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HISTÓRIA DO CRISTIANISMO

SUMÁRIO:

INTRODUÇÃO
PERSEGUIÇÕES
O PAPADO
OS PAPAS DA RENASCENÇA
PAPAS DA CONTRA-REFORMA
PRECURSORES DA REFORMA
A REFORMA
PROTESTANTISMO
A IGREJA NO BRASIL
O EVANGELHO NA AMÉRICA DO SUL

DEFINIÇÃO:
Assim define “Cristianismo” o dicionário Aurélio Séc. XXI: “O conjunto das religiões
cristãs, isto é, baseadas nos ensinamentos, na pessoa e na vida de Jesus Cristo: o
catolicismo, o protestantismo, e religiões ortodoxas orientais”.

INTRODUÇÃO:
Quase todas as informações sobre a vida de Jesus e as origens do cristianismo
provêm de seus discípulos. A lembrança de suas palavras e ações, transmitidas através
dos Evangelhos, mencionam os dias que Jesus passou na Terra. Os discípulos e
seguidores de Cristo concluíram que o que ele demonstrava ser, através de sua
ressurreição, confirmava a sua natureza divina. Os evangelistas (Mateus, Marcos, Lucas
e João) inspiraram-se na linguagem das Escrituras ou Bíblia hebraica; chamada pelos
cristãos de Antigo Testamento, para compor um relato sobre a realidade de Jesus
Cristo. Estes judeus-cristãos, acreditando ser vontade e ordem de Deus que se unissem
para formar uma nova comunidade religiosa, salvadora do povo de Israel, fundaram a
primeira Igreja em Jerusalém. Consideravam que aquela cidade era a mais apropriada
para a nova Igreja receber o prometido o dom do Espírito Santo e de uma renovação
espiritual.

O INÍCIO DA IGREJA
Jerusalém era o núcleo do movimento cristão. A partir deste centro, o
cristianismo espalhou-se para outras cidades e povoados da Palestina e locais ainda
mais distantes. No princípio, a maioria das pessoas que se uniam ao movimento cristão
era seguidora do judaísmo, como o próprio Cristo. Por isto, o cristianismo inicial
manifestou-se como uma relação dual da fé judaica: uma relação de continuidade e ao
mesmo tempo de realização, de antítese, e também de afirmação.
Um fator importante que levou o cristianismo a distanciar-se das raízes judaicas
foi a mudança na composição da Igreja, ocorrida mais ou menos no final do século II.
Nesta época, os cristãos não-judeus começaram a superar, em número, os cristãos
judeus. O trabalho do apóstolo Paulo teve grande influência na ruptura definitiva entre
judaísmo e cristianismo. As cartas enviadas por Paulo a Timóteo e a Tito mostram o
início de uma organização baseada na transmissão da autoridade da primeira geração
de apóstolos; entre os quais se inclui Paulo, aos bispos subseqüentes.

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PERSEGUIÇÃO
O cristianismo teve, em primeiro lugar, que consolidar sua relação com a ordem
política. Dentro do império romano e como seita judaica, a Igreja cristã primitiva
compartilhou o status do judaísmo. Mas, antes da morte do imperador Nero, em 68, o
cristianismo já era considerado rival da religião imperial romana. A lealdade
demonstrada pelos cristãos perante seu Senhor, Jesus, era incompatível com a
veneração do imperador, encarado como divindade. Além disso, imperadores, como
Trajano e Marco Aurélio, viam no cristianismo uma ameaça a seus propósitos e
decidiram extingui-lo.
O Cristianismo teve começo com a pessoa e com os ensinamentos de Jesus, o
Cristo. Ele pertencia à raça judaica, de acordo com sua natureza humana. Mas ele era a
encarnação da própria Palavra de Deus.
A Bíblia contém a história de Cristo, a Igreja existe para contar a história de
Cristo, a história da Igreja é a continuação da história de Cristo.
Para mostrar a relação em que estamos para com a história bíblica e crendo que o
povo da Igreja deve familiarizar-se pelo menos com os fatos elementares da história da
mesma Igreja, apresentamos aqui breve esboço de suas partes essenciais, seus
principais eventos e personalidades É impossível entender as condições atuais da
cristandade a não ser à luz da História. A ignorância da História da Igreja está mais
generalizada do que a ignorância da Bíblia. Um dos principais deveres dos ministros é
ensinar à sua gente, os fatos da História da Igreja.

A História Universal é geralmente dividida em Três Períodos:


ANTIGA: Egito, Assíria, Babilônia, Pérsia, Grécia e Roma.
MEDIEVAL: Da Queda de Roma à Descoberta da América.
MODERNA: Do Século 15 aos Tempos Atuais.

A História da Igreja é geralmente dividida em Três Períodos:


PERÍODO DO IMPÉRIO ROMANO: Perseguições, Mártires, Pais da Igreja,
Controvérsias, Cristianização do Império Romano.
PERÍODO MEDIEVAL: Crescimento e Poderio do Papado, a Inquisição,
Monasticismo, Maometismo, e as Cruzadas.
PERÍODO MODERNO: Reforma Protestante, Grande Expansão da Igreja
Protestante, Larga Circulação da Bíblia Aberta, os Governos Civis libertam-se,
progressivamente, da ingerência da Igreja e do Clero, Missões Mundiais, Reforma Social
e Fraternidade Crescente.

OS GRANDES EVENTOS DA ERA CRISTÃ:


1. A Cristianização do Império Romano.
2. A Invasão dos Bárbaros, e a Amalgamação das Civilizações Romana e
Germânica.
3. A Luta com o Maometismo.
4. A Ascendência e Domínio do Papado.
5. A Reforma Protestante.
6. O Moderno Movimento Missionário Mundial.

OS TRÊS GRANDES RAMOS DA CRISTANDADE SÃO:


PROTESTANTE, dominante na Europa Setentrional e na América do Norte.
CATÓLICO ROMANO, dominante na Europa Meridional e na América do Sul.
CATÓLICO GREGO, dominante no Leste e Sudeste da Europa.

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São resultado de duas grandes brechas na Igreja: Uma no Século 9, quando o
Oriente se separou do Ocidente, em virtude de insistir o papa em ser o Senhor de toda
a Igreja. A outra, no Século 16, pela mesma razão, sob a liderança de Martinho Lutero,
o maior vulto da História do Cristianismo Moderna.
Diz Harnack, “A Igreja Grega é o cristianismo primitivo mais o paganismo grego e
Oriental. A Igreja Católica Romana é o cristianismo primitivo mais o paganismo grego e
romano.” A Igreja Protestante é o esforço por restaurar o cristianismo primitivo,
libertando-o de todo paganismo.

O IMPÉRIO ROMANO
A Igreja teve seu berço no Império Romano
Roma foi fundada em 754 a.C.
Submeteu a Itália em 343-272 a.C.
Submeteu Cartago em 264-146 a.C.
Submeteu a Grécia e a Ásia Menor em 215-146 a.C.
Submeteu a Espanha, a Gália, os bretões e os teutões em 133-131 a.C.
46 a.C. - 180 d.C. Apogeu da glória de Roma. Estendia-se do Atlântico ao
Eufrates, e do Mar do Norte ao Deserto Africano. População aproximada, 120.000.000.

OS DOZE CÉSARES
Julio César, 46-44 a.C. Dominador do mundo romano.
Augusto, 31 a.C. - 14 d.C. No seu reinado, CRISTO nasceu.
Tibério, 14-37 d.C. No seu reinado, Cristo foi crucificado.
Calígula, 37-41 d.C.
Cláudio, 41-54 d.C.
Nero, 54-68 d.C. Perseguiu os cristãos. Executou Paulo.
Galba, 68-69 d.C.
Oto, Vitélio, 69 d.C.
Vespasiano, 69-79.
Tito, 79-81.
Domiciano, 81-96. Perseguiu os cristãos. Exilou João.

OS CINCO BONS IMPERADORES


Nerva, 96-98 d.C.
Trajano, 98-117 d.C. Um dos melhores imperadores, mas perseguiu os cristãos.
Adriano, 117-138 d.C. Perseguiu os cristãos.
Antonino, o Pio, 138-161 d.C. O mais nobre dos imperadores; idade áurea da
glória de Roma; mas perseguiu os cristãos.
Marco Aurélio, 161-180 d.C. Perseguiu os cristãos.

180 - 476 d.C. Declínio e queda do Império Romano


192-284 d.C. “Imperadores da Caserna”, nomeados pelo exército. Período de
guerra civil e desastre interno generalizado.
Sétimo Severo, 193-211 d.C. Perseguiu os cristãos.
Caracala, 211-217. Tolerou o cristianismo.
Eliogábalo, 218-222. Tolerou o cristianismo.
Alexandre Severo, 222-235. Favorável ao cristianismo.
Maximino, 235-238. Perseguiu os cristãos.

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Filipe, 244-249. Muito favorável ao cristianismo.
Décio,249-251. Perseguiu, furiosamente, os cristãos.
Valeriano, 253-260. Perseguiu os cristãos.
Galiano, 260-268. Favoreceu os cristãos.
Aureliano, 270-275. Perseguiu os cristãos.
Diocleciano, 284-305. Perseguiu, furiosamente, os cristãos.
Constantino, 306-337. Tornou-se cristão.
Juliano, 361-363, o Apóstata. Procurou restaurar o paganismo.
Joviano, 363-364. Restabeleceu a fé cristã.
Teodósio, 378-395. Fez do cristianismo a religião oficial.

DIVISÃO DO IMPÉRIO, 395 d.C.

OCIDENTE ORIENTE
Honório, 395-423 Arcádio, 395-408
Valentiniano III, 423-455 Teodósio II, 408-450
Queda do Império Ocidental, 476, sob o Anastácio, 491-518
impacto dos bárbaros, quando começa a Justiniano, 527-565
era do obscurantismo.
Das ruínas do império ocidental surgiu o império papal, e Roma, desse modo,
ainda governou o mundo por 1.000 anos.

CRISTIANIZAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO


E PAGANIZAÇÃO DA IGREJA

Rápida propagação do cristianismo. Tertuliano (160-220) escreveu: “Nós


somos de ontem e, todavia, enchemos o vosso império, vossas cidades, vilas, ilhas,
tribos, campos, castelos, palácios, assembléias e o senado.” Ao fim das perseguições
imperiais, 313, os cristãos eram cerca da metade da população do Império Romano.
Conversão de Constantino. No decurso de suas guerras contra os rivais, para
se firmar no trono, na véspera da batalha da Ponte Mílvia, fora de Roma, 27 de outubro
de 312, viu no céu, acima do sol poente, a figura de uma cruz, e sobre esta as palavras
“Por este sinal vencerás.” Decidiu combater sob a bandeira de Cristo e ganhou a
batalha. Isto mudou o curso da História do Cristianismo.
O edito de tolerância, 313. Por este edito, Constantino concedeu “aos cristãos e
a todos os outros plena liberdade de seguir a religião que a cada um aprouvesse”, o
primeiro deste gênero na História. E foi adiante: favoreceu de todos os modos os
cristãos; deu-lhes os principais cargos; isentou ministros cristãos de impostos e do
serviço militar; incentivou e ajudou a construção de igrejas; fez do cristianismo a
religião de sua corte; expediu uma exortação geral, 325, a todos os súditos para que
abraçassem o cristianismo; e porque a aristocracia romana persistisse em seguir suas
religiões pagãs, mudou a capital para Bizâncio e denominou-a Constantinopla, “Nova
Roma”, capital do novo império cristão.
Constantino e a Bíblia. Encomendou a feitura de 50 Bíblias para as igrejas de
Constantinopla, a serem preparadas no mais fino velo, por hábeis artistas, sob a
direção de Eusébio, e autorizou o uso de duas carruagens públicas para que, sem
detença, lhe levassem essas Bíblias. É possível que os MSS Sinaítico e Vaticano
estivessem nesse grupo.

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Constantino e o domingo. Fez do dia de reunião dos cristãos, o domingo, dia
de descanso, proibindo nele todo o trabalho ordinário e permitindo aos soldados
cristãos assistir ao culto nas igrejas.
Reformas. Com a cristianização do império, foram abolidos a escravidão, os
combates de gladiadores, a morte de crianças indesejáveis, a crucificação como gênero
de pena capital.
Casas de culto. O primeiro templo cristão foi construído no reinado de Alexandre
Severo (222-235). Depois do edito de Constantino, passaram a ser construídos em toda
parte.
O cristianismo torna-se a religião oficial do Império Romano. Embora
Constantino tomasse de fato essa deliberação, só se efetivou no reinado de Teodósio
(378-395), que tornou obrigatório a cada cidadão fazer parte da Igreja. Foi isto a PIOR
CALAMIDADE que já sobreveio á mesma Igreja.
O desígnio de Cristo era vencer por meios puramente espirituais e morais. Até ao
tempo de Constantino as conversões eram voluntárias, por uma genuína mudança do
coração e da vida. Agora, porém, as conversões forçadas enchiam as igrejas de gente
não regenerada. Entrou na Igreja o espírito militar da Roma Imperial, mudando-lhe a
natureza e tornando-a uma organização política e fazendo-a precipitar-se no milênio
das abominações papais.
Queda do paganismo. Teodósio (378-395), ao fazer da Igreja uma instituição
do Estado, empreendeu a supressão à força de todas as outras religiões; proibiu o culto
de ídolos. Sob a vigência dos seus decretos, 375-400, os templos pagãos foram
derrubados pelos cristãos amotinados, havendo derrame de muito sangue. Entrava,
assim, a Igreja em sua grande apostasia. Conquistou o Império Romano, mas, na
realidade, foi esse império que a conquistou, não por eliminá-la, mas por lhe dar sua
própria fisionomia.
A Igreja Imperial do 4º e do 5º Século tornou-se uma instituição de todo
diferente da Igreja perseguida dos três primeiros séculos. Na sua ambição de domínio,
perdeu e esqueceu o espírito de Cristo.
O culto, a princípio muito singelo, passou a cerimônias complicadas, majestosas,
imponentes, com todo o esplendor externo, próprio dos templos pagãos.
Os ministros tornaram-se sacerdotes. O termo “sacerdote” não foi aplicado
aos ministros cristãos antes do ano 200 d.C. Foi tomado de empréstimo ao sistema
judaico, afeiçoando-se ao exemplo do sacerdócio pagão. Leão I (440-461) proibiu o
casamento aos sacerdotes, tornando-se lei o celibato na Igreja Romana. Mas o celibato
produziu seus maus efeitos. Através dos séculos, a imoralidade notória dos sacerdotes
tem sido um dos mais berrantes escândalos dessa Igreja.
Conversão dos bárbaros. Os godos, vândalos e hunos, que derrubaram o
Império Romano, aceitaram o cristianismo; mas em grande escala essa conversão foi
só nominal; e isto outra vez encheu a Igreja de práticas pagãs.
Conflitos com filosofias pagãs. Como cada geração procura interpretar Cristo
em termos de sua própria mentalidade, assim foi que, mal o cristianismo apareceu,
começaram a amalgamá-lo com filosofias gregas e orientais, dai surgindo muitas seitas:
gnosticismo (o mal está na matéria, Jesus era apenas um fantasma, a salvação vem da
íntima iluminação mística), maniqueísmo (dualismo pérsico), montanismo (contínuo e
sobrenatural ministério do Espírito Santo), monarquismo (o Pai, o Filho e o Espírito
Santo são uma só pessoa), arianismo (oposto à idéia trinitária de Deus), apolina -
rianismo (negava a natureza humana de Cristo), nestorianismo (duas naturezas em
Cristo), eutiquianismo (as duas naturezas de Cristo unificadas), monofisitas (Cristo tinha
uma natureza só). Do 2º ao 6º Século, a Igreja foi dilacerada por controvérsias acerca

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destes e de outros “ismos” semelhantes, quase perdendo de vista sua verdadeira
missão.

PERSEGUIÇÕES
Nero. Em 64 d.C. ocorreu o grande incêndio de Roma. O povo suspeitava de
Nero; este, para desviar de si tal suspeita, acusou os cristãos e mandou que fossem
punidos. Milhares foram mortos de maneiras crudelíssimas, entre eles, Paulo e,
possivelmente, Pedro. Tácito diz: “Por conseguinte, Nero, para se livrar dos rumores,
acusou de crime e castigou com torturas exageradas aquelas pessoas, odiosas devido a
práticas vergonhosas, a quem o vulgo chama cristãos. Cristo, autor desse nome, foi
castigado pelo procurador Pôncio Pilatos, no reinado de Tibério; e a fatal superstição,
reprimida por um pouco, irrompeu novamente, não só na Judéia, sede original desse
mal, porém por toda a cidade (Roma), para onde de toda parte tudo quanto é horrível
ou vergonhoso aflui e cai na moda.”
Domiciano. 96 d.C. Este organizou uma perseguição aos cristãos sob a
acusação de serem ateus, isto é, talvez por recusarem participar do culto do imperador.
Foi breve, porém violenta em extremo. Muitos milhares foram mortos em Roma e na
Itália, entre eles, Flávio Clemente, primo do imperador, e sua esposa Flávia Domitila,
que foi exilada. O Apóstolo João foi banido para Patmos.
Trajano, 98-117 d.C. Um dos melhores imperadores, mas achou que devia
manter as leis do império; enquanto que o cristianismo era considerado religião ilegal,
visto os cristãos se recusarem a sacrificar aos deuses romanos ou tomar parte no culto
do imperador, e a Igreja era havida como sociedade secreta, o que era proibido. Não
farejavam cristãos, porém, quando estes eram acusados, sofriam castigo. Entre os que
pereceram neste reinado estavam, Simão, irmão de Jesus, bispo de Jerusalém,
crucificado em 107 d.C., e Inácio, segundo bispo de Antioquia, que foi levado preso a
Roma e lançado às feras, 110 d.C. Plínio, enviado pelo imperador, à Ásia Menor, onde
os cristãos se haviam tornado tão numerosos que os templos pagãos quase ficaram
desertos, e que fora mandado para castigar os que recusassem a amaldiçoar a Cristo e
a sacrificar à imagem do imperador. Escreveu ao Imperador Trajano: “Eles afirmaram
que o seu crime e o seu erro resume-se nisto: costumavam reunir-se num dia
estabelecido, antes de raiar o dia, e cantar, revezando-se, um hino a Cristo, como a um
deus, e a obrigar-se por um juramento não à prática de qualquer iniqüidade, mas a
nunca roubar, nem furtar, nem adulterar; a nunca faltar à palavra, a nunca recusar
lealdade, ainda que solicitados; e depois de fazerem isto, a praxe era separarem-se e
depois reunirem-se, novamente, para uma refeição comum.”
Adriano, 117-138, perseguiu os cristãos, mas com moderação. Teléforo, pastor
da Igreja em Roma, e muitos outros sofreram martírio. Apesar disto, nesse reinado, o
cristianismo fez marcado progresso em número, riqueza, saber e influência social.
Antonino, o Pio, 138-161. Este imperador de certo modo favoreceu os cristãos,
mas sentia que devia manter a lei, havendo, por isso, muitos mártires, entre os quais
Policarpo.
Marco Aurélio, 161-180. Como Adriano, considerava a manutenção da religião
oficial uma necessidade política; mas foi diferente, por estimular a perseguição aos
cristãos. Foi cruel e bárbaro, o mais severo depois de Nero. Muitos milhares foram
decapitados ou lançados às feras, entre os quais Justino, o Mártir. Sua ferocidade foi
excessiva no sul da Gália. As torturas que as vítimas sofriam, sem darem mostra de
medo, quase que eram inacreditáveis. Supliciada da manhã até à noite, Blandina, uma
escrava, só fazia exclamar: “Sou cristã; entre nós não se pratica nenhum mal.”

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Sétimo Severo, 193-211. Esta perseguição foi muito pesada, porém não
generalizada. O Egito e o norte da África foram as regiões que mais sofreram. Em
Alexandria “muitos mártires eram diariamente queimados, crucificados ou degolados”,
entre os quais Leônidas, pai de Orígenes. Em Cartago, Perpétua, senhora nobre, e sua
fiel escrava Felicidade, foram estraçalhadas pelas feras.
Maximino, 235-238. Neste reinado, muitos líderes cristãos proeminentes foram
mortos. Orígenes escapou, escondendo-se.
Décio, 249-251, decidiu-se, resolutamente, a exterminar o cristianismo. Sua
perseguição estendeu-se por todo o império, e foi muito violenta; multidões pereceram
sob as mais cruéis torturas, em Roma, norte da África, Egito, Ásia Menor. Cipriano
disse: “O mundo inteiro está devastado.”
Valeriano, 253-260. Mais severo do que Décio, visava destruir completamente o
cristianismo. Muitos líderes foram executados, entre eles Cipriano, bispo de Cartago.
Diocleciano, 284-305. Foi a última perseguição imperial e a mais severa;
estendeu-se por todo o império. Durante dez anos, os cristãos foram caçados pelas
cavernas e florestas; queimados, lançados às feras, mortos por todas as crueldades
imagináveis. Foi um esforço resoluto, determinado e sistemático por abolir o nome de
cristão.

AS CATACUMBAS DE ROMA
Vastas galerias subterrâneas, comumente de 2,60 m a 3,30 m de largura, 1,30 m
a 2,00 m de altura, estendendo-se por centenas de quilômetros no subsolo da cidade.
Foram usadas pelos cristãos como lugares de refúgio, culto e sepultamento durante as
perseguições imperiais. Das sepulturas de cristãos variam os cálculos, indo de 2 milhões
a 7 milhões. Mais de 4.000 epitáfios têm sido descobertos, pertencentes ao período de
Tibério a Constantino.

OS PRIMEIROS INFIÉIS
Celso, 180 d.C., famosíssimo literato dos primeiros tempos, que se opôs ao
cristianismo. Hoje não há argumento que não se possa encontrar nos seus escritos.
Muitas idéias que hoje querem passar por “modernas”, são antigas como Celso. Porfírio
(233-300 d.C.) também exerceu poderosa influência contra o cristianismo.

PAIS DA IGREJA
Policarpo. 69-156 d.C. Discípulo do Apóstolo João e bispo de Esmirna. Na
perseguição ordenada pelo imperador, foi preso e levado à presença do governador.
Ofereceram-lhe a liberdade, se amaldiçoasse a Cristo, mas ele respondeu: “Oitenta e
seis anos faz que sirvo a Cristo e Ele só me tem feito bem; como podia eu, agora,
amaldiçoá-lo, sendo Ele meu Senhor e Salvador?” Foi queimado vivo.
Inácio. 67-110 d.C. Discípulo de João e bispo de Antioquia. O imperador
Trajano, visitando essa cidade, mandou prendê-lo; ele mesmo presidiu ao julgamento e
sentenciou que Inácio fosse lançado às feras em Roma. De viagem para esta cidade,
escreveu uma carta aos cristãos romanos, pedindo-lhes que não tentassem conseguir o
seu perdão: ansiava ter a honra de morrer pelo seu Senhor, dizendo: “As feras atirem-
se com avidez sobre mim. Se elas não se dispuserem a isto, eu as provocarei. Vinde.
multidões de feras; vinde, lacerai-me, estraçalhai-me, quebrai-me os ossos, triturai-me
os membros; vinde, cruéis torturas do demônio: deixai-me apenas que eu me una a
Cristo.” Regozijou-se no martírio.
Papias. Cerca de 70-155 d.C. Outro discípulo do Apóstolo João e bispo de
Hierápolis, uns 160 km a leste de Éfeso. Pode ter conhecido Filipe, que, segundo uma

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tradição, morreu em Hierápolis. Escreveu um livro: “Interpretações dos discursos do
Senhor”, onde diz que se empenhou em inquirir dos presbíteros as palavras exatas de
Jesus. Sofreu martírio em Pérgamo mais ou menos ao tempo de Policarpo. Este, Inácio
e Papias formam o elo de ligação entre a era apostólica e a posterior.
Justino, o Mártir. 100-167 d.C. Nasceu em Neápolis, antiga Siquém, mais ou
menos quando João morreu. Estudou filosofia. Quando moço, assistiu a muita
perseguição movida aos cristãos. Converteu-se. Viajou vestido num manto de filósofo,
procurando ganhar pessoas para Cristo. Escreveu uma defesa do cristianismo, que
endereçou ao imperador. Um dos homens mais competentes do seu tempo. Morreu
mártir em Roma. Mostrando o crescimento do cristianismo, disse que já no seu tempo
não havia “raça de homens que não fizesse orações em nome de Jesus”.
Eis aqui como Justino, o Mártir, descreveu o culto primitivo dos cristãos: “No
domingo há uma reunião de todos que moram nas cidades e vilas, lê-se um trecho das
memórias dos Apóstolos e dos escritos dos profetas, tanto quanto o tempo permita.
Terminada a leitura, o presidente, num discurso, admoesta e exorta à obediência
dessas nobres palavras. Depois disso, todos nos levantamos e fazemos uma oração
comum. Finda a oração, como descrevemos antes, pão e vinho e ação de graças por
eles de acordo com a sua capacidade, e a congregação responde, “Amém”. Depois os
elementos consagrados são distribuídos a cada um e todos participam deles, e são
levados pelos diáconos às casas dos ausentes. Os ricos e os de boa vontade contribuem
conforme seu livre arbítrio; esta coleta é entregue ao presidente que, com ela, atende a
órfãos, viúvas, prisioneiros, estrangeiros e todos quantos estão em necessidade.”
Irineu, 130-200. Criou-se em Esmirna. Discípulo de Policarpo e Papias. Viajou
muito. Veio a ser bispo de Lião, na Gália. Notável principalmente por causa de seus
livros contra os gnósticos. Morreu mártir. Vão aqui suas reminiscências sobre Policarpo:
“Lembro-me bem do lugar onde o santo Policarpo se sentava e falava. Recordo seus
discursos ao povo, e como referia as relações que tivera com o Apóstolo João, e com
outros que estiveram com o Senhor: como recitava os ditos de Cristo e os milagres que
operava; como recebera a sua doutrina de testemunhas oculares que viram o Verbo da
Vida, em tudo de acordo com as Escrituras.”
Orígenes, 185-254. O homem mais ilustrado (isso é, estudado) da Igreja antiga.
Muito viajado, escreveu muitos volumes, empregando as vezes até vinte copistas. Dois
terços do Novo Testamento estão citados em seus escritos. Viveu em Alexandria, onde
seu pai, Leônidas, sofreu martírio. depois na Palestina, onde morreu em conseqüência
de ser preso e torturado, no governo de Décio.
Tertuliano, 160-220, de Cartago; “Pai do Cristianismo Latino”. Advogado
romano, pagão: depois de convertido, tornou-se um proeminente defensor do
cristianismo.
Eusébio, 264-340, “Pai da História da Igreja”: Bispo de Cesaréia, ao tempo da
conversão de Constantino; teve muita influência junto a este; escreveu uma “História
Eclesiástica”, desde Cristo, até o Concílio de Nicéia.
João Crisóstomo, 345-407, “o boca-de-ouro”. Orador inigualável; o maior
pregador dos seus dias; suas pregações eram expositivas: nasceu em Antioquia, veio a
ser Patriarca de Constantinopla: pregou a grandes multidões na Igreja de Sta. Sofia;
como reformador, caiu no desagrado do rei, foi banido e faleceu no exílio.
Jerônimo, 340-420, “o mais ilustrado dos Pais Latinos”. Educou-se em Roma,
viveu muitos anos em Belém, traduziu a Bíblia para o latim, chamada Vulgata, ainda
hoje a Bíblia autorizada da Igreja Católica Romana.
Agostinho. 354-430. Bispo de Hipona, no norte da África. Foi o grande teólogo
da Igreja primitiva. Mais do que outro, moldou as doutrinas da Igreja da Idade Média.

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Quando jovem, brilhou por sua erudição. Mas era dissoluto. Tornou-se cristão por
influência de Mônica, sua mãe, de Ambrósio, de Milão, e das Epístolas de Paulo.
Escritos dos Pais Apostólicos
A Epístola de Barnabé (entre 70 e 120 d.C.). A Epístola de Clemente de Roma a
Corinto (95 d.C.). Sete Cartas de Inácio (110). A Epístola de Policarpo aos Filipenses
(110). O Ensino dos Doze (entre 70 e 165). O Pastor de Hermas (entre 100 e 140), o
“Peregrino” da Igreja Primitiva. Fragmentos de Papias. O “Díatessaron” de Taciano,
harmonia dos Quatro Evangelhos (150), e outros. A importância destes escritos reside
no fato de se aproximarem da época dos Apóstolos.

CONCÍLIOS ECUMÊNICOS
Nicéia. 325 d.C. Condenou o arianismo.
Constantinopla. 381. Convocado para deliberar sobre o apolinarianismo.
Éfeso, 431. Convocado para dar fim à controvérsia nestoriana.
Calcedônia. 451. Convocado para resolver a controvérsia eutiquiana.
Constantinopla. 553. Para acabar com a controvérsia dos monofísitas.
Constantinopla. 680. Doutrina das duas vontades em Cristo.
Nicéia. 787. Sancionou o culto das imagens.
Constantinopla, 869. Cisma final entre o Oriente e o Ocidente.
Foi este o último ecumênico. Os posteriores foram apenas romanos.
Roma. 1123. Decidiu que os bispos seriam nomeados pelos papas.
Roma. 1139. Esforço por remediar o cisma entre o Oriente e o Ocidente.
Roma. 1179. Para fazer vigorar a disciplina eclesiástica.
Roma. 1215. Para cumprir as ordens de Inocêncio III.
Lião. 1245. Para resolver a contenda entre o papa e o imperador.
Lião. 1274. Novo esforço por unir o Oriente e o Ocidente.
Viena. 1311 Suprimiu os templários.
Constança. 1414-1418. Para remediar o cisma papal. Queimou Huss.
Basiléia. 1431-1449. Para reformar a Igreja.
Roma. 1512-1518. Outro esforço pró-reforma.
Trento. 1545-1563. Para neutralizar a Reforma Protestante. (inclusão dos livros
apócrifos na Bíblia católica).
Vaticano. 1869-1870. Declarou a infalibilidade do papa.
Vaticano. 11 Out. 1962 – 8 Dez. 1965. Para reformar a Igreja. O maior de todos.

O MONASTICISMO
O movimento começou no Egito com Antônio (250-350 d.C.) que vendeu suas
propriedades, retirou-se para o deserto e viveu solitário. Multidões seguiram seu
exemplo. Chamavam-se “anacoretas”. A idéia era ganhar a vida eterna escapando do
mundo e mortificando a carne em práticas ascéticas. O movimento espalhou-se até
Palestina, Síria, Ásia menor e Europa. No Oriente cada um vivia em sua própria
caverna, ou cabana, ou em cima de um pilar. Na Europa viviam em comunidades
chamadas mosteiros, dividindo o tempo entre o trabalho e os exercícios religiosos.
Tornaram-se muito numerosos, surgindo muitas ordens de frades e freiras. Aos
mosteiros da Europa coube a realização do melhor trabalho que a Igreja da Idade
Média fez, no tocante à filantropia cristã, literatura, educação e agricultura. Quando,
porém, essas ordens se tornavam ricas, caíam em grosseira imoralidade. A Reforma,
nos países protestantes, deu cabo dessas ordens, e nos países católicos vão
desaparecendo.

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AS CRUZADAS
Esforço da cristandade por recuperar a Terra Santa, tirando-a de sob o domínio
dos maometanos. Houve sete cruzadas:
Primeira, 1095-1099. Capturou Jerusalém.
Segunda, 1147-1149; adiou a queda de Jerusalém.
Terceira, 1189-1191; o exército não conseguiu alcançar Jerusalém.
Quarta, 1201-1204; capturou e saqueou Constantinopla.
Quinta, 1228-1229; tomou Jerusalém, mas logo a perdeu.
Sexta, 1248-1254; foi um fracasso.
Sétima, 1270-1272; reduziu-se a nada.
As cruzadas, posto que fracassassem no objetivo que se propuseram, influiram
para salvar dos turcos a Europa, e também para estabelecer intercâmbio comercial e
cultural entre a Europa e o Oriente, abrindo assim o caminho para o renascimento da
cultura (Renascença).

O MAOMETISMO
Maomé. Nasceu em Meca, 570 d.C., neto de governador, ofício que teria de
exercer, se não fosse usurpado por outro. Quando moço, visitou a Síria, entrou em
contacto com cristãos e judeus, encheu-se de horror pela idolatria. Em 610 declarou-se
profeta; foi repelido em Meca; em 622 fugiu para Medina; aí foi recebido; tornou-se
guerreiro e começou a propagar a sua fé pela espada; em 630 tornou a entrar em Meca
à frente de um exército, destruiu 360 ídolos e ficou entusiasmado com a destruição
dessa idolatria. Morreu em 632. Seus sucessores chamaram-se Califas.
Rápido crescimento. Em 634 a Síria foi vencida; em 637, Jerusalém; em 638, o
Egito; em 640, a Pérsia; em 689, o norte da África; em 711, a Espanha. Assim, dentro
de pouco tempo toda a Ásia Ocidental e o norte da África, berço do cristianismo,
tornaram-se maometanos. Maomé surgiu num tempo em que a Igreja se paganizara
com o culto de imagens, relíquias, mártires, santos e anjos; os deuses da Grécia
haviam sido substituídos pelas imagens de Maria e dos santos. Em certo sentido, o
Maometismo foi uma revolta contra a idolatria do “Mundo Cristão”; castigo de uma
Igreja corrupta e degenerada. Em si mesmo, porém, foi um flagelo pior para as nações
por ele vencidas. É uma religião de ódio; foi propagada pela espada; incentivou a
escravatura, a poligamia e a degradação da mulher.
Batalha de Tours, na França, 732 d.C., uma das batalhas que decidiram a sorte
do mundo. Carlos Martelo derrotou o exército islamita e salvou a Europa do
maometismo que varria o mundo qual enxurrada. Não fosse essa vitória, o cristianismo
teria ficado completamente submerso.
Os árabes dominaram o mundo maometano de 622 a 1058. A capital mudou-se
para Damasco (661); para Bagdá em 750, onde permaneceu até 1258. A Idade Áurea
do maometismo verificou-se sob Harun-al-Raschid, 786-809, contemporâneo de
Carlos Magno no Ocidente.
Os turcos dominam o mundo maometano de 1058 até hoje. Foram muito mais
intolerantes e cruéis do que os árabes. O tratamento bárbaro que infligiram aos cristãos
na Palestina deu lugar às Cruzadas.
Os mongóis, do centro da Ásia, sustaram o domínio turco, sob Gengis Kan
(1206-1227), que, à testa de vastos exércitos, atravessou a ferro e a fogo grande parte
da Ásia; 50.000 cidades e vilas foram incendiadas; 5.000.000 de pessoas foram
massacradas; na Ásia Menor 630.000 cristãos foram chacinados; a Ásia nunca se
recuperou; foi “o mais terrível flagelo que já afligiu a raça humana”. Sob Tamerlão,
1336-1402, um furacão semelhante por toda parte foi deixando campos talados, vilas

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incendiadas e sangue. À porta de cada cidade seu costume era fazer pilhas de milhares
de cabeças; em Bagdá, 90.000.
A queda de Constantinopla, 1453, para os turcos, foi o fim do império romano
oriental, e fez estremecer a Europa com uma segunda ameaça de domínio maometano,
que, mais tarde, foi sofreado por João Sobieski, na Batalha de Viena, 1683.

LISTA DOS PAPAS - O PAPADO

Desenvolvimento gradual do Papado


Apareceu primeiro como poder mundial no 6º Século.
Atingiu o ápice do poderio no 13º Século.
Declínio do poder, do 13º Século até hoje.

A missão original da Igreja


A Igreja foi fundada, não como instituição autoritária para compelir o mundo a
viver a doutrina de Cristo, mas apenas como instituição que dá testemunho de Cristo,
para apresentá-lo ao povo. Cristo, não a Igreja, é o poder transformador da vida
humana. Todavia, a Igreja foi fundada nos dias do império romano, tomando
gradualmente uma forma de governo semelhante ao do mundo político em que existia,
e vindo a tornar-se vasta organização autocrática governada de cima.

A forma original do governo da Igreja


No fim da era apostólica as igrejas eram independentes entre si, cada qual
governada por uma junta de pastores. Dava-se precedência a um deles, que veio a
chamar-se bispo; os outros, mais tarde, foram chamados presbíteros. Gradualmente, a
jurisdição do bispo veio a abranger as cidades vizinhas.

O primeiro Papa
A palavra “papa” quer dizer “pai”. A princípio aplicava-se a todos os bispos
ocidentais. Por volta de 500 d.C., começou a restringir-se ao bispo de Roma, e logo
veio a significar, no uso comum, “pai universal”, isto é, bispo de toda a Igreja. A lista
católica romana dos papas apresenta os bispos de Roma a partir do 1º Século. Mas,
durante 500 anos, os bispos de Roma NÃO foram papas, isto é, “bispos universais”. A
idéia de que o bispo romano devia ter autoridade sobre toda a Igreja desenvolveu-se
lentamente, contestada acremente a cada passo, e nunca, em tempo algum, foi aceita
universalmente.

Pedro
A tradição católica de ter sido Pedro o primeiro papa é pura e simples ficção. Não
há qualquer evidência histórica de ter sido ele bispo de Roma. Nem ele alguma vez
reivindicou para si tal autoridade, como seus sucessores têm feito. Parece que Pedro
teve uma intuição, dada por Deus, de que seus “sucessores” se preocupariam
principalmente em “dominar o rebanho de Deus, em vez de se tornarem modelos para
ele” (1 Pe 5:3).

OS PRIMEIROS BISPOS ROMANOS


Lino, 67-79 d.C.? Cleto, 79-91? Clemente, 91-100, escreveu uma carta á Igreja
de Corinto, em nome da Igreja de Roma, não em seu próprio nome, e não dá nenhuma
idéia da autoridade papal que mais tarde certos papas assumiram. Evaristo, 100-109.

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Alexandre I, 109-119. Sixto I, 119-128. Telésforo, 128-130. Higino, 139-142. Pio
I, 142-154.
O COMEÇO DA POLÍTICA DOMINADORA DE ROMA
Aniceto, bispo de Roma, 154-168 d.C., procurou levar Policarpo, bispo de
Esmirna, a mudar a data da celebração da Páscoa; mas Policarpo recusou-se a atendê-
lo. Sotero, 168-176. Eleutério, 177-190. Vítor I, 190-202, ameaçou de excomunhão
às igrejas orientais por celebrarem a Páscoa em 14 de Nisã Polícrates, bispo de Éfeso,
respondeu que não temia as ameaças de Vitor, e afirmou a independência de sua
autoridade. Irineu, de Lião, embora bispo ocidental e simpatizasse com o ponto de vista
do ocidente sobre a celebração da Páscoa (isto é, que fosse em dia fixo de semana, e
não em dia fixo de mês), repreendeu Vitor por pretender impor-se às igrejas orientais.
Zeferino, 202-218.

A INFLUÊNCIA CRESCENTE DE ROMA


Calixto I, 218-223, foi o primeiro a basear sua pretensão em Mt 16:18.
Tertuliano, de Cartago, chamou-o usurpador, por falar como se fora Bispo dos bispos.
Urbano I, 223-230. Ponciano, 230-235. Antero, 235-236. Fabiano, 236-250.
Cornélio, 251-252. Lúcio I, 252-253. Estêvão I, 253-257, fez objeções a certas
práticas batismais da Igreja do Norte da África. Cipriano, bispo de Cartago, sustentou
que cada bispo era supremo em sua própria diocese, e recusou submeter-se a Estêvão.
Não obstante, tomava corpo a idéia de que Roma, cidade principal, devia ser cabeça da
Igreja, assim como era cabeça do império.
Sixto II, 257-258. Dionísio, 259-269. Félix I, 269-274. Eutiquiano, 275-283.
Caio, 283-296. Marcelino, 296-304. Marcelo, 308-309. Eusébio, 309-310. Mil-
cíades, 311-314.

A UNIÃO ENTRE A IGREJA E O ESTADO


Silvestre I, 314-335, era bispo de Roma quando, sob Constantino, o Cristianismo
se tornou virtualmente a religião oficial do Império Romano. A Igreja veio a ser,
imediatamente, uma instituição de vasta importância na política do mundo. Constantino
considerava-se cabeça da Igreja. Convocou o Concílio de Nicéia, 325, e presidiu a ele, o
primeiro concílio mundial da Igreja. Este concílio concordou em que os bispos de
Alexandria e de Antioquia tivessem plena jurisdição sobre suas províncias, assim como
o de Roma tinha sobre a sua, SEM QUALQUER IDÉIA de estarem elas sujeitas a Roma.
Marco, 336-337. Júlio I, 337-352. O Concílio de Sárdica, 343, constituído
somente de clérigos ocidentais, não sendo, portanto, concílio ecumênico, foi o primeiro
a reconhecer a autoridade do bispo romano.
Os cinco patriarcas
Pelos fins do 4º Século, as igrejas e os bispos da cristandade vieram a ficar, em
grande parte, sob o domínio de CINCO grandes centros: Roma, Constantinopla,
Antioquia, Jerusalém e Alexandria, cujos bispos vieram a ser chamados PATRIARCAS,
de igual autoridade todos eles, cada qual governando, sozinho, sua província. Depois
da divisão do império, 395, em Oriental e Ocidental, os patriarcas de Antioquia,
Jerusalém e Alexandria gradativamente reconheceram a liderança de Constantinopla; e
daí por diante surgiu a porfia pela liderança da cristandade entre Roma e essa cidade.

A divisão do Império Romano


Libério, 352-366 d.C. Dâmaso, 366-384. Sirício, 385-398, reivindicou jurisdição
universal sobre a Igreja, mas, para infelicidade sua, viu o império dividir-se em dois,

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395, Oriental e Ocidental, o que tornou mais difícil, ao bispo romano, conseguir o
reconhecimento de sua autoridade pelo Oriente.

A “Cidade de Deus”, de Agostinho


Anastácio, 398-402. Inocêncio I, 402-417, que se arrogou o título de “go-
vernante da Igreja de Deus”, e avocou a si o direito de resolver as controvérsias mais
importantes de toda a Igreja.
Zósimo, 417-418. Bonifácio, 418-422. Celestino I, 422-432. Sixto III, 432-
440. Por essa época, o Império Ocidental se dissolvia, rapidamente, ao impacto da
migração dos bárbaros; na aflição e ansiedade daqueles dias, Agostinho escreveu sua
obra monumental, a “Cidade de Deus”, na qual apresentou a visão de um império
cristão universal. Este livro influiu muito na formação de uma opinião favorável a uma
hierarquia eclesiástica universal sob um chefe, advogando assim a reivindicação de
Roma.

Reconhecimento imperial da pretensão do Papa


Leão I, 440-461, chamado primeiro papa por alguns historiadores. O infortúnio
do império foi propício ao papa. As controvérsias retalhavam o Oriente; o Ocidente,
com imperadores fracos, cedia terreno aos invasores bárbaros. O papa era o único
homem forte naqueles dias. Leão, em 452 persuadiu o huno Átila a poupar a cidade de
Roma. Mais adiante, em 455, induziu o vândalo Genserico a compadecer-se da cidade.
Isto contribuiu muito para o renome do papa. Leão afirmou que, por disposição divina,
era o primaz de todos os bispos, e obteve do imperador Valentiniano III, em 445, o
reconhecimento imperial dessa pretensão. Proclamou-se senhor de toda a Igreja;
advogou para si só o papado universal: disse que resistir à sua autoridade era ir direto
para o inferno; defendeu a pena de morte para os hereges. O Concílio de Calcedônia,
451, quarto concílio ecumênico, em que tiveram assento os bispos de todo o mundo, a
despeito do ato do imperador, concedeu ao patriarca de Constantinopla AS MESMAS
PRERROGATIVAS do patriarca de Roma.

A queda de Roma
Hilário, 461-468. Simplício, 468-483, era o papa quando o Império Ocidental se
extinguiu, em 476. Este fato deixou os papas livres da autoridade civil. Os vários e
novos reinozinhos dos bárbaros em que o Ocidente ficou dividido, deram aos papas
oportunidade de fazer alianças vantajosas, e, gradualmente, o pontífice veio a ser a
figura dominante no Ocidente.
Felix III, 483-492. Gelásio I, 492-496. Anastácio II, 496-498. Símaco, 498-
514. Hormisdas, 514-523. João I, 523-525. Felix IV, 526-530. Bonifácio II, 530-
532. João II, 532-535. Agapeto I, 535-536. Silvério, 536-540. Virgílio, 540-554.
Pelágio I, 555-560. João III, 560-573. Bento I, 574-578. Pelágio II, 578-590.

O primeiro Papa verdadeiro


GREGÓRIO I, 590-604 d.C., é, geralmente, considerado como o primeiro papa.
Surgiu num tempo de anarquia política e de grandes perturbações públicas por toda a
Europa. A Itália, depois da queda de Roma, 476, tornara-se um reino gótico; depois
uma província bizantina, sob o domínio do imperador oriental; agora estava sendo
pilhada pelos lombardos. A influência de Gregório sobre os vários reis teve um efeito
estabilizador. Decidiu por si mesmo exercer completo domínio sobre as igrejas da Itália,
Espanha, Gália e Inglaterra (cuja conversão ao cristianismo foi o grande acontecimento
de sua época). Trabalhou, incansavelmente, pela purificação da Igreja; depôs bispos

MÓDULO IX...................................................................................................13
negligentes ou indignos, e opôs-se, zelosamente, á prática da simonia (venda de
cargos). Exerceu muita influência no Oriente, se bem que não reivindicasse jurisdição
sobre a Igreja Oriental. O patriarca de Constantinopla chamava-se a si mesmo “bispo
universal”. Isto irritou muito a Gregório, que repeliu o título como “vicioso e arrogante”,
recusando-se a permitir que lho aplicassem: e, todavia, na prática, exerceu toda a
autoridade representada por esse título. Pessoalmente, era bom homem, um dos papas
mais puros e melhores; incansável nos seus esforços por justiça em favor dos
oprimidos, e de caridade ilimitada para com os pobres. Se todos os papas fossem como
ele, que idéia diferente o mundo não faria do papado!
Sabiniano, 604-606. Bonifácio III, 607. Bonifácio IV, 608-614. Deusdedit,
615-618. Bonifácio V, 619-625. Honório I, 625-638. Severino, 640. João IV, 640-
642. Teodoro I, 642-649. Martinho I, 649-653. Eugênio I, 654-657. Vitaliano, 657-
672. Adeodato, 672-676. Dono I, 676-678. Agatão, 678-682.
Leão II, 682-683, declarou “herético” Honório I. Estranhável: um papa
“‘infalível” chama “herético” a outro papa “infalível”. Mas acontece que os papas só se
tornaram “infalíveis” no Concílio do Vaticano, 1870, que os declarou tais...
Bento II, 684-685. João V, 685-686. Como, 686-687. Teodorus, 687. Sérgio
I, 687-701. João VI, 701-705. João VII, 705-707. Sisínio, 708. Constantino, 708-
715. Gregório II, 715-731. Gregório III, 731-741.

O Papa se torna rei terrestre


Zacarias, 741-752, serviu de instrumento para se fazer de Pepino (pai de Carlos
Magno) rei dos francos (povo germânico que ocupava o oeste da Alemanha e o norte
da França).
Estêvão II, 752-757. Por solicitação sua, Pepino, por sua vez, conduziu seu
exército à Itália, venceu os lombardos, cujas terras (grande parte da Itália) deu ao
papa. Foi esta a origem dos “ESTADOS PONTIFÍCIOS”, ou “DOMÍNIO TEMPORAL” dos
papas. O domínio civil de Roma e do centro da Itália pelos papas, assim estabelecido
por Zacarias e Estêvão e reconhecido por Pepino, 754, foi mais tarde confirmado por
Carlos Magno, 774. O centro da Itália, que uma vez fora cabeça do Império Romano,
depois reino gótico e mais adiante província bizantina, agora tornava-se REINO
PONTIFÍCIO, governado pelo “cabeça” da Igreja. Durou 1.100 anos, até 1870.
Paulo I, 757-767. Estêvão III, 768-772. Adriano I, 772-795.

O poder papal grandemente fomentado por Carlos Magno


Leão III, 795-816 d.C., em paga, por haver Carlos Magno reconhecido, em 774,
o poder temporal dos papas sobre os Estados Pontifícios, conferiu-lhe, em 800, o título
de “imperador romano”, unindo, assim, os domínios romanos e francos no “SANTO
IMPÉRIO ROMANO” e transferindo a capital, de Constantinopla para Aix-la-Chapelle, na
Alemanha Ocidental. Carlos Magno, 742-814, rei dos francos, neto de Carlos Martelo
(que salvara dos maometanos a Europa) foi um dos maiores governantes de todos os
tempos. Reinou 46 anos, fez muitas guerras e conquistas de enorme envergadura.
Seu reino abrangia o que hoje é a Alemanha, a França, a Suíça, a Austria, a Hungria, a
Bélgica, e partes da Espanha e da Itália. Ajudou ao papa, e o papa o ajudou. FOI ELE
UMA DAS MAIORES INFLUÊNCIAS em levar o PAPADO à posição de PODER MUNDIAL.
Pouco depois de sua morte, pelo Tratado de Verdum, 843, seu império foi dividido no
que veio a ser os fundamentos da moderna Alemanha, França e Itália; e, daí por
diante, durante séculos, houve luta incessante pela supremacia, entre os papas e os
reis da Alemanha e da França.

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“O Santo Império Romano”
Estabelecido assim por Carlos Magno e Leão III, declarando-o, Roma,
independente de Constantinopla e restabelecendo o Império Ocidental com soberanos
germânicos no trono, que usavam o titulo de “César”, conferido pelos papas, acreditou-
se que isso era a continuação do antigo Império Romano. Este Império deveria estar
sob a direção conjunta dos papas e dos imperadores germânicos, estes gerindo os
negócios temporais, e aqueles os espirituais. Mas, considerando que a Igreja era uma
instituição do Estado, nem sempre foi fácil delimitar a respectiva jurisdição, daí resul-
tando muitas lutas amargas entre os imperadores e os papas. O Santo Império
Romano, “mais um nome do que um fato consumado”, durou mil anos, e foi liquidado
por Napoleão, 1806. Serviu ao fim a que se propusera, combinando as civilizações
romana e germânica. “Nesse Império entrou tudo quanto fora do mundo antigo; dele
emergiu o mundo moderno” - Bryce.
Estêvão IV, 816-817. Pascoal I, 817-824. Eugênio II, 824-827. Valentino,
827. Gregório IV, 827-844. Sérgio II, 844-847. Leão IV, 847-855. Bento III, 855-
858.

As Pseudo-Decretais de Isidoro ajudam ao papado


Nicolau I, 858-867, o maior papa entre Gregório I e Gregório VII. Foi o primeiro
a usar coroa. Em abono de sua pretensão de autoridade universal, fez uso, com muito
efeito, das PSEUDO-DECRETAIS DE ISIDORO, livro que apareceu em 857, mais ou
menos, o qual continha documentos que se pretendia fossem cartas e decretos de
bispos e concílios do 2º e 3º séculos, todos eles visando a exaltar o poder do papa.
Foram invenções e corrupções premeditadas de antigos documentos históricos, mas a
sua natureza espúria só foi descoberta alguns séculos depois. Soubesse ou não que
fora isso forjado, pelo menos Nicolau mentiu em declarar que aquilo tinha sido
guardado nos arquivos da Igreja Romana desde tempos antigos. Mas serviram ao
propósito que tinham de “selar as pretensões do clero medieval com o sinete da
antiguidade”. “O papado, que se desenvolveu através de vários séculos, foi apresentado
assim como algo que já no princípio surgira completo e que não sofrera alteração.”
Nisso estava incluída a “doação de Constantino”, pela qual se davam, ao bispo romano,
as províncias ocidentais com todas as insígnias imperiais. “O objetivo era antecipar de 5
séculos o poder temporal do papa, o qual de fato repousava nas doações de Pepino e
Carlos Magno.” “Foi a fraude literária mais colossal que a História registra.”
“Fortaleceu o papado mais do que qualquer outro expediente, e constituiu-se, em larga
escala, a base da lei canônica da Igreja Romana.”

A Grande Brecha na Cristandade


Nicolau tomou a peito intervir nos negócios da Igreja Oriental. Excomungou
Fócio, patriarca de Constantinopla, que, por sua vez, o excomungou também. Seguiu-se
a cisão da cristandade, em 869 (consumada em 1054). Embora o Império estivesse
dividido desde 395, e tivesse havido uma luta prolongada e amarga entre o papa de
Roma e o patriarca de Constantinopla, ambos a disputar a supremacia, a Igreja
permanecera UNA. Os concílios eram assistidos por representantes do Oriente como do
Ocidente. Durante os 6 primeiros séculos, o Oriente representara os sentimentos da
Igreja e era sua parte mais importante. Todos os concílios ecumênicos tinham-se
realizado em Constantinopla. ou em lugares perto, usando-se a língua grega; e neles se
resolveram as questões doutrinárias. Mas, agora, a pretensão insistente do papa, de ser
o senhor da cristandade, acabou por se tornar intolerável, dando ocasião a que o
Oriente se separasse de modo definido.

MÓDULO IX...................................................................................................15
O Concílio de Constantinopla, de 869, foi o último concílio ecumênico. Daí por
diante, a Igreja Grega teve seus concílios, e a Igreja Romana os seus. A brecha tem
aumentado com o passar dos séculos. A maneira brutal como Constantinopla foi tratada
pelos exércitos do Papa Inocêncio III, durante as cruzadas, exacerbou ainda mais o
Oriente; e a decretação do dogma da Infalibilidade do Papa, em 1870, cavou ainda
mais o abismo. Rasgada, assim, em duas partes, a cristandade sofreu outra grande
brecha no Século 16, sob a liderança de Martinho Lutero, pela MESMA RAZÃO: a
determinação de o papa ser, ele mesmo, Senhor do povo de Deus.

O mais tenebroso período do papado


Adriano II, 867-872. João VIII, 872-882. Marino, 882-884. Com estes papas,
começou o PERÍODO MAIS TENEBROSO do papado, 870-1050. Os 200 anos entre
Nicolau I e Gregório VII é chamado, por certos historiadores, a “meia-noite da Idade
Média”. Suborno, corrupção, imoralidade e derramamento de sangue fizeram dessa
época o mais negro capítulo de toda a história da Igreja.
Adriano III, 884-885. Estêvão V, 885-891. Formoso, 891-896. Bonifácio VI,
896. Estêvão VI, 896-897. Romano, 897. Teodoro II, 898. João IX, 898-900.
Bento IV, 900-903. Leão V, 903. Cristóvão, 903-904.

O “Domínio das Meretrizes”


Sérgio III, 904-911 d.C., tinha uma amante, Marózia. Ela, sua mãe Teodora
(esposa ou viúva de um senador romano) e sua irmã, “puseram na cadeira papal seus
amantes e filhos bastardos, transformando o palácio pontifício numa cova de
salteadores”. Isto é conhecido, na História, como PORNOCRACIA, ou DOMÍNIO DAS
MERETRIZES (904-963).
Anastácio III, 911-913. Lando, 913-914. João X, 914-928, “foi trazido de
Ravena para Roma e feito papa por Teodora (que ainda tinha outros amantes), para
mais convenientemente, satisfazer ás suas paixões.” Foi morto, asfixiado, por Marózia,
que, para suceder a ele, elevou, ao pontificado, pessoal seu. Leão VI, 928-929, e
Estêvão VII, 929-931, e João XI. 931-936, seu próprio filho ilegítimo. Outro de seus
filhos ordenou os quatro seguintes.
Leão VII, 936-939, Estêvão VIII, 939-942, Martinho III, 942-946, e Agapeto
II, 946-955. João XII, 955-963, neto de Marózia, “foi réu de quase todos os crimes:
violou virgens e viúvas, da alta e da baixa classe; viveu com a amante de seu pai: fez
do palácio papal um bordel; foi morto num ato de adultério pelo próprio marido
enfurecido da mulher.”

Os abismos da degradação Papal


Leão VIII, 963-965. João XIII, 965-972. Bento VI, 972-974. Dono II, 974.
Bento VII, 975-983. João XIV, 983-984.
Bonifácio VII, 984-985, assassinou o Papa João XIV e “manteve-se no trono
papal, manchado de sangue, por meio de pródiga distribuição de dinheiro roubado”. O
Bispo de Orleans, referindo-se a João XII, Leão VIII e Bonifácio VII, chamou-os
“monstros de crimes, cheirando a sangue e imundícia; anticristos sentados no Templo
de Deus.”
João XV, 985-996. Gregório V, 996-999. Silvestre II, 999-1003.
João XVII, 1003. João XVIII, 1003-1009. Sérgio IV, 1009-1012.
Bento VIII, 1012-1024, comprou o ofício de papa com patente suborno.
Chamava-se a isto “SIMONIA”, isto é, compra ou venda de ofício eclesiástico por
dinheiro.

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João XIX, 1024-1033, comprou o pontificado. Era leigo e recebeu, num só dia,
todas as ordens do clero.
Bento IX, 1033-1045, era uma criança de 12 anos quando foi feito papa,
mediante uma negociata com as famílias poderosas que governavam Roma.
“Ultrapassou João XII em iniquidade; cometeu assassinatos e adultérios à luz clara do
dia; roubou peregrinos sobre os túmulos dos mártires; criminoso hediondo, o povo
expulsou-o de Roma.”
Gregório VI, 1045-1046, comprou o pontificado. Três papas rivais, Bento IX,
Gregório VI e Silvestre II. “Em Roma enxameavam os assassinos assalariados; violava-
se a virtude de peregrinos; até as igrejas eram profanadas com derramamento de
sangue.
Clemente II, 1046-1047, foi designado papa pelo Imperador Henrique III da
Alemanha “porque não se achava um clérigo romano livre da contaminação da simonia
e da fornicação.” A situação revoltante clamava por uma reforma.
Dâmaso II, 1048. Altos protestos contra a torpeza e a infâmia pontifícias, e os
clamores por uma reforma tiveram resposta num líder de nome Hildebrando.

A Idade Áurea do poder Papal


Hildebrando, de pequena estatura, desajeitado de aparência, de voz débil,
todavia, pujante de intelecto, animoso, decidido, homem “de sangue e ferro”. Zeloso
defensor do absolutismo papal, aderiu ao Partido Reformista levou o papado à sua
IDADE ÁUREA (1049-1294). Controlou os cinco sucessivos pontificados que precederam
imediatamente o seu: Leão IX, 1049-1054; Vitor II, 1055-1057, último dos papas
alemães; Estêvão IX, 1057-1058; Nicolau II, 1059-1061; em cujo pontificado a
eleição dos papas, que antes era feita pelo imperador, passou a ser da alçada dos
cardeais, Desde então os papas, com poucas exceções (como os de Avinhão), têm sido
escolhidos dentre o clero romano. Alexandre II, 1061-1073.
Gregório VII (Hildebrando), 1073-1085. Seu grande objetivo foi reformar o
clero. Os dois pecados predominantes nos padres eram imoralidade e simonia. Para
curá-los da imoralidade, Gregório insistiu, combativamente, no celibato. Para afastá-los
da simonia (compra de cargo eclesiástico por dinheiro) insurgiu-se contra o direito de o
imperador nomear dignitários para a Igreja. Praticamente, todos os bispos e padres
compravam os seus cargos, visto que à Igreja pertencia a metade de todas as
propriedades e tinha grandes rendimentos, o que ensejava uma vida de luxo. Os reis,
habitualmente, vendiam os cargos eclesiásticos a quem mais oferecesse, independente
da capacidade ou do caráter do indivíduo.
Isto levou Gregório a lutar, insistentemente, contra Henrique IV, Imperador da
Alemanha. Este depôs Gregório. Gregório, por sua vez, excomungou e depôs Henrique.
Seguiu-se uma guerra. Durante anos, a Itália foi devastada pelos exércitos em
combate. Gregório, finalmente, foi expulso de Roma e morreu no exílio. Mas fez, em
grande parte, a independência do papado, do poder imperial. Repetidamente,
denominou-se “soberano dos reis e príncipes”, e provou que o era.
Vitor III, 1086-1087. Urbano II, 1088-1099, continuou a guerra contra o
imperador; tornou-se líder do movimento das cruzadas, o que ainda mais aumentou o
prestígio do papado perante a cristandade.
Pascoal II, 1099-1118, continuou a guerra contra o imperador alemão a
propósito do direito das nomeações eclesiásticas.
Gelásio II, 1118-1119. Calixto II, 1119-1124, na Concordata de Worms, 1122,
chegou a um acordo com o imperador alemão, do que resultou a paz, depois de 50
anos de guerra.

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Honório II, 1124-1130. Inocêncio II, 1130-1143, manteve-se no ofício pelas
armas contra o antipapa Anacleto II, que fora escolhido por certas famílias poderosas
de Roma.
Celestino II, 1143-1144. Lúcio II, 1144-1145. Eugênio III, 1145-1153.
Anastácio IV, 1153-1154. Adriano IV, 1154-1159, o único que foi inglês; deu a
Irlanda ao rei da Inglaterra e autorizou-o a apossar-se dela. Tal autorização foi
renovada pelo papa seguinte, Alexandre III, entrando em execução em 1171. Alexan-
dre III, 1159-1181, o maior papa, de Gregório VII a Inocêncio III; entrou em conflito
com quatro antipapas, reiniciou a guerra pela supremacia contra o imperador alemão,
Frederico Barbaroxa, que, depois de cinco campanhas e muitas batalhas campais entre
seus exércitos e os do papa e seus aliados, havendo terrivel mortandade, fez a Paz de
Veneza, 1177. Alexandre foi expulso de Roma, pelo povo, morrendo no exílio, como
aconteceu com muitos outros papas.
Lúcio III, 1181-1185. Urbano III, 1185-1187. Gregório VIII. 1187.
Clemente III, 1187-1191. Celestino lll, 1191-1198.

O auge do poder Papal


Inocêncio III, 1198-1216, o papa mais poderoso. Declarou-se “vigário de
Cristo”, “vigário de Deus”, “soberano supremo da Igreja e do mundo”, com o direito de
depor reis e príncipes; que “todas as coisas na terra, no céu e no inferno estão sujeitas
ao vigário de Cristo.” Levou a Igreja a sobrepor-se ao Estado. Os reis da Alemanha,
França, Inglaterra, e, praticamente, todos os monarcas da Europa faziam a sua
vontade. Até o Império Bizantino foi por ele dominado, embora a maneira brutal como
tratou Constantinopla resultasse, mais tarde, no afastamento do Oriente. Nunca, na
História, um homem exerceu maior autoridade do que ele.
Ordenou duas cruzadas. Decretou a transubstanciação. Confirmou a confissão
auricular. Declarou que o sucessor de Pedro “nunca e de modo algum podia apartar-se
da fé católica” (infalibilidade papal). Condenou a “Magna Charta”. Proibiu a leitura da
Bíblia em vernáculo. Ordenou o extermínio dos hereges. Instituiu a INQUISIÇÃO.
Mandou massacrar os albigenses. Mais sangue foi derramado durante seu pontificado e
dos seus imediatos sucessores do que em outro qualquer período da história da Igreja,
salvo no esforço papal por esmagar a Reforma, nos Séculos 16 e 17. Dir-se-ia que
Nero, a besta, tinha revivido, assumindo o nome de cordeiro.

Mantido pela inquisição o poder Papal


A inquisição, denominada “SANTO OFÍCIO”, foi instituída por Inocêncio III e
aperfeiçoada sob o segundo papa que se seguiu, Gregório IX. Era o tribunal
eclesiástico, ao qual incumbia prender e castigar os hereges. Exigia-se que todos
prestassem informação sobre pessoas heréticas. Todos os suspeitos de heresia estavam
sujeitos a torturas, sem saber quem os havia acusado. O processo corria,
secretamente. O inquisidor pronunciava a sentença e a vítima era entregue às
autoridades civis para ser encarcerada pelo resto da vida, ou ser queimada. Seus bens
eram confiscados e divididos entre a Igreja e o Estado.
No período que se seguiu imediatamente a Inocêncio III, a Inquisição executou
sua obra mais fatal no sul da França (ver sobre os albigenses), mas a ela coube a
responsabilidade de vastas multidões de vítimas na Espanha, Itália, Alemanha e Países
Baixos. Mais tarde, foi ela a principal agência do esforço papal por esmagar a Reforma.
Afirma-se que nos 30 anos, entre 1540 e 1570, nada menos de 900.000 protestantes
foram mortos, na guerra movida pelo papa com o fim de exterminar os valdenses.
Imagine-se o que não era frades e padres, insensívelmente cruéis e desumanamente

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brutais, a dirigirem a obra de torturar e queimar vivos homens e mulheres inocentes; e
faziam isto em nome de Cristo, por ordem direta do seu “vigário”. A INQUISIÇÃO é o
FATO MAIS INFAME da História. Foi inventada pelos papas e usada por eles, durante
500 anos, na mantença do seu poder.

A continuação da guerra contra o imperador Alemão


Honório III, 1216-1227. Gregório IX, 1227-1241. Inocêncio IV, 1241-1254,
sancionou a aplicação de torturas para arrancar confissões dos suspeitos de heresia. No
pontificado desses três papas, Frederico II, imperador da Alemanha, neto de Frederico
Barbaroxa, um dos mais resolutos adversários do papado, contra este levou seu império
à última grande luta. Após repetidas guerras, o império foi humilhado, e o papado saiu
triunfante.
Alexandre IV, 1254-1261. Urbano IV, 1261-1264. Clemente IV, 1265-1268.
Gregório X, 1271-1276. Inocêncio V, 1276. João XXI, 1276-1277.
Nicolau III, 1277-1280. Martinho IV, 1281-1285. Honório IV, 1285-1287.
Nicolau IV, 1288-1292. Celestino V, 1294.

O Começo do Declínio Papal


Bonifácio VIII, 1294-1303, em sua famosa bula “Unam Sanctam”, disse;
“Declaramos, afirmamos, definimos e pronunciamos que é, absolutamente, necessário
para a salvação que toda criatura humana se sujeite ao Romano Pontífice.” Todavia,
Dante, que visitou Roma no pontificado desse papa, viu-o tão corrupto que chamou ao
Vaticano “semeador de corrupções”, e, ao lado de Nicolau III e Clemente V, pô-lo nas
partes mais baixas do inferno. Bonifácio recebeu o papado quando este estava no auge
do poder, mas encontrou um antagonista à altura, na pessoa de Filipe, o Belo, rei da
França, a cujos pés o papado foi humilhado até ao pó, começando sua ERA de
DECLÍNIO.

A França domina o Papado


O papado fora vitorioso em sua luta de 200 anos contra o Império Germânico.
Mas, agora, o rei da França se tornara o monarca-líder da Europa; um sentimento
nacionalista e um espírito de independência tomavam corpo no meio do povo francês
(consequência, sem dúvida, em parte do massacre brutal, dos albigenses franceses,
levado a efeito pelo papado no século precedente); e Filipe, o Belo, com quem a
história da França começa, assumiu a luta contra o papado. Iniciou-se o conflito com
Bonifácio VIII a propósito do imposto lançado sobre o clero francês. O papado foi
completamente submetido ao Estado; e, depois da morte de Bento XI, 1303-1304, a
sede pontifícia foi removida de Roma para Avinhão, no limite sul da França, e, durante
70 anos, o papado foi mero instrumento da corte francesa.

O “Cativeiro Babilônico” do Papado


70 anos (1305-1377), nos quais a sede pontifícia esteve em Avinhão. Clemente
V, 1305-1314. João XXII, 1316-1334, o homem mais rico da Europa. Bento XII,
1334-1342. Clemente VI, 1342-1352. Inocêncio VI, 1352-1362. Urbano V, 1362-
1370. Gregório XI, 1370-1378. A avareza dos papas de Avinhão não conheceu limites;
taxas pesadas foram impostas; todos os cargos na Igreja eram vendidos por dinheiro, e
muitos cargos novos foram criados, para serem vendidos, a fim de se encherem os
cofres dos papas e ser mantida assim, sua corte luxuosa e imoral. Petrarca, aos
domésticos do papa, acusou de rapinagem, adultério e toda espécie de imoralidade. Em

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muitas paróquias, como medida de proteção às famílias, cidadãos insistiam em que os
padres tivessem concubinas. O “cativeiro” foi um golpe no prestígio papal.

O cisma Papal
40 anos (1377-1417) durante os quais houve, simultaneamente, dois papas, um
em Roma e outro em Avinhão, cada qual a se dizer “vigário de Cristo” e a proferir
anátemas e maldições um ao outro.
Urbano VI, 1378-1389, sob o qual a sede pontifícia foi restabelecida em Roma.
Bonifácio IX, 1389-1404. Inocêncio VII, 1404-1406. Gregório XII, 1496-
1499. Alexandre V, 1409-1410.
João XXIII, 1410-1415, chamado, por alguns, o mais depravado criminoso que já
se sentou no trono papal; réu de quase todos os crimes; quando era cardeal, em
Bolonha, duzentas jovens, freiras e senhoras casadas caíram vítimas de seus
galanteios; como papa, violou freiras e donzelas, viveu em adultério com a mulher de
seu irmão; foi réu de sodomia e outros vícios inomináveis; comprou o cargo pontifício;
vendeu cardinalatos a filhos de famílias ricas; negou, abertamente, a vida futura.
Martinho V, 1417-1431, com quem foi sanado o cisma papal, mas este foi
considerado na Europa um escândalo, levando o papado a sofrer irreparável perda de
prestígio.
Eugênio IV, 1431-1447.

Os papas da renascença, 1447-1549


Nicolau V, 1447-1455, autorizou o rei de Portugal a guerrear contra povos
africanos, tomar-lhes as propriedades e escravizar sua gente.
Calixto III, 1455-1458. Pio II, 1458-1464, teve muitos filhos ilegítimos, referiu,
abertamente, os métodos que usava para seduzir mulheres, aliciou jovens na satisfação
dos próprios apetites e até se ofereceu para lhes ensinar como fazê-lo.
Paulo II, 1464-1471, “encheu sua casa de concubinas”.
Sixto IV, 1471-1484, sancionou a Inquisição Espanhola; decretou que o dinheiro
livraria as almas do purgatório; esteve implicado numa trama de morte contra Lourenço
de Médicis e outros que se opunham ao seu governo; prevaleceu-se da posição para se
enriquecer e a seus parentes; fez cardeais de oito de seus sobrinhos, embora alguns
deles ainda fôssem crianças; no luxo e esbanjamento, rivalizou com os Césares; na
riqueza e no fausto, ele e seus parentes, não tardou que excedessem às antigas
famílias de Roma.
Inocêncio VIII, 1484-1492, teve 16 filhos de várias mulheres casadas;
multiplicou os cargos eclesiásticos e vendeu-os por elevadas somas de dinheiro;
decretou o extermínio dos valdenses e enviou um exército contra eles; nomeou o brutal
Tomás de Torquemada para inquisidor geral da Espanha e ordenou a todas as
autoridades que a ele entregassem os hereges; permitiu touradas na Praça de S. Pedro;
deu lugar a que Savonarola trovejasse contra a corrupção papal.
Alexandre VI, 1492-1503, o mais corrupto dos papas da Renascença, licencioso,
avarento, depravado; comprou seu pontificado; fez, por dinheiro, muitos novos
cardeais; tinha uma quantidade de filhos ilegítimos, por ele reconhecidos, abertamente,
aos quais nomeou para elevadas funções eclesiásticas, quando ainda meninos, e que,
de parceria com o pai, assassinaram cardeais e outros que se lhes opunham. Teve
como amante a irmã de um cardeal que veio a ser o papa seguinte, Pio III, 1503, cujo
marido ele apaziguava com presentes.

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Papas do tempo de Lutero
Júlio II, 1503-1513, sendo o cardeal mais rico, percebendo vultuosa renda de
numerosos bispados e de propriedades de igrejas, comprou o seu pontificado; ainda
quando cardeal, ridicularizou o celibato: envolvendo-se em disputas intermináveis a
respeito da posse de cidades e principados, manteve, e comandou, pessoalmente,
vastos exércitos; foi chamado o “papa guerreiro”; expediu indulgências; era ele o papa
quando Lutero visitou Roma, ficando apavorado com o que viu.
Leão X, 1513-1521, era o papa quando Martinho Lutero começou a Reforma
protestante; filho de Lourenço de Médicis; feito arcebispo aos 8 anos de idade; cardeal
aos 13; nomeado para 27 diferentes cargos eclesiásticos, o que significava, para ele,
vultuosa renda, antes dos 13 anos; foi ensinado a considerar os cargos eclesiásticos
como simples fonte de renda; negociou o trono papal; vendeu honrarias eclesiásticas.
Vendiam-se todos os cargos da Igreja, e muitos outros foram criados. Nomeou como
cardeais crianças de 7 anos; manteve-se em infindáveis negociações com reis e
príncipes, trapaceando, com vistas ao poder secular, de todo indiferente ao bem-estar
religioso da Igreja; manteve a corte mais suntuosa e licenciosa da Europa; seus
cardeais rivalizavam com reis e príncipes em deslumbrantes palácios e passatempos
voluptuosos, servidos de enorme criadagem; e, todavia, esse sibarita confirmou a bula
“Unam Sanctam”, na qual se declarava que todas as criaturas humanas deviam
submeter-se ao Pontífice Romano para serem salvas; expediu indulgências a preços
taxados; declarou que a incineração de hereges era de ordem divina.
Adriano VI, 1522-1523. Clemente VII, 1523-1534. Paulo III, 1534-1549, teve
muitos filhos ilegítimos; inimigo decidido dos protestantes, ofereceu a Carlos V um
exército para dar-lhes combate.

O aparecimento dos Jesuítas


A resposta de Roma à secessão Luterana foi a INQUISIÇÃO, sob a liderança dos
JESUÍTAS, ordem fundada por Inácio de Loiola (1491-1556), espanhol, sob o princípio
de absoluta e incondicional OBEDIÊNCIA ao papa, tendo como objetivo a recuperação
de territórios perdidos para os protestantes e maometanos, e a conquista de todo o
mundo pagão para a Igreja Católica Romana. Seu alvo supremo era a destruição da
heresia (isto é, pensar algo diferente do que o papa dizia pensar); para a consecução
do que tudo era justificável: a fraude, a imoralidade, o vício, até o assassinato. O lema
deles era: “para maior glória de Deus”. Seus métodos: Escolas, procurando,
especialmente, alcançar os filhos das classes governantes, com o fito de, em todos os
educandários, assenhorear-se dos alunos de modo absoluto; ouvir em confissão
especialmente reis, príncipes e autoridades civis, satisfazendo-os em toda espécie de
vício e crime, com o fim de ganhar-lhes as boas graças; força, persuadindo as
autoridades a executar as sentenças da Inquisição.
Na França, foram eles os responsáveis pelo massacre da noite de São Bartolomeu,
pelas guerras de religião, pela perseguição aos huguenotes, pela revogação do edito de
tolerância de Nantes, e pela Revolução Francesa. Na Espanha, Países Baixos, Sul da
Alemanha, Boêmia, Áustria, Polônia e outros países, comandaram o massacre de
incontáveis multidões. Com estes métodos, sustaram a Reforma no Sul da Europa, e,
virtualmente, salvaram da ruína o papado.

Papas da Contra-Reforma
Júlio III, 1550-1555. Marcelo II, 1555. Paulo IV, 1555-1559, estabeleceu a In-
quisição Romana. Pio IV, 1559-1565. Pio V, 1566-1572. Gregório XIII, 1572-1585,
festejou, com missa solene de ação de graças e regozijo, as notícias do massacre de

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São Bartolomeu; instou com Filipe II para mover guerra á Inglaterra. Sixto V, 1585-
1590, expediu uma bula, declarando ser definitiva a sua edição da Vulgata, ao passo
que esta continha 2.000 erros.
Urbano VII, 1590. Gregório XIV, 1590-1591. Inocêncio IX, 1591. Clemente
VIII, 1592-1605. Leão XI, 1605. Paulo V, 1605-1621. Gregório XV, 1621-1623.
Urbano VIII, 1623-1644, com a ajuda dos jesuítas, eliminou os protestantes da
Boêmia.

Papas modernos
Inocêncio X, 1644-1655. Alexandre VII, 1655-1667. Clemente IX, 1667-
1669. Clemente X, 1670-1676. Inocêncio XI, 1676-1689. Alexandre VIII, 1689-
1691. Inocêncio XII, 1691-1700. Clemente XI, 1700-1721, declarou que os reis só
governavam com a sua ratificação; expediu uma bula contra a leitura livre da Bíblia.
Inocêncio XIII, 1721-1724. Bento XIII, 1724-1730. Clemente XII, 1730-1740.
Bento XIV, 1740-1758. Clemente XIII, 1758-1769. Clemente XIV, 1769-
1774, aboliu “para sempre” a Sociedade dos Jesuítas.
Pio VI, 1775-1799. Pio VII, 1800-1820, restaurou os jesuítas com um decreto
que “permanecerá sempre inalterável e inviolável”; fato estranho: um papa “infalível”
restaura o que outro papa “infalível” acabava de abolir “para sempre”; expediu uma
bula, dizendo que “as Sociedades Bíblicas são instrumentos do diabo que visam minar
os fundamentos da religião.”
Leão XII, 1821-1829, condenou toda a liberdade religiosa, a tolerância, as
Sociedades Bíblicas, as traduções da Bíblia; declarou que “todo aquele que se separa da
Igreja Católica Romana, ainda que sua vida seja irrepreensível sob outros aspectos, só
por esta única ofensa não tem parte na vida eterna.”
Pio VIII, 1829-1830, denunciou a liberdade de consciência, as Sociedades
Bíblicas e a Maçonaria.
Gregório XVI, 1831-1846, ardoroso defensor da Infalibilidade Papal; condenou
as Sociedades Bíblicas Protestantes.
Pio IX, 1846-1878, perdeu os Estados Pontifícios; decretou a INFALIBILIDADE
PAPAL; proclamou o direito de supressão da heresia pela força; condenou a separação
entre a Igreja e o Estado, e ordenou a todos os verdadeiros católicos que obedecessem
ao Chefe da Igreja, antes que às Autoridades Civis; verberou a liberdade de
consciência, a liberdade de culto, a liberdade de palavra e de imprensa; decretou a
Imaculada Conceição e deificou Maria; fomentou o apreço supersticioso das relíquias;
condenou as Sociedades Bíblicas e declarou que o protestantismo “não é uma forma de
religião cristã”; declarou que “todos os dogmas da Igreja Católica Romana foram
ditados por Cristo, mediante seus vice-regentes na terra.”

A infalibilidade Papal
A idéia da infalibilidade papal foi assunto de que não se cogitou na literatura cristã
durante 600 anos. Surgiu com o aparecimento das Falsas Decretais e tomou incremento
com a atitude assumida pelo papa, nas cruzadas, e nos conflitos de papas com
imperadores. Muitos pontífices, a partir de Inocêncio III, defenderam-na. Mas os
Concílios de Pisa, Constança e Basiléia decretaram, expressamente, que os papas estão
sujeitos aos concílios.
Pio IX, 1854, “por sua própria autoridade soberana e sem a cooperação de um
concílio”, proclamou a doutrina da Imaculada Conceição de Maria, como uma espécie
de balão de ensaio para sondar os sentimentos do mundo católico sobre a questão. A
receptividade que esse dogma encontrou animou-o a convocar o Concílio do Vaticano

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(1870) com a finalidade expressa de declará-lo Infalível, no que foi satisfeito pelo
Concílio, habilmente manipulado por ele. O decreto reza que “está divinamente reve-
lado” que o papa, quando fala “ex-cathedra”, “reveste-se de infalibilidade na definição
de doutrinas pertinentes à fé e à moral”, e que “tais definições são, de si mesmas,
irreformáveis, e não porque a Igreja consinta nisto.” De modo que o papa é hoje
INFALÍVEL, porque o Concílio Vaticano, por sua ordem, votou que ele o é. A Igreja
Oriental considera o caso como blasfêmia que veio coroar o papado.

A perda do poder temporal


Desde 754, os papas eram governantes civis de um reino chamado “Estados
Pontifícios”, que incluíam grande parte da Itália, sendo Roma a capital; e muitos papas
haviam-se interessado mais em alargar as fronteiras, a riqueza e o poderio desse reino
do que em promover o bem-estar espiritual da Igreja, e, muitas vezes, se prevaleceram
da posição espiritual de chefes da Igreja para aumentar seu poder secular. Patenteava-
se a corrupção papal, tanto no seu governo secular, quanto no espiritual. Era proverbial
o desgoverno papal em Roma: a venalidade dos funcionários, a frequência dos crimes,
as zonas de meretrício, a extorsão de dinheiro aos visitantes da cidade, dinheiro falso,
loterias. Pio IX governou Roma com o auxílio de 10.000 soldados franceses. Quando
irrompeu a guerra entre a França e a Alemanha, 1870, essas tropas foram requisitadas,
e Vitor Emanuel, rei da Itália, apoderou-se da cidade e anexou os Estados Pontifícios ao
seu reino. No plebiscito para transferência de Roma ao governo da Itália, os votos
favoráveis foram 133.648 contra 1.507. Perdeu, assim o papa não somente seu reino
temporal, como se tornou súdito de outro governo, o que era tremenda humilhação
para quem se afirmava ser soberano dos reis. Esse poder temporal lhe foi restaurado,
em miniatura, por Mussolini, em 1929; embora a cidade do Vaticano se constitua de
4.047 ares apenas, o papa voltou a ser soberano, rei, independente de qualquer
autoridade secular.

Papas da atualidade
Leão XIII, 1878-1903, declarou que fora designado cabeça de todos os governos
e que, na terra, ocupava o lugar do Deus Todo-Poderoso; deu ênfase à infalibilidade
papal; acusou os protestantes de serem “inimigos do nome de cristão”; denunciou o
“americanismo”; denominou a Maçonaria “fonte de todos os males”; estabeleceu como
único meio de cooperação a completa submissão ao Pontífice Romano.
Pio X, 1903-1914, acusou os líderes da Reforma de serem “inimigos da cruz de
Cristo.”
Bento XV, 1914-1922. Pio XI, 1922-1939. Em 1928 reafirmou que a Igreja
Católica Romana era a única Igreja de Cristo, e a unificação da cristandade só era
possível pela submissão a Roma.
Pio XII, 1939-1958. João XXIII, 1958-1963. Paulo VI, 1963-1978. João
Paulo I, 1978-1978. João Paulo II, 1978... .

SUMÁRIO
O papado é uma instituição italiana. Surgiu das ruínas do Império Romano,
ocupando o trono dos Césares em nome de Cristo; é uma revivificação da imagem do
Império Romano, cujo espírito herdou; “o espírito do Império Romano reviveu com a
roupagem do cristianismo.” Os papas, na sua maioria, têm sido italianos.
Os métodos do papado. Chegou ao poder pelo prestígio de Roma e em nome
de Cristo, e por astutas alianças políticas (como fez com os francos e Carlos Magno), e
pela fraude (como no caso das Falsas Decretais), e pela FORÇA ARMADA (seus próprios

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exércitos e os de reis subservientes); e pelo derramamento de sangue (como na
Inquisição). É assim que se tem mantido no poder.
As rendas pontifícias. Durante grande período de sua história, a venda de
cargos eclesiásticos, o vergonhoso tráfico das indulgências (venda, “por dinheiro, da
remissão dos pecados”), têm canalizado para o Vaticano rendas vultuosas, que o têm
capacitado a manter, por muito tempo, a corte mais suntuosa da Europa, em NOME do
HUMILDE JESUS CRISTO.
O caráter pessoal dos papas. Alguns deles têm sido bons homens; outros têm
sido, indizívelmente, vis; a maioria se tem absorvido em procurar conseguir poder
secular. Deus tem tido santos na Igreja Católica, porém a maioria dos santos de Deus
tem vivido FORA do VATICANO. Os “Vigários de Cristo”, na maior parte, têm sido tudo
menos santos.
Pretensões dos papas. Não obstante o caráter da generalidade dos papas, dos
seus métodos e da sua história mundana e sanguinolenta, estes “santos padres”
afirmam que são os “Vigários de Cristo”, “infalíveis”, “ocupantes, na terra, do lugar do
Deus Onipotente”, e que é necessário obedecer-lhes para se obter a salvação.
O papado e a Bíblia. Justino, o Mártir, Jerônimo e Crisóstomo insistiram na
leitura da Bíblia. Agostinho considerava as traduções dela um meio abençoado de
propagar a palavra de Deus entre as nações. Gregório I recomendou a leitura da Bíblia,
sem fazer qualquer restrição. Todavia, papas posteriores tomaram uma atitude
diferente. Hildebrando proibiu, aos boêmios, essa leitura. Inocêncio III proibiu, ao povo
ler a Bíblia na língua materna (em latim, a Bíblia era um livro fechado para o povo em
geral). Gregório IX proibiu que os leigos possuissem a Bíblia e suprimiu as traduções.
Estas, que circulavam entre os albigenses e valdenses, foram queimadas, e quem as
possuía era também queimado. Paulo IV proibiu a posse de traduções sem a permissão
do Inquisidor. Os jesuítas induziram Clemente XI a condenar a leitura da Bíblia pelos
leigos. Leão XII, Pio VII, Gregório XVI e Pio IX condenaram as Sociedades Bíblicas. Nas
escolas onde entra a influência do papa, a Bíblia não penetra. Nos países católicos, a
Bíblia tem sido livro desconhecido.
O papado e o Estado. Hildebrando denominou-se “soberano de reis e príncipes”.
Inocêncio III chamou-se “supremo soberano do mundo”, e avocou a si o direito de
fazer deposição de reis. Pio IX condenou a separação entre a Igreja e o Estado, e
ordenou que os verdadeiros católicos obedecessem ao Chefe da Igreja antes que às
Autoridades Civis. Leão XIII afirmou que era o “cabeça de todas as autoridades”. Na
coroação de um papa, colocam-lhe, na cabeça, a coroa papal e lhe dizem: “Tu és Pai
dos príncipes e dos reis, governador do mundo e vigário de Cristo.” A doutrina oficial de
Roma é que os católicos, em caso de conflito, devem obedecer ao papa antes que ao
seu país.
O papado e a Igreja. O papado não é a Igreja, mas uma máquina política que a
dirige, a qual, arrogando-se certas prerrogativas, interpôs-se entre Deus e o Seu povo;
seu objetivo foi, e continua sendo, conservar o povo a ele sujeito.
O papado e a tolerância. O Papa Clemente VIII declarou que o edito de
tolerância de Nantes, pelo qual se concedeu a todos “liberdade de consciência”, era o
que de mais condenável podia haver no mundo. Inocêncio X e seus sucessores têm
condenado, rejeitado, anulado e protestado contra os artigos de tolerância do Tratado
de Vestefália, de 1648. Leão XII condenou a liberdade religiosa. Pio VIII denunciou a
liberdade de consciência. Pio IV, expressamente, condenou a tolerância e a liberdade
religiosas. Leão XIII confirmou o decreto de Pio IX. Embora muitos padres nos EE.UU.
clamem por tolerância, a lei oficial e “infalível” do sistema a que pertencem é contrária
a isso. Os romanistas são a favor da tolerância SOMENTE nos países em que são

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minoria. O papado TEM COMBATIDO, sem trégua, a liberdade religiosa. Querem
tolerância para si, e recusam-na aos outros, onde quer que dominem.
Qual o propósito providencial no papado? Pode ser que, na Providência
divina, o papado tenha servido para, na Idade Média, salvar do caos a Europa Ocidental
e para amalgamar as civilizações romana e germânica. Mas suponha-se que a Igreja
NUNCA se houvesse tornado uma instituição do ESTADO, e que tivesse fugido,
completamente, à procura de poder secular, limitando-se, exclusivamente, à sua
política ORIGINAL de ganhar convertidos para Cristo e educá-los no caminho de Deus;
teria havido o MILÊNIO, em vez de uma ERA DE OBSCURANTISMO, a Idade Média.
Esta história do papado foi aqui incluída para servir de pano de fundo á
Reforma, na persuasão de que devemos familiarizar-nos com os motivos do
movimento protestante e com os fundamentos históricos de nossa fé
reformada. Alguns fatos aí mencionados parecem inacreditáveis. Afigura-se
inconcebível que homens tomassem a religião de Cristo e dela fizessem uma
inescrupulosa máquina política para a conquista do poder mundial.
Entretanto, todas as declarações feitas aqui podem ser verificadas,
consultando-se qualquer História Eclesiástica completa.

PRECURSORES DA REFORMA
Petrobrussianos, fundados por Pedro de Bruys, discípulo de Abelardo, 1110, na
França: rejeitavam a missa, sustentavam que a comunhão era um memorial, e que os
ministros deviam casar-se.
Arnaldo de Bréscia, 1155, discípulo de Abelardo, pregava que a Igreja não
devia ter propriedades; que o governo civil pertencia ao povo; que Roma devia ser
liberta do domínio do papa. Foi enforcado, a pedido do Papa Adriano IV.
Albigenses, ou Cártaros. No Sul da França, Norte da Espanha e da Itália.
Pregavam contra as imoralidades do clero, contra as peregrinações, o culto dos santos
e imagens: rejeitavam, completamente, o clero e suas pretensões: criticavam as
condições da Igreja: opunham-se às pretensões da Igreja de Roma; faziam largo uso
das Escrituras; viviam abnegadamente e eram muito zelosos da pureza moral. Em
1167, constituíam, talvez, a maioria da população do Sul da França; em 1200, eram
muito numerosos no norte da Itália. Em 1208 o Papa Inocêncio III ordenou uma cru-
zada: seguiu-se uma guerra sangrenta; dificilmente, houve outra igual na História;
cidade após cidade foi passada ao fio da espada; massacraram o povo, sem poupar
idade nem sexo; em 1229, foi estabelecida a Inquisição e dentro de cem anos os
albigenses foram, completamente, desarraigados.
Valdenses. Sul da França e Norte da Itália. Pareciam-se com os albigenses, mas
não eram os mesmos. Valdo, rico negociante de Lião, ao Sul da França, 1176, deu suas
propriedades aos pobres e saiu a pregar; opunha-se à usurpação e ao desregramento
do clero; negava, a este, o direito exclusivo de pregar o Evangelho; rejeitava missas,
orações pelos mortos e o purgatório; ensinava que a Bíblia era a única regra de fé e de
conduta. Sua pregação despertou, no povo, grande desejo de ler a Bíblia. Foram sendo
reprimidos, aos poucos, pela Inquisição, exceto nos Vales Alpinos, a sudoeste de Turim,
onde, ainda hoje, existem. São eles a única seita medieval que sobreviveu, tendo para
contar uma história de heróica resistência sob perseguições. São hoje a principal
denominação protestante da Itália.
João Wyclif. 1324-1384. Professor em Oxford, Inglaterra. Pregava contra a
dominação espiritual do clero e a autoridade do papa; opunha-se a existencia de papas,
cardeais, patriarcas e frades; atacou a transubstanciação e a confissão auricular.

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Defendeu o direito, que o povo tinha, de ler a Bíblia. Traduziu esta para o inglês. Seus
adeptos chamaram-se Lolardos.
João Huss. 1369-1415. Reitor da Universidade de Praga, Boêmia. Foi um
estudante de Wyclif, cujos escritos haviam penetrado nesse país. Tornou-se pregador
destemido; atacava os vícios do clero e as corrupções da Igreja; com veemência
arrebatada, condenava a venda de indulgências; rejeitava o purgatório, o culto dos
santos e o uso de uma língua estrangeira na liturgia; exaltava as Escrituras acima dos
dogmas e ordenanças da Igreja. Foi queimado vivo, e seus adeptos, grande parte da
população boêmia, quase que foram extirpados por uma cruzada ordenada pelo papa.
Savonarola. 1452-1498. Em Florença, Itália. Pregava, como um dos profetas
hebreus, a vastas multidões que enchiam sua catedral, contra a sensualidade e o
pecado da cidade, e contra os vícios do papa. A cidade penitenciou-se e se reformou.
Mas o Papa Alexandre VI procurou, de todos os modos, silenciar o virtuoso pregador;
tentou até suborná-lo com o chapéu cardinalício; mas em vão. Foi enforcado e
queimado na grande praça de Florença, 19 anos antes das 95 Teses de Lutero.
Os anabatistas, que apareceram através da Idade Média, em vários países
europeus, sob diferentes nomes, em grupos independentes, representavam uma
variedade de doutrinas, mas, de ordinário, eram, fortemente, anticlericais; rejeitavam o
batismo de crianças, dedicavam-se às Escrituras, e pugnavam pela absoluta separação
entre a Igreja e o Estado. Muito numerosos na Alemanha, Holanda e Suíça ao tempo da
Reforma, perpetuavam idéias recebidas de gerações anteriores. Em regra, eram um
povo calmo e genuinamente piedoso, mas foram rudemente perseguidos, espe-
cialmente nos Países Baixos.
A Renascença, ou reavivamento da cultura, resultado em parte das cruzadas, da
pressão dos turcos e da queda de Constantinopla, ajudou o movimento da Reforma.
Surgiu uma paixão pelos clássicos antigos. Vastas somas foram gastas no
colecionamento de manuscritos e na fundação de bibliotecas. Exatamente nesse tempo,
foi inventada a imprensa. Seguiu-se uma abundância de dicionários, gramáticas,
versões e comentários. Estudavam-se as Escrituras nas línguas originais. “Um
conhecimento novo das fontes da doutrina cristã revelou a grande diferença que havia
entre a singeleza nativa do Evangelho e a estrutura eclesiástica que se dizia funda da
sobre ele.” “A REFORMA VEIO A REALIZAR-SE DEVIDO AO CONTACTO DA MENTE
HUMANA COM AS ESCRITURAS”, e o resultado foi que a mente humana se emancipou
da autoridade clerical e papal.
Erasmo, 1466-1536, homem de vastíssima cultura e autor muito popular da
Reforma. Sua grande ambição foi libertar os homens de idéias falsas a respeito de
religião; e achou que o melhor meio para isso era voltarem eles às Escrituras. A edição
que fez do Novo Testamento Grego forneceu aos tradutores um texto acurado com que
pudessem trabalhar. Crítico implacável da Igreja Romana, deleitava-se, especialmente,
em ridicularizar os “homens profanos de ordens sacras”. Ajudou muito a Reforma, mas
nunca aderiu a ela.
Condições. Havia um descontentamento geral com a corrupção da Igreja e do
clero. O povo inquietava-se com as crueldades da Inquisição.
As autoridades civis ficaram cansadas com a ingerência do papa nos negócios do
governo. A Europa Ocidental irritava-se com o sistema eclesiástico que a mantinha
escravizada; “ao troar da trombeta de Lutero, a Alemanha, a Inglaterra, a Escócia e
outros países ergueram-se de súbito, como gigantes que despertassem do sono.”

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A REFORMA
Martinho Lutero, 1483-1546, depois de Jesus e Paulo, o maior homem de todos
os tempos. Levou o mundo a romper com a instituição mais despótica da História, em
busca da liberdade. “Fundador da civilização protestante.” Nasceu de pais pobres em
Eísleben, 1483. Entrou na Universidade de Erfurt, 1501, para estudar Direito. “Ótimo
estudante, muito desembaraçado na conversação e em debates, muito sociável e
amante da música”, colou grau dentro de tempo excepcionalmente curto. Em 1505,
resolveu de repente entrar para o convento. Monge exemplar e muito religioso, sub-
meteu-se a todas as formas de jejuns e disciplinas, e inventou outras. Por dois anos
suportou, segundo afirmação sua, “tais angústias quais ninguém pode descrever”. Certo
dia, em 1508, quando lia a Epístola aos Romanos, foi iluminado de súbito e a paz lhe
inundou a alma: “o justo viverá pela fé.” Viu, por fim, que a salvação ganhava-se pela
confiança em Deus, mediante Cristo, e não pelos ritos, sacramentos e penitências da
Igreja. Isso mudou toda a sua vida e TODO O CURSO DA HISTÓRIA. “Embora essa
descoberta sua tornasse desnecessária uma Igreja de sacerdotes, não percebeu isso de
pronto.” Continuou admitindo todas as práticas da Igreja, missas, relíquias,
indulgências, peregrinações e a hierarquia papal. Em 1508, tornou-se professor na
Universidade de Wittenberg, posição em que se manteve até sua morte, em 1546. Em
1511, viajou a Roma e, apesar de apavorado com a corrupção e vícios da corte papal,
ainda continuou aceitando a autoridade da Igreja. Voltou a Wittenberg. Seus sermões
sobre a Bíblia começaram a atrair estudantes de todas as partes da Alemanha.
Indulgências. A venda de indulgências por Tetzel deu ocasião a que Lutero
rompesse com Roma. A indulgência era um abrandamento das penas do Purgatório,
isto é, a remissão do castigo do pecado. Segundo a doutrina romanista, o Purgatório é
muito parecido com o Inferno, com a diferença de ser temporário; porém todos têm de
passar por ele. Todavia, o papa declarava ter o poder de mitigar ou de remitir de todos
esses sofrimentos. Esta prerrogativa pertencia exclusivamente a ele. Começou com os
papas Pascoal I (817-824) e João VIII (872-882). Viu-se que as indulgências do papa
eram altamente proveitosas, e generalizou-se logo o seu uso. Eram oferecidas como
estímulo para se participar de cruzadas, ou guerras contra hereges, ou contra algum rei
a quem o papa desejasse punir; ou se ofereciam a inquisidores, ou àqueles que
trouxessem feixes de lenha para a fogueira onde se queimasse algum herege;
concediam-se aos que fizessem peregrinação a Roma, ou aos que se encarregassem de
alguma missão, pública ou privada, do papa; ou se VENDIAM por DINHEIRO. O Papa
Sixto IV, em 1476, foi o primeiro a aplicar tais indulgências às almas do Purgatório.
Eram dadas em arrendamento, para serem vendidas a varejo. Assim foi que “a venda
do privilégio de pecar” veio a ser uma das principais fontes da renda papal. Em 1517,
João Tetzel apareceu pela Alemanha vendendo certificados, assinalados pelo papa,
pelos quais se oferecia o perdão de todos os pecados a quem os comprasse para si e
seus amigos, dispensando-se a confissão, o arrependimento, a penitência ou a
absolvição do padre. Dizia ele ao povo: “Ao tilintar das vossas moedas no fundo da
caixa, as almas de vossos amigos saem do Purgatório e entram no Céu.” Isto horrorizou
a Lutero.
As 95 teses. A 31 de outubro, 1517, Lutero, afixou à porta da Igreja de
Wittenberg, 95 teses, quase todas relacionadas com as indulgências, as quais, em sua
essência, referiam de frente a autoridade do papa. Era aquilo apenas um aviso de que
estava disposto a discutir aqueles assuntos na Universidade. Cópias impressas foram
procuradas com avidez por toda a Alemanha. Foi “a faísca que incendiou a Europa”.
Seguiram-se folhetos após folhetos, em latim para as pessoas ilustradas, e em alemão
para o vulgo. Em 1520, era Lutero o homem mais conhecido na Alemanha.

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A excomunhão de Lutero. Em 1520 o papa expediu uma bula, excomungando
a Lutero e declarando que, a menos que se retratasse dentro de 60 dias, sofreria “a
pena devida por heresia” (querendo dizer a morte). Lutero, ao receber a bula,
queimou-a, publicamente. Foi isto em 10 de dezembro de 1520. “Nova Era da História
começou naquele Dia” (Nichols).
A Dieta de Worms. Em 1521, Lutero foi citado por Carlos V, Imperador do Santo
Império Romano (que, naquele tempo, abrangia a Alemanha, Espanha, Países Baixos e
Áustria), para comparecer à Dieta de Worms; e na presença dos dignitários do império
e da Igreja reunidos, recebeu ordem de retratar-se. Respondeu que não podia retratar-
se de coisa alguma, a não ser do que a Escritura e a razão condenassem: “Aqui estou;
nada mais posso fazer; assim Deus me ajude.” Foi condenado. Tinha, porém, muitos
amigos entre os príncipes alemães para que o Edito fosse executado. Foi escondido, por
um amigo, durante cerca de um ano, e depois voltou a Wittenberg para continuar seu
trabalho, falando e escrevendo. Entre outras coisas, traduziu a Bíblia para o alemão;
isto “espiritualizou a Alemanha e lhe deu um idioma”.
A guerra do papa aos protestantes alemães. A Alemanha era constituída de
muitos Estados pequenos, cada qual governado por um príncipe. Muitos desses
príncipes, com os seus Estados, haviam sido ganhos para a causa de Lutero. Por volta
de 1540, todo o norte da Alemanha tornara-se luterano. Ordenou-se-lhes que
voltassem ao aprisco romanista. Ao invés disso, uniram-se, em defesa mútua, no que
se chamou Liga Smalcald. O Papa Paulo III instou com o Imperador Carlos V que agisse
contra eles, e ofereceu-lhe um exército. Declarou essa guerra uma cruzada, oferecendo
indulgências a todos quantos dela participassem. A guerra durou de 1546 a 1555,
terminando com a Paz de Augsburgo, pela qual se reconheceu, legalmente, a religião
dos luteranos. O papa estimulou essa guerra com o propósito de forçar os luteranos à
submissão. Foi ele o agressor; os luteranos ficaram na defensiva.
O nome “protestante”. A Dieta de Spira, 1529 d.C., em que os católicos eram
maioria, decidiu que estes podiam ensinar sua religião nos Estados Luteranos, mas
proibiu aos luteranos de ensinar nos Estados Católicos da Alemanha. Contra isto, os
príncipes alemães ergueram um formal protesto, ficando, dai por diante, conhecidos
por “protestantes”. O nome, aplicado, originalmente, aos luteranos, estendeu-se no uso
popular aos que hoje protestam contra a usurpação papal, inclusive todas as
denominações cristãs evangélicas.
Na Suíça, país histórico da liberdade, a Reforma foi começada por Zuínglio e
levada avante por Calvino. Os adeptos dos dois, em 1549, uniram-se e constituíram a
“Igreja Reformada”. A Reforma deles teve alcance mais vasto do que a de Lutero.
Zuínglio, (1484-1531) em Zurique, convenceu-se, por volta de 1516, de que a
Bíblia era o meio de purificar-se a Igreja. Em 1525, Zurique aceitou, oficialmente, sua
doutrina; e as igrejas, gradativamente, aboliram as indulgências, a missa, o celibato, as
imagens, tendo a Bíblia como única autoridade.
João Calvino, 1509-1564, francês, aceitou as doutrinas da Reforma, em 1533.
Foi expulso da França em 1534. Dirigiu-se para Genebra em 1536. Aí, sua Academia
tornou-se um centro de Protestantismo, que atraiu homens ilustrados de muitas terras.
Foi chamado “o maior teólogo da cristandade”, e, por Renan, “o homem mais cristão de
sua geração.” Mais do que outro qualquer, orientou o pensamento do Protestantismo.
Nos Países Baixos, a Reforma foi logo aceita; luteranismo, e depois calvinismo;
os anabatistas já eram numerosos. Entre 1513 e 1531, publicaram-se 25 diferentes
traduções da Bíblia em holandês, flamengo e francês. Os Países Baixos eram parte dos
domínios de Carlos V. Em 1522 estabeleceu ele, ai, a Inquisição, e mandou queimar
todos os escritos luteranos. Em 1546, proibiu a impressão e a posse da Bíblia, quer na

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Vulgata, quer traduções. Em 1535, decretou a “morte, pelo fogo”, dos anabatistas.
Filipe II (1566-1598), sucessor de Carlos V, tornou a expedir os editos de seu pai, e,
com o auxílio dos jesuítas, levou adiante a perseguição com fúria ainda maior. Por uma
sentença da Inquisição, toda a população foi condenada à morte, e sob Carlos V e Filipe
II mais de 100.000 foram massacrados com brutalidade incrível. Alguns eram
acorrentados a uma estaca perto do fogo e torrados, lentamente, até morrer; outros
eram lançados em masmorras, açoitados, torturados em cavalete, antes de serem
queimados. Mulheres eram queimadas vivas, metidas à força em esquifes apertados,
pisoteados pelos carrascos. Os que tentavam fugir para outros países eram in-
terceptados por soldados e massacrados. Após anos de não-resistência, sofrendo
crueldades inauditas, os Protestantes dos Países Baixos uniram-se sob a liderança de
Guilherme de Orange, e, em 1572, começaram a grande revolta. Depois de sofrimentos
inacreditáveis, ganharam, em 1609, sua independência; a Holanda, ao norte, tornou-se
protestante; a Bélgica, ao sul, católica romana. A Holanda foi o primeiro país a adotar
escolas públicas mantidas por impostos, e a legalizar princípio de tolerância religiosa e
liberdade de imprensa.
Na Escandinávia, o Luteranismo foi cedo introduzido e feito religião oficial: na
Dinamarca, em 1536; na Suécia, em 1539; na Noruega, em 1540. Cem anos depois,
Gustavo Adolfo (1611-1632), Rei da Suécia, prestou assinalado serviço em fazer
fracassar o esforço de Roma por esmagar a Alemanha Protestante.
Na França. Por volta de 1520 as doutrinas de Lutero penetraram na França. As
de Calvino logo se seguiram. Em 1559 havia cerca de 400.000 protestantes.
Chamavam-se “huguenotes”. O fervor de sua piedade e a pureza de suas vidas
constrastavam, vivamente, com o viver escandaloso do clero romano. Em 1557, o papa
urgiu o extermínio deles. O rei expediu o decreto do massacre e mandou a todos os
súditos leais que ajudassem a caçá-los. Os jesuítas percorreram a França, persuadindo
seus fiéis a empunhar armas para destruí-los. Assim perseguidos pelos agentes do
papa, como nos dias de Diocleciano, reuniam-se, ocultamente, muitas vezes em
adegas, à meia-noite.
O massacre de São Bartolomeu. Catarina de Médicis, mãe do rei, romanista
ardorosa e instrumento dócil do papa, deu a ordem, e, à noite de 24 de agosto de
1572, 70.000 huguenotes, inclusive a maioria dos seus líderes, foram trucidados. Houve
grande regozijo em Roma. O papa e seu Colégio de Cardeais foram, em solene
procissão, à Igreja de San Marco, mandando cantar Te Deum em ação de graças.
Mandou cunhar uma medalha comemorativa do massacre e enviou um cardeal a Paris
para levar ao rei e à rainha-mãe suas congratulações, bem como dos cardeais. “Faltava
um nada para a França tornar-se protestante; ela, porém, esmagou o protestantismo
na noite de São Bartolomeu, 1572.” Em 1792, veio à França uma outra espécie de
“Protesto”. (Thomas Carlyle).
As guerras huguenotes. Em seguimento ao massacre de São Bartolomeu, os
huguenotes uniram-se e se armaram para a resistência, até que, finalmente, em 1598,
pelo Edito de Nantes, concedeu-se-lhes o direito de liberdade de consciência e de culto.
Mas, nesse entretempo, uns 200.000 pereceram mártires. O Papa Clemente VIII achou
“condenável” o Edito de Nantes. Depois de anos de trabalho dos jesuítas, às ocultas, o
Edito foi revogado em 1685, e 500.000 huguenotes fugiram para países protestantes.
A Revolução Francesa, cem anos mais adiante, 1789, foi uma das mais
tremendas convulsões que a História registra. O povo, em frenesi contra a tirania das
classes dominantes (entre elas o clero, proprietário de um terço de todas as terras, rico,
indolente, imoral e desumano em tratar os pobres), levantou-se num reinado de terror
e sangue, e aboliu o governo, fechou as igrejas, confiscou suas propriedades, suprimiu

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o cristianismo e o domingo, e entronizou a deusa da razão (personificada numa mulher
dissoluta). Napoleão restaurou, a Igreja, porém não suas propriedades; em 1802,
concedeu tolerância a todos; e quase pôs fim ao poder político dos papas em cada país.

Na Boêmia, em 1600, numa população de 4 milhões, 80 por cento eram


protestantes. Quando os hapsburgos e jesuítas acabaram sua obra, restavam 800.000,
todos católicos.
Na Áustria e na Hungria mais da metade da população tornara-se protestante,
mas sob o poder dos hapsburgos e jesuítas foram trucidados.
Na Polônia, pelos fins do Século 16, parecia que o romanismo estava para ser
varrido, inteiramente, mas aí, por igual, os jesuítas estrangularam a Reforma pela
perseguição.
Na Itália, país do papa, a Reforma ia-se impondo: mas a Inquisição movimentou-
se e quase não ficou vestígio de Protestantismo.
Na Espanha, a Reforma nunca fez muito progresso, devido à Inquisição, que já
se encontrava lá. Todo esforço por liberdade ou independência de pensamento era
esmagado, implacavelmente. Torquemada (1420-1498), frade dominicano, arqui-
inquisidor, em 18 anos, queimou 10.200 pessoas e condenou 97.000 à prisão perpétua.
As vítimas eram, de ordinário, queimadas vivas, em praça pública, o que dava ensejo a
festividades religiosas. De 1481 a 1808, houve, no mínimo, 100.000 mártires e
1.500.000 pessoa foram banidas. “Nos Séculos 16 e 17, a Inquisição extinguiu a vida
literária da Espanha, pondo a nação quase fora do círculo da civilização européia.
Quando a Reforma começou, a Espanha era o país mais poderoso do mundo. Sua
presente condição de insignificância entre as nações mostra o que o papado pode fazer
com um país.
A Armada Espanhola, 1588. Uma das características da estratégia jesuítica era
procurar subverter os países protestantes. O Papa Gregório XIII “nada deixou por fazer
para compelir Filipe II, imperador e rei da Espanha, a mover guerra contra a Inglaterra
protestante.” Sixto V, que se tornou papa quando os planos iam amadurecendo, fez
dessa guerra uma cruzada (isto é, ofereceu indulgências aos que dela participassem).
Naquele tempo, a Espanha tinha a mais poderosa armada que já sulcara os mares; mas
essa orgulhosa marinha encontrou sua derrota no Canal da Inglaterra. “A vitória da
Inglaterra foi o ponto decisivo no grande duelo entre o Protestantismo e o Romanismo;
não somente firmou a Inglaterra e a Escócia, na causa protestante, como também a
Holanda, o norte da Alemanha, a Dinamarca, a Suécia e a Noruega” (Jacobs).
Na Inglaterra foi revolta, e, depois Reforma. Desde os dias de Guilherme, o
Vencedor, 1066, houvera repetidos protestos contra o domínio do papa sobre a
Inglaterra. Henrique VIII (1509-1547) cria, à semelhança dos seus predecessores, que
a Igreja da Inglaterra devia ser independente do papa, e o rei o seu chefe. Seu divórcio
não foi a causa, mas a ocasião de seu rompimento com Roma. Henrique não foi
nenhum santo, e tampouco o era Paulo III, papa seu contemporâneo, que tinha muitos
filhos ilegítimos. Em 1534, a Igreja da Inglaterra repudiou, definitivamente, a
autoridade papal, e resolveu ter vida independente, sob a direção espiritual do Arce-
bispo de Cantuária, enquanto Henrique VIII assumia o título de “Chefe Supremo” no
tocante aos negócios temporais da Igreja e suas relações políticas. Tomás Cranmer foi
arcebispo de Cantuária e com ele a Reforma começou; os mosteiros foram supressos
sob a acusação de imoralidade; a Bíblia em inglês foi colocada nas igrejas e um Livro de
Orações para o culto em inglês. As igrejas foram privadas de muitas práticas
romanistas. No reinado seguinte, de Eduardo VI (1547-1553), a Reforma fez grande
progresso. Contudo, Maria, a Sanguinária (1553-1558), fez um esforço decidido para

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restaurar o romanismo, e, em seu governo, muitos protestantes sofreram martírio,
entre os quais Latimer, Ridley e Cranmer. Sob a Rainha Elisabeth (1558-1603) houve,
novamente, liberdade, restabelecendo-se a Igreja da Inglaterra à forma em que
permaneceu até hoje. Dessa Igreja, saíram os puritanos e os metodistas.
Na Escócia, a influência de Wyclif ainda perdurava; as doutrinas de Lutero
entraram aí por volta de 1528; as de Calvino logo após. A História da Reforma Escocesa
é a história de João Knox.
João Knox, 1515-1572, padre escocês, cerca de 1540, começou a pregar idéias
da Reforma. Em 1547, foi preso pelo exército francês e enviado à França, onde,
durante 9 meses, esteve condenado às galés. Por influência do governo inglês, foi
solto, voltando à Inglaterra, 1549, onde continuou a pregar. Com a ascensão de Maria,
a Sanguinária, 1553, foi para Genebra, onde absorveu, de modo completo, a doutrina
de Calvino. Em 1559, foi chamado de volta à Escócia pela Câmara dos Lords Escoceses,
a fim de liderar um movimento de Reforma Nacional. A situação política fez da Reforma
da Igreja e da Independência Nacional UM SÓ movimento. Maria, Rainha dos
Escoceses, se casara com Francisco II, rei da França, que era filho de Catarina de
Médicis (célebre pelo massacre de São Bartolomeu). A Escócia e a França ficaram assim
aliadas, suas coroas unidas pelo casamento. A França inclinava-se à destruição do
protestantismo. Filipe II, rei da Espanha, com outros romanistas, tramou o assassinato
da Rainha Elisabeth, para que Maria, rainha dos escoceses, subisse ao trono da
Inglaterra. O Papa Pio V ajudou na trama, expedindo uma bula de excomunhão de
Elisabeth e desobrigando os súditos desta, do dever de lealdade (o que, na doutrina
dos jesuítas, significava que o assassino faria um ato de serviço a Deus). Assim, não foi
possível reformar a Igreja da Escócia enquanto esteve sob o domínio francês. João
Knox cria que o futuro do protestantismo dependia de uma aliança entre a Inglaterra
Protestante e a Escócia Protestante. Deu provas de ser um líder magnífico. A Igreja Re-
formada foi estabelecida em 1560 e, com o auxílio da Inglaterra, em 1567, os franceses
foram expulsos da Escócia e o romanísmo foi varrido daí de modo mais completo do
que de outro qualquer pais. João Knox, em larga escala, fêz da Escócia o que ainda
hoje é.
A Contra-Reforma. Em 50 anos a Reforma varrera a Europa, alcançando a
maior parte da Alemanha, Suíça, Países Baixos, Escandinávia, Inglaterra, Escócia,
Boêmia, Austria, Hungria e Polônia; e fazia progressos na França. Foi um golpe terrífico
na Igreja Romana, que, em represália, organizou a Contra-Reforma. Mediante o
Concílio de Trento (que funcionou durante 18 anos, 1545-1563), mais os jesuítas e a
Inquisição, alguns abusos de ordem moral do papado foram sanados e, no fim do
século, Roma estava organizada para um ataque furioso ao protestantismo. Sob a
direção inteligente e brutal dos jesuítas, recuperou muito do terreno perdido; o sul da
Alemanha, a Boêmia, a Áustria, a Hungria, a Polônia e a Bélgica, e esmagou a Reforma
na França. Dentro de cem anos, lá por 1689, a Contra-Reforma esgotou suas forças. Os
principais governantes que fizeram as guerras do papa foram: Carlos V, 1519-1556, da
Espanha, contra os protestantes alemães; Filipe II, 1556-1598, da Espanha, contra a
Holanda e a Inglaterra; Fernando II, 1619-1637, da Áustria, contra os boêmios; (estes
três foram imperadores do Santo Império Romano); Catarina de Médicis, mãe de três
reis da França (Francisco II, 1559-1560, Carlos IX, 1560-1574 e Henrique III, 1574-
1589), nas guerras de extermínio dos huguenotes franceses.
Guerras de religião. O movimento da Reforma foi seguido de cem anos de
guerras religiosas: 1) A guerra contra os protestantes alemães (1546-1555); 2) A
guerra contra os protestantes dos Países Baixos, 1566-1609; 3) As guerras huguenotes
na França, 1572-1598; 4) A tentativa de Filipe contra a Inglaterra, 1588; 5) A Guerra

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dos Trinta Anos, 1618-1648. Nestas guerras estiveram envolvidas rivalidades políticas e
nacionais, tanto quanto questões de propriedades, visto que a Igreja, na maioria dos
países, era dona de um terço a um quinto de todas as terras. Todas estas guerras,
porém, foram COMEÇADAS pelos reis católicos, a instâncias do papa e dos jesuítas,
com o intuito de esmagar o protestantismo. Eram eles os agressores. Os protestantes
ficavam na defensiva. Só depois de anos de perseguição é que apareceram partidos
políticos protestantes na Holanda, Alemanha e França.
A Guerra dos Trinta Anos, 1618-1648. Na Boêmia e na Hungria, até 1580, os
protestantes eram maioria, inclusive a maior parte dos nobres proprietários de terras. O
Imperador Fernando II, da Casa de Hapsburgo, fora educado pelos jesuítas; com o
auxílio destes, empreendeu a supressão do protestantismo. Os protestantes uniram-se
para a defensiva. A primeira parte da guerra, 1618-1629, redundou em vitória para os
católicos; conseguiram expulsar o protestantismo de todos os Estados católicos. Depois
resolveram re-catolizar os Estados protestantes da Alemanha. Gustavo Adolfo, Rei da
Suécia, viu que a queda da Alemanha Protestante significaria a queda da Suécia, e
talvez o fim do protestantismo. Entrou na guerra, saindo vitorioso o seu exército, 1630-
1632. Salvou a causa protestante. O resto da guerra, 1632-1648, foi, principalmente,
uma luta entre a França e a Casa de Hapsburgo, terminando por se tornar, a França, a
potência principal da Europa. A Guerra dos Trinta Anos começou como Guerra Religiosa
e findou como Guerra Política; resultou na morte de 10 a 20 milhões. Fernando II,
educado pelos jesuítas, iniciou-a com o propósito de esmagar o protestantismo.
Terminou com a Paz de Vestfália, em 1648, que fixou as linhas de separação entre os
Estados romanistas e os protestantes.
Perseguições papais. O número de mártires das perseguições dos papas
excedeu de muito os primitivos mártires cristãos sob a Roma pagã: centenas de
milhares entre albigenses, valdenses, protestantes da Alemanha, Países Baixos, Boêmia
e outros países. Com efeito, “a grande meretriz embriagou-se com o sangue dos
santos.” É comum ouvir desculpar os papas a este respeito, dizendo que foi “o espírito
da época”, e que os “protestantes também perseguiram.” Quanto ao “espírito da
época”, que época foi essa? E quem a fez assim? Os papas. Aquele era o mundo deles.
Durante 1.000 anos, exercitaram o mundo na sujeição a eles. Se os papas não
houvessem arrebatado a Bíblia ao povo, este teria melhores esclarecimentos e aquela
época já NÃO teria tal “espírito”. Aquilo NÃO era o espírito de Jesus, e os “vigários de
Cristo” deviam sabê-lo muito bem. A perseguição é espírito do DIABO, ainda quando
efetuada em nome de Cristo.
Perseguições protestantes. Calvino consentiu na morte de Serveto. Na
Holanda, calvinistas executaram um arminiano. Na Alemanha, luteranos mataram uns
poucos anabatistas. Na Inglaterra, o protestante Eduardo VI executou 2 católicos, em 6
anos (a romanista Maria, nos 5 anos seguintes, queimou 282 protestantes). Elisabeth
executou, em 45 anos, 187 romanistas, na maior parte por traição, e não por heresia.
Em Massachusetts, 1659, 3 quacres foram enforcados por puritanos, e, em 1692, foram
executados 20 por feitiçaria. Ao todo, poucas centenas de mártires podem ser levadas à
conta dos protestantes, no máximo não indo além de poucos milhares, mas à conta de
Roma, milhões incontáveis. Embora a Reforma fosse uma luta gigantesca em prol da
liberdade religiosa, os reformadores, a custo concediam aos outros o que procuravam
para si. Mas os princípios fundamentais do seu movimento eram contrários à
perseguição por motivo de crença religiosa. Lutero dizia: “RACIOCINEMOS sobre isto.”
O papa respondia: “SUBMETE-TE, ou serás queimado.” Embora os reformadores, uma
ou outra vez, mostrassem algum indício da intolerância de Roma, ensinavam que o
cristianismo mesmo devia ser propagado, pura e exclusivamente, por meios

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intelectuais, morais e espirituais. A idéia de Roma era: Conversão pela FORÇA, pelo
braço secular, pela GUERRA. Nos países protestantes, as perseguições cessaram por
volta de 1700.

PROTESTANTISMO
Suas divisões. O movimento protestante foi o esforço de uma parte da Igreja
Ocidental por libertar-se da autoridade de Roma, e conquistar, para todo homem, o
direito de adorar a Deus de acordo com os ditames de sua consciência.
Inevitavelmente, no extravasamento da luta pela liberdade, deu-se a decomposição, da
avalanche, em várias correntes, com ênfases diferentes, que arrastaram, consigo,
alguns erros de Roma. O movimento, de quase 500 anos já, tem feito enorme
progresso e tem melhorado de maneira notável. Há um espírito crescente de unidade e
uma compreensão mais clara do cristianismo. Com todas as suas divisões, é mil vezes
melhor do que o papismo. A Igreja protestante, apesar de estar ainda longe da
perfeição, a despeito de suas correntes contrárias e suas fraquezas, representa, fora de
qualquer dúvida, a forma mais pura de cristianismo, atualmente no mundo, e,
provavelmente, a mais pura que a Igreja tem conhecido desde os três primeiros
séculos. De um modo geral, não há, no mundo, corporação mais insigne de homens do
que os ministros protestantes.
Igrejas nacionais. Onde quer que o protestantismo triunfou, ergueu-se uma
Igreja nacional: a Luterana, na Alemanha; a Episcopal, na Inglaterra; a Presbiteriana,
na Escócia; etc. O culto é celebrado na língua de cada país, contrariamente ao uso
geral do latim nas igrejas romanistas. Invariavelmente, quando em qualquer país uma
Igreja se emancipa do papa, começa a fazer progresso na sua purificação.
Os Estados Unidos foram colonizados: em 1607, por puritanos anglicanos, na
Virgínia; 1615. Por reformadores holandeses, em Nova York; 1620, por puritanos, em
Massachusetts; 1634, por católicos ingleses, em Baltimore, os quais só puderam obter
sua carta constitucional sob a condição de concederem liberdade a todas as religiões;
1639, por batistas, em Rhode Island, sob a liderança do pioneiro Roger Williams, que
defendia tolerância irrestrita para todas as religiões; 1681, por quacres, na Pensilvânia;
aportaram às suas praias, em procura de liberdade religiosa. Assim foi que os EE.UU.
surgiram dos princípios de tolerância religiosa para todos, e de absoluta separação
entre a Igreja e o Estado, princípios que ora informam todos os governos do mundo, de
modo que, em anos recentes, muitos países, mesmo católicos, têm decretado essa
separação (embora pareça haver hoje certo retrocesso); o que significa brihante vitória,
visto como as igrejas serão tanto mais puras quanto forem sustentadas por
contribuições voluntárias, em vez de o serem por impostos, e a verdade melhor
floresce, sob instituições livres do que sob sistemas de fé forçada.
O futuro do movimento protestante depende de sua atitude para com a
Bíblia. “Com a forma tradicional do cristianismo, veio-nos, no próprio texto sagrado,
uma fonte de conhecimento divino, não sujeita, de igual modo, à corrupção, o qual
ensinará a Igreja como distinguir o primitivo cristianismo de todas as subsequentes
adições, e, assim, como levar avante a obra de se conservar pura até ficar completa.”
A escola dominical
Foi fundada em 1780, por Roberto Raikes, editor em Gloucester, Inglaterra, para
ministrar educação cristã a crianças pobres que não frequentavam escola. Fundada
como departamento missionário da Igreja, tem progredido enormemente, participando,
hoje, da sua vida normal. A princípio, requeria-se que os alunos frequentassem a
Igreja. Hoje, em escala alarmante, tornou-se um substituto dela. Seu grande valor está
em promover o conhecimento da Bíblia, em desenvolver qualidades de liderança leiga,

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servindo para livrar o protestantismo dos abusos da autocracia clerical que tem sido a
grande desgraça da Igreja Romana.

Missões mundiais da atualidade


São elas o mais importante movimento da História. Ensejam algumas das
narrativas mais tocantes de toda a literatura, vibrantes de vida, heroismo e inspiração.
Nem pregadores, nem professores de Escola Dominical prestam bastante atenção à
vida dos missionários. Toda congregação deve ouvir sempre contar a história de
Livingstone, sem rival entre os heróis do universo, e de Carey, Morrison, Judson,
Moffat, Martin, Paton e outros, que têm levado as novas de Cristo a terras longínquas,
e fundado sistemas de pregação, de educação e de filantropia cristãs que estão
transformando o mundo. Quando a História for terminada e todos os anais do gênero
humano puderem ser contemplados em sua ampla e total perspectiva, ver-se-á,
provavelmente, que o movimento missionário mundial do século passado, e sua total
influência sobre as nações, terão constituído O MAIS GLORIOSO CAPÍTULO DOS ANAIS
DA HUMANIDADE.

A Igreja Católica Grega ou Ortodoxa Oriental


O cristianismo foi primeiro estabelecido na parte oriental ou grega do Império
Romano. Durante duzentos anos, o grego foi a língua do cristianismo.
Em 330 d.C., Constantino fez de Constantinopla a Capital do Império Romano; dai
por diante, houve rivalidade entre essa capital e Roma.
Em 395, o Império Romano dividiu-se nos impérios oriental e ocidental;
Constantinopla, sede do oriental, e Roma, do ocidental.
Em 632-638, três centros orientais do cristianismo Síria, Palestina e Egito,
cederam lugar ao maometanismo; somente Constantinopla ficou.
No oitavo Concílio Ecumênico, 869, deu-se o cisma final entre as Igrejas Grega e
Latina. Desde o princípio, o Oriente recusou-se a reconhecer o primado de Roma.
Tem havido tentativas para a reunificação das Igrejas, todas em vão, porque o
Oriente não tem querido reconhecer a autoridade do papa.
A Igreja Grega, atualmente, predominando no sudeste da Europa e na Rússia, é
um dos três grandes ramos da cristandade.
A Igreja Grega, em muitas de suas práticas, assemelha-se muito à Igreja Romana.
Ainda assim, não exige celibato dos seus padres, e sendo dirigida pelo Estado, não tem
havido lutas com as autoridades civis, como no Ocidente, entre imperadores e papas.
Quando o Estado é comunista, as autoridades eclesiásticas são agentes e promotores
do comunismo.
Wyclif, 14º Século, “estrela d’alva da Reforma”, traduziu a Bíblia para o inglês, e
abriu caminho à Reforma na Inglaterra.
Lutero, Calvino, Knox, 16º Século, lideraram a revolução protestante que
libertou a Europa Ocidental da escravidão ao papado.
O Puritanismo, na primeira metade do Século 17, surgiu na última parte do
reinado da Rainha Elisabeth. Foi fruto do interesse popular pela Bíblia. Movimento
reformador no seio da Igreja da Inglaterra, de protesto contra o formalismo inerte da
época, e visava à pureza e justiça da vida, em geral. Sendo perseguidos pelas
autoridades eclesiásticas, separaram-se em igrejas independentes, na maioria batistas,
congregacionais e presbiterianas. Do meio desses puritanos, saíram os colonizadores da
Nova Inglaterra, atraídos às costas de Nova York, em procura de liberdade.
Roger Williams, Século 17, clérigo episcopal, foi expulso de Massachusetts, em
1636, e fundou a colônia de Rhode Island, onde se filiou aos batistas. Os puritanos

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tinham sido muito zelosos em reclamar liberdade de consciência para si. Mas Williams
insistiu em liberdade para TODOS. Sua grande paixão foi a ABSOLUTA SEPARAÇÃO
ENTRE A IGREJA E O ESTADO. Honra aos batistas pela ênfase contínua sobre isto,
porque há, ainda, influências poderosas procurando roubar-nos, se possível, esta
preciosa herança.
João Wesley, Século 18, cem anos depois do surto do puritanismo e fruto deste,
visto que sua mãe era de estirpe puritana. Num tempo em que a Igreja havia caído de
novo no formalismo sem vida, ele pregava a doutrina do testemunho do Espírito e de
uma vida santa. Era leitor, na Igreja da Inglaterra, porém nunca lhe permitiram pregar
suas doutrinas nas igrejas. Por isso, pregava nos campos, nas zonas de mineração e
esquinas de ruas. Organizou sociedades que pugnavam pela pureza de vida, e levou
sua existência, que foi longa, a fiscalizá-las. Como o movimento puritanista do século
precedente, mudou inteiramente a tonalidade moral da Inglaterra. Geralmente se
atribui a esse movimento, ter sido salva, a Inglaterra, de uma revolução igual à
francesa. Foi Wesley um dos maiores homens do mundo.
A Bacia do Mediterrâneo, que se estende ao meio da Hemisfério Oriental, entre
os Oceanos Índico e Atlântico, limitado, ao norte, pela Europa, a leste, pela Ásia, ao sul,
pela África, foi, até os tempos modernos, a área em que fluiu a corrente da civilização.
O Império Romano, nos dias de Cristo, dominava a bacia inteira sob o cetro dos
Césares.
Constantinopla (Bizâncio). Foi feita Capital do Império Romano por Constantino.
Durante a Idade Média, continuou como Capital do Império Oriental, sede da Igreja
Grega e Segunda cidade do mundo. Terra natal de Crisóstomo. Caiu sob o poder dos
turcos, em 1453, findando, assim, o Império Oriental.
Roma, onde o espírito dos Césares passou para os bispos da Igreja, os quais se
designaram a si mesmos senhores da cristandade, pretensão que tiveram dificuldade
em ver reconhecida e que mais da metade da cristandade ainda se recusa a
reconhecer. Entretanto, o império papal que surgiu das ruínas do império pagão tem
sido um poderoso coeficiente da História, fazendo de Roma, até há pouco, de um modo
geral a cidade mais influente do mundo.
Jerusalém, Antioquia, Éfeso, Corinto, Roma, principais centros do cris-
tianismo, no primeiro século.
Roma, Alexandria, Cartago, no 2º e 3º Séculos.
Alexandria, no 3º Século, tornou-se sede intelectual da cristandade. Terra natal
de Orígenes.
Roma, Constantinopla, Antioquia, Jerusalém, Alexandria, sedes dos cinco
patriarcas ou metropolitas, que governaram a Igreja enquanto o papado estava em
evolução.
Tours, Batalha, 732 d.C., onde Carlos Martelo deteve o avanço dos maometanos,
e salvou a Europa.
Viena, onde João Sobieski, 1683, derrotou os turcos e afastou, da Europa, a
Segunda ameaça maometana.
Norte da África, Oeste da Ásia, antes cristãos, tornaram-se maometanos, no
7º Século, pela espada; ainda hoje o são.
Jerusalém, berço do cristianismo.
Antioquia, centro de onde o império foi cristianizado.
Meca, cidade natal de Maomé.
Medina, capital do maometismo até 661 d.C.
Damasco, capital maometana, 661-750 d.C.
Bagdá, capital maometana, 750-1258 d.C.

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Lião, residência de Irineu. Centro do cristianismo gaulês.
Cesaréia, residência de Eusébio, Pai da História Eclesiástica.
Cartago, cidade de Tertuliano e Cipriano.
Hipona, cidade de Agostinho, famoso teólogo.
Praga, cidade de João Huss.
Florença, onde Savonarola foi queimado.
Constança, Concílio que ordenou a morte de Huss na fogueira.
Wittemberg, residência de Lutero, libertador da Europa.
Worms, famosa Dieta, onde Lutero foi julgado.
Genebra, residência de Calvino; um centro da Reforma.
Trento, Concílio Papal, para deter a Reforma.
A IGREJA NO BRASIL
O primeiro culto evangélico celebrado no Brasil, realizou-se dia 10 de março de
1557, na Ilha de Villagaignon, no Rio de Janeiro, e foi dirigido pelo pastor Pierre
Richier, um dos três primeiros pastores a chegarem ao nosso continente, quando da
vinda ao Brasil de um grupo de crentes franceses, acossados pelas perseguições
religiosas na Europa. Mais tarde, em 1624, os crentes da frota holandesa, na Bahia,
iniciaram os cultos. Depois, em 14-2-1630, teve início uma série de cultos no Recife
durante a ocupação holandesa. Estes dois últimos casos estavam ligados a Igreja
Reformada Holandesa. Os primeiros cultos em caráter definitivo, no território brasileiro,
foram realizados pela Igreja Anglicana do Rio de Janeiro, desde 1810, para os membros
da colônia britânica, constituída de diplomatas, comerciantes e suas famílias.
No dia 19 de agosto de 1835 chegava ao Rio de Janeiro o Rev. Fontain E. Pits,
que viera sondar a possibilidade de estabelecer Igreja Metodista em terras brasileiras.
Contudo, esse fato foi reservado ao Rev. R. Justin Spaulding, que deu início á
organização de uma congregação, com quatro membros da colônia americana residente
no Rio.
Com um culto realizado a 27 de julho de 1845 a Igreja Luterana dava início às
suas atividades no Brasil. Em 19 de agosto de 1855, em Petrópolis, o Sr. Robert Kalley,
fundou a Escola Dominial, dando assim origem à Igreja Congregacional. No dia 12 de
janeiro de 1862, no Rio de Janeiro, o Rev. Ashbel Green Simonton, fundou a Igreja
Presbiteriana. No ano de 1881 chegaram ao Brasil os primeiros missionários batistas,
William Bagby e Z.C. Taylor. No ano seguinte, isto é, a 15 de outubro de 1882,
fundaram eles a Igreja Batista, em Salvador, na Bahia.
Com o número de dezoito irmãos provenientes da Igreja Batista de Belém, sob a
liderança de Gunnar Vingren e Daniel Berg, no dia 18 de junho de 1911, na cidade de
Belém do Pará, é fundada a Assembléia de Deus no Brasil.

PRIMEIROS ESFORÇOS DO EVANGELHO NA AMÉRICA DO SUL


O avanço do Protestantismo na América Latina nada tem a ver com conquistas
políticas, pois desde o princípio os sistemas políticos dessa região do mundo, sempre se
opuseram à expansão do evangelho. As tentativas feitas pelos huguenotes franceses,
na década de 1550, visando estabelecer-se no Brasil, longe das perseguições, foram
repelidas pelas autoridades portuguesas com o aval da Igreja Romana. Os holandeses,
que haviam controlado o nordeste brasileiro por mais de trinta anos, e nesse tempo
estabeleceram um expressivo trabalho evangélico, também foram expulsos em 1661.
Não obstante a oposição sofrida, pelos fins do Século XVIII, a causa protestante
ganhava asas. Foi nesse tempo que as sociedades missionárias congregacionais e
metodistas começaram a operar nessa área, e nas Guianas, no começo do Século XIX,
quando os ingleses e holandeses controlavam esta última região.

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LUTAS PELA LIBERDADE RELIGIOSA
À medida que os países dominados pela Espanha e Portugal ganhavam sua
independência, muitas leis discriminatórias foram revisadas, e na constituição desses
países a palavra proíbe começou ser trocada por permite: “permite-se o exercício
público de outras religiões”.
Mudadas as leis opressivas em leis favoráveis, as igrejas protestantes começaram
a aumentar. Nas Guianas, que nunca conheceram o domínio espanhol ou português, se
achava o maior número de protestantes. Os moravianos, que haviam chegado ali em
1738, formavam um total de quase 9.000 membros. Os metodistas anunciavam contar
com mais de 4.000 membros. Em 1900, as igrejas desses dois pequenos países
constituiam quase cinquenta por cento dos membros das igrejas evangélicas da
América do Sul. A sombra da inquisição, o clero romano com o aval de muitos
governantes infligia perseguições extremas aos evangélicos na América Latina, o que
de certa forma aumentava o zelo dos crentes e a expansão das Igrejas.
Depois de 1890, o Brasil reconheceu a “absoluta igualdade” entre as diferentes
igrejas aqui existentes. Isso permitia que centenas de igrejas fossem estabelecidas de
imediato. Todavia, a igualdade diante da lei frequentemente era desrespeitada pela
Igreja Romana, que se contentava em levantar sucessivas ondas de perseguição às
igrejas evangélicas do Brasil e de outros países latino-americanos.
É digno de nota que mesmo depois de 1900, países da América Latina como o
Chile, Colombia, Venezuela, Argentina, Peru, Uruguai, Paraguai, Equador e Bolívia, só
com grande relutância abriram as suas portas aos evangélicos, ao passo que as igrejas
evangélicas do Brasil se multiplicavam de maneira surpreendente.
CHEGAM AS PRIMEIRAS BÍBLIAS
Coube às sociedades bíblicas americana e britânica a honra de fazer entrar na
América Latina as primeiras Bíblias, no começo do século XIX. A distribuição de Bíblias
foi feita lentamene, até que surgiram bravos colportores, homens capazes e entusiastas
que devotavam tempo integral no trabalho de venda e distribuição das Escrituras. Não
poucos deles foram alvo de ataques, perseguições e prisões por parte de sacerdotes
católicos. Alguns deles são lembrados hoje como apóstolos da causa da liberdade
religiosa em seu país. Entre os quais se destacaram Penzotti, no Peru, e Tonelli, no
Brasil. Não poucos desses homens sofreram o martírio como preço da nobre causa que
abraçaram.

JAMES THOMSON
Um dos mais famosos colportores desse período de pioneirismo, foi James
Thomson, cuja coragem e amor cristão o levou a percorrer toda a extensão da costa
acidental da América do Sul e atravessar a América Central, o México e a área do
Caribe, levando uma Bíblia debaixo do braço. Thomson destacou-se não só como um
colportor e educador cristão, mas também como um ardoroso evangelista. Suas cartas
enviadas à Inglaterra, sua pátria, revelam seu interesse e hipotecam confiança no
futuro das igrejas evangélicas da América Latina.
Contam-se nos relatos que muitas igrejas foram estabelecidas mediante o
testemunho exclusivo de algum leitor da Bíblia, que compartilhava com outros da
realidade de sua descoberta da verdade divina lendo a Palavra de Deus. Muitos têm
dito que o padrão era claro e simples: primeiro aparecia uma Bíblia, depois um
convertido, e a seguir, uma Igreja.
F. C. Glass, um dos colpoltores pioneiros do Brasil, asseverou: “Em dezenas de
lugares onde vendi os primeiros exemplares das Escrituras que o povo via pela primeira
vez, existem fortes igrejas atualmente... Na maioria dos casos, quase invariavelmente,

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primeiramente aparecia a Bíblia e depois o pregador, excetuando aqueles casos em que
o colportor era também o evangelista; noutros casos, a Bíblia e o pregador surgiam ao
mesmo tempo. Não me lembro de uma única instância em que a Bíblia tenha surgido
em segundo lugar. Falando por experiência pessoal, portanto, devo dizer que se
alguém quiser abrir uma nova área, a primeira coisa a ser feita é enviar alguém munido
de uma Bíblia”.

IMPLANTAÇÃO DE IGREJAS NO PRINCÍPIO


Dentre os primeiros fundadores de igrejas na América Latina, destaca-se o médico
presbiteriano escocês, Robert Reid Kalley. Kalley tem sido chamado de “apóstolo da ilha
da Madeira’, porque estabeleceu muitas congregações evangélicas naquela ilha, e dis-
tribuiu três mil cópias da Bíblia, preparando o caminho para a criação de um ministério
completo ali.
Expulso da ilha da Madeira por perseguição religiosa, Kalley veio para o Brasil,
onde começou um eficiente trabalho missionário a partir de 1855. Não obstante
perseguido também no Brasil, seu ministério produziu frutos maduros deste os
primeiros momentos. Antes de retirar-se do Brasil, em 1876, Kalley havia implantado
igrejas no Estado de Pernambuco, em Niterói, e no Rio de Janeiro. Foi Kalley quem a 19
de agosto de 1855, na cidade de Petrópolis, Estado do Rio de Janeiro, organizou a
primeira Escola Dominical no Brasil. O hinário intitulado Salmos e Hinos, que continua
em uso em muitas igrejas de língua portuguesa; é uma espécie de homenagem ao Dr.
Kalley, pois mais de cinquenta hinos ali contidos foram escritos por ele. Sobre Kalley,
alguém escreveu: “O apóstolo da ilha da Madeira exerceu um apostolado de proporções
mais vastas e em uma área muito maior do que os limites de uma diocese em uma ilha.
As delimitações de sua província de testemunho cristão e de serviço evangélico não
estavam determinadas pela geografia, mas obrigatoriamente coincidiram com aquelas
áreas esparsas e longínquas onde o português era o idioma falado. Quão grande é a
dívida a um homem pelo povo que partilha de uma língua comum”.

A Liberdade é Estabelecida
No começo do século XX a liberdade de culto era pois estabelecida. Tornou-se
possível o desenvolvimento desembaraçado das igrejas. Os primeiros dezesseis anos do
século passado marcaram um novo tipo de crescimento para as jovens igrejas
evangélicas da América Latina. Foram anos de transferências de missionários es-
trangeiros para o interior do continente, enquanto que os trabalhos fundados eram
passados às lideranças de valorosos obreiros nacionais.

Primórdios Pentecostais
As igrejas pentecostais de maior expressão da América Latina, tiveram um começo
comum: os avivamentos que varreram regiões da América do Norte e da Europa.
A Assembléia de Deus, que forma hoje a maior denominação evangélica da
América Latina, atribui as suas origens ao monumental reavivamento da rua Azuza, em
1906, na cidade de Los Angeles, da Califórnia. Gaxiola Lopes, escreve a história
pentecostal do México, dizendo que essa Igreja tem suas origens também no
reavivamento da rua Azuza.
A Congregação Cristã no Brasil também deve seus primórdios no avivamento da
rua Azuza. Segundo a história dessa Igreja, foi em Chicago que Luis Francescon
recebeu a experiência pentecostal do batismo com o Espírito Santo, e então ele e um
companheiro partiram para o Brasil em 1909. O resultado dessa viagem foi o

MÓDULO IX...................................................................................................38
estabelecimento da Congregação Cristã no Brasil, destinada a tornar-se a Segunda
maior Igreja evangélica da Brasil.
Na Argentina, a Assembléia de Deus começou mais ou menos no nesmo tempo, e
embora muito menor que a Assembléia de Deus no Brasil, é hoje uma das maiores
denominações pentecostais naquele País.
As notícias do avivamento ocorrido na rua Azuza, em 1906, sem demora atingiram
diferentes regiões do mundo, estendendo-se até a índia. O pastor Willis C.Hoover,
ministro da Igreja Metodista que trabalhava no Chile, recebeu uma carta de um
conhecido seu que trabalhava na Índia, através da qual explicava os efeitos da
experiência pentecostal na vida de muitos conhecidos seus num posto missionário na
Índia. Por essa razão, Hoover assistiu um culto numa Igreja em Chicago, onde teve a
experiência do batismo com o Espírito Santo. Através dele as chamas do fogo do
Espírito Santo foram lançadas nos campos do Chile.
Outros exemplos revelam começos semelhantes entre igrejas Pentecostais da
América Latina, a que resultou numa nova dimensão da expansão da Igreja. Estas
igrejas têm se antecipado ao tempo e ao progresso, de sorte que hoje, onde chega o
progresso através de estradas, escolas e comunicações, aí há sempre uma Igreja
pentecostal saudando-os bem-vindos.

PRIMÓRDIOS DA IGREJA EVANGÉLICA NO BRASIL


Já muito cedo na história do Brasil, temos notícia de pessoas evangélicas aqui.
Pelo ano de 1530, por exemplo, vivia em São Vicente, Estado de São Paulo, um
escrivão chamado Heliodoro Hessus, filho de Eobano Hessus, amigo de Martinho
Lutero. Mais conhecido ainda tornou-se o nome de Hans Staden, um luterano amigo de
Hessen que, pelo ano de 1550, viveu por algum tempo no Brasil. Tais notícias foram
confirmadas pelo padre José de Anchieta que relata ter encontrado em São Vicente
defensores de idéias luteranas.

Chegada dos Huguenotes no Rio de Janeiro


O vice-almirante francês Nicolau Durand de Villegaignon, ouvindo falar das
maravilhas das terras do Brasil, recém-descobertas, com o apoio do almirante Gaspar
de Caligny, conseguiu de Henrique II, rei da França, dois navios equipados com víveres,
e munido de artilharia, partiu em rumo às terras que tanto ambicionava.
Nessa expedição, Villegaignon não teve o devido cuidado na seleção dos homens
que o acompanharam, o que resultou numa grande conspiração dos seus homens
contra o vice-almirante. Debelada a conspiração, 16 dos conspiradores foram
executados.
Informado do parcial fracasso da expedição chefiada pelo seu protegido, o próprio
almirante Coligny, arregimentou e chefiou a Segunda expedição formada por 300
homens, e mais três navios. Entre os tripulantes dos três navios, haviam 14 cristãos
huguenotes de renome, chefiados por Filipe de Gorguilarai. Haviam também dois
pastores cujos nomes são: Pierre Richier e Guilhaume Chartier. Outros nomes de
cristãos que integravam a comissão dos catorze, são os seguintes: Pierre Bourdon,
Mathieu Varneuil, Jean du Bordel, André La-Fon, Nicolas Denis, Jean de Gardien, Martin
David, Nicolas Raviquet, Nicolas Carmau, Jacques Rosseau, e o historiador da
expedição, Jean de Leri.
Após quatro meses de viagem, da França ao Brasil, a expedição chegou ao porto
do Rio de Janeiro no dia 7 de março de 1557. Villegaignon recebeu festivamente os
cristãos, pois estes mereciam sua confiança e neles estava a esperança do êxito da
conquista desta parte da América.

MÓDULO IX...................................................................................................39
O primeiro culto realizado no Brasil
O desembarque dos huguenotes deu-se no dia 10 de março de 1557, e no mesmo
dia realizou-se o primeiro culto em terras brasileiras. Dirigiu o culto, o pastor Pierre
Richier, que pregou baseado no versículo 4 do Salmo 27. Na ocasião foi cantado o Sal-
mo 5. Onze dias depois, ou seja, no dia 21 de março de 1557, domingo, organizou-se a
primeira Igreja evangélica do Brasil, oportunidade que foi aproveitada para celebração
da Ceia do Senhor.
O vice-almirante Villegaigon foi o primeiro a participar da Ceia do Senhor,
entretanto, mais tarde traiu e perseguiu os cristãos. Por sua ordem foram executados
Jean de Bourdel, Mathieu Verneiuil e Pierre Bourdon. Por esta ação, os historiadores
passaram a chamá-lo de “Caim da América”. Também no dia 20 de janeiro de 1567,
quando eram lançados os fundamentos da cidade do Rio de Janeiro, por ordem de Mem
de Sá, com a assistência do Padre José de Anchieta, foi executado Jacques le Balleur,
cristão chegado ao Brasil na expedição chefiada por Villegaigon.

CONCLUSÃO
Como vimos, a História do Cristianismo é uma história de perseguições e
dificuldades, mesmo que o objetivo é levar a paz e a salvação para os corações
oprimidos e escravizados pelos pecados.
Apesar das perseguições enfrentadas, a existência da Igreja até hoje, só pode ser
o cumprimento das palavras do SENHOR da Igreja em Mateus 16:18: “Pois também eu
te digo que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a MINHA IGREJA, e as portas do
inferno não prevalecerão contra ela.”

MÓDULO IX...................................................................................................40
HISTÓRIA DA TEOLOGIA

INTRODUÇÃO
Chegar ao ponto de apresentar esta obra, foi um longo caminhar, muitas horas de
leituras, de contato com pessoas, de problemas enfrentados no exercício da maratona
de pesquisas, de conselhos amigos que formaram as condições desta jornada; se não
fossem os incentivos, as palavras de encorajamento, creio que não teria chegado neste
ponto. Porém, diante de tudo isto busquei fazer o melhor de mim, objetivando mostrar
de forma precisa este assunto tão complexo, que é a teologia, pois no decorrer dos
séculos passaram a existir várias teorias a cerca do conhecimento teológico, dos quais
abordamos alguns que nos mostrarão como chegaram-se as definições do termo, a
caracterização geral em forma de esboço, como também o aspecto pentecostal da
teologia e de que maneira ela se divide, mais ainda, uma perspectiva teológica para a
melhor compreensão deste assunto que hora tratamos nesta monografia.
Dr. Daniel Oliveira da Rocha

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 01

1. TERMO TEOLOGIA E SUAS DEFINIÇÕES 02


1.1. A DEFINIÇÃO HISTÓRICA DO TERMO
1.2. DEFINIÇÃO FILOSÓFICA
1.3.DEFINIÇÃO GERAL

2. CARACTERIZAÇÃO GERAL DA TEOLOGIA: ESBOÇO HISTÓRICO 03


2.1.O PERÍODO HELENISTA
2.2.O NOVO TESTAMENTO
2.3.A TEOLOGIA PATRÍSTICA
2.4.TEOLOGIA-FILOSOFIA DO ESCOLASTICISMO
2.5.A REFORMA PROTESTANTE
2.6.A TEOLOGIA MODERNA

3. PANORAMA HISTÓRICO DA TEOLOGIA PENTECOSTAL 04


3.1.A CONTINUIDADE DOS DONS ESPIRITUAIS
3.2.A TEOLOGIA PENTECOSTAL E AS MISSÕES
3.3.DIVISÕES POR CAUSA DE DIFERENÇAS TEOLÓGICAS

4. AS DIVISÕES DA TEOLOGIA 09
4.1. A TEOLOGIA EXEGÉTICA
4.2. A TEOLOGIA HISTÓRICA
4.3.A TEOLOGIA SISTEMÁTICA
4.4. A TEOLOGIA PRÁTICA

5. PERSPECTIVA TEOLÓGICA 10
5.1. A MENSAGEM E SITUAÇÃO
5.2.TEOLOGIA APOLOGÉTICA E QUÉRIGMA
CONCLUSÃO 14
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 14

MÓDULO IX...................................................................................................41
HISTÓRIA DA TEOLOGIA

1- O TERMO TEOLOGIA E SUAS DEFINIÇÕES

1.1. DEFINIÇÕES HISTÓRICAS DO TERMO

O termo teologia vem do grego theós, Deus, e lógos, estudo, discurso,


raciocínio. Assim, essa palavra indica o estudo das coisas relativas a Deus, à sua
natureza, obras e relações com os homens, etc. Uma definição léxica diz: ...Um corpo
de doutrinas acerca de Deus, incluindo seus atributos e relações com o homem;
especialmente, aquele corpo de doutrinas estabelecido por alguma igreja ou grupo
religioso em particular.

1.1.1. No Grego Clássico. Uma explicação acerca dos deuses e seus atos
lendários e filosóficos.

1.1.2. No Estoicismo. Relatos místicos sobre os deuses; idéias naturais


(racionais) a respeito dos deuses e de questões espirituais: a religião civil no que diz
respeito aos deuses, aos ritos e às cerimônias religiosas.

1.1.3. No Cristianismo Patrístico. Temos ai, essencialmente, uma teologia


bíblica, incluindo aquilo que a Bíblia diz sobre Deus e seus atos. Mas vários dos pais da
Igreja adicionaram algum material oriundo dos melhores aspectos da filosofia grega,
conforme se vê nos escritos de Platão, de tal modo que até termos platônicos foram
usados para exprimir noções cristã e bíblicas.

1.1.4. Teologia Bíblica. A teologia depende tanto da Bíblia, que essa


expressão, em muitos círculos, acabou significando as próprias escrituras.

1.1.5. Nos Escritos de Abelardo. Ele empregava a palavra para indicar o


estudo filosófico das doutrinas cristãs.

1.1.6. Após Abelardo. Nesse tempo, a expressão passou a indicar o estudo


acadêmico das escrituras e a respeito de Deus. E a teologia tornou-se a rainha das
ciências, investida de suprema importância nas universidades da Europa e do Oriente
Próximo e Médio. Homens da envergadura de Tomás de Aquino escreveram grossos
volumes de teologia, que jamais perderam sua atração sobre as mentes.

1.1.7. Como Unificação do Conhecimento. Os chamados pais da Igreja, e


então os teólogos da Idade Média, enfatizaram a unidade da verdade e do
conhecimento, dando a entender que todos os assuntos de estudo, incluindo as
ciências, são ramos da teologia, visto que todas essas disciplinas de algum modo falam
sobre os atos e as manifestações de Deus. Em tudo descobriríamos a mente de Deus,
tanto na matemática quanto na biologia, como em qualquer outra matéria de estudo.

1.1.8. Teologia como Termo Genérico. No uso moderno, o termo veio a


indicar certo número de disciplinas inter-relacionadas, como a teologia dogmática
(sistemática), a teologia bíblica, a teologia moral, etc.

MÓDULO IX...................................................................................................42
1.1.9. Para a Mente Religiosa. A teologia, segundo esse ponto de vista,
abrange todo e qualquer outro conhecimento dirigindo-o para a sua verdadeira
finalidade.

1.2. DEFINIÇÃO FILOSÓFICA

É o estudo da realidade universal a partir de Deus, isto é, Deus é a fonte que


conduz ao conhecimento da realidade existencial do universo.

1.3. DEFINIÇÃO GERAL

São todas as doutrinas cristãs, não apenas a doutrina específica de Deus, mas
também todas as doutrinas que se referem às relações que Deus mantém com o
universo.

2. CARACTERIZAÇÃO GERAL DA TEOLOGIA:

ESBOÇO HISTÓRICO

2.1. O PERÍODO HELENISTA.


O período Helenista foi importante para a teologia que veio a repousar no Novo
Testamento. Os livros pseudoepígrafos, produzidos durante esse período, foram um
importante elemento na formação dessa teologia.

2.2. O NOVO TESTAMENTO.


O Novo Testamento não se desenvolveu em um vácuo. Mas no mesmo, há um
tremendo avanço nas idéias teológicas, dentro dos escritos apostólicos. Os elementos
mais decisivos no Novo Testamento são os evangelhos sinópticos, e os escritos de
Paulo e de João.

2.3. A TEOLOGIA PATRÍSTICA


O período coberto pela teologia patrística começa imediatamente com os
discípulos até os séculos VII e VIII d.C., embora alguns abreviem mais ainda esse
período. O período patrístico foi um tempo de definições. Embora esses pais estivessem
trabalhando com base na Bíblia, como sua principal fonte informativa, contando com as
filosofias estóica e platônica como suas fontes secundarias, eles não se mostraram
acordes em tudo. Nem mesmo certas doutrinas cardeais, como as doutrinas de Cristo e
da deidade, foram interpretadas de maneira unânime e uniforme. De fato, foi somente
já no século IV d.C. que os credos emitidos pelos concílios puderam produzir uma
ortodoxia mediante a qual foi possível julgar a boa variedade de pontos de vista então
existentes. Havia várias tendências teológicas, como a platonização efetuada por alguns
pais gregos, como Justíno Mártir, Irineu, e, especialmente, os alexandrinos, como
Clemente e Orígenes, e daí ao antiintelectualismo extremo (com a absoluta rejeição
conseqüente da filosofia) de Tertuliano. Foi principalmente o gnósticismo que provocou
a obra dos apologistas.
Devemos ao Credo Miceno e à Definição Calcedônica algumas das melhores
produções patrística, pertencentes principalmente a Atanásio e aos três capadócios. Foi
então que Pelágio levantou a questão da relação entre o livre-arbítrio humano e o
determinismo divino. Seu grande opositor foi Agostinho. O donatismo apresentou um

MÓDULO IX...................................................................................................43
outro desafio à unidade da Igreja, tanto quanto à doutrina quanto à organização.
Devemos observar que a ortodoxia foi sendo definida pelos pais da Igreja, em um
processo que preocupou muitos séculos.

2.4. A TEOLOGIA -FILOSÓFICA DO ESCOLASTICISMO.


A era patrística foi seguida por certo período de inércia intelectual, vinculada à
invasões dos bárbaros e às ditações políticas, tanto no Oriente quanto no Ocidente.
Houve alguns poucos e isolados eruditos, como Bede e Alcuíno; mas foi somente após o
período medieval que houve nova explosão de atividades teológicas. Esse
reacendimento foi estimulado, pelo menos até certo ponto, pela redescoberta do
pensamento dos filósofos gregos, principalmente Aristóteles e Platão. A educação
tornou-se apanágio da Igreja organizada, e os escolásticos, teólogos-filósofos, foram os
principais agentes na transmissão de conhecimentos. Com Abelardo encontramos o
início de um movimento na direção de uma maior racionalização da teologia; e Anselmo
legou-nos uma orientação mais bíblica da teologia. Tomas de Aquino, um dos maiores
filósofos-teólogos de todos os tempos, procurou reconciliar a filosofia à fé religiosa. Ele
usava Aristóteles, primariamente (mas também Platão) para explicar as doutrinas
cristãs. Várias sínteses foram assim produzidas, dependendo dos filósofos envolvidos.
Esse período caracterizou-se pela cristalização de várias típicas doutrinas católicas
romanas, as quais, embora ensinadas desde bem antes, agora eram confirmadas,
formando um rígido sistema. As doutrinas mais importantes que forma assim
confirmadas foram aquelas acerca da pessoa e importância de Maria; da regeneração
batismal; do sacramentalismo, da penitência, do purgatório e da transubstanciação.

2.5. A REFORMA PROTESTANTE.


A Reforma Protestante foi uma espécie de movimento de volta à Bíblia, dentro da
Igreja Ocidental. A Igreja Ortodoxa Oriental já se havia separado do Ocidente no ano
de 1054, defendendo certas doutrinas distintas, sobre algumas questões. Lá pelos
meados do século XV d.C., o escolasticismo já havia perdido o seu primeiro impulso, e
seus pensadores principais tinham ficado no passado. As doutrinas que paulatinamente
tinham sido formadas pelos escolásticos se haviam distanciado cada vez mais de
Agostinho, o qual pode ser reputado como o pai da teologia-filosofia Ocidental.
Martinho Lutero, um monge agostiniano, ia-se irritando com as interpretações e
excessos que para ele, contradiziam a Bíblia. Isso posto, o que ele procurou fazer em
sua essência, foi fazer parte da Igreja organizada voltar a Agostinho.

2.6. A TEOLOGIA MODERNA.


O período pós-Reforma produziu todas as divisões desencadeadas pelas agitações
do século XVI. E foi já no século XIX que surgiram o Liberalismo e a teologia crítica. O
liberalismo extremado provocou a reação da Neo-ortodoxia. Nos círculos evangélicos, o
neo-evangelicalísmo provê uma espécie de posição intermediária entre o liberalismo e o
fundamentalismo. Dentro da Igreja Católica Romana, por sua vez, tem prevalecido o
neoescolastícismo, embora também exista uma ala liberal católica romana. Mas
recentemente, e de uma maneira que pareceria incrível, a chamada Teologia da
Libertação, tem conseguido muitos adeptos no catolicismo romano e até entre
denominações protestantes. Este último movimento busca uma espécie síntese com a
filosofia marxista.

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3. PANORAMA HISTÓRICO DA
TEOLOGIA PENTECOSTAL

3.1. A CONTINUIDADE DOS DONS ESPIRITUAIS.


No decurso da história do Cristianismo, sempre houve pessoas que buscaram
“algo mais em sua peregrinação espiritual, e que, ocasionalmente, eram levadas a
indagar acerca do significado do batismo no Espírito Santo e dos dons espirituais. A
erudição recente tem lançado mais luz sobre os movimentos carismáticos,
demonstrando que o interesse pela obra do Espírito Santo tem perdurado através da
história da Igreja.
Pelo menos dois reavivamentos no século XIX podem ser considerados
precursores do moderno pentecostalismo. O primeiro ocorreu na Inglaterra, em torno
de 1830, durante o ministério de Edward Irving; o segundo, no extremo sul da Índia,
por volta de 1860, mediante a influência da teologia dos Irmãos de Plymouth e sob a
liderança do leigo indiano J.C.Aroolappen. Documentos contemporâneos a respeito de
ambos movimentos incluíam referências ao falar noutras línguas e à profecia.
As conclusões dessa pesquisa corrigem, em parte, a crença existentes em alguns
círculos teológicos de que os dons espirituais cessaram na Era Apostólica. Opinião esta,
aliás, proposta enfaticamente por Benjamim B.Warfield em Counterfeit Miracles (1918).
Warfield argumentava que a autoridade escrita e objetiva das Escrituras, que são
inspiradas pelo Espírito Santo, seriam inevitavelmente subvertida por aqueles que
ensinassem um conceito subjetivo do mesmo Espírito. Nos últimos anos, essa
perspectiva vem perdendo terreno nos círculos evangélicos.
Com a chegada do reavivalismo, no fim do século XVII e início do século XVIII, na
Europa e na América do Norte, os pregadores calvinistas, luteranos e arminianos
passaram a enfatizar o arrependimento e a piedade na vida cristã. Qualquer estudo do
Pentecostalismo tem de se ater aos eventos desse período, especialmente à doutrina da
perfeição cristã ensinada por João Wesley, o pai do Metodismo, e pelo seu assistente,
João Fletcher. A publicação por Wesley de A Short Account off Christian Perfection
(1760) conclama seus seguidores a buscarem uma nova dimensão espiritual. Essa
segunda obra da graça, posterior à conversão, libertaria os crentes de sua natureza
moral imperfeita, que os tem induzido ao comportamento pecaminoso.
Essa doutrina chegou à América do Norte, e inspirou o crescimento do Movimento
da Santidade. A ênfase voltada à vida santificada, mas sem mencionar ou falar noutras
línguas, registrada nas Escrituras (“derramamento do Espírito”, “batismo no Espírito
Santo”, “línguas de fogo”), tornou-se “marca registrada” da literatura e hinódia do
Movimento da Santidade. Uma das principais líderes da ala metodista do movimento,
Phoebe Palmer, editou o Guide to Holiness e escreveu, entre outros livros, The Promise
of the Father (1859). Outro escritor popular, William Arthur, escreveu Tongue of Fire
(1856), um grande sucesso literário.
Aos que procuravam receber a “segunda benção” era ensinado que cada cristão
precisa “esperar” (Lc 24.49) pela promessa do batismo no Espírito Santo. E, assim,
seria quebrado o poder do pecado que domina a pessoa desde o seu nascimento,
levando-a a viver cheia do Espírito. Além disso, Joel profetizou que, como resultado do
derramamento do Espírito de Deus, “vossos filhos e vossas filhas profetizarão” nos
últimos dias (JI.2.28).
A crença numa segunda obra da graça não ficou confinada ao círculo metodista.
Charles G. Finney, por exemplo, acreditava que o batismo no Espírito Santo provesse o
revestimento do poder divino para se obter a perfeição cristã. Sua teologia, porém, não
se encaixa nem na categoria wesleyana, nem na reformada. Embora a teologia da

MÓDULO IX...................................................................................................45
Reforma haja identificado o batismo no Espírito com a conversão, alguns reavivalistas,
dentro desta tradição, aceitavam o conceito de uma segunda obra da graça para
revestir os cristãos do poder do alto. Entre eles se encontravam Dwight L. Moody e R.
A. Torrey. Apesar deste revestimento de poder, acreditavam, a santificação mantinha-
se em sua obra progressiva. Outro personagem-chave, um ex-presbiteriano, A. B.
Simpson, fundador da Aliança Cristã e Missionária, cuja forma de pensar teve grande
impacto na formação doutrinária das Assembléias de Deus, enfatizava nitidamente o
batismo no Espírito Santo.
Semelhantemente, as conferências em Keswick, na Grã-Bretanha (que tiveram
início em 1875), também influenciaram grandemente o Movimento da Santidade na
América do Norte. Os conferencistas em Keswick acreditavam que o batismo no Espírito
Santo produzia uma vida de continua vitória (a vida “mais sublime” ou “mais
profunda”), caracterizada pela “plenitude do Espírito”. Este veio a ser a interpretação
preferida ao conceito wesleyano, que sustentava que o batismo no Espírito produzia a
perfeição cristã.
No século XIX, a ciência médica avançava lentamente e pouca ajuda oferecia aos
que se achavam gravemente enfermos. A fé no poder miraculoso de Deus para a cura
física era acolhida em alguns círculos. Na Alemanha do século XIX, os ministérios que
ressaltavam a oração pelos enfermos (especialmente os de Dorothea Trudel, Johann
Cristoph Blumhardt e Otto Stockmayer) chamavam a atenção dos norte-americanos. A
teologia da Santidade, com sua crença na purificação instantânea do pecado ou no
revestimento de poder do Espírito Santo, produziu um ambiente receptivo aos ensinos
da cura imediata através da fé.
Para muitos cristãos, o batismo no Espírito restaura plenamente o relacionamento
espiritual que Adão e Eva tinham com Deus no jardim do Éden. De modo significante, a
vida mais sublime em Cristo podia, também, inverter os efeitos físicos da queda,
capacitando os cristãos a adquirir autoridade sobre as enfermidades do corpo. Os
defensores da cura divina, tais como Charles C. Cullis, A. B. Simpson, A. J. Gordon,
Carrie Judd Montgomery, Maria B. Woodworth-Etter e John Alexander Dowie, baseavam
boa parte dessa crença em Isaias 53.4,5, bem como nas promessas neotestamentárias
de cura divina. Posto que Cristo não somente perdoava os pecados, mas também
curava as enfermidades, os que viviam pela fé na promessa de Deus (Êx. 15.26) já não
precisavam de assistência médica. Caso lançassem mão desta, estariam demonstrando
falta de fé.
As características cada vez mais “pentecostais” do movimento da Santidade
deixavam seus adeptos dispostos a considerar os dons do Espírito na vida da Igreja.
Embora a maioria deles cresse que o falar noutras línguas tivesse cessado na Igreja
primitiva, os demais dons, inclusive a cura miraculosa, estavam a disposição dos
cristãos. A partir daí somente a incredulidade poderia impedir fosse Igreja do Novo
Testamento restabelecida em Santidade e poder.
Quando, porém, o pregador wesleyano radical da Santidade, Benjamim Hardin
Irwin, começou, em 1895, a ensinar sobre as três obras da graça, os problemas
começaram a surgir. Segundo Irwin, a segunda benção iniciava a Santificação, e a
terceira trazia o “batismo do amor ardente” (o batismo no Espírito Santo). A maior
parte do movimento da Santidade condenava essa “terceira benção” classificando-a
como heresia (a qual, entre outras coisas, criava o problema das evidências distintivas
entre a segunda e a terceira benção). Não obstante, à noção que Irwin possuía de uma
terceira obra da graça - o revestimento do poder no serviço cristão - firmou-se como
alicerce do Movimento Pentecostal.

MÓDULO IX...................................................................................................46
3.2. A TEOLOGIA PENTECOSTAL E AS MISSÕES
Embora os evangélicos do século XIX, adotassem, em sua grande maioria,
conceitos amilenistas ou pós-milenistas, era este que capitava o espírito daquele
tempos. Escritores de todas as tendências, desde Charles Darwin até John Henry
Newman e Charles Hodge, utilizaram-se das descobertas e do progresso da ciência na
formação da doutrina e da escatologia, respectivamente. Outras, porém, chegaram a
conclusão de que a condição da raça humana haveria de piorar ainda mais até a volta
iminente de Cristo.
O modo sombrio como os pré-milenistas avaliaram o futuro imediato gerou
enormes preocupações entre os que haviam assumido o compromisso com a
evangelização mundial. A maior parte do movimento missionário dedicara muitos
tempos e energia a construção de escolas, orfanatos e ambulatórios médicos, com a
finalidade de aproximar as populações indígenas da cultura Ocidental, procurando
induzi-las à conversão. Devido a essa ênfase secundária dada ao evangelismo, o
número real de convertidos relevou ser tão pequeno, que chegava a ser preocupante.
As interpretações pré-milenares de Daniel, Zacarias e Apocalipse: o aparecimento do
movimento sionista; a corrida armamentista de 1890; e o fim do século que se
aproximava. Levaram muitos a perguntar angustiadamente como os milhões não
alcançados ouviriam a mensagem do evangelho afim de se salvarem da destruição
eterna.
A soma dos títulos de Cristo como Salvador, Batizador (Santificador), Médico e Rei
Vindouro, descrita como o “Evangelho Integral” ou o “Evangelho Pleno”, refletia o
desejo de se restaurar o cristianismo do Novo Testamento nestes últimos dias. O
interesse generalizado pelo batismo e dons do Espírito Santo convenceu alguns de que
Deus concederia o Dom de línguas a fim de equipá-los com idiomas humanos
identificáveis (xenolalia) para que pudessem anunciar o Evangelho noutros países,
agilizando assim a obra missionária.
Em certa ocasião, o reavivamento na ACM em Topeka, Estado de Kansas, em
1889-1890, deu origem a organização da Missão Kansas-Sudão, cujos membros não
demoraram a partir para o campo missionário, na África Ocidental. Passando pela
cidade de Nova York visitaram os escritórios de A. B. Simpson, onde ouviram as suas
opiniões sobre a cura divina. E, assim, tornaram-se confiantes: a vida singela na fé e no
poder do Espírito Santo os capacitaria a enfrentar qualquer acontecimento futuro.
Leiamos este relato: “Dois dos seus princípios supremos eram a cura pela fé e os dons
pentecostais de línguas; nenhum remédio devia ser tomado, e nenhum dicionário ou
gramática consultado. O grupo foi acometido pela febre malígna; dois morreram,
recusando a quinina”. Embora a expedição terminasse em tragédia, o ideal continuou
vivo.

Em 1895, o autor e líder do Movimento da Santidade, W. B. Godbey, disse que o


“Dom de línguas” era “destinado a desempenhar um papel de destaque na
evangelização do mundo pagão e no cumprimento profético glorioso dos últimos dias.
Todos os missionários nos países pagãos deviam buscar e esperar esse Dom que os
capacitaria a pregar fluentemente no vernáculo. Eles, porém, não deveriam descurar
em seus esforços”. Esta esperança era compartilhada por muitos outros.
Outro defensor desse emprego missionário de línguas era Frank W. Sandford,
fundador da Escola Bíblica “O Espírito Santo e Nós”, em Shiloh, Estado de Maine, em
1895. Através dos seus esforços didáticos e missionários (publicados e Tongues of
Fire), Sandford também esperava que o mundo fosse rapidamente evangelizado. Não

MÓDULO IX...................................................................................................47
somente orava para receber o dom de “poder e eloqüência para o evangelismo, como
também induzia os outros a fazerem-no.
Na virada do século, o Movimento da Santidade passava a preocupar-se com a
“reforma pentecostal da doutrina wesleyana”, bem como com os quatro temas do
evangelho integral. Mas quando do início do Movimento Pentecostal, poucos anos mais
tarde, a prioridade foi dada ao Dom de línguas, distinguindo-o teologicamente do
Movimento da Santidade. Daniel W. Kerr, o teólogo mais influente nos primeiros anos
das Assembléia de Deus, observou em 1922:
“Durante esses últimos anos, Deus tem nos capacitado a descobrir e a recuperar a
verdade maravilhosa do batismo no Espírito a exemplo do que era concedido no início.
Temos, portanto, tudo quanto os outros receberam (Lutero, Wesley, Blumhardt, Trudel
e A.B. Simpson), e recebemos mais essa outra verdade. Vemos tudo quanto eles vêem,
mas eles não vêem o que nós vemos.”
Sem muita dificuldade, os pentecostais continuavam a ler a literatura do
Movimento da Santidade, e a cantar os seus hinos prediletos, tais como “A Onda
Purificadora”, “Chegou o Consolador”, “A Terra de Beulá” e “O poder dos Tempos
Antigos”. Vinho novo tinha derramado em odres velhos.
Entre os que esperavam o recebimento do poder do Espírito para evangelizar
rapidamente o mundo, achava-se o pregador da Santidade, em Kansas, Charles Fox
Parham e seus seguidores. Convencido pelos seus próprios estudos de Atos dos
Apóstolos, e influenciado por Irwin e Sandford, testemunhou Parham um reavivamento
notável na Escola Bíblica Bethel, em Topeka, Kansas, em janeiro de 1901. A maioria dos
alunos, bem como o próprio Parham, regozijaram-se por terem sido batizados no
Espírito e de haverem falado noutras línguas (xenolalia). Assim como Deus concedera a
plenitude do Espírito Santo aos quase 120 no Dia do Pentecostes, eles também haviam
recebido a promessa (At 2.39). E, na realidade, a “fé apostólica” da Igreja do Novo
Testamento foi, finalmente, restaurada de forma plena. Era lógico, portanto, que
Bennett Freeman Lawrence, ao escrever a primeira história do movimento pentecostal
ou denominar-se de Apostolic Faith Restored (1916).
A distintiva contribuição teológica de Parham ao movimento acha-se na sua
insistência de que o falar noutras línguas representa a “evidência bíblica” vital da
terceira obra da graça: o batismo no espírito Santo, claramente ilustrado nos capítulos
2, 10 e 19 de Atos dos Apóstolos. Em Vóice Crying in the Wildemess (1902-1910),
Parham escreveu que, os que recebiam o batismo no espírito Santo, eram selados como
“noiva de Cristo” (2 Co 1.21,22; Ap 7.21). Santificados e preparados como grupo de
escol de missionários nos tempos do fim, somente estes seriam levados por Cristo no
arrebatamento ( antes da Tribulação) da Igreja, depois de haverem completado a
tarefa estipulada na Grande Comissão. Outros cristãos teriam de enfrentar a ordália da
sobrevivência durante os sete anos da tribulação que se seguiria. Embora tal doutrina
acabasse por ser relegada aos grupos marginais do Movimento Pentecostal, realmente
levantou uma questão que ainda perdura: a singuralidade da obra do Espírito naqueles
que falaram noutras línguas em contraste com os que ainda não falaram.
Topeka contribuiu para o reavivamento ( que passou a ter importância
internacional) da Rua Azusa, em Los Ángeles, Califórnia (1906-1909). Seu líder principal
era o afroamericano William J. Seymour. As notícias das “chuvas serôdias” (cf. Jl 2.23)
espalharam-se rapidamente por outros países através do jornal de Seymour, Apostolic
Faith, e mediante os esforços dos que saíram das reuniões da Rua Azusa às várias
partes da América do Norte e ao estrangeiro.
Embora tivessem ocorrido outros reavivamentos pentecostais importantes ( Zion,
III.; Toronto; Dunn, N.C.), a complexidade e a importância do reavivamento de Los

MÓDULO IX...................................................................................................48
Angeles continua a ser um desafio aos historiadores. Os temas da eminência
escatológica e do poder evangelístico (o legado de Parham) traçaram o caminho
seguido pelos pentecostais americanos nos seus esforços agressivos para pregar o
evangelho “até aos confins da terra” (At. 1.8). Os pentecostais afro-americano, por
outro lado, ressaltaram a reconciliação entre as raças e o derramamento do poder
sobre os tiranizados em Azusa. Reconciliação essa evidência pela composição inter-
racial dos cultos, catalisada pelo fruto do Espírito (o legado de Seymour). Embora o zelo
espiritual pelo evangelismo tenha inspirado a obra missionária, os pentecostais podem
também aprender muitas coisas da mensagem de reconciliação, um dos pontos altos do
reavivamento.

3.3. DIVISÕES POR CAUSA DE DIFERENÇAS TEOLÓGICAS


As diferenças teológicas não evaporaram em meio á emoção de proclamar a
chegada das “chuvas serôdias”. O novo movimento viu-se diante de três grandes
controvérsias, nos primeiros 16 anos de sua existência.
A primeira questão que dividiu os pentecostais entre si surgiu em fins de 1906.
Centralizava-se no valor teológico da literatura narrativa (Atos e os últimos versículos
de Marcos 16) para fundamentar a doutrina do falar noutras línguas como a “evidência
inicial” do batismo no Espírito Santo. Os que seguiam os passos de Parham
consideravam as línguas como a evidência palpável do batismo no Espírito Santo.
Quanto às evidências encontradas em Atos, possuem tanta autoridade quanto qualquer
outro texto das Escrituras. Ou seja, as línguas em Atos, tem a função de ser a evidência
do batismo no Espírito Santo; em 1 Co, as línguas possuem outras funções: ajudar na
vida de oração do crente (14.4,14,28), visando a edificação da congregação (14.5, 27).
Mas para os que examinavam Atos dos Apóstolos do ponto de vista tido como paulino o
falar em línguas em nada diferia no Dom de línguas em 1 Co...
Os que acreditam serem as línguas a evidência inicial do batismo no Espírito,
seguem o padrão hermenêutico de outros restauracionistas: elevam certos costumes da
Igreja Primitiva à condição de doutrina. Afinal, quem poderia negar ser a obra do
Espírito Santo o tema central de Atos, posto que os discípulos foram enviados a pregar
o evangelho até aos confins da terra, tendo como reforço os “sinais e prodígios” (At
4.29,30)? Nesse caso e em outros, como na doutrina do lava-pés, por exemplo, os
pentecostais trinitarianos apelaram para um padrão doutrinário, tendo como base a
literatura narrativa.

Depois de 1906, os pentecostais passaram a reconhecer, cada vez mais, que, na


maioria das ocorrência do falar em línguas, os cristãos realmente estavam orando em
línguas não-identificáveis e não em idiomas identificáveis (glossolália ao invés de
xenolalia). Embora Parham mantivesse sua opinião a respeito da finalidade das línguas
na pregação transcultural, os pentecostais chegaram finalmente à conclusão: as línguas
representavam a oração no Espírito, a intercessão e o louvor.
O outro debate girava em torno da segunda obra da graça: a Santificação. É
instantânea ou progressiva? Conforme se podia prever, a linha divisória foi traçada
entre os pentecostais com tendências wesleyanas (três obras da graça) e os
pentecostais com tendências reformadas (duas obras). No sermão “A Obra Acabada no
Calvário” (pregado em 1910 na Conversão Pentecostal da Igreja de Pedra, em Chicago,
Michigan), Willian H. Durham, um batista que se tornará pentecostal, declarou que o
problema do pecado original (hereditário) recebera o golpe fatal quando da crucificação

MÓDULO IX...................................................................................................49
de Cristo. A fé na eficácia desse evento continuava a frutificar espiritualmente, tendo
por fundamento a justiça de Cristo imputada a todo o que crê.
A terceira controvérsia entre os pentecostais resultou do impulso restauracionista
e da forte ênfase cristológica do evangelho integral. Perguntas a respeito da natureza
da Divindade surgiram nas reuniões do Acampamento Pentecostal Internacional em
Arroyo Seco (perto de Los Ángeles). R.E. McAlister, num sermão batismal, observou
que os apóstolos batizavam usando o nome de Jesus (At 2.38) ao invés da fórmula
trinitariana (Mt 28.19). Os que achavam ter descoberto as características que lançavam
luz sobre a restauração da Igreja do Novo Testamento, foram rebatizados em o nome
de Jesus, seguindo mais um padrão de Atos dos Apóstolos (segundo seu modo de ver).
Vários crentes, inclusive Frank J. Ewart, continuaram o estudo do batismo nas águas.
Daí surgiu outro agrupamento de igrejas.
Esses cristãos enfatizavam a “unicidade”, ou a unidade, da Divindade em
contraste com o conceito cristão ortodoxo de um só Deus em Três Pessoas. Além disso,
os teólogos da “unicidade” sustentavam: posto ser Jesus Cristo o nome do redentor de
Deus, é mediante o seu nome que são concedidas a salvação e as demais bênçãos
divinas. Desde o início formaram-se dois grupos dentro do movimento da “unicidade”:
os que acreditam que a conversão e o batismo das águas em o nome de Jesus são
seguidos por uma segunda experiência de revestimento de poder, e os que sustentam
que os três elementos de Atos 2.38 [o arrependimento, o batismo em o nome de Jesus
e o recebimento do Espírito Santo (falar noutras línguas)] convergem num só ato de
graça - o novo nascimento.

4. AS DIVISÕES DA TEOLOGIA

4.1. A TEOLOGIA EXEGÉTICA se ocupa diretamente do estudo do Texto


Sagrado e assuntos relacionados, tais como auxílio na restauração, orientação,
ilustração e interpretação daquele texto. Inclui ela o estudo das línguas da Bíblia, da
Arqueologia Bíblica, Introdução Bíblica (Geral e Especial), Hermenêutica Bíblica e
Teologia Bíblica.

4.2. A TEOLOGIA HISTÓRICA traça a história do povo de Deus através da


Bíblia e da Igreja desde a época de Cristo. Ela trata da origem, desenvolvimento e
dispersão da verdadeira religião e também de suas doutrinas, organizações e práticas.
Ela abrange História Bíblica, História da Igreja, História das Missões, História da
Doutrina e a História dos Credos e Confissões.

4.3. A TEOLOGIA SISTEMÁTICA toma o material fornecido pelo Teologia


Exegética e Histórica e o arranja e ordem lógica sob os grandes títulos do estudo
teológico. Mas temos que fazer cuidadosa distinção entre as contribuições da Teologia
Exegética e da História. A primeira é a única fonte real e infalível da ciência; mas é a
última, em sua exibição da apreensão progressiva das grandes doutrinas da fé por
parte da igreja, freqüentemente contribuiu para uma compreensão da revelação Bíblica.
A Teologia Dogmática é, estritamente falando, a sistematização e defesa das doutrinas
expressas nos símbolos da Igreja. Assim, temos Dogmática Cristã, por H. Martensen,
com uma exposição e defesa da doutrina Luterana; Teologia Dogmática, por Wm.G.T.
Shedd, como uma exposição da Confissão de Westminster e de outros símbolos
presbiterianos; e Teologia Sistemática, por L. Berkof, como uma exposição da teologia

MÓDULO IX...................................................................................................50
reformada. Mas nenhuma dessas obras adere tão rigidamente ao conceito original da
Teologia Dogmática quanto as obras mais antigas. E a Teologia Dogmática é hoje
freqüentemente identificada com a Teologia Sistemática. Sob a Teologia Sistemática
precisamos certamente incluir também a Apologética, polêmica e ética bíblica.

4.4. TEOLOGIA PRÁTICA trata da aplicação da teologia na regeneração,


santificação, edificação, educação e serviço dos homens. Ela busca aplicar a vida
prática aquilo que os outros três departamentos da teologia contribuíram. A Teologia
Prática abrange os cursos de Homilética, Organização e Administração da Igreja,
Liturgia ou o Programa do Culto, Educação Cristã e Missões.

5. PERSPECTIVA TEOLÓGICA

5.1. A MENSAGEM E SITUAÇÃO

A teologia, como função da igreja cristã, deve servir às necessidades da igreja.


Um sistema teológico deve satisfazer suas necessidades básicas: a afirmação da
verdade da mensagem cristã e a interpretação desta verdade para cada nova geração.
A teologia se move para trás e para diante entre dois pólos: a verdade eterna de seu
fundamento e a situação temporal na qual a verdade eterna deve ser recebida. Não
foram muitos os sistemas teológicos capazes de se equilibrar perfeitamente entre essas
duas exigências. A maioria deles ou sacrifica elementos da verdade ou não é capaz de
falar à situação. Alguns combinam ambos os defeitos. Temerosos de perder a verdade
eterna, eles identificam com algum trabalho teológico anterior, com conceitos e
soluções tradicionais. E tentam impô-los a uma situação nova, diferente. Isto é evidente
na ortodoxia européia, que na América é conhecida como fundamentalismo. Quando o
fundamentalismo se combina com uma tendência anti-teológica, como é, por exemplo,
em sua forma biblicista-evangelical, a verdade teológica de ontem é defendida como
mensagem imutável contra a verdade teológica de hoje e amanhã. O fundamentalismo
fracassa na tentativa de entrar em contato com a situação presente. Não porque ele
fale desde além de qualquer situação, mas porque ele fala desde uma situação do
passado. Eleva algo finito e transitório a uma validez infinita e eterna. Neste sentido o
fundamentalismo tem traços demoníacos. Ele destrói a humilde honestidade da busca
pela verdade, dividi a consciência de seus seguidores que refletem, e os torna
fanáticos. Isto porque são forçados a suprimir elementos da verdade dos quais eles
estão veladamente conscientes.
Os fundamentalistas da América e os teólogos ortodoxos da Europa podem
apontar ao fato de que sua teologia é avidamente recebida e seguida por muitas
pessoas simplesmente por causa da situação histórica ou biográfica na qual os homens
se encontram hoje. O fato é óbvio, mas a interpretação é errada. “Situação”, como um
pólo de todo trabalho teológico, não se refere ao estado psicológico ou sociológico no
qual os indivíduos e os grupos vivem. Ela se refere às formas científicas e artísticas,
econômicas, políticas e éticas nas quais eles expressam sua interpretação da existência.
A “situação”, à qual a teologia deve falar com relevância, não é a situação do indivíduo
como indivíduo e não é a situação do grupo como grupo. Teologia não é nem pregação
nem aconselhamento. Portanto, o sucesso de uma teologia, quando ela é aplicada à
pregação ou ao aconselhamento pastoral, não é necessariamente um critério de sua
verdade. O fato de que as idéias fundamentalistas são avidamente recebidas em um

MÓDULO IX...................................................................................................51
período de desintegração pessoal e comunitária não prova sua validade teológica.
Assim também o sucesso de uma teologia liberal em períodos de desintegração social e
comunitária não é certificado de sua verdade. A “situação” que a teologia deve
considerar é a interpretação criativa da existência. Uma interpretação que é elaborada
em todos os períodos da história, sob todos os tipos de condições psicológicas e
sociológicas. A “situação” certamente não é independente destes fatores. Contudo, a
teologia lida com a expressão cultural que encontrou na prática, bem como na teoria e
não com esses fatores condicionantes como tais. Assim, a teologia não está interessada
na ruptura política entre o Leste e Oeste. Ela está interessada na política dessa ruptura.
A teologia não está interessada no aumento das doenças mentais ou na consciência
crescente delas. Ela está interessada na interpretação psiquiatra dessas tendências. A
“situação” à qual a teologia deve responder é a totalidade da auto-interpretação criativa
do homem num período especial. O fundamentalismo e a ortodoxia rejeitavam essa
tarefa. Ao fazer isto, perdem o sentido da teologia.
A teologia “querigmática” se relaciona com o fundamentalismo e a ortodoxia na
medida em que enfatiza a verdade imutável da mensagem (quérigma) contra as
exigências cambiantes da situação. Ela tenta evitar os defeitos do fundamentalismo,
sujeitando toda teologia, inclusive a ortodoxia, ao critério da mensagem cristã. Esta
mensagem está contida na Bíblia. Mas não é idêntica à Bíblia. Ela está expressa na
tradição clássica da teologia cristã. Mas não é idêntica a nenhuma forma especial desta
tradição. A teologia da Reforma e, em nossos próprios dias, a teologia da nova-Reforma
de Barth e sua escola são exemplos marcantes da teologia querigmática. Em sua época
Lutero foi atacado pelos pensadores ortodoxos. Agora Barth e seus seguidores estão
sob pesados ataques dos fundamentalistas. Isso significa que não é totalmente justo
chamar Lutero de “ortodoxo” ou Barth de “neoortodoxo”. Lutero estava em perigo de
se tornar ortodoxo e Barth está em perigo semelhante. Mas essa não era a intenção
deles, ambos fizeram a tentativa séria de redescobrir a mensagem eterna dentro da
Bíblia e da tradição. Isto contra uma tradição distorcida e uma Bíblia mecanicamente
manipulada. A crítica de Lutero contra o sistema romano de mediações e de graus em
nome das categorias bíblicas decisivas de julgamento de graça, sua redescoberta da
mensagem paulina, e, ao mesmo tempo, sua corajosa apreciação do valor espiritual dos
livros bíblicos eram uma genuína teologia querigmática. A crítica de Barth à síntese
burguesa neo-protestante feita para a teologia liberal, sua redescoberta do paradoxo
cristão, e, ao mesmo tempo, a liberdade de sua exegese espiritual da Epístola aos
Romanos e sua aceitação a critica histórica radical era uma genuína teologia
querigmática. Ambos os casos de ênfase na verdade eterna contra a situação humana e
suas exigências. Em ambos os casos esta ênfase teve poder profético, abalador e
transformador. Sem essas reações querigmáticas a teologia teria se perdido nas
relatividades da “situação”. Teria se tornado a própria “situação” - por exemplo, o
nacionalismo religioso dos assim chamados cristãos germânicos e progressismo
religioso dos assim chamados humanistas da América.
Contudo a “situação” não pode ser excluída do trabalho teológico. Lutero estava
suficientemente descondicionado para usar seu conhecimento nominalista e a educação
humanista de Melanchton para formulação as doutrinas teológicas. Mas ele não estava
suficientemente consciente do problema da “situação” para evitar o deslize em atitudes
ortodoxas. Preparou assim o caminho para o período da ortodoxia protestante. A
grandeza de Barth consiste em que ele sempre de novo se corrija a si mesmo à luz da
“situação”. Ele tenazmente tenta não se tornar um seguidor de si mesmo. Contudo, não
se dá conta de que, ao agir assim, deixa de ser meramente um teólogo querigmático.
Ao tentar derivar toda afirmação diretamente da verdade última - por exemplo, derivar

MÓDULO IX...................................................................................................52
o dever de fazer a guerra contra Hitler a partir da ressurreição de Cristo acaba usando
o método que pode ser chamado “neo-ortodoxo”. Este método reforçou todas as
tendências como a teologia da regeneração na Europa. O pólo chamado “situação” não
pode ser ignorado em teologia, em conseqüências perigosas. Só uma corajosa
participação na “situação”, isto é, em todas as várias formas culturais que expressam a
interpretação de sua existências do homem moderno, pode superar a presente
oscilação da teologia querigmática entre a liberdade implícita no quérigma genuíno em
sua fixação ortodoxa. Em outras palavras, a teologia querigmática necessita da teologia
apologética para sua complementação.

5.2. TEOLOGIA APOLOGÉTICA E QUÉRIGMA

Teologia apologética é “teologia que dá resposta”. Responde às perguntas


implícitas na “situação”, no poder da mensagem eterna e com os meios oferecidos pela
situação a cujas perguntas ela responde.
O termo “apologético”, que teve posição tão elevada na Igreja Primitiva, caiu em
descrédito por causa dos métodos empregados nas tentativas abortivas para defender
o cristianismo contra os ataques do humanismo moderno, do naturalismo e do
historicismo. Uma forma especialmente leviana e desagradável de apologética usou o
argumentum ex ignorantia. Tentou descobrir lacunas em nosso conhecimento histórico
e científico para encontrar um lugar para Deus e suas ações dentro de um mundo de
outra forma completamente calculável e “imanente”. Cada vez que nosso conhecimento
progredia, outra posição de defesa tinha que ser abandonada. Mas o ávidos apologetas
não se dissuadiram por essa retirada continua, de encontrar nos desenvolvimento mais
recentes da física e historiografia novas ocasiões para estabelecer a atividade de Deus
em novas brechas do conhecimento científico. Esse procedimento indigno desacreditou
tudo o que é chamado de “apologética”.
Há, contudo, uma razão mais profunda para a desconfiança do método
apologético, especialmente por parte dos teólogos querigmáticos. Para responder a
uma pergunta, deve-se ter algo em comum com a pessoa que a formula. A apologética
pressupõe uma base comum, não importa quão vaga esta pode ser. Mas os teólogos
querigmáticos estão inclinados a legar qualquer base comum com aqueles que estão
fora do “círculo teológico”. Eles temem que a base comum irá destruir a unicidade da
mensagem. Apontam para os primitivos apologetas cristãos, que viam uma base
comum na aceitação do logos. Apontam para a escola Alexandrina, que encontrou uma
base comum para aceitação do platonismo. Apontam para o uso que Tomás de Aquino
fez de Aristóteles. Sobre tudo, apontam para a base comum que a teologia apologética
julgou haver encontrado com a filosofia do iluminismo, com o romantismo, com o
hagilianismo e kantismo, com o humanismo e naturalismo. Tentam demonstrar que em
cada caso aquilo que se supunha ser a base comum era de fato a base da “situação”;
que a teologia perdeu sua própria base quando entrou na situação. Teologia
apologética, em todas essas formas - na prática isto significa teologia não-
fundamentalista desde o começo do século dezoito - é, do ponto de vista dos recentes
teólogos querigmáticos, um abandono do quérigma, da verdade imutável. Se esta for
uma leitura correta da história teológica, então a única teologia real é a querigmática. A
“situação” não pode ser penetrada. Nenhuma resposta às perguntas implícitas nela
poda ser dada, pelo menos não em termos que possam ser sentidos como resposta. A
mensagem deve ser lançada naqueles que estão na situação-lançada como uma pedra.

MÓDULO IX...................................................................................................53
Certamente este pode ser um método efetivo de pregação sob condições psicológicas
especiais, por exemplo, em reavivamento. Pode ser efetivo mesmo se expresso em
termos teológicos agressivos. Mas não alcança o alvo da função teológica da Igreja. E,
além disso, é impossível. A própria teologia querígmática deve usar o instrumental
conceitual do seu tempo. Ela não pode simplesmente repetir passagens bíblicas. Mesmo
quando o faça, não pode evitar a situação conceitual dos diferentes escritores bíblicos.
Já que a linguagem é a expressão básica e uni-perante de toda situação, a teologia não
pode evitar o problema da “situação”. A teologia querigmática deve abandonar sua
exclusiva transcendência. Deve assumir seriamente a tentativa da teologia apologética
de responder às perguntas apresentadas diante dela pela situação contemporânea.
Por outro lado, a teologia apologética deve levar em conta a advertência implícita
na existência e a reivindicação da teologia querigmática. Ela se perde se não está
baseada no quérigma como substância e critério de cada uma de suas afirmações. Mais
de dois séculos de trabalho teológico estiveram determinados pelo problema
apologético. “A mensagem cristã e a mentalidade moderna” tem sido o tema dominante
desde o final da ortodoxia clássica. A questão perene tem sido: pode a mensagem
cristã ser adaptada à mentalidade moderna sem perder seu caráter essencial e único? A
maioria dos teólogos acreditou que é possível. Alguns negaram como impossível, seja
em nome da mensagem cristã, seja em nome da mentalidade moderna. Não há dúvida
de que as vozes daqueles que enfatizaram o contraste, a diástase, tem sido mais alta e
mais impactante - os homens normalmente são mais fortes em suas negações do que
em sua afirmações. Mas o labor contínuo daqueles que tentaram encontrar a união,
uma “síntese”, tem mantido a teologia viva. Sem eles o cristianismo tradicional teria se
tomado estreito e supersticioso. E o movimento em geral teria caminhado sem o
“espinho da carne” de que necessitava, isto é, uma teologia honesta de alto valor
cultural.
Todas as condenações da teologia dos dois últimos séculos, em grupos
tradicionais e neo-ortodoxos, são profundamente errôneas. (O próprio Barth
reconheceu isto em seu Die protestantísche Theologie im neunzehnten Jahrhundert).
Contudo, é certamente necessário perguntar, em cada caso específico, se a tendência
apologética dissolveu ou não a mensagem cristã. E além disso, é necessário procurar
um método teológico no qual a mensagem e a situação estejam de tal forma
relacionadas, que nenhuma delas seja eliminada. Se este método for encontrado, a
velha questão de já dois séculos sobre “cristianismo e a mentalidade moderna” pode
ser atacada com mais êxito. O sistema a seguir é uma tentativa de usar o “método de
correlação” como uma forma de unir mensagem e situação. Ele tenta correlacionar as
perguntas implícitas na situação, com as respostas implícitas na mensagem. Ele não
deriva as respostas das perguntas, como o faz uma teologia auto-enganosa. Nem
elabora respostas sem relacioná-las com as perguntas, como uma teologia querigmática
auto-enganosa o faz. Ele correlaciona perguntas e respostas, situação e mensagem,
existência humana e manifestação divina.
Obviamente, esse método não é um instrumento a ser manipulado a bel-prazer.
Não é um truque, nem uma invenção. Ele mesmo é uma afirmação teológica. E, como
todas as afirmações teológicas, é feito com paixão e risco. Em última análise, não é
diferente do sistema que sobre ele é construído. Sistema e método se pertencem
mutuamente. E devem ser julgados mutuamente. Será um julgamento positivo se os
teólogos das gerações futuras reconhecerem que ele os ajudou, bem como aos
pensadores não-teológicos, a compreenderem a mensagem cristã como resposta às
perguntas implícitas em sua própria bem como em toda situação humana.

MÓDULO IX...................................................................................................54
CONCLUSÃO

Esperamos que este trabalho tenha sido de total relevância para o elevo
acadêmico e espiritual. No que tange a história da teologia, entendemos, pelo o que foi
exposto, que ela trouxe até nós algo mais profundo e detalhado da grande importância
a cerca do conhecimento sobre Deus que através de sua misericórdia tem esclarecido
aos seus filhos pela iluminação da verdade como a teologia supre a necessidade do
homem no que diz respeito a sua história, isto é, de como ela surgiu e veio até nós.
Portanto, fazemos votos que esta monografia seja muito útil ao enriquecimento
teológico.

MÓDULO IX...................................................................................................55
INTRODUÇÃO À HISTÓRIA GERAL

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO
DADOS ACADÊMICOS
PARTE 1 – CLASSIFICAÇÃO DA HISTÓRIA
MÉTODOS DA HISTÓRIA
A HISTÓRIA COMO CIÊNCIA
FILOSOFIA DA HISTÓRIA
CIÊNCIAS AUXILIARES DA HISTÓRIA
HISTORIOGRAFIA
PARTE 2 – PRÉ HISTÓRIA
IDADE DA PEDRA
IDADE DOS METAIS
IDADE DO BRONZE
IDADE DO FERRO
IDADE MÉDIA
A ALTA IDADE MÉDIA
A BAIXA IDADE MÉDIA
IDADE CONTEMPORÂNEA

INTRODUÇÃO
A memória da humanidade é conservada nos arquivos da história. As origens da
sociedade, a evolução dos povos antigos, o auge e decadência das civilizações, os feitos
de personagens ilustres, os antecedentes de acontecimentos e situações
contemporâneas e a trajetória do homem ao longo do tempo são temas históricos que
constituem uma parte fundamental da cultura individual e coletiva.
Disciplina que se ocupa do estudo dos fatos relativos ao homem ao longo do
tempo, a história se baseia na análise crítica de testemunhos concretos e verídicos. Em
oposição a certas formas de ficção narrativa; como o romance histórico, a história, ao
mesmo tempo que é uma criação literária, busca refletir a verdade dos fatos ocorridos e
demonstráveis. Em oposição à história não científica, narrativa e subjetiva, com
elementos inventados ou interpretados arbitrariamente, a história moderna tende à
objetividade, ou seja, à interpretação crítica e racional dos fatos. Em sua orientação
pragmática, a história sempre se considerou portadora de valores éticos, políticos ou
religiosos, fundamentais para a transmissão da ideologia social.
O vocábulo grego história, que significa "conhecimento por meio de uma
indagação", deriva de hístor: "sábio" ou "conhecedor". O termo latino história foi
adotado por quase todos os idiomas ocidentais, com exceções como o alemão
(Geschichte).
São muitas as definições que se fizeram dessa disciplina. Para Johann Gottfried
von Herder, é "o estudo do passado", conceito que os gregos não haviam especificado.
Marc Bloch definiu a história como a ciência dos homens no transcurso do tempo.
Lucien Febvre destacou o processo de mudança contínua da sociedade humana como a
base da história. Para Benedetto Croce, a história pode adotar elementos filosóficos em
seu processo de conhecimento.
DADOS ACADÊMICOS
A história estuda e organiza os fatos importantes, o cotidiano e a vida dos povos e
da humanidade narrando-os de forma ordenada. A pesquisa dos acontecimentos

MÓDULO IX...................................................................................................56
passados e presentes e das condições econômicas, sociais e culturais responsáveis por
eles é feita de forma crítica. Os historiadores selecionam, classificam e relacionam os
dados levantados pela arqueologia, por bibliotecas, arquivos, diários particulares e
outros documentos, analisando a sua importância, sua autenticidade e seu significado
científico, para ampliar seus conhecimentos e compreender os diversos aspectos da
atuação do homem ao longo do tempo.
Os cursos de história oferecem várias disciplinas em história geral,
contemporânea, do Brasil e das Américas e as matérias optativas são sociologia,
geografia, história da arte, literatura brasileira, arqueologia e antropologia, que são
fundamentais para uma visão interdisciplinar dos fatos. O curso estimula a capacidade
de interpretação, análise e síntese que são fundamentais para garantir uma boa
atuação profissional.
O profissional pode trabalhar com consultoria subsidiando atividades políticas,
artísticas e institucionais através de pesquisas e levantamentos históricos que faz sobre
o assunto, além de ajudar na elaboração de planos, projetos e publicações culturais. Na
área de ensino o profissional pode dar aulas para universidade e para o primeiro e
segundo graus. Na área de pesquisa o profissional investiga e estuda acontecimentos
passados e atuais através da consulta e investigação de documentos.
O curso tem duração mínima de quatro anos, a titulação é de bacharel ou
licenciado em história e não há regulamentação obrigatória para o exercício
profissional.
HISTÓRIA GERAL
PARTE 1
CLASSIFICAÇÃO DA HISTÓRIA
Devido à amplitude do objeto da história, foi preciso dividir seu campo de estudo
em vários segmentos. Considerando-se o meio geográfico a ser estudado, a história é
universal quando se refere a todas as sociedades humanas no mundo; é nacional no
caso de se limitar à de um único país; é regional ou local para áreas geográficas
definidas mas não nacionais. Segundo uma classificação estritamente temporal, divide-
se em pré-história, que se ocupa das culturas anteriores ao surgimento da escrita, e
história.
Assim, a história propriamente dita parte dos testemunhos escritos e foi, por sua
vez, dividida em períodos que, embora de certo modo arbitrários, refletem grandes
blocos bem definidos entre si: idade antiga, medieval, moderna e contemporânea.
Pode-se falar também de história recente, no caso do estudo das últimas décadas, e de
história geral para os panoramas históricos que abarcam todos os períodos. A história
da arte ou da cultura ocupa espaço próprio. Cada uma dessas grandes seções em que
se divide a história como disciplina acadêmica pode, por sua vez, ramificar-se em
diversos temas específicos, centrados em áreas geográficas ou períodos delimitados.
O estudo histórico pode estruturar-se segundo pontos de vistas ou campos de
interesse diferentes; assim, pode-se falar de orientação militar e política, de história
sagrada, de história da Igreja, ou de história da cultura, história social e história
econômica. Na segunda metade do século XX desenvolveu-se um tipo de história
quantitativa, que utilizou sistemas estatísticos e matemáticos como método para
determinar a classificação dos fenômenos, mediante comparações e análises destes a
partir de dados quantificados. Esse sistema é empregado especialmente na história
econômica e na demografia histórica. Outra perspectiva é a da história integral, que se
dedica a unir os diferentes aspectos da evolução das sociedades.

MÓDULO IX...................................................................................................57
FONTES
Considera-se fonte histórica tudo que permite reconstituir os acontecimentos e
formas de vida do passado. As fontes podem ser materiais e imateriais. As primeiras
são os vestígios de civilização material: monumentos, utensílios, vestígios arqueológicos
etc., assim como os documentos de diversas espécies. As fontes imateriais são os
vestígios que sobrevivem nas sociedades e que são detectáveis em suas tradições,
costumes, lendas, ritos e folclore. Outra classificação das fontes refere-se às diretas e
indiretas, sendo estas últimas os vestígios que se rastreiam em criações humanas de
tipo literário, artístico etc., não especificamente ligadas ao documento histórico.
FONTES LITERÁRIAS. Entre as fontes materiais, as literárias são os textos
escritos com propósito histórico ou narrativo. As mais antigas são as inscrições em
pedra, de caráter fúnebre ou comemorativo, referentes a façanhas de guerra ou
destinadas a suportes de códigos legais. Exemplos desses últimos são o Código de
Hamurabi, as pedras rúnicas dos antigos povos germânicos, as estelas maias e os
marcos miliários romanos (colunas que assinalavam distâncias de mil passos). Os
códigos legais estabeleciam leis e costumes; os mais antigos, além do citado, são o
Decálogo hebreu e as Doze Tábuas dos romanos. A poesia épica recolhia a tradição oral
de fatos ocorridos em tempos remotos, como os textos gregos da Ilíada e da Odisséia,
as sagas e o Beowulf dos povos germânicos. Os anais e calendários, a princípio de
caráter religioso, registravam os fatos e festividades do ano civil e outros tipos de
acontecimentos, como pestes, cometas ou a morte dos reis, já na Idade Média.
Destacaram-se os anais dos mosteiros de Fulda e Saint-Gall. As crônicas resultaram da
ampliação dos anais e eram redigidas nas escolas monásticas; destacaram-se a de
Saint-Denis e a crônica de Vicent de Beauvais na França, a de Matthew Paris na
Inglaterra, a de Snorri Sturluson na Noruega e a de Fernando Núñez de Toledo y
Guzmán na Espanha. Crônicas, anais e códices são importantes também para o estudo
das civilizações pré-colombianas da América. A hagiografia é o relato das vidas de
santos, muitas vezes repletas de lendas milagrosas. A biografia possui uma extensa
tradição clássica e durante a Idade Média mesclou-se com a hagiografia para servir
como "exemplo".
FONTES PÚBLICAS E ADMINISTRATIVAS. A intenção das fontes públicas e
administrativas não é, em princípio, nem histórica nem literária; sua redação
corresponde a necessidades administrativas, legais ou econômicas. Os livros de contas
e documentos econômicos recolhem dados relativos a tributos, distribuição do gasto
público, inventários, contratos, transações comerciais etc.; destacam-se os documentos
ingleses medievais, assim como os das casas reais da França e de Castela e, a partir do
século XVIII, os de quase todos os países. Os documentos administrativos incluem
cartas reais, regulamentos de corporações, censos populacionais, textos de processos
judiciais etc. Os documentos da Igreja Católica são abundantes, devido à antiguidade
dessa instituição na história ocidental: cânones de concílios, bulas, registros dos
pontífices, arquivos diocesanos e registros paroquiais.
A documentação diplomática concentra-se na correspondência entre estados e nas
instruções dos governos aos embaixadores. Iniciou-se no século XV com os informes
enviados pelos correspondentes das cidades italianas em diversos países. Podem-se
incluir aqui também os tratados internacionais.
Conhece-se em parte a evolução política de um país pelos documentos
parlamentares, importantes nos casos do Reino Unido, França, Alemanha e outros
estados.
OUTRAS FONTES. Além das imateriais, transmitidas por meio das tradições,
lendas e ritos dos povos, outras fontes escritas completam a dimensão humana dos

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fatos históricos: as memórias, autobiografias, relatos de viagens, diários e
correspondência privada. Junto com essas fontes de caráter privado, a história
contemporânea conta com tipos muito diversos de documentos de interesse histórico:
panfletos, jornais, folhetos, revistas, manifestos etc. A esses somam-se a fotografia, o
cinema, o vídeo, a fita magnética etc., que proporcionam uma informação mais direta e
objetiva.
INTERPRETAÇÃO CRÍTICA DAS FONTES. Para o historiador a verificação das
fontes é sempre necessária; a crítica histórica tem por objeto essa indagação para
assegurar a autenticidade e veracidade dos documentos: seu autor, datação e local de
procedência. Sobre essa base procede-se a delimitações mais precisas. Muitas vezes é
indispensável um trabalho prévio de conservação e restauração para, uma vez
restabelecida a integridade do objeto, possibilitar sua interpretação.
A FALSIFICAÇÃO AFETA COM FREQÜÊNCIA OS DOCUMENTOS OU
TESTEMUNHOS MATERIAIS. O historiador deve verificar primeiro a autenticidade da
fonte, para o que recorrerá à ajuda de especialista e de meios técnicos adequados.
Contudo, mesmo as falsificações podem proporcionar dados interessantes sobre os
gostos e tendências das diferentes épocas, o que é também interessante a partir de
uma perspectiva histórica. Algumas falsificações tiveram vastas conseqüências na
história, como no caso da falsa doação de Constantino à Santa Sé, que serviu de
fundamento jurídico do "patrimônio de são Pedro", ou seja, dos Estados Pontifícios.
Determina-se a antiguidade de uma fonte por meio das ciências auxiliares e dos
elementos materiais; para isso, empregam-se métodos físicos, químicos e eletrônicos
de grande precisão. A localização da fonte originária proporciona dados interessantes,
já que sua forma e conteúdo podem ter variado ao longo do tempo. A descoberta de
peças peculiares a determinadas culturas em lugares afastados de sua origem indica
mobilidade social e intercâmbios ativos entre os povos. Documentos autênticos podem
ter sofrido manipulação em algum momento para atender a interesses políticos ou
legislativos. Motivos propagandísticos, dados inventados ou distorcidos e mesmo a
própria parcialidade do narrador ou historiador podem alterar documentos, que assim
se tornariam particularmente difíceis de interpretar. Embora se considere a tradição oral
uma fonte de veracidade duvidosa e com freqüência distorcida, sua utilidade é
amplamente reconhecida, já que em muitas sociedades esse tipo de transmissão dos
fatos se atém a leis rígidas, que asseguram em parte sua exatidão.
MÉTODOS DA HISTÓRIA
Ao concentrar seu estudo em um tempo e lugar concretos, assumindo uma
perspectiva ou temática específica, o historiador não deve renunciar a uma visão ou
conhecimento geral que lhe possa proporcionar um contexto suficientemente amplo,
para que sua análise seja coerente e os fatos estudados se relacionem com seus
antecedentes e posteriores, até mesmo os mais remotos. Contudo, a especialização é
necessária para aprofundar o estudo histórico, que pode orientar-se segundo diversos
métodos adaptados à pluralidade de aspectos e períodos.
HISTÓRIA POLÍTICA E MILITAR. Durante muito tempo, os fatos políticos e
militares constituíram o principal objeto de interesse da história. Essa orientação centra-
se na atuação e no crescimento dos estados e impérios e suas relações durante a paz e
a guerra. Estuda também as lutas internas pelo domínio dentro de cada estado.
Durante séculos, esse tipo de história baseou-se em ações bélicas e façanhas militares.
Era uma narração de acontecimentos, estratégias e personagens destacados que
absorviam o interesse do historiador. A história política moderna desmembrou-se em
estudos setorizados: constitucional, das instituições e da administração estatal.

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MÉTODO MARXISTA. Durante o século XIX os teóricos socialistas
desenvolveram um tipo de história mais interessado pela população do que pelos
indivíduos em si, e pelos modos de vida mais do que pelos feitos militares. Quem abriu
um novo caminho para a pesquisa histórica, bem como para muitas outras disciplinas,
foi o alemão Karl Marx. Inspirado pela dialética de Hegel, Marx elaborou uma
concepção materialista da história baseada na contradição dos elementos da realidade
social (tese e antítese) como meio para alcançar formas de síntese cada vez mais
avançadas.
Na introdução a Zur Kritik der politischen Ökonomie (1859; Sobre a crítica da
economia política), Marx formulou suas idéias, contrastadas com as do amigo e
colaborador Friedrich Engels, sobre o estudo da economia em suas ligações com a
sociedade. Afirmava que o indivíduo se vê imerso em uma série de relações de
produção, que variam segundo o grau de desenvolvimento da sociedade. A estrutura
econômica depende das características dessas relações de produção, que constituem a
infra-estrutura de uma sociedade, sobre a qual se ergue a superestrutura (ideológica,
política, jurídica etc.), que gera determinadas posições e consciências sociais. A cada
modo de produção material corresponde, assim, um tipo de formação social (escravista,
feudal, capitalista etc.). O conceito de "luta de classes" é basilar para a compreensão
da teoria marxista, já que o desenvolvimento dos meios de produção e as relações
entre os proprietários e os trabalhadores possibilitam estabelecer o processo de
confronto dialético pelo qual a humanidade evolui para formas sociais e períodos
históricos mais avançados. Segundo as leis da dialética, na sociedade capitalista a
revolução proletária conduziria ao comunismo, síntese histórica em que se suprimiriam
as distinções de classe e o estado, este entendido como organização coercitiva da
classe dominante.
As idéias de Marx sobre o materialismo histórico não foram totalmente formuladas
em Das Kapital (1867; O capital), obra de economia política que procurava fugir a
esquematizações simplistas, perigo apontado e combatido por Engels em seus últimos
anos de vida. Ao longo do século XX, a ortodoxia stalinista reduziu o materialismo
histórico a uma fórmula de cinco etapas de desenvolvimento: o comunismo primitivo, o
escravagismo antigo, o feudalismo, o capitalismo e o socialismo, fases necessárias na
evolução de qualquer sociedade. Um novo período da historiografia marxista abriu-se
após a segunda guerra mundial, quando se começou a superar a doutrina stalinista e
passou-se a considerar outros aspectos até então deixados de lado.
POSITIVISMO. Do último terço do século XIX às primeiras décadas do século XX
predominou um tipo de estudo histórico baseado na filosofia política de Auguste Comte.
Esse método foi elaborado a partir de uma comparação empírica de dados e de uma
interpretação racional dos fatos, em que se abandonava toda questão teórica ou
psicológica, mais difícil de objetivar, e se empregavam unicamente as fontes mais
concretas dos documentos. Segundo os positivistas, a aplicação das ciências exatas
possibilitaria o conhecimento das leis da história a partir da análise dos dados. Os
historiadores positivistas trataram especialmente da história dos fatos políticos e
ideológicos. Ocorreu um extraordinário florescimento da erudição e dos repertórios
documentais, como os Monumenta germaniae historica (Monumentos históricos
germânicos) ou a Colección de documentos inéditos para la historia de España. Nesse
período realizou-se um importante trabalho filológico, com a decifração de hieróglifos, e
desenvolveram-se os estudos sobre as ciências auxiliares e a interpretação de fontes.
A história positivista era, segundo Leopold von Ranke, uma exposição dos fatos tal
como se produziram. Com o acúmulo de enormes quantidades de fatos que muitas
vezes não eram interpretados, a história positivista ficou de certo modo limitada por

MÓDULO IX...................................................................................................60
seu próprio método e foi caindo progressivamente em desprestígio à medida que o
século XX avançava. Métodos alternativos complementaram o chamado historicismo
positivista com a introdução da interpretação e a adoção do princípio de que todos os
aspectos da sociedade humana estavam sujeitos a mudanças e transformações.
HISTÓRIA SOCIAL. Historiadores como Lucien Febvre, Marc Bloch e, sobretudo,
Fernand Braudel dirigiram a atenção para o estudo da história como ciência social.
Bloch e Braudel, ao contrário do que sustentava a escola positivista, afirmaram que as
fontes indiretas e imateriais eram válidas e que a observação direta era possível.
Segundo eles, as formas de vida e os costumes ancestrais sobreviviam em muitas
comunidades humanas do presente, por serem mais estáveis e longevos do que os
acontecimentos particulares. Por influência do estruturalismo, esses historiadores
deduziram que a sociedade possui aspectos inerentes a sua própria estrutura:
fenômenos que guardam relação entre si e que têm causas profundas muitas vezes
desconsideradas pelo historiador.
À medida que o estudo histórico se concentra na época contemporânea, a
observação direta torna-se mais freqüente. Os acontecimentos concretos, de curta
duração, em muitos casos não podem ser observados diretamente, mas sim os de
longa duração, cujos aspectos essenciais se reproduzem no tempo. Esse método,
seguido pela escola braudeliana francesa, buscou considerar o homem na sua
totalidade, dedicando atenção a aspectos anteriormente pouco apreciados, como a vida
diária das civilizações, as causas profundas das oscilações da economia etc. O conceito
da história em relação com as ciências sociais foi antecipado por Charles-Victor Langlois
no final do século XIX. As obras de Braudel constituem outro marco dessa orientação.
HISTÓRIA ECONÔMICA. Desde meados do século XIX, a história econômica é
considerada de fundamental importância para a compreensão das relações sociais e
políticas. Sua relação com a teoria econômica é clara. No período entre a primeira e a
segunda guerras mundiais, estudos de economistas como John Maynard Keynes
apresentaram grandes coincidências de método com o trabalho de historiadores da
mesma época, concentrando-se na análise dos ciclos e das conjunturas da economia.
Após a segunda guerra mundial realizaram-se estudos de tipo macroeconômico,
dissociados da orientação conjunturalista, mais dedicada à observação de mudanças
imediatas.
A HISTÓRIA COMO CIÊNCIA
Para os gregos, a história não se referia necessariamente ao passado, sendo antes
uma lista ou descrição sistemática de fatos. Para Aristóteles, a história era o estudo de
fenômenos particulares, enquanto a poesia relacionava-se ao geral, cujo conteúdo era
mais filosófico e exemplar do que o daquela. Durante a Idade Média, a história
permaneceu ligada às crônicas e a uma concepção teológica muitas vezes deformada
em seus relatos pela distorção e pela lenda. O conceito científico começou a avançar
durante o Renascimento, quando os humanistas adotaram uma visão mais ampla e
desvinculada da teologia ao interpretar os textos clássicos. No século XVII
empregaram-se algumas ciências auxiliares que possibilitaram os primeiros esboços de
uma "ciência" histórica em sentido moderno. Em 1681 com De re diplomatica (Sobre a
diplomacia), Jean Mabillon proporcionou um instrumental crítico para depurar e
interpretar as fontes.
Alguns pensadores desse século, no entanto, não consideravam a história uma
ciência. Essa era a opinião de dois dos mais relevantes, Francis Bacon e René
Descartes, embora em outro sentido tenham dado uma excelente contribuição, pois
assentaram as bases filosóficas da idéia do progresso contínuo da humanidade, que
teve tanta influência no pensamento do século XIX. Bacon dava pouca importância à

MÓDULO IX...................................................................................................61
precisão histórica, mas realizou uma divisão útil da história em civil e natural, e a
relacionou com a memória. Descartes chegou a duvidar de que a história fosse um
ramo do conhecimento.
Até o século XVIII não se pode falar de uma concepção científica da história. Jean
Le Rond d'Alembert adotou na Encyclopédie a classificação de Bacon, que relacionou os
conhecimentos humanos com as faculdades da memória (história), da razão (filosofia) e
da imaginação (poesia), e dividiu a história em sagrada, civil e natural. A idéia do
progresso humano foi a raiz do conceito de história como ciência social. Em Scienza
nuova (1725), o filósofo Giambattista Vico desenvolveu mais extensamente a idéia do
nascimento, crescimento e decadência dos povos, procurando indagar as causas do
processo. Para isso foi mais influente a contribuição do barão de Montesquieu em
Considérations sur les causes de la grandeur des romains et de leur décadence (1734;
Considerações sobre as causas da grandeza dos romanos e da sua decadência). As
causas do desenvolvimento deviam ser buscadas na moral e em aspectos mais
objetivos, como as instituições, a política etc., sendo o acaso um elemento acelerador
de processos evolutivos iniciados anteriormente por causas gerais e profundas.
Em History of the Decline and Fall of the Roman Empire (1776-1788; História da
decadência e queda do Império Romano), o britânico Edward Gibbon expôs a teoria do
progresso contínuo da civilização e foi um pioneiro ao utilizar em seu estudo de modo
racional a enorme quantidade de dados acumulada pelos estudiosos anteriores.
Durante o século XVIII, a história não esteve muito vinculada à área universitária,
exceto em alguns locais, como a cidade alemã de Gotinger. Só no século seguinte a
história transformou-se em disciplina acadêmica, a princípio na Prússia e
posteriormente em outras partes da Alemanha. Ao longo do século passou a ser
universalmente aceita como ciência e começou a ser escrita por historiadores
profissionais.
Além disso, a revolução industrial oferecera aos historiadores a possibilidade de
observar um fenômeno de mudança social e econômica sem precedentes que
possibilitou a confirmação de muitos postulados da teoria do progresso humano. Em
1837 Adolphe Blanqui descreveu o processo da revolução industrial e destacou as
relações entre a sociedade e a economia, antecipando as conclusões de Marx.
FILOSOFIA DA HISTÓRIA
Com relação ao historicismo positivista surgiu uma tendência crítica desenvolvida
principalmente por filósofos. Essa tendência adotou duas orientações, a primeira
derivada das posições de Arthur Schopenhauer e, sobretudo, de Friedrich Nietzsche; a
segunda, de tradição kantiana, foi desenvolvida por Wilhelm Dilthey, Heinrich Rickert e
Max Weber.
A primeira opunha-se à tradição positivista criticando a esterilidade do puro
acúmulo de dados eruditos, que considerava fase preparatória para um estudo
interpretativo e de significados: o que para Nietzsche era uma "história monumental"
crítica e arqueológica. Segundo ele, a história proporciona exemplos: julga o passado e
situa o presente no decorrer histórico. A história é, portanto, um diálogo entre o
passado e o presente. Ficava implícita uma distinção evidente em categorias: a história
menos interessante era a dos meros colecionadores de dados, e a superior era a dos
que os interpretam e lhes fornecem conteúdo. Para Nietzsche, a reconstrução do
passado não era um fim em si mesmo, mas possuía um propósito: enriquecer o
espírito mediante a lição da história.
A tendência kantiana, por sua parte, buscou superar a dualidade que a posição
anterior promovia, ao considerar a história uma integração daqueles dois processos: o
da informação pura e o dos conteúdos. Para seus seguidores, é a razão que elabora o

MÓDULO IX...................................................................................................62
conhecimento histórico dos fatos nas sociedades humanas. Nessa tendência era
fundamental o conceito de "valor"; chegou-se a afirmar que os acontecimentos que
sobreviveram na consciência histórica são os que têm relação com os valores em que
acreditaram seus protagonistas e em que acreditam os observadores posteriores.
Rickert aludia aos valores estabelecidos: o estado, o direito, a religião etc., como
esquemas básicos do processo histórico. Max Weber destacou o relativismo da história,
afirmando que os homens resgatam do passado aquilo que de algum modo lhes
interessa em seu presente. Ou seja, cada sociedade tem sua história, e esta se
reescreve continuamente segundo as transformações e os questionamentos dessa
sociedade. Desse modo, o interesse pelo passado reorienta-se sempre segundo as
mudanças experimentadas no presente. O passado não fica, assim, fixado
definitivamente.
Outras tendências de caráter filosófico tiveram seu correlato nos estudos
históricos, como a fenomenologia, o estruturalismo de Claude Lévi-Strauss, a
concepção ético-política da história de Benedetto Croce, a história cultural de Ernst
Cassirer ou, na Espanha, a posição de José Ortega y Gasset em seu livro Historia como
sistema (1941), em que concebe a história como uma cadeia de fatos consecutivos que
respondem a uma "razão histórica".

CIÊNCIAS AUXILIARES DA HISTÓRIA


As contribuições de diversas ciências auxiliares, muitas vezes de grande
complexidade em si mesmas, como a arqueologia, a geografia ou a filologia,
complementam a análise das fontes e o estudo histórico. Nesses casos deve-se falar
antes de um caráter interdisciplinar das ciências que estudam aspectos diversos da
cultura e do ambiente humanos. Entre essas disciplinas poderiam incluir-se também a
psicologia, a economia, a demografia etc. Além dessas, o historiador utiliza outras
disciplinas, de caráter mais instrumental, que lhe permitem a compreensão imediata
das fontes.
Entre essas outras disciplinas podem-se citar: a cronologia (estudo da sucessão e
datação dos fenômenos históricos), a paleografia (leitura de escrituras antigas), a
papirologia (estudo dos papiros egípcios e greco-romanos), a epigrafia (interpretação
das inscrições), a numismática (estudo das moedas), a sigilografia (selos antigos), a
filatelia (selos de correios), a heráldica (brasões) etc. Os métodos para ordenar os
dados obtidos e quantificá-los derivam basicamente da estatística. Em casos mais
precisos de datação, o historiador recorre a meios químicos, físicos e geológicos, assim
como a técnicas complexas baseadas no conhecimento do tempo de desintegração de
certos isótopos radiativos.
Segundo o período considerado, o historiador utiliza umas ou outras ciências
auxiliares. Para o especialista em história antiga serão necessárias a arqueologia, a
epigrafia, a numismática e a papirologia. A heráldica e a diplomática -- estudo dos
documentos -- além da paleografia e da filologia, serão fundamentais para um
medievalista etc.
A lingüística (para a antiguidade, período medieval e primeiros séculos da idade
moderna) constitui disciplina indispensável para o historiador, como a psicologia,
embora os resultados desta sejam menos seguros e sua aplicação científica
relativamente nova. A psicologia histórica permaneceu confundida com a intuição
pessoal do historiador, até a segunda metade do século XIX. Só no final do século XX a
"história das mentalidades" começava a libertar-se de simplificações arbitrárias e de
etnocentrismos.

MÓDULO IX...................................................................................................63
A geografia histórica evoluiu, sobretudo a partir das últimas décadas do século
XIX, para disciplina autônoma. Foi muito renovada pelas pesquisas que comprovaram
alterações climáticas significativas no período geológico atual, em diversas épocas e
partes do mundo. Embora uma justificada desconfiança cerque a utilização da
geopolítica, devido às distorções de autores nazistas, é inegável sua necessidade para a
compreensão da história.
A relação estabelecida entre as ciências humanas e a história é evidente, já que
essas disciplinas, em sua referência ao estudo do passado e dos antecedentes dos fatos
que analisam, aproximam-se necessariamente do método histórico, qualquer que este
seja. A história proporciona uma visão temporal e abrangente que é imprescindível para
entender as situações específicas estudadas pela sociologia ou pela psicologia. A
relação entre história e arte é particularmente indissolúvel.
HISTORIOGRAFIA
Historiografia é o estudo das obras históricas realizadas ao longo do tempo e em
todas as culturas. Embora as tradições orais tenham subsistido em muitos casos, a
historiografia concentra-se nas obras escritas com a intenção de apresentar uma
informação sobre os fatos passados.
O texto histórico mais antigo que se conservou é a pedra de Palermo (cerca de
2500 a.C.), que registra as datas dos reinados dos faraós egípcios e seus feitos mais
destacados. A historiografia hebraica, particularmente relevante, concentra-se nos livros
do Antigo Testamento, redigidos em épocas diferentes, e mais tarde na obra de Flávio
Josefo.
ANTIGUIDADE CLÁSSICA. Os primeiros escritores gregos compuseram poemas
épicos; redigiram-se depois genealogias em verso e, com as conquistas e expedições
colonizadoras, muitos viajantes começaram a expressar por escrito suas experiências no
contato com outros lugares e culturas. Heródoto foi o primeiro historiador cuja obra
sobreviveu. Embora os historiadores e geógrafos gregos não tivessem uma idéia clara
do progresso de sua própria cultura no tempo, deram à história um sentido
universalista, ao estender o âmbito de sua observação a diferentes culturas. Tentaram
desse modo criar uma história abrangente e geral, distinta da tradição oriental, mais
antiga porém mais limitada localmente. De outro lado, procuraram desligar a lenda do
fato histórico, como fez Tucídides, que se esforçou em buscar as causas dos
acontecimentos para tentar extrair deles lições práticas. A primeira história geral do
mundo helênico foi escrita por Éforo. Em Anábasis (Volta), Xenofonte relatou em
minúcias a célebre expedição grega dos 12.000 em território persa. Políbio, autor de
uma história com perspectiva universal, foi considerado o último dos grandes
historiadores gregos. Diodoro da Sicília redigiu biografias comparadas que
prenunciavam as Vidas paralelas de Plutarco, de grande influência na Europa, que
apresenta uma visão moralizante da história, semelhante às de Tito Lívio e Tácito.
Os primeiros registros históricos dos romanos limitaram-se à compilação de anais.
Em períodos posteriores destacaram-se a obra de Júlio César, como modelo de história
militar, e a de Salústio, por sua imparcialidade e documentação, embora com
inexatidões. Tito Lívio, Tácito e Suetônio deram testemunho da qualidade moral e do
gosto pelas biografias exemplares, de realces psicológicos, que tiveram grande
influência no Renascimento.
CRISTIANISMO E IDADE MÉDIA. O cristianismo sentiu necessidade de
apresentar argumentos em defesa da fé e de fixar por escrito os dogmas. Adotando o
Antigo Testamento como relato histórico fundamental, os primeiros cristãos explicavam
o passado e deduziam os desígnios divinos como origem e motor dos acontecimentos.
Elaboraram também uma cronologia e, nos Atos dos Apóstolos, Lucas tentou fazer um

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relato histórico sobre os primeiros seguidores de Jesus Cristo. Na Crônica, Eusébio de
Cesaréia escreveu uma história de caráter geral que serviu de modelo durante a Idade
Média, como mostra, por exemplo, a Grande e general estoria de Afonso X o Sábio, rei
de Castela e Leão. Em De civitate Dei (A cidade de Deus), santo Agostinho escreveu o
que já se pode considerar uma filosofia cristã da história.
A historiografia medieval teve três correntes principais: a cristã ocidental, a
bizantina e a muçulmana. Na primeira, além dos já mencionados, convém recordar a
história profana das crônicas ligadas aos feitos de um monarca ou de uma dinastia. Os
historiadores bizantinos aliaram a tradição grega à cristã. Entre eles, destacaram-se
Prisco, Procópio, Nicetas e outros. De sua parte, o historiador muçulmano Ibn Khaldun
procurou pesquisar as causas do nascimento das culturas, segundo uma concepção
cientificista ausente nas crônicas cristãs.
HISTORIOGRAFIA MODERNA. A recuperação do passado greco-romano pelo
Renascimento possibilitou uma secularização dos historiadores, que se afastaram da
teologia em seus estudos, embora tenham recebido o conteúdo moralizante dos
autores latinos, tal como aparece em Maquiavel, Francesco Guicciardini ou Jean Bodin.
O conceito da antiguidade clássica como idade de ouro predominou na idéia dos ciclos
históricos e alimentou um extraordinário gosto pelas coisas antigas. Lorenzo Valla e
Jerónimo de Zurita y Castro realizaram estudos históricos mais rigorosos, por
verificarem as fontes, e, como conseqüência do descobrimento do Novo Mundo, alguns
historiadores ampliaram o estudo das sociedades humanas (Bartolomé de Las Casas,
Bernal Díaz Del Castillo, Pedro de Cieza de León etc.). As disputas entre católicos e
protestantes também foram enriquecedoras, pois apresentaram novos argumentos
baseados em fontes históricas utilizadas pela primeira vez, como os arquivos do
Vaticano (os Annales ecclesiastici católicos em oposição às Centúrias de Magdeburgo
protestantes).
A pesquisa histórica sobre os gregos prosseguiu nos séculos XVII e XVIII,
revelando interesse também pela história escrita no Oriente. A crítica textual de
documentos ofereceu novo material crítico.
Voltaire publicou as primeiras obras historiográficas modernas, entre elas Le Siècle
de Louis XIV (1751; O século de Luís XIV), reagindo contra o uso da história como
mero registro de acontecimentos políticos. A revolução francesa levou à criação do
primeiro arquivo histórico nacional, permitiu acesso à documentação da nobreza e da
Igreja e propiciou o nascimento do nacionalismo histórico. A esse nacionalismo uniu-se
o culto da Idade Média pelos historiadores do romantismo, como Jules Michelet ou
François Guizot. O século XIX assistiu ao crescente desenvolvimento da historiografia
alemã. Com Wilhelm von Humboldt, a Universidade de Berlim, criada em 1810,
transformou-se na grande instituição para os estudos históricos, que se desenvolveram
também nos outros países europeus e na América, até se conseguir uma grande
pluralidade de opções e um aperfeiçoamento notável das técnicas de pesquisa histórica.
Ao longo do século XIX, chamado "o século da história", os países europeus
fomentaram o estudo e o ensino da história, ao compreender a importância dessa
disciplina para a formação do sentimento nacional. Os governos utilizaram documentos
e pesquisas históricas para justificar reivindicações territoriais ou aspirações
hegemônicas. A formação metodológica passou a ser a característica fundamental do
professor e do pesquisador da história. A figura do historiador profissional estendeu-se
da Alemanha aos demais países da Europa, aos Estados Unidos, à América Latina e a
outras partes do mundo.
Do último terço do século XIX à segunda década do século XX desenvolveu-se a
tendência positivista no campo da historiografia. Seguindo métodos racionalistas, os

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historiadores concentraram-se na realização de sínteses históricas que permitiam
integrar em perspectivas de caráter geral a análise de extensas documentações. O
estudo da história cindiu-se em várias ramificações (história geral, econômica, social,
cultural etc.) e os fatores econômicos e quantitativos, freqüentemente analisados a
partir das premissas do marxismo, ganharam espaço cada vez maior nos trabalhos
históricos, sobretudo na segunda metade do século XX. O intercâmbio bibliográfico, os
congressos internacionais, a publicação de revistas e os trabalhos de colaboração entre
diversos países contribuíram para aproximar as propostas metodológicas das escolas
historiográficas nacionais.
HISTORIOGRAFIA NO BRASIL. Depois da carta de Pero Vaz de Caminha,
principal relato testemunhal do descobrimento do Brasil, as primeiras crônicas só foram
escritas em fins do século XVI. As cartas-relatório dos jesuítas e os documentos
informativos de outras ordens religiosas constituem valioso acervo documental, assim
como as crônicas propriamente ditas, como as de Fernão Cardim e Gabriel Soares de
Sousa. Nos três primeiros séculos que se seguiram ao descobrimento só foram escritas
três histórias do Brasil: a de Pero de Magalhães Gândavo, Tratado da terra do Brasil, só
publicado em 1826; a de frei Vicente do Salvador, das três a mais valiosa, concluída em
1627, porém inédita até 1887; e a de Sebastião da Rocha Pita, História da América
Portuguesa (1730).
Coube ao inglês Robert Southey escrever uma History of Brazil (1810-1819), obra
a que se deve o início de nova fase historiográfica para o Brasil. Com História geral do
Brasil, antes de sua separação e independência de Portugal (1854-1857), Francisco
Adolfo de Varnhagen renovou o conhecimento do passado do país, ao pesquisar
arquivos brasileiros, portugueses, espanhóis e de outros países.
Coube a João Capistrano de Abreu orientar toda uma geração de historiadores
para a pesquisa erudita, sobretudo para a crítica de relatos e crônicas do período
colonial. Rodolfo Garcia deu prosseguimento a sua obra e iniciou a importante série dos
"Documentos históricos", da Biblioteca Nacional.
O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, fundado em 1838, desempenhou um
papel decisivo na historiografia nacional, com a publicação de revistas e documentos de
grande significação histórica. Só recentemente a historiografia brasileira deixou de
consagrar-se preponderantemente à história política, e passou a abarcar uma
apreciável gama de trabalhos de história econômica e demografia histórica.
HISTÓRIA GERAL
PARTE 2
PRÉ-HISTÓRIA
Pré-história é o termo empregado para designar o período da história da
humanidade anterior ao aparecimento de testemunhos escritos. Nas sociedades sem
escrita, apenas a tradição oral conservava os traços do passado: os relatos eram
transmitidos, oralmente, de geração à geração, o que supõe uma enorme capacidade
de memorização por parte dos membros dessas sociedades. A narrativa memorialista
acompanha o desaparecimento da sociedade que a conservava. A arqueologia passa a
constituir o único meio para a reconstrução da natureza e dos acontecimentos da pré-
história.
A arte pré-histórica, aquela que floresceu antes da existência da escrita, suscita
um sem número de especulações entre os estudiosos de hoje. A partir dela,
normalmente é realizado o estudo dos povos primitivos. A compreensão do tipo de
experiências daqueles povos é imprescindível para analisar a arte do período.
Além dos problemas de falta de informações sobre a época, uma outra dificuldade
é tentarmos compreender os tipos de pensamento dos homens de então, estritamente

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relacionado à arte produzida. Por exemplo, é quase certo que tivesse sido uma arte
fundamentalmente criada para servir a propósitos definidos.
Os objetivos de tais propósitos são os que inquietam os pesquisadores
(antropólogos e historiadores em geral). Uma das hipóteses existentes é de que existia
a crença de que a reprodução de uma imagem (como um animal a ser caçado), podia
trazer algum poder especial sobre ela (talvez aí se encontre os primórdios da reverência
a imagens, tão presentes nas culturas posteriores). O uso mágico das habilidades
criativas humanas no período é uma especulação bem aceita entre os pesquisadores.
De qualquer forma, a relação entre a arte produzida e o que esta significava para o
grupo de homens ou a tribo a ela relacionada parece ser a chave para sua
compreensão.
IDADE DA PEDRA
Idade da Pedra é a fase mais antiga da cultura humana, na qual os utensílios
utilizados eram fabricados com pedras, ossos, chifres de cervos ou madeira. O termo
‘Idade da Pedra’ engloba quase toda a existência do homem, uma vez que têm início na
época das peças mais antigas encontradas pela arqueologia e termina, em algumas
regiões do mundo, como Austrália e Polinésia, há somente dois séculos, quando o uso
do metal (marco que delimita o final da Idade da Pedra) foi difundido pelos europeus.
Em meados do século XIX, os estudiosos definiram que o homem viveu em
tempos remotos simultâneamente a uma série de animais extintos. Determinaram que
as pedras que, em séculos anteriores, se denominavam ‘pedras do raio’ eram artefatos
humanos antigos e que a época da pedra talhada precedia, no registro arqueológico, a
da pedra polida, embora desconhecendo a extensão ou duração do período. A Idade da
Pedra, que precede a Idade do Bronze e a Idade do Ferro foi posteriormente
subdividida, pelo naturalista e político britânico John Lubbock, em distintas fases e, em
1865, foram cunhados os termos ‘paleolítico’ (do grego paleo, ‘antigo’ e lithos; ‘pedra’)
e ‘neolítico’ (de neo, ‘novo’) para definir os períodos da pedra talhada e polida
respectivamente.
A Idade da Pedra foi o tempo em que os homens pré-históricos usavam este
material para a fabricação de ferramentas, armas e utensílios domésticos. Esta é a
primeira Idade na divisão que os estudiosos fizeram para definir a evolução do homem
na pré-história, sendo que a Idade do Bronze e do Ferro são, respectivamente, suas
sucessoras. Consta que a Idade da Pedra começou quando o homem descobriu grandes
qualidades neste material resistente, e seguiu-se por muito tempo, até o início da Idade
do Bronze com uso de metais como estanho e cobre. Não se pode definir uma data
para o início do uso da pedra em todo o mundo, pois isso dependia principalmente do
avanço dos diferentes agrupamentos humanos que habitavam a Terra. Por causa de
mudanças drásticas no clima e na cultura humana durante a Idade da Pedra, e para
melhor poder estudá-la, esta era foi dividida em três períodos, chamados Paleolítico,
Mesolítico e Neolítico.
No período Paleolítico, que também é conhecido como Antiga Idade da Pedra por
ser o primeiro dos três, os homens começaram a utilizar a pedra para abater e preparar
sua caça. Armas e instrumentos eram fabricados com lascas de pedra, que possuíam
um poder de corte até então desconhecido pelos humanos. Com o tempo, houve um
aumento na diversificação destes instrumentos, que ganharam funções cada vez mais
específicas e foram gradativamente aperfeiçoados. Os homens passaram a fazer
ferramentas com pedra e ossos de animais e já no final deste período, foram fabricadas
armas avançadas como arpões para caça e pesca. Na fabricação de armas, diferentes
tipos de pedra eram quebradas ou cortadas em lascas, tornando-se mais fortes ou mais

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pontiagudas para melhor servir à sua proposta de massacrar, cortar ou rasgar
alimentos e animais.
O desenvolvimento da manufaturação de armas e diversos instrumentos feitos em
pedra continuou rapidamente através dos tempos. No período Mesolítico, utensílios
cortantes e cada vez mais aperfeiçoados foram adaptados às novas necessidades
humanas, pois o clima estava cada vez mais ameno com o fim da Era Glacial. Com esta
mudança climática a comida tornou-se muito mais abundante, uma vez que a vida
animal florescia com o calor. A caça e a pesca tornaram-se o meio principal para a
subsistência do homem e armas direcionadas para este tipo de atividade foram
desenvolvidas a partir dos modelos antigos. Grãos, vegetais e frutas diversas passaram
a ser preparadas com utensílios que os trituravam ou fatiavam, transformando-os em
farinha ou facilitando a sua digestão. Com a chegada do período Neolítico, estes
utensílios aperfeiçoados começaram a ser utilizados na agricultura, mudando
completamente os hábitos nômades dos seres humanos que antes migravam de um
lado para outro procurando comida. As pedras eram cuidadosamente partidas ou
esculpidas em forma de lança, sendo polidas em seguida e, às vezes, até ganhando um
pequeno desenho serrilhado em sua lateral. Elas eram acopladas a cabos feitos com
ossos ou madeira, transformando-se em lanças poderosas para a caça. Quando o
homem chegou na Idade da Pedra Lascada, ele já produzia vasos em cerâmica e
começava a descobrir a utilidade dos metais que, anos mais tarde, viriam substituir a
pedra.
A evolução na técnica de fabricação de utensílios de pedra ao longo da pré-
história permitiu estudar e classificar as culturas humanas da idade da pedra. O
conhecimento desse período, no entanto, não tem por base apenas os instrumentos
produzidos pelo homem, mas também a análise dos restos de hominídeos fósseis, de
animais e plantas, de artigos de osso e cerâmica, de pinturas e outros objetos
artísticos.
Idade da pedra é o estágio cultural inicial do desenvolvimento humano,
caracterizado pelo uso de instrumentos rudimentares feitos de lascas de pedra. Fase
inicial da pré-história, divide-se em duas grandes etapas: o paleolítico, ou idade da
pedra lascada, e o neolítico, ou idade da pedra polida. Do ponto de vista cronológico,
estende-se desde a aparição dos primeiros utensílios que o homem fabricou, até a
idade dos metais, quando a técnica de trabalhar a pedra foi substituída pela do metal.
IDADE DOS METAIS
O emprego pelo homem pré-histórico de materiais como o bronze e o ferro, que
deram nome ao período conhecido como idade dos metais, e o abandono gradual dos
instrumentos de pedra representaram um importante salto qualitativo no processo
cultural.
Chama-se idade dos metais o período caracterizado pela generalização do uso de
instrumentos metálicos. No sistema proposto no século XIX por arqueólogos
escandinavos, a pré-história pode ser ordenada em estágios sucessivos de
desenvolvimento tecnológico, segundo os instrumentos empregados. Assim, à idade da
pedra se segue a idade dos metais, que abrange as idades do bronze e do ferro. No
entanto, o conhecimento dos metais não ocorreu simultaneamente nas diferentes
regiões do mundo antigo. Na Grécia, por exemplo, a idade dos metais começou antes
de 3000 a.C., enquanto na China isso se deu por volta de 1800 a.C.
ORIGENS. O período de transição entre o neolítico (fase da pedra polida) e a
idade do bronze é comumente denominado calcolítico, ou idade do cobre. Embora
inicialmente raro, o cobre já era utilizado no leste da Anatólia, e seu uso logo se

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generalizou. A necrópole pré-hitita de Alaca ostenta estatuetas de cervos e touros de
cobre, além de numerosas peças de ourivesaria e joalheria.
Mais ou menos em 3500 a.C., o rápido desenvolvimento da metalurgia contribuiu
para a urbanização na Mesopotâmia. Por volta de 3000 a.C., o uso do cobre, já comum
no Oriente Médio, começou a atingir as culturas neolíticas do continente europeu. Foi
usado na Hungria e na Espanha, regiões ricas em minérios desse metal, e difundido na
Europa por tribos nômades. Entretanto, foi o bronze; liga de cobre e estanho,
introduzido por artesãos vindos da Ásia em busca de estanho, que revolucionou a
Europa. Em pouco tempo, floresceu na Europa central, na Espanha e na Inglaterra a
idade do bronze, enriquecida pelo intercâmbio com Creta.
IDADE DO BRONZE
A Idade do Bronze é o período da história, posterior ao neolítico, referente ao
desenvolvimento da cultura material humana, anterior ao uso do ferro, no qual a maior
parte dos utensílios e armas eram fabricados em bronze. Cronologicamente o termo
tem valor relativo, já que o emprego do bronze teve início em distintas épocas e
lugares do mundo, sendo substituído pelo ferro. Acreditava-se que a sua descoberta
tivera origem no Oriente Médio; no entanto, jazidas próximas a Ban Chiang (Tailândia)
demonstram que sua utilização já era conhecida, desde 4500 a.C., data que precede
em centenas de anos o emprego do bronze no Oriente Médio.
2500 AC - 1000 AC - Idade do Bronze em Creta
O grande desenvolvimento comercial marítimo empreendido em Creta foi
possibilitado, inicialmente, através de sua privilegiada posição geográfica, em que a
península era uma porta aberta ao mar que possibilitava grande comunicação entre
diversas regiões européias mediterrâneas e também entre a região norte-africana.
Decorrente do avanço das atividades comerciais e da economia em crescimento, nesta
região estabeleceu-se logo uma rica cultura, em que as artes desenvolviam
grandemente, marcando o início de uma tradição cultural que desenvolveu-se a ponto
de influenciar as culturas ocidentais posteriores. A cultura da época tem dois registros
escritos de grande importância, estudados na contemporaneidade: os chamados linear
A e B, dos quais o segundo apresenta um incipiente e antigo dialeto grego e o primeiro
permanece indecifrado. Tanto as regiões gregas e regiões da chamada Ásia Menor,
tendo o famoso exemplo da cidade de Tróia, preservaram seus elementos culturais até
por volta de 1200 a. C.
A chamada Idade do Bronze teve início nestas regiões descritas, tendo sido
possibilitada também através dos avanços comerciais e econômicos.
O calcolítico pode ser considerado como parte da idade do bronze, mas essa liga
foi muito raramente utilizada no período. A idade do bronze se desenvolveu de fato
entre 4000 e 2000 a.C. Na Europa, estendeu-se até o século XII a.C., quando os
grandes movimentos celtas para lá levaram o conhecimento do ferro.
Por volta de 2000 a.C., Biblos, porto da costa fenícia de influência egípcia, era
importante centro metalúrgico do bronze. Ali foram encontrados sarcófagos de reis
vassalos ou aliados dos faraós da XII dinastia, com vasos de prata, harpas de bronze,
facas e punhais. Em Ugarit (Ras-Shamra), ao norte da Síria, o emprego do bronze,
introduzido no fim do terceiro milênio, difundiu-se muito rapidamente e alcançou o
apogeu na época do novo império egípcio e da expansão miceniana na Síria.
Em 1500 a.C. aproximadamente, a metalurgia florescia na Europa, onde espadas,
pulseiras e grampos eram às vezes trabalhados com técnicas artísticas. O motivo
predominante nas obras da idade do bronze era a espiral, e na Alemanha e na
Escandinávia a ela se acrescentaram as estilizações de animais, principalmente o cisne.

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A divisão cronológica da idade do bronze provocou bastante polêmica, devido à
presença de culturas diversas em territórios muito diferentes. Finalmente, os estudiosos
decidiram estabelecer três fases: bronze antigo, médio e recente.
Nas culturas do mar Egeu, o bronze, o estanho, o ouro e a prata generalizaram-se
na última metade do terceiro milênio nos vasos e na joalheria. Em Creta e nas Cíclades,
o bronze antigo vai de 2700 a 2100 a.C. e, no continente, de 2500 a 1900 a.C.
O bronze médio, que se estende até 1600 a.C., tem início em 2700 a.C. em Creta,
e no ano 2000 a.C no continente. Durante esse período, as artes do metal apresentam
grande progresso em termos de dimensão das armas e de abundância de vasos e
utensílios de bronze. Do bronze recente, que vai de 1600 a 1200 a.C., restaram vários
depósitos de armas e objetos.
IDADE DO FERRO
Idade do ferro é o período da antigüidade durante o qual o ferro substituiu o
bronze como matéria prima na fabricação de instrumentos e armas. O termo Idade do
Ferro refere-se ao período compreendido entre o fim da Idade do Bronze (c. 700 a.C.) e
a expansão do Império Romano (27 a.C.-68 d.C.), isto é, a última fase da pré-história
européia antes da cultura romana trazer a alfabetização e impor uma forma de vida
radicalmente nova. Em regiões da Europa, nas quais as legiões romanas nunca
chegaram (Escandinávia, Alemanha Central ou zonas mais remotas da Grã-Bretanha), a
Idade do Ferro continuou durante todo o período do Império romano. Na China, a
Idade do Ferro começou por volta do ano 600 a.C; na África subsahariana, por volta do
ano 500-400 a.C, e na África do Sul no 200 d.C.
A Idade do Ferro foi um período onde os humanos de todo o mundo começaram a
aprender a extrair e derreter este metal para fabricar armas, ferramentas e utensílios.
Este período é uma das Eras ou Idades em que os estudiosos no assunto dividiram a
pré-história dos humanos, de acordo com a evolução dos mesmos. Seqüencialmente,
existe a Idade da Pedra, a do Bronze e a do Ferro, cujas denominações indicam o tipo
de material usado pelos homens para construir suas ferramentas. Não se sabe
exatamente onde e quando o ferro começou a ser explorado pelos humanos, uma vez
que isso aconteceu em diferentes épocas, dependendo do avanço técnico de cada
povo. A técnica de derretimento do ferro é mais complicada do que a de outros
minérios como o estanho e o cobre e requer vários estágios para que o metal fique
puro, sem fragmentos de pedras. Objetos feitos com ferro fundido datados de 3000
a.C. foram encontrados no Egito, mas sabe-se que os Hititas só o descobriram por volta
de 1900 a.C. e, durante o seu império, aprenderam a aperfeiçoar as técnicas de
fundição e uso deste minério. Nesta época, os Hititas espalharam seu conhecimento
avançado no manuseio do ferro por toda a Europa e região do Mar Mediterrâneo,
marcando definitivamente o fim da Idade do Bronze para muitos povoados locais.
Cerca de novecentos anos mais tarde, a indústria do ferro já movimentava
centenas de pessoas que migravam de seus povoados para trabalhar na extração do
minério. A produção em massa de utensílios de ferro trouxeram pessoas da Ásia para a
Europa e vice-versa, iniciando o uso deste minério na Grécia e norte da Itália. Por volta
do ano 600 a.C., foi a vez de os chineses aprenderem a usar este material e, pouco
tempo depois, eles desenvolveram fornos de fundição tecnicamente superiores aos
europeus, que só começaram a usá-los na Idade Média. Estes fornos produziam um
ferro de altíssima qualidade, muito mais puro do que já se havia visto. Com um material
resistente, os chineses começaram a fabricar armas, como machados e espadas, e
utensílios como enxadas e foices, que os ajudaram a desenvolver ainda mais sua
agricultura, revolucionando seus campos de plantações. O uso do ferro foi, ao longo
dos anos, se espalhando pelo mundo, chegando na África por volta de 400 a.C. e

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tornando-se conhecido dos Celtas por volta de 450 a.C.. Na América, porém, não se
tem conhecimento do uso deste material antes da chegada dos europeus.
A produção em grande escala de utensílios de ferro permitiu novas formas de
ocupação sedentária da terra. Por outro lado, a utilização do metal na fabricação de
armas permitiu que pela primeira vez as populações se armassem e promovessem
movimentos que, durante os dois mil anos seguintes, mudaram a face da Europa e da
Ásia.
A idade do ferro européia tem sido dividida em duas etapas diferentes, conhecidas
pelo nome de dois importantes sítios arqueológicos: o Hallstatt, na Áustria, e o La Tène,
na Suíça.
CULTURA HALLSTATT. A primeira idade do ferro, ou cultura Hallstatt, se
desenvolveu entre os séculos XI e V a.C. e representou o primeiro florescimento da
cultura dos celtas. Teve origem nas regiões central e ocidental da Europa, onde se
encontraram mais de dois mil túmulos, em escavações realizadas no fim do século XVII.
A maior parte desses túmulos se classifica em dois grupos, relativos a uma fase
inicial (1050 a 750 a.C.) e uma final (750 a 450 a.C.). Perto do cemitério havia uma
mina pré-histórica de sal e, devido à capacidade de preservação do sal, conservaram-se
implementos, partes de vestimentas e até mesmo os corpos dos mineiros.
Os resquícios encontrados em Hallstatt são geralmente divididos em quatro fases
(A, B, C e D), embora haja controvérsia entre estudiosos sobre sua delimitação. Na fase
A, o ferro era raro e somente na fase C seu uso se generalizou. Entre os muitos objetos
de ferro dessa terceira fase, encontraram-se longas e pesadas espadas de ferro e
bronze com ponteiras floreadas, além do machado Hallstatt. A fase D, de que não há
vestígios na região leste da Áustria, durou até o surgimento da cultura La Tène em
outras áreas.
A arte Hallstatt é rigidamente geométrica em termos de estilo e evoluiu muito
mais em termos técnicos que estéticos. Há uma tendência generalizada para o
extravagante, e os motivos decorativos são preferencialmente simétricos.
CULTURA LA TÈNE. O segundo período do ferro europeu, chamado cultura La
Tène, teve início em meados do século V a.C., quando os celtas entraram em contato
com as influências gregas e etruscas do sul dos Alpes e se expandiram pela maior parte
do norte da Europa e das ilhas britânicas. A cultura La Tène marca o apogeu da cultura
dos celtas e se estende até o século I a.C., quando eles perderam sua independência
para os romanos.
IDADE MÉDIA
INTRODUÇÃO
Idade Média é o termo utilizado para fazer referência a um período da história
européia, que vai da desintegração do Império Romano do Ocidente, no século V, até o
século XV.
No final do século V, o término de uma série de processos de longa duração, entre
eles o grave deslocamento econômico e as invasões e os assentamentos dos povos
germanos no Império Romano, transformou a face da Europa.
Durante esse período não existiu realmente um mecanismo de governo unitário
nas diversas entidades políticas, embora tenha ocorrido a formação dos reinos. O
desenvolvimento político e econômico era fundamentalmente local, e o comércio
regular desapareceu quase totalmente. Com o fim de um processo iniciado durante o
Império Romano, os camponeses começaram seu processo de ligação com a terra e de
dependência dos grandes proprietários para obter proteção. Essa situação constituiu a
semente do regime senhorial. Os principais vínculos entre a aristocracia guerreira foram

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os laços de parentesco, embora também tenham começado a surgir as relações
feudais.
A única instituição européia com caráter universal era a Igreja, mas dentro dela
também ocorreu uma fragmentação na autoridade. Em seu núcleo havia tendências
que desejavam unificar os rituais, o calendário e as regras monásticas, opostas à
desintegração local.
No século IX, a chegada ao poder da dinastia Carolíngia significou o início de uma
nova unidade européia baseada no legado romano.
A atividade cultural durante o início da Idade Média consistiu principalmente na
conservação e sistematização do conhecimento do passado.
Essa primeira etapa da Idade Média foi encerrada no século X com a segunda
migração germânica e as invasões protagonizadas pelos vikings, procedentes do norte,
e pelos magiares das estepes asiáticas.
Idade Média é o Período da história européia compreendido entre a queda do
Império Romano do Ocidente, no século V, e a afirmação do capitalismo sobre o modo
de produção feudal, o florescimento da cultura renascentista e os grandes
descobrimentos.
Chama-se Idade Média o período da história européia compreendido
aproximadamente entre a queda do Império Romano do Ocidente e o período histórico
determinado pela afirmação do capitalismo sobre o modo de produção feudal, o
florescimento da cultura renascentista e os grandes descobrimentos. A civilização
medieval foi, em essência, a síntese de três elementos: o legado da antiguidade greco-
latina, a contribuição dos povos germânicos e a religião cristã. O império bizantino e a
civilização muçulmana na península ibérica constituem os limites geográficos e culturais
mais claros entre os quais transcorreu essa longa fase histórica. Do ponto de vista
cronológico, essas civilizações também tiveram sua Idade Média, durante a qual
viveram processos de características próprias.
A Idade Média européia divide-se em duas etapas bem distintas: a alta Idade
Média, que vai da formação dos reinos germânicos, a partir do século V, até a
consolidação do feudalismo, entre os séculos IX e XII; e a baixa Idade Média, que vai
até o século XV, caracterizada pelo crescimento das cidades, a expansão territorial e o
florescimento do comércio.
A ALTA IDADE MÉDIA
Até a metade do século XI, a Europa se encontrava em um período de evolução
desconhecido até esse momento. A época das grandes invasões havia chegado ao fim e
o continente europeu experimentava o crescimento dinâmico de uma população já
assentada. Renasceram a vida urbana e o comércio regular em grande escala. Ocorreu
o desenvolvimento de uma sociedade e uma cultura complexas, dinâmicas e
inovadoras.
Durante a Alta Idade Média, a Igreja Católica, organizada em torno de uma
hierarquia estruturada, com o papa como o ápice indiscutível, constituiu a mais
sofisticada instituição de governo na Europa Ocidental. As ordens monásticas cresceram
e prosperaram participando ativamente da vida secular. A espiritualidade da Alta Idade
Média adotou um caráter individual, pelo qual o crente se identificava de forma
subjetiva e emocional com o sofrimento humano de Cristo.
Dentro do âmbito cultural, houve um ressurgimento intelectual com o
desenvolvimento de novas instituições educativas como as escolas catedráticas e
monásticas. Foram fundadas as primeiras universidades; surgiram ofertas de graduação
em medicina, direito e teologia, além de ter sido aberto o caminho para uma época
dourada para a filosofia no ocidente.

MÓDULO IX...................................................................................................72
Também surgiram inovações no campo das artes. A escrita deixou de ser uma
atividade exclusiva do clero e o resultado foi o florescimento de uma nova literatura,
tanto em latim como, pela primeira vez, em línguas vernáculas. Esses novos textos
estavam destinados a um público letrado que possuía educação e tempo livre para ler.
No campo da pintura foi dada atenção sem precedentes à representação de emoções
extremas, à vida cotidiana e ao mundo da natureza. Na arquitetura, o românico
alcançou sua perfeição com a edificação de incontáveis catedrais ao longo de rotas de
peregrinação no sul da França e Espanha, especialmente o Caminho de Santiago,
inclusive quando começava a surgir o estilo gótico, que nos séculos seguintes se
converteu no estilo artístico predominante.
O século XIII foi o século das Cruzadas, defendidas pelo Papado para libertar os
Lugares Santos no Oriente Médio que estavam nas mãos dos muçulmanos. Essas
expedições internacionais foram mais um exemplo da unidade européia centrada na
Igreja, embora também tenham sido influenciadas pelo interesse em dominar as rotas
comerciais do oriente.

Reinos germânicos. A penetração e a fixação dos povos germânicos no território


do Império Romano deram lugar à formação de diversos reinos, a partir do início do
século V. A autoridade imperial deixou de existir no Ocidente no ano 476, com a
deposição de Rômulo Augústulo. A parte oriental do império, centrada em
Constantinopla (atual Istambul), assumiu a partir daí o legado político de Roma.
Os germânicos, ditos bárbaros pelos romanos, organizaram seus reinos dentro das
antigas fronteiras do império e em áreas que nunca tinham sido ocupadas pelos
romanos, como a Alemanha. Cada um desses reinos evoluiu de forma diferente para
dar lugar às monarquias européias medievais. Os ostrogodos instalaram-se na Itália,
conduzidos por Teodorico, e constituíram um dos reinos mais importantes dos séculos V
e VI. Teodorico, convertido ao arianismo, resolveu os conflitos com a população
romano-cristã mediante políticas tolerantes. Procurou elevar o nível cultural de seu
povo e aproximar-se da hierarquia eclesiástica. Além disso, aliou-se a outros reinos
bárbaros para enfrentar a intervenção do império bizantino. Manteve a tradição jurídica
e administrativa de Roma e estimulou o florescimento das artes e das letras.
No fim do século V, os francos fixaram as bases do que seria posteriormente um
dos reinos medievais mais poderosos da Europa. Convertido ao catolicismo, o rei Clóvis
I conseguiu o apoio da população da antiga Gália com uma política de fusão entre os
galo-romanos e os francos. Conseguiu impor-se a toda a Gália, expulsou os visigodos
para a Espanha no ano 507 e dominou os outros povos bárbaros, com exceção dos
burgúndios, que foram vencidos por seus sucessores. As únicas zonas da Gália que não
conseguiu dominar foram a Setimânia e a Provença.
Na península ibérica, os visigodos constituíram uma monarquia próspera e culta,
na qual se fundiram os traços germânicos e as tradições seculares romanas. A
monarquia visigoda esforçou-se para conquistar a unidade territorial e formar um
estado. A oposição da população hispano-romana ao arianismo foi o primeiro obstáculo
que ela teve de vencer. No século VI a monarquia visigoda chegou à plenitude com
Leovigildo, que estabeleceu a unidade territorial depois de vencer os suevos do
noroeste, os bascos do norte e os bizantinos do sudeste. Apesar disso, os problemas
religiosos só foram solucionados quando Recaredo reconheceu o cristianismo como sua
religião, no ano 587, abjurando o arianismo. A ocupação da península ibérica pelos
árabes no início do século VIII foi favorecida pelas lutas entre Rodrigo e Áquila. O
poder dos visigodos extinguiu-se em poucos anos e teve início uma nova etapa na
península e na Europa, com a expansão do Islã.

MÓDULO IX...................................................................................................73
Durante o século VI, o reino merovíngio dos francos sofreu constantes divisões
entre os sucessivos herdeiros da coroa. Essas fragmentações hereditárias do reino,
considerado como propriedade dinástica, foram a causa da sua estagnação política e
cultural. A monarquia debilitou-se em lutas internas, o que permitiu o fortalecimento
dos poderes locais e a intervenção dos lombardos da Itália. Essa situação se manteve
até o início do século VII, quando Dagoberto I impôs a unidade territorial que permitiria
o aparecimento de uma forte dinastia, a carolíngia.
Na Itália ocorreram acontecimentos importantes depois da conquista do reino
ostrogodo pelo imperador bizantino Justiniano I, em meados do século VI. O império
bizantino alcançou, nessa época, seu apogeu político e cultural, e Justiniano I, ajudado
por seus generais Belisário e Narses, tentou reconquistar a parte ocidental do antigo
Império Romano e restabelecer a unidade do Mediterrâneo. Seus sucessores
enfrentaram problemas religiosos e incursões de ávaros, eslavos e persas, que foram
derrotados pelo imperador Heráclio no início do século VII. Os lombardos conquistaram
o norte da Itália em poucos anos, a partir de 568, e empreenderam o ataque ao reino
merovíngio. Bizantinos e lombardos dividiram entre si o território correspondente à
Itália. No fim do século VI, quase todo ele, com exceção de Roma, Sicília e Ravena,
estava sob domínio lombardo.
Na Grã-Bretanha, a invasão de anglos e saxões, em meados do século V, forçou
os bretões a se refugiarem na Cornualha, em Gales e na Escócia, ou a se submeterem
ao novo poder. Os anglo-saxões dividiram o território em sete pequenos reinos, que
lutaram para estabelecer sua hegemonia sobre o sul da ilha.
Os reinos surgidos no Ocidente deram nova fisionomia à Europa, mas não
desapareceu totalmente a tradição que Roma havia legado. Em muitos casos,
principalmente nos lugares mais romanizados, foram mantidos a ordem e o direito
romanos, combinados com contribuições dos costumes jurídicos dos povos germânicos.
A religião, junto com as características de cada um desses povos, foi o principal
elemento de coesão dos novos reinos do oeste europeu, e uma das causas de seu
distanciamento dos bizantinos, cujo cristianismo tinha aspectos peculiares.
Quando desapareceu o poder do império no Ocidente, a Igreja arrogou-se a
supremacia universal. O papa foi reconhecido como a autoridade máxima a que deviam
se submeter os poderes temporais. Assim, a hierarquia eclesiástica de Roma
representou o fator aglutinante das monarquias ocidentais. A progressiva conversão
dos bárbaros ao cristianismo fez da Igreja a instituição mais importante da Idade
Média. A cultura, a arte, a ciência e as letras eram patrimônio eclesiástico. Nos
mosteiros, os monges realizaram um cuidadoso trabalho de compilação dos textos
clássicos e dos escritos teológicos dos padres da Igreja.
A constituição das monarquias européias e do poder temporal do papa favoreceu
o distanciamento político e religioso entre a Europa e o império bizantino. O papado,
assediado pelos lombardos, tinha pedido ajuda a Constantinopla, mas os imperadores
orientais, ocupados com a discussão sobre a veneração das imagens e preocupados
com a pressão do Islã em suas fronteiras, desinteressaram-se dos assuntos do
Ocidente. Os papas se viram obrigados, então, a recorrer ao reino franco, que se
consolidara como principal poder na região. Pepino o Breve destronou os merovíngios e
foi reconhecido como rei pelo papa Estêvão II.
Os francos deram apoio militar ao papado e em pouco tempo venceram os
lombardos. Os territórios que até então estavam sob domínio dos lombardos passaram
ao controle do papa, o que deu origem aos estados pontifícios. Para justificar a cessão
desses territórios e a autoridade papal como poder temporal sobre eles, recorreu-se à
Doação de Constantino, documento forjado pelo qual esse imperador teria transferido

MÓDULO IX...................................................................................................74
ao papa Silvestre I e a seus sucessores a autoridade sobre certos territórios no
Ocidente.
Época carolíngia. A dinastia carolíngia, como sucessora da merovíngia, revelou-se
capaz de estender sua influência à maior parte da Europa ocidental. Pepino o Breve
dedicou-se a ampliar os limites de seu reino, com o que a Gália se tornou a partir de
então uma unidade territorial regida por uma coroa única, mas foi seu filho e sucessor,
o futuro imperador Carlos Magno, quem levou o reino dos francos a seu período de
glória.
Os sucessivos ataques dos lombardos na Itália levaram o papa Adriano I a pedir
ajuda a Carlos Magno que, no ano 774, conseguiu vencê-los e reclamou para si o título
de rei desse povo. A Itália passou à esfera política dos francos. As campanhas militares
de Carlos Magno continuaram por muitos anos, durante os quais ele derrotou saxões,
frisões, bávaros e ávaros. Também estabeleceu um sistema de controle e tributação
sobre os povos eslavos residentes nas fronteiras de seu reino e conteve a expansão do
Islã ao sul dos Pireneus.
Carlos Magno foi proclamado defensor da cristandade européia e da Igreja, e
todos os demais reinos reconheceram a superioridade do reino franco. O papa Leão III,
que precisava de apoio militar constante, coroou-o imperador no Natal do ano 800, e
ele foi aclamado pelo povo como "augusto". Com isso, Carlos Magno uniu sua força e
prestígio políticos ao título de imperador, até então reservado aos monarcas bizantinos
que, forçados pela situação crítica em que se encontravam, em guerra contra búlgaros
e árabes, reconheceram o título imperial do rei dos francos.
Durante o reinado do novo imperador do Ocidente, a Europa experimentou
notável desenvolvimento cultural, que se tornou conhecido sob o nome de
"renascimento carolíngio". Preocupado com a pouca cultura do clero e dos funcionários
imperiais, Carlos Magno mandou construir escolas nos mosteiros, catedrais e em sua
própria corte, sediada em Aachen (Aix-la-Chapelle). Criou a escola palaciana, onde
lecionavam as maiores personalidades da ciência e das letras.
A obra do imperador lançou a idéia da Europa como unidade religiosa e cultural.
Com sua morte, no ano 814, a coroa passou a seu filho Luís I o Piedoso. Entretanto, a
crescente influência da nobreza e a proliferação das relações feudais debilitaram a
monarquia e desestruturaram a unidade política. As lutas pela igualdade de herança e
pela divisão territorial entre os filhos de Luís I precipitaram a desagregação do império
fundado por Carlos Magno.
No ano 843, o Tratado de Verdun definiu as fronteiras dos reinos que couberam
aos filhos de Luís I: o de Lotário I, que também ficou com o título imperial, o de Luís o
Germânico e o de Carlos o Calvo. A tradição da divisão hereditária entre os sucessores
foi mantida por todos os reis carolíngios. Carlos III o Gordo, que tinha conseguido
reunir quase todos os territórios do império franco, abdicou no ano 887. Foram criados
então seis reinos independentes: França, Itália, o reino franco oriental (Alemanha),
Provença, Borgonha e Lorena.
Durante o século IX, os muçulmanos da Espanha constituíram uma força política
unificadora e expansionista. No norte foram fundados reinos cristãos que logo
estenderam seus territórios para o sul, com a Reconquista. Entretanto, a convivência
entre muçulmanos e cristãos predominou por vários séculos. A vida econômica reviveu
durante o período de domínio árabe, e as artes e ciências fizeram grandes progressos.
Nessa época, a Europa sofreu a invasão de uma segunda onda de povos bárbaros
vindos do norte, que agiram, segundo a ocasião, de forma pacífica ou agressiva.
Noruegueses, suecos e dinamarqueses, conhecidos como viquingues ou normandos,

MÓDULO IX...................................................................................................75
perpetraram ataques e invasões, sobretudo contra o litoral da Europa ocidental. Os
suecos, especialmente, visavam o domínio das rotas comerciais do Báltico e da Rússia.
A Irlanda sofreu, desde o ano 834, contínuos ataques dos noruegueses e, mais
tarde, na segunda metade do século IX, dos dinamarqueses, o que provocou a fuga de
numerosos monges para a França. Os ataques dos dinamarqueses se sucederam ao
longo do litoral continental, provocando graves danos ao império carolíngio, assim
como à Espanha, onde foram contidos tanto pelos muçulmanos como pelos reis cristãos
do norte. Os normandos penetraram no interior da Europa, chegaram a Paris e a outras
cidades do continente e fixaram-se no noroeste da França (Normandia) no ano 924. A
partir de meados do século IX, conquistaram o centro e o norte da Inglaterra. Os
suecos, navegando pelos rios Volga e Dnieper, estabeleceram contatos comerciais com
o império bizantino e com os árabes. Na Rússia, fundaram pequenos estados que
funcionavam como sedes de suas atividades comerciais. Kiev e Novgorod eram os mais
importantes.
No fim do século IX um novo povo atacou as fronteiras orientais da Europa: os
húngaros, ou magiares. Ocuparam rapidamente a região do Danúbio, de onde partiram
para incursões pela Itália, França e Alemanha. A desintegração do império carolíngio e
essa segunda onda de invasões deixaram o oeste europeu numa situação de grave
deterioração política e econômica até que, no século X, o estabelecimento do Sacro
Império Romano-Germânico restabeleceu a ordem na Europa central. Oto I o Grande,
coroado imperador no ano 962, encontrou forte apoio no papado e contribuiu, como
antes fizera Carlos Magno, para o fortalecimento da Igreja como poder temporal. Sua
vitória sobre eslavos e magiares transformou-o num novo defensor da cristandade
ocidental.
Na Inglaterra, Alfredo o Grande, rei de Wessex, ergueu fortificações e reconstruiu
o exército, com o que o reino pôde resistir à invasão dos dinamarqueses e aumentar
seu território. Entretanto, na primeira metade do século XI, o rei dinamarquês Canuto o
Grande conseguiu dominar toda a Inglaterra. Em 1066, os normandos do noroeste da
França, chefiados por Guilherme o Conquistador, invadiram a ilha. Desde então,
intensificaram-se os contatos entre o arquipélago britânico e o continente. Na França, a
monarquia foi incapaz de manter a unidade do reino. Os nobres se opuseram à coroa
em defesa de seus próprios interesses. Durante todo o século X foi constante a luta
entre as grandes casas nobres pela hegemonia, até que Hugo Capeto, no ano 987,
conquistou a coroa para si e sua dinastia, substituindo para sempre os carolíngios. Os
reinos cristãos da península ibérica iniciaram nessa época uma lenta recuperação e
passaram a enfrentar o poder islâmico. Leão, Navarra, o condado de Aragão e Castela
continuaram a conquistar territórios ocupados pelos muçulmanos.
Evolução do feudalismo. Até o século XI as monarquias européias viveram um
período de retrocesso econômico em conseqüência das constantes guerras, das ondas
de invasões, da cessação do comércio e do baixo rendimento agrícola. A insegurança,
que manteve isoladas as populações européias durante muito tempo, favoreceu a
implantação do feudalismo. Esse sistema, cujas raízes remontam ao fim do Império
Romano, caracterizou-se pela estruturação da sociedade com base na relação jurídica
denominada vassalagem, estabelecida entre senhor feudal e vassalo ou servo, na qual
o senhor proporcionava proteção em troca de fidelidade, trabalho e pagamento de
tributos. Ao feudo, unidade física da relação de vassalagem, pertenciam seus
habitantes, que passavam a vassalos do senhor a quem fosse transmitido o território
habitado e cultivado por eles. Do ponto de vista econômico e social, o feudalismo
acarretou a divisão da sociedade em duas classes básicas: a nobreza, com diferentes

MÓDULO IX...................................................................................................76
graus de poder até a cúpula real, e o campesinato, cuja subordinação transformou-se
gradualmente em relação de servidão.
O feudalismo determinou a atomização do poder político, pois a sucessão de
relações pessoais entre o rei e a alta nobreza, e entre esta e os pequenos senhores,
criou um sistema de jurisdições e fidelidades particulares apenas simbolicamente
subordinadas à autoridade monárquica. Além disso, a concessão de cargos
administrativos com base nos feudos contribuiu para romper a unidade política dos
diferentes reinos.
Também a Igreja se viu mergulhada na divisão da sociedade em classes, ou
estados. Bispados, abadias e mosteiros possuíam grandes feudos e mantinham com
seus vassalos o mesmo tipo de relações que os senhores leigos. Entretanto, a Igreja
teve papel fundamental na conservação e transmissão dos conhecimentos antigos e
contribuiu para manter a unidade cultural da Europa, principalmente com a expansão
da ordem beneditina. A reforma realizada por essa ordem religiosa no século X, a partir
do mosteiro francês de Cluny, favoreceu a independência da Igreja em relação aos
poderes feudais e estendeu por toda a Europa ocidental o estilo artístico característico
do feudalismo: o românico.
A reforma de Cluny apoiou o fortalecimento da autoridade papal durante a
questão das investiduras, conflito entre o império alemão e a Igreja sobre o direito de
nomear prelados para os cargos religiosos. Os papas Gregório VI, Leão IX, Nicolau II e
Gregório VII (inspirador da reforma gregoriana) e os imperadores Henrique III e
Henrique IV foram os personagens mais destacados dessa luta, que se travou
principalmente no século XI.
A BAIXA IDADE MÉDIA
A Baixa Idade Média foi marcada pelos conflitos e pela dissolução da unidade
institucional. Foi então que começou a surgir o Estado moderno, e a luta pela
hegemonia entre a Igreja e o Estado se converteu em um traço permanente da história
da Europa nos séculos posteriores.
A espiritualidade da Baixa Idade Média foi o autêntico indicador da turbulência
social e cultural da época, caracterizada por uma intensa busca da experiência direta
com Deus, através do êxtase pessoal ou mediante o exame pessoal da palavra de Deus
na Bíblia.
A situação de agitação e inovação espiritual culminaria com a Reforma
protestante. As novas identidades políticas conduziriam ao triunfo do Estado nacional
moderno, e a contínua expansão econômica e mercantil estabeleceu as bases para a
transformação revolucionária da economia européia.
As invasões e o feudalismo fizeram desaparecer quase totalmente a vida urbana
na Europa. As cidades que sobreviveram à decadência do Império Romano
transformaram-se em meras residências de bispos e de senhores feudais, pouco
vinculadas a sua zona rural e a outras cidades.
A partir do século XI, porém, o processo de empobrecimento começou a reverter
nos reinos europeus. Muito lentamente, a organização feudal da sociedade passou a
dar lugar a uma nova ordem, em que o papel econômico mais dinâmico passou para a
burguesia urbana.
A abertura de novas lavouras, o crescimento demográfico e o aumento da
produtividade agrícola, em conseqüência de técnicas mais modernas (uso do arado com
aiveca, canga para animais de tração, moinhos de vento etc.), provocaram um
excedente de mão-de-obra e de produção agrícola que beneficiou o desenvolvimento
das cidades. Surgiu nelas uma nova classe de comerciantes e artesãos, nos burgos ou
bairros construídos em volta das velhas muralhas, que promoveu o intercâmbio entre

MÓDULO IX...................................................................................................77
os núcleos urbanos e o campo, assim como a abertura de rotas comerciais entre
regiões distantes. A atividade dos artesãos urbanos foi regulada por uma instituição
típica da época, a guilda, associação fechada e hierárquica de cada ofício, destinada a
proteger seus associados, evitando a concorrência entre eles.
O crescimento demográfico e econômico propiciou a expansão territorial dos
reinos cristãos, principalmente no leste da Europa e na península ibérica. Também se
abriram ao comércio grandes horizontes marítimos, como o Báltico e o Mediterrâneo,
que passaram a se ligar por rotas terrestres. No norte da Europa, as cidades dos Países
Baixos estabeleceram sólidos laços comerciais com a região do Báltico, onde obtinham
cereais, peles e outras matérias-primas, em troca de produtos manufaturados. A
comunhão de interesses entre essas cidades deu lugar à criação da Liga Hanseática. No
Mediterrâneo, a indústria, o comércio e a atividade financeira floresceram nas cidades
do norte da Itália (Veneza, Gênova, Florença etc.), bem como em Marselha e
Barcelona. Características da época foram as feiras, grandes reuniões anuais de
comerciantes e banqueiros que eram realizadas nas cidades mais importantes.
Os interesses econômicos, junto com o ideal religioso da defesa dos lugares
santos conquistados pelos muçulmanos, permitiram aos estados do Ocidente a
realização de um dos maiores empreendimentos da cristandade medieval, as cruzadas,
que serviu para ampliar os limites do poder europeu, instituir o comércio mediterrâneo
e aliviar a pressão muçulmana sobre o império bizantino. No fim do século XI, o papa
Urbano II autorizou a primeira cruzada, cujo resultado foi a conquista de Jerusalém
pelos cristãos. Durante os séculos XII e XIII realizaram-se novas cruzadas e fundaram-
se diversos reinos cristãos no Oriente Médio, mas todos eles acabaram por cair em
poder dos turcos otomanos. Como parte da expansão territorial da Europa, cabe
destacar a colonização germânica no leste do continente e o avanço da Reconquista na
Espanha. Todos esses empreendimentos, imbuídos de forte espírito religioso, causaram
o aparecimento das ordens de cavalaria.
Na Alemanha, a idéia de formar um império universal cristão e a pressão
demográfica foram as causas da chamada "marcha para o leste" (Drang nach Osten)
dos séculos XII e XIII. Os imperadores alemães protegeram os reis poloneses e
ajudaram-nos a converter ao cristianismo os habitantes da Prússia. Dessa forma, na
primeira metade do século XIII, a Ordem Teutônica iniciou a campanha para a
evangelização dos prussianos, que teve como conseqüência a criação de um estado
alemão em seu território.
Em 1241 os mongóis invadiram o sul da Polônia, mas foram detidos pelas tropas
de Henrique II da Silésia. As destruições provocadas pelos mongóis obrigaram os
sucessores de Henrique II a permitir a imigração de artesãos e camponeses alemães,
para a reconstrução da economia. A influência alemã representou um perigo para a
independência da Polônia até que, no século XIV, sua união com a Lituânia permitiu à
dinastia Jaguelão neutralizar os alemães e recuperar a Pomerânia e Gdansk. A Hungria,
depois da invasão dos mongóis, em 1241-1242, foi vítima da penetração germânica, até
que a dinastia dos Anjou ocupou o poder entre 1308 e 1382. Tal como os mongóis, os
turcos representaram uma perigosa ameaça para o país, cujo rei, Luís I o Grande, foi
derrotado em 1363. Polônia e Hungria formaram uma unidade política a partir de 1440,
mas em 1458 a segunda recuperou sua independência com Matias Corvino. Na
Espanha, as monarquias cristãs continuaram seu avanço sobre os reinos muçulmanos,
que culminaria em 1492 com a conquista de Granada. Na baixa Idade Média, as coroas
de Aragão e Castela viveram um período áureo, tanto do ponto de vista econômico
como cultural.

MÓDULO IX...................................................................................................78
No século XII, as monarquias européias começaram a impor sua autoridade sobre
os senhores feudais, aliando-se para isso à burguesia urbana. Os estados adotaram
novas instituições políticas, as cortes ou Parlamentos, que aprovaram as leis e impostos
que deviam vigorar em todo o território do reino. Na França, os Capetos, apoiados
pelos burgueses, lançaram as bases do poderio monárquico, principalmente durante o
reinado de Filipe II Augusto, que praticou uma política de centralização e expansão da
coroa nos ducados independentes.
Na Inglaterra, Henrique I e Henrique II conquistaram amplas prerrogativas para a
coroa. No século XIII foi redigida a Magna Carta, primeira expressão das bases
institucionais pelas quais o poder monárquico inglês foi regulamentado e submetido ao
Parlamento. Na segunda metade do século XII, o imperador alemão Frederico I Barba-
Roxa impôs seu poder ao papado de Roma. Apesar disso, no fim do século, o papa
Inocêncio III conseguiu fazer valer a supremacia espiritual da Igreja sobre todos os
reinos cristãos. A consolidação desse poder foi favorecida pela reforma promovida pelo
monacato cisterciense, especialmente por são Bernardo de Claraval.
A vida religiosa estendeu-se às cidades e aos burgos por intermédio das ordens
mendicantes. Os franciscanos pregaram o ideal da pobreza e humildade entre as
classes populares, enquanto os dominicanos se ocuparam principalmente do ensino e
do estudo teológico nas universidades. Essas instituições docentes, surgidas
inicialmente como agrupamentos de professores e alunos independentes das antigas
escolas monacais e episcopais, desempenharam um papel importante no
desenvolvimento e na difusão da cultura. A recuperação da filosofia aristotélica motivou
o aparecimento da escolástica, doutrina teológica e filosófica sistematizada por santo
Tomás de Aquino.
A arte gótica foi a expressão estética da baixa Idade Média. A invenção do arco
ogival e da abóbada de nervuras, apoiada em arcobotantes e contrafortes, permitiu a
construção de gigantescas e elevadas catedrais, capazes de alojar um número de
pessoas muito maior do que as velhas igrejas românicas.
Durante o século XIV desencadeou-se na Europa uma profunda crise econômica,
social e espiritual. Uma sucessão de más colheitas, conseqüência de mudanças
climáticas, trouxe a fome a uma população que ultrapassava em muito as possibilidades
produtivas do sistema feudal. Ocorreram numerosas revoltas camponesas contra os
senhores, enquanto nas cidades os trabalhadores pobres das guildas se rebelavam
contra os ricos comerciantes e os mestres artesãos reunidos nos patriciados que
dominavam os governos urbanos. As destruições provocadas por essas revoltas
juntaram-se aos danos causados pelas guerras promovidas pelos senhores feudais com
o objetivo de recuperar o poder perdido. Também a guerra dos cem anos, entre a
França e a Inglaterra, provocou grande devastação e obrigou muitos camponeses a
abandonar suas terras.
A fome favoreceu a disseminação da grande peste que grassou em 1348. As
sucessivas ondas da epidemia, durante a segunda metade do século, reduziram a um
terço o total da população européia. A crise espiritual manifestou-se no cisma do
Ocidente, que durante quase todo o século XIV manteve a Igreja dividida entre Avignon
e Roma, e no aparecimento de movimentos místicos e reformadores que pregavam o
resgate da pureza dos costumes cristãos.
Uma vez superada a crise, o século XV surgiu como período de transição para
novas realidades sociais, econômicas, políticas e culturais. Com o enfraquecimento da
sociedade feudal e da estrutura das guildas, o artesanato e o comércio ganharam maior
liberdade para ampliar suas atividades e adotar as fórmulas que, pouco a pouco,
configuraram o modo de produção capitalista. As monarquias, principalmente a inglesa,

MÓDULO IX...................................................................................................79
a francesa e a castelhana, reforçaram seu poder com a criação de exércitos
permanentes e aparatos burocráticos, adquirindo um caráter autoritário que
prenunciava o aparecimento do aparelho de estado da idade moderna.
A tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos, em 1453, selou o fim do
comércio com o Mediterrâneo oriental. A burguesia européia viu-se obrigada a buscar
novas rotas comerciais pelo oeste, o que contribuiu para o progresso das técnicas de
navegação e possibilitou os grandes descobrimentos. Ao mesmo tempo, a rejeição da
cultura medieval e a busca das fontes originais da arte e pensamento clássicos
propiciaram o aparecimento de uma nova maneira de ver a vida e as formas estéticas.
Do legado medieval e da recuperação da cultura greco-latina surgiu o Renascimento.
IDADE CONTEMPORÂNEA
Período da história ocidental que se estende do início da revolução francesa, em
1789, até a atualidade.

CONCLUSÃO
Apesar da teologia nem sempre concordar com as datas apresentadas pela
história, esse assunto nos dá uma noção das transformações ocorridas na face da terra
desde os dias primitivos até o presente.

MÓDULO IX...................................................................................................80
HISTÓRIA DA PSICOLOGIA

SUMÁRIO:

INTRODUÇÃO
SUA HISTÓRIA
PSICOLOGIA ANIMAL
PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO
PSICOLOGIA SOCIAL
PSICOLOGIA APLICADA
PSICOLOGIA CLÍNICA
PSICOLOGIA EDUCACIONAL
PSICOLOGIA DO TRABALHO
PSICOLOGIA ANALÍTICA
PSICOLOGIA COGNITIVA
PSICOLOGIA DAS PERSONALIDADES
PSICOLOGIA DIFERENCIAL
PSICOLOGIA HUMANISTA
PSICOLOGIA SOCIAL
PSICOLOGIA DA GESTALT

INTRODUÇÃO:
Psicologia é a ciência que estuda a conduta dos organismos superiores em
geral, e do homem em particular, considerados individualmente ou em grupo.
Surgida no século XIX.
As antigas especulações sobre a alma e a capacidade intelectual do homem
foram complementadas desde o século XIX por uma nova ciência, a psicologia, que
estabeleceu métodos e princípios teóricos aplicáveis ao estudo e de grande utilidade
no estudo e tratamento de diversos aspectos da vida e da sociedade humana.
Psicologia é a ciência dos fenômenos psíquicos e do comportamento. Entende-
se por comportamento uma estrutura vivencial interna que se manifesta na conduta.
O termo psicologia origina-se da junção de duas palavras gregas: psiché, "alma", e
lógos, "tratado", "ciência".
A teoria psicológica tem caráter interdisciplinar por sua íntima conexão com as
ciências biológicas e sociais e por recorrer, cada vez mais, a metodologias
estatísticas, matemáticas e informáticas. Não existe, contudo, uma só teoria
psicológica, mas sim uma multiplicidade de enfoques, correntes, escolas, paradigmas
e metodologias concorrentes, muitas das quais apresentam profundas divergências
entre si.
Nos últimos anos tem-se intensificado a interação da psicologia com outras
ciências, sobretudo com a biologia, a lingüística, a informática e a neurologia. Com
isso, surgiram campos de aplicação interdisciplinares, como a psicobiologia, a
psicofarmacologia, a inteligência artificial e psiconeurolingüística
SUA HISTÓRIA
Períodos da história da psicologia.
Há formas mais simples e outras mais elaboradas de se distinguirem as fases
na história da psicologia. Uma forma simples consistiria em considerar dois grandes

MÓDULO IX...................................................................................................81
períodos: o filosófico-especulativo e o científico. O primeiro tem raízes no
pensamento grego e se estende até o final do século XIX ou princípio do XX,
conforme o critério escolhido para delimitação do começo da psicologia científica.
Como marco inicial do período científico poder-se-ia fixar um dentre dois
momentos: a consagração do método experimental como procedimento possível e
adequado à problemática psicológica; caso em que Wilhelm Wundt seria seu
iniciador; ou o uso sistemático do conceito de comportamento como objeto da
pesquisa; e, nesse caso, estaria em evidência John B. Watson.
Os filósofos antigos, gregos e medievais procuravam, antes de tudo, dar
resposta aos problemas fundamentais acerca da natureza da alma, sua relação com
o corpo, seu destino depois da morte, a origem das idéias etc. Somente com o
advento do espírito científico e, principalmente, com a constatação de que há
possibilidade de encontrar fórmulas suficientemente precisas entre variação do
estímulo físico, mudança fisiológica e reação psíquica, é que começou o trabalho
pioneiro de Gustav Fechner, Hermann Helmholtz e Wilhelm Wundt: a psicofísica e a
psicofisiologia.
Para Wundt, o objeto da psicologia era a consciência; entendia a ciência como
estudo da estrutura ou das funções detectáveis na experiência interior, nos
processos psíquicos de sensação, percepção, memória e sentimentos. A essa
concepção da psicologia opuseram-se psicólogos científicos posteriores, em particular
os behavioristas, para os quais só pode haver ciência a partir do que é externamente
observável (no caso, o comportamento).
Principais escolas de psicologia.
Uma das maneiras de classificar as especialidades em que se dividiu a
psicologia é segundo os conteúdos examinados por cada área. Assim, as principais
disciplinas psicológicas seriam a psicologia da sensação, da percepção, da
inteligência, da aprendizagem, da motivação, da emoção, da vontade e da
personalidade. Outra divisão possível se faz segundo o critério de examinar esses
mesmos conteúdos quanto a sua relação com o funcionamento do organismo
(psicologia fisiológica); ou quanto a sua manifestação no decorrer da evolução
(psicologia do desenvolvimento); ou quanto à comparação desses processos nos
diversos graus de evolução animal pode esclarecer o comportamento humano
(psicologia comparada); ou, ainda, quanto ao condicionamento que esses processos
impõem à vida social do homem, ao mesmo tempo que as diversas formas da
convivência social influem na manifestação concreta dos mesmos (psicologia social).
Os pioneiros da psicologia científica, Wundt, William James e Edward B.
Titchener, se incluem na escola estruturalista, para a qual o importante é determinar
os dados imediatos da consciência: as características principais e específicas dos
processos de consciência e seus elementos fundamentais.
A corrente funcionalista, à qual pertenciam os americanos John Dewey, Robert
S. Woodworth, Harvey A. Carr e James R. Angell, privilegia o estudo das funções
mentais, em detrimento de sua morfologia e estrutura. Em vez de investigar somente
"o que é", o psicólogo estudará "para que serve" e "como se efetua" o processo
psíquico.
Na década de 1910, John B. Watson lançou a corrente behaviorista. Criticava
tanto o funcionalismo quanto o estruturalismo, que ele julgava serem demasiado
subjetivos e imprecisos e propôs o estudo exclusivo do comportamento (em inglês
behavior), ou seja, daquilo que é observável na conduta do homem. Segundo ele,
seria cientificamente observável a ação de um estímulo sobre o organismo e a

MÓDULO IX...................................................................................................82
reação deste em face do estímulo. A relação entre estímulo e reação teria seu
protótipo nos reflexos incondicionado e condicionado.
Tanto o estruturalismo quanto o behaviorismo clássico procuravam reduzir o
estudo da psicologia ao estudo dos elementos do comportamento. Contra essa
dissecação da vida psíquica insurgiu-se a corrente fundada por Max Wertheimer, Kurt
Koffka e Wolfgang Köhler, chamada psicologia da forma ou Gestaltpsychologie.
Partindo da investigação das percepções, os gestaltistas formularam o princípio
segundo o qual o conjunto dos fenômenos psíquicos apresenta características que
não podem ser inferidas das partes isoladamente.
Muitos psicólogos europeus, como Max Scheler, Frederick J. Buytendijk e
Maurice Merleau-Ponty; seguem a corrente fenomenológica, cujos caminhos foram
explorados por Franz Brentano e Edmund Husserl já no século XIX. A fenomenologia
em psicologia consiste em captar a vivência do outro diretamente no comportamento
onde está incluída a significação do ato. Portanto, os psicólogos devem analisar tal
comportamento sem procurar "atrás" dele o fenômeno psíquico, mas tentando
descobri-lo no próprio fenômeno, pois o mundo fenomenal pode ser analisado
diretamente, por ser um dado tão imediato quanto o "eu".

Métodos e técnicas.
Os métodos científicos da psicologia podem ser divididos em três grupos:
experimentais, diferenciais e clínicos. Os métodos experimentais, oriundos das
ciências físicas, têm por princípio a variação de um fator, o fator causal também
chamado variável independente, mantendo constantes todas as outras fontes de
influência. Observar-se-ão, assim, as modificações produzidas na variável
dependente. A tarefa fundamental do psicólogo será, de um lado, encontrar medidas
precisas quanto às variações das variáveis independente e dependente, e, de outro
lado, controlar todas as outras variáveis para que seu efeito possa ser considerado
como constante.
Em certos casos, como no estudo do desenvolvimento dos fatores da
inteligência, da personalidade etc., o psicólogo não pode variar diretamente o fator
que deseja estudar. Recorre então ao método diferencial. As diferenças individuais
constituirão a variável propriamente dita; as outras condições, e mesmo as provas às
quais os indivíduos serão submetidos, ficam constantes.
Enquanto os dois métodos citados permitem estabelecer leis gerais, o método
clínico se propõe compreender o indivíduo em sua situação particular ou pretende
aplicar as diversas leis gerais a casos individuais. Seu uso é indispensável no
diagnóstico da personalidade. Para o conhecimento preciso de determinados
fenômenos psicológicos, muitas vezes os três métodos devem ser empregados
conjuntamente.
PSICOLOGIA ANIMAL
Também chamada psicologia comparada, a psicologia animal tem como uma de
suas finalidades a de precisar o degrau em que, na escala evolutiva, determinada
espécie deve ser situada. A maior contribuição da psicologia animal decorre do fato
de que os estudos efetuados sobre animais permitem responder muitas perguntas
relativas à psicologia humana.
Edward Lee Thorndike, Clark Hull, B. F. Skinner e muitos outros teóricos da
psicologia da aprendizagem elaboraram suas leis a partir de dados obtidos com
animais, visto que neles as experiências podem ser simplificadas e mais controlados
os fatores não relevantes. Os estudos de Konrad Lorenz e Nikolaas Tinbergen sobre
os instintos também foram efetuados com animais.

MÓDULO IX...................................................................................................83
PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO
O estudo longitudinal do desenvolvimento procura compreender tanto a época
do aparecimento dos processos psicológicos, quanto as características dos principais
estágios da evolução psíquica. Iniciou-se com as pesquisas sobre a psicologia da
criança, mas os trabalhos de George Coghill, Z. Y. Kuo e outros mostraram a
necessidade de levar em conta também os dados obtidos sobre o desenvolvimento
psíquico dos animais, principalmente no terreno do desenvolvimento motor.
Alguns autores antigos consideravam o desenvolvimento unicamente como um
acréscimo em quantidade e complexidade; teorias posteriores, ao contrário, afirmam
que as modificações qualitativas e descontínuas surgem nos vários níveis da
evolução. Isto levou a caracterizar os níveis de evolução em termos de "padrões de
desenvolvimento". Admite-se que existam formas gerais comuns a todos os
membros da mesma espécie, as quais durante certo período caracterizarão seu
comportamento psíquico.
Estudos sobre a vida embrionária tanto do homem quanto dos animais
mostram que os primeiros movimentos são descoordenados e envolvem o organismo
inteiro. Depois, por individuação e por influência de fatores internos, na concepção
de Coghill, ou mais pela influência de fatores excitantes externos, na teoria de Kuo,
as reações vão especificar-se em ordem precisa, definida. Assim, o desenvolvimento
motor vai de movimentos amplos que envolvem todo o membro até as atividades
finas de coordenação motora.
Todas as teorias concordam que a regularidade do desenvolvimento constitui
uma prova da presença de fatores internos, isto é, de fatores de maturação. Isso
explica, no dizer de Arnold L. Gesell, por que a criança senta-se antes de ficar em pé,
desenha um círculo antes de conseguir copiar um quadrado e fabula antes de poder
dizer a "verdade". Influências externas desfavoráveis, como, por exemplo, ser
impedida de movimentar os membros, atrasam sua locomoção, mas, uma vez
liberada, rapidamente recupera o que perdeu e se iguala às outras crianças de
mesma idade.
O estudo do desenvolvimento da criança exige métodos específicos pouco
usados em outros ramos da psicologia. A análise dos jogos e desenhos infantis, a
observação e análise cinematográfica são algumas das técnicas que permitem
acompanhar sua evolução.
O desenvolvimento da personalidade humana pode ser dividido em cinco etapas
principais: vida intra-uterina, infância, adolescência, período maduro do adulto e
velhice. A divisão ulterior da infância e da adolescência não é ainda uniforme entre
os psicólogos. A maioria, contudo, destaca o primeiro ano de vida como fase
especial. Depois vem a etapa da primeira infância, até os seis anos
aproximadamente. A segunda infância vai de 7 a 11 anos, seguida da fase da pré-
puberdade. A adolescência se subdivide em dois períodos: a puberdade e a
adolescência propriamente dita. Alguns autores ainda distinguem, dos 18 aos 23
anos, o período da juventude.
O recém-nascido, apesar de estar já em contato com um mundo muito mais
mutável do que as condições comparativamente constantes da vida intra-uterina,
caracteriza-se ainda por uma dependência quase total do ambiente e pela aquisição
das condições básicas de uma vida biológica independente: hábitos de alimentação,
discriminação de estímulos e maturação do sistema nervoso.
Na primeira infância, em conseqüência do desenvolvimento motor e verbal, a
criança torna-se agente espontâneo de atividades, por meio das quais buscará

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ativamente novos estímulos e começará a integrar-se, ainda que em boa parte
somente na fantasia, ao mundo social de seus colegas e da família. Na segunda
infância, a criança desenvolve a capacidade de dissociar as qualidades dos objetos e
se abre ao mundo real por meio de generalizações, abstrações e manipulação livre
dos símbolos verbais. Em alguns anos a conquista intelectual transforma por
completo sua atitude para com o mundo externo.
As mudanças orgânicas e somáticas, principalmente o desenvolvimento dos
caracteres sexuais secundários, acompanhados pela socialização da atividade
intelectual, constituem verdadeira fase de transição, que começa aos 12-13 anos e
vai até o fim da puberdade, por volta dos 15 anos. Necessitando compreender-se
nessa etapa, e, ao mesmo tempo, sentindo a influência da sociedade que começa a
exigir dele uma responsabilidade, o adolescente assume progressivamente a direção
ativa e pessoal de sua própria vida. Essa busca de auto-afirmação às vezes fica só no
mundo interno, mas costuma também manifestar-se em rebeldia contra as
autoridades, à procura de "novos estilos" de vida dentro dos quais possa sentir-se
mais seguro.
Dentro de cada um desses períodos, a psicologia do desenvolvimento pesquisa
especificamente o desenvolvimento corporal, a aquisição das habilidades motoras, a
evolução da linguagem e da inteligência, o ajustamento social e emocional. Um dos
estudos mais precisos sobre as características diferenciais de cada ano de vida foi
realizado por Gesell e seus colaboradores. Outros, como Jean Piaget e Maurice
Debesse, preferiram estudar mais globalmente o desenvolvimento, ressaltando as
próprias vivências internas das crianças e adolescentes.

PSICOLOGIA SOCIAL
A personalidade não se desenvolve nem se manifesta no vazio, mas em estreita
interação com outras personalidades. A disciplina científica que estuda a
personalidade em interação é a psicologia social.
Autores antigos tiveram uma visão mais atomística da relação entre a
personalidade e a sociedade. Muitos consideravam que a psicologia social começa
depois que a personalidade se forma graças às forças internas e aos mecanismos de
aprendizagem. Concepção mais recente, sem negar a importância desses fatores,
ressalta que a personalidade, sob todos os pontos de vista, desde o nascimento, está
sendo condicionada cultural e socialmente.
Outro tema preferido da psicologia social moderna é a investigação do status,
isto é, a posição que alguém ocupa no grupo, e do rôle, ou seja, o comportamento
esperado do indivíduo por um grupo humano. Para que uma pessoa seja bem
ajustada, considerada como normal, é necessário que saiba desempenhar seus rôles,
seus "papéis sociais", e encontre suficiente grau de satisfação emocional na vivência
desses papéis.
Muitas pesquisas investigam não tanto a influência da cultura e da sociedade
sobre a personalidade, mas os processos que caracterizam a organização
comportamental dos grupos, a interação dos membros de um grupo. Especial
atenção é consagrada ao estudo dos chamados pequenos grupos e grupos primários,
como seriam o grupo familiar, o grupo de irmãos etc. Nessas circunstâncias, obtêm-
se medidas bastante precisas das diversas forças que interagem.
Dentre os estudos das grandes coletividades, ocupa lugar especial o do estudo
da massa, que se caracteriza por certa "homogeneidade mental", sensibilidade e
excitabilidade de seus integrantes. A concepção mais aceita para explicar as reações
muitas vezes violentas e mutáveis que ocorrem nesse tipo de coletividade é a

MÓDULO IX...................................................................................................85
hipótese baseada em premissas freudianas: sob a pressão social, acumula-se o
sentimento de frustração, mas as pessoas que, individualmente, reprimiriam essa
frustração, quando reunidas em grupo, massa, sob a "ilusão da universalidade",
descarregarão sua agressividade.
A utilização de conhecimentos psicológicos para a resolução de problemas
sociais é considerada como uma tecnologia social, onde os achados derivados de
pesquisa pura e aplicada são empregados na construção de um produto socialmente
relevante. O cientista social dedicado à pesquisa básica; de modelos capazes de
explicar a relação entre variáveis psicossociais; poderá, por exemplo, estudar
experimentalmente qual a maneira mais eficaz de provocar mudanças de atitude em
geral, ou em determinadas situações específicas. O cientista que utiliza
conhecimentos teóricos e básicos em pesquisas diretamente ligadas à resolução de
problemas sociais específicos poderá chegar a tal conhecimento por meio de um
trabalho relacionado a uma situação real, por exemplo, mudança da atitude do
preconceito de um grupo contra outro. O tecnólogo social utilizará esses
conhecimentos na solução de problemas específicos.

PSICOLOGIA APLICADA
Durante muito tempo a psicologia aplicada foi considerada como um ramo da
psicologia no qual os fatos e os métodos da ciência eram aplicados aos problemas
práticos da vida diária. Entretanto, o adjetivo "aplicado" conduz a uma impressão
errônea das relações entre a psicologia pura e a aplicada, sugerindo que esta última
toma de empréstimo à primeira seus princípios e leis. Na realidade, os princípios da
psicologia aplicada são muitas vezes independentemente derivados, a partir do
esforço de solução de problemas práticos.
A utilização dos métodos e resultados da psicologia científica na solução prática
dos problemas do comportamento humano é chamada psicologia aplicada. Embora,
desde o nascimento, a psicologia científica tenha sido empregada nos diversos ramos
da atividade humana, sua aplicação acelerou-se principalmente a partir da segunda
guerra mundial, durante a qual os psicólogos foram solicitados a colaborar na
seleção, preparação e readaptação dos combatentes para as mais variadas tarefas.
Na atualidade, em todas as atividades importantes aplicam-se os conhecimentos
psicológicos.
Existem, portanto, entre outras, psicologia clínica, a educacional, a do trabalho,
a jurídica, a do esporte, a ambiental, a hospitalar, a comunitária, a institucional, a do
lazer e a pastoral. As mais destacadas são sobretudo as três primeiras, tanto pelo
número de psicólogos que se dedicam a elas, quanto pela influência que exercem na
vida contemporânea.

PSICOLOGIA CLÍNICA
Conquanto a expressão psicologia clínica não seja a mais adequada, trata-se de
uma especialidade que veio atender a uma aguda necessidade social de ajustamento
de crianças, adolescentes e jovens no lar, na escola e no trabalho. O
desenvolvimento educacional e econômico e a multiplicação de problemas
profissionais da sociedade moderna ressaltaram a importância do ajustamento
psicológico em todas as ocupações e relações humanas, desde a mais tenra idade,
incrementando a investigação científica no seu domínio e o interesse por suas
aplicações práticas.
A psicologia clínica colabora no diagnóstico e no tratamento das pessoas
desajustadas ou com problemas emocionais. Para o diagnóstico, os psicólogos

MÓDULO IX...................................................................................................86
empregam, além de testes, a entrevista clínica. O tratamento se efetua por meio das
diversas técnicas psicoterápicas. A maior parte dos psicoterapeutas emprega a
psicanálise ou técnicas derivadas das diversas correntes analíticas; alguns empregam
teorias de aprendizagem, inclusive o condicionamento; outros, finalmente, elaboram
seus métodos baseados na fenomenologia. Entre esse, sobressai Carl R. Rogers, que
elaborou a técnica "não-diretiva", ou "centrada no cliente".
No início da aplicação da psicoterapia, predominaram as técnicas
psicoterapêuticas individuais, nas quais cada cliente era atendido por um
psicoterapeuta. A preparação dos psicoterapeutas inclui conhecimento teórico sobre
a personalidade normal e anormal, e estágio prático supervisionado. Em certas
correntes, como na psicanálise, é indispensável que o futuro psicólogo clínico se
submeta à psicoterapia antes de aplicá-la aos outros. Nas décadas de 1960 e 1970,
cresceu sobremaneira o número das técnicas psicoterápicas de grupo.
A elaboração de várias baterias de testes de inteligência verbal e de
desempenho viso-motriz (performance) equipou o psicólogo clínico com recursos
válidos para o exame e psicodiagnóstico. Criaram-se numerosos testes de
personalidade e de aptidão, que enriqueceram ainda mais o acervo técnico e
científico da psicologia clínica.
O emprego da estatística tornou possível a padronização e a verificação da
fidedignidade e validade dos testes de aplicação coletiva e individual, com instruções
escritas que permitiam a auto-aplicação e com apresentação especial que pedia o
relacionamento e a comunicação com o examinador, modalidade mais apropriada ao
exame individual do psicólogo clínico. A validade psicológica do teste, sua
consistência psicodiagnóstica nas aplicações sucessivas e a natureza dos processos
psicológicos investigados vincularam cada vez mais a psicologia clínica à metodologia
psicológica científica, evitando que ela se tornasse uma disciplina de aplicação
prática rotineira, fundamentada apenas na experiência empírica.

PSICOLOGIA EDUCACIONAL
Também chamada psicologia escolar, a psicologia educacional dedica-se ao
exame psicológico do educando, do educador e dos processos educativos, elabora e
sugere instrumentos e meios psicologicamente adequados para que a educação
possa ter melhor resultado. Apesar de se estender a qualquer situação educativa,
ganhou terreno principalmente dentro dos limites da educação escolar. Seu
desenvolvimento acelerou-se depois que Alfred Binet elaborou o primeiro teste de
inteligência e Thorndike investigou as leis de aprendizagem. Além dessas fontes, a
psicologia educacional alimenta-se ainda das técnicas do aconselhamento e das
técnicas da psicologia institucional.
O exame psicológico dos alunos, para distribuí-los em classes de acordo com
suas capacidades reais, a análise das matérias lecionadas, a pesquisa dos sucessos e
malogros escolares, a investigação das aptidões específicas das crianças
excepcionalmente bem-dotadas ou portadoras de dificuldades físicas e psíquicas são
alguns dos campos em que a psicologia educacional traz sua contribuição.

PSICOLOGIA DO TRABALHO
Também chamada de psicologia industrial, a psicologia do trabalho visa a
utilização, a conservação e o aprimoramento dos recursos humanos da indústria,
desenvolve e aplica princípios e métodos psicológicos relativos ao aumento da
produção, ao incremento da satisfação e ajustamento pessoal, e ao melhoramento
das relações humanas dentro da comunidade de trabalho.

MÓDULO IX...................................................................................................87
O trabalho do psicólogo industrial começa antes da admissão do trabalhador na
empresa: a seleção de pessoal. A pessoa, uma vez aceita por parte da direção da
empresa, será seguida pelo psicólogo em sua colocação, treinamento, promoção,
readaptação e na análise das causas de sua eventual demissão. As investigações
psicológicas relativas ao trabalho mostram que o trabalhador deve executar sua
tarefa em ambiente propício, o que diz respeito ao local de trabalho, suas cores,
iluminação, temperatura e ventilação adequadas à natureza do trabalho e ao número
dos trabalhadores, como também o mobiliário e as máquinas em disposição racional,
permitindo movimentos fáceis e seguros. As pesquisas relativas à prevenção de
acidentes confirmaram a hipótese segundo a qual há certos indivíduos com maior
predisposição para sofrer acidentes e que testes e métodos apropriados de seleção
são capazes de identificar essas pessoas antecipadamente.
O rendimento do trabalhador pode ser muitas vezes aumentado graças à
melhor coordenação de seus movimentos. Para maior eficiência, estes devem ser os
mais simples possíveis, dentro das condições particulares de trabalho; devem seguir
a coordenação natural dos músculos e membros para evitar esforço inútil e devem
manter determinado ritmo.
É inegável a importância da racionalização do trabalho, de seu ambiente físico,
assim como da motivação econômica do trabalhador. Entretanto, as pesquisas mais
abrangentes evidenciam que são de igual ou maior importância os fatores que
influem e determinam as relações humanas dentro da indústria: relações entre
direção e empregados, relações entre colegas, relações entre supervisores e
subordinados. Diversas técnicas foram elaboradas para melhorar essas relações
dentro da situação de trabalho.
A psicologia do trabalho desdobra-se em vários ramos, como a ergonomia, que
procura adaptar os aparelhos e instrumentos da vida moderna às condições e
capacidades humanas. Sua cooperação vem a ser solicitada tanto na construção das
cápsulas das viagens espaciais quanto na distribuição adequada de todos os
comandos necessários, instrumentos registradores e de controle automático.

PSICOLOGIA ANALÍTICA
Doutrina psicanalítica que se distingue da freudiana basicamente por valorizar,
além do fator sexológico individual, as influências exteriores recebidas pelo homem,
ao longo de séculos de experiência cultural coletiva. Criada pelo psiquiatra suíço Carl
Jung.

PSICOLOGIA COGNITIVA
Teoria psicológica que se empenha em oferecer uma visão unitária dos
processos mentais. Recolheu elementos da psicologia gestáltica, da neurociência, da
biologia e da cibernética.
PSICOLOGIA DAS PERSONALIDADES
Teoria psicológica segundo a qual a personalidade é resultado de fatores
dinâmicos de conduta, motivações e complexos centrais. Estabelecida por Henry
Alexander Murray, opõe-se à teoria da caracterologia. Também denominada
personologia.
PSICOLOGIA DIFERENCIAL
Ramo da psicologia que estuda as características psíquicas próprias de um
indivíduo, ou de um grupo de indivíduos, em relação com as dos outros.

MÓDULO IX...................................................................................................88
PSICOLOGIA HUMANISTA
Prática psicológica que visa a permitir o estabelecimento das aptidões num
ambiente de equilíbrio e de integração pessoal e favorecer o encontro com o outro.
Formulada pelo americano Carl Rogers.
PSICOLOGIA SOCIAL
Disciplina que combina técnicas e conhecimentos da psicologia e da sociologia
para estudar a interação entre os indivíduos, destes com os grupos e dos grupos
entre si.
PSICOLOGIA DA GESTALT
Escola psicológica que defende o estudo de fatos e comportamentos como
totalidades organizadas, e não como elementos isolados. Formulada na Alemanha na
primeira metade do século XX.
Surgida como reação ao elementarismo associacionista do século XIX, a teoria
da Gestalt enfrentou-se à afirmação segundo a qual a psicologia devia considerar
analiticamente o fenômeno psicológico, decompô-lo em suas partes, chegar ao
elemento básico e, a partir deste, formular teorias explicativas dos mecanismos
psicológicos.
A psicologia da forma, ou Gestalt (termo alemão que significa configuração,
forma ou estrutura) se fundamenta na moderna teoria da percepção, segundo a qual
um dado é percebido como totalidade organizada e o todo tem características que
não podem ser inferidas das partes isoladamente.
SUA HISÓRIA
Em 1890, o psicólogo austríaco Christian von Ehrenfels provocou um sério abalo
na teoria psicológica associacionista ao demonstrar teoricamente que uma forma é
mais que a simples soma das partes que a integram. Exemplificou com uma melodia,
que se compõe de sons, e com uma figura, integrada por linhas e pontos. Em 1912,
Max Wertheimer publicou os resultados de um trabalho experimental sobre a
percepção que foi considerado o marco inicial da escola psicológica da Gestalt. Sua
pesquisa consistiu em exibir objetos estáticos em rápida seqüência, de modo a
produzir no observador ilusão de movimento, que ele chamou phi-fenômeno. O
experimento demonstrou que a percepção se dá em relação ao todo e não quanto às
partes que o integram. Assim, Wertheimer estabeleceu o estudo da percepção como
ponto de partida do gestaltismo, ou psicologia da forma, baseado na premissa
segundo a qual uma totalidade é determinada por leis que lhe são próprias.
Princípios fundamentais. As funções psicológicas, como memória, percepção,
inteligência e emoções foram estudadas pela Gestalt de acordo com os seguintes
princípios:
(1) princípio da pregnância, ou lei da boa forma, que expressa a tendência de
cada estrutura de organizar-se psicologicamente da melhor maneira
possível, segundo uma forma tão completa e perfeita quanto as condições o
permitam;
(2) lei da boa continuidade, segundo a qual os elementos de um conjunto
tendem a acompanhar uns aos outros, de maneira a favorecer a
continuidade de uma linha ou de um movimento e a atingir a forma
estruturalmente mais estável;
(3) lei da simetria, que estabelece que os agrupamentos simetricamente
organizados tendem a ser mais facilmente perceptíveis do que os agrupamentos
assimétricos;

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(4) lei do fechamento, que expressa a tendência de formas imperfeitas ou
incompletas de virem a se fechar ou completar para alcançar maior grau de
regularidade ou estabilidade;
(5) lei do destino comum, que expressa a preferência pelo agrupamento de
elementos que se movem ou se transformam numa direção comum;
(6) princípio da proximidade, segundo o qual os estímulos de maior
proximidade espacial ou temporal tendem a ser agrupados;
(7) princípio da semelhança, que diz que em condições iguais, os estímulos
mais semelhantes entre si, seja pela cor, tamanho, forma ou outra característica,
mostram tendência a agrupar-se.

CONCLUSÃO
Novos rumos. Nas décadas de 1930 e 1940, os princípios da psicologia da
forma estenderam-se a novos domínios, como a motivação, a psicologia social, a
estética e a economia. Os principais nomes ligados a essa generalização das idéias
da Gestalt foram Kurt Lewin, Solomon Asch, Rudolph Arnheim e George Katona. Esse
novo rumo, no entanto, determinou o fim da Gestalt como escola psicológica, pela
fusão com outras idéias da época, sem que se negasse a importância de sua
existência e o valor científico de suas descobertas e a influência na história da
psicologia.

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HISTÓRIA DA FILOSOFIA
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO
A HISTÓRIA DA FILOSOFIA
A ORIGEM DA FILOSOFIA
FILOSOFIA ANTIGA
GRANDES FILÓSOFOS ATENIENSES
FILOSOFIA HELENISTA-ROMANA
FILOSOFIA MEDIEVAL
FILOSOFIA RENASCENTISTA
FILOSOFIA EVOLUCIONISTA
POSITIVISMO E CIÊNCIAS SOCIAIS
FILOSOFIA MODERNA
FILOSOFIA CHINESA
FILOSOFIA ISLÂMICA
FILOSOFIA INDIANA
FILOSOFIA EM PORTUGAL
FILOSOFIA NO BRASIL
FILOSOFIA NA ATUALIDADE

INTRODUÇÃO
Filosofia é um termo com diferentes definições através dos séculos, em geral
referentes à busca da sabedoria e à justificação racional dos princípios universais das
coisas e seres.
O homem sempre se questionou sobre temas como a origem e o fim do universo,
as causas, a natureza e a relação entre as coisas e entre os fatos. Essa busca de um
conhecimento que transcende a realidade imediata constitui a essência do pensamento
filosófico, que ao longo da história percorreu os mais variados caminhos, seguiu
interesses diversos, elaborou muitos métodos de reflexão e chegou a várias
conclusões, em diferentes sistemas filosóficos.
O termo filosofia possui, em nosso uso cotidiano, um sentido amplo. Costumamos
empregá-lo como sinônimo de atividade reflexiva, de qualquer teorização ou
pensamento. É nesta acepção que falamos de uma “filosofia de vida”, e até mesmo de
uma “filosofia de botequim”. Compreendida, porém, em seu sentido estrito, filosofia, ou
antes, philosophia, é um termo surgido na Grécia, empregado para designar um modo
determinado de relação com o saber. Etimologicamente, a palavra philosophia é
composta de philos, “amigo ou amante”, e sophía, “saber, sabedoria”. Assim, podemos
compreendê-la, em seu sentido primeiro, como o amor ou a inclinação ao saber. O
verbo philosophein, filosofar, foi empregado por Heródoto (séc. V a.C.) e Tucídides
(séc. V-IV a.C), historiadores gregos. Os primeiros filósofos a empregar este termo,
ainda que em sua forma adjetiva, foram Heráclito de Éfeso e Pitágoras de Samos (séc.
VI a.C.). Atribui-se a Pitágoras haver se autodenominado filósofo. E Heráclito escreve
(frag. 35): É bem necessário serem os homens amantes da sabedoria (philosóphous)
para investigar muitas coisas. Contudo, somente a partir das reflexões de Platão e
MÓDULO IX...................................................................................................91
Aristóteles o termo filosofia se pôde firmar como a denominação de um âmbito
particular de investigação: o questionamento acerca do fundamento da realidade, bem
como da própria possibilidade de investigar.
Pode-se definir filosofia, sem trair seu sentido etimológico, como uma busca da
sabedoria, conceito que aponta para um saber mais profundo e abrangente do homem
e da natureza, que transcende os conhecimentos concretos e orienta o comportamento
diante da vida. A filosofia pretende ser também uma busca e uma justificação racional
dos princípios primeiros e universais das coisas, das ciências e dos valores, e uma
reflexão sobre a origem e a validade das idéias e das concepções que o homem elabora
sobre ele mesmo e sobre o que o cerca.
Ao longo de sua evolução histórica, a filosofia foi sempre um campo de luta entre
concepções antagônicas; materialistas e idealistas, empiristas e racionalistas, vitalistas e
especulativas. Esse caráter necessariamente antagonista da especulação filosófica
decorre da impossibilidade de se alcançar uma visão total das múltiplas facetas da
realidade. Entretanto, é justamente no esforço de pensar essa realidade, para alcançar
a sabedoria, que o homem vem conquistando ao longo dos séculos uma compreensão
mais cabal de si mesmo e do mundo que o cerca, e uma maior compreensão das
próprias limitações de seu pensamento.
A HISTÓRIA DA FILOSOFIA
Disciplina filosófica que investiga o desenrolar do saber filosófico, em seus
múltiplos desdobramentos ao longo da história do Ocidente. A apreensão da filosofia
em sua historicidade permite mostrar sua inserção em um horizonte cultural; a filosofia
não é um fenômeno isolado, devendo ser compreendida a partir da realidade, da
cultura e do momento na qual ela se gera e desenvolve.
Pode-se considerar Aristóteles o primeiro filósofo a abordar o pensamento de seus
predecessores a partir de uma perspectiva crítica, que culmina em sua própria doutrina.
Contudo, a filosofia somente ganha um sentido propriamente histórico nos séculos
XVIII e XIX, em especial com a sistematização elaborada por Hegel. Durante a
Antiguidade e a Idade Média, a não se pode falar de uma compreensão histórica; esta
consiste basicamente em relatos acerca das vidas e opiniões dos filósofos, sem a
tentativa de estabelecer relações temporais. Na Era Moderna, surge a tentativa de
conferir uma interpretação unificante aos diversos momentos da história das doutrinas
filosóficas; contudo, estas são encaradas como um processo de decadência da razão,
fragmentada em uma pluralidade de doutrinas, onde primam a fantasia e a imaginação
individual sobre o pensamento rigoroso. Com Hegel, pela primeira vez a história da
filosofia ganha uma linha norteadora sistemática, onde os diversos pensadores e suas
concepções aparecem como aspectos sucessivos e distintos de um mesmo processo, o
auto-desenvolvimento do Espírito Absoluto. Posteriormente, também Auguste Comte e
Franz Brentano concebem a história da filosofia sistematicamente, cada um à sua
própria maneira. Surgem, principalmente a partir do legado de Hegel, duas tendências
básicas de interpretação, de modo que a história da filosofia pode ser investigada como
um processo contínuo de desenvolvimento progressivo, ou como a aparição
descontínua de formas de pensamento autônomas e incomunicáveis. Atualmente, pode-
se dizer que há a tendência em incorporar, modificando, estas duas perspectivas.
Podemos encarar os diferentes pensadores, a um só tempo, a partir de sua contribuição
pessoal e única e, ao mesmo tempo, englobá-los na unidade polimorfa do pensar
filosófico, mostrando suas semelhanças, continuidades e diferenças intrínsecas.
A história da filosofia é estudada a partir do advento do pensar ocidental, ocorrido
aproximadamente no século VI a.C. Sua divisão mais tradicional é: filosofia antiga,
medieval, renascentista, moderna e contemporânea.

MÓDULO IX...................................................................................................92
A ORIGEM DA FILOSOFIA
As culturas mais primitivas e as antigas filosofias orientais expunham suas
respostas aos principais questionamentos do homem em narrativas primitivas,
geralmente orais, que expressavam os mistérios sobre a origem das coisas, o destino
do homem, o porquê do bem e do mal. Essas narrativas, ou "mitos", durante muito
tempo consideradas simples ficções literárias de caráter arbitrário ou meramente
estético, constituem antes uma autêntica reflexão simbólica, um exercício de
conhecimento intuitivo.
Observando que os antigos narradores; Homero, Hesíodo; só transmitiram
tradições, sem dar nenhuma prova de suas doutrinas, Aristóteles, um dos fundadores
da filosofia ocidental, distinguiu entre filosofia e mito dizendo ser próprio dos filósofos o
dar a razão daquilo que falam.
Estabeleceu-se assim na cultura ocidental uma primeira delimitação do conceito
de filosofia como explicação racional e argumentada da realidade. No entanto, não
havia sido definida nesse momento a separação da filosofia e das diversas ciências.
Aristóteles, por exemplo, investigou tanto sobre metafísica especulativa, como sobre
física, história natural, medicina e história geral, todas reunidas sob a denominação
comum de filosofia. Somente a partir da baixa Idade Média e mais ainda do
Renascimento, as diversas ciências se diferenciaram e a filosofia se definiu em seus
atuais limites e conteúdos.
A filosofia surge na Grécia, aproximadamente, no séc VI a.C., embora não como
um fenômeno isolado deste povo. Sabe-se que, contribuindo para sua formação, a
cultura e o pensamento dos gregos receberam influências de outras civilizações da
Antiguidade, como por exemplo a egípcia. Por esta mesma época podemos ainda
encontrar, entre alguns povos do Oriente, especialmente na China e na Índia, um modo
de reflexão que, para muitos autores, deve ser, igualmente, denominado. Contudo, foi
na Grécia que este pensamento se consolidou de maneira fundamental, a ponto de
determinar o questionamento de todo o Ocidente, desde sua origem até nossos dias.
Podemos compreender a origem do pensamento filosófico, na Grécia, a partir de
uma dupla vertente: o pensamento mítico e a constituição sóciopolítica da pólis. O mito
é uma forma de pensar arcaica, presente em todas as culturas que conhecemos.
Podemos brevemente defini-lo como um modo de interpretação religioso da realidade,
transmitido por meio de tradição oral, que determina a compreensão do mundo de um
determinado povo, situando e orientando o homem em sua cultura. Como paradigma
sagrado de compreensão, o mito é um saber que, interpretando a origem do universo,
dos deuses, dos homens e suas instituições, enfim, de toda e qualquer realidade,
fundamenta e estrutura a vida individual e coletiva da comunidade. No caso da Grécia
antiga, sabemos da riqueza, em número e formas, que apresenta o conjunto de seus
mitos. É discutível se, na experiência grega, a filosofia aparece como uma ruptura ou
como uma continuação do pensamento mítico. Por um lado, ela rompe com o mito no
que diz respeito ao modo de investigar: se podemos descrever a experiência mítica
como uma cosmogonia, uma criação ou recriação religiosa da origem do mundo, a
filosofia aparece como uma cosmologia, uma apreensão do mundo através do logos.
Isto significa que a filosofia apreende a realidade através do questionamento teórico,
trabalhando, a partir de uma visão geral da totalidade do real, com separações e
aproximações de idéias; dinâmica própria da razão, que estrutura o modo de
pensamento que se tornou mais comum e predominante no Ocidente. Por outro lado, a
filosofia tem em comum com o mito a sua questão: ambos nascem como modos de
interpretar a origem (arché) do real. É neste sentido que Aristóteles, um dos pais da

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filosofia, escreve em sua Metafísica : Por isso também o amante de mitos (philómythos)
é, de algum modo, filósofo: pois o mito é composto de extraordinário .
Outro ponto considerado fundamental para o surgimento da filosofia entre os
gregos é a particularidade que sua organização sóciopolítica apresenta. A Grécia era
organizada em um sistema de cidades-estados, as pólis, que possuíam, como
características principais: autarquia, isto é, cada cidade grega possuía suas próprias leis
e poder para se auto-gerir; democracia, sistema de governo que promovia igual
participação dos cidadãos; e a instituição de uma esfera pública, contraposta à privada.
Esta vida pública se dava nas livres discussões em praça pública, a ágora, fazendo com
que todo assunto relativo à comunidade; deliberações normativas e políticas,
conhecimentos, bem como todo saber técnico ou artístico, estivesse sujeito a discussão
ou plebiscito. Este sistema levou a um apogeu do poder da palavra como elemento
capaz de convencer, de criar realidade. A força da persuasão pela palavra era, na
experiência da pólis, o meio de exercer comando e domínio sobre os outros cidadãos. O
âmbito de uma tal organização era o do debate, da discussão, da argumentação. Assim,
podemos considerar a filosofia como criação da pólis, no sentido de que é deste
contexto social e político que a filosofia retira seu poder de argumentação, reflexão e,
em síntese, a utilização da palavra como meio de alcançar a verdade. Mito e pólis
contribuem, assim, essencialmente para o surgimento do pensar filosófico entre os
gregos.
O primeiro passo para este surgimento foi dado pelo pensamento dos pré-
socráticos. Sem ser explicitamente formulado como questão, o pensamento pré-
socrático inaugura o problema que vai perfazer toda história do pensamento ocidental,
o problema do ser, ao caracterizar a verdade (em grego: alétheia) como o nexo entre
linguagem (logos) e natureza (physis). Para Heráclito, por exemplo, o filósofo (o anèr
philósophos), o que ama a sabedoria, é aquele que busca concordar com a unidade
originária da totalidade de todas as coisas. Esta concordância, a sabedoria, é pensada
por Heráclito como harmonia, o próprio nexo original entre lógos e physis. Todavia,
para que, diante da ameaça do relativismo trazido pelas argumentações sofísticas, se
encontre melhor determinado o que se compreende por verdade, o pensamento de
Sócrates e Platão vai formular explicitamente a questão: o que é?. Esta questão busca
definir isso que subjaz sempre idêntico a si mesmo, a substância ou essência,
fundamento de toda instabilidade acidental da existência aparente. O que em Heráclito
se delimitava como o encontro da harmonia, passa a ser, a partir do pensamento de
Sócrates e Platão, uma procura: nasce, assim, a filosofia como um desejo de
conhecimento. Aristóteles caracteriza expressamente esta transformação quando
afirma, em sua obra v, que O que desde sempre, agora e para sempre, é
constantemente procurado, porque sempre de novo a questão fracassa, é o problema:
o que é o ser? - A filosofia se constitui, a partir da concepção socrático-platônico-
aristotélica, como o pensamento que investiga a questão do ser.
No primeiro livro da Metafísica, Aristóteles define a filosofia como uma ciência
teórica dos primeiros princípios e causa . O ser, compreendido como fundamento,
princípio, é interpretado como uma causa não causada que é causa de tudo. Com isto
pode ser designado o conceito filosófico de Deus. A filosofia, e este é o seu sentido
metafísico, é o conhecimento que busca ir além (em grego: meta) dos entes físicos, ao
encontro de Deus, compreendido como fundamento de todas as coisas. Filosofia como
metafísica é simultaneamente um estudo ontológico, a ciência do ser, e teológico,
porque pensa o ser como fundamento primeiro. A ontoteologia constitui a filosofia
como pensamento metafísico.

MÓDULO IX...................................................................................................94
Na história da filosofia, o ser foi pensado de diversas maneiras. Para Platão, o ser
é idéia; Aristóteles já o pensa como enérgeia; Descartes o chama de consciência, Kant,
de razão e Hegel, de espírito. Por diferentes que sejam os nomes e os modos de
compreensão do ser, a identidade da filosofia, o que a faz ser filosofia, é colocar a
questão acerca do que faz o ente ser o que ele é, a questão do fundamento da
realidade, isto é, a questão do ser.
FILOSOFIA ANTIGA (Século VI - século IV/III a.C.)
Recebe esta denominação o período inicial da história da filosofia. Também
designada filosofia grega e filosofia clássica, seu início marca a própria origem disso
que, no Ocidente, recebeu o nome de filosofia. Seu desenrolar compreende: o
pensamento pré-socrático ; a sofística; a filosofia de Sócrates ; as escolas cínica,
cirenaica e megárica; e seu apogeu, com Platão e Aristóteles.
Tentando abordar uma característica comum a todos estes pensadores e escolas,
podemos afirmar que este período se encontra marcado por uma mesma investigação,
que perpassa a grande diversidade de pensamentos aí manifesta: a correlação entre
phýsis e logos. Tomar estes termos em suas traduções usuais, por natureza e razão ou
discurso, é perder a força própria à experiência de realidade, expressa, pelo
pensamento antigo, através destas noções. Para a concepção grega, phýsis denomina
isto que emerge e vem a ser a partir de si próprio, tomando a si mesmo como causa.
Ela diz respeito, assim, ao princípio constituinte de toda realidade, a unidade desde a
qual os entes, em sua totalidade, vêm a ser isto que eles mesmos são. Por seu turno,
logos não se distingue, radicalmente, de physis; ele expressa o movimento de deixar o
ente apresentar-se e permanecer presente como isto que ele é. A tal movimento de
deixar ser o ente, pertence a linguagem. Esta é, assim, encarada desde o modo de
apresentação, o que a torna intrínseca ao movimento de phýsis.
O pensamento grego caracteriza-se, desta forma, por uma consideração não
dicotômica das relações entre ser e linguagem. Somente a partir desta unidade
fundamental, podem ter início o pensamento sofístico, que, percebendo o laço entre ser
e linguagem, nega a possibilidade do falso, e o processo que visa iniciar a apreensão de
delimitações e distinções entre os dois campos, representado pelas filosofias de Platão
e Aristóteles.
Os principais representantes da filosofia antiga são: Tales, Anaximandro,
Anaxímenes, Heráclito, Pitágoras, Parmênides, Zenão, Melisso, Empédocles, Arquitas,
Anaxágoras, Demócrito, Leucipo, Filolau, Alcmeão, Xenófanes, Diógenes de Apolônia,
Protágoras, Górgias, Sócrates, Antístenes, Aristipo, Platão, Aristóteles.
A FILOSOFIA GREGA
Foi na Grécia, no século VI a.C., que nasceu a filosofia. Ali, em apenas três
séculos, foram propostos os grandes temas de que se ocupou o pensamento filosófico
ao longo da história. A figura de Sócrates, cujos ensinamentos só são conhecidos por
meio da obra de seus discípulos, Platão e Xenofonte, tem servido tradicionalmente de
linha divisória para estabelecer as duas grandes etapas da filosofia grega: o período
pré-socrático e o da maturidade, representado este, fundamentalmente, pelas obras de
Platão e Aristóteles.
Pré-socráticos. O objeto primordial da primitiva filosofia grega foi a reflexão
acerca da origem e da natureza do mundo físico e dos elementos que o constituem e
permitem explicá-lo. Isto é, aquilo que em termos atuais seria denominado uma
metafísica da matéria. O pensamento pré-socrático desenvolveu-se entre uma
cosmologia monista e outra pluralista, entre o materialismo e o idealismo, entre a
afirmação dos grandes valores transcendentes e o relativismo antropológico.

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Cosmologias monistas. O primeiro pensador que, segundo Aristóteles, pode ser
considerado filósofo foi Tales de Mileto, um dos chamados "sete sábios" da Grécia, que
viveu no século VI a.C. Como cientista, aplicou seus conhecimentos matemáticos e
astronômicos à medição de distâncias e à previsão de eclipses; como filósofo,
estabeleceu uma explicação racional; sem apoio no mundo mitológico; sobre a origem
do mundo, que disse ser formado de água.
Anaximandro, contemporâneo e concidadão de Tales, escreveu o primeiro texto
filosófico conhecido, que intitulou Sobre a natureza. Ao estabelecer que o princípio
(arké) de todas as coisas seria o "indeterminado" (ápeiron), Anaximandro deslocou o
problema do plano físico material para o plano lógico. Anaxímenes, seu discípulo, voltou
a um princípio material, que ele identificou no ar.
Cosmologias pluralistas. Empédocles, nascido na Sicília no século V a.C., foi
sacerdote, vidente, taumaturgo; realizador de milagres, político, médico, poeta e
cientista. Estabeleceu como princípio da matéria, quatro elementos ou raízes do ser:
fogo, água, ar e terra. As misturas ou separações entre esses elementos se produziriam
pelo efeito de duas forças cegas, o "amor" e o "ódio". Por sua vez, Anaxágoras, seu
contemporâneo, propôs uma inteligência (nous) que teria agitado as partículas
primitivas, de modo que logo chegaram a formar as atuais combinações. Mais tarde,
Demócrito defenderia a existência de átomos de igual natureza mas de diferentes
formas e magnitudes, que, ao constituir diversas combinações no espaço, dariam
origem aos diferentes corpos que se conhecem.
Realidade e aparências. Parmênides (século V a.C.), fundador da escola
eleática, pensava que nada pode começar a existir, nem tampouco desaparecer, porque
procederia do nada ou se converteria em nada, o que não é possível porque o nada não
existe. Também não existe o movimento ou mudança, e somente, portanto, um único
ser, total, imutável e compacto. Seu discípulo Zenão propôs o famoso argumento
segundo o qual Aquiles, o mais veloz entre os corredores, não poderia alcançar uma
tartaruga, porque lhe seria necessário para isso percorrer a metade do espaço
interposto entre eles, em seguida a metade da metade e assim por diante
interminavelmente. Desse modo, os filósofos eleáticos separaram, de um lado, as
aparências (doxá, "opiniões") que os sentidos percebem e que se mostram
contraditórias em uma análise racional e, de outro lado, a realidade que a razão oferece
e que é objeto do verdadeiro conhecimento.
Heráclito de Éfeso (século VI a.C.) havia afirmado, pelo contrário, que somente
existia o movimento (a mudança, o devir). Tudo flui e nada permanece: "Ninguém pode
banhar-se duas vezes no mesmo rio." O movimento se produz pela tensão entre os
contrários e provoca "o eterno retorno" de todas as coisas, regido pelo logos, que
constitui a lei do universo. Segundo interpretações modernas, não há contradição entre
Parmênides e Heráclito, uma vez que suas respectivas doutrinas enfocam dois planos
diferentes do ser: o absoluto (metafísico) e o cosmos (físico).
Metafísica do número. Pitágoras de Samos (século VI a.C.), bom conhecedor
do Oriente e do Egito, fundador de um grupo ao mesmo tempo científico e religioso,
introduziu na Grécia a idéia da reencarnação das almas, não sob a forma vulgar
modernamente conhecida, mas como transmigração por várias formas de existência.
Sua principal contribuição à filosofia foi considerar os números, as relações e formas
matemáticas como a essência e a estrutura de todas as coisas. Cada coisa possui um
número (arithmós arkhé), que expressa a "fórmula" da sua constituição íntima. De
outro lado, as leis que governam o cosmos são também relações matemáticas.
Relativismo antropológico dos sofistas. Os sofistas fizeram do ato de pensar
uma profissão remunerada. Seu ceticismo em gnosiologia levou-os a uma moral

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oportunista. Se é impossível conhecer o mundo real, o que importa são as aparências e,
por conseguinte, o êxito na vida e a influência sobre os outros. Daí o valor que
concederam à retórica e à oratória. A célebre máxima "o homem é a medida de todas
as coisas" constitui um resumo do relativismo filosófico dos sofistas.
GRANDES FILÓSOFOS ATENIENSES
Sócrates. Interessado, como os sofistas no homem concreto, cujo saber
interrogava, Sócrates pretendeu, no entanto, exatamente o contrário deles. Procurou
demonstrar as incongruências entre idéias e atos, incitar o homem a distinguir por si
mesmo o justo do injusto e a agir corretamente. A probidade ética de Sócrates
desagradou tanto aos conservadores quanto aos defensores da democracia, que o
acusaram de impiedade e o condenaram à morte. Ele poderia tê-la evitado, mas
aceitou-a por obediência às leis.
Platão. A teoria das idéias, uma das principais contribuições filosóficas de Platão,
procurava solucionar o problema da realidade e das aparências, da unidade ou
pluralidade do ser. Platão considerava que as coisas que percebemos são imagens;
sombras projetadas em nossa estreita caverna; de realidades superiores que existem
imutáveis no mundo das idéias, presididas pela idéia do bem. O filósofo argumentava
que, apesar de não existirem duas figuras exatamente iguais, a matemática demonstra
a existência do princípio da perfeita igualdade, que deve existir para que exista uma
verdadeira ciência.
Toda a filosofia posterior continuaria a se questionar sobre a localização das
essências imutáveis que fundamentam uma ciência ou uma ética, e sobre serem essas
essências algo mais que uma mera probabilidade. Os primeiros filósofos cristãos
situaram o mundo das idéias na mente divina, como causa exemplar (arquétipo,
modelo) de toda a criação. A filosofia de Platão; idealista, simbólica, estética; se desliga
do mundo cotidiano, o mundo das aparências, e estimula a penetrar num mundo mais
profundo, que de alguma forma estaria subjacente ao mundo de cada dia e que seria
estimulado por este último. Muitas das contradições que aparecem nos escritos de
Platão só poderiam ser resolvidas mediante o conhecimento do ensino oral do filósofo,
que o considerava a parte mais importante de seu pensamento. Mas as pesquisas que
permitiriam reconstituir o conteúdo desse ensinamento oral só puderam ser realizadas
no século XX.
Aristóteles. Discípulo de Platão e preceptor de Alexandre o Grande, Aristóteles
foi o grande organizador da filosofia ocidental e muito especialmente da metafísica
(estudo do ente enquanto tal) e da lógica, que, nas colocações formuladas por ele,
sobreviveu sem a mínima variação até a aparição da moderna lógica formal ou
matemática. O método aristotélico associa a observação minuciosa com uma
sistematização racional radical. Como a filosofia depois se dividiu em empiristas e
racionalistas, muito se veio a debater se Aristóteles pertencia a uma ou outra dessas
correntes, porém o mais exato é dizer que ele tem uma posição intermediária: o
conhecimento vem pela experiência (como pretendem os empiristas) mas só se torna
válido quando está em conformidade com os princípios lógicos. A contribuição mais
duradoura de Aristóteles foi a organização do sistema das ciências como totalidade
orgânica e o estabelecimento dos graus de confiabilidade dos vários métodos e
conhecimentos.
Últimas filosofias da antiguidade. A dissolução, em primeiro lugar, da cidade-
estado e a decomposição, mais tarde, do império de Alexandre o Grande mergulharam
a antiga Grécia numa época de decadência e incerteza. Aos grandes sistemas filosóficos
anteriores sucederam outros de ambições mais modestas, cujo objetivo fundamental
era ajudar os homens a obter tranqüilidade. Assim, enquanto a escola estóica

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preconizou a moderação das paixões, o epicurismo enfatizou a busca da felicidade. O
ceticismo, por sua vez, negou a possibilidade de um conhecimento absoluto e sublinhou
a importância dos interesses individuais.
Outra corrente filosófica do final da antiguidade foi o neoplatonismo, sobretudo
com Plotino (205-270 da era cristã). De índole simbólica e mística, essa filosofia muito
influenciou o cristianismo medieval, até a redescoberta da filosofia de Aristóteles.
FILOSOFIA HELENÍSTICO-ROMANA (Século IV a.C. - século IV d.C.)
Recebe tal denominação o período da história da filosofia que dá seguimento à
filosofia antiga, e se estende até a irrupção do pensamento medieval. Após a última
grande realização metafísica grega, com a construção do sistema aristotélico, inaugura-
se na Grécia um período eminentemente voltado para investigações de âmbito moral e
religioso. A conquista deste país por Alexandre e, posteriormente, pelos romanos, faz
com que esta modalidade de pensamento se dissemine por todas as regiões
pertencentes a estes domínios. As principais escolas que representam este período,
surgidas na Grécia e perpetuadas através de Roma até fundirem-se, em nossa era, à
nascente doutrina cristã, são: o estoicismo, o epicurismo, o ceticismo, o
platonismo professado pela Academia e o aristotelismo, propagado através do Liceu.
Com a assimilação destas correntes pelo mundo romano, aliada à incorporação de
elementos próprios a diversas religiões orientais, a filosofia ganha características
sincréticas. Nos primórdios da era cristã, ocorre, ainda, o advento dos sistemas
neopitagórico e neoplatônico; este último constitui a mais marcante contribuição de
pensamento oriunda deste período, e representa o último florescimento da especulação
metafísica grega.
A filosofia helenístico-romana compreende, propriamente, três períodos. Uma
primeira fase, marcada pelo helenismo, que representa a expansão da cultura grega
(helênica), especialmente das escolas pós-aristotélicas, ao mundo ocidental. Na
segunda fase, inaugura-se o pensamento romano; este, incorporando a Grécia a seu
Império, incorpora igualmente a filosofia helenista, trazendo-a, contudo, para uma
correlação mais estreita com o âmbito pragmático. Esta é a característica mais
marcante do modo de ser romano, preferencialmente voltado para a atividade, o
negotium. Assim, a maior realização deste povo é a criação de uma sistematização
jurídica, que dá origem ao direito, na forma como atualmente o conhecemos. A partir
desta perspectiva, Roma desenvolve uma filosofia inteiramente voltada para o homem,
encarado desde sua determinação ética. A terceira fase deste movimento abrange os
primórdios do pensamento cristão; este realiza a transição do pensamento pagão à
religião cristã, e assimila as principais doutrinas do pensamento romano, especialmente
a concepção neoplatônica. Neste período, realiza-se a fusão das noções gregas de Uno,
logos e nous com a concepção cristã de Pai, Filho e Espírito Santo, componentes da
Trindade divina, fusão decisiva para a consolidação da nova mentalidade religiosa
ocidental. Pertence a esta fase o segmento dos Apologistas, primeiros grandes
defensores e sistematizadores da doutrina cristã, formados, contudo, dentro dos
moldes da educação e da filosofia romanas.
Os principais pensadores deste período são: Zenão de Cítio, Crisipo, Epicuro, Pirro
de Élis, Sexto Empírico, Cícero, Sêneca, Marco Aurélio, Plutarco, Lucrécio, Proclo,
Plotino, Jâmblico, Fílon, Porfírio, São Clemente, Orígenes, São Justino, Minúcio Félix e
Tertuliano.
FILOSOFIA MEDIEVAL (Séc. V - séc. XIV)
É designado por este nome o período da história da filosofia que se inicia com as
considerações de Santo Agostinho, estendendo-se até o momento de crítica aos
princípios escolásticos, efetuada principalmente por Guilherme de Ockham, que prepara

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o terreno para o surgimento de uma nova ótica, inaugurada entre os séculos XIV e XV,
com o advento da filosofia renascentista. A filosofia medieval é marcada, no Ocidente,
por considerações de caráter metafísico, aliadas a um pensamento de fundo teológico.
Assim, é possível identificá-la, em certa medida, ao período de apogeu da filosofia
cristã. Contudo, não é possível desconsiderar a influência das filosofias árabe e judaica,
que floresceram durante este período, contribuindo para a formação e desenvolvimento
de várias concepções cristãs. Assim, podemos afirmar que o pensamento medieval
compreende, em linhas gerais: a filosofia patrística; a escolástica; as filosofias árabe e
judaica; a mística; o neoplatonismo do século XII; o agostinianismo; o tomismo; o
realismo e o nominalismo, instaurados a partir da disputa dos universais, entre outras
correntes.
Podemos compreender a filosofia medieval não somente em termos de
periodização cronológica, mas principalmente pelo privilégio na consideração de
determinados temas, bem como pelo tratamento conferido a estes. Em primeiro lugar,
o pensamento na Idade Média se encontra em estreita correlação com a filosofia
antiga, tanto com relação aos filósofos clássicos gregos quanto aos pensadores do
período helenístico-romano. Seu pensamento retoma em grande parte elementos
próprios ao platonismo, neoplatonismo e aristotelismo antigos. Durante este período,
procede-se a um valioso resgate, tradução e comentários dos textos antigos, tornando-
os matéria de discussão nos principais círculos filosóficos. Neste sentido, é possível
dizer que a filosofia medieval representa uma “continuação” da filosofia antiga.
Contudo, trata-se, antes, de uma reelaboração de temas antigos. Estes são, durante a
Idade Média, retomados e interpretados desde uma nova perspectiva, característica
deste período: a do religioso. Esta filosofia parte de considerações de cunho teológico,
determinantes para uma nova compreensão do pensamento antigo.
Por tomar como ponto de partida uma compreensão da realidade que tem a
crença Deus como fundamento, as preocupações próprias ao pensamento medieval se
estruturam em torno de algumas considerações centrais: as relações entre filosofia e
teologia, ou a delimitação possível entre razão e fé; a determinação da natureza e
propriedades de Deus, bem como a relação entre o Criador e as criaturas, em especial
o homem; a consideração de uma temporalidade estruturada a partir da idéia de
Criação, efetuada desde o nada, o que acarreta a compreensão de uma temporalidade
linear; a afirmação do mundo como imagem divina, o que permite encarar cada ente
criado como símbolo e manifestação de seu Criador. Contudo, estes são alguns
aspectos de ordem geral, que não permitem visualizar a riqueza e profundidade
próprias aos vários filósofos medievais.
Alguns dos principais pensadores da Idade Média: Santo Agostinho, Anselmo, João
Escoto Erígena, Avicena, Abelardo, Bernardo, Averróis, Alberto Magno, Roger Bacon,
Boaventura, Tomás de Aquino, Mestre Eckhart, Duns Scot, Guilherme de Ockham.
O cristianismo, que impulsionou a cultura ocidental durante toda a Idade Média,
trouxe uma nova visão de Deus, da criação e do destino humano, na qual se
destacavam temas completamente estranhos à filosofia grega, como os da imortalidade
da alma individual, da autoconsciência como fundamento do conhecimento etc. Foi
muito forte, nesse período, a vinculação entre filosofia e teologia.
Os primeiros pais da Igreja recorreram à terminologia conceitual da filosofia
neoplatônica para explicar sua própria fé. Destacou-se entre eles o pensamento de
santo Agostinho, retomado pela escola franciscana.
Durante o declínio da civilização greco-romana, os filósofos ocidentais
abandonaram a investigação científica da natureza e a busca da felicidade no mundo e
passaram a se preocupar com o problema da salvação em outro mundo melhor. Por

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volta do século III, o cristianismo já se havia estendido às classes mais cultas do
império romano.
Santo Agostinho conciliou a ênfase dada pelos gregos à razão com a insistência
dos romanos nas emoções religiosas dos ensinamentos de Cristo e dos apóstolos,
gerando um sistema de pensamento que se transformou na própria doutrina do
cristianismo da época. Em grande parte graças a sua influência, o pensamento cristão
foi platônico em espírito até o século XIII. O estadista do século VI, Boécio, reavivou o
interesse pelos pensamentos grego e romano, especialmente pela lógica e a metafísica
aristotélicas. No século IX, o monge irlandês Johannes Scotus Erigena propôs uma
interpretação panteísta do cristianismo, identificando a Trindade divina com o Uno, o
Logos e a Alma universal do neoplatonismo.
No século XI, ressurgiria o pensamento filosófico, fruto do crescente encontro
entre as diferentes regiões do mundo ocidental e o despertar do interesse pelas
culturas desconhecidas, que culminaria no Renascimento. Os filósofos muçulmanos,
judeus e cristãos interpretaram e esclareceram os escritos de Platão, Aristóteles e
outros sábios gregos, tentando conciliar a filosofia com a fé religiosa e dar às próprias
crenças religiosas pilares racionais. Surgiu a escolástica, cujo método foi dialético ou
discursivo. O interesse pela lógica do discurso levou a importantes avanços, tanto em
lógica quanto em teologia.
Avicena, físico árabe do século XII, integrou o neoplatonismo e as idéias
aristotélicas à doutrina religiosa muçulmana. Outros pensadores de destaque foram o
poeta judeu Solomon ben Yehuda Ibn Gabirol e o filósofo eclesiástico e escolástico
Santo Anselmo, que estabeleceu o papel do realismo lógico num dos debates mais
conflituosos e transcendentes da filosofia medieval, o dos universais. A idéia contrária,
o nominalismo, foi formulada pelo filósofo Roscelino.
O teólogo francês Pedro Abelardo propôs um compromisso entre realismo e
nominalismo, que ficou conhecido como conceitualismo. O jurista ibero-muçulmano
Averroés contribuiu para que a ciência e o pensamento aristotélico tivessem grande
influência no mundo medieval, graças a seus lúcidos e eruditos comentários sobre a
obra de Aristóteles. Outros escolásticos de destaque foram ainda Maimônides, o filósofo
Boaventura e Alberto Magno. Porém, a maior figura intelectual da era medieval foi,
sem dúvida, Tomás de Aquino, que uniu a ciência aristotélica e a teologia agostiniana
num amplo sistema de pensamento, que se transformaria na filosofia autorizada da
Igreja Católica.
FILOSOFIA MEDIEVAL DEPOIS DE TOMÁS DE AQUINO
As maiores críticas à filosofia tomista viriam a ser formuladas por Johannes
Duns Scotus e por William of Occam. Nos séculos XV e XVI, o renascer do interesse
científico pela natureza veio acompanhado de uma tendência ao misticismo panteísta. O
prelado católico romano Nicolau de Cusa, ou Cusano, antecipou a obra do astrônomo
polonês Nicolau Copérnico, ao sugerir que a Terra se move em torno do Sol,
deslocando, assim, a humanidade do centro do universo, que concebia como infinito e
idêntico a Deus. O filósofo Giordano Bruno, que também identificou o universo com
Deus, desenvolveu as implicações filosóficas da teoria copernicana, que influenciariam
correntes intelectuais posteriores, levando ao nascimento da ciência moderna e à
Reforma.
FILOSOFIA RENASCENTISTA (Fim do século XIV - início do século XVII)
Por este termo, denomina-se o período da história da filosofia iniciado a partir da
Idade Média, e que lança as bases para a consolidação dos principais pressupostos da
posterior filosofia moderna. Por constituir-se como transição, este é um período
conturbado, apresentando múltiplas facetas. Uma de suas características principais é a

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tentativa de perpetrar um retorno, bem como uma revalorização do mundo antigo. A
antiguidade clássica jamais deixou de fazer-se presente na filosofia ocidental; durante a
Idade Média, contudo, as filosofias grega e romana sofreram uma adaptação
interpretativa, o que permitiu aliá-las à compreensão cristã da realidade. O
Renascimento pretende um retorno à antiguidade, onde o pensamento clássico possa
operar livre das amarras de uma interpretação cristianizante. Aliada a isso, constata-se
a irrupção de novas maneiras de encarar a religião, insurgidas contra a extrema rigidez
da escolástica medieval. Nesta época, florescem as concepções místicas acerca do
universo, influenciadas pela mística e teologia viva, presente em algumas vertentes do
pensamento medieval, bem como pela derrocada da concepção medieval teocêntrica do
universo; de outra parte, é durante o Renascimento que surge a Reforma protestante,
movimento que traz a individualidade, questão central ao pensamento da época, para o
cerne da concepção religiosa. Renascem, assim, a concepção platônica da realidade,
bem como uma tendência de pensamento de tipo panteísta. Outra característica é o
abrupto avanço da ciência e o grande desenvolvimento das técnicas, operados neste
período. Amplia-se a concepção medieval de mundo, com a teoria copernicana do
sistema heliocêntrico e seu desdobramento, por Galileu, que postula a infinitude do
universo. A ciência volta-se para a investigação da natureza, abandonando o método
especulativo e criando a base do método científico moderno, de tipo experimental-
matemático.
No campo das artes, opera-se uma valorização do homem e da natureza como
temática principal. Surge ainda, nesta época, uma ciência política, que toma o homem
por objeto de consideração e baseia-se fundamentalmente na observação, dos
percursos da história e das experiências concretas das diversas coletividades.
Os principais representantes da filosofia renascentista, em sua multiplicidade de
enfoques e aspectos, são: Nicolau de Cusa, Telésio, Giordano Bruno, Campanella,
Galileu, Erasmo, Thomas More, Maquiavel, Pico della Mirandola, Montaigne, Francis
Bacon.
DO RENASCIMENTO AO IDEALISMO ALEMÃO
Renascimento. As grandes transformações culturais, econômicas e sociais dos
séculos XV e XVI afetaram também a filosofia, que, de monopólio até então quase
exclusivo da classe universitária ("escolástica" é o mesmo que "escolar") passou a
interessar a uma outra camada de intelectuais, sem vínculo com a universidade e mais
ligados à aristocracia e à cultura dos palácios. O resultado foi a ruptura dos vínculos
com a teologia e um crescente processo de secularização da filosofia. Entre muitos dos
novos intelectuais, o interesse primordial já não era pelos temas sacros (divinae
litterae, "letras divinas") e sim pela literatura secular (humanae litterae), daí seu nome
de "humanistas". As preocupações dos filósofos renascentistas, que seriam
desenvolvidas nos séculos posteriores, giraram em torno de três grandes temas: o
homem, a sociedade e a natureza.
Foram os humanistas que se encarregaram da reflexão sobre o primeiro desses
temas. A nova organização do pensamento renascentista fez prevalecer Platão sobre
Aristóteles, a retórica sobre a dialética medieval, os diálogos literários sobre as disputas
lógicas escolásticas. Com a recuperação da literatura clássica, manifestaram-se também
as influências das filosofias do último período da antiguidade, como o atomismo, o
ceticismo e o estoicismo.
No pensamento social, sobressaiu a figura de Nicolau Maquiavel, que defendeu
em O príncipe (1513) a aplicação da "razão de estado" sobre as normas morais. No
século XVII destacaram-se no pensamento político as figuras do inglês Thomas Hobbes
e do holandês Hugo Grotius. O primeiro defendeu a existência de um estado forte como

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condição da ordem social; Grotius apelou para a lei natural como salvaguarda contra a
arbitrariedade do poder político.
Filosofia da natureza. Se os filósofos medievais haviam concebido a natureza
como um todo orgânico, hierarquizado segundo uma ordem estabelecida por Deus, os
renascentistas conceberam-na como uma pluralidade regida pelas leis da mecânica e
presidida pela ordem matemática. Seu método consistia numa fusão da experiência
com a matemática, ora enfatizando esta (Galileu), ora aquela (Bacon). A atitude
científica do Renascimento se manifestou sobretudo nas obras de Nicolau Copérnico e
de Galileu Galilei, e encontrou seu apogeu na figura de Isaac Newton, que publicou em
1687 sua fundamental Philosophiae naturalis, principia mathematica (Princípios
matemáticos da filosofia natural).
Racionalismo. A natureza e a matemática, a observação e a especulação
racionalista, unidas em princípio, acabaram separando-se em duas correntes distintas, o
empirismo e o racionalismo. Ambos os sistemas filosóficos se desenvolveram fora das
universidades, onde se continuou a ensinar um aristotelismo cada vez mais diluído.
O racionalismo, em cuja base se encontra a confiança na capacidade absoluta da
razão para alcançar o conhecimento, serviu-se do método dedutivo para suas
elaborações teóricas. Seu principal representante foi René Descartes, iniciador do
subjetivismo moderno. O pensamento de Descartes, desenvolvido sobretudo em seu
Discurso sobre o método (1637), fundamenta-se numa primeira evidência; "penso, logo
existo"; a partir da qual já era possível a aquisição de novas idéias. A garantia da
certeza dessas últimas se produzia quando cumpriam a condição de serem claras,
distintas e não contraditórias. Importantes adeptos dessa corrente filosófica foram
também Spinoza e Leibniz.
Empirismo. O empirismo, que foi em suas origens apenas um método de
investigação científica, acabou por se transformar, com o tempo, em uma corrente
filosófica de suma importância para o pensamento e a ciência posteriores. Seu primeiro
representante foi o inglês Francis Bacon, que propôs tal método em seu Novum
organum (1620), cujo título era um claro convite à renovação do organum, ou seja a
metodologia lógica de Aristóteles. Bacon postulava como elementos fundamentais da
investigação científica a observação, a experimentação e a indução.
Figuras fundamentais do empirismo, além de Hobbes e Newton, foram também
John Locke e David Hume, que, na segunda metade do século XVII e na primeira do
XVIII, estabeleceram a formulação definitiva dessa corrente filosófica.
Iluminismo. O século XVIII, conhecido como o Século das Luzes ou Iluminismo,
representou o apogeu do empirismo clássico e do racionalismo. Mais do que a
contribuição de novas idéias filosóficas, o que caracterizou essencialmente esse período
foi a sistematização e divulgação das que haviam sido formuladas até então. A
publicação da Encyclopédie (1751-1772), sob a direção do francês Denis Diderot,
constitui exemplo excepcional desse empenho. Seu compatriota Voltaire, literato,
historiador e filósofo, é, talvez, a personalidade que melhor representa o espírito do
Século das Luzes.
No terreno da filosofia social e política destacaram-se Jean-Jacques Rousseau e o
barão de Montesquieu, que defenderam a liberdade e a igualdade entre todos os
cidadãos. Montesquieu propôs em L'Esprit des lois (1748; O espírito das leis) a divisão
dos poderes como garantia da liberdade política. Rousseau, por sua vez, em Du contrat
social (1762; O contrato social), reconheceu como depositário do poder o povo, que o
cede aos governantes mediante uma delegação revogável segundo sua vontade. No
campo da filosofia especulativa, o século XVIII viu nascer um pensamento materialista
e ateu, cujo principal representante foi Diderot.

MÓDULO IX...................................................................................................102
Idealismo alemão. Immanuel Kant, contemporâneo dos iluministas e
identificado com suas idéias políticas, foi também fundador do idealismo alemão.
Retratando sobre o modo pelo qual a filosofia obtém seus conhecimentos científicos
universais a partir dos dados sensíveis particulares, Kant afirmou que a missão da
filosofia é determinar a capacidade da razão para alcançar a verdade. Para ele, a razão
aplica certas categorias -- condições a priori, isto é, anteriores -- aos fenômenos da
experiência. Não se conhece, portanto, a coisa em si, mas seu "fenômeno", sua
manifestação. Esse modo de conhecimento não é aplicável aos objetos da metafísica,
como Deus ou a imortalidade da alma, que não podem ser conhecidos pela razão
teórica, mas somente pela razão prática, que opera na ordem moral.
São também representantes destacados do idealismo alemão Johann Gottlieb von
Fichte, Friedrich Wilhelm von Schelling e G. W. F. Hegel, filósofos que levaram a tal
extremo o racionalismo subjetivista iniciado no Renascimento que chegaram a beirar o
irracionalismo romântico. Romântica foi, efetivamente, sua aproximação da religião e
seu distanciamento da ciência experimental; sua exaltação cósmica do eu e a
preeminência que concederam à vontade e à moral.
MECANICISMO E MATERIALISMO
Os séculos XV e XVI marcam um período de desenvolvimento social, político e
intelectual de corte radical. A visão medieval do cosmos é suplantada pela visão
mecanicista do mundo como uma grande máquina, cujas partes se movem segundo leis
físicas exatas, sem propósito ou vontade. Nesta nova visão filosófica, a experiência e a
razão são os únicos padrões efetivos para elucidar a verdade. O jesuíta espanhol
Francisco Suárez teve grande influência na transformação da escolástica clássica e na
elaboração de uma moderna concepção da lei e da autoridade real. O primeiro grande
representante da nova filosofia foi Francis Bacon, que erigiu um novo método científico
(novum organum), baseado na generalização indutiva realizada a partir da observação
e da experimentação. Foi o primeiro a formular leis para a inferência indutiva.
O trabalho do físico e astrônomo Galileu foi da maior importância para o
desenvolvimento desta nova visão de mundo. Criou a ciência da mecânica, que aplicava
os princípios da geometria aos movimentos dos corpos. Por sua vez, o filósofo
racionalista René Descartes fez da matemática o modelo de toda a ciência, aplicando
seus métodos dedutivos e analíticos a todas as áreas do saber.
Thomas Hobbes elaborou um amplo sistema de metafísica materialista, que trouxe
uma solução para o problema mente-corpo do dualismo, reduzindo a mente aos
movimentos interiores do corpo. Aplicou os princípios da mecânica a todas as áreas do
conhecimento. O filósofo holandês Baruch Spinoza afirmou que toda a estrutura da
natureza pode ser deduzida de umas tantas definições básicas e axiomáticas, conforme
o modelo da geometria de Euclides. John Locke enriqueceu a tradição empirista iniciada
por Bacon: dotou o empirismo de um marco sistemático, fazendo da epistemologia o
principal objeto de interesse da filosofia moderna.
IDEALISMO E CETICISMO
Gottfried Wilhelm Leibniz combinou os descobrimentos matemáticos e físicos de
seu tempo com as concepções orgânicas e religiosas da natureza herdadas do
pensamento clássico e medieval, marcando o início da tradição filosófica do idealismo.
Foi George Berkeley que transformou o idealismo numa poderosa escola de
pensamento, ao uni-lo ao ceticismo e ao empirismo, tornando-se, assim, muito
influente na filosofia britânica. Estabeleceu a visão epistemológica do fenomenalismo e
abriu o caminho que seria seguido pelo movimento positivista no pensamento moderno.
David Hume, por sua vez, incentivou o uso de procedimentos estatísticos, em lugar dos
sistemas dedutivos, e deu novo alento à redefinição de conceitos básicos.

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Em resposta ao ceticismo de Hume, Immanuel Kant construiu um amplo sistema
de filosofia, que pode ser colocado entre as maiores conquistas intelectuais da cultura
ocidental, combinando o princípio empirista de que todo conhecimento se origina da
experiência com a crença racionalista no conhecimento obtido por dedução.
Na França, a atividade social culminou no período conhecido como o Iluminismo,
que impulsionou as mudanças sociais que produziram a Revolução Francesa. Na
Alemanha, através da influência de Kant, o idealismo e o voluntarismo se tornaram as
tendências dominantes, com filósofos como Johann Gottlieb Fichte e Friedrich Wilhelm
Joseph von Schelling. Sem dúvida, o espírito filosófico mais potente do século XIX foi o
filósofo alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel, com seu sistema de idealismo absoluto.
Sua concepção de Estado nacional como a mais alta encarnação do espírito absoluto foi
interpretada, durante muito tempo, como a principal fonte das inúmeras ideologias
autoritárias modernas. Outros pensadores de destaque foram o alemão Arthur
Schopenhauer, o francês Auguste Comte, o economista britânico John Stuart Mill e o
filósofo religioso dinamarquês Sören Kierkegaard.
FILOSOFIA EVOLUCIONISTA
A idéia mecanicista do mundo, característica do século XVII, e a fé na razão e no
senso comum do século XVIII, embora ainda influentes, foram modificadas no século
XIX por uma série de idéias mais complexas e dinâmicas, baseadas mais na biologia e
na história do que na matemática ou na física. Entre outras, foi de grande influência a
teoria da evolução a partir dos princípios da seleção natural, proclamada, em 1858, por
Charles Darwin. Por sua vez, os alemães Karl Marx e Friedrich Engels elaboraram a
filosofia do materialismo dialético, que se tornaria a base ideológica do comunismo.
O filósofo britânico Herbert Spencer englobou a filosofia na sociologia e na
história, por considerá-las as ciências mais avançadas. Friedrich Nietzsche recuperou a
concepção de existência de Schopenhauer como a expressão de uma vontade cósmica,
mas fez da chamada “vontade de potência” a fonte de todo valor. No fim do século XIX,
o pragmatismo, termo inventado por Charles Sanders Peirce, tornou-se uma influente
escola de pensamento, particularmente nos Estados Unidos, com William James. Por
outro lado, o idealismo foi uma poderosa escola de pensamento, graças à obra dos
filósofos britânicos Francis Bradley e Bernard Bosanquet, que ressaltou o caráter
estético e dramático do processo universal. Dentro desta corrente, destaca-se o filósofo
americano John Dewey, que desenvolveu um amplo sistema de pensamento, a que
denominou naturalismo experimental ou instrumentalismo.
Na França, a idéia mais influente de princípios do século XX foi o vitalismo
evolucionista de Henri Bergson, que falava do élan vital, a energia expontânea do
processo evolutivo. Na Alemanha, Edmund Husserl fundou a escola da fenomenologia.
O matemático e filósofo Alfred North Whitehead reavivou o interesse pela metafísica
especulativa, ao desenvolver um grande sistema técnico de conceitos que combina a
teoria platônica das idéias com o organicismo de Leibniz e Bergson. Aplicou os avanços
revolucionários da ciência do século XX para mostrar o fracasso da ciência mecanicista
como meio de interpretar a realidade de forma global e absoluta. Por sua vez, Jorge
Ruiz de Santayana reuniu o pragmatismo, o platonismo e o materialismo numa filosofia
que sublinha os valores intelectuais e estéticos. Benedetto Croce fez do idealismo a
tradição dominante na filosofia italiana; Bertrand Russell continuou fiel às tradições
empíricas e utilitaristas do pensamento britânico; e George Edward Moore defendeu a
realidade dos objetos, apoiando-a na crença do senso comum.
POSITIVISMO E CIÊNCIAS SOCIAIS
Positivismo. No tempo em que na Alemanha prevalecia o idealismo, no Reino
Unido e na França a evolução do empirismo deu lugar à aparição do utilitarismo de

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Jeremy Bentham e de John Stuart Mill e ao positivismo de Auguste Comte. O
utilitarismo, que propunha "a maior felicidade para o maior número possível de
indivíduos", negou a validade dos princípios abstratos e criticou o autoritarismo. O
positivismo, por sua vez, definiu a existência de três estágios de desenvolvimento na
história da humanidade; o teológico-mitológico, o metafísico e o positivo; e considerou
que, já superados os dois primeiros, cabe ao pensamento filosófico, no estágio positivo,
unicamente a descrição dos fenômenos, abstendo-se de interpretá-los metafisicamente.
Marxismo. Karl Marx propôs como objeto da reflexão filosófica o estudo das
relações econômicas e sociais e afirmou que a missão da filosofia, que até então tinha
sido a de pensar o mundo, devia ser agora a sua transformação. Marx subverteu a
dialética de Hegel, segundo a qual a história culminava no estado, garantia da liberdade
do homem, e considerou a luta de classes como a força motora da história.
Novas correntes. A segunda metade do século XIX assistiu ainda ao surgimento
de diversas tendências filosóficas, entre as quais sobressaíram o pragmatismo de
William James; o irracionalismo de Søren Kierkegaard, que antepôs o mundo emocional
ao racional; a filosofia da vontade de Schopenhauer; o vitalismo de Nietzsche,
destruidor dos valores tradicionais e arauto do super-homem; e, sob o impulso da obra
do naturalista Charles Darwin, o evolucionismo.
FILOSOFIA MODERNA (Séc XVII - séc XIX)
Recebe esta denominação o pensamento realizado em vários países da Europa,
compreendido, em linhas gerais, desde as considerações de Descartes até a
sistematização filosófica de Hegel. Contudo, tal delimitação possui muito de arbitrário,
uma vez que, por um lado, alguns autores renascentistas, como por exemplo, Galileu,
configuram antecipações do modo eminentemente moderno de abordar a realidade;
por outro, alguns dos principais temas considerados modernos perduram em várias
linhas da investigação filosófica atual. Deste modo, deve-se ter em mente que esta
classificação é, fundamentalmente, esquemática, servindo para ordenar as diversas
modalidades de pensamento apenas de forma aproximada.
A principal característica deste período é a busca dos princípios pelos quais o
homem pode apreender verdadeiramente a realidade. Enquanto é possível designar as
filosofias antiga e medieval como períodos, fundamentalmente, ontológicos, por
voltarem-se para a investigação do real e seus fundamentos, pode-se dizer que a
filosofia moderna é um período eminentemente gnoseológico da história da filosofia,
sendo sua principal consideração o problema do conhecimento. Este conhecimento é
marcado pela vinculação matemática que possui a ciência deste período. Deste modo, a
verdade buscada pelo conhecimento filosófico moderno deve possuir a certeza, a
simplicidade, a clareza e a mensurabilidade próprios ao âmbito matemático que lhe
serve de parâmetro. Sendo o principal foco de interesse a questão do conhecimento, o
pensamento moderno caracteriza-se, ainda, por adotar uma postura subjetivista. A
análise das condições necessárias para o conhecimento seguro da realidade conduz,
forçosamente, a uma análise do eu subjetivo, como o campo no qual o conhecimento
tem lugar. O conhecimento buscado por esta filosofia, que possui a certeza do
conhecimento matemático, deve ser, por este motivo, necessariamente racional. A
razão é o modo verdadeiro de acesso à realidade, devendo aplicar-se a uma
investigação dos fenômenos naturais tanto quanto à investigação de seus próprios
fundamentos. Neste sentido, as posições consideradas antagônicas neste período -- o
empirismo e o racionalismo -- comungam, porém, quanto à utilização de métodos
fundamentalmente racionais para postular, seja a experiência, seja o intelecto, o
princípio constituidor da realidade.

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Entre os principais filósofos modernos, podemos citar: Descartes, Espinosa,
Pascal, Leibniz, Malebranche, Hobbes, Locke, Hume, Berkeley, Bacon, Montaigne,
Newton, Rousseau, Voltaire, Vico, Kant, Fichte, Condillac, entre outros.
A partir do século XV, a filosofia moderna tem estado caracterizada por uma
contínua interação entre sistemas de pensamento, fundados em uma interpretação
mecanicista e materialista do universo, e os que se baseiam na fé no pensamento
humano como única realidade última. Esta interação reflete o efeito crescente das
descobertas científicas e das transformações políticas na especulação filosófica.
FILOSOFIA CHINESA
INTRODUÇÃO
Filosofia chinesa é a denominação coletiva de várias escolas de pensamento
criadas por eruditos e pensadores chineses. A filosofia chinesa passou por três etapas
históricas: a etapa clássica, período criativo que vai do século VI ao século II a.C.; a
medieval, do século II a.C. ao século XI d.C., período de síntese e absorção do
pensamento estrangeiro; e a moderna, que abrange do século XI a nossos dias, tempo
de maturação das tendências filosóficas anteriores e introdução de novas filosofias,
absorvidas das culturas ocidentais. Em sua evolução, o pensamento chinês tendeu, de
seus espiritualismo, misticismo e sectarismo iniciais, ao humanismo e, mesmo, ao
racionalismo.
ETAPA CLÁSSICA
A etapa clássica da filosofia chinesa teve origem nos últimos anos da dinastia
Chou, que durou de 1027 a.C. a 256 a.C., num clima de anarquia política e agitação
social. Em seus primórdios, a figura mais importante foi Confúcio, que buscava o pleno
desenvolvimento dos seres humanos através da educação moral e do estabelecimento
de uma sociedade hierarquizada.
A segunda grande filosofia da etapa clássica foi o taoísmo. O filósofo Lao-tsé, que
se supõe ter vivido no século VI a.C., é considerado o fundador desta escola. O taoísmo
visava proteger a vida humana, seguindo o Caminho da Natureza ( Tao) e retornando às
primeiras comunidades agrárias e a um governo que não controlasse a vida dos
indivíduos ou interferisse nela. Entre as outras escolas importantes desse período,
encontram-se ainda o mohismo, o naturalismo e os dialéticos.
A escola legalista surgiu como filosofia dominante no Estado de Quing, durante os
caóticos anos entre os séculos IV e III a.C. Seus seguidores afirmavam que toda
liberdade pessoal está subordinada a seu objetivo que é criar um Estado forte sob um
soberano com autoridade ilimitada. Por outro lado, os filósofos confucianos da dinastia
Han criaram um sistema de pensamento que unia elementos dos naturalistas, taoístas e
confucionistas com o respeito à aprendizagem e aos princípios legalistas de
desenvolvimento econômico e de administração, numa filosofia aglutinadora voltada
para o soberano e para o governo. Seu excessivo hermetismo deu lugar a uma forte
oposição nos primeiros séculos de nossa era.
ETAPA MEDIEVAL
Durante os séculos II e III d.C., o vazio filosófico criado pelo colapso do
confucionismo Han foi preenchido pelo taoísmo e também pelo budismo, uma filosofia
então nova na China.
O budismo penetrou na China a partir da Índia e da Ásia Central, entre os séculos
I e VI d.C. Seus ensinamentos eram, principalmente, de ordem religiosa e propunham
escapar dos sofrimentos da vida e da reencarnação infinita, provocados pelos desejos
humanos, alcançando um estado indescritível de ausência de desejo, conhecido como
nirvana. A evolução do budismo adequou-se à predileção chinesa pelo sincretismo, ou
conciliação de credos religiosos opostos. De sua filosofia deriva a doutrina da seita T’ien

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T’ai, mais conhecida como budismo Zen. A reunificação da China, sob a dinastia Sui
(589-618) e a dinastia Tang (618-906), conduziu a vários séculos de sincretismo
religioso filosófico, que aglutinava o taoísmo, o budismo e o confucionismo ressurgente,
ou neoconfucionismo.
ETAPA MODERNA
O neoconfucionismo teve três escolas: a escola do princípio (racionalismo), a
escola da mente (idealismo) e a escola do saber prático (empirismo).
A especulação metafísica do século XI foi sintetizada no século XII pelo grande
neoconfuciano Zhu Xi, que desenvolveu as teses da escola do princípio. Esta escola
afirmava que todas as coisas estavam compostas de dois elementos: o princípio ( li),
que era um reflexo do Grande Absoluto (Tai-chi), e a matéria (ch’i). A escola da mente
surgiu nos séculos XI e XII e seu divulgador foi o estadista Wang Yang-ming. Seguindo
os primeiros ensinamentos da escola, Wang asseverava que a mente não era uma
combinação de li e ch’i, mas apenas li, o princípio. No início da dinastia Tsing, a partir
de 1644, a escola do saber prático deu novo impulso ao estudo dos textos clássicos da
dinastia Han para redescobrir a verdadeira ética e as doutrinas sócios-políticas do
confucionismo.
As falhas do neoconfucionismo se fizeram evidentes no século XIX. Na década de
1890, o filósofo K’ang Yu-wei fez um esforço radical de adaptação do confucionismo ao
mundo moderno como fonte para uma reforma radical das instituições políticas e
sociais chinesas, frente ao imperialismo do Ocidente. A filosofia chinesa do século XX
adaptou uma série de modelos derivados do pensamento ocidental, introduzido desde
1897, ao mesmo tempo em que tentou utilizar idéias das escolas orientais tradicionais.
As filosofias ocidentais mais influentes foram o pragmatismo e o materialismo. Este
último foi o motor da reconstrução econômica chinesa e, a partir do fim da década de
1920, o materialismo histórico adquiriu popularidade entre alguns filósofos não
comunistas. Posteriormente, a maior parte dos materialistas adotou o marxismo-
leninismo como linha política ortodoxa do Partido Comunista Chinês, proposta por Mao
Tsé-tung.
FILOSOFIA ISLÂMICA
Conjunto das concepções filosóficas, expressas em língua árabe e intimamente
relacionadas à religião islâmica, que floresceu entre os séculos VII e XV.
O pensamento árabe representou, em suas mais remotas origens, uma dinâmica
projeção dos grandes sistemas filosóficos gregos, ainda que vazado em língua semítica
e fundamente modificado sob a influência oriental. A dimensão desse fato torna-se
imensa quando se considera que o Ocidente deve aos filósofos árabes quase toda a
preservação, já em nível crítico, do platonismo e, sobretudo, do aristotelismo.
Filosofia islâmica é o pensamento expresso em língua árabe e intimamente
relacionado à religião muçulmana que floresceu entre os séculos VII e XV. Excluem-se
dessa denominação as tendências modernas e contemporâneas da filosofia árabe,
analisadas apenas como floração do Oriente dentro e fora dos limites da Idade Média
latina.
Na origem e, a rigor, ao longo de toda a sua evolução, a filosofia árabe transmite
ao mundo ocidental os fundamentos de quase todo o pensamento filosófico do
Renascimento, em particular na Espanha e na Itália. Sem a contribuição dos
comentadores árabes, o Renascimento seria depositário apenas do monólogo cristão da
Idade Média. Seria correto dizer que os próprios pensadores medievais, em particular
os tomistas, pagaram pesado tributo a esses ousados "heréticos" orientais.
Seitas e escolas teológicas. Em seus primórdios, a filosofia árabe foi
principalmente uma filosofia de teólogos, que devem tudo às crenças e tradições

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religiosas muçulmanas. Até o século IX, as especulações filosóficas do mundo árabe
restringiam-se às discussões teológicas das primeiras seitas e escolas ascéticas, cuja
suprema preocupação residia no exame de questões éticas e morais. O primeiro grande
representante dessa época e notável cultor da reflexão moral de índole teórica foi
Hasan al-Basri, que integrou o grupo chamado Companheiros do Profeta, responsável
pelo início da maioria das discussões teológicas que logo se cristalizariam na
constituição de seitas e escolas teológicas, como as de Antioquia (século III), de
Nasibim, em comunidade de fala síria, e de Nasibim-Edessa, a principal delas, que
floresceu entre os séculos IV e V e reuniu os nestorianos condenados como heréticos
pelo Concílio de Éfeso (431). A esses nestorianos somaram-se depois outras seitas
igualmente heréticas, como as dos monofisistas (responsáveis pela introdução do
misticismo e dos ideais neoplatônicos), dos zoroastrista persas, dos pagãos de Harran e
até mesmo dos judeus.
Tais seitas e escolas; no interior das quais se destacavam os nomes de Alfarabi,
Avicena, Avempace, Abubaker e Averroés, os três últimos já na Espanha; dedicaram-se
inicialmente a debates de questões como os atributos divinos e os conflitos entre a
predestinação e o livre-arbítrio. Contribuíram consideravelmente para a concretização
de uma reflexão filosófica que já se poderia dizer autônoma, cujo expoente supremo foi
Alkindi, que viveu no século IX. Toda essa estratificação orgânica da filosofia árabe
tornou-se possível, em grande parte, graças à transmissão ao universo muçulmano de
consideráveis vertentes dos sistemas gregos, sobretudo o aristotelismo e o
neoplatonismo, o que se deve à versão síria do helenismo, à atividade filosófico-
religiosa dos nestorianos, ao misticismo dos teólogos monofisistas egípcios, e
finalmente, às traduções muçulmanas das versões sírias dos textos gregos.
De Avicena e Algazali. Herdeiro das tradições aristotélico-platônicas de Alkindi e,
principalmente, de Alfarabi, Avicena foi o mais ilustre dentre todos os muçulmanos
orientais. Segundo ele, o conhecimento forma-se a partir da realidade dos objetos
conhecidos, desde a consciência dos princípios primordiais até a revelação escatológica,
passando pelos princípios universais ou ideais. Sua sistematização da especulação
interior é de capital importância para a filosofia escolástica, que absorveu de Avicena
pelo menos três noções básicas: a da existência enquanto acidente que se associa à
essência; a que se relaciona ao conceito da unidade do intelecto agente, constituída à
custa da ascensão da potência no ato do entendimento; e a da distinção entre a
essência e a existência nos seres criados, equivalente à união destes em Deus. Além da
contribuição de ordem metafísica, o avicenismo proporcionou ainda significativas
modificações no campo da lógica, em que conciliou diversos aspectos dos modelos
aristotélicos e estóicos.
Como os predecessores, Avicena tentou harmonizar, em suas várias obras, as
formas abstratas da filosofia com as tradições religiosas do islamismo. Tal pretensão,
porém, falhou em muitos pontos, o que deu origem às críticas movidas contra ele por
Algazali, cujo ceticismo racionalista, particularmente visível em sua Tahafut al-falasifa
(Autodestruição dos filósofos), opõe-se tanto ao aristotelismo avicenista quanto ao
neoplatonismo dos demais filósofos árabes. Em outras palavras, Algazali não admite
racionalização helenizante das crenças religiosas. Seu Deus é o Deus do homem
religioso, e não o do intelectualismo avicenista.
Filosofia árabe na Espanha. Paralelamente às doutrinas desenvolvidas por
Avicena e Algazali, destacam-se aquelas que, a partir do século XI, foram disseminadas
pelos pensadores muçulmanos na Espanha, onde sobressai o nome de Averroés, o
maior dentre todos os filósofos árabes. Antes dele, distinguiram-se o filósofo judeu
Avicebron, Abubaker (autor de um curioso romance filosófico) e, sobretudo, Avempace,

MÓDULO IX...................................................................................................108
que descreveu o itinerário seguido pelo homem para reunir-se ao intelecto agente,
substância una e comum a todos os entendimentos possíveis. É essa, ainda que
obscuramente expressa, a doutrina da unidade do intelecto, cujo maior nome foi
Averroés.
A obra de Averroés; que, como seus predecessores, procurou conciliar filosofia e
dogma; representa a maturidade e a culminância da tradição aristotélica no
pensamento muçulmano da Idade Média latina. Esse trabalho teve grande influência
sobre a escolástica. Em essência, o averroísmo sustentava a eternidade do mundo, que,
por haver sido criado por Deus, não tinha na eternidade uma contradição. Esse mundo
criado e eterno teria surgido por emanação do primeiro princípio criador, mas sua
eternidade exige também a eternidade da matéria, na qual subsistiriam, desde sempre
e enquanto possibilidades, as formas extraídas por Deus para formar as coisas, e não
introduzidas na matéria. A essa eternidade da matéria reagiram Tomás de Aquino e os
antiaverroístas. A doutrina de Averroés, no entanto, iria marcar ainda três outros
momentos históricos: no princípio do século XIII (com o averroísmo latino de Siger de
Brabante), no final desse mesmo século (por meio de Duns Scotus, Pietro d'Abano,
Marsílio de Pádua e outros) e na segunda metade do século XV (com os averroístas da
Universidade de Pádua). Ao século XV pertence também o último valor expressivo da
filosofia árabe, Aben-jaldun, de tendência neoplatônica.
FILOSOFIA INDIANA
Conjunto de concepções, teorias e sistemas filosóficos criados pelas civilizações da
Índia.
Ao contrário dos gregos, os hindus desprezaram a física e a cosmologia em favor
da ontologia e podem ser considerados os verdadeiros fundadores da lógica e da
metafísica. Taranto narra a visita de um filósofo hindu a Sócrates, e o Timeu de Platão
é de nítida inspiração hinduísta.
Filosofia indiana é a denominação genérica que se dá ao conjunto de concepções,
teorias e sistemas desenvolvidos pelas civilizações do subcontinente indiano. Três
conceitos fundamentam o pensamento filosófico indiano: o eu, ou alma (atman), as
ações (karma), e a libertação (moksha). Exceto pelo charvaka (materialismo radical),
todas as filosofias indianas lidam com esses três conceitos e suas inter-relações,
embora isso não signifique que aceitem sua validade objetiva precisamente da mesma
maneira.
Dos três conceitos, o karma, que representa a eficácia moral das ações humanas,
parece ser o mais tipicamente indiano. O conceito de atman corresponde, de certa
maneira, ao conceito ocidental do eu espiritual transcendental ou absoluto. O conceito
de moksha como o mais alto ideal igualmente aparece no pensamento ocidental,
especialmente durante a era cristã, embora talvez nunca tenha sido tão importante
quanto o é para a mente hindu. A maioria das filosofias indianas aceita o moksha como
algo possível, e a "impossibilidade do moksha" (anirmoksha) é tida como uma falácia
material que pode tornar viciosa uma teoria filosófica.
Textos sagrados. Os escritos sagrados da cultura hindu, sobretudo os Vedas (os
mais antigos textos sagrados da Índia), os Upanishads e o Mahabharata, há muito
influenciam o pensamento filosófico indiano. Os hinos védicos, escrituras hindus
datadas do segundo milênio antes da era cristã, são os mais antigos registros
remanescentes, na Índia, do processo pelo qual a mente humana produz seus deuses,
bem como do processo psicológico da produção de mitos, que leva a profundos
conceitos cosmológicos.
Os Upanishads (tratados filosóficos indianos) contêm uma das primeiras
concepções da realidade universal, onipresente e espiritual que conduzem ao monismo

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radical (absoluto não-dualismo, ou unidade essencial da matéria e do espírito).
Também contêm antigas especulações dos filósofos indianos sobre a natureza, a vida, a
mente e o corpo humanos, além de ética e filosofia social.
Sistemas ortodoxos. Os sistemas clássicos, ou ortodoxos, chamados darsanas,
discutem questões como o status do indivíduo finito; a distinção, assim como a relação,
entre corpo, mente e indivíduo; a natureza do conhecimento e os tipos de
conhecimento válidos; a natureza e a origem da verdade; os tipos de entidades que se
pode dizer que existem; a relação entre realismo e idealismo; a questão sobre se os
universos ou as relações são básicos; e o importantíssimo problema do moksha, ou
libertação, sua natureza e os caminhos que a ela conduzem.
As várias filosofias indianas apresentam, no entanto, tal diversidade de visões,
teorias e sistemas, que se torna quase impossível distinguir características comuns a
todas. A aceitação da autoridade dos Vedas caracteriza todos os sistemas ortodoxos
(astika): Nyaya, Vaisesika, Samkhya, Ioga, Purva Mimansa e Vedanta. Os sistemas não-
ortodoxos (nastika) entre eles o charvaka, o budismo e o jainismo, rejeitam a
autoridade védica. Mesmo entre os filósofos ortodoxos, porém, a fidelidade aos Vedas
limitou muito pouco a liberdade das especulações, e os Vedas podiam ser citados para
legitimar uma vasta diversidade de idéias, fossem monistas ou atomistas.
Mimansa, ou Purva Mimansa, é o sistema que fornece regras para a interpretação
dos Vedas e oferece uma justificativa filosófica para a observância do ritual védico. O
Vedanta forma a base da maioria das escolas modernas do hinduísmo e seus principais
textos são os Upanishads e o Bhagavad-Gita. Ao contrário do Mimansa, é um sistema
interessado na interpretação filosófica dos Vedas, mais que com seus aspectos
ritualísticos.
Em sânscrito, Vedanta significa a "conclusão" (anta) dos Vedas. Como eram
muitas as interpretações, desenvolveram-se várias escolas de Vedanta que, no entanto,
têm muitas crenças em comum: transmigração do eu e o desejo de libertar-se do ciclo
de renascimentos (samsara); a autoridade dos Vedas como meio para essa libertação;
Brahma como motivo da existência do mundo; e o atman como agente de seus próprios
atos e, portanto, receptor das conseqüências da ação (phala). Todas as escolas de
Vedanta rejeitam tanto as filosofias heterodoxas do budismo e do jainismo como as
conclusões das outras escolas ortodoxas. Sua influência no pensamento indiano é tão
profunda que se pode dizer que, em qualquer de suas formas, a filosofia hindu se
tornou Vedanta.
A Nyaya examina em profundidade o método de raciocínio conhecido como
inferência. Essa escola é importante por sua análise da lógica e da epistemologia. Já o
Vaisesika sobressai por suas tentativas de identificar, inventariar e classificar as
entidades da realidade que se apresentam à percepção humana. A Samkhya adota um
dualismo coerente entre as ordens da matéria e as do eu, ou alma. Nessa escola, o
conhecimento correto consiste na habilidade do eu de se distinguir da matéria. A Ioga
influenciou muitas outras escolas por sua descrição da disciplina prática para realizar
intuitivamente o conhecimento metafísico proposto pelo sistema Samkhya, a que a Ioga
está intimamente relacionada.
Cada uma dessas escolas de pensamento foi sistematizada por meio dos
conjuntos de sutras. Ao reunir um determinado número de aforismas, fórmulas ou
regras breves e de fácil memorização, os sutras resumem cada uma das doutrinas.
Filosofia indiana e pensamento ocidental. Entre os temas considerados pelo
pensamento indiano e ignorados pelo ocidental estão a origem (utpatti) e a apreensão
(jnapti) da verdade (pramanya). Os problemas que os filósofos indianos na maioria
ignoraram, mas que ajudaram a dar forma à filosofia ocidental, incluem a questão se o

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conhecimento surge da experiência ou da razão, além das distinções entre o juízo
analítico e sintético e entre verdades contingentes e necessárias.
A filosofia indiana começou a interessar o Ocidente no século XVIII, quando foi
feita a tradução do Bhagavad-Gita. No século seguinte, Anquetil-Duperron traduziu do
persa, em latim, cinqüenta dos Upanishads. Foi também no século XIX que a Índia
entrou em contato com o pensamento ocidental, especialmente com as filosofias
empiristas, utilitaristas e agnósticas da Grã-Bretanha. No fim do século, John Stuart
Mill, Jeremy Bentham e Herbert Spencer eram os pensadores mais influentes nas
universidades indianas.
As idéias influenciadas pelo pensamento ocidental serviram para criar uma
vertente de orientação secular e racional, ao mesmo tempo em que estimularam
movimentos sociais e religiosos, entre os quais o movimento Brahmo (Brahma) Samaj,
fundado por Rammohan Ray. No fim do século XIX, o grande santo Ramakrishna
Paramahamsa de Calcutá renovou o interesse pelo misticismo, e muitos jovens
racionalistas e céticos se converteram à fé que ele representava. Ramakrishna pregava
uma diversidade essencial de caminhos que levam à mesma meta. Seus ensinamentos
ganharam forma intelectual no trabalho de Swami Vivekananda, seu famoso discípulo.
Século XX. A primeira faculdade de filosofia da Índia surgiu na Universidade de
Calcutá, no início do século XX, e o primeiro catedrático da matéria foi Sir
Brajendranath Seal, acadêmico versátil que dominava diversas disciplinas científicas e
humanísticas. Sua principal obra publicada é As ciências positivas dos antigos hindus,
que discorre sobre a história da ciência e relaciona os conceitos filosóficos hindus a
suas teorias científicas.
Em pouco tempo, porém, os filósofos mais estudados nas universidades indianas
passaram a ser os alemães Kant e Hegel, e os sistemas filosóficos antigos foram
avaliados à luz do idealismo alemão. A noção hegeliana do espírito absoluto encontrou
ressonância na antiga noção vedanta de Brahma. O mais eminente estudioso hindu
hegeliano é Hiralal Haldar, que abordou o problema da relação da personalidade
humana com o absoluto, como se evidencia em seu livro Neo-hegelianismo. O
acadêmico kantiano que se tornou mais conhecido foi K. C. Bhattacharyya.
Alguns indianos que viveram na primeira metade do século XX merecem menção
por suas contribuições originais ao pensamento filosófico. Sri Aurobindo, ativista político
que mais tarde se tornou yogin, vê a ioga como uma técnica não apenas de libertação
pessoal, mas também de cooperação com a necessidade cósmica de evolução que
levará o homem a um estado de consciência supramental. Rabindranath Tagore
caracterizou o absoluto como a pessoa suprema e colocou o amor acima do
conhecimento.
Para Mahatma Gandhi, líder social e político, a unidade da existência, que ele
chamou de "verdade", pode realizar-se pela prática da não-violência (ahimsa), em que
a pessoa atinge o limite máximo da humildade. Sob a influência do idealismo hegeliano
e da filosofia da mudança, de Henri Bergson, o poeta e filósofo Mohamed Iqbal
concebeu uma realidade criativa e essencialmente espiritual.
FILOSOFIA EM PORTUGAL
Filosofia em Portugal é do ponto de vista histórico, a situação da filosofia em
Portugal tem analogias com a de outros países europeus, com momentos de franco
florescimento e de relativo obscurantismo. Na Idade Média, as questões filosóficas
estavam associadas às discussões teológicas, sobressaindo-se os problemas morais, a
liberdade e o sentido providencial da história. Destacam-se, nesta época, três figuras de
pensadores nascidos em Portugal: Paulo Orósio, Santo António de Lisboa e Pedro
Hispano.

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No ensino universitário seguia-se o percurso escolástico interpretado segundo
alguma das grandes escolas medievais (tomismo, escotismo e ocamismo). O período do
Renascimento foi um dos mais fecundos na reflexão filosófica em Portugal, alimentada
não só pelas fontes antigas como, também, pelos novos conhecimentos do mundo e
dos homens proporcionados pelas viagens. As idéias dos humanistas tiveram franca
aceitação nos meios culturais lusitanos e as obras de pensadores e humanistas
portugueses mereceram o reconhecimento dos melhores espíritos europeus da época.
Merecem destaque os nomes de André de Gouveia, Damião de Góis, Jerónimo Osório e
Francisco Sanches. Também é significativa a contribuição de Francisco de Holanda para
o pensamento estético renascentista e o de Leão Hebreu para a filosofia renascentista
do amor.
O fim do século XVI representa um importante esforço de renascimento do
pensamento escolástico de matriz aristotélica levado a efeito pelos professores
Conimbricenses e outros pensadores jesuítas (Pedro da Fonseca, Francisco Suárez),
ligados pelo magistério filosófico e teológico às Universidades de Coimbra e de Évora.
As idéias da filosofia moderna tiveram pouco eco em Portugal (embora fosse de
origem portuguesa um dos maiores filósofos modernos: Baruch Spinoza) e só no século
XVIII, o pensamento de Bacon, Locke e Newton são recuperados pelo iluminismo
eclético e pedagógico de Vernei, Ribeiro Sanches e frei Manuel do Cenáculo, vindo a
determinar a reforma da Universidade de Coimbra num sentido declaradamente anti-
escolástico e anti-jesuítico, ao mesmo tempo em que extinguia a filosofia do currículo
universitário.
No último quartel do século XIX, alguns pensadores esforçaram-se para se
aproximar das novas correntes do pensamento europeu, principalmente do idealismo
pós–kantiano (destacando-se os nomes de Antero de Quental e Cunha Seixas) e do
positivismo francês (com destaque para Teófilo Braga). No século XX, este esforço
continua, abrindo-se - sobretudo a partir de meados do século - às mais variadas
tendências do pensamento contemporâneo: neopositivismo, filosofia analítica,
neotomismo, existencialismo, fenomenologia, pensamento dialético, marxismo,
pensamento hermenêutico e neopragmatismo. Esta tendência é contrabalançada pelo
movimento da «filosofia portuguesa», representado sobretudo por Álvaro Ribeiro e José
Marinho que propôs, a partir da década de 40, o encontro com as matrizes de um
pensamento hermenêutico da literatura e cultura portuguesas.
Do ponto de vista estrutural, a filosofia em Portugal tem estado marcada pelas
seguintes características:
– Frágil apoio institucional que abrange, também, o ensino, investigação e edição
da cultura filosófica geral.
– Dispersão e diáspora: muitos dos maiores pensadores portugueses, por opção
ou não, viveram e pensram fora do país.
– Descontinuidade: o polemismo, o ecletismo, o ensaísmo e a tendência para
uma filosofia de recorte literário ou para uma literatura e poesia pensantes.
FILOSOFIA NO BRASIL
O pensamento filosófico brasileiro constituiu-se a partir do final do século XVIII,
passando por sucessivas mutações, até ganhar a pluralidade de formas e correntes que
possui em nossos dias. Contudo, não é possível falar de uma tradição intrinsecamente
brasileira de pensamento, constituidora de um cabedal de idéias e de uma metodologia
próprios. Em um país relativamente jovem, cuja porção letrada era formada por
imigrantes europeus e seus descendentes, a filosofia em nosso país foi, em sua quase
totalidade, influenciada por correntes européias, predominantemente pelo pensamento
e cultura franceses.

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Os primeiros pensadores brasileiros de que se tem notícia adotavam as teorias
sensistas e materialistas de Condillac e Cabanis, tentando conciliá-las com o
espiritualismo eclético, veiculado, especialmente, por Victor Cousin. Dentre os adeptos
deste direcionamento, destacam-se, no século XIX, Eduardo Ferreira França e
Domingos José Gonçalves de Magalhães.
Contrapondo-se a esta tendência, a filosofia tomista sempre encontrou expressão
no Brasil. Seu principal órgão de difusão foram os padres jesuítas, cuja ordem chegou
ao país na época mesma de seu descobrimento. Podemos citar, entre seus principais
representantes no século passado, José Soriano de Souza e Vicente Cândido Figueiredo
de Sabóia. O principal objetivo destes pensadores era empreender a crítica, a um só
tempo, do materialismo e do espiritualismo reinantes entre os filósofos brasileiros de
seu tempo, a fim de apresentar o pensamento escolástico como solução para resolver a
contradição matéria-espírito, presente na obra dos filósofos criticados.
Uma doutrina largamente difundida em nosso país durante todo o século passado,
permanecendo atuante até as primeiras décadas deste século, é o positivismo. Seus
adeptos exerceram influência não apenas filosófica, mas igualmente política,
desempenhando importante papel na proclamação da República (vale a pena lembrar
que o lema Ordem e Progresso, presente em nossa bandeira, é igualmente o lema do
positivismo comtiano). Podemos citar, como seus mais eminentes adeptos, Benjamin
Constant, Miguel Lemos e Teixeira Mendes. As correntes evolucionistas e culturalistas,
em voga na Europa durante a segunda metade do século XIX, também encontraram-se
representadas no Brasil. Seus principais divulgadores foram Tobias Barreto e Sílvio
Romero, partidários do culturalismo alemão e do evolucionismo de Spencer,
respectivamente.
Podemos citar como o filósofo brasileiro de maior fôlego e originalidade Raimundo
de Farias Brito, o maior representante da filosofia em nosso país. Este pensador
procura desenvolver uma investigação de caráter próprio acerca dos principais temas
filosóficos atrelados aos problemas existenciais: a verdade, a vida, a dor, a morte.
Segundo Farias Brito, a moral e a finalidade última da filosofia; esta deve atender às
inquietações intrínsecas ao ser humano.
No princípio do século XX, vemos surgir Leonel Franca como um dos nomes mais
representativos do pensamento filosófico deste período. Pensador neotomista,
desempenhou importante papel na restauração e renovação deste pensamento, frente
às questões trazidas pelas doutrinas materialista e espiritualista.
O pensamento filosófico em nosso país foi, ao longo do século XX, ampliando seus
horizontes e suas áreas de contato. Apesar de ainda não podermos falar em uma
“filosofia do Brasil”, é possível abordar a filosofia no Brasil como sendo matéria de
interesse crescente. Em nosso país, algumas universidades divulgam uma gama muito
diversificada de correntes, ocorrendo estudos aprofundados e intercâmbios com os
principais pensadores de nosso século. Podemos citar, como principais direcionamentos
da investigação filosófica brasileira atual: a filosofia analítica, o pensamento existencial
francês e alemão, as filosofias antiga e moderna, o marxismo, a ética, a epistemologia,
a lógica, a filosofia francesa contemporânea.
Filosofia no Brasil é o desenvolvimento de escolas de pensamento estrangeiras
adaptadas à realidade cultural e social brasileira.
A filosofia no Brasil defrontou-se, desde o início, com a questão do homem,
encarando-o, inicialmente, como liberdade em decorrência de circunstâncias concretas:
a independência. Silvestre Pinheiro Ferreira (1769-1846) procurou mostrar que a
transição da monarquia absoluta para a constitucional liberal, não seria possível sem
uma indagação teórica. A resposta de Silvestre foi no sentido de inserir esta indagação

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em um sistema que incorporasse a modernidade, sem renegar a tradição aristotélica
empirista. É o que fez nas Preleções filosóficas (1813), inspirando-se em Locke.
No contexto da cultura luso-brasileira, era impossível ignorar a questão da
liberdade. No ambiente protestante, o novo sistema político podia conciliar-se com a
idéia de que não haveria livre-arbítrio porque a missão do homem na terra era criar
uma obra digna da glória de Deus, devendo o Estado permití-lo. Nesta tradição, o
homem era um peregrino neste mundo. No século XVIII, o livro mais difundido no
Brasil, Compendio narrativo do peregrino da América, de Nuno Marques Pereira (1652-
1728), afirmava que "o homem é um vil bicho da terra e um pouco de lodo". O
problema era, se o homem não é livre e não tem como missão humanizar o mundo mas
fugir dele, como criar uma sociedade livre através de uma revolução. De várias formas
responderam Frei Caneca, Cairu e o regente Feijó. Acabou predominando a escola do
espiritualismo eclético, pregando a liberdade em bases empíricas, sem negar a
autonomia do espírito. Esta escola reuniu quase todos os intelectuais da época em um
movimento rico em obras e autores, entre eles, Gonçalves Magalhães.
A solução apaziguadora do ecletismo não durou muito. A geração de 1870 aderiu
ao que Silvio Romero denominou de "surto de idéias novas". Agora valia,
exclusivamente, a ciência. A filosofia deixara de fazer sentido. O homem foi enquadrado
numa física social, baseada na moral e na política científicas. Tobias Barreto procurou
demolir estas pretensões. Para ser objeto de ciência, a compreensão do homem deveria
ser completa. Acontece que o homem se orienta por causas finais. A verdadeira
característica humana, escreveu, consiste na "capacidade de conceber um fim e dirigir
para ele as próprias ações, sujeitando-as destarte, a uma norma de proceder", sendo
um animal que se doma a si mesmo.
Tobias Barreto apontou na direção do culturalismo contemporâneo que via na
criação da cultura o diferencial do homem. Começou um novo ciclo na meditação
brasileira na qual o homem passou a ser encarado como consciência. Iniciou-se a
superação do positivismo, característica da filosofia da época, e surgiram suas
vertentes: o neopositivismo, fenomenologia, existencialismo, culturalismo e o
neotomismo. Este processo foi lento e penoso no Brasil, pela longa tradição cientificista
da cultura portuguesa iniciada pelo marquês de Pombal que alimentou o positivismo.
A hegemonia positivista no ensino termina nos anos 1920 e, na década de 1930, o
inicio dos cursos superiores de filosofia - com professores franceses na Universidade de
São Paulo (USP) - abriu o pensamento brasileiro ao mundo. Contribuiu para isto a
reação neokantiana no âmbito da filosofia do direito, com Djacir Menezes e Miguel
Reale. Na década de 1940, Nilton Campos inaugurou a difusão da fenomenologia e, na
década seguinte, Cannabrava e L.Hegenberg difundiram o neopositivismo.
Na mesma década, o neotomismo firmou-se graças ao empenho de, entre outros,
Leonardo Van Acker. Reconstituiu-se o fluxo normal e plural das idéias filosóficas no
país que o positivismo desejara interditar.
Hoje, brasileiros fazem doutorados no exterior e inserem o país na normalidade
filosófica. Através da Revista Brasileira de Filosofia - acompanhada das publicações
periódicas dos inúmeros cursos de graduação e pós-graduação - levou a filosofia
brasileira a grande desenvolvimento.
FILOSOFIA NA ATUALIDADE
A partir do começo do século XX teve início uma reflexão radical sobre a natureza
da filosofia, sobre a determinação de seus métodos e objetivos. No que diz respeito ao
método, destacaram-se as novas reflexões sobre a epistemologia ou ciência do
conhecimento; surgidas a partir do estudo analítico da linguagem, e o impulso dado à

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filosofia da ciência. As preocupações fundamentais do pensamento filosófico foram as
concernentes ao homem e sua relação com o mundo que o cerca.
Dentro da chamada filosofia analítica, o empirismo lógico do Círculo de Viena foi
uma das correntes filosóficas que mais ressaltaram ser a filosofia como um método de
conhecimento. Para essa corrente, o objeto da filosofia não é a proposição de um
sistema universal e coerente que permita explicar o mundo, mas sim o esclarecimento
da linguagem das proposições lógicas ou científicas. Ora, para que elas tenham sentido,
devem ser verificáveis, de tal modo que as que não o forem -- por exemplo,
proposições acerca da ética ou da religião -- carecem de qualquer interesse filosófico.
Também a escola de Oxford considerou a linguagem como objeto de seu estudo, se
bem que tenha concentrado sua atenção na linguagem comum, na qual quis descobrir,
latentes, as várias concepções elaboradas sobre o mundo. O austríaco Ludwig
Wittgenstein insistiu na importância fundamental do estudo da linguagem e afirmou
que ela participa da estrutura da realidade, já que não é senão um reflexo, uma
"figura", da mesma.
A fenomenologia de Edmund Husserl propôs uma análise descritiva que permitisse
chegar à evidência da "própria coisa", não como existente mas como pura essência.
Para o vitalismo de Henri Bergson há dois modos de conhecimento: o analítico, no
campo da ciência, e a intuição, própria da filosofia e único meio de captar a
profundidade do homem e do mundo.
No que diz respeito às inquietações e propostas da moderna filosofia, cumpre citar
o instrumentalismo de John Dewey, que estabeleceu como orientação da filosofia e
como critério da verdade a utilidade de uma idéia face às necessidades humanas e
sociais; o existencialismo, que antepôs, na sua reflexão filosófica, a própria existência
do homem a qualquer outra realidade; ou o estruturalismo, que postulou, no estudo de
qualquer realidade, que ela devia ser considerada nas suas inter-relações com o todo
de que faz parte.
Numerosos filósofos integraram em seu pensamento elementos pertencentes a
escolas filosóficas diferentes. Sartre, por exemplo, foi existencialista e marxista, e os
pensadores da chamada escola de Frankfurt ensaiaram uma síntese de marxismo e
psicanálise.
Tanto o marxismo, que com sua pretensão de constituir um instrumento
transformador da sociedade, ultrapassou a simples classificação de escola filosófica,
quanto a psicanálise, que, ao contrário, somente pretendeu em princípio ser uma teoria
e uma terapia psicológicas, exerceram influência poderosa no pensamento filosófico
contemporâneo.
Ao contrário das filosofias antiga, medieval e moderna, que possuem uma unidade
bem delimitada e, assim, apresentam características determinadas, a filosofia
contemporânea é formada por diversas tendências e diferentes problemas, sem
apresentar, portanto, uma orientação comum que possa vir a caracterizar
univocamente o que seja o pensamento contemporâneo. De modo geral, a filosofia
contemporânea começa a partir da crise do pensamento moderno. Se o pensamento
moderno se funda na soberania da razão, o contemporâneo nasce com a crítica ao
racionalismo. Podemos situar historicamente este nascimento, de acordo com alguns
autores, por volta do ano de 1831, ano da morte de Hegel, com o movimento do
romantismo alemão; todavia não há uma unanimidade quanto a esta data, já que
muitos autores defendem a tese de que este nascimento só irá ocorrer nas últimas
décadas do século XIX.
Pela própria pluralidade da filosofia contemporânea, é impossível reduzir todas as
vicissitudes deste pensamento a alguma característica determinada. Neste sentido,

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destacaremos apenas os traços mais importantes deste período da filosofia, sem
todavia determinarmos uma essência que perpassa todo este pensamento.
Podemos citar como características mais importantes da filosofia contemporânea
os seguintes fatos: a crise da metafísica com a derrocada do ideal pós-kantiano e o
conseqüente abalo nos fundamentos das diversas ciências; o abandono do mecanicismo
clássico para dar lugar, cada vez mais, a um fenomenismo; surgimento de um
pensamento contrário a toda perspectiva metafísica da questão filosófica; uma
crescente preocupação pelos temas da evolução, tanto no âmbito biológico como no
social, o que proporciona o surgimento de um pensamento evolucionista histórico; o
surgimento de uma filosofia política, cujo propósito é não só pensar a realidade mas,
principalmente, transformá-la socialmente; a recusa de um idealismo romântico em prol
de um neo-positivismo dinâmico e especializado, com um cunho científico matemático
como também histórico e psicológico; surgimento de filosofias dos valores e da vida,
assim como da fenomenologia, do materialismo e do existencialismo; constituição de
uma psicologia da forma que busca pensar não só estruturas psicológicas, como
também físicas e genéticas; o advento da psicanálise e a questão do inconsciente; o
pragmatismo lógico, as filosofias da linguagem, as analíticas, o desenvolvimento da
lógica; o marxismo em todas as suas vertentes filosóficas e políticas.

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