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Giulio Carlo’ A\ (4 C74 walter | ropi US JOSE OLYMPLO EDITORA Giulio Carle Argan (1909-1992) tem no seu curriculo uma Intenso atividade de cri- tico, de historiador e de escritor J6 como professor de histéria da arte moderna, na Universidade de Roma, colaborou para a Storie d'Italia (com M. Fagiolo) e para o volume Michelangelo architetto (coordena- 60 de P Portoghesi e B. Zevi, 1964). Sua rica bibliografia compreende uma afortu- nada Histéria da arte italiana e ensaios so- bre a arquitetura italiana dos séculos XIll e XIV, assim como sobre Henry Moore, Borro- mini, Picasso, Fra Angelico, Brunelleschi, Arturo Martini, Brever. Dos livros publicados no Brasil, desta- camos Arte moderna, Histéria da arte como historia do cidade, Imagem e persuaséo e Projeto e destino Ublicado em 1951, o livro de Argan sobre Gropius afirmou-se como um verdadeiro “cléssico” da cultu- fa critica do pés-guerra, Meditacéo apai- xonada sobre as caracteristicas e os idéias da vanguarda européia mais atenta a civi- lizagéo industrial, esta obra também re- Presenta uma proposta ideoldgica e criti- ca de largo empenho, que despertou mui- tas adesdes. A Bauhaus e, dentro dela, o trabalho de Walter Gropius refletem o crise da sociedade e da cultura modernas e pro- Pdem um instrumento de reforma ariistica. Associando criatividade e mundo da produ- G0, e propondo uma realidade internacio- nal, para além das tradicées locais, Gropius oferece, do ato de projetar, a imagem de uma operosa possibilidade, que liga o pro- gresso a colaboracéo entre os povos e a um correto uso de técnicas e de modernas co- pacidades produtivas. Seu arrojo de homem europeu tampouco lhe falta quando sua es- cola é fechada pelas autoridades nazistas. Tendo se transferido para os Estados Unidos com seus colaboradores, ele enfrentard o dramético tema da reconstrugéo com uma série de solugées que, eliminadas as contro digdes sociais, possam criar as condigoes para uma existéncia harménica e produtivo. © livro de Argan tem o mérito nada secun- dério de nao somente haver inserido © pro- jeto de Gropivs no quadro dos fates arquite- ténicos do século, mas também de ter feito dele uma das pegas decisivas do cultura contempordanea, walterQropius ea bauhaus Titulo do original em italiano WALTER GROPIUS E LA BAUHAUS © Giulio Einaudi Editore, s.p.4., Turim, 1951 Reservam-se 0s direitos desta edigao a EDITORA JOSE OLYMPIO LTDA. Rua Argentina, 171 - 1° andar — Sao Crist6vao 0921-380 — Rio de Janeiro, RJ - Republica Federativa do Brasil Tel.: (21) 2585-2060 Fax: (21) 2585-2086 Printed in Brazil / Impresso no Brasil Atendemos pelo Reembolso Postal ISBN 85-03-00810°6 Capa: Victor BuRTON CIP-Brasil. Catalogagao-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ. A Argan, Giulio Carlo, 1909-1992 734w ae Walter Gropius ea Bauhaus / Giulio Carlo Argan; tradugao le Joana Angélica d’ Avila Melo; posfacio de Bruno Contardi. — Rio de Janeiro: José Olympio, 2005. Inclui bibliografia ISBN 85-03-00810-6 |. Gropius, Walter, 1883-1962. 2. Bauhaus (Escola). 3. Arquitetura m -Sé i ou eee Século XX. 4. Arquitetura alema — Século CDD - 724.91 05-1019 CDU - 72.036 SUMARIO Introdugéo 7 A pedagogia formal da Bauhaus 29 A arquitetura de Gropius (1911-1934) 87 A arquitetura de Gropius na Inglaterra e na América 137 Apéndice [1957] 177 Nota biografica 179 Principais obras 181 Principais escritos de Gropius 187 Publicagées da Bauhaus 191 Conferéncias, comunicagées etc. nao publicadas em livros ou em revistas 195 Bibliografia geral 197 Posfacio 1988, de Bruno Contardi 213 Indice onomistico 241 NTRODUCAO Walter Gropius foi um homem do primeiro pés-guerra. Sua obra de arquiteto, de teérico, de organizador e diretor da admiré- vel escola de arte que foi a Bauhaus é insepardvel da condig&o histé- rica da reptiblica de Weimar e da fragil democracia alema. Gropius investiu toda a sua cultura figurativa e teérica, bem como seu destino de artista, naquele momento critico da histéria européia. Sua racionalidade, sua positividade e até mesmo seu otimismo ao desenhar programas de reconstrugo social brilham sobre o fundo sombrio da derrota alemé e da angustia do pés-guer- ra; sua fé num futuro melhor para o mundo esconde um profundo ceticismo, um lticido desespero. Nao se tratava apenas de uma defesa psicoldgica e moral: aquele supremo prestigio da raz4o era também a tiltima heranca da grande cultura alema, a Gnica forga de resgate que a Alemanha podia extrair do proprio passado. A obra de Gropius se enquadra na crise dos grandes ideais que caracte- 1 século XX; nasce, também ela, da desagre- ndes sistemas e da confianga depositada capaz de apontar & resolver os proble- a. A racionalidade que Gropius desen- volve nos processos formais da arte &consentanea com a dialética da filosofia fenomenoldgica ¢ existencial (sobretudo a de Husserl), a qual de fato esté ligada historicamente: em substaincia, trataese riza a cultura alema d gagao sofrida pelos gra’ numa critica construtiva, mas imediatos da existénci WALTER GROPIUS EA BAUHAUS de deduzir, da pura estrucura légica do pensamento, determina- ges formais de validade imediata, independentes de toda Weltanschauung- ‘ formal: torna-se arquitetura, Como condigao direta da existéncia Em sua obra, 0 rigor lgico adquire uma evidéncia humana. Na histéria de Gropius € impossfvel separar 0 momento teé- rico do momento criativo ou do momento pedagégico: cada um de seus edificios, de seus programas urbanjisticos, cada uma de suas interveng6es praticas e polémicas, por uma radical renovagao dos métodos produtivos da arquitetura € da arte aplicada ou por uma reforma do ensino formal, é ao mesmo tempo formulagao teérica, aplicagao pratica e ato criativo. Ele é de um temperamento posi- tivo — extrovertido, dir-se-ia hoje —, que deseja agir a qualquer custo sobre o terreno concreto do contingente. Sabe que, na crise dos grandes valores da historia, a estrita légica formal encontra forca de ultima ratio; e se j4 nao € possivel a existéncia de nenhuma civilizagao baseada em princfpios estaveis, mas somente na clare- za e na firmeza dos atos, seu propésito é o de atuar no cerne de uma situagdo com a tempestividade e a exatidao de uma inter- vengao cirtirgica. A racionalidade nao é mais um guia ou uma luz vinda do alto, mas uma técnica infalivel; a condigdo que a deter- mina e justifica é a constatagao da crise, que é sobretudo a crise do sentimento: dai a continua transigao do puro racionalismo ao puro pragmatismo, a substancial identidade entre processo artis- tico e processo critico, entre atividade criativa e atividade didati- ca. Deve-se provavelmente a essa continua transigao 0 fato de a obra de Gropius, interrompida na Alemanha pelo advento do nazismo, ter podido desenvolver-se coerentemente na América € encontrar pontos de contato com o pensamento de um Dewey ou de um Forbes, ampliando assim, ilimitadamente, o horizonte his- t6rico da arte contempor4nea. Em Gropius, levado por sua formagao de arquiteto a conside- rar problemas sociais concretos, a dualidade entre pragmatismo e INTRODUGAO 4 racionalismo reproduz, em outro plano, a contradi¢o entre nacio- nalismo e internacionalismo que, naquele imediato pés-guerra, angustiava toda a cultura européia. Em torno desse ponto gravita toda a sua obra: a arquitetura “internacional” nao ser4 apenas umn nivelamento das técnicas e das formas, mas também, ao mesmo tempo, 0 instrumento e a imagem de uma nova organizagio so- cial. Desta, nao é possivel Prever sequer a estrutura geral; a pr6- pria arte, agindo e desenvolvendo-se no Amago da sociedade e par- ticipando de seu devir, concorrerd para determiné-la. Na Franga como na Alemanha, embora com énfases diferen- tes, sempre que se falava de internacionalismo pensava-se, na rea- lidade, numa nagao supra-histérica ou coletiva, a “nagao européia”, a ser contraposta 4 ameaga da internacional classista. De igual modo, sempre que se falava de racionalismo, a propésito das ine- vitaveis questes sociais da arquitetura, na realidade pensava-se num pragmatismo generalizado e normativo (ou, falando de utilitarismo, numa racionalidade em ato), a ser contraposto a dra- matica concretude dos problemas sociais. O dualismo nfo expri- mia o contraste histérico de ideologias e de classes, que se vinha exasperando a cada dia, mas o mal-estar e as contradigGes inter- nas da classe dirigente: era seu Alibi tedrico diante da pressdo de outras forcas que, da extrema esquerda e da extrema direita, visa- vam ao poder alegando respectivamente um programa interna- cionalista e um programa nacionalista extremado. Nao hé diivida de que Gropius atuou no Ambito de uma cul- tura burguesa e de que seu imperativo racional o impediu I um efetivo {mpeto revoluciondrio. Seu lugar esté naquela fileira de intelectuais que se empenharam em resolver racionalmente os conflitos de classe. Com eles, Gropius assistiu ao desabamento que levou de roldao, além da fragil base da cooperagao intelectual entre i" is essa cultura estivera inue 08 povos, os “eternos valores” aos quals essa tilmente ancorada. eee Alguma coisa, contudo, excetua @ figura de Gropius 0 WALTER GROPIUS B A BAUHAUS antes de tudo, sua incapacidade de ily- e”. do coro dos “europeistas + amentar a nova comunidade no prestf- sfo e sua fria recusa a fund: ade n gio dos “grandes ideais”. Na verdade, esses grandes ideais consti- tufam o sistema que sua dialética desintegrava e dissolvia na fenomenologia da exi pressupusesse, do mesmo fias e ziam a sua propria dialética a experiencia do idealismo que criti- sténcia, ainda que essa mesma dialética os modo como as filosofias existenciais tra- cavam como sistema. Gropius constata que aqueles grandes ideais e aqueles supre- mos valores deixaram de existir com uma determinada estrutura da sociedade; admite que a crise da sociedade é também a crise da arte; quer estabelecer qual pode ser a fungao da arte, como inalienavel “experiéncia” artistica, no iminente processo de trans- formagao da sociedade. Seu limite foi o de ter acreditado que essa transformagdo pudesse reduzir-se a uma evolugao histérica da clas- se dirigente, a fim de adequar-se a novas tarefas sociais. A revolugao de Gropius foi uma revolugo fria, nao abriu a arte novos horizontes de conhecimento, mas assinalou 0 ponto nec ultra de qualquer tradigdo figurativa. Ela esgotou a tradigao artis- tica do mundo ocidental em suas proprias antiteses e resguardou a sociedade futura de qualquer possivel “renascimento”. Além des- se limite, toda eventual retomada artistica deveré necessariamen- te basear-se numa nova concepgao do valor da existéncia e da organizagéo humana. Com Cézanne, as tradigées figurativas nacionais estavam de- finitivamente esgotadas: se toda “sensagao” (e esse emergir da eensagao j4 trai a crise do sentimento) se constitui numa designa- go de consciéncia e se inscreve, como dizia poeticamente Rilke, 5s : DRE eld a orla extrema do circulo, j4 nao ha lugar para o naturalismo no qual, com énfases diversas, se encarnam ( que vai de um sentimento da natureza a u 40 do mundo) as tradigGes artisticas na os alemnes que saidam em Cézanne o re numa escala de valores ma construtiva concep- cionais. Sao justamente dentor que arrebenta os INTRODUGAO ‘i gonzos € escancara as portas do limbo naturalistico deles, para fi- nalmente inseri-los na comunidade ideal européia. Partindo de Cézanne, 0 cubismo elabora uma linguagern que quer ser totalmente racional ou “analitica”; ao remeter a terceira dimensao, que é a dimensao da ilusao ou da “naturalidade” ou do sentimento, a certeza objetiva das duas primeiras, a linguagem figurativa cubista € teoricamente imune a variantes nacionais. O primeiro expressionismo alemAo purga o “complexo de culpa” germanico na racionalidade indubitavelmente supranacional do cubismo. E verdade que, ao visar tao-somente a liberar esse com- plexo e abrir um caminho paraa transcendéncia, o expressionismo acaba deixando de lado a saturada figuratividade cubista e redu- zindo-se ao descarnado formulismo construtivista (no qual a formula assume forga liberadora, comosse pronuncid-la bastasse para entrar no dominio da razao pura); mas € também verdade que essa figuratividade cubista, embora parecesse tao certa € substanciosa, era suficientemente corruptivel para poder dissol- ver-se bem cedo naquela textualidade plana e sem espago que se chama surrealismo e que melhor se chamaria subnaturalismo. Cumpre também lembrar que, se a guerra havia truncado o nascente entendimento e reerguido barreiras ideoldgicas entre as tradig6es culturais francesa e alemé, tais barreiras j4 nao separa- vam dois nacionalismos, mas duas concep¢oes diferentes e dois diferentes programas de vida européia. Quando, em 1917, enu- merava 0 inventaire des principaux produits intellectuels et moraux qui ont cours en France depuis vingt ans et dont la provenance SS germanique, Benda atacava justamente @ concepgao Ines nal marxista como directement opposée a la conception ions (Saint-Simon, Fourier, surtout Proudhon), en haine expresse de lague elle s'est fondée. ionali ‘oblema da internacionalismo envolve 0 pr eens a rquitecura, jd assumira o lugar socialidade da arte, o qual, na a é ; da velha questiio classicista do belo ¢ do dtil, No pos-guert™, WALTER GROPIUS BA BAUHAUS n toda a arquitetura européia fundamenta-se no trindémio jonalismo socialidade-internacionalismo; e essas instAncias raci S am naturalmente @ satisfazer-se na construgao formal “cien- vis tifica” do cubismo- Mas aqui surge @ questao: essa racionalidade, essa certeza for- mal é um sistema no qual a vida pratica, com seus problemas infi- nitos, se ordena e se compoe, OU um método que define os proble- ; propria vida, ao desenvolver-se? No primei- mas apresentados pela toda a sua antiga forga de representacao, ro caso, a arte conserva ea sintese das tradigdes plar concepgao do mundo, d segundo, a mesma critica que destréi toda hist6rica Weltanschauung remete a uma mera condigio de “ser” e “fazer”, indiferenciavel segundo os contetidos histdricos da consciéncia. Os dois Iideres da renovacao da arquitetura européia sao Le Corbusier e Gropius; um e outro lutam por uma reforma em sen- tido racionalista, e suas propostas tém varias teses em comum, mas trata-se de dois “racionalismos” de sentidos contrdrios, que con- duzem a solugdes opostas da mesma questao. Le Corbusier assu- nacionais ainda acontece numa exem- le extensdo e validade ilimitadas; no me a racionalidade como um sistema e traga grandes planos, que deveriam eliminar qualquer problema; Gropius assume a racio- nalidade como um método que permite localizar e resolver os pro- blemas que a existéncia vai continuamente apresentando. A antitese manifesta-se j4 nos caracteres exteriores: Le Cor- busier langa proclamacées, publica manifestos, organiza circuitos de propaganda por todo o mundo, grita aos quatro ventos que il existe un esprit nouveau; Gropius fecha-se em sua escola, transfor- ma sua teoria numa didatica precisa e sua logica numa técnica, € talvez se pergunte se ainda existe um esprit. en a eas gorado pela vit6ria; quer a i coe area ae ae a aibtebiie el ae a-la a fazer sua paz depois daque’ 2 © Sua guerra; dé como garantia da futura cooperaga° INTRODUGAO 13 pacifica entre os povos aquela civilisation machiniste que havia sido uma das causas do conflito; sonha fazer de cada trabalhador um pequeno-burgués, compensando com um standard de bem-estar material a rentincia aos direitos e A luta de classes. Ao mundo que anseia por uma nova ética, ele oferece, radiante, uma perfeita eugenética social. Quando percebe que a civilisation machiniste fabricava canhGes em vez de casas, e, de boa-fé, protesta, os ca- nhées ja tinham comegado a destruir as casas. Entao tefugia-se mais uma vez nos princfpios imortais, torna-se 0 éléve de la nature, faz urbanismo como uma espécie de jardinagem social, sonha com civilizagGes arcaicas e mitos solares, mediterraneos: da histéria do futuro, cai de ponta-cabega, como era previsivel, na pré-histéria. Sua racionalidade esté sempre unida a utilidades especificas e, como as utilidades especificas sdo infinitas, a solugdo racional delas € um standard que representa 0 nivel médio das exigéncias. Inserindo-se na pratica, a racionalidade classifica, coordena, mas sobretudo age como elemento de equilfbrio: previne o surgimento ou contém o desenvolvimento de novos problemas. A tarefa do arquiteto coincide, como se vé, com aquela que a classe “culta” acredita ser chamada a cumprir diante de uma massa que ela su- poe inconsciente do préprio e verdadeiro interesse; e essa cultura € ainda uma cultura humanistica, de classe, cujo prestigio se ba- seia numa experiéncia mais vasta, e até universal, da histéria. Le Corbusier é um homem de boa-fé, que acredita seriamente num novo tipo de contrato social: a burguesia renunciard a guer- ra se o proletariado renunciar 4 revolugao. Como seu ideal ue ernacional no vai além da rentincia a violéncia, emboca no compromisso. As prdprias formas pressdes de contetidos profundes, permane= as de entendimento: nao é necessano que todos se proponham e resolvam os mesmos problemas, basta t0- Por isso se aplica o cubismo d arqui- dos falarem a mesma lingua. tetura: nao se busca nem mesmo uma rasho cientifica, eransfere> cooperagao int ele fatalmente des artisticas, nao mais ex cem como meras formul WALTER OROPIUS BA BAUHAUS ” terura um sistema formal que se dé por fundamen. bases genericamente cientificas. O que importa é superar tadoem snacdo histérica, a dramética aderéncia as Situagdes do a ore oromantismo havia imposto a arte. Assim, a tradi- cca exclufda sem critica, retorna sob as aparéncias mais es FEE de tradigao mediterranea. Se uma clara estry. aes ana da confusa ornamentagao academics, aparenta as escandidas proporg6es do Partenon, comemora-se: € 0 fim de toda problematizagao, de todo romantismo artistico. A alvorada de um novo classicismo surge sobre o mundo finalmente seguro de Pos- se para a arqui suir para sempre seus “eternos valores”. Do outro lado do Reno, nao havia muito entusiasmo pela inter- nacional societdria: os problemas, que para os vencedores eram tema de discursos académicos, para os vencidos eram questées de vida ou morte. O grande capital era o verdadeiro respons4vel pela catds- trofe, mas era também a tinica forga com a qual o inveterado nacio- nalismo alemao podia contar para a desforra. Hoje sabemos que a desforra se chamava Hitler, mas, naquela escuridao, para perceber © que realmente estava acontecendo A burguesia alema eram ne- cessdrios olhos de lince e o ingénuo desespero de Grosz. Aquela burguesia que havia sido Operosa e produtiva, compenetrada da Propria tradicao austera, vinha-se transformando numa plutocracia avida, corrupta, Sanguindria, decidida a desfrutar, até o fim, da ruf- na que havia provocado. A cada dia a inflagao aprofundava ainda mais 0 sulco entre a classe que empobrecia e a que enriquecia; a Tuptura da relacao quase familiar que ligava ab antiquo o industrial 20% S€us Operdtios despedacava a vida social. Junto com a fome de PO ak ee a hostilidade a qualquer actor a vs Oculto a violéncia dates eset ee ae eats vante 0 lugar dessa bur, se Spc tao bem aug : ee Suesia que a relaciona, em sua sAtira, a casta tares, N, e : Aaa 8 mesmos anos, a gélida mascara de Stroheim O Junker @ o Cavaleiro da indGstria. INTRODUGAO i ee ae. Thomas Mann, pertence aquele pequeno gru- po - intelectuais que nao escondem de si mesmos a crise da bur- guesia oe € a investigam muito além das escandalosas aparén- cias descritas pela pena espartacista de Grosz; e no entanto nao perdem a esperanga de que ela ainda possa reatar-se as suas anti- gas tradigdes de cultura, retificar 0 curso de uma evolugao aber- rante, restaurar, no mundo convulso, a autoridade da inteligén- cia. Eu nao afirmaria resolutamente que também Gropius, como Mann, vislumbre a causa profunda da crise da velha burguesia alema numa espécie de tuberculose intelectual, numa debilitante dissipagao artistica, numa fatal transformagao dos tradicionais ideais religiosos (aos quais, contudo, se devia 0 antigo apego a concretude da pratica) em vago idealismo; enfim, no abandono inerte, por parte dessa burguesia, aquele ritmo oscilante de deses- pero e exaltagdo que caracteriza a obra dos seus prediletos: a mt- sica de Wagner tanto quanto o pensamento de Nietzsche e a poe- sia de Hofmannsthal. Entretanto, o firme apelo de Gropius por uma arte inteiramente técnica, livre de qualquer ideologismo, li- gada as férreas leis econémicas da produgio, permite largamente supor: uma vez que a sociedade esta doente da arte, é esse 0 6rgao sobre o qual convém atuar para reduzir-lhe o desenvolvimento anormal e retificar-lhe o funcionamento irregular. O certo é que sua corajosa e até comovente defesa da indus- ncia de muitos anos e a en- determinaram — nada a moderna contra 0 tria — para quem a considere & distai quadre nas circunstancias de fato que a tem de uma entusidstica apologia da técnic persistente tradicionalismo do artesanato. No defesa de uma indistria entendida humani “fordismo”, ou avilcamento plano tedrico, € a sticamente Como potencializagao do engenho contra o n ee da personalidade no mecanicismo da produgao; no plano social, a defesa de uma austera tradigio de operosidade productive) de uma consciéncia ou espiritualidade do trabalho industrial a - peculagiio improdutiva e dissociante. Por isso os vastos 6 WALTER GROPIUS B A BAUHAUS vkbunde e os grandiosos programas reformistas de um e um Behrens, ainda aquecidos pelo entusiasmo romantico de Mortis, reduzem-se na didatica de Gropius a um r- gido formulismo, a esquemas te6ricos exatos, a uma inflexivel dis. ciplina racional, que de outro modo estariam deslocados, se afinal nao se tratasse apenas de sustentar, no campo da arte aplicada, a superioridade da produgao industrial em relag4o a artesanal. O fato & que Gropius preocupa-se bem menos com agir sobre a massa e solicité-la a conquistar um nivel mais elevado de cultura do que comisentar a classe dirigente e produtora a um crescente declinio, reconduzi-la aos seus deveres sociais, reorganizar tecnicamente a produgao, criar as condigdes efetivas e objetivas para © progresso da vida social. Ele exige que a autoridade da classe dirigente nao sociais dos We' Van de Velde e d mais derive da posse dos capitais e dos meios de produgao, mas sim da capacidade de produzir do melhor modo (e aqui entra em jogo a funcdo artistica, porque a arte é modo perfeito), isto é, de- rive de um seguro preparo técnico. Por isso exclui de sua polémica qualquer acento filantrépico e até qualquer simpatia humana, seu discurso esté voltado exclusivamente para os responsdveis, para os “quadros”. O tecnicismo de Gropius, a rigor, pode ser interpretado como uma ndo-politica, no sentido em que visa a resolver ou até evitat, na liicida funcionalidade social, todo contraste ideolégico — ou- tro motivo que nos remete & atitude de Mann e daqueles intelec- tuais alemaes que colocam o afastamento diante da competi¢40 politica como condigao de seu “empenho” no plano da cultura. Mas esse precoce antincio de uma “revolugao dos técnicos”, ess firme convocagio a tarefa que cabe aos intelectuais na transfor- magac: da velha sociedade hierArquica numa sociedade funcional, nao podia deixar de assumir um claro significado politico; e de fat calor meeteaehceasia sta. Em ee, 1923, ao receber uma comissao de intelectuais, o prime INTRODUGAO 7 ro-ministro Stresemann advertia: “Vém-se formando na Alema- nha conceitos malsaos que devem desaparecer. JA nao se quis re- conhecer qualquer diferenga entre trabalho manual e trabalho intelectual; muitas vezes, quis-se subverter a situagao precedente (...) No entanto, os homens nfo sao todos iguais; eles sao diferen- tes, como sao diferentes as forgas espirituais da humanidade; do povo originam-se as forgas que tendem para o alto; uma supressao dessas forgas que aspiram a abrir caminhoe que talvez estejam des- tinadas aos postos de comando seria um nivelamento inadmissivel. Somente se conseguirmos render mais do que outros poderemos recuperar aquilo que a guerra nos tirou.” Da premissa anticomunista passava-se, logicamente, a uma conseqiiéncia nacionalista; para recuperar aquilo que a guerra lhe tirou, a Alemanha deverd “render mais do que outros”. Sua afir- magdo no plano internacional dependeré do modo pelo qual as classes dirigentes alemas souberem cumprir sua tarefa. Palavras semelhantes poderiam ter sido ditas na inauguragao dos cursos da Bauhaus, que, em tltima andlise, € um instrumento criado para produzir uma nova classe de técnicos dirigentes cuja obra possa desenvolver-se no plano internacional. Gropius decla- ra que todo trabalho é a manifestago de uma esséncia interior € somente esse trabalho tem um significado espiritual, ao passo que 0 trabalho puramente mecdnico nao tem sentido vital; “enquan- to a economia e a maquina permanecerem como fins em si mes- mas, em vez de meios para liberar cada vez mais, do peso do traba- lho mecAnico, as energias do espirito, © individuo continua escra- vo e a sociedade nao encontra seu equilibrio definitive”. E mais: “A solugdo nao depende de melhoramentos nas condigées exter- nas de vida, mas sim de uma atitude diferente do individuo em relagéo A sua propria obra.” peti he bitte em relagao a propria obra cumpresss® i jth ‘cto que se destina d coletividade, fungiio social do artista; mas, visto ana teat a obra reflete a relagdo entre indivfduo e corpo is WALTER GROPIUS BA BAUHAUS dessa relagio depende a validade efetiva, simultaneamente art. tica ¢ social, da obra de arte. Assim como, no processo da ideagao a execucio, apresenta. se e se resolve o problema da relagao entre trabalho intelectual ou ideativo e trabalho manual ou executivo, da mesma forma, do particular para o geral, o problema de trabalho qualificado e tra. balho manual, no qual se esquematizava 0 contraste histérico entre capital e trabalho, reduz-se a uma questao de técnica e organiza- gao. De resto, assim abstrafdo dos seus reais e dramaticos termos de luta de classes, esse contraste entre trabalho qualificado e tra- balho manual se apresenta como um momento de transicéo no processo, ainda em curso, de uma sociedade de economia artesanal para uma sociedade de economia industrial. Quando a industria tiver exaurido totalmente a fungao do artesanato e a transforma- go for perfeita, todo trabalhador participara da racionalidade produtiva da indiistria e todo trabalho ser4 trabalho qualificado: esse dia assinalaré a vitéria definitiva da racionalidade social so- bre 0 irracionalismo politico. Naturalmente, nao haverd evolugao e transformagao se a indtistria, em vez de assimilar o artesanato, vier a esmaga-lo com 0 peso da propria organizagao mecAnica, por isso a didatica da Bauhaus é regulada pelo ritmo de um desenvol- vimento gradual da ferramenta 4 mAquina. Na verdade, os pro- Cessos operativos do artesanato transmitiam uma experiéncia es- pecifica da realidade, condicionavam de um determinado modo a relagao entre ohomem e o ambiente. Essa telagdo era limitada pela capacidade dos sentidos em perceber a matéria e pela capacidade da mao e da ferramenta em operar sobre essa matéria. Os recursos mec4nicos da indistria, nascidos de Processos cientificos que ampliam o dominio do conhecimento até muito além dos limites dos sentidos, permitem operar numa zona que ultrapassa o Ambi- to do “natural”; mas, a superagao do “natural”, deve corresponder um conhecimento da realidade mais extenso e aprofundado, nao , o irrealismo e 0 arbitrio do super-homem e da supernatureza. En- INTRODUGAO 19 fim, 0 processo do artesanato a indistria deve reduzir-se ao pro- cesso que converte a experiéncia individual em experiéncia co- letiva. Qual é 0 papel da arte figurativa nesse Processo evolutivo da sociedade? Foi dito que o mal profundo da burguesia alema podia ser diagnosticado como uma espécie de hipertrofia artistica; 0 ca- rater misterioso que se atribufa aos fatos da arte, e, nao raro, aos mais mediocres e banais, era depois estendido a todos os atos de uma classe que se julgava predestinada as grandes tarefas hist6ri- cas, ao renascimento da “alma alema”. A andlise precisa de Viereck demonstrou que 0 préprio nazismo foi, no fundo, uma monstruo- sa superestrutura esteticista. Ao “sublime” indubitavelmente mér- bido dos Wagner e dos Boecklin, Gropius contrapée o estrito regi- me da arte “titil”. A obra de arte nao deve pregar, exortar, apelar para oO sentimento, apontar metas ideais: ela tem seu objetivo em si mesma, e nao além de si; é Gtil na medida em que € arte, visto que a arte é uma fung4o da sociedade; mas é arte enquanto cum- pre essa fungao. A obra de arte é uma realidade que a sociedade produz para corresponder a uma necessidade real, e nao para sa- tisfazer aspiragGes ociosas: uma sociedade que nAo use a arte por ela produzida sera defeituosa, porque as necessidades insatisfeitas ou os residuos ndo utilizados criarao perigosas descompensagdes ideoldgicas. E preciso, portanto, que a arte seja de tal ordem que possa ser completamente reabsorvida na circulagao da vida. Sua fungao é demasiado delicada para se confiar ao arbitrio in- controlavel da inspiragao. Como o “génio” politico, o génio artis- tico nao encontra lugar no quadro de uma organizagao perfeita. Renova-se 0 ostracismo decretado para a arte na Republica, de Platao; mas, do mesmo modo como este se justificava, em tiltima anilise, pelo fato de que as obras isoladas, em sua concreta e ne cessariamente imperfeita realidade, ficavam muito abaixo da idealidade estética pela qual era permeada a propria vida do povo helénico, o novo ostracismo sé seré justificavel se a sociedade rea 0 WALTER GROPIUS EA BAUHAUS 2 ratemente, NOS alos da propria existéncia, essa arte que nhece como transcendéncia e catarse. nenhum dogma estético afirma que a arte deva oduzir-se mediante um processo técnico de carater artesanal; esse tipo de processo esta ligado auma determi. nada concepgao historica da arte. Do ponto de vista marxista, todo inclusive 0 da arte, depende do desenvolvimen- se fosse excegdo a essa lei e continuasse Hizar imane’ ela jf nao reco! Naturalmente, necessariamente pr processo hist6rico, to dos meios de produgao: numa sociedade industrializada, os procedimentos téc- tesanato, a arte constituiria uma forga conservadora e nto, ela dever4 servir-se dos meios de produgao a valorizar, nicos do ar reacionéria. Porta: da indiistria, os tinicos que podem inseri-la no circulo da vida so- cial moderna. Visto que uma estreitfssima continuidade liga ideacao e execugao, a propria idéia de arte deverd transformar-se profundamente para adequar-se aos novos meios de produgao. E, visto que a indtistria produz bens de utilidade coletiva, a obra de arte nao deveré voltar-se para as classes mais cultas, mas ser utilizdvel pela coletividade inteira. Na verdade, ela nao pede para ser interpretada ou compreendida, mas sim utilizada; nao pressu- poe um certo grau de cultura, porque ela mesma determina um certo grau de cultura. A energia racional, de que toda obra esté renleta, descarrega-se na vida e lhe intensifica o ritmo; ainda que a eS Seja 0 escoadouro sereno e liberador para além da contin- Bencia, a arte € a forga que nos faz superar a contingéncia na pr6- oa Contingéncia, obrigando-nos a realizar com clareza racional até Os minimos atos da vida cotidiana. da se voltava-se paraa contemplagao; por meio tetura solene da ‘ton, e a ae esciaeeee ORNS manas ganhavam desta : en a es ejuonaspaixces bY humanismo, sempre ii singe ine heréicos. Mas cee suprimivel dualismo Seay ah 0 Koslunive na arte) con g : uma humanidade hierarquica es sete Spee sg mente dividida numa classe superior INTRODUGAO ea e dirigente, partfcipe, por investidura divina (o “génio”), das leis supremas do universo, e numa classe inferior e servil, cuja tarefa é 0 fazer segundo a indicagao de iluminados regentes. A arte, como eke, a criagdo e oie a das leis desta em imagens , sempre tem, seja ela sacra ou profana, um valor de paradigma: é a prova tangivel do prestigio de uma certa cultu- ra e das classes depositdrias dessa cultura. A arte sacra nas maos da Igreja Romana durante a Idade Média, a arte profana e classi- cizante do Renascimento, a arte eclesidstica da Contra-Reforma, aarte “histérica” do Terceiro Estado sao outras tantas entidades de forga por meio das quais as classes dirigentes exercem sua au- toridade. Se essas classes renunciarem ao seu prestigio e exercerem sua autoridade mediante a intervengo direta nos processos produti- vos, se a praxis, apoiando-se nas ciéncias exatas, tomar 0 lugar da teoria e assumir a dignidade desta, a racionalidade, que constitui a prerrogativa e a forga dessas mesmas classes, nado mais se mani- festarA na designacao de conceitos gerais, mas na série infinita dos atos da existéncia. A vida verdadeira, auténtica, j4ndo sera aque- la que se realiza na contemplagao, mas que se efetua na agao; a realidade concreta, no iluséria, j4 nao sera aquela que ocorre no distanciamento sereno da meditagao, mas que coincide com o em- penho dramético do agir. Esse € 0 problema que Gropius quer colocar e resolver com sua arquitetura e com a didética da Bauhaus. Jé que subsiste uma classe dirigente, que deriva sua capacidade diretora de uma consciéncia mais lucida do real, a arte permanece indubitavel- manifestagao da realidade em suas leis, mente como representagao, do tempo. Cada um, na nas categorias fundamentais do espago e pera empregando objetos que sao da realidade, de: nfio uma realidade constante, genérica, pa- de realidade que est no espago ¢ RO forem pensados racionalmente, & medida em que oJ apreende a realida norAmica, mas aquela fragao tempo do ato. Se esses objetos WALTER GROPTUS F A BAUHAUS a o sera lticida e exata, na qual ele aconte- de e uma localizagao precisas, que lhe a fungao vital sera clara e sem des- e se dé no at ceré com uma rempestivida garantirao @ maxima eficdciay perdicio, como clara € sintéti : e. A tarefa da arte, portanto, €@ de conferir uma absoluta cumpre- clareza formal a t atos de uma existén essa existéncia, com! mesma atividade, ao se cumprir, a0 do mundo que € propria, nao mais do homem “natural” realidade qu ca sera a realidade na qual ela se odos os objetos Pot meio dos quais se exercem os cia organizada; que compOem 0 espago no qual o atividade continua, se realiza e que essa determina; que, enfim, constroem ano ou tendente a reconquistar uma artificiosa naturalidade fugindo A contingéncia, mas do homem social, que vive e opera na con- tingéncia. O individuo nao capta a profunda razao construtiva dos obje- tos artfsticos que condicionam sua existéncia a um espago e a um tempo regulados pela fungao social; mas, no contato com eles, experimenta um prazer estético, que nasce da percepgao nitida e circunscrita, da perfeita correspondéncia que se estabelece entre o mundo interno e 0 externo, do senso de eficiente vitalidade sus- citado pela clareza e pela propriedade formal das coisas que cons- tituem o ambiente imediato de sua existéncia. A propria super fluidade de uma mediagao intelectiva para 0 “goz0” efetivo, prati- co, das coisas artisticas assegura a imediagao, a inevitabilidade, a totalidade desse prazer estético, garante a validade dessa expe- peng artistica doravante insepardvel dos atos cotidianos da vida. ens estética inerente ao fazer, pave nplieeee a pote aaa: implicando o momento @ serie: » Ba ara valor criativo. ee consciente dos ee engsleaanic nae da tradicao se ase. oe gous pesacglte cee como ¢ sabido, fundanre e assim chamado abstracionismo: ste, a-se no princfpio da independéncia da INTRODUGAO 3 forma artistica em relagdo a toda determinante empirica, € por isso se apresenta como absoluto antinaturalismo. Embora essa defini- ¢a0 negativa parega insuficiente, nao se consegue substitui-la por outra, positiva, que declare os novos contetidos, nao-naturalisticos, da forma — contetidos que, na verdade, o abstracionismo nao tem nem pode ter porque reflete uma atitude critica e nao construti- va, repudia toda concepgio sistematica do mundo que vise a rein- tegragdo e a objetivagao de uma natureza, repele toda distincdo entre um contetido (em ultima anilise, sempre naturalfstico) e uma forma que o supere ou 0 libere. Em outras palavras, o abstracio- nismo nao visa a fornecer uma interpretagao da realidade, mas determinar e designar uma condigao da consciéncia na qual toda atitude especulativa seja de fato irrevogavelmente proibida. Nega- se toda evasdo para a natureza, toda efusao do sentimento, toda consolatio philosophiae. A prépria imediagao com que a obra se apresenta em seus tangiveis e incontestaveis fatos formais (as for- mas geométricas, as cores puras), a invariabilidade e a inacessi- bilidade deles 4 emogdo, a impossibilidade de uma fabula de lineis et coloribus nao permitem assumir essa obra como guia numa aven- tura qualquer dos sentidos, da fantasia, do intelecto. A obra de arte, como qualquer coisa da realidade, é constatével mas nao julgavel: ela é mera percepgao, uma percepgao retificada, como a que pode ocorrer a uma consciéncia que se despojou da prépria historia, do proprio contetido de experiéncia; uma consciéncia que, j4 nao possuindo um antes e um depois, € puro momento do ser. A arte é, em sintese, a forma do “fendmeno”. Todavia como condigdo do nao-contemplar, a arte ¢ condi- 40 do fazer, é técnica. Dado que a contemplagao € catarse, supe- ragao da contingéncia na universalidade da histéria, alivio para o obscuro operar da vida e conforto para seu transcorrer no tempo, onao-contemplar j4 ¢ aceitagao do fazer, empenho no conangente, na utilidade imediata do ato. Por isso é que se devem procurar na arquitetura “técnica” as primeiras formas nfio-figurativas ou abs: Mu WALTER GROPIUS B A BAUHAUS e destinadas a resolver problemas objetivos, alidades objetivas dos novos materiais; for- prescindirem de toda concepgao pré- erdade realizam outra inteiramente prem enquanto coisas ou objetos fratas, aparentement praiticos, através das qu mas que, justamente por constitufda do espago, na v nova, inerente a fungao que cum| ae . da realidade, fatos novos que se superpoem a Costumeira nogao naturalfstica. Por outro lado, esse puro fazer nao é pensdvel senao em sua negatividade, em seu ser auséncia e impossibilidade de contem- placdo e distanciamento, rentincia a evasao, empenho. Se assim nao fosse, se 0 ser € 0 fazer fossem um dever ser e um dever fazer, se se apresentasse um fim a alcangar, reabrir-se-ia uma passagem para o futuro e para o passado, e a agao aconteceria de novo num tempo historico e num espago naturalfstico, pois quem nao pos- sui uma concepgao sistematica e certa daquele mundo — que, ao contrario, s6 se apreende no fendmeno — nfo se propde um fim. Nesse sentido, esse fazer pode verdadeiramente assumir um sentido trégico (e nos vem a mente o motivo kierkegaardiano) de continua “derrota”, de ser um fado, a punicdo por uma culpa original. E na gravidade e na urgéncia dessa condig&o de crise da cul- tura européia que 0 apelo de Gropius adquire uma forga moral. Para ele nao se coloca o dilema de angtistia e fé que espicaga o indi- viduo repentinamente consciente de sua solidao no espago e no tempo; a racionalidade, que levou a esse impasse, 6 também a for- G4 que 0 supera, porque se exerce nas telagdes que ligam a comu- nidade dos homens, constituem a sociedade, ; tecem a rede da so- lidariedade humana. No dinamismo da vida social, a quele obscuro fazer se organi- 2a € se esclarece numa técnica, rena ee que € justamente modo de fazer, arte, isto €, um modo de resgatar na imanéncia a espirit = ; pt 4 qual se nega um resultado de transcendéncia, um ¢ hiberar no mundo, na vida que se exerce, as energias que INTRODUGAO 25 j4 nao podem escoar-se na natureza e confundir-se com as energias arcanas do cosmo. Daf 0 chamado de Gropius ao artesanato, em cujo assiduo fa- zer se expressou durante séculos a idealidade religiosa alem4; e daf 0 apelo a industria, que pode ser salvagao ou perdigdo, meio de uma plena coesdo ou de uma completa desagregagao social, mas ser salvagao se souber domar a bruta materialidade da méquinae religar-se Aquela antiga idealidade da qual extrai sua origem his- t6rica e sua justificagéo moral; se souber absorver a tradigao artesanal e desenvolvé-la numa socialidade ilimitada, na qual nao mais existam classes diversas, mas somente diversas fungées. Sao ainda as idéias de Max Weber e de Troeltsch sobre a justifica- tiva do espfrito capitalista na ética religiosa da Reforma: o traba- lho industrial como “ascetismo involuntério e inconsciente do ho- mem moderno”, 0 “senso profissional” como um operar “no mun- do sem divinizar a criatura, isto é, sem amar o mundo”, a socieda- de que nao tem metas ideais mas realiza a espiritualidade humana na clareza, na ordem, no fatal progredir de sua fungao. E ainda o dilema, que angustia toda a cultura moderna, da doenga e do remédio, de um bem e de um mal que, nado mais estatufdos por uma lei natural ou divina, se alternam e se repro- duzem uma partir do outro. A indistria, como a arte, é ao mesmo tempo o mal e o tratamento. Essa identidade j4 estava colocada, desde o fim do século XIX, no art nouveau, que de fato queria ser ao mesmo tempo arte e indtistria, esteticidade e socialidade ilimi- tadas. Haveria exemplo mais caracteristico daquela viciosa hiperfungao do ideal artistico, daquela “artisticidade” j4 inde- limitével em sua historicidade e por isso confundida com a vida, oscilante entre o naturalismo e a quimera, que representa a doen- ga do século? E no entanto também 0 art nouveau, com sua vag poeticidade e musicalidade, aspirava a ser arte social, a abrir s todos, sem discriminagao de classes e de cultura, os parafsos arti+ ficiais da arte, a redimir na poesia a vulgaridade da vida cotidiana. WALTER OROPIUS B A BAUHAUS 26 uco “divinizava a criatura” ou amava 9 mun. go, mas pretendia cumprir um dever absurdo, uma Paradoxal fun. gio hist6rica: divulgar ilimitadamente aqueles que haviam sido os ideais de uma cultura de classe, resolver no préprio cosmopolitismo formal os desequilfbrios e os contrastes de classe. O mito europeu de Gropius j4 nao € a miisica ou a poesia, mas a razdo; um mito mais fechado e amargo, que traz em si os germes da divida e do desengano. E verdadeiramente a tltima carta, que se joga sabendo que se vai perder. Gropius, assim como Mann, cré que a doenga é sempre 0 produto de um erro da vontade, de um desvio interior que, desprendendo-se da concretude da vida, nos impele para o mérbido dominio da desordem, do inconsciente, do Oart nouveau campo sonho, da morte; mas cré igualmente que diagnosticar o préprio mal, identificar suas origens profundas em nossa vida interior, significa eliminar os lentos venenos, repor em circulag4o as linfas estagna- das da imaginagao e do sentimento, destruir com 0 raciocinio a van- tagem que 0 irracional obteve sobre nds; numa palavra: curar-se. Também Gropius, como Mann, nos anos angustiosos do pés- guerra, parece perguntar-se qual vird a ser, numa sociedade futura que jé nao seré burguesa, o destino dos ideais, da cultura, da arte da burguesia européia. Sua construgio ideal é a construgao de um além, e, como toda hipotese de vida futura, baseia-se na experién- Cia e projeta no porvir as aspiragées da vida presente. Seu progra- ma, em certo sentido, € o de redistribuir os bens artfsticos, cuja Bosse Se concentrara numa sé classe. Ele cré ainda, como a gera- gao cho © precedeu, numa redengao do mundo por meio da arte; mas, ja que a prépria arte est enferma, propée a redencao desta Por meio da razao. S40, 4 sua antiga aices ‘ 4 e : es ee ey oe a Se umanjstica e iluminista. Arrancada 4 ambigilidade daquele sonho Poético e até ithe ; e até vagamente humanit 10 € trazida 4 tealidade dos seus interesses materiais ameagados, INTRODUGAO 17 aquela sociedade entrou na fase final e mais pavorosa do seu mal: submergiu no realismo da violéncia e do sangue. Gropius ja estava longe, na América, onde havia buscado re- fagio contra a perseguigao nazista. Pela segunda vez, diante de um panorama de rufnas, ele percebe que a mera restauracdo do status quo nao pode sen4o preparar desmoronamentos mais graves. Seus apelos, feitos da América, por uma reconstrugao que seja sobretu- do reconstrugao de consciéncia parecem impregnados de um novo otimismo; chegam a aflorar 0 utopismo, e justamente pela persis- tente confianga no valor de uma técnica. Desabado o mito da racionalidade, ele tenta agora salvar o primeiro e mais elementar dos valores: a autenticidade da existéncia humana. Mas nao cede & sugestao de novos mitos; também a existéncia, em sua esséncia profunda, é racional. Trata-se, porém, de uma racionalidade de princfpio, que foge a todo esquematismo légico e envolve, justifi- cando-os, até os impulsos mais genufnos do ser humano. O pri- meiro destes continua sendo o de criar, que € um participar da realidade e acrescé-la de novas formas. E precisamente nisso se manifesta a racionalidade humana, no fato de esse criar ser um criar ordenado ou formal, ao passo que os impulsos irracionais determinam um crescimento desordenado e informe; em ultima anilise, destrutivo e letal. Assim, a arte se torna 0 carater de todo impulso humano po- sitivamente vital ou construtivo; e, como perene vontade de cons- ciéncia, é a antitese de toda vontade brutal de poder, espfrito de a ie * paz contra espirito de guerra, virtude contra furor”. A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS A escola de arquitetura e arte aplicada que Gropius criou em 1919 e dirigiu até 1928 conclui os esforgos desenvolvidos, a partir de meados do século XIX, no sentido de restabelecer 0 contato entre o mundo da arte e o mundo da produgdo, de formar uma classe de artifices idealizadores de formas, de basear o trabalho artistico no principio da cooperago. Os antecedentes diretos da Bauhaus s4o 0 movimento morrisiano Arts and Crafts, o Kunst- gewerbeschule e o Werkbund alemaes — movimentos nos quais certamente se reflete a Ansia oitocentista por afirmar o carater de socialidade da arte, mas nos quais a socialidade jé nao se apresen- ta como uma miss4o a cumprir ou um ideal a defender, e sim como cardter ou natureza especifica do fato artistico. Essa grandiosa in- surreigdo das artes “menores” ou “aplicadas” contra a arte “pura”, & qual até se acabard negando toda legitimidade ou autenticidade formal, é indubitavelmente o Ultimo ato da luta romantica contra a ditadura do classicismo; mas € também o primeiro posicio- namento concreto de uma teoria da arte, como ciéncia de um particular fazer humano, contra todo idealismo estético. Se a arte j4 nao €é uma revelagdo da criagao que se oferece ao artista na graga da inspiragdo, mas sima perfeigdo de um fazer que tem no mundo seu princfpio e seu fim e que se realiza inteiramen= te na esfera social, o problema da génese da forma torna-se o pro — WALTER GROPIUS E A BAUHAUS x0 tividade e adquire automaticamente um social. Numa sociedade ideal, que tenha superado as con- a ‘ Jasse e alcangado uma integridade organica ou fun- eradigoes ec re nao sera possivel sequer distinguir um trabalho cional rca — como era, por antonomasia, o trabalho do ae burguesa — de um ae one e servil, de mera execug4o; nem um ativo “produzir” (que, alias, ssl seria tal) de um passivo “fruir” a arte: todo ato que caiba no ieee: da fungdo social, e portanto também o de usar o produto artistico, seré por isso mesmo criativo e participara do devir ou progredir da prio problema da produ’ sociedade. Sendo todo fazer um fazer na realidade e, portanto, um fazer- se da realidade, a arte é o processo pelo qual a consciéncia cons- titui o real em formas sempre novas, resultantes de uma rede cada vez mais ampla de inter-relagdes e de um acervo de experiéncias cada vez maior. E a forma que se cria, justamente por ser a forma mais atual da realidade, e a mais conforme & condigao da cons- ciéncia que a cria, € a priori resolutiva de toda instancia pratica ou utilitdria; em dltima andlise, ela é sempre redutivel 4 necessidade de estabelecer uma nova e concreta relagéo com o mundo e de Tenovar nossa experiéncia. Sea forma é 0 produto de um fazer, somente a experiéncia do fazer artistico nos fornece os €squemas a partir dos quais podemos citcunscrever e definir, tomando consciéncia delas e fixando-as €M sensa¢Ges precisas, as infinita: vem do mundo externo: os es NO, cor etc.) S € passageiras impressOes que nos quemas formais (linha, volume, pla- ativa, pies ate da arte, e no da natureza. A atitude Juan Gris) 0 Fite ii Portanto (como intufra genialmente nao € uma forma ne. fe toda experiéncia artistica. Se a arte Se imprime a esta hs oe da realidade, mas uma forma que "Ot $e), 0 simultaneo construir-se e evoluir da Consciéncia e d, lo ; mundo, esté claro que ela nunca é criagao finita, m™as Criatividad, ; continua. A obra de arte, como forma do nosso A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS a1 estar-na-realidade, tende assim a irradiar-se pelo espago vital da sociedade, a multiplicar-se em infinitos exemplares, a fornecer a todo individuo 0 meio formal para detalhar todo um conjunto de relag6es vitais com o mundo externo. A oposigado de uma concep¢ao “psicolégico-genética” a con- cepgao “estético-dogmitica” do estilo é, como se sabe, o ponto tedrico de chegada da experiéncia historiogrdfica da escola vienense de histéria da arte e, particularmente, de Riegl; cabe a essa escola 0 mérito de, pela primeira vez, ter buscado nos produ- tos anonimos do artesanato aquilo que mais tarde Dewey chamara de “continuidade entre aquelas formas refinadas e intensificadas de experiéncia que sAo as obras de arte e os fatos e as paixdes de to- dos os dias, que sdo universalmente reconhecidos como cons- titutivos da experiéncia”. E significativo que o mesmo Riegl inte- grasse seu conceito de Kunstgeist, ou da arte como expressao de espiritualidade coletiva, com o conceito de Kunstwollen, ou do querer a arte, admitindo assim, implicitamente, que o artesanato, como tipico fazer, € a expressdo de um sentimento da realidade que sé se adquire fazendo. A essa nova concepgao da histéria da arte (que reivindica, para as anénimas mestrangas medievais e para a tradicao técnica do artesanato, o mesmo valor que a historiografia politica reivindicava para o continuo progresso cultural do Ter- ceiro Estado) corresponde, no plano teérico, a formulagao do prin- cfpio da “pura visibilidade”, que visa a justificar a arte como “lin- guagem a servicgo do conhecimento”, ou seja, nado mais em suas finalidades estéticas, mas no seu ser fenoménico ou na textuali- dade dos seus valores formais. A Bauhaus de Gropius, sobretudo em seu desenho inicial, pode ser considerada uma conseqiiéncia direta e um desenvolvimento logico da teoria da arte de Fiedler; a qual, j4 nao se apresentando como teoria do belo, mas como teoria da visao, ¢ da particular visto que se obtém exercendo a arte, devia de fato desembocar nacural- mente numa pedagogia ou didética artistica. WALTER GROPIUS BA BAUHAUS Fiedler separa nitidamente a arte, como meio de sonhectmen, to, de qualquer “Analidade estética ou simbélica te) belo nob ropésive da arte, 6 um elemento da realidade; na medida em que hy de arte é também essa realidade, o belo “é um motivo da realidade que a arte cria”. Embora a pstptie arte ° tenha ee apartir da experiéncia, 0 belo esta ligado a erulencia fenoménica da arte e s6 se manifesta a posteriori, na realidade de fato que a arte produz: ele corresponde ao prazer que a obra de arte propor ciona. Quando, depois de incluir a beleza entre as exigéncias funda- mentais da arquitetura, procurando defini-la, Gropius evita envol- ver na definigao aqueles valores de forma que, no entanto, consti- tufam a base de sua didatica e alude a leveza das estruturas, 4 lumi- nosidade, ao plein-air que a nova arquitetura realiza com as gran- des vidragas, ao prazer que no nasce da contemplagao, mas do emprego do objeto artistico. Realizando-se no desenvolvimento da experiéncia ou na concreta atenuagdo da vida, esse prazer nao sera éxtase mistico nem banal satisfagao de necessidades mate- riais, mas percepgao mais clara e eficaz das coisas, modo mais li- cido de estar no mundo. Fiedler havia escrito que “a esséncia da arte € fundamentalmente simples: elevagao da consciéncia intui- tiva de um estdgio obscuro e confuso a sua forma de clareza e de- terminagao concreta”; “o princfpio da atividade artistica é a pro- dugo da realidade, no sentido de que, na atividade artfstica, a tealidade alcanga sua existéncia, isto é, sua forma concreta numa determinada diregao”; “a arte nao é um enriquecimento arbitra- rio, um algo mais da vida, mas sim um desenvolvimento impres- cindfvel da propria imagem do mundo”. . Assim como nao visa a surpreender a esséncia do objeto, a arte cama nwt dna ai : - De €mo nao € 0 objeto da arte, mas pel Sr Seat bl Oe mn , adquirida; condicionante € a realidade ainda né0 A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 33 diferenciada e classificada por categorias de valores, a realidade em que simplesmente vivemos e agimos. A arte figurativa nao nos oferece “as coisas como so, mas como aparecem” em sua realida- de fenoménica; o dificil, porém, é apurar sua aparéncia real, mui- to diferente daquela que captamos por meio dos sentidos, altera- da como é pela preliminar de nogées j4 adquiridas, pelo fluxo e tefluxo das emogées, pela propria reserva com a qual acolhemos o dado sensorial, j4 sabendo que ele nao corresponde A esséncia oculta cuja discriminagdo seré tarefa do intelecto. Dizendo que a arte capta as coisas como aparecem, nao se alude 4 apreensio sen- sorial, que j4 € um grau de um processo intelectivo, mas sim 4 pura percep¢4o, a um registro isento de qualquer alteragao emotiva: a uma percep¢4o que poderiamos chamar de pré-sensorial. De fato, “pode-se definir a atividade artistica como aquela na qual a agao da mio parece depender exclusivamente do olho, do interesse da visio”. Esse tipo de percepgao, portanto, est ligado a agao da mao, a um fazer: é isso que, operando na realidade, constitui essa reali- dade ea manifesta na forma. O artista nao medita nem interpreta a realidade, mas organiza-a e a revela inserindo-se nela com a racionalidade que é caracterfstica do seu ser enquanto humano. Acabou-se 0 tempo do esprit de finesse; também para a arte, comecou 0 tempo do esprit de géométrie. Doravante, ela est4 par a par com as ciéncias positivas: “Os artistas mais significativos sao sempre espfritos muito exatos.” E facil constatar que o pensamento de Fiedler j4 se situa na linha da fenomenologia; se a arte, no sincretismo absoluto de su- jeito e objeto, acontece e opera na realidade, ela j4 nao realiza um r-na-realidade, um ser-af, um Dasein. Ela genérico sein, mas um esta cia, no lugar e no Momento se cumpre inteiramente na contingén da agao; a imagem do mundo que ela revela (e, a rigor © mundo a imagem constante, ilimitada, 86 tem imagem na arte) nao é um forma e se desenvolve com panorfimica, mas uma imagem que se 08 NOSSOS AOS. WALTER GROPIUS E A BAUHAUS ” scapa a Fiedler que essa idéia de ante pressupde o 0 de todo sistema estético, a crise doe grandes “As pessoas se lamentam da decadéncia e do te. No entanto, a esséncia de sua verdadeira encontrada por esse caminho; aquele que m era s6 um falso brilho. E esse fato se Tampouco e: desmoronament valores da hist6ria: envilecimento da art dignidade s6 pode ser A va assi! até agora se chama’ if i enquadra num fendmeno de alcance geral: no desenvolvimento espiritual moderno, perderam valor uuitas coisas sue eaksicon: feriam importancia, dignidade, beleza a vida; & aan como é int- til tentar devolvé-las ao seu lugar de antes, nao € 0 caso de crer que o mundo vé perder a honra na vulgaridade se romper com elas para sempre, pois trata-se de coisas aparentes.” As proposigées teéricas de Fiedler, que apresentavam a arte como “contemplagao produtiva” ou produtividade ilimitada, con- cretizam-se no pensamento de Gropius num problema histérico preciso: 0 contraste entre artesanato e industria, como antitese interna e ainda nao resolvida da produtividade na sociedade mo- derna. A arte poder concorrer para eliminar essa contradigao se souber apropriar-se dos meios da industria e passar, também ela, da fase hist6rica do artesanato A fase industrial. Pevsner, a quem se deve a perfeita reconstrugao dos motivos ideoldgicos do movimento artistico moderno, situa Gropius no fi- nal de uma tradigdo de idéias que parte de Ruskin e Morris. As cir- Cunstancias nas quais se enquadra a polémica desses dois “pionei- Hae ie : a ae Fos” sao conhecidas: 0 répido desenvolvimento da industria pro- voca a crise do artesanato; a indistria repete mecanicamente os upos deste tiltimo, destréi a espiritualidade do fazer artistico, de- termina um declinio terrivel da cultura e do gosto; convém, Portanto, restituir ao artesanato Seu prestigio artistico ‘ e sua fun- ¢a0 econémica. Mas a concorréncia esmagadora nao causa da depressao do artesanato; na, € a concepcao classicista e ac é€a tnica uma outra, mais antiga e inter- adémica da arte, que relegou 0 A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 35 artesanato a um plano inferior e secundario, reduziu-o a uma ser- vil aplicagao estilfstica, desligou-o de suas antigas idealidades re- ligiosas. O individualismo fez da arte, que era expressdo de humil- dade diante do milagre da criagao, uma expressao de orgulho e de dominio; 0 orgulho é espirito de mentira; para Teconquistar o es- pirito de verdade, é preciso renunciar ao individualismo, retornar 4 moralidade artistica dos “primitivos”, & colaboragao, as comuni- dades de artistas. A insercao desse fator social na produgao artis- tica garantira sua eficdcia na esfera social. © movimento Arts and Crafts quer ser a reconstrugao de uma comunidade artistica capaz de realizar um “estilo” na produgao. Na Alemanha, o desenvolvimento da industria foi mais len- to do que na Inglaterra e a resisténcia do artesanato, mais forte. A antiga tradigao artesa se identificava com a tradigdo nacio- nal; a “praticidade” britanica, da qual a industria parecia ser a encarnagao, era ao mesmo tempo uma ameaga estrangeira a tra- digdo nacional e uma ameaga positivista ao idealismo alemao. O homem que divulga na Alemanha as idéias de Morris é Hermann Muthesius. Mas ele nao alimenta a ilusdo de poder re- integrar o artesanato 4 antiga fungdo econémica e social, e reco- nhece na industria o fator essencial do progresso. “As classes mé- dias”, escrevera Marx, “pequenos industriais, pequenos comer- ciantes, artesdos, agricultores, combatem a burguesia para conser- var sua existéncia de classes médias. Portanto, elas nao sao revo- luciondrias, mas conservadoras; e até reaciondrias, porque tentam girar para tras a roda da histéria.” Os artesaos, como categoria, est4o fadados a desaparecer; e, quando uma categoria desapare- ce, aquela que vem depois herda sua experiéncia, do contrario a civilizagao deveria estar sempre comegando de novo. A indtistria forneceré a sociedade a arte que os artesos j& no poderdo pro- duzir; mas nao poderé limitar-se a multiplicar em série os Gipos criados pelo artesanato, ¢ deverd criar tipos especiais para @ pro~ dugao mecfnica em série, Somente os objetos feitos pelas maqui- WALTER GROPIUS B A BAUHAUS %»% “cso produzidos segundo a natureza econémica da nossa épo- re sinardio o novo estilo, o Maschinenstil. ca”; e eles atte alemao da “praticidade britanica” 6 a Sq. ie a as, se a empirica praticidade britanica se resolvia em comodidade de vida, a Sachlichkeit é objetividade € concretude, correspondéncia exata € calculada entre a coisa e a fungo, entre a forma e o uso. A praticidade deixava aberta uma Passagem a poeticidade, para o sentimento da eae Para Se © que de algum modo pode trazer alfvio as preocupagées imediatas da vida; por esse caminho pode-se chegar até a resolver toda a pratica na palpitagdo césmica da natureza e a fazer da arquitetura, como Wright, uma poesia na qual as pessoas nao se evadem, mas vivem. A Sachlichkeit fecha essa passagem, porque a correspondéncia entre o objeto e a fungao é tao estreita que o valor, a prépria existéncia do primeiro, cessa junto com o fim da segunda. Contudo, 0 objeto se reduziria a mero instrumento (e, a rigor, nao seria nem mesmo isso, porque nao poderia ter forma e seria apenas um subsidio ru- dimentar) se em sua estrutura nao casual, na experiéncia de vida que © aperfeigoou ao longo do tempo, ele nao obtivesse um valor de forma, ndo realizasse uma “beleza aderente”. A isso se chama qualidade. Beleza é algo além do objeto artfs- Uco em si, € um conjunto de relagées de valor como qual objetos produzidos por técnicas e para fins diversos devem estar harmoni- zados; qualidade € uma perfeigdo pertinente ao objeto, obtida ao cabo de um certo Processo técnico, intransferivel e por isso nao mais reconhecivel numa lei geral, mas sim na propriedade espect- fica da forma, isto é, em sua adequagao. E também evidente que essa Propriedade da forma, nao sendo referencidvel a conceitos era, 56 € determindvel na correspondéncia coma utilidade es- pecifica, que assinala 0 tempo histérico em que a obra de arte acontece, ws etn 9, ngs Tsiano Arts and Crafts e ao mesmo A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 37 tempo se contrapée a ele, tem 0 propésito de “combinar todos os esforgos atuais para obter qualidade no trabalho industrial”. Ao abrir 0 primeiro encontro anual do Werkbund, Theodor Fischer declarava: “Nao € a m4quina que faz um trabalho deficiente, mas sim nossa incapacidade de us4-la com eficdcia.” Em outras pala- vras: nossa capacidade de ideagao artfstica ainda est4 aquém do grau de cultura que produziu a maquina; a arte, ou aquilo a que damos esse nome, abrange uma realidade muito mais restrita do que aquela abrangida pela ciéncia e pela técnica modernas; o in- dividualismo artistico proporciona uma experiéncia muito mais limitada do que aquela que a indtistria, como ago coletiva, abre para o mundo moderno. Por isso o Werkbund amplia e especifica a idéia morrisiana da arte como produto de colaboragao. Como a maquina nao permite a intervengao do artifice no curso do processo executivo, todos os problemas de utilidade, de material, de técnica, de economia pro- dutiva devem ser resolvidos a priori, na ideagdo, que resulta assim da coordenagao de experiéncias e competéncias diversas. Teori- camente, a obra de arte é sempre obra coletiva de uma sociedade, que nela resolve uma determinada exigéncia. A maquina nao faz mais do que receber e multiplicar o modelo da ideagao; omomen- to executivo est4 implicito, totalmente previsto, no momento ideativo. Superpostos esses dois momentos, a obra € ao mesmo tempo totalmente teoria e totalmente pratica, como, alias, € ne- cess4rio que ela seja, dado que a pratica (técnica), adequando-se aos processos da ciéncia moderna, absorveu e sub-rogou a fungao da teoria (ideagao). Caberé a didética da Bauhaus dar o tiltimo passo: uma vez que a tarefa tradicional da “prxis” artistica era dar realidade 3 idéia ou a teoria numa experiéncia concreta € construtiva da natureza, superpondo-se 0 momento da teoria ¢ o da pritica, reduzindo-se & unidade os dois termos do antigo dualismo, en- cerra-se definitivamente o tempo do naturalismo ou do inte: ar) WALTER GROPIUS E A BAUHAUS \ lismo artfstico. A arte deveré necessariamente realizar-se jectualh 5 sem passar pela natureza- Se essa € a tradigao ideoldgica, a tradig4o construtiva que pre- para a didética da Bauhaus €a da arquitetura industrial alema. Quando nasce a Bauhaus, a era dos pioneiros do cimento e ao limite daquela nova monumentalidade que do ferro j atingir ; ! ‘ono simbolismo art nouveau da Torre Eiffel. tem seu exemplo tipic O ideal fin de siécle de uma modernidade cosmopolita, de um estilo livre de preconceitos e 4s vezes paradoxal, pertence a Austria: a ligdéo de Otto Wagner pode bifurcar-se nas diregdes aparentemente opostas de Olbrich e Loos, mas a prosa fria e ele- gante de Loos revela-se a contrapartida 4 poesia oy a musica- lidade de Olbrich. Na Alemanha, 0 vendaval do Jugendstil mal encrespa a superfi- cie de uma problematica da arquitetura que remontava a questao kantiana do belo e do Util e que, através da tese hegeliana da ar- quitetura simbdlica, se desenvolvera progressivamente até chegar a teoria da Einfihlung, que apresenta a arquitetura como fusio entre o mundo interno e o externo na unidade da forma, expres- sao da nossa profunda Participagao no dinamismo interno do real. Van de Velde, um entusiasta das idéias de Morris, visa a trans- formar 0 arabesco — que quer ser ao mesmo tempo linha e cor, eludindo a precisao formal de uma e outra — em “linha expressi- va"; verticais e horizontais ainda conservam 0 sentido simbédlico, de ascensao espiritual e de efusao naturalistica, da Einfiihlung; nas Curvas mais abertas ou mais lentas tece-se a jungdo, transcreve-se @ Passagem entre um e outro estado de animo. Estamos no limiar do ex ‘ Pressionismo arquiteténico. O senti- do dramético, : upicamente alemao, do eterno conflito entre espi- rito € matéria se expressa na coexisténcia forgada entre linhas e massas, entre o simbolo espiritualistico € o simbolo naturalfstico. Ne anci ssa linha busca-se a substancia Primaria, a pura e suprema A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 39 idealidade da forma; e, assim como esse hipotético valor sé é designavel por forga de antitese, numa espécie de sublimagao que adelgaga e volatiliza a matéria mas a pressupée, também a linha é a sublimagao da massa mas a pressupde. A massa é resgatada nos perfis cortantes, nos planos que se flexionam obedecendo a uma tensao secreta, nos cheios e vazios que nao se compensam numa organizagao plastica do espago, mas ao mesmo tempo se superpoem e se contrapGem como elementos méveis do caos. O ponto de chegada dessa aspiragao espiritualistica é 0 expressionismo de Mendelsohn, tiltima conseqiiéncia da arquite- tura-simbolo, da arquitetura-misica, da arquitetura como expres- sao de forgas primfgenas e misteriosas que irrompem e aspiram a libertar-se no espirito. A arquitetura industrial nasce da mesma raiz ideolégica e reflete a mesma situagao histérica. A indtstria alem ja superou sua longa fase formativa e empenha toda a vida da nagao num gigantesco esforgo produtivo: j4 nao se acredita numa fruigéo melhor e numa distribuigdo mais igualitaria dos bens da natureza, mas na possibilidade de multiplicd-los com a técnica e de criar outros novos, artificiais. Esse esforgo ciclépico é imagi- nado como uma palingenesia coletiva da alma germanica; na reli- giosidade do trabalho industrial, finalmente se alcangara o pleno dominio do espirito sobre a matéria. As fabricas construfdas por Behrens e Poelzig sfo a imagem viva desse pensamento do capitalismo como vocagao religiosa. Ja nao existem simetrias, proporgoes e relagGes espaciais aceitas a priori; e tampouco uma natureza harménica que alicerce as for- mas arquitetGnicas em suas leis. As massas se articulam segundo uma regra imposta pelo trabalho que se desenvolve ali dentro, as formas se plasmam num processo que & 0 proprio processo da matéria bruta que ferve e se purifica nos altos-fornos, precipita-se em correntes incandescentes, circula por condutos tortuosos, es corre sob os laminadores ¢ as filandeiras ¢ finalmente recebe 0 formato de maneira liicida, exata, macematica, A fabrica ja nao ¢ WALTER GROPIUS EA BAUHAUS 40 r onde se trabalha, mas um instrumento imenso, ina colossal em cujo interior milhares de homens agem uma méquin: disciplina inflex{vel: é a sintese suprema entre m4- a discip! hhados no processo racional que subjuga a apenas um fuga! segundo um quina e homem, empen matéria ao espirito. Essa arquitetura fun tee mente nova também em relagao a arquitetura “técnica”, em cujo ambito continuavam a movimentar-se, na Franga, homens como Garnier e Perret e, na Suica, Maillart. A nova idéia do espago jg e baseia nas intrinsecas qualidades de elasticidade, de ten- damenta uma experiéncia formal inteira- nao si sao, de empuxo dos novos materiais, mas na organiza¢ao, na coe- réncia, na mecAnica do trabalho humano. E impossivel justificar as novas formas com as costumeiras ca- tegorias formais, fundamentalmente naturalfsticas, de massa, de volume, de equilibrio entre cheio e vazio, de relagao plastica entre peso e empuxo porque o préprio ritmo do trabalho mecAnico, so- bre 0 qual essas formas se plasmam, est4 em contradigdo com a natureza, ultrapassa-lhe os limites, violenta-lhe as leis estatufdas. E igualmente impossivel justificar essas formas segundo um espacgo preconcebido, imutavel, geométrico, porque o espaco efetivo dessa arquitetura se determina pela funcao; no maximo, ele pode assimi- lar-se ao espago que Heidegger define em relagdo a atitude original ao nossa estar-no-mundo: um espago que € ao mesmo tempo dis- tancia a superar (Entfemung) e disposigdo das coisas numa determi- ae ordem (Ausrichtueng), Correspondente & nossa necessidade de ‘eine tee um conjunto de lugares, de distancias, valor coma nossa eae aus ons wie . gus ao - anga de posigao no complexo. O fazer + i ; 3 zer torna-se, assim, a condigao de toda designacao de es- Paco. Se, na contemplagao, a reali A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS “ ao longo de infinitas diregSes. Se, na arquitetura classica, a reali- dade preventivamente homologada em termos de espago se tra- duzia numa forma plasmada, numa mesma matéria ou em varias matérias que se reduziam 4 mesma entidade plastica, aqui a reali- dade se traduz em espago sem alienar a matéria, mas, ao contra- rio, determinando-se a cada vez nas mais diversas matérias: a for- ma é um grau da matéria, sua qualidade. Gropius inicia sua carreira trabalhando no estiidio de Behrens; sua formagio artistica se dé no Ambito do Werkbund e da arquite- tura industrial alema. Os primeiros problemas que ele enfrenta so relativos 4 produgao artistica, isto é, 8 génese da forma e ao seu processo. Jéem 1910, ao elaborar com Behrens, em relatério para a pre- feitura, um memorando sobre a pré-fabricagao industrial, Gropius tracava as primeiras linhas de uma reforma da produgao artistica. Durante a guerra, esse primeiro esbogo se transforma num proje- to de reforma do ensino artistico. Recém-desmobilizado, ele ob- tém para o seu projeto 0 apoio do grao-duque de Sax6nia-Weimar e assume a diregao da Sachsische Hochschule fiir bildende Kunst e da Sachsische Kunstgewerbeschule de Weimar. A Bauhaus nasce da fusdo dos dois institutos, com um programa nao muito diferente daquele do Werkbund, mas com um rigor de método que elimina até os vestigios do vago estetismo herdado pelo Werkbund do movimento Arts and Crafts. Gropius nao tenciona destruir o artesanato. Entre artesanato e inddstria, momentos sucessivos Na hist6ria da sociedade, deve existir continuidade de desenvolvimento; 0 artesanaro deve Pro- for o efeito dessa evolugdo, sua a WALTER OROPIUS BA BAUHAUS istema artesanal seria um erro de atavismo, Hoje, ant industria tendem cada vez mais a se aproximar, mais arresanato & fundir-se gradativamente numa nova unidade devem uaacada individuo o sentido da colaboragao so, a vontade de exercé-la. Nessa unidade 14 o campo experimental da industria e, ormas para a realizagao industrial.” rado ao anugo s que isso, produtiva, que restit dentro do todo e, por !s produtiva, © artesanato se funcionando assim, criara as 1 ca A velha classe artesa é numericamente insuficiente e se re- emasiado lentamente para poder fornecer o pessoal diri- gente e Os mestres necessarios industria, a qual, na verdade, é ebreada a recrutar entre todos os que tenham alguma experién- cia de trabalho artesanal. Entre a ferramenta e a méquina nao ha distingdo de qualidade, mas de quantidade ou de “escala”: a ma- quina s6 dard um rendimento positivo se aquele que a usar souber adotar as ferramentas do artesanato, assim, 0 processo mecanico produz di nao destruird o sentimento ou a inteligéncia da matéria, que s6 se adquire trabalhando-a com as ferramentas apropriadas. Dessa premissa resultam duas conseqiiéncias. Se a formagao do artifice consiste em passar do dominio da ferramenta ao domi- nio da maquina, seu processo formativo reproduz o processo evolutivo do artesanato a industria: a escola artistica, portanto, é uma sociedade in nuce, porque o processo didatico reproduz o pro- cesso da evolugao social. De fato, o primeiro perfodo da Bauhaus, ° ge Weimar, caracteriza-se pela orientagdo do ensino para os métodos e processos do artesanato e pela énfase ao mesmo tempo eRDRESa ante: Pp essionistica € popularesca dada aos produtos. Essa é a fase que Poderfamos chamar de “populista” modos do artesanato, a ex; d ,na medida em que busca, nos a abet Pressdo direta de um ethos popular ou ma de ex) énci Perlencias que constitui uma tradi¢ao; mas, ao mes- mo tempo, ela se pi admite que esse ethos s6 pode encontrar uma for- » Superar a rudezae ain plano de “cultura” €xpoente de uma genuidade da arte popular, situar-se num “ Be see ; j » através de um intérprete, o artista, que sej Outra classe, superior e dirigente. A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 4p A ferramenta e, numa escala mais ampla, a maquina operam na matéria e, ao revelarem sua qualidade, constituem-na em for- ma. Ruskin e Morris jf haviam Proposto a matéria como dado ori- ginal de experiéncia, em contraposi¢ao ao conceito classico de natureza. Este se fundamentava na distingao entre sujeito e obje- Co, e assumia a atitude contemplativa como a atitude caracteristi- ca do espirito, isto é, de uma humanidade que presume haver su- perado e transcendido a propria matéria. Ao contrario, a matéria €a realidade pré-naturalistica que nao se da na contemplacao, mas Cuja experiéncia se adquire operando nela com o indispensavel auxilio da ferramenta. Esta, por sua vez, nao é apenas um acréscimo as nossas possi- bilidades de ago, uma mao mais forte e mais Agil que nos permite entrar em contato com certas propriedades da matéria que, de outro modo, escapariam & experiéncia; € também uma determi- nagao do agir, porque em sua forma se concentra uma série de experiéncias que orienta a agao numa determinada diregdo e a obriga a desenvolver-se segundo um processo especifico. Por meio da ferramenta, instrumento de uma vontade schopenhaueriana, penetra-se e vive-se na matéria, até constituf-la em forma ou re- presentagao. Uma vez que as chamadas “constantes nacionais” da arte se manifestam sempre numa particular Weltanschauung, uma ativi- dade que se desenvolva numa zona pré-naturalfstica sera neces- sariamente isenta de qualquer cardter nacional. A crise da natu- reza coincide, na arte moderna, com a crise da histéria e coma aspiragao por alcangar expresses supra-histéricas, antinatura- Ifsticas, internacionais. A didética da Bauhaus nasce justamente da constatagao de que, pela primeira vez, um ideal internacional assumiu uma consisténcia histérica precisa. Assim como a nova consciéncia da realidade reivindica um campo de experiéneia ine finitamente mais vasto do que a “nacureza”, a vida moderna * explica numa esfera infinitamente mais vasta do que a “nage”. SD] WALTER GROPIUS E A BAUHAUS , da histéria, do qual o proprio tédio ou a evasio O sentimento arte dos faues € dos expressionistas eram a mani- dianve dele es e exasperada, € substitufdo pela pura raciona- festagao Fc ccaistote absoluta: € esta que gradualmente retifica lidade como do expressionismo, sempre oscilante e elimina as contradig6es nO, 8¢ entre um 4spero realismo e uma abstrata religiosidade. A Bauhaus, com sua rigida racionalidade, quer criar as condi- gGes para uma arte sem inspiragao, que neo deforme poeticamen- te a realidade da nogao € sim, construtivamente, forme a nova realidade. No mito da inspiragao ou da espontaneidade e de sua ocorréncia a partir de fontes misteriosas ¢ ultraterrenas, vislum- bra-se a presuncio do privilégio, concedido a uma elite, de rece- ber e transmitir a mensagem divina da arte, a fim de servir de guia a uma massa ndo iluminada, condenada a uma inferioridade pe- rene. Mais profundamente ainda, quer-se golpear os extremos ar- tiffcios aos quais a burguesia recorre para dissimular diante de si mesma a propria crise e conservar 0 proprio prestigio: as vagas aspiragGes estéticas € espiritualfsticas com as quais ela mascara 0 egoismo de classe, a ostentagao preciosista de um tormento ideal perante a “forga bruta” das massas, 0 simulado reconhecimento das préprias culpas (lembremos a polémica antiburguesa que 0 fascismo encamparA, e que na realidade nao passa de uma revolta da burguesia mais recente contra suas préprias tradigGes progres- sistas e liberais). Nao é de espantar que, na Alemanha do pés-guerra, a impe- c4vel racionalidade da Bauhaus e seu programa internacionalista constitufssem um escAndalo bem mais grave do que a convulsao ideolégica do expressionismo pré-bélico. Este, afinal, refletia uma doenga na qual a burguesia alema se comprazia; e repetia para essa mesma sociedade, que nao desejava senao pecar, 0 conselho lu- terano de pecar fortemente, mas fazendo-a entrever a eventuali- dade de uma graga que podia chegar no exato momento da pior violéncia (a graga, talvez, de uma vit6ria que Ihe desse o dominio A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 45 sobre uma Europa ao mesmo tempo detestada e ambicionada); a0 passo que a racionalidade da Bauhaus colocava-a diante da incon- testavel realidade histérica de uma derrota, cujo resgate exigia a rentincia aquela mérbida e ambigua oscilagao entre 0 violento eo sublime. Todos os esforgos de Gropius para manter a Bauhaus longe de qualquer ideologia e de qualquer confronto politico nao con- seguem esconjurar a hostilidade encarnigada daquela mesma bur- guesia para a qual seu programa se voltava confiantemente. Con- tra a Bauhaus se coligam: o ambiente artistico oficial, que consi- derava a arte uma iniciagdo e seu exercfcio, um privilégio de casta; o artesanato tradicionalista e conservador; a alta burocracia; as direitas nacionalistas apoiadas no grande capitalismo. Apdiam a Bauhaus os homens tecnicamente mais preparados do mundo industrial e os intelectuais. Quando, em 1925, a hostilidade dos grupos reacionarios obriga a Bauhaus a abandonar Weimar por um ambiente menos retrégrado, um nobilfssimo protesto dirigi- do ao governo da Turfngia inclui, entre muitas outras, as assina- turas de Behrens, Einstein, Oud, Gerhart Hauptmann, Ludwig Justi, Mies van der Rohe, Sudermann, Poelzig, Pankok, Hof- fmann, Hofmannsthal, Kokoschka, Max Reinhardt, Schénberg, Strzygowsky, Werfel, Muthesius. No mesmo ano, a Bauhaus se transfere, com todos os professores € alunos, para Dessau, onde surgiré a nova sede, desenhada por Gropius. Mas trés anos de- pois, em 1928, Gropius tem igualmente de deixar a diregao da escola, que é assumida primeiro por Hannes Mayer e depois por Mies van der Rohe. Os inimigos da Bauhaus encontram nos nazistas seus aliados naturais e, quando Hitler toma o poder, a luta € logo decidida: 9 Bauhaus ¢ oficialmente fechada em abril de 1933 e sua sede, con fiada a uma organizagao juvenil nazista qualquer. Chega-se ate & superpor, As coberturas planas do edificio de Gropius, um celhado inclinado para escoamento, segundo a “cradigdo nacional ger WALTER GROPIUS E A BAUHAUS “” » do abominavel “incernacionalismo” da Bauhaus, queria ca, dO minar até os rastros: mini se eli A Bauhaus foi um tipico exemplo de escola democritica, ba- a prinefpio da colaboraga a como um pequeno mas completo organismo social, izar uma perfeita unidade entre método didatico e sistema produtivo. Dotada de gSUUISOS Palents limitados, com- pletava o orgamento fornecendo a industria, que era sua safda natural, modelos estudados em colaboragao por docentes e alu- nos; dai a participagao destes Ultimos, com pleno direito de dis- cussdo e de voto, no conselho da escola, ao qual competiam so- bretudo as relagdes com o mundo da produgao. Embora a Bauhaus fosse uma escola governamental, sua verda- deira fisionomia era a de uma comunidade artistica organizada. Ao longo de toda a duragao dos cursos, professores e alunos viviam na q o entre professores e alunos. seada no Concebid visava a real escola; a colaboragao entre eles prosseguia inclusive nas horas de lazer, que eram dedicadas a audigdes musicais, conferéncias, leitu- ras, discuss6es, assim como a organizagao de apresentag6es, mos- tras, competigoes esportivas. A atividade artistica se inseria e se ambientava espontaneamente naquele elevado teor de vida: pro- Curava-se, assim, remover da “criag4o” artistica qualquer cardter de excepcionalidade e de sublimidade, para resolvé-la num ciclo nor- mal de atividade e produtividade. A arte destinada a repercutir na vida e confundir-se com ela devia nascer como ato da vida. aon a dito de harmonizagao e fundamentado € som, forma e cor, integrava as diversas das pessoas. Ele substitufa qualquer outro atedrdtico, seu propésito era o de habi- €pgao exata e imediata dos fatos formais ntanea disposigo a enquadrar todo dado do contorno formal. Essa disciplina ten- ancamente, e em relagao estreita, a atitu- atitudes fisicas e Psiquicas tuar Os jovens a uma perc: €induzir neles uma espo: de experiéncia num niti diaa desenvolver simult A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 47 de ativa e a receptiva, consideradas insepardveis; isto 6, a reforgar o principio de que a sensagao e a percepgio sio momentos ativos do espirito e, portanto, nao meras premissas da forma, mas a au- téntica forma. A cultura que se queria dar ao artista nado era um patrim6nio de experiéncias, mas uma livre capacidade de experién- cia, um modo lticido de estar no mundo, uma clara consciéncia de civilizagao. Do rigor do método, nenhum limite derivava para a liberdade do ensino. Os cursos desenvolvidos na escola, por artistas muito diferentes em formagao e temperamento, eram sobretudo exem- plo de economia do trabalho mental: demonstragGes praticas do mecanismo de sensibilidade e de vontade através do qual podia- se chegar a “realizar”, isto é, a constituir a realidade nas formas que so as proprias formas do nosso agir. A coeréncia estilistica, nao mais sendo deduzida da harmonia da criagao ou de uma idéia do belo, s6 era pensdvel como economia, exatidao, auséncia de desperdicio mental na produgao da arte. Nunca existiu, € Gropius afirmou isso muitas vezes, um estilo da Bauhaus; mas a marca des- sa coeréncia, ou exatidao, ou economia mental, e sobretudo da infalivel seguranga na designagao da imagem, encontra-se inde- fectivelmente na obra de todos os que, mesmo sem possuirem uma forte personalidade artistica, passaram por aquele perfeito meca- nismo didatico.' 'Esquema da distribuigao do curriculo na Bauhaus: CURSO PRELIMINAR. Teoria elementar da forma. Experimentos sobre mareriais em la- Ss i Madeira: marcenaria; Metal: merais: ENSINO TECNICO (Werklehre). Pedra: esculturas : mal ‘ Tera: cerfmica; Vidro: vidragas; Cor: pintura mural; Tecidas: tecelagem. Exercievs a boratério: a) ensino sobre os materiais ¢ ‘os instrumentos de trabalho; 6) elementos contabilidade, edleulo de pregos, contraragao, WALTER GROPIUS EB A BAUHAUS “3 A duragio total dos cursos era de trés anos e meio, O “I meiro semestre era dedicado ao ensino preliminar (Vorlehre), i seja, a uma instrugdo elementar sobre os problemas da forma, aavetiode a exercfcios praticos num laboratério especifico Bas principiantes. Terminado esse breve curso preparatério, 0 aluno era admiti- do num dos laboratérios especiais. Em coeréncia com 9 Principio de que “o rendimento do individuo depende do justo equilibrio do trabalho entre todos os érgaos criativos”, o ensino resultava de um conjunto de experiéncias técnicas e formais. O ensino técni- cose desenvolvia em laboratérios especiais Para os diversos mate- Tiais e era integrado por nog6es teéricas de tecnologia (materiais e instrumentos de trabalho) e por nog6es gerais sobre gestdo em- presarial. O ensino formal se articulava com base naqueles que eram considerados os estagios genéticos da forma: a observacao (estudo particularizado da realidade, teoria dos materiais); a re- Presentagao (teoria das Projegdes, técnica das construgées, dese- nhos e modelos para todo tipo de construgao); a composi¢ao (teoria do espago, teoria da Cor, teoria da composigao). Ao término do curso trienal, o aluno obtinha, perante uma comissao externa, o diploma de artesao; submetendo-se a prova mais severa, diante de uma comissio interna, recebia o diploma de “artesdo da Bauhaus”, O curso de aperfeigoamento que se seguia era baseado no ensino da arquitetura e num Serifssimo tirocinio pratico no can- teiro experimental da escola; sua durago variava segundo as ati- tudes eo tendimento. O €xame prestado no final, diante de uma Comissao externa, Proporcionava o diploma de mestre de arte; com pit Posterior exame interno, podia-se conseguir o diploma a Mestre de arte da Bauhaus”, Desdeo Princfpio, colaboraram com Gropius, como professo- *¢6, Johannes Itten — que ja se dedicara ao estudo da pedagosi? A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS ” formal e que Gropius conhecera em Viena em 1918 —, Lyonel Feininger e Gerhard Marcks; em 1921, acrescentam-se ao corpo docente Paul Klee e Oskar Schlemmer; em 1922, Kandinskij; em 1923, Moholy-Nagy. Em 1923, Josef Albers substitui Itten na di- regéo do curso preliminar. Em média, os alunos da Bauhaus eram pouco mais de duzen- tos; provinham de todas as partes da Alemanha e da Austria; sua idade variava entre dezessete e quarenta anos; muitos haviam combatido na Primeira Guerra Mundial. Para os mais pobres, Gropius tinha obtido isengao de mensalidade e taxas; mais tarde, conseguiu também que fossem compensados os alunos que pro- duziam, nos laboratérios da escola, objetos vendaveis. A postura reformista da Bauhaus est claramente expressa no manifesto de 1919, no qual se afirma, entre outras coisas: “Todos nés, arquitetos, escultores, pintores, devemos voltar ao nosso off- cio. A arte nao é uma profissio, ndo existe nenhuma diferenga essencial entre 0 artista e 0 artesao (...) Em raros momentos, a inspiragao e a graga dos céus, que fogem ao controle da vontade, podem fazer com que o trabalho desemboque na arte, mas a per- feigdo no oficio é essencial para qualquer artista. Ela é uma fonte de imaginagao criativa.” “Nés formamos uma nova comunidade de artifices, sem a dis- tingdo de classe que ergue uma arrogante barreira entre artesio e artista. Ao mesmo tempo, concebemos e criamos 0 Novo edifi- cio do futuro, que abrangeré arquitetura, escultura e pintura numa s6 unidade, e que um dia ser& algado para o céu pelas maos de milhées de trabalhadores, como 0 simbolo de cristal de uma nova fé.” “Jé se delineiaa idéia do mundo hodierno, mas sua forma esta confusa e intricada, A antiga visio do mundo, o Eu contrapesto 40 Todo, empalidece; em seu lugar, aflora a idéia de uma nove une dade, que tras em sia conciliagto absolute de rods a8 ansteses a, WALTER GROPIUS A BAUHAUS p [vissareiro da unidade de todas as coisas e Esse reconhecimento a fendmenos dé a obra criadora do homem um sentido s os fen de todos os raizado nas mais fntimas profundezas de nés mesmo, vo, en! coleti toda imagem torna-se simbolo de um pen. See si Jada mais existe em St, . 5 Nada que nos impele a construir; todo trabalho, uma manifes. samento 30 de nossa esséncia intima.” Sobre essa premissa ideoldgica tagao : baseia-se a didética de Gropius. Com 0 fim do dualismo Eu-Todo, cai a antiga concepcao da arte como representagao idealizada (no ey de uma nate con- traposta (o Todo); nds mesmos nos encaixaraes pe iced das coisas e dos fendmenos. O espirito, ou a consciéncia, nao é algo que preexiste e sobrevive 4 experiéncia, mas algo que se cons- trdi com Os nossos atos e, construindo-se, constréi a realidade na qual imerge e da qual é insepardvel. A forma, como camada mais atual da realidade, é sempre uma superficie 4 qual remon- tam e sobre a qual se esclarecem os fatos mais remotos e secre- tos, que de outro modo turvariam a fungdo linear ou contami- nariam a cristalina substancia da consciéncia. Aarquitetura, como construgao, Tepresenta a expressdo mes- ma da construtividade da consciéncia; a ela compete a tarefa de clarificar 0 aspecto confuso do mundo hodierno; nela “cristaliza- s€ a visio do mundo tipica de uma era.” Por que cabe justamente 4 arquitetura essa tarefa? Por uma sua esséncia simbélica, por uma mecanica deterministica? Nem uma nem outra coisa. A arquite- ‘ura, trabalho de homens Para os homens, intervém em todos os mementos €atos da existéncia; intermedeia e condiciona as rela- dlocpe ee com a realidade; determina a dimensao, leis coe ida e do traba auténtica, sg ee es die a € histéric, tal), que € a vida social. Sem a sar ohomem fora de aiid ©, Na fungao que 0 faz lho humano; é quase um segun- Para aquela vida mais elevada e @ (€ nao mais unicamente natu- arquitetura, seria impossfvel pen- Original naturalidade, em seu ser hist6ri- membro de uma sociedade. A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 51 A verdadeira arquitetura “mergulha suas rafzes em toda avida de um povo e cinge num sé amplexo todos os campos da criagao homage todas as artes e técnicas”; e nunca poderd se produzir senao numa ordem social que utilize plenamente todas as forgas individuais e confira vida um significado completo e atual. Em contrapartida, a arquitetura que, “de arte criadora ou compreen- siva do todo, decaiu para exercfcio académico, é, em sua infinita complicagao, 0 espelho fiel de um mundo interiormente dividido, no qual era inevitavel perder a colaboragao necess4ria de todos os que participavam da obra”. Esclarece-se assim um conceito j4 enunciado por Ruskin e Morris a propésito da arquitetura gética; para poder verdadei- ramente realizar um ethos coletivo e dar forma as idéias e aos senti- mentos que representam o elemento coesivo de um organismo social, a arte deve ser o produto de uma colaboragao. “A arte de construir se liga estreitamente a possibilidade de cooperagao en- tre uma pluralidade de individuos operantes, j4 que as obras deles — A diferenca dos produtos isolados, individuais ou parciais, de outras artes — sao de natureza orquestral e, como tais, refletem muito mais fielmente o espirito da comunidade.” Na medida em que é produto de colaboragdo e, em sua construtividade, realiza o grau mAximo de sistematicidade (e, por- tanto, também de economia) no emprego dos diversos materiais, a arquitetura implica, em seu resultado formal, toda a gama das experiéncias feitas sobre todos eles, do metal ao vidro, 4 cor ou as fibras téxteis. Uma vez que essas experiéncias se desenvolveram nas diversas artes (por exemplo: a cerémica representa © Mais alto grau formal alcangado no uso de terras; a escultura, no da pedra; a pintura, no da cor etc.), a arquitetura, como absoluta constru- tividade, é 0 vértice de uma pirdimide cuja base é a moaréria, oua realidade em seu conjunto confuso e inorginico, e cujos lados sfo rtes que distinguiram, refinaram, depuraram as “quae das diversas matérias. Se & as diversa lidades” ou as possibilidades formais WALTER GROPIUS BA BAUHAUS 3 como pura intuigao espacial, era a idéia-base aveudiett experiéncia da realidade e 0 prineipie de todas as ar- . oderna, como construgao do espago, éa sinte- tes, a ok pncleneas realidade e 0 fim tiltimo de todas as artes, se eee uma atividade coletiva, vn expansao nao depende dos individuos, mas dos interesses da ohanie Acons- trugao pura, livre de fins (Zoveshenabuene)s oa unicamente da vontade de um povo inteiro.” Essa impostagao do problema da praticidade arquitet6nica é completamente nova. A arquitetura nao pode propor-se fins praticos, porque tem seu fim em si mes- ma; ela nao é um meio para a solugao de certos problemas, mas a solugdo de todos os problemas; enquanto representagao de um mundo que resolveu as préprias antiteses, nao pode admitir exi- géncias que nao tenham sido resolvidas j4 em seu processo. Sem divida, a arquitetura é construgao do espago, ou melhor, é 0 pré- prio espago em seu construir-se; mas, como a constru¢ao resolve todos os problemas da realidade e da existéncia, isto é, as infinitas telagGes dos homens entre sie com as coisas, 0 espago da arquite- tura é a dimensao da vida social em sua complexidade e totalida- de. Somente nesse sentido, como sfntese da vontade de um povo inteiro, essa construgao pode ser inteiramente pura ou desinte- Tessada. arquitetura classica, a : Os elementos constitutivos do espago sao o ntimero e 0 mo- ne é 5 Ses imento. E somente com o ntimero que o homem distingue as Coisas, compreende e or, bilidade permite ao obje mir forma propria (...) ganiza o mundo da matéria. S6 a divisi- to destacar-se da matéria original e assu- niza Os ntimeros, te he ee chamesne: Do eee ee sentacao do nosso céreb : eee © OVURED EO} SOc Ceito de infinito, Se 5 reuse I potente para apreender 0 con: medida em que jie vida, nés vivemos 0 espago infinito na 40 espaco com meios rane do Todo, mas s6 podemos dar forma NOss0 indivisivel E, 'mitados. Percebemos 0 espaco com todo 0 4, com a alma, coma inteligéncia, com 0 cot A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 53 po, e lhe damos forma com todos os nossos Orgaos corporais. Atra- vés da intuigdo e da energia metafisica que absorve do Todo, o homem descobre 0 espago imaterial da aparéncia e da visdo inter- na, dos fenémenos e das CriagGes ideais; intui as telagées entre Seus meios representativos, entre as Cores, as formas, os sons e, com eles, dé forma concreta a leis, nGmeros, medidas. Mas esse espaco da intuigao exige realizar-se no mundo material; a matéria € dominada pelo cérebro e pela mao. O cérebro concebe 0 espago matematico em termos de ntimeros e dimensées (...) A mao apreende 0 espago material sens{vel fora de nés; elabora-o segun- do as leis da matéria e da mecAnica, pesa e mede a substancia material que determina sua solidez, suas propriedades mec4nicas € construtivas. Domina-o com a habilidade manual mediante o instrumento e a mAquina. “Contudo, 0 processo criativo de uma representa¢ao e elabo- ragao espacial é sempre simultaneo (...) O espago artistico viven- te s6 pode ser construfdo por homens cujos conhecimentos e cuja habilidade técnica obedegam a todas as leis da estatica, da mec- nica, da 6tica, da actistica, e que encontrem no dominio comum dessas leis 0 meio seguro para tornar viva e corpérea a idéia que trazem em si. No espago artistico, todas as leis do mundo real, es- Piritual e intelectual encontram uma solugao simultanea.” Em resumo: a forma é a forma da nossa finitude, que sem dii- vida nos permite representar-nos 0 infinito sem fornecer-lhe limi- tes convencionais (caso da geometria euclidiana e da perspecti- va), mas reconhecendo sua ilimitada divisibilidade, isto é, admi- tindo que, da matéria original e compacta, objetos possam desta- Car-se e assumir uma forma prépria. Sons, formas, cores nao sio elementos da realidade que o artista escolhe e compée, mas nos- 80s recursos interiores, os simbolos da nossa finitude, pelos quais vamos delimitando ou definindo a realidade infinita; por isso, © espago “imaterial” ou “artfstico” que resulta dessa unidade entre finito e infinito, entre consciéncia e realidade, é ao mesmo tempo WALTER GROPIUS E A BAUHAUS ss © da aparéncia ou do fendmeno, e da visio interna ou da o-espage |. Se a propria aparéncia, ou fendmeno, j4 é um resyl- criagao ideal. ostumeiro processo que vai da aparéncia senso. = 2 Bend formal perde todo valor; 0 espago “material” ne sae (elembremos a obserwacsoansloga de Fiedler) jdnao é um espetdculo que atinge nossa emotividade, mas sim uma rea- lidade que pegamos com a mao, no ato de exeouian um trabalho. Nao podemos fugir a essa manualidade; sem ela, no entrariamos em contato com o infinito da matéria ou da realidade; nossa finitude ou humanidade, em vez de ampliar-se, iria Testringir-se até desaparecer: j4 nao estarfamos no mundo. Para esse fazer, portanto, nao é possivel designar outra causa ou outro impulso que nao seja a utilidade imediata, a Pressdo até mesmo fisica da realidade que quer ser definida, porque esse con- tinuo definir € a nossa existéncia, a condigao que nos torna seres reais. Por isso, no espago artistico ou na forma compdem-se e se resolvem todos os problemas, que nds mesmos j4 nao podemos distinguir em prdticos e ideais. Por isso, ainda, a arquitetura é a Soma ou a sintese de todas as artes, de todos os modos do “fazer”; e, em sua absoluta construtividade espacial, resolve também, com os problemas especificos a que cada arte isolada responde, todos os problemas praticos da existéncia: ela € 0 caminho mais seguro de comunicagao do Eu com 0 Todo. Uma vez que, na unidade e na continuidade do fazer, as diversas Personalidades nao sao sepa- Taveis zer é eis (de fato, 0 fazer é Presente absoluto, ao Passo que as diver- Sas personalidades se distingue vem; do mais h quais eles vivem e das quais se ser- , als Proce ‘umilde utensiio, estende-se necessariamente, num ‘SSO. Continuo, a articula, complexo de v4 c $40 estrutural do edificio, desta ao egtacce - edificios e distribuicao deles segundo as exi- e 5 UNcionais da comunidade, até chegar a designar A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 55 a forma da cidade, a abranger todos os aspectos do mundo orga- nizado. Aos que se escandalizavam com essa tedugao da arte a con- tingéncia da vida, com essa aparente limitagdo ao microcosmo do utensilio, do mével, da pagina tipografica, Gropius podia respon- der que, pelo contrério, havia ampliado o alcance da arte a ponto de incluir nela, junto as formas minimas da utilidade cotidiana, as formas m4ximas da ordem social; numa palavra, todos os momen- tos da cultura. O microcosmo do utensilio tem seu horizonte no macrocosmo do urbanismo. “O erro pedagégico fundamental da academia consistia em apostar no génio e nao na média.” A colaborag4o exclui 0 arbitrio sublime do génio, exaltagdo suprema do individuo. A colabora- ¢4o é, por si mesma, um fato social e pressupde no agir artistico certos principios e processos comuns, cuja validade se estende necessariamente a toda a esfera social, unindo os dois momentos —criar 0 objeto e desfrutar dele — da produgao artistica. Assim, 0 processo formativo da arte, ou a pedagogia artistica, desenvol- ve-se em circulos cada vez mais amplos, até identificar-se com 0 processo formativo da sociedade, com o seu continuo progresso. A batalha do Arts and Crafts e do Werkbund tinha dado o primeiro passo no caminho da “reconciliagao do mundo da pro- ducdo com o mundo dos artistas criadores”; contudo, “a educa- Gao técnico-pratica permaneceu diletantista, e continuou a des- tacar em primeiro plano 0 esbogo desenhado ou pintado”, conce- bido com vistas a um desenvolvimento picté6rico ou plastic, e nado a uma execugao mecénica em série. O processo da produgao em massa & muito diferente do pro» cesso da produgao de objetos isolados. O artesio, ¢ claro, conce= be o objeto numa certa matéria e para UM Certo USO, MAS COMSeE vaa possibilidade de modifiear o desenho inicial ao ena fecgio, Essa possibilidade, ademais, ¢ um earditer necessanio, re WALTER GROPIUS E A BAUHAUS trabalho. A confecgao ocupa um certo tempo ¢ se desenvolye Por fases sucessivas; cada uma representa uma experiéncia que ngo podera ser ignorada no processo ulterior. Como hé um Progresso no conjunto da produgao, ha um progresso entre tipo e tipo, en. tre exemplar e exemplar do mesmo tipo, entre fase e fase do mes. mo exemplar. Os objetos mais perfeitos so aqueles que Condensam a maior soma de experiéncias, embora complexidade nao signifi. que complicagao. O artifice convive com a matéria, aprende a conhecé-la trabalhando-a, transforma-a, torna-a sensivel a0 seu mundo afetivo e imagindrio. Os tipos poderao ser modificados no trabalho sobre cada um, para corresponder a exigéncias Particula- res, as solicitagdes de uma determinada classe ou das Pessoas a quem se destinam. Se, ao contrario, a execugdo for confiada 4 mé4quina, toda a série de experiéncias que 0 artesao realizava no trabalho deve ser prevista e sinteticamente inclufda na ideagao. Uma vez que se deve ter, de safda, uma experiéncia perfeita, ne vanetur, das possibilidades da matéria, ela deverd ser uma expe- néncia tedrica, embora adquirida com um longo tirocinio pratico. O mesmo se pode dizer da forma: também esta nao pode ser mo- dificada durante o processo executivo, nem pela intervengio de fatos subjetivos nem pela intengao de corresponder a pedidos es- pecificos. No programa da Bauhaus, A teoria da matéria corres- ponde a teoria da forma, o corol4rio comum As duas € 0 standard, 0 produto da média pela média. Economicamente, ele consiste em obter um maximo de qualidade com o minimo custo; socialmen- te, sua difusao nivela as diferengas exteriores, de usos e costumes, entre as diversas classes; e assim, mantendo inalteradas as neces” sarias diferencas de fungao, anula as diferengas de grau entre 0 integrantes da comunidade. A unidade entre teoria da matéria e teoria da forma que se '° liza no standard tem também uma justificagao mais profunde. e Cluida a priori qualquer posigao objetivista, s6 temos da ete! conhecimento que adquirimos ao utiliz4-la ou ao nos servirmos 0°” A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 57 ao longo do secular desenvolvimento da tradigdo artesanal: nao existe uma abstrata teoria da madeira, da pedra ou da cor, mas uma teoria da madeira, da pedra ou da cor em relacao ao nosso uso da madeira para confeccionar méveis, da pedra para esculpir, da cor para pintar. Toda teoria da matéria esté, portanto, em funcao da forma; e, de fato, é na forma que a matéria revela sua “qualidade”. O tipo, o standard, esté em fungao da reprodugdo mecanica em série. Embora isso possa parecer um paradoxo, o standard é uma garantia do respeito pela autenticidade da ideagdo e um remédio contra o perigo da monotonia. Enquanto a industria repetia de maneira aproximada, isto é, exemplar por exemplar, formas pen- sadas para o trabalho artesanal, a monotonia nascia da repetigao das mesmas particularidades formais; ao contrdrio, se 0 objeto é pensado como generalizagao formal e a méquina se limita a repro- duzi-lo em milhares de exemplares, haverd identidade e nao uni- formidade, porque cada objeto conservaré intacta sua qualidade de “original”, da mesma maneira como um texto poético nada perde do seu valor sé porque foi reproduzido em milhares de exem- plares. Dessa maneira, 0 standard elimina a mediagao do objeto, como coisa que responde a uma utilidade prdtica, e determina o contato direto do publico com 0 valor ou a “qualidade” da forma. Nesse sentido, o standard modifica profundamente a relagao entre o ptiblico e o objeto: este j4 nao poderd ser contemplado ou frufdo por sua singularidade, pela exceléncia do artifice ou pelo contetido de histéria humana que se mesclou a historia da sua formagao, mas poderd apenas ser usado com a racionalidade e a precisao funcional que ele mesmo impde com sua forma. Oobjeto artistico possui doravante a capacidade de condicionar a existén- a como principio operante de clareza e de cia, inserindo-se nel: : mo tal, j4 nao possa ser objeto de jufzo es- ordem; e ainda que, co’ tético, introduz nos atos da existéncia com os quals se conecta uma experiéncia estética, conferindo a cada um deles um pleno senti- do de realidade. WALTER oRoplus BA BAUHAUS ss ao curso preliminar. O obj gogica da Bauhaus er ity ata valorizagao dos ree reconhecimento € a ex! rd dividuais”. Tratava-se sobretudo de “liberar no riadoras”, evitando, contudo, “qualquer empe- determinada linha estilfstica”. Por isso, o problemas da observagao e da representa- e ideal entre forma e contetido”. O jo- a “liberagao” emancipando-se “dos s” e tomando consciéncia dos “li- A base peda tivo deste era “o sos expressivos in aluno as energias © nho voltado para um ensino se limitava aos go, visando “a identidad vem artista pode alcangar ess esquemas convencionais j4 morto mites impostos pela natureza as suas ener tem categorias formais; para um aluno, o “meio original de expres- para outro, o claro-escuro; para um terceiro, a gias criadoras”. Nao exis- s4o” seré o ritmo; cor etc. Cada um desses meios € um simbolo no qual a conscién- cia finita abrange a realidade infinita. Na primeira orientagao do curso preliminar estudada por Itten sobre bases essencialmente pedagégicas, dava-se grande importan- cia ao exame de antigas obras de arte segundo os métodos analiti- cos da “pura visibilidade”, outro indicio de que a Bauhaus se ori- ginava mais das teorias da arte contempordneas a ela do que de uma determinada corrente figurativa. Essas andlises visavam a es- clarecer a estrutura interna da forma e investigar seu processo genético, assim como a desenvolver no aluno a capacidade de en- tender quais processos levam uma dada matéria a evoluir até a forma. Em outras palavras, decompunha-se um quadro do Meister Franke ou ae Bosch para demonstrar como uma certa madeira pode coun oe uma cadeira, ou ome vidro na forma de Viewioducne Pp sas desde a matéria até a forma um ses limitam acom = es Senses holier Preensao critica da ob que a i : es eee vezes de alguns tone Ou esquematiz se eniion ing ante; Evidentemente, tais anéli- ra de arte; nao porque nesta ao exame formal, mas por~ mo busca de um motivo, 4 : 5 , Por natureza, generalizant! “mas No convém esquecer que € o produto d A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 59 uma tendéncia critica destinada justamente a generalizar a com- preensao do fato artistico. Sem essa limitagdo, que anula todos os elementos chamados por Berenson de ilustrativos e sobre os quais se concentra a atengao dos buscadores de “poesia”, seria eviden- temente impossivel justificar o quadro ou a est4tua num plano de valores, segundo um grau de efetiva “utilidade”, que possam ser alcangados igualmente por um mével, um tecido ou uma compo- sig4o tipografica. Por efeito dessa esquematizagao, que a des- personaliza, a obra de arte torna-se acessfvel a todos os compo- nentes de uma sociedade, enquanto participantes de uma condi- g4o cultural comum. Em seguida, o curso preliminar compreendia o estudo parti- cularizado da “natureza”; mas, como a natureza s6 é pensdvel como conjunto, a anélise desenvolvida sobre a estrutura interna ou as qualidades das diversas matérias visavam a deslocar 0 interesse di- rigido 4 natureza como complexo de nogées para a realidade en- quanto desenvolvimento. E claro que a matéria nao pode ser pen- sada como um determinado “objeto”; a percepg4o da matéria em sua singularidade pressupde a superagdo da concepgao do espago como unidade ou homogeneidade (lembremos a idéia-base do espacgo como divisibilidade) e, portanto, a superagao da visao naturalistica. Sendo impossivel dispor as varias matérias como outros tantos “elementares”, objetivamente individualizados, na prdtica esse processo se concretiza mediante a regressao do dado da experiéncia empirica para um grau pré-naturalfstico ou pré- sensorial; qualquer dado de experiéncia, ainda que seja um objeto j4 produzido pela mao humana, retorna ao grau de matéria se for abstraido das costumeiras leis da visao espacial. Eliminando 0 espago como unidade métrica independence da matéria das coisas, e renunciando assim a posig&io de objerividade ou de distanciamento que assumira com essa concepgio do espa- 0, 0 artista entra em contato imediato com a TONS percede-a em sua singularidade, isto &, no fato de ser sla, Ob8CA ote CORNY WALTER GROPIUS E A BAUHAUS 60 duictil ou fridvel, rfgida ou eldstica etc. Todo rente, lisa ou &spera, jogo, a fim de um contato mais pleno ; | entra em jogo, See aia ais profunda na realidade. Essa atitude e de uma agente utilit4ria ou profissional, na medida cee cn é sempre encarada tendo em “s alguma Coisa a ser feita e os meios para fazé-la. Portanto, a matéria nao é algo determinado, com certos contornos e caracteres, mas uma possi- bilidade. De fato, a avaliagao das propriedades da matéria no se dé numa relagao de proporgées, mas na experiéncia conjunta da mao e da ferramenta. A relac4o entre varias matérias depende da di- versidade das sensagdes que elas produzem no agente; e a nova espacialidade que essa relagao determina esta estreitamente liga- da a experiéncia que este adquiriu e adquire operando sobre elas. As pesquisas desenvolvidas na Bauhaus sobre a associagao de di- versas qualidades de superficie (textures) visavam precisamente 4 determinagao de uma nova espacialidade, interna A matéria, varia- vel segundo a associago de materiais diversos, resultante das ten- SOes, atragdes ou repulsées entre eles, O espago € produzido e construido por essas relagGes entre diversas qualidades de maté- ia, do mesmo modo como a associagao de metais diversos produz um salto de potencial elétrico e Provoca o nascimento de uma energia. Como a experiéncia que se tem da Matéria esté sempre per = =) trabalho; essa nore espacialidade € insepardvel do PO" da experiéncia, da familiaridade que se estabelece entre eon eee sobs a qual ele ph Dessa forma, a idéia paso continuo oy on eae constante é substitufda pela ss es- €spago-tempo e esta ja sere eee oe ot mee veladora Petspectiva para Late eee eee . ie a contemplacao da criagdo, mas sim a dimensao do fa: er eter} d é, a dimen zer ou do d i re minar a realida i i e, ISCO 1 S40 do Presente absoluto, A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 61 dos cursos superiores: basta pensar no curso de Klee, que remon- tava a origem da forma explicandoa linha como 0 percurso de um Ponto em movimento e a superficie como 0 produto do movimen- to de uma linha, chegando a figurar a realidade nao como estru- tura espacial definida, mas como transi¢ao ou recuperag4o recf- proca de forgas ativas e passivas; ou o curso de Kandinskij, volta- do para a pesquisa de linhas de tensao, como indicios da consti- tuigao das imagens num espago a parte, resultante da atragdo ou da repulsdo entre linhas e cores. Tipico exemplo dessa concep- ¢40 da forma sao também os estudos sobre as sucessivas posigdes da mo ao tragar um desenho e sobre a influéncia dessas na de- terminagao formal: estudos que nao sé demonstram como se ten- dia a unificar ab origine o processo ideativo, mas também como j4 nao se reconhecia no signo uma representagao ideal, mas sim “alguma coisa” que efetivamente se cumpre ou acontece na rea- lidade. Quando a diregao do curso preparatério passa para Albers e Moholy-Nagy, a didatica essencialmente experimental e formativa instituida por Itten tende a transformar-se numa pesquisa formal mais direta. Permanece e até se desenvolve (embora com incon- testdvel recurso A collage e ao readymade surrealista) o principio de reconhecer a matéria original da arte nas coisas de uso corren- te, justamente naquelas com as quais temos relagdes de mera uti- lidade e que, nunca encaradas como objeto de contemplagao, nao estamos habituados a assumir como determinantes de uma visio espacial: caixas de fésforos, papel de embrulho, laminas de bar- bear, arames, jornais, fragmentos de tecido, tornam-se a nova Urstoff da construgao formal. Também j4 nao se tende a pesquisa mais profunda da matéria para além do espago naturalfstico destrufdo, mas sim a pura dialética de reverter a nogdo na anu- nogao, do espago naturalistico no espago abstrato, do espago ho- mogéneo no espago divisfvel. Veremos como, sobre esse, trans formagao da didética da Bauhaus, influfram no s6 a diregdo Ceo WALTER GROPIUS EB A BAUHAUS a nbém a experiéncia construtiva que Gropius vinha rica, mas (af ; ’ desenvolvendo em sua a “ onan De fato, essa € a fase mais nitidamente Construtivista” da Ye Tato, mais interessantes das experiéng; Bauhaus: es nee por induzir uma espacialidade, - eae - equivalentes hipdteses espaciais (desde ja, nao oe tomar 0 espago senao oe hipdtese), numa sped cie: como, por exemplo, o deseny olvamente e uma forma plasti- ca, de infinitas formas plasticas, a partir da simples superficie de uma folha de papel, mediante uma série de cortes e de dobras, Aparentemente, nada além de um passatempo de jardim-de-in- fancia complicado ao infinito, e supomos que para isso tenha con- corrido a proximidade de um espirito ao mesmo tempo ingénuo e sofisticado como o de Klee, assim como a intengao pedagégica mais direta de investigar as origens primeiras da forma no construtivismo instintivo da crianga, o qual se exerce por livres e sucessivas de- signagGes formais, sem se determinar num problema positivo da realidade e sem que em algum momento a forma se apresente como forma de alguma coisa. Na verdade, esses exercicios formais visa- vam a demonstrar experimentalmente que a superficie, o volume &, em geral, todas as costumeiras categorias da forma nao estao ancoradas na realidade objetiva e podem transmutar-se livremente uma na outra, assumindo valores diversos e determindveis somente em relagdoa vontade Construtiva que as designa; e Por isso s40 a0 mesmo is € ilus6rias, 56 f es nO tempo teais e ilusdrias, s6 sendo Possivel tal distingao por teferéncia a uma Teal; Podendo obter tal ce S40 imaginéria do re: idade externa objetivamente certa. Nao s¢ Tteza, € impossivel indicar na arte a supera- hipotese, da one dominio dela € o da poseibilidede da “oncretude inicial; Pen Problema da matéria perde sue bilidades infinitas; 1 ao J& nao € sendo a dimensao das possi- S€ UM processo ad i i Sens de limite, toda construgao torna- ‘nitum; & sempre uma série ilimitada de for- my mas. Entao are x ae ‘ Producao em série torna-se 0 processo intrinseco A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 63 da ideagao formal e a maquina, o mais direto recurso expressivo do artista: e, sob esse ponto de vista, 0 problema da arquitetura j4 nao é determinével na singularidade dos edificios, mas nur siste- ma produtivo que vai da pré-fabricagdo ao urbanismo. O “desenho” j4 nao é 0 meio grafico com o qual se abstrai a forma a partir da acidental matéria da coisa; “desenho”, no senti- do ativo de “projeto”, é intuigao de relagdes construtivas ou espa- ciais dentro da matéria e por isso j4 nao é um abstrair a realidade pluridimensional em duas dimensées, mas um concretiz4-la em todas as dimensées. Por isso o desenho se liberta da manualidade da agdo grafica, que, como tal, ocorre sempre num espago e num tempo naturalfsticos. Moholy-Nagy, assim como, nos mesmos anos, Man Ray e Eckner, de fato recorre 4 maquina fotogrdfica, que su- postamente pode registrar o puro dado éptico, isento de altera- ges emotivas e de habitos nocionais. Na verdade, a “construgao” ou “desenho”, quando jé nao se trate de uma construgao intelec- tualfstica e, portanto, destinada a compor uma natureza, nao mais se desenvolvera sobre a, mas dentro da percepgao, que, também ela, é ato: por isso, a origem e o desenvolvimento da forma sao buscados no prdprio processo de fotografar ou nos momentos su- cessivos que também compéem a percepgao instantanea. Dai as pesquisas sobre a estrutura formal da percepgao: os sucessivos fotogramas de um corpo em movimento, a impressao direta dos negativos, as fotomontagens, as fotografias com raios R6ntgen ete. Os coroldrios dessa posigéo construtivista so facilmente verificdveis nos varios ramos de atividade da Bauhaus e em sua extensao a todos os atos da existéncia nos quais haja um interesse “visual”, Sendo toda constituigao da realidade em imagem, a n- gor, o produto de uma atividade artistica mais ou menos consciente € organizada, disso se deduz que © mundo s6 obters sua ar ra “forma”, adequada a situagao atual da humanidade, qua todos os processos formativos tiverem sido levados ao mesmo grau ot WALTER GROPIUS BE A BAUHAUS de conseiéncia e organicidade; isto 6, quando tiver sido eliminada a sobrevivéncia dos processos empiricos aos quais nos acostuma- mos e que repetimos por inércia. Em todos os ramos do ensino artistico da Bauhaus, verifica-se © mesmo processo evolutivo das formas do artesanato as da in- duistria. E facil reconhecer, na insisténcia inicial sobre os tipos € os processos da arte popular, uma atitude populista, substancial- mente anéloga dos artistas russos de vanguarda (recorde-se 0 entusiasmo de Antoine Pevsner pela pintura de tradig4o bizantina, de Kandinskij pelos temas decorativos e pelas cores da arte popu- lar, de Chagall pela imagerie dos ex-votos e da pintura esponta- nea). Também na Bauhaus, 0 apelo ao artesanato mais tradicional e folclérico exerce fungao antiburguesa e visa a revalorizagao de um Volksgeist artfstico contra o gosto genericamente cosmopolita das classes burguesas, mas com a intengao de levar para a produ- ¢4o industrial as genuinas forgas criativas e a antiga experiéncia operativa das classes trabalhadoras, reconhecendo-lhes o direito a participar da diregao da produgao. A oficina de mobilidrio, dirigida por Marcel Breuer, é a que experimenta mais diretamente as posigGes tedricas e a evolugdo artistica de Gropius. Entre 1921 e 1925, prevalece o emprego da madeira, e 0 objetivo principal é o de estabelecer uma transigao dos tipos da confecgo artesanal a novos tipos pensados para a confecgao industrial — € ocostumeiro processo da ferramenta a maquina. E certo que a busca da “qualidade” ou determinagao formal da matéria conduz a esquematizacao e tipificagao dos ele- Mentos construtivos; mas a ripa e a madeira maciga permanecem como - motivos dominantes de uma carpintaria que mergulha suas rafzes na tradigdo popular. E evidente a telagdo entre esses méveis pesadamente articulados ea casa Sommerfeld, construfda . por Gropius em 1921. A partir de 1925, contudo, as Pesquisas da oficina de mobiliério voltam-se para tipos concebidos Para a produgo industrial total is te A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 65 mente independentes da tradigdo e da técnica do artesanato. £ jus- tamente de 1925 a primeira cadeira de tubo metélico criada por ae a propria matéria, o tubo metilico, j4 é um produto industrial; nao mais sendo concebivel um processo involutivo, que se realize com a intervengao de uma técnica artesanal sobre um material produzido pela industria, a produgao industrial é agora o nico processo expressivo admitido por esse tipo de criagao. O mével de metal elimina a estatica maciga do mével de ma- deira e a substitui por um conjunto de linhas tensas e curvas elds- ticas, que visam a secundar os movimentos espontaneos do corpo humano. Seu carter é mais grafico do que arquitet6nico; ele nao ocupa um espa¢o, mas trama-se ou se desenha neste; por sua ima- terialidade, mais que uma coisa pousada no espago, € a conjetura de um nosso estar-no-espago. Nao é sendo um encontro de coor- denadas, um lugar ou sitio espacial abstrato que a presenga da pessoa humana tornar4 vivo e concreto. Ocorre-nos que até mes- mo sua possibilidade de dobrar-se, desaparecer, reencaixar-se no vazio, nao depende tanto de uma efetiva oportunidade pratica quanto da secreta persuasao de que esse objeto s6 existe quando é usado, de que ele comega e acaba junto com certos atos da nossa vida. Breuer dizia jocosamente que, de progresso em progresso, acabaremos sentando-nos em esguichos de ar; 0 sentido oculto, a metafisica que se esconde sob a racionalidade desses esqueletos metialicos é toda uma pesquisa dos ligamentos invisiveis que nos suspendem no espago como estranhas marionetes que, em vez de moverem-se num cenério fixo, movem com a trago de seus fios o proprio cendrio em que agem. Nao se trata mais de passar da matéria a forma; como © ponto de partida j4 € uma forma (0 tubo metélico), 0 processo € construr ao formal: da unidade a complexidade, por meio de projegoes Su cessivas. E, por esse caminho, o mével se reintegra a erquitetura, nao mais entendida como representagio estatica e plistica de um espago definido, mas como dimensio das infinitas possibilidades da vida. WALTER GROPIUS EA BAUHAUS Observa-se a mesma evolug’o no tratamento da cermica, que rmas artesanais e popularescas, pole- micamente contrapostas a superfluidade e 4 complicagao dos ti- pos prediletos do gosto burgués, para chegar & determinag4o de formas simples para a produg4o em série. E andlogo 0 desenvolvi- mento da oficina de metais, que no infcio acerta 0 passo com oO programa do Werkbund (interpretagao da matéria através de uten- sflios e de técnica), mas, num segundo momento, agora confiada 4 orientagio de Moholy-Nagy, muda rapidamente de diregao; abandonam-se os metais preciosos ¢ o trabalho manual, polariza- se o estudo sobre o trabalho industrial do ago cromado, do alumi- nio, do niquel, sobretudo em relag4o aos equipamentos de ilumi- nag¢ao. Muitissimos tipos de difusores e de lampadas de mesa, es- tudados durante aqueles anos na Bauhaus, foram adotados pela indGstria e entraram no uso comum: nossos costumes no emprego parte da revalorizag4o de fo! da luz decorrem em grande parte das idéias da Bauhaus. Pela pri- meira vez, uma lampada n4o é concebida como um complicado objeto ornamental que incidentalmente serve para produzir luz, mas sim como a solugdo objetiva de um problema cujos dados sao uma fonte luminosa e um ambiente a ser iluminado. Ambos os dados so Sbvios, mas provavelmente teria sido dificil especificé- los se no se tivesse refletido sobre a relaco espacial existente entre urna fonte de luz ¢ uma 4rea a iluminar. De fato, somente a tipologia formal da nova arquitetura, com suas leves e claras paredes pen- sadas como telas méveis ou como diafragmas num espago conti- nuo, podia sugerir o desejo de uma difusao uniforme e sem som- bras fortes, quase urna saturag4o lurninosa do ambiente; assim como anys as oa paniet € a0 teto uma fung4o iluminante, en- anto superficies refletoras, Dess, luminosa — ¢ nao h4 cian : ae eae concha, em cilindros concéntri Whar. ae : oh phen Cos pretendem ser uma “forma” da em estabel lecer- undo saberia definir de outro modo cerae uanapeloate ae senZo como “de construgao”, A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 67 Seen ae O para chegar a uma identificagao ab- soluta entre luz e espago. Creio nao estar enganado ao atribuir a origem desse pensa- Ten construtivo sobre a luz ao proprio Gropius, que j4 em 1923 imaginava, para seu esttidio em Weimar, um sistema de tubos difusores orientados em diregSes opostas, correspondentes a dis- tribuigdo dos méveis e dos vaos livres. is eeolee da Bauhaus para um ideal de perfeita unidade ou “integragao” formal segue-se facilmente na decoragao mural. No injcio, a personalidade dominante é Oskar Schlemmer, um artista que sofreu a influéncia de Seurat e cubistas e a quem se deve uma curiosa teoria formal, o “compressionismo”. Na Bauhaus de Weimar, Schlemmer imaginou uma série de decora- ges murais em estuque e em pintura. Seu objetivo é 0 de “com- primir” na parede um espa¢o equivalente ao do ambiente, criando assim superficies capazes de compensar ou preencher o vazio deste. Trata-se de estabelecer uma identidade entre cheio e va- zio, entre espago real e espago figurado; de supor uma espacia- lidade continua, ilimitada, eldstica, adesiva, premente como um fluido no qual as pessoas se movem como peixes na 4gua. Dado que, em semelhante espago, nao é possivel distinguir superficies e volumes, pois falta a distancia 6tica e mental para a objetiva- go e a classificagao dos valores, postula-se a priori a identidade entre forma e cor. A parede é sempre uma perspectiva, Ou me- lhor, uma dupla perspectiva, uma tela na qual se projetam e se impregnam as profundidades que supomos aquém ¢ além: € um processo caracterfstico daquela progressiva anulagio do finito espacial, propria da Bauhaus e, em outras palavras, da arquite- tura de Gropius. Temos uma prova disso nos exercicios didaacos que se realizavam sobre a equivaléncia forma-con por exemplo, dado um certo contorno, recobrir uniformemente essa Area com a cor considerada mais adequada para “preenché-la”, E A BAUHAUS xn WALTER GROPIUS Embora engenhosas € sutis, as pesquisas de Schlemmer no campo da decoragao mural ainda sao uma luta contra o dado material; a decoragao se sobrepoe a parede, pretenid anulé-la ou subjugé-la, mas ainda a admite como limite extrinseco. Na Bauhaus de Dessau, por sugestao direta d para outras questoes, aparentemente mais banais: novos tipos de papéis de parede, absolutamente privados de elementos figurati- vos e cujo valor consiste exclusivamente na qualidade de superfi- cie, na “tessitura” ou na “granulosidade” da matéria. Também es- ses tipos, que em sua extrema simplicidade eram portadores das novas idéias espaciais, foram adotados pela indiistria e difundidos em vastissima escala. E indtil dizer que eles sao realizdveis exclu- je Gropius, os estudos se voltam sivamente por meios industriais; mais uma vez, contudo, a passa- gem do tipo artesanal ao tipo industrial pressupde um novo pro- cesso ideativo, facilmente reconhecivel como um processo de integragao ou de indug’o da forma — ou de um “desenho” — na matéria. Disso resulta uma nova matéria, absolutamente livre de referéncias naturalisticas, que nao é tecido, reboco, estuque ou pintura, mas ainda assim implica, sintetiza e supera todas essas diversas experiéncias formais e técnicas. Também é interessante observar que, para a determinagao desses novos tipos de revestimento de paredes, concorreram indubitavelmente as experiéncias que se vinham realizando no campo da iluminagao. De fato, na qualidade plastica da superfi- cle, em suas caracteristicas tacteis, esté implicita uma designagao espacial, quase uma profundidade e uma plastica “comprimidas” sobre o plano; e, como essa profundidade e essa plasticidade “in- tegradas” 3 {ci 6 a superficie representavam originariamente diversas ee fisicas de expansao ou de contengao da luz, a quali- a ie ; = . —_ ou téctil do revestimento é sempre transferivel a uma le fatos luminosos e avalidvel como grau de sensibilidade OU reativ: idade a luz. A qual, Portanto, é concebida como identi- ficada e i quase fisicamente amalgamada as paredes, que a absor- A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 69 vem, refletem-na, difundem- na e a refratam; e, assim como a luz tende a tornar- Se estrutura espacial, a arquitetura tende a resol- ver-se em volumes luminosos. O processo evolutivo do ensino de tecelagem repete o da de- coragao mural. Primeiro, assistimos a uma colocagao do problema em termos de artesanato: a pintura se sobrepée ao tecido, evo- cando esquemas popularescos que, como na ceramica, tendem a reafirmar 0 gosto genuino pelas cores vivas e pelas formas nitidas contra 0 vicioso gosto corrente pelas cores neutras, evanescentes, esfumadas. Como essa tendéncia remetia 0 tecido a uma esfera muito préxima 4 da pintura, que, precisamente em contraste com aquele gosto, buscava formas violentas e cores acesas, vemos re- fletirem-se nos tecidos os motivos de Kandinskij, de Klee, do cubismo. Comega-se a combinar as cores segundo um sentido e um ritmo espaciais. Essa espacialidade “induzida”, 4 matéria se integra e a modifica; assim, encontramo-nos diante j4 nao de uma matéria naturalfstica que exige ser assumida como forma, mas de uma mera conjetura ou hipétese de “matéria espacial” que sé exi- ge ser materialmente executada. O processo de integragao do es- paco na matéria acontece na concep¢ao; a matéria j4 é uma for- ma; 0 processo produtivo nao pode ser mais do que um processo mecAnico de estampagem e multiplicagao da forma concebida. Do objeto definido, no qual a matéria do tecido e da cor se organiza- va em tapete, xale etc., passa-se assim a pega de fazenda, & ete ria que traz em si, integrado 4 propria qualidade, seu proprio de- senho” que, contudo, agora s6 pode ser reconhecivel na oat ou no agrupamento de fios. Da matéria original passou-se aquela em vez de forma, “matéria formal”. Tam- modelos que influenciaram produgao téxtil. publicidade, do teatro, & fera de influéncia sobre os de introdusir na vida que poderfamos chamar, bém nesse campo a Bauhaus criou profundamente 0 desenvolvimento da Com a reforma da tipografia, da Bauhaus amplia ilimitadamente sua es} sos € costumes sociais; nao se traca apenas nw WALTER GROPIUS FA BAUHAUS cotidiana, através de objetos de uso comum, um senso mais preci- so da forma e, portanto, uma consciéncia mais lticida da realida- de, mas também de identificar e potencializar os centros da sensi- bilidade do homem social. Na tipografia, a renovagao se estende da forma dos caracteres } arquitetura da pagina e do livro. Nitidos caracteres lineares, extremamente simplificados, reduzidos a uma combinagao de re- tas e cfrculos ou semicirculos, uniformemente espagados, tomam © lugar das intricadas letras géticas e das barrigudas letras latinas feitas em claro-escuro. O emprego de um caractere tinico, que varia somente no “corpo”, é regra constante; elimina-se até o uso de maitisculas. Salta aos olhos a analogia estilfstica entre o desenho dos novos caracteres e 0 perfil dos novos méveis metilicos; eu ousaria dizer que os caracteres esto na pagina como esses méveis na arquitetura. Eles sao os elementos de uma composigado espa- cial, a pagina. A arte do paginador consiste em induzir ou integrar uma espacialidade na superficie da folha. Nao se trata de uma espacialidade ilus6ria que se superpde a superficie; como sempre ocorre na estilistica da Bauhaus, a espacialidade nao é iluséria (porque ilusio é sempre superagao de um dado objetivo), mas sim conjetural ou hipotética. Entre a superficie da pAgina e a espacialidade da composigao tipogréfica nao ha contradigao, assim como nao pode haver contradigao entre o plano da lousa e um sdlido geométrico representado sobre ela. Daf a liberdade mais absoluta dos esquemas Ccompositivos. A pagina tipografica é um meio pelo qual apreendemos fatos e conceitos independentes da forma dos sinais com os quais eles ~Sasat moeppaidsh ame te revolucionéria, de Shien a i do pedie A pégina Same 4 : aistas e surrealistas); 6 absur- Ceitos escritos nela; s6 se pode Pad a oo eer méxima clareza visual, fied re ans Pome pRaNs ne a leitura estd ligada a percepgao s6 aparentemen- A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 71 mecca ee cmttenre om i sal : plicada 4 compreensao do texto é a pagina escrita; esta é o instrumento que nos poe em contato com aquela Outra realidade escondida, o texto, que constitui nosso interesse imediato. A pagina é 0 espago, a dimensao, a condigao ou a forma da realidade em que ocorre esse ato essencial do ho- mem civilizado que é a leitura; a nitidezea ordem desse espago, a propriedade dessa forma sao as condig6es da plenitude e da vali- dade desse ato. Em sintese: durante séculos, os caracteres de im- prensa foram pensados em fungao da “escrita”, quase como rema- te epigrafico da obra literdria; agora, eles sao pensados em fungao da “leitura”, como um instrumento do leitor O mesmo aconteceu com a arquitetura: antes, ela estava em fungao do arquiteto cria- dor, na condigao de intérprete das supremas abstracoes religiosas e politicas; agora, esté em fungao do homem que nela habita, como instrumento da existéncia dele. O novo estilo publicitdrio talvez seja o tinico terreno sobre o qual a Bauhaus aceita 0 jogo polémico. Nele se retinem as expe- riéncias feitas nos campos cénico, fotografico, tipografico; e re- percutem com mais evidéncia certos temas e motivos de movi- mentos artfsticos contemporaneos como o surrealismo, inteiramen- te estranhos ou apenas marginais ao programa da Bauhaus. Os car- tazes publicitarios tradicionais cultivavam a mais estagnada inér- cia mental e a mais rasa imbecilidade do publico: vinhetas, as quais se pensava conferir maior capacidade impressiva recorrendo ao grosseiro expediente da caricatura. Aqui, ao contrério, chama-se a atengao mediante a evidéncia imediata de um elemento objet- vo (figura, fotografia, letras garrafais), quase sempre construido num espago irreal que 0 isola e o impoe A percepgao, imprimindo- ona memoria. As propostas da Bauhaus para uma nova fungao do teatro se encaixam no quadro de uma crise, cujos primeiros sinromas e montam ao fim do século XIX. A histdria do teatro esti ligada * WALTER GROPIUS E A BAUHAUS histéria da arte figurativa por um conjunto de relagbes que vai muito além da simples cenogr afia. A partir do Renascimento, tea- tro é pintura falada, pintura € teatro mudo; a Dare do teatro e da dintura é a ficgdo, o mundo do possivel. A crise do teatro, assim como a da pintura, comega com a cisdo entre o possfvel e 0 veros- simil; este permanece como objetivo supremo, enquanto 0 possf- vel nao € sendo o prolongamento do verdadeiro na imaginagao; se, a0 contrério, o possivel for pensado como 0 oposto do real, como ndo-ser oposto ao ser, o inverossimil é a forma prépria do possivel. Na medida em que se perde a certeza de uma realidade objetiva, a propria existéncia humana torna-se uma continua projegdo no possivel. Supondo-nos nas situagdes mais absurdas, colocando-nos por hipdtese nas conjunturas mais inverossimeis, rompemos 0 in- volucro das nogées habituais ou convencionais, saimos da paisa- gem naturalista que essas nogdes compdem ao nosso redor, obte- mos uma representagao extremamente viva e icOnica de nossa real situagao no mundo, da inacreditavel seqiiéncia de acasos, de con- tradigdes, de absurdos, de equivocos, de paradoxos com os quais, na verdade, se entremeia continua e imprevisivelmente a nossa existéncia. Todo o nosso ser, em sua cronica interna e externa, com seu secreto mundo inconsciente, ird refletir-se no ritmo do espe- taculo. Por isso as Tepresentagées do circo, do teatro de varieda- des, do balé, com seu séquito de imagens ao mesmo tempo banais e absurdas, idiotas e paradoxais, com sua franca e rasteira fisicidade, isbgece ce assumem uma se eid teatro dito profundo. Nao é de . ieee : oe oe a de uma crise dramatica taenamacs ae an = crencialmente na comicidade; €s0n, justamente naqueles anos, ‘obre a comicidade enquanto incidente, um ritmo “normal”, mas também enquanto a Problemética das relagdes entre o mundo al. Ainda que se insista na tecla da dor ou da Tuptura imprevisivel de A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 3 angtistia, osom que daf provém éo “grotesco trdgico” (exemplo:0 filme expressionista O gabinete do dr. Caligari, que realiza exata- mente 0 mesmo imprevisto de comicidade, embora num Tegistro emocional oposto). Naturalmente, esses problemas nao nascem na Bauhaus. Quem recordar o tom draméatico a Victor Hugo, de muitas pinturas de Delacroix, ou, em plano inferior, o paralelismo entre naturalismo pict6rico eo teatro verista do fim do século XIX, nao tera dificuldade em reconhecer que os primeiros indfcios de mudanga nas tradicionais telagdes entre teatro e pintura, com o deslocamento do dominio da “ficgao” naturalista para o dominio da realidade formal, j4 podem ser notados no interesse com que Os pintores modernos encaram 0 circo e o balé; comegando pelos toureiros e pela Lola de Valence, de Manet, pelas bailarinas, de Degas, pelas cangonetistas, de Toulouse-Lautrec, para chegar as amazo- nas, de Seurat e aos arlequins, de Picasso. Depois viera o tempo dos balés russos, dos “pintores no teatro”, da revolugao cubista no cenfrio e nos figurinos, da identidade entre cendrio, coreografia e miisica. O cinema introduzira uma nova idéia de espago cénico: o espago-fungao; e a propria objetividade perceptiva desse veiculo, sua imparcialidade no registro da série emotiva das imagens, leva ao mesmo tempo ao realismo (cinema americano) e 4 abstragao formal (Survage, Eggeling, Ruttmann). Mais de um motivo do teatro “sintético, atécnico, alégico, ir- real”, teorizado pelo futurismo italiano, entra na concepgao céni- ca da Bauhaus. O teatro total funde todos os tipos de espetaculo, envolve o espectador na agao, submete-o a uma violenta descar- ga de emogées, libera suas energias interiores e, pelo menos na intengao, fortifica sua capacidade de percep¢ao, sue sen de viver. Personagens, movimento, miisica, luzes, cores tema mess gram num organismo VIVO, NUM espago ant= oro. Schlemmer € 0 idealizador de uma 0 espago eénico como produro do movi> “construgiio” que se realiza e da qual importancia e se inte mado, colorido, son cenotécnica que assume mento e do ritmo, como uma " WALTER GROPIUS B A BAUHAUS os priprios espectadores participam; também os personagens tor- nam-se “formas espaciais”, a luz se projeta em formas sucessivas e prementes, cada designagao formal atinge uma sensibilidade ex- posta e determina reag6es imediatas. Os figurinos teatrais de Schlemmer, que fazem do personagem uma forma espacial em movimento, parecem inspirados nas foto- grtafias estrobosc6picas, que fixam numa tinica imagem as sucessi- vas situagdes de um corpo em movimento; 0 personagem se inte- gra ao cenario, determina o espago deste no decorrer do préprio gesto ritmico. Vale a pena perguntar-se por que, afinal, depois de despojar o teatro de sua antiga fungao moralista e didatica, se quer submeter 0 espectador a esse bombardeio de sensagdes; e por que se busca, com tanto empenho, “intensificar” a existéncia. A resposta € 6b- via: por existirem forgas que, agindo em sentido contrério, empo- brecem e mortificam a existéncia. E estas sao representadas pelo trabalho mecAnico, repetitivo, da indtstria. Evidentemente, pode- se objetar que esse tratamento desintoxicante nao elimina a causa do mal; e que esta s6 poderé ser eliminada restituindo-se ao traba- lho um caréter socialmente ativo, mediante a participagdo direta das mestrangas na iniciativa da produgao. Mas 0 remédio, embora nao elimine o mal, indiretamente o denuncia, nao se podia exigir mais do que isso de homens que eram os expoentes do capitalis- mo mais iluminado e avancado, mas, ainda assim, capitalismo. Com os objetivos Sociais, também a estrutura arquitet6nica do Co € atores. Sobre isso, basta lembra por Weininger, o teatro em forma de © ‘teatro total” idealizado Por Gro; F 0 teatro esférico projetado Uestudado por Farkas Molnar, Pius para Piscator. A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 15 As experiéncias realizadas no ¢: ‘ampo teatral e no campo. pu- blicitario convergem Para um nov. : a © ramo da arquitetura: a apre- sentagao de exposigées. Hoje, estamos tao habituados as surpre- sas dessa arquitetura publicitdria que dificilmente nos damos con- ta de que ela se baseia numa nova concepgao da relagao entre coisa e espaco. Aqui, 0 objeto jé nao “pousa” no espaco, mas se move, multiplica-se, age; no mesmo ambiente, criam-se Perspectivas miltiplas, cruzadas, cada uma das quais conduz a um fato diferen- te; a arquitetura é moldada pela necessidade de sugerir horizontes sempre diversos, de desaparecer ou de transformar-se de repente em objeto, em escrita, em chamamento; de afastar de sia atengao do visitante para polarizd-la sobre os fatos formais suscitados como por encanto. E também nova a relagao que se cria entre essa ar- quitetura proteiforme e transformista e seu habitante Provisério; porque o ambiente condiciona diretamente a existéncia do espec- tador, compromete-o, constrange-o a renunciar as suas nogdes espaciais de sempre, obriga-o a um estado de tensao mental, defi- ne imperativamente os objetos do interesse dele. Trata-se agora de um espago, no sentido mais preciso do termo, que se constréi com a propria vida, e que satisfaz imediatamente, com uma pe- remptéria clareza de formas, as excitagdes emocionais que ele mesmo solicita. A arquitetura é 0 vértice para 0 qual concorrem todas as ex- periéncias artfsticas da Bauhaus: é construgao absoluta, fora da construtividade intrinseca do espirito. J4 dissemos que ela nao tem fins préticos, porque 0 momento pratico ja nao é sppeesiel do momento tedrico, e a propria racionalidade nao tem exgresena ay do ato; pelo contrario, é liberagao em relagaoa pratica. “A air os consideram um prinefpio fundamental, na ma fungao clarificadora. A liberagao da ar fusiio da ornamentagao, & relevancia dada adogiio de solugdes concisas & econdmi- nalizagao, que muit realidade é apenas u quitetura diante da pro’ As fungGes estruturais, @ i) WALTER GROPIUS E A BAUHAUS uramente material do processo formal o da nova arquitetura.” Até a beleza © uma conseqiiéncia pratica da forma; de fato, um dos caracteres “ » secundarios da arquitetura éode corresponder com um “prazer ‘ de transformar a necessidade prati- cas representam 0 aspecto P de que depende o valor pritic estético A urgéncia da pratica, ; ca num desejo de clareza formal, de satisfazer com a “representa- ¢G0” as instdncias da “vontade””. Junto ao problema da pratica, resolve-se e elimina-se na ar- quitetura o problema da realidade empfrica ou da natureza; abre- se, como dimensio racional da vida racional, “uma nova visao do espago”. “Se construir € principalmente uma questao de métodos e de materiais, a arquitetura implica a posse do espago.” A distin- cdo entre construgao e arquitetura, como técnica e ideagao for- mal, é apenas aparente, dado que, nao podendo construir-se se- nao no espago, a construgao é determinagao da idéia espacial; mas é importante que a “viséo” seja uma “posse”, um efetivo estar-no- espago, um querer 0 espago. “Nés queremos que 0 organismo arquitet6nico nasga claro, nu e luminoso por uma lei interna sua, sem mentiras e artificios; que ele faga seu o mundo das maquinas, do rddio e dos automéveis; que manifeste funcionalmente seu sentido e seu propésito através da tensao interna e reciproca de suas massas e recuse tudo aquilo que ele pode dispensar e que esconde a forma absoluta do edifi- cio.” O mundo que a arquitetura faz seu nao é imével, natureza ae mas 0 mundo vivo e mével da sociedade. Nessa realidade, infinitamente mais ampla, ivel, j4 na 0 “senso de sivas ines deen ERE a iga forma arquitetonica”; “comega a delinear-se uma nova estdtica das ho- ee: que tenta contrabalangar a forga da gravidade”. J4 nao pamper assimétrico e ritmico”; “o novo ‘a nies eee ie bandeira a Superagao da inércia e ie és alae en sil ‘Omposigao das antiteses”. A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 77 Entre os muitos discursos, manifestos, programas e polémicas sobre a arquitetura moderna, € dificil encontrar Palavras mais cla- ras. Nao se opée por mero espirito de contradigéo uma dinamica da nova arquitetura A estdtica da antiga; mas ainda uma estatica, que ultrapassa 0 caso particular da forga da gravidade tradicional- mente expressa pelas verticais e se estende até compreender ou- tras séries de forgas, j4 nao redutiveis A Oposigao entre peso e empuxo, mas verific4veis na tensio interna e reciproca das mas- sas. O princfpio da simetria e do eixo central é substitufdo pelo principio da pluralidade de eixos e centros de equilfbrio; a recf- proca compensagao das “proporgées”, pela continuidade do rit- mo; a arquitetura das antiteses (peso-empuxo; vazio-cheio; hori- zontal-vertical), por uma arquitetura unitdria, sucessiva e conti- nua como a prdpria realidade. Para tomar consciéncia do nosso ser, j4 nao € necessdrio opor-lhe a idéia do nao-ser; nds somos, e isso € tudo. (No m4ximo, a questo que se apresenta é saber se esse nosso ser nao € também um nao-ser; e o nosso anseio por uma nova realidade, mais um modo de sair da realidade.) Das premissas formais, desce-se aos corolarios construtivos. As paredes j4 nao sdo elementos portantes, cuja situagao corres- ponda a identificagdo das forgas da gravidade, mas somente dia- fragmas que escandem e retalham 0 espago, determinando-o com telagdo ao principio de movimento que 0 gera, a0 momento da vida que se desenvolve. As janelas j4 nao sao yanias eatin: numa massa, a qual elas se contrapdem; vazio € cheio sao igual- mente elementos da realidade, entre os quais nao pode haver an- titese. Nao sao sequer separaveis, um cheio pode tornar-se figura- tivamente um vazio e vice-versa: 0 ideal formal da aes aaa 7 tura é a grande vidraga, que € ao mesmo tempo gat 5 ca “aes perficie e profundidade, exterior sre te Ce a ar”. tuar entre parede e parede com a impony annneieiill Jé nfo sendo possfvel nenhuma distingaio de a aula es go € tempo se identificam na arquiterura, como s WALTER GROPIUS EB A BAUHAUS tificado na filosofia fenomenoldgica ena fisica einsteiniana. Espago éncia, dimensao da vida consciente em seu os instantes da vida nao sao isécronos s variam de intensidade e de duragao, diversas segundo o ritmo de nossa existéncia, cada fragdo do espago tem uma extensao e uma dura- cdo varidveis segundo a intensidade e a diregdo da agao que Co por ele. Também pelo fato de a arquitetura acontecer na aueSSeo ou no movimento, nenhum dos elementos, por estarem circuns- critos no espago e no tempo varidveis da fungao, pode prever ou- tro elemento ao qual se contrapor. Ademais, uma tal contraposigao pressuporia uma determinagao formal que os elementos isolados nao possuem a priori, mas conquistam na “construgao” (lembre- mos como a silhuetagem classica dosava em cada elemento uma certa e invaridvel “quantidade” espacial). Nao mais possuindo essa é construgéo da consci desenrolar-se: assim como como os de um péndulo, ma tém extensao e profundidade determinagao formal, os elementos isolados j4 nao sao qualificaveis, exceto a posteriori, como massas, planos, volumes, isto €, como componentes de espago. O espaco nao € o dado, mas o resultado da arquitetura, cujo processo é justamente aquele que vai da uni- dade ao todo espacial por meio do movimento. Mas 0 que é a unidade de espago, e como se determina? A uni- dade-base da arquitetura é a forma tfpica, padronizada, o elemen- to pré-fabricado. Na ideagao e na produgao dos elementos cons- trutivos pré-fabricados, esgota-se totalmente a relagdo entre ma- téria € técnica, porque o processo mecAnico da indistria repete o Processo mental que vai da matéria A forma. Desse modo € que a complexa e multiforme experiéncia do artesanato, exa que é sempre experiéncia da matéria, alcanga o limiar da pura construtividade. de uma equagao jé é uma entidade mate- de valor que ganhard concretude numé- 0 elemento pré-fabricado nao € matéria, | ouuma designagao de valor que ganha- ugao. Por meio da pré-fabricagao, a arqui- Assim comoa incégnita méatica, uma designagao Nica na solugdo, também mas urna entidade formal 14 concretude na constr A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 19 tetura resolve totalmente em Si a experiéncia do artesanato e se coloca no plano da Produgao industrial ou de uma plena utiliza- ¢40 dos modernos Meios produtivos. Por serem formas em Potencial, os elementos pré-fabricados nao s4o pensdveis como os elementos de uma composigao fecha- da ou finita, mas somente como 0s elementos de uma série ilimi- tada, que se desenvolve segundo um ritmo de espago-tempo, isto é, segundo o decorrer de um movimento ou de uma fungao. Por isso, 0 resultado légico da pré-fabricagao nao é a arquitetura, no sentido tradicional da palavra, mas o urbanismo como arquitetu- ra estendida a toda a 4rea na qual se entretecem e se desenvol- vem as relagGes de colaboracao econdmica e social de uma comu- nidade. Sabemos que, no conceito moderno, o urbanismo nem mesmo € delimitavel ao complexo urbano, mas se estende ao con- junto das atividades produtivas de uma comunidade organizada. O urbanismo, portanto, jé nao é uma premissa geral da arquitetu- ra, mas sua forma histérica atual; de modo mais preciso, uma ar- quitetura entendida como “atividade coletiva”, resultante da von- tade “de um povo inteiro”, imagem e instrumento de seu “pro- gresso”. De fato, o tema fundamental do ensino arquiteténico na Bauhaus era a combinagao de unidades formais tipicas (Einzel- Raumkérper) em relagao a diversos tipos de nticleos e de fungdes sociais; e, j4 em 1923, passava-se do estudo das unidades edilfcias isoladas para o estudo da coordenagao entre elas pues da fun- gao de uma comunidade organizada, que, no caso) especifico, era a propria Bauhaus (projeto para a Bauhaus de Weimar). Na industrializagao dos elementos da SEC Ice CERO ao Sante to de obras, no standard, na relagao entre pré-fabricacao e eben nismo, acreditou-se ver o fim das possibilidades coe — es da ater eka an om a ee ee en eens torna-se evidente que 6, ela mesma, determinante de espago, 80 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS tipicidade das formas-base nao limita as possibilidades das combi- nagdes espaciais, tanto quanto, na pintura, © emprego de cores puras néo limita a infinita variedade de combinagées mee elas. Sabe-se que a cor pura nao € a cor elementar, mas a cor een ta”, em cuja determinagao nao intervém nem fatores naturalfsticos (luz, atmosfera) nem preconceitos espaciais (perspectiva, claro- escuro, tom). De igual modo, a unidade formal tfpica € aquela que pode ser situada na construgao independentemente de qualquer condicdo estatica ou perspéctica preestabelecida. A concepgao de arquitetura que procuramos apresentar tem mais de um ponto de contato com o programa formal do grupo De Stijl, formado em Leyden, em 1917, por Theo van Doesburg, Mondrian, Rietveld e Oud; em 1922, atrafdo pela vigorosa agao renovadora da Bauhaus, o De Stijl criou em Weimar uma segao que, contudo, nao chegou a fazer parte organica do instituto. Mesmo assim, a tangéncia entre os dois é importante, e sem diivi- da a andlise das formas arquiteténicas elaborada por Gropius pode ser, em mais de um aspecto, comparada a anélise das formas pic- toricas elaborada por Mondrian. A anélise de Mondrian nao se debruga sobre 0 dado sensorial, mas sobre o dado perceptivo; como a percepgao nao est ligada uma atribuigdo de valor, seu processo consiste substancialmente na passagem dos “valores” da nogao naturalistica ao “nao-valor” da percep¢4o pura. J4 nas pinturas de Mondrian entre 1911 e 1914 evidencia-se a busca de uma espa- cialidade aperspéctica, puramente dimensional ou direcional, que, excluindo toda semelhanga naturalistica, coloca-se como lugar da Percepgao pura. A partir de 1917, Mondrian se dedica a uma de- eames mais rigida das coordenadas espaciais que fixam a condigao da percepcao, entendida como perfeita impassibilidade emocional e absoluto “nao-valor”, Pode-se afirmar que a pintura ‘va; seja qual for a ordem de seus ™pre 0 zero espacial. A pintura, amado, em certo perfodo (1914- de Mondrian é uma pintura reduti fatores crométicos, 0 produto é se ue © préprio Mondrian tinha ch, A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 81 1917), “do see do menos” (isto 6, signos + e -), pode resumir- se numa operagao aritmética. Ele divide campos de cores com li- nhas horizontais e verticais; assim, obtém zonas cro} tativa e quantitativamente diferentes, que ele reduz a igualdade compensando a diferenga quantitativa com a qualitativa e vice- versa. Pode chegar até a pura reticula negra sobre fundo branco — ou seja, até a rentincia ao dado material da cor — designada somente como “sitio espacial” pelas coordenadas lineares. Esse é © ponto de chegada, ou de interrupcao, da andlise formal de Mondrian: 0 ponto em que, superpondo-se e identificando-se percepgao e forma (ou uma e outra igualando-se a zero), j4 nao é possivel qualquer processo formal ulterior. mAaticas quali- Gropius compreendeu perfeitamente o indubitavel limite formalistico do grupo De Stijl e do neoplasticismo; e nao se pode falar de uma verdadeira influéncia dessas correntes sobre a Bauhaus, exceto em alguns esquemas de composigao tipografica. Contudo, aquela experimentagao sobre as relagGes entre percep- ¢40, espacgo e forma representava uma contribuigdo importante para a Gestaltstheorie que Gropius vinha elaborando como teoria mesma da arquitetura. Através do princfpio da divisibilidade (que é principio de movimento, isto é, o oposto da imobilidade contemplativa), Mondrian havia reduzido a pintura a uma planimetria de zonas coloridas e substitufdo a representagao plastica ou pictérica do espago por uma pura designagao espacial; sua pintura nao éaima- gem que se realiza, mas um esquema ou uma formula que deters mina no observador uma certa condigdéo mental que o habilita a conceber imagens espaciais; ela é, ou quer ser, em substancia, um modo de visao ou uma atitude diante da realidade que a posse desse esquema formal determina permanentemente no ee Analogamente, na arquitetura o valor se desloca do — lo da forma realizada para o esquema gerador da forma, para a ’ jens metria, para o prinefpio de divisio e distribuigdo do espagos esse 82 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS esquema condiciona a existéncia do individuo que habita 0 espa- go da arquitetura, constrangendo-a a acontecer, ate mesmo nos minimos atos, dentro de um certo plano de civilizagao, transpon- do-a de uma condigado de mero naturalismo para uma condigao de plena socialidade. A planimetria pictérica de Mondrian tem o propésito de conduzir 4 condigdo mental da percepgao 0 observa- dor que se encontra na condig4o mental da nogao, eliminando tudo aquilo que, nesta ultima, € convengao, habito, tradigao vi- sual; a planimetria arquiteténica nao quer tanto corresponder a certas demandas utilitarias objetivas (que sao, também elas, 0 pro- duto de habitos inveterados de vida ou de convencées sociais e preconceitos de classe) quanto clarificar essas demandas, isto é, reduzir o utilitarismo empirico e voluptuoso a uma necessidade efetiva, absoluta, racional. Se toda subdivisao espacial corresponde a um certo comple- xo de atos necessdrios, e se todos os atos da vida que se integram numa fungao sao igualmente necessdrios, todo compartimento espacial de uma planimetria racional tem um valor absoluto, é uma “unidade”, um Einzel-Raumkérper. Reconhece-se a perfeita racionalidade de uma planimetria justamente por isto: todos os espacos que ela divide, seja qual for sua extensdo métrica, se ni- velam como valores espaciais absolutos; em cada unidade, en- contra-se a mesma completude ou clareza espacial; nenhum hiato de espago inerte ou formalmente impreciso subsiste na concisa economia da planta. A e558 altura, €legitimo Perguntar-se qual situacdo humana , Partir desse momento se torna um dos Sener dominantes na polémica da arquitetura, nao é em abso- uto um programa emergencial, form colapso econdémico, A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS a3 problema que a nova arquitetura extrai da edificagdo utilitaria comum e faz seu, como Principio de determinagao formal, de es- tilo. Eo quantum que a fungao social, na econo mento progressivo, destina a existéncia do ind quantum, por excesso ou por falta, significaria s fungao, diminuir 0 nivel de vida de muitos para elevar o de pou- Cos, criar descompensacées, admitir dolosamente, na fungao so- cial, a intervengdo de causas tetardadoras e dissociantes. O Exis- tenz-Minimum €, portanto, a condigao de vida propria daquele asceta moderno que, para Troeltsch, é 0 Protagonista do capita- lismo industrial das classes médias, aquele que cré na “ilimita- bilidade e infinitude do Principio do trabalho” e deseja que este mia de seu movi- ividuo: sair desse ubtrair energias 4 nao sirva tanto ao gozo e ao consumo quanto “a continua amplia- ¢4o do préprio trabalho e a cada vez mais vasta reprodugao do capital”. Uma tal sociedade, que nao quer e nao pode erguer os olhos do préprio trabalho para contemplar o tranqiiilizante espetaculo da natureza nem conhece outro meio de salvag4o que ndo seja um fazer cada vez mais comprometido, exige no entanto que o exfguo fragmento de realidade no qual cada um de seus atos se cumpre seja extremamente claro e tenha contornos definidos. S6 assim esse “fazer” nao mais sera expiagdo de uma culpa original, mas um positivo conhecer e construir, Gestaltung. A clareza da forma sera a confirmag4o da validade do agir, assim como o fato de ela ser sempre inconclusa, infinitamente prorrogdvel ou reprodutivel, aberta a possibilidades ilimitadas, ser4 a prova de sua adesao a uma existéncia que € sempre “possibilidade a realizar”. Por isso a arquitetura, suprema expressao da construtividade do espirito, ser4 o princfpio formal ativo, que se desenvolve na existéncia e a condiciona e a realiza. Também sua forma sera ao mesmo tempo clarfssima e inconclusa, prorrogével ¢ reproductvel ao infinito, até chegar a designar a fungio de uma cidade, a pla- nificar a produtividade de uma regio, a tragar as linhas diretivas se WALTER GROPIUS B A BAUHAUS do mundo: daquele mundo que, dizia Heidegger, ist nie sondem weltet. Recusando qualquer poética preestabelecida, a didatica da Bauhaus constréi uma teoria da arte cujo caréter € o de nao ser separivel do processo criativo. Toda forma € simultaneamente teo- ria e praxis, conceitoe ato. O principio da nao-figuratividade, que esté na base dessa pedagogia artistica e de todas as correntes artis- ticas da época, é justamente o principio de uma forma que nao é, e sim se faz; de um fazer ou criar que, através do objeto artfstico, passa do produtor ao consumidor do bem artfstico sem perder seu carater de atividade. Como mero “processo”, 0 produzir artistico ocorre no contin- gente. O mundo, em si, nao é bom nem mau, nem belo nem feio, nem racional nem irracional. Na verdade ele nao €, e sim se tor- na, € o processo formal é justamente o processo de seu devir. Daf o aberto interesse da Bauhaus por qualquer movimento ou cor- rente, desde que tivesse cardter de absoluta contemporaneidade ou atualidade e, assim, testemunhasse uma condigo presente. Nas formas da Bauhaus encontramos vestigios de cubismo, de futuris- mo, de expressionismo, de surrealismo, de neoplasticismo, de suprematismo; mas trata-se de um cubismo sem veleidades gnosiol6gicas, um futurismo sem tumultuados fundamentos nacio- nalistas, um suprematismo sem niilismo, um surrealismo sem com- plexos sexuais e transformado num jogo de paradoxos. A expe- riéncia dessas correntes determina o plano de atualidade, ao qual se aplica, como processo clarificante, a Gestaltungstheorie da Bau- haus; mas esse reconhecimento objetivo da atualidade ou da ne- cessidade histérica daqueles fatos ou daquelas correntes nao bas- ta para explicar, em sua complexidade, a telagdo entre a Bauhaus € uma poética nitidamente definida, como a do grupo De Stijl, ou , com artistas profundamente originais, como Kandinskij ou Klee. A dissensao entre Theo van Doesburg e Gropius, que teve A PEDAGOGIA FORMAL DA BAUHAUS 85 momentos bastante Asperos, foi inclusive Tecentemente objeto de discussao. O fato de a poética do De Stijl ter tido uma influéncia extremamente importante sobre a Bauhaus, e até determinante no que se refere 4 mudanga de enderego entre a primeira fase, de Weimar, e a segunda, de Dessau, foi abertamente teconhecido pelo proprio Gropius. Mas “as Preocupagées de van Doesburg acerca dos problemas de forma pura nao combinavam com 0 ideal da Bauhaus no sentido de educar o individuo no interesse da comu- nidade inteira”. Em outras palavras, Gropius reconhecia a impor- tancia das propostas formais de Doesburg, mas nao podia nem queria ligar a escola e condicionar sua funcdo didatica e social a um determinado “estilo”, que deveria ser assumido como dogma, porque seu objetivo era sanar uma situagao, estabelecer um certo método de trabalho, reatar por meio da arte certas relagdes de colaborag4o social, e nao afirmar e sustentar uma determinada teoria da forma. De resto, a polémica entre o De Stijl e a Bauhaus revela bem mais claramente seus motivos profundos quando, em vez de representé-la na divergéncia entre Doesburg e Gropius, nés a con- sideramos dentro da nitida oposigao existente entre a pintura de Mondrian e a pintura de Klee. A posigao deste ultimo, no com- plexo didético da Bauhaus, sempre foi subavaliada, ainda que ele tenha estado ligado a escola até o fim por um profundo interesse e, no ensino, tenha procurado transfundir as mais preciosas expe- riéncias de sua arte rarfssima. Mas que relago essa arte baseada numa personalfssima Erlebnis pode ter tido com o poe racionalistico, e extremamente concreto, da Bauhaus? NG Ambito desse programa, dedicado a inserir valores de “qualidade’ na pro- ducdo quantitativa da indistria, cabe justamente a ae o a qualquer outro, o mérito de ter aprofundado o we ve bi valor de uma “qualidade”, que certamente nao se podia definir com as formulas de novos sistemas proporcionais Ou Con os an da secgao durea. £ Klee quem adverte que “qualidade” nao ¢ um So WALTER GROPIUS E A BAUHAUS a “forma” perfeita, mas um valor que cres- o interno da existéncia humana: o pro- co sobre a aventura interior, o fruto da petivel das experiéncias humanas. valor constante, ou uM ce e amadurece no temp duto de uma longa meditaga mais pessoal, singular e nao re} Por esse caminho, e nao por um ‘ a ele chega a identificar o momento supremo da “qualidade” com a idéia e quase a prefigurada experiéncia da morte: a experiéncia derradeira, que nao pode ter continuagao ou desenvolvimento, e &somente nossa. De fato, que outra coisa, afora o obscuro aflorar da idéia da morte, proporciona por contraste um valor seguro a todos os atos da existéncia e, mais ainda, escande-os e os define, rompendo a continuidade da série deles, situando-os num espago e num tempo, dando-lhes 0 claro limite de uma “forma”? E que outra coisa, afora esse pensamento secreto e recorrente, introduz na vida, e entremeia com todos os seus momentos praticos, aque- la insopitavel metafisica que em v4o o pragmatismo moderno acre- dita haver derrotado e banido para sempre? Assim, com o tema dessa constante referéncia a uma experién- extremo pessimismo romantico, cia derradeira, ressurgem a necessidade de um compromisso mo- ral — secreto mas vivissimo — na atividade artistica e a certeza de que a contribuigao a coletividade s6 pode ser a de uma experién- cia pessoal, conscientemente vivida ou sofrida. E é justamente esse motivo humano que explica o valor de mito que o industrial design reconhecerd e identificara no objeto, para além de sua prépria funcionalidade (pensemos na obra de Breuer, o mais direto cola- borador de Gropius); e que ex, hati oma ene a © um insustentavel rigor de princi- pios e com i om © retorno ao empirismo ou a brusca conversa ao mito naturalistico do “organico” plica de quais exigéncias partird mais A ARQUITETURA DE GRopius (1911-1934) Behrens trabalhava naquela fabrica de turbinas da AEG! que inaugura a nova trajet6ria da arquitetura industrial alema quando Gropius, diplomado dois anos antes pela Technische Hochschule de Munique e vindo de uma longa viagem pela Europa, entrou Para 0 esttidio dele, como assistente. Mais de um plano de detalhamento daquela construgo limpida como um cristal e exa- ta como um teorema deve ter passado pela prancheta do jovem; e nenhuma outra experiéncia podia reforgar tanto 0 desenvolvimen- to de suas atitudes mentais como a de assistir ao nascimento da- quele edificio, expressdo caracteristica dos novos ideais do Werkbund. Nas exatas proporgées dessa obra, que desmaterializam a massa numa calculada combinagao de linhas e superficies, 1é-se © antincio de um novo tempo. A indiistria saiu de sua dificil incu- bagao: j4 nado é o monstro mecAnico que destrdi o espirito e tampouco, ao contrério, o novo espiritualismo que sublima a ma- téria. Ela é a imagem do proximo destino do mundo, o horizonte de uma civilizagdo que se sente livre ¢ segura de si assim como a antiga civilizagao helénica de que falavam os poetas e os filssofos. A nova civilizagao diviniza 0 “corpo” social como os antigos gre- ‘Allgemeine Elektrizitiits Gesellschaft (N. da T). S88 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS gos divinizavam o corpo fisico; o trabalho € o segredo da nova beleza, assim como 0 exerefcio fisico era o segredo da antiga. Todo fazer torna-se um educar, um educar-se, uma pedagogia. A peda- gogia da arte equivale a uma idéia da arte como pedagogia: a arte € a forma perfeita de um mundo que é um contfnuo formar-se. A Faguswerk, construfda por Gropius em Alfeld, em 1911, com a colaboragao de Adolf Meyer, é concebida dentro desse espirito. Escreve Pevsner: “Seu projeto ultrapassa nitidamente o de Beh- rens para a AEG. Somente alguns detalhes de janelas mostram a influéncia de Behrens. No bloco principal, tudo é novo e cheio de idéias brilhantes. Pela primeira vez, a fachada inteira é concebida em vidro. Os elementos portantes reduzem-se a sutis colunas de ago. Nos angulos, nao hé sustentagdo alguma, solugdo que desde entéo foi imitada varias vezes. Também o valor do teto plano é modificado. Somente nas construgdes de Loos, anteriores a Faguswerk em alguns anos, temos 0 mesmo gosto pelo cubo abso- luto. O contido equilfbrio de Behrens entre horizontais e verti- cais foi abandonado; aqui, um movimento horizontal para diante, de enorme eficdcia, domina a composig¢ao.” A Faguswerk, sucessivamente remanejada nas alas menores, deve ser avaliada segundo a complexa articulagao entre os varios blocos, distribufdos no espago segundo as exigéncias precisas da fungao produtiva. Tal distribuigao se apdia nas coordenadas espa- Ciais indicadas pela vertical da chaminé e pela horizontal da lon- ga tubulacao aparente, as quais corresponde a justaposi¢éo, em angulo reto, dos dois ediffcios Principais. Esses dois elementos es- tritamente funcionais, chaminé e tubulacdo, te estranhos a tradigao estilistica que fixav: omen sean sal sieiee Gehan satis oe an de diregao Opostos num coordenadas espaciais tee, e a ae ere peutaar aeetat aps situagdes espaciais, Desaparece ei ences bei E howe assim, toda possibilidade de arti- Por serem inteiramen- @ para cada elemento A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) a9 cular os elementos construtivos : Por meio de modinaturas oy de nédulos plasticos de forga; a composigao arquiteténica torna-se uma construgao geométrica de planos Paralelos e Ortogonais Sendo apenas indicagées direcionais, essas coor denadas sao, evidentemente, reversiveis: cada uma dela Ss pode representar igualmente, em telag4o a outra, o Principio e o fim do &spago cons- trutivo. Este, portanto, tem infinitos Pontos de vista, todos inter- nos e coincidentes com um Ponto vivo, seja este cheio ou vazio, da construgao. Ao estabelecer essa condigao visual, Gropius apre- senta 0 primeiro postulado de sua arquitetura: 0 edificio s6 tem um valor de determinagao espacial, ou seja, um valor estético, para quem se situa dentro do seu €spago e, nao mais podendo objetiva- lo, vive e atua nele. Como quer que se mova a Pessoa no Ambito desse espago, uma vez que a contraposi¢ao daquelas diregdes ou coordenadas per- manece invaridvel, todo fato formal é sempre referenciado ao ab- soluto da pura horizontalidade e da pura verticalidade: as pers- pectivas podem variar ao infinito, mas a soma de seus valores é sempre constante, isto é, sempre igualmente capaz de satisfazer a necessidade de determinago espacial que est ligada a todo ato da existéncia. Dizemos entao que a primeira caracteristica — ao mesmo tempo metafisica e prdtica — dessa arquitetura é a de rea- lizar a priori toda aspiragdo cognoscitiva, de saciar a necessidade de forma que é a raz4o profunda de toda ago, de construir aquela idéia finita do infinito que é a esséncia mesma da consciéncia humana, de resolver numa representagao a continua tensio da vontade. : s Se 0 espago j4 nao é uma realidade certa e consistente, mas sim um devir ou construir-se cuja lei dindmica interna ou Cujo esquema de agregagao a arquitetura procura ¢ Sees que nao se poderé realizé-lo ou materializé-lo, mas meee woe lo numa sucessio ilimitada e continua de situagoes ou ideagiio (desenho); ¢ isso 4 arquitetura volta a ser puro projeto 90 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS pode constituir um interessante aspecto humanistico, até mesmo plat6nico, da arquitetura de Gropius. Mas essa ideagao implica e resolve, em sua propria formulagao racional, o momento pratico da execugio; sob tal ponto de vista, a ideagao é uma agao absolu- ta que resolve a priori a infinita casufstica da pratica. As formas j4 nao sao classificdveis como massas, superficies, volumes, porque esses valores s6 sao reconheciveis num espago preordenado e cer- to, no ambiente fixo da natureza; ao passo que elas nascem com o espago que designam, compdem para a vida um ambiente de infi- nitas dimensdes, como as da prépria vida, e no qual j4 nao € pos- sivel distinguir entre espectadores e atores, agao € cenario, certo e provisério, real e ilusdrio, parado e mével, positivo e negativo. Por isso é que essa arquitetura nao deseja tanto realizar uma ima- gem mental, torn4-la verdadeira na natureza, quanto congeld-la ou fix4-la em sua propria imaterialidade, remeter ou levar 0 proje- to, intacto, a espacialidade indefinida, impor a esse infinito a for- ma pela qual a mente humana, em sua finitude, o concebeu; e, portanto, sub-rogar a idéia 4 natureza, do mesmo modo como a vida do homem “civil” ocorre como continua superposigao de suas “possibilidades” internas 4 realidade que se lhe opde. Essa idéia da forma como designagao de um espago nascente, e por isso irredutivel a historicidade da natureza e de seus efeitos, tende espontaneamente a explicar-se numa matéria o menos con- sistente e estavel possivel, espacialmente e plasticamente impon- deravel, inencontravel na natureza: o vidro. Se recordarmos a distingao de Alberti entre a superficie, que pertence fisicamente as coisas e€ constitui a epiderme sensivel pela qual elas confinam com 0 espago, € o plano, como pura secgao ou projegao de pro- fundidade, sera facil reconhecer que o vidro, do modo como Gropius o emprega, esté sempre em fungao de plano e nunca de superficie. E que Gropius visava justamente ao plano, como pura entidade espacial, parece suficientemente demonstrado pelo fato de que, na Faguswerk, os delgados suportes da cobertura nao coin- A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 91 cidem com as arestas do bloco, onde as laminas de vidro se en- contram em Angulo reto: quer- se que o plano envidragado nao tenha limites de contorno; que ele nao encontre, uma quina, uma medida de superficie, e nao receba porgao definida de altura e largura, uma precisa e j G40 espacial. na firmeza de , de uma pro- mutavel situa- Tais vidragas, de resto, nao valem por si sds, mas pela profun- didade ou pela estrutura interna que, por transparéncia, é legivel através delas; pelo espago oposto, interno e externo, que se espelha nessas laminas refletoras; pela Superposigao ou penetragao reci- proca desses dois espagos, 0 de cd eo de 1d, sobre esse diafragma Suspenso € incorpéreo. Desaparece assim, como vérias vezes se observou, toda separagao entre o espago externo € 0 interno, coi- sa que logicamente deveria acontecer, porquanto, havendo-se desde 0 principio apresentado o espago como extensao nado designavel por limites, mas somente por indicagGes ou diregées, todo o espago ja estava unitariamente Suposto como interno, isto €, nado como vista, mas como lugar da agao e do movimento. Naturalmente, assim como a profundidade legivel para além do vidro destréi a superficie como tela sélida, a vidraga destréi a profundidade como vazio efetivo e pratic4vel. Transcrevendo-se nos limites da armagdo metilica das vidragas como sobre papel milimetrado, 0 vazio deixa de manifestar-se como efeito natura- listico de massa ou de penumbra atmosférica e vale como mera hipétese ou possibilidade de espago. Em outras palavras: esse pla- no envidragado nao é um “valor” expressivo de espago, mas uma condigao, e precisamente uma condigao de divisibilidade, pela qual duas regides espaciais opostas, mesmo superpondo-se e interpe- netrando-se, quase fundindo-se em fluxo continuo uma na outra, constituem-se em imagem. : etneck Podemos entao assinalar, nessa arquitetura to MotVACA pe a eventualidade pratica, um claro processo abstrativo, ~ m : obter a imagem ou a forma a partir de uma precisa relutagac oe WALTER GROPIUS E A BAUHAUS nogio espacial estatufda e a tradicional positividade da forma: proceso dialético que se concretiza justamente na oposigao do prin- cipio da divisibilidade ao princfpio can6nico da homogeneidade do espago. Basta um exemplo: para que as reduzidas 4reas em al- venaria nao oponham ao suspenso diafragma de vidro a certeza tangivel de uma superficie e nao constituam assim uma referéncia s6lida, para além da qual a profundidade venha a readquirir, por forga de antitese, uma substancia fisica de atmosfera, essa exigua zona de alvenaria é levemente recuada em relag&o ao plano das vidragas. Esses diversos fatos formais, j4 nao referenci4veis a um primeiro plano e a um horizonte, definem-se assim numa mével e reciproca relatividade de valores: a superficie, que deixou de ser tal porque se tornou o plano de projegao da profundidade, ou a profundidade, que deixou de ser tal porque se projetou e se ins- creveu sobre a superficie, colocam-se ao mesmo tempo aquém e além das estreitas faixas de parede e, a despeito da concreta evi- déncia de matéria por parte destas, situam-nas numa zona pura- mente conjetural ou hipotética. A construgao atinge assim uma qualidade grdfica que a reme- te, € isso justamente pelo processo construtivo, a integridade for- mal original do projeto desenhado, do mesmo modo como 0 pro- cesso mec&nico restitui, concretizada no objeto, a integridade da ideagao inicial. J4 nao pode ser deixada nenhuma margem aos “efeitos” de luz e sombra, a articulagao plastica das massas e dos volumes e, menos ainda, ao imprevisto de relagGes afins entre a arquitetura e o espaco da natureza. O edificio, enquanto mero lugar espacial, nao pode situar-se no €spago naturalistico: seria como admitir que, ao término de uma reagao quimica, pudessem ser Sees intactos, junto com o composto, os componentes da palace te6rica, essa inatac4vel frieza dian- direta ou indiretamente, cites ne i Teun a licida e tsicitgetica eats Orga persuasiva ou emotiva, essa » €m suma, de que a obra de arte A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 93 nunca pode ser um “efeito” Porque é, por natureza, uma “causa”, saoindicagoes clarfssimas do ponto de partida de Gropius; ele nao mals aceita a natureza nem como salvacéo nem como pecado, j4 est além de qualquer possivel classicismo e de qualquer possivel romantismo. A segunda obra importante data de 1914 e foi feita para aquela exposigao do Werkbund, em Coldnia, que pode ser considerada a demonstragao do expressionismo arquitet6nico. Convém lembrar que, 4 onda de wagnerismo que dali a pouco desembocar4 nas primeiras obras de Mendelsohn, no se subtraem nem mesmo os mais severos representantes da arquitetura industrial: sao de 1912 a fabrica A. G. de Poelzig, com suas pesadas e opressivas massas quadradas, e a Wasserturm de Behrens, que repete obsessivamen- te o tema da massa cilfndrica. Na exposigao do Werkbund, 0 tea- tro de Van de Velde molda novamente no exterior os vaos do in- terior, como se 0 edificio tivesse sido extrafdo do escoamento de uma matéria plastica; massas quadradas contrastam com paredes em curva, linhas retas tragam o perfil dos blocos. Hoffmann dese- nha o pavilhdo austrfaco num solene e funerdrio “adagio” de pilastras caneladas. A Glashaus, de Bruno Taut, no pesado simbo- lismo da grande abdbada facetada, celebra wagnerianamente o mito do diamante, criatura de luz expressa pelas visceras escuras da terra. Em tal cenério, 0 prédio de escritérios e a galeria anexa das mAquinas, construfdos por Gropius com a colaboragao de Meyer, deviam parecer pouco mais do que corretos exemplares de prosa construtiva; mas eram, ao contrario, a palavra mais nova, 0 mais audaz fato construtivo. Das duas fachadas do prédio de escrit6- rios, uma € dividida em duas ordens, a primeira de pilares baixos, em ladrilho, e asegunda totalmente recoberta por vidragas; a oucra 6 uma cortina compacta de alvenaria, percorrida por delgadas es- trias verticais ¢ realgada, embaixo, por um portal plano, levemen- te saliente. O revestimento em vidro, que Nos lados da primeira o WALTER GROPIUS E A BAUHAUS fachada desce até 0 solo, formando dois breves corpos avangados, estende-se até os flancos e se conclui, nos lados da fachada opos- ta, por duas torretas semicilindricas dentro das quais ficam as es- cadas em espiral. Também na cobertura, 0 ritmo é mais movimentado do que na fabrica de Alfeld. Sobre a parte central da fachada envidragada, corre um Atico baixo, flanqueado por dois corpos mais elevados, de teto plano fortemente saliente; na fachada oposta, esses mes- mos corpos formam o plano de fundo para a superficie mural, cuja cornija eles rematam com a saliéncia dos tetos — os quais, pai- rando acima da construgdo, coordenam as partes desta e ligam, em perfeita unidade e continuidade construtiva, os quatro lados do edificio. O movimento das massas articuladas sobre eixos dife- rentes compensa a regularidade do perimetro fechado, restabele- ce a continuidade entre espaco externo e interno e desenvolve, numa visdo circular e continua, a composigao s6 aparentemente simétrica. A essa nova complexidade construtiva corresponde um novo valor da matéria: as superficies ganham corpo e espessura; Os vos se escavam, escuros e profundos, nas paredes de ladrilho; as vi- dragas se nublam, tornam-se telas difusoras; as pesadas cornijas salientes ressaltam a profundidade afunilada das entradas; as massas se articulam em charneiras evidentes, as quinas transformam-se em dobradigas no encaixe dos planos. Justamente naquele perfodo, comecavam a ser conhecidas na Europa as obras de Wright; e Gropius se inclui entre os primeiros a intuir a nova idéia de espago que se expressava naquela plastica din’ Zo aka namic: A enérgica projegdo de tetos e cornijas, a insisténcia nas horizontais, a articula a0 interna dos planos e seu encaixe fortemente marcado, © gosto verdadeiramente inesperado pela , qualificagao das superficies segundo a rea- eae pe se Superposi¢ao e interpenetragao das Propria seguranga com que o edificio se alvenaria aparente, a 40 delas a luz, A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 95 instala no espago sdo elementos demasiado caractertsticos da tem4tica de Wright para deixar supor uma simples coincidéncia ocasional. Mesmo que se queira explicar aquele vivo contraste das massas Como uma concessdéo momentdnea aos Motivos externos da corrente expressionista, da qual, na verdade, ele vinha-se afas- tando cada vez mais, permaneceria significativo que aquela nova Strebung construtiva se resolvesse em contato com Wright; do mesmo modo como os mais reflexivos pintores expressionistas vi- savam a liberar sua inquietagéo teligiosa na totalidade de cons- ciéncia da pintura de Cézanne. Isso significa que, entre tantos con- vites a sair de uma histéria que se fizera demasiadamente estreita e opressiva, Gropius teve a coragem moral de reconhecer a insu- ficiéncia de uma tradigdo que se dizia européia e de amplié-la e revigord-la com uma experiéncia mais abrangente e 0 mais dife- rente possivel de seu proprio temperamento. Por isso é que a apro- ximagao com Wright tem nao s6 0 sentido de polémica interna, que se encontra em quase todas as atitudes de Gropius, como tam- bém acontece numa agudizagao de espfrito critico e se conclui numa consciéncia mais clara da histéria. Wright nao era apenas 0 filho de uma civilizagao jovem e en- caminhada para conquistas maravilhosas, o pioneiro e o profeta de uma arquitetura que parecia extrair sua forga da propria natu- teza: ele era o homem que afirmava uma existéncia organica da matéria, indicando na forma geométrica 0 grau tltimo de um con- tinuo devir ou crescer dela (““o desenho € abstragao de elementos naturais em termos puramente geométricos”); o homem que apre- sentava a arquitetura como pura intui¢gao da realidade ou “plasticidade” que se determina com o proprio spaces o homem que, nesse espago arquitet6nico, nao via epnere ease uma _ . tureza espetacular e convencional, mas a propria realidade em sua ilimitada fenomenologia. Wright era o homem que havia criado um novo € poderoso estilo construtivo com base nas premissas ideoldgicas de Ruskin e Morris, que Gropius também aceita como % WALTER GROPIUS E A BAUHAUS ponto de partida teérico, mas cujos magros corolérios figurativos ele nao podia aceitar da mesma forma. Hoje, a definigéo de Edoardo Persico para Wright — o Cézanne da arquitetura — nos parece extremamente aguda, mas unilate- ral e exclusivamente européia. Porém, se recordarmos que Persico encarava Wright sob um ponto de vista muito préximo ao de Gropius (que era o daimon platénico de sua alma européia), talvez compreendamos como Gropius podia voltar-se para Wright movi- do pelo mesmo impulso interior com que Rilke encarava Cézanne. Numa cultura que j4 se construfa inteiramente sobre simbolos abstratos, certamente nao era a mensagem whitmaniana ou a fra- grancia campestre da arquitetura de Wright que poderiam iludir uma consciéncia tao lucidamente européia como a de Gropius; mas sim a certeza inabaldvel de sua forma, que inscreve no mes- mo e preciso horizonte a consciéncia e o mundo e, no ato criativo de construir, esclarece e organiza o atropelo confuso, mas vivo e transbordante, das sensagdes. Na obra de Wright, Gropius sente a preméncia do problema do qual a Europa fatalmente se distan- ciava: o problema da realidade, do fervilhante mundo da matéria, de uma criatividade que impele e transforma esse mundo, justifi- cando nele a presenga ativa do homem. Sem esse contato, prova- velmente a Bauhaus jamais teria nascido, ou entdo teria perma- necido como uma admirével estilistica, em vez de apresentar-se como teoria da criatividade artistica e instrumento de uma alta pedagogia social. Masinem Por isso Gropius se abandona ao furor construtivo do americano. Ele imp6e a si mesmo uma obrigagao de coeréncia, empenha-se em explorar metodicamente, mas dilatando-os até abranger um novo horizonte de realidade, dos em Alfeld, sobretudo, 0 motivo da vid nhando oe ee fechado, mas buscando, no interior deste, OS! a ; wt si st lade de expansao e quase de impeto para o exterior, ni i {ci . iada qualidade das Superficies, um contato ora brusco e os temas desenvolvi- Taga continua. Dese- 4 A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) as abrasivo oe luz, ora apenas tangencial a ela, Gropius procura captar e assimilar & estrutura 0 espago empirico, o mundo da ma- téria filtrando-o, diria eu, através de Sucessivas tramas grdficas superpostas e cruzadas. A desconfianga em relagao a todas as simbologias formais nao cede nem mesmo diante da simbologia imediatamente poética de Wright. O vidro, para Wright, pode tornar-se ar, gua ou luz, se- gundo 0 caso; para Gropius, permanece objetivamente como um plano translticido. Mas, a diferenga de sua obra em Alfeld, 0 vidro j4 nao € uma tela sobre a qual uma estrutura interna se projeta, como sobre a pelicula de uma radiografia; € um diafragma corpéreo, embora de substancia inatural e instavel, que se insere no cerne da construgio e entra no jogo das massas e dos vazios, do mesmo modo como, nas pinturas cubistas, o fundo —o inatural, conven- cional, hipotético “fundo” da pintura tradicional — adquire um novo peso coloristico e espacial, projeta-se nos objetos, decom- poe e recompée esses objetos, substituindo aquilo que era s6 um denominador espacial comum a todos os valores por um expoente espacial que conduz cada valor ao mesmo grau de nitidez formal. Na fachada envidragada, os pilares pouco espagados da parte inferior escandem uma estreita alternancia entre cheio e vazio: um cheio e um vazio que parecem comprimidos, extrafdos ou es- cavados a forga de entalhe no cerne da compacta alvenaria. No alto, as massas quadradas dos corpos sobrelevados, aliviadas pelos tetos suspensos e salientes, expandem-se livres no espago aberto. A superficie envidragada estende-se sobre um plano proeminen- te em relacao ao dos pilares, inserindo, entre a fechada compres- sao da parte inferior e a livre expansao espacial da parte superior, © velério de uma profundidade projetada e entrevista, flutuante. Suprime-se assim a condigao de certeza espacial cm queresse eg traste podia, como tal, efetuar-se; e toda a composigo se Cranste= re das trés dimens6es habituais para uma quarta dimensio, mage 08 valores, j4 no podendo distribuir-se e proporcionarse ordena- 9s WALTER GROPIUS E A BAUHAUS damente, integram-se reciprocamente, cada um encontrando nos outros a definig&o ou 0 limite que j4 nao pode encontrar numa escala perspéctica ou na referéncia a um horizonte comum. Todos as valores alcangam ent&o o mesmo grau de emergéncia, a mesma atualidade ou evidéncia plena; e, quase por uma lei de gravitagao recfproca, ou por aquelas “reciprocas tenses internas entre as massas” de que 0 proprio artista nos fala, cada um deles se apre- senta, enquanto valor absoluto, como a sintese de todos os ou- tros. Como nao pode deixar de ser, visto que toda forma consigna, em sua finitude, a imagem do infinito. Se Wright havia falado de integridade plastica, aqui seria pre- ferivel falar de integragao construtiva; porque nao se visa tanto a imediag&o da intuigaéo quanto seu processo interno, uma autopro- dugao da forma. Exemplos tfpicos dessa integragao das formas na construgo: a compensagao a distancia, mas de estrita medida, entre 0 afunilamento profundo da entrada e os corpos sobreleva- dos; e 0 prodigioso equilibrio entre esses dois corpos balanceados eas gaiolas envidragadas que descem flanqueando, como volumes graficos e incorpéreos, a série de pilares do térreo. S6 iconograficamente € que a sucessao de delgadas pilastras na fachada oposta lembra a tematica neo-romanica do Werkbund; o propésito real desse tragado é o de ampliar a extensao 6tica da superficie para além de suas efetivas dimensdes, o de prolongé-la na duragao mais ainda do que no espago, aumentando assim sua capacidade de absorver a luminosidade condensada nos corpos envidragados laterais. A lembranga de Wright est4 patente no portal transposto, quase calcado e embutido no plano de fundo, e na insisténcia quanto as cornijas. Mas, também aqui, todo ressal- to plastico de massa se neutraliza em contravalores precisos, reabsorve-se e se dissolve no equilfbrio interno: a profunda esca- vagao da entrada, quase dilufda na massa pelas curvas suaves da abertura afunilada, combina-se a intensa e repetida contraposi¢ao entre cheio e vazio nas janelinhas laterais; a cortina de alvenaria, A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 99 que a cornija saliente empurra para uma zona onde a freqliéncia das pilastras j4 nao pode valer senao como vibragao luminosa, suspende-se como um diafragma flutuante entre cheio e vazio, e, €m Sua compactagao, resgata a imponderabilidade espacial da su- perficie envidragada da outra fachada. Este é, sem dtivida, 0 momento mais Pictérico do estilo de Gropius; mas somente no sentido de que, dissolvendo-se plena- mente a canénica sintaxe espacial na imediatez do ato construti- vo, os “valores” j4 nao se definem Por um seu constante contetido de espaco, mas pela vivae palpitante “sensagdo” espacial que trans- mitem. A construgao jé no visa a consolidar e magnificar em ter- mos herdicos, ou monumentais, as tradicionais nogées da realida- de ou do espago, fundamentar estavelmente a autoridade huma- na sobre as bases lapidares da experiéncia hist6rica; visa, pelo con- trario, a destruir em sua dialética todo sistema de nogdes, contes- tar o sistema légico da natureza, liberar na forma o mundo origi- nal e nativo da “sensag4o”, justamente no sentido que esse termo recebeu a partir da pintura de Cézanne (a petite sensation). Com- preende-se entao como a prépria luz, que aqui é admitida a parti- cipar da combinagao de superficies e massas, de vazios e cheios, j4 nao € uma qualidade do espago naturalistico ou um fluido césmi- co no qual o ediffcio imerge, mas sim uma qualidade interna da forma, um elemento ativo da construgio. De fato, basta observar como a luz se gera a partir da propria construgao, tem suas fontes e seus coletores nos dois corpos avangados de vidro, nas laterais das duas fachadas, e dali penetra variadamente em profundidade e derrama-se em superficie; e como, nas duas gaiolas convexas, laterais A cortina de alvenaria, essa fonte luminosa se traduz ae 4gil ritmo envolvente das escadas helicoidais, que fixam a rubrica de movimento sobre a qual se articulam todos trugdo e, ao mesmo tempo, a condigao de visa Assim se encerra aquele que podemos cha formagio de Gropius, com uma experiéneia que, os valores da cons- (0 do edificio. mar de perfodo da ultrapassando as 100 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS aspiragdes ideoldgicas e as experimentag6es técnicas da arquite- tura, a partir de agora se fundamenta sobre a Area, incomparavel- mente mais vasta, da cultura figurativa européia. A primeira construgo de Gropius depois da guerra j4 € um documento da didética da Bauhaus. A casa Sommerfeld é uma pequena residéncia em madeira. A lembranga de Wright é ainda uma lembranga de antes da guerra: remonta as Prairie Houses, embora, j4 em 1919, na Holanda, Oud se atormentasse com os algoritmos espaciais de Midway Gardens. Mas, em 1915, Oud ain- da estava na érbita de Berlage, e sua passagem para o neoplas- ticismo acontece na linha dos estilismos graficos da Secessao. Para Gropius, Wright permaneceu como 0 heréi da profecia de Morris: para além da temitica das horizontais e das cornijas acentuadas, 0 interesse se dirige 4 matéria ristica, 4 carpintaria, ao trabalho com machado e goiva. Nesse imediato p6s-guerra, um apelo a tra- digéo e 8 manualidade artesanal podia ter mais de um motivo: Protesto contra a falsa ciéncia académica, reagdo moral aos cri- mes recentes da “civilizagdo das m4quinas”. No caso especifico, a tradigao é a dos mestres da madeira, o mais auténtico artesanato alem&o, ao qual remonta aquela arcaica arquitetura lignea que Parecia a Strzygowsky a mais genuina expressdo construtiva da espiritualidade nérdica. Mas as ceramicas, os metais, os tecidos, OS mOveis em madeira maci¢a que se confeccionavam por aquela €poca na Bauhaus, ao reclamarem as formas originais do artesa- nato, demonstram que a proposta de Gropius foi essencialmente didética: contestar 0 Preconceito da iniciagao artistica, confirmar a continuidade entre trabalho artesanal e arte. A arquitetura torna-se trabalho de entalhe e ensambladura, é um espaco que se escava na Matéria. Esta é acolhida, como na _ interpretagao mais auténtica, a Partir da tradigdo do artesanato: nao se trabalha sobre uma naturalfstica Urstoff, mas sobre uma estrutura que aquela tradigao j4 integrou, j4 assimilou a matéria. A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 101 O “dado” material nao é tanto a madeira quanto a forma que esta recebeu ab antiquo como material de construgao, na sélida ossatura das traves, no curso horizontal do madeirame. Desde muitos sé- culos antes, associou-se 4 matéria uma idéia de espago segundo a qual cheio e vazio j4 nao sao separdveis como puras entidades es- paciais em contraste; cheio e vazio, saliéncias e reentrancias, sio a respiragao, as sistoles e as didstoles da pulsago vital da matéria. Os profundos cortes enviesados nas laterais da entrada escavam um vazio na massa, mas também o expandem para toda a superfi- Cie; e essa escavagao se compensa no alto, pela emergéncia da parte mediana da fachada e pelo vazio da janela, que ganha corpo e se estende além do plano com as arestas dos vidros montadas em prisma. Dessa forma, no alto, a cornija é interrompida a fim de sublinhar o movimento dos planos, enquanto, embaixo, as arestas chanfradas da marquise encadeiam solidamente saliéncias e reentrancias, restabelecendo a unidade e a compactagao do blo- co. O espago é ainda luz, que o vivo movimento dos planos e a evidéncia da estrutura igualam a matéria; o trabalho construtivo, seja ele projeto ou execugao, € o processo pelo qual a matéria evo- lui até a pura qualidade espacial da luz. Apesar de sua estrita economia, a casa Sommerfeld ainda se situa na 6rbita da figuratividade expressionista. Sem sair da Bauhaus, pode-se aproximar essa edificagao de certas xilografias de Feininger; nao 6 pela referéncia comum, € certamente nao casual, ao artesa- nato em madeira, mas também pela tentativa comum de desenvol- ver, a partir de certos dados objetivos (para o gravador, a narragao ou o fato a ilustrar; para o arquiteto, uma necessidade de vida a acolher; para o gravador e para © arquiteto, a matéria € a ferramen- ta), uma nova idéia de espago mensurdvel somente pela one do agir humano: um espago que nao distribui, mas se distribui segundo as ocorréncias e as fungdes daexisténcia, magn Entretanto, essa breve inclinagao a eattl antots arquitetura de Gropius, como no desenvolvimento Pe ie WALTER GROPIUS E A BAUNAUS Bauhaus, outro efeito além da conexao definitiva do cence de espago ao conceito de movimento, quer se entenda este, Ultimo como fungao vital ou como agao efetiva, manual, do artista. No Monumento aos Mortos de Margo, 0 puro fato plastico j4 é pen- sado como uma coagulagao e precipitagao do espago por efeito do movimento: um movimento que, compreensivelmente, nao pode mais ser agao ou trajet6ria num. determinado espago, mas somen- te ruptura de uma condigao de equilfbrio, desvio em relagdo a certas constantes, desmoronamento de planos oblfquos e de de- clives resvaladigos. A matéria é 0 produto dessa condensagao do espaco, percorrido por uma corrente de movimento; e j4 nao é uma matéria primordial que a vontade do artista desperta de sua estase natural, mas uma matéria artificial, nascida com a forma e que, fora desta, é somente massa fluida e lamacenta, em perene movi- mento ou tensdo: o cimento. (Um indfcio precioso: por uma recorréncia talvez inconsciente, a marca de movimento do mo- numento repete o impeto contido da Vitéria de Samotracia. O pro- cesso abstrativo daquele trdgico simbolo de derrota nos devolve em negativo essa imagem libertadora; retransforma em matéria a forma que sublimava a matéria, subverte o impulso que libertava da pedra a imagem, numa queda que a esmaga e a confunde com 0 bloco. A Hélade de Nietzsche retorna, mas como Erinia, na Alemanha de Weimar.) Essa evasao para a plastica pura nao permanece sem efeito, na medida em que um modelo de habitagdo, de 1922, se apresenta como uma excéntrica concregao de blocos, encaixados um no Outro mas, dirfamos, prestes a se libertarem em virtude de um impulso de movimento gerado pela planta articulada. Justamente durante esse perfodo na Bauhaus, missas de Doesburg, sobre a equivaléncia Itten, partindo de algumas pre- trabalhava em certos experimentos plasticos entre estatico e dinamico fora de um espago Seguro € constante, o Gnico em telagdo ao qual esses dois momen- tos 5 i Podiam distinguir-se e contrapor-se; e € facil perceber que A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 103 nesses termos de estdtico e dindmico se transferia e se esquema- tizava 0 contraste entre cubismo e expressionismo, contraste a que essa pesquisa visava justamente a superar. Também 0 modelo de Gropius é um experimento nessa diregao: nao se trata de plan libre (até porque uma planimetria livre s6 poderia basear-se na mera utilidade, assim como a planimetria simétrica se fundamentava na mera beleza), mas da tentativa de determinar 0 valor de cada ele- mento construtivo num sentido quase topoldgico, como resultado de um movimento inapreensfvel em si (porque ocorre num espa- go impreciso), mas sem o qual ndo se dariam situagées espaciais. “As formas”, esse era um dos slogans da Bauhaus, “sao a imagem (Gefasse: literalmente, o contetido) do movimento, 0 movimento é a esséncia da forma.” A condigao de movimento é expressa pela freqiiéncia dos pla- nos obliquos, enviesados, pelo encontro deles em angulos agudos ou obtusos, pelo desenvolvimento do ediffcio em diversas diregSes espaciais. Dessa forma, a assimetria, como ruptura da estatica tra- dicional e génese de movimento, é uma assimetnia total, verificdvel em todas as diregdes e dimensGes: em superficie e em profundida- de, na planta e em perspectiva, na disparidade de cota dos pisos, na alternancia dos corpos altos e baixos, nas emergéncias e nas reentrancias das massas, no desenvolvimento de verticais ¢ hori- zontais sobre planos diferentes. Essa assimetria se exprime como fungao de movimento na rotagao excéntrica, sobre eixos multi- plos, das massas construtivas: € uma condigao totalmente nova, embora ainda fundamentada no reexame de algumas premissas de Wright. Se, para Wright, quem olha ou, mais exatamente, quem vive a arquitetura esté sempre no centro do espago construido, que por isso € uma expansao ou uma exaltagado doses snneciae des organicas ou vitais, aqui a condigao de apreciagao nado ga me Y € instintiva vitalidade, mas uma efetiva capacidade de visio; 6 que a visio ja no é pensada como a relagao entre UM sujeito e - objeto igualmence iméveis, mas como a resultante de co's me we WALTER GROPIUS fb A BAUHAUS s 6rbitas se interseccionam ¢ se superpdem ento do sujeito e o movimento do obje- seja como for, de movi- mentos combinados cujal continuamente: 0 movim to. O Sbvio comentario de que se trata, nao pode senao confirmar que, para mento potencial ou suposto a nao € uma certeza estdvel, mas um Gropius, a forma arquitet6nic in eri ou um werden, um valor que remete sua propria determina- gao a uma sucessao de valores no espago € no tempo, portanto, © oposto nao s6 da monumentalidade académica, mas também da- quela nova monumentalidade que transparece tanto na pintura cubista e na arquitetura de Le Corbusier quanto na plasticidade de Wright. A partir desse momento, a idéia espacial de Gropius tende a realizar-se numa série periddica de imagens espaciais, de “espagogramas”, isto é, num processo ilimitado de subdivisao ou estratificagao. O conceito basico, a unidade mével de medida do espaco, passa a sera “escala”, como mera relatividade: a forma ideal dessa arquitetura infinita seré o urbanismo. Pertence a esse perfodo o projeto apresentado ao concurso do Chicago Tribune. E 0 arranha-céu como forma simbélica, imagem da infinitude espacial onde nos é permitido viver em virtude de uma arquitetura que se apossou dos meios, dos procedimentos, do proprio ritmo de produtividade da industria. Etambém, acredita- mos, um apelo explicito que esse filho da Europa langa ao mundo novo, ao mundo das infinitas possibilidades: apelo que se repetira pouco depois, em outro rumo e dirigido a um outro mundo novo de infinitas possibilidades, coma Participagao no concurso para 0 Paldcio dos Sovietes em Moscou. © a meee No projeto para o Chicago Tribune, é que a cons- ean ee toda a sua altura e todo o seu socks bi oi a ai ahs sim como um espago para et ed ke ck Aaa eo est4ticos € proporcionais: como whet ee aia a da desenvolvida em todas as dimen; E anume tia; jen hia pEG los sdes do espago. Também aqui A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 16s reaparecem as j4 assinaladas diferengas de nivel no Posicionamento dos blocos, as quais corresponde a diversidade no desenvolvirnento deles em altura e em extensao. Os grandes balcées angulares nao tém a fungao de equilibrar a ascensao das verticais, porque as ver- ticais, j4 nado tendo nenhum valor de ascensao ou de impeto, sao simplesmente linhas que se prolongam e teoricamente poderiam prolongar-se até o infinito. Esses balcdes prolongam as horizon- tais da estrutura, demonstram que a quadratura das superficies nao se exaure nas superficies, que 0 espaco é divisfvel em largura e em profundidade tanto quanto em altura, que o edificio, enfim, atra- vessa 0 espago, do qual constitui a efetiva e exclusiva estrutura, em todas as diregées. Entao, j4 nao é designavel com certeza nenhum ponto do es- paco, a nao ser aqueles assinalados pelo encontro, isto é, pelo li- mite reciproco, de dois ou mais planos; e, como a arquitetura é construgao ou posse de espago, 6 existe valor de forma nas estru- turas, que sao os tnicos lugares espaciais designaveis com segu- ranga. De fato, se 0 espago ja nao se dé como uma forma fechada ou uma caixa perspéctica, mas é definido somente pelo encontro de trés retas ou planos perpendiculares, 0 ponto ou a linha de encontro serao sempre centrais e internos; por isso a estrutura éa Gnica forma que se pode atribuir ao espago, ou melhor, toda idéia de espago ja €, in nuce, uma estrutura. A qual, em suma, nao € senio a efetivagao do principio da divisibilidade do espago, ou seja, © processo pelo qual a mente humana, em sua finitude, pode pos- suir ou definir 0 infinito. De fato, inserem-se nesse perfodo, entre 1921 e 1923, os estur dos desenvolvidos na Bauhaus sobre a agregagao em sézie de uni- dades espaciais mediante um ritmo extensivo, que vai do elemen- to pré-fabricado a casa e, desta, & comunidade, ae ° devir e a progressiva complexidade da organizagao & da oe social. O problema da socialidade da arquitetura se propde, assim, uma em termos totalmente novos: Se todo ato humane que realise Wo WALTER GROPIUS BA BAUHAUS ‘a outras, novas, em continuo progresso, € trugdo do interior e do exterior, da cons- entao todo ato humano € construtor de como pura construtividade, seré ao mes- possibilidade e anunet ao mesmo tempo cons! ciéncia e da realidade, espago. A arquitetura, mo tempo o meio eo fim desse proceso, a realizagao do progresso humano como uma cada vez mais clara percepgao e construgao da realidade. Essa instancia urbanfstica, que s6 sera plenamente desenvol- vida trés anos mais tarde, nas Siedlungen Térten, em Dessau, ja é reconhecivel no projeto para a comunidade da Bauhaus de Weimar; que, por sua vez, constitui o primeiro esbogo do subse- giiente projeto para a mesma comunidade, realizado em Dessau em 1925. A tinica casa desse primeiro projetoa ter sido construfda, para a exposigdo da Bauhaus de Weimar, é de fato uma tipica uni- dade urbanjstica, uma célula edilicia capaz de reproduzir-se num tecido urbano homogéneo. Trata-se de uma planta extremamen- te simples, que elimina quaisquer vaos e articulages supérfluos, e dispde quartos e servigos ao redor de uma sala quadrada, a qual corresponde, no andar superior, um esttdio de artista circundado Por terragos nos quatro lados. Assim, 0 espago é construfdo, tanto na planta quanto no tragado vertical, por meio de sucessivas quadraturas ou projegdes; o segundo andar repete o esquema ct- bico do primeiro, do mesmo modo como 0 conjunto da planta resulta da projegao e da subseqiiente integracdo das unidades es- Paciais. E facil entender que essa composig¢do quase modular, ao proce- der por sucesso de diafragmas espaciais, tendea desintegrar a uni- dade da ae numa justaposigao de planos; visto que, se a massa € 0 volume sao sempre algo que est4 no espago, o plano é nada mais Roa — ores que constitui ‘© esquema dace: Meetcacath ea oe e plano em diferentes diregdes. i icipal de lena, de 1922, as paredes cas, que a que a orla do teto desenha como um leve trago de cane- A ARQUITETURA DE GROPIUS (191 1-1934) 107 ta, parecem estender-se além do espago, renascer além do vazio que elas refletem e cuja forma incorpérea delineiam; as arestas se chanfram para evitar que um contraste demasiado nitido entre luz e sombra dé solidez de volume ao mensuradissimo jogo de planos reentrantes que delimitam a superficie sobre a profunda cavidade da entrada; o corte horizontal da marquise neutraliza esse rede- moinho de vazio, liga o espago externo ao espago grafico que se desenha sobre os planos do ediffcio, confere leveza aérea as mas- sas; na cuidadosissima dosagem de valores, os claros e os escuros nao passam de gradagées de branco sobre branco. E aqui que a experiéncia pictdrica, abandonando definitivamente qualquer complacéncia de efeitos, se conclui — nao sem um toque de suprematismo — numa qualidade grafica mais perfeita. A dimen- so, o desenho, a fragil articulagao, a propria massa do reboco nos advertem de que essas alvas paredes nascem, por uma lenta meta- morfose, das paredes envidragadas da Faguswerk e do ediffcio da exposigao do Werkbund; como aquelas vidragas, elas refletem em sua luminosidade o espago externo € 0 interno; mas, uma vez que essa luminosidade se definiu na absoluta qualidade formal e coloristica do branco puro, tal espago j4 nao traz consigo 0 aspec- to mutante das coisas que 0 preenchem, € pura entidade, puro valor, forma. Uma obsessio de rigor, de abstracao formal, impregna 0 estilo de Gropius: tragados limpidos, planos perfeitos, estruturas dese- nhadas mediante uma pautagao ou quadriculagao ideal do espa- co. Num modelo de casa de praia, de 1924, as trés dimensoes se i é ada e torné-la incorporam uma na outra ate anular a cubatura pes ma pura delineagao de volumes varios. E facil notar que a plastica dessa edificagéo nasce da pennies cia e da inversao — do plano frontal a planta, da vertical a hon- zontal e vice-versa — de um mesmo esquema grafico. Em suma, ela nasce da repetigao do mesmo prinefpio ou da mesma one formal em diferentes situagdes espacials: Entio essa AAC fundo e horizonte para w tos WALTER GROPIUS E A BAUHAUS desmaterializar a forma, de contradizé-la na oqaiveléncis absolu- ta entre valores positivos e negativos, de impedi-la de constituts- se como coisa fisica no espago fisico, traduz-se na identificagao de um ponto de transigao entre a estase e o movimento, na ruptura de um sistema de equilibrio, no ilimitado prolongamento dos va- zios ao longo das verticais e das horizontais, tal como se apresen- ta, aqui, o contraste entre 0 vazio da grande varanda e a escava- co no bloco sobranceiro a ela. A rigorosa € bem planejada distri- buicdo das superficies nao visa outra coisa senao a destruir a su- perficie e restituir ao plano, como mera entidade geométrica, seu valor abstrato e absoluto de “lugar” espacial. A primeira idéia da fabrica da Bauhaus de Dessau, a obra-pri- ma de Gropius e da arquitetura moderna européia, pode ser de- tectada no projeto para uma Academia de Filosofia, estudado com Meyer em 1923. O tema especffico que 0 projeto se propoe é a relagao entre a distribuigao planimétrica e em altura das massas; mais precisamen- te, a neutralizagdo da massa como fato plastico ou pictérico e sua Construgao como espago, através do principio de divisibilidade estabelecido pela planta. Da tipologia formal de Gropius, estéo agora exclufdos os pla- nos obliquos e transversais que, materializando a condigao de movimento, reconduziam do movimento em abstrato a fisicidade do mével e a textualidade plastica ou pictérica das massas. A com- Posi¢ao se articula sobre as paralelas e sobre as ortogonais. Dada a fixidez dessa telagdo, uma rotagao completa da construgao, tal como se dé numa plena circularidade de vista, pode fazer os valo- ade ao tah ao negativo (plena Cee wmantotbaeil deraopaas, ae vie soma constante, isto é, duplo L, ou em sudstica alain nbs ian és ° ear’ joi amenasses ce, . um Leitmotif dessa arquitetura, € um corpo em L ao redor do eixo A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 109 que passa pelo vértice deixa inalterada a relagdo entre os dois la- dos e por isso realiza uma perfeita circularidade de vista. Deve-se notar que 0 esquema em L se reproduz também na escala dos va- lores em altura; assim, a circularidade de vista se torna esférica, total. (Por isso Gropius insiste na necessidade de que os edificios possam ser apreciados como completa forma arquiteténica tam- bém na visao do alto, uma vez que a visao aérea passou a ser constitutiva da sensibilidade do homem moderno. Essa € também uma das justificagdes da estética dos tragados ou dos planos e, conseqiientemente, do carater especificamente artfstico do urba- nismo.) Tal rotacao ideal, sempre entendida como ruptura de um equi- Itbrio estdtico e como infcio de movimento, é confiada a um siste- ma de forgas (a “tensdo interna e recfproca das massas”) que se desenvolve a partir da situagao espacial e da importancia dos blo- cos. No caso do projeto em questo, o fulcro de rotagdo est4 no corpo central, mais desenvolvido em altura; a galeria baixa e lon- ga nao passa de um brago de alavanca, cuja extensao é medida em relagdo a massa do corpo da direita; 0 equilfbrio dinamico do con- junto baseia-se no fato de que @ maior massa do corpo da esquer- da, diretamente articulado ao fulcro, corresponde a maior exten- so dos corpos da direita. E indubitavel que essas pesquisas se baseiam na anélise da mecAnica elementar da alavanca, da biela etc. Contudo, seria um tido esprit nouveau e civilisation machiniste, erro interpreté-las no sen' porque 0 fato mecanico nao é tomado como exemplo formal, como uiteturas-silo almejadas nas arquiteturas-navio a vapor ou nas arq| por Le Corbusier e na pintura de maquinismos de Léger, mas sim e determinante de forma. Tais pesqui- sas refletem a consciéncia sobre a insuficiéneia da nogdo comum de espago, baseada na geometria euclidiana, € sobre & NECessty dade, j4 afirmada pela relatividade einsteiniana, de estendes, do mundo dos conceitos a0 mundo dos fendmenos == ae § justae como principio de espago io WALTER GROPIUS E A BAUHAUS mente 6 mundo das fungdes, do movimento, das pomsibilicades —, os limites da idéia de espago. A unidade panti planimetria e forma arquiteténica depende justamente da tmpossibilidads de pensar a construgdo como um conjunto de valores nO tees aunt espago constante, e da conseqiiente necessidade de senti-la Soni desenvolvimento, projegao e revolugao continua num espago in- definido. Como nao se dé numa abstrata proporgao numérica, mas no fendmeno ou na sensagio, o espago € a prépria figuratividade, no sentido mais amplo do termo. Por isso, mais uma vez, devemos constatar a coincidéncia com as experiéncias did&ticas sobre a genética da forma. E evidente 0 contato com as idéias de Klee sobre a origem da linha a partir do movimento de um ponto, da superfi- cie a partir do movimento de uma linha, do volume a partir do movimento da superficie; e, numa esfera maior, sobre a origem da forma a partir da continua e reciproca transformagao de forgas ativas em passivas, e de passivas em ativas, através de um “fator intermedidrio” que é, afinal, o “ponto morto” ou de inércia da mecénica. Igualmente evidente é 0 contato com a teoria “das ten- sdes” de Kandinskij; e deve-se notar como ambas as teorias levam a destruigao da massa como efeito naturalistico e 4 sua redugdoa uma fungao espacial. O que, mais uma vez, confirma a que ponto a “funcionalidade” de Gropius se baseia num prinefpio de figura- tividade, muito mais do que em conceitos extrinsecos (e ainda naturalisticos) de praticidade e de técnica construtiva. Sao essas as premissas sobre aS quais nasce a opus magnum de Gropius, . sede da Bauhaus de Dessau. Provavelmente, Gropius Jamais teria alcangado tao humana clareza de formas, tao limpida certeza de consciéncia, se sua inteligéncia estivesse voltada uni- camente para a especulacao sobre as rel, + S€ © impulso moral da humana, nao o tivesse imp tivesse dedicado os melho: ‘agOes entre forma e espa- Pratica, que parece reger sua conduta elido ao apostolado didatico; se ele nao Tes anos de sua vida ao esforgo de resti- A ARQUITETURA DE GROPIUS (191 1-1934) i tuir um horizonte a uma geracao de intelectuais que a experién- cia da guerra parecia haver condenado “A desordem e i 7 a dor pre- coce”; se, enfim, nao se tratasse, aqui, fim, ni de dar um lugar, um ende- rego, uma exist€ncia positiva a uma sociedade que ele mesmo havia organizado e preparado para exercer no mundo uma agao clari- ficadora ¢ libertadora. Aqui, 0 trabalho, o estudo, 0 lazer se com- punham numa harmonia que ele préprio havia predisposto e da qual participava; aqui, a colaboragao produtiva realizava um ideal de solidariedade moral, assim como a criagdo artfstica, um ideal de liberdade espiritual; aqui, a antiga Grécia podia transformar-se numa nova Alemanha; daqui sairia o antincio de uma civilizagao nova, na qual o trabalho fosse fonte de alegria estética, modo de viver com plenitude no mundo. A postura antimonumental, numa arquitetura que é ao mes- mo tempo fabrica e escola e que pretende dar forma ao ideal do trabalho como educagao, coincide com a postura urbanistica; nao creio que exista uma formulag4o mais precisa da génese histérica do urbanismo moderno como antimonumentalidade de principio. (A outra demonstragio, ad absurdum, serd oferecida pelo carter antiurbanjstico da arquitetura monumental nazista e fascista; ex- presséo do Estado prevaricador e opressor, que destréi a vida so- cial, justamente quando o modemo urbanismo nasce como expres- sao da livre funcionalidade e vitalidade do corpo social.) O edificio da Bauhaus, conclufdo em 1925, quer ser considera do sobretudo no tragado urbano no qual se insere ese articula, trans- pondo uma rua, defrontando outra, acolhendo no cotovelo entre dois bragos um campo esportivo; evitando, em suma, interromper 0 tecido da vida citadina, inscrevendo-se nela com seu proprio NE as proprias frentes envidragadas, to para satisfazer 8 necessidade executa um trabalho manual, sea perspective destruida mo, escancarando para 0 exterior nao tanto para captar mais luz quan\ instintiva, experimentada por quem de voltae meia erguer o olhar para re/aze™ pela obstinada concentragio sobre a matéria. m WALTER GROPIUS E A BAUHAUS Os dois corpos principais contém a escola técnica e os labora- tdrios, e sfio ligados por um corpo-passarela, no qual esto instala- dos os escritérios administrativos; um outro brago, refeitério e lo- cal de reunides, liga os laboratérios ao ediffcio dos esttidios e dor- mitérios dos alunos; ao redor, entre as 4rvores do Parque, as pe- quenas moradias dos docentes. Comparada aquela examinada hA pouco, a planimetria da Bauhaus revela uma concep¢ao mais compacta, que, em qualquer fase da rotagao, assegura o valor invaridvel de uma visao total. Nao ha ponto de vista sob 0 qual o edificio possa ser apresentado em escorgo, possibilitar efeitos especificos, sugestdes perspécticas. No espago total, a tinica condigdo de visao é um estar-em, uma parti- cipa¢ao no ritmo gerador. O fulcro desse sistema de alavanca coincide com 0 encontro dos bragos; mas 0 equilibrio entre esses blocos tao diferentes em extensao, desenvolvimento, estrutura e densidade de massas, a determinagao daquilo que poderfamos chamar o “tempo” de rota- ¢40 ideal sdo regulados por uma massa de inércia, que serve de contrapeso e de balancim: 0 ediffcio dos dormitérios-estidios, ri- gidamente ligado ao fulcro pelo pavilhao baixo que serve de refei- torio-auditério. Esse edificio € 0 elemento menos envolvido na dinamica funcional: local de recolhimento e repouso, em telagao a vida da comunidade, Ponto morto onde o movimento cai e re- comega, em relagdo A mecanica compositiva. Na verdade, ele con- Serva sua compactude de massa quadrada para compensar 0 vazio que se estende entre as duas alas da escola técnica e dos laboraté- | que uma triplice ordem de Sacadas, enxertadas num dos lados na | | ue i a es é que se acione a Fota¢ao que o brago tigido do refeitério transmite / : A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 113 aos outros corpos da constru¢ao. O fato de, inércia nao insistir num €spacgo genérico, desintegrar-se na mecAnica interna do esp: monstrado ainda pela qualidade das superficies; de manh, a pa- rede reflete nos grandes janel6es 0 espaco das vidragas fronteiras e, na fachada oposta, a Projecao das pequenas sacadas em balan- go compromete o espago aberto no jogo plastico do plano escan- dido por uma densa alternancia entre cheios ¢ vazios. Todo o con- junto € concebido como um lento girar de volumes e de planos que esgotam, em sua qualidade plastica, as forgas do movimento suscitado por eles mesmos. Mas nao basta constatar a necessidade e a precisao de todos os momentos de forga da perfeita concepgao formal; porque, aqui, a forga nunca € poténcia efetiva, dissimulada ou resolvida em re- lagdes formais, mas sim a forga da forma, o grau de sua fungao espacial. Ea forma que, como tal, exerce uma forga, transforma a seguir, essa massa de mas sim, por sua vez, ago construtivo, é de- uma idéia de movimento em impulso efetivo, suscita e impde a consciéncia um ritmo gerador ou construtivo de espago. Um exem- plo: 0 pavilhao do refeitério-auditério e a passarela que transpoe a tua sao de fato as duas Arvores de transmissio do movimento; articulam-se no fulcro do sistema, mas desenvolvem-se em dire- Ges ortogonais e em niveis diferentes; determinam uma evidente contraposigao entre volumes cheios e vazios, igualmente precisos, mas essa contraposigao j4 nao acontece num mesmo plano, e sim em planos normais; entao, aquilo que tradicionalmente chs uma complementaridade transforma-se em nitida oposigao ou inver- so de valores. De fato, no pavilhdo temos uma sucesso de cheios e vazios segundo uma escansao vertical; na passarela, tetris ae. continuidade de faixas horizontais de cheio e vazio. Assim, & pas- sagem de uma situagao espacial a outra € realizada Samco te por meio de elementos de movimento, a freqiiéncia & are go. A rigorosa funcionalidade das estrucuras, & auséneia ny : de todo elemento decorativo, mas também de toda transigénei i WALTER GROPIUS E A BAUHAUS ou delonga formal é determinada, portanto, pela necessidade de nao atribuir aos elementos construtivos uma qualificagdo formal que eles devem receber exclusivamente da freqiiéncia e da dire- ¢40, isto 6, do movimento. , , Dessa maneira, questiona-se a propria matéria, na medida em que possa representar uma qualidade ou uma determinagao per- manente da forma: planos de alvenaria branca e planos envidra- gados alternam-se numa dialética densa, que priva as vidragas de toda substancia de profundidade e as paredes, de toda substancia de superficie; que anula o contraste entre vazio e cheio e designa © espago na construgao ideal ou na forma nascida da tesolugao dessa antitese naturalistica. Assim como, na ciéncia moderna, nega-se o valor original das matérias isoladas, que nao seriam se- nao 0 resultado do diferente ritmo de movimento ou da diferente freqiiéncia de vibracdes de unidades indiferenciadas, também na arquitetura, € na arte em geral, desaparece toda tipologia formal e estrutural, e tudo se reduz A ilimitada mobilidade da mais simples unidade formal. O princfpio de movimento que € assumido como deter- minante de €spago ou de forma, e que substancialmente se iden- tifica com o Principio do €spago-tempo, nao é evidentemente localizdvel no €spaco e no tempo da nogao; em sua continuida- de, esse espaco esta simultaneamente realizado e em processo de realizacao e, Por isso, € redutivel a uma fungdo dialética, ao Processo mental da superacao ou da eliminagao do espaco est4- Justamente num processo con, ciéncia, de modo a colocar- ciente ou racional, Strutivo ou de clarificagao da cons- Se como uma mecanica da vida cons- A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 115 nalamos 0 vinculo Perspéctico, axial, que liga o vazio compreen- dido entre as duas alas principais ao bloco dos dormitérios-estidios pode-se notar como, nesse complexo maquinismo de “virabre- seis feed 2 quins”, o Angulo reto, isto é, a continua compensagao entre mAxi- ma frontalidade e maximo €scorgo, permanece sendo 0 motivo- base da composigao. Observaremos agora como a distincdo entre © corpo da escola técnica e a passarela, que se incrusta nele, é marcada por uma branca moldura em alvenaria, que repete perspecticamente a fachada externa do bloco dos dormitérios-es- ttdios. Nao hé diivida de que essa moldura é ainda essa fachada, mas projetada no fundo de uma perspectiva teérica. A insergao desse motivo perspéctico tem o valor de uma demonstragao por absurdo; assim como todas as outras referéncias perspécticas, de- signa 0 espago tedrico em relagao ao qual o espaco construtivo assume pleno valor de realidade ou de movimento. E facil estabe- lecer uma analogia entre esses motivos e os motivos perspécticos recorrentes na publicidade e sobretudo na grafica da Bauhaus; num € noutro casos, a perspectiva é assumida como meio de transposi- ¢4o surrealfstica. Mas justamente isso € importante: na conscién- cia figurativa e didatica de Gropius, o surrealismo nao permanece como arbitrio ou veleidade poética; € o naturalismo tradicional que, j4 nao podendo ter forga demonstrativa, se transp6e para além dos limites da consciéncia, tornando-se in toto surrealistico; em confronto com aquele naturalismo caduco, transferido do concreto ao abstrato, a forma dita abstrata, o puro dado formal ou coloristico adquirem valor de absoluta realidade, de plena e incontestével concretude. Esse processo da construgao como elimi eis espaco nocional na pura realizagao espacial tem seu eres eS = gada naquilo que Gropius denomina “anova estética das rage tais”, A Bauhaus € 0 mais significativo exemplo disso: o he edificio nao 6 sendo uma série de planos honzontas oe quase planantes acima do solo. A origem conceitual desse nagio dialética do 16 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS pio compositivo deve ser buscada num PORES de Wright, que Gropius dialetiza e, por fim, subverte. Na temética naturalistica de Wright, a vertical € 0 smbolo daquilo que surge, cresce e se eleva; ea horizontal, daquilo que se expande, gravita, adere. Para Gropius, a vertical € indicagao de diregaoe, precisamente, de gra- vidade ou de queda; inversamente, por razdes légicas, a horizon- tal € ascensao, libertagdo, ultrapassagem de qualquer limite de horizonte. Por isso as horizontais sao elementos aéreos e as massas do edificio, que se desenvolvem justamente sobre a horizontal, sao separadas do solo por uma base reentrante a fim de poderem real- mente “planar”. A prépria vidraca continua que envolve os qua- tro lados dos laboratérios tem um significado formal totalmente novo: aumenta 0 intervalo entre as faixas horizontais que, na pas- sarela e no corpo da escola, se sucedem em camadas triplice e quédrupla. E esse o lugar onde o movimento centrifugo alcanga o maximo de intensidade e inicia sua fase de queda; por isso se rare- faz a densidade construtiva da massa e os planos ganham altura, estendem-se e se adelgagam. Por isso essa vidraga nao nos diz mais nada sobre a profundidade que esté além, sobre a estrutura portante que ela envolve; é pura vibragao e tadiagao luminosa. O espago formal j4 nao € hip6tese abstrata que transcende o espago de na- tureza; em seu pleno valor de realidade, ele se dé com imediatez absoluta, satisfaz no mais alto grau a necessidade de luz e de at- mosfera eo desejo de sensagdes estéticas que sao préprios do ho- mem civilizado. A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 117 e dosado, com base nao tanto no dado objetivo da utilidade quanto na capacidade de determinagao espacial implicita nos atos da exis- téncia. O pronunciado ressalto e a profunda reentrancia dos planos, o nivel desigual das coberturas, 0 corte nitido dos cheios e dos vazios, que a pequenez dos blocos torna mais evidente, nado bas- tam para fornecer uma justificagao exclusivamente plastica dessa arquitetura, como a que pode ocorrer em certas experiéncias for- mais de Doesburg na mesma época. Assim, esse balango entre volumes cheios e vazios é calculado de modo a restituir idealmente a condicao do plano, como enti- dade geométrica, lugar formal entre duas extensdes espaciais ili- mitadas. Transferida a estrutura interna toda funcdo portante, paredes e vidragas j4 nao sao diafragmas divisorios, mas superfi- cies de contato que empenham e resolvem, na clareza do desenho construtivo, o espago infinito da realidade. Jé nao se pode falar de comunicabilidade, de livre circulagao espacial: quem olhar a par- tir do exterior encontrar, nesse respiro de planos avangados ou reentrantes, outros tantos horizontes de profundidade que confe- rem ao proprio espago paisagistico um sentido ou uma pratica- bilidade de interior, assim como 0 interior adquire a extensao, a amplitude de horizonte, a plenitude luminosa e atmosférica do espaco aberto. Entre arquitetura e paisagem j4 nao existe uma relagdo, mas 0 oposto da relagao, a continuidade ou contigitidade absoluta; e no entanto, a construgio ainda é tecida de superficies imaculadas e de vidragas frias, refletoras, sem que se conceda a essa paisagem 0 mfnimo pretexto luminoso de um reboco mais 4spero, de uma aresta suavizada, de um trecho de cornija destina- do a modular 0 corte nitido do vazio no cheio. O fato € que o edificio jA nao busca uma relagao de sujeigao ou de dominio ae 0 espago de natureza, mas © substitui, assim como, na conscién- cia, 0 conceito substitui a informagao empirica sem contestié-la, mas transpondo para um plano mais alto tudo o que, nela, é sene us WALTER GROPIUS E A BAUHAUS sagao viva, apelo imediato, valor de existéncia. A construgdo € um espago livre e continuo, como outrora se supunha livre e con- tinuo o espago de natureza; na perfeita condigao de civilizagao que a casa realiza, em seu conjunto tanto quanto nos minimos deta- thes da decoragao e dos utensilios, o homem social obtém aquela perfeita condigao de liberdade e de plenitude vital que era consi- derada prépria do homem natural na natureza: seu maior grau de consciéncia, sua maior clareza interior nao poderao senao dar-lhe uma percepgao mais nitida e uma capacidade mais imediata de desfrutar das coisas reais. E tampouco a natureza tem ainda mi- tos, Ou traz misteriosas mensagens, ou conserva, ciumenta, as leis supremas do espago. Doravante ela é feita somente de coisas: dr- vores que sombreiam ou purificam a atmosfera, prados que repou- sam os olhos e se oferecem as brincadeiras das criangas, céus que iluminam. Entre os homens e as coisas, flui uma relagdo mais fran- ca; na natureza, o homem j& nao é nem senhor nem escravo; sua condigao de civilizagao, sua diretiva de existéncia sao agora sufi- cientemente seguras para que ele possa aceitar as coisas em sua realidade fenoménica. A atitude dele diante da natureza despoja- da de seu mistério € a atitude pratica do usar. Luz, ar, frvores, éguas S40 Outros tantos materiais e instrumentos de seu infatigdvel for- mar ou construir. E provavel que essa nova e despreconceituosa imediagao do contato coma realidade tenha concorrido para ras- gar omitolégico véu de que ainda se vestia a arquitetura de Wright e para abrir ao velho pioneiro aquele horizonte humano mais po- Sifivo Cuja expressao poética é a “casa sobre a cascata”: a mais européia, sem diivida, entre suas arquiteturas. Para Gropius, essa idéia mais lticida e cabal do estar-no-mundo assinala a escolha de- cisiva da profissao urbanistica. O primeiro lote de miniapartamentos para o subtirbio de rten (Dessau) estava pronto em setembro de 1926; em 1928, ‘rezentas e dezesseis unidades ¢stavam construfdas. Grande parte To A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 119 do mobiliario safa dos laboratérios da Bauhaus. No decorrer de Poucos anos, a escola havia entrado no ciclo Produtivo e partici- pava diretamente do desenvolvimento da comunidade. O préprio projeto de Gropius se desenvolve dentro da linha didatica da Bauhaus; é uma Sucessao articulada de Einzel- Raumkérper distribuidos em Parte na forma radial e em parte em triplices fileiras de arcos concéntricos em torno do armazém coo- perativo. Nenhuma preliminar geométrica preside & distribuigdo flexivel das unidades: estas sao de quatro tipos e baseiam-se no Principio da familia como nticleo-base da sociedade. O tema formal no é diferente daquele das pequenas residén- cias da Bauhaus. A insergao de planos cortantes entre uma uni- dade e outra, o alinhamento alternado de corpos salientes e Treentrantes sao 0 principio de movimento que confere & fileira de Pequenos prédios uma plena capacidade de dominio espacial. Cada unidade é um ntimero na série; e a continuidade da série basta para excluir qualquer relagdo de capacidade entre espago empirico e construgao. Os préprios elementos que definem as unidades consideradas isoladamente compéem e articulam a série, na me- dida em que a propria entidade definida do ntimero contém 0 prin- cipio da sucesso infinita. O processo de repetigdo da forma ad infinitum (processo que, por sua vez, implica o reconhecimento do sistema produtivo da indtistria como sistema geral da atual construtividade ou produtividade) torna-se o processo tipico da produgao edilfcia. O urbanismo é justamente arquitetura cont- nua, construgao que nao se realiza num espago, mas sim que rea- liza 0 espago como dimensao do possivel. O conceito wolffliniano da forma aberta encontra no novo urbanismo sua expressfig mais completa, porque forma aberta significa aberta no espagta isto & capaz de integrar-se ao espago e, em tiltima anilise, de integré-lo a si mesma. Levado as tiltimas conseqiiéncias, o principio da for- ma aberta conduz ao plein-air eA pura estruturalidade (assim como, em pintura, conduzira a Cézanne e ao cubismo), 10 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS Mas, aqui, a estrutura — que na arquitetura técnica do cimen- toe do ferro, e na do proprio Wright, se complica para carregar-se de um contetido espacial mais exaustivo e resolver em si toda a casuistica das sensagdes — simplifica-se ao extremo, reduz-se a mera subdivisao do espago. Adotam-se materiais leves, que simplificam ao m4ximo os quesitos de peso e resisténcia, buscam-se solugdes compositivas até mesmo elementares, como as de jogos juvenis. A estrutura j4 nao é implicagao e solugao final de complexas leis fisicas, mas pura proposig4o espacial; e, como a divisibilidade do espago é atividade constitutiva da consciéncia, d4-se em todo ato mais simples da existéncia, na mais despojada das técnicas. Sea construg4o nao implica ou Tepresenta, mas sim coloca 0 espago, e coloca-o como série ou sucesso, seu principio é o tempo: como ritmo da produgao edilicia, como duracao da construg4o, como tegra de desenvolvimento do nticleo urbanjstico, como economia geral da comunidade. O urbanismo, Portanto, nao é senao a arqui- tetura concebida no espago-tempo, ou na quarta dimensio, isto é, na mais atual concepgao do espaco. A forma, se é unidade na série, nao pode possuir um processo formativo prdprio, porque todo an- tecedente seu remeteria A série precedente, isto é, 4 prépria forma; nem um desenvolvimento compositivo ou Proporcional, porque todo desenvolvimento conduziria apenas a série subseqiiente. Ela perma- nece, portanto, como mero dado de Percepg¢ao, ou seja, mera reali- dade. Seu valor é um valor in re, inerente a sua definigao grafica e coloristica; tal valor, nao mais diferivel 4 harmonia de um conjun- to, circunscreve-se ao tempo minimo da Percepcao, isto é, de um “presente” que s6 se dé no agir utilitario ou econémico. O urbanis- MO, portanto, é a arquitetura da sociedade ativa e operante, em Progresso, do mesmo modo como o monumental é a arquitetura de uma sociedade inerte, hierarquica, cristalizada. Em 1928, Gropius deixa a Bau , haus e retoma em Berlim oexer- cfcio liberal da Profissao. Sey pro, grama de agao educativa ja nao A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 121 se podia conter nos limites de uma escola. O urbanismo é uma pedagogia formal que deseja exercitar-se na totalidade da esfera social. Ela determina o tragado sobre o qual se movem e se organi- zam as forgas cooperantes da sociedade. Dado que cooperagao é sobretudo eliminagao de contradigées, a tarefa do urbanismo con- siste essencialmente em eliminar as contradigdes. Uma das maio- res € aquela que a indtistria capitalista abriu entre a organizagao do trabalho coletivo e a autonomia do individuo e da familia. O urbanismo nasceu dessa contradigo; visa a condicionar a exis- téncia a acelerago produtiva que a ameaga, a preservar o valor do individuo numa estrutura necessariamente coletivista: € uma idéia de liberdade cuja histéria, de Owen a Fourier e a Engels, entremeia-se a histéria do socialismo e das reivindicagGes de massa. A economia de massa tende fatalmente a transformar a exis- téncia em existéncia de massa. Traduzida em termos urbanisticos, essa contradigao se configura como problema da relagao entre a economia da produgao e a economia da habitagao. A gravidade e a preméncia do problema sao demonstradas pela vertiginosa am- pliagao das zonas insalubres, dos slums das classes operarias nas grandes cidades industriais; pelo congestionamento do tréfego, pelo crescente esmagamento da “escala humana”. Urbanisticamen- te, o problema € também um problema de distribuigao espacial, trata-se de harmonizar, numa s6 dimensao, 0 espago do trabalhoe o espaco da habitagao, a fim de que o trabalho industrial possa ser uma fungao de progresso, € nao um proceso destrutivo da socie- dade. A agudizagao do interesse social reforca o princfpio de rigor formal que rege toda a atividade construtiva de Gropius. Sea for ma, como perfeita expressdo da vida consciente, € sobretudo divi- so ou distribuigdo de espago, @ solugao desse problema sera tams bém uma solugao formal. De fato, é tipicamente formal a atitude de Gropius em relag’o ao quesito central dos urbanistas seus COn= m WALTER GROPIUS E A BAUHAUS, temporineos: prédios altos ou prédios baixos. Colocado em ter- mos abstratos ou de prinefpio, esse quesito é ainda um quesito de composigdo que pressupde o espago como dado certo e imutavel. Se o valor urbanistico do espago se define no prdéprio ato de sua distribuigdo ou construgo, ou seja, em relagdo com o fator tem- po, o problema de prédios baixos, médios ou altos nao pode existir no abstrato. Num projeto estudado em 1929 com vistas ao con- curso para uma colénia de pesquisas (Spandau-Haselhort, Berlim), Gropius retine organicamente, numa érea de 45 mil metros qua- drados, diversos tipos de edificagdes que vao desde a unidade mf- nima de um sé andar ao bloco de doze. A posigao assumida por Gropius em sua comunicagao ao con- gresso urbanistico de Bruxelas, em 1930, nao é uma posigdo de compromisso. Ele reconhece que as duas formas fundamentais da habitagao (edificagdes unifamiliares e edificag6es coletivas) corres- pondem a antitese entre campo e cidade; na consciéncia das pes- soas, a atual estrutura industrial da sociedade exacerba tal con- tradigao; procura-se fazer “penetrar nos campos as concepgées urbanas e provocar um retorno da natureza as cidades”. A luta pela forma da habitagao é sobretudo de natureza psicolégica. Mas as nefastas conseqiiéncias higiénicas e sociais da habitagao coleti- va resultam apenas do fato de que uma insuficiente estrutura po- litica e administrativa abandona os bairros operdrios nas maos da especulacao. As edificagdes coletivas podem realizar construtiva- mente condigées de arejamento e de luz tao boas quanto aquelas Para uma sé familia. Nao ser4 o compromisso da casinha com jar- dim que vird resolver um problema no qual se reflete a antitese entre urn sentimento romantico da Natureza e a exigéncia moder- na de uma perfeita racionalidade de vida, As construgées altas, ao mesmo tempo que diminuem as dis- tancias € asseguram ao espago urbano uma melhor relagao pro- Porcional entre extensao ¢ elevagao, enquadram-se perfeitamen- te na estrutura simplificada da Sociedade moderna, que delega a terme A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 123 comunidade muitas fungGes educativas e econdémicas outrora de- sempenhadas pela familia. Nao se exclui que os bairros residenciais de habitag6es baixas ainda tenham uma razdo de ser, na comple- xidade do tecido urbanistico, e correspondam as exigéncias de alguns estratos da classe média dotados de certa independéncia econdmica; contudo, os prédios altos, desde que nao o sejam a ponto de criar densidades excessivas ou de determinar laceragdes na unidade do tragado urbano, representam “a verdadeira forma biolégica da habitagao hodierna”. Neles se exprime, em grau mé- ximo, a “mudanga, produzida através da cultura e da socialidade, do sentimento em relagdo 4 natureza fisica”. O subirbio Térten ainda era baseado no binémio individuo- natureza, embora apresentado em termos completamente novos. As grandes Siedlungen Dammerstock, em Karlsruhe, e Siemensstadt, em Berlim, construfdas entre 1929 e 1930, fundamentam-se, ao contr4rio, no binémio sociedade-natureza. A emogdo, o sentimen- to da natureza sao fatos individuais; relacionados as exigéncias funcionais de uma comunidade, os fatores naturalfsticos se esquematizam: assim como 0 espago ja nao é avalidvel como fun- do paisagistico, mas somente como 4rea fabricavel, a natureza ja nao € avalidvel senao dentro das categorias da luz, do ar, do ver- de, isto é, numa relagao de necessidade e de utilidade para a vida humana. Como é a forma que determina 0 espago, é a forma ou a construg4o que determinam as quantidades de luz, de ar e de ver- de necessdrias a vida, e transformam os fatores naturalisticos ge- néricos em fatores especificos vitais; o préprio espago nao € senao a soma desses fatores, isto é, o dimensionamento da natureza em relagao a vida humana. Portanto, é a arquitetura que, com sua propria estrutura, obtém da natureza tais fatores vitais e condi- ciona-os a existéncia; e € por meio da fungao distribuava da ar quitetura que os homens vivem na realidade sua vida consciente, isto é, percebem € possuem 0 espago. O proceso formal da arquitetura, como proceso de divisdo e ie WALTER GROPIUS E A BAUHAUS omega pelo loteamento do terreno e pela étrica que deve intercorrer entre mas- a fim de que todas as unidades distribuigdo espacial, ¢ determinagao da relagao m! sas construfdas e intervalos livres, habitacionais realizem iguais condigées de aeragao, insolagao e horizonte; e esse cAlculo, aparentemente apenas matemiatico, coin- cide exatamente com aquele calibrado balango entre volumes cheios e volumes vazios (no qual cheio e vazio nao passam de atri- butos reversfveis do volume como pura designagao grafica) que constitui um dos motivos fundamentais da temética formal de Gropius. Para que todas as unidades habitacionais consigam iguais con- digdes de ar, luz e horizonte, é necessdrio que elas se alinhem na mesma frente; 0 edificio ganha em altura e em extensao aquilo que perde em profundidade; & casa-bloco sucede-se a casa-plano e, a distribuicdo em tabuleiro de xadrez, a distribuigao em fileiras. Sobre essa frente, que a alternancia entre volumes salientes e reentrantes restitui 4 condigdo geométrica do plano, todos os es- pacos ou os vaos habitacionais assumem necessariamente a mes- ma determinagdo construtiva e espacial; a estrutura se simplifica em exatas intersecgGes de planos; elimina-se a disting4o tradicio- nal entre dreas nobres e 4reas de servigo; desaparecem patios e pequenos vaos para circulagao de ar; somente as estruturas inter- nas exercem a fungdo portante, que por sua vez tende a reduzir-se cada vez mais mediante o emprego de materiais leves; as paredes externas se esvaziam, nao passam de sensfveis superficies de con- tato por meio das quais 0 ediffcio se trama livremente no espago aberto. As estruturas aéreas de ago e vidro j4 nao sdo sendo uma perspectiva ideal, quase uma pauta sobre a qual se possa decalcar a existéncia “racional” dos homens. O projetado “edificio alto” de vidro e ago nao € senao um plano ou um diafragma transparente, sobre o qual as duas porgGes opostas de espago parecem inter- penetrar-se e cristalizar-se nos vaos habitacionais, nas laminas cortantes dos balcées: tecido ou trama geométrica de uma vida’ A ARQUITETURA DE GROPIUS (191 1-1934) 125 tarefeita, reduzida ao minimum de uma formula e a abstrata preci- Ao de uma fungao matemitica. Os préprios elementos Paisagisticos, arvores e canteiros, esto inseridos entre as fileiras dos blocos; sugere-se cultivar jardins sobre Os tetos planos dos prédios; a natureza, outrora pensada como fun- do ou horizonte da vida, agora esta implicada na construgaio, como elemento interno. A racionalidade do ediffcio nao extrair4 o ho- mem da realidade para constrangé-lo na mecAnica de uma machine @ habiter; ao contrério, nessa racionalidade, que é a propria tacionalidade da consciéncia, a realidade se dé com uma nova imediatez de sensagdes, e cada uma destas ser4 tanto mais clara e Mais excitante quanto inserida num lugar e num tempo precisos. Outro indicio dessa necessidade de reduzir ou integrar 4 cons- trucao o espago externo est na relagao que se estabelece entre a habitagao e a vida social: servigos centrais, salas de reunido e 4reas de lazer transferem para 0 prédio, como sede de uma comunida- de, fung6es antes desenvolvidas dentro da familia ou atribufdas a locais ptiblicos de encontro. Disso resultar também uma redugao do trafego nas ruas: o que simplificard o tragado urbano e agilizar4 a circulagao. A disposig&o das fileiras de prédios perpendicular- mente As vias de transito, como os dentes de um pente, nao s6 distingue o espago trafeg4vel do espago habitacional como tam- bém permite uma canalizagdo mais organizada do movimento. Na propria construgao é absorvido e resolvido um elemento do tréfe- go (corredores externos para a circulagao vinda dos apartamen- tos); € mais um modo de eliminar qualquer pausa entre espago externo e interno e induzir no edificio um elemento de movimen- to. Nessa arquitetura concebida como absoluta e ilimitada capa- cidade, o mencionado prinefpio do “minimo de existéncia” encon- tra uma justificagao, j4 ndo apenas econdmica, mas Ser Se trutiva: toda fragdo de espago que nao seja efetivamente “habita- , fa”, dimensionada com base num ato humano preciso, ndo pode: 4 sendo turvar a percepgiio do espago ¢ a clareza das sensagdes 126 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS — 0 que equivaleria a readmitir na consciéncia elementos néo- formais ou de naturalismo empirico, determinar zonas de inércia na fungao vital, autorizar fases de passividade sentimental, con- descender com a poeticidade convencional do lar, restabelecer, na consciéncia do homem social, posig6es individualistas ou de pri- vilégio. O minimo de existéncia, que na textualidade de seu enun- ciado poderia parecer uma precaugo da sociedade capitalista para enfrentar com o minimo dispéndio 0 problema da habitagao po- pular, é, ao contrério, no pensamento de Gropius, a condicao moral de base para uma sociedade coletivista. Paralelamente aos estudos sobre habitagao, Gropius desenvolve uma série de pesquisas e projetos que podem ser considerados inte- grantes de sua concepgo urbanistica, na medida em que tém por objeto aquelas funges que a sociedade modema delega diretamente 4 comunidade, como a distribuigao do trabalho ea educagao. A distribuigdo da mao-de-obra é uma das Principais fungdes organizativas da sociedade moderna; nesta, a agéncia de empre- 808 assume a mesma importancia que, na sociedade de estrutura hierarquica, era atribuida aos centros Tepresentativos da autori- dade politica, administrativa, religiosa. E af que se regulam os desequilibrios que a grande indtstria inevitavelmente produz en- tre demandae oferta de trabalho, é af que se assegura a circulagao continua da mao-de-obra e se evitam os tragicos impasses do de- semprego. Com o edificio do Arbeitsamt de Dessau (1928-1929), Gropius propée-se criar 0 “tipo” edilicio Para a fungao sindical. , Oprincipio de movimento da Construgao deve ser buscado no giro” que os freqiientadores tealizam dentro dela, isto é, na fun- ¢4o de coletae distribuicao a que 0 edificio se desti de duas alas em Angulo reto, com miltiplas entradas, verificdvel: a centralizagao Se conclui na fuga dos dois na. Ele resulta articuladas sobre um vasto hemiciclo A postura urbanistica € facilmente das Massas, a totagao sobre o eixo que bragos tetilineos, quase como se des- A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 127 -earregasse uma forga centrifuga acumulada, refletema Preocupa- ho de fazer do edificio um niicleo central, de coleta e irradiagao, No tecido urbanistico: como um volante que regula a uniformi- dade do movimento da vida social. Trata-se, alias, da mesma fun- Go articuladora que, no subtirbio de Térten, fora atribufda a planta em L do armazém cooperativo, colocado no centro do enfileira- mento das habitagées. Estamos, assim, na Presenga de um elemento motor, que transmite e resolve no espago urbano uma fungao so- Gial. Esse caréter de niicleo ou de fulcro reflete-se também na configuragdo externa: no peso das massas adensadas, no reapare- Cimento de cornijas bem marcadas, que reforgam a alusio de movimento, na prépria matéria, o ladrilho, que confere as super- ficies uma consisténcia e uma gravidade de massa. Outro niicleo gerador ou propulsor, no tecido urbano, é a es- Cola: no caso, a escola técnica ou profissional, primeiro grau da atividade produtiva. A propria Bauhaus jé resultava da sintese c escola-oficina; o projeto para a Maschinenbauschule de Hagen (1929) € a proposta de um “tipo” edilfcio que resulte da sintese escola-fabrica. Basta um olhar para perceber que 0 ritmo jd nao tem o fecha- mento, a circularidade perfeita da Bauhaus; que a energia de movimento nao é€ reabsorvida e exaurida com a mesma exatidao na extensao e na densidade construtiva das massas; que 0 movi- mento construtivo tende a comunicar-se com © espago circun- dante. O esquema planimétrico se reduz ao encaixe, em Angulo reto, de dois grandes bragos, solidamente plantados no espago; e o brago em profundidade compensa, em altura, a maior extensio do brago frontal. A delicada articulagaéo de planos da Bauhaus sucede o forte encastoamento, quase uma penetragao das massas uma na outra; e a parte destas que avanga para além do encaston- mento, quebrando deliberadamente a continuidade do ritmo, parece desenvolver uma forga de tragio e confers ao mans? ideal do conjunto uma evidéneia quase fisica, um sentido 1s WALTER GROPIUS E A BAUHAUS peto centrifugo. E vemos aparecer pela primeira vez um elemen- to, 4 nao apenas de designagao grdfica, mas de ilusao de movi- mento: 0 corpo envidragado em setor circular que, inserido na extremidade esquerda da fachada, parece concentrar no escorgo de suas paredes um potencial de energia mais alto e tornar-se as- sim o perno da revolugao excéntrica do conjunto. E significativo que essas mesmas caracteristicas de centralidade urbanjstica reaparegam nos projetos para auditdrios e teatros ela- borados durante esses anos. E que o teatro, nessa polis ideal, é centro de educagao coletiva e contribui para resolver a contradi- cao entre trabalho de massa e exist€ncia individual. Reintegran- doa sensibilidade desgastada pelo trabalho mecAnico, reabilita-a para encontrar nesse mesmo trabalho, em seus processos € em seus ritmos, um pleno contato com a realidade e a satisfagdo dos ins- tintos vitais. O teatro nao mais seré instrugao moralista ou escola de sentimentos, mas educagao integral da sensibilidade voltada para desenvolver, coma capacidade perceptiva, a aptidao para uma rApida organizagao e construgao do espaco. O “teatro total”, que se concretiza no projeto de 1927 para Piscator, baseia-se nessas premissas sociais. O desejo de expressao do qual nasceram tragédia e drama “continha em si a necessidade de uma limitagao espacial do acontecimento, ou seja, um teatro”. Do palco circular, “nascido da arena agonfstica, no qual a recita- ¢40 se desenvolve simultaneamente em toda a frente esférica e 0 ator € o porta-voz de uma massa de espectadores disposta con- centricamente em torno dele”, passa-se ao palco semicircular, “de proscénio saliente como uma lingua de terra dirigida a platéia, também esta semicircular”, e dele ao teatro cortesao do século ee tas é cpaaue dos espectadores, que assistem : uma grande janela a um drama que se desen- volve junto deles”; a prépria distingao entre palco e platéia refle o uma distingao de classes, que prova como aquele teatro era umi tipica fungao da sociedade de estrutura hierarquica. A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 129 O “teatro total”, ao contrério, visa a unir palco e platéia, fa- zendo eomnduco acontecimento invada a area dos espectadores, cores ReSEREN todo 0 espago do local, mediante luzes e Presa seque meorporem a cena, em todas as dire¢Ges, 0 espaco do teatro”. O projeto do “teatro total” retine as trés formas histé- ticas do palco. Tem um tragado elfptico, como um imenso ovo dividido ao meio no sentido do comprimento; no 4pice fica o pal- co triplice, mével e giratério em todas as direges, e cujas raias podem estender-se em torno da platéia. Esta é em forma de anfi- teatro, sem frisas e camarotes, e disposta em torno de um proscénio elevavel e abaixdvel; 0 proscénio e as fileiras anteriores da platéia podem fazer um giro de 180°, transformando-se o primeiro numa arena e o segundo numa fileira de anfiteatro. A estrutura externa do “teatro total” tem como eixo o sistema de movimento da fungdo interna. As duas grandes massas que correspondem ao palco e 8 platéia articulam-se sobre um fulcro central. Por ser elfptico, esse fulcro articula as massas sobre dois ei- xos paralelos; a insergdo de planos transversais que convergem para esses eixos orienta a rotagdo ideal das duas massas principais em diregdes opostas, como as més de um moinho; por isso o complexo do edificio é sentido como um duplo e oposto girar de planos que se retraem e se desenvolvem em ritmo constante, uns a partir dos ou- tros. De qualquer ponto de vista, a uma expansao corresponde uma contragao de espagos e, a uma dilatagdo de superficies convexas, uma brusca retracao de superficies cOncavas. Os elementos oblfquos das escadas, desenhando-se no exterior através das vidragas, e a sas desenvolvem o ritmo de revolu- edificio parece abrir-se e fechar-se a mAquina que funciona “a inter- subseqiiente ascensao das mas: go em todas as dimensdes. O sobre si mesmo, como uma imens' inter valos”. No projeto — igualmente nao realizado — para 0 audirério © 0 Museu de Halle, a sala, tanto no interior quanto no exterior, ndo passa de uma enorme concha sonora em torno da qual se ergue uma urdidura metélica, altfssima, que parece transmitir ad espago 490 WALTER GROPIUS B A BAUHAUS infinito a vibragdo daquilo que ja nao é seno An colossal caixa harménica ou um gigantesco instrumento musical, Oo mesmo m- peto de movimento, 0 mesmo ritmo de rotagao sobre eixos milti- ternancia entre concentragao e expansao de ener- plos, a mesma all ma do projeto apresentado ao concurso para o gia constituem 0 fe! palacio dos Sovietes em Moscou. Estamos, convém lembrar, numa fase de extrema tensao do movimento moderno na Alemanha; com Gropius, na linha de fren- te, situam-se Mendelsohn e Mies van der Rohe. Mas se em Mendelsohn as massas ainda procuram laminar-se, por uma ten- sdo interna, em superficies espelhantes, e se em Mies van der Rohe a estratificagao dos planos busca organizar-se na estabilidade da massa (matéria que quer transformar-se em sfmbolo e simbolo que quer encarnar-se na matéria), Gropius j4 transpés 0 limite além do qual uma realidade e uma iluséo, uma matéria e um simbolo, no sao separdveis, porque o préprio simbolo, pela racionalidade que o produz, é tao verdadeiro quanto a realidade. No projeto, de 1930, para um teatro em Karkov, a massa do edificio se dissimula, ou antes se desintegra, numa sucessdo de telas envidragadas, obliquas ou em curva; agora 0 espago € so- mente alguma coisa que se sup6e para além de um fragil, provi- s6rio, transparente diafragma, que ainda assim satisfaz nosso desejo imediato de limite. Transposto esse limite, o limite seguin- te, seja ele plano ou massa, é como uma imagem vista por refra- ¢4o através de um véu de dgua: imagem real de coisa real, mas Cujas distancia e situagao precisa ainda é impossivel estabelecer. De fato, nesse espago j4 nao hé nada de certo, além da imediatez, do repentino despertar e do stibito transcorrer da sensagao. O ele- cok ecnanie: ahas das massas € é levado para fora cita um movimento que se - DnniaaNas a a alaPartg sat nada mais que duas BH hap ath @ infinito e se dispersa: € sustentadas por um delgado eee projecada agile pilar central, em torno do qual se A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) BI aparafusa a espiral de uma curta escada helicoidal. (Na mostra dos materiais nao-ferrosos, reencontraremos 0 mesmo motivo, e desta vez animado por um efetivo movimento de rotagao conti- nua. Poucos anos depois, em Nova York, a vitrine de uma joa- lheria seré desenhada como um sutilfssimo jogo ilus6ério de vi- dragas que, ao longo da perspectiva das reluzentes armagoes, re- metem de uma para a outra a imagem de uma profundidade fic- ticia, enquanto, no centro, um mecanismo de espelhos giraté- rios executa incansavelmente seu movimento.) A resolugao formal de um fator preciso de movimento nao é um problema novo na arquitetura de Gropius. J4em 1913 ele tinha imaginado uma locomotiva aerodinamica como uma massa plas- mada por seu préprio impulso de movimento, por seu percurso no espacgo. Em 1930, ele projeta uma carroceria de automével; po- rém 0 movimento jé nao € pensado como uma forga externa que plasma as formas, mas sim como uma propriedade interna da for- ma, uma possibilidade de posse absoluta e fisica do espago implf- cita na exatidao de seus planos e de seus perfis. As exposigdes preparadas por Gropius nesses anos (a do Werkbund em Paris, em 1930, e a dos metais nao-ferrosos em Berlim, em 1934) sdo a expressdo mais tipica de uma arquitetura em movimento, que faz 0 espago. Delgadas armag6es metalicas que tramam um espago no espago, designam cubaturas ilusérias, vivem de um efémero esplendor de reflexos; reluzentes superficies que se contraem ou se expandem com frios fulgores; esferas, cilin- dros, discos metélicos que giram sobre si mesmos como numa nto: espirais que se enrolam e desenrolam, mAquina em movime: letas suspensas num imponderavel aparafusando no espago as al inv6lucro de fios brilhantes. A facil referéncia dessas arquiteturi ras de Pevsner e Gabo, verdadeiros instrum a transformagio do espago da terceira para a ¢ confirma o quanto esse ultimo grau de conseiéneia as-mecanismo as escultu- entos de precisdo para quarta dimensao, espacial s6 pode is WALTER GROPIUS E A BAUHAUS 1: numa condigao de consciéncia ‘a entre as categorias tradicionais ue em todo ato da vida mental ser aleangado na ideagao formal que, eliminando qualquer barreir de fantasia e raciocfnio, identifiq um momento total e unitério do existir e do conhecer. A posigao de Gropius nesses Ultimos anos de sua atividade na Europa tem indiscutiveis pontos de contato com algumas propo- sigdes programaticas do futurismo italiano e com 0 movimento arquitet6nico soviético que parte do suprematismo de Malevic. O principal ponto de contato com o futurismo € a teoria do tea- tro, como proposta identidade entre realidade e ilusao e conse- qiiente destruigdo de toda objetividade formal; dai decorre a ne- cessidade do movimento (recorde-se a nova tipologia da arquite- tura dinamica no manifesto de Sant’Elia) como superag@o final da objetividade da forma e da estabilidade ideal de seus valores. O suprematismo, partindo das premissas futuristas, coloca em ter- mos mais claros a identidade entre forma e sensa¢ao, isto €, a an- titese entre sensagdo, como forma do contingente, e representa- ¢4o, como forma do transcendente. A experiéncia revolucionéria adverte Malevic de que o mundo sub specie etemitatis da repre- sentagdo é ainda uma ficgao da qual as classes dirigentes se ser- vem para afirmar seu prestigio, distrair as classes trabalhadoras de seus reais e vitais interesses, persuadi-las a transferir para uma providencial catarse, para um além, a solugdo de seus problemas. A representagao, portanto, apesar de sua presungao de eterno, € a expressdo de interesses concretos, até mesmo utilitdrios, assim como a ciéncia oficial e a religiao. O abstrato, ao contrario, € 0 dominio do ser, da vida em si, finalmente livre no espago e no tem- po infinitos do subconsciente e do superconsciente. Mas nfo serao 0 subconsciente e o superconsciente a nova esfera, mais ampla e vital, da consciéncia? Aquele que até ontem era considerado o mundo da ilusdo e do pecado nao seré o mundo da verdade que sucede ao mundo da ficg4o, 0 mundo da moral €m ato que sucede ao mundo da moral autoritéria? A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 133 <: Ultima grande ilusdo européia se exprime em imagem na arquitetura que, sempre mantendo seu centro ideal na Bauhaus, se ramifica rapidamente na Austria, na Hungria, na Tehecos- lov4quia, estendendo suas gavinhas extremas ao norte da Europa, até a Finlandia, e ao sul, até a planicie do P6. Essa arquitetura, que visa a realizar em todos os paises uma mesma condigdo de ci- vilizagdo e de vida, recusa toda determinagdo formal precisa; mais que um estilo, impde um método na colocagao dos problemas; mais que um complexo de contetidos e de formas, um modo de ser, uma atitude diante do real. E ainda: ilimitada em seus con- tetidos tanto quanto nas formas infinitamente repetiveis, j4 nao quer ser figuragao ou construg4o, mas mera figuratividade e construtividade, a construtividade do espirito que situa a realida- de: puro “desenho” ou programa, enfim, que trace para o mundo as linhas mestras de seu desenvolvimento. Uma forma imponderével, rarefeita, depurada de todo con- tetido de sentimento ou de emogdo, imune a todo resfduo de na- tureza, inatacdvel como um conceito e, como toda verdade conceitual, ilimitada e repetfvel ao infinito: uma forma que nao esteja no espaco, mas que seja O proprio espago, um “espacejar” continuo; uma estrutura que os proprios homens tegam com seus atos racionais e que, dessa racionalidade em ato, seja ao mesmo tempo condigao e expressao: eis o supremo ideal da nova estética, que recusa também esse nome € quer ser apenas uma teora da formatividade, uma Gestaltungstheorie. Todas as infinitas e imprevisfveis relagdes com 0 mundo ex- terno — os préprios semelhantes, a realidade — serao compu- t4veis na arquitetura como numa tabela logaritmica- A arqui- tetura ser4 a propria civilizagao, em formas sens{veis; & atuali- dade pura e absoluta sera a dimensao temporal & espacial em que todos os atos da existéncia encontrarao sua justificagdo, trata utopia nasce dessa ‘sua forma, seu pleno valor. A mais abs “prdtica” mais intencional que efetiva, separada da dura e ob- As WALTER GROPIUS E A BAUHAUS, jetiva realidade. A “racionalidade” torna-se uma hipdtese mora- listica. — : Hoje, reconsiderando aquele mundo que intufa o perigo do abismo e tentava salvar-se na arquitetura como numa nova fé, podemos perguntar-nos se aquela tao cautelosa epreventacag das condigées de vida j4 nao seria uma relutancia perante a vida, um adiamento para 0 infinito dos seus problemas mais urgentes: um mo- do de subtrair-se, tragando programas ilus6rios, a um mal-estar que j& nao podia justificar-se pelo marasmo do pés-guerra e, a cada dia, se precipitava na impiedosa luta politica. Um utopismo frio e desesperangado construfa seus castelos no ar na periferia das gran- des cidades; mas, no “racionalismo” das estruturas perfeitas des- | ses castelos, era mais facil descobrir um protesto do que uma pro- posta, talvez a ultima defesa dialética do idealismo europeu con- | tra a irracionalidade emergente junto com os mitos barbaros da poténcia e do sangue. O nazismo alemio e o fascismo italiano colocarao fora da lei 0 “racionalismo” arquitet6nico e as instan- cias sociais que ele exprimia; o que, sem dtivida, ser4 uma ofensa | gratuita a civilizagao. Mas a “formula” racionalista jé estava supe- rada na propria consciéncia de quem a tinha elaborado e susten- tado, o problema urgente j4 nao era uma grandiosa reforma, agora impossivel, mas a encarnigada defesa dos direitos essenciais da vida _ individual. Acreditamos ser esse o problema de Gropius nos anos tragicos | em que a burguesia alema, como se percebesse a inevitabilidade de tal dilema, procura resolvé-lo aseu modo, instituindo um novo principio de autoridade nao mais baseado na moral, mas na po- téncia do Estado. j E nesse ponto que se rompe a relagao entre Gropius ea socie- dade alema. O apelo tardio aos movimentos extremistas, confian- tes no porvir, revoluciondrios, da cultura figurativa européia ja era 0 indicio da tensao polémica que devia concluir-se fatalmente na ruptura; a participagao no concurso para o teatro de Karkove para A ARQUITETURA DE GROPIUS (1911-1934) 135 0 palacio dos Sovietes em Moscou sao os sintomas indubit4veis de uma decepgao e de um protesto, de uma esperanga remetida a um mundo futuro. Sao esses os termos de exaltagdo e de angtistia dentro dos quais se coloca a proposta social concreta, positiva, do urbanismo de Gropius; que, naquela fase final da democracia ale- ma, tem na verdade o sentido de uma suprema e desesperada tenta- tiva de salvagao. Com todo 0 esforgo dele, nesses e nos anos poste- riores, dedica-se a superar tal dilema, a esclarecer e teorizar suas teses urbanisticas. E importante assinalar, contudo, que 0 urba- nismo moderno nao nasce de um programa otimista nem de um utopismo euférico, mas de uma profunda e tormentosa crise da sociedade; e, portanto, nao visa tanto a realizar um ideal abstrato de organizagio social quanto a enfrentar e resolver, em sua urgen- te e dramitica concretude, os problemas reais desta sociedade. A ARQUITETURA DE Gropius NA INGLATERRA E NA AMERICA A primeira fissura na f€ racionalista de Gropius remonta, se- gundo acreditamos, ao perfodo 1927-1928, quando ele decide abandonar a diregdo da Bauhaus. Qualquer que tenha sido o motivo determinante dessa decisao, é certo que, a partir daquela data, o trabalho dele se afasta da érbita da colaboragao didatica na escola. A tao almejada reforma do teatro, os projetos seguintes para o teatro de Karkov e para 0 palacio dos Sovietes, a prepara- cdo de exposigdes entre 1931 e 1934 refletem experiéncias indivi- duais, que era quase um dever tentar por conta prépria, e que indubitavelmente visam a levar a “racionalidade” além dos seus limites, ao terreno sem barreiras que se acreditava pertencer a fan- tasia e a imaginagao. HA nessas experiéncias um tom extremista e um desejo de ruptura que reconduzem a posigoes nitidamente revoluciondrias, como o primeiro futurismo italiano ou os movi- mentos russos de vanguarda. Ao confiante programa inicial de uma estreita colaboragéo com a indiistria sucede-se, com esse NOVO e mais dramético “europefsmo”, uma decidida polémica ancibur- guesa. Mais que a uma nova figuratividade, tende-se a destruigto ou A dissolugio de toda figuratividade; & dererminagio das mais puras ¢ imateriais geratrizes formais, 4 individualizagdo dos primei- Ass WALTER GROPIUS E A BAUHAUS a identificagao final i imento, ros impulsos construtivos, ao mero MovIMeENTO, entre espago € tempo. ; Recapitulemos o desenvolvimento do tema do movimento na arquitetura de Gropius. Num primeiro Oe : Ce dinamico se concretiza na aplicagao de princfpios mecanicos precisos, numa cinemdtica da forma; depois, o movimento se identifica 4 forma, como uma forga que esta produz e reutiliza para reproduzir-se em determinagées sucessivas e infinitas; por fim, a idéia de movimento se materializa em imagens motoras, numa continua “revolugao” da forma em torno das préprias geratrizes. Desde o principio, a neces- sidade de movimento refletia o principio de que a forma, como ato criativo, nao pode abstrair-se ou imobilizar-se no simulacro ou no exemplar, mas deve agir ou exercer uma fungo na realidade em que vem a inserir-se; contudo, o movimento permanecia como um prin- cfpio externo e a prion, uma geratriz formal. Era o principio, ja assi- nalado, do ntimero e do movimento que ordena os ntimeros: um espago, j4 nao capaz de ser ocupado mas um impulsionador, que intervém na estrutura e, determinando-a, imprime-lhe seu ritmo. Sem diivida, busca-se materializar esse principio motor num movimento efetivo, num “deslocamento” tangivel e continuo da forma sobre seus eixos; todavia, a forma, embora repetivel ao infi- nito e igualmente valida em todas as Possiveis situagGes espaciais, Permanece como entidade geométrica, simbolo fechado, unidade da série. Esse seu infinito Tepetir-se e projetar-se € a demonstra- ¢40 de uma sua perfeigdo in re e, ao mesmo tempo, de sua efetiva impossibilidade de desenvolvimento ou de variagao na realidade. Alcangou-se de fato uma forma invaridvel, como valor, dentro da infinita variagao das condigoes externas; mas, justamente por essa sua imunidade quase Matematica, a forma nao modifica a realida- d 4 a é na qual se insere. E, se € colocada como um sinal de igualdade entre 0 real e oilus6rio, sem de efetiva ampliagao da esfera Nas, €is que a “racionalidad POis resolver essa equivaléncia numa do real ou das possibilidades huma- » le” dessa forma, em vez de dar-lhe va- A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA ENA AMERICA 139 lidade ilimitada, limita-a em relagao a realidade, ag tesolve-a em mera hipdétese ou em mero programa: num “desenho”, que nunca po- der ser verdadeiramente criativo porque continuar4 reproduzindo a si mesmo. Como eno conciliar essa continuidade ou reprodutibilidade ili- mitada da forma com o movimento vital da fungao? Esta nunca é infinita, desprovida de finalidade; e ocorre sempre no terreno con- creto da pratica. A despeito do compromisso ativista assumido na base de sua unido com a produgao industrial, a arquitetura “racional” con- tinuava, a contragosto, como representa¢ao ou contemplagao; mes- mo que fosse “contemplagao produtiva”, no sentido de Fiedler. Tao bem percebe Gropius que a uniformidade das grandes Siedlungen, aplicagao integral do principio da divisibilidade do es- paco e da repetibilidade da forma, acabava reduzindo e extinguindo a fungao, que ele se dedica a buscar uma compensagao naqueles centros de hiperfung4o social que, no tecido urbanistico, sao re- presentados pelos centros de atividade educativa e organizativa. Para a escola, para o teatro, para nticleos vitais da administragao e do trabalho, Gropius inventa uma tipologia construtiva especial, dinamica ou energética, muito diferente do tecido celular, da quadratura uniforme dos espagos destinados a habitagao coletiva. Recorde-se sua concep¢ao do teatro como educagao intensiva da percepgao e da sensagao: assim como a escola, e mais do que 2 escola (pois sua agdo didatica tem um raio mais amplo), 0 teatro€ a Existenz-Maximum que compensa a Existenz-Minimum da habi- tagdo — sua tarefa é recarregar de glébulos vermelhos o sangue empobrecido do corpo social, mas sobretudo reconstruit as ener- gias perceptivas ou, em sentido lato, as energias vitals que 2 i balho “repetitivo” ou mecanico vai continuamente deaths > E claro que a consciéncia das contradigdes sociais, da aS dade final desse trabalho industrial, que outrora se sup tadamente criativo, se tora cada vez mais agude. Na —_ essa estrutura social perfeita é to pouco perfeita que Preiss 140 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS zer em si suas proprias corregdes e Os aparatos revolucionérios que a renovem e modifiquem continuamente. A intengao— facilmente perceptivel nos projetos arquitet6nicos e nas preparagGes de mostras entre 1928 e 1934 — de explicitar e sensibilizar o movimento, identificando seu princfpio abstrato com a realidade concreta da “coisa que se move”, j4 € um indicio seguro da superagao da forma geométrica como forma a priori, que, conquanto seja o menos material e menos pesado dos objetos, € objeto que supde um espago a priori, ainda que como ritmo e nao como proporgao. Para superar o postulado racionalista da forma geométrica, € necessdrio assumir a forma e 0 movimento, j4 ndo como principios, mas como fenémenos: a espiral que se enrola, os planos que giram sao justamente indicios de uma andlise fenomenoldgica sobre o ser da forma. Entre- tanto, se o ponto de partida da pesquisa é a vontade de demonstrar a invariabilidade da forma dentro da variagaio das condigGes externas, e por esse caminho chegar 4 demonstrag4o de uma invariabilidade do real mesmo dentro da continua variagao das aparéncias, 0 ponto de chegada da anilise fenomenolégica é oposto: € a demonstragao da necessria variabilidade da forma dentro da continua variagao, do continuo vir-a-ser da realidade. E, como doravante é impossfvel dis- Unguir 0 objeto do sujeito, eis que a realidade varia ou se modifica Justamente com a forma, por seu continuo “formar-se” ou construir- Se; € assim a forma artistica, que havia sido reduzida a mera produ- tividade, readquire o cardter Primitivo de produtividade inicial ou cniatividade: torna-se a Corre¢ao, 0 genufno impulso renovador do Mecanicismo da sociedade modema, a forca centripeta que reconduz a0 concreto, a realidade, uma produtividade que tende a escapar pela oe a multiplicar-se, a repetir-se ao infinito. Por isso Gropius atribui uma importancia televante, na histéria ideologica da arquite- tura moderna, ao manifesto de Sa: tos do movimento modemo da arqi te, afirma no mito do dinamism tividade. nt Elia: um dos poucos documen- _ luitetura que, embora confusamen- (0 uma exigéncia concreta de cria- os A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA E NA AMERICA 141 Quando se diz criatividade, reabre-se de safda o problema de um mundo externo, de algo que comega a existir e se desenvolve segundo certas leis. Substituir essas leis por uma norma racional estével significa interromper esse desenvolvimento e limitar a pré- Pria fungao da razao, que, ao contrrio, deve crescer e modificar- se com a experiéncia. Ea TazaO que assume 0 mundo externo e os estratos profundos ou inconscientes do nosso ser e lhes confere um contorno e uma forma, leva-os a um grau de consciéncia, tor- na-os vitais. Também a filosofia e a ciéncia acabaram por modifi- Car seus processos para enquadrar novas séries de fendmenos; e se esses processos se distanciaram cada vez mais da légica formal, nem por isso deixaram de ser racionais. Pelo contrario: a razdo, supe- tando esses esquemas légicos, recuperou uma forga criativa, de au- téntica “existéncia”. Reaparece assim, a partir do nivelamento racionalista, o valor da individualidade. A atividade artfstica repousa sobre uma base Muito mais ampla do que o puro raciocinio; ela resulta agora da “reciproca tensao entre as faculdades inconscientes e conscientes da existéncia, de uma flutuagao entre a realidade ea ilusao”. A for- ma j4 nao € esquema ou estrutura, mas o real em sua totalidade; do real, tem a ductilidade, a mutabilidade, a infinita diversidade de aparéncias; porque essa continua mutagao do real j4 nao é um impetuoso e incontrolvel “crescer” pelo impulso de forgas origi- Nais ou “organicas”, mas o produto de um nosso “estar-na-realida- de” mediante uma série de relagGes ou inter-relagGes cada vez mais da nossa consciéncia operante, das nossas das e abrangentes. Como se vé, € ain- do mais voltada para supor uma ara esclarecer o sentido atual amplas e complexas, sensag6es cada vez mais luci da a antiga “racionalidade”, mas n: perfeita estrutura do mundo, e sim p e concreto do nosso “estar no mundo”. Pr" Nada é mais indtil do que investigar até que ponto se “ameri- ‘anizaram” (se é que essa palavra tem sentido) homens como iw WALTER GROPIUS E A BAUHAUS Gropius ou Thomas Mann, que a veloz crise reaciondria da Ale- manha impeliu a buscar reftigio nos Estados Unidos; e nada me- nos generoso do que o balango do sofrimento de quem partiu e de quem ficou, como se o horizonte moral de uma forte personalida- de humana pudesse mudar a cada curva do caminho. Para Gropius, contudo, 0 éxodo de 1934 é uma espécie de gran- de retorno. Da Inglaterra, primeira etapa de seu exilio, viera com Ruskin e Morris a primeira mensagem da fungao social da arte; da Inglaterra tinham vindo 0 espirito de praticidade, que a Alema- nha perdera havia muito tempo, e o primeiro impulso para o pro- gresso industrial desse pais. Na Inglaterra haviam-se refugiado os melhores nomes da cultura artistica alema: de Mendelsohn a Pevsner, que justamente naqueles primeiros anos elabora 0 esbo- go de seu memordvel Pioneers of the modem movement, a primeira reconstrugao histérica positiva das origens e dos motivos ideais do movimento artistico moderno. A Inglaterra oferece a Gropius um colaborador precioso, cheio de entusiasmo e inteligéncia: Maxwell Fry. Quanto a América, basta lembrar que Morris tinha dado ao realismo americano aquele fermento teligioso que fara da arqui- tetura de Sullivan e de Wright a expresso e quase o simbolo da mais genuina democracia lincolniana. Para Gropius, era como remontar as fontes primeiras de sua propria tradigdo ideoldgica, recuperar a confianga naquele “progresso” que na Europa, depois do primeiro e exuberante florescimento, se corrompera cedo de- mais no agressivo egoismo das classes dirigentes. A fé na industria € na miss4o educativa conservava, naquele pais e naqueles anos, uma legitimidade indubitavel: nao era a antinatureza, suprema pureza ou suprema Corrupgao, mas um modo de viver com mais plenitude na realidade, de utilizar os bens, de realizar um grau maior de educagao e de liberdade humana, O anseio europeu de Gropius Se extingue com a angistia das contradigées de classe: permanece apenas 0 entusiasmo de uma contribuigado de experiéncia a ser A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA E NA AMERICA 143 levada a civilizagéo do mundo. A evolugao dele, a partir desse momento, nao conhece crises draméticas; é a Progressiva amplia- gao de uma experiéncia formal, até as tiltimas conseqiiéncias. Provavelmente a colaboragao de Maxwell Fry ajudou Gropius a reencontrar, nas poucas obras do periodo inglés, um tom mais sereno e cordial, um contato mais facil e espontaneo com as coi- sas do mundo. J4 nao hé um ideal a defender a qualquer custo, mas um programa a desenvolver. E 0 primeiro tema é propicio: uma escola de vilarejo, como centro da vida social de uma pequena comunidade. A escola € o medium entre sujeito e ambiente, e ambiente nao é apenas a natureza fisica, mas a natureza e a socie- dade como um todo. “A sensibilidade da crianga s6 pode ser educada através da agao, e a agdo pressupde um espago; nao o espago fechado de uma sala ou de um gindsio, mas 0 espago da natureza” (H. Read). A escola de Impington propée-se fazer do espago construido o prolongamento do espago da natureza, dar as exigéncias praticas e higiénicas uma justificagao pedagdgica. A planta é estudada em fungao de uma sociedade in nuce, na qual estudo e trabalho se baseiam na continuidade da experiéncia educativa. Ha um amplo vestfbulo onde alunos e professores se encontram e se entretém como no peripaton do liceu grego; ha salas onde os meninos podem recolher-se 4 vontade para estudar, tra- balhar, descansar; laboratérios e hortas experimentais; todos os servigos médicos, higiénicos e assistenciais que constituem a base da vida social moderna. As salas de aula se abrem, com grandes vidragas, para o espaco arborizado: a escola € 0 lugar aberto a to~ das as experiéncias, o instrumento de uma e livre entre o individuo e seu ambiente. ae oe As alas baixas do ediffcio, articuladas sobre o nucleo ‘i abrem-se no espago oferecendo-se ao maximo conmaN? oa a * € aatmosfera: o movimento ja nao é prinefpio ou lei de a mas facil e espontaneo desenvolvimento da vide numa ee acolhedora. A arquitetura reencontra & matéria genuine, omunicagao saudavel ay WALTER GROPIUS BA BAUHAUS senho ao mesmo tempo sibio e sumArio da ferramen- m aberta suas nuas paredes de tijolos, escancara er aluz do sole a sombra das 4rvores. As su- nao tendem a quintesséncia do plano e da simples, o de ta. Exibe na paisage! seus vaios para receb perficies e as curvas ja parabola, mas sao corte € fl construgao. Pela primeira vez, cio nao tende a reproduzir a pureza grafica do projeto, mas a rea- se na relagdo plastica entre cheios e vazios, a inserir-se como exao de uma matéria que se reaviva na na arquitetura de Gropius, 0 edifi- lizar- coisa viva num espago vivo. A casa para Benn Levy em Londres, de 1936, talvez seja a primeira idéia de Gropius para uma moradia que n&o seja condi- cao a priori de vida, mas um lugar onde se vive; nado um nimero numa série, mas unidade individualizada e conclufda. Se, no pas- sado, o edificio visava a reproduzir a linearidade do grafico, como uma planta que se projeta nas diversas dimensdes realizando 0 principio da divisibilidade espacial, aqui a planta é a articulagao interna de um organismo plastico bem definido. A casa é algo mais que a mera célula de habitagao, correspondente a uma fungao social precisa, mas limitada: é a dimensdo da vida, em todas as suas complexas fungées ou exigéncias. A geratriz desse “espaco vital” € a existéncia do individuo em todos os seus momentos e aspec- tos: entre os quais est4 também a necessidade de uma relagao concreta com o mundo externo, a “fruigéo” da natureza. Por isso © espago j4 nado é apenas uma “medida”, mas uma realidade na qual as pessoas vivem ou um limite em que elas funcionam: a mera estrutura de planos sucede-se a plastica dos cheios e dos vazios. Observe-se a perfeita medida com que o corpo mais alto com- Pensa, por meio da parede curva, a amplitude do corpo mais bai- XO, € como 0 ritmo espacial j4 nao se determina pelo balango cal- culads entre impulsos centrifugos e centripetos, mas pelo calmo eee iis ae : : a Forma e movimentoy na mais omplementares e ainda assim sepa- rveis no contexto, nascem da Prdpria intuigdo e se exprimem na A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA E NA AMERICA 145 répria realidade formal. No c i i id no ponto onde o plano 2 ak ne ane ‘ - , mpanha a curva des- te; acima, uma cornija suspensa repete graficamente a curvatura das paredes e ali inscreve 0 espaco aberto do terrago; embaixo, o plano horizontal de uma larga varanda escande, como uma pausa no ritmo, as diversas qualidades do vazio no térreo e na janela continua do andar superior. Todo valor encontra sua definigado imediata no elemento construtivo que o determina: a Tepeticao infinita se transforma em composigao articulada. Vazio e cheio ja nao sao valores antitéticos, que um refinado jogo de subdivisdes e freqiiéncias pode aproximar até a diferenga de uma fracgao mini- ma, sem no entanto chegar a fundi-los e identificd-los, a fazer do vazio fisico um “cheio” formal e vice-versa; mas sim, de fato, so a propria realidade plastica que o desenho construtivo modula, flexiona e enuncia com feliz liberdade criativa. O desenho, essa antiga légica formal, é agora a condigao pela qual vazio e cheio coexistem como valores de igual sinal, dotados da mesma plenitu- de e imediatez figurativa, mas gradudveis segundo uma infinita gama de quantidades e qualidades. Em 1937 Gropius ja est4 na América, lecionando na Univer- sidade de Harvard. Inicia-se um perfodo de intenso trabalho pro- fissional, did4tico, publicistico. Primeiro, 0 ensino se volta unica- mente para a formagéo profissional e técnica do arquiteto; depois, aescola se transforma num centro colaborativo para © estudo dos grandes problemas da pré-fabricagao e da planificagao urbanfst- enhum ponto de ca. Obviamente, a escola de Harvard nao tem ni contato com a Bauhaus; baseia-se numa rigorosa teoria da “ee tagao de projetos e no severo estagio pratico em SERIES oe 2 a formar um tipo de técnico com responsabilidades aed - mais amplas que as dos diplomados de Dessau Na Bauhau ani- qualidade de arquiteto era um ponto de chegada, porque & pl a tae: ficagéio urbanfstica nao era senio a reprodugiio ad infinitum, & a gundo combinagdes quase matemiaticas, da “ee formal; aqui, a unidade formal néo é a forma geométrica, ts a forma intufda ou criada, o nticleo vital de onde se geram ORE CAH Os com- plexos urbanjsticos, € por isso a atividade do arqulters se desen- volve e se cumpre na planificagao animada e criativa. O que impor- ta j4 ndo é o nimero que se torna série, mas 0 germe vital que se desenvolve até construir 0 tecido organico do corpo social. E, como este nao deve nivelar, mas harmonizar as individualidades, tam- bém a arquitetura deve reencontrar um tom individual ou cria- tivo; e restituir intacta aos homens, com a plenitude e a clareza plastica de suas formas, a “naturalidade” de que a organizagao eco- ae WALTER GROPIUS B A BAUHAUS némica e social inevitalmente os priva. A busca de uma unidade ou integridade plastica da forma tor- na-se cada vez mais precisa. E possivel que, para esse desprendimento final da forma em relagao a antiga dialética dos contrarios, tenha concorrido, ao lado do contato direto com as correntes orgdnicas que provinham de Wright, a necessidade de lidar com uma nature- za inusitada, de tao nova e atraente “dimensao”, cheia de apelos aquela capacidade de sensagao que 0 idealismo figurativo europeu durante tanto tempose esforcou por reprimir, em nome de uma virtus intellectualis da qual o racionalismo arquitet6nico é sem dtivida uma derradeira e extremada amostra. Contudo, nao podemos concor- dar com aquele critico do Architectural Forum que, como confirma- ¢a0 da influéncia exercida pela cultura americana sobre a obra re- cente de Gropius, cita o emprego freqiiente da pedra bruta, da madeira e de outros Cantos materiais nativos; eo aparecimento de linhas curvas nas plantas e nos algados, com a definitiva rentncia a uma rigida subdivisao geométrica dos espagos. E certamente verdade que, chegado a América, Gropius se dé conta da existéncia de mais de um pon: pria didéticaea didatica Pragmatista a: Dewey, to de contato entre sua pré- mericana, por exemplo, a de ProposigGes de sua teoria da adeira psicologia da arte. Mas € que, em seus escritos certas figuratividade evolufram para uma verd. A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA ENA AMERICA 147 _ basta lembrar a primeira enunciacao da didética da Bauhaus, como proceso que vai da matéria a forma, para excluir que a superag4o do racionalismo arquiteténico, por parte de Gropius, pudesse ma- nifestar-se como uma estupefata e entusidstica descoberta da maté- ria e de suas leis “organicas”. Tal superagao é, ao contrario, uma conquista interna ou de consciéncia; a libertagao diante de uma espi- cagante necessidade dialética, a identidade longamente buscada, e finalmente alcangada, entre o momento da sensagdo e o momento da forma ou da ago construtiva. Sem diivida, o ambiente americano oferecia muitas possibili- dades a difusdo dos princfpios e dos métodos da Bauhaus. O pré- prio Gropius explica, numa série de artigos, os conceitos funda- mentais da educagao formal. A exposig&o “Bauhaus 1919-1928” no Museu de Arte Moderna de Nova York, em 1938, assinala um enorme sucesso. A América parece empolgada por herdar uma grande idéia européia, a idéia que 0 nazismo baniu. Em torno dos colaboradores de Gropius, também eles refugiados na América para escapar a perseguigdo nazista, formam-se outras tantas pequenas Bauhaus: Moholy-Nagy assume a diregéo de The New Bauhaus em Chicago, outros centros de educagao formal nascem no Black Mountain College em torno de Albers e Schawinsky; na segao de arquitetura do Armour Institute de Chicago, em torno de Mies van der Rohe e Hilbersheimer, na School of Industrial Design de Nova York, na School of Design de South Carolina, no México. Mas, se a influéncia desses centros de educagao formal foi decisi- _ va para a evolugao da arte americana em diregao aos pad . _ chamado “abstracionismo” europeu, sobretudo pe er _ vimento do industrial design, seu raio de ago jamais consegu! alcangar a amplitude daquele da Bauhaus de Dessau, A idéia da Bauhaus permanece como uma idéia européia hs culada a um drama europeu: a necessidade de sanar uma eee social perturbada por desequilfbrios sucessives & cada a _ graves, e de reconduzir a produgie, desviada pelos ego's WALTER GROPIUS E A BAUHAUS Ws A i reta. Como idéia européia, pola- wr : pica ane da burguesia intelectual wi es bedisipenits aberto para um “idealismo” cuja necessidade ela capta confusamente. Mas nao pode extabelece e realizar um verdadeiro programa didatico-social, porque nao enfrenta - gran des problemas sociais americanos e ee a See Capitalists americana, afastando-se cada vez mais dos ideais religiosos da democracia lincolniana, preparava-se para percorrer um processo involutivo anélogo ao da burguesia capitalista européia. ‘Ademais 0 proprio Gropius, em sua atividade profissional e em seu ensino universitério, mantém-se fundamentalmente europeu. Avalia com objetividade absoluta e com sereno realismo as condi- goes de fato da civilizagéo na qual opera e 4 qual propée-se trazer uma positiva contribuigao de experiéncia; e, como a forma é sem- pre solugao de problema, é natural que ela se ressinta dos diversos dados do problema ao qual se refere. Mas a atitude de Gropius continua essencialmente critica. Em sua obra de 1938 em diante, em vao serao buscadas aque- las concessdes ao “gosto” americano que tao facilmente se perce- bem na arquitetura de Neutra, de Mies van der Rohe, do préprio Breuer. Gropius se recusa a emprestar seu préprio problema, es- sencialmente “histérico” e europeu, aos vagos anseios de “espiri- tualidade” da entediada plutocracia americana: seu pensamento mantém-se concentrado em descobrir as contradigées daquela sociedade tao diferente da européia, mas talvez tao dilacerada quanto esta. Ele escolhe a colaboragao de Breuer, talvez o mais “artista” entre os arquitetos da Bauhaus; e escolhe-a justamente Por acreditar que a intuigao artistica, o impulso criativo, deve re- Cuperar a dianteira sobre a mecanicidade do puro racionalismo; mas separa-se de Breuer quando percebe que a “artisticidade” deste ae. facilmente descambar para um refinado gosto pela decora- ¢40, pela arte de luxo. RepSe ento toda a sua confianga nos alu- nos da escola; com eles constitui um grupo cooperativo, com 0 a hi a |] = ikee i oo o com A. Meyer) agi abora cold ca Fagus, Alfeld , 1912 (em i Fabri 2-3, Fabrica Fagus, projeto da fachadae planta. : Vistas. 6-7. Exposicao de Colénia, 1914. Prédio para escritérios (em colaboragao com A. Meyer) : Detalhe da eseada do prédio para eseritorios ¢ sala de maquinas: 10. Casa Sommerfeld, Berlim, 1921 11. Maquete de prédio residencial, 1922 (em colaboracao com A. Meyer) 12. Projeto apresentado ao concurso do Chicago Tribune, 1922 N Ky ‘iid ny ie " jt tC eS! go OS re RR ne Rat f ny = ne = ae 1922 (em colaboragiio com A. Meyer) 1, 1923 (em colaboragio 13. Teatro Municipal de lena, 14. Maquete de uma academia de Filosofia em Erlange com A. Meyer) 15. Maquete de uma casa na praia, 1924 1. Entrada. 2. Sala de aula. 3. Depésito. 4. Laboratérios. 5. Gabinete de fisica. 6. Camara escura. 7. Saguao. 8. Exposigao. 9. Instrutores. 10. Polimento. 11. Carpintaria. 12. Méquinas. 13. Marcenaria. 14. Auditério. 15. Palco. 16. Refeitério. 17. Cozinha. idle 16-17. Bauhaus, Dessau, 1925. Planta do térreo e vista aérea. 1. Vestibulo. 2. Sala de aula 3. Sala dos professores 4, Biblioteca 5. Datilog a 6. Administragao. 7. Recepgao. 8. Diregio 9. Administragao da Bauhaus. 10. Contabilidade e caixa: 11. Exerefcios fundamentais. 12. Depésito 13. Tecelagem. 14. Instrutores. 15. Vestidrio, 16. Estiidios 18-19. Bauhaus. Planta do primeiro andar e vista aérea. 20. Bauhaus. Vista de conjunto 21. Vista sul ista norte. stidios e refeitério. 24-25. Bauhaus. Detalhe do grande ble ste al Te to 1] cn oH HH m \|\\\¥i 2co envidragado e desenho da fachada 26-27, Passarela e vista noroeste 29-30, Dormitério-tipo para alunos e gabinete do diretor 4 Quarto: Sala de estar/quarto de héspedes. 3. Lavanderia. Domésticos. > 1. Terrago. 2. Dormitério. la de estar. de jantar. 5. Copa 6. Banheiro. 7. Despensa 8. Cozinha Bauhaus, Dess: 2 auhaus, Dessau. Casa do diretor, Plantas do primeiro andar e do térreo. 3-34, Vistas leste e norte. vt 1. Dormitério. 2. Estiidio. 1. Quarto. 2. Cozinha. 3. Sala de jantar. 4. Sala de estar. Serereeey 35-36. Bauhs ae 35-36. Bauhz ; veininad: eae raus. Residéncias geminadas para docentes, Plantas do primeiro andar € do térreo 37-38. Vistas nor 39. Bauhaus. Residéncias para docentes. Detalhe. 9 10 20 30m hee nS 10. Residéneias unitarias e geminadas, 11. Residéneia unitaria. Cumin LU / crm UU / 42. Subtirbio Dessau-Torten. Planimetria geral. 45-46. SubGrbio Dessau-Térten. Plantas das casas-tipo, 1927. 47-48. Casas-tipo, 1927. 49-50. SubGrbio Dessau-Térten. Plantas das casas-tipo, 1928 51. Casa-tipo, 1928. 52. Cooperativa de consumo. 53. Escritério do Trabalho, Dessau. Planimetria. 54-55, Vista leste & interior Entrada Sala de estar. Sala de jantar. Cozinha. Despensa Depésito Carvao Dormitério Banheiro. OCDIDNHEWN 56 Casa expe rimental em Stuttgart, 1927 (montagem inteiramente a seco): 31-58, Plane as do primeiro andar e do térreo ab-c-d-e abedet 59-64. Elementos construtivos e exeny 65-67, Plantas. 1. Dormitério. 2. Trabalho: 3. Quarto. 4. Sala de jantar. 5. Cozinha. 6. Banheiro. 7. Depésito. 8. Area de p 9, Sala de estar plos de possiveis combinnagees 6 8. Residéncia em Zellendorf, 1928. 72.P, 73. Bairro Siemensstadt, Berlim, 1929-1930, Fojeto para um grande loteamento habitacional, 1929. 76. Projeto para um bairro residencial de edificios altos, 1930. 77. Maquete de edificio com estrutura em ago. 78. Planta de edificio com estrutura em ago. 79. Planimetria do “teatro total” para Piscator, 1926. 80-81. Maquete 88. Teatro de Karkoy, 1930. Planta. Projeto. | ie 90-93, Maquete ¢ projeto do palacio dos Sovietes, 1931. 99. Sala comum na exposigio de Paris, 1930 (e i euer): m colaboragao com M. Breuer) comune planta 100-10 shee 1, Edificio Deutsche Bau-Ausstellung, 1931, Sala ¢ 102-103. Detalhes da salacomum do edificio, 106-107. Casa pré-fabrieada, 1932, Fases de montagem 0 5 10m 108-110. Casa desmontavel e amplidvel, 1932. Plantas. TA ae Wi] TENN '11-112. Detalhes. EM Wer ra obi U awe 3 113-115, Mostra dos materiais ndo-ferrosos, Berlim, 1934 Detalhes (em colaboragiio com J. Schmidt) 116-118, Mostra dos materiais nao-ferrosos. Detalhes. om M, Fey) 119-120.¢ 0. Casa Levy, Londres, 1936 (em colaboragte ¢ eal 1. Aposentos de empregados. 1. Dormitério. 2. Esttidio. 3. Sala de estar par criangas. 4. Dormitério das criangas. 1. Entrada. 2. Sala de jantar. 3. Sala de estar. 4. Quarto de jogo: 5. Cozinha. 6. Servigo. 7. Garagem. 8. Terraco cobert 121-123, Casa Levy. Plantas (segundo a Architectural Review). 1. Auditério com equipamento para projecao sonora. 2. Laboratério de madeira e de metal. 3. Palco. 4. Cozinha. 5. Sala comum para adultos. 6. Pingue-pongue. 7. Bilhar. 8. Saleta de jogos. 9. Sala de leitura para adultos. 10. Saleta para professores. 11. Refeitério 12. Biblioteca. 13. Vestidrios e duchas. 14. Bedel. 15. Salacomum para adultos. 16. Sala comum. 17. Salas de jogos para alunos. 18. Ambulatério. 19. Laboratério cientifico. 20. Alfaiataria. 21. Salas de aula. 22. Piscina. 23. Gindsio. 24. Passagem coberta. 25. Fonte. solaboragdio com 125-127. Escola em Impington, 1936. Vistas e plane (em colaboragio ce M. Fry). Entrada de visicantes Y 1 {Hh | Heh ~ | Enerada para [TTT] Pa A] exposigdes 1 + Pale a cent 7 tt | Pequeno |e Misica auditério 4 L. sa M j ee POUT ETE TO | c 1e iat Entrada para estudantes ZA 128. Wheaton Colle, ge, Art Center, C; ‘i colaboracgéo com M, Rhea amb ge Mai eT Blaniaer ste, nERoESte & 938. Vistas nore 130-13 5 2. Casa Gropius em Lincoln, Mass., | sudeste (eme deste (e m colaboragio com M Breuer) 133. Casa Gropius. Vista noroeste 134-135, Plantas do primeiro andar e do térreo. 2. Banheiros. 3. Vestidrio. 4. Dormitério 5. Quarto de héspedes 6. Quarto das criangas 7. Terrago 8. Guarda-roupa 9. Entrada. 10. Guarda-roupa 11. Esttidio. 12. Sala de estar. 13. Sala de jancat 14, Sanitario. 15. Banheiro de s 16, Quarto de emp’ 17. Cozinha 18, Copa 19, Portico, 20, Enerada de servigo ervigo Jos. ‘ava Gropius. Terrago, 2. Dormitério. 3. Sala de estar. 4.Cozinha. 5. Sala de jantar. 6. Terrago. 138-139. Casa Ford em Lincoln, Mass., 1939. Plantas do primeiro andar e di térreo (em colaboracio com M. Breuer). 140-141 Vistas, 142-143. Casa em Cohasset, 1938 (em colaboraga4o com M. Breuer) 144-145. Casa em Pittsburg, 1940. Vista e planta (em colaboragao com M. Breuer) 0 5 10m 1, Entrada. 2. Sala de estudo dos rapazes 3. Cabine de projegao e camara esc 4. Elevador. 5. Sala de jogos 6. Bar dos rapazes. 7. Piscina 8. Lavanderia 9. Compartimento de secagem 10. Condicionamento de ar. 11. Despensa 12. Vestiario das mogas. 13. Adega 14. Vestidrio dos rapazes. 15. Despensa de verduras 16. Depésito de carvao 146 Casa Chamberls a . Breuer): ain, Weyland, Mass., 1939 (em colaborago com M. 147-148. Casa Abele, Framingham, Mass. 1941 guerra, New Kensington mM Breuer) 149.152 sale operaria para as inddistrias de -1943, Planimetria e vistas (em cola boragie ee ; a T= PEEEB By ys yer ome 28,0 yh TTT | Jax, do Jo primero 80 1941 Plancas gio com K. We hysmann) 153-15 155. Cer nitro de lazer em Key West érreo € projeto (em colabora pois 156. Casa pré-fabricada, 1946. Uma hora e quarenta e cinco minutos dep io da montagem (em colaboragao com K. Wachsmann) Trés horas depois do inicio da montagem. 1. Novo hospital. 2-3-4-5. Instituto psiquidtrico (em construg¢ao). 6. Setor de convalescenga (em estudo). 7. Alojamentos do pessoal. 8. Central mecanica. 9. Observagao. 10. Instituto de pesquisas (j4 existente). 11. Soroterapia. 12. Clinica (ja existente). 13. Escola médica. 14. Gindsio. 15. Alojamentos do pessoal (jd existente). 16. Novas lavanderias. 17. Quartos. 18. Lojas: 159. Vista parcial do Complexo Hospitalar Michael Reese, Chicago, 1947 (Gropius e colaboradores), 048, Planimetria ge ) 160-161 Ni - lovos edificios da Universidade de Harvard, | ts Collaborative e vista de " ade conjunto (The Architec rsidade de Harvard, 1950. Detalhes cts Collaborative). 162-164. Graduate Center da Unive de exteriores (The Archite 165-167. Graduate Center da Universidade de Harvard, Detalhes de exteriores © Center da Universidade > de Harvard. Escultura de Richard Lippol 169, Parede divisdria 170. Projeto para os escritérios da Sociedade Americana para o Progresso da Ciénciaem re) all ‘Washington, 1952. Planta do térreo (The Architects 9 : eg 5 (er 3 Za 2 , BEEES 2 s oe 25 2 3 See ces z a € 605 oO 6 2,885 Eneeo © 0 £3.08 5 eeges esas Seren s & ob 8 O'S 9 Beeese sec ee se @gegPotlssss sg sD Seevug ag ys ke sicasasgdad Sane Se dasa 174-177. Projeto para os escritérios da Sociedade Americana para 0 Progresso da Ciéncia. Fachadas dos lados sul, leste, norte e oeste: A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA E NA AMERICA 149 qual se dispor4 a estudar o plano de renovagio dos edificios da instituigao; a idéia de escola como primeiro organismo social, que determina as préprias formas segundo a prépria fungao formativa, ainda estd na base de sua obra de mestre. Pelo que se pode depreender a partir de um grfico, 0 projeto para o Art Center do Wheaton College, estudado com Breuer entre 1937 e 1938, é outro passo em diregao a uma estrutura cada vez mais livre e desmaterializada. O fulcro do movimento compositivo (0 palco giratério do teatro, que liga os dois grandes corpos para- lelos) s6 é perceptivel na planta; mas a sensagéo de movimento transmitida pelas paredes oblfquas da sala se traduz construtiva- mente na exaltagao dos vaos, nas estruturas rareadas e estendidas como tirantes, na sistematica eliminagao do peso. Os planos, se- jam eles envidracgados ou em alvenaria, vibram como diafragmas eldsticos no limite da tensao; os perfis se arqueiam como uma vela muito esticada; as superficies parecem fremir como asas de um planador ainda preso, mas j4 tomado pelo sopro do vento. A es- trutura, que antes era sec¢ao, quadratura ideal tecida no espago infinito, agora obtém um valor liminar, um valor de horizonte: como se, nao sendo possivel captar do espago nenhum outro sinal sensfvel, a nao ser 0 término do horizonte, que manifesta ao mes- mo tempo sua real infinitude e a inevitavel finitude da imagem, esse término de repente se tornasse interno ao espago percepti- vel em qualquer trago do desenho, como uma corrente de ritmo que descobrisse a profunda esséncia espacial de toda determina- 40 formal. A primeira vista, pode surpreender- go da composigao sobre dois grandes corpos regulares ¢ parale- los. Mas observe-se a ligacao entre eles por meio das paredes oblt- quas do teatro e do pavilhao baixo destacado, excéntrico, aberto em Angulo obtuso. O ponto de fuga, para ° qual SE ak Paredes oblfquas, cai além do perimetro do ediffeio; ao passe to ; a divergéncia dessas mesmas obliquas, em sentido oposto, nos a inusitada apresenta- 180 WALTER GROPIUS EA BAUHAUS ey rs conjunto ao prinefpio de movimento rotativo que se localiza jungitio dos dois bragos desiguais do pavilhao destacado. De, forma, os dois blocos principais ficam inclufdos numa rubrica do movimento, quase atravessados, dirfamos, pelos fios invisfveis de» um ritmo que, desenvolvendo-se em giros cada vez mais amplos, identifica o movimento dos planos construtivos 4 mobilidade ou mutabilidade continua do espago circunstante, a variedade das cotas, ao perfil ondulado do terreno, a flutuagao dos densos aglo- merados das 4rvores, 4 variagdo das luzes e das sombras. Esse paralelismo, essa simetria, essa estase aparente sao uma necessi- dade légica, desde que os dois grandes corpos do edificio, j4 envol- vidos numa condigéo de movimento, s6 poderiam designar outra condigao materializando e limitando um ritmo imponderavel e ili- mitado, concentrando e adensando os planos suspensos no vazio. Esse projeto nao realizado talvez seja o ponto crucial do esfor- co dedicado a superago do racionalismo. Aquele principio mo- tor que vimos apresentar-se como uma cinematica da forma, e que num segundo momento chegou a constituir-se como fendmeno objetivo de movimento, é agora realiz4vel fora de qualquer alusao dinamica, na intensidade e na duragao da sensagao formal. Ele € até mesmo a prdpria condigao da sensagdo, visto que toda sensa- ¢40 que nao caiba no circulo de um continuo devir descambaria de imediato para a nogao e perderia sua atividade interna. O mo- vimento ja nao é nem mesmo diregao, porque, se por acaso O fosse, o desenvolvimento formal seria sempre previsivel, retornando-se assim a construtividade racionalista pela sucessiva repetiga0 OU projecao da forma; é, ao contrdrio, pura mobilidade, principio vital comum a realidade e a consciéncia e, por isso, igualmente percep- tivel nos atos formais da arte e no mundo fenoménico. As residéncias particulares que, com Breuer, Gropius construiu na América a partir de 1938 podem ser consideradas os documen- tos de uma organicidade subjetiva, que nao visa a surpreender uma vitalidade i f i i ( nterna ou um “crescimento” do real, mas 0 ritmo ou ei A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA E NA AMERICA 15) movimento interno da consciéncia que estabelece a realidade, seu “crescer” e organizar-se até incluir na prépria capacidade criati- va, na sucessdo e na coordenagao das sensagdes, todos os aspec- tos eos Momentos do real. Eo proceso inverso ao de Wright. Cada nova obra de Wright é uma imersio na realidade, a descoberta de um estrato seu mais profundo, o estabelecimento de novos e im- previstos vinculos com o mundo dos fendmenos. A técnica se re- nova e se redescobre a cada vez no ato da criagdo, que apaga atras de si toda experiéncia precedente. Gropius nao visa a criagdo, mas A criatividade como atividade geral da consciéncia, investiga-lhe os processos, amplia-lhe os desdobramentos, constréi e aperfeigoa uma técnica. Sendo razodvel supor que na casa de Gropius tenha prevale- cido a invengao de Gropius e na de Breuer, a invengao de Breuer, acreditamos poder atribuir a este tiltimo o emprego mais amplo de materiais brutos e nativos, o gosto acentuado pelo contraste entre as diversas qualidades dticas e tateis desses matenais, a atengao extremamente aguda as varias textures € ainda uma pes- quisa em tudo coerente com aquela que o proprio Breuer condu- zira na Bauhaus, e destinada a diferenciar as sensagdes torné-las mais precisas. Na casa de Gropius, mesmo quando uma breve cor- tina de alvenaria se insere entre o alvo reboco e a transparéncia das superficies envidragadas, tal insergdo conserva uma razio es- pacial; é o medium que, como uma articulagao viva, liga espago aberto e espago construfdo, uma “chave” coloristica que inclui no mesmo registro a luz natural ea luz que a propria estructura posit: vamente determina. Em todas as construg6es desse perfodo, ¢ f- cil reencontrar a presenga de um elemento anélogo: na casa Ford em Lincoln, é uma chaminé que sulca uma parede lisa e quebra a regularidade do perimetro; alhures éuma varanda, uma eeeeee envidragada, uma série de traves sutis come laminas que ree ; oa um terrago. A luz é a dla descoberta formal de Gropiuss nao se trata de uma luz que as diferentes qualidades das s as2 WALTER GROPIUS BA BAUHAUS cies absorvam ou reflitam com uma pictorica variedade de efei- tos, e sim de uma luz-espago que a propria estrutura “constréi” e cujas elementos formais se reduzem para penn a margem de qualquer intelectualismo, como pura sensagao. Na casa de Gropius, por exemplo, 0 forte entablamento de Angulo, suspenso no vazio, assinala o limite de um plano imagina- rio, além do qual o vazio continua e penetra no Amago da cons- trugdo; por sua vez, a varanda prolonga © espago interno até 0 externo, resumindo-os na mesma trama construtiva, no mesmo: tracado grafico, no mesmo diafragma transparente das vidragas. A estrutura nitidamente aperspéctica (que, de fato, nao admite: pontos de vista determinados) visa substancialmente a reduzir todo © espaco, construfdo ou natural, ao zero, ao vazio tedrico; a elimi- nar toda condic&o visual positiva, a impedir toda polarizagao da sensibilidade 6tica ou espacial: assim, qualquer elemento formal, tanto da natureza como do edificio, j4 nao se dé como valor num sistema, e sim como liicida e imediata sensagao. Por isso a propria condigao basica da visibilidade, a luz, j4 nao é confiada a efeitos empiricos, mas fixada pela qualidade dos planos, pela sucessao, a largos intervalos, das delgadas traves contra o céu aberto acima dos terragos, pelos alinhamentos de réguas verticais e horizontais que fixam a freqiiéncia da vibragdo luminosa. De fato, se 0 espago jé nao se dé no célculo ou na construgao geométrica, mas naquilo que Fiedler chamava “o interesse do olho eda mao”, isto é, na positiva construtividade da sensacdo, 0 espa- go ea luz sao 0 produto do proprio ato construtivo. A construgao, como construgao de espago, é construgao de luz; e o processo construtivo, que opunha a profundidade ou extensdo empfrica um €spago organizado, agora opée as infinitas e inconstantes impres- s6es luminosas uma construgéo luminosa, uma luz “espacial”. Convém recordar o que dissemos quanto aos vazios e a0S cheios. Gropius vem de uma tradigdo figurativa que considerava , a luz ‘ , como 0 contrario e o complemento da sombra, um ser na0. A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA E NA AMERICA 153 designdvel de outro modo que nao em antitese a um ndo-ser. Ern arquitetura, luz e sombra correspondiam a cheio e vazio. Se cheio e vazio j4 nao s4o vistos como ser e nao-ser, mas como momen- tos igualmente positivos do ser, o mesmo acontece quanto 4 luz e a sombra. Desde as primeiras obras, ao buscar na transparéncia e na pura geometricidade das estruturas um termo de igualdade entre cheio e vazio, Gropius visava a alcangar uma consubstancialidade de espaco e luz, embora a luz ainda fosse um modo de desmaterializar oespago e de reduzi-lo 4 construgao geométrica. O processo ia do particular ao universal; da sensagao, que ainda era um dado, ao conceito. A longa investigagao, que procuramos acompanhar, so- bre o valor da fung4o, do movimento, da cinematica da forma, e sobretudo o empenho em reconduzir uma abstrata “teoria da arte” a diddtica concreta vao cada vez mais desacreditando o tradicio- nal prestigio do conceito; se tudo é um fazer ou um construir, e se a propria sensagao nao é recepgo passiva, mas contribuigao con- tinua e ativa do espfrito humano 8 constituigdo do mundo, pode- se seguramente afirmar que a “sensagdo vem de dentro” e tem toda a plenitude e a autoridade do ato. Essa frase é de Kelley, um psicélogo americano, e se refere es- pecialmente & percepgao pelo olho; mas, inserida na hist6ria da arquitetura e da didatica de Gropius, assume um sentido mais pro- fundo. Visto que a casa € 0 produto formal da vida que se desen- volve em seu interior, o dado inicial da construgao é a propria vida, na unidade e na complexidade de seus momentos. Chega-se até mesmo a casa “aumentavel”, por sucessivos acréscimos orginicos previstos na planta inicial, prontos a serem desenvolvidos junto com o desenvolvimento da familia, que constitui o nticleo funda- mental da agregacao social. A flexibilidade dos tragados, tanto nas unidades isoladas quanto nos grandes complexes, significa que a planificagéo deve adaptar-se ao desenvolvimento da comunida- de, em vez de condicions-lo a uma norma preestabelecida. A planea ise WALTER GROPIUS E A BAUHAUS jA nfio & uma distribuigdo racional de espagos em relagdo a uma série preordenada de fungdes, mas um esquema dictil e elstico, capaz de situar, de dar uma perfeita justeza espacial, uma forma, enfim, a todos os atos da existéncia. J4 nao é a arquitetura que planifica a vida, mas a vida que determina a arquitetura; a qual, em tiltima anilise, nao € sendo o modo de corresponder ao desejo, inerente a todo ser humano, de dar aos seus atos um limite, ou um horizonte, ou um termo de eficdcia. A propria atitude do homem diante da realidade j4 nao é designavel como interesse de conhe- cimento nem como interesse pratico, mas como tendéncia espon- tanea a reduzir 4 “escala humana” e a tornar objeto de experién- cia o mundo circunstante. A arquitetura nao se mimetiza, mas tampouco submete a realidade externa a autoridade de suas for- mas “racionais”, certas, imutaveis; ela penetra e se insere na pai- sagem na mesma medida, e com a mesma desenvoltura, com que a paisagem penetra e se insere em seu perimetro variado, em seus grandes terragos abertos, em suas imensas vidragas; e se, em suas paredes mais internas, acontece-nos encontrar um ornamento de troncos ou de pedra bruta, isso nao alude a um miraculoso cresci- mento da arquitetura a partir da pedreira e da floresta, mas sim- plesmente indica que a realidade penetrou até mesmo nas fibras mais internas, constituiu-se em sensagao, encontrou sua forma nessas estruturas. Como 0 espago jd nao se supe em construgdes geométricas, mas da-se na textualidade e na finitude da sensagao, essa arquite- tura nao tem outro limite de espago que nao o horizonte fisico de seu ambiente imediato. Arvores, rochas, longinquos perfis de mon- tes recebem da construgao uma nova marca, uma forga de sensa- ¢40 formal; por mérito da arquitetura, como de um prodigioso instrumento espacial, constituem-se em forma, produzem-se como precisos valores de linha, volume, cor. O edificio j4 nao exprime o mundo em imagem, mas imprime ao mundo a forma ou a estrutu- ra da consciéncia: é um meio através do qual se cumpre e se reno- A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA E NA AMERICA 155 va continuamente a experiéncia do real. Daf a necessidade dos perimetros livres e movimentados, modelados sobre a elasticida- de das plantas; dos vazios que se abrem em todas as diregées, até para o alto, porque também o céu é ambiente ou “circunstancia”; dai a ligagao das estruturas, com vivos tent4culos construtivos ou com a jardinagem discreta e sensfvel, 4 anatomia mais interna da paisagem. Daf, ainda, a aspiragao por levar esse delicado instru- mento construtivo ao alcance de todos, por conceber esquemas arquitet6nicos sempre passiveis de desenvolvimentos organics, por divulgar os processos construtivos através da variada componibilidade dos elementos pré-fabricados. Que horizontes didaticos mais amplos correspondem A fase recente da arquitetura de Gropius? Nao consta que ele tenha par ticipado das varias tentativas de reconstruir uma Bauhaus na América. Outros, e mais que todos o antigo aluno e colaborador Moholy-Nagy, desenvolveram os prinefpios dele numa sutil e ex- tremamente ampla analftica formal. Gropius sequer desfrutou das possibilidades de sucesso que, indubitavelmente, a recente orien- tagao de sua arquitetura podia ter dentro da alta burguesia ameri- cana. Desde que se tornou professor na Universidade de Harvard, 0 objetivo principal de seu ensino sempre foi a planificagao urba- nistica, no sentido mais amplo: a arquitetura nao € sendo a feno- menologia da planificagdo. Uma vez que j4 nao se reconhece na arquitecura uma figuratividade prépria, 0 treinamento do arqui- teto se baseia num ensino formal de carter geral e no exercicio pratico, de canteiro. Tudo se reduz a relagéo entre uma cultura e uma técnica, Uma nismo & a obra coletiva de uma sociedade cultura, porque o urba' aaa uma Wenica, orginica e perfeiramente integrada, sem classes; Porque a cultura néo é patrimdnio, mas processe progressive en Ato, e por isso todo fato de cultura cabe necessariamente NO riemo de uma construtividade. O conceito de que nao existe um proble- iss WALTER OROPIUS BE A BAUHAUS ma do real, portanto nem mesmo uma figuratividade, a no ser dentro da esfera da atividade social, € um dos pontos mais inte- ressantes do pensamento de Gropius: “O termo design abrange em geral toda a rbita daquilo que nos circunda e que se deve 4 mao do homem, desde o simples utensflio cotidiano ao complexo tra- gado de uma cidade inteira.” Ele afirma que a arte nao poder4 cumprir sua tarefa de educagao formal enquanto estiver baseada em esquemas de valor dependentes do sentimento pessoal; a figuratividade tem suas leis, suas normas técnicas internas, e estas nao lhe limitam a forga criativa, tanto quanto nao o fazem as leis da harmonia ou do contraponto em relagao 4 criatividade da misica. Nao se renuncia ao standard, que nao € uma forma caracteris- tica do racionalismo formal, mas sim o resultado constante da experiéncia artistica, o ponto de chegada de uma tekné. Também a arquitetura grega e a gética (que Gropius considera a dltima expresso vital da arquitetura européia, antes do movimento mo- derno) produziram seus standards. Somente a partir do momento em que a sociedade perdeu sua unidade e a arte se colocou como expresso do individual (admitindo, assim, a autoridade diretiva do individuo sobre a massa) foi que desapareceu a consciéncia do valor do standard: 0 qual € produto de uma selegdo, triunfo daqui- lo que € “vital e impessoal sobre aquilo que € pessoal e acidental”. Com essa concepgao do standard, volta a baila o valor da histéria; de fato, essa forma derradeira e sintética da experiéncia, esse (di- tia Dewey) supremo grau de “interagao” numa complexa série de telagGes, s6 é alcangavel mediante um Processo ou uma sucessao critica e seletiva de experiéncias. Disso decorre que o standard j4 nao € um objetivo que a sociedade se propde e em cuja obtencao ela eA a eliminar certas contradigdes a fim de obter um grau maior de integridade, mas sim a expressfio de um fundamento unitério, de um ethos coletivo, que a sociedade possuiu outrora e que logo se foi obscurecendo ou dissipando: um inconsciente co- A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA ENA AMERICA 157 letivo que se torna consciéncia coletiva. Mais tarde, Gropius en- copra a confirmagao disso: ao descobrir, na antiga arquitetura japonesa, aquela mesma clareza espacial e aquela mesma liicida racionalidade formal que havia procurado desde as suas primeiras obras. de aut gp Easemp Oriente, que a Wright parecera tipica- mente “organica”, oferece a Gropius a prova de que a racionalidade nao é uma atitude artificiosa, mas a mais natural e espontanea atitude do homem civilizado. O artista nao se serve da natureza, suas fontes sao internas A sociedade; as matérias de seu trabalho nao sao matérias origi- nais, mas produtos, bens econémicos da sociedade na qual ele age. O custo de um certo material, o grau de experiéncia técni- ca que se alcangou ao trabalhé-lo, 0 fato de esse material ser encontrado no local ou precisar ser trazido de longe nao sao meras contingéncias praticas, e sim, tanto quanto a “qualidade” dele, outras tantas possibilidades do fazer; a atividade do artista nun- ca remonta aos princfpios supremos do ser, mas prossegue e de- senvolve um processo, uma técnica j4 em ato, e se desenrola inteiramente no circulo da socialidade. “Qualquer um é originariamente capaz de produzir formas espaciais se seu sentido 6tico-espacial tiver sido oportunamente desenvolvido”, isso equivale a afirmar que a faculdade criativa ori- ginal é geralmente destrufda por uma falsa educagao artistica. Nao é dificil descobrir a quem se dirige tal observagao: nao se ensina ainda, e justamente nas escolas que se dizem artfsticas, dadeiro valor da arte € algo imponderdvel e inapreens! : do significado preciso dos signos ¢ das sensagoes formais — eal, ho Como entao espantar-se com que, em confronto com ess lo rebaixadas a mero empirismo omo poderao os homens es de seu estar-na-realidade, que © ver- ‘vel, além percepgao e a sensagao tenham sid €a tecnica, a mera manualidade? E tar felizes, ou pelo menos conscientes Sa $6.08 atos desse seu estar, seu trabalho, enfim, sfo considey te uma fadiga cega e surda, ou até um castige original, enquan\ 188 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS revelagao e 0 goz0 da realidade que eles mesmos concorrem para construir so eternamente subtrafdos ao horizonte de suas vidas, remetidos a um improvavel além, ou melhor, reservados a uma “classe culta” & qual cabe exclusivamente o privilégio de impelir a prdpria existéncia para além dos limites do util e do material? E tarefa da arte, como educagao artistica, ensinar os homens a tomarem consciéncia da realidade que seu trabalho determina continuamente, a dar-se conta da criatividade de seu agir no 4m- bito de uma construgao social. Ent4o, a técnica mecanicista, que humilha e mortifica, se transformar4 numa técnica criativa, a qual exaltaré o valor da vida. Visto que no se experimenta a realidade a nao ser realizan- do, e que o realizar é presente absoluto, nao existe distingao pos- sivel entre mundo objetivo e mundo subjetivo, entre realidade e ilusao. O reconhecimento da nao-realidade da ilusdo depende de uma reflexao a posteriori, isto é, do fato de que a sensagao, ao ser julgada, perde a vivacidade original. A pureza, a lei de rigor do fato artistico, manifestam-se justamente nisto, no fato de que a sensagao € a tinica experiéncia em ato, ao passo que toda aprecia- ¢4o sobre ela, todo juizo de valor, € determinado por outras expe- riéncias, j4 passadas, que se superpGem ou se misturam & atual. Por exemplo: quando olhamos uma rua retilfnea, temos a sen- sacdo de que as paredes das casas convergem para um ponto. Sabe- mos que na verdade elas nao convergem, porque uma experiéncia precedente, elevada a condigao de nogao (0 fato de ter percorrido uma rua semelhante e constatado que as paralelas nao convergem para um ponto), retifica a sensagdo e a supera. Desenharemos essas linhas convergentes nao porque tal € nossa sensagdo genuina, mas para dar a ilusdo do efetivo paralelismo dessas linhas. Durante sé- culos, dar uma ilusao ou aproveitar-se de uma experiéncia adquiri- da constituiu 0 objetivo de uma arte pensada como artificio; reali- zar uma sensaGao ou executar uma experiéncia é a fungao da arte moderna. E nao se trata de “fruir” a sensagdo, o que continuaria A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA ENA AMERICA 199 sendo os mecolherste ao passado, mas de produzi-la; isto de ligar as sensagoes cuja realidade se constréi a um fazer, a uma atitude dina- mica, é a tarefa da educagao artistica, sem a qual nossa acao se de- senvolveria de modo obscuro e informe, ou até mesmo, por nunca se situar numa realidade, nao se poderia realizar. Os exemplos citados por Gropius em seu ensaio “Design Topics” pertencem ao repertério comum da psicologia experimen- tal: dois quadrados iguais, respectivamente tracejados por linhas horizontais e verticais, parecem prolongados na diregao oposta aquela do tracejado; um bebé de poucos meses, ao ver a lua pela primeira vez, estende a mao para pegd-la; tomando-se a fotografia de uma superficie acidentada, basta vird-la de cabega para baixo para que as elevagdes paregam depressGes e vice-versa; uma si- lhueta recortada em preto sobre branco parece mais delgada que a mesma silhueta feita em branco sobre preto, e assim por diante Esses efeitos chamam-se comumente ilusGes de ética, mas nao nos interessam como tais, isto 6, como “equivocos” visuais que uma nogdo anterior logo vem retificar; 0 que interessa é estabelecer que essa 6 a pura e auténtica “sensagao”. Esta nao nos esclarece sobre ocontetido, sobre o patriménio de nogées adquiridas, mas sobre o processo ativo e atual da consciéncia. O que leva a julgar e con- denar a sensagao como um erro ou um engano dos sentidos é de fato uma parada e um retorno da consciéncia a experiéncias pas- nte responsa- sadas ou a nogées pelas quais ela nao é imediatame: stavel ou na vel, em suma, é a fé numa “natureza” sistematica e & tabeleceu e transmitiu as leis dessa natureza. autoridade que es ureza, Mas Somente uma arte que nao repita as aparéncias da nat alidade, ou da experiéncia, assim se con- determine a forma da re poderd ser considerada plenamente cretize no presente absoluto, livre, ou seja, plenamente criativa. ; Para excluir que Gropius tenha passado levianamence jo racionalismo europeu ao psicologismo americano, bastard CONstae tar a perfeita coeréncia dessas proposigdes CeSrIcas COM. sua adivie 160 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS dade construtiva, e nfo sé com a mais recente. O caso dos qua- drados tracejados explica-se pela intervengio do fator tempo na percepgtio de espago: o tracejado cria uma série de intervalos que alentecem a percepgao no sentido oposto ao das linhas, percep- ¢G0 que o individuo tende a continuar mentalmente. Portanto, essa chamada ilusdo de dtica € percepgao auténtica que, como toda percepgao, nao acontece no puro espago, mas no espago-tem- po. Espago e tempo sao separaveis quando recapitulamos uma ex- periéncia passada, ou melhor, a distingao entre eles é 0 processo tipico da organizagao ou coordenagao das experiéncias que se chama historia. A arte classica, baseada na historicidade da cons- ciéncia, de fato coloca a forma como espacialidade pura e reduzo tempo ao espago por meio da perspectiva. Ao contrario, a inseparabilidade entre espago e tempo € a condigao do presente, isto é, da sensagao e da ago, por sua vez inseparaveis. A arte clds- sica concebia a forma como perfeita estase (sendo toda estase um passado, um ter sido) e inferia a permanéncia ou a eternidade dela; a arte moderna coloca a forma como movimento e vir-a-ser, e in- fere-lhe a provisoriedade ou a mobilidade continua. Ea tltima con- seqiiéncia da batalha contra o monumental travada por Gropius durante toda a sua carreira artistica; eéa condig&o do urbanismo, como arquitetura no tempo, que chega até a prescrever a duragao limitada e a decadéncia de suas préprias formas. O exemplo da silhueta que parece mais ampla ou, ao contra- tio, mais delgada, segundo seja destacada em branco sobre preto ou em preto sobre branco, é explicado pela irradiagao da lumi- nosidade do branco para além dos contornos. Registraremos incidentalmente que, justamente Para evitar a imediagao da sen- sagao € transferir o contraste entre branco e Preto para uma rela- ¢40 proporcional, a arquitetura classica mediava a passagem do vazio ao cheio com 0 modelado, isto €, oclaro-escuro, das cornijas; € que, eliminando as cornijas modeladas, a arquitetura moderna visa exatamente a restituir A Sensa¢ao espacial sua imediagao. Mais A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA E NA AMERICA 161 precisamente, na proposigao de Gropius est4 implicita a idéia de que a luz, como fato formal, é inteiramente independente da rela- do naturalistica entre fonte e tela; a propria forma € sensagao luminosa, e a quantidade de um branco e de um preto, a qualida- de do desenho que define os contornos das 4reas deles sao sufi- cientes para determinar valores de luz. Ou melhor, como essas qua- lidade e quantidade tém possibilidades ilimitadas de variagao, a luz formal tem a mesma mutabilidade da luz natural. Ao comen- tar um informe técnico sobre a conveniéncia de garantir as obras de arte dos museus, mediante a iluminagao artificial, aquela per- feita condicao de visibilidade que, com a luz diurna, é apenas uma fleeting occurrence, Gropius protesta: a luz artificial nado muda, a luz diurna é viva e cambiante. “A fleeting occurrence produzida pelas mudangas da luz é justamente aquilo de que precisamos, porque todo objeto visto nos contrastes da cambiante luz do dia propor- ciona, a cada vez, uma impressao diferente.” Portanto, a forma artistica nao fixa um efeito especifico de luz, mas realiza a luz em sua continua mutago: nao é uma luz ilusdria que substitui a luz natural, mas a transformagao das impresses luminosas inconstan- tes, indistintas, inqualificadas, numa sucessao ordenada de sensa- g6es “construtivas”. A identidade entre forma, espago & luz, oua idéia de uma forma que seja ao mesmo tempo construtiva de es- paco e determinante de luz, constitui, como observamos, © tema fundamental das residéncias particulares construfdas por Gropius na América. Por isso é interessante notar como aquela identidade reconduz a uma simplificagao estrutural, que aproxima as obras ~— es ae mais recentes (por exemplo: 0 belfssimo complexo do Harvar ig anos do periodo Graduate Center) da esmerada composigao de planos de Pe ; : do, as alvas superficies Go tude luminosa, Um VIgOF berto circundante bem das superficies ds mais estritamente racionalista. Contu Harvard Graduate Center tém uma pleni cromatico, uma “captura” sobre o espago a diferentes da pura e imaterial geometricidade Bauhaus. we WALTER GROPIUS E A BAUHAUS Porém, € significativo que o problema da sensagao ativa ou eriativa, embora colocado em termos clarfssimos, continue vin- culado & contraposigéo entre realidade e ilusdo, que indubita- velmente conserva as marcas de dualismos j4 superados. Gropius jamais cortou suas profundas rafzes européias; através do novo psicologismo, ressurge a antiga obsessao moral. Também a ilusdo é algo que se produz na vida (mesmo que a partir de uma condigao de dor) e a ela pertence; algo que somente um zelo religioso re- move da unidade da existéncia e repele para 0 inferno do nao-ser (ou do pecado): reabrindo contradig6es insanaveis, diminuindo o valor da vida e da responsabilidade humana. Realidade e ilusdo ainda sao termos do problema porque a arte ainda esté empenha- da num esforgo pela libertagao das consciéncias. Nao se pode des- truir de repente a ilusdo, que é sempre um esforgo destinado a abalar e modificar uma realidade tida por inerte e imutavel; nao se pode de repente apregoar aos homens, contra uma tradigdo de séculos, que somente a realidade é criativa, porque € o mundo do possivel, ao passo que a iluso, que opera no mundo do impossi- vel, nao o €. Convém, de preferéncia, ensinar os homens a acredi- tar em suas ilusGes como se elas fossem realidade e a duvidar da imutabilidade do real. A solugdo pode parecer precéria, e ainda impregnada de um antigo pessimismo europeu; mas, afinal, era o maximo esforgo que uma consciéncia européia, como a de Gropius, podia impor-se para esquecer as prdprias contradiges e adaptar- se ao Otimismo, a confianga, a satide (também elas mais ilusorias do que reais) do mundo americano. “Além da concretizagao de seus objetivos praticos por meio do intelecto e do cAlculo, o projeto deve ser o produto do desejo e da paixao humana.” E compreende-se: se a “escala humana” € a tinica medida do espago, também os impulsos Passionais e as aspiragdes ideais tornam-se medida do espaco. O urbanismo, suprema expres- sao da vida social, j4 nao é fungao pura e uniforme; é tensdo, supe- A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA ENA AMERICA 163 ragao, designagao de possibilidades, planificagao ilimitada, Nele, o desenho recupera seu significado original de ideag4o e projeto, raiz de toda possivel determinagao formal. A postura social do urbanis- mo nao esta tanto no socorro imediato que um “saneamento” ou um acréscimo edilfcio trazem a uma classe em crise quanto na ca- pacidade de reconduzir toda a sociedade as suas construtividade e criatividade originais, desinteressadas, livres de superestruturas. A preocupagao principal de Gropius, na época dos arranjos urbanjsticos de Dessau, Karlsruhe, Berlim, voltava-se para o dile- ma entre cidade e campo, para dois tipos contrastantes de socie- dade e de trabalho. A cidade, centro da produgdo racionalizada da indistria, era o espago organizado ao qual se contrapunha a natureza empirica. Mas, se a forma jd nao é uma realidade que se da somente numa atividade racional, o desenho ou a planifica- do, como pura construtividade, é inerente a prdpria vida, ao seu decorrer cfclico em todos os estratos e momentos do real. A arte repoe em crise a industria, 4 qual, contudo, vinha-se ligando inti- mamente; reconhece nela uma fungao limitada e parcial, embora necessaria; atribui-lhe a produgao dos instrumentos sobre os quais, porém, a criatividade humana deveré conservar um dominio com- pleto. Deve-se ter em mente que a breve histéria das cidades ameri- canas nao podia ocasionar a dissensdo entre prestigio civico e fun- gdo urbana que constitui o punctum dolens do urbanismo europeu. Os termos da questao sao mais crus, conquanto precisos: de um lado, as forgas destrutivas da especulagao, de outro as forgas cons- trutivas do trabalho. Nao se trata de defender a atualidade da fun- Gao contra a inatualidade do privilégio, mas a vida contra ° can- cer, contra aquilo que Wright define como a aceleragio febril e letal das grandes cidades. A partir de posigoes diferentes e com argumentos diversos, Mumford, Wright, Gropius travam a mess batalha pelo desenvolvimento livre da fungao vita — ciosa ¢ unilateral hiperfungdo econdmica. Os pontos | contra a Vie essenciais do ied WALTER GROPIUS E A BAUHAUS programa so: a limitagao dos perfmetros urbanos, o Senhaate das grandes aglomerag6es, a constituigao de pequenas comunidades orginicas, o retorno 4 “escala humana”. Encaixa-se nessas pro- postas 0 recurso cada vez mais amplo a pré-fabricagao: a redugao de custos e de tempo, a simplificagao dos processos construtivos, a possibilidade de fazer surgirem rapidamente novos nticleos habitacionais em zonas distantes dos centros de produgao dos varios materiais de construgao, que constituem condigées essenciais para a formagao de comunidades descentralizadas, mas cultural- mente adiantadas. A pré-fabricagao, que deve limitar-se aos ele- mentos, sem prévios esquemas rigidos de habitagao, tem também uma fungao educativa especifica: ela determina um standard téc- nico e permite a livre explicitagdo da construtividade espontanea das comunidades. Os elementos poderao ser compostos em uni- dades de formato e aspecto diferentes, segundo combinagées infi- nitas. Também infinitas serao as possibilidades de entrelagar a ar- quitetura ao espago-ambiente, adaptando-a plasticamente a varie- dade do terreno e da vegetacao. As novas aglomeragées, com sua flexibilidade e sua capacidade de modificar-se ao longo do tempo | junto com o desenvolvimento das fungGes, serao a expresso viva de uma sociedade que continuamente se organiza e se cria, reno- vando a realidade em que vive. O arquiteto nao forneceré as li- nhas diretivas e os Principios formais dessa continua e ilimitada autocriagao, coma qual, finalmente, desapareceré o atual “exces- so de mecanizago, contrdrio avida”. A partir de 1940, Gropius se dedica quase exclusivamente ao estudo dos new city patterns for the people and by the people, expres- S40 tipica daquele “ato de Projetar criativo” (creative design) que S€ contrapde, como continuo fazer-se, A estabilidade ou monu- Jetos, estudados com Wachsmann, de moradias feitas de painéis montaveis e desmontdveis em pouc: ‘as horas, e com o simples em- prego de ferramentas elementares; € a instalagao de uma colonia —-? ta A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA ENA AMERICA 165 operaria em Sey Kensington (Aluminium Terrace), formada por duzentos e cingiienta unidades flexivelmente distribufdas terreno desigual e ondulado. aoe Recordemos 0 esquema sistemitico, articulado, concéntrico do surbirbio Térten, préximo a Dessau, onde cada casa era ‘ise estavel de uma familia, uma posse que a arquitetura tinha a tarefa quase politica de consolidar e cristalizar. Em New Kensington, onde as estruturas nao passam de frdgeis e méveis diafragmas tecidos no espago e as habitagGes tém a leveza e a provisoriedade da ca- bana ou da palafita, a arquitetura j4 nao € um modo de fechar-se e isolar-se, afirmando uma ciumenta e exclusiva posse do espago, mas sim um modo de entrar e viver na realidade, de aderir quase fisicamente ao espago, de estabelecer uma continuidade entre o local de trabalho e 0 local de moradia. O problema arquitetura- paisagem, como caso especifico do antigo dilema civilizagao-na- tureza, j4 nao tem razao de ser: a paisagem se manifesta na arqui- tetura, qualifica-se e se constréi nas formas desta, assim como se manifesta e se qualifica nas plantages dos campos, no tecido das vias, na canalizagao das aguas. E facil ligar as propostas mais recentes de Gropius 4 experién- cia urbanjstica americana das “cidades-satélites”; porém, as greenbelt towns mantém-se econémica, administrativa e estrutu- ralmente dependentes das metrépoles, das quais constituem os bairros residenciais; melhoram as condigées higiénicas e sociats da habitagao, mas nao modificam substancialmente as condigées de utura da sociedade. Esses nt- trabalho e nao incidem sobre a estr cleos secundarios sao compardveis aos meteontos que se despren- dem de um corpo celeste e continuam sendo arrastados na Srbita scem ao redor do tronco dele, ou aos pequenos arbustos que cre: - 4 . i, de uma 4rvore secular; a atengao de Gropius, ao contrain, Go € CONS> se para a formagao de miicleos auténomos, para & agregag tituigéio de novas comunidades, para a ligagtio destas ds malhas de um ilimitado tecido social. Nao se trata de praticar sangrias pare ny WALTER GROPIUS E A BAUHAUS redlueir a pressio sangilinea e prolongar a existéncia do velho cor- po urbano, mas de determinar o prinefpio vital e gerador de novos organismos socials. E verossimil buscar o motivo dessas pesquisas sobre as comu- nidades nascentes no vasto movimento de migragao interna de- terminado nos Estados Unidos pelas necessidades da produgao bélica. Mas é significativo que Gropius se recuse a considerar es- ses grandes deslocamentos de massas trabalhadoras como uma contingéncia destinada a acabar com as causas que a produziram. Para Gropius, a guerra, a qual se assiste de longe mas com uma angustia facilmente compreensivel, nao € o paréntese de loucura ao qual se segue o retorno a razdo, mas sim uma profunda crise de transformagao social. A reconstrugao nao deve levar 4 retomada da mesma estrutura social, cujas contradig6es internas e cujas dissociag6es de classe produziram o conflito. Uma das principais causas dessa desordem funesta é o mecanicismo da sociedade ca- pitalista: “Tudo foi estabelecido sobre as bases da economia e da indtstria, e esta degradou o ser humano até us4-lo como uma fer- ramenta. Foi dai que nasceu a terrivel luta entre capital e traba- lho.” Como restabelecer 0 equilfbrio e restaurar o tecido social dilacerado pelos conflitos de classe? O elemento humano dever4 ser o fator dominante da reconstrugao; sera necessdrio retornar a escala humana, destrufda pela dimensao paradoxal do mecani- cismo; seré necessdrio “humanizar” a presenga da m4quina nos atos da vida. A falta de escala humana, essa condenagao a viver num €spago cujos limites nao enxergamos, a realizar ages cuja finali- dade nao discernimos, a nos inserirmos num sistema cuja estrutu- Fa ignoramos, a servir a interesses cujo valor nos escapa: é isso que impede o estabelecimento de um conjunto organico, vital, ativo, de relagées sociais. Também a cidade, 0 velho tronco social em que se baseiam os privilégios de classe que santificamos mediante 0 pomposo nome de tradigao, est4 destinada a transformar-se profundamente. Como A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA ENA AMERICA 167 Biualonds como Wright, Gropius considera inabitdveis o espago, a dimensao da metrépole moderna, esta impede o cidadao de manter relagGes pessoais com os representantes que ele elege, acio- na © mecanismo impiedoso da politica pela politica, favorece a especulagao e exploragao do homem pelo homem, coloca o indi- viduo numa desoladora condigao de “solidao social”. O destino dos velhos centros urbanos, com suas fungdes desordenadas mas ainda vitais, nao pode ser decidido com um simplista “voltemos a natureza”. Humanizar é um termo vago, e a monstruosidade da metrépole talvez seja apenas um “humano demasiado humano” é necess4rio, de preferéncia, moralizar. Os projetos, atualmente em fase de realizado, para o saneamento de toda a area de Chica- go em torno do complexo hospitalar Michael Reese demonstram que a tese das pequenas comunidades organicas nao pode ser aceita como um dogma. Também as velhas cidades podem ser renova- das, identificando-se os nticleos socialmente ativos e assumindo- os como centros da nova organizagao. A cidade nao é apenas 0 centro de um vasto sistema produtivo; na verdade, a mera fungao econémica, condicionada como esta a interesses de classe, freqiientemente € causa de centralizagdo excessiva, de especula- Ao, de desordem; em contrapartida, as fung6es culturais e de as- sisténcia, como as que derivam do espirito de solidariedade e con- correm para desenvolvé-lo, sao altamente ativas e, assim, paracu- larmente capazes de construir 0 espago urbano. Por isso um hos- pital, uma escola, um centro de pesquisas cientificas, um museu tém um potencial urbanistico nao inferior ao de um grande com- plexo industrial. Mais uma vez, a fungao da arte (j& que & necessa- riamente artistica a energia que transforma as velhas estrucuras © cria novas) é a de contrapor-se a uma politica (no sentido da Realpolitik alema) a fim de abrir caminho para uma polis ideal. Os cénones de um novo humanismo brotam de consideragdes que poderiam parecer puramente téenicas: a extensio dos noves nticleos deveré ser regulada com base no ciclo temporal da jorna- ies WALTER GROPIUS EA BAUHAUS , dae em distancias que possam ser percorridas a p6; os novos ta gados deverio distribuir-se organicamente em torno das artérias de grande tréfego, como flores alimentadas rey CONS: caule; a instrugao ser considerada a primeira fungao social, e estreitamente vinculada ao trabalho; a administragao ser articulada; a ligagao entre os nticleos, determinada pelo ritmo ou pelo ciclo da produ- go. O urbanismo, no sentido mais amplo, doravante é planificagao do trabalho humano. O dilema entre cidade e campo, raciona- lidade e sentimento, nao podera subsistir: toda a realidade, indiscriminadamente, se constituira em forma, obter4 o mesmo grau de clareza no trabalho dos homens. A civilizagdo ser de fato uma segunda natureza. Na verdade, nao se propde um retorno impossfvel ao patriar- cado, 4 economia doméstica do periodo pré-industrial. A casa se dissolve, quase desaparece no tecido construtivo da nova so- ciedade. A partir do momento em que a maior parte das incum- béncias que eram préprias da familia se transferiu A comunida- de, e em que escolas, fabricas, hospitais, asilos, teatros passaram a cumprir fungdes educativas, produtivas, recreativas e assis- tenciais antes desenvolvidas entre as paredes da casa, esta se tornou necessariamente mais restrita, mais fragil, estruturalmente mais simples. Também por isso, A estdvel e encorpada “criagao” formal, que derivava suas leis de um principio de autoridade, sucede-se a livre “criatividade”, expressio de um principio de atividade: a pura designagao, 0 ato de projetar ilimitado e into- lerante até mesmo ao limite das formas nas quais se realiza, o tragado esquematico das grandes linhas de desenvolvimento, a planimetria ideal do trabalho humano. A planificagao € ainda uma pedagogia formal, a Pedagogia da Bauhaus, mas estendida e identificada a esfera social. cnn ose a hin ; ; tole sobre ela: € ao mesmo tem- Poancentivo ao progresso e freio Para a aceleragao artificiosa dos A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA ENA AMERICA 169 processos dele, para o impulso centrifugo que solicita a humani dade a sair de sua propria rbita vital. apaberavelmente, © pensamento mais recente de Gropius restitui a ane © motivo espiritualista (quase digo religioso) que, num primeiro momento, ele havia transferido ao trabalho indus- trial. A arquitetura, assim concebida, ainda € 0 remédio para um mal insidioso da civilizagdo contempordnea, a compensagao para uma forga desagregadora que ainda continua a gerar-se no inte- rior da estrutura social, uma vitéria que se obtém contra tudo o que de inerte e infecundo permanece estagnado no fundo da cons- ciéncia: “A arquitetura criativa contempordnea usa triunfalmen- te novas estruturas que dao um aspecto de leveza e quase de levi- tagao; volumes em balango e lajes suspensas parecem contestar @ lei da gravidade e, comunicando um sentido de abertura para o mundo inteiro, oferecem grandes superficies envidragadas que podem abrir-se e fechar-se segundo as necessidades. Alcangou-se uma plena unidade entre 0 espago vital interno e 0 externo. Nao faz sentido classificar a arquitetura moderna como um movimen- to puramente racionalista e cientifico. Ao contrario: seus inicia- dores dirigiram seus esforgos para a fusdo entre técnica e emogao e através do célculo.” a formula do interna- a expressio derivar das O projeto urbanisa- a vida, mas a ordem ‘co através do espa- através da intuigdo criativa, mais qu Também se retorna, para refuta-la, cionalismo arquitet6nico; tende-se a “faze! condig6es regionais € de elementos nativos”. co nao € uma ordem racional que se imponha que a propria vida se dé em seu desenvolviment 0 e do tempo. : A a sobre o valor da intuigao nao basta, porém, para fa- zer-nos concluir que Gropius, depois de ter sido um pioneira do espfrito industrial e de té-lo levado triunfalmente Aquilo que era considerado o sacrario, o hortus conclusus da arte, esteja agora a frente de um movimento Inverse, destinado a destronar & indus in WALTER GROPIUS BA BAUHAUS te. Dado que a forga motriz da construtividade, iativas, continua sendo a agao humana, mas nao uma técnica especffica, tfstica, mas sim a técnica em eria em nome da art a fonte das sensagdes er arte ainda é redutivel 4 técnica; como seria a técnica da produgao ar geral, como agao organizada e consciente, como carater de ativi- dade da existéncia. Uma dbvia comprovagao disso € oferecida pelo empenho com que a arte moderna se dedica a intervir em todos os atos da vida civil; e isso, nao pela imediata finalidade pratica de uma comodidade, que afinal poderia satisfazer-se melhor numa preguigosa acomodagao a habitos inveterados, mas para despren- der-se de todo costume, para obrigar-nos a experiéncia, constran- ger-nos a viver num processo progressivo. O que hoje se pede a arte j nao é que ela se adapte 4 vida moderna, e sim que imponha a vida a inflexdo de novidade, de atualidade, de continua renova- cdo que é justamente a inflexdo da modernidade. O apelo de Gropius ao cardter de intuitividade da arte visa sobretudo a modificar 0 conceito corrente de “técnica” como mero mecanicismo. Superar a concepgao de vida determinada pelo industrialismo nao significa voltar 4 produgio individual (sobre esse ponto, Gropius é peremptério), mas superar o limite que © racionalismo da produgao industrial impés & produtividade huma- na; € somente isso que se pede quando se fala em “humanizar” a maquina, em reconduzir a escala humana a dimensio ilimitada que © repetitive work abriu para os homens, e na qual inevitavelmente se perde 0 sentido de concretude da realidade e da vida. Para S. Giedion, a Weltanschauung da civilizagao moderna se teduz a isto: a mecAnica “assumiuo comando”. Mas é muito duvi- doso que consiga manté-lo. A propria facilidade com a qual 0 homens moderno realiza suas aspiragGes prdticas provoca uma confus4o na consciéncia dos valores: também na arquitetura, Vi- ns ‘ % ; s confundirem-se utilidade e ideologia. A crise est4 em anda- ™i ys nto: os trabalhadores se Tecusam a reconhecer-se como me «, ” x “ a id instrumentos” de uma produgao que, em diltima instancia, se i A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA E NA AMERICA 171 tifica om uma diregao politica de classe. Ao slogan de Giedion Mechanisation takes command, responde o slogan de Munford, Man takes command: e € a marca de um novo espirito construtivo, de uma técnica fundamentada na intuigao, e nao no célculo A iltima idéia de Gropius é a de uma arte que takes command sobre a mera mecAnica. Ele iniciou sua atividade de artista num momento em que a arte era uma prerrogativa de classe, uma forca conservadora, um instrumento da diregao politica da burguesia, um incentivo a vontade de poder, um estimulo a guerra. Entao sustentou que a arte devia reformar-se através de uma indiistria que estava na vanguarda do progresso e, nesse contato, renovar os proprios meios expressivos. Depois, as posigdes se inverteram o mundo esperou em vao a felicidade prometida, e da civilisation machiniste s6 recebeu matanga e miséria. A indtistria também se revelou prerrogativa de classe, instrumento de dominio e opres- so, forga desagregadora e destrutiva, obstaculo ao progresso vi- tal: uma espécie de “monumental” econémico. Mas nao adianta retornar a uma natureza que se perdeu para sempre, a industria devera regenerar-se na arte agora “regenerada” e, por meio dela, reconquistar uma dimensao humana e reconduzir sua propria produtividade exasperada a uma criatividade concreta e positiva Vem assim a estabelecer-se, entre a arte e a industria, uma espécie de circulo: a arte é o impulso criador que corrige © mecanicismo exacerbado e desenvolve em sentido progressivo os processos produtivos industriais, que de outro modo eendesiam a repetir-se ao infinito; a industria, por sua ve?, redut o arbitrio da invengao artistica a disciplina de uma produtividade efetiva, eco- fundir ilimitadamente os produtos ar les criativas latentes em cada indivt a — e sua agi ANTO MAS némica, e, além disso, ao di tisticos”, estimula as faculdad duo. A arte sera tanto mais for' regeneradora, tanto mais eficaz sobi souber renunciar aos “contetidos” ine @ estructura ou os prinespios atives deles, temente criatys re o corpo social = Qui rtes da consci€ncia Par isolar que afinal sio os mesmos ‘que dirigem a continua evolugo ou autocriagao da sociedade. De fara, © ciclo arte-indiistria, abarcando todas as formas vitais da atividade humana e resolvendo o contraste entre ideago e exe- ‘cugSo, ou trabalho mental individual e trabalho manual coletivo, faz a passagem da consciéncia individual 4 coletividade e realiza a integra¢So total entre forgas unitdrias e forgas sociais. Hoje, em todos os paises civilizados, os fenémenos artisticos mais vitais, e seguramente j4 encaminhados a constituir uma nova tradicSo figurativa, séo sem diivida aqueles que se encaixam no ciclo cujos contornos Gropius foi o primeiro a desenhar: 0 ciclo que compreende em seu mbito o planning e 0 industrial design, a planificagSo urbanistica e 0 projeto industrial. A grande lig&o da Bauhaus ja esté mudando concretamente os costumes dos homens e 0 panorama do mundo; depois de uma funesta experiéncia de dor e de sangue, as sementes langadas no primeiro pGs-guerra estao produzindo seus frutos. A idéia que, na Alemanha de Weimar, pareceu uma absurda e perigosa utopia, e Que © nazismo tentou brutalmente cortar pela raiz, é hoje reto- como vélido argumento de esperanga por todos os que aspi- ceramente @ uma reconstruc¢ao moral da sociedade huma- na. Tendo jé passado dos setenta anos, e sabiamente abstendo-se mut posigdes de luta, Gropius assiste a essa reafirma- ¢30 de sua idéia, numa condigSo histérica bem mais grave e mais Gramistica; € n3o se cansa de advertir que o problema, embora se configure em termos basicamente técnicos, mantém-se essencial- mente como um problema moral, de consciéncia. Em mais um si- nal de madura sabedoria, ele foge das extensdes ideolégicas; insis- te ne necessidade de nao sair dos limites de um profissionalismo iluminado e consciente, de manter em todo ato ideativo ou operative lucidez e 2 consténcia de um “método”. Mas esse “mé- todo” ndo é sb uma légica do pensamento: é um método de traba- thoe de wida, um modo de enfrentar e de resolver problemas con- ‘SSO; €, Se Mecessariamente se traduz numa “técnica” ¢ produz A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA E NA AMERICA 173 fatos, isso depende precisamente da qualidade moral do impulso que o determina. Porque a condigao de toda ago consciente é sempre a avaliagao de uma situagao histérica, o reconhecimento de um estado de necessidade que exige nossa intervengao e deter- mina os modos desta. Hoje, no campo ilimitado da criagio de for- mas, Gropius € aquilo que, num campo inteiramente diferente, mais especificamente cientifico, se chama “metodologista”. Este “nao realiza grandes descobertas cientificas, compardveis ds dos filésofos-cientistas (...) Hoje as coisas acontecem de maneira bem diferente. O trabalho cientifico tem um cardter mais coletivo do que individual, e toda grande descoberta esta tao ligada aos re- cursos experimentais de investigagao, ds descobertas j4 em poder da ciéncia, as teorias a partes das quais o pesquisador formula o problema em questao etc., que a preparagao filos6fica geral do cien- tista nao pode ter um peso efetivamente relevante. Eao nivel téc- nico do ambiente em que se atua que cabe um peso decisivo (...) Entre os varios fatores culturais que concorrem para formar o nivel técnico indispensdvel (...) um dos mais importantes (...) & justa- mente constitufdo pela consciéncia metodoldgica das operagoes cientificas.”' Basta fazer algumas transposigdes de termos e esse passo poderé dar-nos idéia da tarefa que Gropius propoe a si mes- mo e aos arquitetos modernos. Mas até que ponto essa substituigao €legitima? Até que ponto € legitimo estender a arte procedimentos de pensamento que se le e exeqiiibilidade nao po- aplicam a ciéncia, mas cuja validad campos da cultura mo- dem ser ignoradas também nos outros derna? om Renunciamos a discutir a questao estética geral, que atv istorici go-historicidade reduz ao velho debate sobre a historicidade oua nao torte . da arte. O que interessa destacar é que a obra er e : cf eis é : Gropius, assim como, no passado, se inseriu no quadro do pe! 1953, pp 2950 TLORYMONAT, Sagi di flosofia neorazionalistcn, ‘Tarim, pp in WALTER GROPIUS B A BAUHAUS ere-se hoje, de pleno direito, no q que se chama “neo-racionalismo” adramento explica claramente dois pesquisa de Gropius aos procedie planning e a abertura de sua ar- formais, manifestamente dife- ntraste com os valores pos- mento fenomenoldgico, ins dro daquele desdobramento “peo-iluminismo”. Esse enqu: fatos: a aparente limitagao da mentos técnicos e formativos do quitetura a novas séries de valores rentes e As vezes aparentemente em CO! tulados pelo primeiro racionalismo ou por aquilo que podemos chamar de racionalismo programatico. E ébvio que a distingao feita entre “racional” e “nao-racional” nao coincide com a distin- go entre ldgica sistematica e intuigao, porque também a intuicgao é uma “técnica” do pensamento humano; e € precisamente a essa técnica interna e diretamente operativa, e nao 4 técnica deduzida e aplicativa, que Gropius dedica agora sua investigagao mais inte- ressada. As novas formas de sua arquitetura — na qual a planta é cada vez mais livre, as curvas se associam As retas, e a série dos materiais empregados é mais variada —, tanto quanto seus novos conceitos sobre a flexibilidade dos tragados urbanos, sao justamen- te o resultado de sua pesquisa sobre aquela que podemos denomi- nar a ilimitada fenomenologia da construtividade. “Nada impe- de”, observa ainda Geymonat, “que as técnicas racionais possam: vir a ser corrigidas, aperfeigoadas, substitufdas; sua racionalidade n4o significa certeza absoluta. Ao contrério, qualquer certeza ab- soluta equivaleria a uma negacao da tacionalidade, porque signi- ficaria apelar para algo superior a nés, algo transcendente, nao- humano.” O importante, contudo, é que essas técnicas sejam sem- Pie eee ae ces cod - Eo que vale para a ciéncia tam- bém v 5 i ale para a arte: 0 ato de criar, como o de investigar, s6 € verdadei i 6 adeiramente livre e s6 conduz a resultados positivos quando amparado por uma firme confianga ‘ ” Z . ? méatica” nas préprias possibilidades, Preconceito, por uma “confianga progra- € portanto livre de qualquer mit iga © ou tradigéo, de qualquer temor reverente dial A ARQUITETURA DE GROPIUS NA INGLATERRA E NA AMERICA 175 es de snbpeaieitae untocdvels!. Sao justamente essa confianga Programatica”, essa busca ngorosamente contida no ambito do humano, essa recusa a qualquer mito ou transcendéncia, essa socialidade ou laicidade de Principio, enfim, que constituem 0 carater de toda a atividade de Gropius de 1910 até hoje: € isso que o defende até dos mais fascinantes mitos da arte modema, tanto do mitologismo naturalista de Wright quanto do mitologismo tacionalista de Doesburg. Devemos entao declarar inatual sua ligdo? Nesse caso, seria preciso ter a coragem de chegar as tiltimas Conseqiiéncias: negar que a cultura moderna esteja mais em telagdo com a tradigdo iluminista, negar que a racionalidade seja 0 préprio carater do pensar e do agir humano, refugiar-se mais uma vez no dominio das “verdades intocaveis” e até mesmo aceitar os preconceitos e os “fdolos” dos quais “verdades” dessa natureza nao podem em absoluto separar-se. APENDICE [1957] RA DET SO . Ba toftia g arte do xt va Nota biogrdfica Walter Gropius nasceu em Beriim em 18 de maio de 1883. Tendo conclufdo em 1907 o curso de arquitetura nas universidades de Berlim e de Munique, e depois de visitar, em viagem de estudos, a Espanha, a Italia, a Franga, a Inglaterra e a Dinamarca, torna-se primeiro-assis- tente de P Behrens. Em 1910, inicia sua atividade artistica e, em 1913, obtém na exposic¢ao de Antuérpia a medalha de ouro por mobiliario e decorag4o de interiores. Convocado pelo Exército, serve em divisées combatentes até o fim da Primeira Guerra Mundial. Desmobilizado em 1918, € chamado 4 diregdo da Grossherzoglichen Sachsischen Kunst- gewerbeschule e da Hochschule fiir bildende Kunst de Weimar; as duas escolas s4o mais tarde fundidas num sé instituto que ganha o nome de Staatliches Bauhaus. Na década de sua direcao da Bauhaus, Gropius consegue reunir no instituto, em cargos de ensino, as mais significa- tivas personalidades do movimento artistico moderno na Alemanha. A Bauhaus torna-se objeto de ardentes discussdes sobre os problemas da arte e do ensino artistico moderno. Em 1925, em conseqiiéncia da oposicao politica do governo da Turingia, a Bauhaus € obrigada a trans- ferir-se para Dessau. Em 1928, tendo deixado a diregao da Bauhaus, Gropius a ae . ‘ ici itetura; dedi- Berlim, agora como profissional liberal, o exercicio da ae aa Ca-se prioritariamente aos problemas da habitagao ; ion ‘Ap6s a conguista do poder pelos nazstas ele ¢obrigado arte “se:na Inglaterra, onde, de 1934 a 1937, trabalha com Maxwell 1 I esse pats influencia fortemente 0 desenvolvimento oma em 180 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS Em 1937, é convidado a ocupar a cAtedra de arquitetura na Graduate School of Design da Harvard University (Cambridge, Mass.). Nos Esta- dos Unidos, retoma a atividade profissional, em colaboragdo com Marce| Breuer. Contudo, suas atividades principais continuam sendo o ensino, © estudo dos grandes problemas da habitag4o e do urbanismo, 0 estudo da génese da forma artistica e a educagao formal. Em 1937, é nomeado membro honorario do Royal Institute of British Architects (Riba) e vice- presidente do Instituto de Sociologia de Londres. Torna-se membro do American Institute of Architects e da American Academy of Art and Science. A partir de 1938, dirige o Departamento de Arquitetura da Universidade de Harvard. Em 1953, deixa Harvard e recebe em Sao Paulo, o Grande Prémio Internacional de Arquitetura. Em 1954, faz uma viagem ao Japao, por conta da Fundagao Rockefeller. As numerosas dis- tingdes a ele concedidas por universidades e institutos cientificos euro- Peus e americanos, acrescenta-se, em 1956, a Royal Gold Medal do Riba. No final da guerra, regressa A Alemanha a fim de desenvolver al- guns projetos, como o da fabrica de porcelana Rosenthal, em Selb (1963-1967). Em 5 de julho de 1969, Walter Gropius falece, em Boston, nos Esta- dos Unidos. Principais obras 1906-1909 Casas para trabalhadores na Pomerania. 1910-1911 Fabrica Fagus (primeiro bloco), Alfeld-an-der-Leine (emco- laboragao com A. Meyer). 1911 Habitagdes em Wittenberg, Frankfurt-an-der-Oder. 1913-1914 Hospital, Alfeld-an-der-Leine. Locomotiva para uma fabrica de Gdansk. Armazéns em Fredland e Dramburg. Participagao na exposigao de Antuérpia. Edificio ptiblico em Rummelsburg, Pomerania. Caixa Econémica em Dramburg. Casa Semmering. Fabrica de amido Kleffel. Casas rurais na Pomerania. 1914 Prédio para escritérios e sala de maquinas. Exposi¢ao do Werkbund em Colénia (em colaboragao com A. Meyer). 1921 Casa Sommerfeld, Berlim. Concurso para casas de operarios da Fabrica Hess em Erfurt. Monumento aos Mortos de Margo, Weimar. 1922 Concurso para um arranha-céu em ago € vidro para o Chicago Tribune. 1922-1924 Reforma do Teatro Municipal de lena. 2 1923 1924 1925 1925-1926 1926 1927 1928 WALTER GROPIUS B A BAUHAUS Casa em Weimar Academia de Filosofia em Erlangen. Fabrica Fagus (segundo bloco), Alfeld-an-der-Leine. Asilo para idosos, Alfeld. Fabrica de papel, Alfeld. Casa Auerbach, lena. Casa Klitzing. Pantedes Reis e Mendel, Berlim. Palacete Hausmann, Pyrmont. Casas Benscheidt, Alfeld. Exposigao de cristais espelhados em Leipzig. Edificio em Dresden. Sanatério na Turingia. Ediffcio da Bauhaus, Dessau. Casas para os professores da Bauhaus. Implantagao do subtirbio Dessau-Torten (primeiro e segundo loteamentos). Subtrbio Dessau-Torten (terceiro loteamento). Casa Ecke, Hamburgo. Cooperativa de Consumo, Dresden. Exposigdes em Stuttgart. Prédios habitacionais. Casa Zuckerkandl, ena. Moradias em Colénia. Projeto do “teatro total”. Projeto para o Museu de Halle. Casas de madeira para fins de semana. Casas Biesenhorst, junto a Berlim. Casa Harnischmacher, Wiesbaden. Casas Wolfen, Dessau. Casas em Merseburg. Cooperativa de Consumo, Dessau-Térten. Casa Lewin, Zellendorf, 1929-1933 1929 1930 1931 1932 1933 PRINCIPAIS OBRAS Implantagao Dessau-Térten (quarto loteamento). Escritério do Trabalho, Dessau. Carrocerias para automéveis Adler. Concurso para conjuntos habitacionais, Spandau-Haselhorst. Moveis-tipo para trabalhadores. Casas em Berlim. Escola profissional em Berlim. Escola técnica, Hagen. Casas Dammerstock, Karlsruhe. Casas coletivas Siemensstadt, junto a Berlim. Asilo para idosos, Kassel. Estudos de casas enfileiradas para a Reichsforschungs- gesellschaft. Exposigao de Paris. Salas comuns no “edificio alto” Projeto de edificios com estrutura de aco. Palacio da Justiga, Berlim. Projeto do Teatro de Karkov. Casas Gagfah em Lindenbaum, Frankfurt. Exposig6es da arquitetura alema, Berlim. Salas de reuniao e ginastica. Sanatério Erich Mendelssohn. Pantedo Bienert, Dresden. Projeto do palacio dos Sovietes, Moscou. Fabrica Voss, Hannover. Usinas metaltirgicas. Fabrica Adler, Frankfurt. Exposigao “A casa amplidvel”. Clube em Buenos Aires. Casas Standard, Buenos Aires. Prédio da Fabrica A. Rosa, Barcelona. Concurso para o Reichsbank, Berlim. Casa Bahner, junto a Berlim. Casa Maurer, Berlim-Dahlem. 1934 Exposigao 1936 1936-1937 1937 1938 1939 1940 1941 1942 1944 1946 1947 1948 1948-1951 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS q “Povo alemio — trabalho alemdo” (em colabo- ragio com J. Schmid). Mostra dos materiais nio-ferrosos (colaboragéo com J. Schmidt). Casa Benn Levy, Londres (em colaboragéo com Maxwell Fry). Escola em Impington Village, Inglaterra. (Em colaboragao com Maxwell Fry). Projeto para o Wheaton College, Art Center, Cambridge (Mass.) (Em colaboragéo com M. Breuer). Casa Gropius em Lincoln (em colaboragao com M. Breuer). Casa em Lincoln (em colaborag4o com M. Breuer). Casa em Pittsburgh (em colaboragao com M. Breuer). 250 unidades habitacionais operdrias em New Kensington (em colaboragao com M. Breuer). Casa em Framingham, Mass. Joalheria, Nova York. Estudo para casas tipicas Panel House System (em colabora- ¢40 com K. Wachsmann). Plano urbanistico do Michael Reese Hospital, Chicago. Projeto da Universidade Hua Tung em Xangai (The Architects Collaborative). Implantagao do Harvard Center (The Architects Collabo- tative). 1950 Harvard Graduate Center (sete dormitérios) (The Archi- 1951 tects Collaborative). Escola Peter Tacher Junior, Attleboro, Mass, (The Architects Collaborative). PRINCIPAIS OBRAS 185 1952 Escola elementar de Killey Ave em Warwick, Rhode Island (The Architects Collaborative). Escola elementar Norwood em Warwick, Rhode Island (The Architects Collaborative). 1953 Escritérios McCormick Estate, Chicago (W. G. em colabo- ragao com Arthur Myhrum). Boston Center, Boston (W. G. em colaboragao com Pietro Belluschi, Hugh Stubbins, Carl Koch, Walter Bogner). 1954 New England Shopping Center, Sangus, Mass. (W. G. em colaboragao com Ketchum, Gind, Sharp). Escola elementar de Flagg Street, Worchester, Mass. (W. G. em colaboragao com Albert J. Roy). Escola elementar para a Collier's Magazine (publicada em Collier’s Magazine, 1954). 1955 Escola elementar, Waltham, Mass. (The Architects Colla- borative). Junior High School, South Attleboro, Mass. (The Architects Collaborative). Clinica para doengas do térax, Boston, Mass. (The Archi- tects Collaborative). 1956 Escolaelementar, West Bridgewater, Mass. (The Architects Collaborative). Defence Housing, Otis Air Force Base, Falmouth, Mass. (The Architects Collaborative). 1923 1925 1930 1935 1938 1945 1955 1919 1930 1934 Principais escritos de Gropius Livros Idee und Aufbau des Staatlichen Bauhauses, Bauhaus ed., Weimar. Internationale Architektur, “Bauhausbiicher”, n° 1, Munique. Neue Arbeiten in Bauhauswerkstatten, “Bauhausbiicher”, n° 7, Munique. Bauhausbauten in Dessau, “Bauhausbiicher”, n° 12, Munique. The New Architecture and the Bauhaus, Faber & Faber, Londres. Bauhaus (em colaborag4o com H. Bayer), ed. Museum of Modern Art, Nova York. Rebuilding our Communities, Paul Theobald ed., Chicago. Scope of total Architecture, Harper & Brothers, Nova York (ed. ale- ma sob 0 titulo de Architektur, Wege zu einer optischen Kultur, Vischer ed., Frankfurt). Ensaios “Programm des Staatlichen Bauhauses.” “Flach-Mittel-oder Hochbau?”, comunicagao no III Congresso de Arquitetura Moderna, em Bruxelas. “Theaterbau”, comunicagao na lV Convengao Volta, Roma, Atas da Reale Accademia d'Italia. 1935 1937 1938 1939 1940 1941 1942 1943 WALTER GROPIUS EB A BAUHAUS “The formal and technical problems of Architecture and Planning”, A.LA. Journal, maio. ©The role of the reinforced concrete in constructions”, The Concrete Way, setembro-outubro. “Grandes Poblaciones”, Nuestra Arquitectura, setembro. the development of modern “Estracti dagli scritti di Gropius”, Quadrante, Milao. “Architecture at Harvard University”, Architectural Record, maio. “Essential for Creative Design”, The Octagon (A.I.A.), julho. “Education toward Creative Design”, American Architects and Architecture, maio. “Background of the New Architecture”, Civil Engineering, dezembro. “Toward a Living Architecture”, American Architects and Archi- tecture, janeiro-fevereiro. “Essentials of Architectural Education”, P M., n° 42, primavera- verao. Prefadcio ao volume de E. DENBY, Europe Rehoused. Verbete “Arquitetura para a educag4o”, Enciclopaedia Britannica. “Training the Architect”, Twice a Year, n° 2. “Contemporary Architecture and Training the Architect”, Architectural Forum, marco. “Defense Housing” (em colaboraco com Martin Wagner), Atas do Congresso “National Defense Migration”. “Three House Types, Defense House at New Kensington”, “Architectural Forum”, outubro. “The new City pattern for the People and by the People. The problem of the Cities and Towns. Conference on Urbanism”, Harvard University, “Prefabrication System desi, Aschitectural Record, abril. “ oe ys ‘i ” The 8) Prefabrication S ee designed by General Panel Corp. gned by General Panel Corp.”, 1944 1945 1946 1947 1948 1954 1955 PRINCIPAIS ESCRITOS DE GROPIUS 169 “Housing in Framingham, Mass.”, Architectural Forum, junho. “A program for City reconstruction”, Architectural Forum, julho. “Variety of Houses from identical prefabricated units designed by Harvard Students”, The New Pencil Point, dezembro. “The arch. contribution to the post-war reconstruction”, Bay State Builder. “Aluminium Terrace Housing, New Kensington Settlement”, Architectural Forum, julho. “Jewelry Shop”, Pencil Point, agosto. “Practical Field experience in Building to be an integral part of an architect Training”, Bay State Builder, julho. “Principles of Modern Design”, Agnes Scott Alumnae Quarterly. “Design Topics”, Magazine of Art, dezembro. “Teaching the Arts of Design”, College Art Journal, primavera. “Bl Arquitecto en la sociedad industrial”, Revista de Arquitectura, Buenos Aires. “Un nuovo capitolo della mia vita”, Casabella, Milao. “Bight steps toward a solid architecture”, Architectural Forum, Nova York. “Mastery of Space and Techniques”, Progressive Architecture, Nova York. “Gestaltung von Museumgebiude”, Jahresring, Stuttgart. Publicagées da Bauhaus 1919 Programm des Staatlichen Bauhauses in Weimar (pref. de W. Gropius). 1921 Zwélf Holzschnitte von Feininger, Weimar. Neue europdische Graphik. Neue europdische Graphik. Erste Mappe: Meister d. Staatlichen Bauhauses in Weimar (14 xilografias, litografias e gravuras de Feininger, Itten, Klee, Marcks, Muche, Schlemmer, Schreyer). Neue europdische Graphik. Dritte Mappe: Deutsche Kiinstler (14 litografias, xilografias e linoleogravuras de Bauer, Baumeister, Campendonk, Dexel, Fischer, von Heemskerck, Hoetger, Marc, Schwitters, Stuckenberg, Tapp, Waver). Neue europdische Graphik. Vierte Mappe: Italienische und Russische Kiinstler (11 4guas-fortes e litografias de Archipenko, Boccioni, Carra, Chagall, De Chirico, Gontcharowa, Jawlensky, Kan- dinskij, Larionov, Prampolini). Neue europdische Graphik. Funfte Mappe: Deutsche Kiinstler (13 4guas-fortes, litografias, xilografias e linoleogravuras de Beckmann, Burchartz, Gleichmann, Grosz, Heckel, Kirchner, Kokoschka, Kubin, Mense, Pechstein, Rohilfs, Scharff, Schmidet- Rotluff). 1922 Satzungen d. Staatlichen Bauhauses in Weimar ( zacao didatica; b. organizagdo administrativas & au t dices sobre as provas dos exames e as varias soe h ie Kandinsky. Kleine Welten: zwolf Blatt Original-Graphik (impres na Bauhaus para a editora Propylien). contém: a. organi atro apeN- 2 WALTER GROPIUS E A BAUHAUS Auasstellung von Arbeiten der Gesellen und Lehrlinge im St. B., Weimar (abril-maio). 1923 Das Wielandslied der alten Edda, org. por K. Simrock, com 10 Se aks 1919-1923, 226 pp., 147 il., 20 es- tampas em cores. Paginagao de Moholy-Nagy; capas de H. Bayer. WALTER GROPIUS, Idee und Aufbau des Staatlichen Bauhauses (Mu- nique). 1924 Numero especial da revista Junge Menschen de Hamburgo (vol. V, n° 8) com artigo dos alunos da B. Presse-Stimmen (Ausziige) fiir das St. B., Weimar, 72 pp. (com dois suplementos: “Nachtrag zu den Pressestimmen”, marg¢o-abril, “Kundgebungen fiir das St. B.”, outubro). 1926 “Bauhaus, Dessau”. Prospecto, desenhado por Herbert Bayer. “Bauhaus-Heft”. Numero especial do periddico Offset, Buch-und Werbekunst, Leipzig, n° 7. Escritos de Gropius, Breuer, Moholy- Nagy, Albers, Bayer, Stélzl, Schlemmer. Capa de Joost Schmidt. 1929 “Bauhaus”. Prospecto com artigos de Klee, Kandinskij, Albers, Peterhans, Riedel, Mayer. Programas dos cursos. “Catdlogo da exposigao da Bauhaus”, Basiléia. 1925-1930 — Bauhausbiicher. Série de volumes editados por Gropius e Moholy-Nagy, publicada por Albert Langen, Munique. 1. WALTERGROPIUS, Intemationale Architektur, 1925; 2? ed., 1927. 2. PAUL KLEE, Padagogisches Skizzenbuch, 1925; 2% ed., 1928. - ADOLF MEYER, Ein Versuchshaus des Bauhauses in Weimar, 1925. 4. OSKAR SCHLEMMER, Die Buihne im Bauhaus, 1925. 5. PIET MONDRIAN, Neue Gestaltung, beelding, 1925. 6. THEO VAN DOESBURG, Grund Kunst, 1925. 7. WALTER GROPIUS, Neue Ar] 1925. Neoplastizismus, Nieuwe begriffe der neuen Gestaltenden beiten der Bauhauswerkstdtten, 10. is 12. 13? 1. PUBLICAGOES DA BAUHAUS, 193 . L. MOHOLY-NAGY, Malerei, Photographie, Film, 1925; 2@ ed., 12s . W. KANDINSKY, Punkt und Linie zu Flache: Beitrag zur Analyse der malerischen Elemente, 1926; 2? ed., 1928. J.J. ROUD, Hollandische Architektur, 1926; 29 ed., 1929. K. MALEWITSCH, Die gegenstandslose Welt: Begriindung und Erklérung des russischen Suprematismus, 1927. WALTER GROPIUS, Bauhausbauten Dessau, 1930. A. GLEIZES, Kubismus, 1928. L. MOHOLY-NAGY, Vom Material zur Architektur, 1929 (trad. inglesa por D. M. 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Creio ter reconstitufdo com suficiente exatidao a atividade artistica de V. Sa. até 1928 e, naturalmente, coletei todas as in- formagées poss{veis a respeito das atividades de V. Sa. na Inglater- ra e na América. Para esta tltima parte, contudo, minhas infor- magoes estao certamente incompletas... Permito-me, portanto, dirigir-me diretamente a V. Sa. a fim de solicitar a gentileza de enviar-me: 1. Todo o material grafico e fotografico que V. Sa. queira ver reproduzido em meu volume; 2. Informagées sobre as obras construfdas ¢ os escritos pubh cados por V. Sa. na América...” 26 WALTER GROPIUS BA BAUHNAUS A primeira carta do intenso intercmbio epistolar entre Argan e Gropius — distribufdo ao longo de vinte anos, mas concentrado essencialmente entre 1948 ¢ 1951, periodo de realizagao do volu- me Finaudi—! esclarece a intengao do livro que estava nascen- do: nao tanto delinear uma monografia sobre Gropius, mas sobre- tudo trazer a luz — convém repetir — “a enorme importancia da Bauhaus na histéria da cultura figurativa moderna”. De fato, j4 desde o titulo esta clara a impossibilidade, para Argan, de consi- derar como objeto de anélise a obra arquitetonica de Gropius in- dependentemente de sua didatica. Toda a densa trama do livro é tecida na continua remissdo, quase um espelhamento, entre as duas atividades principais de Gropius, a de projetista e a de professor, uma esclarecendo ou fundamentando a outra e vice-versa; € isso vale nao sé para a Introdugdo e para os dois primeiros capitulos do livro — dedicados, 0 primeiro, explicitamente 4 pedagogia formal da Bauhaus e 0 segundo, a arquitetura do perfodo alemao —, mas também para o terceiro, que desenrola o fio da ultima atividade de Gropius em relagao ao seu ensino em Harvard e A sua partici- pagao no The Architects Collaborative (TAC). Desde as primei- ras paginas, Argan esclarece: “Na histéria de Gropius é impossi- vel separar 0 momento teérico do momento criativo ou do mo- mento pedagégico: cada um de seus edificios, de seus programas urbanjsticos, cada uma de suas intervencées praticas e polémicas, 1 ‘A correspondéncia, conservada por Argan, compée-se de uma s6 carta deste (datada de 11 de novembro de 1948) e de 27 de Gropius (datadas de: 4 de fevereiro de 1949; 15 de fevereiro de 1949; 3 de marco de 1949; 8 de margo de 1949; 22 de marco de 1949; 14 de junho de 1949; 5 de julho de 1949; 20 de setembro de 1949; 30 de janeiro ie 1950; 8 de marco de 1950; 12 de junho de 1950; 19 de outubro de 1950; 11 de janeiro de 1951; 25 de janeiro de 1951; 13 de abril de 1951; 25 de abril de 1951 dite ale ja- da do volume da Einaudi; 18 de junho de 1951; 25 de fevereiro de 1953; 20 de baile 1954; 27 de janeiro de 1956; 1° de junho de 1956; 10 de outubro de 1957; 28d 0 de 1960; 9 de janeiro de 1961510 de julho de 1962; 1° de abril de 1968; 2 d abel d 1968). Seguramente, a troca epistolar foi mais intensa, porque as G resi clon outras cartas, evidentemente nao guardadas por Argan. Hi ®1d., History of Art Criticism, Nova York, 1936; reeditado em Sekt ° : a de la critique d'art, Bruxelas, 1938. A primeira edigio italiana, amp! * pei ie ; modificada no dltimo capitulo, ¢ de 1945 (Storia della critica daree . ss a reeditada em 1948). A edigio Einaudi, com prefiicio de Nello Ponente . de \ bibliografin ampliada sob organizaghe de Guglielmo nase ow es OL, VENTURY, Il gusto det primitivi, Bolonha, 1926 Acdigto Binaus, 4 9 tae, Soa am dolla critica d'arte (1947), eum Sawai € nee Roma, t yas O55, p KO no WALTER GROPIUS EB A BAUHAUS por uma Italia que andava de bicicleta. Lembremos, por exemplo — até para dar ao leitor uma idéia, ainda que aproximada, das condig6es de trabalho daqueles anos atormentados, mas heréicos —, a mostra sobre a “Pintura francesa de hoje”, realizada em se- tembro de 1946 com os cartées-postais reunidos por Venturi, na qual foram apresentadas reprodugées de Braque, Fougeron, Léger, Manessier, Matisse, Picasso, Pignon, Singer, Villon etc. Em 1946, Argan, ilustre estudioso italiano, foi convidado para um periodo em Londres pelo Warburg Institute, o instituto de his- toria da arte fundado por Aby Warburg em Hamburgo para o es- tudo da historia das imagens, transferido para a Inglaterra por ocasiao da tomada do poder pelos nazistas, e ainda dirigido, nos Primeiros anos do pés-guerra, por Fritz Saxl, o principal colabora- dor de Warburg. Amigo, desde muitos anos antes, de Erwin Panofsky, que co- nhecera em 1931 em Turim, de Richard Krautheimer e de Rudolf Wittkower, com os quais suas relagdes remontam a meados dos anos de 1930, durante a temporada dos trés na Biblioteca Hertziana de Roma, Argan, embora nao podendo ser considerado um “iconologista” em sentido estrito, seguramente j4 conhecia as orien- tagdes metodoldgicas, na €poca pioneiras e ainda nao aceitas pelo mundo académico, do Prestigioso centro de pesquisa londrino. O artigo sobre “The architecture of Brunelleschi and the origins of the perspective theory in fifteenth century”, elaborado naquele periodo e publicado no Journal of the Warburg and Courtauld Institute, € certamente uma teflexdo sobre a panofskiana ————_____ "Id., “The architecture of Brunelleschi and the o1 fifteenth century”, em Journal of the Warburg and Courtauld Institute, IX (1946), pp. 96- 121. Agudas observagées sobre 0 ensaio de Argan encontram-se in s. MACCHIONI, “Ideale mo nella cultura artistica del Quattrocento a Firenze”, em Studi | | POSFACIO 1988 2 Prospettiva come “forma simbolica”, 8 além de ponto d, i . ie um denso discurso critico que mais eaonittnte tarde encontrarg v argumenta- ¢40 completa no volume mondadoriano de 1955,14 a Mas sobretudo, considerando o ensaio sobre Brunelleschi com ° olhanvoltado para 9 J4 proximo Gropius, convém observar que a TnYENAO 28) Perspectiva € interpretada por Argan como elabora- g40 de um “instrumento cognoscitivo das leis que regulam a for- ma — por antonomisia, a classica, considerada Perfeita—ea natureza, como forma da realidade empirica’,"’ a identificagao entre arte € processo cognoscitivo, que estrutura racionalmente a realidade, ser4 certamente motivo de teflexdo, acima de improva- veis e inoportunos paralelismos, para o volume sobre a Bauhaus. Em sua breve mas proficua temporada londrina, Argan en- frentou outros dois temas de estudo: o Primeiro, Henry Moore, concretizou-se em alguns ensaios publicados em 1948;'° o segun- do, a cultura artfstica inglesa do século XVIII, deveria conduzir aum volume sobre a pintura insular do Iluminismo, de Hogarth a Turner. O livro nunca veio & luz. Iniciado entusiasticamente, depois interrompido, em seguida retomado e, por fim, abando- nado definitivamente, dele restam somente alguns capitulos editados em datas e vefculos diferentes, "’ além de um curso uni- versitario cujas apostilas apareceram mais tarde. Explica-se: na NE. PANOFSKY, Die Perspektive als “symbolische Form”, Leipzig-Berlim, 1927 (trad. it. La prospettiva come “forma simbolica” e altri scritti, Milao, 1961). "GC. ARGAN, Brunelleschi, Milao, 1955; reeditado em 1978. "'S. MACCHIONI, Ideale umanistico e neoplatonismo, cit., p. 68. ‘8G. C. ARGAN, “XXIV Bienale di Venezia. Henry Moore”, em Emporium (julho-agosto de 1948), pp. 61-64; id., Henry Moore, Turim, 1948. Reeditados em Studi e nove cit, pp. 283-293, e em id., Salvezza e caduta nell’arte moderna, Milao, 1964, pp. 180- 182. , "Veja-se, pela ordem de publicagio, id., “Le idee artistiche di William Hogarth’, em be glish Miscellany, 1 (1950), pp. 161-178; id., “La pittura dell'Tlluminismo in Roghihores . em Seritti di storia dell’arte in onore di Mario Salmi, Roma, 1963, Il, pp. 361-389) why Let pittura dell'Illuminismo in Inghilterra. Dispense dell'anno accademico 1904 1965, Roma, 1965, Todos os escritos esto reunidos em id, Da Hogarth a Picasso, Milo, [983 22 WALTER GROPIUS B A BAUHAUS verdade, o interesse de Argan por esse momento freqiientemente desprezado da histéria da arte € motivado pela pesquisa sobre aquela que parece ser a génese de uma cultura figurativa estru- turalmente critica e, como tal, moderna, por isso, atua nas ca- madas profundas do pensamento dele, aflorando volta e meia numa comparagao, numa citag4o, mas sem concretizar-se num estudo detalhado. Permanece, por assim dizer, como dado adquirido, como re- flexdo sobre os postulados m4ximos da arte moderna, cujo nasci- mento € assim atribufdo, ou pelo menos relacionado, a cultura critica do Iluminismo. O interesse de Argan pela arte contemporanea nao € dos anos do pés-guerra: remonta ao perfodo universitdrio turinés. A con- comitancia entre o estudo da arte antiga e o interesse pela moder- na € bem demonstrada pelo fato de que, no fasciculo de LArte — revista dirigida por Lionello Venturi — imediamente posterior aquele que contém o primeiro ensaio publicado por Argan e dedi- cado a “Andrea Palladio e la critica neoclassica”,'® aparece 0 arti- go sobre “II pensiero critico di Antonio SanvElia”;!? tema reto- mado, cinco anos mais tarde, no volume Dopo Sant'Elia, para a editora Domus, de Milao, com o significativo subtitulo de “Punto di partenza della nuova architettura”.2° O artigo sobre “La sceno- grafia contemporanea”, publicado em Rassegna musicale, é de 1931; data de 1933, na linha do interesse de Lionello Venturi pelo impressionismo, a resenha do volume de Roger-Marx sobre ee ee ‘“Id., “Andrea Palladio e la critica neoclassica”, em LArte, I (1930), 4, pp. 327-346; reeditado em id., Dal Bramante al Canova, Roma, 1970, pp. 71-84, ¢ em id., Classico Anciclassico, Il Rinascimento da Brunelleschi a Bruegel, Miléo, 1984, pp. 343-351. “Id., “Il pensiero critico di Antonio Sanv'Elia”, em LArte, | (1930), 5, pp. 491-498; reeditado em Progetto ¢ destino cit., pp. 203-211, “1d., “Il pensiero critico di Antonio Sant’Elia. Punto di i partenza della nuova architettura”, ew Dopo Sunt Elia, Miléo, 1935, pp. 43-55 € 77-84,

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