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Wim Wenders falando de si e dos seus filmes: uma viagem a um universo ‘m que as imagens impdem a sua ldgica, um discurso sempre emocionado, deixa transparecer a angustia, o entusiasmo ea perplexidade de um lar que resiste & efemeridade do visivel. ‘lonal de Portugal - Catalogagao na Publicagao WENDERS, Wim, 1945- légica das imagens. - Reimp. - (Arte & comunicag&o ; 50) ISBN 978-972-44-1471-3 Cbu 791 ___Timpressio ¢ Acabamento DPS - DIGITAL PRINTING SERVICES, LDA EDICOES 70, LDA. em Agosto de 2018 ISBN: 978-972-44-1471-3 SBN da 1 edicfo: 972-44-0437-4 Wenders, nascido a 14 de Agosto de 1945 em Diissel- uentou. depois de estudos interrompidos de Medicina ilosofia, de 1967 a 1970, a Escola Superior de Cinema de escreveu critica de cinema entre 1968 e 1971 e rodou, ), Summer in the City, a sua primeira longa-metragem. partiu em 1979, por varios anos, para a América. 982, encenou a primeira representagao da peca Uber die de Peter Handke, no Festival de Salzburgo. Wenders, or e produtor, vive em Berlim, ebeu pelos seus filmes, varias vezes, 0 prémio para 0 filme alem&o (Falsche Bewegung/Movimento em Fal- ar amerikanische Freund/O Amigo Americano, Der liber Berlin/As Asas do Desejo), bem como prémios jonais: 0 Leao de Ouro, em Veneza (por Der Stand der Estado das Coisas), a Palma de Ouro, em Cannes (por que tenho esta terrfvel pergunta diante de mim, vém- 2 espirito uma série de respostas possiveis. De manha noite outra, mais uma na mesa de montagem, outra contemplar as fotos de antigas filmagens, uma quando com a contabilista, mais uma quando penso nas pessoas quem trabalho desde h4 anos. Todas estas respostas, todas raz6es para filmar, s4o validas s40 verdadeiras, mas digo comigo que «lA atrés» tem de haver algo que é «ainda verdadeiro», talvez uma «obrigaciio» ou até uma «neces- Quando, com doze anos, rodei o meu primeirissimo filme com uma camara de oito milimetros, coloquei-me a janela de asa € filmei de cima a rua, 0s carros e os transeuntes. O meu yiu-me e perguntou; «Que fazes tu ai com a camara?» E eu -«Estou a filmar a rua, como bem vés.» «E para qué?», intou-me ele. Nao soube que responder. Dez ou doze anos . um cruzamento, do sexto andar, sem mexer a cdma- nte tanto tempo até a bobina estar vazia. A ideia de antes nado me ocorreu. A distancia, posso ima- -me deve ter parecido um sacrilégio. pale A ier destruicao da percepeao i Filmez-Vous? 700 Cinéastes du Monde entier Libération, caderno especial de Abril de 1987. Mesmo no comego — e dele muito reston —, para mim, fazer es era: colocar-se a cimara algures e dirigi-la para alguma isa muito concreta, e depois nao fazer mais nada, deixé-la _apenas correr. E os filmes que mais me impressionavam eram também os dos realizadores muito, muito antigos, da viragem ~ do ila, que gravavam apenas e se admiravam que depois 1 sse algo no material. Estava-se, muito simplesmente, pelo facto de se poder fazer uma imagem de alguma a em movimento e de se poder revé-la. Um comboio entra a estac¢do, uma mulher de chapéu recua um passo, ha fumo, e gis 0 comboio para. Os pioneiros do cinema filmavam, & manivela, alguma coisa como isto, examinando-a no dia seguin- fe, muito orgulhosos e contentes. — E mais o olhar do que 0 MiG eralmente, ok modo imedinio filme A o Robby ¢ cu, horas @ meta, um filme a preto ¢ tue coddmos em seis dias, Summer in the quase privado, devido ao as de as pessoas serem amigas ¢ devido ao facto de termos ral tudo. apenas uma vez ~ ou duas yezes, no quando. alguma coisa corria totalmente mal, Este pri- realmente ser téo longo quanto quis, ¢ foi o na escola superior de cinema. Chegou a até para mim préprio era demasiado longo; tem duas horas e meia. Ha nele uma imagem de um Berlim, que permanece durante dois minutos, sem se, $6 porque eu gostava muito desse cinema is, Ow 0 trajecto ao longo da Kudamm, de filmado da janela do carro. Tem a duragio ‘minuto, 36-9 passar e, quando fiz rds na sala € corta as fitas : nigo e disse-me que lhe tinham agradado =n Une Mak POE ae azo 6 que eu nao tinha Smee) HORI oie que atrayessei o tinel. ud se-Ihe: «O tinel durou, infelizmente, todo este tempo, ae metros de comprimento.» E af, ele olhou-me de soslaio Now he sse: «Voc? nilo pode fazer isso.» Eu deveria era ver os filmes ” dele; ele fazia filmes em 8 mm, tinha estado na Roménia ¢ tinha © feito um. filme de 20 minutos ~ e ali estava tudo sobre a Romé- ‘Bstava verdadeiramente zangado, embora anteriormente ido muito amével. JA nao se despediu, nem sequer _ me cumprimentou. E, apesar disso, nés tinhamos-lhe anterior mente apresentado muita coisa no filme que o poderia ter tor~ lo realmente agressivo, mas nada disso 0 afligiu, de modo ~ nenhum, tanto como o facto de eu nao ter desligado a cfimara no tinel. Quando a imagem nao muda, quando as pessoas julgam ja viram 0 suficiente e ela, apesar de tudo, permanece, 2m de um modo estranhamente colérico. Pensam que teria -haver uma razio, mas néio pensam de modo nenhum que, ” io, chega perfeitamente que nos agrade o que ha para _ yer, Tem, portanto. que haver uma outra razfio que as pessoas vio conhecem e isto tora-as coléricas. E, de facto, mais colé- io que perante ofensas auténticas que também podemos, vida, filmar. ‘muito importante que os filmes denotem uma sequén- gosto de nada que perturbe essa sequéncia ou que a— atural. Os filmes, ainda que sejam tao artificiais exemplo, aquele que estamos agora a fazer, A An- , Guarda-redes..., em que respeitar esta sequenciali- uidade do movimento ¢ a sequéncia da aegao tem que ser coerentes, 0 tempo que € apresentado » pode, sem mais nem menos, dar um salto. y primeiro € vemos muito bem que, yu para ele, tempo que agora falta, que algo de inteiramente monstruoso, colérico. E inteiramente indiferente de que “se trata, mas acho sempre que € muito impor- ativamente & sequéncia do tem- sunt am apresentados de modo artificial, trate, em absoluto, de «tealidade». Precisa- temos que nos agarrar’a regras muito concretas, te regras de vistio. Nao gosto, de modo nenhum, s que procedem abstractamente © nos quais cada imagem, modo, constitui um pensamento s6 por si, em que as pensamentos jsolados resultam, entao, em alguma itrsrio. Nos filmes, ha sequéncias de tempo que tém utras, e nfo pensamentos que tenham aos outros. Acho que uma mudanga de cena nc e \, ef fina- ie ch | préxima. No. fundo, do que aria era de nfo ter de omitir todo o tempo entre rém, que o omitir por vezes, porque isso dura ager vai da sala de . insuportavel nao mostrar, escada, pelo meio. ‘outro? De algum moro, 0 problema de neabar Mi aegho que, no fundo, continua ~ phe-sesne logo ver os argumentos. De certa forma, porém, 6 filme justamente o corte, ‘Todas ay acgdes, ludo o que, HO ASO, ABOrA O guArdaredes faz, tem alguna continuidade a quill Se mostra justamente apenas una parte mullo particular, stitui para mim a maior parte das dificuldades: coma € escolhe, ~ Aparecett recentemente um jornalista que jA conhecia 6 mance quase de cor, a perguntar por passos exnctos do to, e como é que eu os teria filmido e, nessa altura, tive “medo, Isto ¢, no momento em que alguma colsa jA esta real mente conclufda, em que medida é que o filme tem algo a ver com 0 livro, ou se é que tem de todo a ver com 9 livro, Houve “f alguém que, a0 acabar de yer uma amostragen, disse que uma ‘cena muito concreta Ihe tinha parecido realmente como que satda do livro. E eu j4 nfo me lembrava, sequer, 6¢ isto estava -Jealmente no livro ou como é que era precisamente no Livro € “admirei @ apenas que viesse af alguém ¢ dissesse que aquilo era tal ¢ e qual como no livro. ~ No liveo interessousme, no fiat: - do, menos «Handke» do que a histéria ¢ o modo como alguma -oisa é descrita, como seja a mudanga de uma frase para outta, que nos leva, de repente, a ler muito interessados, mais e mais, "porque cada frase esta de modo muito exacto cerla por si mes de modo que, a certa altura, a sequéncia das frases interes ito mais do que a sequéncia da acgao, como as colsas “evoluem ou o que, afinal, se passa, No livro, isto apradou-me e|mente. ‘A forma como uma coisa se segue 4 Outra, uma Esta exactidio foi também precivamente 0 que fazer o filme, ¢ também de fazer 9 filme — semelhante, nomeadamente com imagens qué se utr de um modo que se assemelha hs | s, portanto, que também tem que estar certas 9 - é nah isso oO de ter dito-tuda t isto de modo muito pou. de certa forma, nunca mais reflecti teoricamente que estamos a fazer o filme. Espero que este aa modo, um filme popular. Cuidei sem. alguma coisa demasiado subtil, especial, -alguma coisa muito simples. Porém, no para nos insi- , Mas para interessar talvez também as pessoas que s6 ‘filme porque talyez thes recorde 0 futebol. E, no tudo o que pudesse perturbar alguém. Julgo também sera um filme de compreensdo muito facil. Nao hi mada de misterioso, secreto, confuso, embora ‘sempre 0 mais dificil de as pessoas entenderem, que realmente nada para alémdo que vemos no filme e ‘nao representa nada mais para além do que ele faz. torne um filme dificil de compreender para muita esforcei por fazer um filme tém que 14 procurar mais do que la Setembro de 1971. Filmkritik, 1972, cader-

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