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Resenha do livro trata de um esquema de categorias, de classificação, algo

ARISTÓTELES PARA TODOS muito comum no nosso cotidiano. Estamos sempre


Adler Mortimer catalogando, dividindo.
E para compreender melhor isto precisamos de Aristóteles,
INTRODUÇÃO quem teve uma grande capacidade de fazer perguntas e
Adler destaca a importância da Filosofia para nos ajudar a reflexões a partir do senso comum. Dentro da categoria
compreender melhor as coisas que já sabemos. E nesse “Mineral”, por exemplo , Aristóteles nos faria distinguir
aspecto Aristóteles é o melhor professor, nos ajudando a não apenas seres inanimados dos não vivos, mas
pensar filosoficamente. inanimados simples e compostos, embora para ele a
Ele nasceu na cidade macedônica de Estagira em 384 a.C principal divisão é a que separa as coisas vivas das não
e viveu até 322 a.C. Foi tutor de Alexandre Magno e abriu vivas.
o Liceu, a sua própria escola, em 335 a.C. Nela havia uma O animado é superior ao inanimado. Animais são
biblioteca, zoológico e uma extensa coleção de mapas. superiores às plantas. Eles nascem, crescem, reproduzem,
E mesmo tendo vivido há vinte e cinco séculos não teria se locomovem , a maioria tem órgãos dos sentidos e são
sido melhor professor do que se tivesse vivido hoje, apesar capazes de desempenhar funções que as plantas não
de todas as descobertas da Ciência moderna, tendo em desempenham.
vista que teve as mesmas experiências do senso comun que O homem está no topo da escala. É um tipo peculiar,
temos nos dias atuais. Experiências expressas através de animal racional, capaz de raciocinar, elaborar perguntas a
palavras como "coisa", "mente", " causa", "parte" respeito do quê, porquê e para quê, dar respostas e fazer
"muitos"... que usamos para tratar das plantas que reflexões. Só o ser humano é capaz de pensar
crescem, dos animais que nascem e morrem, dos filosoficamente. Nenhum outro animal joga jogos
sofrimentos, de dormir, sonhar, de exercitar o corpo e filosóficos. As diferenças de cor da pele, tamanho,
tomar decisões. O seu modo de refletir sobre elas nos ajuda formato da cabeça, cabelo são acidentais, não essenciais,
a compreender melhor a nossa vida, o mundo e a sociedade como as que separam os homens dos animais. O
em que vivemos. Partiu do senso comum, das importante são as características essenciais comuns, a
experiências que todos temos (e não nos foram ensinadas humanidade comum.
na escola, pois constituem patrimônio comum do
pensamento humano a respeito de tudo), diferentes das 2 – A Grande Divisória
experiências especiais dos cientistas feitas nos laboratórios A grande divisória é a linha que separa o mundo físico
e que normalmente não testemunhamos. Mas não parou no (apenas parte de tudo o que existe) de todo o universo que
senso comum, foi muito além, chegando a percepções e pode ser pensado. Objetos matemáticos, personagens,
entendimentos profundos, incomuns, sendo o objetivo Deus, ideias e teorias... não são corpos.
deste livro tornar este pensamento mais fácil de entender. Ao pensar o mundo físico Aristóteles traçou uma linha
divisória, de um lado pôs os corpos e do outro os seus
PARTE I atributos, como as fragrâncias e as cores. Na verdade são
O HOMEM COMO ANIMAL FILOSÓFICO aspectos relacionados com a quantidade, qualidade e lugar
ou posição. Tamanho e peso, por exemplo, não existem
1 – Jogos filosóficos por si mesmos. São características que existem nas coisas
Dois jogos muitos comuns: “Animal, Vegetal, Mineral” e físicas. E as coisas físicas existem por si mesmas e são
“Vinte Perguntas” consistem em fazer perguntas. O mutáveis, enquanto os seus atributos não estão sujeitos à
primeiro é o que mais nos faz pensar filosoficamente, pois
mudança. O verde nunca se torna vermelho, mas é o O romance de Crusoé é uma história de conquista e
tomate verde que fica vermelho quando amadurece. domínio da natureza pelo homem, uma história de
Os atributos que permanecem durante a vida toda é o que coragem e previdência. Aristóteles teria considerado as
faz a coisa pertencer a determinado grupo particular de mudanças na natureza produzidas sem Crusoé e não o
coisas e diferenciam uma coisa da outra. Por exemplo, a homem contra a natureza, mas trabalhando com a
capacidade de levantar este tipo de questão é um atributo natureza.
permanente do ser humano e o que o diferencia dos outros Esclarece a linha que separa o natural do artificial. Um
animais e mostra que os animais racionais não são apenas incêndio na floresta causado por um raio é obra da
coisas físicas. E por isso são chamados pessoas, o que é natureza, portanto natural. Um incêndio causado pelo
diferente de coisa. Palavra problemática, pois pode dizer homem de forma descuidada, sem qualquer planejamento
respeito tanto às coisas físicas quanto aos seus atributos. (de forma acidental) ou propósito é algo natural, pois o
Cabe então prestar a atenção aos diferentes sentidos das incêndio foi causado, não produzido. Então nem tudo o
palavras que usamos. que resulta das ações humanas é uma obra de arte, ou seja,
uma produção humana. O fogo existe por si só e há
3 – As três dimensões do homem incêndios na floresta mesmo sem a presença humana.
Como pessoa o ser humano possui três dimensões: Fazer, Quanto ao fogo produzido deliberadamente pelo homem,
agir e conhecer. Na primeira temos o homem que é artista, por exemplo, para produzir a sua refeição, pode ser
artesão, produtor de uma diversidade enorme de coisas. A colocado do lado da linha do artificial, podendo ser
Poética de Aristóteles é um tratado sobre o homem chamado um acontecimento artificial. Os homens
fazedor. A palavra grega da qual vem a palavra “poesia” constroem casas, não ajudam a natureza a produzi-las.
significa fazer. Na segunda o homem como capaz de Casas são produtos artificiais, não existiriam na ilha sem
buscar a felicidade, um ser moral que distingue entre o que Crusoé as tivesse construído. Ele não fez a casa do
certo e o errado e na terceira o homem como um ser que nada, aproveitou a matéria pré-existente na natureza, como
aprende sobre a sociedade, a natureza e sobre o próprio a madeira, os ramos, além das ferramentas que possuía.
conhecimento. Podemos chamar a construção de casas de produto
Aristóteles distingue três tipos de pensamento: “o artificial, mas não totalmente, por causa dos materiais
pensamento produtivo”, que descreve o homem fazedor; aproveitados. A Bíblia nos diz que Deus é que fez o
“o pensamento prático”, que o homem elabora como ator mundo do nada. Os homens são responsáveis pelas
e o “pensamento especulativo”, que descreve o homem produções, Deus pela criação.
como conhecedor. Filhos são produtos naturais, não artificiais, podem ser
Estes três aspectos das atividades humanas estão feitos sem nenhuma premeditação, planejamento ou
relacionados com a verdade, objetivo do conhecimento, propósito, diferente de provocar incêndios ou construir
com a bondade, pois individualmente e vivendo em casas. Quando os homens têm ideia de como a procriação
sociedade temos interesse em buscar o certo e o errado, acontece na natureza podemos dizer que ter filhos é, ao
com a beleza, que diz respeito a produzir coisas bem feitas. menos em parte, resultado de planejamento. Mas se não
tiver tal conhecimento, ter filhos é completamente
PARTE II acidental.
O HOMEM COMO FAZEDOR
5 – Mudança e permanência
4 – Crusoé segundo Aristóteles As coisas são mutáveis. O Movimento e a mudança, a
geração e a corrupção ocorrem em todo o mundo natural.
É o que mostra nossa experiência comum da natureza. Por 2- Quem fez? A resposta desta questão é a causa eficiente,
outro lado, em meio à mudança sempre permanece algo, que é o fazedor. Diz respeito aquilo com que alguma coisa
que continua o mesmo. A bola de tênis arremessada, por é feita. O sapateiro é a causa eficiente do sapato.
exemplo, mudou de lugar, mas é a mesma bola. 3 – O que está sendo feito? A resposta desta questão é a
Da ampla variedade de corpos em movimento Aristóteles causa formal, diz respeito aquilo no que alguma coisa é
distingue o que é natural do artificial. Uma bola que cai é feita. Não é a forma, mas uma ideia que é comum a todos
algo natural. Arremessada pela interferência do ser os sapatos, por exemplo, a sapaticidade (ser sapato).
humano é um movimento artificial, assim como a pintura 4 – Está sendo feito para quê? A resposta desta questão é
de qualquer coisa (mudança de qualidade) é artificial. Já o a causa final, diz respeito aos objetivos, finalidades que se
amadurecimento do tomate pelo calor do Sol é natural. tem em vista ao produzir algo. Não é possível que alguém
As mudanças de quantidade nos seres inanimados são produza algo sem nenhum propósito.
ilimitadas. Você pode colocar lenha indeterminadamente As quatro causas se relacionam e são fundamentais em
na fogueira. Nas mudanças de quantidade nos seres vivos todas as transformações em qualquer produção humana.
há limites, pois pode dar o máximo de cenoura para um Nas operações da natureza é mais difícil identifica-las. No
coelho que haverá um limite para o seu tamanho. Um gato amadurecimento de um tomate provocado pela luz solar
não ficará do tamanho de um tigre. Um balão pode ficar de ele passou de verde para vermelho. O tomate é a causa
um tamanho mínimo até desaparecer, mas os animais material da mudança, sujeito que sofreu a mudança. A
quando param de crescer não diminuem de tamanho até vermelhidade (ser vermelho) é a causa formal e ao mesmo
desaparecer. Em todas as mudanças, naturais ou artificiais, tempo a causa final, diferente de uma pessoa que pinta uma
ocorrem transformações na matéria. cadeira verde de vermelho, pois o seu propósito era
Todas as mudanças demandam tempo para acontecer. distinto da vermelhidade que era a causa formal da
Algumas levam instantes quase imperceptíveis, como por transformação da cor da cadeira.
exemplo, um balão que estoura e um coelho que morre. No caso da mudança relacionada ao crescimento de um ser
Aristóteles chama tais mudanças de geração e corrupção. vivo a questão é mais complexa. Aristóteles usa o exemplo
E mesmo neste tipo de mudança existe algo que de uma bolota que recebe nutrientes da luz do Sol, da
permanece, o que nem sempre é identificável com chuva e do solo e acaba por se tornar um carvalho
facilidade. Nas produções e destruições artificiais o que desenvolvido. A forma desenvolvida é a causa final, que
permanece são os materiais utilizados, para fazer uma estava presente, em potência (o que está destinado a ser),
cadeira por exemplo. O que desaparece é a forma. Na desde o primeiro momento na semente. No linguajar da
morte de um coelho o que permanece é a matéria orgânica, ciência moderna o código genético de uma semente dá a
que pode entrar na composição de outro ser vivo. ela as instruções para crescer e desenvolver-se. Para
Chamamos isto de conservação da matéria. Aristóteles estas instruções eram dadas pelas potências
intrínsecas de um ser vivo, o que de certa forma é
6 – As quatro causas intercambiável com as explicações modernas, que dão o
Em relação a todas as mudanças que conhecemos na poder de interferir nos processos naturais.
experiência comum, a respeito de qualquer produção
humana, Aristóteles formula respostas para quatro 7 – Ser e não ser
questões fundamentais: Em se tratando das mudanças produzidas pelos seres
1- Ela vai ser feita de quê? A resposta desta questão é a humanos, a produção artificial, cabe entender o conceito e
causa material, aquilo de que alguma coisa é feita. Couro a relação entre quatro palavras: matéria, forma, potência e
é a causa material do sapato. ato. A matéria pode adquirir uma forma, ou estar privada
dela e nesse aspecto pode adquiri-la. Pedaços de madeira etapas e sequência correta da produção. A mente, as mãos
não são cadeira em ato, mas tem a potencialidade (a e as ferramentas são a causa eficiente do que foi produzido,
potência de tornar-se cadeira) de adquirir a forma de atuando sobre os materiais. Mas a mente é o principal,
cadeira, deixando assim de ser cadeira potencial. Mas ao fonte das ideias produtivas e do saber prático, sem os quais
tornar-se cadeira não deixa de ser madeira de um certo seria impossível fazer qualquer coisa.
tipo, portanto algo persiste nesta mudança. A palavra techinikos do grego significa a capacidade para
E toda matéria tem uma forma e tem uma potência limitada produzir as coisas. O equivalente em Latim é ars, e em
para adquirir outras formas. Madeira não pode tornar-se Português arte. O artista é aquele que possui a
uma lâmpada. Uma matéria que não tivesse forma teria qualificação, a técnica, utilizada desde as tarefas mais
uma capacidade ilimitada de adquirir outras formas. Então simples até as mais complexas. Não são artistas apenas
não seria nada em ato, mas o nada não existe. A matéria aqueles que produzem “obras de arte”, mas todos que
informe não existe. possuem as ideias produtivas e o saber prático para
O nascimento e a morte de animais não são tão fáceis de produzirem coisas: agricultores, cozinheiros, médicos,
entender. Quando um lobo devora um coelho a matéria do professores, sapateiros... Médicos e agricultores, por
coelho desintegra, desaparece e ele não possui a sua forma, exemplo, são artistas cooperadores com a natureza, no
tornando-se forma de outro tipo de coisa, a do lobo. sentido que cooperam com a natureza na produção de
O processo de nascimento de um coelho começou com a frutas e grãos e na preservação da saúde, respectivamente.
fertilização do óvulo da coelha pelo esperma do coelho. E O mesmo vale para os professores, que colaboram na
nenhum dois era coelho em ato, ainda que os dois juntos aquisição do conhecimento. São artes cooperativas, não
tivessem a potencialidade de vir a ser coelho. O bebê produtivas.
coelho desenvolve-se no útero da mãe coelha e o seu As artes produtivas diferem de muitas maneiras umas das
nascimento nada mais é do que a separação de um corpo outras e são de grande variedade. Vão de casas, roupas,
vivo do outro, movimento que passou de um local para o sapatos, cadeiras até pinturas, estátuas, poemas e canções.
outro, de dentro para fora da mãe coelha. Algumas são obras para usar por um determinado
propósito e outras para fruir, que satisfazem as pessoas que
sentem prazer ao percebê-las, seja olhando, ouvindo ou
8- Ideias produtivas e saber prático lendo.
O pensamento produtivo ou ideias produtivas envolve Aristóteles relaciona o belo e a beleza com o fato de fazer
tudo aquilo que podemos chamar de ideias criativas, que bem feito as coisas e com o prazer que sentimos em
estão relacionadas com as formas que a matéria pode contemplá-las. Podemos contemplar uma estátua, uma
assumir. As ideias produtivas de um artesão é o que lhe música, uma mesa, uma casa. Tais obras demonstram a
permite transformar a matéria-prima em uma cadeira, por qualificação de quem as fez e pessoas qualificadas talvez
exemplo. Tais ideias estão presentes nos planejamentos sejam mais sensatas para emitir opiniões se uma obra de
preparados (o que nem sempre acontece), no papel, para a arte foi bem feita ou não. E assim como uma pessoa pode
produção de uma casa ou de qualquer outra coisa. Quem ser mais qualificada do que outra, pessoas podem melhor
prepara o plano tem a ideia produtiva (o arquiteto no caso gosto do que outras, sendo mais sensato conversar com tais
da casa) e quem executa tem o saber prático, aquele que pessoas sobre a beleza das obras de arte, embora possamos
utiliza as matérias-primas, materializando a ideia (o dizer que a beleza de uma obra de arte depende também de
construtor). outros fatores.
O saber prático envolve a escolha das matérias-primas, dos O saber prático, a qualificação, derivam primordialmente
materiais apropriados e das ferramentas e o domínio das no conhecimento de senso comum da natureza e em etapas
posteriores no conhecimento científico da natureza, mesmo que elas possam ser feitas. Mas poderíamos
tecnologia, que nos qualifica e nos permite produzir perguntar por que e sua resposta levar até a outro por que
coisas. Mas o conhecimento do senso comum, a até chegar a uma resposta que não admitiria mais um por
compreensão dos processos naturais, o pensamento que e assim chegar de fato ao fim último, para o qual tudo
filosófico não é inútil. A ciência é útil para produzir coisas. o mais seria meio. Mesmo não tendo tal fim definitivo em
A Filosofia é útil não para produzir coisas, mas para dirigir mente pode-se começar o pensamento prático e a sua ação
melhor as nossas vidas e sociedades para que sejam propositada.
melhores, uso mais voltado para o agir e não para o fazer.
10 – Viver e viver bem
PARTE III Quanto mais velhos somos é provável que tenhamos um
O HOMEM COMO ATOR plano de vida mais cuidadoso e que nossas ações sejam
mais sérias, embora haja exceções, pois muitos conservam
9 – Pensando sobre fins e meios suas atitudes pelo prazer como finalidade de vida,
O pensamento produtivo está relacionado com a buscando essencialmente objetivos imediatos.
fabricação das coisas, envolve as ideias produtivas e o Sócrates afirma que uma vida não planejada não vale a
saber prático. O pensamento prático trata de fins e meios, pena ser vivida e para Aristóteles não vale a pena examinar
do modo de proceder para atingir determinados objetivos. uma vida não planejada. Planejar uma vida é cuidar para
É necessário ter um propósito, o objetivo a ser conseguido que ela seja boa, o que significa pensar sobre os objetivos
e escolher entre as diversas maneiras possíveis de alcança- e meios para consegui-la. Aristóteles afirma ainda que é
lo. preciso ter o plano certo, aquele que almeja o fim que todos
Aristóteles afirma que normalmente os seres humanos devemos buscar, o bem que todos devemos almejar,
agem com um fim em vista, o que é pensado primeiro a identificado por ele como a busca da felicidade.
fim de agir propositadamente. E para atingir tal finalidade Uma vida boa é aquela onde atendemos as nossas
têm que pensar nos meios, que vem primeiro na ordem da necessidades essenciais e/ou tomamos as atitudes
execução. Ele relaciona o fim com um bem, pois não tem necessárias para tal: nutrir, trabalhar, cuidar da saúde,
razão de ser agir para buscar o que seria um mal para nós. estudar e obter certos prazeres. A vida é um meio para se
Para atingir um fim que almejamos podemos dizer que os viver bem, o que deve ser um fim em si mesmo, um bem
meios são bons e maus. Bons porque agimos para buscar por causa dele mesmo. E viver bem é obter a felicidade,
um bem e maus porque podem atingir consequências um fim definitivo. Ninguém faz a opção por uma vida de
indesejáveis por razões bem distantes do objetivo tristeza, infeliz.
desejado. O roubo de dinheiro para comprar um carro nos Mas como pode haver um plano correto se somos tão
colocaria em sérias encrencas, que devemos evitar. diferentes em nossos desejos e aquilo que faz a felicidade
Aristóteles afirma que há coisas que buscamos por causa para alguns pode ter o efeito contrário em outros? Como
delas mesmas, pois se todos os fins fossem meios não pode então haver um fim último que todos devemos
existiria o pensamento prático, que começa justamente buscar? Há resposta. No entanto ela é simples e ao mesmo
com o fim a ser alcançado. E começamos a agir através de tempo incompleta: felicidade, viver bem, uma boa vida
meios que nos permitam chegar ao objetivo, nesse caso são como um todo.
puramente meios. Mas há fins que também são meios para
outros fins. 11 – Bom, melhor, o melhor
Pressupomos que o fim que temos em mente é definitivo e Consideramos bom algo que é desejável e melhor uma
que não seria possível fazer mais perguntas a respeito dele, coisa que é mais desejável do que outra. E embora as
pessoas sejam diferentes compartilham uma humanidade E quando as necessidades naturais são atendidas
comum, os atributos comuns porque somos humanos, parcialmente ou minimamente é impossível viver bem.
sendo que as diferenças em tais atributos (capacidade de Um plano para viver bem é melhor do que outro quando
raciocinar, por exemplo) são apenas de graus. permite a realização das nossas necessidades naturais em
As necessidades são desejos intrínsecos, inerentes à todos os aspectos, aquele que almeja todos os bens reais e
natureza humana, para os quais temos certas tendências na ordem e na medida correta e que nos permita buscar
naturais. Todos temos a necessidade biológica da nutrição coisas que queremos na medida em que não nos impeçam
para manter a vida, expressa através da fome, presente em de realizar as nossas necessidades naturais.
todas as pessoas de todos os lugares. Embora as
circunstâncias diferentes estimulem desejos por comidas
diferentes. 12 – Como buscar a felicidade
A necessidade biológica da nutrição está presente em Thomas Jefferson parece ter tido a ideia aristotélica de que
todos os seres vivos. Consideremos agora uma todos os seres humanos possuem a mesma natureza, tendo
necessidade exclusivamente humana, o desejo de os mesmos direitos naturais, o que equivale às mesmas
conhecer. Aristóteles afirma: “Por natureza, o homem necessidades naturais. Escreveu na Declaração de
deseja conhecer”. Mas privados da fome os homens têm a Independência dos EUA que todos têm o direito à vida, à
consciência da sua privação, o que na maioria das vezes liberdade e à busca da felicidade. A felicidade deve ser o
não acontece com o conhecimento. Mas ela existe, fim último de todas as nossas ações e consiste na aquisição
tenhamos ou não conhecimento dela. de todos os verdadeiros, necessários para nós e é por isso
Estes exemplos de necessidades naturais contrastam com que temos direito a eles, como disse Jefferson. Precisamos
as apetências adquiridas. Estas estão relacionadas com os da vida para viver bem e da liberdade para proceder nossas
desejos que muitas vezes podem ser equivocados, que não escolhas e para fazer um esforço planejado para viver bem.
derivam das nossas necessidades naturais. Poderemos É preciso distinguir o fazer do agir. O pensamento
muitas vezes desejar algo que parece bom, mas que não relacionado com a produção de alguma coisa precisa do
realidade não é, coisas que não precisamos, apenas saber prático e da ideia produtiva, que são os meios. Mas
queremos. Os bens reais satisfazem nossas necessidades não necessariamente temos a obrigação de buscar aquele
naturais, precisamos deles, não apenas queremos. fim (produzir uma cadeira, por exemplo). A busca da
Para Aristóteles as coisas realmente boas são aquelas que felicidade é diferente, é um dever, uma obrigação. Mas
satisfazem as necessidades naturais, aqueles que como deve fazer isso, como obter felicidade?
necessitamos, tenhamos consciência ou não. O que é bom Aristóteles oferece duas respostas para esta questão. A
para nós deve sempre ser desejado porque necessitamos primeira consiste na enumeração de todos os bens que são
desse algo, mas o que só parece bom para nós é algo que necessários para uma vida boa e a segunda a sua
podemos desejar erradamente. prescrição. Somos animais que pensam, que conhecem e
O único plano necessário para obter uma vida boa, a que tem a necessidade de exercitar nossas mentes, mas
felicidade, é o plano que nos leva a desejar e obter as coisas temos corpos que precisam de cuidados. Aristóteles lista
necessárias, realmente boas, não apenas importantes para entre os verdadeiros bens os bens corporais, bens físicos:
viver, mas para viver bem. E como somos humanos o que a saúde, a vida e o vigor, além dos prazeres, obtidos pela
vale para um é necessário para todos, pois a nossa natureza experiência dos sentidos. Compartilhamos destes bens
e as tendências são comuns. A felicidade é a mesma para com os animais, mas somos diferentes na maneira de
todos os seres humanos. busca-los, pois podemos suportar uma dor corporal ou
abrir mão de um prazer corporal para dar espaço para
outros bens mais importantes, o que é recomendável. Tais “virtude”. As virtudes exemplificadas são intelectuais e os
bens são meios para uma vida boa e ao mesmo tempo são bons hábitos do tipo exemplificado por uma decisão firme
fins em si mesmos, para os quais outras coisas servem de de escolher corretamente constituem o caráter de uma
meios. Entre tais coisas citamos a comida, a bebida, roupas pessoa, e por isso Aristóteles os chama de virtudes morais,
e o sono. Aristóteles chama todos estes bens de bens que desempenham um papel importante em nossa busca da
externos ou riquezas, necessários para a saúde, vitalidade, felicidade, de tal forma que Aristóteles diz que uma vida
prazer corporal... portanto para uma vida boa. E a sua boa é uma vida em que as escolhas foram moralmente
privação, a falta de uma certa quantidade de liberdade e de virtuosas.
riqueza, constitui um obstáculo para a busca da felicidade.
Aos bens corporais e os bens externos de riqueza
Aristóteles acrescenta os bens da alma, os bens 13 – Bons hábitos e boa sorte
psicológicos, sendo os mais óbvios os da mente, como A virtude moral consiste nas escolhas certas, dos bens
todos os tipos de conhecimento, incluindo o saber prático verdadeiros, daqueles que atendem as nossas necessidades
e as capacidades. E como somos animais sociais a longo prazo e, portanto são os mais importantes na
precisamos viver em sociedade, de amar e ser amados, de hierarquia dos bens. A riqueza e o prazer, por exemplo, são
ter amigos e não viver como escravos. Aristóteles bens, mas limitados, pois podemos querer mais do que o
considera a amizade um bem da alma, pois semelhante ao necessário para uma vida boa e se tornarem prejudiciais
conhecimento, atende uma necessidade psicológica nossa. para nós. Outros bens, como o conhecimento, são
E assim como há os prazeres do corpo, há também os ilimitados, nunca são demais. Daí a necessidade dos bons
prazeres da mente: o prazer de ser amado, de fazer e fruir hábitos de escolha, que tornam uma pessoa virtuosa,
das obras de arte e de adquirir conhecimento. Aristóteles condição essencial para a busca da felicidade. Os nossos
inclui a autoestima e a honra, pelos motivos certos (não arrependimentos demonstram quantas vezes fazemos
pela fama) como verdadeiros bens, pois os seres humanos escolhas erradas.
desejam ser amados. Os bons hábitos são criados e praticados repetidas vezes
A segunda resposta de Aristóteles para a questão da busca geram prazer e nos permitem realizar tarefas com menos
da felicidade envolve um tipo diferente de receita a ser dificuldades. A pontualidade, por exemplo, se adquiri com
seguida. Ela nos orienta a desenvolver um bom caráter mais facilidade sendo pontual com frequência.
moral, uma outra classe de bens que necessitamos: os bons A virtude moral possui dois aspectos: O primeiro é a
hábitos. Citamos os bons hábitos corporais, certas temperança, que consiste em resistir aos excessos, por
capacidades, e os bons hábitos da mente, que nos permitem causa de bens mais importantes. A riqueza, por exemplo,
realizar certas ações de excelência com regularidade. deve ser na medida certa. O segundo é a coragem, que
Existem também os bons hábitos que nos permitem fazer consiste em sofrer dores e transtornos, na disposição de
escolhas regularmente, como por exemplo, o bom hábito fazer o bem para obter o necessário para uma vida boa, o
de abster-se da tentação de comer e beber demais, o que é que muitas vezes exige esforço, dedicação, para a
uma decisão correta. Os bens verdadeiros podem ser superação das dificuldades. A existência dos obstáculos
adquiridos e ter prazer em excesso, o que causaria mal. Por não nos desobriga de praticar os bons hábitos.
isso é que Aristóteles diz que devemos buscar os Mas, adquirir conhecimento, capacidades e bons hábitos
verdadeiros bens na medida certa, na ordem correta e em geral, não dependem exclusivamente de nós.
numa relação correta entre si. Ele deu o nome a todos os Dependemos de nossos pais e professores, por exemplo.
bons hábitos de “excelência”, sendo que nos chega por via Não temos como obrigar a sorte a sorrir para nós,
latina a palavra que mais usamos para os bons hábitos é determinar a condição de nascimento. Saúde, riquezas,
bens externos ou pobreza e doença podem recair sobre nós. faz com que o indivíduo obtenha aquilo que tem o direito
Então, para ter uma vida boa, dependemos da virtude de esperar, para que haja a paz e a harmonia. O amor
moral, e este aspecto é o fundamental, mas dependemos significa querer o bem do outro, agir com benevolência,
também da boa sorte. A virtude moral nos ajuda a suportar onde cada um busque a felicidade do outro, mas nem
os infortúnios, adquirir os verdadeiros bens e a administrar sempre é assim e o que existe é o egoísmo. As verdadeiras
bem o que temos pela boa sorte. amizades são raridade. Aí a justiça tem de intervir para o
Então, ter a posse dos verdadeiros bens, depende da bem de todos.
virtude moral, da boa sorte, o que por sua vez depende do O que os outros têm o direito de esperar de nós? Que não
ambiente físico e da sociedade. Precisamos de bom ar, façamos nada que possa ser obstáculo para a busca da sua
água e outros recursos. E como somos animais sociais felicidade; que cumpramos as promessas feitas; que
precisamos considerar um terceiro aspecto, além da respeitemos os seus direitos, digamos a verdade,
coragem e da temperança, a justiça, que consiste em devolvamos o que foi emprestado e que possamos
considerar o bem alheio para termos a nossa felicidade. contribuir para que os outros tenham posse dos
Até porque as nossas decisões erradas poderiam prejudicar verdadeiros bens, o que é uma generosidade do amor, não
a sociedade. E o bem alheio, o de todos, envolve o Estado, uma exigência da justiça. Cabe ao Estado aplicar as leis,
que deve ser justo, atender ao bem de todos. promover o bem estar da sociedade como forma de que
todos alcancem a felicidade.
14 – O que os outros têm o direito de esperar de nós
A maioria de nós pertence a um grupo organizado, pois 15 – O que temos o direito de esperar dos outros e do
somos seres sociais. Participamos de uma família, de um Estado
Estado, de clubes, escolas e outros associações. A família A nossa relação com os outros deve ser pautada deve ser
existe para preservar a vida dos seus membros e o Estado pautada na máxima “amar o próximo como a si mesmo e
para melhorar esta vida, sendo então associações naturais, agir com os outros como gostaria que agissem com você”.
não no sentido das associações de formigas ou abelhas Primeiro devemos buscar os bens verdadeiros para nós
(originárias simplesmente do instinto), mas no sentido de mesmos e como os direitos são intrínsecos a natureza
que existem para atender nossas necessidades naturais, humana e temos as mesmas necessidades temos de esperar
mas formadas voluntariamente, com um plano de dos outros o mesmo que devem esperar de nós.
organização. São voluntários e naturais, sendo o Estado A sociedade é boa em si mesma, pois atende a
originário dos grupos de famílias e tribos que envolveram necessidades naturais nossas, como viver em sociedade,
mais seres humanos e trabalhos conjuntos, tendo o embora possam não ser boas da forma como se organizam
objetivo de atender com mais eficácia o aumento da quando não proporciona os verdadeiros bens para todos.
riqueza dos seus membros. Como os seres humanos não estão unidos perfeitamente
Segundo Aristóteles o homem é um animal político, ou pelo amor o Estado é necessário, por isso bom em si
seja, social, vivendo em sociedade de maneira pensada, mesmo. Não se trata de prender criminosos, mas de tomar
estabelecendo leis e costumes com o objetivo de uma vida decisões para o bem de todos, nem de um poder coercitivo,
melhor, sendo necessário o Estado para atingir tais pois o homem virtuoso obedece às leis não porque teme a
objetivos. A palavra grega para Estado é “pólis”, de onde punição, não sendo coagido pelo governo. Os maus é que
vem a palavra político e no Latim a palavra é “civis”, de querem mais liberdade.
onde vem a palavra civil e civilizado. O fato de o governo ser necessário e então bom em si
E como no Estado raramente os homens são amigos uns mesmo não torna todas as formas de governo boas. Para
dos outros e falta o amor, se faz necessária a justiça, o que Aristóteles o bom governo é aquele que promove o bem
dos governados, que tem uma autoridade reconhecida e As sensações recebidas são as matérias-primas que
aceita, não o despótico, o que age pela força ou pelo bem formam a nossa experiência sensível. Recebemos do
único dos governantes. Deve ser constitucional, baseado mundo externo através da percepção as sensações de
em leis, que sejam justas. Este é o governo dos homens movimentos, cores, tamanhos, formatos, asperezas e
justos e iguais. No entanto Aristóteles cometeu o erro de tantos outros. Quando ajuntamos as sensações recebidas
achar que muitos seres humanos tinham naturezas passamos de passivos para ativos, num processo que
inferiores (os escravos e as mulheres, por exemplo), não envolve memória e imaginação e a compreensão também
percebendo que apenas pareciam inferiores por conta da participa. É ela que através da atividade da nossa mente,
maneira que eram tratados na sociedade, não porque seus não dos nossos sentidos, distingue correr, pular, cores,
dons fossem inadequados. Hoje é preciso considerar que repouso, sons, animais... formando ideias a partir dos
todos devem ser governados como cidadãos, com voz no dados dos sentidos. As ideias são o produto da atividade
próprio governo, como livres e iguais. E as diferenças de da nossa mente em seu esforço de compreender o mundo
dons devem ser levadas em consideração apenas para o que experenciamos pelos sentidos. Compreendemos a
exercício dos cargos públicos, não para o exercício da natureza diferentes de cães e gatos, por exemplo, tendo
cidadania. uma noção da natureza particular de cada um deles. É na
O melhor Estado para Aristóteles é aquele que faz o mente que a forma das coisas tornam-se as nossas ideias
máximo para promover a busca da felicidade para os seus claras sobre elas, separando-as da matéria
cidadãos, ajudando-os a conseguir todos os bens reais de individualizante. Produzir ideias é o exato oposto de
que precisam e têm direito, suprindo as privações por produzir coisas. E, além disso, somo capazes de
causa do azar ou da má forma, e não por causa da má compreender coisas do pensamento que não conseguimos
conduta. Ou seja, fazer pelos cidadãos o que não podem perceber sensivelmente, como o bem e o mal, o certo e o
fazer por si mesmos, colaborar estabelecendo as condições errado.
necessárias para viver bem e incentivando tal fim, sabendo O pensamento começa com a formação de ideias a partir
que as virtudes morais dependem de cada pessoa. das informações recebidas pelos sentidos, está relacionado
com as ideias que produz, junta, separa, confronta até
PARTE IV produzir conhecimento, até de objetos que não fazem parte
O HOMEM COMO CONHECEDOR da nossa experiência sensível, como a Álgebra e a
Geometria. As sensações em si não são nem verdadeiras e
16 – O que entra na mente e o que sai dela nem falsas. O erro está no pensamento, não na percepção
A parte IV aborda o pensamento teórico, voltado para o sensível. As ideias também não são nem verdadeiras e
conhecimento, não para a produção ou para a ação. nem falsas, mas a combinação das ideias no nosso
Segundo Aristóteles as palavras que usamos expressam as pensamento produzem as opiniões que emitimos, sendo
ideias com que pensamos, sendo a linguagem importante estas verdadeiras ou falsas.
para o conhecimento. As ideias vem dos sentidos, as Aristóteles distingue três níveis de pensamento na
janelas da mente, o início de todo o aprendizado, antes da produção de conhecimento pela mente:
escola, inclusive. Ele divide os sentidos externos em cinco: 1- Através das matérias-primas e da experiência sensível à
Visão, audição, tato, olfato e paladar. Os sentidos estão mente humana formula ideias.
relacionados com os órgãos dos sentidos externos que 2 -Com as ideias são formulados juízos, algo que afirma
recebem as ações externas, sendo, portanto passivos, mas ou nega, expressos por sentenças declarativas onde
altamente especializados. aparecem o “é” ou “não é”.
3 -O raciocínio ou inferência envolve o dar razões para asserções feitas por outras pessoas e a questionar tudo
aquilo que pensamos. Neste aspecto o que pensamos pode aquilo que dizem.
ser verdadeiro ou falso, mas também lógico ou ilógico. As generalizações científicas são testadas e consideradas
Aristóteles é o fundador da ciência da Lógica. E ainda que verdadeiras e mantidas enquanto não há exemplos
o pensamento lógico seja melhor que o ilógico, nem negativos que as falsifiquem. Um único exemplo negativo
sempre chega a proposições verdadeiras, podendo cometer pode contradizer asserções gerais expressas pela palavra
erros pensando logicamente e acertos pensando de forma “todos”. Os seres humanos tendem a generalizar. Se forem
ilógica. Por isso torna-se necessário ao que torna o protestantes, por exemplo, tendem a considerar que os
pensamento lógico e verdadeiro ou falso. católicos são isso ou aquilo, tal ou qual. Um exemplo
negativo invalida a generalização.
17 – Os termos peculiares da Lógica “Ou” e “não” são palavras que controlam nosso
Aristóteles está associado à lei da contradição e ao pensamento. Cara ou coroa, só pode ser um ou outro, não
Silogismo, como regras do pensamento correto. simultaneamente. Essa é uma disfunção forte. Tomates
A lei da Contradição é uma regra de pensamento e uma podem ser vermelhos ou verdes, essa é uma disfunção
asserção sobre o mundo. Ela diz o que não pensar e nos fraca. Isto nos permite fazer inferências simples e diretas,
ordena a evitar contradizer-nos em palavras e sem seguir passos de raciocínio. Se um número inteiro não
pensamentos, prescreve como devemos pensar a respeito é ímpar podemos inferir imediatamente que ele é par.
das coisas de forma que nosso pensamento esteja em Equívocos podem ser cometidos. “Todos os cisnes são
conformidade com elas. Não podemos afirmar e negar a brancos”; “alguns objetos brancos são cisnes” e “todos os
mesma proposição. Uma coisa não pode existir e não objetos brancos são cisnes” dizem respeito a uma
existir ao mesmo tempo, o que é auto evidente e daí conversão ilícita. A classe de objetos brancos é maior do
inegável. que a classe de cisnes, que são alguns objetos brancos do
“Ou Platão foi professor de Aristóteles ou não foi”. “Todos mundo.
os cisnes são brancos ou alguns cisnes não são”. Tais “Se” e “então”e “já que” e “logo” são dois pares de
asserções são contraditórias, pois não podem ser ambas palavras que funcionam como operadores na inferência
verdadeiras ou ambas falsas. Uma tem de ser verdadeira e imediata e no processo mais complexo do raciocínio. “Se”
outra falsa. e “então”são asserções de inferências corretas e incorretas
As asserções “Todos os cisnes são brancos” e “nenhum logicamente, não dependem das asserções serem
cisne é branco” são contrárias. Alguns cisnes podem ser verdadeiras, cada uma podendo ser falsa. “Todos os cisnes
brancos e outros pretos. Duas asserções são contrárias são brancos”, pode ser falso, mesmo assim pode-se inferir
quando ambas não podem ser verdadeiras , mas ambas que alguns cisnes são brancos.
podem ser falsas. “Se todos os cisnes são brancos, então segue-se
“Alguns cisnes são brancos” e “alguns cisnes não são necessariamente que alguns cisnes são brancos”. “Se todos
brancos” são asserções subcontrárias. Ambas são os cisnes são brancos, então não se segue que todos os
verdadeiras e não falsas. objetos brancos são cisnes”.
“Diferente de “preto” e “branco”, alguns pares de termos “Já que todos os cisnes são brancos, logo segue-se que
que são contrários esgotam as alternativas, são alguns cisnes são brancos”. Neste caso a veracidade ou a
excludentes. Ex. “Todos os números inteiros são pares ou falsidade da primeira asserção afeta a veracidade ou a
ímpares”. falsidade da segunda. A conclusão da minha inferência
Tais regras do pensamento são importantes para nos ajudar pode ser falsa, porque a asserção inicial é falsa. A verdade
a fazer asserções coerentes e perceber incoerências nas pode ser que nenhum cisne é branco, falso concluir que
alguns são. “Se todos os cisnes são brancos”, estou apenas O raciocínio pode ser lógico independentemente de as
dizendo se todos são, não que todos são. Isto é diferente de premissas e a conclusão serem de fato verdadeiras ou
afirmar “já que todos os cisnes são brancos”. falsas. A conclusão é de fato verdadeira quando as duas
Tais regras de Aristóteles para a inferência imediata são a premissas forem de fato verdadeiras. A conclusão pode ser
base para resumir as regras de raciocínio que constituem o verdadeira ou falsa quando uma premissa é falsa e uma
silogismo, como no modelo: conclusão falsa saiu de alguma (uma ou ambas) premissa
Premissa maior: Todos os animais são mortais. falsa. Somente quando afirmarmos a veracidade das
Premissa menor: Todos os homens são animais. premissas trocando “se” por “já que” podemos trocar
Conclusão: Todos os homens são mortais. “então” por “logo” e afirmar a veracidade da conclusão e
temos o direito de questionar a veracidade das premissas
Premissa maior: Os anjos não são machos nem fêmeas se negarmos a veracidade da conclusão.
Premissa menor: Alguns homens são anjos. Aristóteles chama de Entimenta o argumento compacto,
A premissa menor é falsa, mas o raciocínio é correto. que omite ou esconde premissas indispensáveis. São
raciocínios que envolvem uma série de asserções a
Premissa maior: Os mamíferos não botam ovos. respeito da diferença entre os homens e os anjos que
Premissa menor: Os seres humanos são mamíferos. tornam o governo necessário para a sociedade humana
Conclusão: Os seres humanos não botam ovos. como citado no raciocínio hipotético de Alexander
As duas premissas são verdadeiras, a conclusão Hamilton:
verdadeira. “Se os homens fossem anjos, nenhum governo seria
necessário”.
O raciocínio silogístico é mais complicado do que a “O governo é inquestionavelmente necessário para uma
inferência imediata. Nesta a validade é expressa por um sociedade de seres humanos”
“se” e um “então” e no silogismo são três termos
diferentes, de duas asserções a uma conclusão em que Logo, não teria exitado em negar que os homens são anjos.
aparecem nos dois termos. Por exemplo, “animais”, Negar a consequente (asserção então) no raciocínio
“homens” e “mortais”. “Homem” e “mortal”, sempre hipotético lhe dá o direito de negar a antecedente (ou a
desaparece o 3º termo (“animais”). O termo médio, asserção se).
comum às premissas maior e menor, desaparece porque
cumpriu a sua função no processo de raciocínio. O 18 – Dizer a verdade e pensa-la
raciocínio silogístico é mediado, diferente da inferência Verdade e falsidade são ideias do senso comum, que todos
imediata, onde não há termo médio. Se a premissa maior compreendemos. Todos sabemos da diferença entre contar
ou a premissa menor for negativa então a conclusão tem uma mentira e contar uma verdade.
de ser negativa e o termo médio tem de funcionar como Uma mentira consiste em dizer exatamente o oposto do
conectivo. Uma conclusão afirmativa tem de vir de duas que eu penso e dizer a verdade é fazer aquilo que se diz
premissas afirmativas. E de duas premissas falsas se segue estar de acordo ou em conformidade com aquilo que se
logicamente que uma conclusão falsa. pensa. E pensar verdadeiramente é o acordo entre aquilo
Premissa maior: Nenhum pai tem filhas. que se pensa e aquilo a respeito do que se pensa. Pensar
Premissa menor: Todos os homens casados são pais. que Colombo era espanhol é uma falsidade e pensar que
Conclusão: Nenhum homem casado tem filhas. ele era italiano é pensar verdadeiramente, pois realmente é
italiano.
Dizer a verdade para uma pessoa é quando o acordo é entre asserção, podendo conferi-la pela percepção dos sentidos
aquilo que dizemos e aquilo que efetivamente pensamos. e considerando a opinião dos outros.
E pensar a verdade diz respeito ao acordo entre o que
pensamos e os fatos reais tais como são, a correspondência 19- Além da dúvida razoável
entre a mente e a realidade. As opiniões se aproximam do conhecimento quando têm o
As sentenças declarativas, que de alguma forma contém as peso das provas a seu favor, ou quando as conclusões são
palavras “é” ou “não é”, descrevem os fatos, como as validamente demonstradas por premissas que são
coisas são, e, portanto são verdadeiras ou falsas. Já as verdadeiras de modo auto evidente. Quando o professor
asserções prescritivas, que prescrevem o que devemos compreende a demonstração e afirma a conclusão à luz das
fazer e os meios que devem ser utilizados são verdadeiras premissas que a provam tem o conhecimento e o aluno que
quando estão em conformidade com a realidade, com o não a compreende, mas repete com base na autoridade do
desejo certo, aquele que realmente é bom para nós, que professor não tem o conhecimento, mas opinião. Quanto
satisfaz as nossas necessidades humanas. Desejar o mais as opiniões forem sustentadas por boas razões, bases
conhecimento, por exemplo, está de acordo com um desejo racionais, observações ou pela autoridade de alguém, mas
certo, por isso devemos desejar conhecer. se aproximam do conhecimento. Diferenças de meras
Muitas asserções não são tão auto evidentes, como por opiniões sem bases racionais, ligadas às crenças pessoais,
exemplo, dizer que aquilo que é realmente bom deve ser sem provas podem ser discutíveis. Podemos considerar
desejado. Muitas asserções são aceitas sem maiores como opiniões melhores as que são sustentadas por provas,
discussões. É o caso do que foi afirmado por Thomas testemunhadas por pessoas qualificadas e bons
Jefferson quando escreveu que todos os homens são argumentos.
criados iguais, dotados pelo seu Criador de certos direitos As opiniões baseadas nas observações, pesquisas e
inalienáveis, o que demandaria extensos raciocínios para raciocínios científicos são consideradas conhecimento
ser provado. pelos cientistas, embora não haja conclusão científica
Uma asserção é verdadeira quando as premissas usadas verdadeira, pois em se tratando de generalizações podem
são verdadeiras e quando o próprio raciocínio está correto. surgir provas contrárias através de novas investigações,
E para provar a verdade de uma asserção devemos apelar possibilitando correções ou rejeições. O oposto sempre é
para as evidências proporcionadas pelas experiências dos possível. Ainda assim muitas conclusões científicas são
nossos sentidos, por meio da observação. Se duvidarmos fundamentadas por uma preponderância de provas e razões
que um prédio possua 50 andares podemos provar a inquestionáveis há séculos, sendo conhecimento
verdade observando e contando e confirmar com a firmemente estabelecido.
observação de outras pessoas, em muitos casos em As conclusões científicas são baseadas em investigações,
especial com a observação de pessoas especializadas, pesquisas, observações, descobertas, planejadas e
testemunhas qualificadas. executadas. O pensamento filosófico também é
Uma certa quantidade de observações pode nos convencer conhecimento, pois a partir das experiências do senso
de que as generalizações são provavelmente verdadeiras, comum, das experiências cotidianas, melhoradas através
quanto maior o número de observações mais podemos de reflexões e análises são feitas melhores conclusões
ficar convencidos. Por exemplo, afirmar que todos os naquilo que chamei senso comum incomum de Aristóteles.
esquimós são pequenos. Uma única observação contrária As conclusões científicas da época de Aristóteles já foram
pode provar que a generalização é falsa. Pela experiência praticamente todas falseadas, corrigidas e melhoradas,
e pela razão podemos provar a veracidade de uma enquanto as conclusões filosóficas de Aristóteles têm mais
de dois mil anos e ainda podem, hoje mesmo, reclamar o os atomistas. Nada pode ser atual e indefinido, então não é
status de conhecimento filosófico. infinito, logo não pode haver um infinito em ato de
As conclusões históricas podem ser consideradas nenhuma espécie. Os infinitos potenciais é que existem.
conhecimento estabelecido, ainda que novas pesquisas Fazem parte dos processos infindáveis de adição ou
venham a mudar nossa visão do assunto. A investigação divisão.
histórica chega a conclusões sobre questões factuais Um momento de tempo sempre sucede ou precede outro.
particulares, reunindo provas historiográficas, propondo E dois momentos do tempo não coexistem em ato,
conclusões. podendo o tempo ser infinito.
Para Aristóteles conhecimento propriamente dito, no
sentido estrito da palavra é aquele fundamentado nas 21- A Eternidade
verdades auto evidentes. As conclusões matemáticas, as Aristóteles considerava que um número infinito de
conclusões científicas, as opiniões filosóficas e as momentos sucederia uns aos outros, sendo o tempo infinito
conclusões históricas sempre poderão ser falseadas, e o mundo eterno (sem começo nem fim), não no mesmo
corrigidas, embora muitas estejam fundamentadas em sentido da eternidade de Deus. Mas o Deus de Aristóteles,
provas, raciocínios, observações, bons argumentos há ao contrário do Deus bíblico, não criou o mundo, porque
séculos, possuindo status de conhecimento. não via qualquer razão para chegar a pensar que o mundo
teve um começo.
PARTE V Para ele a medida do tempo é a medida da mudança, do
QUESTÕES FILOSÓFICAS DIFÍCEIS movimento, a dimensão em que o movimento ocorre. E o
espaço é a dimensão em que as coisas materiais existem.
20 – A Infinitude O movimento não tem começo nem fim, pois tudo tem
Aristóteles, contra a Leucipo e Demócrito, pensou ter causa (causa e efeito), ocorrendo sempre uma sucessão de
demonstrado que não havia átomos indivisíveis, mas causas. Afirmava a necessidade da existência de um
unidades da matéria muito pequenas, podendo sempre ser primeiro motor, mas não era a primeira causa de uma série
divididas. E não haveria um número infinito de átomos no de coisas que movem e são movidas.
mundo. Imenso mas não infinito, pois seria impossível Passar a existir e deixar de existir são um tipo de mudança,
que um número infinito de coisas coexista em ato em que nunca começa nem termina. E pode haver um número
qualquer momento do tempo. Aristóteles julga que pode infinito de coisas que passam a existir e deixam de existir
haver dois infinitos potenciais, mas não atuais. num tempo infinito, embora não possa haver um número
Recordando: potencial diz respeito a aquilo que pode ser e infinito de coisas individuais que coexistam em nenhum
atual é aquilo que é. momento do tempo. Ele tinha em mente o movimento dos
Um é o infinito potencial da adição. Ex: a infinitude dos corpos celestes, exemplificando a eternidade do
números inteiros. Sempre há um número seguinte, maior movimento e com ela, a eternidade do mundo.
ainda, somente possível, uma vez que o ato levaria um
tempo sem fim para ser realizado. 22- A imaterialidade da mente
Outro é o infinito potencial da divisão. Potencial, mas não As coisas são compostas de matéria e forma. A forma não
atual. A divisão continua sem parar. O número de frações é o formato. É a ideia na mente, a compreensão do tipo de
entre 2 e 3 é infinito. coisa a ser feito, antes da forma pela qual transformou a
Os dois infinitos são potenciais, mas não atuais. Não madeira em cadeira, por exemplo. A forma é o aspecto
existem em ato em nenhum momento. Aristóteles negava imaterial. Conseguimos pensar a matéria sem pensar a
uma infinitude em ato de coisas existentes, como diziam forma. Mas a matéria pura, desprovida de forma, não pode
existir, não pode ter atualidade. As formas tem a sua existência do universo, assim como a concepção de Deus
existência na matéria, mas existem separadas, na mente como 1º MOTOR surgiu na mente de Aristóteles por causa
como ideia da coisa a ser feita. da necessidade de explicar a eternidade do universo e seu
A mente conhecedora pega ideias das coisas naturais do movimento perpétuo.
mundo físico, tirando as formas das coisas materiais da Mas é difícil determinar se a concepção de Deus como
matéria desses objetos compostos, sejam árvores ou criador teria surgido na mente dos pensadores do Ocidente
cavalos. Saber não é como o ato de comer através do qual sem a sentença inicial do Gênesis: “No princípio Deus
assimilamos a matéria e a forma do alimento. Saber é criou o céu e a terra”. Aristóteles poderia ter concebido
entender a coisa tirando a forma da mesma, algo Deus simultaneamente como 1º MOTOR e como Criador
individual, a formação de uma ideia nas nossas mentes. no sentido de causar a existência daquilo que pode existir
Quando entendemos uma maçã, por exemplo, entendemos ou não, sem considerar o fato de aquilo passar a existir.
as maçãs em geral, não essa ou aquela individual.
Percebemos pelos sentidos a individualidade dessa ou Postado por José Antônio de Faria
daquela maçã, mas não podemos, pelas ideias que temos
em nossas mentes, entender a sua individualidade. Por isso
Aristóteles chama a mente a forma das formas, o lugar
onde a forma das coisas pode existir separada da sua
matéria.
Porque a mente humana guarda, segura a forma das coisas,
tem de ser imaterial. Quando conhecemos o tipo de coisa
em geral, não envolve a ação de nenhum órgão material. É
um ato da nossa mente, um elemento imaterial em nossa
composição, que pode ser relacionado ao cérebro como
órgão material, mas que é distinto dele. A mente é distinta
do cérebro.

23- DEUS
Aristóteles considerou o universo como eterno, dado as
mudanças perpétuas, pensando a partir dos movimentos
dos corpos celestes. E o que os mantém perpetuamente em
movimento tem de ser um motor em movimento que não é
ele mesmo movido por outra coisa em movimento. É o
Primeiro Motor, que move tudo, a causa atrativa ou causa
final. É imóvel, eterno, imutável e imaterial, não sujeito às
mudanças, o ATO PURO (forma sem matéria), desprovido
de potência. Perfeito, não carecendo de nenhuma
perfeição. Chamou este ATO perfeito DEUS.
Esse raciocínio foi utilizado por pensadores posteriores
para provar a existência de Deus, criador. A concepção de
Deus como criador veio da necessidade de explicar a

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