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9-804-016

R E V: 22 DE D E Z E M B R O DE 2003

C O N S TA N C E E. BA G LEY

Aspectos Legais de Séries de Gestão

A Doutrina de Stare Decisis e Lawrence v. Texas


Existem dois tipos principais de sistemas legais: direito civil e direito consuetudinário. Em países de direito
civil, tais como França e Alemanha, as leis governamentais são estabelecidas por uma constituição e em estatutos
promulgados pela legislatura e escritos em legislações ou códigos de lei, tais como o Código Napoleônico na
França. Certos aspectos dos sistemas de direito civil datam da época do Império Romano e do Código de
Justiniano compilado entre 528 e 534 a.C. 1 Apesar dos Tribunais, em um tema de direito civil, terem o poder de
interpretar a constituição e os estatutos, eles não possuem o poder de criar novas leis.

Países de direito consuetudinário, tais como a Inglaterra, os Estados Unidos e a Austrália, normalmente
também possuem uma constituição (que no caso da Inglaterra não está estabelecido em nenhum documento
único escrito) bem como estatutos adotados pela legislatura. Às vezes, a legislatura irá aprovar um estatuto
estabelecendo princípios e diretrizes gerais e irá delegar a uma agência administrativa ou departamento
executivo a autoridade de decretar regulamentações para executar esta intenção legislativa. Por exemplo, o Ato
Sarbanes-Oxley de 2002 delegou à Comissão de Títulos e Câmbio dos Estados Unidos (SEC) a autoridade de
definir as instâncias nas quais um advogado deve relatar irregularidade corporativa à junta diretiva talvez mesmo
à SEC bem como as qualificações que os diretores nos comitês de auditoria devem possuir para serem
considerados independentes.

No sistema de direito consuetudinário, os juízes não apenas possuem a autoridade de interpretar a


constituição, os estatutos promulgados pela legislatura e as regulamentações adotadas pelas agências
administrativas, mas também podem criar uma nova lei no decorrer da decisão de um caso particular. Direito
consuetudinário — as regras jurídicas feitas por juízes enquanto decidem um caso envolvendo uma questão não
resolvida pelas disposições da constituição ou um estatuto válido ou regulamentação— originado na Inglaterra.
Nos Estados Unidos, inclui toda a jurisprudência da Inglaterra e das colônias americanas antes da Revolução
Americana, bem como a jurisprudência americana desde o período colonial.

Nos Estados Unidos, a Cláusula de Supremacia da Constituição americana estabelece que a Constituição
americana seja a lei suprema do país. Qualquer lei federal ou estadual que entre em conflito com os Estados
Unidos. Constituição é inválida. A Suprema Corte americana possui a autoridade final de interpretar a
Constituição americana e decidir se está em conflito com alguma lei federal ou estadual. 2

1
Ray August, International Business Law (Direito Empresarial Internacional), 2a. ed. (Upper Saddle River, NJ: Prentice Hall, 1997), p. 42.

O Professor Constance E. Bagley preparou esta nota como base para discussão em sala de aula.

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804-016 A Doutrina de Stare Decisis e Lawrence v. Texas

O direito consuetudinário é desenvolvido por meio da doutrina de stare decisis, que significa “ficar com as
coisas decididas.” Uma vez que um tribunal decide um caso particular, outros tribunais lidando com um
problema jurídico similar irão normalmente seguir a decisão daquele tribunal. A ausência de certa contenção na
habilidade dos juízes em alterar a lei a seu bel prazer em uma jurisdição de direito consuetudinário iria tornar-se
imprevisível e interferir na habilidade das partes de moldas suas transações financeiras com certo grau de
certeza.

Apesar da Suprema Corte americana raramente indeferir suas decisões anteriores, isto pode vir a acontecer.
Por exemplo, em 1954, a Corte declarou as escolas segregadas ilegais sob a Cláusula de Proteção Igualitária da
Emenda Constitucional Quatorze, que estabelece que nenhum estado deve "negar a nenhuma pessoa dentro de
sua jurisdição a proteção da igualdade de direitos." A Corte expressamente indeferiu sua decisão em Plessy v.
Ferguson4 na qual havia declarado que vagões segregados não violavam a Cláusula de Proteção Igualitária desde
que as instalações disponíveis para Afro-Americanos fossem "iguais" àquelas fornecidas aos brancos.

Mais recentemente, ativistas de direitos humanos incitaram a Suprema Corte a reverter sua decisão de 1973
sobre Roe v. Wade5 em que uma mulher tem constitucionalmente um direito protegido ao aborto. A Corte
declinou indeferir Roe v. Wade em 1992 após “considerar as questões constitucionais fundamentais resolvidas por
Roe, princípios de integridade institucional e a regra de stare decisis.”6 A pluralidade de opinião escrita pelos
Ministros da Suprema Corte O’Connor, Kennedy, e Souter permanece sendo a articulação principal da
importância da doutrina de stare decisis no sistema de direito consuetudinário americano:

A obrigação de seguir precedentes começa com a necessidade, e a necessidade contrária marca seu
limite externo. . . . De fato, o próprio conceito de Estado de Direito subjacente a nossa própria Constituição
requer tal continuidade ao longo do tempo que um respeito por precedentes é, por definição,
indispensável. No outro extremo, uma necessidade diferente se faria necessária caso uma decisão judicial
chegasse a ser vista tão claramente como erro que sua aplicação fosse por aquela mesma razão condenada.

Mesmo quando uma decisão para indeferir um caso anterior não é virtualmente predeterminada, em
último e raro caso, é de senso comum que o princípio do stare decisis não é um “comando inexorável,” e
certamente não é o mesmo em todo caso constitucional. Ao contrário, quando esta Corte reexamina uma
decisão anterior, seu julgamento é normalmente informado por uma série de considerações pragmáticas e
prudenciais designadas para testar a consistência para indeferir uma decisão anterior com o ideal de um
Estado de Direito, e para avaliar os custos respectivos para reafirmar e indeferir um caso anterior. . . .

Portanto, neste caso, podemos questionar se a regra central de Roe foi considerada impraticável; se a
limitação da regra no poder do estado pode ser removida sem injustiça grave aos que contaram com ela
ou dano significativo à estabilidade da sociedade governada pela regra em questão; se o crescimento da lei
nos anos intervenientes deixou a regra central de Roe um anacronismo doutrinal descontado pela
sociedade; e se as previstas de Roe do fato até agora

2
Marbury v. Madison, 5 U.S. (1 Cranch) 137 (1803).
3
Brown v. Board of Education, 347 U.S. 483 (1954).
4
163 U.S. 537 (1896).
5
410 U.S. 113 (1973).
6
Planejamento Familiar de S.E. Pennsylvania v. Casey, 505 U.S. 833 (1992).

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mudaram nas duas décadas seguintes para fazer com que a decisão central seja de alguma forma
irrelevante ou injustificável ao lidar com a questão a que se refere.

[Uma] comparação que a história do século 20 solicita é sobre os casos empregando a regra “separada,
porém igual” de aplicação da Emenda Quatorze de garantia de proteção igualitária. Eles começaram com
a decisão de Plessy v. Ferguson que legislativamente ordenava a segregação racial em transportes públicos
funciona sem negação de proteção igualitária, rejeitando o argumento de que separação racial imposta
pela máquina legal da sociedade americana trata a raça negra como inferior. A Corte Plessy considerou “a
falácia subjacente do argumento do demandante ao consistir na suposição de que a separação forçada de
duas raças carimba a raça colorida com uma marca de inferioridade. Caso seja assim, não é por encontrar
nada no ato, mas somente porque a raça colorida escolhe colocar aquela construção sobre ela.” Se, na
realidade histórica, os Juízes na maioria Plessy acreditavam ou não nisso, este entendimento da implicação
de segregação foi a justificativa apresentada para a opinião da Corte. Mas este entendimento dos fatos e a
regra que foi apresentada para justificar foram repudiadas em Brown v. Board of Education. . . .

A Corte em Brown lidou estes fatos da vida observando que seja qual fosse o entendimento na época
de Plessy do poder de segregação para estigmatizar os que eram segregados com uma “marca de
inferioridade,” era claro que em 1954 aquela segregação legalmente sancionada possuíam de tal forma um
efeito, ao ponto de que racialmente as instalações educacionais públicas separadas eram consideradas
inerentemente desiguais. O entendimento da sociedade dos fatos sobre o qual o julgamento constitucional
buscou em 1954 era então fundamentalmente diferente da base reivindicada para a decisão em 1896.
Enquanto pensamos que Plessy estava errado no dia que foi decidido, . . . devemos também reconhecer
que a explicação da Corte de Plessy para sua decisão era tão manifestamente contrária com os fatos
aparentes para a Corte em 1954 que a decisão de reexaminar Plessy era por este único motivo não apenas
justificada, mas necessária.

O alcance do direito a privacidade e responsabilidade pessoal lidado em Roe e casos anteriores e a doutrina de
stare decisis novamente passou para primeiro plano em 2003 quando a Corte Suprema Americana foi convocada
para reavaliar sua decisão de 1986 em Bowers v. Hardwick na qual a Corte sustenta um estatuto estadual tornando
a prática de sodomia um delito criminal. O Anexo 1 contém excertos extensos tanto da opinião da maioria da
Corte Suprema Americana em Lawrence v. Texas, 123 S. Ct. 2472 (2003), quanto das opiniões dissidentes.

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Anexo 1

Excertos de

JOHN GEDDES LAWRENCE E TYRON GARNER v. CORTE SUPREMA

DO TEXAS DOS ESTADOS UNIDOS

123 S. Ct. 2472 (26 de Junho de 2003) (certas citações e notas de rodapé omitidas).

JUSTICE KENNEDY apresentou a opinião da Corte.

A liberdade protege a pessoa de intrusões do governo injustificadas em uma moradia ou outros locais
privados. Em nossa tradição, o Estado não é onipresente no lar. E existem outras esferas de nossas vidas e
existência, fora de casa, onde o Estado não deve ser uma presença dominante. A liberdade estende-se além das
fronteiras espaciais. A liberdade presume uma autonomia de si que inclui a liberdade de pensamento, crença,
expressão e certa conduta íntima. O caso em questão envolve a liberdade da pessoa tanto em dimensões espaciais
como mais transcendentais.

I
A questão diante da Corte é a validade de um estatuto do Texas que torna crime que duas pessoas do mesmo
sexo tenham certa conduta sexual íntima.

Em Houston, Texas, oficiais do Departamento de Polícia do Condado de Harris foram enviados para uma
residência privada em resposta ao relato de um distúrbio por armas. Eles entraram em um apartamento onde um
dos requerentes, John Geddes Lawrence, residia. O direito da polícia de entrar não parece ter sido questionado.
Os oficiais observaram Lawrence e outro homem, Tyron Garner, realizando um ato sexual. Os dois requerentes
foram detidos, mantidos sob custódia durante a noite, acusados e condenados perante um Juiz de Paz.

As denúncias descreviam seu crime como "desvio de relação sexual, nomeadamente sexo anal, com um
membro do mesmo sexo (homem)." Esta lei estadual aplicável é Tex. Penal Code Ann. § 21.06(a) (2003). Estabelece
que: "Uma pessoa comete uma ofensa caso pratique um desvio na relação sexual com outro indivíduo do mesmo
sexo." O estatuto define "desvio de relação sexual" da seguinte forma:

"(A) qualquer contato entre qualquer parte dos genitais de uma pessoa e a boca ou anus de outra pessoa; ou

"(B) a penetração dos genitais ou o anus de outra pessoa em um objeto."

Os requerentes contestaram o estatuto como uma violação da Cláusula de Proteção Igualitária da Décima Quarta
Emenda e de uma disposição similar da Constituição do Texas. . . .

Nós concedemos um certiorari para considerar três questões:

"1. As convicções criminais dos Requerentes sob a lei do Texas de "Conduta Homossexual" -- que criminaliza
a intimidade sexual entre casais do mesmo sexo, mas não comportamento idêntico por casais de diferentes sexos
-- violam a garantia da Emenda Quatorze de proteção igualitária de direitos?

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"2. As convicções criminais dos Requerentes para a intimidade sexual consensual do adulto em casa violam
seus interesses vitais de liberdade e privacidade protegidos pela Cláusula do Devido Processo da Décima Quarta
Emenda?

"3. Bowers v. Hardwick, 478 U.S. 186 (1986) deveria ser indeferida?"

Os requerentes eram adultos no momento do alegado delito. Sua conduta foi em privado e consensual.

II
Concluímos que o caso deve ser resolvido determinando se os requerentes eram livres como adultos para
realizar a conduta privada no exercício de sua liberdade sob a Cláusula do Devido Processo da Décima Quarta
Emenda da Constituição. Para este inquérito nós consideramos necessário reconsiderar a decisão da Corte em
Bowers.

Existem declarações genéricas do alcance substancial de liberdade sob a Cláusula do Devido Processo em casos
anteriores, mas o ponto de partida mais pertinente é nossa decisão em Griswold v. Connecticut, 381
U.S. 479 (1965).

Em Griswold, a Corte invalidou a lei estadual que proibia o uso de drogas ou dispositivos de contracepção e o
aconselhamento, instigação e cumplicidade no uso de contraceptivos. A Corte descreveu o interesse protegido
como um direito à privacidade e deu ênfase à relação matrimonial e ao espaço protegido do leito matrimonial.

Após Griswold, ficou estabelecido que o direito de tomar certas decisões referentes à conduta sexual estende-
se além da relação matrimonial. Em Eisenstadt v. Baird, 405 U.S. 438 (1972), a Corte invalidou a lei que proibia a
distribuição de contraceptivos para pessoas não-casadas. . . .

As opiniões em Griswold e Eisenstadt era parte das bases para a decisão em Roe v. Wade, 410 U.S. 113 (1973).
Como é amplamente conhecido, o caso envolve uma contestação à lei do Texas que proíbe abortos, mas as leis de
outros Estados eram igualmente afetadas. Apesar da Corte sustentar que os direitos da mulher não são absolutos,
seu direito de eleger um aborto possuía proteção real e substancial como um exercício de sua liberdade sob a
Cláusula do Devido Processo. A Corte citou casos que protegem a liberdade espacial e casos que vão muito além
disso. Roe reconheceu o direito de uma mulher de tomar certas decisões fundamentais que afetam seu destino e
confirmou uma vez mais que a proteção da liberdade sob a Cláusula do Devido Processo possui uma dimensão
substancial de significância fundamental ao definir os direitos da pessoa.

Em Carey v. Population Services Int'l, 431 U.S. 678 (1977), a Corte confrontou uma lei de Nova Iorque que
proibia a venda ou a distribuição de dispositivos contraceptivos para pessoas com menos de 16 anos de idade.
Apesar de não haver um único parecer da Corte, a lei foi invalidada. Tanto Eisenstadt como Carey, bem como a
decisão e os fundamentos em Roe, confirmaram que o raciocínio de Griswold não poderia ser confinado para a
proteção de direitos de adultos casados. Este foi o estado da lei com respeito a um dos casos mais relevantes
quanto a Corte considerou Bowers v. Hardwick.

Os fatos em Bowers tinham algumas semelhanças com o caso em questão. Um oficial de polícia, cujo direito
de entrar parece não ter sido colocado em questão, observou Hardwick, em sua própria cama, realizando uma
conduta sexual íntima com outro homem adulto. A conduta era uma violação de um estatuto da Georgia que
torna a prática de sodomia um delito criminal. Uma diferença entre os dois casos é que o estatuto da Georgia
proibia a conduta fossem os participantes do mesmo sexo ou não, enquanto que o estatuto do Texas,

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como vimos, se aplica apenas a participantes do mesmo sexo. Hardwick não foi processado, mas ele moveu uma
ação na corte federal para declarar o estatuto do estado inválido. Ele alegou que era um homossexual praticante e
que a proibição criminal violava direitos garantidos a ele pela Constituição. A Corte, em uma opinião por Justice
White, sustentou a lei da Georgia. . . .

A Corte iniciou sua discussão substancial em Bowers como segue: "A questão apresentada é se a Constituição
Federal confere um direito fundamental para homossexuais praticarem sodomia e, portanto invalida as leis de
diversos Estados que ainda consideram tal conduta ilegal e o tem feito por um longo tempo." Esta declaração,
nós agora concluímos, revela a falha da própria Corte de apreciar a extensão da liberdade em jogo. Dizer que a
questão em Bowers era simplesmente o direito de praticar uma certa conduta sexual degrada a reivindicação que
o indivíduo apresenta, da mesma forma que iria degradar um casal legalmente casado se fosse dito que o
casamento é simplesmente sobre o direito de ter relação sexual. As leis envolvidas em Bowers e aqui são, para ter
certeza, estatutos que não pretendem mais do que proibir um ato sexual específico. Suas penalidades e
propósitos, contudo, possuem consequências de maior alcance, tocando na conduta humana mais privada, o
comportamento sexual, e nos locais mais privados, a casa. Os estatutos buscam o controle de uma relação pessoal
que, intitulada ou não por reconhecimento formal da lei, estão dentro da liberdade de escolha das pessoas sem
que sejam punidos como criminosos.

Como regra geral, isto deve aconselhar contra tentativas do Estado, ou uma corte, para definir o significado de
uma relação ou estabelecer seu dano ausente de fronteiras a uma pessoa ou abuso de uma instituição que a lei
protege. É suficiente para nós saber que adultos podem escolher entrar neste relacionamento no confinamento de
suas casas e suas próprias vidas privadas e ainda manter sua dignidade como pessoas livres. Quando a
sexualidade encontra uma expressão expressa na conduta íntima com outra pessoa, a conduta pode ser apenas
um elemento na ligação pessoal que é mais duradoura. A liberdade protegida pela Constituição concede a
pessoas homossexuais o direito de fazer esta escolha.

Ao ter mal-entendido a reivindicação de liberdade então apresentada, e deste modo, estabelecendo a


reivindicação de saber se existe um direito fundamental para a prática de sodomia consensual, a Corte Bowers
disse: "Proscrições contra tal conduta possuem raízes antigas." Em escritos acadêmicos, e em diversos relatórios
amicus acadêmicos apresentados para assistir a Corte neste caso, existem críticas fundamentais às premissas
históricas sustentadas pelas opiniões da maioria e em acordância com Bowers. . . .

A princípio deve ser observado que não há histórico de longa data neste país de leis direcionadas à conduta
homossexual como uma questão distinta. . . . Assim, as recentes leis de sodomia americanas não foram dirigidas
para homossexuais como tal, mas sim com o intuito de proibir atividade sexual não-procriativa de forma geral.
Não sugere a aprovação de conduta homossexual. Pretende mostrar que esta forma particular de conduta não foi
pensada como uma categoria separada da conduta similar entre pessoas heterossexuais.

As leis que proíbem a sodomia não parecem ter sido forçadas contra consentir adultos de agir em privado.
Um número substancial de processos e condenações dos quais existem registros subsistentes foram por atos
predatórios contra aqueles que não podiam ou não consentiram, como no caso de um menor ou uma vítima de
agressão. . . .

. . . A proibição criminal duradoura de sodomia homossexual sobre a qual a decisão Bowers deu o devido
crédito é tão consistente com uma condenação geral de sexo não-procriativo quanto com uma tradição
estabelecida de atos processuais devido a seu caráter homossexual.

A política de punição por consentimento de adultos por atos privados não foi muito discutida na literatura
jurídica anterior. Podemos inferir que uma razão para tal foi a própria natureza privada da conduta. Apesar da
ausência de processos, podem ter havido períodos em que houve crítica pública

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a homossexuais como tais e uma insistência para que o direito penal impusesse o desencorajamento de suas
práticas. Mas longe de possuir "raízes antigas", as leis americanas direcionadas a casais do mesmo sexo não foram
desenvolvidas até o último terço do século 20. As decisões relatadas referentes ao processo de sodomia
homossexual consensual entre adultos durante os anos 1880-1995 não são sempre claras em detalhes, mas um
número significante envolvia conduta em locais públicos.

Apenas a partir de 1970 que os Estados apontaram relações do mesmo sexo como processo criminal, e apenas
nove Estados o fizeram. Os favoráveis a Bowers mesmo em alguns destes Estados não aderiram à política de
suprimir a conduta homossexual. Durante o curso das últimas décadas, Estados com proibições heterossexuais
caminharam em direção à sua revogação.

Em suma, as bases históricas com base em Bowers são mais complexas que a opinião da maioria e o parecer
favorável do Juiz Presidente Burger indicado. Suas premissas históricas não são indubitáveis e são, no mínimo,
exageradas.

Deve ser reconhecido, obviamente, que a Corte em Bowers estava elaborando o principal argumento que por
séculos tornaram-se vozes poderosas para condenar a conduta homossexual como imoral. A condenação foi
moldada por crenças religiosas, concepções de direito e comportamento aceitável, e respeito pela família
tradicional. Para muitas pessoas não se tratam de questões triviais, mas convicções profundas aceitas como
princípios éticos e morais aos quais elas aspiram e que, portanto determinam o curso de suas vidas. Contudo, tais
considerações não respondem a questão que temos diante de nós. A questão é se a maioria pode utilizar o poder
do Estado para impor estas visões para toda a sociedade por meio da aplicação do direito penal. "Nossas
obrigação é definir a liberdade de todos, e não impor nosso próprio código moral."

O Juiz Presidente Burger foi da mesma opinião da Corte em Bowers e posteriormente explicou seus pontos de
vista como segue: "As decisões de indivíduos referentes a conduta homossexual foram sujeitas a intervenção
estadual por toda a história da civilização ocidental. A condenação destas práticas é firmemente enraizada na
moral judaica-cristã e em padrões éticos." Como com as suposições do Ministro White sobre história, a
investigação lança certa dúvida na natureza radical da declaração do Juiz Presidente Burger já que refere-se à
conduta privada homossexual entre adultos em consentimento. Em todos os casos, acreditamos que nossas leis e
tradições da última metade do século são de grande relevância aqui. Estas referências mostram uma consciência
crescente de que a liberdade dá proteção substancial a pessoas adultas para decidir sobre conduzir suas vidas
privadas em questões relacionadas ao sexo. "A história e a tradição são o ponto de partida, mas não em todos os
casos, o ponto final do inquérito do devido processo substancial.

Este reconhecimento emergente tornou-se aparente quando Bowers foi decidido. Em 1955, o Instituto de
Direito Americano promulgou o Código Penal Modelo e deixou claro que não recomendava ou permitia
"penalidades criminais por relações sexuais consensuais conduzidas de forma privada." E justificou sua decisão
com três razões: (1) As proibições enfraqueciam o respeito pela lei ao penalizar uma conduta realizada por muitas
pessoas; (2) os estatutos regulamentaram a conduta privada como não prejudicial aos demais; e (3) as leis eram
arbitrariamente impostas e assim levavam ao perigo de chantagem. Em 1961, Illinois alterou suas leis para
adaptar-se ao Código Penal Modelo. Outros Estados em seguida o seguiram.

Em Bowers a Corte referiu-se ao fato de que antes de 1961, todos os 50 Estados tinham proibido a sodomia, e
que no momento da decisão da Corte, 24 Estados e o Distrito de Columbia tinham leis de sodomia. O Ministro
Powell lembrou, no entanto, que estas proibições eram com frequência ignoradas. Georgia, por exemplo, não
tinha feito cumprir suas leis por décadas.

As referências radicais do Juiz Presidente Burger sobre a história da civilização ocidental, a moral judaico-
cristã e padrões éticos não foram consideradas por outras autoridades que apontavam para uma direção oposta.
Em 1957, o comitê que aconselhava o Parlamento Britânico recomendou a revogação das leis

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que puniam a conduta homossexual. O Parlamento promulgou o fundamento destas recomendações 10 anos
depois.

Ainda de maior importância, quase cinco anos antes de Bowers ter sido decidida a Corte Europeia de Direitos
Humanos considerou um caso com paralelos a Bowers e ao caso de hoje. Um homem adulto residente na Irlanda
do Norte alegou que era um homossexual praticante que gostaria de envolver-se com conduta homossexual
consensual. As leis da Irlanda do Norte negaram-lhe este direto. Ele alegou que havia sido questionado, sua casa
tinha sido vasculhada e que temia um processo criminal. A corte sustentou que as leis proscrevendo a conduta
eram inválidas sob a Convenção Europeia de Direitos Humanos. Dudgeon v. United Kingdom, 45 Eur. Ct. H. R.
(1981) P52. Autoritativa em todos os países que são membros do Conselho da Europa (21 nações na época, 45
nações agora), a decisão é contrária à premissa de Bowers de que o argumento apresentado era insubstancial em
nossa civilização ocidental.

Em nosso próprio sistema constitucional, as deficiências em Bowers tornaram-se ainda mais aparentes nos
anos seguintes ao seu pronunciamento. Os 25 Estados com leis proibindo a conduta relevante mencionada na
decisão Bowers são reduzidos agora a 13, dos quais 4 impuseram suas leis apenas contra conduta homossexual.
Nestes Estados onde a sodomia ainda era proibida, seja por conduta homossexual ou heterossexual, existe um
padrão de não-execução com relação ao consentimento aos adultos de agir em privado.

Dois casos principais decididos após Bowers lança sobre sua decisão ainda mais dúvidas. Em Planejamento
Familiar do Sudeste Pa. v. Casey, 505 U.S. 833 (1992), a Corte reafirmou a força substancial da liberdade protegida
pela Cláusula do Devido Processo. A decisão Casey novamente confirmou que nossas leis e tradição oferecem
proteção constitucional a decisões pessoais relacionadas a casamento, procriação, contracepção, relações
familiares, criação e educação infantil. Ao explicar o respeito que a Constituição requer para a autonomia da
pessoa ao fazer estas escolhas, declaramos o que segue:

"Estas questões que envolvem as escolhas pessoais mais íntimas e pessoas que uma pessoa pode fazer
durante a vida, escolhas centrais para a dignidade e autonomia pessoal, são centrais para a liberdade
protegida pela Décima Quarta Emenda. No centro da liberdade encontra-se o direito de definir os conceitos
pessoais de existência, de significado, do universo, e do mistério da vida humana. Crenças sobre estas
questões não poderiam definir os atributos de personalidade se fossem formados sob compulsão do
Estado."

Pessoas em um relacionamento homossexual podem buscar autonomia para tais questões, assim como
pessoas heterossexuais o fazem. A decisão em Bowers lhes negaria este direito.

O segundo caso pós-Bowers de relevância é Romer v. Evans, 517 U.S. 620 (1996). Nele a Corte derrubou a
legislação com base em classes direcionada a homossexuais como uma violação da Cláusula de Proteção Igualitária.
Romer invalidou uma emenda à constituição do Colorado que nomeava como pessoas de classe solitárias quem
fosse homossexual, lésbica ou bissexual, fosse por "orientação, conduta, práticas ou relacionamentos," e privaram-
lhes de proteção sob leis anti-discriminatórias estaduais. Concluímos que a disposição tinha "nascido da
animosidade contra a classe de pessoas afetadas" e depois que não tinha nenhuma relação racional com um
propósito governamental legítimo.

Como um argumento alternativo neste caso, o conselho dos requerentes e alguns amici argumentaram que
Romer forneceu a base para declarar o estatuto do Texas inválido sob a Cláusula de Proteção Igualitária. Este é um
argumento sustentável, mas concluímos que o caso atual requer que tratar se Bowers continua tendo validade.
Caso tivéssemos que sustentar o estatuto inválido sob a Cláusula de Proteção Igualitária, alguns poderiam
questionar se uma proibição seria válida se redigida de outra forma, ou seja, para proibir a conduta tanto entre
participantes do mesmo sexo quanto de sexos diferentes.

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Equidade de tratamento e o direito ao devido processo para solicitar respeito por conduta protegida pela
garantia substancial de liberdade estão ligados a respeitos importantes, e uma decisão pelo último ponto avança
para ambos interesses. Se a conduta protegida tornar-se criminosa e a lei que o faz permanece não-examinada por
sua validade substancial, seu estigma pode permanecer mesmo se não fosse obrigatório por questões de proteção
igualitária. Quando a conduta sexual é tornada criminosa pelas leis do Estado, esta declaração em e sobre si é um
convite a submeter pessoas homossexuais à discriminação tanto em esferas públicas quanto privadas. A decisão
central de Bowers foi trazida em questão por este caso e deve ser discutida. Sua continuidade como precedente é
degradante para a vida das pessoas homossexuais.

O estigma que este estatuto criminal impõe, além disso, não é trivial. O crime, para comprovar, não é nada
mais do que um delito classe C, um pequeno delito no sistema legal do Texas. Ainda assim, permanece sendo um
crime com tudo o que lhe cabe para a dignidade das pessoas acusadas. Os requerentes irão carregar em seus
registros históricos de suas condenações penais. . . . Além disso, a condenação penal carrega consigo as demais
consequências colaterais sempre seguidas de uma condenação, como observações em formulários de candidatura
a empregos, para mencionar um exemplo.

Os fundamentos de Bowers sustentaram uma grave erosão de nossas decisões recentes em Casey e Romer.
Quando nosso precedente tenha sido então enfraquecido, a crítica de outras fontes é de maior importância. Nos
Estados Unidos, a crítica a Bowers tem sido substancial e contínua, desaprovando seu raciocínio em todos os
aspectos, não apenas no que se refere às suas suposições históricas. As cortes de cinco diferentes Estados negaram
segui-lo ao interpretar disposições em suas próprias constituições de estado paralelamente a Cláusula do Devido
Processo da Décima Quarta Emenda.

Na medida em que Bowers se apoiava em valores que compartimos com uma civilização mais ampla, deveria
ter sido notado que o raciocínio e a decisão de Bowers eram rejeitados em outros lugares. A Corte Europeia de
Direitos Humanos seguiu não a Bowers, mas a sua própria decisão em Dudgeon v. United Kingdom. Outras nações,
igualmente, tomaram medidas consistentes com uma afirmação do direito protegido de adultos homossexuais de
possuir uma conduta consensual íntima. O direito que os requerentes buscam neste caso foi aceito como uma
parte integral da liberdade humana em vários outros países. Não houve mostra alguma de que neste país o
interesse governamental de circunscrever a escolha pessoal é, de alguma forma, mais legítimo ou urgente.

A doutrina de decisões vinculantes em relação ao acordado com os julgamentos da Corte e à estabilidade da


lei não é, portanto, um comando inexorável. Em Casey nós observamos que quando a Corte é solicitada a rejeitar
um precedente reconhecendo um interesse de liberdade constitucional, confiança individual ou sociável na
existência daquela liberdade aconselha com especial força contra o curso reverso ("A liberdade não encontra
refúgio em uma jurisprudência de dúvida"). A decisão em Bowers, contudo, não induziu a confiança detrimental
comparável a algumas instâncias onde direitos individuais reconhecidos estavam envolvidos. De fato, não tem
havido nenhuma confiança individual ou sociável em Bowers do tipo que poderia recomendar contra a anulação
de sua decisão uma vez que havia razões convincentes para fazê-lo. Bowers em si causa insegurança, já que os
precedentes antes e após sua emissão contradizem sua decisão central.

O raciocínio de Bowers não resiste a uma análise cuidadosa. Sobre esta opinião dissidente de Bowers,
O MINISTRO SUPREMO STEVENS veio com as seguintes conclusões:

"Nossos casos prioritários tornam duas preposições abundantemente claras. Primeiramente, o fato de
que a maioria do governo do Estado tem tradicionalmente visto uma prática específica como imoral não é
uma razão suficiente para defender uma lei proibindo a prática; nem a história nem a tradição podem
salvar uma lei proibindo a miscigenação do ataque constitucional. Em segundo lugar, as decisões
individuais de pessoas casadas, referentes a intimidades de seus relacionamentos físicos, mesmo quando
não intencionados a produzir descendentes, são uma forma de "liberdade" protegida pela Cláusula do
Devido Processo da

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da Décima Quarta Emenda. Além do mais, esta proteção se estende às escolhas íntimas de pessoas tanto
não-casadas como casadas." 478 U.S., at 216 (notas de rodapé e citações omitidas).

A análise do MINISTRO STEVENS, do nosso ponto de vista, deveria prevalecer sobre Bowers e deveria
prevalecer aqui.

Bowers não foi correto quando foi decidido, e não é correto hoje. E não deve seguir vinculando precedentes.
Bowers v. Hardwick deveria ser e agora torna-se anulado.

O presente caso não envolve menores. Não envolve pessoas que possam ter sido lesadas ou coagidas ou que
estão situadas em relacionamentos onde o consentimento não pode ser facilmente recusado. Não envolve conduta
pública ou prostituição. Não envolve se o governo deve dar reconhecimento formal a qualquer relacionamento
que pessoas homossexuais buscam entrar. O caso envolve dois adultos que, com consentimento total e mútuo de
ambas as partes, realizam práticas sexuais comuns a um estilo de vida homossexual. Os requerentes têm direito a
respeito por suas vidas privadas. O Estado não pode degradar sua existência ou controlar seu destino ao tornar
um crime sua conduta sexual privada. Seu direito à liberdade sob a Cláusula do Devido Processo lhes dá o direito
pleno de realizar sua conduta sem a intervenção do governo. "É uma premissa da Constituição que existe um
campo da liberdade pessoal que o governo não pode entrar." O estatuto do Texas não promove interesse de
estado legítimo que possa justificar sua intrusão na vida pessoal e privada do indivíduo.

Se os que elaboraram e ratificaram as Cláusulas do Devido Processo da Quinta Emenda ou da Décima Quarta
Emenda soubessem os componentes da liberdade em suas múltiplas possibilidades, eles teriam sido mais
específicos. Eles não suportam ter este entendimento. Eles sabiam que os tempos podem nos cegar para certas
verdades e gerações posteriores conseguem ver que as leis que uma vez foram acreditadas necessárias e devidas,
de fato servem apenas para oprimir. Enquanto a Constituição resistir, pessoas de cada geração podem invocar
seus princípios em sua própria busca pela liberdade maior.

O julgamento do Tribunal de Recurso para o Décimo Quarto Distrito do Texas é invertido, e o caso é detido
para procedimentos futuros não inconsistente com esta opinião.

Fica assim decidido.

* * *

DISSIDÊNCIA: MINISTRO SUPREMO SCALIA, com quem o JUIZ PRESIDENTE e o MINISTRO SUPREMO
THOMAS juntos discordaram.

"A liberdade não encontra refúgio em uma jurisprudência de dúvida." Planejamento Familiar do Sudeste Pa. v.
Casey, 505 U.S. 833, 844, 120 (1992). Aquela foi a resposta de sentença da Corte, há quase mais de uma década
atrás, para aqueles que buscavam anular Roe v. Wade, 410 U.S. 113 (1973). A resposta da Corte hoje, àqueles que se
engajaram em uma jornada de 17 anos para anular Bowers v. Hardwick, 478 U.S. 186 (1986) é bem diferente. A
necessidade de estabilidade e certeza não apresenta barreiras.

A maioria do resto da opinião de hoje não possui relevância para sua decisão atual -- que o estatuto do Texas
"não promove interesse de estado legítimo que possa justificar" sua aplicação a requerentes sob revisão de base
racional. Antes, aos 18 (cancelar Bowers na medida em que sustentava o estatuto anti-sodomia da Georgia sob
teste de base racional). Apesar de haver uma discussão sobre "disposições fundamentais", antes, aos 4 e "decisões
fundamentais," ibid. em nenhum lugar a opinião da corte declara que a sodomia homossexual é um "direito
fundamental" sob a Cláusula do Devido Processo; nem sujeita a lei do Texas ao critério de revisão que seria
apropriado (escrutínio rigoroso) se a sodomia homossexual fosse um "direito fundamental." Assim, ao anular o
resultado de Bowers, a Corte deixa estranhamente intocada sua conclusão jurídica principal: "O requerido nos
teria anunciado . . um direito fundamental

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para praticar sodomia homossexual. Não estamos dispostos a fazer isto." Ao invés disso, a Corte simplesmente
descreve a conduta do requerente como "um exercício de sua liberdade" -- o que sem dúvida é -- e continua a
aplicar uma forma desconhecida de revisão de base racional que terá implicações de longo alcance além deste
caso.

I
Começo com a surpreendente presteza da Corte para reconsiderar a decisão dada há meros 17 anos atrás em
Bowers v. Hardwick. Eu pessoalmente não acredito na aderência rígida ao stare decisis em casos constitucionais;
mas eu acredito que deveríamos ser consistentes ao invés de manipuladores ao invocar a doutrina. As opiniões de
hoje em apoio à revogação não se preocupa em distinguir -- de fato, nem se incomoda em mencionar -- o louvor
ao stare decisis de co-autoria de três Membros da maioria atual do Planejamento Familiar v. Casey. Nele, quando
stare decisis significava a preservação de direitos de aborto inventados judicialmente, a crítica difundida de Roe
era forte razão para reafirmá-lo:

“Onde, na realização de suas obrigações judiciais, a Corte decide um caso de tal forma para resolver o
tipo de controvérsia intensamente divisora refletida em Roe[,] . . . sua decisão possui uma dimensão que a
resolução do caso normal não suporta. . . . Anular sob pressão na ausência de razão mais convincente . . .
iria subverter a legitimidade da Corte além de qualquer questão grave."

Hoje, contudo, a oposição difundida a Bowers, uma decisão resolvendo uma questão tão "intensamente
divisora" como a questão em Roe, é oferecida como uma razão em favor de seu cancelamento. Qualquer
"inquérito" também foi deixado (da maneira conduzida em Casey) sobre se a decisão levada a ser anulada foi
"provada
'impraticável.'"

A abordagem de hoje ao stare decisis nos leva a anular um precedente erroneamente decidido (incluindo uma
decisão "intensivamente divisora) se: (1) seus fundamentos têm sido "derrubados" por decisões subsequentes; (2)
tem sido sujeito a crítica "substancial e contínua" ; e (3) não tenha induzido "confiança individual ou societal" que
não aconselha a anulação. O problema é que o próprio Roe -- cuja maioria hoje seguramente não possui
disposição para indeferir -- satisfaz estas condição ao menos no mesmo nível que Bowers.

***

(1) . . .

Eu não discuto que a reivindicação da Corte de que Romer v. Evans, 517 U.S. 620 (1996), "derrubou" os
"fundamentos" da decisão da base racional de Bowers. Mas Roe e Casey foram igualmente "derrubados" por
Washington v. Glucksberg, 521 U.S. 702, 721 (1997), que sustenta que apenas direitos fundamentais que são
"'profundamente enraizados na história e tradição da Nação'" se qualificam para qualquer outra coisa que não
seja escrutínio de base racional sob a doutrina do "processo devido substantivo." Roe e Casey, obviamente,
sujeitaram a restrição de aborto a elevado escrutínio sem nem mesmo tentar estabelecer que a liberdade de
abortar estava enraizada na tradição desta Nação.

(2) Bowers, diz a Corte, tem sido sujeita a " [crítica] substancial e continuada, desaprovando seu raciocínio
em todos os aspectos, não apenas em relação a seus pressupostos históricos.". . . Obviamente, Roe também (e por
extensão Casey) foi (e continua sendo) sujeito a críticas inexoráveis, incluindo críticas de dois comentaristas
citados hoje pela Corte.

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(3) Isto abre, para distinguir a disposição sólida e inalterável de Roe da prontamente anulável Bowers, apenas
o terceiro fator. "Não houve," disse a Corte, "nenhuma confiança individual ou societal em Bowers de forma que
fosse contra a anulação de sua decisão. . . ." Parece-me que a "confiança societal" nos princípios confirmados em
Bowers em descartados hoje foi poderosa. Incontáveis decisões judiciais e decretos legislativos contaram com a
antiga proposição de que a crença de uma maioria governante de que certo comportamento sexual é "imoral e
inaceitável" constitui uma base racional para regulamentação. . . . Leis estaduais contra bigamia, casamentos
homossexuais, incesto adulto, prostituição, masturbação, adultério, fornicação, bestialidade e obscenidade são
igualmente sustentáveis apenas à luz da validação das leis de Bowers baseadas nas escolhas morais. Cada uma
destas leis é colocada em questionamento pela decisão de hoje; a Corte não realiza esforços para restringir o
escopo de sua decisão e excluí-los de sua posição.

***

A opinião de hoje é produto de uma Corte, que é produto de uma cultura da profissão jurídica, que tem sido
amplamente ligada à chamada pauta homossexual, pelo que quero dizer que a questão principal promovida por
alguns ativistas homossexuais focaram na eliminação do opróbrio moral que tem sido tradicionalmente
vinculado à conduta homossexual. . . .

Uma das declarações mais reveladoras na opinião de hoje é a desagradável advertência da Corte de que a
criminalização da conduta homossexual é "um convite a sujeitar pessoas homossexuais à descriminalização tanto
na esfera pública quanto privada." Com isso fica claro que a Corte tem tomado parte na guerra cultural, partindo
de seu papel de assegurar, como observador neutro, que as regras democráticas de compromisso são observadas.
Muitos americanos não querem pessoas que abertamente realizam condutas homossexuais como parceiros de
negócios, como chefe de escoteiros para seus filhos, como professores nas escolas de seus filhos, ou como
pensionistas em sua casa. Eles vêem isso como uma proteção para si e suas famílias de um etilo de vida que eles
acreditam ser imoral e destrutivo. A Corte vê como "discriminação", que é a função de nossos julgamentos para
deter. A Corte está tão imbuída com a cultura anti-homossexual da profissão jurídica, que está aparentemente
inconsciente que as atitudes daquela cultura não são obviamente "dominantes"; que na maioria dos Estados, o
que a Corte chama de "discriminação" contra aqueles que realizam atos homossexuais é perfeitamente legal; que
propostas para banir tal "discriminação" sob o Título VII foram repetidamente rejeitadas pelo Congresso; que em
alguns casos, tal "discriminação" é ordenada por estatuto federal, veja 10 U.S.C. § 654(b)(1) (ordenar dispensa de
forças armadas de qualquer membro em serviço que realize ou tenha a intenção de realizar atos homossexuais); e
que em alguns casos tal "discriminação" é um direito constitucional veja Escoteiros da América v. Dale, 530 U.S. 640
(2000).

Deixe-me ser claro que não tenho nada contra homossexuais, ou qualquer outro grupo, promovendo sua
agenda através de meios democráticos normais. As percepções sociais de sexo ou outra mudança de moralidade
se alteram com o tempo, e cada grupo tem o direito de persuadir seus conterrâneos de que sua visão sobre tais
questões é a melhor. Que os homossexuais tiveram relativo sucesso nessa empreitada é atestado pelo fato de que
o Texas é um dos poucos Estados restantes que criminalizam atos homossexuais privados e consensuais. Mas
persuadir seus conterrâneos é uma coisa, e impor seu ponto de vista na ausência da vontade da maioria
democrática é outra coisa. Eu não iria solicitar mais a um Estado para criminalizar atos homossexuais -- ou, para
esta questão, manifestar qualquer desaprovação moral deles -- do que eu iria proibi-lo de fazê-lo. O que o Texas
escolheu fazer está bem dentro do alcance da ação democrática tradicional, e sua mão não deveria estar apoiada
na invenção de um "direito constitucional" totalmente novo por uma Corte que é impaciente pela mudança
democrática . . .

Um dos benefícios de deixar a regulamentação desta questão para as pessoas ao invés de para os tribunais é
que as pessoas, ao contrário de juízes, não precisam levar as coisas a sua conclusão lógica. As pessoas podem
sentir que sua desaprovação da conduta homossexual é suficientemente forte para não permitir o casamento
homossexual,

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mas não suficientemente forte para criminalizar atos homossexuais privados -- e pode legislar em acordância.
Hoje a Corte finge possuir uma liberdade similar de ação, para que não precisemos temer a imposição judicial do
casamento homossexual, como ocorreu recentemente no Canadá (em uma decisão que o Governo canadense
decidiu não apelar). Veja Halpern v. Toronto, 2003 WL 34950 (Ontario Ct. App.). No final de sua opinião -- após ter
destruído os fundamentos de nossa jurisprudência de base racional -- a Corte disse que o presente caso "não
envolve se o governo precisa dar reconhecimento formal a nenhuma relação que pessoas homossexuais
pretendem estabelecer." Não acredite nisso. Mais iluminador do que esta renúncia descarada e irracional é a
progressão do pensamento manifestado por uma passagem recente na opinião da Corte, que observa as proteções
constitucionais proporcionadas a "decisões pessoais relativas a casamento, procriação, contracepção,
relacionamentos familiares, criação e educação infantil," e então declara que "pessoas em uma relação
homossexual podem buscar sua autonomia para estas questões, assim como pessoas heterossexuais o fazem." A
opinião de hoje desmonta a estrutura da lei constitucional que permitiu a distinção a ser feita entre uniões
heterossexuais e homossexuais, na medida do que se refere ao reconhecimento formal do casamento. Se a
desaprovação moral da conduta homossexual não é "interesse legítimo do estado" por questões de proscrever
aquela conduta; e se, como a Corte fala suavemente (deixando de lado qualquer pretensão de neutralidade),
"quando a sexualidade encontra expressão declarada em conduta íntima com outra pessoa, a conduta pode ser
apenas um dos elementos de ligação que é mais duradouro". que justificativa seria possível para negar os
benefícios do casamento aos casais homossexuais exercendo "a liberdade protegida pela Constituição"?
Certamente não é o encorajamento da procriação, já que pessoas estéreis e mais idosas podem se casar. Este caso
"não envolve" a questão do casamento homossexual apenas se considerarmos a crença de que princípio e lógica
não têm nada a ver com as decisões desta Corte. Muitos irão esperar que, como a Corte confortavelmente nos
assegura, isto é assim.

***

. . . Eu discordo.

MINISTRO THOMAS, discordante.

Eu partilho da opinião dissidente do MINISTRO SCALIA. Eu escrevo separadamente para observar que a lei
diante da Corte hoje "está. . incomumente tola." Griswold v. Connecticut, 381 U.S. 479, 527 (1965) (Stewart, J.,
discordante). Se eu fosse um membro da Legislatura do Texas, eu teria votado por revogá-la. Punir alguém por
expressas sua preferência sexual por meio de conduta consensual não comercial com outro adulto não parece ser
uma forma merecedora de empregar recursos de execução de lei válidos.

Não obstante, eu reconheço que como um membro desta Corte, eu não estou autorizado a ajudar requerentes
ou outros similarmente situados. Meu dever, ao invés disso, é "decidir casos ' de forma agradável para a
Constituição e as leis dos Estados Unidos.'" E, assim como o Ministro Stewart, eu "não posso encontrar [nem na
Declaração de Direitos nem em nenhuma outra parte da Constituição um direito geral de privacidade," ou como a
Corte chama hoje, a "liberdade da pessoa tanto em suas dimensões espaciais como transcendentais.”

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