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1.

Quais são, segundo Heidegger, os preconceitos referentes ao conceito


de ser?

Os preconceitos dividem-se em três: o primeiro refere-se a máxima


universalidade do conceito de ser; o segundo, a indefinibilidade do conceito de
ser e, por fim, o terceiro refere-se ao ser como conceito evidente por si mesmo.
Em relação ao primeiro, o ser é concebido como unidade referente a todo e
qualquer gênero e espécie de ente, mesmo estando para-além de toda e
qualquer delimitação regional dos entes. Sobre o segundo, trata-se da conclusão
provinda da alegação da máxima universalidade do ser. O ser, neste caso, é
impossibilitado de ser definido por atribuição de um ente, dado que o mesmo
transcende toda e qualquer universalidade genérica dos entes. Acerca do
terceiro, o ser é concebido como sendo aquilo que já sempre se faz previamente
compreendido quando há uma relação com um ente.

2. Como poderíamos relacionar Dasein e ser?

Para Heidegger, a questão do ser – a questão dona de seus olhos – só


ganha a sua devida clareza na medida em que se analisa o único ente portador
da abertura ao ser, isto é, capaz de compreender ser. Este ente, então, é
concebido por Heidegger como sendo o ente humano, ou dito em termos
ontológicos, o Dasein. Este, conforme o filósofo alemão, é o único ente capaz de
questionar seu próprio ser. Diferente dos demais, ele é, por excelência, aquele
que não se limita a simplesmente em ocorrer entre os outros. É, pois, somente
ele aquele capaz de manter uma relação ativa e transitiva com seu próprio ser e
com o ser dos entes intramundanos. É por essa via, então, que Heidegger
encontra a justificativa da íntima relação na qual Dasein e ser permanece.

3. O que entende Heidegger por Cotidianidade?


Guiado pelo seu conceito de método fenomenológico – conceito este que
busca dizer e discutir os fenômenos assim como eles se mostram numa primeira
aproximação e na maioria das vezes –, a cotidianidade é entendida por
Heidegger como sendo, em primeiro lugar, a dimensão respeitante as exigências
de seu método e, em segundo lugar, como a dimensão onde o ser, enquanto
fenômeno, se mostra. Conforme suas explicitações, a cotidianidade é o que
primeiro perfaz o caráter ôntico do ser do ente humano. Devido a isso, uma
tendência de salto por cima da mesma – uma tendência de desconsideração de
seu significado – se tornou recorrente. Desta forma, a cotidianidade surge como
ponto de partida para as análises acerca do modo de ser-no-mundo do Dasein.
Por meio de tais análises, a cotidianidade mostra-se enquanto um intenso
sistema de relações práticas estruturadas sobre uma intensa dimensão
significativa.

4. O que entende Heidegger por impessoal?

Por impessoal Heidegger entende o âmbito no qual se dá a compreensão


mais cotidiana do ente humano. No seio da cotidianidade, em meio a turbulência
dos afazeres, das ocupações que o Dasein permanece a empreender, a
alteridade do mesmo é nivelada, medianizada. Quem é o Dasein cotidiano? Não
se sabe. O que se sabe é que ele é aquele que trabalha com jardim, portanto,
jardineiro; o que se sabe é que ele trabalha com motos, portanto, um mecânico;
o que se sabe é que ele pede esmola, portanto, um mendigo. E quem sou eu
enquanto Dasein? sou aquele que cotidianamente vai à universidade, e por isso,
um estudante qualquer. As relações interpessoais, em sentido ontológico-
existencial (sob a perspectiva da cotidianidade) são concebidas por Heidegger
como relações de publicidade: eu e o outro permanecemos enquanto tais no
anonimato. O anonimato é o ninguém. Através desta compreensão, o Dasein
acaba por se engessar em possibilidades pré-definidas cuja responsabilidade
não é dele e nem de um outro, mas de ninguém. O impessoal, ou ainda a
impessoalidade cotidiana, é, portanto, a zona na qual o ente humano encontra o
conforto para a sua existência, o escape de toda e qualquer situação decisiva na
qual o seu ser possa vir a se encontrar.

5. Descreva os seguintes conceitos heideggerianos: Cura, Angústia e


Morte.

- Por Cura, Heidegger entende o modo de ser do Dasein. A expressão Cura faz
alusão a antiga fábula de Cura, fabula esta que aqui poderia ser considerada
como sendo a gênese da origem humana. Em sentido ôntico, Cura diz respeito
ao cuidado prático no qual o Dasein permanece imerso para consigo mesmo.
Em sentido ontológico, cura diz respeito a três grandes momentos que
constituem a existência humana. Esses três momentos são: a faticidade, a
existencialidade, e a decadência. Em Ser e Tempo, a faticidade é dita como a
consequência imediata do estado de lançado de nosso ser, a nossa chegada ao
mundo, ao nosso passado que continua em vigor. A existencialidade, por sua
vez, é dita como o nosso próprio modo de ser, isto é, o ser de projeto, o ser que
permanece, enquanto presença mundana, a elaborar as possibilidades de seu
futuro próximo. A decadência, por conseguinte, diz respeito ao modo de ser da
inautenticidade, ao ser que permanece, em seu presente, junto ao mundo. A
cura, portanto, é interpretada por Heidegger a partir desses três existenciais,
existenciais estes que, segundo sua temporalidade própria ganham um sentido
próprio. Eís a definição de Cura: “um anteceder-a-si-mesmo-no-já-ser-em (no
mundo)-como-ser-junto-a (os entes que vêm ao encontro dentro do mundo)”.1

- Heidegger entende a Angústia como sendo uma disposição privilegiada. A


angústia é distinguida pelo filósofo frente ao temor. Angústia não diz respeito a
um ente que se anuncia no mundo enquanto danoso, ameaçador; diz, na
verdade, ao próprio ser-no-mundo. Ela serve a Heidegger como o meio no qual
o Dasein pode se singularizar (para vislumbrar a totalidade estrutural da
existência humana – Cura) e experimentar a plena liberdade, isto é, a liberdade

1 HEIDEGGER, 2015, p. 260.


de não mais estar envolto do turbilhão propagado pela existência inautêntica,
pelo modo de ser da decadência. Na experiência da angústia, o ser do ente
humano é levado a uma transição: do familiar, do sentir-se em casa, ao estranho,
ao não sentir-se em casa. A angústia é tratada por Heidegger como o humor no
qual o ser do ente humano livra-se das amarras da alienação, da ditadura
teimosa do impessoal.

- A morte, segundo Heidegger, tem um papel fundamental no desdobramento da


questão da propriedade existencial. A partir de uma relação consciente,
autêntica (apercebendo-a enquanto a antítese de sua existência), do ente
humano com seu ser-para-morte possível, a morte é entendida partir de cinco
momentos: 1. Ela sua própria possibilidade, pois a mesma diz respeito a cada
um, individualmente, em sua singularidade. 2. Ela é uma possibilidade
irremissível, dado que o ser encontrado em jogo só pode ser assumido por ele
mesmo, e não por outro. 3. Ela é possibilidade insuperável, pois se mostra
enquanto fronteira de todo e qualquer existir. Trata-se da mais radical expressão
da finitude. 4. A morte é uma possibilidade certa. 5. A morte é uma possibilidade
indeterminada, dado o fato dela ser uma ameaça constante, sem lugar e hora
para acontecer. A morte, nesse sentido, é entendida como existencial, como um
aspecto intimamente ligado ao modo de ser do homem. Para Heidegger, o
Dasein é, portanto, um ser-para-morte.

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