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Roteiro de Leitura

LACAPRA, Dominick – Retórica e História

Sobre o autor

• Dominick LaCapra, 1939-...


• Norte-americano, ensinou na Cornell University, de onde é hoje professor emérito; dedicou-
se não apenas ao ensino da história, mas também à literatura comparada e aos estudos
judaicos; nos últimos anos, vem refletindo sobre memória e as possibilidades de narrar o
trauma, particularmente em relação ao holocausto
• LaCapra transitou da história intelectual para preocupações teóricas e epistemológicas;
esforçou-se em aproximar a história dos procedimentos da crítica literária; também dialoga
com a teoria psicanalítica
• Em muitos de seus estudos, questionou usos simplificados da noção de contexto, como algo
que incidiria de maneira determinista sobre os textos, “explicando-os” de modo unidirecional
e inevitável. LaCapra tampouco sustenta, entretanto, uma visão do texto como algo
absolutamente descolado do contexto, ou da linguagem como completamente autônoma – ao
contrário, convida a pensar a relação entre texto e contexto em termos dialógicos

O texto e sua conjuntura de publicação original

• “Retórica e história” é o primeiro capítulo de History and Criticism, coletânea de artigos e


ensaios publicada originalmente em 1985
• Nunca traduzida integralmente no Brasil, essa obra parece ter despertado, inicialmente, o
interesse de historiadores que trabalham na fronteira com a literatura: o capítulo 5 apareceu
como “História e o romance” na revista de história da UNICAMP em 1991. Mais recentemente,
o livro vem sendo recuperado em torno de preocupações teóricas e historiográficas. Além de
nosso texto de leitura obrigatória, a polêmica crítica de O queijo e os vermes, de Carlo
Ginzburg, segundo capítulo de History and Criticism, foi publicada na revista Topoi em 2015,
sob o título “O queijo e os vermes: o cosmo de um historiador do século XX”.
• Alguns elementos do prefácio1 que nos podem auxiliar na leitura:
o LaCapra afirma como seu propósito reavivar um entendimento da historiografia como
algo intimamente ligado ao discurso retórico e ético-político, o que se traduz, para o
autor, em uma busca por aproximar a história social (contextos) da história
intelectual (interpretação, métodos de crítica e autocrítica)
o Ele procura argumentar que “todas as formas de historiografia talvez se beneficiem
de modos de leitura crítica que tomam como premissa a convicção de que
documentos são textos que suplementam ou retrabalham a ‘realidade’ e não
meramente fontes que divulgam fatos sobre a ‘realidade’” – ou seja, sustenta uma
nova forma de crítica das fontes, mais atenta a seus aspectos linguísticos e aberta aos
diálogos com a teoria literária e com as filosofias da linguagem
o LaCapra também está preocupado com as dimensões éticas e políticas do trabalho de
historiadoras e historiadores, com a possibilidade de a história constituir, mais que
simplesmente uma profissão, uma vocação

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LACAPRA, Dominick. Preface. In: History & Criticism. Ithaca: Cornell University Press, 1985, p. 9-12.
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“Retórica e história”

• LaCapra abre o texto com a constatação de que a retórica vinha ganhando força entre os
historiadores como objeto de estudo, mas que raramente se empreendiam esforços reflexivos
e autocríticos sobre a própria retórica e seu papel na constituição e no desenvolvimento da
nossa disciplina (p. 97)
Sugiro que vocês leiam o texto procurando entender: Como LaCapra entende a retórica? e que
funções ele sugere que uma atenção às dimensões retóricas do discurso pode desempenhar
no âmbito da teoria da história?
• Quando começa a explicitar sua concepção de retórica e comenta a perspectiva de revisitar as
concepções antigas a partir das modernas análises linguísticas e discursivas, LaCapra alude
implicitamente a Aristóteles. O filósofo grego pensou a retórica como complementar à
filosofia, e não como algo a ser evitado, uma distorção do conhecimento com fins
argumentativos e sobretudo políticos, como costuma ser o sentido atribuído à retórica no
senso comum. Aristóteles também distinguiu três gêneros de retórica – cuja retomada pode
ser útil para as reflexões sobre os laços entre retórica e história, na medida em que cada um
deles remete a diferentes objetivos e estruturas temporais:2
a) Deliberativa ou política: argumentos contêm conselhos ou dissuasões; seu fim é
demonstrar que uma determinada ação é conveniente ou prejudicial; refere-se ao
futuro
b) Forense ou judicial: argumentos contêm acusações ou defesas; seu fim é
demonstrar a justiça ou injustiça; refere-se ao passado
c) Epidíctica ou demonstrativa: argumentos contêm elogios ou censuras; seu fim é
mostrar a virtude ou o defeito de uma pessoa ou coisa; refere-se ao presente
Em todos esses casos, a retórica se associa às coisas possíveis e, portanto, está
ligada à busca pela prova, e não a uma mera distorção da realidade para cumprir
determinados fins argumentativos.
• Parte crucial da argumentação de LaCapra se constrói em torno da crítica ao que ele chama de
“modelo documental de conhecimento”
Sugiro que vocês leiam o texto procurando entender: O que LaCapra entende por “modelo
documental de conhecimento”? Por que motivos ele o critica? Como a atenção à retórica pode
ajudar a superar as limitações desse modelo?
• Sugestões pragmáticas para o percurso da leitura:
1. As p. 97-102 contém a apresentação geral dos objetivos e das preocupações teóricas do
texto; prestem bastante atenção nessas páginas.
2. Entre as p. 102 e 112, LaCapra retoma algumas obras de balanço e polêmicas
historiográficas que se desenvolveram nos Estados Unidos entre as décadas de 1960 e
1980; o objetivo é ilustrar a prevalência do “modelo documental de conhecimento”; não
se preocupem tanto com os detalhes nesta parte da argumentação.
3. A partir do final da p. 112, até o encerramento do texto na p. 118, LaCapra esboça o que
chama de um “programa pragmático ou ‘positivo’”, ou seja, traça propostas concretas
sobre as relações entre retórica e história, em 8 tópicos numerados.
Uma boa forma de apreender essas propostas é tentar sintetizar cada uma delas em uma
frase curta.

2
Resumo elaborado a partir de: ARISTÓTELES. Retórica. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012, p. 21-24.

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