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Resistências e
jogos de poder
O rganizadores
ISBN: 978-85-462-0143-3
CDD: 384
Índices para catálogo sistemático:
Filmes 384.8
Equipamentos e materiais visuais 371.335
Representações públicas 791
IMPRESSO NO BRASIL
PRINTED IN BRAZIL
Foi feito Depósito Legal
Capítulo 1.
Em caso de incêndio, deixe queimar 15
Cassio Brancaleone
Capítulo 2.
Cinema e História: Edukators, de Hans Weingartner 33
Gerson Wasen Fraga
Capítulo 3.
Vida selvagem: escritos sobre liberdade,
aventuras amorosas e contracultura 53
Éverton de Moraes Kozenieski
Capítulo 4.
A crise da Sociedade Individualista
e seu duplo em o Clube da Luta 65
Daniel de Bem
Capítulo 5.
Entre dois mundos: uma análise do filme “Histórias Cruzadas” 93
Daniela Sbravati
Capítulo 6.
Twelve Years a Slave:
usos historiográficos e pedagógicos do filme 113
Marcelo Téo
Capítulo 7.
Pensar historicamente a partir de Blow-Up:
imagens, reminiscências e o olhar historiográfico 135
Rafael Hansen Quinsani
Capítulo 8.
A amizade como A Grande Beleza:
Foucault, Heidegger e Paolo Sorrentino 159
Atilio Butturi Junior
Capítulo 9.
Potências da carne em XXY 183
Prof. Dr. Fábio Feltrin de Souza
Capítulo 10.
Sobre larápios e espertezas em Nueve Reinas
– reflexões sobre a Argentina da virada do século XXI 201
José Alves de Freitas Neto
Referências 217
7
Introdução
Não são novas no campo das ciências humanas as reflexões
que buscam encontrar intersecções entre cinema, educação e
crítica social. Desde pelo menos os desdobramentos das leituras
promovidas pelos mais proeminentes representantes da Escola
de Frankfurt, o enquadramento do cinema como parte dos dis-
positivos criados pela, assim chamada, Indústria Cultural parece
ter superado a antinomia entre reprodutivismo social alienante
e ingênuo entretenimento individualizante. Embora ambos os
aspectos certamente estejam presentes tanto na dimensão do
consumo dos ditos artefatos culturais, quanto na própria partici-
pação de indivíduos e coletividades em processos que impliquem
em uma práxis social autorreferenciada como “cultural”, a com-
plexidade, a multidimensionalidade e a dinamismo daquilo que
contemporaneamente entendemos por cultura nos impele a bus-
car correlações cada vez mais transversais entre ela e os diversos
elementos que constituem a vida social.
Se não é mais recomendável defender qualquer tipo de “uni-
dade de análise transcendental” como ponto de apoio irrefutável
de qualquer teoria, tampouco se pode aceitar o lugar fácil das ge-
neralizações que desaguam nas assertivas do tipo: “tudo é cultura”
(Wagner, 2010). Em outras palavras, o exercício hermenêutico e
mesmo epistemológico em questão reivindica a reflexividade e a
recursividade das opções teóricas como parte de um repertório de
estratégias heurísticas que desvelem conexões possíveis entre de-
terminados fenômenos, visando alcançar a compreensão possível
de determinados aspectos ou ângulos de uma realidade situada.
Nesse sentido, o cinema é um recurso passível de oferecer
fontes inesgotáveis para a reflexão social, histórica e filosófica so-
bre a cultura moderna. Seja como um dos produtos mais bem
delimitados da mencionada indústria cultural, como expressão
narrativa de valores dominantes ou dissidentes, como documen-
8 Fábio Feltrin de Souza | Cássio Brancaleone (Orgs.)
Cassio Brancaleone
Erexim, julho de 2015
15
Capítulo 1.
Em caso de incêndio, deixe queimar
Cassio Brancaleone1
Introdução
País: Alemanha
Ano: 2001
Data de estreia: 2001
Duración: 101 min.
Elenco: Aykut Kayacik, Barbara Philipp, Devid Striesow, Doris
Schretzmayer, Jamie Schuricht, Klaus Löwitsch, Martin Feifel,
Matthias Matschke, Nadja Uhl, Sebastian Blomberg, Til Schweiger
Distribuidora: Columbia Pictures
Produtora: Claussen & Wöbke Filmproduktion GmbH
33
Capítulo 2.
Cinema e História:
Edukators, de Hans Weingartner
Gerson Wasen Fraga1
O cinema (des)educador
2. A expressão teria sido utilizada pelo Papa João Paulo II, em 2004, após haver assis-
tido ao filme “A Paixão de Cristo”, dirigido por Mel Gibson. Posteriormente, o Va-
ticano negou que o Sumo Pontífice tivesse emitido qualquer opinião sobre o filme.
3. Vale aqui relembrar que mesmo o saber historiográfico não deve ser confundido
com a verdade pura e simples.
38 Fábio Feltrin de Souza | Cássio Brancaleone (Orgs.)
4. No exato momento em que este texto está sendo produzido, a França enfrenta
uma sequência de atentados terroristas promovidos por grupos fundamentalistas
islâmicos e milhares de pessoas buscam refúgio na Europa, tentando escapar da
Guerra Civil na Síria e do terror imposto pelo grupo Estado Islâmico neste país e no
Iraque. Outros tantos milhares de europeus engrossam manifestações de rua contra
o Islã, dando mostras de uma perspectiva não menos fundamentalista, enquanto
número não menos menor marcha propondo a não criminalização do Islã e a convi-
vência pacífica entre os povos. Na Nigéria, uma explosão causada por uma menina-
-bomba deixou duas dezenas de mortos e um igual número de feridos. O atentado,
ao que tudo indica foi organizado pelo grupo extremista Boko Haram. No Iêmen,
outro atentado, este contra uma escola de polícia, matou cerca de 40 pessoas. No
Brasil, as viúvas do regime militar tiram os seus véus e vão às ruas, propondo o fim
da democracia, tendo como base de sua argumentação uma possível “cubanização”
ou “bolivarianização” da política nacional, revivendo assim argumentos da Guerra
Fria. Se sabem quem foi e o que propunha Simón Bolívar, é algo duvidoso.
40 Fábio Feltrin de Souza | Cássio Brancaleone (Orgs.)
10. Após enfrentar a grande crise social de maio de 1968, que por pouco não pôs
fim a seu governo, Charles de Gaulle foi o grande vitorioso nas eleições do mês
seguinte, quando ampliou sua base política na Assembleia francesa.
11. A troca global de referências culturais já neste período pode também ser exem-
plificada pela canção “É proibido proibir”, de Caetano Veloso, inspirada em uma
pichação feita nas ruas de Paris com a mesma frase (Il est interdit d’interdire).
12. Federação dos Estudantes Socialistas.
46 Fábio Feltrin de Souza | Cássio Brancaleone (Orgs.)
13. Embora gravemente ferido com três disparos, sendo dois na cabeça, Rudi so-
breviveria. Contudo, sua morte prematura em 1979, por afogamento após um
ataque epilético enquanto tomava banho, não pode ser dissociada dos efeitos que o
atentado produziu em sua saúde.
Cinema e Sociedade: Resistências e jogos de poder 49
Capítulo 3.
Vida selvagem: escritos sobre
liberdade, aventuras amorosas e
contracultura
Éverton de Moraes Kozenieski1
Introdução
O roteiro
O cenário
A personagem
Considerações finais
Capítulo 4.
A crise da Sociedade Individualista
e seu duplo em o Clube da Luta
Daniel de Bem1
Introdução
Tyler fala tudo isso e ainda diz que aquela é a sua opinião,
que ele poderia estar errado, que o ocorrido podia ser mesmo
uma grande “tragédia pessoal”, uma postura bastante autônoma
“com tintas anarcoindividualistas”, como veremos posteriormen-
te. O discurso em questão expressa a revolta com essa perspectiva
do consumo como satisfação ou plenitude, pois é da natureza do
consumo capitalista a impossibilidade da saciedade... É, seguido
do incêndio (fato concreto), o momento de transformação subje-
tiva, de mudança no entendimento da personagem, que o levará
das lutas às ações subversivas e dessas para um quase “suicídio”,
quando propositadamente Tyler provoca uma capotagem.
Lembremos que o homem sem nome trabalha em uma com-
panhia de seguro, justamente na área de seguros automotivos; as-
sim, a cena da capotagem é a identificação da nossa personagem
com as vítimas dos acidentes que são seu objeto de trabalho. Ele
se torna e “morre” como uma das vítimas que antes eram só esta-
tísticas em planilhas. Em decorrência do acidente, o homem sem
nome entra em uma espécie de coma, enquanto Tyler assume
como personalidade preponderante e, assim, se despede e deseja
melhoras para seu alterego:
Considerações finais
Capítulo 5.
Entre dois mundos:
uma análise do filme
“Histórias Cruzadas”
Daniela Sbravati1
O poder da escrita
Trabalho doméstico
As babás, um paradoxo
não dito, com o que propaga e com o que rompe são aspectos
que precisam ser problematizados, porém, a partir de uma pers-
pectiva diferente da que adotamos para analisar uma pesquisa da
área de história. Caso contrário haverá o pressuposto de que nos
filmes sempre há ausência, pois a linguagem audiovisual não per-
mite captar todas as etapas de um trabalho acadêmico. Da mes-
ma forma que um trabalho acadêmico se distancia da sociedade
para a qual é produzido justamente por sua linguagem pouco
atrativa e por vezes não inteligível aos não historiadores.
A breve análise empreendida sobre o filme “Histórias Cruza-
das” considerou em primeiro lugar a importância do tema abor-
dado. O trabalho doméstico de mulheres negras nos EUA na
década de 1960 é negligenciado, tanto na historiografia, quanto
no cinema. Ainda que notadamente o filme corrobore um mo-
delo de dominação social, a possibilidade de milhões de pessoas
ao menos pensarem sobre a questão pode ser transformadora.
Neste sentido, o ensino de história possui um papel fundamental
na medida em que provoca o olhar crítico através do questiona-
mento e da reflexão. Assim como qualquer outra fonte histórica
o filme precisa ser analisado e interpretado de acordo com o pe-
ríodo em que foi produzido.
A trama se passa nos anos 1960, no entanto diz muito so-
bre a sociedade contemporânea e ultrapassa os limites do sul dos
EUA, evidenciando que o trabalho doméstico permanece como
uma atividade desvalorizada e as domésticas como seres “invisí-
veis”. Ser quase da família mantém o trabalhador numa situação
de indefinição e vulnerabilidade social e os conflitos e tensões
são inerentes às relações entre patrões e empregadas, ainda que
a estratégia da deferência seja amplamente utilizada pelos traba-
lhadores. As relações de afetividade não se isentam de uma lógica
segregacionista, constituída a partir da ideia de superioridade de
um grupo em relação a outro.
Nossa sociedade é dividida entre os que escrevem a história e
aqueles que são objeto dela. Na maioria das vezes os trabalhadores
110 Fábio Feltrin de Souza | Cássio Brancaleone (Orgs.)
Capítulo 6.
Twelve Years a Slave:
usos historiográficos e
pedagógicos do filme
Marcelo Téo1
Identificação e negação
12. Sobre a precariedade da liberdade de trabalho no século XIX, ver: Lima (2005).
122 Fábio Feltrin de Souza | Cássio Brancaleone (Orgs.)
13. Duas décadas mais tarde, a matrícula de escravos de 1871, que tinha por obje-
tivo regularizar a situação da escravidão através do registro, exigindo que também
os senhores comprovassem a sua posse, também foi usada como forma de reescra-
vização ilegal.
14. Conforme Northup, a lei foi a aprovada em 14 de maio de 1840, intitulada
“Uma lei para proteger mais efetivamente os cidadãos livres deste estado de serem
sequestrados ou submetidos à escravidão”. Determinava, assim, o dever do gover-
nador, recebendo informações suficientes de que um cidadão livre do estado de
Nova Iorque estivesse sendo mantido como escravo injustamente em outro estado,
mediante “alegação ou mentira de que tal pessoa seja um escravo, ou que pelo
costume da cor ou pela regra da lei seja considerado ou tomado por um escravo”,
Cinema e Sociedade: Resistências e jogos de poder 123
15. “Em vez de consultar todas as autoridades…e acabar aturdido… você vai, na
verdade, ver o que aconteceu. Não haverá opiniões expressas. Você simplesmente
estará presente no fazer-se da história” (Pierre, 2008, p. 1, tradução do autor).
16. O escritor e editor estadunidense Henri Louis Gates Jr. é o responsável pela
assessoria histórica do filme. Diretor do Hutchins Center for African and African
American Research da Harvard University, foi responsável pela organização e direção
de inúmeras publicações e documentários para a TV sobre a presença africana nas
Américas, consagrando-se notório especialista na questão dos direitos e da cultura
afro-americana. A edição do livro pelas editoras Penguin/Companhia das Letras
conta com um posfácio de Gates Jr.
126 Fábio Feltrin de Souza | Cássio Brancaleone (Orgs.)
Considerações
Capítulo 7.
Pensar historicamente a partir de
Blow-Up: imagens, reminiscências e
o olhar historiográfico
Rafael Hansen Quinsani1
Introdução
4. Em 1959, Antonioni foi obrigado a sair pelos fundos da sala de exibição de Can-
nes devido à hostilidade da plateia durante a exibição de A aventura.
Cinema e Sociedade: Resistências e jogos de poder 141
9. Ginzburg (2002, p. 38) lembra que o limite deste relativismo é de caráter cog-
nitivo, político e moral.
Cinema e Sociedade: Resistências e jogos de poder 155
Capítulo 8.
A amizade como A Grande Beleza:
Foucault, Heidegger
e Paolo Sorrentino
Atilio Butturi Junior1
INTRODUÇÃO2
5. O título é uma referência à música dos The Talking Heads, homônima (This
Must Be the Place — Naive Song), cantada por David Byrne no filme e mais em
outra ocasião. O primeiro verso evoca algo como a morada do ser: “Home is where
I want to be/ But I guess I’m already there”.
Cinema e Sociedade: Resistências e jogos de poder 161
2. A amizade e a autossubjetivação
3. A amizade e a beleza
10. Para um debate sobre a metafísica presente nesse último Foucault, ver o prefá-
cio de Jurandir Freire Costa para o livro de Ortega (1999).
Cinema e Sociedade: Resistências e jogos de poder 175
Ramona: Onde?
Jep: No teto.
11. Produz-se, conforme ele mesmo enunciara: “[...] destinado a me tornar Jep”.
180 Fábio Feltrin de Souza | Cássio Brancaleone (Orgs.)
Jep: Mas como, vai embora? Romano... por que está indo
embora?
Considerações finais
Capítulo 9.
Potências da carne em XXY
Prof. Dr. Fábio Feltrin de Souza1
correr, é agarrada por eles que logo tiram seu calção e vasculham
sua genitália em busca de respostas e deparam-se, estupefatos e
extasiados pelo exotismo, com os dois sexos. Ao mesmo tempo
em que um deles pergunta se “fica duro”, a acaricia e parece que-
rer penetrá-la, Vando surge e dissipa o grupo. A cena é construída
com forte carga dramática, enfatizando o quase estupro de Alex
em toda sua brutalidade. Da mesma forma, questiona e denuncia
a possibilidade daquele corpo ser invadido, violentado, escrutina-
do sem que isso se configure como um “problema”. Que jogo de
verdade este corpo está inserido que permite tal ato? A heterosse-
xualidade compulsória cria sua necessária exterioridade, ou seja,
os corpos anormais, e a possibilidade biopolítica de intervenção
em gays afeminados, intessex, travestis, lésbicas e todo corpo que
rompa com a norma (Calling & Santos, 2011, p. 245). Para Fou-
cault, nada escaparia ao poder, principalmente ao poder sobre a
vida, ao poder que criou e classificou corpos como errados, doen-
tes, anormais e passíveis de intervenção, como o de Alex.
O filósofo francês identificou o nascimento da biopolítica
num momento histórico bem definido, no qual a vida passa a
ser considerada um objeto do poder. Esse poder se caracterizaria
pelo direito de vida e morte, isto é, pelo direito de “fazer morrer e
deixar viver” e seria exemplificado pela espada do soberano. Des-
sa forma, o soberano exerceria seu poder sobre a vida do súdito
na medida em que pode matá-lo. No entanto, a partir do século
XIX há um deslocamento do exercício do poder que Foucault
identificou como “fazer viver, deixar morrer”. Esse novo direito à
vida passou a ocupar um lugar central nos destinos da sociedade,
ao passo que a morte ocuparia o lugar do privado. Essa ruptura,
contudo, não se deu de maneira abrupta, tampouco se manifes-
tou como uma simples sucessão, foi percebida a partir de fatos
concretos que se tornaram mais evidentes com o aparecimento
das tecnologias disciplinares que tornaram o capitalismo mais
rentável, nas políticas de natalidade e mortalidade e no nasci-
mento de uma ciência política (Foucault, 1999).
194 Fábio Feltrin de Souza | Cássio Brancaleone (Orgs.)
Capítulo 10.
Sobre larápios e espertezas em
Nueve Reinas - reflexões sobre a
Argentina da virada do século XXI
José Alves de Freitas Neto1
Están ahí, pero no los ves. De eso se trata. Están, pero no están.
Así que cuidá el maletín, la valija, la puerta, la ventana, el
auto. Cuidá los ahorros, cuidá el culo. Porque están ahí, van a
estar siempre ahí. Chorros. No, no, eso es para la gilada. Son des-
cuidistas, culateros, abanicadores, gallos ciegos, biromistas, me-
cheras, garfios, pungas, boqueteros, escruchantes, arrebatadores,
mostaceros, lanzas, bagalleros, pesqueros, filos. (Bielinsky, 2000)
ao redor e perceber que quase todos são como ele, mas que não
assumem o que fazem, nem o que desejam. É quase um exercício
de superação da moral convencional.
Marcos não se enxerga como o único ser corrompido no
mundo. Mesmo que sua história remeta a dilemas com seus ir-
mãos mais jovens desde a partilha de uma herança composta por
poucos bens, Marcos pretende dar um golpe maior para poder
solucionar as questões anteriores e, para isso, reúne suas econo-
mias e pede auxílio a Marcos, selando a parceria entre ambos.
Os golpistas precisam investir no próprio golpe e, por isso, há a
tensão em relação à venda da coleção de selos. À medida que o
espectador conhece as histórias e as razões do personagem, somos
expostos a uma hesitação que fica patente no olhar de Juan. É o
instante em que Marcos provoca o comparsa perguntando-lhe
por qual quantia seria capaz de dormir com outro homem. Na
resposta negativa imediata, Marcos vai elevando o valor hipotéti-
co de uma oferta financeira até obter o silêncio de Juan. Da ne-
gativa veemente ao silêncio que expressa o vacilo de Juan, Marcos
conclui que “putos no faltan, lo que faltan son financistas”.
A possibilidade de não viver de trapaças é posta em diferen-
tes momentos. Juan, por exemplo, aprendeu alguns truques na
infância com o pai e é apresentado na película como um ser an-
gustiado na atividade em que se encontra. No desdobramento de
Nueve Reinas sabemos que seu pai está preso e isso o incomoda.
Mas este incômodo não é a porta para um discurso moraliza-
dor, apenas reforça a impressão de que para certas pessoas, como
Juan e Marcos, a vida enquadrada nos códigos sociais não é mais
possível. As causas, claro, não são abordadas pelo filme, mas po-
demos inferir múltiplas combinações como aspectos pessoais do
comportamento e o simulacro de ganhar prata na jogatina que o
país se transformou.
Cinema e Sociedade: Resistências e jogos de poder 211
Referências
AGAMBEN, G. O amigo. O que é um dispositivo. Trad. Viní-
cius Nicastro Honesko. Chapecó: Argos, 2014.
______. Homo sacer: o poder soberano e à vida nua I. Belo
Horizonte: Humanitas, 2007.
A GRANDE beleza. Direção: Paolo Sorrentini. Itália, França:
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AMADO, Ana. “Novo cinema argentino: fábulas do mal-estar”,
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BALTAZAR, Maria João. Do olhar moderno em O Homem da
câmara de filmar ao olhar do fotógrafo em Blow-up. In: MAR-
TINS, Moisés de Lemos; PINTO, Manuel (Orgs.). Comunica-
ção e Cidadania. Actas do 5º Congresso da Associação Por-
tuguesa de Ciências da Comunicação. 6-8 set. 2007, Braga:
218 Fábio Feltrin de Souza | Cássio Brancaleone (Orgs.)
atendimento@editorialpaco.com.br
Saiba mais em
www.editorialpaco.com.br/publique-pela-paco/