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O conhecimento científico é o conhecimento comprovado.

Para um conhecimento ser


considerado como científico, e, portanto, verdadeiro, ele deve ser derivado de maneira rigorosa
desde a obtenção dos dados da experiência adquiridos por forma da observação, até seu
experimento, formação e posteriormente comprovação de uma hipótese, para se formar uma
teoria. Esses princípios têm seu início no Empirismo, com Aristóteles, que explicita que apenas
o que pode ser captado do mundo externo, pelos sentidos, ou do subjetivo, pela introspecção,
pode ser considerado conhecimento válido em termos científicos, descartando qualquer verdade
revelada e transcendente do misticismo, ou que seja inata do racionalismo. Preferências
pessoais, opiniões e suposições especulativas não conseguem obter seu lugar na ciência, pois a
ciência tem como objetivo ser absolutamente confiável, e para isso, deve ser provado
objetivamente, segundo a visão que se popularizou durante e como consequência da Revolução
Científica que ocorreu durante o século XVII, com participação de nomes como Galileu e
Newton.
Aristóteles afirma em sua série de tratados, Metafísica, título esse que não foi
empregado por Aristóteles, mas sim por Andrônico de Rodes, que Sócrates teria sido o primeiro
a usar a indução, e a dar definições para a mesma, mesmo que diferindo em alguns aspectos do
conceito contemporâneo.
Segundo a lógica, o indutivismo ou método indutivo é o raciocínio que procura concluir
uma verdade geral, após ter considerado um número suficiente de observações em casos
particulares. Seguindo a perspectiva indutivista no método científico, a ciência começará então
com a observação, e as ilações indutivas permitirão então progredir de princípios singulares ao
gerais, leis e teorias científicas. Para os indutivistas, não há ciência sem a indução. Tudo se
inicia na observação, partindo dos fatos, e a hipótese do observador é confirmada pela
experiência.
Tem-se, portanto, que para o indutivista ingênuo, que será um observador imparcial, o
objetivo de gerar uma afirmação universal, que afirma algo sobre o comportamento ou as
propriedades de algum aspecto do universo, a partir de afirmações singulares, que se referem a
uma ocorrência específica, em lugar e tempo específicos. Tal objetivo deve ser alcançado
seguindo as leis do raciocínio indutivo, que são:
1 – O número de observações singulares realizadas deve ser grande.
2 – As observações devem ser repetidas em múltiplas circunstâncias e ocasiões.
3 – Nenhuma proposição singular deve conflitar ou contradizer a lei universal derivada.
É nesse aspecto, portanto, que se observa a principal diferença do método indutivo para
o método dedutivo. Enquanto o primeiro parte de afirmações singulares para se obter uma
afirmação geral, o segundo, em maior parte, parte de uma afirmação geral, para alcançar uma
afirmação singular e específica. Porém, ambos seguem os princípios da observação do
empirismo. Tais diferenças podem ser exemplificadas como:
Método Indutivo – “O ferro, cobre e ouro conduzem eletricidade. Ferro, ouro e cobre
são metais. Logo, metais conduzem eletricidade.”
Método Dedutivo – “Todos os homens são mortais. Sócrates é um homem. Logo,
Sócrates é mortal.”
É válido citar também, que no método dedutivo existem deduções cujas premissas
maiores são iniciadas por condicionais, e não necessariamente irão partir de premissas gerais,
como modus ponens e modus tollens:

Modus ponens – “Se P, então Q. P. Portanto, Q.”


Modus tollens – “Se P, então Q. Q é falso. Logo, P é falso.”
Outra observação a ser feita, é que seguindo o método dedutivo, sempre será impossível
partir de premissas verdadeiras, e alcançar uma conclusão falsa. Porém no raciocínio indutivo,
isso é possível, apesar de muito pouco provável. Tal peculiaridade se dá pelo fato de que em
um raciocínio dedutivo, toda a informação que se busca obter para alcançar a conclusão já está
contida nas premissas, sendo assim, impossível a obtenção de uma conclusão que seja algo
qualquer além de verdadeira. Porém, no raciocínio indutivo, a conclusão pode conter alguma
informação que não está contida nas premissas que foram anteriormente adquiridas através da
observação, ficando em aberto a possibilidade de que essa informação extra contradiga, ou
cause a falsidade da conclusão esperada, apesar das premissas serem anteriormente verdadeiras.
Chega-se então, nos problemas e inconsistências encontrados para se validar o método
indutivo.
Embora possam ser observadas semelhanças ao ceticismo pirrônico de Enesidemo de
Cnossos, David Hume, filósofo britânico conhecido pelo seu empirismo e ceticismo radicais
(Compondo a tríade do empirismo britânico ao lado de Locke e Berkeley, e sendo considerado
um grande pensador do Iluminismo Escocês), introduz o chamado Problema da Indução, em
meados do século XVIII, onde Hume procura expor e distinguir os bons dos maus hábitos
indutivos, já que não há, na teoria indutivista, qualquer distinção objetiva entre eles.
Hume apresenta a questão de se o método indutivo, usando da generalização, pode levar
ao conhecimento científico. Tomando generalização como qualquer argumento que não seja
dedutivo, e que possui uma conclusão mais geral do que as premissas, Hume denota que o
problema da indução se refere a:
1 – Pressupor que uma sequência de eventos observada será imutável, e se comportará
no futuro do mesmo modo que se comportou no passado.
2 – Generalizar sobre as propriedades de uma classe de objetos, com base em um número
limitado e finito de observações do número de instâncias específicas da classe.
Tais podem ser exemplificados como: “As leis da física sempre se manifestarão como
foram observadas, independentemente das circunstâncias”. Tal afirmação pode ser falseada, se
outro campo de observação for analisado, algo que é recorrente neste campo científico. Quanto
à generalização, se um, ou vários observadores observam um cisne, depois dois, até se alcançar
um número extremamente elevado, e todos são brancos, segundo o indutivismo, todos os cisnes
no universo são, e sempre serão, brancos. Porém, não existe prova cabal de que um cisne negro
não possa surgir, ou que simplesmente não tenha sido percebido pelos sentidos dos
observadores.
Portanto, quantas observações teriam de ser feitas até uma generalização ser justificada?
Segundo Hume, infinitas. Segundo ele, não existem comprovações absolutas de que as coisas
sempre continuarão a ser e a acontecer como sempre foram e sempre aconteceram. Como cético,
Hume procura se basear no absoluto e imutável, portanto apenas a plausibilidade nunca será o
suficiente. Ele adianta que os argumentos que o método indutivista apresenta para corroborar
sua validade, são, em si próprios, indutivistas, o que torna a gênese do conhecimento um círculo
vicioso sustentado nele próprio, no qual não se pode confiar racionalmente. Conclui-se então,
que segundo Hume, a indução é um corolário contingente, e só pode levar a uma conclusão que
tem apenas certo grau de probabilidade de estar correta e, mesmo que seja extremamente alto,
nunca será absoluto. Hume insiste que qualquer ligação probabilística ou causal, dependerá
sempre de hábitos da mente, e não têm base na nossa experiência do mundo.
Um filósofo contemporâneo que traz adições às inconsistências expostas por Hume, é
Alan Chalmers. Nascido em Bristol, Inglaterra em 1939, conseguiu sua licenciatura em Física
pela Universidade de Bristol em 1961, seu Mestrado em Física pela Universidade de
Manchester em 1964, e seu PhD sobre a Teoria Eletromagnética de James Clerk Maxwell pela
Universidade de Londres em 1971. Ele se dirigiu então à Austrália, se tornou membro do
Departamento Geral de Filosofia em 1972, e permaneceu até 1986. De 1986 a 1999 foi o chefe
do Departamento de História e Filosofia da Ciência na Universidade de Sydney, onde continua
como Professor Adjunto Honorário. Chalmers foi eleito para fazer parte da Academy of
Humanities em 1997. Foi premiado com a Medalha Centenária pelo governo Australiano por
“Serviços para a humanidade na área da História e Filosofia da Ciência”. Seu interesse primário
de pesquisa e estudo é a Filosofia da Ciência, e ele é o Autor do livro “O que é ciência afinal?.”
(Chalmers A. F. Editora brasiliense. 1993.)
Na obra “O que é ciência afinal?.” Toma o Indutivista como ingênuo, apresentando
outros problemas que o método indutivo sofre, além dos apresentados por Hume. Chalmers
discute o conceito de que se a observação é capaz de proporcionar um conjunto seguro de
proposições como início, por que então o raciocínio indutivo leva ao conhecimento científico
confiável?
Chalmers discute o princípio da indução na prática. Já foi pontuado que o método indutivista
chega à uma afirmação geral a partir de um grande número de afirmações singulares. Porém, quantas
observações são suficientes para constituir “um grande número”? Como o princípio da indução deseja
guiar os observadores para a obtenção do conhecimento, então a condição “grande número” deveria
ser determinada detalhadamente. Ou então, o que fazer no caso de a observação de um evento de
baixa ocorrência, como uma condição médica rara? O princípio da indução torna-se então inválido, por
não poder se obter um grande número de afirmações singulares, e consequentemente, não ser
possível chegar a uma afirmação geral.
Outra questão abordada, é o que exatamente pode ser considerado como significativo,
quando se trata de uma variação nas circunstâncias de uma observação? Pode-se usar o exemplo
do ponto de fervura da água. Tem-se o conhecimento de muitas variáveis em nosso cotidiano
que podem afetar esse ponto, tais como a pressão relativa a cor do recipiente, a pureza da água
e, caso não for pura, quais elementos estão presentes, e qual a quantidade de cada um, e por
conseguinte. Um experimento somente seria viável caso for mencionado qual(is) dessas
variações seriam significativamente relevantes para se estimar e determinar o ponto em que a
água atingirá a fervura, porém, para tal, deve-se observar conhecimentos teóricos adquiridos
previamente para se avaliar a situação corretamente. Isso iria portanto, novamente, contra o
princípio da indução, que diz que a ciência começa com a observação. Porém, dado o exposto,
é percebido que os conhecimentos prévios do observador possuem um papel vital na
observação, antes mesmo da mesma ser realizada.
Por fim, Chalmers discute sobre como o indutivista toma a observação como ferramenta
indispensável e única na construção do conhecimento. Todavia, as imagens captadas pelas
retinas de um indivíduo não são os únicos agentes presentes em uma observação, e esta sempre
terá a influência de aspectos da vida do observador, como a sua formação cultural,
conhecimento prévio, e até mesmo as expectativas possuídas naquele momento específico.
Em meados do século XX mais especificamente na década de 1930, então, o filósofo e
professor autro-britânico Karl Raimund Popper, traz à tona a escola de pensamento do
Falsificacionismo, e consigo, o princípio da falseabilidade ou refutabilidade, como solução para
o Problema da Indução.
Este é o princípio que uma hipótese, ideia, teoria ou asserção, tem de poder ser mostrada
falsa. É considerado um conceito muito importante na epistemologia. Popper vem diretamente
do problema exposto por Hume e traz o princípio de que apesar de um enunciado existencial
singular não poder garantir um enunciado universal, este pode sim, falsear um enunciado
universal: Se a observação existencial de um único cisne negro for realizada, então o enunciado
universal de “todos os cisnes são brancos” será automaticamente falso (conceito este já exposto,
chamado de Modus Tollens). Popper conflitava diretamente com os positivistas do Círculo de
Viena, pois afirmava que o princípio indutivista não proporciona nenhum sinal conveniente
diferenciador do caráter empírico, e também nenhum critério de demarcação, que para Popper,
era o mais significativo.Popper denominou como problema de demarcação a dificuldade em
estabelecer um critério que possibilite distinguir entre as ciências empíricas e lógicas, das
metafísicas (algo que também foi abordado extensivamente por Immanuel Kant).
Os pensamentos de Popper tem caráter extremamente progressista. Ele defende que a
ciência, a geração e descoberta de conhecimento nunca deve ser um processo cumulativo, mas
sim progressivo, e o fato de poder falsear uma ideia usando de base outras que podem a
contrapor, e sugerir soluções aos vazios deixados pela primeira, faz com que a ciência sofra
uma evolução contínua. Popper também afirma que o empirismo sempre sofrerá influência
sobre o próprio ponto de vista do pesquisador, e portanto, nenhuma teoria originada deste
método poderia propor-se a ser uma verdade cabal, então falsear uma ideia também é uma
maneira de preencher lacunas e até mesmo superar preconceitos que podem ser as bases de uma
teoria.
O falseamento trabalha com a premissa de que se um conhecimento adquirido é bem
fundamentado, então o mesmo é capaz de evolução e progresso, então optar por esse modo de
pesquisa é escolher por uma fonte que irá regular o processo de obtenção de informações, e
sempre manterá o processo de crítica ativo.
A teoria de Popper se mantém fundamental na contemporaneidade. A falseabilidade
serve para distinguir conjuntos de informações da caráter falso, como pseudociências, do campo
da verdadeira ciência. Toda pseudociência tende a apresentar argumentos generalizadores, e
nunca apresentar possibilidades de falseamento, portanto, não há como se provar falsa, tendo
que se assumir verdadeira de qualquer forma.
Através desta breve análise, conclui-se que o método científico parte da observação, e
esta é uma ferramenta fundamental para o mesmo, porém não a única. Começando com o
Empirismo, depois se apresentando de forma indutivista, refutado por Hume, Chalmers e
Popper, estes filósofos mostram que a ciência está, e deve estar, sempre em constante
progressão e evolução, que sempre deve haver espaço para questionamentos e dúvidas, e
também para se pôr a prova quaisquer verdades absolutas que sejam expostas à humanidade.

Bibliografia:

AZEVEDO FILHO, A. Princípios de Inferência Dedutiva e Indutiva: Noções de Lógica e


Métodos de Prova. 1ª Edição 2010.

CHALMERS, A. F. O que é ciência afinal?. Editora brasiliense,1993.

HUME, D. " Dúvidas Cépticas relativas às operações do entendimento," Tratado da


Natureza Humana (1736), Parte 2. Trad. S. S. Fontes. Lisboa: Gulbenkian, 2002.

POPPER, KARL RBATH, SÉ RGIO. Conjecturas e Refutações. Brasilia: Editora


Universidade de Brasiĺ ia, 2008.

SOUZA, A.J.M de et al. Iniciação à lógica e à metodologia da ciência. São Paulo: Cultrix,
1976.

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