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Francisco Rosa

Síntese Sonora
16/12/2019

Modelos energéticos da música


acusmática
Um resumo

Os modelos energéticos “tornam possível entrar num mundo musical específico,


normalmente pelo uso de um modelo físico” (Vande Gorne, 2018), sendo que destes modelos
surgem arquétipos, que funcionam como uma gramática na audição e composição da música
acusmática, conduzindo o ouvinte na audição. Assim sendo, a composição de música
acusmática passa pela conjugação de diferentes arquétipos, e na maneira como se conjugam
entre si, e com a ideia musical. Estes arquétipos podem ser considerados uma maneira
diferente de catalogar todos os sons existentes (sem ser pelos padrões normais ), através do seu
comportamento e imagem física. Nas palavras de Annette Vande Gorne:
“The archetype is not only an image for me. It is also a real-life physical experience,
real-life physiology, the relationship with the body, and the relationship with proven physical
laws.” (Anderson, 2012)

Assim sendo Annette Vande Gorne faz a distinção entre as seguintes energies:
• Percussão-Ressonância
• Fricção-Granulação
• Acumulação de corpúsculos
• Oscilação
• Balançar
• Ressalto
• Fluxo
• Pressão-Deformação(Flexão)
• Rotação
• Espiral

MODELOS ENERGÉTICOS - RESUMO


• Percussão-Ressonância
Este é o modelo mais generalizado de produção de som, usado geralmente nos
instrumentos musicais. Pode considerar-se que existem três componentes na criação deste
modelo: o excitador, o ressoador, e o difusor. Tomando o exemplo de um trompete a tocar
numa igreja, o excitador pode ser considerado os lábios do trompetista em vibração, o
ressoado é o trompete e campânula, e o difusor, o ambiente acústico da igreja. Este modelo
pode ser caracterizado através do modelo instrumental e natural do envelope ADSR (attack,
decay, sustain, release).
Como lecionado no ano anterior, um som desta morfologia possui um ataque e uma
ressonância (ou como referido no livro, um halo harmónico), que empresta a cor ao ataque.

• Fricção-Granulação
A fricção (ou atrito) é “raw energy between two surfaces coming into contact” (Vande
Gorne, 2018). Este modelo é gestual, isto é, um modelo baseado num movimento,
envolvendo uma transição entre um estado a deslizar e uma paragem, observando a diferença
entre estados, instáveis ou estáveis (como por exemplo o grão), e havendo uma conexão direta
entre intenção, gesto e o som resultante, no movimento utilizado.
Assim, a velocidade a que se produz o atrito, bem como o a tipologia do som, o grão,
bem como o quanto o som se sustém.

• Acumulação de corpúsculos
Este modelo tem como base o limiar da perceção de eventos individuais do humano.
Utilizando o grão como elemento base, este modelo procura criar uma acumulação de grãos
gradual ao longo do tempo, até criar uma massa principalmente uniforme, havendo a
possibilidade de haver existência de sons que sobressaiam na massa. É importante não
confundir com fluxo, sendo que a diferença entre os dois está na escala de audição (se bem
que o mesmo som pode dar origem tanto a um como a outro). Vale a pena realçar que o
importante neste modelo é precisamente o processo e não a forma. Os factores percepcionais
a ter em conta na construção deste modelo podem sem o grão, a massa (ou seja, a ocupação
no espectro das alturas), o calibre (o tamanho do grão), e a densidade da acumulação.

MODELOS ENERGÉTICOS - RESUMO


• Oscilação
A oscilação é um movimento regular, rápido e mecânico entre dois pólos distintos, assim
como num pêndulo. Tal como no objecto referido anteriormente, existe a necessidade de um
movimento que dê origem ao gesto, que continuará, “criando” uma lei, baseada num modelo
matemático que descreve os fenómeno físico (neste caso, a lei do pêndulo).
Neste modelo os fatores de variação são a velocidade, a densidade, a frequência (não em
termos de altura, mas sim de número de oscilações por unidade de tempo), o espectro, o
campo estéreo, e a ilusão de profundidade.

• Balançar
O balançar também é um movimento contínuo entre dois pólos, mas possui uma
grande diferença em relação à oscilação: o movimento é mais lento, irregular, e gestual, sendo
possível ouvir a trajetória entre os dois pólos.
Os fatores de variação são a velocidade, a densidade, a frequência, o espectro, o campo
estéreo, e a ilusão de profundidade

• Ressalto
Uma vez mais, existe um modelo matemático que descreve este fenómeno que ocorre
na natureza: a lei do ressalto. Assim sendo, este modelo pode ser descrito como um “repeated
movement against one pole, with incremental and predictable acceleration in the impacts
(diminution of the time between two impacts)”. Uma vez mais, temos neste modelo o
encontro entre lei e gesto.
Para este modelo, o fator de variação é a velocidade, e os critérios de tipologia halo
harmónico, e matéria são variações na perceção do ressalto.

• Fluxo
O fluxo caracteriza-se pela variação lenta e contínua, com uma variação mínima, sendo
que musicalmente o objetivo é manter e focar a audição, mesmo sem um contorno definido,
longínquo, ou com poucas mudanças. Este conceito relembra Heráclito, para quem a
eternidade é o momento presente, em constante mudança, relembrando um rio.
O fator densidade, e o perfil de massa (isto é, a mudança continua na massa) são fatores
de variação.

MODELOS ENERGÉTICOS - RESUMO


• Pressão-Deformação (Flexão)
De forma muito simples, é um ir e vir contínuo de energia entre dois pólos, na qual
existe aplicação de força, e um retorno da mesma, que leva a uma evolução e transformação
de espectro, ao longo da trajectória. Um exemplo deste modelo é o de uma mola, na qual
existe uma força que altera a forma física da mola, acumulando energia, havendo depois uma
libertação da mesma.
Os fatores velocidade, bem como os critérios de perfil de massa (mudança continua na
massa), e perfil melódico (trajetória contínua da altura), com transformação ou variação o
envelope melódico, podem ser usados na percepção da pressão-deformação.

• Rotação
A rotação é tanto um movimento, como um método, sendo precisamente mais uma
forma de movimento que outra coisa, ouvindo-se como uma repetição cíclica, contínua e
periódica. O espaço assume um carácter muito importante neste modelo, ajudando a realçar
o movimento.
Os fatores velocidade, frequência, e espaço assumem-se como critérios para obter
variação nas rotações.

• Espiral
Uma espiral é nada mais, nada menos que uma rotação com uma variação de
velocidade, seja ela crescente, em direção a um pico, ou decrescente, em direção a um ponto
baixo.

Bibliografia
GORNE, Annette Vande. Treatise on Writing Acousmatic Music on Mixed Media. 1ª edição.
Lien. 2018 (pp. 10-23)
ANDERSON, Elizabeth. An interview with Annette Vande Gorne. Computer Music Journal,
36. MIT. 2012. (p. 13)

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