Você está na página 1de 5

ALCALÓIDES DE PESCHIERA AFFINIS (MUELL.

A R G ) MIERS (APOCYNACEAE)

Wilson Wolter Filho (*)


Carlos Humberto Souza Andrade (**)
Raimundo Braz Filho (***)
Francisco José de Abreu Matos (**)

RESUMO

Á vista da discohdanda do* dado* h.cgi*to.ado* na lÁXeAatuAa {Cava,!964, 1968 ;


JeA&y, 1963 e Moto*, 1976) quanto ao* alcalóide* dt PeAcíiíeAna afâini*, teXonou-*z * eu
OAtudo com o objetivo cie avaliou a po**Zvzl influindo de. fato fiz* ecológico* na compo*i
ção química dz*ta z*pzdz. Foiam anali*ado* amo*toa* da* ca*ca* e do Iznko da* καΐ-
zz* de matzAÃ.al coletado em locais dife/ientes cm altitude, longitude e latitude, foàam
identificado* aim de *ub*tânda* de natureza atifaXxca {*ito*teAol, β-amÍA-Ína e lupe-
ol). o* *e.Quint.e* alcalóide* indÓlíco*: cotionan.idina, voacangina, 20-zpihzynzanina, voa
icfiidtina, affini*ina, vobaAina, olÁvadna c uma mi*tun.a de. 19-hidAoxi-ibogamina e. iboxi
galna). dzntoz e*tz*, quatAo *ão inédito* na z*pzdz {voacangina, voacdòt-ina, 19-hi -
(koxi-ibogaina e. zboxigaXna). Ape.no* pequena* difçAznça* Cofiam ob*eAvada* no* toz* ma-
tzAiaiò e*tudado*, ob*eAvando-*e poKem, acentuado aife.fie.nco quando compa/iada* com o* ne
iuttado* obtido* no pnÁxadAo toabalho químico *obfie o* alcalóides dz*ta z*píde {JznAy,
1963).

DíTRODüÇÃO

Peschiera affinis está registrada na literatura como espécie ambígua no gênero

(Cava, M . P . e t a í . , 1968) e m f u n ç ã o d o s t i p o s d e a l c a l ó i d e s q u e t e m sido i s o l a d o s desta

espécie. A ausência de alcalóides d o tipo iboga p r i m e i r o s trabalhos levou o s autores

a sugerir e s t e f a t o c o m o u m p o s s í v e l distintivo entre os gêneros Peschiera e Tabernae -

montana (jerry, Α . , e t a i . , 19&3). No terceiro trabalho foram descritos, entretanto ,

alcalóides d o t i p o iboga c o m o p r i n c i p a i s c o n s t i t u i n t e s , c o n c o m i t a n t e m e n t e com a presen-

ça de a l c a l ó i d e s d o t i p o s a r p a g i n a ( M a t o s , F.J.A., e t a i . , 1 9 7 6 ) , o q u e p a r e c e sugerir,

segundo o s a u t o r e s , q u e e s t a s d i f e r e n ç a s q u í m i c a s t e m p o u c a s i g n i f i c a ç ã o sistemática.

( *) Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - CNPq/INPA.


( ** ) Universidade Federal do Ceará - UFCe
( *** )Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ.
Por o u t r o lado v e r i f i c a - s e q u e a e s p é c i e m u d o u sua d e s i g n a ç ã o g e n é r i c a de Taber-

naetnontana, o r i g i n a l m e n t e dada por M u e l l e r A r g o v i e n s i s , p a r a P e s c h i e r a , d a d a por Miers

quantro vezes, desde 1970 ( M a t o s , I960) o q u e p a r e c e s u g e r i r um e l e v a d o g r a u de seme-

lhança e n t r e os d o i s g ê n e r o s (Hwang e t a l . , 1 9 & 9 ) · Esta s i m i l i t u d e se r e p e t e na consti

tuição qufmica com referência aos alcalóides identificados em várias plantas de ambos

gêneros.

Supondo então, que as diferenças r e g i s t r a d a s na l i t e r a t u r a q u a n t o a constituição

q u í m i c a d e s t a e s p é c i e p u d e s s e m d e c o r r e r de v a r i a ç õ e s e c o l ó g i c a s a m b i e n t a i s , retomou- se

o e s t u d o d a p l a n t a c o l e t a n d o - s e e s p é c i m e s e m três l o c a i s de d i f e r e n t e s a l t i t u d e , longi-

t u d e e l a t i t u d e , t o d o s s i t u a d o s no N o r d e s t e . S e l e c i o n o u - s e p a r a o e s t u d o comparativo a

casca e o lenho das rafzes q u e f o r a m t r a b a l h a d o s separadamente.

PARTE EXPERIMENTAL

MATERIAL Ε MÉTODO

0 material u s a d o para e s t u d o e n v o l v e u a c a s c a e o lenho d a raiz de exemplares de

Peschiera (Muel1. Arg.) M i e r s , coletados nos seguintes l o c a i s : a r r e d o r e s d e Fortaleza ,

CE ( l a t i t u d e Sul : 3 ° ^5 1
^ 7 ' , long i t u d e V/.C r. : 3 8 ° 31 1
2 3 ' , a l t i t u d e : 2 6 , 3 5 m ) , arredo -

res de U b a j a r a , CE ( l a t i t u d e S u l : 3 ° 5 1 , l o n g i t u d e W . G r . : k°
1
5 6 ' , a l t i t u d e ; 870m) e

a r r e d o r e s de Cocai , PI (latitude S u l : 3 ° 2 8 ' 96 11


, l o n g i t u d e W . G r . : h]° 3 4 ' , altitude :

122m) (IBGE, 1959). Suas e x s i c a t a s e s t ã o d e p o s i t a d a s no H e r b á r i o d o D e p a r t a m e n t o de

Biologia da U n i v e r s i d a d e Federal do C e a r á , sob os n?s 9 6 3 8 , 9 6 9 5 e 9 6 7 8 , respectivamen-

te, onde foram botanicamente identificadas.

Os e x t r a t o s m e t a n o l i c o s d a c a s c a e d o lenho d a raΓζ d o s três e s p é c i m e n s de P.

affinis, obtidos separadamente, foram submetidos ao seguinte processo de extração e

frac i onamento:

0 e x t r a t o m e t a n o l i c o foi d i s s o l v i d o e m u m s o l u ç ã o a q u o s a de á c i d o tartãrico a 8¾

com aquecimento. A s o l u ç ã o , a p ó s a t i n g i r a t e m p e r a t u r a a m b i e n t e , foi filtada através

de um funil de placa porosa ã pressão reduzida. 0 f i l t r a d o foi e x t r a í d o c o m 5 porções

de 400 ml d e é t e r e t í l i c o a fim de r e m o v e r o m a t e r i a l não alcaloídico, Este extrato

revelou f r a c o t e s t e p o s i t i v o p a r a a l c a l ó i d e s , s e n d o c o n s t i t u í d o p r i n c i p a l m e n t e de subs-

t â n c ias ali fát i c a s .

A s o l u ç ã o a q u o s a a c i d a foi e n t ã o a l c a l i n i z a d a c o m h i d r ó x i d o de a m ó n i o sendo, em

s e g u i d a , e x t r a í d a c o m 5 p o r ç õ e s de h00 ml de é t e r e t í l i c o , s u c e s s i v a m e n t e , p a r a remover

a maior parte dos alcalóides e, logo a p ó s foi e x t r a í d a c o m 3 p o r ç õ e s de clorofórmio ,

(5OO ml d e c a d a uma) a f i m d e r e m o v e r o r e s t a n t e d a s b a s e s η i t r o g e n a d a s .

A a n á l i s e d a s f r a ç õ e s por c r o m a t o g r a f i a e m c a m a d a d e l g a d a d e s í l i c a permitiu cons

tatar a identidade entre as frações etéricas e clorofórmicas o b t i d a s .

A fração etérea contendo os alcalóides t o t a i s foi s u b m e t i d a a f r a c i o n a m e n t o cro

194 Vol ter Filho et a)


matogrãfico e m c o l u n a de s í l i c a (Merck, a r t . 773*0 eluída sucessivamente com hexano,

hexano/benzeno (1:1) b e n z e n o , b e n z e n o / a c e t o n a (9,5:0,5;9,1;7:3) e, finalmente, com ace-

tona. Este processo cromatogrãfico conduziu ao isolamento de 9 alcalóides dos extratos

da casca e d o l e n h o d a raíz d o s três e s p é c i m e n s c o l e t a d o s , n a s q u a n t i d a d e s e s p e c i f i c a -

das na T a b e l a 1.

RESULTADOS

A s seguintes substâncias isoladas foram identificadas por c o m p a r a ç ã o d o s dados

espectrométricos e f í s i c o s c o m o s r e g i s t r a d o s na l i t e r a t u r a : coronaridina (Raj e t a l . ,

197*0, v o a c a n g i n a (Raj et al ,, 1 9 7 * 0 , 20-epi h e y n e a n i na (Matos et al . , 1 9 7 6 ) , v o a c r i s t i -

na ( Y a m a g u c h i , 1 9 7 0 ) , v o b a s i n a (Yamaguchi, 1 9 7 0 ) , affinisina (Cava e t a l . , 1964), 19-

hidroxi-ibogamlna (De B e l l e f o m e t a l . , 1 9 7 5 ) e olivacina (Yamaguchi, 1970).

DISCUSSÃO Κ CONCLUSÃO

0 e s t u d o de P e s c h i e r a a f f i n i s , r e t o m a d o c o m v i s t a a a v a l i a ç ã o d a importância

quimiotaxonômica d a o c o r r ê n c i a o u n ã o d e a l c a l ó i d e s d o tipo i b o g a , c o n s i d e r a d a por Weis

bach e c o l a b o r a d o r e s (Jerry e t al . , 1963) como possível caráter diferencial e n t r e a s es_

pécies do g ê n e r o P e s c h i e r a e de o u t r o s g ê n e r o s , inclusive T a b e r n a e m o n t a n a , m o s t r o u pe-

quena s i g n i f i c a ç ã o s i s t e m á t i c a , j á q u e se r e g i s t r o u a p r e s e n ç a d e a l c a l ó i d e s d o tipo

iboga c o m o c o n s t i t u i n t e s principais nas amostras'desta espécie coletadas em diferentes

locais d o N o r d e s t e (Tabela 1). Evidenciou-se uma p r o x i m i d a d e m a i o r e n t r e Peschiera

affinis(Matos e t a l . , 1 9 7 6 ) e Peschiera lundii (Hwang e t a l . , 1 9 6 9 ) , e menos acentuada

com P e s c h i e r a l a e t a (Jahodár e t al . , 1 9 7 * » ) , pela o c o r r ê n c i a , n a s três e s p é c i e s , de alca

lóides do tipo iboga, além de sarpagina e vabasína. Este e s t u d o q u í m i c o s u g e r e que

estas t r ê s e s p é c i e s p o d e r i a m se c o n s t i t u i r e m u m g r u p o e s p e c i a l dentro do complexo bota

nico P e s c h i e r a - T a b e r n a e m o n t a n a , e m b o r a H w a n g e c o l a b o r a d o r e s c o n s i d e r e P e s c h i e r a lundii

mais a p r o p r i a d a n o g ê n e r o Tabernaetmontana (Hwang e t a l . , I 9 6 9 ) . Pelo mesmo motivo Pes -

chiera a f f i n i s n ã o d e v e r i a m a i s ser c o n s i d e r a d a c o m o e s p é c i e a m b í g u a n o g ê n e r o , como

se refere C a v a e c o l a b o r a d o r e s (Cava et a l . , I968).

Os dados apontados neste trabalho permitem questionar o estudo de Peschiera affi

nis r e a l i z a d o por C a v a e c o l a b o r a d o r e s (Cava e t a l . , 1 9 6 4 ) , que descreveram vobasina

como p r i n c i p a l a l c a l ó i d e d e s t a e s p é c i e , e n a o r e g i s t r a r a m a o c o r r ê n c i a de a l c a l ó i d e s do

tipo iboga n e s t a planta.

N a s t r ê s a m o s t r a s a u t ê n t i c a s d e P e s c h i e r a a f f i n i s d e d i f e r e n t e s p r o c e d ê n c i a s , fo

ram i d e n t i f i c a d o s o s a l c a l ó i d e s d o t i p o iboga: coranaridina, voacangina e 20-epiheynea-

nina como c o n s t i t u i n t e s p r i n c i p a i s . Algumas diferenças f o r a m o b s e r v a d o s q u a n t o ao teor

relativo d e s t e s a l c a l ó i d e s e quanto a presença de pequena quantidade de 19-hidroxí-ibo-

gamina e d e i b o x i g a í n a n a c a s c a d a r a í z e d e a f f i n i s i n a n o lenho d a raíz d o material

Alcalóides d e P e s c h i e r a a f f i n i s ... 195


coletado em Fortaleza.

A frequência r e l a t i v a m e n t e e l e v a d a d e s t a e s p é c i e n o C e a r á e e m seus a r r e d o r e s , a

liada a i n t e r e s s a n t e s p r o p r i e d a d e s d e a l g u n s d e seus a l c a l ó i d e s , c o m o a c o r o n a r i d i n a ,

que apresentou propriedades analgésicas, íηibícão da gravidez e m ratas adultas (Meyer et

-l·, 1973) e o uso d o s s e u s a l c a l ó i d e s p r i n c i p a i s c o m o p r e c u r s o r e s d e s u b s t â n c i a s biolo

g i c a m e n t e a t i v a s , p o s s i b i l i t a a sua e x p l o r a ç ã o p a r a a l c a n ç a r n o v o s m e d i c a m e n t o s .

SUMMARY

The methanolic extracts of bark and woody roots from three espécimens ol
VeAchÃJina af finis [kpoc.ynace.az) collected at different QeoQh.aphA.cal òites {fortaleza ,
Ubajara-CE e Cical-?l) affolded, after chromatographical separation, the following
alkaloids-. con.onafu.dine, epihe.yneanine, affinisine, vobasine, olívaci.ne, voacangine, υο
acristine, iboxygaine and 19-hi.dfioxA.-ibogamine. The latter foufi substances were found
previously in the genus Tabvnnanthe and V@acAnga and are registered here iok
Pe&chiera affinis for the first time.
Referências bibliográficas

Cava, M.P., Talapatra, S.K., Weisback, J.A., Douglas, Β. , Raffauf, R.F. e Ribeiro, 0 .
- 1964. Structures of affinine and Affinisine, Alkaloids of Peschiera affinis/Taber-
naemontana af finis . Chem. and Ind., 26 :1193.

Cava, M.P., Tjoa, S.S.; Ahmed, O.A. e da Rocha, A.F.I. - 1968. The Alkaloids of Taberna
emontana riedelli and T. rigida. J. Org. Chem., 33(3):1055.

De Bellefon, M.; Debray, M.M.; Le Men-Olivier, L. e Le Men, J. - 1975. Alcalóides du


Pandaca mocquerysii var. Pêndula Phytochemistry, 14(7):1649.

Hwang, B.; Weisbach, J.Α.; Douglas, B.; Raffauf, R.; Cava, M.P. e Bessho, K. - 1969
The Alkaloids of Peschiera lundii (D.C.) Miers. Isolation and structure Elucidation
of Voacristine Pseudoindoxyl and Iboxygaine Hydroxyindolenine. J. Org. Chem., 34(2) :
414.

Jahodár, L.; Voticky, Z. e Cava, M.P. - 1974. Geissoschizol in Peschiera laeta. Phytoche
mistry, 13(2):2880.

Jerry, Α.; Weisbach, R.; Raffauf, F.; Ribeiro, 0.; Macko, E. e Douglas, B. - 1963. Alka
loids of Peschiera affinis. J. Fharm. Sci., 52(4):350.

Matos, F.J.A. - 1960. Contribuição ao Estudo Farmacognóstico de Tabernaemontana affinis


Muell. Arg. (Peschiera affinis (Muell. Arg.) Miers). Tese de Livre Docência em Farma
macognosia, UFCe, Fortaleza, CE.

Matos, F.J.A.; Braz Filho, R.; Gottlieb, O.R.; Machado, F.W.L. e Madrugada, M.I.L.
1976. 20-Epiheyneanine, an Iboga Alkaloids from Peschiera affinis. Phytochemistry,15
(4):551.

Meyer, W.E.; Coppola, J.A. e Goldman, L. - 1973. Alkaloids Studies VIII: Isolation and
Characterization of Alkaloids of Tabernaemontana heyneana Wall and Antifertility Pro
perties of Corobaridine. J. Pharm. Sci., 62(7):1199.

IBGE. - 1959. Enciclopédia dos Municípios Brasileiros. Vol. 15, 469-9 e Vol. 16. 208 ,
543.

Raj, Κ.; Shoeb, Α.; Kapil, R.S. e Popli, S.P. - 1974. Alkaloids of Tabermaemontana di -
varicata Phytochemistry, 13:1621.

Yamaguchi, K. - 1970. Spectral Data of Natural Products. New York, American Elserier Pu­
blishing Company Inc.

(Aceito para publicação em 15/04/85).

Alcalóides de Peschiera affinis 197

Você também pode gostar