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Ação Cível 018/2010


Autor(a): União Social Democrata – USD
Réu: Delegado-geral da Polícia Nacional Gevense
Assunto: Concessão de nacionalidade.
Relator: Ministro Júnior (por exclusão)

RELATÓRIO

1. Trata-se de Ação Cível protocolada pela União Social Democrata contra o


Delegado-geral da Polícia Nacional Gevense. A ação veio ao protocolo como ADI e,
após convertida em Ação Cível e distribuída ao Ministro Diego Mariano (MCC), veio a
mim depois de o MCC ter declarado sua suspeição.

2. Em síntese, a alegação da autora é esta: É ilegal o ato do Delegado-geral que


concedeu a nacionalidade a 11 pessoas no período em que a Constituição determinou
fosse ‘fechada’ a imigração, segundo o artigo 27 da Constituição Gevense. Além disso,
alega, tal ato prejudica a lisura do processo eleitoral corrente. Requer a anulação do ato
concessivo de nacionalidade com a conseqüente expulsão dos membros admitidos.

3. Em contestação, o réu sustentou tese segundo a qual em seu ato não há


ilegalidade, vez que agiu de acordo com as instruções da MCE-SCJ, cujo atraso em
iniciar o processo eleitoral motivou alterações extraordinárias no calendário eleitoral.
Defende que os atos concessivos da nacionalidade ora questionados foram bem
fundamentados e que, portanto, são legais.

É o relatório. Decido.

4. Pesa contra os atos concessivos da nacionalidade questionados nesta ação a


assertiva de que os tais atentaram contra o disposto no artigo 27 da Carta da República.
Este artigo estabelece o momento exato no qual a Polícia Nacional Gevense deve
abster-se de aceitar quantos sejam os postulantes da cidadania gevense, em vista à
proteção de Processo Eleitoral próximo contra casuísmos do Poder Executivo através do
órgão supramencionado.

O artigo 27 tem papel fundamental para todo o processo democrático. Sem


dúvida alguma, sua finalidade normativa não é outra senão a proteção do próprio Estado
Democrático de Direito, notadamente no Governo Virtual onde já foi hábito aceitar
cidadãos nas madrugadas em pleno processo eleitoral, desconfigurando todo cenário
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político-eleitoral e desprestigiando os votos dos cidadãos compromissados com a causa
nacional.

Não obstante à importância social e normativo-axiológica do artigo 27 da Carta


Magna, impende analisar a natureza do comando normativo do artigo e avaliar se, no
caso concreto posto em discussão nos autos, sua aplicação é viável, proporcional e
segura.

5. A Constituição reservou ao Poder Judiciário a atribuição de administrar o


processo eleitoral público de qualquer natureza. Assim é o artigo 26 da Carta, in verbis:

Art. 26. Serão organizadas pela SCJ, além dos referendos,


plebiscitos e eleições para a SCJ, nos termos da Lei Geral Eleitoral: (...)

Ao analisarmos o artigo 26, depreendemos que a vontade do Legislador


Constituinte, seguindo a tradição gevense, foi de relegar ao Poder Judiciário,
nomeadamente à Suprema Corte de Justiça, a organização das eleições presidenciais,
parlamentares, judiciárias, referendos e plebiscitos, nos termos, assim textualmente
estabelecido, “da Lei Geral Eleitoral”. Ao fazer isto, a Constituição reservou à Lei Geral
Eleitoral a capacidade de restringir, em certa medida, os parâmetros gerais do Processo
Eleitoral. Noutras palavras, a Constituição, já no início do capítulo referente ao
Processo Eleitoral – note-se que o artigo 26 encabeça o capítulo – restringiu todos os
seus comandos concernentes ao processo eleitoral, deixando ao legislador
infraconstitucional o estabelecimento de demais disposições normativas a respeito do
processo eleitoral. Tenho pra mim se tratar de norma de eficácia contida. Isto
automaticamente nos remete à teoria da aplicabilidade/eficácia das normas
constitucionais, tema do Direito Constitucional que passo a abordar logo abaixo.

6. Ao se reportar ao tema, o jurista e professor da Universidade do Estado do Rio


de Janeiro, Luís Roberto Barroso, em seu clássico Interpretação e Aplicação da
Constituição, faz antes de tudo a análise dos três planos de verificação científica dos
atos jurídicos (e, extensivamente, dos atos legislativos – os emanados pelo Poder
Público, legislativos, administrativos ou judiciais). Diz o autor:

“Classicamente, os atos jurídicos comportam análise


científica em três planos distintos e inconfundíveis: o da
existência, o da validade e o da eficácia. (...)
Faz-se apenas o registro de que a existência do ato jurídico
está ligada à presença de seus elementos constitutivos (...) e
a validade decorre do preenchimento de determinados
requisitos, de atributos ditados pela lei.” (p. 235)

Sob esta ótica, a norma jurídica – objeto especial para o deslinde dessa questão –
será existente se, no plano fático, existir, estiver escrita, for promulgada e publicada. O
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veto presidencial ou a não aprovação de projeto de lei no Parlamento evidentemente faz
da pretensa norma inexistente.

Já a validade da norma jurídica, como fica patente pela afirmação de Barroso, é


a compatibilidade ou harmonia da norma jurídica com a Constituição em seu aspecto
técnico-formal, isto é, a constitucionalidade formal da norma. É o que chamamos
vigência (validade técnico-formal), que opera em três aspectos, segundo Miguel Reale:
(1) legitimidade do órgão donde emanou a norma jurídica, (2) competência material e
(3) legitimidade do procedimento.

Prossegue Luís Roberto Barroso falando sobre o terceiro plano de análise, o da


eficácia das normas jurídicas:

“Eficaz é ato idôneo para atingir a finalidade para a qual foi


gerado. Tratando-se de uma norma, a eficácia jurídica
designa a qualidade de produzir, em maior ou menor grau,
os seus efeitos típicos, “ao regular, desde logo, as situações,
relações e comportamentos nela indicados; neste sentido, a
eficácia diz respeito à aplicabilidade, exigibilidade ou
executoriedade da norma”. Atente-se bem: a eficácia
referente à aptidão, à idoneidade do ato para a produção de
seus efeitos, Não se insere no seu âmbito constatar se tais
efeitos realmente se produzem.” (p. 236)

O terceiro plano é de especial importância para a questão trazida nos autos, pois
se refere à capacidade de a norma operar efeitos jurídicos. Isto é, a norma será eficaz se
no mundo do Direito for dotada do poder de gerar efeitos. A doutrina comumente
diferencia a eficácia em jurídica e social. Barroso, no excerto acima, aludiu à eficácia
jurídica, chamando a eficácia social, posteriormente, de efetividade (isto é, “a realização
do Direito, o desempenho concreto de sua função social”). Este é importante para a
Sociologia Jurídica, enquanto aquele para a Dogmática.

Sobre a eficácia das normas constitucionais, prossegue Barroso:

“A Constituição tem uma existência própria, autônoma,


embora relativa, que advém da sua força normativa, pela
qual ordena e conforma o contexto social e político. Existe,
assim, entre a norma e a realidade, uma tensão permanente.
É nesse espaço que se definem as possibilidades e os limites
do Direito Constitucional”. (p. 237 e 238)

Isto significa que há sempre questões de eficácia jurídica das normas


constitucionais a serem enfrentadas. A regra é que, como ensina Canotilho, “a uma
norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê”. Mas há
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casos em que ou a natureza da norma constitucional acaba por limitar sua eficácia (mas
nunca torná-la nula, conforme a ortodoxia jurídica) ou o próprio dispositivo
constitucional limita-se a si mesmo em certa medida. Nesse ponto, Luís Roberto
Barroso invoca os ensinos de José Afonso da Silva encontrados em sua obra
Aplicabilidade das Normas Constitucionais. Silva estabeleceu uma classificação
tricotômica das normas constitucionais quanto a sua eficácia (ou aplicabilidade) assim
definida:

a) normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade imediata.


b) normas constitucionais de eficácia contida e aplicabilidade imediata.
c) normas constitucionais de eficácia limitada.

As normas de eficácia plena e aplicabilidade imediata são aquelas que


“receberam do constituinte normatividade suficiente a sua incidência imediata e
independem de providência normativa ulterior para sua aplicação”, afirma Barroso. As
normas de eficácia contida (ou restringível, segundo Michel Temer) são aquelas que
“receberam, igualmente, normatividade suficiente para reger os interesses os interesses
de que cogitam, mas prevêem meios normativos (leis reguladoras, conceitos genéricos
etc.) que lhes podem reduzir a eficácia e aplicabilidade”, continua. Por último, sustenta
o mesmo autor que as normas de eficácia limitada são as que não receberam do
constituinte normatividade suficiente para a sua aplicação, deixando para o Legislador
infraconstitucional a tarefa de completar a sua regulamentação. Geralmente, são normas
de princípio intuitivo ou programático.

Aqui nos interessa saber qual é a natureza do artigo 27 da Constituição, isto é,


qual o caráter da eficácia do artigo que fundamental toda a pretensão inicial. Antes,
contudo, de adentrar no assunto, permito-me uma digressão para tratar da tese de direito
adquirido. Só há direito adquirido quando um ato for praticado em conformidade com o
Direito vigente à época. Ato praticado contra legem jamais pode constituir direito
adquirido a quem quer que seja. Passo, agora, à análise do artigo 27.

7. Em primeiro lugar, é de se ressaltar que o artigo 27 pertence ao capítulo da


Constituição que trata das eleições. Isto é importante porque deixa evidente a natureza
eleitoral do dispositivo. Em se tratando de um comando constitucional atinente às
eleições, deve ser interpretado não à parte dos demais dispositivos, e sim à luz de toda
conjuntura constitucional eleitoral. Se as normas de uma lei, especialmente a
Constituição, devem ser interpretadas sempre sistematicamente, a fortiori devem ser
interpretadas dentro de um mesmo sistema aquelas que mantêm entre si semelhante
identidade de razão jurídica. Por isso que se o artigo 27 já não pode ser interpretado
isoladamente em decorrência do princípio da unidade da Constituição, muito menos
pode ele ser interpretado sem a verificação do valor semântico-jurídico dos demais
dispositivos inscritos no capítulo destinado às eleições. E, a essa altura, torna-se
importantíssimo o artigo 26 da Constituição que, além de ser o “caput do capítulo”,
contém ordenações gerais para o processo eleitoral. É assim o artigo 26 (já citado):
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Art. 26. Serão organizadas pela SCJ, além dos referendos,


plebiscitos e eleições para a SCJ, nos termos da Lei Geral Eleitoral: (...)

Como já afirmei no início da decisio, o artigo 26 compreende absolutamente


todo o processo eleitoral, manifestado sob forma ou de eleições ou de consultas
populares. É tal o alcance do dispositivo que se fez questão de estabelecer
constitucionalmente o calendário da realização das eleições presidencial e parlamentar.
Portanto, tomo o artigo 26 como o logos procedimental do processo eleitoral gevense.
Isso nada mais é que dizer: o artigo 26 estabelece o princípio geral da consecução
formal do processo eleitoral. E em conseqüência da impossibilidade de em apenas um
artigo ou capítulo da Constituição exaurir todos os aspectos formais de todo o processo
eleitoral, o constituinte genuíno deixou à lei a tarefa de estabelecer “os termos”, isto é,
definir alcance, restrições, estabelecer direitos, deveres, prazos, competências etc.
Portanto, é inequívoco que o artigo 26 é norma de eficácia contida, pois o Constituinte
deu à Lei Geral Eleitoral o poder de regulamentar todo o processo eleitoral. E como o
artigo 26, como já afirmei, é o logos, o fundamento formal do processo eleitoral,
alcança todas as demais disposições constitucionais que tutelam procedimentos do
processo eleitoral.
É forçoso reconhecer, pois, a aplicabilidade da exegese do artigo 26 ao artigo 27.
Por quê? Porque, além de o artigo 27 ser norma de natureza eleitoral, ele é também
norma de natureza formal integrante do processo eleitoral. Embora reconheça o
conteúdo axiológico do artigo 27 (é bom lembrar as três dimensões do Direito, nos
ensinos de Reale), que é a proteção do Estado Democrático, sua função é estritamente
procedimental. Ele alcança a finalidade de proteger a lisura das eleições ao estabelecer
certo procedimento que se deve adotar ante a proximidade da abertura de um processo
eleitoral.
Concluo entendendo que o artigo 27 também é norma de eficácia contida por
exegese do sentido intrínseco do artigo 26, pois, sendo encerrando ambos procedimento
e esse o núcleo procedimental do processo eleitoral e norma de eficácia contida, é
cogente aplicar eficácia idêntica ao artigo 27.

8. Toda esta argumentação leva-nos imediatamente à Lei Geral Eleitora, a qual


jamais teria importância se a interpretação dada aos artigos 26, 27 e demais do capítulo
constitucional sobre eleições não fosse a adotada nesta decisão. Assim é o artigo 27:

Art. 27. É vedada a entrada de novos membros na comunidade central do Governo


Virtual 15 dias antes do início do processo eleitoral,
assim como a permanência de turistas, ou estrangeiros durante este período.

Impede-se que, a 15 dias da abertura do processo eleitoral, conceda-se a


nacionalidade a quem quer que seja, além de determinar-se a retirada de estrangeiros
durante o processo eleitoral. Prima facie, é lícito entender o artigo como norma abstrata
e geral, de grande alcance. Não se fala em competência, nem mesmo em acontecimentos
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extraordinários. Não se fala quem deve proceder à retirada dos estrangeiros, por
exemplo.
O Legislador Ordinário, no entanto, percebendo a necessidade de regulamentar o
artigo 27 e devidamente autorizado pelo artigo 26 da Constituição, estabeleceu na Lei
Geral Eleitoral o seguinte:

Art. 9º. Faltando 15 dias para o início do processo eleitoral, a


SCJ publicará a lista dos partidos e seus respectivos membros elegíveis
e determinará a suspensão da entrada de novos membros.

O artigo 9º dessa Lei Geral obedeceu à Constituição, pois manteve o prazo por
ela estabelecido. Se ocorresse de modo diverso estaria viciada por inconstitucionalidade.
A lei não contrariou a Constituição; na realidade, ela obedeceu e prestigiou a Carta da
República, pois regulamentou um dispositivo que, contrario sensu, teria eficácia pouca
eficácia.
Seguiu também o artigo 26 da Constituição na medida em que manteve a
Suprema Corte de Justiça como órgão administrador do processo eleitoral, atribuindo a
ela a competência de determinar a suspensão da entrada de novos cidadãos. Isso
significa que a Lei Geral Eleitoral condicionou a suspensão da concessão da
nacionalidade gevense a ato individual, concreto, particular da Suprema Corte de
Justiça. É, a rigor, um ato administrativo stricto sensu.
Ora, não obstante à razão que teve o legislador na edição do artigo 9º da Lei
Geral Eleitora, não há outro caminho senão o de reconhecer que a proibição da entrada
de novos cidadãos no GV durante o prazo fixado está condicionada à ato da Suprema
Corte de Justiça através, na atual organização judiciária, do Ministro para Causas
Eleitorais. Isto, de um lado, não ofende a Constituição, visto que ela mesma permitiu
especificamente à Lei Geral Eleitoral estabelecer e restringir a eficácia de qualquer
dispositivo procedimental sobre o processo eleitoral, e, de outro lado, garante à
Suprema Corte certo grau de discricionariedade para, diante das peculiaridades do caso
concreto, flexibilizar o memento do fechamento da imigração.
Essa discricionariedade constitutiva da Administração Pública (e entendo que a
Suprema Corte de Justiça age no processo eleitoral tipicamente como órgão da
Administração Pública) não pode ser usada, obviamente, com má-fé. Havendo dolo, isto
é, intenção de prejudicar a lisura do processo eleitoral, deve-se seguir com a apuração
da prática do crime perpetrado pela autoridade judiciária e, ao mesmo tempo, com a
revogação de todos os atos conseqüentes.
O caso concreto é diverso. Não se cogitou que Lucas Guerra teria atrasado o
processo eleitoral por má-fé, com intenção de causar prejuízo ao processo eleitoral.
Ademais, isso só seria possível se houvesse entre ele e o responsável pela Polícia
Nacional Gevense conluio para a prática da fraude. Afasto, portanto, qualquer teoria de
má-fé por parte do gestor judiciário, entendendo o caráter extraordinário do ocorrido.
O Delegado-geral da Polícia Nacional Gevense agiu corretamente porque a
proibição imposta pelo artigo 27 está condicionada ao ato do Ministro para Causas
Eleitorais. Isto é, só há proibição se houver determinação da SCJ; a eficácia do
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dispositivo está vinculada, em razão do impacto que o fechamento da imigração causa e
de eventuais peculiaridades, à determinação da Suprema Corte. Entendimento contrário
seria suficiente para a anulação de todo o processo eleitoral, o que desqualificaria os
princípios constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade, além é claro do
próprio princípio democrático.

9. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a ação, declarando válidos os


atos concessivos de nacionalidade em favor de B rú Sestari; Isra Faccin; Talita Luz;
Romulo; João Kull; Anantelli; Línive; Alle; mahblahblah; Gigio; Mario Gremista de
Bagé.

Prazo para interposição de recurso: 3 dias.

Registre-se. Publique-se. Cumpra-se.

Ministro Júnior Farias


Vice-presidente da SCJ
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