a 8 e o número de átomos por
célula unitária é igual a 2, pois ao átomo do centro somam-se as frações de um oitavo,
correspondentes aos oito átomos dos vértices.
O fator de empacotamento da estrutura CCC é igual a:

Alguns exemplos de metais que se cristalizam segundo a estrutura cúbica de corpo centrado são: o
ferro alfa, cromo, molibdênio, vanádio, tântalo e tungstênio.

1.2.4. Estrutura cristalina cúbica de face centrada (CFC)


A figura 1.7 apresenta a célula unitária da estrutura cristalina cúbica de face centrada (CFC) que
possui um átomo em cada vértice do cubo e um átomo no centro de cada face.

FIGURA 1.17 – Célula unitária da estrutura cristalina cúbica da face centrada.


Cada célula unitária possui quatro átomos, um devido à soma das frações de um oitavo,
correspondentes aos átomos nos vértices, e mais três devido à soma das metades dos átomos dos
centros das faces. O fator de empacotamento desta estrutura é igual a:

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Pela figura 1.18 verifica-se que o número de coordenação da estrutura CFC é igual a 12 e também que
a vizinhança de cada átomo é a mesma.
Muitos metais se cristalizam segundo a estrutura CFC, como é, por exemplo o caso dos metais ferro
gama, níquel, cobre, alumínio, prata, ouro, chumbo e platina.

1.2.5. Estrutura cristalina hexagonal compacta (HC)


A figura 1.19 apresenta a célula unitária da estrutura cristalina hexagonal compacta, que possui um
átomo em cada vértice do prisma hexagonal, um átomo no centro das bases e três átomos no centro do
prisma.
O número de átomos na célula unitária é igual a:
2 x 1/2 = 1 (átomos dos centros das bases)
12 x 1/3 x 1/2 = 2 (átomos dos vértices do prisma)
3 (átomos no centro do prisma)
Total de átomos na célula unitária = 1 + 2 + 3 = 6

FIGURA 1.19 - Estrutura cristalina hexagonal compacta


O fator de empacotamento da estrutura HC é igual a:

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O número de coordenação de estrutura HC é igual a 12, pois cada átomo possui 12 vizinhos.

Como exemplos de metais que se cristalizam segundo a estrutura hexagonal compacta, temos o
magnésio, titânio, zircônio, zinco e cádmio.

1.3. DEFEITOS NA ESTRUTURA CRISTALINA

1.3.1. Formação da estrutura cristalina


Quando um metal, ou liga no estado líquido é resfriado até seu ponto de fusão, inicia-se a
solidificação, através da formação de cristais em pontos da massa líquida. A cristalização irá formar
estruturas cristalinas que são dependentes do metal ou da composição da liga conforme será visto no
Capítulo 3. O estudo da solidificação como transformação de fase será realizado em maior detalhe no
Capitulo 5.
Conforme exemplificado na figura 1.27. ao se considerar o resfriamento do metal. no estado líquido
dentro de um molde, surgem, em vários locais, núcleos para a solidificação. Os cristais crescem a
partir destes núcleos até que começam a se encontrar uns com os outros na fase final da solidificação,
produzindo interfaces como a indicada na figura 1.28.
Denomina-se grão cada cristal individual do material. No caso do material policristalino, cada grão
encontra-se cercado por vários outros. A superfície de encontro de dois grãos é denominada contorno
de grão.

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FIGURA 1.27 - Solidificação dos grãos e formação do material policristalino

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FIGURA 1.28 - Contorno de grão. A região de transição que acomoda a diferença de orientação na
estrutura cristalina de grãos adjacentes é estreita, bastando poucos espaços atômicos para tal.

1.3.2. Classificação dos defeitos na estrutura cristalina


A estrutura cristalina real apresenta defeitos que podem ser observados a olho nu (defeitos
macroscópicos) ou que requerem para a sua observação um microscópio ótico (defeitos
microscópicos) ou um microscópio eletrônico (defeitos submicroscópicos). Como ilustração destas
classes de defeito tem-se alguns exemplos, a seguir.

a) Defeitos macroscópicos
- Porosidades (bolhas - gás retido: vazios - vácuo);
- Trincas;
- Inclusões;
- Segregações.

b) Defeitos microscópicos
- Contornos de grão;
- Outros contornos.

c) Defeitos submicroscópicos ou subestruturais


- Defeitos térmicos:
- Lacunas;
- Discordâncias;

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- Outros átomos em solução sólida.

Esta classificação possui a desvantagem de que o mesmo defeito pode ser de um tipo ou de outro, de-
pendendo do seu tamanho. Por exemplo, uma trinca ou um contorno de grão poderiam ser visíveis a
olho nu ou não.
Os defeitos na estrutura cristalina mais importantes são os submicroscópicos, que serão a seguir estu-
dados na escala atômica, dentro da classificação abaixo, proposta por Huntington em 1942.

a) Defeito de ponto
São correspondentes a variações na estrutura cristalina que envolvem poucas posições atômicas
englobadas num pequeno volume aproximadamente esférico.

b) Defeitos de linha
As irregularidades se estendem por um volume aproximadamente cilíndrico, ao longo de uma linha
reta ou curva.

c) Defeitos de superfície
Correspondem a irregularidades ao longo de uma superfície, contendo os átomos que lhe são
vizinhos.

Além dos defeitos inerentes ao próprio reticulado cristalino, existem as imperfeições devidas à
presença de átomos de outros elementos na estrutura.
Estes átomos são denominados impurezas quando sua presença é conseqüência do processo de
fabricação, e elementos de liga quando são adicionados com o propósito de se obter propriedades
desejadas.

1.3.3. Imperfeições associadas à composição química


Os átomos de outros elementos, sejam impurezas ou elementos de liga, podem acomodar-se na
estrutura cristalina de um dado metal formando uma solução sólida.
Chama-se matriz à estrutura cristalina do metal considerado, que é denominado solvente.
Os outros elementos, cujos átomos estão na solução sólida, são denominados solutos.

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Os átomos solutos podem estar em solução sólida substitucional, quando ocupam posições dos
átomos da matriz na estrutura cristalina, ou em solução sólida intersticial, quando ocupam interstícios
na estrutura cristalina.

As figuras 1.29 e 1.30 ilustram estes casos.

FIGURA 1.29 - Solução sólida substitucional (a) Átomos maiores; (b) Átomos menores que os da
matriz.

FIGURA 1.30 - Solução sólida intersticial


A distorção na estrutura cristalina, provocada pelos átomos em solução, significa um afastamento dos
átomos da sua posição de equilíbrio.
Os átomos que se encontram nesta região de distorção possuem, portanto, um nível energético mais
elevado que os átomos que constituem as porções perfeitas da rede cristalina.

A tabela 1.6 apresenta a forma como outros elementos se dissolvem na estrutura cristalina do ferro.

Assim como nas soluções em fase liquida, as soluções sólidas também apresentam um limite de
solubilidade, isto é, valores máximos para o teor de soluto na matriz.

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Nas soluções substitucionais o limite de solubilidade é função da relação entre os tamanhos atômicos,
número de elétrons no último nível, estrutura cristalina de cada elemento e eletronegatividade.
Se a diferença entre os tamanhos atômicos de dois elementos for inferior a cerca de 15% pode-se
esperar que haja grande solubilidade entre eles.
Na solução sólida intersticial, os átomos do soluto ocupam posições na estrutura cristalina onde há
um maior espaço para sua acomodação.

Por exemplo, considerando-se a estrutura CFC do ferro, os vazios octaédrico e tetraédrico possuem
raio interno de 0,52 e 0,28 angstroms respectivamente.
Os átomos de carbono ou de nitrogênio que ocupem estas posições estarão provocando distorção na
rede cristalina, porque seus raios atômicos são maiores 0,8 e 0,7 angstroms, respectivamente que o
espaço dos interstícios.
Na estrutura CCC do ferro, o interstício tetraédrico (r = 0,36 A) é maior que o octaédrico (r = 0,19 Â),
porém menor que o octaédrico na estrutura CFC (r = 0,52 Â).
Portanto, como conseqüência, tem-se que a estrutura CFC tem maior possibilidade que a CCC de
dissolver átomos de carbono ou nitrogênio em solução intersticial, mesmo sendo uma estrutura mais
compacta.

1.3.4. Defeitos de ponto

Lacunas são espaços vazios na estrutura cristalina que poderiam estar preenchidos por um átomo. São
também chamados de vazios ou vacâncias e constituem defeitos de ponto importantes, dada a sua
relação com o fenômeno da difusão, como será estudado no capítulo 2.
Com o aumento da temperatura, a quantidade de lacunas aumenta exponencialmente, sendo geradas a
partir de outros defeitos na estrutura cristalina, como por exemplo, os contamos de grão.
As lacunas podem também ocorrer associadas, aos pares ou em grupos maiores.

A figura 1.33 ilustra estes tipos de defeito de ponto.

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FIGURA 1.33 - Defeitos de ponto. (a) Lacuna; (b) Bilacuna; (c) Defeito de Schottky; (d) Átomo em
interstício; (e) Defeito de Frenkel

1.3.5. Defeitos lineares

Os defeitos lineares são denominados discordâncias ou deslocações e possuem fundamental


importância na deformação plástica dos metais, em função da sua atuação no deslizamento entre
porções do cristal.

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FIGURA 1.34 - Discordância aresta. A linha da discordância é a perpendicular ao plano do papel,
correspondente à aresta do semiplano adicional.

FIGURA 1.35 - As bolhas de sabão em (a) representam um plano compacto perpendicular a uma
discordância aresta. O esquema em (b) facilita a visualização do semiplano extra correspondente.

FIGURA 1.39 - O esforço para arrastar um tapete é menor, restringindo-se a região em movimento.

A analogia com a movimentação do tapete pode ser compreendida ao se considerar. através da figura
1.40, que poucos átomos em tomo da linha da discordância encontram-se fora das suas posições de
energia mínima, e que pequenos movimentos são suficientes para que o semiplano correspondente à

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discordância se alinhe com outro plano de átomos. A conseqüente movimentação da discordância
prossegue até que esta atinja a superfície do cristal, formando um degrau de deslizamento, cuja
extensão corresponde a um deslocamento da discordância.

O deslocamento de uma discordância da sua posição para a próxima posição equivalente é denomina-
do vetor de Burgers da discordância, representado pela letra "b".
Conforme o semiplano esteja acima ou abaixo do plano de deslizamento, a discordância aresta é dita
positiva ou negativa.
A discordância simbolizada na figura 1.40 é por exemplo, uma discordância aresta positiva.

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FIGURA 1.40 - O esforço de cisalhamento F produz pequenos movimentos atômicos e troca das
ligações entre os átomos. A discordância se movimenta produzindo um degrau correspondente a uma
distância atômica (para o sistema cúbico simples).

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1.3.6. Defeitos planares

As irregularidades na estrutura cristalina associadas à superfícies são os defeitos planares, que serão a
seguir abordados e que incluem as superfícies livres do metal os contornos de grão, outros contornos
(maclas, interfaces com outras fases presentes) e as falhas de empilhamento.

a) Superfícies livres
Os átomos do metal que constituem superfícies livres do metal, como a superfície de bolhas ou
porosidades, ou a superfície em contacto com a atmosfera, encontram-se num nível energético mais
elevado do que os átomos que se encontram no interior do cristal.
Isto se dá porque os átomos superficiais têm vizinhos apenas de um lado, causando um
desbalanceamento das camadas de elétrons e originando um efeito de tensão superficial e de energia
de superfície.
Ao se considerar um processo de fratura num metal, tem-se que uma parcela da energia necessária
para a fratura será empregada como energia superficial associada à criação das superfícies da fratura.

A figura 1.47 apresenta um esquema dos átomos superficiais de um metal.

FIGURA 1.47 - Os átomos na superfície livre encontram-se num nível energético mais elevado que
os átomos do interior, porque não estão completamente circundados por outros átomos.

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b) Contornos de grão
As diferentes orientações entre os cristais desenvolvidos a partir de núcleos distintos, formam, como
ilustrado pelas figuras 1.27 e 1.28, superfícies constituídas por átomos que acomodam estas
diferenças.
A figura 1.48 apresenta contornos de grão vistos ao microscópio ótico e um modelo atômico
indicando a desordem na superfície de fronteira entre os grãos vizinhos.

FIGURA 1.48 - (a) contornos de grão de molibdênio vistos no microscópio ótico (b) modelo atômico
indicando a variação nas distâncias entre os átomos dos contornos de grão.

Os contornos de grão possuem outros defeitos subestruturais ou submicroscópios, como lacunas e dis-
cordâncias.
Como as distâncias interatômicas nos contornos de grão diferem da posição de equilíbrio já vista na
figura 1.6, tem-se que os átomos pertencentes aos contornos de grão possuem nível energético
superior ao dos átomos no interior dos grãos. Isto os torna mais suscetíveis de sofrer modificações,
como participar de reações químicas (correndo-se) ou metalúrgicas (nucleando uma segunda fase).

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2. DIFUSÃO
2.1. Vibrações térmicas
Os átomos de um metal se encontram em movimento, vibrando em tomo da sua posição de equilíbrio
na estrutura cristalina. Quanto maior a temperatura, maior será a intensidade da vibração dos átomos,
porque deste modo se armazena no metal a energia utilizada para o aquecimento. Esta energia é
liberada durante o resfriamento.
A movimentação de um átomo, ou mudança de posição, exige que este átomo atinja um nível de
energia mais elevado que permita liberar-se dos seus vizinhos. Com o aumento da temperatura cresce
a quantidade de átomos com nível energético acima do valor mínimo necessário para o deslocamento,
bem como o número de lacunas. Ao movimento dos átomos no metal se dá o nome de difusão, que é
tanto mais intensa, quanto maior a temperatura.

2. Mecanismos de difusão
Os mecanismos de difusão mais prováveis são:

a) Difusão intragranular (ou no volume)


Os átomos se deslocam pelas posições correspondentes no sistema cristalino. Tem-se a difusão
substitucional e a difusão intersticial, conforme a movimentação seja de átomos em solução sólida
substitucional ou intersticial.

b) Difusão na superfície livre e nos contornos


Como as superfícies livres do metal e os contornos de grão são superfícies abertas, isto é, apresentam
maior espaço entre os átomos também possuem energia mais elevada, tem-se a formação de caminhos
preferenciais para a difusão, segundo estas superfícies.

c) Difusão nas linhas de discordâncias (ou difusão tubular)


Os espaços mais abertos associados a uma linha de discordância facilitam a difusão. Tal tipo de
difusão é mais importante, se a densidade de discordâncias for elevada.

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Os tipos de difusão podem atuar simultaneamente, como esquematizado na figura 2.6. O metal A,
depositado por soldagem sobre o metal B, difunde-se em B pelo volume e peles contornos de grão.
Nesta difusão combinada, os átomos de A movimentam-se mais rapidamente pelos contornos de grão.
O aumento da concentração de A nos contornos de grão causa a difusão de A dos contornos para o
interior dos grãos, como indicado pelas setas.

FIGURA 2.6 - Difusão combinada no volume e nos contornos de grão.

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