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FICHA TÉCNICA

Título FREGUESIA DE MIDÕES – Uma História Milenar (951-2017)


Autor João Carlos Santos Pinho
Editor Junta de Freguesia de Midões
Capa Foto de João Pinho
Contra Capa Foto cedida por Abílio Nunes
Arranjo Gráfico Nuno Beirão
Impressão Pantone 4
Tiragem 500 exemplares
ISBN 978-989-96382-2-8
Dep. Legal n.º
1.ª Edição Setembro de 2017

Nota: O autor é totalmente contrário ao assim denominado Novo Acordo Ortográfico, pelo que continua a escrever
segundo a chamada norma antiga.

© Copyright 2017
Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor.
Igreja Matriz de Midões, anos 30?, séc. XX
ÍNDICE

Siglas e Abreviaturas Utilizadas .................................................................................... 9


Créditos Fotográficos................................................................................................... 10
Tábua Cronológica....................................................................................................... 11
Prefácio........................................................................................................................ 15
Mensagem do Presidente da Junta de Freguesia............................................................ 17
Introdução................................................................................................................... 19
A Historiografia Sobre Midões..................................................................................... 21

I – O MEIO FÍSÍCO E A PAISAGEM.................................................................... 25

II – PRÉ-HISTÓRIA E ANTIGUIDADE.............................................................. 31
1. Os Vestígios Pré-Históricos....................................................................................... 33
2. Midões – os Lusitanos e os Romanos........................................................................ 35

III – A TOPONÍMIA.............................................................................................. 39

IV – MEDIEVALIDADE......................................................................................... 45
1. Vestígios de morte e de vida e as Origens do Povoamento......................................... 47
2. A gestão do território: administração civil e religiosa................................................. 58
2.1. O poder concelhio: Midões e Couto...................................................................... 60
2.2. O controlo senhorial do território: o Mosteiro de Lorvão e a Sé de Coimbra......... 63
2.2.1. Amarais: Senhores de Touriz............................................................................... 67
2.3. Inevitáveis fricções entre poderosos........................................................................ 68
3. A vida económica e social......................................................................................... 69

V – A MODERNIDADE......................................................................................... 71
1. Administração do território...................................................................................... 73
1.1. Evolução Político-Administrativa........................................................................... 73
1.2. O funcionamento dos concelhos: Midões e Coito................................................. 76
2. Demografia e vida económico-social......................................................................... 77
2.1. A população e o território...................................................................................... 77
2.2 Economia e sociedade............................................................................................. 80

VI – CONTEMPORANEIDADE........................................................................... 83
A. Do Liberalismo à República.................................................................................. 85
1. Novos pensamentos e ideias polÍticas, as invasões francesas e as guerras liberais........ 85
2. Reformas administrativas Oitocentistas: a afirmação do poder concelhio
e comarcão de Midões e o surgimento de Tábua....................................................... 90
3. A organização e funcionamento dos Concelhos de Midões e Couto ......................... 93
3.1. A composição da vereação e a eleição das justiças................................................... 93
3.2. A relação com os poderes supramunicipais............................................................ 96
3.3. Os bens concelhios................................................................................................ 99
3.4. Administrar em prol dos interesses colectivos........................................................ 101

5
3.5. A sistematização militar: a Companhia de Ordenanças de Midões......................... 125
4. O fim do Concelho e da Comarca de Midões e a ascensão de Tábua........................ 127
5. A Freguesia e Paróquia de Midões: enquadramento, órgãos e funcionamento........... 136
5.1. A actuação da Junta de Paróquia de Midões: relações administrativas com o local, mu-
nicipal e regional .................................................................................................. 147
6. A vida económica e social entre dois séculos............................................................. 156

B. Os Primeiros Anos Republicanos.......................................................................... 160


1. A Transição para a República.................................................................................... 160
2. Os desejados melhoramentos ................................................................................... 169

C. O Estado Novo..................................................................................................... 175


1. Os novos tempos, entre o passado e o futuro............................................................ 175
2. Melhoramentos locais .............................................................................................. 175

D. Tempos Democráticos.......................................................................................... 187


1. A Transição de Poder................................................................................................ 187
2. A consolidação da democracia: progresso e desenvolvimento.................................... 190
2.1. Os anos 80............................................................................................................ 190
2.2. Os anos 90............................................................................................................ 193
2.3. Século XXI............................................................................................................ 195

E. Evolução Económica e Social: da República à Actualidade........................................ 198

VII – PATRIMÓNIO.............................................................................................. 205


A. Património Religioso............................................................................................ 207
1. A Igreja Matriz de Midões........................................................................................ 207
1.1. Primeiras referências, titulares, enquadramento religioso....................................... 207
1.2. A Comenda de Santa Maria de Midões................................................................. 213
1.3. Evolução espacio-temporal do templo................................................................... 214
1.4. Vida religiosa......................................................................................................... 230
2. Residência Paroquial................................................................................................. 234
3. Capela de S. Miguel (Outeiro de S. Miguel)............................................................. 236
4. Capela de S. Sebastião (Coito).................................................................................. 238
5. Capela de Santa Ana (Vila do Mato)........................................................................ 239
6. Capela de Nossa Senhora do Campo (Casal da Senhora).......................................... 240
7. Cruzeiro (Casal da Senhora)..................................................................................... 242
8. Capela de Santo Amaro (Casal de Santo Amaro)...................................................... 243
9. Capela de Nossa Senhora da Esperança (Touriz)....................................................... 243
10. Capela/Casa Mortuária........................................................................................... 244
11. Alminhas................................................................................................................ 245

B. Património Civil................................................................................................... 248


1. Pelourinho Manuelino de Midões............................................................................ 248
2. Pelourinho do Couto (ou Coito) de Midões. ........................................................... 248
3. Antiga Casa da Câmara do Concelho de Midões...................................................... 249

6
4. Casa do Juiz de Midões............................................................................................ 250
5. Cemitério................................................................................................................. 250
6. Fonte da Caricha...................................................................................................... 253
7. Fonte de Valverde (Midões)...................................................................................... 254
8. Sede da Junta de Freguesia........................................................................................ 258
9. Coreto...................................................................................................................... 259

C. Património Particular........................................................................................... 259


1. Casa dos Sousas Machados ou Casa do Coronel....................................................... 260
2. Casa dos Soares d’Albergaria ou Casa do Capitão-Mor............................................. 262
3. Casa do Ribeirinho................................................................................................... 262
4. Casa de João Duarte d’Almeida (hoje de Lino Veiga)................................................ 263
5. Vila Bertilde............................................................................................................. 264
6. Palácio de Valverde................................................................................................... 264
7. Palácio das Quatro Estações...................................................................................... 265
8. Solar do Esporão...................................................................................................... 266
9. Casa de João Brandão (Casal da Senhora)................................................................. 267
10. Capela de Nossa Senhora das Dores....................................................................... 268

D. Património Desaparecido..................................................................................... 269


1. Um Mosteiro em Midões: ficção ou realidade?......................................................... 269
2. Capelas desaparecidas............................................................................................... 272
3. O Pelourinho de Touriz............................................................................................ 283
4. A Casa dos Ferreiros (Touriz)................................................................................... 283

VIII – FAMÍLIAS E PERSONALIDADES.............................................................. 285


1. D. Paz...................................................................................................................... 287
2. D. Gonçalo Pereira de Midões.................................................................................. 287
3. Sebastião d’Albuquerque Pinto Tavares Freire Castelo Branco................................... 288
4. Roque Ribeiro d’Abranches Castello Branco (Visconde de Midões).......................... 288
5. Família Pinto Caldeira (ou os da Borralha)............................................................... 290
6. Família Soares de Albergaria .................................................................................... 291
7. Família Fonseca Magalhães....................................................................................... 292
8. Agostinho Borges de Figueiredo e Castro (Visconde do Vinhal)............................... 293
9. José Caeiro da Mata................................................................................................. 293
10. Basílio Freire Caeiro da Matta................................................................................ 294
11. João Victor da Silva Brandão.................................................................................. 295
12. António Duarte d’Almeida Veiga............................................................................ 309
13. Luís Abrantes da Costa........................................................................................... 310
14. Dr. Henrique de Almeida....................................................................................... 310
15. Padre José da Costa Saraiva..................................................................................... 311
16. Amândio Nunes Monteiro..................................................................................... 311

FONTES E BIBLIOGRAFIA.................................................................................. 313

APÊNDICE.............................................................................................................. 321

7
SIGLAS E ABREVIATURAS UTILIZADAS

ACPT Arquivo do Centro Paroquial de Tábua


AF Assembleia de Freguesia
AJM Arquivo da Junta de Freguesia de Midões
AHP Arquivo Histórico Parlamentar
AMT Arquivo Municipal de Tábua
ANTT Arquivo Nacional Torre do Tombo
AUC Arquivo da Universidade de Coimbra
conc. concelho
CM Câmara Municipal
CMT Câmara Municipal de Tábua
cont. continua
CTT Correios de Portugal
cx. caixa
D. Dom
D.ª Dona
Dr. Doutor
Dr.ª Doutora
Eng. Engenheiro
Ex.ª Excelência
Ex.mo Excelentíssimo
fl. folha
fls. folhas
ibid. no mesmo lugar
JF Junta de Freguesia
JFM Junta de Freguesia de Midões
L.da Limitada
m. metro
nom. nomeado
op.cit. obra citada
p. página
PCMT Presidente da Câmara Municipal de Tábua
pp. páginas
Sto. Santo
t. tomo
vol. volume

9
CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS
Abílio Nunes: fotos 31, 50, 102, 109, 114
Arquivo da Universidade de Coimbra: fotos 52, 53, 123
Arquivo Nacional da Torre do Tombo: fotos 18, 19, 23
Biblioteca Nacional de Portugal: foto 119
Câmara Municipal de Tábua: 32, 36, 48, 49
Centro Social Caeiro da Matta: foto 42
Cristina Tavares: foto 54
Família Correia Nobre: foto 122
João Pinho: fotos 1, 2, 4, 5, 7, 8, 10, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 20, 21, 22, 24, 25, 26, 27,
28, 29, 30, 33, 34, 35, 37, 38, 40, 41, 43, 44, 45, 46, 47, 51, 55, 56, 57,
58, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 68, 69, 70, 71, 72, 73, 74, 75, 76, 77,
78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 86, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96,
97, 98, 99, 101, 103, 104, 105, 107, 108, 110, 111, 112, 113, 115, 116,
117, 118, 124, 125
Luís Pedro: fotos 3, 6, 9, 11, 39, 67, 100, 110
Monografia de Touriz: foto 126
NATO: foto 121
Projecto Cripe: foto 120

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TÁBUA CRONOLÓGICA
DATA ACONTECIMENTO/EFEMÉRIDE
22/12/951 ou 955 Documento fundacional da História de Midões. Muna doa ao mosteiro de Lorvão
todas as herdades que possui entre os rios Mondego e Alva, especialmente Midões
e Touriz (Tábua).
21/11/1119 Gonçalo Guilhufes e sua mulher Ermesinda, e Patrebono e sua mulher Soanilli,
doam ao Mosteiro de Lorvão uma herdade que têm na Vila de Midões e na «vila
de Teorize», hoje Touriz:
1124 O Bispado de Coimbra compra a Maria Rodrigues e seus filhos Mónio Guimariz e
Susana Guimariz, 1/3 das herdades que estes possuíam em Midões e Touriz, então
considerado território de Seia, por 16 morabitinos de ouro.
20/03/1133 D. Afonso Henriques couta ao Mosteiro de Lorvão, o Mosteiro de Speraindeo e a
vila com o mesmo nome bem como as vilas de Sabugosa, Freixedo e Midões.
13/11/1169 D. Afonso Henriques outorga à Sé de Coimbra metade do Couto de Midões.
1220-1229 A Igreja de Santa Maria de Midões surge referenciada na lista de igrejas
1256 O Papa Inocêncio IV reafirma, por sentença, que Midões pertence à Diocese de
Coimbra, documento que, provavelmente, se integra no contexto de um diferendo
com a Diocese da Guarda.
Julho 1257 A abadessa de Lorvão, D. Marinha Gomes de Briteiros, estando no primeiro ano
do seu abadessado, concede carta de foral ao domínio do mosteiro na parte que
tinha em Midões.
1258 As inquirições do tempo de D. Afonso III registam as terras de Seia, nelas inscrevendo
várias localidades sob actual jurisdição administrativa de Tábua: Loureiro, Covas,
Percelada, Vila Chã, Candosa, Carragosela, Ázere, Sinde, Tábua, Espariz, Midões,
Várzea de Candosa, Touriz e Couto.
06/09/1296 A Diocese de Coimbra e o Mosteiro de Lorvão celebram uma composição, pela
qual este cede aquele os dízimos a que tinha direito nas Igrejas de Midões e Serpins,
enquanto o primeiro abdica em favor do segundo, dos direitos das igrejas de Figueira,
Vilela, Botão, Souselas e S. Martinho.
14/03/1340 Por sentença dos ouvidores régios no âmbito das Inquirições que D. Afonso IV or-
denou que se efectuassem em Midões, na parte pertença do Mosteiro de Lorvão foi
decidido que a jurisdição do crime passasse para a alçada régia, ficando o mosteiro
apenas com a jurisdição cível.
01/06/1395 D. João I, confirma a D. Martinho, Bispo de Coimbra, os privilégios e jurisdicções
nos coutos e lugares de Valezim (concelho de Seia), Vila Cova, S. Sebastião, Avô,
Midões, Candosa, Nogueira, e Coja.
10/06/1396 Carta de D. João I, reconfirmando ao Bispado, então governado por D. João
Manuel, a jurisdição cível e crime em vários lugares, entre os quais na Vila de Avô,
Midões e em Candosa.
12/09/1514 D. Manuel concede foral manuelino a Midões e à Póvoa de Midões.
1527 Touriz aparece englobada no numeramento no Termo da Vila de Seia. No mesmo
documento são delimitados os termos dos concelhos de Midões e do Coito.
1617 Manuel Miranda custeia o fabrico da custódia de prata para a igreja.
07/06/1670 O Papa Clemente X concedeu Bula Pontifica de Indulgência Plenária a todos os
irmãos que se confessassem e comungassem no Altar de Santa Ana (Vila do Mato).

11
DATA ACONTECIMENTO/EFEMÉRIDE
1688 D. Maria de Miranda e Castelo Branco, viúva de Manuel Pereira Franco, moradora
na Vila de Midões, edifica a Capela da Senhora do Desterro, Jesus e Maria e José
no interior da Igreja Matriz
1721-1758 De acordo com as memórias paroquiais, a freguesia e paróquia de Midões compunha-
-se não só pela Vila de Midões, mas também pelos seguintes lugares: do Casal do
Vasco, Casal da Senhora, Vale de Gaios, Vila do Couto, Casal do Esporão, Casal de
Touriz, Casal da Ribeira, Casal do Cadoiço, Casal de Santo Amaro e Vila do Mato.
10/07/1745 Os mordomos das capelas da freguesia requerem a Bispado de Coimbra que pa-
rem as obras nos seus templos, enquanto durassem as da Igreja Matriz orçadas em
300.000 reis.
02/09/1748 O Bispado procede a sequestro nos rendimentos e renda da Comenda de Midões
para custear as obras da Igreja Matriz e da Capela de Nossa Senhora do Campo.
18/09/1787 Capítulo de visita determina, por motivo de ruína, a transferência das funções
paroquiais da Igreja Matriz para a Igreja de Nossa Senhora do Campo.
23/09/1788 Provisão de D.ª Maria I acedendo ao pedido da Câmara, Nobreza e Povo da Vila
de Midões para que pudessem continuar a dispor de médico.
07/12/1789 Portaria da Relação do Porto confirmando que o Concelho de Midões sujeitaria,
também, às correições mandadas executar pelo Bispo Conde através dos seus Juízes
Ouvidores.
03/11/1791 Nomeação de Antão Antunes Martins, do lugar da Póvoa, como Alferes da
Companhia de Ordenanças na Vila de Midões.
29/08/1805 Provisão Régia autorizando a realização de uma feira franca, na terceira segunda
feira de todos os meses no Sítio das Dores em Midões.
15/08/1822 Dedicação da Igreja Matriz a Nossa Senhora das Neves.
01/03/1825 Nasce João Victor da Silva Brandão
1828 Forma-se, em Midões, um Corpo de Voluntários Realistas, apoiantes de D. Miguel.
Julho 1832 Lançamento de uma cobrança extraordinária da décima em Midões e no Couto -
conhecido como imposto das janelas, serviu para financiar o exército miguelista.
01/05/1834 A Câmara Municipal de Midões reconhece D.ª Maria como Rainha e D. Pedro
como regente.
21/03/1835 Reforma judicial que determinou uma nova divisão judiciária do Reino. Midões
torna-se sede de um julgado abrangendo 18 concelhos: Ázere, Bobadela, Candosa,
Casal, Ervedal, Lagares, Lagos da Beira, Percelada, Lourosa, Midões, Nogueira do
Cravo, Oliveira do Hospital, Oliveirinha, Sanguinheda, Seixo do Ervedal, Semide,
Tábua e Vila Pouca da Beira.
1837 Após as leis Setembristas de 1836 o Concelho de Midões fica constituído por
Candosa, Covas, Midões, Oliveirinha e Póvoa de Midões.
23/10/1837 D. Maria II reconhece, por despacho oficial,. Roque Ribeiro d’Abranches Castello
Branco como 1º Visconde de Midões.
1838 Desempenha funções como Regedor da Freguesia de Midões António Coelho.
06/01/1838 A Câmara Municipal de Midões decide criar um Partido Cirurgião, com ordenado
de 100.00 reis nomeando João Pais da Cunha.
13/01/1838 Invasão da casa do pároco de Midões, António das Neves Sousa Pimenta, pelo
Batalhão Nacional de Midões.
28/11/1840 Criação da Comarca de Midões da qual dependiam os concelhos de Avô, Midões,
Oliveira do Hospital e Tábua.

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DATA ACONTECIMENTO/EFEMÉRIDE
30/12/1841 Tendo em vista a reparação do edifício da Câmara Municipal de Midões foram
arrematados os bens dos extintos concelhos, designadamente, as Casas das Cadeias
das extintas Vilas de Candosa e Percelada, Oliveirinha e Midões.
28/08/1842 Assassinato do Juiz da Comarca de Midões, Nicolau Baptista de Figueiredo Pacheco
Telles, de cujo crime se acusou João Brandão.
17/02/1850 A Câmara Municipal de Midões aprova o Código de Posturas.
1851-1852 João Victor da Silva Brandão assume pela primeira vez a presidência da Câmara
Municipal de Midões.
31/12/1853 Supressão do Concelho e Julgado de Midões e integração no Concelho e Comarca
de Tábua.
20/02/1854 Data da representação enviada ao Rei D. Pedro V contra a supressão do concelho e
anexação a Tábua, assinada por mais de 300 pessoas.
28/01/1856 A Câmara Municipal de Tábua aprova o regulamento do Partido Médico de Midões.
1872 Intervenção na Fonte da Caricha, dando-lhe o aspecto actual.
30/05/1872 A Junta de Paróquia aprova a proposta do seu presidente Domingos da Fonseca
Ferrão requerendo a criação, com base na portaria do Ministério do Reino de 1859,
de uma cadeira para o sexo feminino.
30/03/1874 A Junta de Paróquia decide lançar derrama extraordinária no valor de 550.000 reis,
a cobrar em dois anos pelos paroquianos, para com o seu produto se edificar uma
escola do sexo feminino.
17/11/1880 Falecimento de João Brandão em Angola, em circunstâncias pouco claras.
19/12/1889 Agostinho Borges de Figueiredo e Castro é agraciado com o título de 1º Visconde
do Vinhal por carta do rei D. Carlos.
1890 Aprovação dos estatutos da Irmandade do Santíssimo Sacramento
1912 António Duarte d’Almeida Veiga publica a obra Midões e o seu velho município – o
primeiro estudo histórico sobre Midões e sua região.
30/06/1912 A Junta de Paróquia de Midões representa ao Ministro do Interior pedindo a repa-
ração da escola dos dois sexos que se encontrava em ruínas.
Julho 1912 O Governador Civil autoriza a trasladação das ossadas do velho para o novo cemi-
tério de Midões.
1913 Entra em funcionamento a primeira escola em Touriz.
07/11/1919 Data da carta enviada por um conjunto de habitantes de Midões para aformosear
a zona de Valverde.
1920 Abre a escola primária de Touriz, com ensino misto.
Março 1928 O cruzeiro é colocado ao centro do adro da Igreja.
07/10/1932 Inauguração da nova escola primária de Touriz.
11/10/1933 Decreto 23.122 In Diário do Governo 231 classificando como imóvel de interesse
público os pelourinhos de Midões e do Coito.
14/11/1937 Ianuguração da nova escola primária de Midões.
18/09/1938 Inauguração da Estação de Correios de Midões.
23/02/1947 Inauguração da nova escola primária de Vila do Mato, construída no âmbito do
Plano dos Centenários.
27/09/1952 Inauguração da residência paroquial pelo Bispo D. Ernesto Sena de Oliveira
03/10/1952 Fundação da Comissão de Melhoramentos de Touriz

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DATA ACONTECIMENTO/EFEMÉRIDE
1955 O marco geodésico de S. Miguel sofre importante intervenção.
11/06/1958 Inauguração do abastecimento de água a Midões e da electrificação de Vila do Mato
29/07/1959 Inauguração em Touriz do Largo Engenheiro Basílio Freire Caeiro da Matta
13/06/1971 Inauguração pelo Presidente da República Américo Tomás da ponte Rui Sanches
(Ministro das Obras Públicas e Comunicações), beneficiando a freguesia de Midões.
30/01/1975 Auto de posse da Comissão Administrativa da Junta de Freguesia de Midões, no-
meada por portaria de 6/12/1974, DG nº 20, II Série, de 24/01/1975
07/09/1986 Inauguração do Parque Desportivo de Vila do Mato – Visconde de Vinhal
14/10/1989 Inauguração do Parque Desportivo de Touriz – Visconde de Vinhal
02/07/1990 O Presidente da República, Dr. Mário Soares visita a Freguesia de Midões.
17/07/1990 A Ponte de Sumes é classificada como Imóvel de Interesse Público.
31/07/1997 Inauguração das obras de ampliação do posto médico, na presença de várias indi-
vidualidades.
13/08/1999 Inauguração do pavilhão gimnodesportivo de Midões, pelo Secretário de Estado do
Desporto, Dr. Miranda Calha.
20/07/2001 Inauguração da Biblioteca Municipal de Tábua João Brandão.
16/09/2002 Inauguração da Escola Básica Integrada de Midões pelo Ministro da Educação
David Justino.
2004 Trabalhos arqueológicos no âmbito da construção do Centro de Dia revelam im-
portantes vestígios arqueológicos.
Setembro 2006 Inauguração do Centro Social Caeiro da Matta.
05/10/2008 Homenagem a 3 combatentes falecidos no Ultramar.
21/04/2012 Inauguração pelo Bispo D. Vergílio Antunes do Centro de Actividades Juvenis/Sede
do Agrupamento de Escuteiros.
05/05/2013 Inauguração do Salão Social – Casa Mortuária em Touriz.
12/09/2014 Festa evocativa da atribuição de foral manuelino.

14
PREFÁCIO

M
ais de 100 anos volvidos e eis que surge uma nova monografia “Freguesia de
Midões - Uma história milenar”. Não vem, de modo algum, destronar “Midões
e o seu velho município” de António Duarte de Almeida Veiga, publicada em
1911, mas vem, antes de mais, acrescentar mais conhecimento e saber sobre
esta histórica freguesia. 
A história de Midões, como podemos ler nas páginas deste livro, remonta ao século X,
mais propriamente a 951, ano em que Midões, juntamente com Teodorize ( Touriz) é
doado ao Mosteiro do Lorvao. 
Desde essa altura teremos oportunidade de ver que esta terra cresce, cresce em impor-
tância política, administrativa e religiosa até ao século XIX, mais propriamente até 31 de
Dezembro de 1853, data em que , perde os seus ancestrais foros e regalias, com a grande
reforma de Mouzinho da Silveira. 
Conta-se e ouve-se por estas terras que se perderam esses ancestrais foros e regalias
que contam com dois forais, um do século XIII e o segundo, foral novo, atribuído por
D. Manuel I, em 1514, cuja comemoração dos seus 500 anos aconteceu em 2014, por
causa das "atrocidades" cometidas por João Brandão.
Ora, são estas questões e muitas outras que podemos desmistificar nas páginas desta
monografia. A história tem a grande capacidade de nos reavivar a memória. A memória
material, materializada nos solares, na igreja, nas casas típicas beirãs que encontramos por
Midões, nas pontes, inscrições e demais vestígios da ocupação romana, nos belos conjun-
tos de sepulturas antropomórficas, no pelourinho, símbolo do seu municipalismo. Mas
também a memória imaterial, das famílias nobres, dos condes e viscondes, de cónegos,
de juízes e também de ferreiros e de povo. 
A análise da paisagem histórica, da importância do Rio Cavalos, dos campos de mi-
lho, dos moinhos e dos moleiros. Tanto conhecimento que a história nos traz, através da
pesquisa, da investigação refletidas nestas páginas pela mão do historiador João Pinho.
É com grande alegria e emoção que vejo, agora, publicada tão importante obra sobre
tão importante terra, que não me viu nascer, mas me viu crescer e que adotei como minha.
Os vindouros que a estimem, que a enriqueçam e nunca a deixem cair em esquecimento.
Uma vez importante, importante para sempre.

Ana Paula dos Santos Faria Neves


Vice-Presidente da Câmara Municipal de Tábua

15
Actualmente, a freguesia de Midões apresenta-se como uma óptima referência turística do
município. Ao caminhar pelas ruas da vila é possível sentir um passado não muito distante,
evidenciado pela arquitectura do período setecentista ao novecentista, em imponentes edifícios
senhoriais.
Passear por estas ruas permite-nos, sem dúvida, sentir o fulgor e a história de tempos idos
e que se vão perpetuando pelos tempos

[Luís Pedro Ferreira: Tábua – um passado com futuro, Município de Tábua, 2007, p. 60]
MENSAGEM DO PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA

A
publicação da monografia de uma freguesia é sempre um marco importante
para a preservação da sua história e das suas gentes. 
É igualmente importante para o seu Presidente, José Alberto Pereira que,
orgulhoso da sua terra, vê realizado o desejo de deixar nas páginas deste livro o
passado histórico que ainda hoje se respira e se observa nas ruas e nas pessoas da freguesia
de Midões.
Consciente da riqueza ancestral de Midões partimos ao encontro do historiador certo
que fizesse a investigação e pesquisa de todos os documentos e registos que encerram a
sua história. 
Encontramos o historiador João Pinho que após algumas conversas sobre o que se
pretendia, nos apresentou uma proposta que foi aceite. 
Daí até hoje foi um crescendo, que só depois de ler as páginas deste livro poderemos
perceber.
A ideia era trazer até nós o ano do nascimento de Midões até à atualidade. Perceber
que durante 11 séculos esta vila teve a sua importância que se mantém até aos dias de
hoje. E que nestes 11 séculos há vestígios de ocupação romana, em inscrições na capela
de S. Sebastião do Couto de Midões, na ponte romana dos Sumes, imóvel classificado,
mas também o seu pelourinho manuelino, como prova da sua municipalidade, ligado ao
seu foral novo atribuído por D. Manuel I, em 1514, que por todo o país reforçou o poder
municipal de muitos concelhos. 
Testemunho da sua importância são os solares e palácios espalhados por toda a freguesia,
prova viva de uma nobreza poderosa que foi enfraquecendo em meados do século XIX,
aquando das guerras liberais e miguelistas. Foi nessa altura que surgiu essa figura mítica,
mas verdadeira, que se chamou João Brandão.
Com tudo o que João Brandão fez de bom e de mau, permanece, até hoje, na memória
de todos os Midonenses. 
Midões foi concelho, de reconhecido mérito até 31 de Dezembro de 1853. A partir daí,
o seu poder foi enfraquecendo, mas nem por isso os seus habitantes baixaram os braços. 
O orgulho Midonense permanece inalterável ao longo de todos estes anos. Ciosos do
seu património histórico, da sua ancestralidade, dos seus antepassados, os Midonenses vão
rever-se nas páginas deste livro “Freguesia de Midões, uma história milenar” de João Pinho. 
A sua publicação deixa-nos mais ricos e assegura a perpetuação da história e dos nossos
antepassados. Um povo sem história, não existe, não sobrevive, morre. 
Queremos que Midões continue a ser aquela vila beirã cheia de glória, poder e história,
vaidosa das suas origens ancestrais.
Um trabalho destes nunca se deve a uma só pessoa. Deixo um agradecimento muito
especial a todos aqueles que comigo quiseram fazer esta longa viagem histórica. Falo dos
meus pares, Paulo Jorge Pereira Portugal e Cristina Alexandra Morais Borges Tavares, bem
como todos os membros da assembleia de freguesia, Carlos Manuel Maceira de Campos,

17
Carla Maria Ferrão Almas, Armando Coelho Monteiro, Agostinho Alberto da Silva Pereira,
Ana Cristina Pereira Silva, Carlos Manuel Alves e José Francisco de Jesus Borges.  
Por fim, à Câmara Municipal de Tabua que possibilitou esta publicação, o nosso
profundo agradecimento.
O caminho faz-se caminhando e foi este o caminho que quisemos trilhar, para chegar
a todos vós. 

Midões, 3 de Setembro de 2017

José Alberto Pereira


Presidente da Junta de Freguesia de Midões

18
INTRODUÇÃO

T
enho singulares memórias de Tábua que me projectam para a infância. Para a
casa de minha tia-bisavó, perto da actual biblioteca municipal João Brandão,
que frequentei durante os estios dos meus primeiros anos de vida, lugar de
reuniões familiares de entes quase todos desaparecidos do mundo dos vivos.
A imagem da vila desse tempo remete para um espaço de muitos agricultores e de densa
floresta, de beirões corpulentos e peles enrugadas, animado no verão pelo regresso dos
emigrantes, festas de aldeia, romarias e vindimas. Ao redor da mesa familiar falava-se pouco
sobre Tábua ou Midões, embora a figura de João Brandão fosse lembrada por meu avô, que
nutria por este tipo de figuras (em especial pelo Zé do Telhado) uma admiração especial.
Aos poucos esse ramo familiar foi largando Tábua, atraída por Coimbra onde des-
pontavam novas oportunidades e desafios. Aquele mundo beirão e serrano, feito de ar
puro e liberdade, acessível a partir de Coimbra por uma estrada de curvas e contracurvas
(Nacional 17), foi ficando cada vez mais distante, física e emocionalmente.
Apesar de frágeis e cada vez mais longínquos os laços familiares que me uniam a Tábua
não se quebraram. Quando menos esperava revigoraram, pela mão da minha prima Ana
Isabel Sousa que de há uns anos a esta parte vem acompanhando proximamente o meu per-
curso na área da história local e regional. A ela se deve a primeira ponte, informal mas decidi-
da, que se estabeleceu entre o autor desta monografia e as autarquias tabuense e midonense.
Estávamos nos princípios de 2015 quando reuni com a Dr.ª Paula Neves, Vice-
Presidente da CM Tábua, e trocámos ideias várias sobre história e cultura. O projecto que
então mereceu amplo consenso, e que constituía o maior desafio em aberto, passava pela
elaboração de uma monografia sobre Midões, que todos reconheciam como a freguesia
mais antiga e importante do actual município de Tábua, mas que não dispunha daquele
instrumento cultural actualizado.
Das palavras passámos aos actos, constituindo-se uma equipa de trabalho supervisio-
nada pela Dr.ª Paula Neves onde se incluiu: José Alberto Pereira, Presidente da Junta de
Freguesia de Midões, Luís Pedro Ferreira, Técnico Superior da CMT no Sector da Educação
e Filipe Pais, Técnico Superior da CMT, no Sector da Biblioteca.
Enquanto investigador o trabalho centrou-se, inicialmente, no levantamento de infor-
mação no Arquivo da Junta de Freguesia de Midões e no Arquivo Municipal de Tábua,
fundos estruturantes desta monografia, onde se conservavam séries documentais muito
relevantes para a compreensão da evolução político-administrativa e económico-social da
comunidade.
A este primeiro trabalho, demorado e complexo, sucederam-se outras etapas: levanta-
mentos no Arquivo da Universidade de Coimbra, Arquivo Paroquial de Tábua e na Torre
do Tombo. Paralelamente, consultou-se a bibliografia existente na Biblioteca Geral da
Universidade de Coimbra e nas Bibliotecas Municipais de Tábua e Coimbra, neste último
caso com consulta do fundo de periódicos.

19
E assim se passaram quase dois anos feitos de investigação e escrita sobre a Freguesia
de Midões. Onde pude comprovar a Antiguidade e a força da História que corre em
Midões: documentos anteriores à fundação da nacionalidade, o poder concelhio dominante
regionalmente, as famílias abastadas e suas casas senhoriais, o património religioso ou as
personalidades que levaram o nome de Midões pelo mundo.
O historiador não deve tecer juízos de valor sobre os acontecimentos que analisa. Mas
também não pode ficar indiferente a momentos tão marcantes na vida das comunidades,
como foi o caso particular da extinção do concelho de Midões em 1853. Um momento
muito delicado e original na História de Midões, com consequências e repercussões que
atravessaram séculos e chegaram aos nossos dias. E não pode haver receio de afirmar: a
emergência de Tábua enquanto sede concelhia resultou da decadência imposta a Midões,
onde factores de ordem política e administrativa se confundiram com interesses pessoais.
Este trabalho, com mais de 300 páginas, não reproduz toda a dimensão de Midões,
vasta e riquíssima em qualquer área da ciência histórica. Na qualidade de autor, e apesar
do elevado grau de satisfação com que olho para o resultado do esforço de meses, sei que
há ainda muito caminho a fazer pela dignificação da História de Midões. Assim, desejo
que este contributo franqueie portas para outras aturadas investigações ao nível das redes
sociais e familiares, património particular, genealogia, personalidades ou colectividades.
Ao nível da História Local ficam também desbravados alguns caminhos, designadamente,
os conducentes a monografias sobre as freguesias vizinhas.
Uma palavra de agradecimento para todos aqueles que permitiram a realização deste
trabalho e me deram a oportunidade de fazer aquilo que mais prezo em termos profissio-
nais - o estudo do poder local e das freguesias:
À Dr.ª Paula Neves e ao Sr. José Alberto Pereira por me terem confiado o projecto
e conferido todas as facilidades à sua realização; à Ana Isabel Sousa a amizade serena e
profunda, ao Luís Pedro o acompanhamento permanente e dedicado do gabinete ao ter-
reno, ao Filipe Pais a disponibilidade incondicional nas consultas aos fundos do Arquivo
Municipal de Tábua, à Dra. Cristina Tavares pela revisão, à Maria Helena Moreira da
Silva e Dânia Amaro o apoio dedicado no acesso ao arquivo da Junta de Freguesia de
Midões, ao Nuno Beirão, pelo profissionalismo e entrega na arte de paginar, à Pantone4
pelo empenho e colaboração na impressão.
À minha família e amigos verdadeiros um obrigado especial pela compreensão e estí-
mulo que fui recebendo ao longo desta caminhada.

Midões, 04 de Agosto de 2017. Dia de Nossa Senhora das Neves

20
A HISTORIOGRAFIA SOBRE MIDÕES

A
importância de Midões no contexto histórico nacional cedo captou a atenção
de vários investigadores, historiadores ou simples curiosos. O facto de ter sido
um concelho de grande relevância até às reformas liberais oitocentistas, pela
área administrativa e judicial que abrangia, ficou na memória dos povos e um
facto quase sempre assinalado pelos estudiosos.
Passando, posteriormente, a integrar o Município de Tábua, e baixando à categoria de
simples circunscrição administrativa, Midões tornou-se freguesia religiosa e sede de junta
de paróquia. Porém, o tempo não apagou sinais evidentes do passado assente em nobres
pergaminhos: as casas senhoriais ou o património religioso sobreviveram às convulsões
e alterações políticas, administrativas, sociais. Foram a candeia sempre acesa, reflexos
objectivos e subjectivos do caminho trilhado.
Data dos princípios do séc. XX a primeira tentativa, bem conseguida, de estudo alar-
gado da História de Midões. Foi seu autor António Duarte d’Almeida Veiga, com a obra
Midões e o seu velho município (Lisboa,1912), cuja relevância Marco Daniel Duarte desta-
cou: «...o primeiro trabalho que procurou desenhar a história de uma parcela daquele terri-
tório (…) a mais esteada obra com intuitos e metodologia histórica que visa a preservação
da memória e a consolidação de huma história antiga (…) texto fundador da reflexão sobre
a História de Tábua e nele se contém informação produzida por um método que se enqua-
dra no longo percurso que conduziu à praxis de correntes historiográficas posteriores»(1).
Na verdade, esta monografia extravasa os limites administrativos da freguesia, cen-
trando-se no filão da história municipalista, procurando a origem do antigo município
de Midões, de alargada abrangência territorial, motivo pelo qual são analisados espaços e
temas actualmente fora da área da freguesia.
O trabalho, como o autor refere na sua Advertência, demorou 6 anos a ser concluído,
e reflecte a proximidade a muitos acontecimentos vividos no decurso do séc. XIX, a quem
o autor se sentia ainda ligado – apesar de descendente, na época não residia na região.
Ao longo da obra o autor deixa escapar vários desabafos sobre as injustiças que recaíram
sobre o povo de Midões sendo bom exemplo o que se detecta na abordagem à antiguidade
do mesmo: «nenhum outro mais nobre existe na peninsula que o calumniado povo de
Midões». Mas é no derradeiro capítulo, que designou como «Ostracismo e Regeneração»
António Veiga acaba por revelar o leit-motiv da empreitada a que se propôs: denunciar
a injusta extinção da Comarca e do Concelho de Midões, a esperança numa reforma
administrativa republicana que repusesse a antiga ordem.
Orgulhoso do trabalho produzido e certo da aceitação que teria na comunidade,
António Veiga dedica a obra aos seus conterrâneos, terminando o seu trabalho lançando

  DUARTE, 2009 pp. 21-23


(1)

21
uma invocação aos filhos de Midões, comparando a sua terra à «nova Jerusalém», apelo
intenso para que residentes e naturais ausentes continuassem a amar a terra, as suas gentes,
o seu património.
Esta monografia sai a lume numa altura de convulsão política e social pós Implantação
da República. Ao tempo da sua edição surgiriam as primeiras críticas ao seu trabalho.
Remetendo-o ao director do jornal O Tabuense, António Maria Simões Ferreira, veio
este a escrever uma recensão, reconhecendo o mérito de quem investigou, mas criticando
o facto de conferir a Tábua posições de inferioridade perante Midões(2).
Uma obra de circulação restrita, que cedo terá esgotado, e que com o decorrer dos anos
se valorizou, sendo muito procurada no meio alfarrabista. Poucos exemplares se conservam
em bibliotecas públicas nacionais. A Freguesia de Midões possui um original, assinado
pelo autor, em Benavente, no dia 25/VI/1912, que foi ofertado pela familia Smith. A
Câmara Municipal de Tábua não possui original, tão somente um exemplar fotocopiado.
No ano de 1952, sairia um importante contributo historiográfico, embora centrado
nas questões da arte: o Inventário Artístico de Portugal. Distrito de Coimbra, Vol. IV, pro-
movido pela Academia Nacional de Belas-Artes e esforço de descrição e inventariação de
António Nogueira Gonçalves e Vergílio Correia.
Em 1986, e após 74 anos passados sobre a edição da obra António Veiga, Midões
seria novamente objecto de estudo. Uma edição de autor do Padre José da Costa Saraiva
intitulada Monografia de Midões, na qual integrou uma abordagem à vida de João Brandão
e uma resenha histórica e artística do Concelho de Tábua.
Na Introdução ao trabalho, o sacerdote do clero diocesano de Coimbra e pároco de
Midões desde 14/10/1984, refere que a ideia lhe nasceu no espírito logo que tomou posse
da paróquia, sendo a sequência lógica do que escrevera e consultara na Comarca de Arganil
e no Tabuense, sob o pseudónimo de Fernando de Sintra.
Autor com vasta obra correlacionada com a temática eclesial, actualiza, no caso de
Midões, várias informações constantes no livro de 1912, acrescentando algumas novas
temáticas.
Posteriormente temos o estudo As alminhas do Concelho de Tábua, em edição da pa-
róquia de Midões do ano de 2003, tendo como autores Pedro Carlos Lopes de Miranda
e Orlando José Carrasqueira Martins.
Uma povoação em especial, Touriz, mereceu a atenção de um conterrâneo que dedicou
parte da sua vida a escrever sobre a História e estórias deste povoado, a maioria em jeito de
crónicas e de fundo memorialístico. Falamos de Amândio Nunes Monteiro, autodidacta
que entre as várias obras que lançou, consagrou dois volumes à sua terra (2005 e 2007) ,
intitulados Touriz-História de um Povo.
Nos últimos anos acentuou-se a procura do ADN Histórico do Município de Tábua,
levando a autarquia a promover a historiografia regional, apoiando vários estudos.

 Vide O Tabuense, nº 6, 10/02/1912, p.2 e nº 7. 17/02/1912, p. 1


(2)

22
Em 2007, saía a lume um roteiro histórico natural pelo município tabuense, com a
obra Tábua: um passado com futuro, do técnico da autarquia, Luís Pedro Ferreira.
Dois anos depois, em 2009, e da colaboração firmada entre a autarquia tabuense e o
Ceis20, nascia a obra Tábua: História, Arte e Memória, do museólogo e historiador de arte
Marco Daniel Duarte, natural da Covilhã. Obra que no ano seguinte seria distinguida pela
Academia Portuguesa de História, com o prémio Prof. Doutor Joaquim Veríssimo Serrão,
instituído naquela academia pela Fundação Eng. António de Almeida.
Ainda no sentido de promoção da história local, salientam-se os trabalhos de transcrição
de fontes e investigação do historiador Fernando Pais: Memórias Históricas de um Concelho:
Tábua Setecentista (2013) e 500 anos: o Concelho de Tábua nos Forais Manuelinos (2014)
Em 2016 o município apoiaria a primeira publicação de um trabalho académico: a
dissertação de mestrado em História Medieval, de António José Simões Nunes, concluída
na Universidade de Coimbra, em 2014, e intitulada As terras de Tábua na Idade Média.
Também no ano de 2016 foi publicada nova edição de autor, promovida por Alberto
Fontes Barata: O Concelho de Tábua: contributos para a sua História.
Contudo, de todas as temáticas abordadas, a que mereceu mais ampla reflexão foi o
caso de João Brandão, que ainda hoje alimenta estudos de investigadores na área criminal,
judicial, social e da história das mentalidades.

23
I
O Meio Físíco
e a Paisagem
Capítulo I  O MEIO FÍSICO E A PAISAGEM

A
Freguesia de Midões, com uma área de 19,98 km2, localiza-se no extremo nascente
do Município Tabuense, sendo delimitada: a norte, pelos rios Mondego e Seia e
pelo Concelho de Carregal do Sal, a Sudoeste pela Freguesia de Tábua, a Sul pelo
Rio de Cavalos e pelas Freguesias de Candosa e Covas, a Sudeste pela Freguesia
de Vila Nova de Oliveirinha, a Poente pela Freguesia de Póvoa de Midões e, a Nascente,
pelo concelho de Oliveira do Hospital (vide mapa com limites administrativos, p. 49).
Compõe-se por 15 lugares (povoações, pequenas aldeias e quintas): Midões (sede da fre-
guesia, a 8 km da sede do município), Casal da Senhora, Couto (ou Coito), Esporão, Ribeira,
Santo Amaro, Touriz, Vila do Mato, Cadoiço, Vale de Gaios, Tojais, Vasco, S. Miguel,
Quinta do Góis, Quinta da Lameira,– onde vivem 1725 habitantes (INE, Censos 2011).
O Município de Tábua, que antes era constituído por 15 freguesias, após a reorgani-
zação administrativa do território das freguesias (Lei n.º 11-A/2013 de 28 de Janeiro),
passou a compreender 11 freguesias: União de Freguesias de Ázere e Covelo, Candosa,
Carapinha, União de Freguesias de Covas e Vila Nova de Oliveirinha, União de Freguesias
de Espariz e Sinde, Midões, Póvoa de Midões, Mouronho, União de Freguesias de Pinheiro
de Côja e Meda de Mouros, São João da Boa Vista, e Tábua.
Um município do centro de Portugal, pertencente ao Distrito de Coimbra, com uma
área de 209 km2, parte integrante da unidade territorial Região do Pinhal Interior Norte.
O seu território administrativo tem fronteiras com Carregal do Sal e Santa Comba Dão
(Norte), Arganil (Sul), Penacova (Oeste) e Oliveira do Hospital (Este-Sueste).
Uma região que usufrui de um clima temperado, com Verões não excessivamente quen-
tes nem secos e os Invernos, por norma, suaves e chuvosos, incluindo-se na denominada
«…região climática de tipo marítimo da fachada Atlântica»(3).

  DAVEAU, 1980
(3)

27
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Assim, os meses mais frios são Dezembro, Janeiro, Fevereiro e Março, sendo que Janeiro
apresenta a mais baixa temperatura mínima média, com 6ºC. Os meses mais quentes são
Julho e Agosto, com médias mensais superiores a 21ºC. Os meses mais chuvosos são Outubro,
Novembro, Dezembro e Abril, sendo Novembro o mais chuvoso, com uma precipitação
média de 362 mm. O mês menos chuvoso é Agosto, com precipitação média de 0.2mm.
Só excepcionalmente ocorrem dias de neve ou de calor excessivo. No Verão quase
sempre se faz sentir uma brisa suave e fresca, enquanto no Inverno as condições se tornam
duras quando os ventos sopram de Este, vindos da Serra da Estrela. Os nevoeiros, raros,
tornaram-se mais frequentes com a construção da Barragem da Aguieira.
A freguesia, como dissemos, é delimitada por três cursos de água que integram a Bacia
Hidrográfica do Rio Mondego: o próprio Mondego que corre a Este e Norte delimitando
a freguesia e o município, com as municipalidades de Carregal do Sal e Santa Comba Dão;
o Seia, que nasce junto à vila com o mesmo nome, delimitando o concelho de Tábua com
o de Oliveira do Hospital, indo desaguar no Mondego próximo de Vila do Mato; e o Rio
de Cavalos, que nasce junto a S. Paio de Gramaços (conc. Oliveira do Hospital), afluente
de várias ribeiras, como a Ribeira de Midões(4), e de rios como o Rio Seco(5), que desagua
também no Mondego (margem esquerda), próximo da Várzea Negra, já na freguesia da
Póvoa de Midões.
Um curso de água muito importante não só na História de Midões, mas do próprio
Município de Tábua, onde laboravam vários moinhos e lagares de azeite (vide fotos 1 a 3),
que delimita seis freguesias do mesmo: Vila Nova de Oliveirinha, Covas, Midões, Candosa,
Póvoa de Midões e Tábua. Perto de S. Geraldo, existe uma nascente de águas sulfurosas, a
que se atribuem propriedades terapêuticas, sobretudo para doenças de pele (vide foto 4).
O relevo é planáltico, característico da Beira Alta, recortado por outeiros e vales, e en-
quadrado entre as serras da Estrela, Lousã, Buçaco e o Caramulo. Um território integrante,
do ponto de vista geológico, no Maçico Hespérico – Zona Centro Ibérica, composto por
rochas magmáticas (granitóides) com orientação predominante oeste-este.
O intenso magmatismo originou, sobretudo, granitóides das séries alcalina e calco-
-alcalina, estando as rochas básicas muito subordinadas. São bem visíveis, ao longo do
curso do Rio de Cavalos os granitos calco-alcalinos biotíticos com megacristais e granulado
grosseiro, usualmente designados por “granito dente de cavalo” (vide foto 5), e que podem
estar na origem do topónimo daquela linha de água.
António Duarte d’Almeida Veiga destacou na sua monografia sobre Midões duas
curiosidades naturais que permanecem actuais e merecem especial realce:

(4)
  Ribeira de Midões, nasce na freguesia de Midões, perto da povoação e desagua no Rio Cavalos, junto a Vale
de Gaios, aldeia da mesma freguesia
(5)
  Rio Seco, desagua no Rio de Cavalos junto da povoação da Ribeira. Nasce junto a Gavinhos (Conc. Oliveira
do Hospital), passando perto de Vila Nova de Oliveirinha (conc. Tábua)

28
Capítulo I  O MEIO FÍSICO E A PAISAGEM

- O desaparecimento do Rio de Cavalos, a jusante da ponte romana de Sumes, numa


cratera existente por baixo de várias pedras graníticas, reaparecendo a uma distância de
trezentos metros. E acrescenta sobre o assunto: «Dizem os que tem descido às profundezas
d’aquele rio subterraneo pelos varios buracos que lá conduzem, quando, no verão, cor-
rente fica reduzida a um pequeno ribeiro, que lá em baixo se encontram num verdadeiro
labyrinto e salas e corredores»(6).
- O Outeiro de S. Miguel, pequena elevação de terreno acima do nível da vila, com
314 m. coroada por uma capela e um marco geodésico (vide foto 6): «O panorama, porem,
que se disfrutcta de lá é incomparavel, e completo como nenhum outro (…) abrange-se
os quatro pontos cardeaes a muitas leguas de distancia, limitados somente pelas serras da
Estrella, Caramullo, Bussaco e Louzã; e, coroando as alturas circundantes, e por entre a
serrada vegetação verde-negra que cobre toda a bacia da Beira, descobrem-se cem povoações
beirôas» (vide foto 7) . Este afloramento é, na verdade, o terceiro de maior altimetria do
concelho de Tábua, depois do Pinhal de Santa Cruz/Venda da Esperança com 513 m. e
Outeiro das Forcas/Candosa, com 406 m.
O marco geodésico designado S. Miguel de Midões está enquadrado por três outros
marcos auxiliares. Nada se sabe sobre o primitivo vértice, que era um tronco de pirâmide
quadrangular encimado por pirâmide, embora exista uma placa com a data de 1854. No
entanto, em 1955, a estrutura sofreu alterações: a pirâmide foi truncada e sobre o tronco
foi construído um cilindro e sobre esse um bolembreano, colocando-se na plataforma do
pilar um gradeamento, assinalando-se com uma placa a intervenção(7).
Ainda dentro dos limites da freguesia temos a Pedra do Rei, local a partir do qual se
obtém uma paisagem magnífica. Acede-se através de um trilho antes da ponte que vai
para S. Geraldo, junto à Quinta de S. Jacinto.
Ao solo se atribuem dois usos predominantes: o agrícola, com campos de cultivo, e
o florestal, onde se assinala a expansão do pinheiro, tanto do bravo como do manso, e,
mais recentemente, do eucalipto. Sobre pinheiros mansos é de realçar o Pinhal da Laija,
em Touriz, onde subsistem centenários exemplares.
Tal como se verifica na maior parte do país, a vegetação existente difere bastante do co-
berto vegetal natural ou primitivo. De facto, a vegetação “bravia”, com espécies dominantes
de carvalho alvarinho, carvalho cerquinho e sobreiro, em associação com o estrato arbus-
tivo rico em espécies de medronheiro, urze, tojo ou carqueja, entrou em regressão, fruto
da interferência humana. O aumento da população e a crescente necessidade de arrotear
terras para a alimentar, têm sido apontados como as principais causas do recuo assinalado.
No princípio do século XX a doença dos castanheiros, conhecida localmente dizimou
vários soitos onde existiam exemplares de grande porte, cuja rentabilidade contribuía para

  VEIGA, 1912, pp. 11-12


(6)

  MONTEIRO, 2007, p. 186


(7)

29
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

o equilíbrio do orçamento familiar. Em Touriz, por exemplo, a razia foi quase total como
recordou Amândio Nunes Monteiro:
«Logo à entrada de Touriz, no local onde se encontra instalado o complexo desportivo
do Grupo Desportivo Tourizense, havia um frondoso soito. No Chão de Corga existia
outro, assim somo no Chão da Laija, Soitinho e Chão da Vinha, além de dezenas de
árvores isoladas que se viam por toda a parte. Hoje, nada existe: a “malina”. Como por
lá dizem, matou-os a todos.
Do maior, o Soito dos Porcos, onde mais de uma centena de castanheiros existia e que,
estendendo-se desde a margem esquerda do Rio de Cavalos ia até junto da povoação de
Vila Chã, já na Freguesia de Covas, só resta o nome e a saudade de quem calcorreou aqueles
pitorescos caminhos, saboreou os seus frutos e, no Verão, gozou a frescura da sombra de tão
benfazejas árvores. Em Santo Amaro, havia também um soito de razoáveis dimensões…».(8)
Nas zonas ribeirinhas da freguesia abundam os salgueiros, vimeiros, o bunho. A paisagem
agrária da freguesia, à semelhança do restante município, é composta por terras de sequeiro
e de regadio, ficando as mais férteis nas margens das principais linhas de água: o Mondego
e o Alva, a que devemos, também, associar as várzeas nas margens do Rio de Cavalos.
Nos seus terrenos férteis, especialmente, a norte, despontam vários géneros agrícolas,
produzindo, com abundância, milho, centeio, cevada, vinho, legumes, batatas e azeite. A
propósito de cereais, recorde-se que pouco se semeava trigo, cevada ou centeio. A maior parte
do pão era de milho e quando se misturava com trigo o pão ganhava o nome de trigamilho.
Nas margens dos cursos de água, abundam as árvores de fruto, umas mais antigas do
que outras: a pereira, macieira, nespereira, ameixieira e, mais recentemente, os pessegueiros
ou as laranjeiras, as quais apresentam elevada produtividade.
Apresenta uma localização estratégica, estabelecendo fortes relações económico-sociais
com Tábua (a 9 km), Oliveira do Hospital (11 km), Santa Comba-Dão (22 km), Arganil
(28 km), Seia (30 km), Mangualde (51 km), e Gouveia (47 km) Coimbra (73 km), e
Guarda (103 km),

  MONTEIRO, 2005, p. 46
(8)

30
II
Pré-História
e Antiguidade
Capítulo II  PRÉ-HISTÓRIA E ANTIGUIDADE

1. OS VESTÍGIOS PRÉ-HISTÓRICOS

E
xistem vários indícios, muito recuados, da presença humana no actual terri-
tório da Freguesia de Midões estando identificados nove sítios arqueológicos:
Gamelão dos Mouros, Lugar de Vale de Gaios; Pinheiras, Quinta da Cerca,
lugar Casal da Senhora; Quinta das Moitas, Midões; Cumieira, Midões; Quinta
das Hortas, Casal da Senhora; Igreja Matriz de Midões; Quinta do Esporão I; Quinta do
Esporão II; – Ponte de Sumes, São Geraldo(9).
Os mais antigos vestígios serão os que António Veiga revelou na sua obra: as pedras
balouçantes. Situa-as em dois núcleos no triângulo definido no território pelos três rios
que a rodeiam: um a 3 km de distância da sede, próximo da Póvoa e outro, a montante
do Mondego, próximo da Vila do Mato(10) (vide fotos 8 e 9).
Na visita efectuada classificou o primeiro de «simplesmente estupidificante», localizan-
do-o num acentuado declive para o Mondego, isolado e a meia encosta, onde se destacava
uma enorme rocha granítica «em forma de degrau ou altar, sobre o rio», com 12 m. de
largura por 9/10 m. de altura. Sobre esta rocha dispunha-se a «pedra balouçante», uma
pedra mais pequena, de forma oblonga, com 3,5 m. de altura.
Avaliou o monólito em centenas de toneladas, afirmando que o mesmo se faz balançar
com apenas dois dedos!. E particularizou dois aspectos: a existência de uma lage encostada
à grande rocha, quadrangular, com 1 m. «sobre a qual foram abertos traços formando
pequenos quadrados em forma de xadrez» e, sobre e pedra balouçante «um pequeno
círculo aberto n’ella».

  LOURENÇO, 2007, pp. 153-157


(9)

  VEIGA, 1912, pp. 23-25


(10)

33
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Esta pedra balouçante está localizada na Freguesia da Povoa de Midões e foi classificada
como Imóvel de Interesse Público pelo diploma 251/70, Diário do Governo de 03/06/1970,
onde também foi classificado o Penedo na Tapada das Eiras em Penafiel (Perozelo).
Quanto ao segundo sítio, localizado nas proximidades de Vila do Mato, também
numa encosta de pequeno declive considerou-o «menos interessante». Com 2 m. por 5
m., assentava «em forma de peão, sobre uma lage que aflora da terra, e balouça assim com
a maxima facilidade, não deixando duvida que andou ali a vontade do homem, já pelo seu
tamanho, já pela configuração». Os locais designam este megálito como «penedo c’abana»
pois assim acontece se o empurrarmos, não obstante as várias tentativas, infrutíferas, com
tractores, para o deslocarem.
Além destes curiosos vestígios, o autor alude, também às «pedras de raio», datando-
-as da idade da pedra polida (Neolítico) e, pelos vistos, abundantes nas casas dos vários
aglomerados populacionais uma vez que, segundo a tradição livrava de faíscas eléctricas.
Centrando a sua atenção nos dolmens e embora equacionasse a existência de vários
exemplares na freguesia, certifica apenas um, que se localizava entre o lugar do Cadoiço
e o Outeiro de S. Miguel, que designa como «precioso thesouro archeologico». Adianta
vários pormenores sobre o mesmo: situado numa fazenda, à margem de um caminho, à
esquerda de quem vem do Outeiro; uma pedra ainda de pé, as outras tombadas com a que
formava a mesa em cima destas. Este testemunho está, na actualidade, em parte incerta.
As pesquisas levadas a efeito na freguesia, recentemente, apontam no sentido de anti-
quíssima ocupação humana, em tempos anteriores ao da utilização da escrita. Em 2004,
e no âmbito dos trabalhos arqueológicos relacionados com as obras de construção em
Midões do Centro de Dia, encontraram-se uma lasca e uma esquírola de sílex e, numa
vinha na Quinta do Sobreiro, fragmentos cerâmicos, um dos quais da época pré-histórica
com fracturas antigas e fragmentos de quartzo talhado(11)
Na Cumieira, foram recolhidos alguns quartzos e um nódulo de sílex talhados.(12) Ainda
em Midões, e enquadrável no Neocalcolítico foi encontrado, em sítio cuja localização exacta
se desconhece, um machado de pedra polida em anfibolite de cor negra apresentando
uma zona para colocação de cabo.
Em Touriz, segundo Amândio Monteiro, no sítio conhecido como Olival da Capela,
era vulgar aparecerem restos de cerâmica bem conservados, moedas, pedras trabalhadas
e ferramentas antigas(13).

(11)
  DUARTE, 2009, p. 30
(12)
  NUNES, 2016, p. 43
(13)
  MONTEIRO, 2005, p. 13

34
Capítulo II  PRÉ-HISTÓRIA E ANTIGUIDADE

2. MIDÕES – OS LUSITANOS E OS ROMANOS


De acordo com os dados mais recentes da historiografia local e regional, o território
do Município de Tábua, integrava-se na província romana da Lusitânia, com capital em
Scallabis (actual Santarém) e, para efeitos político-administrativos na civitas de Bobadela,
cujas fronteiras se demarcavam com as civitates de Viseu e Aeminium (actual Coimbra).
Na sua monografia, António Veiga adianta a hipótese de Midões ter sido a capital
de um povo importante, inclusivamente, a base da primitiva civilização dos Lusitanos.
Em favor da tese que desenvolve apresenta como argumentos: as pedras balouçantes
como evidências dessa época, equiparando-os a monumentos nacionais, fúnebres ou
comemorativos de factos nacionais; e, nos Outeiros da Cumieira e Santa Cruz (vide
foto 10), junto às referidas pedras «os destroços de uma velha cidade», pré-romana e por
estes restaurada.
A partir da tradição local, e das referências que colheu em autores antigos e modernos,
aquelas ruínas seriam o que restava da Cidade de Nabril, pujante no tempo do imperador
Titus, a «progenitora de Midões», a 500 m., para norte, da então Vila de Midões. Para
suportar a sua conclusão, socorre-se da memória que lhe vem dos tempos da infância
quando cipós e moedas apareceram ao plantar-se uma vinha, e dos levantamentos de ter-
reno que fizera para o livro e que revelaram: um pedaço de coluna de granito com 0,5 m.
de comprimento, a metade de uma mó e, no cimo do Outeiro da Cumieira, uma camada
de pedaços de «grossa telha romana».
É, também, a leitura dos antigos autores conjugada com a tradição que o leva a apre-
sentar mais argumentos em prol da identificação de Midões com Nabril: a desaparecida
ponte sobre o Mondego, em Vale de França, e que teria dado comunicação para a estrada
militar romana referida no itinerário de Antonino Pio; a pedra gravada, na parede de um
prédio próximo ao local da ponte, com uma inscrição da qual apenas se lia IMPERATORE
TITO HANC PONTEM e que traduzida corresponde a «no reinado do imperador Tito
foi construída, ou restaurada, aquella ponte» (pedra hoje desaparecida); e outra pedra,
descoberta por acaso num passeio com sua filha, então no muro de uma casa térrea, na
Póvoa, em granito e com uma inscrição de difícil leitura, mas que Nogueira Gonçalves e
Vergilio Correia (1953, p.224) decifraram como sendo: IMP.TITO.VIII COS/PONTEM
AEDIFICAVIT./ SEVERUS VIVE.
O raciocínio sobre a matéria leva-o concluir que a cidade foi destruída com a chegada
dos Visigodos no séc. V. É muito provável que António Veiga se tenha baseado na obra
de Pinho Leal(14) para sustentar parte da sua argumentação. Contudo, e como assinala
Marco Daniel os estudos «…identificam este espaço, designado por Veiga como Nabril,
não como uma cidade romana, mas antes como uma villa»(15), a qual distanciaria 500

  LEAL, 1873-1890, p. 211


(14)

  DUARTE, 2009, p. 39
(15)

35
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

metros da villa da Cumieira, onde se encontraram estruturas, colunas de granito, cipos e


moedas, tégulas, imbrices e tijoeleiras, e na qual se integrava a Quinta das Moitas enquanto
área de exploração agrícola – um espaço onde trabalhos recentes levaram à descoberta de
fragmentos de escória de vidro, tijoleira e cerâmica comum manuel e de roda, datáveis
do período romano.
O facto de se tratar de Villa não exclui, contudo, a possibilidade de ter sido uma zona
fortificada nem o de ter sido destruída pelos visigodos, que pouparam os seus arrabaldes:
Vila do Mato, Midões, Póvoa de Midões, Couto e Esporão.
As indagações sobre a época romana não se cingiram a Nabril. É, também, a memória
de criança de Veiga que o leva a aprofundar o conjunto de propriedades rústicas conhecidas
como Castro, num vale e a três quilómetros da localização apontada para Nabril, próximo
do Rio de Cavalos. Como relata, socorreu-se da ajuda do então prior da freguesia Reverendo
Cónego Garcez para identificar o local, «um campo intrincheirado», remontando à época
romana não só os vestígios do muro do lado poente (pedras sem desbaste), como também
a construção da ponte sobre o Rio de Cavalos, que no conjunto fariam parte da fortaleza
ou povoação dos primeiros habitantes da qual os romanos se apropriaram.
Recorda, a este propósito, as condições intrínsecas propicias à fixação das populações
primitivas ao longo do Rio de Cavalos e que teriam feito do referido castro uma «sentinela
avançada da cidade de Nabril»: a sua localização estratégica «como que um promontorio, do
lado esquerdo sobre o rio de Cavalos, do lado direito sobre o vale agricultado»; os refúgios
naturais «sob a penedia de cyclopicas dimensões, que, em vários pontos, penetrando de
um lado na montanha talhada quasi a pique sobre o rio (…) já nas cavernas que devem
existir sob a amalgama de penêdos que, em baixo, cobre o leito do rio».
Contudo, escavações arqueológicas no ano de 2002 concluíram que o designado
«Castro de Sumes» havia sido ocupado em período proto-histórico indeterminado, pelo
que não se confirmou, até à data, a cronologia romana avançada por António Veiga. Com
localização próxima ao Rio de Cavalos, localizado num cabeço aplanado, tinha defesas
naturais a Oeste, Norte e Sul, coincidentes com encostas escarpadas, sendo pelo ponto a
Este, mais frágil defensivamente, que se faria o acesso ao castro. As escavações revelaram
10 fragmentos de bojo de fabrico manual, cozedura oxidante e com pastas muito micáceas,
de cor castanha clara(16).
As antigas pontes da Freguesia de Midões fariam parte de uma rede que se articulava
com a principal via romana, a qual, segundo António Nunes passava «…junto à Pedra
da Sé, e que chega quase ao leito do rio Mondego, vinha da civitas de Bobadela, que fazia
a ligação à estrada que ligava Viseu à grande via que vinha de Olissipo e se dirigia até
Bracara Augusta»(17).

  DUARTE, 2009, p.37


(16)

  NUNES, 2016, p.49


(17)

36
Capítulo II  PRÉ-HISTÓRIA E ANTIGUIDADE

Sandra Lourenço adianta hipótese similar, segundo a qual a referida via partindo de
Bobadela, saía na direcção de Covas, dividindo-se a Sul do Rio de Cavalos «seguindo um
troço para norte, em direcção a Viseu, e outro para oeste, para entroncar na via Olisipo-
Bracara Augusta. É pois aproximadamente a três quilómetros para noroeste de Covas,
que está referenciada a ponte de Sumes sobranceira ao rio de Cavalos e cujo um pequeno
troço de calçada segue no sentido de Midões, passando presumivelmente nas imediações
da villa romana da Cumieira em direcção ao vale do Mondego…»(18).
No que diz respeito a Ponte de Sumes (vide foto 11), edificada sobre o Rio de Cavalos,
e assente directamente no afloramento granítico, a sua datação romana parece confirmar-
-se, pelo menos no que diz respeito às fundações, mostrando um arco de volta perfeita
e aparelho regular semelhante ao arco de Bobadela, composto por silhares de granito de
grande e média dimensão. No tabuleiro da mesma, com pavimento em lajes irregulares
há vestígios de uma via ou calçada romana, semelhante à que passa próximo da Pedra da
Sé. Foi considerada Imóvel de Interesse Público pelo Decreto n.º 29, DR 163, de 17 de
Julho de 1990.
Nos princípios de Novembro de 1990 foram destruídas a calçada e guardas da ponte(19).
Serão também obras de engenharia do período romano ou tardo romano duas pontes: a
de S. Geraldo e a de Vasco (vide fotos 12 e 13), ambas reconstruídas no período medieval.
Junto à Ponte de S. Geraldo, e num espaço agrícola localizaram-se, recentemente,
vestígios de cerâmica sendo ainda de assinalar a descoberta de um tesouro composto por
7 quilos de moedas romanas «o que leva a defender que naquela local possa ter existido
um complexo de fundição de moedas»(20).
O estudo da época romana aplicado ao território de Midões, empreendido por António
Veiga leva-o, por fim à povoação do Couto. Examinando a Capela de S. Sebastião, que
se ergue no centro antigo da povoação, verifica e observa duas «pedras quadrilongas»
colocadas numa das paredes laterais, cada qual com sua inscrição (vide fotos 14 e 15):
- GENIO MVNICIPITEMPLVM / C. CANTIVS MODESTINVS / EX PATRIMONIO SVO
- VICTORIAE TEMPLVM/ C. CANTIVS MODESTINVS/ EX PATRIMONIO SVO
Estas inscrições, traduzidas para português significariam: Caius Cancios Modestino,
cidadão romano, levantou este templo ao deus do município á custa dos seus haveres; e ao deus
da victoria, á custa dos seus haveres. Lápides estas que teriam feito parte de dois templos
romanos, ou que poderão ter sido trazidas dos escombros da antiga cidade de Nabril.
Esta inscrição, para lá do seu valor intrínseco, revela-se importante por uma dupla
leitura: não só ficamos a saber da «mais antiga construção religiosa por terras de Tábua»,
mas também de «…perpecionarmos uma continuidade, consciente ou inconsciente, do
próprio património, uma vez que, em época que não conseguimos concretizar, as pedras

(18)
  LOURENÇO, 2007, p. 105
(19)
  AJM – Livro de Actas da Assembleia de Freguesia de Midões, 1990-2002, fl. 3
(20)
  DUARTE, 2009, p. 49

37
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

vindas de um templo antigo, ainda que pagão, foram utilizadas na construção de um novo
edificio, também ele dedicado ao culto, mas agora cristão»(21).
Conjugando estas inscrições com as referências ao mosteiro de Speraindeo ou Sperand,
com sua vila, feitas no documento de 1133 que analisamos adiante, e atendendo a que
Sperandei é um nome romano, o autor que vimos citando aduz a hipótese daquela antiga
vila ter dado origem ao lugar do Couto de Midões, tendo este perdido o seu nome pri-
mitivo pelo coutamento, conservando o Esporão, então anexo ou arrabalde da velha vila,
e onde se teria levantado o mosteiro, o nome desta.
Uma importância histórica continuada, que atravessou séculos de história, e que viria
a justificar o esplendor do municipalismo midonense.
Em 1988 e no âmbito das obras da Capela Mortuária (Igreja de Midões), encontrou-
-se um cipo funerário de incineração, prática associada aos povos antes da cristianização.
Com as dimensões de 0,84 (Alt.) x 0,32 (Larg.) x 0,51 (base), possui coluna decorada com
rosáceas, uma carantonha e uma inscrição ainda não decifrada na totalidade (STACRV…A).
Ainda na mesma capela está uma inscrição romana também pouco legível(22).
A presença romana está também documentada para a área envolvente à Igreja Matriz,
onde em 2004, com o desaterro para a construção do Centro de Dia se recolheram frag-
mentos de imbrices e de cerâmica comum(23). No sítio arqueológico de Vale de Gaios foram
também recolhidos 5 fragmentos de cerâmica manual, quatro deles de pastas grosseiras e
um que apresenta elementos plásticos.

(21)
  DUARTE, 2009, p. 52
(22)
  ibid. p.53
(23)
  LOURENÇO, 2007, p. 156

38
III
A Toponímia
Capítulo III  A TOPONÍMIA

M
IDÕES - Lugar e sede da freguesia com o mesmo nome. A sua origem não reúne
consenso entre os investigadores, sendo controversa a origem germânica(24). Nas
anteriores monografias sobre Midões, os seus autores concluem que o topónimo
tem origem árabe, designadamente, de Midan; local ou campo de torneios(25).
Talvez relacionado com Midoy da Galiza (Corunha), apresenta variáveis antigas como
Midones, Midoens, Mitones, Midonis e, por fim, Midões.
É também possível que derive do antropónimo Mido que surge em documento do
ano de 882, dando lugar no documento de 1169 à Villa Midonis - Quinta de Midão,
nome de antigo proprietário.
O topónimo é frequente em Portugal: Barcelos, Castelo de Paiva, Castro Daire,
Gondomar, Penacova, Tábua (Midões e Póvoa de Midões) e Valpaços.
CADOIÇO - Aparece nos documentos antigos como cadouço e cadoço. Designa lugar
profundo de um rio, pântano ou charco, pequena cavidade na rocha para recolher água
pluvial (26). Um substantivo masculino de «aloque grande», «pego profundo em ribeiro».(27)
Contudo, opinião diferente teve o padre José da Costa Saraiva que, consubstanciando
a opinião de Veiga considera uma palavra «derivada de Kaidon, residência do Kaid ou
governador árabe do lugar»(28).
Um topónimo frequente em Portugal e registado nos seguintes lugares: Alcobaça,
Fornos de Algodres, Loulé, Mação, Rio Maior, Tábua, Torres Vedras, Valpaços.

(24)
  MACHADO, 1993, p. 989
(25)
  VEIGA 1912, p. 68
(26)
  MACHADO, 1977, p. 22
(27)
  MACHADO, 1993, p. 308
(28)
  SARAIVA, 1986, p. 21

41
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

COUTO ou Coito – Topónimo que deriva do adjectivo Cauto do latim. Cautu, ro-
deado de garantias, seguro que está em segurança. Originou por via popular o português
couto(29). Como afirmou Viterbo: «Antigamente, se chamou couto a um lugar, ou herdade,
ou porção de terreno, demarcado por autoridade do monarca e, juntamente, se chamavam
couto os marcos, e padrões, ou pedrões, que lhes serviam de balizas»(30). De facto, o Couto
ou Coito da freguesia de Midões, foi sede de um pequeno concelho e uma pequena parcela
das terras coutadas em favor do Mosteiro de Lorvão e da Sé de Coimbra em 951 e 1169.
Topónimo frequente em Portugal, Galiza e Brasil.
ESPORÃO - De acordo com os estudos de Pedro Machado o topónimo deriva do
latim Sporõne,(31) substantivo masculino, colocando a hipótese de também poder derivar
do adjectivo áspero (32). Diferente opinião sobre a evolução linguística deste topónimo foi
expressada tanto por António Veiga como por Costa Saraiva. Ambos lhe apontam origem
latina/romana, mas fazem-no derivar de Sperand/Seperandeo/Spairandeo, nome de antiga
villa e hoje o lugar do Couto, e local onde se levantou um mosteiro com o mesmo nome
(citado no documento de 1133), que passou por diversas formas – Sperande, Sporao,
Esperão – até se fixar em Esporão(33).
Topónimo Alijó, Arouca, Estremoz, Felgueiras, Góis, Grândola, Melgaço, Pombal,
Ponte de Lima, Reguengos de Monsaraz, Ribeira de Pena.
TOURIZ - Embora alguns apontem como sendo topónimo derivado de touril, touro
do lat. Tauru, a hipótese mais consistente é a aquela que o dá como derivando deTheo-
derici (villa) genitivo de antrp. M. Theodericus.(34) No importante documento de 951-
955, relativo à doação de Midões, é referida a villa de Teodorize ou Teoderici (fidalgo ou
donatário), designação que com o tempo se corrompeu em favor de Touriz.
Topónimo referenciado em Castelo de Paiva, Estremoz, Loulé, Marco de Canavezes,
Ponte de Sôr, Santiago do Cacém. Touris na Galiza ou Toiriz (Pontevedra).
CASAL DA SENHORA - Existem duas possibilidades para justificar a origem do
topónimo: estar relacionado com a doação feita por D. Sancho I a sua filha D. Teresa
(reformadora do Mosteiro de Lorvão); ou ser consequência do culto à Virgem Maria, que
ali se cultua com o título de Nossa Senhora do Campo, na capela do povoado.
VILA DO MATO - Será um topónimo com raízes antiquíssimas, possivelmente dos
primeiros séculos da monarquia, quando se dava o título de villa a pequenas povoações.
António Veiga adiante a hipótese de D. Afonso Henriques ou algum sucessor ter doado
o lugar a um senhor com apelido Mattos, formando assim a designação actual. Também

(29)
  MACHADO,1977, pp. 102 e 179
(30)
  VITERBO & FIÚZA, 1964, p. 142
(31)
  MACHADO, 1977, p. 469
(32)
  MACHADO, 1993
(33)
  VEIGA, 1912, p. 46; SARAIVA, 1986, p. 21
(34)
  MACHADO, 1993, vol. III, p. 1424

42
Capítulo III  A TOPONÍMIA

não será de excluir, até pela riqueza dos solos da zona, que o seu topónimo se relacione
com existência de altos matos hoje desaparecidos.
SANTO AMARO – A aldeia terá tido origem num santuário no qual se venerava,
como hoje, aquele santo e que terá entre 400-500 anos.
VASCO – pequeno lugar da freguesia. Topónimo originário do castelhano Vasco, deri-
vado regressivo de Vascón, do mesmo latim Vascõne. Como antroponímico a sua existência
vem do séc. XVI. Topónimo muito frequente.
VALE DE GAIOS - Topónimo ligado com as características naturais do local (num
vale), a que se juntou o substantivo masculino gaio (ave).
A RIBEIRA - tal como Vasco ou Vale de Gaios é povoação antiga.

43
IV
Medievalidade
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

1. VESTÍGIOS DE MORTE E DE VIDA E AS ORIGENS DO POVOAMENTO

O
território da freguesia de Midões emerge como um dos mais relevantes espaços
do actual município Tabuense no que diz respeito à presença de vestígios de inu-
mação reportando à Alta Idade Média. Estas populações, que se fizeram inumar
nas sepulturas escavadas na rocha, podem ter dado origem às villas referidas na
documentação do séc. XII.
A área próxima à Igreja Matriz de Midões tem-se revelado profícua: nos anos 90 do
séc. XX, e quando se construiu a Casa Mortuária foram localizadas três cabeceiras de
sepultura com formas discóides e decoradas com a cruz de braços curvilíneos em relevo
e que actualmente se encontram colocadas no muro norte que delimita o adro onde em
alguns blocos de granito se observam marcas de canteiro; no lado sul e também perto do
muro foram encontradas, em 2002, mais duas cabeceiras de sepulturas «confirmando,
assim, que nesse sítio se localizaria uma necrópole também associada a um espaço reli-
gioso, como aliás era comum neste período cronológico»(35) a qual terá sido parcialmente
destruída na construção do templo no séc. XIX.
Existem, também, várias sepulturas abertas na rocha granítica na freguesia, escavadas
na pedra, que tanto Veiga (1912) como Saraiva (1986) assinalaram como sendo da Era-
Pré Românica, com origem árabe. Os trabalhos recentes da arqueologia confirmam-nas
como sendo da Alta Idade Média, aparentemente, não associadas a edifícios religiosos,
as quais devem andar relacionadas com locais de habitat/sepultura, correspondentes a
núcleos familiares.

  DUARTE, 2009, p. 62
(35)

47
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Em dezasseis sítios arqueológicos identificados no município, nove localizam-se na


Freguesia de Midões perfazendo, no total, 11 sepulturas assim distribuídas(36):
- Na necrópole da Quinta das Hortas/Casal da Senhora: 4 sepulturas sem tipologia
identificada, escavadas paralelamente no mesmo afloramento granítico, orientadas
no sentido Oeste-Este, e implantadas num pequeno cabeço (vide foto 16).
- Quinta das Moitas, em Midões: conjunto de duas sepulturas antropomórficas esca-
vadas no afloramento granítico e implantadas numa encosta suave. Junto a uma das
sepulturas, e para sul a partir da cabeceira, existe uma pequena pia, que poderá estar
associada a algum ritual de inumação, por exemplo, a lavagem do corpo.
- Pinheiras/Quinta da Cerca/Casal da Senhora: conjunto de duas sepulturas antropo-
mórficas, implantadas numa encosta e escavadas em afloramentos graníticos diferentes;
- Quinta do Esporão I: Conjunto de 2 sepulturas em afloramentos graníticos diferentes,
distando 8 m entre si, implantadas num planalto. Recolheram-se escassos fragmentos
de imbrices grosseiros, um fragmento de dormente em granito, fragmentos de bojo
de pasta castanha clara e produção manual.
- Gamelão dos Mouros, Vale de Gaios: sepultura não antropomorfica escavada no
afloramento granítico, reaproveitada como lagareta. A 80 m. para este recolheram-se
fragmentos cerâmicos eventualmente associados a algum habitat. Espólio: fragmen-
tos de imbrices grosseiros e 4 fragmentos de bojo em cerâmica comum, com pastas
grosseiras de cor castanha clara e produção manual.
Junto ao povoado de Vasco e a 50 metros da ponte, encontram-se vestígios de uma
calçada aparentemente medieval. Também a Ponte de S. Geraldo, à semelhança da Ponte
de Sumes, apresenta sinais de ter sido reconstruída na época medieval.
No sítio arqueológico conhecido como Quinta do Esporão II, encontra-se um curioso
penedo granítico, com lagareta associada, de cronologia indeterminada, mas com forte
probabilidade de ser da Alta Idade Média. Localizado em encosta suave «…que na sua
extremidade nordeste apresenta 3 degraus talhados com 20 cm de largura e 11 cm de
altura. Os degraus dão acesso ao topo do penedo onde se encontra escavado um tanque
central com 200 cm de comprimento 132 cm de largura e que atinge cerca de 60 cm de
profundidade. Neste tanque central, o calcatorium, encontra-se escavado um canal de
escoamento com cerca de 22 cm de comprimento, 8 cm de largura e 5 cm de profundi-
dade, o qual dá acesso a uma pia receptora, o lacus, de forma mais ou menos circular»(37).
Além destas sepulturas, Amândio Monteiro refere o desaparecimento de «…duas sepulturas
romanas escavadas no granito, que se encontravam na Vinha da Lameira, em frente das Laijas»(38).
Todos os autores que se debruçaram sobre as origens do povoamento em Midões
apontam, como momento fundamental, as invasões bárbaras defendendo a tese de que

(36)
  LOURENÇO, 2007, pp. 154-155
(37)
  ibid. p. 156
(38)
  MONTEIRO, 2005, p. 12

48
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

MAPA - Limites Administrativos da Freguesia de Midões

49
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 1 - Moinho de Vale de Gaios

FOTO 2 - Moinho de Vale de Gaios

50
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

FOTO 4 - Àguas sulfurosas de S. Geraldo

FOTO 3 - Interior do moinho de Vale de Gaios pertença do moleiro Luciano Santos FOTO 5 - O granito «Dente de Cavalo»

FOTO 6 - Outeiro de S. Miguel - marco e capela

51
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 7 - Panorâmica para a Cordilheira Central

FOTO 8 - Penedo da Moura

52
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

FOTO 9 - Penedo c'abana Vila do Mato

FOTO 10 - Outeiro da Cumieira

53
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 11 - Ponte Romana de Sumes

FOTO 12 - Ponte de S. Geraldo

54
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

FOTO 13 - Ponte de Vasco

FOTO 15 - Inscrição Romana na Capela de S. Sebastião, no Couto FOTO 14 - Inscrição Romana na Capela de S. Sebastião, no Couto

55
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

56
FOTO 16 - Sepulturas Antropomórficas (Quinta das Hortas, Casal da Senhora)
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

as mesmas teriam impulsionado a migração da mancha de ocupação populacional nos


Outeiros de S. Miguel e Santa Cruz para Midões, conferindo a esta área uma consistência
habitacional que se tornou motor do desenvolvimento social e económico da freguesia.
Para Costa Saraiva os visigodos, após a destruição de Nabril, ter-se-iam estabelecido
no seu antigo território, usando o Vale Verde para os seus torneios e corridas de cavalos,
desde o sopé do Outeiro de S. Miguel até às alturas da Torre.
É, também, consensual que a primeira zona habitada de Midões (os primórdios da Vila
de Midões) poderá ter sido a da Caricha, topónimo ligado ao termo caria (alcaria), vocábulo
de origem árabe que significa aldeia, sendo assim a Caricha um diminuitivo – aldeizainha.
António Veiga defende, inclusive, que a população se começou a estender da Caricha
na direcção da Torre, sendo esta uma pequena fortaleza ou torre de vigia construída após
a conquista árabe, enquanto Saraiva considera que nos seus primeiros tempos Midões se
compunha de três locais: Caricha, Praça e Vale Verde - que não seria o espaço actualmente
assim designado, mas sim a zona do Ribeirinho. Próximo à Caricha se localiza a casa que
segundo a tradição popular é a mais antiga de Midões (vide foto 17).
Atendendo às provas escritas, designadamente, o documento emitido entre os anos de
951-955(39) a Vila de Midões e a povoação de Touriz eram, por esse tempo, cristãs (vide
fotos 18 e 19). Trata-se, provavelmente, do documento mais antigo referente ao actual
concelho de Tábua, cuja importância nacional foi reconhecida, ao ser seleccionado para
o projecto Origens do Português. Um testamento, datado de 22 de Dezembro, pelo qual
Muna doa ao mosteiro de Lorvão todas as herdades que possui entre os rios Mondego e
Alva, especialmente Midões e Touriz (Tábua):
Em primeiro lugar dou-vos toda a minha villa chamada de Midões, com os seus mosteiros,
com as suas honras e com os seus termos antigos, e toda a outra minha villa de Touriz, e dou-vos
as mesmas villas com as suas honras em todo o seu contorno. Em primeiro Iugar pelo rio de
Cavalos até sua entrada no Mondego, e do outro lado pela villa de Travanca, ce dali por onde
aquela archana (?) entra no Mondego. Dou-vos também o seu porto com a barca de Midões».
Trata-se do documento escrito fundacional da História de Midões, pelo qual as vilas
de Midões e de Touriz passaram a pertencer ao Mosteiro de Lorvão. Que nos aponta a
importância do porto que por essa época animava a vida comercial e social por via fluvial.
Este documento refere, também a doação da vila de Friúmes (Penacova) e dos mosteiros
existentes no território.
A partir deste momento, o Mosteiro de Lorvão instala-se nas terras do actual municí-
pio tabuense, iniciando um processo de aumento dos seus domínios através de doações,
compras e escambos. Um documento cuja veracidade é autenticada pelas assinaturas dos
confirmantes, os Bispos de Viseu e de Coimbra, e que seria ao longo dos séculos seguintes
trasladado em diferentes ocasiões.

  Vide Apêndice. Doc. I. Trata-se de um documento considerado por alguns como apócrifo, lançando dúvidas
(39)

sobre a datação proposta nos estudos iniciais (968 e 969) e apontando os anos de 951-955 como alternativa

57
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

2. A GESTÃO DO TERRITÓRIO: ADMINISTRAÇÃO CIVIL E RELIGIOSA


O território do actual Município de Tábua integrou, em tempo da Reconquista e du-
rante a Idade Média, as Terras de Seia, um vasto julgado medieval no qual se integravam,
administrativamente, não só as primitivas paróquias do concelho de Tábua, mas também
povoações mais distantes como Arganil e Coja. Era também conhecido como foro de Sena e
estendia-se até aos limites de Coimbra, perto de Carapinha, no actual concelho de Tábua,
limite sul da civitas senense e posterior castelo de Seia(40)
As inquirições de 1258 registam as terras de Seia, nelas inscrevendo várias localidades
sob actual jurisdição administrativa de Tábua: Loureiro, Covas, Percelada, Vila Chã,
Candosa, Carragosela, Ázere, Sinde, Tábua, Espariz, Midões, Várzea de Candosa, Touriz
e Couto.
Terras muito importantes do ponto de vista estratégico, na medida em que ocuparam
durante muitos anos a posição de fronteira leste do território cristão, na parte ocidental
da Península Ibérica.
A ocupação destes territórios foi importante para a fixação de instituições de poder,
que, com a sua jurisdição, haviam de congregar homens em seu redor, e ao mesmo tempo,
criar referências fundamentais para a nação que se afigurava Portugal»(41)
Espaço martirizado pelas lutas entre cristãos e muçulmanos, mas que em 1055 foram
reconquistadas por Fernando I, O Magno, juntamente com Viseu. Após a recuperação
de Coimbra, em 1064, reuniram-se as condições para se promover o povoamento do
território, tornando-se um importante núcleo de moçarabismo.
Pelo foral concedido a Seia, em 1136, verifica-se que as terras de Seia contactavam com
as de Coimbra, fazendo-se a delimitação tendo como referência a Carapinha.
Em termos de administração civil Midões pertencia, no tempo de D. Afonso I, à cor-
regedoria de Seia, assim se mantendo até à reforma judicial de D. Afonso IV, apesar da
contenda então havida. Com a criação das ouvidorias no tempo de D. Afonso V passou
a fazer parte de Arganil e à Provedoria da Guarda (conforme expressa a carta de foral
manuelina).
Do ponto de vista da organização e administração religiosa o território cedo integrou a
Diocese de Coimbra. No séc. XIV, por exemplo, Midões integrava um conjunto vasto de
paróquias, constituindo o arcediagado(42) de Seia, situado entre o do Vouga e o de Penela.
Era, também, território de vários senhorios, com especial destaque para dois coutos de
Midões; um pertença do Mosteiro de Lorvão e outro da Sé de Coimbra. O primeiro tem
relação mais antiga com este território, de acordo com a doação de D. Muna, em 951-955.

(40)
  PAIS, 2013, p. 18
(41)
  NUNES, 2016, p. 41
(42)
  Grau intermédio da organização administrativa diocesana, entre as paróquias e a diocese, cuja origem
remonta ao séc. XI

58
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

Um mosteiro muito influente junto da corte, com importante papel, por exemplo, na
reconquista de Coimbra em 1064.
No Couto de Midões, a jurisdição cível e crime foi exercida até 14 de Março de 1340
pelo Mosteiro de Lorvão. Contudo, nesta data, e por sentença dos ouvidores régios no
âmbito das Inquirições que D. Afonso IV ordenou que se efectuassem em Midões, na
parte pertença do Mosteiro de Lorvão - sentença do chamamento geral - «…foi decidido
que a jurisdição do crime passasse para a alçada régia, ficando o mosteiro apenas com a
jurisdição cível»(43).
Desta forma, o mosteiro laurbanense perdeu a capacidade de nomear juiz e meirinho
auxiliados por mordomos, jurados e almotacés, para os casos de crime (com apelação para
abadessa, que julgava por ouvidores sendo apelação de ultima instância para o rei) que pas-
sou para os funcionários régios – o juiz do crime e o meirinho - com as respectivas coimas.
No entanto, por carta de D. João I, datada de 10/06/1396 foi reconfirmado ao Bispado,
então governado por D. João Manuel, a jurisdição cível e crime em vários lugares, entre
os quais na Vila de Avô, Midões e em Candosa(44).
No Couto de Midões, mas na parte pertença à Sé de Coimbra, este poderoso senhorio
eclesiástico detinha e exercia jurisdição. Seguindo um privilégio do rei D. Pedro I havia
juízes eleitos pelos moradores, que tratavam de matérias criminais e cíveis e da sua sentença
havia apelação para o bispo e deste para o rei. Pelo mesmo privilégio a Sé de Coimbra
mantinha as jurisdições cível e crime nos seus coutos de Midões, Candosa e Côja.
Midões era o centro de um território importante para o Bispado de Coimbra, de que
ficaram registos na documentação escrita: D. Tibúrcio, Bispo de Coimbra entre 1234 e
1248, celebrou alguns dos seus actos episcopais na Vila de Midões e nela permaneceu
em Maio de 1245, quando se deslocava, em viagem, para o I Concílio de Leão, o qual se
iniciou em Junho do mesmo ano.
Os monarcas sublinharam a importância do território, concedendo privilégios reais
em favor deste senhorio eclesiástico: a 12 de Setembro de 1255, D. Afonso III isentava o
Bispo de Coimbra e os cónegos da mesma Sé, do cumprimento da anúduva, estendendo-
-o esta isenção aos Castelo de Seia, Coutos de Lourosa e Midões, que pertenciam à Sé
de Coimbra(45).
A 20 de Abril de 1290 D. Aimerico d’Ébrard, Bispo de Coimbra, divide os bens que
na região de Tábua possuía em comum com o deão e cabido, ficando com a posse das
igrejas de Coja, Midoes, Santa Marinha de Seia e Taveiro (no concelho de Coimbra), e
entregando-lhes Pedrogão Pequeno (concelho de Seia), Avô (concelho de Oliveira do
Hospital), Tourais (concelho de Seia), e Murtede (concelho de Cantanhede).

(43)
  DUARTE, 2009, p. 80
(44)
  AMT – Livro de Actas da Câmara Municipal de Midões, 1788-1792, fls. 16-16v.
(45)
 DUARTE, op.cit, p. 86

59
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Em algumas ocasiões foram necessárias intervenções régias para acautelar os direitos do


prelado de Coimbra: D. Pedro, por diploma de 10 de Julho de 1358 ordena que a adminis-
tração judicial régia não interfira onde o Bispo e o Cabido da Sé detêm as suas jurisdições,
cíveis, ou criminais, citando-se os casos específicos do Couto de Midões, e as Vilas de Avô,
Candosa, Nogueira, Lourosa e Coja(46). O mesmo monarca, por carta de 11/12/1358 defi-
niu novamente a jurisdição dos Coutos Diocesanos, determinando que se respeitasse a juris-
dição eclesiástica exercida pelas autoridades eclesiásticas, tanto civil como criminal, com di-
reito a pôr tabeliães, nos coutos de Avô, Candosa, Midões, Vila Cova do Alva, entre outras.
D. João I, a 1 de Junho de 1395 confirmaria a D. Martinho, Bispo de Coimbra, os
privilégios e jurisdições nos coutos e lugares de Velazim (concelho de Seia), Vila Cova, S.
Sebastião, Avô, Midões, Candosa, Nogueira, e Coja(47).
Para lá dos referidos coutos, cuja exploração o rei havia cedido a senhorios eclesiásticos
de grande expressão, sabemos, de acordo com as Inquirições de 1220 que existiam 4 casais
e meio pertença do rei, estando um deles desabitado. Uma destas unidades seria o Casal
da Senhora, território situado na freguesia de Midões, era um reguengo no tempo de D.
Afonso II(48). Ou seja: uma porção do território que pertencia ao rei, que para si reservava
o usufruto do mesmo. É provável que o mesmo estivesse relacionado com uma doação
que D. Sancho I fizera a sua filha a Infanta D. Teresa.
António Nunes apresentou, na sua tese de mestrado, uma proposta de demarcação
dos coutos e domínios medievais nas terras de Tábua(49).
O território de Touriz também foi objecto da disputa entre o poder real e o senhorial.
Em 1276, o prestameiro da Bobadela, exigiu, que Gomécio Peres e Geraldo Peres lhe
pagassem parte dos direitos da «Vila de Tuiriz». D. Afonso III escudado nas Inquirições
de 1258, que confirmavam Touriz como pertencente à Coroa, avisa as autoridades de Seia
para que não permitissem a continuação dessa exigência(50).
Uma parte do território de Touriz entraria, em 1386, na posse do senhorio de Bobadela, por
doação de D. João I a Gomes Freire. Mais tarde, o 8º titular do senhorio, Luís Freire de Andrade,
receberia carta de confirmação de alguns casais, em Touriz e na aldeia vizinha de Negrelos.

2.1. O poder concelhio: Midões e Couto

Na Idade Média estruturou-se, também, a organização político-administrativa local,


salientando-se a importância do Concelho de Midões.

(46)
  MARQUES, 1984, doc. 310, p. 113-116
(47)
  ANTT - Cabido da Sé de Coimbra, M.38, Nº 2181
(48)
  DUARTE, 2009, p.97
(49)
  NUNES, 2006, pp. 104-105
(50)
  PAIS, 2014, p. 21

60
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

Em Julho de 1257, a abadessa de Lorvão, D. Marinha Gomes de Briteiros, estando no


primeiro ano do seu abadessado, concedia carta de foral ao domínio do mosteiro na parte
que tinha em Midões, o qual está alicerçado na doação de D. Muna, efectuada no séc.
X, a que se foram emparcelando outras posteriores doações em 1119 e 1131 «de terras e
bens em Midões e outras partes que se confrontam, com obrigação de alumiar os altares
e esmolas dos pobres»(51).
A Carta de Foral fixa um conjunto de regras de existência, atribuindo a homens livres
a possibilidade de gerirem parte dos destinos da comunidade. Um diploma fundador do
concelho e da correspondente autonomia local, que reconhece o estatuto e regulamenta
não só as relações da comunidade com o poderes superiores, em matérias diversas (foro
fiscal, judicial e militar), mas também as relações internas do município – a legislação da
época em articulação com as Ordenações.
Pelo documento(52) constata-se a existência de práticas de administração local. Temos
referências ao juiz de Midões, D. Paz e, da parte do mosteiro, ao seu procurador Fr. Mateus,
ao capelão João e a D. Mendo e D. Gil, monges de Alcobaça. Também havia, em Midões,
um mordomo, com funções de justiça e de arrecadação das rendas e tributos do mosteiro,
que era auxiliado nas sua funções pelos homens bons do lugar. Algumas cláusulas do foral
protegiam-no de ameaças previsíveis: 20 morabitinos pagaria quem o ameaçasse, quem não
respeitasse o seu testemunho pagaria 2 soldos, quem o chamasse por penhora dar-lhe-ia a
penhora dobrada; por penhora do mordomo no valor de 1 morabitino pagaria 4 dinheiros.
Este foral define os direitos do mosteiro: rendas, tributos e serviços. A renda principal,
parciária, consistia em pagar anualmente 1/8 de pão, vinho, linho e legumes. Como rendas
acessórias temos a eirádega(53) e a fogaça(54): pela primeira pagavam 5 alqueires de centeio
ou de pão que tivessem e, pela segunda, 4 alqueires de trigo.
Havia, também, foros estabelecidos: quem tivesse vinha e casa ou almoinha de rega-
dio, ou quem tivesse casa ou vinha, daria uma galinha e 10 ovos. Quem trabalhasse para
cavaleiros dava 5 alqueires ou ¼ de vinho se tivesse vinha. Quem tivesse porco daria um
corazil(55) e se vendesse o porco dava uma galinha.
No diploma, a portagem(56) merece atenção detalhada. Um imposto de que estavam
isentos os moradores do concelho, mas que abrangia um leque variado de situações:
- Por besta carregada de pescado, o vendedor dava um soldo se o vendesse todo, mas
se o não vendesse todo teria de se acertar com o mordomo.

(51)
  PAIS, 2014, p.21
(52)
  Vide Apêndice, Doc. IV
(53)
  Foragem de cereais, vinho e linho que o foreiro pagava ao senhor, além do foro principal
(54)
  Encargo pago pelo camponês ao senhor, relacionado com o seu “fogo”(casa), por regra satisfeito em cereais,
galinhas e ovos
(55)
  Parte da costela de animal
(56)
  Imposto indirecto que incidia sobre a compra e venda de mercadorias. Por norma, era pago pelos estranhos
ao concelho, que o deviam por certos produtos que introduziam ou tiravam para venda

61
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

- Da carga de asno (burro) 6 dinheiros e, da carga de vinho, pagava ¼.


- Da carga de sal de besta cavalar pagava 1 almude e, de uma carga de sal asnal (burro)
pagava 1 alqueire.
- Pela portagem de boi para a lavoura pagava 1 soldo.
- Por cada boi ou vaca que quisessem matar pagava-se 6 dinheiros, pagando-se o
mesmo por couro.
- Por pele de cordeira feita, pagava 5 dinheiros, pela cabritinha feita, 4 dinheiros, pelo
porco 2 dinheiros.
- Por outra compra qualquer num valor de 1 morabitino pagaria 4 dinheiros. De basta
cavalar pagaria 2 soldos e de burro 1 soldo.
- Por reixelo pagava 1 dinheiro.
- o bufão (ou bufarinheiro) dava 1 dinheiro

O foral expressa, também, cláusulas sobre a transacção de propriedade imóvel: os


moradores do couto não podiam vender as herdades a cavaleiros, nem a homens de or-
dens eclesiásticas, nem a dona; pela venda do direito de usufruto (laudémo ou terrádigo),
pagavam a oitava parte do preço.
Neste documento encontramos, também, várias normas que procuram disciplinar as
relações entre moradores, procurando evitar conflitos e manter a ordem, designadamente,
através de normas de direito, indicações de crimes e suas penas: homicídio, rapto, esterco
na boca, violação de domicílio, uso indevido de armas, justiça privada (ferro quente e
sangue sobre os olhos).
Assim, e em caso de homicídio, os homens pagavam 20 morabitinos, por esterco na
boca (difamação) e rapto, também 20 morabitinos, pelo uso de ferro quente ou de quem
fizesse sangue sobre os olhos, 10 morabitinos, pela casa violada, 60 soldos e quem tirasse
a arma por ira pagava 2 soldos ou perdia a arma.
Por fim, o foral definia que quem estivesse contra o mesmo, fosse considerado maldito
como Judas traidor, lançado no Inferno e pagasse 500 morabitinos.
Existem várias formas de aferir a importância dos concelhos medievais. Assim, é um
facto atestado as repetidas representações de Midões em cortes através dos respectivos
procuradores do concelho: Coimbra (1390, 1472), Évora (1391, 1408, 1475, 1481),
Lisboa (1410, 1412, 1445, 1446), Santarém (1418, 1468).
Para lá do antigo Concelho de Midões, existiu na área da actual freguesia outro con-
celho medieval, também muitíssimo antigo - o concelho e vila do Couto (ou Coito).
A vila medieva do Couto começou a perder influência para a vizinha Vila de Midões, de
tal forma que não viu reconfirmado o estatuto municipal com a atribuição de foral no
âmbito da reforma manuelina. Está hoje reduzido a lugar da freguesia de Midões, mas
nele se preservou um símbolo concelhio, o pelourinho medieval.

62
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

Este concelho não se deve confundir com o Couto de Midões, dado que era uma fracção
das terras coutadas. Segundo afirma o seu juiz nas inquirições de 1258 os seus homens
trabalhavam fora do couto, deslocando-se para o reguengo de Travanca(57).
Por outro lado, e no tempo de D. Fernando (1367-1383), a Vila do Couto de Midões
situada nas Terras de Tábua, foi chamada a contribuir para as obras na torre e muralha de
Coimbra, pagando 28 libras e 4 soldos, havendo ainda a registar os pagamentos de outras
vilas: Ázere, Candosa, Côja, Covas, Sinde, Tábua e Oliveirinha.

2.2. O controlo senhorial do território: o Mosteiro de Lorvão e a Sé de Coimbra

A História Medieval de Midões está profundamente marcada pela acção de dois pode-
rosos senhores eclesiásticos: A Sé de Coimbra e o Mosteiro de Lorvão. A documentação da
época é clara a este respeito, dando testemunho do exercício do poder sobre o território,
incluindo fricções entre ambos.
Após a citada doação de 951-955 não se detectam mais indícios da presença de Lorvão
por estas terras até ao séc. XII, algo que se compreende pelo facto de em 987 as terras
entre o Douro e o Mondego terem caído sob domínio muçulmano, só regressando o
interesse quando as terras na margem direita do Mondego voltarem à posse cristã e com
ambiente de paz.
De facto, e apesar de doações em Vila Chã e Vila de Tábua no ano de 1115, só a 21
de Novembro de 1119 temos notícia de nova doação ao Mosteiro de Lorvão envolvendo
Midões: Gonçalo Guilhufes e sua mulher Ermesinda, e Patrebono e sua mulher Soanilli,
doam uma herdade que têm na Vila de Midões e na «vila de Teorize», hoje Touriz: «…
terras rotas e por romper, pedras móveis e imóveis, saídas e entradas, pastos, pauis, águas
sessegas de moinho, pelos seus termos antigos, que são: do Rio de Cavalos até entrar no
Mondego, passam pela vila de Travanca e pela arca até ao Rio Mondego. Têm estas terras
adquiridas por presúria, o que bem prova a perturbação da vida destas terras»(58).
Alguns anos depois, temos notícia de uma segunda doação da Vila de Midões ao
mosteiro laurbanense: a 20 de Março de 1133, D. Afonso Henriques couta o Mosteiro
de Speraindeo e a vila com o mesmo nome, bem como as vilas de Sabugosa, Freixedo e
Midões(59), confirmando a alçada lorbanense sobre territórios que há mais de século e meio
lhe tinham sido transmitidos: Midões, por D. Muna, em 951-955 e os restantes por D.
Inderquina Pala, em 961.

(57)
  PAIS, 2014, p. 21
(58)
  NUNES, 2016, p. 63
(59)
 Vide Apêndice, Doc. II. Documentos Medievais Portugueses. Documentos Régios. I (Tomos I e II), pp.
154-156, nº 132

63
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

As doações em dois períodos diferentes têm sido interpretadas pelo facto o território
ter sido reconquistado pelos muçulmanos e só «…definitivamente conquistado por Egas
Moniz, pois no governo do Conde D. Henrique estes territórios ainda se encontravam
sob domínio muçulmano»(60).
Do couto de Lorvão faria parte a povoação de Vila do Mato, possivelmente deste o
início do coutamento. Em 1308, temos informação da existência de problemas naquele
lugar, uma vez que a 10 de Outubro, a abadessa D. Constança Soares enviou carta ao juiz
de Midões por causa dos abusos aí cometidos(61).

OS TERMOS DO COUTO E VILA DE MIDÕES SEGUNDO O DOCUMENTO


DE 20 DE MARÇO DE 1133

O couto inicial junto à porta de Midões e ainda pela estrada até junto da
Pousadouro, e caminha junto a esta estrada até junto ao forno térreo, junto ao vale e
do curral, junto do lagar e desce junto do campo para a vinha de Vermudo Miguel,
continua junto à estrada até junto da ponte do rio de Cavalos e prossegue pelo caminho
inativo pelo próprio riacho até abranger; junto ao vale que divide Midões com Teorize
e até junto à Arcanam que fica entre Midões e Travanca e que segue para o riacho de
Sena, e pelo próprio riacho desce até ao Mondego e segue junto ao Mondego até junto
ao lugar que começámos.
O parágrafo acima refere-se à tradução do referido documento de latim para
uma versão em português, que publicamos na íntegra no Apêndice (Doc. II). Versão
esta que vai ao encontro, grosso modo, com aquilo que António Nunes escreveu
sobre os limites observados no referido documento:
«Os termos do Vila de Midões eram os seguintes: começava no porto de Midões
e daí ia pela estrada até ao pousadouro (local de descanso), seguindo pela estrada,
até ao forno telheiro, de seguida através desse vale e por ele, ia direito a um lagar,
seguindo os campos e atravessava a estrada pela ponte sobre o rio de Cavalos,
continuava a direito, seguindo a corrente do rio e daí, por meio do vale que divide
Midões com Touriz, passando entre Midões e Travanca, em direcção ao rio Seia,
onde este desagua no rio Mondego. Esta delimitação, vem demonstrar que esta
carta de couto é da parte mais rica de Midões porque dentro do couto está a Vila
do Mato, Touriz e o Couto (povoação actual). A outra parte que mais tarde vem a
ser coutada à Sé de Coimbra, não entra nesta delimitação». [António Nunes – As
Terras de Tábua na Idade Média, Câmara Municipal de Tábua 2016, p. 102]

  DUARTE, 2009, p. 75
(60)

  NUNES, 2016, p. 66
(61)

64
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

Em 1364, no tempo da abadessa D. Maria Anes, o mosteiro outorgou carta de afora-


mento colectivo de um herdamento no referido couto e situado na Vila do Mato tendo
como foro: 7 fogaças, 7 galinhas a fogaça, 1 teiga de trigo e todos os outros foros do couto,
excepto a carreira(62).
Quase um século depois a relação senhorial do mosteiro em relação a Vila do Mato
mantém-se: a 12 de Março de 1448, a abadessa D. Maria da Cunha, reunida em cabido
com a prioresa e subprioresa emprazam a Nuno Fernandes o herdamento da Vila do
Mato, sito no Couto de Midões, mantendo a jurisdição e recebendo de renda 80 libras de
moeda antiga, no 1º dia de Janeiro. Contudo, algum tempo depois, em 1452, a abadessa
aceitará a resignação de Nunes Fernandes, (mercador, e outros moradores em telhado,
julgado de Besteiros), do referido aforamento, fazendo novo emprazamento a Gonçalo
Nunes, escudeiro, criado de Martim Afonso de Miranda, morador em Midões, casado
com Beatriz Nunes, filha de Nuno Fernandes, pelo pagamento de 70 libras de moeda
antiga, de renda anual, pela Páscoa(63)..
A Catedral de Coimbra ocupa, à semelhança do Mosteiro de Lorvão, um lugar muito
importante na fase da Reconquista, remontando a tempos anteriores à nacionalidade e
tendo sido restaurada no governo do Bispo D. Paterno (1080-1087).
Sendo incontestável, pelos documentos analisados, a história partilhada por Midões
e Mosteiro de Lorvão, é, também, facto comprovado as relações de poder tecidas pela Sé
Conimbricense, em várias localidades do município Tabuense: Midões, Espariz, Ázere e
Tábua registam a sua presença, em especial depois da ofensiva almorávida que ameaçou a
Região de Coimbra, em 1116/17, levando a doações e concessões efectuados pelos condes
de Portucale tendo em vista a consolidação do domínio territorial nas fronteiras do então
Condado Portucalense – de que resultou o aumento do património da Diocese de Coimbra.
Segundo António Nunes foi o senhorio eclesiástico mais poderoso nas terras de Tábua.
De facto, a Sé Conimbricense aumentou o seu património pela via de doações ou le-
gados particulares e outros actos jurídicos efectuados sobre a propriedade. Assim, sabemos
que no primeiro quartel do séc. XII os bispos de Coimbra iniciaram a expansão do seu
domínio pelo território midonense: em 1124, compram a Maria Rodrigues e seus filhos
Mónio Guimariz e Susana Guimariz, 1/3 das herdades que estes possuíam em Midões
e Touriz, então considerado território de Seia, por 16 morabitinos de ouro. Herdades
compostas por montes, fontes, terras, águas e bases de moinhos(64).
Em 1148, o Bispo D. João Anaia (1148-1155) recebeu de Egas Bermudes um casal
sito em Touriz para reparar uma violação que ele cometera no couto de Côja (c. Arganil),
que era pertença do dito Bispo.

(62)
  NUNES, 2016, p. 65
(63)
  ibid.
(64)
  ibid. p. 68

65
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Contudo, seria através dos privilégios outorgados por D. Afonso Henriques que a Sé
de Coimbra acentuaria o seu domínio: a 13/11/1169 e 41 anos depois de ter concedido
carta de couto do castelo de Coja (03/09/1128), o nosso primeiro monarca outorga à Sé
de Coimbra metade do Couto de Midões(65), uma vez que a outra metade havia sido já
doada ao Mosteiro de Lorvão (951-955) e, posteriormente, coutada a Vila de Midões em
favor do mesmo a 20 de Março de 1133. As duas metades formavam, reunidas, um dos
coutos medievais mais importantes do reino português.
A concessão de 951-955 é feita para remédio da sua alma e de seus pais e para ser
lembrado nas orações dos clérigos da Sé e pelo bom serviço que o bispo da Sé de Coimbra,
D. Miguel Salomão lhe fizera. Segundo as inquirições de 1258 a villa de Midões foi du-
rante muito tempo toda do Mosteiro de Lorvão até ao momento em que «o senhor bispo
pediu ao senhor rei para que coutasse Midões», dando o mosteiro, em 1169, metade à Sé
de Coimbra. Ainda de acordo com as referidas inquirições no Couto de Midões davam
colheita ao rei com Lourosa e Vila Pouca (c. Oliveira do Hospital), uma vez ao ano quando
o rei passasse pelo lugar(66).
Através das cartas de couto promoveu-se o povoamento do território e conseguiu-se uma
mais eficaz defesa das fronteiras. Neles estava proibida a entrada da funcionários régios para
efeitos de aplicação da justiça, recepção de tributos ou exigência de prestação de serviços
militares. Por isso eram considerados terra imune, por norma delimitados por marcos ou
padrões e concedidos a autoridades eclesiásticas. Foram um instrumento de senhorialização.
A partir daquele momento a Sé de Coimbra e o Mosteiro de Lorvão passam a repartir
o território de Midões: «…o couto da parte de Lorvão ficava entre o rio Mondego e o de
Cavalos (com excepção da confluência destes, abaixo do porto de Midões) e uma linha
que cortava do rio Cavalos para o de Seia, passando sensivelmente pelo Esporão. O couto
da Sé abrangia aquele triângulo e ocupava uma faixa ao longo da margem esquerda do rio
de Cavalos, desde a sua foz até cerca do rio de Covas»(67).
A delimitação do couto de Midões da Sé de Coimbra evidencia a divisão das terras
com o Mosteiro de Lorvão. Como recorda António Nunes o documento de 1169 contém
aspectos muito interessantes: acidentes naturais aproveitados para efectuar divisões como
«uma grande pedra natural», uma ponte destruída, o porto de Midões, um lugar chamado
Pousadouro onde pousavam «os homens e mulheres cansados» e um marco que parecia
«ter semelhança com homens ao modo de ídolo»(68).
Tendo em atenção esta delimitação, Midões estaria integrado no couto pertencente
ao Mosteiro de Lorvão ficando, no entanto, por esclarecer a pertinente questão levantada
por Marco Duarte (2009 p. 75): «se os limites da doação de Muna, em 969 [951-955],

(65)
  Vide Apêndice, Doc. III
(66)
  Vide NUNES, 2016, pp. 68 e 102
(67)
  CORREIA & GONÇALVES, 1953, p. 239
(68)
  NUNES, 2016, p. 103; vide Apêndice, Doc. III (tradução)

66
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

são, sensivelmente, os mesmos que os referidos no documento afonsino de 1133, a quem


pertenceriam os territórios que, em 1169, são coutados à Sé de Coimbra?».
Nas centúrias seguintes continuamos a detectar a forte influência da Sé de Coimbra.
A 19 de Março de 1291, João Martins, antigo Cónego em Lisboa e Coimbra, deixa, por
testamento, várias propriedades em Midões (uma herdade de pão e uma casa e metade
de uns moinhos em Midões).
No tempo do Bispo D. Estêvão Anes Brochardo as transacções de bens de raiz na área
do senhorio da Sé tornam-se frequentes: a 05 de Maio de 1305, o cavaleiro Martim Anes
e sua mulher Joana Martins, vendem a Mestre Raimundo, deão da Sé de Coimbra e ao
cabido, vários bens que tinham nos Coutos de Midões, Coja e em Avô; e, a 21 de Maio
de 1305, seria aprovada e ratificada a compra das mesmas(69).
Para além destes dois importantes senhorios eclesiásticos, detecta-se a presença nas
terras tabuenses de outra importante instituição; o Mosteiro de Santa Cruz, embora sem
presença registada na área da freguesia.

2.2.1. Amarais: Senhores de Touriz

Domingos Joanes rico homem das terras de Seia no tempo de D. Afonso Henriques,
instituiu no seu testamento, de 1203, o 2.º morgado de Touriz, anexo à capela que fundou
na Igreja de Santa Cruz da Vila de Oliveira do Hospital, onde está sepultado com sua
mulher, Domingas Sabachais (vide fotos 20 a 22).
Era apelidado de «cavaleiro de Oliveira» e além de senhor do lugar de Touriz a ele
pertenciam os direitos reais de Esgueira e de outros povos na Comarca de Riba-Côa, por
mercê do Rei D. Afonso Henriques, pelos serviços prestados na guerra contra os mouros(70).
Foram seus sucessores, entre outros:
- Martim Domingues: senhor da Capela dos Ferreiros e administrador do Morgadio
de Touriz;
- Pedro Martins, que segundo a inquirição de D. Afonso III aparece como fidalgo de
Touriz, pertencendo-lhe metade dos direitos reais e lutuosos sobre os 70 casais, não
sendo os seus moradores obrigados a ir à guerra ou a prestar serviço militar. No seu
tempo, o vínculo de Touriz terá sido aumentado, passando a incluir Vila Chã.
- Martim Gonçalves do Amaral, que casou no tempo de D. Afonso 5.º com Mécia
Dias Homem, dos Homens Costas, principais da Lageosa, filha de Álvaro Dias,
cavaleiro de D. João I, em 1385. Um dos seus filhos, Frei André do Amaral, foi
Chanceler da Ordem de Malta, Embaixador em Rodes, Comendador de Vera-Cruz,
Ansemil, Chavão, Vila Cova, Alcafache, Fontela e outras. Pertenceu ao Conselho de
D. Manuel I, fidalgo de cota de armas (Amarais, chamados de Touriz), por carta de

  DUARTE, 2009, pp. 88-89


(69)

  GONÇALVES, 2006, Vol. I., p. 331


(70)

67
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

23/04/1515. Fez parte da expedição contra o sultão do Egipto, tendo sido condenado
por alegada traição e entendimento com Solimão II, quando da tomada de Rodes
pelos turcos, tendo sido decapitado em 1522(71).
Os limites das terras do Morgadio de Touriz estendiam-se desde a margem direita do
Rio de Cavalos, nos limites de Touriz, até á sua foz, no Rio Mondego, junto à aldeia de
Sevilha e, desde Travanca, na margem esquerda do Rio Ceia, até à foz no Rio Mondego,
bem perto da Vila do Mato(72).
Diz-se que a Casa dos Ferreiros, em Touriz, propriedade de Domingos Joanes e
Domingas Sabachais era das mais ricas e belas da Beira. De tudo quando lhes pertenceu res-
ta a Capela dos Ferreiros, acima mencionada, onde se podem observar as armas concedidas
por D. Manuel I ao bailio Frei André do Amaral, o qual também instituiu na Igreja Matriz
de Midões a Capela dos Amarais também ela desaparecida com a renovação da igreja.

2.3. Inevitáveis fricções entre poderosos

Em 1256 o Papa Inocêncio IV (1243-1254) reafirma, por sentença, que Midões per-
tence à Diocese de Coimbra, documento que, provavelmente, se integra no contexto de
um diferendo com a Diocese da Guarda(73).
Em 1295, o Cabido da Sé de Coimbra emana instruções aos responsáveis concelhios
dos seus lugares e coutos de S. Romão, Midões, Candosa, Avô, Coja, Vila Pouca. Santa
Comba e Granja «para que não consintam que nenhum cavaleiro, escudeiro ou qualquer
homem poderoso possa comprar herdamentos nos coutos do Cabido»(74).
Apesar das disputas, em 6/09/1296 a Diocese de Coimbra e o Mosteiro de Lorvão
celebram uma composição, pela qual este cede aquele os dízimos a que tinha direito nas
Igrejas de Midões e Serpins, enquanto o primeiro abdica em favor do segundo, dos direitos
das igrejas de Figueira, Vilela, Botão, Souselas e S. Martinho(75).
As composições estenderam-se, também, a particulares. A 17 de Setembro de 1301, a
abadessa do Mosteiro de Lorvão, D. Constança Soares, e o Cavaleiro Martim Peres, e sua
mulher Sancha Peres, pelo qual se estabeleceu «…que os vassalos e os moradores do citado
couto teriam, nas relações, os mesmos deveres e direitos que haviam usado e dispostos
com os avós e pais de Martim Peres»(76).
No mundo medieval a disputa pela posse das terras era frequente, levando as partes
a instâncias judiciais, provocando, nalguns casos a intervenção dos monarcas para sanar

(71)
  GONÇALVES, 2006, Vol. I., p. 332
(72)
  MONTEIRO, 2007, p.15
(73)
  DUARTE, 2009, p. 76
(74)
  PAIS, 2014, p. 14
(75)
  ANTT – Cabido da Sé de Coimbra, 1ª Incorporação: Documentos Particulares, M.30, N.º 1246
(76)
 DUARTE, op.cit, pp. 77-78

68
Capítulo IV  MEDIEVALIDADE

as questões. A 04 de Agosto de 1319 D. Dinis ordena a Martim Redondo, meirinho da


Beira, que cumprisse a decisão do ouvidor régio a propósito do diferendo que opunha o
Mosteiro de Lorvão e Gonçalo Anes de Briteiros, por causa de uns herdamentos em Midões.
Este conflito prolongou-se no tempo e dele se conservou abundante documentação,
da qual se destaca:
- A 17 de Setembro de 1319, o meirinho da Terra de Seia, Vicente Martins, cumpre
o determinado na carta régia de D. Dinis, entregando à abadessa de Lorvão, os
«herdamentos novos» entre Travanca e o Couto de Midões, origem do contecioso
com Gonçalo de Briteiros.
- A 6 de Novembro de 1331, o Juiz de Penacova, Vasco Peres, dá cumprimento a
uma carta do Rei D. Afonso IV, ouvindo em audiência os representantes das partes,
concluindo que Gonçalo Briteiros se apropriou indevidamente dos herdamentos e
ordenado que as justiças da Terra de Seia, meirinho e corregedor, o obrigassem a
restituir ao mosteiro os bens em causa «…declarando que este se encontra proibido
de causar danos aos lavradores do Couto de Midões»(77).

3. A VIDA ECONÓMICA E SOCIAL


O homem medieval modificou a paisagem de Midões, destruindo a primitiva, em
estado selvagem, criando a agrária como resposta às necessidade básicas mediante o arro-
teamento de terras compaginado com o movimento da Reconquista.
As inquirições afonsinas de 1258 são, a este propósito uma boa fonte de informações
sobre a paisagem agrária medieval. A agricultura praticada era, obviamente, de subsistência
baseada no cultivo de cereais (cevada, trigo e milho painço), vinho e linho. O azeite seria
produzido em pequena escala, uma vez que a oliveira teria pouca expressão, pois não é
referenciada(78).
Quanto à vinha era já uma realidade pelo menos no séc. XIII, pois num documento
sem data, uma mulher de nome Maria doa uma vinha em Midões, sendo certo que em
1412 a vinha era já cultivada na freguesia(79).
Ao longo dos principais cursos de água dispunham-se azenhas, que permitiam a rega das
várzeas, as quais produziam abundantes produtos, designadamente, cereais, vinho e linho.
No documento do ano de 951-955 alude-se à existência de um «porto com o seu barco
de Midões», indício de actividade comercial pela via fluvial e eventual fonte de rendimento
para o Mosteiro de Lorvão(80).

(77)
  DUARTE, 2009, p. 79
(78)
  NUNES, 2016, p. 36
(79)
 DUARTE, op.cit, pp. 88 e 90
(80)
 NUNES, op.cit., p. 63

69
V
A Modernidade
Capítulo V  A MODERNIDADE

1. ADMINISTRAÇÃO DO TERRITÓRIO

1.1. Evolução Político-Administrativa

N
o princípio do séc. XVI, e em termos de administração religiosa, Midões
integrava a Diocese de Coimbra e compunha-se de duas freguesias: Midões e
Póvoa. O pároco de Midões, apresentado pela Mitra de Coimbra, era Reitor
ou Vigário e tinha como rendimentos certos 400.000 reis, rendendo esta
circunscrição de administração religiosa 8.000 reis.
Em termos de administração civil, o concelho de Midões integrava a Província da
Beira, da qual também faziam parte Ázere, Carapinha, Covelo, Espariz, Mouronho,
Oliveirinha, Pinheiro de Coja e Sinde. Para efeitos de administração judicial pertencia à
Ouvidoria de Arganil.
Com a reforma administrativa manuelina criaram-se vários concelhos e extinguiram-
-se outros: «Após a reforma, surge um novo concelho, Oliveirinha, e as já vilas de Tábua,
Midões, Candosa, Ázere e Sinde vêem renovado o seu estatuto administrativo. Outras
localidades (Carragosela, Espariz, Mouronho e Pinheiro de Coja), todas elas pertencen-
tes ao concelho de Coja, mesmo tendo foros próprios, nunca conseguiram autonomia
suficiente do bispado de Coimbra, para passarem a vila, mesmo Mouronho, que tinha
recebido foral de D. Jorge em meados do século XIV»(81).
Devido às transformações e reformas administrativas e judiciais, aqueles enquadra-
mentos foram mudando. Na lista de Vilas e Concelhos da Correição da Guarda relativa
a 1679, está incluída Midões, bem como a Vila do Couto.

  PAIS, 2014, p. 26
(81)

73
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Ao percorrermos as memórias setecentistas (1721 e 1758), verificamos que Midões


surge englobado na jurisdição da Comarca da Guarda, tal como Carapinha, Covas, Covelo,
Oliveirinha, Pinheiro de Coja e Sinde. Em meados do séc. XVIII, e de acordo com as
referidas memórias, Midões tinha como donatário a Coroa, o que significa que a parte
que pertenceu ao Mosteiro de Lorvão voltou, na totalidade, para a sua posse.
A freguesia e paróquia de Midões compunha-se não só pela Vila de Midões, mas
também pelos seguintes lugares: Casal do Vasco, Casal da Senhora, Vale de Gaios, Vila
do Couto, Casal do Esporão, Casal de Touriz, Casal da Ribeira, Casal do Cadoiço, Casal
de Santo Amaro e Vila do Mato.
Midões era, para efeitos de administração eclesiástica, uma vigararia, recebendo o vi-
gário cerca de 40.000 reis de rendimento, que não representava a totalidade do auferido,
na medida em que a este se tinha de somar o chamado pé-de-altar, obtido com serviços,
como os baptizados, casamentos e funerais, definido pelos párocos como incertos. No que
diz respeito a Touriz tudo parece indicar que pertenceu durante séculos à jurisdição de
Seia. No numeramento de 1527 aparece incluída no Termo da Vila de Seia.

O FORAL MANUELINO DE MIDÕES: TEXTO E CONTEXTO

A 12 de Setembro de 1514, D. Manuel I concedeu foral novo, em simultâneo a


Midões e a Póvoa de Midões como se pode ler na titulação do documento: «Forall
de Mydooês e povoa do bispado de Coimbra» (vide foto 23). Reconhecia, assim, a
importância do antigo concelho, regulamentando, administrativamente, o território
através da fixação de privilégios e deveres.
Recorde-se que os forais se encontram divididos em três grupos: velhos (desig-
nando todos os anteriores ao reinado de D. Manuel), os novos (concedidos durante
o reinado do Venturoso) e novíssimos (outorgados nos reinados posteriores).
Uma concessão na lógica de reforço da autoridade administrativa da governação
régia e que assentou em vários factores: o facto de os velhos forais estarem, em
grande parte, escritos em latim; o estado de conservação dos mesmos impedindo
correctas interpretações do texto; a disparidade nos pesos e medidas, com valores
diferindo de região para região.
A tarefa foi prolongada no tempo e no espaço, reformando-se 596 forais, li-
derada por uma comissão de que faziam parte: Rui Boto (Chanceler-Mor), João
Façanha (Desembargador), Fernão de Pina (Cavaleiro da Casa Real).
O estudo, transcrição e contextualização dos forais manuelinos do actual
concelho de Tábua foram objecto de edição comemorativa dos 500 anos da sua
concessão em 2014: «O Concelho de Tábua nos forais manuelinos», da autoria de
Fernando José Gouveia Pais. Nestas obras encontramos referências pormenorizadas
sobre os seguintes exemplares: Ázere, Sinde, Tábua, Midões, Candosa, Oliveirinha
e Mouronho. Mas também sobre outras localidades do actual concelho de Tábua
como Meda de Mouros, Pereira, Bogalhas, Pinheiro de Coja Carragosela e Espariz

74
Capítulo V  A MODERNIDADE

(no Foral de Coja), bem como a parte de Covas (no foral de Lagos da Beira) e
Carapinha (no foral de Sanguinheda, 1513) .
Centrando-nos nas informações disponibilizadas naquela obra, relativas ao foral
manuelino de Midões, será de destacar:
- No documento foralengo vários assuntos são remetidos para a legislação em
sede da ouvidoria consagrada na carta de foral de Arganil: partir do pão, maninhos,
forças, pensões, montado, serviço de pessoas, vento, arma e portagem.
- Em termos de tributação sobre a produção agrícola, os lavradores de Midões
pagavam o dízimo e a nona parte ao senhor, e ¼ de alqueire do restante vinho e
cereais por cada 16 alqueires.
- Gado do Vento: toda a pessoa que encontrasse bois, vacas, ou qualquer gado ou
bestas «achadas de vento» tinha que dar conta ao rendeiro ou mordomo no espaço
de 8 dias. A posse final do gado do vento variava de concelho para concelho, sendo
um direito real em Midões, embora noutros concelhos pertencesse ao senhorio.
- Maninhos e Montados: as terras não agricultadas ou incultas eram usadas
para o pastoreio de gados do concelho e de fora dele, sendo a utilização das pasta-
gens tributada com o imposto do montado, o qual não era cobrado. Quanto aos
maninhos, terrenos baldios de logradouro comum dos vizinhos, pertenciam ao
donatário, e podiam ser aforados, mas sempre em acto público.
- Justiça: o poder municipal exercia a prática de justiça de primeira instância, fonte
gerador de recursos, sendo a Câmara o local de eleição. Por esta razão o foral contempla
capítulos sobre matéria judicial, especificamente, sobre violência e uso de arma, algo que
parece indiciar serem os de maior frequência, ao mesmo tempo que isenta os que ainda
não tinham plena autonomia jurídica, como menos de 15 anos, mulheres e escravos.
As forças, um conjunto de violências contra pessoas (verbais e físicas) e bens,
estava taxada em 108 reais. O porte de armas era permitido, contemplando situa-
ções de isenção como o uso em legítima defesa. Porém, o uso indevido de armas
era duramente punido, com uma coima de 200 reais e perda das respectivas armas,
embora o foral não especifique o destino dado ao dinheiro e armas.
- Portagem: um extenso capítulo, evidenciando a componente principal do
foral – a fiscal. Procurava gerir o abastecimento mercantil do concelho, era da
alçada exclusiva da vereação camarária, controlando as necessidades da população
em matéria de produtos alimentares e manufacturados. Esta tributação tinha
como principio fundamental só ser paga por comerciantes externos ao concelho,
os moradores locais ou vizinhos estavam isentos, bem como pessoas eclesiásticas,
e mercadores de um vasto conjunto de localidades.
Na mesma época da concessão do foral manuelino levantou-se um pelourinho
em Midões, símbolo do poder e autonomia concelhios e espaço público de execução
de sentenças judiciais.
Pelo decreto de 13 de Agosto de 1832, assinado por Mouzinho da Silveira, co-
nhecido como leis dos forais, foram os mesmos extinguidos, no âmbito das reformas
administrativas oitocentistas.

75
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

1.2. O funcionamento dos concelhos: Midões e Coito


Os concelhos de Midões e do Couto tinham o seu próprio termo, cujas delimitações
foram definidas no numeramento de 1527. Sobre o limite de Midões se escreveu: «Este
concelho tem de termo meia légua em comprido e meia em largo, parte e confronta com
o termo do Couto e com o termo de Oliveira do Conde pelo Rio Mondego e com o
concelho de Tábua e com o concelho de Candosa».
No de Midões se integrava a freguesia de Póvoa de Midões, e apresentava uma organi-
zação municipal bem estruturada: oficiais concelhios como juízes ordinários, vereadores,
procurador e escrivão. Em Apêndice publica-se em tabela as magistraturas conhecidas, de
1687-1855, embora com algumas lacunas, (82)
O apoio aos desvalidos era assegurado pelo Concelho de Midões, cuja dinâmica se
detecta nos assentos paroquiais. Assim, em 1565 era Escrivão dos Órfãos, Simão António
e, em 1780, José da Mota Rebelo. Em 1650 surge como Juiz dos Òrfãos da Vila de Midões
e suas anexas António Dairoa e escrivão Sebastião Madeira(83).
A existência da «Roda dos Engeitados deste Conselho de Midoens», é-nos atestada
pelo baptismo de José, ocorrido a 13/02/1793, no qual se evocou as circunstâncias do
exposto: «…na noite amanhecendo para o dia primeiro deste mez com seu enxoval de linho
e tres pedaços de baeta branca, sem escrito nem cédula por onde constasse de baptismo».
Um dos padrinhos seria José Pedro, Escrivão da Câmara, tendo como testemunha João
Martins, Juiz Ordinário do Concelho(84).
Nos registos paroquiais avultam, a partir de finais de Setecentos, vários baptismos de
expostos. Um dos mais curiosos foi o baptismo das gémeas Jacinta e Maria, a 08/03/1798
«…expostas na via publica desta villa sita no Cazal de Vasco», na noite de 26 para 27/02.
Traziam um reduzido enxoval e dois bilhetes, em forma de verso «quarteto» que o pároco
transcreveu:
Maria: «Esta menina não vai baptizada ponhão-lhe o nome Maria que queira Deos
que não minta há de ser engraçada»
Jacinta: «Esta que he recem nascida preciza de agasalhada ella não vai baptizada por-lhe-
-ão o nome Jacinta. Tenhão delle caridade que se fosse vossa filha a sustância vos custaria
roda roda que hé já tarde = Da Maria»(85).
Por carta régia de 30/06/1785 foi confirmado Juiz dos Órfãos o Dr. Luiz Antonio de
Abranches Brandão (natural de Andorinha, Lagos da Beira)(86).

(82)
  Vide Apêndice, Tabela A.
(83)
  VEIGA, 1912, p. 196
(84)
  AUC – Fundo Paroquial: Midões, Baptismos 1734-1899, fl. 111v.
(85)
  ibid. fl. 175
(86)
  AMT - Livro de Actas da Câmara Municipal de Midões, 1788-1792

76
Capítulo V  A MODERNIDADE

Como dissemos, os limites do Concelho do Couto, que incluíam a Vila do Mato,


também foram definidos no numeramento de 1527: «O qual concelho tem de termo meia
légua em comprida e meia em largo parte e confronta com Lagos da Beira e com a Vila de
Seia e com Oliveirinha e com o concelho de Candosa e com o concelho de Midões e com
o termo de Oliveira do Conde e Rio Mondego e com o concelho do Ervedal».
O Couto era ainda um concelho no século XVII. Nas memórias paroquiais de 1758,
a Vila do Couto estava já anexada ao termo de Midões. O pelourinho atesta a sua antiga
municipalidade.
Para efeitos fiscais os concelhos de Midões e do Couto constituíam um importante e
extenso território fiscal de cobrança de sisas, cujos limites desconhecemos. Por carta de
24/05/1659 foi nomeado como proprietário do ofício de Escrivão das Sisas de Midões
e do Couto, Simão Machado da Costa, cavaleiro-fidalgo, por falecimento de Sebastião
Madeira que vinha desempenhando o cargo(87).

2. DEMOGRAFIA E VIDA ECONÓMICO-SOCIAL

2.1. A população e o território

Sabemos que em 1496 Midões tinha 52 fogos e Couto de Midões 32. Segundo o
numeramento de D. João III (1527-1532) a Vila de Midões e o seu termo perfaziam 72
moradores, repartidos pelas povoações de Midões (38), Póvoa de Midões (32) e a Póvoa
de Vale da Taipa (2). Sendo moradores equivalente a fogos ou famílias, significa que
Midões teria nesta altura, aproximadamente, 122 habitantes. No que respeita ao concelho
do Couto perfazia um total de 50 moradores, 20 dos quais na Vila do Mato. Touriz, que
no tempo de D. Afonso III era constituída por 70 casais(88), surge neste numeramento
incluída como povoação do Termo da Vila de Seia, contabilizando 20 famílias, equiva-
lentes a 90 habitantes.
Em 1649 e na relação de vilas, concelhos e lugares da correição da Guarda, Midões
teria 85 moradores, aproximadamente, 320 habitantes. De acordo com as informações
paroquiais de 1721, Midões teria 924 fregueses de sacramento, número actualizado para
800 pessoas em 1758, não contando com jovens e infantes. De realçar que nesta altura a
paróquia tinha como anexa a Póvoa de Midões, contabilidade que excluímos dos totais
apresentados.

  GONÇALVES, 2006, vol. II, p. 323


(87)

  ibid. 2006, Vol. I, p. 331


(88)

77
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Estando a 40 léguas de Lisboa e a 9 de Coimbra, a população midonense ocupava-


-se, na esmagadora maioria, do cultivo e exploração do solo. Pelas memórias paroquiais
de 1758(89) sabemos quais as culturas mais abundantes na região: milho grosso, feijão,
centeio e azeite, praticando-se o cultivo do vinho e trigo em menor quantidade. No caso
de Midões é de assinalar, em especial, o milho e o azeite, que são também, os principais
produtos agrícolas da região.
Na região realizavam-se feiras em Covelo, Espariz, Sinde e Midões. Nesta última loca-
lidade tínhamos duas feiras anuais, que não eram francas, em dias festivos e consagrados
à Virgem Maria: 15 de Agosto (dia da Assunção) e 25 de Março (dia da Anunciação).
Através dos registos paroquiais é possível perceber a evolução territorial da freguesia
de Midões: os seus lugares e lugarejos, quintas, quintinhas e sítios. Alguns caíram no es-
quecimento, outros chegaram atè à actualidade. Na tabela 1 abaixo segue o levantamento
com designação e ano em que surge pela primeira vez nos registos paroquiais, anotando-se,
quando possível a evolução na grafia:

TABELA 1 – Os povoados da Freguesia de Midões, sécs. XVI-XIX


Lugares Anos
Valverde 1574
Vila de Midois/Midoins 1564/1599
Vila do Mato 1564
Couto/Vila do Couto/Coito 1566/1609/1786
Vasquo/Vasco/Casal do Vasco 1566/1610/1649
Casal de Touriz//Toiriz/Touris 1567/1598
Casal da Estrada /Estrada 1576/1676
Esporão/Casal do Esporão 1578/1612
Casal de Rio Sequo/Casal do Rio Seco/Rio Seco 1590/1638/1670
Baloquas 1596
Casal da Vieira 1599
Casal de Santo Amaro/ Santo Amaro 1601/1670
Casal de Nossa Senhora/Casal de Nossa Senhora do Campo/Casal da Senhora/ 1601/1609/1679/1736
Casal da Senhora do Campo
Vale de Gaios/Casal de Vale de Gaios 1610/1695
Casal do Casaleiro 1624
Outeiro 1626
Casal da Varzea Redonda/Varzia Redonda 1645/1669
Ribeira/Casal da Ribeira 1657/1669
Cadouço/Casal do Cadouço 1661/1688
Val de Taipa 1663

  ANTT – Memórias Paroquiais, Midões, vol. 23, m.º 141, pp. 891-894
(89)

78
Capítulo V  A MODERNIDADE

Lugares Anos
Rio de Cavalos 1739
Casal do Faval 1750
Quinta do Góis 1752
Uchas (limite da Vila do Mato) 1777
Quinta do Carvalhal 1778
Casal de S. José 1780
Quinta do Souto de Porcos 1783
Quinta da Ribeira 1784
Quinta do Rio de Cavalos 1786
Quinta da Regada 1793
Quinta do Rio (limite de Touriz) 1793
Quinta da Cerca 1794
Quinta da Ponte de Sebastião Tavares (Rio de Cavalos)/Quinta da Ponte de 1801/1803
Rio de Cavalos
Quinta do Cadaval 1804
Quinta dos Tojais 1813
Quinta do Peixe 1844
Quinta das Gesteiras 1851
Quinta do Lagar d’Avessada 1849

[Fonte: AUC – Paroquiais de Midões: Mistos, 1565-1699; Baptismos, 1734-1899]

Para além destes lugares que com maior ou menor dificuldade conseguimos identificar,
existem outras noções mais dificeis de definir territorialmente, como «arrabalde» da Vila
de Midões (1644). Outros espaços, bem conhecidos, como o adro, a Torre, o «cimo do
lugar» surgem nas referências dos assentos paroquiais durante o séc. XVII.
O crescimento de alguns lugares também se reflecte nas designações empregues para os
situar: é o caso do Casal do Vasco que em 1802 surge com a anotação de ser «suburbio desta
vila». (Midões, obviamente); da Quinta de Souto de Porcos como «limite de Touriz» em 1806.
Na Vila do Mato temos uma zona específica, «a fonte», assinalada em 1661, a Rua da
Fonte em 1785, o fundo do lugar (1809). Ainda através dos registos paroquiais se iden-
tificam sinais tipicos do mundo social do antigo regime, como a existência de escravos,
«molheres de ma fama», ciganos e mortes por assassinato. E também se assinala a exis-
tência de homens e mulheres rijos que faleciam de idade avançada. Foi o caso de Simão
Gonçalvez, que faleceu a 18/12/1651, no Casal de Nossa Senhora do Campo quando «…
passava de cem annos nunqua caducou nem esteve doente q’ estivesse de cama tres dias
inteiros»(90). Ou de Ana Francisca, de Touriz, que faleceu com 100 anos a 26/01/1667(91).

  AUC – Fundo Paroquial: Midões, Mistos 1565-1699, fl. 145


(90)

  ibid. fl. 154


(91)

79
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

2.2 Economia e sociedade


Analisando os registos paroquiais da freguesia de Midões para os séculos XVI e XVII
(Baptismos, Casamentos e Óbitos), à guarda do Arquivo da Universidade de Coimbra,
obtivemos uma panorâmica sobre a vida económica e social da freguesia. A ligação à terra
não se evidencia, antes se deduz, por ser vulgar e praticada pela maioria da população, em
exclusivo ou acumulando com outras actividades. Na perspesctiva que traçamos é bem
visível o ordenamento social típico do Antigo Regime:
- 8 militares; todos soldados e falecidos fora da freguesia (2 em Alfaiates, 1650; 2 no
Cerco de Badajoz, 1660);
- 8 religiosos; a maioria naturais do lugar de Midões, sendo de destacar D. Luís da
Purificação, Cónego Regrante de Santa Cruz de Coimbra, 1683, ou Nicolau Ribeiro
de Breu, Cavaleiro da Ordem de Cristo, familiar do Santo Ofício, que faleceu a
04/03/1699 e foi sepultado na capela-mor da Igreja;
- 7 escravos; a maioria de Midões e prestando serviços nas Casas Senhoriais,

Eram, contudo, diversificadas, as actividades desempenhadas pela população. Em


termos de profissões ou ofícios dos quais resultavam a produção de bens de consumo
destacavam-se:
- 9 Moleiros; dos quais 5 residentes em Midões, caso de António Francisco, cuja
actividade se detecta no período 1626-1637. Desconhece-se se os moinhos eram
próprios ou estavam arrendados.
- 8 Alfaiates; a maioria situados em Vila do Mato (5), embora o registo mais remoto seja
o de Simão Antunes, do Couto, em actividade em 1625, tendo falecido a 02/02/1646;
- 7 Barbeiros; a maioria concentrados no Couto (5), sendo o mais antigo registo o de
António Roiz, do referido lugar e que vem a falecer em Vila do Mato a 09/11/1680.
- 7 Sapateiros; desde António Dinis, do Couto, cuja actividade se sinaliza em 1569,
até Manuel Francisco, de Touriz (1668).
- 5 Cardadores; a maioria da Vila do Mato, de que é exemplo Domingos Manuel
(actividade detectada entre 1626-1661).

Dentro deste conjunto de actividades, realce para a existência de 3 carpinteiros, 2 tosa-


dores, ambos de Vila do Mato (António Gonçalves, 1628, e António Pires, 1633-1640),
ou do forneiro Gaspar Fernandes, do Couto (1627), de alcunha «o salgado», que prestava
serviço no forno que era de Gaspar Roiz. Ainda dentro do leque de oficios temos: o pedreiro
Bastião Fernandes, de Vila do Mato, com actividade de 1630-1657; o serrador Simão
Francisco (Vila do Mato, 1632), o tanoeiro António Fernandes (do Couto, 1632-1637),
o cerieiro António Soares (Midões, 1694), o currador António Jorge (Midões, falecido
em 1673), da tecedeira Isabel Domingues, do Couto (falecida em 1659).
Algumas profissões requeriam formação e conhecimentos de algum nível, caso de
Baltazar Temudo (tabelião, Midões, 1565), ou de Simão António (Escrivão dos Órfãos,

80
Capítulo V  A MODERNIDADE

Midões, 1565). Registam-se, também, 2 porteiros e Antónia Francisca, do Couto «mulher


de má fama» como se escreveu em 1693.
A vida comercial era animada por almocreves como Pêro Francisco de Midões (1629-
1632), de mercadores como António Eanes de Midões (1625) ou do vendeiro Francisco
Figueiredo, do Couto (1668).
No século XVIII o ordenamento social já assinalado mantém-se:
- 20 religiosos: a maioria de Midões (7), mas também de Touriz (5) ou Vila do Mato (4);
- 13 militares; sendo 9 com patentes, destacando-se Francisco Soares de Albergaria,
Mestre de Campo e Fidalgo de Sua Majestade, falecido a 28/01/1753 e sepultado
junto às portas principais da Igreja.
- 9 criados/escravos: sendo que 4 pertenciam ao Capitão-Mor Roque Ribeiro de Abreu.

A diversificação de actividades praticadas pela população acentua-se, sendo de destacar


o desenvolvimento da moagem, na medida em que se assinalam 26 moleiros que prestavam
serviços ou tomavam de arrendamentos os moinhos de poderosos senhores, como Narciso
de Sousa Machado ou de Roque Ribeiro de Abreu.
Daquele conjunto, 9 eram moleiras, cooperando familiarmente na gestão dos engenhos,
os quais se dispersavam pelas principais linhas de água: 7 em Rio de Cavalos e 4 no Rio
de Ceia, não sendo possível nos restantes assinalar a sua localização.
Mas outras actividades assumiam relevância económico-social: 9 alfaiates, 9 barbeiros,
6 carpinteiros, 6 pedreiros, 5 ferreiros, 5 pisoeiros, 5 sapateiros, 2 forneiros, 1oficial de pez
(Manuel Domingues, natural de Leiria, falecido em Touriz, 08/12/1762), 1 serralheiro
(José Fernandes da Cruz, e Midões, falecido a 07/01/1786), 1 oficial de tornieiro (João
Mimoso, de Vila do Mato, falecido a 16/07/1786), 1 cardador (José António, Vila do
Mato, 1791),
Em termos comerciais realçam-se 3 mercadores, 2 boticários (André de Oliveira e
André Rodrigues dos Santos, ambos de Midões).
A elevação do nível de formação da população é uma das características desta centúria,
se comparado com os dados obtidos para os anteriores. É dentro desta lógica que vemos
surgir: 2 médicos, possivelmente familiares – Francisco Correia Borges, a exercer clínica
no Convento do Louriçal e António Correia Borges, médico do partido; 2 doutores, 1
licenciado e 1 bacharel (Francisco de Paula Abranches e Vasconcelos, de Midões, formado
em Leis e Fidalgo da Casa Real, falecido a 08/10/1795). De realçar o registo referente à
parteira Maria Afonsa, de Midões, cuja actividade se prolonga de 1757-1782.

81
VI
Contemporaneidade
«Midões, a quem o passado legou um nome que a tornou conhecida e quazi lendaria, é
sem dúvida a primeira terra da Comarca de Taboa pela sua posição topográfica – pelo numero
e bem acabado da maioria dos seus edeficios . pela pureza dos seus ares – pela movigeração
relativa de seus habitantes – pela belesa e riqueza de seus campos, e ainda pelo seu comercio e
industria. Não obstante, ella, que devia ser hoje a rainha d’esta parte da provincia da Beira
Alta, ahi jaz abandonada, quasi segregada da sociedade, e sem vias de communicação, que,
comoda e economicamente lhe conduzam os seus produtos, aliaz de bastante valor, a linha
ferrea, que ahi corre a menos de dez kilometros, mas da qual a separa o rio Mondego com as
suas encostas ingremes e escabrosas! Ella ahi jaz, Senhor! Ha mais de meio seculo coberta de sua
tristeza que lhe legou o passado, lutando pela vida, sem um unico favor dos poderes públicos»

[Representação enviada ao Rei a 17/11/1901 pedindo a criação de uma estação postal com sede em
Midões, quando se estava a proceder à reforma do serviço público. In Livro das Sessões da Junta de Paróquia
de Midões, 1897-1902, fl. 28v.]
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

A. DO LIBERALISMO À REPÚBLICA

1. NOVOS PENSAMENTOS E IDEIAS POLÍTICAS, AS INVASÕES FRANCESAS E


AS GUERRAS LIBERAIS

A
implantação do liberalismo foi um movimento político e social marcante
na nossa História oitocentista. Em termos de administração local, instaurou
um sistema centralista e hierarquizado, visando o controlo do território e
das comunidades pelo governo central. O caos e dispersão administrativa do
Antigo Regime foram substituídos por um sistema burocratizado e centralizado, assente
na nomeação de agentes de Estado, representantes do poder central. É bem exemplo da
nova realidade autárquica, o Distrito, sem qualquer tradição entre nós, que veio reforçar
a hierarquia, sob controlo dos ministros do reino.
As Invasões Francesas (1807-1811)(92) trouxeram devastações e perturbações ao reino,
mas foram as responsáveis pela entrada das ideias liberais da Revolução Francesa de 1789.
Apesar de Midões ter sido poupada à devastação, entre os midonenses destacaram-se no
cenário político-militar duas figuras: Miguel Tavares de Albuquerque, jovem alferes da
Infantaria 10 que foi colhido em Badajoz a 06/02/1810 e Sebastião de Albuquerque,
coronel, que se distinguiu em várias batalhas do conflito durante o mesmo período(93).
Encontram-se nos registos paroquiais de Midões relativos a este período várias refe-
rências à terceira invasão. Como o baptismo de Maria, a 12/01/1811, nascida na Vila de

  Foram três as invasões francesas, lideradas respectivamente por Junot, Soult e Massena
(92)

  DUARTE, 2009, p. 291


(93)

85
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Loriga «…para onde se retirara sua mãe para evitar as atrocidades do Exercito Francez,
no dia trinta e hum do mez proximo passado, filha de Manoel Tavares natural de Touris
e de sua mulher Rita da Silva natural de Lagares»(94).
Após o fim das Invasões Francesas, o Governo ficou sob responsabilidade do marechal
William Beresford, estando o monarca ausente da metrópole e o país a tentar recuperar
dos estragos que a Guerra Peninsular lhe trouxera.
Foi, neste contexto, que eclodiu a Revolução Liberal de 1820, obrigando D. João VI
a regressar a Lisboa. O país seria dotado de uma constituição que duraria pouco tempo
e depressa cairíamos numa guerra civil que dividiu o país, famílias inteiras, provocando
exílios e perseguições, adiando a construção de um novo Portugal.
Uma revolução a que se opuseram os Absolutistas, partidários do Antigo Regime: pouco
depois da revolução, a 11/11/1820 dá-se o movimento contra revolucionário levado a
cabo por militares – A Martinhada. Apesar da Constituição ter sido jurada e proclamada
por D João VI em 1822, a Rainha D. Carlota Joaquina e D. Miguel não a juram, Assim,
a 27/05/1823 desencadeia-se uma tentativa de destituição do rei – A Vilafrancada e, em
29/04/1824 nova tentativa, também liderada por D. Miguel – A Abrilada, que fracassou
e o forçou a abandonar Portugal, refugiando-se em Viena.
D. João VI morre em 1826 com o país numa complexa situação, agravada pela ques-
tão da sucessão e soberania portuguesa em relação ao Brasil: o filho primogénito varão,
D. Pedro, era desde 1822 imperador do Brasil; D. Miguel, o segundo filho varão seria
o sucessor mais lógico, porém, a revolução vintista levara ao poder os partidários do
Liberalismo, que tomaram o poder quando D. João VI estava ausente da metrópole, no
Brasil, para onde se havia deslocado devido às Invasões Francesas.
Procurou-se resolver esta situação complexa através de reformulação da constituição: a
Carta Constitucional de 1826, um documento liberal moderado, que pretendia conciliar
as posições antagónicas. Como esperado, D. Miguel jura a Carta mas após regressar a
Portugal convoca as cortes ao modo tradicional e faz-se aclamar Rei Absoluto.
Ao nível da História de Midões também as posições se estremaram. Cinco famílias
dominavam a vida económica e social na freguesia, mas só duas aderiram ao Miguelismo:
a família Albuquerque, que liderava, e a Casa do Esporão (família do 1º Visconde do
Vinhal) enquanto os liberais eram comandados pelos Abreus Abranches, sendo de destacar
a figura do Dr. Roque Ribeiro de Abranches Castelo Branco, mais tarde distinguido com
o titulo de Visconde de Midões, e as famílias dos Abreus Abranches, Fonsecas Magalhães,
Soares d’Albergaria e Veigas.
De 1828 a 1834, a vila de Almeida tornou-se tristemente célebre, porque ali foi re-
colhida a maior parte dos presos políticos da época, fruto das lutas liberais e fratricidas.
Foram usadas como prisões os quartéis velhos ou casamatas, as casernas das portas da Cruz

  AUC – Fundo Paroquial: Midões, Baptismos 1734-1899, fl. 312


(94)

86
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

e Santo António e da porta principal da vila. Eis a relação de midonenses que conheceram
a prisão, alguns dos quais nela faleceram:
- Joaquim José de Lemos, escrivão, de Midões, entrou em 21-7-1829, culpa rebelião,
faleceu a 4-2-1833 em Avançada de Cruz;
- Manuel Costa Tavares, presbítero, de Touriz, entrou em 21-7-1829, culpa rebelião,
faleceu a 19-12-1832 em Avançada de Cruz;
- Aristides A. Ribeiro Castelo Branco, Bacharel em Leis, de Midões, entrou em 25-
7-1829;
- Luiz M. Soares Albergaria, Bacharel em Cânones, de Midões, entrou em 25-7-1829,
culpa rebelião, removido para Arganil em 24-2-1833;
- José Rodrigues, alfaiate, do Casal da Senhora, entrou em 25-8-1829, culpa rebelião,
removido para Arganil em 4-3-1833;
- José Brandão, serralheiro, Casal da Senhora, entrou em 25-8-1829, culpa rebelião;
- Anna Emília Motta, paisano, de Midões, entrou em 16-10-1829, culpa rebelião,
solta em 4-2-1832;
- José Soares Carcereiro, paisano, de Midões, entrou em 22-11-1829, culpa rebelião;
- José Borges Victor, jornaleiro, de Midões, entrou em 22-11-1829, culpa rebelião,
removido para Arganil em 4-3-1833;
- José Maria da Costa Veiga, boticário, de Midões, entrou em 22-11-1829, culpa
rebelião, faleceu na prisão principal em 2-11-1832;
- José Domingues, paisano, entrou em 19-9-1830, culpa rebelião, removido para a
cadeia civil da praça em 19-3-1832;
- Francisco de Sousa, paisano, entrou a 05-02-1832, culpa de rebelião;
- Luiz Monteiro Soares, Bacharel, de Midões, entrou em 24-4-1833, culpa rebelião;
- José da Cruz Ferrador, paisano, de Midões, entrou em 25-5-1833, culpa rebelião;
- José Borges Victor, paisano, Casal da Senhora, entrou a 25-04-1833, culpa de re-
belião(95).
Todos os que resistiram às condições muito pouco humanas da prisão, foram libertados
em 18 de Abril de 1834, dia em que em Almeida foi aclamado o governo da rainha D.
Maria II. A 26/05/1834 assinou-se a Convenção de Évora-Monte, tendo como objectivo
terminar com o clima de guerra entre liberais e absolutistas. Contudo, e ao contrário do
esperado, os combates agudizaram-se após a Revolução de Setembro de 1836, e o país foi
palco de violentos combates em diversas regiões.
Foi neste contexto que se destacaram inúmeras guerrilhas: os Brandões na Província
da Beira; Zé do Telhado (José Teixeira da Silva) no Minho; Remexido (Joaquim de Sousa
Reis) no Algarve.
Na Província da Beira, a intensidade das lutas e dos danos foi, especialmente, violenta,
forçando o acordo conhecido como Conferência de Paz, alcançado na aldeia de Gavinhos

  CARVALHO, 1973, pp. 92-145.


(95)

87
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

(conc. Oliveira do Hospital), conduzindo à assinatura da paz entre liberais, entre os quais os
Brandões, e absolutistas. Era o fim do conflito localmente conhecido como Revolta da Serra.
Entretanto, ocorreram divisões no seio dos liberais: por um lado, os que defendiam a
implementação de um sistema liberal moderado, apoiando a Carta Constitucional de 1826,
enquanto outros desejavam um sistema liberal mais radical, revendo-se na Constituição de
1822. Assim, em Setembro de 1836, alguns deputados eleitos pelo Norte, partidários do
liberalismo radical, forçaram a demissão do Governo, D. Maria II jura a Constituição de
1822, iniciando um período conhecido na nossa História por Setembrismo, liderados por
Passos Manuel e Sá da Bandeira, que direccionaram o país no sentido das ideias liberais
consubstanciadas na Constituição de 1838.
Foi um período de conjuntura interna difícil, com animosidades várias, vindas de
Miguelistas, Liberais Moderados e Cartistas. Foi neste clima que em Midões ocorre a
invasão da casa do pároco, António das Neves Sousa Pimenta, pelo Batalhão Nacional de
Midões a 13/01/1838(96).
As actas do extinto Concelho de Midões reflectem bem a instabilidade deste período,
com a ascensão ora de liberais, ora de miguelistas, à liderança do governo municipal,
impedindo nomeações ou designando novos protagonistas. Em Midões, formou-se, em
1828, um Corpo de Voluntários Realistas, autêntico exército miguelista, que organizou
recolha de donativos entre a população para as despesas necessárias, cifrando-se o total,
em Setembro, em 128.795 reis. Também no Coito, entre finais de 1830 e princípios de
1831, se recolheram donativos de panos de linho, estopa e mantas, através da arrematação
de milho que rendeu 2520 reis(97).
Alguns anos mais tarde, em Julho de 1832, temos o registo do lançamento da cobrança
extraordinária da décima, tanto em Midões, como no Coito, para «a collecta das janelas»,
imposto muito controverso e inspirado no modelo francês, lançado por D. Miguel, que
incidia sobre o número de janelas que cada casa possuía e que serviu para financiar a guerra
contra seu irmão D. Pedro IV.
A paz possível seria consequência do clima trazido pela restauração definitiva da Carta
Constitucional, em 1842, após o movimento liderado por António Bernardo Costa Cabral,
permitindo que aquele diploma vigorasse até 1910 com algumas modificações. Entrávamos
assim no período político do Cabralismo: embora o novo governo fosse liderado pelo
duque da Terceira o poder efectivo estava nas mãos de Costa Cabral, que governou de
forma autoritária até 1846.
Apesar da revolta popular minhota da Maria da Fonte contra as leis da saúde ou da
Patuleia, no Porto, Costa Cabral só foi definitivamente afastado da vida portuguesa em
1852, através do golpe militar liderado pelo Duque de Saldanha, que apesar de Cartista

  DUARTE, 2009, p. 300


(96)

  AMT – Livro das Sessões da Câmara Municipal do Coito, 1828-1834, fl. 27v.
(97)

88
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

discordava das ideias de Cabral. Iniciava-se assim o período da Regeneração, associado a


prosperidade e desenvolvimento.
Um período conturbando, avultando os testemunhos de irregularidades várias. Veja-
se o caso de Midões, quando o resultado eleitoral apurado na Mesa da Assembleia de
Midões foi decretado bem longe do lugar, em Lisboa e na sessão da câmara parlamentar, a
05/01/1852, proclamando deputados pelo Círculo de Arganil: Aristides Ribeiro Abranches
Castello Branco, António Saraiva de Carvalho e António Corrêa Caldeira(98).
Ultrapassada a instabilidade política dos anos pós-vintismo, os decisores centram-se
na resolução dos problemas latentes: a interioridade, os melhoramentos infraestruturais,
a macrocefalia de Lisboa, a emigração, o envelhecimento da população, abandono da
actividade agrícola, as assimetrias e desertificação.
A 22/05/1851 o marechal Saldanha chefia um golpe militar e inicia o movimento da
Regeneração. O novo governo constitucional tem como grande figura António Maria
Fontes Pereira de Melo. É o início de uma nova era, da ascensão do capitalismo e das obras
públicas. Coincide com um período de estabilidade política com condições para politica
de melhoramentos materiais «…que outra coisa não traduzia senão a criação de condições
para a lenta, sinuosa, complexa e tardia implantação do capitalismo em Portugal». Inicio
da construção do Portugal Moderno»(99)
Entre os melhoramentos introduzidos no país destacam-se a rede viária (construção de
estradas em Macadame), implantação da rede ferroviária que no final do séc. XX cobria
quase o todo nacional articulando o mercado interno com o externo; implantaçao de novas
indústrias. Ficou conhecido como fontismo e fez-se à custa do endividamento do Estado e
remessas dos emigrantes que se fixaram no brasil pós independência em Setembro de 1822.
Na óptica dos governos da época, o programa de melhoramentos materiais constituiria
uma das traves-mestras do projecto de desenvolvimento interno «...ao incrementar os di-
versos sectores económicos - agrícola, industrial, comercial - de que sairiam beneficiados o
estado e os cidadãos, os interesses particulares e os nacionais, em suma, o próprio país»(100).
É, também, a época do desenvolvimento do telégrafo e imprensa e, em especial, dos
transporte de pessoas e circulação de mercadorias, que se faziam na 1ª metade do século,
através de carros de tracção animal e navegação fluvial (almocreves, barqueiros, carreteiros),
mas que passaram a ser feitas por comboio ou utilizando a navegação a vapor.
O período da Regeneração trouxe o programa de melhoramentos materiais, uma das
traves-mestras do projecto de desenvolvimento interno «...ao incrementar os diversos
sectores económicos - agrícola, industrial, comercial - de que sairiam beneficiados o es-
tado e os cidadãos, os interesses particulares e os nacionais, em suma, o próprio país»(101)

(98)
  DUARTE, 209, p. 246
(99)
  OLIVEIRA, 1996, p. 184
(100)
  VAQUINHAS, 1995, p. 37
(101)
  ibid. p. 37

89
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Apostou forte em dotar o país de uma rede viária e ferroviária que cobrisse o território de
N-S, tendo em vista a articulação do mercado interno com o externo.
Este período terminaria em 1868 com a Janeirinha, movimento que traduziu o des-
contentamento popular com o agravamento da carga fiscal, sancionada por governos de
coligação entre regeneradores e históricos.

2. REFORMAS ADMINISTRATIVAS OITOCENTISTAS: A AFIRMAÇÃO DO PODER


CONCELHIO E COMARCÃO DE MIDÕES E O SURGIMENTO DE TÁBUA

O actual Município de Tábua resulta de enquadramentos legais que permitiram ane-


xações e desanexações até chegarmos ao mapa actual, constituído por 11 freguesias, após
a reforma administrativa concluída em 2013.
As reformas administrativas do séc. XIX, determinaram um mapa de 15 freguesias, em
vigor de 1898 a 2013, distribuídas pelo corpo territorial de 199,8 km2: Ázere, Candosa,
Carapinha, Covas, Covelo, Espariz, Meda de Mouros, Midões, Mouronho, Pinheiro de
Coja, Póvoa de Midões, São João da Boa Vista, Sinde, Tábua e Vila Nova de Oliveirinha.
Midões, desde tempos imemoriais sede de concelho, era constituído em 1823 pelas
freguesias de Midões e Póvoa, e Julgado pertença de Arganil, mais tarde integrado na
Comarca de Seia.
As sucessivas reformas administrativas liberais tiveram como matriz fundamental a re-
forma de Mouzinho da Silveira que, a partir de 1832-34, importou uma realidade exterior
à portuguesa, a francesa, mais propriamente a da Constituição Napoleónica do ano VIII,
influência que entre nós perduraria até Abril de 1974. Como premissas fundamentais o
centralismo e controlo das comunidades locais.
O desmantelamento da ordem jurídica do Antigo Regime começa com o decreto
n.º 23, de 16/05/1832, assinado por D. João VI: 6 Províncias, que congregavam 26 divisões
eleitorais, cada divisão agrupava concelhos que a nível nacional se cifravam em 785, 4086
freguesias, 765.210 fogos e 3.026.450 habitantes, dos quais 12.500 eram religiosos. Nos
distritos de Lamego, Coimbra e Guarda estava o maior quinhão de concelhos do país. A
imagem do país político-administrativo não deixava margem para dúvidas:
«Era, ainda, um pequeno país, fragmentado em pequenos concelhos num grande nú-
mero de freguesias, mas que tinham uma autonomia e atribuições descentralizadas que a
reforma de Mouzinho veio destruir, «napoleonicamente», com o objectivo formal de mo-
dernizar o Estado e a intenção, não confessada e controlar as populações e o território»(102).

  OLIVEIRA, 1996 p. 206


(102)

90
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Com o fim da guerra civil entre liberais e absolutistas, a 26/05/1834, Mouzinho da


Silveira faz publicar uma ampla reforma que compreendia, nos seus aspectos essenciais:
abolição dos pequenos morgados, extinção dos impostos das dizímas, revogação dos foros,
censos e rações, reorganização das finanças públicas, da justiça e reforma administrativa.
Como objectivos fundamentais assumia os de «…criar as condições jurídico-institucionais
para que Portugal pudesse constituir-se num Estado moderno, onde uma burguesia
moderada e empreendedora pudesse, finalmente, substituir a aristocracia senhorial e as
estruturas do “Portugal Velho” do Antigo Regime»(103).
A reforma manteve praticamente o mesmo número de concelhos herdados do Antigo
Regime, mas construiu uma divisão político-administrativa a três níveis: a Província, as
Comarcas e os Concelhos. À frente de cada Província um Prefeito, na chefia das comarcas
um Subprefeito e em cada concelho um Provedor - autoridades nomeadas pelo Rei.
Funcionando junto das províncias, das comarcas e dos concelhos previa como escreveu
Marcello Caetano «…uma junta de cidadãos da confiança dos povos e por eles eleitos para
promover os seus interesses, vigiar no emprego dos cabedais públicos que aos magistrados
é confiado». Esses corpos administrativos eram: a Junta Geral de Província, a Junta da
Comarca e a Câmara Municipal do Concelho»(104).
Ao provedor do concelho estava destinada a exclusiva autoridade administrativa, com
uma série de funções: obedecer às directivas do prefeito e subprefeito, executar as delibe-
rações da Câmara Municipal, realizar operações do registo civil, exercer funções de polícia
e manutenção da ordem pública, superintendência das escolas, assegurar o recrutamento
de mancebos para o exército.
Em termos eleitorais, todas as eleições eram indirectas: «as freguesias nomeiam elei-
tores que elegem os vereadores componentes das câmaras municipais; estas procedem à
escolha dos procuradores que integram as juntas de comarca, as quais elegem de novo os
componentes das juntas gerais de província»(105).
No caso especifico das vereações, eram elegíveis para vereadores os cidadãos com ren-
dimentos anuais mínimos de 200.00 reis nas cidades e principais vilas e com 20.000 nos
restantes concelhos de menor dimensão. Pressupostos que tinham objectivos específicos,
designadamente, reduzir aos pequenos, médios e grandes proprietários rurais, comerciantes,
ou outros profissionais, normalmente letrados da capacidade para ser eleito vereador e
dessa forma servir de intermediário entre o nível local e o poder central.
Pela reforma judicial de 21/03/1835, estabeleceu-se nova Divisão Judiciária do Reino,
criando-se no Distrito de Coimbra vários Julgados. Midões tornou-se sede de um, de-
pendente do Tribunal da Relação do Porto, e abrangendo 18 concelhos, a saber: Ázere,
Bobadela, Candosa, Casal, Ervedal, Lagares, Lagos da Beira, Percelada, Lourosa, Midões,

(103)
  OLIVEIRA, 1996 p. 181
(104)
  ibid. p. 207
(105)
  ibid. p. 208

91
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Nogueira do Cravo, Oliveira do Hospital, Oliveirinha, Sanguinheda, Seixo do Ervedal,


Semide, Tábua e Vila Pouca da Beira. Pretendia-se a total separação de poderes, pelo que
estes concelhos, abrangendo uma extensa área, ficavam apenas com funções administrativas,
reservando-se ao julgado o foro judicial.
Por este decreto, Midões passou a pertencer à Beira Baixa, embora por pouco tempo,
pois a 07/08 do mesmo integraria a Beira Alta. Um pouco antes, pela lei que criou os
Governos Civis a 25/04/1835 e pelo decreto de 18/07 ficou ligado ao distrito de Coimbra
e à Província do Douro, o mesmo sucedendo com o concelho da Vila do Couto, então
a funcionar de forma precária ou inoperante, ligado a Candosa ou em vias de anexação
a Midões.
As leis Setembristas de 06 e 29/11/1836 extinguiram centenas de concelhos: Passos
Manuel suprimiu 455, a maioria dos quais onde não existia elite local ou de população
reduzida, caso de Ázere e Sinde, que como simples freguesias transitaram para o concelho
de Tábua no início de 1837.
Pelas referidas leis o todo nacional ficou dividido em 351 concelhos, enquanto Midões
ficou composto por 5 freguesias: Candosa, Covas, Midões, Oliveirinha e Póvoa de Midões.
Touriz, também por esta época se anexou a Midões, vinda da administração de Seia.
Com o Código Administrativo de 31/12/1836, de que ficou encarregue José da Silva
Passos, Portugal ficou com uma nova concepção político-administrativa: dividido em
distritos, concelhos e freguesias, tendo como magistrados administrativos o Administrador
Geral do Distrito, o Administrador do Concelho e o Regedor da Freguesia. Em sintonia
com estes órgãos individuais funcionavam os colectivos: a Junta Geral do Distrito, a
Câmara Municipal e a Junta de Paróquia. A escolha dos administradores do concelho e
dos regedores compreendiam um processo curioso: listas tríplices ou quíntuplas votada
directamente pelos eleitores entre os quais o governo escolhia aquele que melhor lhe
parecesse (ver tabela 8).
A experiência Setembrista conferiu maior autonomia e mais largas atribuições, e foi
de certa forma descentralizadora. Porém, esta tendência seria contrariada pouco depois
com medidas centralistas:
- Lei de 29/10/1840, que restringiu a capacidade eleitoral dos cidadãos e criou o
Conselho Municipal, formado pelos maiores e menores contribuintes-eleitores, en-
quanto o regedor de paróquia passou a ser um simples delegado do administrador
do concelho nomeado pelo rei;
- Código Administrativo e Cabralista de 18/03/1842, de espírito centralizador, con-
feriu grande intervenção dos maiores contribuintes na administração municipal. Foi
a consequência da resistência das comunidades locais à penetração do Estado, com
os protestos ocorridos com a abolição de muitos concelhos. Esteve em vigor 36 anos
até 01/01/1879.

Entretanto, e a nível judicial, criou-se a Comarca de Midões, a 28/11/1840, da qual


dependiam os concelhos de Avô, Midões, Oliveira do Hospital e Tábua. Nela funcionava

92
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

um tribunal da polícia correcional, cujos membros foram eleitos a 04/07/1841: os vo-


gais, Bernardo Joze Delgado (Vila de Midões), Alexandre de Souza Drago (Oliveirinha),
Francisco Augusto da Costa Amaral (Covas), Manoel Antonio d’Albuquerque (Candosa),
e os suplentes, Antonio Coelho (Midões) Joze da Rocha (Vila do Mato)(106).
No tempo de D. Maria II, operou-se nova remodelação judicial, cuja divisão con-
templou três áreas de análise: concelhos do Alto (Tábua incluído), concelhos do Centro
(Coimbra) e concelhos do Poente (Figueira). No Distrito de Coimbra, por diploma de
15/11/1841, criaram-se novos julgados com sede nas vilas de Avô, Coja, Oliveira do
Hospital Tábua, entre outras, reduzindo a área dos julgados de Midões e Arganil(107).
O concelho de Midões foi aumentando a sua área territorial e, pelo diploma de
18/03/1842 ficou constituído pelas freguesias de Midões, Póvoa, Candosa, Covas e
Oliverinha. O pequeno concelho da Candosa foi extinto, em 1842, e anexado ao de
Midões, onde se manteve até 31/12/1853, data em que este foi extinto, passando todo o
seu território para o Município de Tábua.
Com esta alteração o Juiz de Paz ou o Juiz de Direito passaram a ser designados para
o «Distrito» de Midões e Tábua, consequência da anexação, mantendo-se os respectivos
juramentos.

3. A ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DOS CONCELHOS DE MIDÕES E COUTO

3.1. A composição da vereação e a eleição das justiças

A área administrada pelos concelhos de Midões e Coito era considerável, na medida


em que, como se deduz da leitura dos livros de actas concelhios, a Póvoa integrava o termo
de Midões, e Vila do Mato o termo do Coito. No caso do concelho de Midões a sua área
territorial aumentou na sequência do diploma de 18/03/1842 que nele integrou para além
das freguesias de Midões e Póvoa, as da Candosa, Covas e Oliveirinha.
A partir dos diversos livros do extinto Concelho de Midões (vide foto 24) é possível
acompanhar a evolução da estrutura e composição da Câmara Municipal de 1687 até
1853, embora com alguns hiatos por falta de informações complementares (ver tabela A
– Magistraturas de Midões, 1687-1855 – Apêndice).
Assim, entre 1687 e 1834 a Câmara Municipal de Midões era constituída por um Juiz
Ordinário, dois Vereadores, um Procurador e um Escrivão, organização que no caso do
Concelho do Coito é idêntica para o período sobre o qual dispomos de dados (ver tabela 2).

  AMT – Livro de Actas, Sessões e Acórdãos da Câmara Municipal da Vila de Midões, 1841-1848, fl. 2v.
(106)

  BARATA, 2016, p. 11
(107)

93
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

TABELA 2 – Composição da Câmara Municipal do Coito, 1828-1835(108)


Data Juiz Ordinário Vereadores Procurador Escrivão (do público)
1828 Joze da Rocha Roque de Abrantes Luis Antonio Joze Fernandez Brito
Joam de Miranda Marques
1829 Domingos de Joze Francisco (Vila Manuel Ribeiro
Figueiredo Borges do Coito)
Roque de Figueiredo
(Vila do Mato)
Manoel Ferram Moço
(Vila do Mato)
Manoel Ribeiro (Vila
do Mato)
1830 Luis d’Oliveira e Antonio Ferrão Id.
Mello (Vila do Mato) Francisco da Fonceca Joaquim Lopes
Antonio da Costa (Vila do Mato,
(Vila do Mato) subs- nom. 23/01)
tituído a 3/12 por
Joze Calisto (Vila do
Mato)
Manoel Pinto
1831 Id. Joaquim Ribeiro Joze Borges Joze Fernandes
(Vila do Mato) de Brito (Vila do
João Pereira (Vila do Couto)
Mato)
1832 Manoel Joaquim Joao dos Santos Antonio da Costa Joze da Cunha
Borges (Vila do Coito Joze Pinto Abrantes
de Midões)
1833 Luis Antonio Joquim Antunes Joze Calisto Id.
Marques (Vila do Joze Martins Labia
Couto)
1834 Domingos de Joaquim de Paiva Francisco Ferrão Joze Antunes
Figueiredo Borges João Coelho
1835 Manoel Coelho Joaquim Bonifacio Joaquim de Paiva Francisco Soares de
Mosso (Vila do (Vila do Mato) (Vila do Mato) Mathos (Tapada)
Mato) Francisco Ferram
(Vila do Mato)

É de assinalar, em especial a actuação e âmbito de funções do juíz ordinário: eleito


anualmente pelo concelho de homens bons, de entre os vizinhos, nos termos previstos nas
Ordenações Filipinas, I, 67, para aplicar o direito no concelho. Era um oficial honorário,
não letrado, e que, em muitos casos, não sabia ler nem escrever. A partir do séc. XVII,
exigiu-se que o juiz soubesse ler.
Constituíam o corolário da autonomia concedida aos concelhos portugueses que, com
estes magistrados, continuavam independentes da justiça régia, não obstante terem de a
aplicar. Era da sua competência: a manutenção da segurança dos moradores do distrito e

  Fonte: AMT - Livro das Sessões da Câmara do Coito de Midões, 1828-1834


(108)

94
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

da ordem pública, o conhecimento dos feitos civis e criminais cometidos no concelho e


a defesa e o acatamento das leis concelhias e do reino.
O juiz ordinário, em delegação da comunidade, julgava em primeira instância e tinha
uma competência geral sobre todas as causas, com excepção das atribuídas a jurisdição
especial. Das decisões do juiz ordinário podia recorrer-se para a respetiva Relação.
A Constituição de 1822 manteve a existência de juízes ordinários (art. 180.º 181.º),
eleitos directamente pelos cidadãos do concelho e com a competência de julgar sem recurso
as causas cíveis de pequena importância e as criminais, em que se tratasse de delitos leves.
Em todas as causas, e nos termos da Constituição, procediam verbalmente, ouvindo as
partes e mandando reduzir o resultado a auto público.
O decreto n.º24, de 16 de maio de 1832, estipulava no seu art. 26.º que os juízes or-
dinários tinham competência para julgar causas de qualquer natureza que não excedessem
o valor de 12 mil réis em bens de raiz e 24 mil réis em móveis, e para fazer e determinar
todos os atos preparatórios dos processos cíveis e criminais, nos termos da lei
A partir de 1835 e até 1839 a Câmara Municipal de Midões passa a ser constituída
por um Presidente, um Vice-Presidente, Vereadores-efectivos e Vereadores substitutos, um
Procurador-Fiscal e um Escrivão. Nos últimos anos de actividade (1840-1853), mantém
o Presidente, Vice-Presidente (embora nem sempre designado), Vereadores e Procurador
Fiscal, passando a contar com um Secretário e um Tesoureiro.
A eleição das justiças concelhias de Midões e Coito (Juiz e Vereadores e Procurador)
obedecia a um ritual realizado nas Casas da Câmara, que se designava como «Auto de
abertura do peloiro». Tomemos o exemplo da eleição das justiças midonenses para ser-
virem no ano de 1827, realizada a 30/11/1826, em que a vereação cessante conduz o
processo: «…mandarão a sua presença a Arca aonde se metem as justiças e logo foi aberta
e nela [achouse] a pauta pequena onde nela aparecera para Juis do dito Aristides Ribeiro
Abranches desta vila e para vereadores Bernardo Anriques de Val de Gaios e Antonio
Pereira de Val de Coiso, e Procurador Manoel da Fonceca da Povoa como melhor consta
da pauta e de tudo para constar mandarão fazer este auto que asignarão».
A transcrição do auto de abertura de pelouros para 1828, realizado a 30/11/1827 será
ainda mais elucidativa do procedimento:
«Ahi abrimos a Arca dos Peloros e nela achamos dois bollos de sera e em hum estava a
Pauta Pequena que o seo theor he da forma e maneira seguinte = Poloro dos ofeciais das
Justiças que ande servir neste concelho de Midoens no anno de 1828 = 1829 (…) e não
se continha mais em a dita pauta que fielmente aqui copiada»(109).
Cada pauta era assinada pelo Corregedor da Comarca e os juramentos às novas justiças
ocorriam, por norma, no mês de Janeiro do ano da entrada em funções, e na presença do
juiz cessante. As justiças eram confirmadas pelo Bispo, como donatário da Vila.

  AMT – Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834.


(109)

95
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Nem sempre os designados assumiam as suas funções. Em pleno conflito entre liberais
e absolutistas, esta realidade tornava-se mais evidente por razões politicas. Em 1827, por
exemplo, foi designado para exercer a função de juiz, Aristides Ribeiro Abranches Castelo
Branco, que no entanto não chega a tomar posse e juramento, sendo substituído por José
Maria da Costa Veiga, em auto de eleição realizado a 18/12/1826 que no entanto não foi as-
sinado por todos, seguindo-se várias páginas riscadas até à sua posse definitiva a 01/01/1827.
As dissensões e tensões entre liberais e miguelistas assumem maior relevância com a
publicação da portaria régia de 23/07/1828, pelos Negócios da Justiça, levando à subs-
tituição do juiz ordinário eleito, Luis Cabral, por «suspecto na administração da justiça,
infiel, e pouco ou nada adido á cauza de El Rei Nosso Senhor» que é declarado inabilitado
ao exercício de funções e substituído por José Ramos, do Casal da Senhora, sendo também
substituído o procurador António de Brito por António Feliciano (da Vila de Midões)(110).
A Câmara Municipal de Midões reunia, também, periodicamente, para efectuar eleição
de importantes funcionários ou auxiliares da administração concelhia: almotacés (trimes-
tralmente), louvados, cobradores e recebedores da décima e do real do vinho, depositários,
fintadores. Elegiam, também, anualmente, o carcereiro para a cadeia, e um responsável
para tratar do relógio do concelho.
No caso da Câmara Municipal do Coito elegiam, da mesma forma que Midões, al-
motacés, louvados, avençais da décima.
No que respeita a Touriz, seria um pequeno concelho do Termo da Vila de Seia, que
nas primeiras décadas do séc. XIX nomeava anualmente dois recebedores de impostos da
Sisa e da Décima, à semelhança do que acontecia nas restantes aldeias do concelho. Pelas
referidas leis de 1836 Touriz transitou, provavelmente, de Seia para a freguesia e concelho
de Midões, pois a partir de 1835 deixa de constar nas actas da Câmara Municipal de Seia.
No Arquivo Municipal desta cidade guardam-se dois livros dessa época: um de Coimas
(1833-1835) e outro de Contas (1826-1836).

3.2. A relação com os poderes supramunicipais

Apesar de Midões ser sede de um concelho de considerável dimensão tendo, inclusiva-


mente, no seu termo a Póvoa de Midões, existiam laços de dependência administrativa e
jurisdicional com autoridades superiores. Retenha-se, por exemplo, o facto da expedição
e recepção da correspondência mais relevante ser feita através da Ouvidoria de Arganil e
Comarca da Guarda, sujeitando-se também, às correições mandadas executar pelo Bispo
Conde através dos seus Juízes Ouvidores – prática e posse antiquíssima confirmada por
portaria da relação do Porto de 07/12/1789(111).

  AMT – Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834


(110)

  AMT – Livro de Actas da Câmara Municipal de Midões, 1788-1792, fl. 10


(111)

96
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Terá sido aquela decisão judicial a razão pela qual a vereação midonense transcreve,
em 1789, nos livros do seu cartório, diversos documentos sobre o assunto sendo de
destacar: Carta de D. João III ao Bispo D. Jorge de Almeida, de 28/11/1527 e Carta de
D. Sebastião, de 07/06/1574 ao Bispo D. Manuel Dias de Meneses, ambas de idêntico teor,
confirmando a jurisdição cível e crime e concedendo o provimento por carta dos ofícios
de dois juízes e dois escrivães dos órfãos das terras e coutos que lhe pertencem; Carta de
D. Filipe II de 07/12/1628; Alvará da Rainha D.ª Maria, de 31/01/1785 atribuindo ao
Bispo Conde D. Francisco de Lemos de Faria Pereira Coutinho «prevelegio de nam entra-
rem a fazer correisam nas terras coutos e senhorios da Sua Mitra em que tem Jurisdiçam
Civel e Crime os corregedores das comarcas onde sam situadas as referidas terras coutos e
senhorios havendo somente deixado de gozar do dito Privilegio aquelles dos Bispos seus
antecessores, que suplicando-o vieram a fazer antes de serlhes concedido»(112).
Menos informações possuímos sobre o Concelho do Coito, mas que permitem perceber
que se integrava na Comarca de Arganil pelo menos entre 1828-1834.
Nos livros do concelho de Midões e do Coito encontramos também o reflexo da
evolução da política nacional, designadamente, a complexa implantação do liberalis-
mo, vintismo e constitucionalismo. Os avanços e recuos ficaram expressos nos autos de
juramento às correntes ideológicas emergentes redigidos na Casa da Câmara perante as
principais autoridades e famílias da região:
- A 31/07/1826: o auto de juramento à Carta Constitucional Portuguesa, outorgada
por D. Pedro IV, em que a vereação de Midões declara: «Juro comprir, e fazer comprir
e goardar a Carta Constituceonal decretada e dada pelo Senhor Dom Pedro Coarto
em 29 de Abril de 1826 para os Reinos de Portugal e Algarves e seos Domineos»(113).
O juramento seria deferido pelo vereador mais velho em exercicio, Jose Tomás, ao
Juiz Ordinário e aos oficiais da Câmara Municipal e militares da Companhia de
Ordenanças de Midões.
- A 07/05/1828: Auto de Aclamação a D. Miguel pela vereação do Coito, assitindo a
Nobreza, Clero e Povo, tendo ido em «procissão ate o Pilourinho desta Villa afim de
dar vivas ao Senhor na forma seguinte: Viva a nossa Santa Religião Catholica Romana.
Viva o Sñr Dom Miguel, Rey Absoluto de Portugal e seos Dominios, e Protector da
m.ª Sangta Religião. Viva a Familia Real; viva a Caza de Gragança. Vivão todos os
seos fieis vassalos»(114). Auto e atitude que motivam um requerimento de protesto
pela aclamação de D. Miguel, assinado pelo Bel. Julio Gomes da Silva presente e
trascrito na sessão seguinte, de 02/06, onde se recusa a assinar o auto «…porq.´por
elle se tirava a croa ao Sr. Dom Pedro . quarto noco Rei lejitimo e se lje outrugava
a Senhor D. Miguel a q.m não pertencia». Esta atitude leva a vereação coitense, no

(112)
  AMT – Livro de Actas da Câmara Municipal de Midões, 1788-1792, fls. 11-11v.
(113)
  AMT – Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834
(114)
  AMT – Livro das Sessões da Câmara Municipal do Coito, 1828-1834

97
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

dia 30/7, a relembrar o seu posicionamento de apoio a D. Miguel, decidindo formar,


inclusivamente, uma companhia de caçadores no âmbito dos corpos de voluntários
Realistas.
- A 02/07/1828: Auto de Aclamação de D. Miguel I, em plena época de triunfo abso-
lutista. Reunidas as autoridades concelhias, militares e religiosas na Casa da Câmara
do Coito estes «…averam por bem de aclamar ao Senhor D. Miguel Premeiro, por
Rei abesseluto de Portugal dando os vivas ao mesmo (…) Viva a Santa Relegião =
Viva o Senhor Dom Miguel Primeiro, Rei abesoluto de Portugal e seus domínios
= Viva a Caza ea Bragança e toda a Famelia Rial». Deram-se graças e cantou-se ao
altissimo, assistindo ao acto os comandantes de uma guarda de voluntários realistas.
Todos assinaram e foi escrivão Manoel Antunes d’Almeida, no impedimento do
escrivão da camara(115).
- A 29/12/1828: Auto de Câmara para se riscar os autos de aclamação a D. Pedro,
cumprindo o determinado no Real Aviso de 11/12 do mesmo ano, o que se fez
riscando-se várias folhas do livro de actas, tornando-as ilegíveis, entre as quais o auto
de aclamação a D. Pedro a 21/01/1827 (vide foto 25).
- A 03/08/1831, com o regresso de D. Pedro IV à Europa e levantada a questão da
sucessão e eminente intervenção estrangeira em solo português, a Câmara Municipal
de Midões reúne na Igreja Matriz, com assistência do Clero, Nobreza e Povo para
manifestar apoio à causa de D. João VI e dos absolutistas:
«A Camara por fim, e pelos povos que representa reconhece na Augusta pessoa de
Vossa Magestade seo legitimo cobrantto e senhor natural cujo direito de legitimidade se
devolveo na Augusta Pessoa de Vossa Magestade e armamento do Infante Senhor Dom
Joam Sexto Augusto Pay de Vossa Magestade = A Camara não reconhece nem pode re-
conhercer outra sobrania em Portugal e seos dominios (…) = A Camara declara não tem
ignorancia alguma na excolha»(116).
No mesmo sentido, mas a 04/09/1831, o Concelho do Coito em auto de «Camera
Geral» representa a fidelidade a D. Miguel: «..na Augusta Pessoa de V. Mag.e seo lejitimo
soberano e Sinhor natural cujo direito de legitimidade se devolveo na Auigusta Pessoa de
V. Mag.e ao momento da infausta morte do Sinhor Rei Dom João Seixto Augusto pai de
V. Mag.e» (…) A Camera muito espontaniamente offerece a V.M. as suas pessoas, bens
e vidas e suplica humildemente a V.ª M. para que no cazo de nececidade se digne fazela
antes passar pella mais sanguinulente guerra do que pertmottir que o sangue frio seja
intregue a elles lioens famintos com quem o inferno folga e Purtugal se horroriza»(117).
- A 01/05/1834, com a vitória liberal garantida, a Câmara Municipal de Midões
reconhece D.ª Maria como Rainha e D. Pedro como regente «…em favor da justa

(115)
  AMT – Livro das Sessões da Câmara Municipal do Coito, 1828-1834
(116)
  ibid.
(117)
  ibid. fls. 22v.-23

98
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

cauza da Liberdade e por comsequiencia da estabilidade do Trono» (vide foto 26).


Alguns dias depois, a 26/05, celebra-se novo auto de aclamação, nas Casas da Câmara,
na presença do Clero, Nobreza e Povo e do corregedor interino, Bernardo Coelho:
«…por elles foi unanimemente dito que reconhecião e aclamavam por sua legitima
Rainha a Senhora Donna Maria Segunda e a Carta Constecional que seo Augusto Pai o
Duque de Bragança Regente em nome da mesma sua Augusta Senhora generozamente
otorgara a nação portugueza»(118).

3.3. Os bens concelhios

No Arquivo Municipal de Tábua conservam-se vários livros do extinto Concelho de


Midões. Os mais relevantes são os de actas, de considerável âmbito cronológico, desde
1782 a 1853, cobrindo deste modo os últimos anos da sua actividade, excetuando os pe-
ríodos 1793-1825 e 1835-1837, que correspondem a épocas de grande agitação politico
social: no primeiro caso ao período das invasões francesas, no segundo ao pós guerra civil
entre liberais e absolutistas.
A série de livros do Concelho de Midões(119) compõe-se, também, de livro do Tombo
do Concelho, de receita e despesa, de autos e acordos, de posses e diplomas, e de recen-
seamento eleitoral. Quanto ao Concelho do Couto apenas se conservou um exemplar de
1828 a 1834.
No entanto, o livro mais antigo do Concelho de Midões é um Tombo dos bens conce-
lhios, tresladado a 15/10/1777 a partir do tombo antigo de 1687 que então se apresentava
em mau estado de conservação.
Esta cópia deve-se ao escrivão da Câmara Municipal de Midões, José Pedro, e através
dela conhecemos como foi conduzido o processo da feitura do tombo em 1687: super-
visionado por Agostinho de Oliveira Rebelo (Desembargador de Sua Majestade e da
Relação do Porto), que cumprindo as determinações régias, designadamente, a Provisão
Régia de 28/04/1684 se deslocou às comarcas da Província da Beira para proceder não
só aos tombos dos bens das respectivas câmaras (incluindo Midões, que o não tinha),
mas também ao ajuste dos cabeções das sizas. Da redacção do tombo ficou encarregue o
escrivão e tabelião publico judicial e notas na Vila de Midões, Antonio de Queirós, que
concluiu a tarefa a 30/08/1687.
O tombo de 1777 mostra-nos o conjunto de bens sob administração do Concelho
de Midões, sendo de destacar a Casa da Câmara Municipal, localizada na Praça da Vila
«donde esta o polourinho (…) a qual tem seu sobrado e logea com sua grade na porta da

  AMT – Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834


(118)

  É ainda de salientar que alguns destes livros se encontram em deficiente estado de conservação, pelo que
(119)

nem sempre se conseguiu extrair toda a informação neles contida

99
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

logea e fixadura mourisca e dous bancos no sobrado e mesa e se da de tres asentos»(120). A


parte de cima da casa servia «de Camera e Casa do Concelho das Audiencias», enquanto
no restante espaço funcionava a Cadeia e a Roda (vide foto 27).
A Câmara Municipal de Midões tinha sob sua administração a manutenção de 4
fontes: uma junto ao adro da igreja da Vila «…a qual está no caminho com seu arco e
tanque piqueno pela parte de baixo pera as bestas beberem e outro mayor mais abaixo que
serve de lavar roupa desta Villa e Concelho»; a fonte chamada «da Cal», junto às casas de
Nicolão Ribeiro «tambem de arco com seus assentos a pé e pera os cantaros»; outra fonte
chamada «do Paço», junto à terra de D. Maria «que nam tem arco»; e um chafariz que
fora antigamente fonte, «no fim e cabo desta villa pella parte do meyo dia e nasce para o
poente em huma carreira».(121)
Ainda no domínio dos bens imóveis pertenciam ao município midonense dois currais
e uma terra. Um curral localizava-se na entrada da Vila e «sitio do Lourinho no Cimo da
Suenga», servindo para guardar o «gado que se achava nos Coutos». O outro curral ficava
na entrada do lugar da Póvoa «com sua testada e rocio» e nele se recolhia o «gado que se
acha e emcoumado e acoymava»(122).
O referido terreno situava-se junto ao Rio Mondego e era conhecido como «Terra do
Olo». Estava, inicialmente, assinalada «com cruzes em penedos nativos a que os offeciais
da Camera em muitos annos hirem fazer correiçoens e avivar as ditas cruzes»(123), mas por
decisão do desembargador as cruzes foram substituídas por 11 marcos assinalados com
C.C.º aquando da demarcação da mesma efectuada a 25/08/1687.
Á guarda dos vereadores reunia-se, também, um conjunto de bens móveis, os pesos e
medidas: 6 medidas de cobre (uma de medir vinho e cinco de medir azeite), duas medidas
de cobre pequenas, um cabaço de ferro «de maquiar», vários pesos de ferro, meias arrobas
de ferro, peças de ferro, duas balanças «de pezar carne», oito pelas de ferro «entre alguns
collares e assim mais o eyxo das bellanças de pezar ouro com sua queixa», um pico e uma
cunha de ferro, uma craveira de ferro «de aferir varas de medir pano e côvados» e uma
mordaça e um colar.
Existe outro Tombo do Concelho de Midões, datado de 1850. Com apenas 3 folhas
preenchidas este livro serviu de inventário dos livros que pertenceram ao antigo cartório
concelhio(124).
Quanto ao Concelho do Coito não se conservaram livros de inventário de bens con-
celhios. O que sabemos, extrai-se do livro de actas de 1828-34, pelo qual ficamos a saber
que esta pequena municipalidade tinha como bens próprios: as casas da câmara, a cadeia

(120)
  AMT - Tombo dos Bens do Concelho de Midões, 1777, fl. 4v.
(121)
  ibid. fl. 5
(122)
  ibid. fl. 5v.
(123)
  ibid. fl. 6
(124)
  AMT – Tombo do Concelho de Midões, 1850

100
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

(lançando-se em Março de 1830 uma finta para que fosse composta), um lameiro em Vila
do Mato que arrendava anualmente, e um açouge onde cobrava direitos sobre a carne
transaccionada.A Casa da Câmara da extinta Vila do Coito foi arrematada a 31/05/1840
por José de Mendonça, da Vila de Midões, pelo valor de 240 reis(125).
A 30/12/1841, e para acudir às despesas necessárias aos reparos do edifício da Câmara
Municipal de Midões, foram arrematados, nas Casas das Sessões da Vila de Midões, com
pregões na Rua Pública e autorização do Conselho de Distrito, os bens dos extintos con-
celhos, designadamente, as Casas das Cadeias das extintas Vilas de: Candosa por 20.000
reis a D. Mariana Cândida; Percelada, por 20.000 reis a Bartolomeu da Costa Ornelas,
do mesmo lugar; de Oliveirinha, por 35.000 reis, a Francisco de Paulo, do Vinhal; do
Coito, por 12.000 reis, a António Soares, de Midões, por 12.000 reis. Também se vendeu
o lameiro sito à Lavandeira, limite do lugar da Vila do Mato, ao Visconde de Midões,
por 48.000 reis(126).
Os baldios municipais foram também rentabilizados. A 25/02/1849 a vereação decide
aforar ou arrendar todos os terrenos baldios, o que se vem a concretizar nos meses seguin-
tes: a 06/05/1849 afora o baldio sito As Eiras, a Bernardo do Couto, da extinta Vila de
Oliveirinha por 820 reis; a 31/05/1849, emprazando a José Tavares, da Percelada metade
do terreno baldio pegado à praça do concelho daquele povo, por 200 reis anuais (127)
Mais tarde, pela lei de 26 de Julho de 1850, os baldios foram classificados em paroquiais
e municipais. Nesse sentido, a edilidade midonense decide, a 06/02/1851 emprazar um
terreno baldio, próximo ao Rio Mondego «sito à Curtinha», a António Alexandre Roiz e
sua mulher, Maria Nunes Martins, do lugar da Póvoa, pelo foro anual de 4800 reis, tendo
a escritura sido firmada a 27/01/1852(128).

3.4. Administrar em prol dos interesses colectivos

A actividade e autonomia do Concelho de Midões era extensa, como se infere da aná-


lise dos seus livros de actas, autos e acordos: registo dos autos de eleição dos seus oficiais,
louvados e almotacés e outros funcionários, autos de nomeação e juramento, cobrança e
arrematação de impostos, transcrição de petições, registo da eleição dos oficiais da compa-
nhia de ordenanças, acordão sobre gado, nomeação de médico e de comissões, entre outras.
A análise das actas da Câmara Municipal do Concelho de Midões desde 1788 atè à
sua extinção evidencia a preocupação das autoridades (vereações) pela gestão do território

(125)
  AMT – Livro das Actas das Sessões e Acórdãos da Câmara Municipal de Midões, 1839-1840, fl. 25
(126)
  AMT – Livro das Actas, Sessões e Acordãos da Câmara Municipal da Vila de Midões, 1841-1848
(127)
  AMT – Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fls. 9, 12
(128)
  ibid. fls. 109-111v.

101
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

sob sua administração. Seguiam a lei geral, transcrevendo e cumprindo ordens, portarias
e provisões.
Na transcrição de leis ou ordens emanadas do próprio rei destacam-se as cartas que
definiam o monopólio na venda de certas mercadorias:
- Privilégio do tabaco, também designada como « Prevelejios dos Estouques» que
D. João passou a requerimento dos contratadores gerais da comercialização daque-
la cultura. A 20/04/1819 foi confirmado na função, por Pedro Vaz de Carvalho,
Administrador da Comarca da Guarda. António Agostinho, da Vila de Midões,
gozando das isenções liberdades e privilégios que recaíam sobre os contratadores:
escusos dos encargos do concelho, como fintas para pontes, bem como da procissão
do Corpo de Deus(129).
A 04/04/1829 foram eleitos pela vereação o Estanqueiro do Tabaco ao miúdo para
Midões (Francisco Fernandes) e para a Póvoa (António Rodrigues Canastreiro). A partir
de 1831, o estanqueiro passa a acumular a responsabilidade de fornecer o tabaco, papel,
sabão e papel selado.
- Privilégio de estanqueiro de roupa e sabão, sendo eleito a 31/01/1828 José Ramos,
do Casal da Senhora.
No caso do Concelho do Coito, e apesar de só possuirmos informações para um tempo
limitado (1828-1834), temos também a nomeação de Estaqueiro de Tabaco a 11/8/1830,
deferindo-se a pretensão de José da Rocha, do mesmo lugar e concelho. Eleito de acordo
com a «capasidade e bens que pessue» e pelo facto do concelho apesar de ter mais de 90
fogos «se acha sem estanque de tabaco», quando a lei determina que toda a povoação com
mais de 60 moradores tenha estanque»(130).
A lei local era baseada em usos e costumes, os quais afloram nas actas municipais atra-
vés de autos de câmara sobre matérias específícas como coimas que recaíam sobre gados
(Fevereiro de 1790, Fevereiro de 1834), nomeando-se coimeiros para os diversos lugares do
concelho que anotavam as infracções em livros de coimas, dos quais não encontrámos rasto.
Também era atribuição concelhia regular e taxar os géneros agrícolas vendidos no concelho.
Midões terá tido, à semelhança de outros concelhos da sua importância político-
-administrativa um Código de Posturas, eventualmente um livro próprio, através do
qual decidia em matérias da sua competência. É vestígio desse esforço de codificação as
posturas aprovadas a 07/05/1838 sobre pesca e caça, caminhos públicos, matas e árvores
públicas e, a 01/02/1845 sobre a venda do vinho.
Porém, o conjunto de posturas mais bem elaborado, com instruções para os zeladores e
juízes eleitos foi aprovado pela Câmara Municipal de Midões a 17/02/1850 e remetido com
urgência para o Conselho de Distrito tendo em vista a sua aprovação (vide Apêndice, Tabela
B). Estas posturas compunham-se de 5 títulos: o primeiro com disposições relativas à repressão

  AMT – Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834


(129)

  AMT – Livro das Sessões da Camara do Coito de Midões, 1828-1834, fl. 14


(130)

102
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

do dano causado por animais; o segundo com disposições sobre o dano causada por homens
(extenso e composto por 20 artigos), o terceiro relativo à policia das estradas e aquedutos
públicos, o quarto sobre a polícia de fontes e saúde pública e quinto com disposições gerais.
A este código se anexou um capítulo com instruções para zeladores (composto por
11 artigos) e um título com instruções para os juízes eleitos (composto por 13 artigos).
As finanças municipais foram uma fonte de permanente preocupação para as vereações,
dado que não raras vezes as despesas superavam as receitas. Antes dos Códigos de Passos
Manuel (1836) e Costa Cabral (1842), as receitas municipais provinham de rendimentos de
forais concelhios, multas e coimas (directamente ou através de rendeiros) ou rendas de porta-
gens. Escassos rendimentos que raramente davam para fazer face às despesas, as quais tendiam
a aumentar com gastos extraordinários resultantes da presença de destacamentos militares.
O recurso aos sobejos das sisas, tributo central deixado pelo Antigo Regime, tornou-
-se frequente e importante pela grande liberdade concedida às Câmaras Municipais na
sua execução.
A partir de 1834, a extinção de vínculos, alcavalas e sisas gerais motivou protestos
dos concelhos deixando-os quase na asfixia financeira. Para suprir estes desequilíbrios e
dada a urgência de verbas, os órgãos camarários apenas podiam recorrer ao lançamento
de tributos directos, as fintas ou derramas.
Entre os principais impostos lançados pelos municípios durante o séc. XIX devemos
destacar: contribuição municipal (imposto directo, lançado sobre os proprietários em fun-
ção dos valores da contribuição predial e industrial), derramas, real do vinho, da jeropiga
e aguardente, real da água, impostos sobre ocupações de terrenos públicos, mercados e
feiras. No entanto, os subsídios oficiais (Estado e Distrito) constituíam a maior fatia das
receitas das câmaras.
O Código de 1842 procurou impor alguma ordem no complexo problema das finanças,
regulamentando os orçamentos dos concelhos e criando mecanismos de controlo da sua
execução. As Câmaras Municipais continuaram com a autorização de lançamento de con-
tribuições directas e indirectas, sendo as primeiras proporcionais à décima da contribuição
predial paga pelos contribuintes. As contas eram analisadas pelos conselhos do distrito e
aprovados pelas CM e Conselhos municipais depois de propostos pelo presidente. Porém,
as Câmaras Municipais não prestavam contas regularmente e por vezes os mapas iludiam
as determinações da lei, ocultando ou resumindo informações.
Da realidade acima mencionada encontramos ecos nos livros do extinto concelho
de Midões. A 14/04/1839 e na presença de dois homens de cada freguesia, a Câmara
Municipal de Midões acorda em derramar pelos habitantes do concelho 177.910 reis
«…para satisfazer ás dispexas deste concelho, visto que a receita do mesmo não chega»,
declarando não assumir as dividas antigas do concelho pois «…entravão na duvida dellas,
da sua veracidade, e attendendo á pobreza deste concelho»(131).

  AMT – Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834, fl.33


(131)

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Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

No mesmo sentido, devido à pobreza do concelho e às fintas anualmente lançadas sobre


os seus habitantes, é de referir o protesto de três habitantes da Vila de Midões, lançado
na acta do dia 10/05/1840, contra os 20.000 reis definidos no Decreto de 15/11/1836
(artº15), pagos pelo município aos mestres de primeiras letras da Candosa, Covas e
Oliveirinha(132).
Nas despesas anuais, a CM Midões tinha ainda de dispor de verbas para suportar os
imóveis em que funcionava a Administração do Concelho e o Tribunal e, a partir de 1850,
a própria vereação, por impossibilidade de reunir nos antigos paços do concelho. Para
minorar os custos procurou rentabilizar alguns bens concelhios: aforando terras (Lameiro
do Concelho e Lameiro em Vila do Mato) e o assento em que se realizava a feira, ou ar-
rematando, no final do ano, a azeitona dos seus olivais, sitos no adro, no Olo, e junto ao
Mondego - em Dezembro de 1840, entregou o ramo a Manuel Madeira da Fonseca, da
Póvoa. Outras fontes de receita advinham das infracções cometidas ao Código de Posturas.
No orçamento aprovado pela Câmara Municipal de Midões para 1847-1848 é evidente
a dificuldade de gerir o município em termos financeiros: as despesas atingem os 573$349,
a receita fica-se pelos 154$750, de que resulta um déficit de 418$599, que a vereação espera
liquidar com contribuição lançada aos povos do concelho. Para uma melhor elucidação
do destino das receitas e despesas veja-se a tabela abaixo:

Tabela 3 – Orçamento da Câmara Municipal de Midões, 1847-1848(133)


Despesa Valor Receita Valor
Administrador do Concelho 30$000 Foros 4$770
Secretário da Administração 30$000 Feira 4$800
Expediente para Administração 4$000 Coimas 4$880
Casa para Administração 9$600 Aferimentos $300
Oficial de Diligências da Administração 6$000 Real imposto do vinho 140$000
Secretário da Câmara 35$000 TOTAL 154$750
Expediente para a Câmara 3$400
Livros para a Câmara 1$640
Oficial da Câmara 6$000
Encarregado do Relógio 6$000
Professor de Primeiras Letras 20$000
Quota para Expostos 338$351
Contribuição para a Universidade 5$542
Terça Nacional 4$916
Casa para o Tribunal 9$600
Festividade de Corpo de Deus 2$900
(cont. na página 113)

  AMT – Livro das Actas das Sessões e Acórdãos da Câmara Municipal de Midões, 1839-1840, fl. 24
(132)

  AMT – Livro de Actas, Sessões e Acórdãos da Câmara Municipal da Vila de Midões, 1841-1848, fls. 100-100v.
(133)

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Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

FOTO 17 - A casa mais antiga de Midões, segundo a tradição popular

FOTO 18 - Testamento de D. Muna, doando Midões e Touriz ao Mosteiro de Lorvão, 951-955 [ANTT Ordem de Cister,
Mosteiro de Lorvão, Antiga colecção especial, mc 1 n.º 5]

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Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 19 - Testamento de D. Muna doando ao Mosteiro de Lorvão Midões e Touriz, 951-955 [ ANTT - Livro Preto da Sé de Coimbra, fls. 27 e 27v

FOTO 21 - Capela dos Ferreiros, Estátua Jacente de Domingos Joanes

FOTO 20 - Capela dos Ferreiros, Matriz de Oliveira do Hospital. Retábulo


de Nossa Senhora com o menino FOTO 22 - Capela dos Ferreiros, Estátua Jacente de Domingas Sabachais

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Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

FOTO 24 - Lombadas dos Livros do Concelho Midões (AMT).

FOTO 23 - Foral Manuelino de Midões, 12.09.1514 [ANTT - Leitura Nova, FOTO 25 - Livro de Acordãos e Autos da CM Midões, 1836-1834,
Livro de Forais Novos da Beira, fl. 42v.] riscado pelos miguelistas (AMT)

FOTO 26 - Auto da CM Midões reconhecendo D. Maria como rainha e D Pedro como regente 01.05.1844 (AMT)

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Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 27 - Antiga Casa da Câmara Municipal de Midões

FOTO 28 - R
 epresentação popular contra a extinção do Concelho de Midões,
assinaturas, 1854 (AUC)

FOTO 29 - Livros da Junta de Paróquia de Midões

FOTO 28 - Representação popular contra a extinção do Concelho de Midões,


1854 (AUC). FOTO 30 - Livros da Junta de Paróquia de Midões

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FOTO 31 - Uma das entradas na Vila de Midões, postal de princípios séc. XX
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 32 - Escola de Touriz, 1931 FOTO 33 - Escola Primária de de Touriz na actualidade

FOTO 36 - Escola Primária Oficial de Midões,1944 FOTO 34 - Escola Primária de Midões na actualidade

FOTO 35 - Escola Primária de Midões. Notícia da sua inauguração e homenagem ao Dr. Henrique de Almeida (Comarca de Arganil, 23.11.1937)

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Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

FOTO 37 - Notícia da inauguração da Escola de Vila do Mato,


Comarca de Arganil, 07.03.1947 FOTO 38 - Escola Primária de Vila do Mato na actualidade

FOTO 39 - Centro de Recreio e Convívio de Midões e em primeiro plano a antiga sede da freguesia

FOTO 40 - Perspectiva do Parque Desportivo de Touriz

FOTO 41 - Salão Municipal de Desportos

111
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 42 - Centro Social Caeiro da Matta, Midões

FOTO 43 - Sede administrativa da Freguesia de Midões

FOTO 44 - Centro de Actividades Juvenis de Midões

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Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Despesa Valor Receita Valor


Quotas prováveis de 2% ao tesoureiro 8$000
Concertos na cadeira, relógio e outras despesas 6$000
não classificadas
Reparo das calçadas de Midões, Esporão, Fonte 46$400
do Casal e Caminho das Agoas Ferrias
TOTAL 573$349

A cobrança de impostos ocupava grande parte das reuniões dos executivos municipais.
O imposto do rial do vinho, destinado às obras públicas, era arrendado pelos concelhos
em autos de arrematação pública realizados, por norma, nos inícios de Janeiro, ficando
as verbas ao cuidado de depositário e recebedor; um em Midões e outro na Póvoa. Em
1827, por exemplo, foi arrendado o imposto de Midões, na praça pública, a Antonio
Brandão, serralheiro, por 50.420 reis e o da Póvoa Junto à porta de Manoel Madeira, do
lugar, «aonde se costumão fazer as arramatacoens», por Agostinho da Fonceca, do lugar
por 12.000 reis, metade pagos no acto e a outra pelo S. João(134).
Em Novembro de 1826, e para evitar os abusos e prejuizos públicos resultantes da
cobrança deste imposto, o município de Midões nomeou uma Comissão de Administração
do mesmo, composta por Francisco Rodrigues Brandão (Secretário) e os «Deputados» Joze
Maria da Costa Veiga e Antonio Nunes. Esta comissão, na sequência da obtenção de um
relógio de torre para o concelho, vem a revogar parte do regulamento, nomeadamente o
art.º 5.º, após autorização do Corregedor da Comarca para que se pagasse a um homem
«encarregado de dar corda ao mesmo relogio e vigiar sobre a sua conservação lhe pondo
aceite as molas do mesmo e cuidar em que elle esteja bem regolado», vencendo anualmente
10.000 reis anuais, pagos do Cabeção das Sizas do concelho, tendo eleito para tal função
Joaquim Joze Lemos, da Vila de Midões(135).
Os taberneiros estavam, também, obrigados ao pagamento de direitos sobre o vinho
que vendiam, depois de apresentarem às autoridades concelhias os manifestos do vinho.
Outro imposto muito relevante era a décima, que incidia sobre o rendimento, e que pres-
suponha a nomeação de avençais, fintadores, aferidores e cobradores nos vários lugares
que compunham o concelho.
A questão extremamente sensível dos pesos e medidas, conduz a dois autos sobre pa-
drões, realizados em Outubro de 1788 na presença da gente nobre da Vila o que reflecte
a importância do momento(136). A 07 do dito mês, reunida a CM de Midões, a vereação

(134)
  AMT - Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834
(135)
  AMT – Tombo do Concelho de Midões, 1850
(136)
  Neste acto marcou presença a gente nobre de Midões: Roque Ribeiro de Abranches Castel-Branco, Sebastião
Tavares de Albuquerque Fereire Castel-Branco e Joaquim José Monteiro Cabral; o Capitão Manuel da Fonseca
Magalhães (todos desta Vila); e o Dr. Manuel da Cunha e Gouveia e o Alferes Antão Antunes Martins «ambos
do lugar da Póvoa deste termo».

113
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

acorda em que se estabelecesse no concelho um padrão «…para todas as medidas tanto


de raza como de liquido, que vem a ser para medir grão vinho e azeite»(137).
No referido auto ordena-se que a medida de azeite seja aferida pelo alqueire de cobre
utilizado pela D. Teresa Leonor de Vasconcelos, da Vila, que era a medida conforme aos
meios alqueires que corriam na maior parte do concelho. Para tal fim ordenam também
que se mandem fazer novos instrumentos de medida: um cântaro de cobre, aferido pelo
quartilho concelhio «em modo que levase bem o certo 15 dos ditos quartilhos para servir
de pedram par quarta de medir»; uma medida de meio alqueire para medir os cereais, em
madeira, com ferro pelos lados, a ser aferida pela medida dos aferidores Manuel Francisco
e Miguel Ferrão, ambos carpinteiros do lugar da Póvoa, e que vem sendo utilizada também
pelo rendeiro José Paulo, da Vila de Midões, nos frutos da renda de que é administrador;
«hum razoilo» de madeira.
A estas novas medidas, a vereação determina que se lhe coloquem as insígnias munici-
pais - «…em lugar competente huma marca de ferro para a todo o tempo serem conhecidas
a qual marca será a letra M. e a era por algarismo»(138) - e que os padrões estivessem na
mão do aferidor eleito pela Câmara, ficando obrigados todos os moradores do concelho
a aferirem por eles suas medidas, sob pena de 500 reis. Os próprios pesos e medidas uti-
lizadas eram aferidas regularmente pelo município.
Já depois da anexação por Midões de vários concelhos, acordou-se, na sessão de
13/02/1850, que as medidas utilizadas em cada um deles fossem respeitadas, proibindo-se
e advertindo-se os habitantes: «…não podem usar das medidas dos concelhos anexados
se não para receber foros ou penções antigas que aquele que uzasse dellas para outro fim
ficara sujeito as penas impostas aos que vendem por medidas falças na Ordenação»(139).
Num tempo de incipiente assistência médica os esforços concelhios centravam-se na
existência de um partido médico que assistisse nas enfermidades. De acordo com os registos
paroquiais setecentistas, o partido de médico na Vila existiu pelo menos entre 1779-1792,
sendo desempenhado pelo Dr. António Correia Borges.
Nesse sentido, representou a Câmara, Nobreza e Povo de Midões a D. Maria, em 1788,
para que continuasse a dispor de médico na Vila de Midões, uma vez que corriam risco
de o perder por serem pagos pelos sobejos da finta para o Cabeção das Sisas, que naquele
ano se tornaram exíguos.
Ao pedido foi sensível a rainha, que por Provisão de 23/09/1788 (Lisboa) decidiu: «Hey
por bem fazer aos suplicantes mercê de que possão acrecentar mais a quantia de 40.000
reis de partido annual ao que ja tem de outra tanta quantia por Provizão para o Medico

(137)
  AMT – Livro de Actas da Câmara Municipal de Midões, 1788-1792, fl. 5
(138)
  ibid. fl. 5v.
(139)
  AMT – Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fl. 21v.

114
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

de que tractão os quaes lhe serão pagos na mesma forma que lhe pago o referido primeiro
Partido e será obrigado o dito Medico a curar os Pobres da dita Villa e termo de graça»(140).
Em consequência, a 17/01/1792 apresentou-se em Midões após nomeação por carta
régia, o cirurgião José Gomes Tavares, filho de Manuel Gomes, natural dos Fiais, termo
da Vila do Ervedal, Comarca da Guarda(141).
A 05/04/1827 desempenhava funções como médico do partido, António Correia
Borges. Então com 85 anos, o povo representa superiormente a «inabilidade» em desem-
penhar as suas funções, também ele doente havia quatro meses e impossibilitado de sair
de casa. A Câmara Municipal de Midões, após parecer do Bacharel José Maria Lemos,
decide aposentá-lo com metade do ordenado (100.000 reis) levando em consideração o
«munto que debe a este Medico», colocando o lugar a concurso. No entanto, o médico
recorre da decisão superiormente e a 14/04/1828 a CMM é obrigada a restituí-lo à posse do
Partido Médico de Midões em virtude de ordem do Desembargo do Paço, de 13/03/1828
remetida pelo corregedor da comarca(142).
A avaliar pelo abaixo assinado dos moradores do concelho presente na sessão de câ-
mara a 22/05/1834, a assistência do médico do partido era inexistente, por estar vago o
lugar, acarretando graves consequências: «…com gravissimo prejuízo athe com a morte de
mais de sincoenta moradores mortos desgracadamente deserto por falta de assistência de
hum medico como he publico e notório achando-se mesmo agora muntos enfermos que
deserto morrerão se lhe não acodirem sendolhe empocivel por sua pobreza o chamarem
outro medico de fora»(143).A municipalidade decide aceitar a indicação do povo, nomeando
naquele dia para médico do partido o Bel. João Duarte de Almeida, médico da Câmara
Municipal de Oliveira do Conde, por saberem que deseja ocupar o lugar vago.
A 06/01/1838 o município midonense decide criar um Partido de Cirurgião, com
ordenado de 100.000 reis, nomeando João Pais da Cunha com as seguintes condições:
residir na Vila de Midões e não poder demorar-se fora dela mais do que 3 dias, socorrer
os pobres de graça, atender ao Domingo quem necessitasse sem custos levando durante
os outros dias 40 reis por receita.
Se as consultas fossem na Vila cobraria 120 reis «…e o mesmo no Casal, esporão,
Santo Amaro e Touriz, enquanto em Vil do Mato e da Póvoa ,Ribeira e Val da Taipa, 200
reis, e Val de Gaios 240, Vargia e Candoza e Persellada 400 rs; Covas e Balocas 240, «…e
levara de todas as vezitas do Rio de Cavalos e ribelas para alem de 300 reis e sendo de
noite o dobro e sendo nececario fazer alguma operação devera levar aquilo que se ajustar
com os doentes»(144).

(140)
  AMT – Livro de Actas da Câmara Municipal de Midões, 1788-1792, fl. 8v.
(141)
  ibid. fls. 46v.-47
(142)
  AMT - Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834; Livro de Registo de Leis e Ordens do
Concelho de Midões, 1827-1829
(143)
  AMT - Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834
(144)
 AMT – Livro das sessões e acordãos da Câmara Municipal de Midões, 1838-1839, fls. 2v.-3

115
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Daqui em diante a evolução do partido médico de Midões é feita de avanços e recuos,


avultando pouca informação até meados do século. De facto, a 17/02/1850 a munici-
palidade pede autorização ao Conselho de Distrito para a sua criação com ordenado de
200.000 reis(145). Este manda ouvir a CM Midões e o Conselho Municipal sobre o assunto
órgãos que já se haviam pronunciando anteriormente. Reunindo a 05/05 enviam exposição
conjunta ao Conselho do Distrito, de desagravo com a actuação das autoridades distritais
na qual fazem um diagnóstico da situação assistencial em meado do século:
«…os povos todos os dias reclamão a vinda do Medico, mostrandosse sumamente
indignados com a repugnancia que á muito o mesmo Ex.mo Conselho tem mostrado
na criação do dito Partido que a saude dos povos e com especialidade a clace desvalida
e indegente reclama, visto que todos os dias se veem morrer a mao de barbeiros pessoas
que depois se cunhece serem victimas da brutalidade e ignorancia destes charlateis»(146).
Tendo aquele conselho distrital levantado dúvidas acerca da competência da criação
do partido médico, a municipalidade recorda a Portaria do Ministério do Reino de
26/01/1846, lembrando a urgência que tal assunto revestia para a região dados os «muitos
casos de mortes dezastrozas acontecidas por falta de assistência do Medico».
A 22/07/1850 o Conselho de Distrito aprova a criação «do Partido de Medecina»
com ordenado anual de 100.000 reis «com o pulço livre e obrigação de o medico tratar
os pobres de graça». Reagem os habitantes de Midões, que marcam presença reunião
municipal de 30/03/1851, alegando que «como acontecia estar a propriadade deste con-
celho acomolada em poucos indevidu-os e o resto dos abitantes serem pobríssimos veio
a rezultar ser o partido criado com o pulço cativo apezar de ter o titulo de pulço livrem
e em ultimo rezultado não aver pertendente algum ao dito Partido apezar de ter estado
sempre a concurso»(147).
Por este motivo requereram que o ordenado fosse elevado a 150.000 reis nas condições
seguintes: «…com o pulço livre para os propiatarios e pessoas que pela sua industria ou offi-
cios podessem pagar as vezitas e captivo para os pobres que pela sua pobresa documentada
por certidão de parochos ou regedores aprezentada ao medico mostrarem a impossiblidade
de lhes pagarem». Requerimento que a municipalidade subscreve, solicitando autorização
para o Conselho de Distrito.
A 14/09/1851, prevendo-se para breve o provimento do partido de médico, a vereação
aprova a tabela com os salários relativos às visitas que fossem necessárias aos povos: por
cada visita em qualquer ponto do concelho - 120 reis; por cada resposta ou informação
- 120; «E fora de caza acrecerá o caminho que será na Villa, Vasco e Coito» - 120; nos
Casais e Cazal da Senhora - 240; na Póvoa, Vil do Mato, Val de Gaios e Ribeira - 360;

(145)
  AMT – Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fl. 22v.
(146)
  AMT – Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fl. 47v.
(147)
  ibid. fl. 64v.

116
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Val de Taipa e S. Geraldo - 480; Varzia e Villa Cham – 600; Candoza e Perselada – 720;
Oliveirinha, Covas e Loureiro – 720; outros casais de Covas – 800(148).
Ficavam isentos de pagar os que não tivessem meios de subsistência justificados por
atestado do pároco da freguesia. Aqueles valores seriam revistos na sessão seguinte de 25/09,
numa reforma que reviu em baixa os valores atribuídos para Varzia e Vila Chã (480 reis),
Val de Taipa e S. Geraldo (360) Covas, Candosa, Perselada e Oliveirinha (600).
Num espaço muito curto a vereação midonense, então dominada por João Brandão,
nomeia, por unanimidade, dois médicos para o partido de medicina de Midões: a
20/07/1852, o Bel. Bernardo d’Abreu Mesquita, formado na UC, natural de «Villacova
sobre Avô», em atenção às boas informações e deliberação do Conselho de Distrito; e, a
06/09 nomeia por unanimidade o Dr. António Abílio Gomes Costa, de Santo Amaro,
sujeitando-o às cláusulas acordadas nas sessoes de 14/09/1851 e 30/03/1851(149), o qual
desempenha a função pelo menos até 1853.
A assistência aos desvalidos era da competência do concelho que suportava a existên-
cia de uma Roda dos Expostos, que funcionava, de acordo com o Tombo de 1777 nas
Casas da Câmara. Porém, em 1831 funcionava na casa de Ignacia, viúva de Bernardo da
Fonceca, acordando a vereação a 05/04 que a Roda dos Expostos fosse transferida para a
casa de Juliana Rita, mulher de António Tavares, da Vila de Midoes, nomeando-a para o
«inprego de rodeira», com o vencimento anual e «costumado» de 6.000 reis. Em Abril de
1839 a vereação confirma-a como rodeira, com ordenado anual de 3200 reis, mantendo-
-se como rodeira de transição já depois do Regulamento de 20/12/1844. Esta rodeira seria
substituída a 14/06/1850 por Maria de Oliveira, designando-se como ama de leite Ana de
Oliveira, ambas da Vila de Midões «…ficando uma e outra obrigadas a prestar as suas cazas
de habitação para o estabelecimento da Roda», ficando por determinar os vencimentos
por não se terem recebido os regulamentos e instruções sobre a «criação dos expostos» (150).
Conservaram-se pelo menos dois livros com a matrícula (relação) dos expostos do
termo de Midões que cobrem um considerável âmbito cronológico, de 1803 a 1849.
O primeiro, abrange o período de 24/04/1802 a 19/05/1845, exceptuando-se o ano de
1844 sobre o qual não existem registos. Naquele período foram expostas na roda 96 crian-
ças, oriundas de vários pontos do concelho de Midões, a primeira das quais uma criança
com o nome de José, a 24/04/1802, que saiu da criação a 30/07/1810 e teve como ama
Joana Maria, da Vila de Midões(151). O segundo livro com a relação dos expostos, abrange
o período de 26/09/1845 a 28/10/1849, durante o qual foram expostas 112 crianças,
sendo de destacar os anos de 1846 (23), 1848 (29), e, em especial, o de 1847 (42)(152).

(148)
  AMT – Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fls. 71v.-72.
(149)
  ibid.fls. 83 e 84v.
(150)
  ibid. fl. 54
(151)
 AMT – Matrícula dos Expostos do Termo de Midões, 1802-1845
(152)
  AMT – Matricula dos Expostos do Termo de Midões, 1845-1849

117
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

A sustentação dos expostos foi-se tornando um problema económico e social, não só


pelo número de expostos mas também pelas elevadas quantias envolvidas, incluindo às
amas, e que eram liquidadas na Tesouraria Geral do Distrito e, mais tarde, na Repartição
Distrital dos Expostos. Em Agosto de 1841 a situação atinge a ruptura: devendo o mu-
nicipio 427.440 reis das colectas entre a população de 1839-1840, foram nomeados bens
do concelho para penhora e cobradores para as diversas freguesias. Assim e para a freguesia
de Midões nomearam-se: na Vila (António Rodrigues Brandão, José da Cruz, Joaquim
Brandão Junior), Vila do Mato (Luis António, José da Rocha, José de Figueiredo, José
Rodrigues), Casal da Senhora (José Francisco da Costa, José Ramos, Estêvão Borges,
Estêvão Garcia), Coito (Joaquim Pinta, José Francisco Tamanqueiro), Esporão (António
Aldonacio), Santo Amaro (Manuel Francisco), Cadoiço (António de Alcantra), Touriz
(João Nunes Branco) e Ribeira (Francisco de Oliveira).
A 14/01/1849 a dívida na Repartição dos Expostos atingia a soma de 675.702 reis e,
perante a iminência de uma acção contra o municipio, a vereação delibera lançar uma derra-
ma sobre a população na importância de 458.011 reis, lançando-se mais 20.000 reis para as
despesas dos cobradores das freguesias de Midões, Póvoa, Candosa, Covas e Oliveirinha(153).
As questões relativas à higiene e segurança alimentar estão subjacentes à decisão de
29/07/1841, em que a vereação decide estabelecer uma praça na Vila de Midões: «…
aonde serião obrigados todos aquelles cidadãos, que tem por uzo, e costume venderem
em sua caza generos de comestivar e levarem=nos a Praça desta Villa todos os dias athe as
dez oras, ou meio dia, penna de que sendo alguns comestivos, como bacalhau, sardinha
pão, e estando em suas cazas dentro do prazo marcado serem multados por cada uma vez
na quantia de cem reis»(154).
A manutenção de vias de circulação foi uma preocupação constante, sendo de des-
tacar a limpeza e conserto de diversos caminhos ou calçadas como as de Midões-Rio de
Cavalos, Midões-Capela de S.Miguel, Rua do Arrabalde, Estrada da Canada, Caminho
do Outeiro-Cadoiço, Caminho da Barca do Rio Mondego, Caminhos de Touriz, de
Sequeiras e do Pico, ou Rua do Espirito Santo em Midões. Contudo, só a 30/09/1849,
a municipalidade reúne, na sequência de circular do Governo Civil, com o Conselho
Municipal e Administração do Concelho, párocos, regedores e pessoas principais do
concelho para deliberarem sobre a construção de estradas, então um assunto considerado
como «um fim tão justo».
Desta reunião sairia um importante acórdão: «Que este concelho se prontificava a dar
para a construcção e milhoramento das estradas principais e transguecais deste concelho,
1000 pessoas de trabalho braçal de quatro em quatro mezes e em todo o anno 3000 mil
pessoas de trabalho, entrando neste numero 140 labradores por anno»(155).

(153)
  AMT – Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fl. 1v.
(154)
  AMT – Livro das Actas, Sessões e Acordãos da Câmara Municipal da Vila de Midões, 1841-1848, fl. 4v.
(155)
  AMT - Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fl. 15v.

118
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

As primeiras calçadas da época contemporânea, construídas em Midões, datam de mea-


do dos anos 60 do séc. XIX, como consta da acta da sessão extraordinária de 04/09/1879
que indeferiu a Maria de Sousa, de Tábua, a construção de um balcão na Rua do Lourinho,
por ser pública e de muito trânsito. Na deliberação da junta de paróquia pode ler-se:
«Em 1866, época em que se fizeram as primeiras calçadas em Midões, cuja mão d’obra
na sua quazi totalidade foi paga á custa dos seus habitantes, e de 3 outros que sopposto
nesta terra não habitem, muito para ellas concorrerão, deitarão-se abaixo muitos balcões,
cujos donos forão indeminizados, por alguns cidadãos benemeritos desta terra, tendo esta
medida a aprovação, e os incomios do ilustre senado d’então»(156).
A manutenção de espaços públicos foi outra preocupação, designadamente, o esforço
em torno das fontes. A 05/08/1839 arrancou a «Obra da Feira e do Tanque Publico do
Adro da Igreja», deliberando-se entregar ao mestre pedreiro José de Sousa a quantia de
32.000 reis(157) que concluiu a obra em Novembro do mesmo ano. Um pouco antes, em
Setembro, o município ajustou a João da Costa, dos Ariais-Casal da Senhora, o coberto
para a feira, por 17.000 reis.
Em meados do mês a fonte pública do Casal da Senhora fica sem água devido a alguns
indivíduos terem aberto um poço atrás da mesma, facto denunciado por António Rodrigues
Brandão à Câmara Municipal de Midões, que a 15/8 vistoria o local impondo pena de
4.000 reis a todo o habitante «que tornasse a cavar ou abrir no ditto poço», deliberando
que o oficial de diligências informe os habitantes do referido lugar «para que elles não
possão para o futuro alegar ignorancia»(158).
Alguns anos depois, a 05/12/1847, a municipalidade atende, favoravelmente, o reque-
rimento dos moradores do mesmo lugar que por «não terem huma fonte publica onde
vão buscar agua para beber, e uzos domésticos», sugeriam a construção de uma nova fonte
a partir de um nascente, por 30.000 reis, deliberando-se incluir a despesa no próximo
orçamento municipal A obra, executada no sitio conhecido como fonte, seria arrematada
a 12/12 por Manuel Brandão, do dito casal, por 20.000 reis com a condição de ficar «…
do mesmo modo que está a que se acha ao Adro da Villa de Midões, e ficar com as escadas
em frente da fonte, e encanar-se a valla»(159).
A 21 de Julho de 1851 a vereação coloca à disposição do presidente 12.000 reis para
a construção de uma fonte em Santo Amaro ficando autorizado a ajustar-se com pedrei-
ros(160). Em Dezembro de 1853 liquida-se o valor da intervenção executada na Fonte do
Coito no valor de 6.000 reis (161).

(156)
  AMT - Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1878-1883, fl. 15v.
(157)
  AMT – Livro das Actas das Sessões e Acórdãos da Câmara Municipal de Midões, 1839-1840, fl. 2
(158)
  ibid. fl. 3
(159)
  AMT – Livro das Actas, Sessões e Acordãos da Câmara Municipal da Vila de Midões, 1841-1848, fls. 60v, 62v.
(160)
  AMT - Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fl. 70v.
(161)
  AMT – Livro da Receita e Despesa do Concelho de Midões, 1849-1854

119
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Infraestruturas como as pontes também eram objecto de atenção desvelada.


A 02/04/1840 o município acorda no pagamento ao «mestre Souza» de 5.000 reis para
a «Obra na Ponte de Rio de Cavallos», que consistia na aplicação de três paredes novas
e calçada (162).
No que diz respeito à instrução primária, existe o registo da cobrança do subsídio
literário, imposto criado por Alvará de 10/11/1772, e destinado a custear as reformas no
campo da instrução promovidas pelo Marquês de Pombal. Era cobrado pelos concelhos
mas a gestão estava a cargo de uma Junta Geral que geria o pagamento aos professores.
A 10/01/1833 o concelho nomeava como cobrador José Ramos, do Casal da Senhora(163).
Bento Inácio Duarte de Almeida terá sido o primeiro professor a exercer na freguesia.
Fê-lo em Midões, onde tomou posse a 22/07/1835, desconhecendo-se as circunstâncias
em que desempenhava a função. De 1835 a 1966 é conhecida, com algumas lacunas, parte
do professorado que assegurou as funções de instrução primária nas escolas da freguesia:
Midões, Vila do Mato e Touriz (ver tabela 4).

Tabela 4 – Professores Primários das Escolas de Midões, Vila do Mato e Touriz, 1835-1966(164)
ESCOLA PRIMÁRIA DE MIDÕES
Nome Observações
Bento Ignacio Duarte d’Almeida Posse em 22/07/1835.
Bento Ignacio Duarte d’Almeida Em exercício de 1841-1843. Provimento da cadeira de ensino
primário de Midões.
Carta de nomeação pela rainha, por despacho de 02/04/1841.
Nomeação por mais dois anos, atendendo ao grau de sufi-
ciência e exame como opositor à cadeira. Ordenado anual
de 90.000 reis (pagos pelo tesouro) e 20.000 reis pelo Cofre
da Câmara Municipal.
Bento Ignacio Duarte d’Almeida 1843-1851. Professor proprietário e vitalício da Cadeira
de Ensino Primário de Midões. Nomeação por carta de
D. Maria, 24/07/1843, por 3 anos.

(162)
  AMT – Livro das Actas das Sessões e Acórdãos da Câmara Municipal de Midões, 1839-1840, fl. 21; Livro das
Actas, Sessões e Acordãos da Câmara Municipal da Vila de Midões, 1841-1848, fl. 4v.
(163)
  AMT – Livro de Autos e Acórdãos do Concelho de Midões, 1826-1834
(164)
  Fonte: AUC - Registo dos Diplomas dos Professores de Instrução Pública, 1835-1841, 1841-1861, 1861-
1881; Registo das cédulas passadas a professores, 1845; Cadastro de professores 1843/45; descritivo das cadeiras de
instrução primária, sexo feminino no distrito, década 60-70, séc. XIX; Mapa descritivo das cadeiras de instrução
primária, sexo masculino no distrito, década 70; Mapa descritivo das cadeiras de instrução primária, sexo masculino
no distrito, séc. XVIII e XIX; Mapa descritivo das cadeiras de instrução primária, sexo feminino no distrito, década
70 e dados anteriores, séc. XIX; Mapa descritivo das cadeiras de instrução primária, sexo feminino no distrito,
década 70 e dados posteriores, séc. XIX; Movimento dos professores e professoras de instrução primária no distrito
de Coimbra, 1888; Movimento dos professores e professoras de instrução primária no distrito de Coimbra, 1894;
Annuário Commercial de Portugal, (1897-1902), Vol. II (1902-1919; 1921-1982), Vol. III (1920)

120
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

ESCOLA PRIMÁRIA DE MIDÕES


Nome Observações
João Álvaro d’Almeida 1865-1888. Provido a 26/01/1865. Provisão vitalícia a
14/04/1868. Carta do Ministério do Reino de 4/02/1865,
por 3 anos. 150.000 reis anuais em 1888.
Belmira Cândida Gonçalves 1873-1888. Provimento vitalício 28/05/1873. Cadeira
feminina.
Em 1888 recebia 150.000 reis anuais. Em 1888 regia a 1ª
classe.
João Antunes de Macedo Provimento temporário a 28/08/1868. Vitalício a 15/11/1871
Vencimentos de 110$000, pagos 90.$000 pelo Estado e
20$000 pela CM Tábua.
João Álvaro d’Almeida 1898-1901.
Belmira Cândida Gonçalves
Alfredo César da Silva Cardoso 1901-1905. Provimento de 23/07/1901, 3ª classe. Despacho
de 23/09/1904 para 2ª classe. Casa e mobília próprios, sem
residência. Ordenado de 120.000 reis.
Maria Laura da Silva Freitas 1901-1910. Provimento definitivo por despacho de
23/09/1904. Escola feminina. Transferida de Riba de Mouro
(Monção) por despacho de 28/03/1901.
Agostinho Vaz Tavares 1908-1916.
Cristina de Carvalho Vieira das Neves 1908-1950. Aposentou-se em 1950.
José Ribeiro 1918-1925.
Manuel Edmar d’Oliveira 1923-1925.
Horácio Antunes Ferreira 1925-1928.
Luis da Cunha Gama 1934-1939.
Maria da Purificação Pedroso de Oliveira 1937-1939.
Otília da Conceição Cabrita 1942-1960.
Neste período também estiveram a desempenhar serviço
como professores: Antero Correia Duarte Trindade, Germana
C. Jara e Manuel Trindade (1943) e Belmira Falcão (1944)-
Vasco da Gama Veloso Branquinho 1945-1955.
José do Nascimento Matos 1945-1966. Neste período também desempenhou função
como professora Maria Amália Seco de Gouveia (1962-
1964), Maria Teresa dos Santos e Maria Zelinda Franco de
Andrade Matos (1962-1966) e Luís Borges da Silva Pereira
(1966).
ESCOLA PRIMÁRIA DE VILA DO MATO
Nome Observações
Belmira Nunes de Figueiredo Em exercício de 1923-1925.
Cecília Esteves de Gouveia 1943.
Cecília Esteves Gomes de Gouveia 1945-1955.
Maria Helena Moreira 1962-1966.
ESCOLA PRIMÁRIA DE TOURIZ
Nome Observações
António Valério Boto Ele natural de Candosa, ela de Coimbra.
Maria Anunciação Branquinho

121
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

ESCOLA PRIMÁRIA DE TOURIZ


Nome Observações
Irene da Conceição Ovídio Em exercício de 1943-1955. Neste período exerceram na
José M. de Almeida qualidade de regentes escolares: António da Costa Mesquita,
Eugénia de Matos Coelho e Dinis Figueiredo Alves da Costa
(1951).
Alzira do Nascimento 1945-1955.

Em Outubro de 1839, a vereação designa João Pais da Cunha Mamede para membro
da Comissão Inspectora de Instrução Primária do Concelho. Em 1841, temos o registo
de estar a exercer como professor de primeiras letras da Vila de Midões, Bento Ignacio
Duarte de Almeida(165), em cuja função se terá mantido até pelo menos 1851.
Em 1843-1845, no Concelho de Midões existiam 4 cadeiras nos lugares de Candosa,
Oliveirinha, Percelada e Midões, enquanto que no concelho de Tábua funcionavam cadeiras
em Ázere e em Tábua, recebendo cada professor 7$500 (166).
A 11/02/1849 e em resposta a circular do Governo Civil, a CM Midões considera de
grande necessidade a criação de uma cadeira de Gramática Latina na Vila, propondo a
supressão da cadeira de ensino primário de Oliveirinha, representando-se às Cortes sobre
o assunto (167).
Em termos religiosos, competia aos vereadores da CM Midões a nomeação de pes-
soas para pegar no pálio no dia de Corpo de Deus. O mais antigo auto de eleição data
de 15/06/1829 tendo sido nomeados: Bernardo Joze Delgado (Midões), Luis Borges e
Antonio Nunes Martins (Póvoa), Dr. Luis de Oliveira e Mello e Joze da Rocha (ambos
de Vila do Mato) e Manoel Joaquim Borges (Vila do Couto)(168).
Pelo menos desde 1838 que também competia ao concelho designar os cobradores
e recebedores das côngruas dos párocos. Os cobradores e recebedores de esmolas para
a Senhora do Amparo também eram eleitos pelas vereações de Midões e do Coito.
A 04/04/1830 foram designados, no caso de Midões: Miguel de Azevedo (Val Faisco),
Manoel Francisco Cazeiro (Póvoa), Manoel Cardozo (Midões) e Antonio Pedro (vila de
Midões) como Recebedor Geral das esmolas da Senhora do Amparo. No que toca ao
Coito de Midões, a vereação nomeava dois cobradores também designados por pedidores:
um para a própria Vila do Coito e outro para a Vila do Mato, recaindo as escolhas, em
Março de 1830 em Jose Francisco Tamanqueiro e Fortunato Fernandes, respectivamente,
havendo também registo da existência de um despositário(169)

(165)
  AMT – Livro das Actas, Sessões e Acordãos da Câmara Municipal da Vila de Midões, 1841-1848, fls. 4-4v.
(166)
  AUC – Fundo do Governo Civil: Cadastro de professores 1843/45
(167)
  AMT – Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fl. 3
(168)
  AMT - Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834
(169)
  AMT – Livro das Sessões da Câmara Municipal do Coito, 1828-1834

122
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Num mundo profundamente rural, marcado pela agricultura e pecuária, os concelhos


midonense e coitense regulavam-se por um conjunto de regras que incidiam sobre o gado
de pastoreio, sendo provável que tivessem um código de posturas sobre o tema e livros
de coimas onde eram anotadas as infracções que se traduziam em importantes fontes de
receita. A 13/02/1834 a vereação midonense acorda sobre este assunto: «…que todo o
gado de fora que for apanhado neste concelho pagara de coima da primeira vez 120 reis
e a segunda dobrada e o gado do nosso conselho pagarão sendo 30 cabeças 60 reis e o
povo pagarão á purpurção do gado que tiverem (…) e o gado que for apanhado no dano
pagara coima dobrada»(170).
A concessão de licenças para pastoreio tornou-se frequente em Midões: a 13/11/1839
autorizou-se o padre Francisco Xavier de Figueiredo, do concelho de Tábua, «para seu
gado pastar neste concelho humas pastagens, que tinha comprado», com a cláusula «…que
se o gado comesse as do lougradouro publico do concelho ficaria subjeito a poderem-lhe
lançar coimas na conformidade das Posturas»(171).
No que respeita ao Concelho do Coito verificamos que concediam licenças para
pastagem de gado a indivíduos residentes fora da sua área territorial concelhia, das quais
auferiam significativos rendimentos: a 18/03/1829, foram passadas a Manoel Martins,
Francisco Fernandes, Anna Zambuja e Antonio Soares, (todos de Midões) e Antónia
marques (viúva, de Touriz), que pagaram o valor anual de 960, 440, 600, 480 e 440 reis,
respectivamente(172). Uma das principais pastagens situava-se na Tapada de Sequeiros.
A comercialização da carne no açougue municipal era fiscalizada pelo concelho que
arrematava o ramo anualmente a quem mais desse. A 30/01/1840 entregou o ramo da
carne de vaca por 50 reis, maior lanço oferecido por Luisa de Sousa da Vila de Midões, que
devia respeitar um conjunto de condições:«..desse vaca boa, e capaz devendo ser primeiro
revista por hum dos Membros da Camara, e ella arematante se obriga a dar a sobreditta
vaca por espaço de tres mezes a saber Fevreiro, Março e Abril, e a Camara adiantar a arre-
matante a quantia de 24.000 reis, e ella Camara se obriga a porhibir, que neste conceho
se de vaca em outro acougue»(173).
A concessão de licenças para o funcionamento de lojas públicas ficou definido em
acórdão da CM Midões, de Janeiro de 1839, pelo qual se estabeleceu que o oficial de
pregoeiro do concelho lançasse pregões no dia 15 pelas várias povoações «para que toda
aquella pessoa que tiver lojas publicas de pezo e medida, tabernas, açougues, e outras
quaqesquer lojas, vão tirar licença da Camara do ditto Concelho de Midões», sob pena
de 1200 reis (174). Ainda sobre este assunto, e na sessão de 17/02 estipulou-se as quantias

(170)
  AMT - Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834
(171)
  AMT – Livro das Actas das Sessões e Acórdãos da Câmara Municipal de Midões, 1839-1840, fl. 9
(172)
  AMT – Livro das Sessões da Câmara Municipal do Coito, 1828-1834
(173)
  AMT – Livro das Actas das Sessões e Acórdãos da Câmara Municipal de Midões, 1839-1840, fl. 15
(174)
 AMT – Livro das sessões e acordãos da Câmara Municipal de Midões, 1838-1839, fl. 27

123
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

das licenças no valor de 240 reis (além do imposto da licença) alargando a obrigatoriedade
do licenciamento a hospedarias públicas.
A atenção das autoridades concelhias também contemplava aspectos ligados à seguran-
ça do território. Assim, em Janeiro de 1838, nomeava cabos de policia para o concelho.
A comunicação entre pessoas fazia-se, essencialmente, através de correspondência.
A 17/12/1842 foi nomeado como Correio Delegado na Vila de Midões, Bento Ignacio
Duarte de Almeida, tomando juramento a 04/12/1842 ficando obrigado a pagar à admi-
nistração do Correio Assistente de Viseu, 14.400 reis anuais(175). Sucedeu-lhe, em 1849,
José Ribeiro de Azevedo.
Em conformidade com a Carta de Lei de 27/10/1840 preparou-se o recenseamento
de eleitores tendo em vista as eleições indirectas de Junho de 1842 legitimadoras do novo
poder que resultou do movimento militar de 27 de janeiro, do mesmo ano, concretizado
por Costa Cabral. A partir do decreto de 30/07/1847 o município passou a realizar o
recenseamento dos eleitores e elegíveis para os cargos municipais e paroquiais.
Refira-se também que nos livros de actas do extinto concelho de Midões, inicialmente
composto pelas freguesias de Midões e Póvoa, figuram vários actos de gestão relativos às
freguesias de Candosa, Covas e Oliveirinha, os quais desde 1836 estavam integrados no
Concelho de Midões: nomeação de professores, cabos de polícia, louvados repartidores
de água, informadores para as côngruas dos párocos, juramento a juizes de paz, autos de
contas, atestados de boa conduta, autorização para pastoreio, venda de bens imóveis ou
treslado de provisões.
Com a criação das juntas de paróquia o concelho passou a proceder a auto de contas
às mesmas, anualmente, para verificar a sua legalidade.
Por Provisão Régia de 29/08/1805 e acórdãos da CM Midões de 10/02/1834 e
06/01/1838, passou a realizar-se no Sítio da Senhora das Dores, em Midões, (junto à
capela da mesma invocação) uma feira franca, na 3.ª segunda feira de todos os meses(176).
Durava um dia e nela se transacionavam produtos diversos: faixas de lã, algodão, bacalhau,
arroz, sardinha, centeio, cevada, feijão, batatas, pão ou vinho.
Já no tempo da I.ª República, talvez consciente do declínio da feira, a Junta de Paróquia
de Midões tomou medidas, em 1914, para animar o evento, deliberando incluir no
orçamento de 1915 a verba de 18.000 reis «…para ser destrebuida em prémios à junta
melhor de bois que aparecer na nova feira de gado que se vae a inaugurar na Feira Nova
de Midões».(177)
Esta feira mensal realiza-se, actualmente, no referido sítio (Largo da Feira, junto da
Capela de Nossa Senhora das Dores), à segunda feira entre os dias 15 e 21 de cada mês.

(175)
  AMT – Livro de Registo de Posses e Diplomas do Concelho de Midões, 1841-1887, fl. 6
(176)
 AMT – Livro das sessões e acordãos da Câmara Municipal de Midões, 1838-1839, fl. 1v.
(177)
  AJM - Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1911-1918, acta de 20/12/1914, p.49

124
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

3.5. A sistematização militar: a Companhia de Ordenanças de Midões


Em Portugal, a constituição de companhias de ordenanças militares, data do início do
séc. XVI. D. Sebastião estruturaria de forma organizada as Ordenanças do Reino; com o
Regimento dos Capitães Mores, de 1570, alargou aquela estrutura a todo o reino, criando a
base de um exército nacional (até então existiam somente duas Capitanias Mores, uma em
Lisboa e outra no Porto. Na época, cada companhia de ordenanças seria constituída por 250
homens, distribuídos por 10 esquadras, compreendendo como oficiais: um capitão, um alfe-
res, um sargento, um meirinho, um escrivão e 10 cabos. Cada companhia possuía um sím-
bolo próprio; uma bandeira. De cada Capitania-Mor fazia parte um número determinado de
companhias de ordenanças, correspondendo a sua área territorial a uma cidade, vila, concelho
ou território senhorial. Os oficiais das ordenanças eram designados pelas câmaras munici-
pais, excepto nas terras onde existisse um alcaide mor (que assumia o cargo de Capitão-Mor).
Durante o período da União Ibérica, as companhias de ordenanças entram em declínio,
sendo restabelecidas após a Restauração da Independência a 01/12/1648, naquela que foi
uma das primeiras medidas de carácter militar de D. João IV. A partir de então, as ordenan-
ças passaram a prestar um serviço militarmente activo, na defesa e manutenção das forta-
lezas e pontos estratégicos de cada localidade. Com o prolongar da Guerra da Restauração
criaram-se tropas auxiliares (tropas de 2.ª linha) e tropas pagas (de 1.ª linha), levando a que
as ordenanças deixassem de constituir corpos activos, assumindo funções de recrutamento e
mobilização de homens para aquelas linhas do exército. A partir de 1646 deixam de ter qual-
quer obrigação de serviço militar activo, tanto em tempo de guerra como de paz. Durante
o séc. XVIII, cabe às ordenanças elaborarem listas de moços capazes para o serviço militar.
No séc. XIX, as eleições dos oficiais das Companhias de Ordenanças compreendiam
uma solenidade própria: em acto de vereação da Câmara Municipal, perante o Capitão-
mor do Distrito, Procurador Geral da Câmara, analisava-se o currículo de 3 candidatos.
Com o tempo, a estrutura das companhias acabaria por reflectir a organização social
das localidades onde se inseriam, com os cargos dirigentes a serem atribuídos aos mais
notáveis das terras.
Do ponto de vista militar, Midões era sede de uma Companhia de Ordenanças, como
o provam os treslados das patentes concedidas a vários oficiais que constam dos livros
de actas: a 03/11/1791 foi nomeado Antão Antunes Martins, do lugar da Póvoa, como
Alferes da Companhia de Ordenanças na Vila de Midões, sucedendo a Manuel da Fonseca
Magalhães, sendo a posse conferida pelo Coronel Manuel António da Paixão Governador
das Armas da Província da Beira. No ano seguinte, a 17/01/1792 seria nomeado e aprovado
para Alferes José Botelho de Brito, do lugar da Póvoa, subindo Antão Antunes Martins
à condição de Capitão, confirmado por José Bernardino Monteiro Cabral, Capitão Mor
das Vilas de Midões e Couto e seus distritos.(178).

  AMT – Livro de Actas da Câmara Municipal de Midões, 1788-1792, fls. 45v. e 48


(178)

125
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

De acordo com as assinaturas presentes no Auto de Juramento à Carta Constitucional


Portuguesa, a 31/07/1826 a companhia das ordenanças de Midões apresentava como
principais elementos: Roque Ribeiro (Capitão-Mor), Francisco Xavier da Costa (Capitão),
Gaudencio Joze e Luis Borges (Alferes), Manoel Ignacio, Manoel Ribeiro e João Coelho
(Sargentos) e mais 9 cabos(179). No Coito ficava a sede da 2ª Companhia de Ordenanças.
Com o Liberalismo, e pelo decreto de 18/03/1823, foram extintas as ordenanças na
sequência da criação da Guarda Nacional, que assumiu as funções destas. Com D. Miguel
I foram restabelecidas e, mais tarde, definitivamente extintas pela Guarda Nacional após
a vitória liberal na Guerra Civil (decreto de 24/03/1831).

4. O FIM DO CONCELHO E DA COMARCA DE MIDÕES E A ASCENSÃO DE TÁBUA


A 31/12/1853 operaram-se novas alterações de âmbito judicial e administrativo, com
a reorganização comarcã. Os concelhos e julgados de Farinha Podre e Midões foram
suprimidos e as respectivas freguesias integradas no Concelho de Tábua, o qual passou
à categoria de Comarca. De Midões transitaram as cinco freguesias que o compunham:
Candosa, Covas, Midões, Oliveirinha e Póvoa (Midões). Do extinto concelho de Farinha
Podre (actual S. Pedro de Alva), as freguesias de Covelos, Farinha Podre, S. Martinho (da
Cortiça), Oliveira do Cunhedo (Oliveira do Mondego), São Paio, Paradela e Travanca.
No ano seguinte recebe as freguesias desanexadas de Arganil: Espariz, Pinheiro de Coja,
Meda de Mouros e Mouronho.
Contra a supressão concelhia protestou o povo de Midões em Fevereiro de 1854,
enviando representação ao Rei D. Pedro V, na qual apresenta os seus fundamentos para
se manter como Cabeça de Comarca e sede de concelho: posição geográfica e vias de co-
municação, antiguidade e história, dinâmica comercial e agrícola, concluindo pela maior
afinidade com Oliveira do Hospital do que com Tábua em caso de anexação (vide foto 28).

REPRESENTAÇÃO DO POVO DE MIDÕES CONTRA A EXTINÇÃO CONCELHIA

Os povos do extinto Concelho de Midões não se conformaram com a supressão


do concelho. Prova-o a representação assinada por mais de 300 pessoas e enviada
ao Rei D. Pedro V, datada de 20/02/1854.
«Os Povos do extincto Concelho de Midões, com o mais profundo respeito levão
aos pés do Throno de Vossa Magestade a sua Reprezentação, contra o Decreto de 31 de
Dezembro último na parte que diz respeito ao mesmo concelho: não o fizemos logo que
tivemos conhecimento n’aquelle Decreto, porque de propozito quizemos deixar passar o

  AMT – Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834


(179)

126
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

momento da primeira impressão para obrarmos com mais reflexão; e porque quizemos
dar logar a que outros Povos reprezentassem primeiro, afim de que se não dissesse que
nós eramos os unicos que nos queixavamos.
Senhor = Aquelle Decreto ferio de morte, e aniquilou este Concelho; de um só golpe
privou-o da categoria de Concelho, afastando para longe as respectivas Repartiçoens
publicas da Justiça, da Administração, da Fazenda e do Correio; e fes desapparecer
d’aqui a Cabeça da Comarca: não lhe valeo ser concelho independente desde tempos
immemoriaes com Foral dado pr ElRei o Senhor Dom Manuel em 1514; não lhe valeo
gozar da categoria de Cabeça de Comarca desde 1835; não lhe valeo a importancia
da Villa de Midões, e a sua bellissima situação: tudo foi desprezado e desattendido por
aquelle Decreto, que pésa sobre os Povos representantes como um anáthema desteuidor
que tudo arrazou !!!
Se tivessemos motivos para acreditar que para a adopção d’esta medida, tinha
predominado um pensamento politico qualquer, ficariam submissos e resignados; mas
conhecendo pelos factos que acompanhão [Fl. 1v.] este negocio, que não houve pensa-
mento algum politico; não podemos deixar de elevar á prezença de Vossa Magestade
as nossas queixas contra as perniciozas disposiçoins d’aquelle Decreto na parte que nos
diz respeito; não tanto pela privação em que ficámos das vantagens que nos davão as
circunstancias acima referidas, nem por ver-mos extinguir e murchar a tal ou qual
supremacia de que gozavamos, porque não somos ambiciozos, mas (note-se bem) pelos
inconvenientes que d’uma tal medida resultão para o Bem Público.
Se é certo que para uma acertada divisão de territorio, deve attender-se aos habitos,
costumes, e tendencias dos Povos, á sua industria, e modo de existir, e athé mesmo á
qualidade e naturesa do sólo, e condiçoens de sua superficie; parece incrivel que, na
medida que se adoptou a respeito do Concelho de Midoens, houvesse a mais pequena
attenção para estas cicumstancias: e temor a convicção de que se fosse consultada a
Junta Geral do Districto; se fosse ouvido o digno e experimentado Governador Civil,
não deixarião de informar contra a medida adoptada.
Senhor = O Concelho de Midões, rico em todas as producçoens da terra, levando
um grande augmento a sua agricultura, colhe fructos em abundancia não só para o seu
consumo, mas para exportar, e, para assim dizer, vive só de si, no que respeita aos generos
de primeira necessidade; por isso nunca em tempo algum teve dependencia da Villa de
Taboa, não disemos bem, dos pequenos e insignificantes Cazaes, situados em grandes
distancias uns dos outros, a que se dá o nome de Taboa, aonde não ha se quer [Fl. 2]
um mercado importante, nem predicado algum que contribua a chamar ali os Povos
vizinhos; por isso as relaçoens de Midões com aquella Taboa erão nenhumas; e obrigar
os seos Habitantes a recorrer ali, é contrariar directamente os seos habitos. – Em quanto
que em todo o extincto Concelho de Midões, debaixo da mais laborioza, e incansavel do
Habitante se vê por toda a parte florecer a Agricultura, ao contrario na maior partedo
Concelho a que vae incorporar-se o de Midões, não se devisão senão terrenos incultos e
estereis, testemunho vivo já da ingratidão do sólo, já da indolencia dos habitantes, que

127
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

se contentão com a precaria subsistencia, que póde provir-lhes, ou d’andar na Estrada


atraz de Bois e Cavalgaduras, condusindo mercadorias de uma para outra parte, ou da
navegação do Rio Mondego. He bem sensivel a differença de costumes, das tendencias
e da industria que existe entre estes Povos; e são obvias as consequencias funestas que
podem resultar para o Bem Publico da agglomeração d’elementos tão heterogeneos: as
correspondencias dos jornaes (vejão-se os n.ºs 2 e 5 do Conimbricense) denuncião já
entre os Povos do novo Concelho uma verdadeira e assanhada antipatia.
Além de que há no limite das duas Povoaçoens uma Ribeira que nos mezes d’Inverno
toma grande abundancia d’Aguas, e se torna demasiadamente caudaloza; esta Ribeira,
apezar das instantaneas reprezentaçoens das Juntas Geraes do Districto, ainda não tem
uma Ponte no sitio de Valle D’Orca, onde passa a Estrada que communica os Povos de
Midoens com os de Taboa, e nesses mezes estão por muitas vezes incommunicaveis: [Fl.
2v.] esta circunstancia deve merecer toda a consideração, e parece-nos que por si só he
bastante para patentear a inconveniencia da medida.
Nós dissemos que Taboa propriamente não existe, mas que se dava este nome a
differentes Cazaes, situados a grande distancia uns dos outros; e agora accrescentaremos
que nenhum d’esses casaes contem os edificios necessarios para acommodar todos os em-
pregados, e tem elles de viver deslocados uns dos outros: as partes que tiverem de tratar
negocios perante o Juiz de Direito e seos Escrivaens, perante o Administrador e Recebedor
do Concelho, perante a Secretaria da Camara, terão de percorrer grandes distancias
de cazal em cazal em busca dos respectivos empregados. Emfim, Senhor, a Cabeça de
Comarca, e mesmo a do Concelho, com a extinção que agora se lhe dá, he impraticavel,
he impossivel, em uma localidade com taes condiçoens. Estamos seguros de que o Juiz
de Direito, e o Administrador do Concelho, começando desde logo a experimentar estes
inconvenientes, e outros muitos que nos abstemos de referir, porque não queremos parecer
apaixonados, e muito menos acintosos, não deixarão de os levar logo ao conhecimento
do Governo, pedindo providenciar. Senhor = não somos exagerados no que temos dito;
exposemos a verdade, e não receamos que alguém em boa fé nos contradiga.
Em conclusão pedimos que se restabeleça o Concelho de Midões, e se lhe restitua
a Cabeça de Comarca, para a qual se encontrão aqui todas as commodidades, sem os
inconvenientes que ficão [Fl. 3] notados em Taboa; e d’esta forma, separando-se de
Taboa o Concelho de Farinha Podre, porque já não he preciza a sua annexação para
córar a collocação da Cabeça de Comarca em Taboa, aplanão-se as difficuldades que está
offerecendo aquelle concelho na justa e bem fundada repugnancia que tem em reunir
a Taboa – mas se o Decreto de exterminio immerecido he irrevogavel para o Concelho
de Midões, se elle está sem remedio votado á morte, então, e só nesse cazo (note-se bem)
declaramos e pedimos ser antes annexados a Oliveira do Hospital, que, em relação
a Midoens, está na razão inversa de Taboa; estamos em mais contacto com os Povos
d’aquelle Concelho, ha para ali mais tendencia, ha mais conformidade nos habitos,
nos costumes, na industria, e são as communicações mais faceis em todo o tempo; e a
Villa d’Oliveira do Hospital, senão offerece tanta commodidades como Midoes para a

128
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

collocação da Cabeça de Comarca, offerece comtudo as que são indispensaveis: d’esta


forma, Senhor, damos um testemunho da sinceridade com que dissemos no principio,
que nós não eramos ambiciozos de supremacia.»

Assinaturas autógrafas:
Cezar Ribeiro Abranches Castello Branco
Nicoláu Ribeiro d’Abranches
José Ribeiro d’Azevedo
António Antunes de Lemos
António da Costa Baeta
Cezar Augusto Coelho
Manuel Antunes
Manuel da Cunha da Costa Veiga
João Álvaro d’Almeida
Francisco António de Brito
Cezar Delgado
Antonio Ricardo da Costa Veiga
José da Cunha de Gouveia
António Augusto Ribeiro
Herculano Augusto Coelho
(…)
António da Costa Nunes (Vigário)
António Abilio Gomes Costa Médico, proprietário e procurador à Junta de Distrito
Bento Garcez d’Oliveira (proprietário);
Luis Borges (prop);
Manuel Pais da Cunha Mamede (Escrivão de Paz);
Pedro Pinto Alves (prop);
Antonio Lopes (Prop);
José Dias (sapateiro);
Manuel Garcia Monteiro (Bacharel);
António Martins (serrador);
Jose Martins (serrador);
António Miranda (sapateiro);
Manoel Francisco (pastor);
Manuel da Costa (sapateiro);
José Martins (alfaiate);
Jose Dias (carpinteiro);
Jose Rois (tamanqueiro);
Regedor da Freguesia de Covas (Antonio Alves)

[AUC – Fundo do Governo Civil: «Representações» In Reformas Administrativas 1841-1854, Cx. 466]

129
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Midões era assim despojada de seus ancestrais foros e regalias, não só da sua autonomia
concelhia mas também de importantes magistrados administrativos como o Administrador
do Concelho, delegado do governo central, que procurava garantir a aplicação das leis
e dos regulamentos, superintendendo nos estabelecimentos escolares, hospitalares e de
beneficência, bem como na autoridade policial. Os elementos que constituíam este órgão,
são conhecidos para o período de 1826 a 1853 (ver tabela 5).

Tabela 5 – Administradores do Concelho de Midões, 1826-1853(180)


Data Administrador Secretário/Escrivão Oficial de diligências
1826Bento Ignácio Duarte de
Almeida
1835-1837 Id. - João Duarte de Almeida
- António Maria da Costa
Veiga
1838 Id. - Luis Duarte de Almeida,
(da Vila de Midões)
1839-1840 Id. - Luis Duarte de Almeida
- Manoel Nunes Borges (da
Varzia)
- Manoel Nunes Borges
1841- 1843 - Joze Soares d’Albergaria - Joze Mendes
Pereira - Luiz Duarte de Almeida
- Domingos Borges de
Figueiredo
- Bento Ignácio Duarte de
Almeida
1844-1845 Bernardo Joze Delgado ?
(administrador interino)
1846 António Soares de - Luis Bernardo d’Aranda
Albergaria Pereira e Albergaria (in-
terino)
1847 - Bento Fortunato de - Francisco Augusto da
Oliveira Carvalho Silva Coelho
- Fernando de Gamboa
Vasconcellos e Aylla
1848 Fernando de Gamboa ? - Joze de Almeida
Vasconcellos e Aylla - António dos Santos Oliveira

 Fontes: Livro das Actas das Sessoes e Acordãos da Câmara Municipal de Midoes 1839-1840; Livro das Actas,
(180)

Sessões e Acordãos da CM Vila de Midões 1841-1848; Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões
1849-1854; Livro de Registo de Testamentos da Administração do Concelho de Midoes, 1836-1843; Livro de Registo
de Testamentos, Administração Concelho Midões e Administração Concelho de Tábua, 1850-1857; Livro de Registo
de Posses e Diplomas do Concelho de Midões, 1841-1887; Livro de Registo de Posses e Diplomas do Concelho de
Midões, 1841-1887; Livro de Registo de Passaportes, 1840-1858; AJFM - Livro da Receita e Despesa da Confraria
do Senhor e Santissimo da Vila de Midões, 1802-1850; Livro da Receita e Despesa da Confraria de Santo Estevão
da Vila de Midões, 1802-1839

130
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Data Administrador Secretário/Escrivão Oficial de diligências


1849-1852 Joze Augusto da Silva ?
Coelho
1850-1853 ? - Francisco Augusto da
Silva Coelho
- Joze Maria da Costa Veiga
1852-1853 Joze Augusto da Silva Francisco Augusto da Silva
Coelho Coelho

Findava, também, a actividade de órgãos consultivos como o Conselho Municipal,


criados no reino pela Lei de 29/10/1840, com funções consultivas junto da Câmara
Municipal de Midões e formado pelos maiores contribuintes-eleitores, os quais vieram
a ser extintos com o Código Civil de 1878, obra do Partido Regenerador. Os elementos
que compunham o Conselho Municipal Midonense, bem como algumas das suas origens,
são conhecidos para o período 1842-1855 (ver tabela 6):

Tabela 6 – Conselho Municipal de Midões, 1842-1855(181)


DATA EFECTIVOS SUBSTITUTOS
- Joze Soares da Fonseca Magalhaens
1842
(Midões)
- António Rodrigues Brandão (Midões)
- Joze da Cruz (Midões)
- Dr. Joze Augusto Cardozo do Amaral
(Midões)
- António Soares Antunes (Póvoa)
1848-1849 - Joze Soares d’Albergaria - António Joaquim de Oliveira
- Domingos Borges de Figueiredo - Bernardo do Couto
- Manoel Joaquim Borges - João Lourenco de Abreu
- Antonio de Brito (Varzea) - António Ignácio
- Luis Borges - Francisco da Costa
1850-1851 Domingos Borges de Figueiredo (Esporão)
- - Luis Borges (Póvoa)
- João Lourenço de Abreu Mesquita (Loureiro) - António Ignácio (Póvoa)
- Ambrozio Sanches da Fonseca (Midões) - Manuel Joaquim Borges (Coito)
- Joze da Cruz - António de Brito (Varzia)
- Ricardo António da Costa Veiga (Póvoa) - Bernardo da Costa (Oliveirinha)
1852-1853 - Dr. Vicente de Paula Correia de Sá e - António da S.ª Moreira Coelho
Moura - Patrício Joze de Lima e Castro
- Dr. Ricardo João Pimentel - Joze da Cruz
- Joze Soares de Albergaria Pereira - João Lourenço de Abreu Mesquita
- Domingos Borges de Figueiredo - Manuel António de Albuquerque
- Francisco Augusto da Costa Amaral

 Fonte: Livro das Actas das diversas eleições no Concelho de Midões 1844-1852; Livro das Actas, Sessões e
(181)

Acordãos da CM Vila de Midões 1841-1848; Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões 1849-
1854; Livro de Registo de Posses e Diplomas do Concelho de Midões, 1841-1887

131
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

DATA EFECTIVOS SUBSTITUTOS


1854-1855 - Joze Soares d’Albergaria Pereira (Vila do - Ambrozio Sanches da Fonseca (Midões)
Mato) - Luis Borges (Póvoa)
- Domingos Borges de Figueiredo - Joze de Moura (Villa Cham)
(Esporão) - Bartholomeu da Costa (Perselada)
- António de Brito (Varzia) - Manuel Baptista (Candoza)
- Padre Joze Pinto (Regada)
- Manuel Joaquim Borges (Coito)

Estas e outras funções transitaram para a administração tabuense que via aumentar as
suas responsabilidades passando a administrar um concelho composto por 17 freguesias.
A emergência político-administrativa de Tábua em contraciclo com a queda de Midões
tem sido justificada de duas formas:
- Tendo em atenção o facto de a maioria dos governos que se seguiram à Convenção
de Évora Monte (Maio 1834) serem de tendência centralizadora, de inspiração fran-
cesa, procurando, na prática, que as sedes dos concelhos, na Província da Beira, se
fixassem a uma distância de 15km umas das outras (mais tarde elevada a 20km) com
uma tolerância de 3-4 km. Este facto tornava remota a possibilidade de sobreviverem
em conjunto, pelas curtas distâncias entre si, Midões, Tábua e Oliveira do Hospital,
tendo sido a posição geográfica a determinar a extinção.
- Com o facto de Midões ter sido prejudicada pela acção de João Brandão, figura que
povoa o imaginário regional e nacional da história oitocentista. Aparentemente,
existe uma evidente relação entre a extinção de Midões e os crimes imputados a João
Brandão, assinalada por vários autores como Pinho Leal ou António Veiga, da qual
resultou a ascensão de Tábua.
De facto, de há muito que os ecos dos acontecimentos e instabilidade vivida em Midões
eram do conhecimento de todos e chegaram à Assembleia Parlamentar. Na sessão da
Câmara dos Deputados de 12/02/1852 dizia-se: «Os acontecimentos de Midões não tem
nada com a Política: são assassinos que commetteram o crime de matar o Juiz de Direito,
e que antes e depois disso, muitas outras mortes tem commettido, sem ate agora serem
presos para serem punidos conforme as Leis. É preciso (…) attender ao estado desgraçado
em que esta terra tem vivido há muito tempo; e necessário que isto tenha remédio»(182).
Algum tempo depois nova intervenção, no mesmo sentido, de um deputado. A
16/03/1852 colocava-se a questão das rejeições dos Administradores em exercerem em
Midões: «…estas pessoas não querem, não podem querer ir exercer auctoridade n’um
Concelho tão desgraçado, como por exemplo, este de que fallamos, o de Midões (…) eu
por mim, e hei de combinar a esse respeito com os meus Collegas, tenho intendido que o
verdadeiro era acabar com este Concelho pela parte administrativa e pela parte judicial»(183).

  AHP - Diário da Câmara dos Deputados da Nação Portuguesa, nº 32, 12/02/1852, p. 101
(182)

  Id. N.º 58, p. 188


(183)

132
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Uma intervenção fortemente apoiada e baseada na crença de que a supressão concorreria


para o restabelecimento da ordem pública.
A desclassificação de Midões em favor de Tábua foi assinalada por vários autores, entre
os quais António Veiga, aquele que escreveu mais próximo temporalmente aos factos,
assinalando: «Por isso, aproveitando a reorganisação comarcã feita por decreto de 31 de
dezembro de 1853, o governo, em castigo dos crimes d’uma parte minima dos filhos de
Midões, despojou a villa de todos os seus foros e regalias de terra autonoma, reduzindo-a a
uma pura e simples freguezia, e transferindo a séde da comarca e do concelho para Taboa,
a esse tempo um logarejo com quatro ou cinco habitações, e ainda hoje uma terra de bem
mesquinha aparencia, considerada em toda a parte um presidio para os funcionarios que
não podem deixar de passar por lá; e que ainda hoje, o anno da graça de 1905, talvez a
única cabeça da comarca onde tal acontece, não tem um candieiro de iluminação publica, e
quasi não tem agua para beber, podendo por aqui aferir-se a illustração das suas vereações,
e os beneficios que terá dispensado ás outras povoações do concelho»(184).
No mesmo sentido, esteve a intervenção do deputado Pinto d’Almeida que afirmava na
Câmara dos Deputados, a 01/02/1854: «formaram uma comarca em Taboa, e extinguiram
a de Midões; e saiba v. ex.ª e camara, que em Taboa não ha casa para o juiz, nem casa para
empregados, e que é uma povoação que tem trezentos e tantos fogos»(185).
Mas não foi pela extinção que a paz regressou aquele território. O caso de Midões
seria um exemplo sucessivamente abordado no parlamento, procurando averiguar-se da
realidade criminal, enquadrando-o com o restante país. Nesse sentido, em Março de 1855
requereu-se naquela assembleia «um mappa chronologico dos assassínios e ferimentos
praticados desde 1.º de janeiro de 1853»(186), em vários concelhos entre eles o de Midões.
Muitos anos volvidos, a paz e ordem permaneciam por restabelecer, sendo eloquente
o testemunho de um deputado a 25/04/1870: «Eu, sr. presidente, tive a honra de ser
queimado em estatua no meio da villa de Midões, mas com um apparato pouco usado.
Fizeram um boneco de palha com um rotulo, onde se lia o meu nome, deram-lhe todos os
sacramentos com acompanhamento obrigado dos sinos da igreja (triste e sacrílega paródia!)
e, por fim queimaram o boneco, dobrando a finados todos os sinos da freguesia (risos).
O que se disse e o que se fez junto das cinzas do tal boneco póde a camara ajuizá-lo. Os
echos de Midões repetiam sem espanto o ruido da festa, porque estão habituados ha muito
a ser despertados por casos similhantes. (…) E não foi só em Midoes que me fizeram estas
honras. Tambem fui enterrado em estatua no adro da freguezia da Lageosa, que pertence ao
concelho de Oliveira do Hospital. Disseram-me que dirigia a festa Manuel Brandão»(187).

(184)
  VEIGA, 1912, pp. 267-268
(185)
  AHP - Diário da Câmara dos Deputados da Nação Portuguesa, nº 26, p. 4
(186)
  DUARTE, 2009, p. 306
(187)
  Diário da Câmara dos Deputados da Nação Portuguesa, n.º 18, p. 180

133
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Pela lei de 24/10/1855 foram extintos vários concelhos e reorganizada a área dos que
continuaram actividade. Assim, transferiu-se de Arganil para Tábua as freguesias de Espariz,
Meda de Mouros, Mouronho e Pinheiro de Coja. Em sentido inverso saíram do concelho
de Tábua, as freguesias de Farinha Podre, Oliveira de Cunhedo, Paradela, S. Martinho e
Travanca. O concelho de Tábua ficava, deste modo, com 16 freguesias.
Antigos privilégios exclusivos da Vila de Midões mantiveram-se apesar da nova realidade
concelhia sedeada em Tábua, como foi o caso do médico de partido. Após a integração do
concelho de Midões em Tábua, foram criados dois Partidos Médicos, um com sede em
Tábua e outro sediado em Midões, tendo o regulamento sido aprovado pela Câmara de
Tábua a 28/01/1856(188). Os honorários variavam conforme as distâncias a percorrer. A
12/10/1856 toma posse como médico do partido Albano Mendes de Abreu(189).
Uma das sobrevivências das antigas liberdades que os concelhos da monarquia por-
tuguesa haviam usufruído foi o Juiz Ordinário, cuja importância foi diminuindo com o
desenvolvimento do aparelho judicial. Pelo decreto de 28/12/1869 passou a depender da
nomeação régia, vindo a ser extinto, definitivamente, pelo decreto de 29 de junho de 1886.
Por força da lei de 16 de Abril de 1874, os Juízes Ordinários passaram a ser de nomea-
ção régia pelo período de três anos. Em 12/11/1875 foi criado um julgado municipal, de
pouca duração, com sede em Midões, constituído não só por esta freguesia, mas também
pelas freguesias de Covas, Ervedal, Oliveirinha e Póvoa.
Em Abril de 1878 pede demissão da função de Juiz Ordinário Miguel Duarte de
Almeida. Atenta às consequências do que poderia causar a Junta de Paróquia de Midões
procura remediar a situação:
«…e não querendo que Midões perdesse a categoria de Cabeça de Julgado Ordinário
pelo poder acontecer ser nomiado o Juiz Ordinario, alguém que não fosse rezidente nesta
terra», delibera-se oficiar ao actual juiz «…a offerecer-lhe casa competentemente mobilada
para n’ella se fazerem as audiencias e todos os serviços concernentes a este Julgado»(190).
Em 1878 seria publicado novo Código Administrativo, obra do Partido Regenerador,
tendo como principal figura Rodrigues Sampaio. Veio reformar o cabralista, respondendo
às várias criticas sobre a administração local. O país tinha, na época 21 Distritos, compostos
por 290 concelhos e 160 comarcas.
Os objectivos do novo código eram abrangentes: conservação dos distritos e concelhos
actuais, respeito pelas tradições históricas e seculares do país, manutenção e autonomia
dos foros municipais, eleição quadrienal para os corpos administrativos, renovados
parcialmente de 2 em 2 anos, eleição directa das Juntas Gerais do Distrito, organização
da fazenda municipal, alargando as faculdades tributárias dos concelhos e formação das

(188)
  BARATA, 2016, p. 12
(189)
  AMT – Livro de Registo de Posses e Diplomas do Concelho de Midões, 1841-1887, fl. 35
(190)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1878-1883, fl. 11v.

134
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

receitas indispensáveis para o desempenho de novos serviços ou supressão do conselho


municipal. Este código suprimiu 46 concelhos e vigorou até 1910.
Em 1884 a Comarca de Tábua compunha-se das seguintes freguesias: Covas, Póvoa,
Ázere, Pinheiro, Candosa, Espariz, Tábua, Oliveirinha, Vila Pouca, Lourosa, Bobadela,
Mouronho, Midões, Covelo, Sinde, Carapinha, Ervedal, Sampaio, Medamouros e
S. João(191).

5. A FREGUESIA E PARÓQUIA DE MIDÕES: ENQUADRAMENTO, ÓRGÃOS E


FUNCIONAMENTO

Com o desaparecimento do concelho de Midões sobreviveu a noção freguesia, embo-


ra de pequena expressão, definida no já referido decreto de 18/07/1835. Tinha à frente
dos seus destinos uma Junta de Paróquia, que durante décadas foi o principal órgão de
administração pública ao nível local.
Os livros de actas respeitantes a este órgão cobrem um vasto campo cronológico, desde
1835 a 1918 (vide fotos 29 e 30), tendo a estrutura orgânica evoluído de acordo com a
lei vigente (ver tabela 7).

  AMT – Livro de Recenseamento dos jurados da Comarca de Tábua, 1867-1884


(191)

135
Tabela 7 – Constituição das Juntas de Paróquia de Midões, 1835-1918(192)
Data Presidente/Juiz Vogais/membros efectivos Vogais substitutos
1835 António Chaves (vereador mais velho)
1838 João Soares Gracia - João Tavares
- Joze Francisco da Costa
- Manoel Francisco
1839-1841 Cezar Ribeiro Jozé Ribeiro de Azevêdo (Secretário)
Abranches Castelo
Branco
1847-1849 Máximo Tavares - Bento Ignácio Duarte de Almeida - António Joze de Alcantra
- Ambrozio Sanches da Fonseca - António Joaquim de Oliveira
- Manoel Madeira Ilharco
1850-1851 Dr. António Soares - Cesar Ribeiro de Abranches Castello Branco - Bernardo Joze Delgado
d’Albergaria - António da Silva Moreira Coelho - Joze Soares da Fonseca Magalhães
Domingos Borges de
Figueiredo (Esporão)
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

136
1852-1853 Manuel Joaquim - Francisco Augusto da Silva Coelho - Joze da Cruz
Borges - José Maria da Costa Veiga - Bento Ignácio Duarte de Almeida
1854-1855 João Victor da Silva
Brandão

(192)
  Fonte: AJM - Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões: 1862-1871; 1871-1877; 1878-1883, 1883-1893; 1893-1897; 1897-1902; 1905-1911; 1911-1918;
Livro da Receita e Despesa da Confraria do Senhor e Santissimo da Vila de Midões, 1802-1850; Livro da Receita e Despesa da Confraria de Santo Estevão da Vila de Midões,
1802-1839; AMT - Livro das Actas das Sessoes e Acordãos da Câmara Municipal de Midoes, 1839-1840; Livro das Actas, Sessões e Acordãos da Câmara Municipal da Vila de
Midões, 1841-1848; Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854; Livro das Actas das diversas eleições no Concelho de Midões 1844-1852; Livro de
Registo de Testamentos da Administração do Concelho de Midões, 1836-1843.
Presidente Vogais Tesoureiro Escrivão
1862-Out. 1867 António Maria -António Augusto -João Álvaro d’Almeida - António Monteiro
Gaudencio Borges Coelho -Manoel Tavares - Augusto Joze Dias
(Pároco e Presidente)
- Joze Augusto
d’Almeida
Jozé Ribeiro
d’Azevedo
- Bento Ignacio
Nov. 1867-1871 Id. -Bel. Roque Ribeiro César Antunes Augusto Joze Dias
Domingos da Fonseca d’Abreu Abranches
Ferrão - Christiano Augusto
da Silva Moura
- Augusto Cezar da
Silva
- Francisco Borges
Coelho
1872-1873 Domingos da Fonseca - Miguel Achyles Id. Id.

137
Ferrão (pároco e Soares d’Albergaria
presidente) - Bel. Nicolau Ribeiro
d’Abranches
- Christiano Augusto
da Silva Moura
- Augusto Cezar da
Silva Fernandes
1873-1875 António Mendes - Bel. Roque Ribeiro Id. Id.
d’Alcântara d’Abreu Abranches
- Miguel Achilles
Soares d’Albergaria
- Christiano Augusto
da Silva Moura
- Augusto Cezar da
Silva
1876-1878 Id. Id. Id.
(reeleitos)
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE
Data Presidente Vice-Presidente Fiscal Vogais Tesoureiro Escrivão/Secretário
1878-1879 Bel. Roque Ribeiro Christiano Augusto Joze Ribeiro Efectivos: Cezar Antunes Id.
d’Abreu Abranches da Silva Brandão d’Azevedo -Manoel Joaquim
Borges
- Joze Ribeiro
d’Azevedo
- Nicolau Álvaro
Sergio d’Almeida
-Substitutos:
- João Alvaro
d’Almeida
- Francisco Borges
Coelho
- Joze Maria da Rocha

1880-1881 Id. Id. Id. Efectivos: Id. Id.


- Francisco Borges
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

138
Coelho
- Joze Ribeiro
d’Azevedo
Substitutos:
- António Augusto
Cruz
- Roque Pinto Garcia
1882-1883 Id. Id. Id. Efectivos: Id. Id.
- António Augusto
Coelho
- Manoel Joaquim
Borges
Substitutos:
- Alfredo Joze Stofal
- Eduardo Pereira
Soares
Data Presidente Vice-Presidente Fiscal Vogais Tesoureiro Escrivão/Secretário
1883-1885 Id. Id. Id. Efectivos: Id. Id.
- Manoel Joaquim
Borges
- António Augusto
Coelho
Substitutos:
- Diogo d’Almeida
Loureiro Castello
Branco
- Joaquim Joze de
Lemos

1886-1889 Id. Id. Id. Efectivos: Id. Id.


- Manoel Joaquim
Borges
- António Augusto

139
Coelho
Substitutos:
- Joze Maria da Costa
Veiga
- Álvaro Amaro
d’Oliveira
- Joze Pereira Soares
1887 Id. Id. Id. Efectivos: Id. Id. Id.
Augusto Cezar da - Manoel Joaquim
Silva Borges
- Joze Maria da Costa
Veiga
Substitutos:
-Augusto Cezar da
Silva
- Roque Pinto Garcia
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE
Data Presidente Vice-Presidente Fiscal Vogais Tesoureiro Escrivão/Secretário
1888 Id. Id. Id. Id. Id. Id.
Joze Dias Agostinho
(15/04/1888)
1889 Id. Id. Id. Id. Id. Id.
1890-1892 Id Id. Id. Efectivos: Manuel Braz
- António Augusto (Midões, entra a
Coelho 7/6/1891)
- Manoel Joaquim
Borges
Substitutos:
-Augusto Cezar da
Silva
- Joze Maria da Costa
Veiga
Data Presidente Vice Presidente Tesoureiro Vogal Secretário
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

140
1893-1895 Francisco Freire Francisco Borges António Ribeiro José Balthazar da Nicolau Álvaro
d’Oliveira Garcez Coelho Silva d’Almeida
1896 Id. Augusto Cezar da Id. Id. Affonso Henriques de
Silva Souza
1897-1898 Id. Id. Id. Id. Id.
1899-1901 Id. Id. Id. - Alfredo José Stoffel Id.
Fernando Augusto - José Balthazar da
da Silva Silva
- Fernando Augusto
da Silva
Data Presidente Vogais Tesoureiro Secretário
1902-1904 Id. - Abílio d’Almeida António Cruz de Id.
Simões Costa Moura
- António Fernandes
Coelho
- António da Costa
Junior
- Nicolau Álvaro
d’Almeida
1905-1907 Id. - António Fernandes António Fernandes Id.
Coelho Coelho
- António Joaquim
Tavares
- Francisco da Cruz
- Albano Álvaro
d’Almeida
1908-1910 Id. - António da Costa Antonino d’Almeida Id.

141
(Comissão Junior (Midões)
Paroquial) - António da Costa
Marques
- António Francisco
Grillo Junior
Agostinho Garcia
Data Presidente Tesoureiro Secretário Vogais Efectivos
1910-1913 Arnaldo Máximo Antonino d’Almeida Affonso Henriques de - Fernando Augusto da Silva
(Comissão Coelho Sousa - António Armando Soares d’Albergaria
Republicana) - Arnaldo Vieira das Neves
- Eduardo Pereira Soares
Data Presidente VPresidente Tesoureiro Secretário Vogais
1914-1918 Id. António Joaquim Antonino d’Almeida Id. - Augusto da Cruz de Moura
Tavares - José Afonso Soares - António Rosa Pinto
Coelho (Midões) - Camilo Nunes Machado
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

No auto de posse manteve-se, nos primeiros tempos, o juramento de fidelidade ao


Rei e à Carta Constitucional. A composição deste órgão sofreria modificações ao longo
do tempo, decorrentes das alterações legais.
Também por esta altura surge a figura do Regedor de Paróquia, com autoridade admi-
nistrativa delegada pela administração central, com amplos poderes no campo da ordem e
cumprimento da lei. O registo mais antigo sobre a actividade de um regedor data de 1838
e diz respeito a António Coelho. A actividade do regedor perdurou até à queda do Estado
Novo e conseguimos recolher informações sobre os regedores e regedores substitutos de
1838 até 1970, embora com algumas falhas (ver tabela 8):

Tabela 8 – Regedores da Freguesia de Midões, 1838-1970(193)


Data Regedor efectivo Regedor substituto
1838 António Coelho
1842 Maximo Tavares
1849 José Borges
1849-1852 António de Brito
1855-1857 Luis Francisco José Borges
Jose Tavares Borges
1863 José Pereira Soares
1866 Augusto César da Silva
1872 Frederico Augusto Cid Figueiredo Ornellas
1874-1876 Francisco Borges coelho
1876-1877 Augusto Cezar da Silva
1877-1878 Manuel Augusto Dias
1878-1879 José Augusto d’Almeida Nicolau Pinto
1879-1881 Manuel Augusto Dias
1881-1886 José Augusto d’Almeida
1886-1890 Manuel Augusto Dias Roque Pinto Garcia
1890-1897 José Augusto d’Almeida Nicolau Pinto
1897-1900 Francisco Morais Junior Joaquim Lourenço
1900-1901 José Augusto d’Almeida Nicolau Alvaro d’Almeida

  Fonte: AUC – Fundo do Governo Civil de Coimbra: Livro de Registo dos diplomas de regedores da paróquia
(193)

e outros alvarás, 1848-1851, Livro de registo dos diplomas de nomeação e exoneração dos Regedores de Paróquia,
1852-1858, 1852-1858, 1874-1877, 1887-1900, 1900-1910, 1910-1920, 1920-1936; Livro de registo de
regedores dos concelhos, 1871-1915, 1874-1915, 1896-1933, 1917-1935; Livro de termos de juramento
de regedores dos concelhos, 1910-1915, 1915-1919: AMT - Livro das Actas, Sessões e Acordãos da Câmara
Municipal da Vila de Midões, 1841-1848; AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1862-1871;
1871-1877; 1878-1883; 1883-1893; 1893-1897; 1897-1902; 1905-1911; 1911-1918; Livro das Actas das
Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1918-1937; 1937-1953 Annuário Commercial de Portugal, (1897-1902),
Vol. II (1902-1919; 1921-1982), Vol. III (1920).

142
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Data Regedor efectivo Regedor substituto


1901 - 1904 Francisco da Cruz
1904-1906 Zeferino Dias da Silva José Dias Agostinho
1906-1908 Francisco da Cruz
1908-1909 António d’Oliveira Coelho Agostinho d’Abrantes Ferrão
1909-1910 Alfredo Jorge
1910 Luis d’Abrantes da Costa Eduardo Joaquim de Brito)
António d’Oliveira Coelho
1910-1913 António Joaquim Tavares
1913 António Francisco Grilo
1913-1916 Arthur Mendes António Calisto d’Oliveira
1916-1919 Germano da Fonseca
1919-1920 José Afonso Soares Coelho Franklim Abrantes Ferrão
1920 Eurico Rodrigues Ferrão
António Francisco Grilo
1920-1922 José Pinto Abrantes
1922-1926 Eurico Rodrigues Fernandes Manuel Henrique Morais
1926-1932 Germano da Fonseca
1932-1934 Eurico Rodrigues Fernandes
1934-1935 Germano da Fonseca
1935-1939 Eurico Rodrigues Fernandes Francisco de Figueiredo
Augusto Monteiro
1946-1960 Germano da Fonseca
1962-1970 Fernando Ramos

Existe abundante documentação sobre as reformas administrativas iniciadas nos anos


40 ao abrigo de decisões governamentais. Tratou-se do projecto de arredondamento das
freguesias, definido pela Carta de Lei de 02/12/1840, que tinha como objectivo eliminar
situações anómalas a nível nacional, como o facto de existirem lugares que pertenciam a
duas e mais freguesias, ao mesmo tempo que procurava combater impostos exagerados,
como a derrama paroquial (côngrua).
O projecto de arredondamento das freguesias iniciou-se em 1841 e ficou concluído
a 29/03/1842, estando na base do decreto governamental de 31/12/1853 que alterou a
divisão judiciária e administrativa (194).
Esta reforma, que também pretendia abranger a administração eclesiástica, apresen-
tava variados fundamentos para as alterações sugeridas: argumentos de natureza fiscal,
em especial a diminuição dos encargos com pessoal como «as gratificações e ordenados

  Também não sofreram alterações: Álvares, Fajão, Góis, Pampilhosa, Penacova, Lousã, Poiares, Penela,
(194)

Avô e Oliveira do Hospital.

143
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

do Administrador do concelho, de um Escrivão da Administração, de um Escrivão da


Camara Municipal, dos officiaes de diligencias d’aquella e d’esta, dos Medicos, Cirurgiões,
e Boticários de partido, e outros…»(195); a extinção dos Juízes Ordinários «os quaes todos
desejam ver extinctos, pelas chicanas, enredos, e protecção aos criminosos, para que só tem
servido, com raras excepções, na maior parte das terras»(196); e o alargamento da sede dos
julgados, cabeças de comarca, «não só para dar maior interesse aos Juizes de Direito, mas
para que os povos podessem ao mesmo tempo gosar da illustração d’um Juiz com respon-
sabilidade, em lugar d’um Juiz Ordinario, que se desculpa sempre com a sua ignorância».
Esta nova divisão contou com as indicações e sugestões remetidas não só pelas Câmaras
Municipais, mas também as encaminhadas do Administrador do Concelho. Na sessão de
09/06/1854, a Câmara dos Deputados autorizou o Governo a completar a reforma da
divisão territorial e judicial, corrigindo, nos distritos já reformados situações de absoluta
necessidade, estendendo-a, por outro lado, aos distritos ainda não alterados. Não vinha
esta medida ao acaso, pois nesta altura eram já muitas as reclamações apresentadas ao
Governo e Cortes contra a reforma executada, pedindo que a mesma se recentrasse, em
especial, no arredondamento das freguesias, circunscrição administrativa onde muitos
problemas se mantinham inalterados.
Vertidas as intenções no decreto de 06/09/1854, assumiram a liderança da reforma
as Juntas Gerais dos Distritos, consultadas a esse respeito. No caso de Coimbra, foram
nomeadas três comissões (alto distrito, centro e poente) que se ocuparam de examinar as
representações e propor soluções.
A reforma das freguesias, das paróquias e dos concelhos continuou na ordem do dia nos
anos seguintes, uma vez que persistiam, em muitos locais, situações complexas: limites de
paróquias, Igrejas localizadas no extremo das freguesias, sustentação dos párocos, dificul-
dade em administrar os sacramentos, povoações a pertencerem a um ou mais concelhos,
desproporção no número de fogos.
Pela lei de 04/06/1859, o governo ficou autorizado a proceder no continente e ilhas
à divisão, união e supressão das paróquias, respeitando a lei de 1840. Pela Portaria de
27/06/1859, foi o processo retomado pedindo-se aos Governadores Civis e Prelados
Diocesanos, que informassem sobre a melhor divisão paroquial do seu distrito, procurando
que «se attenue a grande desigualdade que se encontra na actual divisão de Parochias, para
que não succeda, como actualmente acontece, serem em muitas d’ellas tão apoucados os
recursos, que mal chegam para fazer face ás despezas indespensaveis do culto, á congrua
sustentação do Paroco».
Ao nível local foram nomeadas comissões diocesanas e distritais encarregues de ana-
lisar e remeter as propostas finais. A nível nacional esta tentativa não logrou resultados

  «Divisão Territorial» In O Conimbricense, nº 19, 28/03/1854, p. 1


(195)

  «Divisão do território In O Conimbricense, nº 75, 10/010/1854, p. 1


(196)

144
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

satisfatórios: nem todos remeteram os esclarecimentos, outros apenas em parte o fizeram,


alguns declararam não confiar nos trabalhos remetidos.
O processo da divisão territorial seria relançado, a nível nacional, pelo decreto de
21/04/1862: o Governo solicita aos Governadores Civis que informem sobre os concelhos
que devem ser restaurados, suprimidos ou alterados, criando comissões em cada uma
das comarcas judiciais (Comissões Comarcãs), compostas pelos seguintes indivíduos:
Pároco ou Presbítero nomeado pelo prelado diocesano; Delegado do Procurador Régio;
Administrador do Concelho, Presidente e Vice-Presidente do concelho.
Em Setembro de 1862, a Secretaria de Estado dos Negócios do Reino define a criação,
em cada capital de distrito, de uma comissão, presidida pelo Governador Civil, Director
das Obras Públicas, Delegado do Tesouro e dois cidadãos de reconhecida aptidão e pro-
bidade, e que tenham grande conhecimento do distrito. A esta comissão caberia analisar
os requerimentos, representações e reclamações, inserindo as alterações que julgasse ne-
cessárias, remetendo, por fim, o projecto de arredondamento ao Ministério dos Negócios
Eclesiásticos e de Justiça.
O Mapa da Divisão Paroquial proposto pela Comissão Comarcã de Coimbra (relati-
vo aos concelhos e julgados de Coimbra, Condeixa e Penacova) foi aprovado em Sessão
Comarcã do dia 25 de Abril de 1865(197).
As leis de administração civil de 26/6/1867 e 11/7/1867 vieram dar continuidade à
reforma da Administração Civil, há muito discutida, mantendo as paróquias eclesiásticas,
mas criando a partir destas novas paróquias civis por união daquelas, não alterando, porém,
a divisão eclesiástica. A lei definiria, então, um conjunto de indicações que as juntas de
paróquia deviam seguir: nas cidades e vilas nenhuma paróquia civil ficaria com menos de
1000 fogos; nas povoações rurais, a paróquia civil não poderia compreender menos de
500 fogos; nenhuma paróquia eclesiástica ficaria a pertencer a mais de uma paróquia civil,
nem a paróquia civil a mais do que um concelho; e ter-se-ia em atenção as atribuições e
encargos, bem como a comodidade dos povos.
Às Câmaras Municipais competia propor a divisão das paróquias civis, que se queriam
completas, ou seja, de modo a que não ficassem pertencendo a diferentes concelhos, os
quais não poderiam ter menos de 3.000 fogos. Por fim, e ainda à Câmara Municipal, na
divisão e circunscrição dos concelhos, competia seguir um conjunto de critérios:
«1.ºÁ extensão da área territorial e á densidade da população; 2.ºÁs condições eco-
nómicas e á commodidade de cada grupo de povoação; 3.º Á natureza e à permanência
das relações tradicionaes e de commercio entre as diversas povoações; 4.º Á similhança
das especialidades agrícolas e industriaes, e ás affinidades commerciaes produzidas pela
necessidade ou conveniência da troca de certos e determinados productos; 5.º Ás divisões
naturaes do solo produzidas pelos rios e pelas montanhas, e á maior ou menor facilidade

  Mappa Geral das Povoações, casaes, quintas, etc., das freguezias que compõem a Comarca de Coimbra, Coimbra,
(197)

Imprensa da Universidade, 1865 pp. 23-25

145
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

de communicações por meio de pontes, estradas e vias férreas; 6.º A quaesquer outros
factos não especificados neste artigo, que tendam a dar aos districtos, aos concelhos e às
parochias verdadeira unidade natural»(198).
Os governadores civis apresentariam as consultas às juntas gerais dos distritos, en-
viando estas ao governo a sua proposta, devendo organizar 3 mapas: o das paróquias civis
por concelhos, indicando o número de paróquias eclesiásticas por cada paróquia civil; os
fogos e a cabeça da paróquia civil; o mapa da divisão dos concelhos indicando o número
de fogos de cada um, o número de paróquias civis, e qual a capital do concelho; e um
mapa do distrito administrativo, tendo em atenção a importância económica dos distritos,
atribuições, comodidade e interesse dos povos.
Às Juntas Gerais do Distrito foi concedido um prazo para organizar os respectivos
mapas de cada uma das circunscrições definidas. No caso das paróquias civis o mapa
concelhio deveria conter a indicação «das parochias ecclesiasticas que deve ficar com-
prehendendo cada parochia civil, dos fogos de que constar, e da povoação que deva ser
cabeça da parochia civil»(199).
A 30/07/1867 e tendo em atenção o preceituado na lei a Junta de Paróquia de Midões
emite a sua opinião:
«A Junta acordou unanimemente q’ se forme uma Parochia Civil com a séde e Midões,
q’ comprienda as freguesias de Midões, Póvoa de Midões (situados na margem direita do
Rio de Cavallos) e das freguesias de Oliveirinha, Covas, e Candoza, situadas na margem
esquerda do mesmo rio»(200).
As diversas propostas enviadas pelas juntas gerais do distrito foram analisadas pelo
Conselho de Estado, em Novembro de 1867, que nomeara uma comissão para estudar
o assunto e dar o seu parecer. A reforma administrativa seria publicada, oficialmente, em
Dezembro, tendo-se suprimido 125 dos 302 concelhos existentes, ficando o país organiza-
do em 17 distritos, 177 concelhos, e 1.046 paróquias civis e 3.966 paróquias eclesiásticas,
com o número de fogos de 1.075.236(201).

5.1. A actuação da Junta de Paróquia de Midões: relações administrativas com o local,


municipal e regional

Conhecemos a actuação da Junta de Paróquia de Midões entre 1862 e 1918 de forma


ininterrupta, pela consulta das actas respectivas. A atenção muito especial que a Junta de

(198)
  O Conimbricense, n.º 2085, 24/8/1867, p. 1
(199)
  ibid.
(200)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1862-1871, fl. 15v.
(201)
  «Nova divisão de Portugal» In O Conimbricense, nº 2127, 14/12/1867, p. 1

146
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Paróquia foi dando ao longo dos tempos, à questão dos templos da freguesia e da cons-
trução da freguesia foram destacados para o capítulo apropriado dedicado ao património.
Neste longo período de tempo, o Município e o Governo utilizam a freguesia/paróquia
como base para o lançamento dos impostos, caso da décima ou da côngrua, nomeando
informadores locais.
Um dos raros assuntos que subiu ao Governo Civil remetido pela Câmara Municipal
de Tábua data de 1858 e refere-se às obras nas fontes de Midões. Tendo a edilidade
reunido com o AC de Midões este último requerera que a Camara «…com a possível
brevidade providenciasse para que as fontes de Midões fossem compostas, pedindo mais
para que se tomasse em consideração o estado de ruina em que vão estando as calçadas
d’aquella villa»(202).
Por ofício enviado pelo PCMT, José Baptista Veloso, a 21/11/1858, recorda-se a
requisição feita pelo AC, há mais de 2 meses encarregando o vereador José da Cunha da
Costa Veiga «…para tractar da compostura da fonte da Carixa, e como o dito vereador
visse que aquella fonte para ficar boa precisava de melhor compostura, deliberou-se em
sessão de 14/11 que se passassem editaes para se arrematar aquella obra, que esta Camara
espera se conclua em pouco tempo. É certo que o estado de ruina não é tanto como se
quer fazer, e esta Camara sabe que as mesmas fontes tem sido limpas por ordem do mesmo
Administrador assim como o são as de mais do concelho. Em quanto porem á compostura
das calçadas da mesma Villa de Midões, com pesar esta Camara se vê obrigada a dizer a
V. Ex.ª que nada se póde por emquanto fazêr. V. Ex.ª sabe o atrazo em que esta Camara
tomou posse do Municipio, e nestas circunstncias não é possível poder remediar tudo, e
não faz pouco em acudir ao mais necessario; mas quando esta Camara estivesse em cir-
cunstancias de mandar compôr as calçadas de certo preferiria primeiro as d’esta Villa de
Taboa, que não estao em melhor estado».
A junta de paróquia reunia na Casa das Sessões (Sacristia da Igreja), na Residência
Paroquial ou na casa do presidente. A 01/03/1896 aprovou uma derrama de 12% sobre
as contribuições gerais do estado para diversas despesas, essencialmente ligadas ao culto,
onde se destacava a abertura de uma escada para o camarim e arranjo do «pavimento
superior da sachrestia, onde se deve fazer a caza das sessões da Junta, que não tem»(203).
A obra seria arrematada, a 06/12 pelo carpinteiro António Garcia, reidente na freguesia,
pela importância de 150.000 reis
Ocupava-se de assuntos variados: atestados (pobreza, isenção militar) recenseamentos
escolares; lançamento de 10% sobre as contribuições gerais do Estado para as despesas da
paróquia e 3% para as despesas com instrução primária; lançamento do rol e cobrança
da contribuição paroquial; organização de orçamentos de receita e despesa; lançamento

(202)
  AUC – Fundo do Governo Civil: «Obras nas fontes de Midões», 1858 In .Documentos relativos a obras
públicas de melhoramentos rurais e urbanos do distrito, 1850-1894
(203)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1893-1897, fls. 13v.-14

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Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

e cobrança do imposto sobre o trabalho e serviço braçal; gestão dos dias de serviço bra-
çal (aplicado na conservação de caminhos e fontes). Por vezes, respondia a solicitações
superiores.
Exercia, também, um papel de fiscalização sobre as contas das confrarias, passando a
gerir as do Santíssimo Sacramento e de Santo Estêvão.
Com responsabilidades crescentes ao nível da gestão da freguesia, contava no terreno
com o apoio de zeladores e guardas campestres, nomeados pelo município, que velavam
pelo cumprimento das posturas municipais, em matérias do interesse público - como
usurpações, vedações de terreno - bem como por informadores para os prédios rústicos
e urbanos.
Sabemos, pelo enquadramento legal da época, que a principal das preocupações da
junta de paróquia passava pela gestão e decência do culto praticado na freguesia, estando
obrigada, por lei, a entregar inventários dos seus bens de forma periódica.
Porém, as carências quase sempre foram superiores às disponibilidades. É bom exemplo
deste paradigma a solicitação feita a 01/12/1878, em sessão extraordinária, da qual resul-
tou uma petição a enviar ao Bispo Conde nos seguintes termos: «Diz a Junta de Parochia
da Freguezia de Midões, que sabendo passa a ser propriedade do Estado o Convento de
Cellas, junto a Coimbra, pelo óbito da ultima religiosa, e tendo como V.Ex.ª não ignora
a nossa Igreja Matriz absuluta carencia de quazi tudo o que é mais issencial para decencia
do culto divino, e não tendo como não tem, meios para o conseguir, vem rogar e pedir
submissamente a V.Ex.ª para ser contemplada com algumas alfaias religiosas e damascos
do suppra dito convento»(204).
Uma das nomeações mais importantes efectuadas pela Junta de Paróquia era, a este
respeito, a do sacristão, como se infere da indicação de António Tavares Fernandes para
o desempenho da função em Outubro de 1872. Por 7200 reis competiam-lhe um leque
alargado de atribuições:
«…tocar as Ave-marias de manhã, ao meio dia, e ao anoitecer todos os dias; borrifar
com agua e depois varrer toda a Igreja, côro e torre, sacudir o pó aos santos e moveis
todos os sábados e quando seja necessario; ter sempre com aceio e limpeza as alampadas,
turibulo, cruzes, castiçaes; e dobrar todos os paramentos e arrecadal-os todas as vezes que
servirem; de tocar os sinos ao sair do Santissimo, e para a missa bem como ajudar a ella
todos os Domingos e dias sanctificados; e afixar nas portas prinsipaes todos os iditaes que
forem lidos à missa conventual e que devam ser afixados»(205).
As finanças paroquiais obrigavam a um delicado equilibrio. Constituíam despesas
fixas os salários do relojoeiro e do sacristão, que em 1862 recaía na mesma pessoa, Luis
Pais, de Midões, o qual acumulava a verba de 14.000 reis (206); a cera, a compra de livros,

(204)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1878-1883, fl. 7
(205)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1871-1877, fl. 12v.
(206)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1862-1871, fl. 2v.

148
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

o registo paroquial, a gratificação ao secretário, os santos óleos e a festa do santissimo, na


qual se gastou em 1863 8.000 reis.
Para fazer face às despesas, a Junta de Paróquia arrematava o milho da esmola da Páscoa,
ou a azeitona dos olivais das «antigas confrarias», sitas em Midões, Casal da Senhora e Vila
de Matos. Actos públicos que decorriam à saída da missa, no adro da Igreja e previamente
anunciados em editais: em Fevereiro de 1862 é arrematada por Miguel Duarte de Almeida,
de Midões, por 10 alqueires de azeite. Outra forma de angariar receitas passava pela venda
das oliveiras secas. A partir de 18/11/1866 a Junta de Paróquia passou a arrendar não só
os olivais (a azeitona em si mesma) mas também as propriedades das antigas confrarias:
- Cezar Alves, arrendou a sorte da preza por 4 anos pagando pelo S. Miguel, 2400 rs;
- Manoel Pereira, do soito de porcos, a sorte sita à Capela de Touriz, 4 anos, 2000 rs;
- Joze Pereira, do Cazal, olival da Rebôla, 2.000rs
- Joze da Cruz, de Midões, a sorte da Lameira, 360 rs
- Luiz Pais, de Midões, olival do Outeiro Vistôzo, sendo a azeitona para a junta, 1800
- Cazemiro Gomes, do Casal, sorte de mato e olival sito a Val d’Area, senco azeitona
para a junta, 600rs;
- João Almas, do Cazal, olival pequeno sito á Tapadinha, azeitona para a junta, 620 rs
- Francisco Marques, do Cazal, pela renda do olival sito á Tapadinha, azeitona para
junta, 180 rs;
- Cezar Alves, olival grande da Rebôla, azeitona para a junta, 2880 rs(207).

As verbas cobradas pelas sepulturas no cemitério paroquial ou o barro que a partir de


1906 começou a ser explorado na base do Outeiro de S. Miguel tornaram-se importantes
fontes de rendimento.
Em termos de vias de circulação, é de levar em atenção que o sentir político da época
fazia derivar o progresso da capacidade em ultrapassar a interioridade. Assim, Tábua e
Midões aparecem nos anos 60 e décadas subsequentes de Oitocentos entre as localidades
que mais se fazem queixar através do deputado Monteiro Castello Branco, acerca da
necessidade de construção de ramais e estradas.
A 25/02/1888, a Junta de Paróquia delibera enviar uma mensagem de reconhecimento
e agradecimento ao Eng.º José Augusto das Neves Cabral, pelo apoio à representação «…
que a mesma Junta fez subir ao Governo de Sua Magestade pela repartição d’obras publicas,
pedindo em nome dos povos desta freguezia, e por conveniencia de toda esta região, a
construcção d’um ramal d’estrada que ligue Midões com a estrada real n.º 52 de Galizes
ao Carregal do Sal (nas alturas da ponte da atalhada sobre o rio Mondego, representação
que foi atendida»(208).

  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1862-1871, fls. 11-11v.
(207)

  AJM – Livro das Sessões e Deliberações da Junta de Paróquia de Midões, 1883-1893, fls. 46 e 48v.
(208)

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Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Apesar de decretada, a estrada não foi construída de imediato estando, nos finais de
1905, em início de construção, motivo pelo qual a JP representa ao Rei, em Dezembro
do referido ano para que decrete a construção da variante ligando «…directamente para
Carregal do Sal aproveitando a Villa Meã do mesmo concelho um troço de estrada já
aberto», alterando o percurso inicial da mesma estrada pela dificuldade na execução de
«numerosas e importantes obras d’arte» colocando assim «…esta parte populosa e rica
da provincia da Beira, em rápida e curta communicação com a mais próxima Estação
dos Caminhos de Ferro» (209). A 12/07/1908 aprova-se voto de louvor e reconhecimento
ao Dr. Zeferino Cândido, deputado às Cortes pelo círculo de Arganil, pelos esforços em
torno da obra «ainda em principio e (…) obra d’altissimo interesse para o desenvolvimento
comercial e agricola [Fl.28v.] desta grande e productiva região».
A instrução primária ganha novo alento nas preocupações paroquiais a partir da década
de 70. Na verdade, e em termos governativos, só a partir de finais daquele decénio ganhou
força o desejo de instruir o povo, por parte dos meios cultos, respondendo à exigência
popular sobretudo do operariado. Alguns factos contribuíram para a tomada de consciên-
cia: a vinda de José Fontana para Portugal, em 1872 e papel que teve na divulgação da Iª
Internacional e organização dos movimentos operários; a fundação do PS em 1871; ou a
fundação do Partido Republicano em 1878.
No entanto, e até aos últimos anos do séc. XIX, mantiveram-se muito degradadas as con-
dições da rede de instrução pública, sendo preocupante a carência de edifícios e o mau estado
dos existentes. No censo da população de 01/12/1890, e num total de 5.049.729 pessoas,
cerca de 4.000.957 eram analfabetas, só funcionavam 2.618 das 3.825 escolas primárias
régias as quais, somadas a 1.514 escolas particulares perfaziam 1,17/escolas por 1000 hab.
A esta situação havia a acrescentar: a má distribuição geográfica dos respectivos postos;
e, fora dos centros urbanos mais importantes, não se formavam professores, sendo difícil
fixá-los em postos de província(210).
A 30/05/1872 a Junta de Paróquia aprova a proposta do presidente Domingos da
Fonseca Ferrão requerendo a criação, com base na portaria do Ministério do Reino de
1859, de uma cadeira para o sexo feminino «que julga de grande utilidade para bem da
instrução e da moralidade». Assunto que volta a ser discutido na sessão de 30/06, tendo
a Junta de Paróquia oferecido «…uma salla convenientemente mobilada para as lições
dos alunos, bem como fornecer ás que não tiverem meios livros, papel, tinta e pennas, e
dar no fim do anno áquellas que o merecerem os prémios que é costume darem-se (211).´
Entre 1872 e 1873 a junta de paróquia coloca por 4 vezes a pregão «obra das paredes
para a caza das aulas do sexo feminino e masculino», sem que tenha conseguido o seu objec-
tivo. Porém, à 5ª tentativa, ocorrida a 06/07/1873 foi a obra, por fim, arrematada por Joze

(209)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1905-1911, fl. 3
(210)
  BEJA & SERRA & MACHÁS & SALDANHA, 1990, p. 72
(211)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1871-1877, fls. 10v,. 11

150
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Luis Alves, casado, morador na Povoa de Midões pelo preço de 2250 reis a braça, ficando a
junta paroquial com as seguintes obrigações: «abrir os alicerces, a conduzir a pedra, o barro,
e dará a cal para as juntas de pedra, bem como dará os pinheiros e madeiras precisos para os
andames e pôr-lhe ali água para amassar o barro»; examinará a obra «amiudadas vezes»(212).
A 27 de Outubro seria arrematada a obra de madeira, por Manuel de Sousa Ricardo,
de Midões, por 65.000 rs, dando a JP a madeira e ferragens, com obrigação de tudo ficar
pronto até Março de 1874.
Estas obras foram, no entanto, provisórias, uma vez que a 30/03/1874 a JP lançava
uma receita e despesa extraordinária no valor de 550.000 reis, valor da derrama a lançar
pelos paroquianos, a cobrar em dois anos e para com ela se fazer uma escola do sexo fe-
minino «…não havendo ninhuma para se arrendar, nem a Junta esteja nas circonstancias
de pagar a renda anual»(213).
A 20/08 do mesmo ano e estando assumidas as responsabilidades de casa e mobília
para a escola do sexo feminino, e estando criada a cadeira, a junta delibera «mandar fazer
caza para a dita escholla», enquanto no ano seguinte manda lançar e cobrar a derrama –
situação que constituirá um problema na medida em que muitos paroquianos alegam não
ter meios para cumprir os pagamentos.
Além de Midões, existia outra cadeira para o sexo feminino em Tábua, criada por de-
creto de 10/06/1874. Quando às cadeiras para o sexo masculino, funcionavam, durante
esta década, em Àzere, Candosa, Covas, Midões, Mouronho, Povoa de Midões, Sinde,
Tábua e Oliveirinha (criada por decreto de 20/07/1876) (214).
Quando o encargo das escolas de instrução primária passou para a câmara municipal,
as escolas feminina e masculina de Midões foram alvo de vistoria do Sub-Inpector Escolar,
Bento Joze da Costa, a 14/12/1882 cujas conclusões foram negativas para a escola feminina
e positivas para a masculina:
«Não posso deixar de sentir que a do sexo feminino esteja tam desprovida de mobília
e utensilios que pouco falta para não haver alli um obgecto symbolico de que é uma caza
d’instrucção. VS.ª e a Junta a que dignamente preside não desconhecem a obrigação de
ministrar caza de rezidencia para o professor, casa escolar e a mobília, e utensílios.
Peço pois a VS.ª faça com que desapareçam as faltas notadas, cujos inconvenientes são
manifestos, afim de não se estorvar o progresso moral desta freguesia.
Grato me é declarar a VS.ª que achei muito satisfatória o estado de adiantamento dos
alunos da eschola do sexo masculino, o que me obriga a consignar aqui um voto de louvôr
ao professor respectivo» (215).

(212)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1871-1877, fls. 20-20v.
(213)
  Ibid .fl. 24
(214)
  AUC – Fundo do Governo Civil: Mapa descritivo das cadeiras de instrução primária, sexo masculino no
distrito, década 70, séc. XIX
(215)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1878-1883, fl. 46v.

151
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Em 1888(216) existiam no distrito 186 escolas, sendo 159 cadeiras masculinas e 58


femininas. Tábua tinha 16 escolas, sendo 10 masculinas e 2 do sexo feminino, tendo 10
providas e 6 sem cadeiras: Ázere, Candosa, Carapinha, Covas, Covelo (não tinha cadeira),
Espariz (não tem cadeira), Meda de Mouros (não tinha cadeira). Midões (tinha duas, ambas
na vila) Mouronho, Oliveira de Fazemão (não tinha cadeira), Oliveirinha, Pinheiro (não
tinha cadeira), Póvoa de Midões, S. Paio, Sinde, Tábua com 2. Em 1894 este panorama
mantém-se sem grandes alterações de relevo, com excepção de estarem providas Espariz,
Meda de Mouros e Oliveira de Fazemão(217).
Em Fevereiro de 1891 a CM Tábua ordena o recenseamento das crianças da freguesia
em idade escolar, encarregando Armando Duarte Loureiro d’Almeida desse trabalho, na
impossibilidade do secretário da junta.
Em Agosto de 1899 a JP decide enviar uma representação ao Rei «…contra o abandono
a que foi votada a casa d’eschola d’ambos os sexos d’esta freguezia, e conseguintemente
vem tambem pedir a Vossa Magestade se digne ordenar se façam na mesma casa os reparos
mais urgentes e inadiáveis»(218).
As questões correlacionadas da saúde e higiene assumiam, por vezes, proporções ines-
peradas. Em 1885 e perante a ameaça da epidemia de cólera morbus a JP, por indicação do
Administrador do Concelho, nomeia uma Comissão/Junta de Beneficência «para socorrer
os pobres e desvalidos de fortuna no caso desta freguezia ser invadida»(219).
Uma comissão composta por homens notáveis e influentes na região: Dr. Abílio
d’Almeida Simões e Costa, médico do partido municipal do concelho; Francisco Corrêa
de Carvalho, negociante, da Ribeira; Joze Borges, proprietário, de Touriz; António da
Costa, negociante, Esporão; António Sanches da Fonceca, proprietário, de Midões; Diogo
d’Almeida Loureiro, Juiz de Paz do Destricto de Midões, de Midões; Joze Augusto Madeira
d’Andrade, farmacêutico, de Midões; Miguel Achilles Suares d’Albergaria, Juiz Ordinário
do Julgado de Midões; Antonio Augusto Rocha, proprietário, e Francisco Borges Coelho,
Vereador da Câmara Municipal de Tábua, ambos de Vila de Mato; Augusto Joze Dias,
proprietário, do Casal da Senhora.
Entre 1900-1907 desempenhou funções como médico do partido de Midões o
Dr. Alberto Maria Cruz do Vale (pai do Dr. Fernando Vale), a que, sucedeu no desempe-
nho da função o Dr. Abílio Lopes Gomes.

(216)
  AUC – Fundo do Governo Civil: Movimento dos professores e professoras de instrução primária no distrito
de Coimbra, 1888
(217)
 Id. Movimento dos professores e professoras de instrução primária no distrito de Coimbra, 1894
(218)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1897-1902, fl. 16v.
(219)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1883-1893, fls. 17-17v.

152
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

A CONTENDA ENTRE O MÉDICO DE MIDÕES E A CÂMARA MUNICIPAL DE TÁBUA (1909)

Em 1908/1909 levantou-se uma contenda entre o facultativo do partido médico


de Midões, o Dr. Abílio Lopes Gomes e a Câmara Municipal de Tábua, presidida
por José Cândido Borges da Cunha, com o médico a responder, publicamente, em
várias edições do jornal A Verdade, ao processo que lhe fôra instaurado pela edilidade
tabuense da qual faziam parte dois vereadores com ligações a Midões: o padre e có-
nego de Midões, Francisco Freire de Oliveira Garcez e Antonino da Costa Godinho.
Ao longo de 12 números do referido periódico, e sob o título «Perseguição ao
médico do partido de Midões»(220), seriam publicados os depoimentos do referido
médico, com data de 07/01/1909, acompanhados de 95 assinaturas de testemunhas
e o texto da sua defesa, nos quais refutou as várias acusações que lhe eram feitas:
desleixo profissional, modos rudes e grosseiros, excessos sobre a tabela camarária na
cobrança de honorários para Vila do Mato, Midoes e Póvoa de Midões, e exigência
de pagamento de serviços médicos a doentes que alegavam pobreza.
O assunto também chegou à Câmara dos Deputados. A 01/09/1909 o deputado
republicano Estêvão de Vasconcelos expõe o caso que lhe fôra relatado por carta
acompanhada de um memorial: «…a serem verdadeiros os factos mencionados no
memorial (…) teem-se praticado neste caso irregularidades escandalosas e abusos
revoltantes e torna-se necessario que o Sr Ministro do Reino intervenha, sem mais
delonga, para assegurar o cumprimento da lei e o decoro que devem existir em
todos os serviços do Estado».
Na longa exposição a Câmara Municipal de Tábua é acusada de abusos e irregu-
laridades gravissimas, designadamente, a perseguição efectuada pelo Vice-Presidente
da edilidade tabuense, António Costa Godinho ao referido facultativo, por inspi-
ração do então pároco de Midões, Francisco Freire d’Oliveira Garcez. A terminar a
sua exposição o deputado solicita uma sindicância imediata para averiguar os factos.
A contenda continuaria nos anos seguintes tendo a Junta de Paróquia de Midões,
deliberado, a 15/02/1911 enviar representação à CM Tábua «..para que seja posto
ponto final na perseguição que algumas comissões parochiaes do concelho estão
movendo ao medico do partido de Midões»(221), que agradece o gesto em ofício
datado do mesmo mês.
A nosso ver é um dos mais interessantes episódios que se colhem para a época,
e que terá provocado grande agitação social, dividindo a população da freguesia.
É nítido o fundo político e pessoal que esteve na origem da contenda, que teve
por base a organização dos serviços de saúde e a suposta ilegalidade no exercicio
da Medicina.

 Vide A Verdade, Ano 1.º (1909), n.º 1 a n.º 13


(220)

  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paroquia de Midões, 1905-1911, fl. 45


(221)

153
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Ao dar por findas as suas funções, a JP consignou na acta do dia 16/06/1907 um


testemunho ao Dr. Alberto Vale «…de subida estima, consideração e agradecimento
d’esta freguesia ao profissional distincto, dotado de grandes faculdades de trabalho e com
inexcedível zelo e interesse pelos seus doentes»(222).
Na sua monografia Amândio Monteiro destaca duas figuras, que se distinguiram em
termos médico-assistenciais na freguesia na primeira metade do século XX: O Dr. José
Pina, médico oficial do partido sedeado em Midões durante mais de vinte anos, natural
de Galizes e o Dr. Henrique de Almeida, que além da clínica geral era especializado em
Pediatria e que «assistiu a centenas de partos»(223).
A manutenção dos bens públicos, como as fontes foram preocupação constante na
acção da junta de paróquia. Em 1896 iniciava-se a exploração das águas da fonte do Coito
modificando-se o seu aspecto. Por outro lado a 21/11/1897 parte do povo de Touriz
organiza-se, apresentando abaixo assinado à JP denunciando a intenção de José Ferreira,
daquele lugar «em construir um muro de pedra para tapar a servidão que o povo de
Touriz tem para a fonte publica no sitio do Rucio publico da mesma povoação»(224). Um
documento subscrito pelos seguintes habitantes Camillo Nunes, Henrique Nunes, João
Augusto Coelho, Agustinho Abrantes Ferrão, Joze Gomes Pinto, Luiz da Costa Coelho,
Joze Nunes Branco, Luiz Monteiro, Joze Lourenço, Joze Augusto da Cruz, Antonio Nunes
Branco, Antonio Joaquim Brito.
Atenta às necessidades de comunicação entre os povos, delibera enviar a 05/02/1899
uma representação à Direcção Geral dos Correios e Telégrafos pedindo «…a creação d’um
estafeta e respectiva mala, entre a estação postal de Midões e a povoação de Touriz, bem
como d’uma caixa de correio com encarregado gratuito na referida povoação de Touriz»(225).
Sobre este assunto realçam o aumento da correspondência e a falta de um distribuidor
rural que assegure a distribuição dos 130 fogos de Touriz e Ribeira, acrescentando que
o industrial Camilo Nunes se oferecera para suportar o encargo da criação da caixa de
correio em Touriz. Recorde-se que apesar da dimensão da freguesia só na sede existia um
encarregado do correio: missão entregue a José Augusto Madeira de Andrade (1896-1905,
José Cândido Borges da Cunha (1908-1912) e Maria d’Aleluia Ramos (1914-1928)(226).
Como o assunto não se resolveu, a 07/07/1901 envia representação aquele órgão,
disponibilizando José Gomes Pinto, de Touriz, para encarregado da mesma. Na justifi-
cação da sua necessidade para Touriz enfatiza-se a emigração da população para Espanha
e Alentejo com consequentes dificuldades aos destinatários e remetentes que se têm de
deslocar à cabeça de freguesia.

(222)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paroquia de Midões, 1905-1911, fl. 18
(223)
  MONTEIRO, 2007, p. 90
(224)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1897-1902, fls. 2v.-3
(225)
  ibid. fl. 12v.
(226)
  Dados retirados dos Anuários Comerciais de Portugal

154
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Ainda nesse ano, mas a 17/11 e estando a proceder-se à reforma do serviço público
de correspondência, a Junta de Paróquia envia ao Governador Civil uma representação
dirigida ao Rei para a criação de uma estação postal com sede em Midões apresentando
os seus argumentos:
«…a sua estação postal de terceira classe que está muito longe de satisfazer ás neces-
sidades d’estes pontos, apesar da boa vontade e saber do respectivo encarregado. Senhor!
O movimento da actual estação. Se é a um tempo prova da importancia local, é tambem
um argumento muito valioso para o nosso humilde pedido. A estação de Midões, alem
dos registos, encomendas e bilhetes postaes, rende annualmente mais de 500.000 reis em
estampilhas, sem falarmos nas que consomem dois encarregados de caixas postaes e das
que vende o distribuidor rural na sua passagem por esta freguesia»(227).
A 18/02/1906 a JP aprovaria um voto de louvor ao Dr. Sebastião Maria de Sousa Horta
e Costa pelos «esforços e cuidados em saptisfazer o empenho d’esta junta» na criação da
Estação Telégrafo Postal em Midões. Porém, e apesar dos trabalhos terem começado o
Governador Civil suspende os trabalhos. Anos mais tarde, em 1909, e na sequência de
edital da Inspecção Geral dos Telégrafos e Indústrias Eléctricas «convidando os povos e
corporações administrativas a pedir a creação de Estação Telegrapho Postais» de acordo
com disposições da portaria de 30/6 delibera «…pedir a installação imediata d’esse
melhoramento»(228),
Durante alguns anos, a gestão dos baldios coube às juntas de paróquia. Contudo, a lei
de 26 de Julho de 1850 classificou os baldios em paroquiais e municipais: os primeiros,
cujos moradores da paróquia tivessem posse por 30 ou mais anos; e municipais aqueles em
cuja posse tivessem estado os moradores do concelho durante um igual espaço de tempo.
Pelo Código Civil de 1867 ocorreu importante distinção entre dominio público, pivado
e domínio comum, definindo com a categoria de coisas comuns «os baldios municipais
e paroquiais» (art.º 381, n.º1).
Pela lei de 28/08/1869, aconselhou-se a desamortização dos baldios que não fossem
necessários ao logradouro dos povos dos municípios e das paróquias.
A 04/03/1888 a JP resolve aforar para edificações os baldios «…onde ellas possam
ter logar, subjeitando-se quem os requerer para esse fim aos alinhamentos e condições
que a Junta lhe impozer; ficando como lugradouro comum as lages do Paul, do lugar do
Esporão, bem como as de Touriz», ao preço de fôro para edificações de 10 reis por M2(229).

(227)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1897-1902, fls. 29-29v
(228)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1905-1911, fl. 36
(229)
  AJM – Livro das Sessões e deliberações da Junta de Paróquia de Midões, 1883-1893, fls.46v.- 47

155
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

6. A VIDA ECONÓMICA E SOCIAL ENTRE DOIS SÉCULOS


O país continou essencialmente rural e agrícola, em que a economia de subsistência
coexistia com os avanços da economia de mercado, ritmada pelas dependências externas
«assente na laboriosidade e subordinação existencial da massa dos pequenos proprietários
e rendeiros e assalariados rurais»(230).
De acordo com historiadores e sociólogos o período que medeia entre a segunda metade
do séc. XIX e princípios do séc. XX está associado «…o fim das sociedades camponesas»
entendendo-se, como tal, o termo de um sistema civilizacional, que tem como caracte-
risticas dominantes o isolamento relativo e fraca extensão territorial das comunidades, a
importância estrutural do grupo doméstico a organização da vida económica e social e o
interconhecimento como forma particular de regulação social»(231).
Este paradigma seria substituído pelo aparecimento das sociedades industriais, urba-
nizadas, tecnologicamente avançadas, orientadas para a massificação da produção e alicer-
çadas numa mobilidade e diversificação social acentuadas. Assim e desde 1850 operam-se
várias transformações: progresso intenso, triunfo do capitalismo, desenvolvimento sem
precedentes à escala global, embora assimétrico.
Porém, durante o séc. XIX, a vida social e comunitária de Midões girava em torno do
mundo agrícola, maioritariamente masculino, com uma estrutura fundiária caracterizada
pela divisão da propriedade. Seria acentuado o contraste entre grandes/médios proprietários
e a massa dos pequenos exploradores e assalariados rurais, estes a maioria da população
trabalhadora rural (campesinato) constituída por micro-proprietários, micro-rendeiros e
assalariados.
Para o séc. XIX, proprietários e lavradores eram categorias sócio profissionais identi-
ficadas com a posse, uso e usufruto da terra, contrapondo-se aos trabalhadores que não
possuíam uma unidade de exploração agrícola. De acordo com os registos paroquiais,
em especial os de 1860/1880, detectam-se 107 trabalhadores, 43 proprietários (sendo
9 mulheres), 3 lavradores e 8 jornaleiros (dos quais 6 são mulheres). Gente com fortes
ligações ao mundo agrícola ao qual andariam também ligados os 15 operários (entre os
quais 7 mulheres) e os 3 pastores.
Recorde-se a este propósito a definição de algumas categorias profissionais:
- Proprietário: se deve entender: «…o que tinha direito de “dispor” do que era seu, de
“usar, gozar, e dispor dela, como bem lhe parecer, dentro dos limites determinados pela
lei (…)Traduzirá o modelo de cidadão subjacente à sociedade liberal «mas também a uma
importante transformação social: o facto de muitos enfiteutas se terem transmutado em

  ROQUE, 1982, vol. I, t.I, p. 27


(230)

  VAQUINHAS, 1995, p. 34
(231)

156
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

proprietários plenos (por via da abolição ou remissão de foros) e, sobretudo, de muitos


lavradores-rendeiros terem passado a proprietários das terras que exploravam» (232)
- Lavrador: era «tanto o que lavrava como aquele que mandava lavrar, e tanto podia
ser proprietário como rendeiro (…) revelava um tanto de estatuto social e económico, já
que nem todos os que se ocupavam na terra recebiam essa designação. Desde logo, não
contemplava aqueles que trabalhavam por conta de outrem, e aplicava-se aos agricultores
dotados de alguma auto-suficiência em termos de meios e de instrumentos de lavoura.
Isto é, aqueles que dispunham de terra, fosse em propriedade plena, fosse em domínio útil
enfiteutico, fosse em regime de arrendamento; e aqueles que dispunham de apetrechos
de lavoura próprios indispensáveis à mobilização agrícola dessa terra sem ser a simples
enxada, caso em que provavelmente não passariam de meros jornaleiros (…) cavões ou
cavadores (…) portanto, em regra, o lavrador dispunha de arados ou charruas e dos res-
pectivos animais de tiro»(233).
Também participavam nos consertos públicos locais enquanto outros trabalhadores
com o serviço braçal.
- Trabalhador: «profissões e categorias ocupacionais ligadas à execução, por conta de
outrem, das diferentes tarefas agrícolas e à direcção do pessoal de lavoura»(234). Equivalente
a empregados agrícolas contratados individual ou colectivamente, com caracter eventual,
transitório ou permanente, e pagos à jorna, ao mês, ao ano, por empreitada. Para o século
XIX e princípios do XX consideram-se como exemplos de trabalhadores: boieiros, cabreiros,
capataz, cavador (jornaleiro de enxada), ceifeiro, criado (servo ou doméstico assalariado),
criado de lavoura (trabalhador permanente), escravo, feitor.
- Jornaleiro: trabalhadores assalariados à conta e risco da sua força de braços, desempe-
nhava uma multiplicidade de tarefas agrícolas. Eram pagos ao dia «possibilitando também
aos proprietários contratar a mão-de-obra necessária apenas nos períodos mais afadigados
do calendário agrícola; as vindimas, em Setembro; as sementeiras de Inverno e as ceifas e
malhas de Junho e Julho»(235). As jornas eram pagas à semana ou em intervalos de oito a
dez dias e podia incluir as refeições.
As jornaleiras eram operárias agrícolas, que trabalhavam a soldo fora do seu agregado
doméstico: na monda e apanha da azeitona, ervas e matos, nas vindimas, ceifas, apanha
de bolota, junco, estrume, na condução do arroz, ou no descamisar do milho. Ganhavam
metade das jornas pagas aos homens. Eram contratadas sem garantia de continuidade, e
o recrutamento variava de acordo com a época do ano e as necessidades e disponibilidade
de mão-de-obra(236).

(232)
  MADUREIRA & MARTINS & MONTEIRO, 2002, vol. III, , pp. 93-94
(233)
  ibid. p. 75
(234)
  ibid. p. 139
(235)
  ibid. p. 206
(236)
  ibid. p. 199

157
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Em termos de artes e ofícios, e segundo os registos paroquiais, existe uma diversificação


de actividades: 12 serradores, sendo de registar a concentração em Touriz (5), 11 alfaia-
tes, 11 sapateiros, 6 padeiros, 3 barbeiros, 3 carpinteiros, 3 pedreiros, 3 tamanqueiros, 1
ferrador (José da Costa, de Midões, 1860), 1 ferreiro (João Rocha, Vila do Mato, 1860),
1 serralheiro (Francisco José, de Midões (1817). Registe-se, também, o aparecimento de
uma curiosa ocupação, desempenhada por António Quaresma, de Santo Amaro «ocupado
em fazer colheres» (1802).
A indústria de moagem continua em alta, com 11 moleiros, 7 dos quais laborando no
Rio de Cavalos e 3 no Rio Ceia. Paralelamente assistimos ao florescimento da indústria da
tecelagem, mundo feminino por excelência, com 13 mulheres dedicando-se a essa tarefa.
A dinâmica comercial está presente com o farmacêutico José Augusto Madeira
d’Andrade (estabelecido em Midões, mas natural de Sevilha, freguesia de Tábua), nos
tendeiros, José Francisco e Teresa Dias, ambos do Cadoiço, ou no barqueiro António
José, de Vila do Mato (1810).
A uma classe social superior pertenciam os 2 médicos, os 3 militares (todos capitães),
7 religiosos, 6 doutores e 1 bacharel em Leis (António Soares de Albergaria).
Uma das curiosidades deste levantamento prende-se com o volume de informação
relativo ao sexo feminino. Á mulher estava reservada, sem dúvida, a administração das
lides da casa: 39 costureiras, (7 de Midões, 7 de Vila do Mato, 6 do Casal da Senhora e
4 de Vila do Mato), 22 empregues no «serviço de casa», 6 criadas, 1 cozinheira (Jacinta
Soares, de Midões, 1860).
Nos últimos 20 anos do séc. XIX generalizam-se as dificuldades no mundo agrícola,
que se intensificam a partir de 1875. É o tempo das vendas por arrematação, expropriações
judiciais, diminuição do valor venal da terra, mas também dos esforços de modernização
agrícola, com aquisição das primeiras máquinas e novos instrumentos por parte dos pro-
prietários mais ousados. Como resposta à depressão agrícola intensificou-se o associativismo
rural, com criação de adegas regionais e sindicatos agrícolas.
Na Exposição Distrital de Coimbra, de 1884, iniciativa da Escola Livre das Artes do
Desenho, brilhou bem alto a qualidade dos produtos midonenses, que arrecadaram vários
prémios(237):
- Na Terceira Secção, relaiva aos tecidos, vestidos e acessórios receberam prémios: D.
Maria da Piedade Gamboa Abranches, de Midões, com bordados diversos; Alexandre
Salvador, de Midões, pelas fôrmas e D. Maria Barbara da Silva Lemos, de Midões, com
bordados a branco, frioleiras;
- Na Quarta Secção, relativa a Indústrias Extractivas e suas transformações/Indústria
Agrícola, foram premiados: Augusto José Dias, de Midões, pelo Vinho tinto de 1883 e
vinho palhete; e José Augusto Madeira d’Andrade, de Midões, pelo vinagre; Christiano

 1º Centenário da Exposição Distrital de 1884, Coimbra: Revista-Conferências-Prémios, Edição Fac-similada


(237)

do Secretariado das Comemorações, Coimbra, 1984, pp. 180-181, 184-188

158
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Moura, de Midões, pelo queijo e António Borges de Brito, do Cadoiço-Midões, com os


machados, podão e enxada.
- Na relação suplementar foi premiado João Álvaro d’Almeida, de Midões com o
Costelo para caçar pássaros.

Acta da instalação da Comissão Paroquial

«No dia dezoito do mez de dezembro do anno de mil novecentos e dez, na sala
das sessões da Commissão Parochial d’esta freguesia de Midões achando-se presente os
cidadãos Arnaldo Maximo Coelho, Alvaro Amaro d’Oliveira, Antonio Armando Soares
d’Albergaria, Fernando Augusto da Silva e Antonio d’Almeida, foi por estes deliberado
comecar a funcionar desde já em virtude do adeantado do tempo e precisando tomar
diversas deliberações urgentes. Foram nomeados por aclamação, presidente Arnaldo
Maximo Coelho, tesoureiro Antonio d’Almeida e secretario o já existente Affonso
Henriques de Sousa, assumindo desde já os logares para que foram nomeados»

AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1905-1911, fl. 43

B. OS PRIMEIROS ANOS REPUBLICANOS

1. A TRANSIÇÃO PARA A REPÚBLICA


A 05/10/1910 instituiu-se em Portugal o Republicanismo, pondo-se fim à Monarquia,
forma hereditária de regime e poder, que durou 9 séculos. A criação do Estado Novo, e
aprovação da Constituição em 1933, deu por finda a Iª República Portuguesa.
Só dois meses após o movimento nacional que implantou o regime republicano se
sentiram os efeitos administrativos em Midões. A 18/12 tomava posse, por aclamação, a
Comissão Republicana Paroquial, composta pelo presidente Arnaldo Maximo Coelho, o
tesoureiro António d’Almeida e o secretario Affonso Henriques de Sousa.
A Comissão Paroquial funcionaria em simultâneo e em articulação com a Comissão
Municipal composta por republicanos. Inicio de uma nova época, em que se sentem as
heranças do passado, mas também o desbravar de novos caminhos: por um lado, a Junta
de paróquia, continua a centrar-se na gestão e decência do culto, bem como em praticar
actos antigos, como passagem de atestados de pobreza; mas, por outro colabora na orga-
nização das novas matrizes de acordo com decreto de 09/05/1912.
Foi no tempo da I.ª República que se operaram profundas modificações no aparelho
local. A 13 de Outubro de 1910, publica-se o Decreto-Lei que repõe em vigor o Código

159
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Administrativo de 1878 e parte do de 1896. A Paróquia sobrevive enquanto órgão de


administração local, funcionando com comissões administrativas, mas apenas meia dúzia
de anos: «De facto, um pouco mais tarde, com a Lei N.º 621, de 23 de Junho de 1916, a
Divisão Administrativa do Território altera-se com a Paróquia Civil substituída pela desig-
nação de Freguesia. Este novo órgão manter-se-á até aos dias de hoje, independentemente
das várias alterações dos órgãos supra locais que entretanto se verificaram»(238) (ver tabela 9).
Em termos de funcionamento a continuidade imperou em algumas matérias, na tran-
sição de um órgão de administração religiosa e paroquial para um novo, essencialmente,
de administração civil: continuou a nomear cobradores para o lançamento paroquial, ou a
apanhar a azeitona das antigas confrarias, passando atestados, essencialmente, de pobreza,
mas também de residência, emigração, reformas e pensões. O local para a realização das
reuniões mantém-se no sítio onde se vinha fazendo as reuniões da junta de paróquia: na
sala existente por cima da Sacristia da Igreja Matriz.
O Decreto n.º 13.917, de 09/07/1927, extinguiu a Comarca de Tábua tendo as suas
freguesias sido distribuídas por 3 comarcas diferentes (Arganil, OH, Santa Comba Dão)
e por dois distritos diferentes (Coimbra e Viseu) e por duas províncias diferentes (Beira
Litoral e Beira Alta). A Comarca de Tábua seria restaurada pelo DL do Governo nº 202/73
de 04/05/1973.
O vinho destacava-se das demais produções agrícolas, promovendo-se a sua rendibili-
zação e dignificação comercial. A região tabuense integrou, desde o início, a demarcação
da região vinícola do Dão definida pela Carta de Lei de 18/09/1908. Uma região de
360.000 ha, cercada pelos maçicos montanhosos da Estrela, Caramulo, Buçaco, Nave,
Lousã e Açor, com condições ecológicas homogéneas.
Esta abundância na produção agrícola conduziu, na 1ª metade do séc. XX ao nasci-
mento de cooperativas: Estrela d’Alva (1920, Espariz), Cooperativa de Consumo (Tábua,
1931), Sindicato Agrícola (Tábua, 1931, e outro em Meda de Mouros, 1932), Grémio
da Lavoura de Tábua (1941).

2. OS DESEJADOS MELHORAMENTOS
O século XX ficou marcado pelo desenvolvimento da ideia do progresso da «res publi-
ca». As populações anseavam por melhoramentos a vários níveis: electrificação, saneamento,
vias de comunicação (vide foto 31), infraestruturas ligadas à Saúde e Educação, temas
amplamente discutidos nos periódicos locais ou nas intervenções dos deputados da nação.
No que respeita à electrificação, em Fevereiro de 1926 o Governo autorizava as Câmaras
Municipais de Santa Comba Dão, Mortágua, Tábua e Carregal do Sal a constituírem uma

  PINHO, 2008, p. 236


(238)

160
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

FOTO 45 - Salão Social e Casa Mortuária de Touriz

FOTO 47 - N
 otícia da inauguração da Escola Básica Integrada
FOTO 46 - Escola Básica Integrada de Midões de Midões, A Comarca de Arganil, 16.09.2002 p.4

161
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 48 - Festa evocativa da atribuição do foral manuelino a Midões no Largo de Valverde, 12.09.2014. O Presidente da Freguesia de Midões,
José Alberto Pereira usando da palavra, ladeado pelo Presidente da Câmara Municipal de Tábua, Mário Loureiro

FOTO 49 - Festa evocativa da atribuição do Foral Manuelino no Largo de Valverde

162
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

FOTO 50 - A Igreja de Nossa Senhora das Neves, Midões, postal de princípios do séc. XX

163
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 51 - A Igreja de Nossa Senhora das Neves, Midões, na actualidade

FOTO 52 - Breve de Clemente XIV concedendo indulgência plenária à Igreja de Midões, para o primeiro Domingo do mês de Outubro,
05.07.1773 (AUC Capelas, Cx.XIII, doc.3)

FOTO 53 - Breve de Clemente XIV concedendo altar privilegiado à Igreja de Midões, , 06.07.1783 (AUC Capelas, Cx.XIII, doc.3)

164
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

FOTO 54 - O padre José Lourenço de Matos junto dos sinos adquiridos em 1937

FOTO 55 - Perspectiva do interior da Igreja de NS das Neves, Midões

FOTO 57 - P
 erspectiva do interior da Igreja de NS das Neves
FOTO 56 -Perspectiva do interior da Igreja de NS das Neves, Midões de Midões (a partir do altar mor)

165
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 59 - A Capela mor e retábulo da Igreja de NS das Neves, Midões

FOTO 58 - Estatueta de Santo Estêvão FOTO 60 - Escultura de NS das Neves, séc. XIX

166
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

FOTO 61 - Imagem de Nossa Senhora das Neves, 1872 FOTO 62 - Pintura na abóbada da capela-mor

FOTO 64 - Estatutos da Irmandade do Santíssimo Sacramento, 1890

FOTO 63 - Nossa Senhora da Piedade, meados séc. XV FOTO 65 - Tombo da Confraria de Santo Estêvão, 1808-1840 (AJM)

167
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 66 - Residência Paroquial de Midões

FOTO 67 - Capela de S. Miguel (perspectiva do exterior) FOTO 68 - Retábulo da Capela de S. Miguel, séc. XIX

168
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

federação regional para o aproveitamento da energia das águas do rio Dão e construção
de uma linha a partir de Santa Comba Dão.
Um ano depois, o Concelho de Tábua passou a albergar uma central produtora de
energia no sítio de Rei de Moinhos, limite e freguesia de Meda de Mouros, concelho de
Tábua e a 6km de Arganil, sede da Hidroeléctrica, constituída a 22/02/1927, tendo a
pretensão de substituir no futuro, a energia térmica pela energia hidráulica(239).
Assumido o objectivo do município em instalar a rede eléctrica no concelho de Tábua,
com iluminação pública, particular e industrial, foi na presidência do Dr. Castanheira
de Figueiredo (1928-1932) que se deram os passos necessários. A 10/10/1931 foi aberto
concurso para o fornecimento de electricidade às vilas de Tábua, Candosa e Midões, tendo
a CMT contraído um empréstimo de 250 contos.(240) Em Agosto de 1932 a electrificação
de Candosa e Midões estava já em fase de conclusão.
No entanto, foi um projecto moroso. Em 30 de Setembro de 1932 noticiava-se que
tinha sido assinada escritura de fornecimento de material eléctrico, com uma casa comercial
de Lisboa, que se comprometia, em 6 meses, a montar os cabos desde a fábrica de Rei de
Moinhos, freguesia de Meda de Mouros atè à Vila de Midões. Um passo importante, que
ficou a dever-se à acção de Castanheira de Figueiredo, presidente da edilidade Tabuense,
que a 27/07/1932 firmara contrato de fornecimento da electricidade com a Hidroeléctrica
de Arganil. O primeiro ensaio aconteceu a 30/05/1933, em Tábua, Midões, Candosa e
São João da Boa Vista(241).
No que respeita ao abastecimento de água a partir de fontes são de registar algumas
intervenções: reparação da fonte de Vasco (1913), construção da fonte do Casal da
Senhora e início da exploração das suas águas (1916) e conclusão das obras da fonte do
Adro (Setembro de 1928).
Tanto a reparação de fontes como as calçadas da freguesia tornaram-se frequentes por
razões de natureza higiénica. É um bom exemplo a reparação da fonte de Vasco, solicitada
pela Comissão Paroquial à CM Tábua a 05/10/1913 «por se achar em pessimo estado,
recebendo agua impura duma pôça que está junto á fonte, não servindo por isso para
o consumo publico»(242). No mesmo sentido, a vistoria que solicita da mesma entidade
«nos bairros denominados Catraia e Torre, desta povoação de Midões, onde se acham
construídos diversos curraes em terreno publico e bem assim algumas d’aguas de telhados
e agueiros que prejudicam a estrada municipal ha pouco construída»(243).
Nos finais de 1914 tomam-se medidas de carácter geral para reduzir efeitos negativos
de algumas práticas: por um lado, salvaguardando-se as fontes públicas da freguesia,

(239)
  DUARTE, 2009, p. 214
(240)
  ibid. p. 213
(241)
  ibid. p. 214
(242)
  AJM - Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1911-1918, p. 30
(243)
  ibid.

169
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

proibindo-se através de editais lavagens de roupa nos tanques ou que os animais se abaste-
çam nos bebedouros; por outro, colocar em arrematação todo o lixo das ruas da freguesia.
Em termos de redes viárias, retoma-se, desde logo, um desejo antigo, oficiando-se,
em Março e Junho de 1912 ao Director das Obras Públicas do Distrito para que dote a
estrada de Midões à Ponte da Atalhada, seguida de representação dirigida ao Ministro
do Fomento pedindo-lhe o subsídio de 2 contos de reis «..para as obras da estrada em
começo de construcção, entre esta Villa e a Ponta da Atalhada», solicitação reforçada em
Março de 1914(244).
Na saúde, os primeiros anos republicanos foram responsáveis pela melhoria das con-
dições de vida das populações locais e pela abertura da discussão em torno das questões
prementes da saúde e da assistência hospitalar. Nesse sentido, é de destacar, a 25/07/1914
uma fundação de Socorros Mútuos em Tábua tendo como objectivo a instalação de um
hospital, que a Misericórdia de Tábua chama a si logo que se constituiu a 01/05/1933
mas que só vem a ser inaugurado na década de 50 do séc. XX.
Contudo, em Midões, o sistema de saúde continuava dependente do poder concelhio,
através do exercício da medicina pelo facultativo municipal, enquanto a Junta de Paróquia
se mantém atenta: a 16/04/1911 pede alguns tubos de vacina contra a varíola «por se
acharem nesta freguesia inumeras creanças por vacinar»(245).
Em termos de educação e seguindo os princípios norteadores republicanos, procurou-se
a institucionalização educativa visando a disseminação de estabelecimentos para ministrar
o ensino, com especial enfoque na educação dos meios rurais. Em Março e Abril de 1910
a junta de paróquia têm a intenção de criar escolas mistas em Vila do Mato e Touriz,
enquanto que em Midões, e durante o mês de Fevereiro de 1911 se apela à Comissão
Municipal pedindo a reparação da casa de escola da freguesia «por se achar em pessimo
estado», bem como a edificação de duas casas de banho para uso dos alunos(246).
Alguns meses depois, a 18/06, delibera criar uma caixa escolar para subsidiar alunos
pobres «…organizando para esse fim diversas kermeses que ficaram a cargo de commissões
que serão nomeadas oppurtunamente»(247).
Pelo Decreto de 29/03/1911, o Governo da República tornou oficial o ensino infantil,
primário e normal, exigindo novas soluções à arquitectura escolar e pressionando a cons-
trução, remodelação e reparação dos equipamentos educativos. Descentralizou o ensino
primário, atribuindo competências às Câmaras Municipais, no que respeitava a instalações
escolares, posteriormente, regulamentadas pelo Decreto 134, de 15/09/1913, que veio
estabelecer requisitos mínimos de higiene e salubridade para os locais de instalações das
escolas primárias.

(244)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1911-1918, pp. 13, 16, 18 e 38
(245)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1905-1911, fl. 47
(246)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1905-1911, fl. 45v.
(247)
  ibid. fl. 48

170
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

A ruína da casa da escola de Midões para os dois sexos levaria a JP a aprovar, a


30/06/1912 uma representação ao Ministro do Interior pedindo a sua reparação «por se
achar em pecimo estado de conservação e incapaz de servir para o fim a que é destinada»,
situação denunciada ao Inspector Escolar em Novembro de 1913. (248). Em Dezembro
de 1914 atinge-se um ponto limite: representantes da CM Tábua e o Sub-Delegado de
Saúde procedem a exame à escola, que é dada como incapaz autorizando a JP a arrendar
casa própria para funcionamento das escolas dos dois sexos, ficando a renda a expensas
do município até que a casa de escola fosse reparada.
Em Touriz a primeira escola de instrução primária iniciou funcionamento em 1913
funcionando até à sua extinção «…na casa que foi do pai do saudoso António Borges.
Pertence actualmente aos herdeiros do Sr. Abílio Catarro»(249).
Em 1920 abriu, com ensino misto a Escola de Vila do Mato(250). Uma década que seria
difícil para as escolas: as instalações escolares haviam piorado em relação aos primeiros anos
da República, na rede de ensino faltavam novos edifícios e, os classificados anteriormente
como «boas casas de escola» estão degradados. A participação na Iª Guerra Mundial, e o
esforço financeiro e social exigido, ou as migrações dos campos para a cidade, aumentando
a mortalidade infantil, desviaram muitas crianças da instrução indo servir para comércio
e casas particulares.
Alguma produção legal procurou, no entanto, incrementar a construção de escolas:
o Decreto 6700 de 23/06/1920, do Ministro da Instrução, encarregou a Repartição das
Construções Escolares de proceder ao estudo, elaboração de projectos e de cadernos de en-
cargos para escolas a construir consoante as necessidades; ou o Decreto 7304 de 09/02/1921
do governo de António José de Almeida, procurando garantir a conclusão dos edifícios
escolares, regulamentou a concessão de subsídios, permitindo a administração directa
das obras por Câmaras Municipais ou Juntas de Freguesia, cabendo à Repartição das
Construções Ecolares fiscalizar, elaborar projectos e proceder a medições e orçamentos.
No entanto, foi fraca a resposta da construção civil ao lançamento das obras, pela falta de
empreiteiros e de materiais.
Pelo Decreto nº 10.532, de 11/02/1925, abandonou-se a intenção de novas cons-
truções, competindo às Câmaras Municipais celebrar os contratos de arrendamento de
edifícios para escolas, depois de aprovados para esse fim, e que deverão ser processados
pelas Câmaras Municipais as respectivas folhas da renda de casas de escolas e habitação
dos professores nos termos dos respetivos contratos e pagar de harmonia com a Lei do
inquilinato.
No entanto, até 1929, não se construíram a nível nacional grande parte dos edifícios
programados e, até 1931, não se elaboraram novos projectos: «Num país de economia

(248)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1911-1918, p. 18
(249)
  MONTEIRO, 2005, p. 53
(250)
  MONTEIRO, 2007, p. 176

171
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

muito atrasada, a realização de melhoramentos locais, de pouca monta que fossem, assumia
grande importância para a fachada de uma política que se centralizava e endurecia. As
escolas, equipamentos que, a par do cemitério, têm o maior impacto comunitário, quer em
zonas urbanas quer em núcleos rurais, mereceram atenção especial, apesar de ser proclama-
do, pelos ultra-conservadores, que não havia a menor utilidade em ensinar o povo a ler»(251).
No que respeita à expedição de correspondência, a 04/09/1910 foi aberto concurso
para a estação telegráfica. A 24/12/1918 a JFM atenta à grande irregularidade e prejuízo
para o público causado pelo serviço de Correios na Freguesia de Midões, delibera elaborar
uma representação dirigida ao Director Geral dos Correios pedindo «…a remodelação
do serviço do correio n’esta Freguezia (…) que o transporte da correspondencia passe a
fazer-se até Midões a cavalo ou em carro, e aqui haja um distribuidor para fazer a entrega
pelo domicilio, na vasta área da Freguezia».
A fundamentar o seu pedido apresenta como razões de fundo: «Se este pessoal foi
suficiente até ha algum tempo, não o é agora, que o movimento é muitas veses superior
ao que era (…) como facto permanente que precisa de ser especialmente remediado há a
solicitar que a correspondencia que vem das malas de Taboa para a Estação postal d’esta
vila é em tão grande contidade que por vezes são dois portadores a transporta-la, e ainda
algumas encomendas e cartas ficam em Taboa de um dia para o outro»(252).
Uma novidade trazida pelos primeiros regimes republicanos foi o Registo Civil,
tornando-o obrigatório, embora não se saiba quando começou a funcionar em Tábua a
repartição do registo civil da Comarca de Tábua.
Em Junho de 1912 propôs-se o nome do cidadão Arnaldo Vieira das Neves, farmacêu-
tico, de Midões, para exercer o lugar de ajudante do oficial do registo civil na freguesia,
por se encontrar vago «fazendo muita falta aos povos d’esta região», vindo a desempenhar
a função até 1923. Foi substituído por Abílio Álvaro d’Almeida (1924-1934) a que suce-
deu Amadeu Rodrigues Tavares (1935-1943) e mais tarde Otília da Conceição Cabrita
(1942-1964)(253).
O aformoseamento urbano levou a Junta de Freguesia de Midões a empenhar-se
activamente na conclusão de vários melhoramentos, lançados a maioria nos princípios da
década de 20: alargamento do cemitério, a abertura de uma via de acesso a partir do Largo
D. Paz, o arranjo da praça ou largo de Valverde. A 25/03/1923 chega inclusivamente a
realizar-se um «referendum» em que todos os eleitores votaram a favor do empréstimo
de 5.000 escudos para acabamento das obras encetadas(254), empreendimentos que de-
moraram alguns anos a serem dados por concluídos na medida em que a 26/05/1929 a
JFM solicitava à CM Tábua a concessão de um subsídio para conclusão destes trabalhos.

(251)
  BEJA & SERRA & MACHÁS & SALDANHA, 1990, p. 169
(252)
  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1918-1937, fls. 4-4v.
(253)
  Dados levantados dos Anuários Comerciais de Portugal
(254)
  ibid. fls. 30-30v.

172
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Tabela 9 – Executivos da Freguesia de Midões, 1918-1974(255)


Data Presidente Vice-Presidente Secretário
1918 Nicolau Álvaro Abílio da Costa António Monteiro António Corrêa
(Comissão) d’Almeida Pinto e Costa
1919-1921 Abílio Baeta António Joaquim Antonino José Afonso Soares
(Comissão) Cardozo dos Reis Tavares d’Almeida Coelho
António Corrêa
Pinto e Costa
1922-1925 António Joaquim António Augusto - Id. António Corrêa
Tavares Borges - Pedro Ferreira de Pinto e Costa
Mesquita
- José da Fonseca
Monteiro
1926 Aníbal Augusto António Joaquim - José da Fonseca Id.
Amaro Tavares Monteiro
- Amadeu
Rodrigues Tavares
Data Presidente Vice -Presidente Vogal-efectivo Tesoureiro
1926-1928 Id. Id. António Augusto Amadeu Rodrigues
(Comissão Borges Tavares
Administrativa)
1928-1932 - Abílio Baeta - Antonino - António Id.
(Comissão Cardoso dos Reis d’Almeida Francisco
Administrativa) - António - António d’Alcântara
Casemiro Casemiro - Joze Abrantes
- Cassiano Pinto
Monteiro
1932-1934 Ernesto Augusto de Nicolau Rocha Abílio da Costa Id.
(Comissão Moura Marques
Administrativa)
1934-1935 António Casemiro Luiz Abrantes da Ernesto dos Santos Id.
(Comissão Alcantara Costa Saraiva
Administrativa)
1935-1937 Amadeu de Moura Abílio da Costa - Libânio Rocha Id.
(Comissão Oliveira Marques - Arnaldo de
Administrativa) Figueiredo
- Adelino Tavares
Martins
Data Presidente Secretário Tesoureiro
1938-1945 Amadeu Rodrigues Amadeu Rocha Luiz Abrantes da
(Comissão Tavares Costa
Administrativa)

  AJM - Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1911-1918; Livro das Actas das Sessões da Junta de
(255)

Freguesia de Midões, 1918-1937; 1937-1953; 1953-1960; 1961-1968

173
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Data Presidente Secretário Tesoureiro


1946-1950 Id. António Casemiro Alcantara Arnaldo de
Figueiredo

1951-1954 Aníbal Garcia Amadeu Tavares Manoel Marques


Ferrão
1955-1959 Id. Luiz Casimiro Alcântara Id.
1960-1963 Marcelino José José Tavares Id.
Stoffel Leitão
Esteves
1964-1967 Id. Id. Id.
1968-1971 Id. Paulo do Carmo António Alves
Rodrigues
1972-1974 Id. Id. Id.

C. O ESTADO NOVO

1. OS NOVOS TEMPOS, ENTRE O PASSADO E O FUTURO


A 11 de Abril de 1933 entrava, oficialmente, em vigor a constituição política do Estado
Novo que perduraria até 1974. Contudo, há muito que as manifestações centralizadoras
e corporativas do novo regime se faziam sentir, inclusive, em Tábua.
Mas, o novo regime, não se esquece das manifestações perpetuadoras do seu poder: a
28/05 a CMT celebra, com apoio das juntas do concelho, uma homenagem ao Estado
Novo, da mesma forma que a 28/04 juntas e edilidade enviam cartas e telegramas, de
homenagem e solidariedade ao Presidente do Conselho.
A nível local e apesar do novo regime, são várias as linhas de continuidade com o
passado: passam-se atestados de residência e pobreza, vende-se a azeitona das oliveiras,
arrendam-se as propriedades da junta (Tojais).
Numa lógica de rentabilizar recursos, António Borges acumula, desde 1939, as funções
de guarda da igreja, toque de sino e responsável pelo trabalho no cemitério paroquial.
Os baldios mantêm-se como tema transversal. Nos princípios de 1943, delibera-se
oficiar ao Presidente da CMT para dar autorização «…para vender os baldios desta junta e
as oliveiras da mesma, com o fundamento de que aqueles referidos baldios só dão prejuízo,
porque se paga contribuição dos mesmos»(256).

  AJM - Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1937-1953, fl. 32v.
(256)

174
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

2. MELHORAMENTOS LOCAIS
Uma grande parte das pequenas, mas fundamentais, obras de melhoramentos locais,
efectuaram-se através da atribuição de subsídios pelo município, e execução de projectos
pela Repartição de Melhoramentos Rurais. Estes tornaram-se mais frequentes a partir
do momento em que o Estado Novo dispunha de verbas para tal fim, ou seja; com o
lançamento dos Planos de Fomento em 1953. Mas, a política de atribuição de subsídios
intensificou-se apenas a partir da década seguinte.
No que respeita a vias de comunicação, uma das infra-estruturas que mais tinta fez
correr foi a construção da ponte sobre o rio Mondego, ligando os concelhos de Tábua
com o do Carregal do Sal, nas freguesias da Póvoa e Currelos.
Consta que o primeiro projecto vem dos tempos de Fontes Pereira de Melo, destinan-
do-o à passagem de uma estrada que «…partindo da Venda da Esperança – na estrada
real – terminava no Carregal do Sal, ligando a futura linha do caminho de ferro da Beira
Alta – em construção naquele tempo»(257).
Apesar de se terem construído alguns lanços de novas estradas consta que quem desblo-
queou a situação foi Nicolau Firmino, natural de Penamacor e que contraiu matrimónio
com D. Emília Pedreira, natural da Póvoa de Midões. Homem culto, prestigiado professor
de latim que explorava uma livraria no Bairro Social do Arco do Cego – Académica D.
Filipa –Salazar tinha por ele grande apreço. Interessado na resolução dos problemas dos
residentes, terá aproveitado uma audiência com o ditador para lhe expor a situação o qual
lhe prometeu resolver a situação(258).
A reclamação foi apresentada pelo Deputado Pinto Barriga, em Abril de 1957, argu-
mentando que a sua construção era de transcendente importância para a economia duma
vasta região, ligando os Distritos de Viseu e Coimbra, abrangendo vastas povoações e
apontando também a razão turística. Assunto que se prolonga para a década seguinte,
arrastando-se e tomando, por força dos sucessivos adiamentos, a designação de «ponte
do enguiço».
Ultrapassadas as dificuldades foi inaugurada a 13/06/1971 pelo Presidente da República
Américo Tomás e baptizada com o nome de Rui Sanches, Ministro das Obras Públicas
e Comunicações. Uma obra muito necessária pois se antes da sua construção tinha de se
percorrer 35 km, entre Póvoa de Midões e Carregal do Sal, o trajecto encurtou para 11 km
apenas, beneficiando a freguesia de Midões.
Mas outras vias de circulação mereceram a atenção do executivo local, que as foi
satisfazendo com recurso a serviço braçal, incluindo obras de arte: pontão na Quinta da
Ribeira (concluído em Janeiro de 1934); Estrada Seixos-Alvos a Midões (Maio 1934);

  MONTEIRO, 2005, p. 183


(257)

  ibid. p.185
(258)

175
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Caminho Midões-Várzea (concertando-se ponte e calçada em Maio 1936), calçadas do


arrabalde de Midões e de Vila do Mato (1936).
Com a estabilização do regime, os orçamentos da junta conciliados com subsídios
municipais permitem a reparação de diversas vias: Caminho do Coito (1937), Rua do
Cemitério (1941), Caminho Coito-Esporão (1945).
Uma das obras mais importantes deste período foi a reabilitação da via que atravessa-
va a Vila de Midões. A 20/01/1954 a JF solicitou ao MOP a pavimentação «a cubos de
granito» pois com o «actual movimento de automóveis, é de absoluta necessidade evitar,
no Verão, a imensa poeira que invade as habitações, e, no Inverno, o tremendo lamaçal
que a torna quasi intransitável»(259).
Até final do regime, a JF Midões apostará na conservação e reparação dos vários cami-
nhos da freguesia, de que foram exemplos: Caminho das Sequeiras e Caminho Midões-
Coito (1968), Rua Nova (1969), Calçada do Casal da Senhora e Calçada de Touriz (1971).
Houve, também, lugar à abertura de valas ou construção de aquedutos.
No que respeita ao acesso a água potável é de destacar a atenção sobre a conservação
das fontes, alvo de diversas intervenções: fonte do Adro (obras concluídas em Setembro de
1928, havendo registo de consertos em 1938, 1952, 1953 e 1968), Cadoiço (colocação de
corrimões em Outubro de 1934, reparação 1938), Touriz (adaptação de fonte de chafurdo
para fonte de bica em Outubro 1935 e colocação de porta de ferro em Janeiro de 1937),
Vasco (reparação em 1936 e modificação da estrutura em 1960), Vila do Mato (1938),
Adro (1938), Casal da Senhora (1952) e tanque do Adro (1964).
No caso da fonte de Vila do Mato, a exploração das águas conduziu a uma escritura pú-
blica, de 1938, sobre as sobras das ditas águas, que passaram a pertencer a Nicolau Rocha e
Dr. Eduardo dos Santos. Contudo, em Dezembro de 1948, a JF constata que da referida ex-
ploração resultara beneficio para eles, em maior quantidade de águas, acordando-se, por tal
motivo, entre as partes que compensassem em terreno junto á mesma fonte, o suficiente para
construção de um tanque para lavadoiro publico com a superfície de 6 metros por 4 e ainda
um pedaço de terreno anexo ao referido tanque, que serviria para estendal de roupa»(260).
Esta fonte foi reparada em Outubro de 1945 e, em Outubro de 1956 foram os herdeiros
de Nicolau Rocha intimados pela JF a executarem a referida obra no prazo de um ano.
Touriz foi a segunda povoação do concelho de Tábua, a seguir a Meda de Mouros, e à
frente da própria sede, a ter o privilégio do abastecimento de água ao domicílio. Um facto
que se fica a dever à acção da Comissão de Melhoramentos, fundada em 03/10/1952 por
um grupo de naturais da aldeia mas residentes em Lisboa tendo em vista a resolução das
carências vividas e constituída pelos seguintes elementos: Celestino da Silva Coelho(261),

(259)
  AJM - Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1953-1960
(260)
  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1937-1953, fls. 52-52v.
(261)
  Alfaiate em Lisboa, sócio fundador (n.º 1) da Comissão de Melhoramentos de Touriz, com sede na Rua
do Arco do Marquês de Alegrete, n.º 50, 2º andar – vide MONTEIRO, 2005, p. 123

176
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Amândio Nunes Monteiro, Agostinho Nunes, Américo Nunes, José Nunes Branco,
António Nunes e António Abrantes Ferrão(262). Mais de 50 tourizenses se associaram a esta
iniciativa, tendo-se organizado em Touriz uma delegação que se encarregou de angariar
os fundos necessários reunindo a verba de 100 contos.
O custo de abastecimento da água rondou os 350 contos, tendo-se recebido de com-
participações do Estado 178 contos. No computo final a Comissão investiu em Touriz
mais de 400 contos, sendo de destacar: lavadouro e tanque da fonte de Baixo, construção
e demolição de muros, placas de azulejo, dois chafarizes, um na Rua do Cabo e outro na
Fonte de Baixo, que foram pagos ao empreiteiro António Macieira Júnior, e plantação
de árvores.(263)
Desta forma se deu um passo importante colocando «…termo às antiquadas fontes
de chafurdo» (duas, uma conhecida como Fonte de Baixo e outra como Fonte de Cima)
«…para dar à nossa terra uma obra de que tanto necessita – o condigno abastecimento de
água [ao domicilio]».(264) A mesma comissão suportou durante alguns anos o pagamento da
energia eléctrica consumida pelos motores da estação elevatória e manutenção da mesma.
No Plano de actividades da CMT para 1955 destacava-se a intenção em garantir o
abastecimento de água a Midões, objectivo atingido a 11/06/1958 data em que se inau-
guraram duas importantes obras públicas na freguesia: «..há muito tempo ansiosamente
aguardados pelo povo desta terra e de Vila do Mato (…) data tão grata para Midões, que
vê concretizada uma vital necessidade de há longo tempo: o abastecimento de água; e para
Vila do Mato, que viu também finalmente transformado em realidade um sonho antigo:
a sua electrificação»(265).
Estas obras públicas de águas cifraram-se no valor de 2.000$00, e contaram na sua
inauguração com a presença de uma comitiva na qual se destacava o Governador Civil,
Coronel Ernesto Nogueira Pestana, a que se associaram as autoridades concelhias e locais,
contando com a actuação da Filarmónica de Avô (266).
A sessão solene decorreu na sede da junta, tendo usado da palavra: José Teles Corte Real,
Presidente da Câmara Municipal de Tábua, que destacou os melhoramentos e enalteceu
a familia do Dr Henrique de Almeida em prol da terra; padre José Lourenço de Matos;
o Governador Civil e o Ivo Borges que recitou quadras. Encerrada a sessão todos se diri-
giram para o chafariz principal onde o GC cortou a fita simbólica «assim inaugurando o
abastecimento de água a Midões».

(262)
  MONTEIRO, 2005, p. 56
(263)
  ibid. p. 143
(264)
  António da Costa Mesquita - «A acção da Comissão de Melhoramentos de Touriz e o abastecimento de
água àquela povoação» In A Comarca de Arganil, Ano LVIII, N.º 4814, 12/06/1958, p. 6
(265)
  «Na freguesia de Midões foram inaugurados dois importantes melhoramentos com a presença do
Governador Civil do distrito, do presidente da Câmara Municipal de Tábua e de outras entidades» In A Comarca
de Arganil, Ano LVIII, N.º 4815, Sábado, 14/06/1958, p. 1
(266)
  AJM - Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1953-1960

177
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Após o copo de água seguiram para Vila do Mato, tendo sido recebidos em casa do
Dr. Bartolomeu Noronha da Costa, onde se serviu um beberete, antes da inauguração
oficial do melhoramento.
Em 1955 a CMT procederia a electrificação das localidades de Pinheiro de Coja,
Bogalhas e Pereira (que tinham usufruído de comparticipação governamental) e de Vila
do Mato, Sevilha, Sergudo e Venda do Porco.
No campo da saúde, recorde-se o Hospital da Misericórdia de Tábua, em construção
desde os finais da década de 30, que seria inaugurado nos princípios de Setembro de 1955.
Ao nível escolar, os alunos da freguesia frequentavam a escola de instrução primária
de Midões. No entanto, em 1929, as competências para as construções escolares haviam
transitado para a Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN),
integrada no Ministério do Comércio e Comunicações. Na década seguinte, registaram-
-se importantes alterações legais no sentido da promoção de novos edifícios escolares:
o Decreto nº 19531 de 30/03/1931 incentivou os particulares a oferecerem edifícios,
atribuindo-lhes o direito de indicar as pessoas para o primeiro provimento de professo-
res, devendo as construções obedecer às normas técnicas e pedagógicas estabelecidas pela
DGEMN; o Decreto n.º 21697 de 19/09/1932 regulamentou a concessão de subsídios
ao Estado, processos de assistência técnica e administração das obras, comparticipando o
Estado até 50% do valor, sendo o restante remetido às autarquias e populações.
Foi neste contexto que se construiu a Escola Primária de Touriz em 1931 (vide fotos 32
e 33) mas só em 1932 «tornada realidade graças à iniciativa e vontade férrea de bairristas e
homens bons»(267), que lançaram uma subscrição pública, encorajados pelo Dr. Castanheira
de Figueiredo, então Presidente da CM Tábua(268). Esta comissão era composta pelos
seguintes elementos: Antonino Godinho, Mário Ferreira Chaves, industrial de Midões
(Santo Amaro), Abílio dos Reis, Armando Pereira, António da Costa Marques, Ernesto
Saraiva, entre outros(269).
Ao presidente da edilidade se deve uma contribuição muito significativa para a con-
clusão das obras: 11.000$00 para acabamentos do edifício e 4.015$50 para o mobiliário
e material didáctico, havendo ainda a destacar o assinalável donativo e oferta do terreno
pelo Dr. José Caeiro da Matta(270).
Abriu a 07/10/1932 e teve como primeiros professores António Valério Boto, de
Candosa, e a Dª Maria Anunciação Branquinho, natural de Coimbra. Pouco tempo depois
da sua inauguração era já um sucesso: «…tem já um curso assaz apreciável, acusando a
sua frequência, nos dois sexos, aproximadamente 130 alunos»(271). Na década de 40 era

(267)
  MONTEIRO, 2005, p. 18
(268)
  Natural de S. João da Bovista, Presidente da Câmara Municipal de Tábua, 22/09/1928 a 16/10/1932
(269)
  «A Escola de Touriz» In A Comarca de Arganil, Ano XXXIII nº 1960, 11/7/1933, p. 2
(270)
  MONTEIRO, 2005, p. 112
(271)
  «A Escola de Touriz» In A Comarca de Arganil, Ano XXXIII nº 1960, 11/7/1933, p. 2

178
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

frequentada por 80 alunos e dotada de três professores(272). Na actualidade está fechada e


não tem qualquer utilização.
Apesar daquele sucesso em Touriz, as consultas feitas às Comissões Administrativas
das Obras de Edifícios Escolares distritais sobre a possibilidade de se concluírem edifícios
com recursos financeiros locais não eram agradáveis: «As respostas, na sua grande maioria,
veiculavam negativas e também perplexidade - as Câmaras não dispunham de verbas, o
povo era pobre, crescia o número dos desempregados, havia fome»(273).
A nova escola primária de Midões, construída entre 1934 e 1937, resultou duma ini-
ciativa particular, contando com subscrição pública e apoio do Estado. Foi seu principal
impulsionador o médico Henrique de Almeida, clínico geral em Midões, especializado
em Pediatria, que em Março de 1934 solicitou do Ministro das Obras Públicas a compar-
ticipação pelo Fundo do Desemprego para a construção do edíficio escolar, obra orçada
em 90 contos «responsabilizando-se êle pelo restante»(274).
Em Agosto de 1936 a obra estava quase concluída e era motivo de destaque na im-
prensa regional:
«Esta importante vila está já dotada com um magnífico edifício escolar, devido à
iniciativa do Sr. Dr. Henrique de Almeida, que, com uma tenacidade admirável, tem
promovido subscrições e festas a favor de tão interessante obra e, ultimamente, conseguiu
que, com o auxílio do Comissariado do Desemprêgo, o edifício ficasse quási concluído.
Resta apenas fazer algumas obras interiores e o resguardo do parque anexo, sendo de
esperar que o Govêrno lhe conceda novo auxílio, de forma a que a escola possa ser inau-
gurada o mais brevemente possível»(275).
Demorou algum tempo até que a escola fosse inaugurada, tendo começado a funcionar
antes da abertura oficial, apenas com aula do sexo femunino. De facto, só a 14/11/1937
foi inaugurada, em clima de grande festa, a nova escola primária de Midões (vide fotos
34 a 36), e prestada sentida homenagem ao seu principal impulsionador, o referido Dr.
Henrique de Almeida.
A sessão solene decorreu numa das salas do novo edifício, tendo iniciado pelas 13h00,
num espaço repleto de povo, destacando-se as crianças e a actuação da Filarmónia do Ervedal
da Beira. A sessão foi presidida pela Professora Cristina de Carvalho Vieira das Neves e o reve-
rendo prior José Lourenço de Matos. O filho mais novo do homenageado descerrou o retrato
do pai e a população ofereceu uma prenda ao bennfeitor, adquirida por subscrição pública.
Naquele acto, usaram da palavra: António da Cunha Marques «estudante aplicado
do liceu» que iria frequentar a Universidade de Coimbra e que leu uma saudação; o
Dr. Amândio Reis da Rocha, advogado que enalteceu a «personalidade invulgar, que soube

(272)
 MONTEIRO, op. cit. pp. 39, 42, 53
(273)
  ibid.
(274)
  «Para a construção do edifício escolar de Midões» In A Comarca de Arganil, Ano 34, n.º 2025, 06/03/1934, p. 1
(275)
  «Um belo edificio escolar» In A Comarca de Arganil, Ano XXXVI, n.º 2271, 14/08/1936, p. 1

179
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

transpôr todas as dificuldades com que deparou na construção daquele esplendido edifício»,
para em seguida recordar os tempos da infância, em que ambos haviam frequentado «uma
casa sem condições para escola, sem luz, sem ar. Terá sido talvez esta mesma recordação
que terá feito nascer, mais tarde, no espírito do Dr. Henrique de Almeida a ideia de dotar
a sua terra com uma escola ampla, com ar e luz a jorros»(276).
No entanto, a intervenção mais aguardada foi a do grande obreiro, Henrique de
Almeida, homem próximo ao Estado Novo, que no uso da palavra recordou todo o pro-
cesso que conduzira ao momento que se estava a viver:
«Foi em 1928 que pensei pela primeira vez na possibilidade da construção do edifício
que hoje inauguramos solenemente. Pedi então a todos os midonenses, a todos os amigos
de Midões e a todos os meus amigos particulares, que me auxiliassem nesta cruzada. A
minha ideia, salvo rarissímas excepções, foi carinhosamente acolhida e ao meu apêlo quasi
todos responderam generosamente, segundo as suas posses, desde o mais abastado ao mais
humilde dos trabalhadores rurais»(277).
Na ocasião manifestou profunda gratidão ao Eng.º Álvaro Teixeira Morais Pinto de
Almeida, Engenheiro-chefe dos Edificios e Monumentos Nacionais de Coimbra, a quem
atribuiu papel decisivo quando as obras do edíficio ficaram suspensas por falta de verba.
Perante o momento delicado, terá sido o penhor de que se chegaria a bom porto: «A
escola de Midões há-de ser concluida custe o que custar; o Estado Novo não deixa obras
por concluir, nem promete aquilo que não tenciona ou não pode fazer. S.Ex.ª prometeu,
cumpriu e conquistou mais um amigo pessoal. Também me teria conquistado a amizade
política se eu não comungasse já nas mesmas ideias antes de o conhecer»(278).
No mesmo dia, e a acompanhar a notícia publicada em A Comarca de Arganil, sobre a inau-
guração da escola, surge uma entrevista ao homenageado, assinalando quatro factos relevantes:
- Nas motivações que o fizeram pugnar pela nova escola, destacava: «muito me entris-
tecia profundamente o considerável número de crianças que, por falta de lotação e
de professores, iam aumentar, mais ainda, a vergonhosa percentagem de analfabetos
em Portugal, e em 1928 “sonhei” com a construção de um edifício que comportasse
as duzentas e muitas crianças acusadas no recenseamento escolar»(279);
- O sucesso das primeiras diligências que efectuou, obtendo incentivos que lhe deram
alento a continuar: a carta do primo, Augusto Soares da Cruz, disponibilizando
5.000$00 para auxiliar na iniciativa; a carta do também primo e padre Miguel
Augusto da Cruz (6.600$00), e a do seu pai, oferecendo 2.000$00 a título particular
e, 5.000$00 através da fábrica que possuía no Rio de Janeiro;

(276)
  «Midões presta homenagem ao sr. dr. Henrique d’Almeida», In A Comarca de Arganil, Ano XXXVII n.º
2400, 23/11/1937, p. 3
(277)
  Ibid.
(278)
  Ibid.
(279)
  Ibid.

180
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

- Quanto à localização da escola: assinala que era para ter sido construída na Estrada de
S. Miguel: «com o propósito de favorecer Touriz, uma das povoações mais populosas
da freguesia, e ainda Cadoiço, Santo Amaro e algumas quintas. É nesta ocasião que
Touriz pensa também em construir a sua escola própria, motivo que o leva a comprar
o terreno no extremo oposto da vila para favorecer Casal da Senhora, Vale de Gaios»;
- Quando o dinheiro para a obra esgotou, foi criado pelo Estado o Fundo de
Desemprego. Nessa altura, toma a responsabilidade de assumir 50% da construção,
recebendo o subsídio estatal de 30 contos. Sendo a verba diminuta, apela para mi-
nistros e directores gerais, e escreve ao Presidente do Conselho: «…e o que é certo é
que uns vinte dias depois de escrever aquela carta estavam em Midões engenheiros
dos Edifícios Nacionais de coimbra para avaliar todos os trabalhos. Respirei»(280). Mais
tarde veio o financiamento esperado para as obras de conclusão.

Após décadas a ministrar o ensino primário, a escola veio a encerrar e nela funciona
o Jardim de Infância de Midões.
Uma década após a inauguração da nova escola de Midões, seria inaugurada, a
23/02/1947, a nova escola primária de Vila do Mato, no âmbito do Plano dos Centenários
(vide fotos 37 e 38).
Em Abril de 1943, a imprensa local divulgava as escolas a construir no distrito, ao
abrigo do referido plano, definindo para o concelho de Tábua, novas construções em
Balocas, Vila Chã, Vila do Mato e Tábua(281).
Dois anos depois, anunciava-se o resultado do concurso público para a construção
de 370 edíficios escolares em vários concelhos do país. No caso particular do distrito de
Coimbra, apenas se apresentou um concorrente, Manuel Martins Júnior, de Lisboa, que
adjudicou a construção de 48 edíficios escolares pela quantia de 4.796.720$00(282).
Confirmada aquela arrematação, definiu-se que a primeira zona de trabalho seria a
compreendida pelos concelhos de Arganil, Tábua e Oliveira do Hospital(283).Dois anos
depois, os trabalhos estavam concluídos, tendo sido inaugurado de forma festiva, no
Domingo, dia 23/02/1947, pelas 15h00 um «moderno e lindo edifício escolar, do plano
dos centenários»(284).

(280)
  «Midões presta homenagem ao sr. dr. Henrique d’Almeida», In A Comarca de Arganil, Ano XXXVII n.º
2400, 23/11/1937, p. 3
(281)
  «As Escolas Primárias no Plano dos Centenários» In A Comarca de Arganil, Ano XLIII, n.º 2936,
09/04/1943, p. 1
(282)
  «Vão ser construídos na nossa região vários edíficios escolares e salas de aula» In A Comarca de Arganil,
Ano XLV, n.º 3124, 27/02/1945, p. 1
(283)
  «A construção de novos edíficios escolares» In A Comarca de Arganil, Ano XLV, n.º 3139, 24/04/1945, p.1
(284)
  «Em prol da instrução. Vila do Mato inaugurou festivamente a sua nova escola» In A Comarca de Arganil,
Ano XLVII, n.º 3325, 07/03/1947, p.1

181
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Uma comitiva das forças vivas da região marcou presença no acto de inauguração, a
que compareceram «muitas centenas de pessoas, não só da localidade como das freguesias
vizinhas»(285), num momento animado pela banda de música do Ervedal da Beira, com direito
a foguetes e morteiros, e lançamento de flores, pelas raparigas da terra, sobre os convidados.
O Presidente da CM de Tábua, José Teles Corte Real, cortou a fita antes da sessão
solene que decorreu no amplo salão escolar, num dia de intenso frio que serviu para realçar
as qualidades do «interessante fogão de aquecimento, que muito dispôs a assistência».
Após palavras de circunstância proferidas pelo presidente da CMT, seguiu-se a leitura
do auto de entrega do edíficio à edilidade, compreendendo uma sala mista, construída
pelo Estado Novo em regime de comparticipação. Acto contínuo, foi o edíficio confiado
à guarda, zelo e competência da professora Cecília Esteves Gouveia, usando em seguida da
palavra: o pároco de Midões, José Lourenço de Matos, o Comandante da Legião Portuguesa
de Tábua, Joaquim António Gaúcho, e o Director Escolar do Distrito, Bernardo Rodrigues.
Como era o momento de assinalar aqueles que mais haviam contribuído para a cons-
trução da escola, o Presidente da CMT relembra o gesto de D. Maria José Borges Rocha
e Castro, de Venda do Porco e residente em Coimbra, agradecendo-lhe a «gentílissima
e valiosa oferta do terreno para a construção desta escola e suas dependências, gesto de
altruísmo e benemerência pública»(286), que veio a ser consagrado em voto de louvor re-
gistado na acta da reunião do executivo tabuense de 15/03/1947(287).
A benemérita, também conhecida como D. Maria José Borges Abranches Rocha, nasceu
na Casa da Venda do Porco, a 08/04/1893, e faleceu na Quinta da Encavalada-Nogueira
do Cravo, a 13/07/1981, sem geração (288). Casou a 26/08/1918 com Pedro Augusto
Pereira de Castro, ilustre republicano, nascido em Figueira de Castelo Rodrigo, em 1867,
onde foi Presidente da Câmara e Administrador do Concelho, Juiz do Supremo Tribunal
de Justiça, Deputado, Governador Civil do Porto e Ministro da Justiça em 1924-1925.
A ligação com a Freguesia de Midões resulta do facto de D. Maria José ser filha do
comendador João Maria da Rocha, grande proprietário, comendador da ordem de NS
da Conceição, nascido na Vila do Mato (Midões) e falecido na casa da Venda do Porco.
A encerrar a cerimónia da inauguração, guardou-se, também, um minuto de silêncio
pela alma de Afonso Henriques de Sousa «que muito contribuiu para a realização do me-
lhoramento inaugurado»(289). Pouco sabemos do seu envolvimento na obra escolar, mas
sabemos que era republicano, Secretário da Comissão Republicana Paroquial de Midões
(1910-1913) e vogal da Irmandade do Santíssimo Sacramento (1911).

(285)
  «Em prol da instrução. Vila do Mato inaugurou festivamente a sua nova escola» In A Comarca de Arganil,
Ano XLVII, n.º 3325, 07/03/1947, p.1
(286)
  ibid. p. 2
(287)
  AMT – Livro de Actas das Sessões da Câmara Municipal de Tábua, 1945-1947, fl. 88v.
(288)
  OLIVEIRA, 2005, p. 41
(289)
  «Em prol da instrução. Vila do Mato inaugurou festivamente a sua nova escola» In A Comarca de Arganil,
Ano XLVII, n.º 3325, 07/03/1947, p. 2

182
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Cumprindo a sua função durante décadas, a escola primária de Vila do Mato veio a
encerrar há alguns anos. Sofreu recentemente obras de requalificação e é usada pela po-
pulação, sobretudo o exterior e anexos, em ocasiões festivas.
Quanto à residência dos professores, poucas foram as casas para professores construídas
na década de 20, enquanto na década seguinte vingou a tendência para reduzir a escola
a pouco mais que sala de aula. Apesar do Regulamento de Disciplina Escolar definir o
alojamento dos professores no lugar da sede da escola a tendência foi contrária e, em
22/06/1935 o Ministro Duarte Pacheco, por despacho, adia a sua construção mas solicita
a reserva de terreno para esse fim na implantação das escolas.
O Ministério da Educação Nacional, Carneiro Pacheco, que titulava a pasta desde 1936,
publicou um conjunto de leis com os princípios ideológicos do Estado Novo: Instituição da
Junta Nacional de Educação, com poderes sobre todos os aspectos do ensino e investigação;
obrigatoriedade dos livros únicos para as várias disciplinas do ensino primário; criação da
Obra das Mães para a Educação Nacional atribuindo-lhe a superintendência em todas
as formas de ensino infantil e em todos os aspectos da educação das raparigas; revisão do
programa de ensino primário, baixando para a 3ª classe a escolaridade elementar; criação
dos postos escolares, nos meios rurais, com um mínimo legal de frequência; atribuição às
Câmaras Municipais da responsabilidade «…de fornecerem as instalações para as escolas
e postos escolares, as quais deveriam obedecer, entre outros, ao princípio da separação dos
sexos»; ensino primário gratuito para quem atestasse ser pobre(290).
No programa de educação nacional do Estado Novo, havia intenção de ensinar as crian-
ças a ler, mas seria prioritário educar politicamente o povo. Queria estabelecer uma rede de
postos de ensino elementar, ficando de fora a escolaridade dos adultos, admitindo-se que
a emigração ou o serviço militar acabariam por atenuar as elevadas taxas de analfabetismo.
Ainda nesse espaço, e por determinação oficial o novo regime queria que as crianças
cedo reconhecessem as autoridades máximas do país. Por isso, a partir de 28/05/1934, as
salas de aula passaram a ostentar o retrato do Chefe de Estado bem como o do Presidente
do Conselho e, em 1940, a bandeira nacional.
Ao abrigo da legislação vigente, o município continuava a assegurar as grandes despesas
de funcionamento das escolas do concelho: renda das casas das escolas, limpeza e expe-
diente, mobiliário escolar e material didáctico exigido pela portaria nº 7.791. No entanto,
a partir do DL nº 26.116 de 23/11/1935, os professores passaram a suportar 50% da
despesa com a renda da casa quando a despesa do arrendamento do edifício escolar fosse
na totalidade suportada pelo município.
Entre 1926 e 1935 a rede escolar não seria contemplada, ao contrário do divulgado,
com significativas melhorias: «…o grande volume de pedidos dizia respeito à construção
de novos edifícios (ou ampliações) e à realização de grandes reparações (telhados, tectos,
soalhos), a análise das Contas Correntes dos empreendimentos revela dezenas de obras

  BEJA & SERRA & MACHÁS & SALDANHA, 1990, p. 240


(290)

183
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

que, depois de autorizadas, não chegaram a ser lançadas, ou, então, a ocorrência de gastos
mínimos – abertura de caboucos, colocação de vidros, caiações, etc. No fim de cada ano
eram anuladas as dotações não aplicadas e retiradas as verbas não gastas»(291).
Desde o ano de 1932 havia na DGEMN uma secção de arquitectura apta a elaborar
projectos – a 5ª Secção da Direcção dos Edifícios Nacionais do Sul, chefiada pelo Arq.
Guilherme Rebello de Andrade. Em 1933 a sua memória dava conta da falta de apetrecha-
mento humano e material da secção para «executar plano de obras de escolas primárias»,
avançando contudo para o trabalho de preparação dos novos projectos. Definiu, então,
vários conceitos, entre os quais o da Regionalização a que deveriam obedecer os «edifícios
escolares a construir em série pelo governo» e que seria a base dos projectos tipo regionaliza-
dos dos arquitectos Raúl Lino e Rogério de Azevedo(292), encomendados pelo MOP entre
1933-1935, dos quais se concluíram 32 edificios Raul Lino e 56 Rogério de Azevedo.
Até final da década os Governadores Civis a pedido do MOP elaboraram relações das
escolas primárias que necessitavam de verbas para novos edifícios ou reparações, mas não
existia um plano global de empreendimentos e os pedidos eram atendidos caso a caso.
A construção de novas escolas no concelho, substituindo as existentes, torna-se a solução
óbvia e tais projectos seriam executados ao abrigo do Plano dos Centenários, designação
oficial publicada em discreto artigo da Lei n.º 1985, de 17/12/1940 (Lei Orçamental
para 1941). Esta designação veio a identificar não só o plano da rede escolar, como ma-
pas das estimativas, fases do envolvimento doutrinário (bases pedagógicas) e a realização
material dos edifícios, perpetuando as comemorações do Duplo Centenário da Fundação
e Restauração de Portugal que decorreram entre Janeiro de 1939 e Dezembro de 1940.
Foram equipas da DGEMN que executaram os trabalhos para o lançamento, a partir
dos primeiros anos da década de 40, das várias fases do anunciado plano. Raul Lino e
Rogério de Azevedo não trabalhariam nos projectos das Escolas dos Centenários. Contudo,
os novos edifícios tipo basearam-se nos seus projectos regionalizados datados de 1935.
Dos edifícios escolares a construir queria-se forte impacto social e político: «eram uma
força que tinha de ser transmitida aos núcleos freguesia»(293), dizia-se, tendo a DGEMN
continuado as obras dos edifícios começados antes de Setembro de 1938 lançando novos
empreendimentos, a título excepcional, respondendo às muitas solicitações das JF, CM e
GC, tendo as Câmaras Municipais comparticipado as obras a 50%.
Duarte Pacheco teve a intenção de iniciar rapidamente os trabalhos para a construção
de 200 edifícios. Cada uma das direcções da DGEMN (Norte, Centro, Lisboa e Sul) es-
tudaria a localização de um grupo de 50 escolas e 84 salas, de que resultou a organização
e remessa dos Mapas de Distribuição dos Edifícios, alterados e examinados pela Comissão
de Revisão da Rede Escolar, motivando alguns protestos das CM.

(291)
  BEJA & SERRA & MACHÁS & SALDANHA, 1990, p. 197
(292)
  ibid. p. 190
(293)
  ibid. 1996, p. 14

184
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

A 28/01/1942 a Direcção do Centro remetia toda a documentação para o anúncio do


concurso público referente à construção de 47 escolas. Quanto aos projectos definiram-se os
tipos base: o Centro, além do tipo Beira Litoral, de Rogério de Azevedo (distritos de Aveiro
e Coimbra), construiria o tipo Estremadura - cantaria de Raúl Lino (distrito de Leiria)
O Plano dos Centenários desenvolveu-se em 6 fases, entre 1944-1974, e procurou
seguir o princípio legal da não coeducação dos sexos (fiel aos princípios ideológicos do
Estado Novo) quanto às salas e edifícios, mesmo nos meios rurais. Queriam-se edifícios
distintos e, nas primeiras empreitadas do Norte e Centro construíram-se pequenas escolas
geminando-se os edifícios por razões de economia (terreno, prazos, custos), mantendo
entradas independentes e recreios separados. No Centro todos os edifícios gémeos previstos
eram de 2 salas, uma para cada sexo, tipo Beira Litoral(294).
A 20/4/1930 a Comarca de Tábua dava conta da intenção em se edificar uma nova
escola em Midões. Esta viria a contar com o apoio financeiro estatal, tendo o governo
central disponibilizado 30 contos em 1934.
Doravante, as actas passam a referir-se à Escola Velha, que continuou a funcionar em
imóvel arrendado pela Junta de Freguesia em duas fracções : 1º andar à professora da
escola e rés do chão do imóvel a particulares. Entre Janeiro de 1947 e Dezembro 1951 o
rés do chão esteve arrendado ao Club Desportivo e Recreativo de Midões por 120$00(295).
Posteriormente, e a partir de 1973, nele se instalou a Casa do Povo.
Em finais de 1935, a junta de freguesia suportava encargos com a luz e expediente
de funcionamento do curso nocturno na Escola Masculina de Midões. Por alguma razão
que desconhecemos, este curso veio a interromper-se, deliberando a JF retomá-lo, em
Novembro de 1938, por considerá-lo «absolutamente necessario para esta freguesia, em
virtude do numero de analfabetos ser muito grande», encarregando-se de pagar a despesa
da luz e de outras despesas(296).
O recenseamento de 1950 apontou para a existência em Portugal de 2.916.600 anal-
fabetos com mais de 7 anos e, na faixa dos 7-11 anos (idade escolar) 20,3% das crianças
continuava por alfabetizar. Pelos Decreto-Lei n.º 38968 e Decreto n.º 38.969 de 27/10,
publicou-se o Plano de Educação Popular, procurando, de uma forma dura, criar con-
dições para que todos completassem o 1º nível de instrução primária: obrigando todas
as crianças a frequentar a escola primária até à aprovação no exame de ensino elementar
(3ª classe) ou até completarem 13 anos de idade; multa aos encarregados de educação e
fim do abono de família em caso de não cumprirem. Pôs-se também, em movimento a
Campanha Nacional de Educação de Adultos, custeada pelo Fundo Nacional de Educação
de Adultos, com carácter informativo, que veiculava propaganda, filmes, missões culturais
e noções de educação.

(294)
  BEJA & SERRA & MACHÁS & SALDANHA, 1990, pp. 27-28, 31
(295)
  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1937-1953, fl. 47
(296)
  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1937-1953, fl. 9

185
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Para combater o estado deficitário do país a nível de infraestruturas delineou-se o


I Plano de Fomento, para vigorar de 1953-1958, primeiro ensaio português de prática de
planeamento económico, tendo como objectivos: aumentar a produtividade do trabalho,
reduzir desemprego, melhorar o nível de vida no país. Daqui resultou maior afluência
escolar e novas construções escolares.
O edifício da velha escola serviu, em meados de 1953 e 1973, para funcionamento do
Curso Oliva e, em finais de 1953 pensado para sede da freguesia.
O recenseamento de 1950 apontou para a existência em Portugal de 2.916.600 anal-
fabetos com mais de 7 anos e, na faixa dos 7-11 anos (idade escolar) 20,3% das crianças
continuava por alfabetizar. Pelos Decreto-Lei n.º 38968 e Decreto n.º 38.969 de 27/10,
publicou-se o Plano de Educação Popular, procurando, de uma forma dura, criar con-
dições para que todos completassem o 1º nível de instrução primária: obrigando todas
as crianças a frequentar a escola primária até à aprovação no exame de ensino elementar
(3ª classe) ou até completarem 13 anos de idade; multa aos encarregados de educação e
fim do abono de família em caso de não cumprirem. Pôs-se também, em movimento a
Campanha Nacional de Educação de Adultos, custeada pelo Fundo Nacional de Educação
de Adultos, com carácter informativo, que veiculava propaganda, filmes, missões culturais
e noções de educação.
Uma palavra final para o material didáctico e mobiliário. As Escolas dos Centenários
à luz dos padrões actuais, não seriam confortáveis nem particularmente acolhedoras,
mas ofereciam as condições higiénicas e pedagógicas essenciais. O problema, frequente,
foi a sobrelotação. O material escolar tinha duas proveniências principais Ministério da
Educação Nacional, que escolhia e comprava o material didáctico (distribuído através das
Direcções Escolares), nem sempre novos ou completos; e o Ministério das Obras Públicas
que lançava os concursos de fornecimento de mobiliário e fiscalizava as entregas(297).
Em termos de correios, a 18/09/1938 foi inaugurado o edifício da Estação de Correios
de Midões, na presença do Director dos Serviços de Coimbra, após conclusão das obras
promovidas pela Administração Geral dos Correios. Seriam responsáveis pelo funciona-
mento desta unidade, na qualidade de chefe de serviço: Beatriz Janela Leitão (1938-1939),
Maria Albertina (1943-1960) e Paulo do Carmo (1962-1972).(298)

  BEJA & SERRA & MACHÁS & SALDANHA, 1990, p. 267


(297)

  Dados recolhidos dos Anuários Comerciais de Portugal


(298)

186
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

D. TEMPOS DEMOCRÁTICOS

1. A TRANSIÇÃO DE PODER
A primeira reunião, após a revolução de 25 de Abril, da Junta de Freguesia de Midões
ocorre a 30/04. A alusão ao movimento é sintética revelando cautela:
«Mais deliberou tomar conhecimento do Movimento das Forças Armadas de 25 de
Abril de 1974 e aguardar ordens superiores»(299).
Até final do ano, o funcionamento da junta em nada se alterou relativamente ao pas-
sado, revelando preocupações com o regulamento do tráfico rodoviário, com a criação da
telescola, canalização de águas ou reparação de caminhos. Chega, inclusivamente, a agir
de acordo com a lei vigente, designando a nova JF a 13/12, em reunião extraordinária.
O novo ano, traria o necessário enquadramento nas reformulações político-adminis-
trativas em curso. A 30/01/1975 realiza-se o auto de posse da Comissão Administrativa
da Junta de Freguesia de Midões, nomeada por portaria de 6/12/1974, DG nº 20, II
Série, de 24/01/1975:
«Aos 30 dias do mês de Janeiro do ano de 1975 na sede da Junta de Freguesia de
Midões, onde se encontrava o Excelentíssimo Senhor Professor José do Nascimento Matos,
Presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Tábua, para os fins con-
signados no parágrafo 2.º do art.º 258 do Código Administrativo, aplicável por força do
parágrafo 3.º do art.º 384 do mencionado diploma legal, compareceram os senhores José
Augusto Moura Godinho, empregado de escritório, Sebastião Pereira Ribeiro, empregado
de escritório, Alfredo Dias Borges, comerciante, António Correia de Oliveira, padeiro, e
António Tavares, empregado de escritório, nomeados por Portaria de 6 de Dezembro findo
e publicada no Diário do Governo, segunda série, de 24 de Janeiro, respectivamente, para
Presidente e Vogais da Comissão Administrativa da Junta de Freguesia de Midões que,
nos termos do art.º 4 do Decreto-lei nº 236/74 de 6 de Junho do ano findo, há-de servir
até à publicação das disposições legais relativas á organização dos corpos administrativos,
prevista no programa do Governo Provisório, a que se refere o Decreto-lei, nº 203/74,
de 15 de Maio. Verificados os poderes e a identidade de Presidente e Vogais da referida
Comissão Administrativa, prestaram, de seguida e individualmente o seguinte juramento:
«Eu, abaixo assinado, afirmo solenemente pela minha honra que cumprirei com lealdade
as funções que me são confiadas». Posto isto o magistrado instalador declarou todos os
membros da mencionada Comissão Administrativa investidos nos seus poderes e consti-
tuída e apta a deliberar a Comissão Administrativa da Junta de Freguesia de Midões»(300).

  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1968-1978, fl. 27
(299)

  ibid. fl. 32
(300)

187
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Esta comissão iria gerir os destinos da freguesia até às primeiras eleições autárquicas
democráticas. Na prática a linha de continuidade prevalece, como reparação de caminhos
(terraplanagem Caminho de acesso a Vale de Gaios, 1976), pontes, fontes, lavadouros
(como de Vila do Mato, 1976), reparação do relógio da torre da igreja. Apostam, também,
na captação de água na povoação do Esporão, no arranjo do Valverde.
A 31/01/1977 a Comissão Administrativa cessa funções, entrando em actividade a
primeira junta de freguesia eleita democraticamente, depois de empossada a 28/01 (ver
tabela 10). Entre as preocupações que transparecem das actas, evidencia-se a questão
financeira: a partir de Junho de 1979, aparece no movimento de receita mensal, pela pri-
meira vez, a rubrica de cobrança de lugares na feira, cujo rendimento passou da Câmara
Municipal, que sempre a tinha vindo a explorar, para a Junta de Freguesia de Midões,
solicitação esta que havia sido pedida pela Junta à Câmara Municipal, aquando da sua
tomada de posse em Janeiro de 1977(301).
Com um volume crescente de despesas, valeu à JFM a existência de algumas fontes
de rendimento fixas: posto médico, aluguer da antiga escola; feira mensal; subsídios da
CMT e cemitério.

Tabela 10 – Executivos da Freguesia de Midões 1974-2017(302)


Data Presidente Vogais
1974-1976 José Augusto Moura Sebastião Pereira Ribeiro; Alfredo Dias Borges;
(Comissão Godinho António Correia de Oliveira; António Tavares
Administrativa)
Presidente Secretário Tesoureiro
1977-1979 José Augusto Moura Alfredo Armando Aníbal Dorindo Borges
Godinho Rodrigues Dinis
1980-1982 Aníbal Dorindo Borges Fernando Manuel Dinis António Ferreira da Silva
Borges
1983-1985 António Alves Rodrigues José Alberto Pereira Armando Fontes da Costa
1986-1989 José Alberto Pereira Armando Coelho Armando Fontes da Costa
Monteiro (técnico conta-
bilista, Casal da Senhora)
1990-1993 António Alves Rodrigues Guilherme Manuel Armando Fontes da Costa
Pereira Stoffel Esteves
1994-1997 Guilherme Manuel António Manuel Rocha Armando Fontes da Costa
Pereira Stoffel Esteves Correia Oliveira
1998-2001 Id. Id. Id.
2002-2005 Id. Id. José Manuel da Costa
Borges

  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1978-1983, fl. 8v.
(301)

  Fonte: Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões; 1968-1978; 1978-1983; 1983-1987;
(302)

1988-1999; 2000-2006; 2006; 2007-2014, 2014-2016

188
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Data Presidente Vogais


2005-2009 Paulo Alexandre Cardoso Paulo Jorge Pereira Sérgio Carlos Coelho
Oliveira Portugal Fontes
2009-2017 José Alberto Pereira Id. Cristina Alexandra
Morais Borges Tavares

2. A CONSOLIDAÇÃO DA DEMOCRACIA: PROGRESSO E DESENVOLVIMENTO

2.1. Os anos 80

No início da década, a vida político-social da freguesia era marcada pelas reuniões da


junta com a população, vitais para a sobrevivência e valores democráticos. A 25/01/1980
a JF assume a «necessidade urgente contactar com todas as populações desta freguesia»,
deliberando efectuar uma reunião em cada lugar «a fim de se inteirar das maiores necessi-
dades dos seus habitantes com o fim de tentar com os meios de que dispõe resolver alguns
dos seus problemas, em conjunto com a Câmara Municipal de Tábua».
Acto contínuo, a 29/02/1980, deliberam visitar todos os lugares da freguesia «…afim
de auscultar as populações locais e saber deles quais as suas carências mais prementes, para
assim dar resposta às mesmas na medida do possível»(303).
Destas reuniões, saiu o levantamento das necessidades a que a Junta procurou acorrer:
limpeza e abertura de caminhos, obra dos lavadouros do adro (construção de tanques
individuais em 1980), do tanque e fonte de Vila do Mato (Julho 1980-1981), reparação
do fontenário da Igreja de Midões (1986);
Uma das obras mais importantes deste período foi a construção do Centro de Recreio e
Convívio de Midões empreendimento inicialmente gerido por uma Comissão Instaladora
(vide foto 39). Como se pode ler na acta extraordinária de 13/06/1981 e acta da AF de
27/06/1981, o edifício do referido centro foi entregue à JF por incapacidade financeira
de concluir o projecto:
«Aos 13 dias do mês de Junho de 1981 reuniu extraordinariamente a Junta de Freguesia
de Midões, conjuntamente com a Comissão Instaladora da Casa do Centro de Recreio e
Convívio de Midões, para receber desta Comissão o Edifício que se encontra em construção
o qual foi entregue a esta Junta por deliberação unânime daquela comissão, na condição
desta Junta levar a bom termo a conclusão das obras necessárias ao funcionamento e aos
fins a que o referido Centro se destina, uma vez que a referida Comissão Instaladora se
vê impossibilitada de continuar as obras por falta de verba, conforme consta da cópia da

  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1978-1983, fl. 15
(303)

189
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

acta assinada pelos membros da Comissão. Deliberou esta Junta nesta reunião aceitar o
edifício e as condições propostas pela comissão»(304).
Passando o imóvel para a posse da Junta, serviu o mesmo para vários fins e instituições:
- Na reunião extraordinária da JF de 09/10/1981, decidiu-se alugar uma parte aos
Serviços Médico Sociais de Coimbra para Posto Médico, tendo-se celebrado escritura
a 29/04/1982, tendo o Serviço Distrital de Coimbra dos Serviços Médico Sociais
procedido à transferência da U.S. Midões para as novas instalações;
- Mais tarde, na sessão de 31/12/1981 foi cedido à Associação Recreativa e Cultural de
Midões «…o salão grande do Edificio da Casa do Centro de Convivio, composto por
uma cosinha, palco, camarim e salão propriamente dito (…) ficando comprometida
a Associação a ceder o salão para todos os actos públicos, culturais e recreativos,
solicitados por qualquer organismo ou grupos ou ainda pessoas representativas de
qualquer lugar da freguesia, solicitação que deve ser feita com aviso prévio, e de
comum acordo com ambas as partes; é condição necessária e obrigatória para que se
mantenha a cedência das referidas instalações, que a Associação mantenha o regular
funcionamento das mesmas»;
- A 31/10/1982 cedendo à Escola Primária de Midões gratuitamente, a sala situada
no Edifício do Centro de Convívio que fica entre a Secretaria da Junta e o Posto
Médico, a fim de ali funcionar uma classe de crianças diminuídas, já que na escola
não há salas vagas para tal fim»(305);
- A 31/01/1984 cedendo à Casa do Povo de Midões, a sala que se encontrava disponível
na Casa Convívio, a título provisório;
- A 11/07/1984, cedendo ao Rancho Infantil da Casa do Povo de Midões, o salão
grande do Edificio da Casa do Centro de Convivio de 15 em 15 dias, para ensaios (306);

De todas estas cedências, a efectuada à Associação Recreativa e Cultural de Midões


tornar-se-ia problemática: por deliberação da AF de 23/11/1985, em votação secreta, onde
votaram 7 a favor, 1 em branco e 2 contra, a Junta de Freguesia concedeu um prazo à
Associação Recreativa e Cultural de Midões, «para que proceda ao levantamento de todo
o material existente na Casa de Convívio e Recreio»(307). No entanto, o assunto continuou
a ser debatido nos meses seguintes transitando para o ano seguinte, levando a um aceso
diálogo entre as partes, vertido na reunião da AF de 23/03/1986:
«a) A gestão do edifício é feita pela Junta de Freguesia; b) A manutenção do edifício
é da responsabilidade da Associação Recreativa de Midoes; c) Todas as obras a efectuar
no edifício, só poderão ser efectuadas com prévia aprovação desta Assembleia; d) Após a

(304)
  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1978-1983, fls. 34v.-35
(305)
  ibid. fls. 37, 40, 46v.
(306)
  AJM – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Midões, 1983-1987, fl. 9v.
(307)
  ibid. fl. 28

190
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

utilização do salão, a limpeza do mesmo é da responsabilidade de quem o utilize; e) uma


cópia da chave do Salão do Centro de Convivio e Recreio, deve ficar na sede da Junta de
Freguesia; f ) para qualquer utilização do salão alheia à actividade da Associação Recreativa
de Midões, terá que ser feito o respectivo pedido à Junta de Freguesia; g) Assim que seja
oportuno a Junta de Freguesia deverá colocar a identificação no edifício de “CENTRO
DE RECREIO E CONVIVIO DE MIDÔES”»(308). Um conflito desagradável que se
prolongou durante o ano e que culminou com a mudança de fechaduras por parte da JFM.
O abastecimento de água à freguesia foi assunto de vital importância durante a década,
que ficou marcada no seu arranque pela albufeira da Barragem da Aguieira concluída em
1979 e inaugurada em 1981 veio a ocupar alguns pontos limítrofes do concelho de Tábua.
Nesta época promoveu-se a reparação de várias fontes da freguesia: a do Adro-Midões
(1977 e 1981), a da escola-Midões (1976 e 1982), a de Valverde-Midões (1977), a de
Vila do Mato (1980) e a do Cadoiço (1982).
Ainda ao nível do abastecimento de água, de registar o agradecimento expresso na acta
da junta de 31/08/1983, em nome do progresso, designadamente, a gentileza da Srª D.ª
Maria Júlia Hall e D.ª Eugénia Abranches de Almeida «…em terem cedido a passagem da
conduta das àguas que vêm abastecer esta freguesia, visto ser uma obra de tanta utilidade
pública»(309).
A disponibilização de equipamentos públicos de lazer e diversão, em especial para as
crianças, leva o executivo de freguesia a adjudicar a construção de um Parque Infantil em
Fevereiro de 1985. Em 1986 seria inaugurado o Parque de Jogos em Vila do Mato e, em
1989, o Parque Desportivo de Touriz (vide foto 40).
Em Setembro de 1984, a AF concluía como sendo baldios da freguesia a relação apre-
sentada pelo Secretário da JF, José Alberto: Largo da Farmácia, Terreno de pastagem com
recinto de S. Miguel e Pinhal, Outeiro de S. Miguel, terreno destinado a largo público
com fontanário e roda, em Touriz e Pinhal e mata em Vila do Mato e o Salão do Convivio
em Midões(310).
A rentabilização de baldios foi também procurada em articulação com os interesses
turísticos regionais: a 30/11/1988 a JF autorizou a concessão à Associação de Pesca e Caça
de Midões (ASPECA) «…dos terrenos baldios com sitio na Vila do Mato constituídos por
pinhal e mata (…) para a instalação de um campo de treino de cães de caça, campo de
tiro e outras actividades ligadas a acto venatório regulamentado pela lei vigente», ficando
autorizadas obras para beneficiação dos mesmos «ou o incremento turístico da Região»(311).
O apoio às colectividades da freguesia passou a assumir crescente dimensão, por força
do crescimento cultural e associativo: Associação Recreativa e Cultural de Midões, Grupo

(308)
  AJM – Livro de Actas da Assembleia de Freguesia de Midões, 1986-1990, fl. 1v.
(309)
  AJM – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Midões, 1983-1987, fl. 5
(310)
  AJM – Livro de Actas das Sessões da Assembleia de Freguesia de Midões, 1977-1986, fl. 13v.
(311)
  AJM – Livro de Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1988-1999, fl. 9

191
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Desportivo Tourizense, Associação Recreativa de Vila do Mato, Rancho Folclórico de


Midões, Grupo Cultural Casa do Povo de Midões, Liga Regional Coitense, CNE Ag. 972
de Midões, Associação Recreativa e Cultural Casalense, e às Irmandades.
Em termos de educação, realce para o facto de nos anos 80 ter começado a funcionar a
telescola no salão da Associação Recreativa de Midões. Neste período, importa reter com
especial atenção, a implementação da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86 de
14/10), que reorganizou o ensino em Portugal. A educação passou a estruturar-se em 3
áreas: pré-escolar, educação escolar e educação extra-escolar. A educação escolar passou
a compreender a existência de 3 níveis distintos: Básico, Secundário e Terciário (ensino
superior). As antigas escolas primárias passaram a integrar o 1º Ciclo de Ensino Básico.

2.2. Os anos 90

A década abriria com um momento histórico: a visita do Presidente da República, Dr.


Mário Soares, a Midões, no dia 02/07/1990.
Em termos de projectos fundamentais a desenvolver em Midões ao longo da década
salientaram-se: Casa Mortuária, Sanitários Públicos no Largo da Feira e Alargamento do
Posto Médico.
Dentro da intenção de desenvolver o turismo regional a JF Midões realizou, em Março
de 1993, a Feira de Queijo, com participação de várias queijeiras, que evoluiria, em 1996,
para Feira do Queijo da Serra.
Na sua sessão de 30/06/1994, a JF em articulação com a AF delibera iniciar os tra-
balhos relativos à toponímia dos diversos lugares, constituindo uma comissão composta
pelos cidadãos: Guilherme Manuel Pereira Stoffel Esteves, António Manuel Rocha Correia
Oliveira, Armando Fontes Costa, Fernando Marques Henriques, António Carlos Marques
Antunes e Joaquim Fortunato Oliveira Camisolas(312).
A 30/06/1995 a AF aprova os nomes de algumas ruas, tendo como base sugestões/
alterações propostas pelos moradores: em Touriz, alterando o Beco da Encalhada para
Beco da Reboleira; e no Coito, alterando a Rua do Seixal para Rua Mártir S. Sebastião,
bem como a Rua Mártir S. Sebastião para Rua da Capela(313).
No final de 1999 e de modo a colaborar na atribuição dos nomes de ruas e na atri-
buição dos números de policia, formou-se uma comissão no seio da AF constituída pelos
seguintes elementos: José Luís Saraiva, Júlio Gomes, Jorge Santos, Fernando Henriques,
Rogério Rodrigues(314).

(312)
  AJM – Livro de Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1988-1999, fl. 43v.
(313)
  AJM – Livro das Actas das Sessões da Assembleia de Freguesia de Midões, 1990-2002, fl. 14v.
(314)
  ibid. fl. 33

192
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Em termos de vias de comunicação houve uma forte aposta no alcatroamento/cimen-


tação, em obras executadas por administração da CMT e JFM: Estrada de Vale de Gaios
(Alcatroamento), nova estrada de acesso a Vale de Gaios (por fazer desde 1988), Ruas de
Vale de Gaios (cimentadas), Largo e Ruas do Casal da Senhora (alcatroamento); Rua da
Catraia-Midões (alcatroamento), Rua de Vasco-Midões (alcatroamento), Largo de Touriz
e Rua do Cabo (alcatroamento); Ribeira e parte da estrada de acesso até ao depósito da
água (alcatroamento); Urbanização do Coito (alcatroamento).
Fora desta lógica, foi de importância regional, a aprovação da variante Tojais-S. Miguel,
aprovada superiormente nos finais de 1997. Também se rectificaram caminhos agrícolas
e florestais em mau estado.
Na questão desportiva, o início de 1995 ficaria marcado pela questão da constru-
ção de um pavilhão gimnodesportivo. Os órgãos autárquicos disponibilizariam terreno
no Campo de S. Miguel, com 28x16 m., tendo valido a intervenção do Presidente da
CMT Engº Francisco Ivo de Lima Portela, a quem a JF lançou a 03/02/1995, um voto
«…reconhecendo o esforço e empenho demonstrado par que o Pavilhão Gimnodesportivo
seja uma realidade na Freguesia de Midões»(315).
O protocolo de construção seria assinado a 23/02/1995 na presença do Secretário de
Estado da Educação e do Governador Civil(316). A 13/08/1999 esta valência seria inau-
gurada integrando a Sala de Desporto Escolar da Freguesia, pelo Secretário de Estado
do Desporto, Dr. Miranda Calha, Governo Civil e Presidente da Câmara Municipal de
Tábua (vide foto 41).
Durante estes anos, tomaram-se algumas medidas para melhorar os espaços públicos
de lazer: Parque de Merendas no Coito e Parque de Merendas/Parque Infantil em Touriz
(no Largo das Lages), ambos arrancando em meados de 1996, com a curiosidade de se
terem transformado antigas lixeiras/baldios.
Em termos de assistência médica, alargou-se o posto médico em 1997, num processo
célere: a 31/03 a JF e AF acordaram na realização da obra por administração directa, uti-
lizando a verba inscrita em Plano de Actividades no valor de 2250 contos; a 31/07 inau-
guraram-se as obras de ampliação na presença de várias individualidades - Coordenadora
do Serviço Sub-Regional de Saúde de Coimbra, Presidente da CMT e seus vereadores,
Delegada de Saúde de Tábua, Directora do Centro de Saúde de Tábua, médicos, enfer-
meiros e pessoal administrativo do CS Tábua e extensão de Saúde de Midões, elementos
da AF Midões, representantes de colectividades(317). A 29/11/1997 deliberou-se manter
a renda de 5.000$00 das instalações alugadas à ARS Centro/Sub-Região de Saúde de
Coimbra durante os próximo 5 anos (1998-2002).

(315)
  AJM – Livro de Actas das Sessões da Assembleia de Freguesia de Midões, 1990-2002, fl. 13
(316)
  AJM – Livro de Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1988-1999, fl. 53v.-54
(317)
  ibid. fls. 79, 81v.

193
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

As preocupações com os mais idosos conduziriam à construção do Centro Social


Caeiro da Mata da Paróquia de Midões (vide foto 42), cuja constituição, a 27/03/1995
se deve ao Padre Manuel Carvalheiro Dias. A 16/01/1998 adquiriu o estatuto de IPSS,
tendo funcionado durante 3 anos em instalações provisórias, gentilmente cedidas pela Liga
Regional Coitense, com as valências de Centro de Dia e de Serviço de Apoio Domiciliário.
A 09/12/2001 o Conselho da Fábrica da Igreja concordou com o pedido apresentado
pelo Centro Social Caeiro da Matta para a cedência de superfície de 1688 m2 para a cons-
trução do referido centro, definindo como condições: cedência por período não superior
a 30 anos, utilização dentro dos objectivos estipulados, Cedência a Sul do artigo 1005 na
zona mais conhecida como Passal; delimitação a efectuar através de muro se possível(318).
Em Setembro de 2006 foi inaugurado o novo edificio, não só com as referidas va-
lências, mas também com a de creche. Para este equipamento social foram canalizados
importantes recursos, incluindo não só da própria junta de freguesia (1250 euros em
Abril 2007 para obras na sede e 1500 euros em Janeiro 2008 para aquisição de viatura),
como os provenientes de várias associações da freguesia, como o donativo da Associação
Recreativa de Midões, que à data da sua extinção, contribuiu com 2126$90(319). Desde
Março de 2012 que possui a valência de Centro de Noite. Tem, na actualidade, equipa-
mentos noutras freguesias (Póvoa de Midões, Mouronho e Carapinha) e conta com mais
de 100 colaboradores e cerca de 405 clientes.
Em termos escolares, de realçar o facto de ter começado a funcionar no ano lectivo
1997-1998 a escola nocturna, dirigida aos que beneficiam do rendimento mínimo e que
não terminaram a sua escolaridade obrigatória, ou seja, a quarta classe, o sexto ano e o
nono ano, e para mais alguém que estivesse interessado.
No tempo do Engº Ivo Portela retirou-se o trânsito do interior de várias povoações
com a construção de variantes. Foi o caso de Midões, mas também de Tábua, Póvoa de
Midões, Covas e Ázere.
No abastecimento de água, de registar a reparação da fonte e tanque do Esporão bem
como da fonte de baixo, em Touriz (1994).

2.3. Século XXI

A Junta de Freguesia alargou as suas competências e funções durante os últimos anos


de acordo com a lei vigente: o licenciamento de canídeos, desde 1999, ou a dinamização
de OTL. Com a instalação de um novo paradigma, houve necessidade de se modernizar:
disponibilizando site na Internet, comprando aplicações informáticas, criando um ponto

  ACPT – Livro do Tombo da Corporação Fabriqueira Paroquial da Freguesia de Midões, 1927-2004, acta n.º 24
(318)

  AJM – Livro de Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 2000-2006, fl. 17v.
(319)

194
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

de acesso público e livre a toda a freguesia que funcionou na Junta de Freguesia desde
Janeiro de 2006.
A sua sede transitou para o edifício da Fábrica da Igreja de Midões, onde se encontra
actualmente (vide foto 43), tendo a Junta cedido, em contrapartida, a casa do Largo
Valverde. Com esta troca foi possível a celebração de contrato entre os CTT e a JF Midões,
a 31/10/2011, ficando o primeiro a receber um subsídio mensal – forma de evitar o encer-
ramento da Estação de Correios de Midões(320). Dado o estado de degradação dos anexos da
estação dos CTT a JF procederia ao seu arranjo para servirem de sala de reunião e arrumos.
Ao nível desportivo realizou-se, em 2006, o Campeonato Mundial de Kempo no Salão
de Desporto da Freguesia. Apostou-se no cicloturismo dinamizado desde o ano 2000 pelo
CNE 972 Midões, e nos motoclubes, como o de João Brandão desde a sua constituição
em 2004. O voleibol, o grupo de ginástica ou o tourizense, foram também apoiados.
Os equipamentos da freguesia, como o Centro de Convívio de Midões foi ampliado
em 2006 com construção de garagens para arrumos e salas. Obras importantes para a fre-
guesia, em termos sociais, como o Centro Social e Paroquial de Midões foram subsidiadas,
o mesmo sucedendo com as diversas colectividades e apoio a necessitados.
Um dos principais equipamentos construídos, resultante de uma parceria entre o
Centro Social Caeiro da Matta, a Fábrica da Igreja e os Escuteiros de Midões ao abrigo
do PRODER medida 3.2.2. Serviços Básicos para a População Rural, foi o Centro de
Actividades Juvenis/Sede do Agrupamento de Escuteiros (vide Foto 44). Um espaço para
desenvolvimento de acções lúdico/educativas das crianças e jovens, sede do Agrupamento
de Escuteiros 972 Midões, benzido e inaugurado a 21/04/2012 pelo Bispo de Coimbra
D. Virgílio Antunes. Contou com o apoio financeiro da Junta de Freguesia.
De realçar, também, a continuação da actividade da Comissão de Melhoramentos
de Touriz, responsável pela construção do Salão Social – Casa Mortuária, inaugurado a
05/05/2013 (vide Foto 45).
Em termos de rodovias, foi alargada a Estrada da Ribeira para Negrelos (2012), e o
caminho rural na Quinta do Góis (2012), entre outros.
Na criação de espaços de lazer, será de destacar a reconstrução do açude de Vale de
Gaios, em cooperação com os habitantes da localidade, tendo em vista a construção de
uma praia fluvial, bem como o parque do Coito.
Do ponto de vista escolar foram aplicados vários parques infantis na freguesia entre
2000-2001, designadamente: no Coito, Casal da Senhora, Ribeira e Midões. O apoio ao
jardim de infância também não foi esquecido.
No seguimento da aprovação superior, em 1999, do projecto 2000, seria inaugurada a
Escola Básica Integrada de Midões, a 16/09/2002 (vide Fotos 46 e 47). O novo equipa-
mento foi inaugurado pelo Ministro da Educação David Justino, que à entrada da escola

  AJM – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Midões, 2007-2014, acta n.º 10, 31/10/2011, fl. 34 (e
(320)

documentos anexos)

195
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

foi recebido por crianças que lhe ofereceram flores e por salva de foguetes. Além do mi-
nistro, usaram da palavra o Presidente da Comissão Instaladora, José Carlos Silveira, e o
Presidente da CM Tábua, Ivo Portela. A imprensa local deu ampla cobertura ao momento:
«Na segunda-feira, foi inaugurada em festa, pelo Ministro da Educação, David Justino,
a Escola Básica Integrada de Midões.
Uma Escola, como alguém disse, «construída em tempo recorde» e cujo custo ascende
quase aos 700.000 contos. Mas é uma obra digna, que dignifica Midões e o concelho de
Tábua.
Moderna e funcional e construída em espaço agradável e arejado, a nova Escola foi
concebida para 18 turmas e neste momento já tem um universo de 400 alunos, que a partir
de agora passam a dispor de condições que lhes permitem, substancialmente, melhorar as
suas condições de ensino»(321).
A nova escola foi implantada em terrenos cedidos em grande parte pela benemérita
Cuqui Fierro que no momento da inauguração não seria esquecida, tendo o seu nome
sido perpetuado na ampla alameda construída à frente do estabelecimento escolar «num
gesto de reconhecimento e de gratidão».
Em prol deste equipamento escolar a AF aprovou a 30/04/2002 o encerramento das
escolas primárias pertencentes à JF Midões(322). A disponibilização desta escola foi um
momento importante na educação das crianças da comunidade, uma vez que a outra
escola existente em Midões fora concluída em 1936.
Foi ainda no seu âmbito que a JFM subsidiou, em 2004, a estrutura do palco desti-
nado a várias actividades. Por outro lado, adquiriu-se, no ano 2006, uma viatura do tipo
mini-bus, com 16 lugares para transporte de alunos para a escola.
As questões ligadas ao ambiente levaram a freguesia a implementar em Janeiro de 2005
um sistema de recolha dos designados «monstros domésticos», bem como à colocação de
ecopontos.
O respeito pela memória e pela história levam a JF e AF a aprovarem os Símbolos
Heráldicos da Freguesia: a 30/04/2001 o executivo aprecia o estudo elaborado pela Diácria
Editora Ld.ª, constituído por Brasão, Bandeira e Selo. Delibera, por unanimidade, aprová-
-lo e enviá-lo à Comissão de Heráldica da Associação dos Arqueólogos Portugueses, para
a emissão do respectivo parecer nos termos da Lei nº 53/91 de 7/8 e posterior remessa à
AFM para nos termos da Lei nº 169/99 estabelecer a respectiva constituição(323).
Também o respeito pela história, vertente militar, esteve na origem da homenagem
de 05/10/2008, promovida pela Associação de Combatentes do Concelho de Tábua, em
conjunto com a JF Midões, a três combatentes que tombaram no Ultramar: António

(321)
  «Ministro da Educação inaugurou novas escolas» In A Comarca de Arganil, Ano CII, n.º 11.270, Quinta-
feira, 16/09/2002, p. 14
(322)
  AJM – Livro das Actas das Sessões da Assembleia de Freguesia de Midões, 1990-2002, fl. 47
(323)
  AJM – Livro de Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 2000-2006, fl. 10v.

196
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Henriques Oliveira Marques, Carlos Manuel Abrantes Borges e José Eduardo Marques –
cujos nomes foram inscritos numa placa descerrada junto à sede da autarquia(324).
Ainda no âmbito do respeito pela sua antiguidade, a Junta de Freguesia realizou a
12/09/2014, uma festa evocativa dos 500 anos da atribuição de foral (vide fotos 48 e 49)
e deliberou adjudicar, em Maio de 2016, a Monografia da Freguesia.
A toponímia continuou a ser revista e actualizada com novos topónimos, tendo-se
aprovado em 2004: Avenida Cidade Nabril (Estrada nova desde a rotunda de S. Miguel
até ao cruzamento da Estrada dos Tojais), tendo em vista perpetuar a antiquíssima cidade
romana de nome Nabril que originou o aparecimento de Midões; Praceta 12 de Setembro
(praceta na urbanização construída pela Midopredial), evocando o 12 de Setembro de
1514, data de atribuição de novo foral a Midões, elevação a Vila; e o Beco do Palácio
(beco transversal à rua da Igreja) junto à casa do 2.º Visconde de Midões, conhecida por
palácio(325).
Também a toponímia de Vila do Mato foi objecto de reformulação com a aprovação,
nos finais de 2004, do Beco das Eiras, Beco Chão da Pereira e Rua das Sarnadas.Em
Agosto de 2007 aprovaram-se os topónimos Beco de Santa Ana (Vila do Mato) e Rua da
Estrada Velha (Tojais)(326).
Nos últimos anos a JF Midões tem-se desdobrado em múltiplos esforços: manutenção
e conservação dos templos da freguesia e do semitério, subsídios a colectividades, dona-
tivos ao jardim infância, apoio às festividades profanas e religiosas, reparação de fontes e
fontanários, apoio a equipas nos jogos sem fronteiras, construção de passeios, arranjo de
valetas, entre outros.

E. EVOLUÇÃO ECONÓMICA E SOCIAL: DA REPÚBLICA À ACTUALIDADE


Dos princípios do século à actualidade o país sofreu grandes transformações no seu
tecido económico e social. A Freguesia de Midões não fugiu a essa regra e as principais
linhas de continuidade e de ruptura são bem visíveis na análise de fontes manuscritas,
como os registos paroquiais, mas também nas imprensas, caso dos anuários comerciais.
Em termos demográficos municipais, de acordo com os dados dos censos, foi sempre uma
freguesia pujante: a segunda maior em número de habitantes em 1882, a primeira em
1970, de novo segunda em 1981,1991 e 2011 (ver tabela 11).

(324)
  «Midões homenageou (postumamente) três combatentes do Ultramar» In A Comarca de Arganil,
15/10/2008, p. 20
(325)
  ibid. fl. 35
(326)
  AJM - Livro de Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 2007-2014, fl. 5v.

197
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Em 1911, pouco depois da implantação do regime republicano, a freguesia tinha 2910


habitantes. Cruzando as fontes acima descritas(327) verificamos como o peso da actividade
agrícola era imenso: 89 pessoas como agricultores, com grande concentração em torno de
Vila do Mato, e 25 proprietários. Também ligado ao mundo rural a figura de um feitor
– António da Costa Marques (Touriz).
Nas artes e ofícios destacam-se: os alfaiates de Touriz, António Augusto Borges e
Franklim de Abrantes Ferrão; os carpinteiros José Pinto, António Tavares Vaz e António
Augusto (Coito), António Borges da Silva (Touriz) e António Pereira (Cadoiço); os sa-
pateiros Camilo Nunes Machado (Touriz, falecido em 1951) e António Francisco Grilo
Júnior (Vila do Mato), os serradores de Touriz, António Joaquim Brito, Manuel Diniz
e José Bernardo, os moleiros Manuel Fernandes e Maria dos Prazeres (da Mourinha) e
Miguel Pais e Maria da Glória (Moinhos da Cerca), o serralheiro Francisco Lourenço
Pinto (Coito), o funileiro Henrique Dias (Midões), o latoeiro António Caetano Antunes
do Vale, ou o tintureiro José Henriques Monteiro (Vale de Gaios).
Vinte anos depois, em 1931, a freguesia mantém quase o mesmo quantitativo popu-
lacional total com 2814 habitantes. A ligação umbilical ao mundo agrícola mantém-se,
porém, reduz o número de agricultores para 68, e de proprietários para 14, enquanto
emerge a designação de trabalhadores actividade onde se inscreveram 11 pessoas.
Nos proprietários considerados como «principais», a maioria marcaram as décadas
seguintes pela dimensão e produção das suas parcelas de terreno, que nalguns casos
produziam óptimo vinho e azeite: António Augusto Rocha, Eugénio Amaro, Maria José
da Cunha Magalhães, Miguel Soares de Albergaria (e Herdeiros), Piedade de Gâmboa
Abranchas (e Herdeiros), Amadeu Rocha, Antonino de Almeida (e Herdeiros), António
Casimiro de Alcântara, Arnaldo Vieira das Neves, Eng.º Basílio Freire Caeiro da Mata,
Casimiro Monteiro, José Alves da Costa, Luís da Costa Júnior (e Herdeiros), Altina
Brandão Amaro, Visconde do Ervedal, Mário Chaves e outros.
Nas artes e ofícios avultam 12 alfaiates, 5 barbeiros, 4 pedreiros, 3 sapateiros, 2 serra-
lheiros, 2 padeiros (José Rodrigues Tavares e Porfírio de Figueiredo, ambos de Midões),
4 famílias de moleiros, 1 canastreiro (Joaquim da Costa, do Coito) e o casal de tecelões,
Joaquim Cardoso e Alzira Henriques (de Vale de Gaios).
No entanto, é o impressionante número de serradores a principal novidade face a 1911:
com 25 indivíduos dedicados a esta arte, uma grande parte moradores em Touriz (10).
A actividade de lagaragem sofre forte incremento nestes anos surgindo seis unidades:
Dr. Francisco Borges Paes Pina, Maria Barbosa da Silva Brandão, Maria José da Cunha

(327)
  AUC – Fundo Paroquial, Freguesia de Anobra: Baptismos 1900; APS – Livro de Baptismos de Anobra
(1910), Livro Misto de Baptismos, Casamentos e Óbitos: 1920, 1928-1932, Livro Misto de Baptismos, Casamentos e
Óbitos (1933-1949), Livro de Baptismos, 1950-1959, 1959-1969, 1970-1972; Livro de Casamentos, 1951-1959;
AMC - Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Condeixa, 1905-1908; Livro das Actas da Comissão
Executiva da Câmara Municipal de Condeixa, 1924-1926 Annuário Commercial de Portugal, Vol. 2 (1916-1968)

198
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Magalhães, Modesta de Gâmboa Abranches, Visconde do Ervedal da Beira, Joaquim José


de Lemos (Herdeiros),
Uma palavra também para aqueles que surgem como negociantes/comerciantes –
António Pereira d’Alvellos (Midões) e Francisco Borges (Vila do Mato). O mundo da casa
continua o espaço por excelência da mulher, com 9 domésticas por ocupação.
Duas décadas depois, em 1951, a freguesia apresenta 2862 habitantes. Nas fontes
consultadas torna-se evidente diminuição da dependência face ao mundo agrícola e
florestal: 37 agricultores, 4 proprietários (Aníbal Garcia Ferrão, do Casal da Senhora;
José Mendes, da Vila do Mato; José da Cruz, de Midões, José de Oliveira Machado, do
Casal da Senhora), 3 trabalhadores e 2 resineiros (Albano Ferreira, do Esporão e José de
Carvalho, de Santo Amaro).
Nas artes e ofícios salienta-se a diversidade e não a quantidade: 7 serradores (dos quais
4 são de Touriz), 6 pedreiros, 3 alfaiates, 2 carpinteiros, 2 sapateiros, 2 padeiros, 1 ferreiro
(Vergilio de Oliveira), 1 latoeiro, o casal de moleiros, Francisco Henriques e Armanda
da Conceição Marques (da Quinta da Ponte). Detecta-se, também, o funcionamento de
3 lagares: o de Antonino da Costa Godinho, o do Eng.º Basílio Caeiro da Mata (grande
produtor de azeite) e o de Sebastião Carlos Albuquerque.
Começa nestes anos a desenhar-se a curva ascensional daqueles que se dedicam ao
comércio e negócios. Num total de 6 indivíduos, 4 na sede da freguesia, entre os quais se
contam: Marcelino José Leitão Esteves, Armando da Rocha Completo, Amadeu Rodrigues
Tavares e Acácio de Brito (estabelecidos em Midões), Fernando Ramos (Casal da Senhora)
e Joaquim Alves da Costa (Touriz).
Neste registo, se comparado com 1931, dá-se uma “explosão” no número de senhoras
que se dedicam às lides domésticas, perfazendo o número de 39. A ligação à prestação
de serviços públicos começa a desenhar-se, com António Monteiro e Arnaldo Vieira das
Neves (ambos de Midões).
De destacar no elenco de gente dedicada às artes e ofícios acima a longevidade de
alguns indivíduos: dos alfaiates António Augusto da Costa (Midões, 1925-1967), de Luís
Lourenço (1925-1967) ou Franklim Abrantes (Touriz, 1927-1960); barbeiros António
Borges da Costa (Touriz, 1926-1960) ou de Manuel de Figueiredo (Vila do Mato, 1926-
1960); ferradores António Martins (1925-1960), latoeiro Laurentino Mendes (1934-
1967).
Os dados que recolhemos dão crédito ao que escreveu Amândio Monteiro na sua
monografia sobre Touriz:
- Sobre os serradores: recordou que se perdia no tempo a razão de se terem radicado
tantos destes trabalhadores em Touriz, cujo conhecimento foi sendo transmitido de
geração em geração. Afirmou que nos começos dos anos 30 existiam na localidade
cerca de 50 «serradores de madeira», utilizando ferramentas de origem artesanal.
Alguns emigravam sazonalmente para outras terras, como Espanha: Províncias das
Astúrias, Cáceres, Catalunha ou Galiza. De forma natural, alguns constittuiram
familia e vivem em terras de Espanha os seus descendentes. Refere, a este propósito

199
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

o nome de Heliodoro, tourizense residente em Navalmoral de La Mata que ainda


não tendo cumprido serviço militar foi feito guerrilheiro à força na guerra civil,
tombando na Sierra de Gredos(328).

A finalizar o seu texto sobre os serradores, recordou uma quadra que se cantava pelas
romarias da região:

Os rapazes de Touriz
Todos eles são serradores
Mas quem os vir aos domingos
Dá-lhes nome de Doutores

Tabela 11 – Evolução da População Total residente na Freguesia de Midões, 1864-2011


ANO POPULAÇÃO
1864 2478
1878 2636
1890 2869
1900 3501
1911 2910
1920 2447
1930 2814
1940 2955
1950 2862
1960 2431
1970 2202
1981 2115
1991 2083
2001 1757
2011 1725

Em 1970, a freguesia tinha 2202 habitantes. Para trás ficaram 7 décadas onde se destaca
o desenvolvimento do comércio e serviços onde quase nada faltava ao cidadão-freguês.
As questões ligadas à assistência e saúde tiveram nos médicos do partido figuras prima-
ciais, como Francisco Homem Brandão e Albuquerque, Henrique Barbas d’Albuquerque,
Henriques de Almeida, José Pereira de Pina ou Petronilho Feio.

  MONTEIRO, 2005, p. 28
(328)

200
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

Complementarmente a Vila de Midões, e seus povoados, dispunha desde finais do


século do apoio de farmacêuticos: José Augusto Madeira de Andrade (estabelecido em
1896), José Cândido Borges da Cunha (estabelecido em 1908), ano em que também se
estabeleceu Arnaldo Vieira das Neves & C.ª (1908).
No apoio legal e jurídico poderia recorrer, nos princípios do século, aos advogados
Aníbal da Fonseca Magalhães Coelho e, posteriormente, ao Dr. Amândio Reis da Rocha,
e ainda ao notário João Augusto de Figueiredo Sampaio e Mello (até 1928) – cargo criado
na vila a 07/0//1905 (vide Diário do Governo n.º 149).
Várias agências bancárias tiveram em Midões as suas representações:
- Banco Lisboa & Açores, representado por Fernando Augusto da Silva (1908-1921);
- Banco Lisboa & Açores e Espírito Santo e Comercial de Lisboa, primeiro represen-
tado por Eurico Rodrigues Fernandes (1943-1949) e, posteriormente, por Amadeu
Moura Oliveira (1950-1960);
- Banco Português do Atlântico, Banto Totta-Aliança, Pinto Magalhães Ld.ª, e Banco
Borges & Irmão, representado primeiro por Maria Manuela Moura (1962-1964) e,
posteriormente, por António Alves Rodrigues (1966-1969);
- Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa, Banco Pinto & Sotto Mayor e Banco
Nacional Ultramarino, representado por Eurico Rodrigues Fernandes (1962-1969)
- Banco Português do Atlântico, Pinto de Magalhães Ld.ª, representado por António
Alves Rodrigues (1970-1972)
- Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa e Banco Nacional Ultramarino (1970-
1972).

Também desde princípio do século XX que as seguradoras se haviam instalado em


Midões:
- Probidade, representada por Fernando Augusto da Silva, 1909-1921;
- Mundial, representada por António da Costa Júnior, no Esporão em 1921 e, poste-
riormente, por Amadeu Rodrigues Tavares, 1934-1972;
- Tagus, representada por Antonino de Almeida, 1921-1935 e, posteriormente por
Guilherme Manuel da Conceição, 1937-1972.
- Portugal Previdente e Ultramarina, representada por Arnaldo Vieira das Neves (1928-
1964) e, posteriormente, por Arnaldo Vieira das Neves, 1966-1972;
- Império, representada por Marcelino José Stoffel Leitão Esteves, 1962-1972;
- Em meado dos anos 60 constituiu-se a Sociedade Industrial Midoense como represen-
tante da Ultramarina, que também garantiu a representação da Atlas a partir de 1970.

O transporte de bens e pessoas era garantido, na primeira metade do século pelo aluguer
de automóveis, anos em que se destacaram: Eurico Rodrigo Fernandes (1925-1939); Luís
Henriques Morais, Alfredo Rodrigues Morais, Armando Lourenço Pereira e Marcelino
José Stoffel Leitão Esteves (1962-1972).

201
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Algumas antigas profissões de artes e ofícios, de base manual, evoluíram para moder-
nas unidades, mecanizadas: foi o caso da Sociedade Industrial de Serração e Carpintaria
Midoense, Ld.ª, a partir de meado dos anos 60; o mesmo sucedendo com a Extrazel –
Sociedade Extractiva de Azeites, Ld.ª, com a serralharia civil de Luís Abrantes da Costa, Sucr.
A ligação ao mundo agrícola embora esmorecendo não se perdeu na totalidade, mo-
tivo pelo qual abriram espaços para comércio de adubos: Arnaldo Figueiredo (Touriz),
mas também Costa & Costa, Guilherme Manuel da Conceição, Fernando Ramos e José
Agostinho Pereira.
A vida social desenvolvia-se em torno de cafés que começam a surgir nos anos 50:
primeiro com a Imperial, seguindo-se os cafés de Amadeu Tavares, de Herculano Miguel
Tavares, Luís Casimiro de Alcântara e José Monteiro (Cadoiço), ou António Borges. Da
vida social fazia parte a aquisição de jornais, fonte de conhecimento e formação. Em
Midões, existiram as seguintes agências de jornais que funcionavam no sistema de repre-
sentantes: Fernando Veiga, Café Imperial Manuel Alves e Olívia Borges Tavares.
A partir de finais dos anos 50 desenvolve-se a construção civil, com as empresas de
Luís Abrantes, Sucr., Fernando Tavares Ribeiro, José Francisco Dinis, Eugénio Pereira de
Figueiredo. Evolução que se conjuga com a venda e assistência a material eléctrico através
de António Dias Fortunato, Fernando Tavares Ribeiro e Luis Abrantes da Costa Sobrinho.
Mas nenhuma actividade se compara ao frenesim trazido pelas mercearias, fonte de
recursos alimentares, contabilizando-se entre 1896 e 1972 a existência de 38 espaços na
freguesia: Fernando Augusto da Silva, Luiz Pinto da Rocha, Francisco Pinto, António da
Costa Júnior (Esporão), Antonino d’Almeida, Alfredo Jorge, Abílio Álvaro d’Almeida,
José da Fonseca Monteiro, Luis Pinto da Rocha, Mário Chaves (Touriz), Pedro Ferreira de
Mesquita, Alfredo Rodrigues Morais, Amadeu Rodrigues Tavares, Antonino de Figueiredo
(Coito), Arnaldo de Figueiredo (Vila do Mato), Augusto Pereira (Touriz), Fernando Ramos
(Casal da Senhora), Guilherme Manuel da Conceição, José Alves, José Rodrigues Tavares,
Júlio Pinto Pereira (Casal da Senhora), Costa & Costa, Henrique Ferrão (Vila do Mato), José
da Cruz, Acácio de Brito, Herculano Miguel Tavares, António Antunes (Coito), António
Borges, António Cardão, Armando de Oliveira Correia (Coito), Carlos Costa (Esporão),
Luís Casimiro de Alcântara, Marcelino José Stoffel Leitão Esteves, Menandro Miguel,
António Pereira, Manuel Ferrão da Silva (Casal da Senhora), José Monteiro (Cadoiço).
Em complemento às mercearias destacam-se: as padarias de Sebastião Rodrigues que
esteve várias décadas em actividade (1904-1960) ou, mais recentemente, a Unipão; e os
talhos, por exemplo, de Alberto Gomes da Costa (anos 30) ou de Mário da Fonseca, que
surge em 1943.
Paralelamente a estes estabelecimentos haviam negociantes de produtos variados: de
ovos, como António Tavares Peixe, actividade que com o tempo desapareceu; de cereais
ou de peles e de gado. Em Midões chegaram a existir sapatarias, a primeira das quais a
de Emídio Cavalheiro, nos anos 20, embora fosse nos anos 60 que tal negócio entrou em
expansão, aparecendo os estabelecimentos de Alfredo Santos, António Nunes Machado
e Arlindo Brito.

202
Capítulo VI  CONTEMPORANEIDADE

As questões ligadas aos falecimentos foram asseguradas pelas agências: Costa & Costa,
José Alves da Costa (Touriz), Acácio de Brito e Herculano Miguel Tavares.
Por fim, o desenvolvimento industrial. A 07/05/1961 a Junta de Freguesia de Midões
apreciava a solicitação requerida pela Sociedade Industrial de Serração e Carpintaria
Midonense Ld.ª, na qual pretende que lhe seja fixada a distância para a nova instalação,
compreendendo plaina, máquinas de carpintaria, moagem, entre outros. Em resposta,
delibera o executivo midonense, por unanimidade, que seja «… considerada da maior
vantagem para a economia local as instalações requeridas. Outrossim declara que não se
lhe afigura que advenham prejuízos para quaisquer pessoas»(329).
Esta empresa efectuaria várias obras na freguesia e depois do seu estabelecimento
outras se fixaram na freguesia tais como, Midobloco L.da, Midofabril, Midofloresta ou a
Midocalmil L.da.

  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1961-1968, fl. 3
(329)

203
VII
Património
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

A. PATRIMÓNIO RELIGIOSO

1.A Igreja Matriz de Midões

1.1. Primeiras referências, titulares, enquadramento religioso

T
emplo situado na Rua da Igreja. Tem como orago Nossa Senhora das Neves,
mas foi nos primeiros tempos da nacionalidade dedicada a São Pelágio – como
figura nas Inquirições de D. Afonso II. Posteriormente, desde finais do séc. XV,
ocupou a dignidade de patrona principal do templo Nossa Senhora do Pranto.
No séc. XIX passou a ser a Virgem Maria com o título de Nossa Senhora das Neves, tam-
bém conhecida como Santa Maria Maior. O título remete para uma antiga tradição segundo
a qual um casal romano, que pedia à Virgem Maria a inspiração para saber como empregar
bem a sua fortuna, recebeu em sonhos a mensagem de que a Santíssima Virgem desejava
que lhe fosse dedicado um templo precisamente na colina do Janículo (Monte Esquilino)
quando aparecesse coberto de neve. Esse fenómeno milagroso aconteceu na noite de 4 para
5 de Agosto, em pleno Verão, datas em que se passou a venerar Nossa Senhora das Neves.
O templo seria construído com esta invocação, no século IV e na referida colina, no
local preciso onde a Virgem Maria deixara as suas pegadas, após aquele invulgar nevão
romano, sendo na actualidade designado como Basílica de Santa Maria Maior, a mais
antiga das quatro basílicas romanas principais(330).

 Vide O Grande Livro dos Santos, Círculo de Leitores, 2012, p. 205


(330)

207
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

A lista das igrejas de 1220-1229 regista 6 templos nas actuais terras do município
tabuense. Uma delas é a de Santa Maria de Midões, tendo como patrono o Bispo de
Coimbra. As outras são S. Mamede de Ázere, Santa Maria de Covas, Santa Maria de
Oliveira/Oliveirinha, Santa Maria de Sinde e S. Salvador de Tábua(331). Esta realidade é
confirmada pelas inquirições de 1258.
O mais antigo pároco conhecido a exercer na paróquia de Midões remonta aos anos de
1281-1282: tratava-se de João Pascoal, Reitor de Midões. Cónego de Coimbra. Público
tabelião da cúria episcopal conimbricense (ver tabela 12).
Na lista de Igrejas de 1320-21, e no que respeita à Diocese de Coimbra, aparecem não
só os templos já referidos mas também o de Candosa. Uma relação organizada por arcedia-
gados, integrando aqueles templos o de Seia, situado entre o do Vouga e o de Penela. De
acordo com a taxação inserta na lista, cobrava-se em Santa Maria de Midões 120 libras, um
valor equivalente ao de Tábua e superado por S. Mamede de Ázere e Santa Maria de Sinde
(130 libras) e Santa Maria de Covas (150 libras) – taxas aplicadas conforme a capacidade
económica de cada igreja, havendo no arcediagado algumas igrejas que pagavam valores
mais elevados na casa das 400, 300 e 200 libras(332).
Os rendimentos das igrejas provinham das rendas das suas propriedades, constituídas
ao longo do tempo e provenientes, na sua grande maioria, de doações dos fiéis, e dos
direitos eclesiásticos cobrados.
O censual da Sé de Coimbra, datado do séc. XIV, arrolou as colheitas da diocese, ou
seja, as contribuições que as diversas igrejas deviam pagar ao Bispo e ao Cabido a título
de obrigação por ocasião da visita episcopal. Aquelas eram satisfeitas em vacas, porcos,
cabritos, galinhas, ovos, cereais, pão, legumes, vinho, azeite, manteiga, mel, especiarias,
sal, cera, lenha, linho, palha e, nalguns casos dinheiro.
Santa Maria de Midões continuava sob patronato do Bispado de Coimbra e pagava uma
colheita, havendo algumas igrejas que pagavam apenas meia colheita ou valores em libras.
O referido censual mostra o aparecimento de duas novas igrejas (Espariz e Mouronho),
produto da expansão populacional.
Os mais antigos registos paroquiais celebrados na antiga matriz de Midões ocorreram
no 2º e 3º quartel do séc. XVI: a 04/03/1565, casaram Dominguas Simoes, filha de Symão,
moradora «no casall acyma de Touris», desconhecendo o cônjuge; a 19/04/1574, baptizou-
-se Maria, filha de Domingos Lopes e Maria Antunes, moradores em Valverde - Midões(333).
De acordo com as Memórias Paroquiais de 1758, das seis dezenas de igrejas e capelas
distribuídas pela região, a paróquia e vigararia de Midões assume particular destaque com
os seus 11 templos: em Midões, a igreja paroquial da invocação de Nossa Senhora do
Pranto, a Capela de S. Miguel e a Capela do Espírito Santo; no Casal da Senhora, a Capela

(331)
  NUNES, 2016, p. 51
(332)
  ibid. p. 56
(333)
  AUC - Registos Paroquiais de Midões: Mistos, 1565-1699

208
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

de Nossa Senhora do Campo e a de Nossa Senhora da Graça; em Vila do Mato, a Capela


de Santa Ana; no Esporão a de Santo António; no Coito as Capelas de S. Sebastião e de
S. Miguel; no Casal de Touriz, a de Nossa Senhora da Esperança; no Casal da Ribeira a
de S. José e outra em Santo Amaro.
Embora nas memórias paroquiais de 1758 não se faça menção às capelas particulares,
as informações de 1721 permitem efectuar o seu levantamento: a instituída em Midões,
em 1719 por João de Abrantes, morador em Cabanas, concelho e vila do Bispado de
Viseu, com imagem de Nossa Senhora do Socorro onde se diz missa; a de Nossa Senhora
da Conceição, de que é administrador D.ª Engrácia Maria e a erigiu Manuel da Costa e
se diz missa; a que erigiu e administra Estêvão de Maria Brandão, com imagem de Santo
Estêvão e nela se diz missa; outra que erigiu D.ª Maria de Miranda Serena, administrada
por Francisco Soares de Albergaria, com as imagens de Nosso Senhor Jesus Cristo, de
Nossa Senhora e de S. José, na qual se diz missa; no lugar de Touriz uma capela erigida
por António de Tavares Leitão e sua mulher D. Luiza Viegas, por eles administrada.
Após a desvinculação do Convento de Lorvão, o pároco era da apresentação da mitra
(Bispado) de Coimbra. Até 1914 Póvoa e Midões fizeram parte do Arciprestado de Travanca
de Lagos. No ano seguinte passou a integrar o de Tábua.

Tabela 12 – Relação de Párocos da Freguesia de Midões, 1281-2017


DATA PÁROCO OBSERVAÇÕES
1281-1282 João Pascoal Reitor de Midões. Cónego de
Coimbra. Público tabelião da curia
episcopal conimbricense.
1433 Vasco Anes Prior de Midões. Ouvidor-Geral do
Bispado.
1577 Manuel Marques do Amaral Vigário.
1564-1566 Joam de Vargas
1566-1569 Antonio Fernandez
1568-1581? Iohão Leitão Provido em Abril de 1568
Vigário de «Nosa Senhora de
Midois».
Faleceu a 03/12/1600.
1588?-1591? Goncalo Pinto
1594?-1596 Manoel Jorge
Julho 1596-1597 Antonio Marques
Julho 1597-1618? Hieronymo Ribeiro Vigário. Nomeado por carta de
04/04/1597. Natural da Vila de
Fornos, Bispado de Viseu.
Foram seus coadjutores:
Domingo Luiz, Simão Ferreira, Pero
Pereira.
Faleceu a 09/02/1618.

209
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

DATA PÁROCO OBSERVAÇÕES


Julho 1618-1648 Pedro Ribeiro Furtado Vigário. Teve como coadjutores:
Pero Pereira, Emanoel Jorge;
Francisco Pereira Ribeiro, Balthazar
Luis.
Faleceu a 24/09/1664 em Midões.
1664-1676(Setembro) Vigário Pedro Marques Foram seus coadjutores: Simão
Gomes e Antonio Diniz.
1676 (Setembro) Vigário Manoel Marquez de Amaral Natural de Nabainhos. Teve como
coadjutores: Antonio Diniz, Manoel
Roiz, Antonio Alveres, Amaro
Botelho e Felipe da Silva.
Faleceu a 28/05/1717.
1688 (Mar) – 1693 (Ago) Manoel Nunes Ferrão Faleceu em Midões a 15/08/1693 e
foi sepultado na Igreja.
1693 (Set) 1696 (Agosto) António Dinis Vigário encomendado.
1696 (Set.) 1698 (Março) António Ribeiro Pinto Id.
1698 (Maio)-1700 Manoel Marques de Amaral Felipe da Silva foi seu coadjutor.
1701-1717 (Agosto) Felipe da Silva Vigário encomendado. Teve como
coadjutores: Amaral Coelho,
Gregório d’Oliveira e António
Alveres.
1717 (Agosto) - 1731 Francisco d’ Oliveira Tavares - Vigário. Teve como codjutores:
António Alveres, André Francisco
Afonso, Manoel Machado Pinto e
Antonio Soares de Albergaria.
A 23/09/1727 concede licença ao
coadjutor Manoel Machado Pinto
para administrar todos os sacramentos.
Faleceu a 31/01/1732, sepultado na
Capela Mor.
1731 (Outubro) – 1732 Miguel Antunes
(Julho)
1733 - Gonçalo de Sousa Foi seu coadjutor Domingos
Martins.
Junho 1735-Junho 1770 João de Sousa Machado Vigário. Teve como coadjutores:
Manoel da Fonseca, Manuel Nunes,
Manuel Machado, Manoel Alves,
Jacinto Alvares, Joze da Silva de
Abreu e José de Sousa Ferrão.
Faleceu a 6/6/1777 e foi sepultado na
Capela-Mor.
1770 -1777 Manuel José Ferreira Colação a 13/12/1770.
Natural da Freguesia de Santa Ovaia
e Prefeito no Seminário de Coimbra.
1777 (Junho)- Manoel Joze da Costa Vigário Encomendado. Natural da
Vila do Mato. Bacharel formado em
Cânones e presbítero secular.
Faleceu a 5/11/1787.

210
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

DATA PÁROCO OBSERVAÇÕES


1778 (Janeiro) – 1811 Manoel Jozeph Ferreira Vigário.
Teve como coadjutores: António
Marques Pimenta, Joze de Souza
Ferrão, João de Oliveira e Jacinto
Joze Pinto.
Faleceu a 21/7/1811, foi sepultado
na Capela Mor de Nossa Senhora do
Campo.
Agosto 1811 – Junho 1814 João Francisco da Costa Vigário. Teve como coadjutor Jacinto
Joze Pinto.
Julho 1814-Fev – 1833 Joze de Araujo Nogueira Vigário que terá sido assassinado pe-
(baptismos) los liberais em 1833. Foi coadjuvado
por João de Oliveira.
Março-Junho 1833 Jacinto José Pinto Coadjutor. Natural da Quinta da
Regada.
Julho 1833 - António Afonso Borges Garcia Natural de Lagares.
1/06/1831- António Ignacio Coelho de Faria Entrou por circular do Provisor do
Bispado.
Julho 1835-Janeiro 1839 António das Neves Sousa Pimenta Encomendado. Natural de Côja.
Abril 1839- Maio 1856 António da Costa Nunes Gonçalves. Natural das Culcas ou Esculcas.
Junho-Novembro 1856 Albino Alves Tavares Encomendado. Natural de Vila Chã.
Novembro 1856- António Maria Gaudêncio Borges Vigário. Natural de Lagares.

Novembro 1857-Junho Adelino Augusto da Silva


1861
Junho 1861-Agosto António Maria Gaudencio Borges Foi coadjuvado por Domingos da
Fonseca Ferrão.

Setembro- 1861 – Maio António Monteiro de Moura Na qualidade de coadjutor.


1862 Machado
1863- Set. 1873 António Maria Gaudencio Borges Teve como coadjutor António
Ricardo da Costa Veiga.
Set. 1871 – Nov. 1873 Domingos da Fonseca Ferrão
Nov. 1873 – Abril 1880 António Mendes d’Alcantara Prior. Natural de Lagares da Beira.
Abril 1880 -1886 Jozé António Diniz Natural da Lageosa.
1887 - até 15/05/1915 Francisco Freire d’Oliveira Garcez Cónego Honorário. Natural de
Perselada.
Maio 1915 - Set. 1916 Luís Pereira da Silva
Set. 1916-Dezembro 1927 António Lourenço Baptista Natural de Torrozelas, freguesia de
Arganil.
Dez. 1927-Abril 1929 Francisco Alves da Rocha Santos Pároco de Travanca de Lagos.
Encarregado da paróquia de Midões.
Maio 1929-Dezembro 1933 José de Sousa Moreira Prior.

211
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

DATA PÁROCO OBSERVAÇÕES


Dezembro 1933- Maio 1984 José Lourenço de Matos Natural de Folques-Arganil, onde
nasceu a 08/09/1907, residiu em
Midões até ao seu falecimento a
21/06/1984.
Junho 1984-Outubro-1984 Sertório Baptista Marques Vigário Episcopal da Zona Nordeste.
14/10/1984-Setembro 1987 José da Costa Saraiva Prior.Nasceu no Porto em 1924, com
raízes familiares em Nogueira do
Cravo-Oliveira do Hospital.
Nomeação por decreto episcopal de
10/10/1984.
Outubro 1987-1993 José Guedes Quitério
1994-Outubro 1994 José Carlos Brito Nomeado por decreto do Bispo,
tomou posse a 23/01/1994. Natural
de Vidual, Concelho de Pampilhosa
da Serra. Residente em Travanca de
Lagos.
Outubro 1994-Setembro Manuel Carvalheiro Dias Pároco de Midões e simultâneamente
1996 Prior de Candosa, Covas e Póvoa de
Midões.
Set. 1996-Setembro 1999 Pedro Carlos Lopes de Miranda Pároco de Midões, Covas e Cadosa.
Natural de Ançã, conc. Cantanhede.
Decreto de 08/09/1996
Novembro 1999-Maio 2004 Manuel Alves Maduro Pároco de Midões, de Covas e outras
paróquias. Teve como colaborador
o Leitor e depois Diácono, Orlando
Carrasqueira Martins.
Maio 2004-Maio 2005 Manuel Silva Paiva
Julho 2005-Agosto 2008 Orlando José Carrasqueira Martins Natural de Abiul-Pombal. Ordenado
sacerdote na Sé Nova de Coimbra,
em 26/06/2005.
Agosto-2008-2017 João Fernando Marques Dias Também pároco de Vila Nova de
Oliveirinha e de outras paróquias
da Unidade Pastoral de Tábua.
Colaborador do Semanário Correio
de Coimbra.

Fonte: AUC - Paróquia de Midões: Mistos 1565-1699, 1915, 1916, 1917/18, 1919,1920, 1921, 1922,
1923, 1924, 1925, 1926, 1927, 1928, 1929, 1930-1931, 1932, 1933, 1934, 1935, 1936, 1937, 1938, 1939,
1940, 1941, 1942, 1943, 1944, 1945, 1946, 1947, 1948, 1949, 1950, 1951, 1952, 1953, 1954, 1955, 1956,
1957, 1958, 1959, 1960, 1961, 1963, 1964, 1965, 1966, 1967, 1968, 1969, 1970, 1971, 1972, 1973, 1974,
1975, 1976, 1977, 1978, 1979, 1980, 1981, 1982, 1983, 1984, 1985, 1997, 1998, 1999, 2000, 2001-2003;
Baptismos: 1911, 1912, 1913, 1914, 1986-1996, 2004-2008; Casamentos 1911, 1912, 1913, 1986-1996;
Óbitos; 1911, 1912, 1913, 1986-1996; Câmara Eclesiástica, Cx. 14, Doc. 64

212
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

1.2. A Comenda de Santa Maria de Midões


Sabe-se que nas rendas da igreja foi instituída uma das chamadas comendas novas da
Ordem de Cristo que rendia anualmente 30.000 reis.(334) Segundo as informações paro-
quiais de 1721 a imagem que estava no altar da Capela-mor era da Comenda da Ordem
de Cristo, espaço onde também se encontrava uma sepultura datada de 1589, referente a
D.ª Filipa Panhoia Baeta do Conde de Villa Nova, mulher que foi de Francisco da Costa
de Vasconcelos, fidalgo da Casa Real e Comendador da igreja(335).
Em meados do século XVIII, a Igreja Matriz de Midões teve uma grande intervenção
que se prolongou no tempo, e que motivou requerimento dos mordomos das capelas
da freguesia, com data de 10/07/1745, dirigido ao Bispado, para que parassem as obras
enquanto durassem as da Igreja orçadas em 300.000 reis(336). Este pedido foi deferido, e
mostra espírito de entreajuda e respeito pelo templo principal, permitindo canalizar os
seus parcos recursos para a grande obra da Igreja Matriz, que era vasta: púlpito, capela
baptismal, solhar o pavimento de toda a Igreja, forrar em madeira o Altar da Senhora e
o Altar do Senhor, uma cruz «a romana», reforma dos 4 confessionários, entre outras.
Os capítulos de visita da primeira metade do séc. XVIII denunciam as divergências
entre os comendadores e os vigários de Midões, ficando vários capítulos por cumprir.
Obrigado a concorrer anualmente com 6.000 reis para a Capela Mor e Sacristia da Igreja
de Midões, a verdade é que chegados a 1748 as obras necessárias estavam por fazer, bem
como as da Capela da Senhora do Campo de que também era responsável. Na conta que
o padre João de Sousa Machado deu ao Provisor do Bispado, a 18/06/1748, informava ter
pago obras da sua própria bolsa (Capela Mor, Sacristia e Casas de Residência), concluindo
sobre o assunto: «O comendador quis por-se fora e ele pede que se nomeie fabricário, pois
só assim se pode fazer as ditas obras»(337).
Sem alternativas, por não haver fabricário e dinheiro, a Câmara Eclesiástica após avisar
o comendador, ordenou sequestros no rendimento e frutos da comenda e do rendeiro se
existisse.
A 02/09/1748 a comissão nomeada pelo Provisor do Bispado, Manuel dos Reis e
Sousa, e constituída pelo vigário de Midões, João de Sousa Machado, tendo como escri-
vão o padre João Xavier Brandão, da freguesia da Póvoa de Midões reúne e promove o
sequestro nos rendimentos e renda da Comenda de Midões. No entanto, depara-se com
a resistência do rendeiro:
«…diss q’ a renda era sua e não do Comendador, por q’ ao ditto Comendador pagava
settecentos e tanttos mil reis, e q’ so nelles he q’ eu pudia fazer emb.º ou sucresto p.ª o

(334)
  CORREIA & GONÇALVES, 1953, pp. 239-240
(335)
  PAIS, 2013, p. 123
(336)
  AUC – Câmara Eclesiástica, Cx. 24, Doc. 9
(337)
  AUC – Câmara Eclesiástica, Cx. 24, Doc. 3

213
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

pagamen.to q’ elle ditto rendr.º havia de entregar, p.ª o Nattal, e pareceume tinha alguma
razão, e tãobem sey q’ por ora não ha fruttos q’ sucrestar na ditta renda mais q« dous gro-
vos de centeyo, q’ he certto não chegao p.ª satisfazer ao cap.º da Capp.ª mor desta Igr.ª».
É então determinado fazer-se embargo de sequestro no Quartel do Natal da Renda da
Comenda, o que ocorre a 04/10/1748, nas casas do rendeiro Bernardo Ferro, da Vila do
Seixo, assistente e morador na Vila de Midões, que fica notificado a entregar 116.000
reis ao depositário.
Com esta verba adquirem-se, nos finais de 1749 e princípios de 1750, vários materiais,
designadamente, para a Capela Mor:
- Capa de Asperges de damasco encarnada, vestementeiro, da Cidade de Coimbra,
por 14.080 rs e cortinas de damasco encarnado, para o nicho da Senhora do Pranto
no valor de 4500 rs., ambos feitas por Manuel Gomes Louro;
- Painel para a boca do camarim da tribuna, em preço de 6,5 moedas feito pelo mestre
pintor Simão Pais de S. Payo, da cidade de Viseu, por 31.000 reis.
- Uma banqueta para o altar, ajustado ao carpinteiro mestre Joze de Affonseca, de Lagos,
juntamente com a grade para o referido painel, por 1 moeda de ouro (4800 reis);
- Uma cruz à romana para o altar, ajustada ao escultor de Bobadela, pelo preço de 1600
reis «…por q’ he necessar.º seja mais levantada do q’ as do mais altares».

Seria, também, com o dinheiro do referido sequestro que se promoveriam as obras


na capela particular da Igreja, administrada pelos herdeiros de João Caetano de Mello,
morador ao Paço do Lumiar, em Lisboa. Entre 1783-1788 surgem nos registos paroquiais
de Midões, como Administradores da Comenda, José Paulo e Luísa Maria.

1.3. Evolução espacio-temporal do templo

A actual igreja matriz é uma construção do séc. XIX, tendo sucedido à antiga, de apenas
uma nave, que estaria localizada em local mais avançado, no espaço onde se encontra o
cruzeiro (vide fotos 50 e 51).
De acordo com as memórias paroquiais de 1758 a antiga igreja albergava, interior-
mente, quatro altares: o altar-mor, o do Santíssímo, o de Nossa Senhora do Rosário e o
de Nossa Senhora da Conceição, sendo este uma capela particular(338).
Pelas informações paroquiais de 1721, no altar de Nossa Senhora do Rosário estavam
mais duas imagens: de Santo Estêvão e São Sebastião. Quanto à Capela de Nossa Senhora
da Conceição, instituída por Manuel de Miranda, ao tempo era administrada por Francisco
Caetano de Melo, morador em Coimbra.

  PAIS, 2013, p. 123


(338)

214
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

Junto ao corpo da igreja existia outra capela, com altar, mas sem imagem ou missa,
que administrava António de Tavares Leitão, natural do Porto e morador em Touriz. Seria
a Capela dos Amarais, instituída pelo balio Frei André do Amaral e que ostentava o seu
escudo de armas, que já não existe por ter desaparecido com a renovação da igreja. Leitão
administrava-a por sua mulher, Luísa Amaral de Azevedo, descendente dos Amarais de
Touriz, com quem se havia casado em 1676(339).
Nas informações paroquiais de 1721 refere-se a Capela da Senhora do Desterro, Jesus
e Maria e José, edificada em 1688 por D. Maria de Miranda e Castelo Branco, viúva de
Manuel Pereira Franco, moradora na Vila de Midões(340). A 28 de Abril do referido ano
apresentou requerimento pedindo licença para nela se dizer missa, tendo feito no mesmo
mês escritura de obrigação de bens (olivais e vinha). Em Maio foi a capela vistoriada e or-
denada autorização para celebração de missa. Esta capela estaria no interior da igreja matriz.
Tal como sucedeu com a maioria das freguesias do concelho de Tábua, o terramoto
de 1755 não causou grandes perdas de património edificado ou documental. Em 1773 o
Papa Clemente XIV concedeu dois Breves à Igreja de Nossa Senhora da Vila de Midões:
indulgência plenária a 05/07/1773, para o primeiro Domingo do mês de Outubro; e altar
privilegiado ou de missas privilegiadas, a 06/07/1773(341).
Nos finais do séc. XVIII o templo apresentava-se arruinado. A necessidade da sua reedi-
ficação consta de um processo de 28/04/1796 arquivado na Câmara Eclesiástica(342). Por ele
se verifica que desde 1786, a Igreja Matriz se achava arruinada, e suspensa a celebração dos
ofícios divinos desde o capítulo de visita de 18/09/1787, no qual os visitadores Francisco
Manso Canaes de Andrade e d’Barbosa e José Ferreira da Costa decidiram transferir as
funções paroquiais para a Capela de Nossa Senhora do Campo, no Casal da Senhora.
Do processo consta a alusão à união fracassada do povo midonense para evitar a ruína:
«…e tendo os freguezes reconhecido a urgente necessidade da sua reedificação, e depois
de varias disputas e deliberaçoens rezolvido obrigarem-se a certo género de contribuição
(…) e por não ter esta todo o effeito q’ se esperava por cauza de se terem suscitado contra-
diçoens e oppoziçoens proprias de hum povo numerozo, qual hé o da dita feguezia, onde
o espirito da discordia acha sempre alguns animos dispostos p.ª a desunião tão pernicioza
a similhantes obras».
Nas transcrições dos vários capítulos de visita nota-se a contradição existente entre
a necessidade e a divisão popular. Assim foi na visita de 16/11/1788: «…todo o povo
se acha animado a reedificar a sua Igreja sentindo e conhecendo a necessidade absoluta
desta obra; com tudo ainda havia alguã divizão entre alguns dos freguezes sobre o modo
da contribuição para a mesma obra: o que não pode deixar de prejudicar aos progressos

(339)
  GONÇALVES, 2006, Vol. I, p. 331 e seguintes.
(340)
  AUC - Cabido, Instituições Pias, Cx. XII, Doc. 41
(341)
  AUC – Cabido, Instituições Pias, Cx. XIII, Doc. 3
(342)
  AUC – Câmara Eclesiástica, Cx. 6, Doc. 7

215
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

della». Ou, na de 18/01/1795: «Acha-se a Igreja desta Parochia arruinada há tantos annos,
que se o povo della tivesse aquelle zello caridade e união que deve haver, já podião ter
huá nova Igreja».
Uma divisão que permaneceu ao longo do tempo, mesmo depois da escritura celebrada
entre os paroquianos da freguesia sobre a forma de contribuição para a reedificação da
Igreja. Um documento lavrado a 27/04/1788, perante o Tabelião António Vas, da Vila
de Midões.
«…e por elles foi dito que nas duas vizitas pastorais proximas passadas foi dito que
se tinha reconhecido, na primeira que este templo estava amiaçando ruina e na segunda
que estava aruinada a terça parte desta igreja e a outra parte emcapaz de admetir concerto
pella anteguidade das paredes alem disso de hum ambito muito piqueno para receber o
Povo numerozo desta mesma freguezia que comprehende de 330 fogos, e que athe os sinos
estavam fora colocados em humas vigas ou traves de madeira asentandosse que fosse a
Igreja mais ampla e capas para receber o numerozo povo
«…e por elles foi dito que se obrigavam a reidificar esta mesma Igreja comtribuindo
para isso como tem prometido e assentado todo o povo por meio da redisma dos fruttos
que porduzem as terras desta freguezia e a da Povoa de que sam proprietarios os moradores
desta freguezia de Midoens, a saber pagando a metade do dizimos de milho vinho azeite e
senteio (…) por todo o tempo que durar a dita obra que sera huma igreja nova com boa
aria comforme o risco que deleniou o mestre Joam da Silva Mendes que no dito Domingo
proximo passado asistio estava prezente».
As pessoas eleitas e nomeadas para firmarem este contrato, foram, da parte do povo:
Roque Ribeiro de Abreu Abranches Castello Branco; Jose Bernardino Monteiro Cabral
(Capitão-Mor); Sebastião Tavares Pinto de Albuquerque Freire Castello Branco; Arcanjo
da Costa e Manuel João (Vila do Mato, termo da Vila do Coito); Antonio Pinto (Quinta
da Regada, do mesmo termo); João Marques (Vila do Coito); Manuel Tavares (lugar do
Cadouço, termo da Vila de Lagos, desta mesma freguesia).
Da parte da igreja, assinaram os reverendos párocos, Manuel José Ferreira, e João e
Oliveira, sendo testemunhas o Dr. Antonio Correa Borges (Midões) e o Reverendo Manuel
Saraiva (lugar do Babão, termo de Tábua).
O novo templo foi promovido pelo Vigário José de Araújo Nogueira, apoiante migue-
lista, que terá sido assassinado pela facção liberal em 1833(343).
A imponência do templo, o aparato da sua traça e a própria implantação no terreno,
conferem-lhe uma grandiosidade singular, que levou o Bispo D. Manuel Correia de Bastos
Pina a classificá-la como Sé das Beiras e Fialho de Almeida a lançar-lhe palavras de elogio(344).

  CORREIA & GONÇALVES,1922, pp. 239-240


(343)

  «Midões» In A Comarca de Arganil, Ano XXXVII; n.º 2400, 23/11/1937, pp. 3-4
(344)

216
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

FOTO 69 - Dia de festa no Outeiro de S. Miguel, 2016

FOTO 70 - Capela de S. Sebastião, no Coito

FOTO 71 - Interior da Capela de S. Sebastião, no Coito FOTO 72 - Imagem de S. Sebastião, primeira metade séc. XVI

217
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 73 - Capela de Santa Ana (fachada) FOTO 74 - Capela de Santa Ana (perspectiva do interior)

FOTO 75 - Retábulo da capela-mor

218
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

FOTO 76 - Imagem de Santa Ana, de pedra do séc. XVIII FOTO 77 - Pintura do tecto da capela mor

FOTO 78 - Capela de Nossa Senhora do Campo

219
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 79 - Interior da Capela de Nossa Senhora do Campo

FOTO 80 - Retábulo da Capela-Mor da Capela de Nossa Senhora do Campo

220
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

FOTO 81 - Tecto da Capela de Nossa Senhora do Campo

FOTO 82 - Pormenor do medalhão da abóbada da capela-mor

FOTO 83 - Lintel da porta de acesso à Sacristia, 1691 FOTO 84 - Cruzeiro do Casal da Senhora

221
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 85 - Capela de Santo Amaro (panorâmica do exterior)

FOTO 86 - Capela de Santo Amaro (perspectiva do interior) FOTO 87 - Escultura de Santo Amaro, séc. XVII

222
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

FOTO 88 - Capela de Nossa Senhora da Esperança, em Touriz

FOTO 89 - Interior da Capela de Nossa Senhora da Esperança, em Touriz

223
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 90 - Casa Mortuária de Midões

FOTO 91 - Alminhas no Cadoiço FOTO 92 - Alminhas na Rua da Caricha, Midões FOTO 93 - Alminhas em Vila do Mato

224
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

O autor do projecto foi o Arquitecto José do Couto dos Santos Leal, que também
projectou a Igreja Matriz de Nogueira do Cravo, sendo nomeado em 1824 Mestre-de-
Obras da Universidade de Coimbra, em 1824(345).
A dedicação da igreja a Nossa Senhora das Neves fez-se no dia 15 de Agosto de 1822,
celebrando-se a primeira missa por D. Inácio Tavares Pinto de Albuquerque, natural de
Midões e cónego regular da Ordem de Santo Agostinho(346).
Por essa altura foi aposto, na torre direita, um sino com 46 arrobas, vindo a torre
campanária a ruir em 1860. As obras na igreja continuaram nos anos seguintes tendo o
apoio da Câmara Municipal de Midões, que na sua sessão de 19/02/1829 determinou que
metade do dinheiro obtido com a cobrança do imposto do rial do vinho fosse aplicado
«…para as obras da Igreija desta villa em quanto elas durarem»(347). Mais tarde, em Junho
de 1840, o município pagaria, ao «mestre Souza», 14.000 reis pela «Obra da Sacristia»(348).
Com a entrada em funcionamento da Junta de Paróquia de Midões, manteve-se a
vigilância sobre as condições de conservação e manutenção da igreja. Podemos acompa-
nhar esta especial atenção através dos seus livros de actas que principiam no ano de 1862:
- A 09/08/1866: lançando derrama pelos paroquianos e requerendo autrização à CM
Tábua dada «a absoluta necessidade concluir a obra da caiadura da Igreja Matriz
e não tendo a junta meios alguns para pagar a despesa». Foi colocada a pregão a
02/07/1867 e arrematada pelo caiador Manuel José por 90.000 reis o m3, pagos
em 3 prestações (349);
- A 20/09/1867, aplicando os 100.000 reis obtidos pela Junta da Bula da Santa Cruzada
por intermédio do Sr. José Maria da Silva Torres(350), de Lisboa, na «douradura do altar-
-mór e tribuna da Igreja, e pintura da Capella mór e Sachristia da mesma», obra orçada
em 242.000 rs pelos douradores Joze Joaquim Ricardo e Bernardo Marques (351).

A 10/08/1868 foi a obra arrematada por Manuel Rebello Ferreira, mestre pintor e
proprietário, natural de Sampaio, concelho de Gouveia, pela quantia de 230.000 reis,
dando por fiador o vogal da Junta, Sr. Christino Augusto da Silva Moura(352). Em sinto-
nia, solicita-se autorização à CM para lançar derrama aos paroquianos na importância
de 142.000 reis em falta, que o Conselho Distrital aprova em Abril de 1868 e que foi
lançada em 19/12/1868.
- A 12/05/1873 foi colocada em praça pública o projecto «murar o adro da Igreja».

(345)
  BARATA, 2016, p. 126
(346)
  SARAIVA, 1986, p. 30
(347)
  AMT – Livro de Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834
(348)
  AMT – Livro das Actas das Sessões e Acórdãos da Câmara Municipal de Midões, 1839-1840, fl. 27
(349)
  AMT – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1862-1871, fls. 10 e 14v.
(350)
  ibid. fl. 16v.-17 A Junta de Paróquia aprova um voto de louvor a 01/10/1867
(351)
  ibid. fls. 16-16v.
(352)
  ibid. fl. 18v.

225
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

- A 14/08/1878, deliberou, em reunião extraordinária «…mandar fundir o sino grande,


ficando o novo com quarenta e cinco arrobas de pezo, arbitrando a percentagem de
20% sobre as diversas contribuições que paga esta freguesia». Assim, e para 1880
elaborou-se orçamento suplementar para a respectiva obra no valor de 300.000 réis,
que consistia em duas rubricas: troca/fundição do sino grande partido no valor de
260.350 reis e transporte do mesmo ao Porto, viagens de ida e volta por 36.650
reis(353). A cobrança da percentagem decorreu entre Dezembro 1880 e Janeiro de 1881,
tendo a junta ajustado a refundição do sino grande, a 30/01(354), com Sebastião Dias
Sorrilha de Campos e José Augusto Dias de Campos (de Parada, S. João de Areias)
e José António Linhares (de Ourondo, conc. da Covilhã).
- A 28/04/1885, foi arrematada a obra «das grades ou teia da Egreja Matriz» pelo valor
de 40.000 reis e prazo de execução de 2 meses, por João Alvaro d’Almeida, casado,
proprietário, do Coito(355).

Menção para pequenas obras de que ficou registo nos livros de actas paroquiais: arranjo
do soalho (1867, 1872), tapume das quatro frestas das paredes da igreja (1867). Em 1889
foi embelezado o adro da igreja com arranjo dos muros de suporte e, em Agosto de 1906
concluiu-se a reconstrução do coro da igreja paroquial por 26.000 reis, executado pelo
carpinteiro Joze Balthasar da Silva, de Touriz. Durante o ano de 1909 reconstruiu-se o
telhado da capela mor.
A 03/12/1905 representou a JP de Midões ao Rei pedindo autorização para um em-
préstimo no valor de 500.000 reis para a compra de dois sinos novos, pelo facto de se
terem partido os existentes(356), cuja verba seria suportada pela contribuição de 15% das
contribuições gerais do estado.
A 30/08/1908 colocou-se em arrematação pública o fornecimento de dois sinos de
825 quilos e de 525 quilos, postos na Estação de Caminhos de Ferro de Santa Comba
Dão, depois de escolhidos na casa fornecedora por delegados da Junta, dando em con-
trapartida o material dos sinos quebrados calculados em 550 rs o quilo(357). Entre quatro
possibilidades, a opção recairia sobre a Casa Luís Franciso da Rocha, da Cidade do Porto.
Nos finais de 1920 a JFM iniciou as obras de terraplanagem do adro da igreja man-
dando fazer o portão de ferro e competente grade para vedação do mesmo, investimento
que contou com um subsídio de 1500$00 fruto do empenho pessoal do Dr. Lima Duque,
Ministro do Trabalho e do Sr. José Freire Garcez, Administrador do Concelho, os quais
foram louvados em sessão da junta de freguesia a 16/01/1921(358).

(353)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1878-1883, fl. 22v.
(354)
  ibid. fl. 30
(355)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1883-1893, fl. 15
(356)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1905-1911, fl. 1v.
(357)
  Id. fls. 28v e 29v.
(358)
 AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1918-1937, fls. 16, 17-17v.

226
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

Em Março de 1928 mudou-se o cruzeiro que se encontrava a um canto do adro para


o centro do mesmo (359).
A torre direita sofreu obras nos anos cinquenta, promovidas pelo Padre José Lourenço
de Matos e, no âmbito do seu restauro, intervencionou-se o sino e o relógio, datados de
1937 (vide foto 54) entre outras pequenas intervenções, que contaram com compartici-
pações estatais.
A igreja apresenta-se revestida de reboco pintado de branco (intervenção realizada pela
Junta de Freguesia em 2014), e as suas linhas são características do barroco final e decora-
ção ao estilo rococó. O frontispício apresenta extremidade inferior revestida de material
pétreo, sendo o pano da frontaria e os das torres delimitado com pilastras marcando, neste
caso, os seus cunhais.
A porta principal, com moldura, apresenta jambas decoradas com motivos vegetalistas
e cabeceira recortada com frontões curvos. A fachada surge ritmada por um friso que
delimita os dois níveis do imóvel, com coro-alto servido por três janelas, sobre a porta
principal, com verga curva e encimadas por frontões também de recorte curvo.
Duas torres integram a fachada, cujos vãos, rectilíneos, se alinham com as restantes
aberturas da frontaria, sendo os cunhais marcados por pilastras da ordem jónica. Os
respectivos campanários, de base quadrangular apresentam coberturas bolbosas e são
delimitados por quatro pináculos. Estas torres enquadram a empena, desenhada por um
frontão curvo interrompido, que suporta vasos, e assentando sobre um entablamento
desprovido de decoração prolongado pelos campanários a suportar uma cruz. O tímpano
da empena é ornado com uma coroa, que envolve uma composição raiada. Este conjunto
é rematado por um laço de gramática e proporção “rocaille”.
As fachadas laterais apresentam a junção de dois corpos de dimensões diferentes. O
maior, marcado por pilastras nos cunhais, possui janelas, portas de verga recta e portas de
verga curva e entablamento liso. Já a fachada posterior apresenta alçado cego de empena
encimada por crucifixo. A cobertura do imóvel consiste na articulação de vários telhados
de duas águas.
O interior da igreja, de nave única (vide fotos 55, 56 e 57), apresenta um guarda
vento de madeira, pias de água benta, baptistério, coro-alto guarnecido de balaustrada de
madeira. Sob o coro dispõem-se duas portas em cada lado: uma permitindo o acesso ao
coro e aos campanários, e outra ao baptistério.
Na capela baptismal as paredes são de cor alva, rasgadas por vãos de verga curva e de
verga recta, e possuem painéis azulejar polícromos de 5x4, decorados com passos da via-
-sacra. A pia é lítica e circular, assenta em fuste decorado com caneluras e superfície ornada
com motivos florais. Os painéis de azulejos apresentam orlas ornadas com concheados,
enrolamentos e folhas de acanto de policromia amarela, verde e manganês, colocados sobre
fundo azul e delimitadas por dois filetes amarelos, de contornos em manganês. As cenas

 AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1918-1937, fl. 49
(359)

227
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

dos painéis são pintadas a azul, de contornos em manganês. Como se pode ler no próprio
painel, os azulejos são oriundos da Faiança Battistini de Maria de Portugal.
O púlpito possui balaústres de madeira, mísula pétrea e o acesso ao mesmo faz-se por
porta de madeira emoldurada por vão revestido de pedra, servido por escadas colocadas
entre as duas paredes.
Os dois retábulos da nave, um em cada extremidade, ladeiam o arco da capela-mor,
datando do séc. XIX e sendo, provavelmente, contemporâneos das grandes intervenções
desse século. Possuem mesa de altar incorporada, sacrário encimado por motivos vegeta-
listas e crucifixo. A superfície das estruturas retabulares é branca, orlada a verde e decorada
com elementos vegetalistas, dourados e marmoreados em verde e dourado. Apresentam,
nas extremidades, pilastras compósitas, e possuem duas colunas que enquadram o coroa-
mento dos mesmos, constituídos por entablamento, frontão curvo a suportar elementos
vegetalistas, e remate sustentando duas urnas, guarnecidas com elementos vegetalistas.
A estrutura é orlada com enrolamentos vegetalistas, decorada com coração flamejante
trespassado, no retábulo da esquerda, com um livro e uma palma envoltos por resplendor
e encimados por motivos fitomórficos, no da extremidade oposta.
No camarim do retábulo do lado do Evangelho, oberva-se a escultura do Sagrado
Coração de Jesus, assente sobre nuvem, típica da imaginária produzida nas oficinas de
estatuária religiosa do norte do País. Sob a mesa de altar temos a estátua em pedra do
protomártir Santo Estêvão, polícroma, datável da 2ª metade do séc. XVI(360) (vide foto
58), que será proveniente de uma capela com o mesmo nome, instituída por Estêvão de
Miranda Brandão Castelo Branco no séc XVII. Próximo a este retábulo destaca-se uma
escultura de Nossa Senhora de Lourdes, assente em mísula de granito.
O retábulo da extremidade oposta acolhe a escultura de São José, figurando com o
Menino, E, próximo a esta, a escultura de Nossa Senhora de Fátima, assente em mísula.
O altar e o ambão situam-se próximo do arco triunfal, sendo este de lavra semelhante à
restante talha.
A Capela-mor é de proporções consideráveis (vide foto 59) exibindo nas paredes brancas
dois quadros polícromos: um representando a Virgem com o Menino e, na parede oposta,
Santo António com o Menino.
O programa decorativo do retábulo da capela-mor é semelhante ao dos retábulos da
nave, contudo mais complexo e trabalhado. A linguagem do neoclássico é vincada na deli-
cada decoração vegetalista do altar e nas estruturas de apoio das duas colunas que ladeiam
o camarim do trono, revestido com losangos verdes e motivos vegetalistas encarnados.
O trono apresenta-se decorado com ornamentos fitomorfos dourados e marcado por
marmoreados verdes e vermelhos, suporta uma escultura de Nossa Senhora das Neves
(vide foto 60), do séc. XIX, de túnica rosa rogaçante e manto azul, orlado com motivos
vegetalistas na cor do ouro, segurando o Menino Jesus.

  CORREIA & GONÇALVES; 1952, pp. 239-240


(360)

228
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

O retábulo contém em cada extremidade uma porta, espaço marcado por pequeno
nicho e delimitado por colunas e pilastras. Sob o nicho situam-se dois relevos na mesma
madeira do retábulo, polícromos, os quais, apesar da difícil identificação parecem ser:
na extremidade esquerda, uma das Santas Mulheres que acompanharam Jesus Cristo
à sepultura ou São João Evangelista na medida em que se encontra ligado à Paixão(361).
Na extremidade oposta Santa Maria Madalena ou alguma figura alegórica relacionada
com a Paixão de Cristo.
Sobre estes relevos temos nichos com duas esculturas, uma em cada extremidade: do
lado esquerdo uma escultura sem atributos iconográficos, na extremidade oposta uma
representação de São Pedro.
O coroamento do retábulo é de estrutura e programa decorativo semelhante aos restan-
tes dispositivos que enobrecem os altares, divergindo no elemento envolto pelo resplendor
«que, no caso do retábulo maior, se encontra povoado pela sobreposição das letras A e M,
correspondendo à saudação angélica narrada por Lucas e posteriormente cristalizada na
mais célebre oração mariana “Ave-Maria”(362).
Incorporado no altar-mor, suspensa em calhas, e ao nível da tribuna, está uma imagem
de Nossa Senhora das Neves, assinada por Augusto C. R. Ferreira e datada de 1872 (vide
foto 61).
O interior do templo apresenta abóbada branca, desprovida de decoração na nave,
mas com uma pintura ao centro desenhada numa elipse na capela mor, representando
uma custódia envolta por nuvens e querubins (vide foto 62).
Na Sacristia existe uma Senhora da Piedade, de meados do séc. XV, de pedra e com
sinais de repinte (vide foto 63), abrigada num nicho, paramentos antigos e um lavabo
setecentista. Do espólio da igreja também fazem parte magníficas peças de ourivesaria:
uma custódia datada de 1617, de prata dourada, com duas colunas de cada lado, com
campainhas, pé alongado e superfícies decoradas. No pé, um letreiro indica quem a cus-
teou, Manuel Miranda e sua mulher: ESTA /COSTO/DIA.D/EV/MAN/OEL.D/E MI//
RAN/DA.IA.DE.FO// E.S.MO./D.NA/1617.
Destacam-se, também, três cálices: um do séc. XVI, de prata, outro do séc. XVII,
bom trabalho exibindo motivos concheados e símbolos eucarísticos – maná, arca da
aliança, espiga e cacho - e outro de pé de estanho. A cruz paroquial é, também, de prata
trabalhada, do séc. XIX.
A festa litúrgica à Padroeira, Nossa Senhora das Neves, realiza-se a nível nacional a 05
de Agosto, mas em Midões há muito que não se realiza. Ao longo dos tempos destaca-
-se, porém, a festa do Corpo de Deus, de grande solenidade, custeada e organizada em
parte pelo município de Midões. Em 1849 a ela assistiam, como convidados: os párocos

  DUARTE, 2009, p. 489


(361)

  DUARTE, 2009, p. 490.


(362)

229
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

das freguesias do concelho, o Juiz de Direito da Comarca «e mais Impregados Publicos»,


as irmandades, e a Companhia do Batalhão Nacional estacionado em S. João de Areias.
Seguindo o uso e costume antigo, os vereadores designaram, a 31/05, para pegar
na «umbella», António Ribeiro de Abranches Castello Branco e, para pegar no pálio:
Domingos Borges de Figueiredo, do Esporão; João Lourenço de Loureiro, Jozé Soares de
Albergaria, da Vila do Mato, Dr. Jozé Augusto da Silva Coelho, Jozé Joaquim Brandão,
e António de Xaves da Póvoa(363).
Situado junto à igreja localiza-se o passal da freguesia, uma propriedade de boa terra
onde o pároco recolhia produtos agrícolas. Em 2001 foi cedido para a construção do
Centro Social Caeiro da Mata da Paróquia de Midões.

1.4. Vida religiosa

Em termos de práticas religiosas sabemos, pelas memórias paroquiais de 1758, que não
se realizavam romagens. Contudo, havia as ladainhas de Maio, procissões que se faziam
nas localidades rurais, através dos campos, partindo da igreja para três diferentes ermidas
ou capelas. No caso da freguesia de Midões, seguiam da Igreja Matriz para a Capela de
Nossa Senhora do Campo, no Casal da Senhora, passando pela de S. Miguel até à Capela
de Santa Ana, na Vila do Mato(364).
Na Época Moderna, a organização em torno da vida religiosa compreendia a existência
de várias confrarias. Segundo o testamento de 1648, que instituiu o morgado de Midões,
havia pelo menos cinco confrarias: do Santíssimo, a de Nossa Senhora do Rosário, a de
Santo Estêvão, a de São Sebastião e a dedicada a Jesus(365).
Segundo as memórias paroquiais de 1758 existiam, nesta altura, apenas duas: a dedi-
cada a Nossa Senhora das Neves (também designada como Nossa Senhora do Pranto); e
a de Santa Ana, na Vila do Mato.
Na segunda parte do século XIX a Junta de Paróquia de Midões exercia, também,
um papel de fiscalização sobre as contas das confrarias, passando a gerir as do Santíssimo
Sacramento e de Santo Estêvão.
A 17/11/1878 a JP solicita ao Conselho Distrital autorização para a venda dos bens
rústicos da Confraria de Santo Estêvão e do Santíssimo dado serem «insignificantes os ren-
dimentos que tiram (…) tanto que muitos anos não chegão para pagar as contribuições»(366).
A 05/09/1880 resolve-se oficiar ao Delegado do Tesouro, para que diligencie com brevidade

(363)
  AMT - Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fl.12
(364)
  ANTT – Memórias Paroquiais, vol. 23, nº 141, p. 893
(365)
  SARAIVA, 1986, p. 35
(366)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1878-1883, fl. 5v.

230
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

na venda dos bens da ditas confrarias aproveitando o facto das oliveiras se apresentarem
em «tão boa perspectiva»(367).
Hoje existem ainda as do Santíssimo, em Midões, e a de Santa Ana, em Vila do Mato,
cujos livros se encontram, na sua maioria à guarda do Arquivo do Centro Paroquial de
Tábua, havendo algum espólio na Junta de Freguesia de Midões.
Confraria do Santíssimo: Erecta na Igreja Matriz. Tendo em atenção a designação sur-
gida em alguns dos livros, a partir de 1802 é possível que a esta confraria se tenha unido
à que em 1648 corria sob invocação de Jesus, passando a designar-se como «confraria do
senhor e do santissimo».
O Provedor da Comarca da Guarda tomava-lhe as contas mas, a partir de 1826, tal
supervisão passou para o Administrador do Concelho e, a partir de 1837, a contabilidade
apresentava-se em conjunto pelos mordomos das confrarias do Santíssimo Sacramento
e Santo Estêvão.
Roque Ribeiro d’Abranches Castello Branco e Jozé Correa de Loureiro são os mais
antigos mordomos conhecidos para esta confraria, desempenhando a função de 1803-1813,
cujas eleições decorriam por norma, em Junho,(368). Tinham como principais fontes de
receita, os foros de propriedades, os folares e o azeite vendido das suas oliveiras, enquanto
que as despesas se concentravam na decência e funcionamento do culto e no apoio aos
desvalidos: cera, esmolas, incenso, padres e pregadores para as festas, objectos para os
ofícios divinos. O corolário da sua actividade foi, desde a fundação, a realização da festa
em honra do Santíssimo Sacramento.
Por vezes, quando a Fábrica da Igreja não dispunha de verba para pagamento ao
sacristão (aconteceu em 1839), a confraria suportava esse encargo. Tal como as demais
confrarias, funcionava como banco, avalizando empréstimos aos irmãos.
No inventário de bens apresentado ao Governo Civil em 1852, constavam importantes
somas provenientes de dinheiro a juro, foros e administração de oliveiras. Na relação de
bens móveis destacam-se alguns metais preciosos, oferecidos por eclesiásticos próximos
à confraria: custódia de prata dourada, 4 cálices, sendo um de prata que ofereceu o
Ilustríssimo Vigário Capitular do Bispado o Dr. Jose Manoel d’Lemos, píxide de prata,
relicário de prata, cruz processional, 6 castiçais de latão oferecidos pelo referido vigário
capitular, 5 castiçais de estanho grandes. 1 turibulo com naveta de metal amarelo, 1 «hum-
bella» de tiço de ouro com franga de ouro «que por meio de esmolas que deu a Freguezia a
arranjou o actual parocho Antonio da Costa Nunes Gonçalves»; um pálio de tiço de ouro,
outro de damasco preto, outro encarnado, várias vestimentas e paramentos(369).

(367)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1878-1883, fl. 24v.
(368)
  AJFM – Livro da Receita e Despesa da Confraria do Senhor e Santíssimo da Vila de Midões, 1802-1850
(369)
  AUC – Fundo do Governo Civil: «Inventário dos fundos em dinheiro bens d’raiz, e moveis, pertencentes
a Confraria do Santissimo, ereta na Igreja Matriz de Midões» In Inventários de Paróquias e Freguesias, 1838-
1854 (cx.)

231
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

A Irmandade do Santíssimo Sacramento aprovou os seus estatutos em 1890 mandando-


-os imprimir(370) (vide foto 64). A leitura do seu conteúdo esclarece-nos sobre algumas
vicissitudes do processo, designadamente:
- Estatutos reconhecidos pelo notário António Neves Pereira de Castro, em Tábua a
11/6/1889. Foram assinados por 17 indivíduos: Francisco Freire d’Oliveira Garcez
(Prior); João Álvaro d’Almeida (Coito); António Augusto Coelho (Midões); Nicolau
Augusto Completo (Coito); António Francisco Grilo (Vila do Mato); Miguel da Silva
Ribeiro (Midões); João Almas d’Oliveira (Midões); Alfredo José Stoffel (Midões);
Francisco Moraes; José Dias Agostinho (Midões); António Henriques Baptista;
António Pinto Garcia (Midões); Ambrósio Sanches da Fonseca (Midões); José Pereira
Soares de Carvalho (Midões); José Mendes Garcia (Midões); Alvaro Amaro d’Oliveira
(Midões); Christiano Augusto da Silva Moura (Midões);
- Alvará do GC assinado por Francisco Miranda da Costa Lobo, a 18/06/1889 pelo
qual aprova os estatutos;
- Despacho de Manuel, Bispo Conde, de 19/06/1889 aprovando os estatutos da
irmandade do SS no seguimento do pedido do pároco colado na Igreja de Midões.
Francisco Freire d’Oliveira Garcez que a criou;
- Designação da primeira mesa, constituída por: Presidente - Francisco Freire d’Oliveira
Garcez; Promotor - António Pinto Garcia; Tesoureiro - António Ribeiro; Secretário -
Joaquim Tavares Pinto; Mordomos- Augusto Cezar da Silva, António Augusto
Coelho, Álvaro Amaro d’Oliveira;
- A Lista dos Irmãos da Irmandade e suas moradas, composta por gente da freguesia
mas também de fora dela, como o Prior Adelino Augusto da Silva (da Vacariça), o
Dr. Anibal Augusto da Fonseca Magalhães Coelho (Lisboa), Dr. António Soares
d’Albergaria (Lisboa). De realçar também D. Miguel Achilles Soares d’Albergaria
(Vila do Mato), ou o Dr. Roque Ribeiro d’Abreu Abranches (Midões), e o Visconde
do Vinhal (Esporão). A lista encerra com um grupo de senhoras: D. Antónia de
Vasconcelos (Midões), D. Belmira Cândida Gonçalves (Midões), D. Ignácia da
Fonseca Magalhães (Midões), D. Maria Adelaide Garcez (Midões), D. Maria
da Piedade Abranches (Midões), D. Rosalina da Fonseca Magalhães (Midões) e
Viscondessa de Midões.
Da leitura conjugada dos estatutos e das actas da Irmandade percebe-se o papel decisivo
no reerguer da corporação religiosa efectuado pelo pároco da freguesia Francisco Freire
d’Oliveira Garcez, a quem os novos mesários designaram nos primeiros tempos como
«auctor e fundador».
Em 1911 tinha como obrigações mais relevantes: entregar a décima parte da receita
ordinária para actos de beneficência e assistência; 1000 reis para Hospitais de Alienados;

  Estatutos da Irmandade do Santissimo Sacramento da Freguesia de Midões, Coimbra, Typographia das


(370)

Instituições Cristãs, 1890

232
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

subsidiar o ensino primário da sua freguesia segundo os estatutos (artº 22); e acompanhar
de graça à sepultura todas as pessoas pobres da freguesia(371). Reunia na Casa das Sessões
e tinha a seguinte constituição: Agostinho d’Abrantes Ferrão (Presidente); António Pinto
da Rocha, Fernando Augusto da Silva e Afonso Henriques de Sousa (Vogais).
A 11/11/1928 a Junta de Freguesia de Midões acordou que todos os irmãos da
Irmandade do Santíssimo Sacramento e suas mulheres fossem isentos do pagamento dos
emolumentos cobrados pela entrada no cemitério no caso de falecimento. E que o coveiro
não cobrasse mais de metade do que cobra a qualquer irmão.
Irmandade de Santa Ana (Vila do Mato): já existia nas informações paroquiais de
1758 e estava em pleno funcionamento em 1886-1887. Concorreu ao longo dos tempos
para as obras na capela, colocando o maior empenho na realização da festa de Santa Ana.
Confraria de Santo Estêvão (Vila de Midões): confraria muito antiga, já existente em
1648, que terá sido extinta pelos finais da década de 30 do séc. XIX e que poderá estar
relacionada com a capela de Santo Estêvão, instituída por Estêvão de Miranda Brandão
Castelo Branco, da família Mirandas Brandões, no séc. XVIII.
De acordo com o seu Tombo(372), finalizado em 1840 (vide foto 65), tinha um conjunto
assinalável de bens de raiz, de que se destacavam as «sortes de terra com oliveiras»: em S.
Miguel limite do Coito, Casal da Senhora, Sitio das Barrocas, limite do Casal da Senhora,
Olival da Capela, no lugar de Touriz, Vale do Pato, limite de Midões, Sitio do Pico (limite
do Coito), Sitio da Cabrita, limite de Midões. Possuía, também, várias oliveiras dispersas
pelo território, como o conjunto de 26 situadas na Preza, limite de Midões, e alguns bens
móveis.
De acordo com os dados do livro de receita e despesa(373) a confraria tinha como prin-
cipais obrigações: a preparação da festa em honra de Santo Estêvão, incluindo a missa
cantada, o responso, o sermão, a procissão, a nomeação de mordomos, a compra de cera,
as esmolas para pobres e enfermos. Para estes fins, dispunha de um conjunto de receitas,
nas quais de incluíam: exploração das oliveiras acima referidas, foros e juros de escrituras.
Em 1822 a confraria ordenou a pintura do santo e, no ano seguinte, comparticipou nas
obras para o Convento de S. Francisco da Guarda.
Nos anos 20 funcionava na paróquia, a Confraria da Doutrina Cristã e, nos anos 40,
teve alguma vitalidade a Conferência feminina de Nossa Senhora das Neves (SARAIVA,
1986, p. 35).

(371)
  ACPT – Actas das Sessões da Irmandade do Santíssimo Sacramento de Midões, 1911-1912, 17/12/1911
(372)
  AJM – Tombo dos Bens da Confraria de Santo Estêvão, 1808-1840
(373)
  AJM – Livro da Receita e Despesa da Confraria de Santo Estêvão, 1802-1839

233
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

2. RESIDÊNCIA PAROQUIAL
Localizada junto à Igreja Matriz. A 16/07/1887 realizou-se importante reunião entre a
Junta de Paróquia de Midões e o então pároco, Francisco Freire d’Oliveira Garcez, tendo
em vista a resolução da situação denunciada através de requerimento deste último, datado
de 25/6: «…não estando a caza da rezidencia parochial nas condições de ser habitada»
havia alertado a JP em sucessivos ofícios e pedidos de esclarecimentos e como o assunto
não se resolveu pediu a reunião extraordinaria com a JP «afim de se tratar das obras a fazer
na caza ou com a caza da rezidencia parochial».(374)
Nesta reunião o pároco apresenta esclarecimentos adicionais: que era urgente uma
residência interina por estar vivendo a dois quilómetros da Igreja Matriz, na Quinta
da Regada; que se vistoriassem e fizessem os reparos necessários na residência e que o
Presidente da Junta se responsabilizasse pelo arrendamento da casa. A JP designa Augusto
Cezar da Silva para tratar do assunto marcando vistoria para o dia 17/7.
Volta o assunto a ser debatido na sessão de 04/09, chegando-se a acordo em alugar
para residência interina do pároco a casa do Dr. Luis Monteiro Soares d’Albergaria,
estabelecendo-se com o feitor, a renda de 22.500 reis. Deliberam, também, tomar conta
da antiga residência, pondo-a à renda, aplicando o seu produto na ajuda do pagamento
das obras que a mesma necessita(375).
Porém, entrou-se no ano de 1888 e as obras projectadas para a velha residência não
avançavam, o que motivou novo requerimento do pároco de Midões, presente na sessão
extraordinária de 25/02, relembrando os custos com o arrendamento, e a necessidade
da obra a cargo da Junta de Paróquia segundo o preceituado no Código Administrativo.
O assunto divide a junta, que vem a deliberar por maioria colocar no orçamento
«uma verba ou percentagem sobre as contribuições do estado para os reparos necessarios
e indispensaveis para se tornar habitavel a velha rezidencia parochial, que hoje se acha
n’um estado deploravel»(376).
Em Agosto de 1888 a residência paroquial passa a funcionar no primeiro andar e de-
pendências da casa de Diogo d’Almeida de Loureiro Castelo Branco, pelo preço de 27.000
reis anuais(377). Contudo, já depois de rubricado acordo, o arrendatário não cumpre com
as necessárias obras de conservação e reparação que a casa necessitava, levando a um pleito
judicial, conduzido pelo procurador Dr. Carlos Alberto Xavier d’Andrade, pelas perdas e
danos causados ao pároco e à Junta de Paróquia.
A 03/03/1889 a JP aprova as plantas da casa da residência, novo cemitério, muros do
adro e respectivos orçamentos, remetendo-os à CMT para cumprimento das formalidades

(374)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1883-1893, fl. 34v.
(375)
  ibid. fl. 38v.
(376)
  ibid. fl. 45v.
(377)
  ibid. fl. 51v.

234
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

legais(378). Na sessão de 7/4 são novamente presentes, e já aprovados pela CMT, sendo
remetidos para aprovação superior.
Contudo a questão seria polémica. Em Julho, constata-se que falhara o empréstimo
para se fazer a residência paroquial, o cemitério da freguesia, e os muros de suporte no
adro, apesar dos contactos do presidente para empréstimo em diversas partes da quantia
de 2 contos e 500,000 reis. Perante as circunstância houve necessidade de optar pela obra
mais urgente, a da residência paroquial, com empréstimo de um conto e 200.000 reis a
juro de 8% ao ano, por espaço de 5 anos.
Deliberação que seria suspensa pelo Governo Civil assim justificada: «…visto que essa
despeza não é encargo obrigatorio da Junta a qual somente cumpre acorrer aos reparos da
mesma rezidencia, quando o usufructuario não for obrigado a ella» (379).
Contra a decisão reage a junta de paróquia em sessão extraordinária a 19/07 alegando
que «…julga ter a seu cargo como outras juntas julgam, e tanto que está pagando aluguer
de caza para viver o parocho como tambem fazem outras juntas d’este Destricto e até do
Concelho (…) Esta Junta está tambem dividamente aucthorizada a lançar contribuição
de 23% cujo lançamento está feito, sendo mesmo impossível deixar de fazer a respectiva
cobrança attento o contracto feito pela junta, para que foi legalmente aucthorizada»(380).
Exposta a argumentação, assume a deliberação anterior esperando que o GC a não con-
trarie «afim de obstar ao gravíssimo transtorno».
Ainda em Julho abre-se praça para a construção da residência paroquial dando entrada
apenas uma proposta, assinada pelo mestre de obras José de Paiva, no valor de 1 contos e
175.00 réis, que a JP aceita a 04/8, ficando o arrematante com o material da velha casa,
excepto os dois currais contíguos ao cemitério. Mais se definiu que a obra finalizaria em
Maio de 1890 e que a casa fosse coberta «…com têlha de marcêlha, a cuzinha e depen-
dencias com têlha portugueza»(381).
Situada próximo da Igreja, a actual residência foi construída no tempo do padre José
Lourenço de Matos, com generosa colaboração de toda a paróquia (vide foto 66). O edificio
foi inaugurado a 27/09/1952 por D. Ernesto Sena de Oliveira, Arcebispo Bispo – Conde
de Coimbra. Na época era Presidente da CM Tábua, o Eng.º Caeiro da Mata, titular da
Casa do Esporão, que na qualidade de paroquiano colaborou na construção da residência
e participou na recepção episcopal(382).

(378)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1883-1893, fl. 55
(379)
  ibid. fls. 58, 59
(380)
  ibid. fl. 59v.
(381)
  AJM – Livro das Sessões e deliberações da Junta de Paróquia de Midões, 1883-1893, fls. 60-60v.
(382)
  BARATA, 2016, p. 218

235
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

3. CAPELA DE S. MIGUEL (OUTEIRO DE S. MIGUEL)


Foi construída no Outeiro com o mesmo nome do arcanjo, próxima do marco geo-
désico, datado de 1854 e reconstruído em 1955. Vem referida nas memórias paroquiais
de 1758 como estando localizada na Vila do Coito.
A 04/04/1897 e após trabalhos de alargamento e reconstrução de iniciativa particular,
a Junta de Paróquia desejava «…promover, quanto possível, o seu acabamento com o
amplo fim, de crear nova fonte de receita para esta Junta, e de fazer desaparecer d’aquelle
lindíssimo ponto de vista, o desleixo d’umas poucas de gerações»(383).
Em sintonia, delibera, também, solicitar autorização superior para gastar na obra da
«armação da Capella de S. Miguel» a quantia de 69.000 reis, saldo da contribuição paro-
quial lançada para a construção do cemitério e que ia suavizar o orçamento suplementar
daquela intervenção no valor de 73.560 reis.
Uma obra de muita importância, em que a capela foi reconstruída com os contributos
de muitos fregueses, entre os quais se destacaram João Maria de Moura, residente em
África, José António de Almeida, residente no Rio de Janeiro e D. Antónia de Vasconcelos
Abranches, residente em Midões – a quem a JP expressou voto de profundo reconheci-
mento a 15/08/1897.
Uma obra que terá tido as suas vicissitudes, na medida em que a 06/12 a JP consente
que D. Antónia de Vasconcellos reconstruísse a capela a expensas suas. Alguns meses depois,
na sessão da JP de 19/09/1898, comparece Silverio Coelho Paes de Amaral, mordomo da
Casa Ribeirinho, oferecendo, em nome do Sr. Felipe Ribeiro d’Abranches, irmão de D.
Antónia de Vasconcellos, a imagem de S. Miguel «…que o mesmo Senhor mandou fazer
no Porto, e que destinava á capella de S. Miguel acabada de reedificar por esta Junta»(384).
A primeira festividade em honra de S. Miguel após a reconstrução da capela foi es-
pecialmente sentida. A JP lançaria um voto de agradecimento aos eclesiásticos «…que
gratuita e espontaneamente se prestaram a assestir á festividade de S. Miguel em 29 do
mez findo»: Antonio Pereira Coelho (pároco de Pinheiro de Coja); João Gomes Lopes
(Prior de Travanca) e Miguel Augusto da Cruz), e aos reverendos oradores (Francisco
Ribeiro Coelho d’Abranches, Prior de Alcobaça e Manoel Rodrigues de Castro, prior em
Stª Comba Dão) e às irmandades do SS de Midões e de Sant’Ana de Vila do Mato «…
que na tarde de 28 acompanharam a imagem de S. Miguel da Egreja para a sua Capella,
e no dia 29 tomaram parte na procissão, com que terminou a festa»(385).
Até 1910 a festa em honra do arcanjo despertava muito interesse, incluindo no progra-
ma uma concorrida feira. No entanto a tragédia que vitimou um jovem natural da vizinha
aldeia do Coito, devido a rebentamento de foguete quando segurava a pauta da música

(383)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1893-1897, fl. 24
(384)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1897-1902, fl. 9
(385)
  ibid. fls. 9v.-10

236
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

a um membro da Banda Filarmónica em actuação no coreto, fez com que a festividade


decaísse de interesse nos anos seguintes(386).
Após a reconstrução da Capela de S. Miguel o culto funcionou condignamente durante
alguns anos. Porém, a 01/02/1925 a JFM toma conhecimento do estado de ruína em
que se apresenta o templo, nomeando uma comissão encarregue de angariar donativos e
proceder às reparações necessárias, constituída pelos seguintes elementos: Dr. Henrique
d’Almeida, Joze da Fonseca Monteiro e Antonino d’Almeida(387).
Do ponto de vista histórico-artístico, a capela possui na fachada uma extremidade
inferior revestida por frisos e pilastras de pedra nos cunhais, suportando, cada uma, um
elemento piramidal (vide foto 67). A porta com lintel rectilíneo e extremidades laterais cur-
vas, é ladeada por duas pequenas janelas gradeadas e encimadas por janelão de verga curva.
A empena, de contornos curvos, expõe, ao centro uma cruz sobre pedestal. Na parede
lateral esquerda acede-se, por escadaria, a uma porta aberta na extremidade superior e ao
topo do marco geodésico adossado à capela. A parede lateral direita contém uma peque-
na janela gradeada e a fachada posterior um alçado cego. O telhado é formado por duas
águas, com empenas.
O interior do templo apresenta um lambril de azulejos de padrão azul, de temática
geométrica e vegetalista. O retábulo é polícromo, com superfície pintada de marmoreados
azuis e vermelhos, decorados com motivos vegetalistas dourados, integrando mesa de altar
com castiçais, colunas, pilastras e frontão curvo.
No retábulo destaca-se a escultura de São Miguel, de madeira, provavelmente do séc.
XIX(388) (vide foto 68). Os espaldares laterais dos retábulos apresentam duas mísulas, uma
em cada extremidade, sustentando, no lado esquerdo a escultura de Nossa Senhora de
Fátima e, no lado oposto, uma imagem de Nossa Senhora da Conceição. Existe, também,
uma representação de Santa Luzia e uma figura do hagiológico não identificável.
O Outeiro de S. Miguel serviu ao longo dos anos para diversos eventos e foi arrendado
em Outubro de 1956, por 150$00 anuais «…para efeitos de um campo de obstaclos para
treino de cavalos» pela renda anual de 150$00 «…e durante o período de tempo que possa
convir às duas partes (Junta de Freguesia e Dr. José Maria Simões Coelho)(389)». A área foi
sendo arrendada para pastagens.
Em Outubro de 2012 a JF procedeu ao arranjo e pintura da capela que se encontrava
em mau estado de conservação. No princípio de 2013 demoliu-se o antigo depósito de
água ali existente, uma vez que se havia construído o novo e estava já a funcionar.
A festa em honra de S. Miguel continua a realizar-se a 29 de Setembro (vide foto 69).

(386)
  MONTEIRO, 2007, pp. 179-182
(387)
  AJM – Livro das Acta das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1918-1937, fl. 36v.
(388)
  CORREIA; GONÇALVES, 1952, p. 241
(389)
  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1953-1960

237
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

4. CAPELA DE S. SEBASTIÃO (COITO)


Localizada na parte mais elevada do Coito de Midões ao cimo da Rua da Capela. Foi
reformada no século XVIII, havendo registo de nova intervenção em 1950, de que resultou
ter ficado com «espaço mais reduzido para a parte da cabeceira»(390).
Na fachada, a porta e janelas são de verga curva ligeiramente achatada e empena cul-
minando com uma cruz sobre pedestal (vide foto 70). Na fachada lateral direita sobressai
um pequeno campanário, com um sino, duas janelas de cantaria pétreas e, incrustadas
na parte inferior da parede, duas lápides do período romano, justapostas, já referenciadas
aquando da abordagem aos vestígios romanos. Têm 1,97X0,50 m. de altura e nelas se pode
ler: GENIO MVNICIPI TEMPLVM / C. CANTITUS MODESTINVS /EX PATRIMONIO
SVO; VICTORIAE TEMPLVM / C. CANTIS MODESTINVS / EX PATRIMONIO SVO.
A cobertura é de telhado com duas águas e empenas triangulares na fachada principal
e posterior, apresentando esta um alçado decorado com uma cruz de pedra e a lateral
esquerda possuindo uma pequena janela.
O interior da capela reveste-se de ladrilhos cerâmicos, lambrim de azulejos azuis, de-
corados com motivos geométricos, vegetalistas e com filetes (vide foto 71). A porta lateral
direita, que existia próxima das referidas epígrafes romanas já não existe, bem como o
retábulo modesto, entretanto removido.
Na actualidade e assentes sobre mísulas são de destacar 3 esculturas: S. Sebastião, da
1ª metade do séc. XVI (vide foto 72), S. Tiago e S. Miguel, ambas datadas do séc. XVII.
As demais imagens são modernas.
A festa em honra do Mártir S. Sebastião festeja-se a 20 de Janeiro ou no Domingo
mais próximo à data. É costume haver missa e procissão acompanhada pela Irmandade
do Santíssimo Sacramento e por uma Filarmónica.

5. CAPELA DE SANTA ANA (VILA DO MATO)


Este templo localiza-se em Vila do Mato na Rua José Teles Corte Real. Foi objecto
de intervenção no séc. XIX e, como consta de vários registos paroquiais, serviu algumas
vezes de matriz (caso de 1812).
A capela é antecedida por um pequeno adro murado, guarnecido com gradeamento
metálico. Na fachada, destaca-se a torre sineira, na orla direita, delimitada por pilastras,
uma das quais mais ressaltada (vide foto 73).

  CORREIA & GONÇALVES, 1952, p. 241


(390)

238
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

O frontispício completa-se com um portal de verga curva, encimada por janelão de


sacada, que ostenta um gradeamento metálico, e com empena curvilínea contornada co-
roada com uma cruz lítica na cumeeira. Nas extremidades da empena destacam-se fogaréus.
No interior os tectos são curvos e em betão armado, mas os anteriores eram em
madeira(391)(vide foto 74). A viga de suporte, em betão armado, assenta em duas colunas
cilíndricas de granito, aproveitadas da estrutura anterior. Cada coluna está ornamentada
com uma pia de água benta. As paredes possuem lambrim de azulejo, a capela tem arco
cruzeiro, duas portas laterais simétricas e pavimento recente, em mosaico. A capela foi
restaurada em 1983-1984. A padroeira é festejada no último Domingo de Agosto, com
missa e procissão.
O retábulo da capela mor é do estilo neoclássico do séc. XIX (vide foto 75), sendo de
realçar a imagem de estilo quase popular, obra de oficina coimbrã do séc. XVII, venera-
da como Santa Ana (vide foto 76). Na abóbada da capela é de realçar a pintura de uma
custódia envolta por nuvens e dois anjos, da segunda metade do séc. XIX (vide foto 77).
Associada a esta capela existiu a Irmandade de Santa Ana, que teve as suas rivalida-
des e questões com a Irmandade da Senhora do Pranto, erecta na Matriz de Midões.
A 01/03/1794 o vigário de Midões, Manuel José Ferreira, denuncia à Provedoria da Câmara
Eclesiástica, os abusos cometidos pela Irmandade de Santa Ana(392):
«…rixas, odios, disputas, partidos, perturbacoens do socego publico, e outras ruinas
da caridade e unidade christam, de q’ esta freg.ª tem por vezes sido o theatro, e o come-
çou já a ser no anno de 1760, por occazião de pretender esta Irm.de preceder a outra da
Snr.ª do Pranto orago desta freg.ª erecta na matriz: cuja questão se decidio na Relação do
Porto a favor da Matriz».
Passado aquele momento turbulento a Irmandade de Santa Ana estava novamente no
centro de atenções pelos piores motivos:
«Hoje actualm.te e já desde o ano passado a sobređ.ª Irm.de animada pelo R.do João
Francisco da Costa do m.º lugar de V.ª do Matto, q’ se tem há annos erigido seu chéfe,
pretende celebrar na đ.ª capela e não na Matriz apezar da contradição do sup.te, dous
chamados Aniversarios da mesma Irm.de com o fundam.to de q’ estão na posse de assim
o praticarem há m.tos annos com licença do sup.te qual ate agora lha concedia; e de q’
p.ª isso tem desp.º do Dr. Provedor da Comarca: como se fosse da sua competencia o
destinar lugar p.ª os Divinos Officios».
O vigário de Midões alega então as falhas detectadas que imputa à acção ao Reverendo
João Francisco da Costa (Vila do Mato) e a seu pai Manuel João (Juiz da Irmandade de
Santa Ana), e José João e João Gomes, ambos mordomos da mesma. O maior problema
é a falta de solenidade na celebração dos aniversários, praticada com clérigos de fora da
freguesia, negando-se participar em tais actos e levantando a suspeita de má administração

  BARATA, 2016, p. 140


(391)

  AUC – Câmara Eclesiástica, Cx. 12, Doc. 12


(392)

239
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

das contas da corporação. E conclui, solicitando a pena de suspensão aos clérigos que
assistam às referidas funções da Matriz, respeitando assim as práticas antigas.
Por informação de 04/04/1794, o Escrivão e Procurador da Confraria de Santa Ana,
defende-se das acusações: que sempre na dita capela se fizeram e celebraram aniversários
(anexando certidão); que o vigário queixoso há mais de 15 anos que vinha assistindo às
ditas funções «principalm.te emquanto foi irmão da d.ª confr.ª»; que a capela de Vila do
Mato e sua Irmandade «sempre foi milhor em tudo; e com especialid.e em ornamentos,
q’ a da Matriz» e que é pelo facto de esta «estar hoje de todo arruinada» que se celebram
na capela as ditas funções; que os aniversários e mais obrigações da confraria se fizeram e
praticaram na sua capela desde tempos imemoriais, que a 07/06/1670 o Papa Clemente X
concedeu Bula Pontifícia de Indulgência Plenária a todos os irmãos que se confessassem e
comungassem no Altar de Santa Ana, tanto no dia da sua festa como no dia 7/09; que os
mordomos são todos pessoas de bons costumes, cuja boa administração pode comprovar
o Provedor da Comarca da Guarda que tem tomado suas contas; por fim, que o vigário
errara, colocando a questão no Juízo Leigo e não no Eclesiástico solicitando «que em
tudo se ponha perpetuo silencio, e se em contrário for protestão e declinam este juizo».
Nos finais de Dezembro de 1794, o Juízo Eclesiástico remete o processo para o Juízo
Privativo da Câmara da Guarda, desconhecendo-se a tramitação posterior.

6. CAPELA DE NOSSA SENHORA DO CAMPO (CASAL DA SENHORA)


Situada no Largo João Brandão em Casal da Senhora é, provavelmente, a melhor
capela pública da freguesia (vide foto 78). De meados do séc. XVIII, está próxima de um
cruzeiro da mesma época e da casa da família de João Brandão. Vem referida nas memórias
paroquiais de 1758. O templo funcionou em diversas ocasiões como igreja da freguesia,
estando o comendador obrigado à fábrica da Capela-mor.
A esta capela tinham os fregueses de Midões e da Póvoa grande devoção, devido não
só aos sermões dos Sábados da Quaresma, mas também pelas ladainhas da Semana Santa
e manifestações de proteção da sua Senhora. Tais conclusões se extraem das informações
do vigário de Midões, João de Sousa Machado, em 29/10/1747, no âmbito do processo
que culminaria com o abandono da Capela de Nossa Senhora da Graça e transferência
da imagem para a Capela da Senhora do Campo em 1747:
«…por q’ a esta Sr.ª tem esta freg.ª e a freg.ª da Povoa grd.e devoção porq’ em todos
os sabados da qoresma nesta cap.ª há sermoens, em ella se ajuntão a ouvillos as duas freg.
as cantando queda huma das freg.as de manham a sua ladainha em louvor da Sr.ª e alem
disto lá tornão as ladainhas da Semana Santta, e varias devocoens q’ tem estas freg.as e
tem com esta Sr.ª tal fee, q’ qd.º oo tempo está siniluozo dizem a boucha cheia e assim he,
q’ nuncha raios corischos pedra ou agoa fes danno algum nestas freg.as e avendo tantos
perigos pellas outras, o q’ tudo atribuimos a esta soberanna Sr.ª; e por isso não só o pouvo

240
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

do Casal da Sr.ª se quer empinhar com esta Sr.ª e sua cap.ª mas tambem esta freg.ª e a da
povoa, e agora m.to mais pois tambem esta freg.ª se acha em m.ta necessid.e»(393).
O frontispício exibe portal com jambas decoradas com elementos curvilíneos e lintel
ornado com o monograma IHS (Jesus Hominum Salvator) – Jesus Salvador dos Homens.
A porta principal é ladeada por dois óculos e encimada por entablamento a suportar um
frontão interrompido, que enquadra um óculo com a mesma morfologia dos anteriores,
mas coroado com concha.
A fachada principal possui empena contornada por entablamento curvilíneo, supor-
tando uma pequena cruz. Os muros laterais apresentam vãos de verga curva e o posterior
alçado cego e empena triangular marcada por entablamento de pedra.
O telhado é de duas águas, com apenas uma sobre a sacristia, estrutura intervencionada
recentemente. Os fogaréus piramidais terão sido trasladados da zona cimeira das pilastras,
onde rematariam os cunhais.
Três corpos definem a articulação do espaço: a nave, a capela-mor (mais estreito que
o anterior) e a sacristia, colocado na lateral esquerda e servido por uma pequena escadaria
pétrea de dois lanços, adossada ao corpo. As fachadas principal e posterior apresentam
cunhais marcados por pilastras, e revestidos de material lítico nas paredes laterais.
A nave reveste-se de ladrilhos e lambrim cerâmico decorado com padronagem azul de
temática vegetalista e geométrica (vide foto 79). O púlpito, no lado do Evangelho, tem
gradeamento de madeira envolvendo a bacia de pedra, colocada sobre mísula decorada com
enrolamento. O coro-alto, de madeira é guarnecido com balaustrada no mesmo material.
Um arco de pedra faz a transição da nave para a capela-mor. Nas paredes laterais e
assentes sobre mísulas temos duas esculturas: a da esquerda, de Nossa Senhora de Fátima
e a da direita, a de S. José. O retábulo, incluindo a mesa de altar decorada é da estilística
rococó, mais de labor periférico do que trabalho de uma grande fábrica e exemplo do que
foi bem acolhido nas paróquias do interior do país.
Apresenta-se com motivos vegetalistas dourados, revestido com marmoreados azuis,
vermelhos e castanhos, com faixas douradas e pretas. Sobre a mesa de altar assentam cas-
tiçais e um crucifixo em metal, e uma escultura da Virgem com o Menino.
A estrutura retabular contém duas colunas com capitéis da ordem coríntia, com terço
inferior estriado e os nichos e a caixa do trono decorados com motivos florais. O nicho
da extremidade esquerda abriga uma escultura de Santo António, enquanto o da ilharga
direita o de um Santo Bispo. No trono uma escultura de Nossa Senhora com o Menino,
vulgo Senhora do Campo, datada do séc. XVII (vide foto 80).
O retabulo é encimado por pequenos anjos e entablamento de contornos curvílineos
que sustenta frontão curvo interrompido, onde se colocam, em acrotério, dois anjos, um
em cada extremidade acompanhados de dois fogaréus a enquadrar um espaldar ornado
com pequenas pilastras, enrolamentos e motivos vegetalistas dourados.

  AUC – Cabido, Instituições Pias, Cx. V, Doc. Nº 26


(393)

241
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

A cornija que percorre o templo encontra-se pintada com marmoreado verde. No


tecto da capela-mor, singular, de madeira pintada, destaca-se uma cartela legendada com
a palavra ANNO e decorada com enrolamentos, conchas e pequenos anjos. Na extremi-
dade oposta representa-se um ornato semelhante, legendado com a data 1794. Um tecto
edificado através da técnica «trompe l’oeil», apresentando balaustradas, pequenas varandas,
pilastras, grinaldas, entablamento ressaltado e anjos (vide foto 81).
Ao centro, exibe um medalhão elíptico, de moldura decorada com flores e cartelas,
enquadrado por dois frontões curvos na cor vermelha. O medalhão mostra uma oliveira in-
serida numa paisagem e a legenda «QUASI OLIVA SPECCIO / SA IN CAM / PIS ECCLI
XXIV / 19» (vide foto 82). Trata-se de uma passagem retirada do Livro do Eclesiástico
que significa «qual oliveira especiosa no campo», expressão que se refere, segundo a antiga
tradição perenética, à Virgem Maria, aqui venerada como Nossa Senhora do Campo.
No lintel da porta de acesso à Sacristia consta a data de 1691 (vide foto 83). Na capela
existe, também, um missal romano, datado de 1722.

7. CRUZEIRO (CASAL DA SENHORA)


Localizado próximo da capela de Nossa Senhora do Campo e da casa de João Brandão
data, provavelmente, de 1798(394) (vide foto 84).
Apresenta a cruz colocada sobre um elemento circular, assentando em pedestal recti-
líneo, suportado por três degraus. Este pedestal possui quatro faces decoradas, exibindo
em duas delas uma cruz emoldurada e inscrições: numa vislumbra-se, com dificuldade a
referida data de 1798, a outra está completamente ilegível.

8. CAPELA DE SANTO AMARO (CASAL DE SANTO AMARO)


Pequena ermida dedicada a Santo Amaro. Fachada evidenciada por cantarias que as-
sinalam o portal, duas janelas e uma sineira, conferindo ao templo um imponente vigor,
para o que também concorre a empena do telhado, em especial a linha curva que se de-
senha no lintel do portal e na cantaria superior dos pequenos janelos. Uma cruz metálica
destaca-se na frontaria (vide foto 85).
O interior apresenta um retábulo de reduzidas dimensões (vide foto 86), onde se acolhe
uma escultura pétrea policromada, de Santo Amaro, popular, datada do século XVII (vide

  CORREIA & GONÇALVES, 1953, p. 241


(394)

242
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

foto 87). A estrutura retabular é ladeada por duas pinturas de madeira, do séc. XVII, de
S. João Baptista e S. Paulo.
A festividade a Santo Amaro ocorre a 15 de Janeiro ou em Domingo próximo, com
missa e procissão. De cunho simples e rural, outrora se arrematavam figos e peras secas
em honra do padroeiro.

9. CAPELA DE NOSSA SENHORA DA ESPERANÇA (TOURIZ)


Localizada no Largo Eng.º Basílio Caeiro da Matta. No lintel do portal desta pequena
ermida, de granito, pode ler-se: «ESTA CAPELA FEZ DOS DIS/1606». Uma legenda
que poderia situar cronologicamente a construção, bem como o nome do construtor,
Domingos Dias. Mas assim não é, como escreveu Amândio Monteiro:
«A padieira da porta principal da capela que ostenta a inscrição, gravada no granito,
1606, é uma inexactidão. Esclareço que essa Pedra não lhe pertence e é uma grosseira
mentira. Pertenceu, sim, à demolida capela de S. José que existiu na Rua do Cabo, onde
nesse tempo se verificava o começo da povoação, a qual se estendia pelos Chães, Olival
da Capela, Galvões e Vale do Romão»(395).
Sobre esta capela sabe-se que em 1620 era administrada por João de Amaral, (396),
provavalmente João do Amaral de Azevedo, descendente dos Amarais de Touriz, senhor
da Capela dos Ferreiros e do Morgado de Touriz. Casou com Maria Soares de Albergaria
e falecei no Porto a 22/07/1639(397).
No lugar também existiu uma capela instituída por António Tavares Leitão, que casou
em 1676 com Luísa Amaral de Azevedo, descendente dos Amarais de Touriz, sobre a qual
pouco se sabe(398).
A capela actual é um templo construído por volta de 1895, para a qual aproveitaram
a padieira da porta a que atrás se fez referência»(399). A fachada principal deixar ver os
elementos piramidais colocados nos ângulos superiores dos cunhais e a cruz, muito alta,
no cimo da empena, bem como um óculo de reduzida dimensão sobre o portal. À direita
deste, vislumbra-se uma sineta e a torre sineira, no cimo do beirado, na fachada lateral
direita (vide foto 88).

(395)
  MONTEIRO, 2005, p. 12
(396)
  AUC – Paroquiais de Midões, Mistos 1565-1699, fl. 136v.
(397)
  GONÇALVES, 2006, Vol. I, p. 338
(398)
  Ibid. p. 331 e seguintes.
(399)
  MONTEIRO, 2005, p. 12

243
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

No interior, um pequeno retábulo, tendo no nicho central a escultura da patrona da


ermida, Nossa Senhora da Esperança, datada do séc. XVII, ladeada pelas esculturas de São
José (que terá vindo da demolida capela) e de São João (vide foto 89).
A festa em honra da padroeira é festejada no 2º Domingo de Setembro, com missa,
procissão, quermesse, geralmente acompanhada de filarmónica.

10. CAPELA/CASA MORTUÁRIA


Localizada na extremidade nascente do Adro da Igreja Matriz. Em meados de 1996,
após troca de impressões entre a JF e o padre Manuel Carvalheiro Dias, concluiu-se que a
construção da capela mortuária era de absoluta necessidade para a freguesia e que o local
ideal para a sua implantação seria uma construção subterrânea no adro da igreja.
Em Setembro do mesmo ano constituiu-se uma comissão de apoio à sua construção,
constituída pelos seguintes elementos: António Carlos Marques Antunes, António José
Oliveira Duarte e José Luís Fernandes Saraiva(400).
Aproveitando a gentileza do Eng.º Manuel Mariz Vasconcelos, deu-se início aos traba-
lhos(401). Porém, só um ano depois se lançou concurso. E, a 31/10/1997, na sequência da
deliberação antiga de 13/02/1995, aplicou-se o dinheiro recebido da extinta Casa do Povo
de Midões, no valor de 745.000$00 e respectivos juros «como pagamento de parte da Casa
Mortuária da Freguesia de Midões, presentemente em fase adiantada de construção»(402).
Em meados de 1998 ficou a obra concluída (vide foto 90).

11. ALMINHAS
Pequenos monumentos muito difundidos no contexto da Contra-Reforma. Expressam
a fé na comunhão dos santos e numa genuína solidariedade para com os que sofrem,
vivos ou defuntos. Um caminho privilegiado de santificação e salvação, com forte apelo à
oração pelas almas do Purgatório. Por isso as alminhas se erguem em memória de pessoas
particulares pelos seus familiares, um monumento à solidariedade colectiva para com as
almas que sofrem a dor da sua purificação.
As representações mais habituais: Cristo crucificado, sobressaindo das chamas do
Purgatório e atraindo as almas que delas se vão libertando; a representação associando

(400)
  AJM – Livro de Actas das Sessões da Assembleia de Freguesia de Midões, 1990-2002, fl. 19
(401)
  AJM – Livro de Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1988-1999, fl. 68v.
(402)
  ibid. fl. 83v.

244
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

a esta missão redentora Nossa Senhora. Por norma, os artistas envolvidos, populares ou
eruditos, representam as almas do purgatório com todas as classes sociais e eclesiásticas.
Pedro Miranda e Orlando Martins procederam, em 2003 ao levantamento por fre-
guesias, das alminhas do concelho de Tábua(403), tendo identificado 11 exemplares na
Freguesia de Midões:

Cadoiço:
Uma foi erguida em terreno particular de cultivo, a 70 m. da berma direita da E.N. 502,
sentido Midões-Oliveira do Hospital, 100 m. após cortada para o Esporão. Construída em
granito, de elevada estatura (63cm x 200cm x 24cm), fixada através de sistema de encaixe
em base de granito. Encimada por cruz trilobada de cercadura saliente, predominando ele-
mentos decorativos em forma de enrolamentos relevados. Em bom estado de conservação.
Outra ergue-se adossada a uma casa particular, no entroncamento da E.N. 105 com
a E.N. 502 (cruzamento de Touriz). Alminhas também em granito, bem trabalhadas e de
formato rectangular (65 cm x 127cm x 25cm). Ao centro encontra-se o nicho emoldu-
rado, servindo de apoio, na parte superior, a uma cruz trilobada de cercadura saliente e
dois enrolamentos decorativos. Sob o nicho encontra-se um pequeno campo epigráfico e
alguns motivos com fins decorativos. Em estado razoável de conservação (vide foto 91).

Coito:
Ficam situadas na Rua das Almas, estão integradas na parede de uma casa particular
parecem ser antiquíssimas. Apresentam um nicho relevado, com arco e sobre este uma
cruz latina também em relevo. No nicho encontramos vestígios de policromia notando-se
a figura de Jesus Crucificado.

Apresentam-se em bom estado de conservação e apresentam as seguintes dimensões:


70cmX94cm. A parte inferior ostenta uma data que sugere o ano de 1750.

Esporão:
Situam-se no lado esquerdo da E.N. 1304, sentido Esporão-S. Geraldo, depois da
cortada para Touriz. Edificadas em granito, encontram-se adossadas a um muro de pedra
e estão em bom estado de conservação. Possuem as dimensões 168cmX57cmX27cm. De
formato rectangular, são constituídas por um nicho emoldurado, ladeado por quatro en-
rolamentos e encimado por uma cruz latina, também em relevo. Sob o nicho encontra-se
um pequeno campo epigráfico e um círculo.

  MIRANDA & MARTINS - As alminhas do Concelho de Tábua, Paróquia de Midões, 2003


(403)

245
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Midões:
Alminhas imponentes, as mais altas de todo o concelho de Tábua, situadas no lado
direito da Rua da Caricha, em direcção à fonte com o mesmo nome, a poucos metros do
pelourinho. Apresentam as dimensões 80cmX240cmX16cm (vide foto 92).
Apresenta um excelente trabalho de canteiro, onde o nicho central ocupa o lugar
central. A sua moldura prolonga-se na parte inferior, incluindo um campo epigráfico, três
rectângulos almofadados e um quadrado com uma cruz no seu interior. Sobre o nicho
encontra-se uma cruz trilobada ladeada, na parte superior, por dois círculos e, na parte
inferior, por dois pináculos. Debaixo dos pináculos encontram-se alguns relevos destruídos
e uma ampulheta entre dois círculos.

Tojais:
Alminhas em granito, de beleza singular, erguidas do lado direito da E.N. 337, sentido
Vila do Mato – Midões, junto à placa que sinaliza o início da povoação dos Tojais. De
bom mestre, apresenta o nicho tendo como moldura duas colunas encimadas por um
arco trabalhado de forma primorosa e coroado com uma cruz trilobada de faces sulcadas.
Na parte inferior do nicho foi insculpida uma data que parece ser 1902. As alminhas
têm como dimensões: 54cmX130cmX14cm e estão fixas por sistema de encaixe, num
bloco de granito.
Apresenta os dois cantos superiores partidos mas apresenta, no geral, bom estado de
conservação.

Touriz:
Chegaram a existir três alminhas nas saídas da povoação «paineis rectangulares em
granito toscamente gravados que representavam as “almas do purgatório”», tendo desa-
parecido as duas que se localizavam do lado do Esporão(404).
Assim, subsistem as alminhas em granito, de formato rectangular, situadas no Largo da
Fonte de Baixo, com as dimensões de 60cmX160cmX25cm. Apresentam sinais de erosão,
embora seja notória a mestria do centeiro, designadamente, ao nível dos enrolamentos
decorativos. O nicho apresenta-se duplamente emoldurado, com campo epigráfico sob
o nicho e cruz trilobada.
Em outros tempos estas alminhas foram partidas, em toda a largura, junto à cruz, mas
uma intervenção posterior permitiu unir as duas partes através de dois gatos de ferro. É
de louvar o gesto do proprietário de uma moderna moradia que mandou incorporar o
painel das alminhas na parede da mesma, dando-lhe assim mais dignidade e protegendo-a
de actos de vandalismo.

  MONTEIRO, 2005, p. 50
(404)

246
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

Vasco:
No lado esquerdo da estrada de acesso a Vasco, e a dez metros do arco, encontramos,
no cimo de um muro de pedra, um nicho emoldurado com campo epigráfico. É o que
resta de umas alminhas em granito sendo visível um coto apoiado no arco do nicho que
denuncia a existência, noutros tempos, de uma cruz em relevo. As alminhas têm as di-
mensões de: 50cm x 70cm x 15cm.
Existem outras alminhas, em granito, de formato rectangular, no cruzamento entre
o caminho de terra que segue de Vasco na direcção do Casal da Senhora e o caminho de
terra que vem do Largo da Feira de Midões.
O nicho é de coroa arrendonda, com moldura albergando um campo epigráfico e
três rectângulos almofadados. Sobre o nicho temos uma cruz trilobada, ladeada na parte
superior, por dois círculos e, na parte inferior, por dois pináculos. Abaixo destes, e em
simetria, encontram-se relevos destruídos e uma ampulheta entre dois círculos.
Dadas as evidentes semelhanças entre estas alminhas e as que se encontram na Rua da
Caricha, em Midões, é provável que sejam obras do mesmo mestre ou uma cópia.
Tem como dimensões: 68cm x 174cm x 26cm.

Vila do Mato:
Originais alminhas em granito, de formato rectangular, com coroa arredondada, situa-
das no encontro da Rua do Carreiro com a Rua do Viso e a Rua da Lajinha (vide foto 93).
O nicho apresenta dupla moldura, ocupando o lugar central, sobre o qual se ergue uma
árvore ladeada por dois círculos.

Na parte inferior das alminhas insculpiram-se duas datas, avivadas a preto: 1940, dentro
de um campo epigráfico duplamente emoldurado; e outra, de 1786, sob o mesmo campo
e junto a enrolamentos relevados. Diz o povo que a primeira data se refere à mudança das
alminhas para o sítio em que se encontram, sendo a segunda a data da sua construção.
Foram partidas e coladas acima do nicho. Apresentam as dimensões: 65cm x 190cm x 26cm.
Existem outras alminhas nesta povoação, incrustadas numa casa particular na Rua José
Teles Corte Real. Em granito, são constituídas por duas partes: o nicho, emoldurado e
ladeado por enrolamentos; e uma cruz grega, em relevo, num bloco de granito separado
do nicho.
Dimensões: 60cm x 60cm. Em deficiente estado de conservação.

247
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

B. PATRIMÓNIO CIVIL

1. PELOURINHO MANUELINO DE MIDÕES


Localizado no Largo do Pelourinho. Obra de labor manuelino, em pedra granítica,
o pelourinho foi implantado na época da concessão do foral de 1514, classificado desde
1933 como Imóvel de Interesse Público (Decreto 23.122 In Diário do Governo 231,
11/10/1933). Símbolo da autonomia concelhia, ali se executavam, de forma pública, as
sentenças judiciais.
Base decorada com canelura, estrutura de suporte composta por três degraus e uma
plataforma quadrangular. Fuste constituído por quatro toros entrelaçados, com uma altura
de 2,60 m., capitel anelado, decorado com motivos florais. Remate com a continuação
dos quatro toros e um ornato vegetalista a coroar a coluna (vide foto 94).

2. PELOURINHO DO COUTO (OU COITO) DE MIDÕES.


Localizado na Rua do Pelourinho. Implantado na rua com o mesmo nome. Também
considerado imóvel de interesse público desde 1933 (vide foto 95). Formado por estrutura
de suporte de três degraus, compensando a cota desnivelada do terreno, que servem de
base ao fuste. Este é de secção poligonal mas já não sustenta o capitel que outrora rematou
o conjunto, impossibilitando a classificação tipológica. É ainda visível o sinal da argola.

3. ANTIGA CASA DA CÂMARA DO CONCELHO DE MIDÕES


Edifício localizado junto do pelourinho de Midões (vide foto 96). Encontra-se em
adiantado estado de ruína, havendo perdido a cobertura. O imóvel possui uma pequena
escadaria de acesso ao interior, com uma fonte adossada. Terá funcionado também como
cadeia e serviu para aquartelamento. Recentemente funcionou como escola primária.
Existe alguma documentação sobre este importante imóvel, símbolo do perdido es-
tatuto de autonomia municipal midonense. A 10/09/1841, e em reunião extraordinária,
a vereação delibera enviar ao Administrador Geral uma representação dando conta do
«mao estado em que se acha nesta Villa a Caza denominada = os Paços da Camara =».
Refere que já não é a primeira vez que se informa do mau estado e a outras autoridades,
remetendo orçamento das despesas «…acrescentando apenas que se ellas então se faziam
com motivo urgente, agora mais urgente se torna pela collocação nesta Villa da Cabeça
da nova Comarca; por que não temos huma caza que offreca ao Juiz do Direito para

248
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

celebrar as audiencias nem cadea nem ao menos sirva de guardar em costodia prezos de
menor consideração depois do ultimo arrombamento feito na cadea ha pocos mezes. A
caza que servia de cadeia ficou inteiramente inutilizada. He pois indispensavel atender
para es ta necessidade»(405).
Em face da situação, a vereação solicita autorização ao Conselho de Distrito para vender
as casas das Câmaras Municipais dos antigos concelhos, bem como uma sorte de terra na
Vila do Mato, que pertencia ao antigo concelho do Coito, para com o produto da venda
se efectuarem «reparos de primeira necessidade».
Na sessão camarária de 03/0/1842, e com as vendas daqueles bens concretizadas, os
camaristas decidem construir novo edifício para as Casas da Câmara e Cadeia:
«…que visto o deplorável estado em que se achão as Cazas de Camara, e Cadea deste
concelho que se redifficasse desde os alicerces segundo os apontamentos dados pelo Mestre
Pedreiro Souza», decidindo expropriar para o mesmo fim as casas de Maria Bárbara, de
Midões, de acordo com o Decreto de 17/04/1838 por ser «indispensavel a parte daquela
caza intrar a fazer parte da Caza e Cadea». (406).
Esta decisão, porém, não foi avante. A partir de Junho de 1850 e atè à extinção
do concelho, ocorrida em 1853, a Casa da Câmara da Vila de Midões, bem como a
Administração do Concelho passam a funcionar em imóvel de César Ribeiro Abranches
Castello Branco, 2º Visconde de Midões, localizado na extremidade da vila «onde morava
o falecido delegado», arrendado pelo valor de 9600 reis (407)

4. CASA DO JUIZ DE MIDÕES


Localizada no Largo D. Paz. Trata-se do imóvel onde residiu o Juiz da Comarca de
Midões, Nicolau Baptista de Figueiredo Pacheco Telles, natural de Aguieira (Águeda),
assassinado a 28/08/1842, de cujo crime se acusou João Brandão.
A casa acompanha a curvatura da estrada e ostenta na fachada principal, ao nível do
piso térreo, um lambrim pintado a cinzento, cinco portas de verga recta, e uma janela
(vide foto 97). O piso superior contém seis janelas de batente rectilíneas. A fachada lateral
esquerda apresenta alçado cego. O imóvel, de telhado de duas águas, possui uma grande
chaminé telhada.

(405)
  AMT – Livro das Actas, Sessões e Acordãos da Câmara Municipal da Vila de Midões, 1841-1848
(406)
  ibid. fl. 27
(407)
  AMT - Livro da Receita e Despesa do Concelho de Midões, 1849-1854; Livro das Actas das Sessões da Câmara
Municipal de Midões, 1849-1854, fl. 54

249
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

5. CEMITÉRIO
O antigo cemitério de Midões localizava-se no centro da Vila, junto da residência
paroquial. Existem vários registos relativos à sua existência, que se correlacionam com o
novo cemitério localizado na Rua das Moitas.
Em Abril de 1850 o serralheiro António Borges, do Casal da Senhora, concluiu a obra
das portas férreas para o cemitério de Midões, por 8725 reis liquidados em 1841-1842,
quando era presidente Bento Ignácio Duarte de Almeida(408).
Em 1864, após várias subscrições do povo para a sua construção e conclusão, e não
existindo recursos disponíveis, a Junta de Paróquia reúne a 08/04 decidindo que se aplicasse
na conclusão da obra do cemitério, o saldo da despesa de 1861-62 «para n’elle se faserem
os enterramentos». Os vogais acordam, também, que o pedreiro José da Costa conclua «o
capiado do semiterio e a parede contigua a elle pela quantia de 14.940, e q´se rogassem
operarios para o aplanarem»(409).
O novo cemitério é uma obra que começou a desenhar-se em 1880. Na sessão do dia
21/03 a Junta de Paróquia de Midões analisa dois ofícios da Comissão Distrital, versan-
do «…sobre a necessidade urgente da Junta de Parochia mandar proceder á mudança e
construção d’um novo semiterio»(410).
Mas tudo evoluía lentamente e os anos foram passando. Na sua sessão de 04/09/1887,
a JP analisava o ofício do AC de 17/08/1887 propondo a remoção do cemitério por
questões higiénicas:
«Estando o cemiterio d’essa freguezia em péssimas condições hygienicas, precizando
por isso ser removido para um local apropriado, e como esta remoção está comettida
às respectivas Juntas de Parochia pelo Codigo Administrativo; - sirva-se VS.ª tractar da
referida remoção para o que deve, desde já, solicitar da Junta Geral deste Districto uma
parte do subsidio que deve destinar aquelle serviço, por intermedio desta administração,
e outra parte tratar de a obter pelos meios indicados no CA»(411).
Na época era presidente da Junta de Paróquia o Bel. Roque Ribeiro d’Abreu Abranches,
sobrinho do Visconde de Midões. Corroborando a apreciação do AC, delibera pedir sub-
sídio à Junta Geral do Distrito para a remoção do cemitério, solicitando a presença de 2
médicos do partido para escolher local apropriado para o novo cemitério. Aproveitando
o momento acrescenta a disponibilidade de seu tio «offerece a dar ou pagar o terreno para
elle e neste suposto mais facil se torna a remoção aludida»(412).

(408)
  AMT – Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fls. 44 e 45v.
(409)
  AMT – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1862-1871, fl. 5
(410)
  ibid.1878-1883, fl. 21
(411)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1883-1893, fls. 37v.-38
(412)
  ibid. fl. 38v.

250
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

A 03/03/1889 a JP aprova as plantas não só do cemitério, mas também da casa da


residência, novo cemitério, muros do adro e respectivos orçamentos, remetendo-os à
CM Tábua para cumprimento das formalidades legais. Na sessão de 7/4 são novamente
presentes, e já aprovados pela CMT, sendo remetidos para aprovação superior.
A 26/05/1891 a JP reúne, extraordinariamente, na presença do pároco da freguesia,
que dias antes enviara um ofício dando conta que «… no cemitério paroquial quase não
havia logar para interramentos pelo que pedia se habilitasse a Junta quanto antes a construir
um novo cemiterio»(413). A situação é analisada, partindo do facto da freguesia ter uma
população superior a 3040 habitantes e um pequeníssimo cemitério, de 31x21 metros,
ocupado na quase totalidade por jazigos, sepulturas e oliveiras. É, também, lamentado o
facto da paróquia não dispor de meios e andar sobrecarregada pela contribuição lançada
para a residência paroquial. A concluir, decide-se oficiar à Junta Geral do Distrito para
obtenção de subsídio e ao Administrador do Concelho para que os médicos do concelho
venham escolher o novo cemitério.
Meses depois, a 01/07/1892 a JP toma conhecimento que os facultativos dos partidos
do concelho, Dr. Fortunato Vieira das Neves e Abílio d’Almeida Simões Costa, haviam
escolhido o terreno apropriado para a construção do novo cemitério «…na propriedade que
Joze da Costa Viegas e sua mulher Thereza de Jezus, teem e possuem no sitio denominado
as – Moitas – no lemite d’esta Villa», acordandose na expropriação amigável de 1500 M2,
pela quantia de 100.000 reis, que logo receberam, «…incluindo-se n’esta expropriação
um penêdo junto ao terreno expropriado», ficando ainda obrigados «…a dar ao longo do
seu predio uma cervidão de 2,5 metros de largura, que do caminho publico dê ingresso
e passagem para o cemiterio»(414).
Passariam mais alguns anos até que novo impulso fosse dado para a construção do
novo cemitério. Na sessão extraordinária de 8/11/1896 os 20 maiores contribuintes da
contribuição predial dão o seu acordo para o empréstimo de 900.000 reis destinados à
construção do cemitério paroquial numa área de 564 M2. Apenas Antonino d’Almeida
Gomes Costa votou contra a decisão, destacando-se os votos positivos do Bel. Roque
Ribeiro d’Abreu Abranches; Visconde do Vinhal, Francisco Correia de Carvalho, Augusto
Cezar da Silva, Francisco Borges Coelho, Joze Augusto Madeira d’Andrade, Manoel Pereira
Martins, Manoel de Moura, João de Moura, Joze da Costa Cifra, Alfredo Joze Stoffel(415).
A 07/02/1898 a JP solicita superiormente que o velho cemitério da freguesia, «quasi
em abandono e sem as condições exigidas pela hygiene publica e legislação respectiva,
fosse declarado incapaz para o serviço d’interramentos», convidando os possuidores de

(413)
  AJM – Livro das Sessões e Deliberações da Junta de Paróquia de Midões, 1883-1893, fl. 72v.
(414)
  ibid. fl. 79v.
(415)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1893-1897, fl. 19v.

251
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

sepulturas particulares a comparecerem no novo cemitério «para se lhes marcar terreno


correspondente»(416).
Ainda no mesmo mês e dada a urgência nas obras, ao Governo a autorização para
empréstimo e à Comissão Distrital a aprovação da derrama projectada de 15% sobre as
contribuições gerais do Estado e seus adicionais. A autorização para o início da obra consta
do Decreto de 25/02/1897 (DG nº 46 de 27/02/1897), lançando-se a derrama referida
no ano civil de 1898.
Em Março, contrata-se o empréstimo com António Augusto Rocha, da Vila do
Mato. Mas só após a implantação da República se pede autorização ao Governo Civil, a
07/04/1912 para «fazer a trasladação das ossadas do cemiterio velho para o novo», tendo
o Administrador do Concelho autorizado por oficio nº 325 de Julho (417). No entanto,
o processo de trasladação motivará acesa polémica entre o pároco Francisco Garcez e a
Comissão Paroquial, a quem acusa de vandalismo, desleixo e abandono de sepulturas,
entre outros factos.
Em sentido inverso, parte do que pertencia ao cemitério antigo era vendido, como
os portões de ferro e a telha, comprados por Agostinho Almas Marques, de Midões, em
Novembro de 1914.
Apesar de recente, depressa o novo cemitério precisou de obras de alargamento, de-
liberando a JFM na sessão de 10/03/1920 expropriar o terreno da D. Urbana Monteiro
Soares de Albergaria, localizados a Norte, com a extensão de 1050 metros, rubricando-se
acordo a 21/04/1921: o terreno foi na totalidade cedido gratuitamente à JF Midões com
a contrapartida de se lhe cedêr no mesmo cemiterio e em volta do seu jazigo de família
um metro de terreno com um pequeno muro, afim de resguardar as terras das parêdes do
seu jazigo»(418). Pela mesma altura, a 18/04, expropriaram-se os terrenos necessários para
abertura da via Largo D. Paz-Cemitério.
A obras do alargamento do cemitério, e a abertura da via de acesso seriam executadas a
partir do ano de 1922 por conta da Junta de Freguesia ficando concluídas nos princípios
de 1929.
Por carta lida na reunião de 30/03/1952, a Casa do Esporão, através do seu
Administrador, António Neves, confirmou «a entrega de seu antigo jazigo à Junta desta
Freguesia para servir de capela do Cemitério»(419). No entanto, esta decisão não seria cum-
prida, na medida em que a 05/01/1955 se deliberou proceder à venda deste jazigo por ser
«pequeno para que fosse adaptado para capela», determinando aplicar o produto da sua
venda na construção de uma capela – o que se fez, vendendo-o a D. Aurora Morgado de
Godinho, residente em Santo Amaro, freguesia de Midões, por 23 contos.

(416)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1897-1902, fl. 4
(417)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1911-1918, pp. 13 e 19
(418)
  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1918-1937, fls. 13,14, 19 e 20
(419)
  AJM – Livro das Actas da Junta de Freguesia de Midões, 1937-1953, fl. 64

252
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

Em Dezembro de 1936, começou a desenhar-se o segundo alargamento do cemitério,


quando a JFM constatou essa necessidade nas suas reuniões. Nos finais de Janeiro do ano
seguinte chegou a estar concluído o levantamento da planta do cemitério(420). Os anos
foram passando e, em Agosto de 1949 a JF pagou ao engenheiro 1000$00 da planta para
o prolongamento, trabalho efectuado durante o mês de Junho.
Impulso decisivo seria o tomado pela Direcçao de Urbanização de Coimbra, que através
de oficío n.º 4355 de 26/9/1955 concedeu 46.000$00 a favor das obras de ampliação(421).
Foi ao longo dos anos alvo de grande atenção por parte da Junta de Freguesia que nele
procedeu a várias beneficiações. Do ponto de vista histórico é de altíssimo interesse pela
mais valia da arte funerária, onde encontramos formas diversificadas de representação
da cosmovisão da vida e morte, segundo determinados contextos históricos, ideológicos,
sociais e económicos (vide fotos 98 e 99).

6. FONTE DA CARICHA
Localizada no Largo Fonte da Caricha. O aspecto actual data de 1872 e foi uma obra
construída a expensas do município de Tábua nos tempos pós-extinção de Midões. Existem
referências nos livros de actas concelhios a esta fonte, que foi intervencionada em Julho
de 1841, Agosto de 1842, Novembro de 1847 e Setembro 1851. Nestes livros surge com
grafia diferente da actual: Charisca (1842), ou Charixa (1847).
Naquele espaço, era costume estender-se roupa como se reconhece na deliberação da
municipalidade midonense a 04/12/1850, dando razão às queixas de vários habitantes da
Vila contra Francisco da Cruz, do mesmo lugar que «…tinha tapado um olival em que as
lavadeiras desta Villa customavão estender roupa e miadas». A decisão confirma que a «Villa
de Midões estava no gozo da servidão de estenderem a roupa e miadas no dito olival»(422).
Em meados de 1996 foi reparada e restaurada, bem como os tanques envolventes.
A fonte é constituída por um espaldar pétreo, ladeado por duas pilastras, guarnecido
com duas bicas emolduradas que descarregam a água para um tanque rectangular (vide
foto 100). O espaldar está decorado cm um desenho vegetalista, com sugestão de argolas
metálicas, enquadrando a inscrição que data a edificação: «OBRA MUNICIPAL DE
1872». A decoração do espaldar completa-se com uma moldura ressaltada, orlada por
enrolamentos ritmados por aletas que assentam nos capitéis das pilastras que culminam
no frontão curvo que serve de sustento a um fogaréu.

(420)
  AJM – Livro das Actas da Junta de Freguesia de Midões, 1937-1953, fls. 92-93v.
(421)
  AJM - Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1953-1960
(422)
  AJM - Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1878-1883, fl. 60v.

253
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

No lado esquerdo da fonte, temos um tanque com água que liga a estrutura a um
muro de sustentação de terras, completando-se a ligação com um muro construído sobre
o tanque, decorado por um painel polícromo de azulejos com dimensões de 3x5, com a
legenda a azul «FONTE DA CARICHA», com orlas decoradas por motivos vegetalistas
azuis e amarelos.
No lado direito da fonte, situam-se dois tanques acessíveis através de escadas e fossos
que contornam os limites dos mesmos que possuem estruturas apropriadas para lavagem
de roupa. Um gradeamento verde, de metal, delimita o conjunto protegendo o espaço
da fonte e dos tanques.

7. FONTE DE VALVERDE (MIDÕES)


A fonte e jardim que hoje aformoseiam o centro de Midões, na antiquíssima zona de
Valverde, resultam das preocupações urbanísticas de um conjunto de habitantes midonen-
ses interessados no desenvolvimento da sua terra. Por carta enviada à JFM, a 07/11/1919
(vide foto 101), que circulou entre a população, continental e ultramarina, para angariar
adeptos e financiamento calculado em 4.000$00, fizeram constar «a necessidade de fazer
desaparecer do centro desta villa, um grande trato de terreno, compreendido em a Rua
Nova e a estrada municipal desta villa ao Coito»(423) (vide foto 102).
Foram principais signatários daquele pedido: Fernando Augusto da Silva (a quem se de-
via enviar a correspondência e subscrições por ser correspondente do Banco Ultramarino),
Luiz Carlos de Melo Flores, João Augusto de Figueiredo Sampaio e Melo, Henrique
d’Almeida, José Antonio Almeida, Amandio Rocha, Eduardo Pereira Soares e Arnaldo
Vieira das Neves, membros de uma comissão mais alargada.
Convictos daquela necessidade colocam à disposição da JFM verbas para expropriações,
incluindo despesas com advogados ou solicitadores para realizarem o que caracterizam de
relevante «melhoramento parochial». Estando concluído o melhoramento era sua inten-
ção erguerem um monumento no centro da praça homenageando todos os subscritores.
A JFM dá grande relevo ao assunto e associa-se ao desejo da população. Assim e nos
termos do nº 8 do art.º 2.º da Lei de 25/7/1912 votou por unanimidade a «…conveniencia
e como tal expropriada para utilidade publica os referidos terrenos compreendidos entre
as referidas ruas, para a construcção d’um jardim melhoramento este, de que esta villa
muito carece»(424).
Com as obras da fonte concluídas, nos princípios de Janeiro de 1937 iniciou-se a
arborização do espaço e, em inícios de 1941, o calcetamento, para o que concorreram

  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1918-1937, fls. 10-10v.
(423)

  ibid.
(424)

254
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

significativos donativos, entregues ao Dr. Henrique de Almeida, em Midões, e Francisco


Augusto C. Marques, morador em Lisboa: Dr. José Fernandes (200$00), Dr. João Teixeira
Direito (50$00), José Magalhães Varandas (100$00), João Duarte Veiga (500$00), numa
soma de 850$00, esperando-se donativos de Áfricas e Américas(425).
Uma obra muitíssimo necessária na medida em que escasseavam as alternativas de abas-
tecimento: «o chafariz da Caricha, além de servir quase quási exclusivamente o bairro do
mesmo nome, está, infelizmente condenado a não poder utilisar-se todo o ano, em virtude
de, nos últimos tempos, sofrer frequentissimas infiltrações que tornam a água imprópria
para o consumo»(426), enquanto que a «velha fonte do Adro» se encontrava a «conta gotas».
A 29/02/1996 a JF promoveu intervenção no Chafariz do Largo Valverde. Dado o
estado de degradação do painel de azulejos existentes, encomendou-se novo painel, consti-
tuído por 15 azulejos, respeitando os motivos existentes, pintados pela Senhora D.ª Odete
Maria Melo da Costa Pereira, residente na Urbanização do Coito(427).
O chafariz apresenta espaldar de contornos curvilíneos e um tanque rectangular, guar-
necido com travessa de metal, delimitado por dois blocos de pedra, colocados na vertical e
inseridos no espaldar da fonte, e encimado por um painel de azulejos azuis de figura avulsa
com temática zoomórfica, paisagística e campestre, assinado por «Ocosta» (vide foto 103).
Sobre o painel de azulejos um lintel rectilíneo é interrompido por dois elementos
circulares que conteriam as bicas, sustentando dois arcos de volta perfeita, preenchidos
por gradeamento metálico, decorados, cada um, com uma aduela ressaltada.
A fonte culmina com uma estrutura piramidal que suporta um candeeiro para a
iluminação do espaço contíguo ao fontenário. A fonte é guarnecida com duas estruturas
simétricas, semelhantes a dois bancos, integradas diagonalmente.

(425)
  «Abastecimento de água à Vila de Midões» In A Comarca de Arganil, Ano XXXVII. nº 2310, 01/01/1937, p. 2
(426)
  ibid. p. 2
(427)
  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1988-1999, fl. 68 e 73

255
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

CARTA DIRIGIDA À POPULAÇÃO DE MIDÕES PARA O AFORMOSEAMENTO DO


JARDIM DE VALE VERDE, 07/11/1919

«Ex.mo Sr. Presado Conterranio


O nosso velho e lindo Midões com os seus antigos e novos palacios, e outras vistosas
construções modernas, está reclamando um melhoramento importante que, realçando
extraordinariamente a sua estética, depende apenas de uma pouca de boa vontade dos
seus filhos naturaes e adoptivos, e lhe dará primacia sobre todas as terras da região.
Entrando na villa, ao chegar a Valle Verde onde entroncam as tres estradas que
actualmente a servem, toda a belesa do local desaparece com o tosco muro em que se
esbarra, e que resguarda um quintalão a que só faltam os respectivos ciprestes para ser
tomado como um cemiterio.
Ora, se esse embirrento quintalão desaparecer, com as velhas casas a que se encosta,
restará em seu lugar uma ampla e formosa praça, ladeada por magnificas construções,
que completará a impressão sentida na Caricha com o seu chafariz e as suas construções
modernas, verdadeiros palacios; na Praça, com o vestuto e grandioso palácio senhorial
que lá se levanta e a que se segue a nobre casa dos Monteiros Soares d’Albergaria; o
Ribeirinho com essa vasta e moderna habitação que abrange uma quinta parte da
villa; na entrada do Loirinho ela alinhada e desafogada rua que ahu vae fincar; e no
Senhor dos Passos onde o forasteiro depara logo com a monumental egreja paroquial
e o formoso palacio dos velhos Viscondes; isto além de muitas outras construções mais
modestas, mas tambem vistosas; dando assim ao mesmo forasteiro, ao chegar á futura
praça; e impressionado pela sua vastidão e beleza, a idéa de que se encontra em uma
pequena cidade provinciana.
Portanto os abaixo assignados, enthusiasmados com esta real e brilhante prespecti-
va, constituídos em comissão, apelam para o amor patrio de todos os filhos de Midões,
naturaes e adoptivos, e dos proprietarios na freguezia (pois escusado é contar com os
poderes públicos) para que os ajudem a levar a efeito este enorme melhoramento da sua
terra, contribuindo para que os ajudem a levar a efeito este enorme melhoramento da
sua terra, contribuindo monetariamente para elle.
São precisos, pelo menos, quatro mil escudos. É uma quantia relativamente grande,
mas maior é, certamente, o amor dos midonenses pela terra que os viu nascer ou adop-
taram, alguns com grandes fortunas; e, todos unidos no mesmo sentimento, cada um
na proporção dos seus poderes, facilmente e sem maior sacrifício a cubrirão.

A Comissão, pois, certa do patriotismo de V. Ex.ª, vem pedir-lhe a sua generosa


contribuição para tal fim e rogar-lhe se digne comunicar-lhe com o mínimo de demora
com quanto subscreva para poder realisar rapidamente a missão que se impõe»

256
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

A COMISSÃO
Alvaro Amaro d’Oliveira
Amandio Reis da Rocha
Anibal Augusto da Fonseca Magalhaes Coelho
Arnaldo Vieira das Neves
Antonio d’Almeida
Antonio Duarte d’Almeida Veiga
Antonio Fernandes Coelho
Diogo d’Almeida Loureiro Castello Branco
Eduardo Pereira Soares
Eugenio Amaro
Fernando Augusto da Silva
Francisco Augusto da Costa Marques
Henrique d’Almeida
João Augusto de Figueiredo Sampaio e Mello
José Soares Coelho
Luiz Carlos Manuel de Mello Flores

[In Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1918-1937, fls. 10-10v.]

8. SEDE DA JUNTA DE FREGUESIA


É difícil identificar os espaços em que funcionou a sede da Junta de Freguesia de
Midões na primeira metade do séc. XX. Contudo, neste ano, e na sessão extraordinária do
dia 09/08/1953, deliberou-se conceder poderes ao Presidente da Junta para tratar com a
Câmara Municipal do arrendamento da casa da antiga escola desta vila para nela instalar
a sua sede, levando em linha de conta as beneficiações e o «estado de abandono em que
se encontra a referida casa»(428).
Entre meados de 1957 e princípios de 1958 decorreram obras de reparação e con-
servação, que vieram permitir não só o funcionamento da própria junta, mas também o
arrendamento da parte não necessária a esse fim.
Com a transferência da sede da junta para o Edificio do Centro de Convívio, nos anos
80, parte do rés do chão do edifício antigo da junta foi arrendado para nele se instalar
«..um consultório médico, ao Senhor Doutor Francisco Fernandes da Costa, que exerceu
a sua actividade durante alguns meses no Posto Médico dos Serviços Médico-Sociais e que

  AJM - Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1953-1960
(428)

257
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

aquando da sua saída o povo desta freguesia fez recolha de algumas centenas de assinaturas
para que o referido clinico não deixasse de prestar serviço nesta Freguesia»(429).
Em Abril de 1985 outra parte do rés do chão do imóvel seria cedido ao Rancho
Folclórico da Casa do Povo de Midões, onde havia funcionado a escola de adultos, para
arrumação dos instrumentos musicais e ainda para «servir de gabinete de direcção do
rancho»(430). Esta dependência regressou à posse da JF em Fevereiro de 1995(431).
No âmbito da Presidência Aberta de Mário Soares, a sede da junta seria visitada a
04/07/1990, onde «foi aguardado por várias individualidades e muito povo em Midões»(432).
Em meados de 1995 a sede da JFM foi intervencionada com pequenas obras de be-
neficiação. Em 1999 o antigo edifício da Junta de Freguesia, sito na Praça do Pelourinho,
foi cedido para Centro de Dia.
Por acordo com a Fábrica de Igreja de Midões e CTT, a Junta de Freguesia passou a
funcionar, desde 2011, no imóvel em que se encontra, sito no Largo D. Paz.

9. CORETO
Situado no Outeiro de S. Miguel junto da capela dedicada ao arcanjo. De planta
octogonal, guarnecido por gradeamento metálico, ao qual se acede através de pequena
escada (vide foto 104) . Duas placas no gradeamento voltado a Nascente datam o coreto
de 1905: uma assinalando a oferta de J.A. d’Almeida e a outra os promotores da festa
desse ano, F. A. da Silva e A. A. d’Oliveira.

C. PATRIMÓNIO PARTICULAR
Midões foi importantíssima e antiquíssima Vila da Província da Beira, onde prospe-
raram várias famílias que nela fizeram erguer as suas casas senhoriais, durante a época
Moderna, símbolos de fidalguia e de poder. A Vila de Midões foi até à extinção concelhia
oitocentista o habitat de famílias nobres que ali tinham o seu solar, como na actualidade
se atesta pelo património edificado, com edifícios apalaçados ou solares e mansões, onde
o granito típico da região é elemento fundamental.

(429)
  AJM – Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1978-1983, fl. 47v.
(430)
  AJM – Livro de Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1983-1987, fl. 23v.
(431)
  AJM – Livro de Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1988-1999, fl. 52v.
(432)
  «O Presidente da República na nossa região» In A Comarca de Arganil, Ano XC, N.º 9548, 05/07/1990,
Quinta Feira, p. 5

258
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

1. CASA DOS SOUSAS MACHADOS OU CASA DO CORONEL


Situada na Praça do Pelourinho, próximo da antiga casa da câmara do extinto concelho.
Solar dos Machados Albuquerques e hoje da família do Visconde do Ervedal. O nome de
Casa do Coronel fundamenta-se na larga estadia do 1.º filho do matrimónio, Sebastião
d’Albuquerque Pinto Tavares Freire Castello Branco, fidalgo da Casa Real, coronel do
regimento de milicias de Arganil(433).
Um dos mais antigos elementos conhecidos da família dos Machados, de Midões é
Gaspar Machado, nascido em 1510, escrivão do judicial em Midões, que casou com Joana
Ferrolha e viveram na Vila.
Um dos descendentes desta famílisa seria Domingos Machado o moço, neto de Manuel
Lopes de Sousa, Fidalgo da Casa de Sua Magestade, baptizado em Midões, a 21/10/1630,
que casou a 08/11/1666 com Ana Fernandes, de Anseriz. Um dos filhos foi o Reverendo
Domingos Machado de Sousa, baptizado a 10/05/1671, formado em Cânones em 1698
e ordenado em 1702, Juiz Apostólico e advogado da Casa da Suplicação, que instituiu
um importante vínculo na Vila de Midões.
No referido vínculo suecedeu seu sobrinho Narciso de Sousa Machado, Bbaptizado
a 29/10/1699, familiar do Santo Ofício por carta de 31/10/1737. faleceu a 05/01/1777.
Casou em Travanca de Lagos a 23/05/1757 com Maria Bernarda Freire da Costa Brandão
que também usou o nome de Maria Bernarda Cardoso Freire de Andrade e Abranches, e
faleceu no Solar dos Machados a 05/01/1777(434).
O edifício é uma construção de finais do séc. XVII, e terá sido ampliado e modificado
no século seguinte(435) por acção de Narciso de Sousa Machado. Imóvel de planta rectan-
gular, frontispício com cunhais pétreos e pilastras a marcar os alçados (vide foto 105).
Estes elementos suportam arquitrave e cornija saliente, sendo sublinhados por pináculos
colocados ao nível do telhado.
A fachada principal apresenta vãos do piso térreo com verga rectilínea, à excepção
da porta de acesso, colocada na extremidade oposta à da capela e da porta da entrada
principal. Os vãos do piso superior possuem verga curva, exceptuando as aberturas da
parede lateral da capela.
O portal principal contém pilastras com moldura e lintel polilobado, suportando uma
estrutura, com lintel e cornija, que sustenta dois enrolamentos a enquadrar o brasão. O
elemento heráldico compõe-se pelo escudo esquartelado decorado com cinco estrelas de
seis pontas, com cinco arruelas e um leão. O escudo está envolvido por folhas de acanto
e encimado por elmo enquadrado por concheados e enrolamentos à volta da figura mi-
tológica que coroa o conjunto.

(433)
  SARAIVA, 1986, p. 27
(434)
  GONÇALVES, 2006, Vol. II, pp. 322-323
(435)
  CORREIA & GONÇALVES, 1952, p. 240

259
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Nas extremidades laterais do imóvel dois corpos prolongam-se em relação à estrutura


transversal, os quais são denunciados na fachada principal pelos cunhais, pilastras e por
um frontão aberto. A fachada harmoniza-se com a restante frontaria do solar e exibe portal
rectilíneo, composto por pilastras com moldura, friso decorado com caneluras e cornija.
O portal completa-se com dois pináculos, colocados sobre plintos, enquadrando o fron-
tão curvo interrompido por uma cruz com peanha, que suporta dois modilhões longos
que sustentam a cantaria inferior do janelão, o qual apresenta gradeamento, jambas com
molduras e lintel polilobado. O tímpano apresenta enrolamentos a emoldurar um nicho
que outrora albergou uma escultura.
A fachada posterior do solar apresenta uma longa varanda com cobertura suportada
por pequenas colunas assentes sobre plintos unidos por gradeamento metálico.
A capela existente no Solar dos Machados é dedicada a Nosso Senhor Jesus da Vitória
e resulta da vontade do já rferido Domingos Machado de Sousa. A 18/05/1751 e estando
o templo concluído apresentou petição para nela se dizer missa quotidiana, dotando-a
«com a sua congrua e obrigação de todos os seus bens»(436). O instrumento de instituição
da capela data de 21/03/1750, o instituidor designou como administrador da mesma o
sobrinho Narciso de Sousa Machado. A licença autorizando a celebração de missa data
de Maio de 1751.
O seu interior apresenta um retábulo de madeira dourada datável do 3º quartel do
século XVII, que parece ter sido adaptado àquele local, pelas marcas de amputações nal-
gumas partes e acrescentos noutras. Exibe escudete da Ordem do Monte Carmelo e um
baixo-relevo com a representação de São Francisco. A capela integra, do séc. XVII, três
esculturas, representando: São Bento, São Bernardo e Santa Escolástica. Já a escultura de
São Domingos, de molde popular, parece obra da centúria seguinte.
Nesta capela foi fundada a 26/03/1936 a Conferência de S. Vicente de Paulo, na
presença do pároco da freguesia José Lourenço de Matos, e que aprovou a sua cons-
tituição: D. Alice Goito de Pina (Presidente), Cristina de Carvalho Vieira das Neves
(Vice-Presidente), Eugenia Abranches d’Almeida (Tesoureira), Maria da Conceição de
Albuquerque (Secretária), Anunciação da Cunha Marques, Alice de Magalhães, Armanda
Soares d’Albergaria(437).
Deste templo saía a procissão do Corpo de Deus até à igreja.

  AUC – Cabido, Instituições Pias, Cx. XIII, Doc. 2


(436)

  ACPT - Livro de actas da Conferência de S. Vicente de Paulo, 1936-1937


(437)

260
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

2. CASA DOS SOARES D’ALBERGARIA OU CASA DO CAPITÃO-MOR


Localizada na Rua do Passadiço. Esta casa terá sido o berço de um dos ramos da famí-
lia Soares d’Albergaria, de Midões. A fachada principal ostenta elementos setecentistas,
como a varanda de dois andares, apoiadas em base rectangular elevada e uma escadaria
que culmina na extremidade inferior em motivo ornado de volutas.
Tanto a escadaria como a varanda datarão do século XVIII, albergando o solar no seu
interior uma capela. A fachada lateral esquerda exibe o escudo de armas da família que
para alguns não está rigorosamente bem representado: enquadrado por molduras, apre-
sentando no fundo com cantos recortados, um escudo, com cruz latina de extremidades
trilobadas, encimado por um elmo que sustenta o dragão.
Duas conchas colocadas lateralmente unem os elementos vegetalistas e florais, seguros
por enrolamentos na extremidade superior, assentando na zona do fundo, em motivos
curvilíneos a enquadrar uma flor.
A fachada posterior da casa inclui um logradouro ajardinado, colmatando-se o desnível
do terreno com escadaria de um lanço. O alçado é marcado por dois andares de varandas
a todo o comprimento: no nível inferior com colunas e pilares assentes em bases altas;
e, no nivel, superior, apenas com pilares. Em ambos um gradeamento metalico verde
articula os tramos.

3. CASA DO RIBEIRINHO
Localizada na Rua do Ribeirinho. Pertença da família dos Abreus Abranches o amplo
imóvel foi edificado no séc. XVIII, sofrendo várias intervenções ao longo do tempo. De plan-
ta rectangular, integra uma capela, separada da estrutura principal. Foi o solar dos Ribeiros
Abranches Castello Branco, uma das mais antigas famílias de Midões (vide foto 106).
Edifício de dois pisos, com vãos de verga recta dispostos pelas fachadas. O frontispício
apresenta, alinhado ao centro, um alpendre, sustentado por duas colunas de pedra, servido
por uma pequena escadaria que dá acesso ao segundo piso.
A fachada lateral direita integra uma porta no piso inferior e uma janela de sacada
do piso superior, com varandim metálico. A cornija ressaltada de pedra, do séc. XVIII,
culmina as paredes. Os telhados foram intervencionados na década de 80 do séc. XX.
A capela da casa está separada da mesma (vide foto 107). A 12/10/1767 Roque Ribeiro
de Abreu, da Vila de Midões, apresentou requerimento ao Bispado de Coimbra para
erigir uma capela junto às casas que havia concluído de novo, com a invocação de Nossa
Senhora do Rosário(438). Na petição dirigida à Câmara Eclesiástica, e que faz parte do

  AUC – Cabido, Instituições Pias, Cx. XIII, Doc. 4


(438)

261
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

referido processo, alega os motivos da sua decisão, nomeadamente, para a «…sua familia
poder ouvir missa, e ter nella os exercicios espirituais segundo o seu expirito, e devoção».
A capela foi intervencionada na zona superior em Oitocentos. Tem como orago Nossa
Senhora do Rosário e serviu, segundo algumas fontes, de Igreja Paroquial de Midões após
a implantação da República(439). O templo apresenta cunhais de pedra e fachadas anterior
e posterior com alçados cegos e empenas triangulares delimitadas pelo entablamento.
Os frontões são encimados por uma cruz com pedestal e, nas extremidades, são rematados
por vasos com decoração flamejante.
A entrada, na zona lateral, possui porta de verga recta, de jambas ornadas com moti-
vos vegetalistas, encimada por frontão curvo que enquadra um ornato fitomórfico. Um
nicho, actualmente sem escultura, enquadrado por duas pilastras, encima o frontão. O
entablamento e o telhado elevam-se para assinalar e realçar o portal, sendo encimados por
uma cruz, sobre pedestal, ladeada por dois vasos com decoração flamejante. Uma entrada
obra de um artíficie de categoria.
A capela foi aumentada, através da construção de um corpo de menor largura, por
vãos de verga recta. O edifício alberga, no seu interior, talhas e azulejos do século XVIII.

4. CASA DE JOÃO DUARTE D’ALMEIDA (HOJE DE LINO VEIGA)


Localizada na confluência do Largo de Valverde, Rua Cónego Garcês e Rua Nova
(vide foto 125A).
Imóvel de planta rectangular, situado próximo da fonte, junto da antiga casa do Juiz. O
seu frontispício mostra pilastras pétreas nos cunhais e aparelho lítico na extremidade inferior.
O piso térreo possui duas janelas de guilhotina, com jambas, lintéis e peitoris de pedra
com verga rectilínea. Aquelas janelas enquadram a porta principal, de verga, com fecho
ressaltado, fazendo-se acesso através de pequena escadaria.
O piso superior apresenta quatro janelas, com morfologia idêntica às do piso inferior,
e uma janela de sacada, alinhada com a porta principal, com varandim sustentado por
mísula, enriquecido com gradeamento metálico, constituído por motivos geométricos e
fitomórficos e encimado por duas pinhas.
A fachada lateral direita é estética e morfologicamente semelhante à fachada principal:
a porta possui verga curva e não tem escadaria de acesso, a fachada apresenta duas janelas
no piso superior.
Os vãos são preenchidos por elementos de madeira branca, contornados com denti-
culados verde, com excepção das portas, também verdes e de madeira, nas fachadas. O
edificio suporta um telhado de quatro águas, com beirado sobre a cornija de pedra.

  SARAIVA, 1986, p. 48
(439)

262
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

5. VILA BERTILDE
De acordo com a placa afixada na fachada «VILLA/BERTILDE/1930» foi neste ano que
a casa se edificou, inspirando-se nos chalés suíços de finais do séc. XIX, princípios do séc. XX.
Um muro guarnecido por gradeamento delimita a casa e respectivo logradouro da
habitação. O frontispício apresenta, no piso térreo, três portas de verga rectilínea, quatro
de verga curva (duas das quais de sacada), separadas por um mainel rectilíneo e servidas
por um varandim guarnecido com gradeamento metálico pintado de verde. Na empena
existe uma janela de sacada, com pequena varanda.
O acesso faz-se por escada, com corrimão metálico verde, que inicia em dois lanços
bifurcados colocados transversalmente ao outro lanço.
O imóvel apresenta telhados de duas águas, onde se rasgam trapeiras com beirado. A
casa, de dois pisos, mostra a extremidade inferior marcada por cunhais pétreos e janelas
de verga rectilínea.

6. PALÁCIO DE VALVERDE
A designação deste imóvel advém da sua localização no centro de Midões, no sítio
denominado de Valverde junto à Rua do Ribeirinho (vide foto 108). Como consta da
inscrição afixada na porta, a casa datará de 1907. Apresenta planta rectangular e o seu
perímetro é demarcado por muro pétreo, guarnecido por gradeamento metálico, unido
por pequenos pilares de pedra, que suportam ornatos piramidais com entradas assinaladas
por altos pilares rectilíneos, encimados por vasos na fachada principal e na lateral esquerda.
A fachada principal compõe-se, no piso térreo, por janelas de verga recta e a porta
de entrada principal, onde além da placa granítica que assinala o ano de construção se
encontra, também, a legenda «VALVERDE». A janela de sacada e a porta principal estão
enquadradas por duas pilastras de capitel jónico.
O piso superior contém mais quatro janelas de sacada, partilhando a mesma varanda,
sustentada por mísulas, e ladeiam pilastras que se desenham do chão até ao entablamento.
Nas extremidades a fachada é ainda rematada por mais um par de janelas e todos os vãos do
piso superior integram cantarias rectilíneas e são encimados por frontões de desenho curvo.
Na fachada lateral esquerda os vãos do piso inferior apresentam verga recta, à excep-
ção da porta principal, com verga curva. As janelas do piso superior possuem cantarias
rectilíneas, encimadas por frontões curvos. Os referidos vãos do piso superior incluem
varanda e quatro delas estão agrupadas aos pares. As restantes janelas estão colocadas nas
extremidades e ostentam, no avental, ornato circular decorado com motivo floral.
Os vãos do imóvel dispoem-se de forma simétrica e alinham-se entre os pisos. A ex-
tremidade superior apresenta arquitrave, friso, enriquecido com argolas metálicas, ambos
desprovidos de decoração, e uma cornija ressaltada. O telhado, de quatro águas, é decorado
na cumeeira com dois pináculos cerâmicos.

263
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

7. PALÁCIO DAS QUATRO ESTAÇÕES


Localizado no Largo D. Paz, fronteiro à Igreja Matriz. Construção do séc. XIX recebe
a designação das quatro esculturas alegóricas que rematam a fachada principal, e referen-
tes às estações do ano: Inverno, Primavera, Verão e Outono (vide fotos 109, 110 e 111).
O palácio é constituído por vários corpos articulados, dos quais se destaca o quadran-
gular, em que se apuseram as referidas alegorias, e um torreão na extremidade nascente.
O acesso ao imóvel faz-se através de um portão metálico vermelho, ladeado por pilares
encimados por vasos.
O corpo principal define os dois pisos, explicitados pelos níveis dos vãos, separados
por friso pétreo. A fachada principal contém 6 vãos de verga curva, três no piso inferior e
três no piso superior, guarnecidos com gradeamento no piso térreo, alinhando-se a porta
principal com a janela de sacada, enriquecida com varanda de gradeamento metálico,
enquadrada por duas pilastras jónicas.
A janela de sacada é encimada pelo escudo de armas, de moldura semicircular. O escu-
do, de moldura circular, é envolto por elementos vegetalistas e encimado por coroa ducal.
Como símbolos heráldicos destacam-se: cinco elementos florais, um leão, duas águias,
separadas por lista, e cinco asas. O entablamento do edificio possui argolas metálicas e,
nas extremidades, duas goteiras decoradas com carrancas.
A fachada lateral esquerda constitui-se por vão rectos, no piso inferior, e curvos no
superior, um dos quais de sacada. Possui, tal como na fachada lateral oposta, empena
curva, com vão correspondente ao corpo com cobertura que separa os dois terraços. Na
fachada oposta, de alçado cego, constitui-se por corpo adossado, unindo ao mencionado
torreão, com seis janelas de verga curva, três em cada piso.
O torreão apresenta três pisos, cunhais revestidos de pedra, ameias e merlões, vãos de
verga curva, recta e apontada no último piso. Existe ainda um corpo adossado ao torreão,
de linhas simples e despojadas. Anexo ao palácio detecta-se um edificio de cunhais mar-
cados com pilastras, cornija ressaltada, vãos rectos e circulares, telhados de quatro águas
e chaminé.
O interior do palácio encontra-se muito degradado, observando-se em mau estado de
conservação, o revestimento de troços de paredes e de tectos, em madeira, gessos decorativos
e parte dos frescos de temática vegetalista, ao gosto do eclectismo Oitocentista português.

264
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

8. SOLAR DO ESPORÃO
Solar localizado na povoção do Esporão foi mandado construir pelo Dr. Agostinho
Borges de Figueiredo e Castro, advogado e primeiro Visconde do Vinhal, de quem se diz
terem pertencido 80% das propriedades rústicas de Touriz(440).
A sua sobrinha, D. Ana da Cunha Freire de Magalhães casou com o médico e profes-
sor da Universidade de Coimbra, Dr. Basílio Freire, natural de Travanca de Lagos. Deste
casamento, nasceu Maria da Glória Ana Cunha de Magalhães Freire Caeiro da Matta que
se consorciou com o professor da Faculdade de Direito de Coimbra e Lisboa, ministro e
diplomata, Dr. José Caeiro da Matta, natural do Vimieiro, Estremoz, pai do Eng.º Basílio
Freire Caeiro da Matta, a quem mais tarde se atribuiu o título de Segundo Visconde de
Vinhal e que se casou com D. Margarita Gonzalez Fierro, natural da cidade asturiana de
Gijon, filha de Ildefonso Gonzalez Fierro e de Florentina Vino Campa, de cujo consórcio
não houve filhos(441).
É em torno desta família que se desenha a História do Solar do Esporão, alindado e
ampliado pelo Dr. José Caeiro da Mata, que dela fez segunda residência e espaço privile-
giado de veraneio, embora a administração, no princípio do século, estivesse a cargo de
duas irmãs, tias da esposa de Caeiro da Matta: D. Maria Joé e D. Maria Teresa, coadjuvadas
pelo Sr. António da Costa Balocas, feitor de vastas propriedades, residente na Casa dos
Ferreiros, possuidor de procuração para representar os proprietários e que foi possuidor
do primeiro veículo movido a gasolina em Touriz – um side car (442).
Ostenta sobre o portão de entrada o brasão com aspa acantonada de quatro flores de lis,
tendo um leão por timbre e paquife que foi transferido da Casa dos Ferreiros, em Touriz(443).
Possui um arco pétreo, com portão metálico verde, encimado por dois elementos pi-
ramidais, colocados nas orlas, e por espaldar, emoldurado por enrolamentos e rematado
por frontão triangular, que revela o brasão da Casa dos Ferreiros.
O portão dá acesso a um jardim que acolhe esculturas e ao solar de paredes amarelas
(vide foto 112). É um imóvel de dois pisos, constituído por cunhais, cornija de pedra,
vãos de verga recta e curva, e diversas escadas adossadas às paredes, algumas realçadas com
pequenos alpendres.
Possui painéis azulejares, entre os quais uma figura de convite, colocados em vários
locais, citando monumentos portugueses como o Palácio-Convento de Mafra e o Aqueduto
das Àguas Livres(444).

(440)
  MONTEIRO, 2007, p. 145
(441)
  ibid. p. 146
(442)
  ibid. pp. 149 e 219
(443)
  CORREIA & GONÇALVES, 1952, pp. 240-241
(444)
  DUARTE, 2009, p. 517

265
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Na fachada principal salienta-se a capela, com portal, colunas compósitas, encimado


por janelão de sacada, empena curvilínea, emoldurada por frontão curvo interrompido e
sobrepujada por cruz pétrea. Também se realça um corpo rectilíneo, avançado, com vãos
nos dois pisos, ostentando um portal encimado por janelão de sacada, balcão metálico de
verga curva guarnecida com frontão triangular curvo – elementos enquadrados por duas
pilastras da ordem colossal, elevando-se a cimalha para formar um frontão triangular.
A fachada é ainda marcada por pilastras e vãos rasgados nos panos da parede.
Na área envolvente da casa encontra-se um grande muro de tratamento cenográfico, no
qual, enquadrado por pilastras e aletas e sobre uma abertura gradeada, se ostenta o escudo
dos Viscondes do Vinhal. É visível junto à estrada de acesso ao Esporão (vide foto 113).
Na noite de 20 para 21 de Novembro de 1937 foi o solar bastante afectado por vio-
lento incêndio, que poupou a capela. Na altura, suspeitou-se de mão criminosa(445). O
último titular da Casa do Esporão foi o Eng.º Basílio Freire Caeiro da Mata, que não
deixou geração. Após a sua morte a casa foi vendida por colaterais. Da casa se tem uma
deslumbrante panorâmica sobre o vale do Rio de Cavalos, S. Geraldo, Covas e Candosa.

9. CASA DE JOÃO BRANDÃO (CASAL DA SENHORA)


Casa de família da conhecida figura de Midões, que se localiza próximo da capela de
Nossa Senhora do Campo e do cruzeiro datado do séc. XVIII, no Largo João Brandão.
O imóvel compreende dois pisos, possui aparelho isódomo, vãos de verga curva, uma
escadaria de dois lanços, com corrimãos metálicos e telhado de quatro águas (vide foto
114 e 115). A casa já não está na posse dos descendentes de João Brandão, mas os seus
habitantes, tal como a população do lugar, mantiveram a denominação, num esforço de
manter viva a memória, como atestam as duas placas metálicas, com legendas, colocadas
na parede voltada para a capela, recordando a sua figura mais conhecida:
«NESTA CASA NASCEU EM / 01 DE MARÇO DE 1825 / JOÃO BRANDÃO
/ A LIBERDADE É O MAIOR / E O MELHOR BEM DO MUNDO /1825-1880»,
afixada e paga pela Junta de Freguesia nos finais de 1996.
A / JOÃO VICTOR DA SILVA BRANDÃO / HOMENAGEM DOS CASALENSES
/ 1 DE MARÇO DE 2000».
Na capela da moradia se conservavam imagens de grande valor, atribuídas ao escultor do
séc. XVII, Manuel Pereira, autor do célebre S. Bruno da Cartuxa, de Miraflores, Burgos(446).

  «Um pavoroso incendio» In A Comarca de Arganil, Ano XXXVII, n.º 2400, 23/11/1937, p. 1
(445)

  «Midões» In Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. XVII, Editorial Ld.ª, Lisboa-Rio de Janeiro,
(446)

p. 187

266
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

10. CAPELA DE NOSSA SENHORA DAS DORES


Situa-se no local onde se realiza a feira de Midões, conhecido por Largo da Feira (vide
foto 116). A sua construção resultou da promessa feita por Caetano Machado Simões,
morador na Freguesia de Midões, que a 07/06/1730 apresentou requerimento ao Bispado
para construção de uma capela sob invocação da «Senhora das Sette Dores»(447), entre a Vila
de Midões e o Casal de Nossa Senhora do Campo da mesma freguesia. Um local escolhido
com ponderação e que então possuía uma designação diferente da actual:
«…junto da estrada publica em o sittio e lugar aonde se chama a cabrita destricto
da mesma freg.ª cujo sitio e lugar he m.to capas p.ª a erreçção da mesma capelinha em
q´concorrem todos os requizitos por razão de estar no cam.º da Via Sacra da đ.ª V.ª E
por elle passar todos os sabados da quaresma procissão com ladainha p.ª a Nossa Snar.ª
do Campo da đª freg.ª e ser o đº sittio e lugar m.to emxutto e m.to assente com boa e
admiravel v.ta p.ª todas as p.tes».
Pelo referido processo verifica-se que as autoridades eclesiásticas ficaram receptivas
com a ideia. Contudo, o suplicante vem a falecer, sem fazer a escritura de hipoteca. Os
seus herdeiros, o Reverendo Manuel Machado Pinto e seus irmãos, remetem petição para
que se dê cumprimento à disposição, juntando a escritura de dote, em documento datado
de 12/02/1749. Após apresentação de nova escritura de dote, datada de 01/03/1749 e
ouvidas as testemunhas, conclui-se que as propriedades rendem anualmente 13.500 reis,
deductis expensis, sendo duas foreiras ao Mosteiro de Lorvão, com rendimento anual de
8.000 reis, que a 30/03/1749 responde pela sua abadessa não consentir que «se metão em
vincolo de capella por não ser conveniente»
Demorou algum tempo até que se reunissem todas as autorizações necessárias. De
facto, só a 09/01/1756 a capela seria definitivamente vistoriada, da qual resultou a licença
para benzer a capela em Junho de 1756.
O templo é uma pequena construção, com boas cantarias, constituída por frontispicio
com exremidade inferior, pintada de cinzento, com pilastras pétreas nos cunhais, duas
janelas de fresta larga e porta de verga recta, encimada por cruz, ladeada por dois elementos
piramidais colocados sobre pedestais.
Exceptuando a parede lateral esquerda, que contém um vão, as restantes paredes, pin-
tadas de branco, possuem alçados cegos. O entablamento delimita o frontão triangular
e o telhado de duas águas, com beirado saliente, repete os elementos sobre o portal: cruz
central ladeada por elementos piramidais.
O interior é de nave única e pavimento de pedra. Alberga um retábulo polícromo,
com mesa de altar, do séc. XVIII, constituído por quatro colunas coríntias e coroamento
decorado com resplendor ourado a emoldurar um coração. No vão do retábulo a escultura
de uma pietá, patrona da capela, datada da época da construção do templo.

  AUC – Cabido, Instituições Pias, Cx. XIII, Doc. 1


(447)

267
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

D. PATRIMÓNIO DESAPARECIDO

1. UM MOSTEIRO EM MIDÕES: FICÇÃO OU REALIDADE?


A historiografia sobre Midões tem abordado a possibilidade de ter existido vida
monástica até tempos recentes. No documento mais antigo sobre Midões, o testamento
de 951-955, D. Muna doou ao Mosteiro de Lorvão, entre outros bens uma «villa que se
chama Flamianes que está situada na margem do Alva com os seus arredores, limites antigos
e mosteiros com suas honras e uma biblioteca».
Com o coutamento de 1133 promovido por D. Afonso Henriques em favor do
Mosteiro de Lorvão, surge a referência ao Mosteiro de Speraindeo bem como a uma
vila com o mesmo nome. Apesar de várias notícias que dão este mosteiro associado ao
Distrito de Viseu, vários autores têm-no conotado com a actual localidade do Esporão,
hipótese que a toponímia parece dar credibilidade na medida em que poderá ter evolução
linguística de Speraindeo.
Na falta de dados mais esclarecedores ficamos na dúvida,x se aquela passagem se referia
a porções do território habitadas por eremitas ou a casas monásticas organizadas segundo
uma Regra de vida comunitária mais alargada.
António Veiga(448) considera muito provável a existência em Midões e seu termo de
um ou mais conventos, admitindo, como crível, a existência de um mosteiro no lugar do
Esporão, então arrabalde da Vila de Speraindeo. Partindo das informações extraídas do
Agiologio Lusitano, designadamente, a proximidade do lugar do Couto e da Serra da Estrela,
fundamenta a existência do convento de Midões, com a invocação de Nossa Senhora do
Couto, fundado em 1539, por Maria Borges, moradora na Rua Nova de Lisboa(449).
Mais acrescenta o autor, que o processo de extinção do convento estaria na posse de
António Soares d’Albergaria, Juiz do Supremo Tribunal de Justiça, que contudo sua filha,
Júlia Soares d’Albergaria, não conseguiu localizar após o falecimento do pai.
Tendo em atenção os registos orais que então colheu em Midões sobre o assunto, a
fidalguia local não manteria as melhores relações com o convento, dado que o mesmo
lhes retirava fiéis das capelas das suas casas senhoriais. No mesmo sentido a lenda que
corria entre o povo, sobre a reputação moral do cenóbio, desde que uma «bela freira» nele
entrou, e que sendo alvo da cobiça de diversos fidalgos resistira até ser conquistada por
um cavaleiro, que nem o Santo Oficio, nem os juízes de Midões chegaram a identificar.
Ou, também, que todas as freiras estariam grávidas do capelão do convento e que todos
foram queimados pelo Santo Oficio em Coimbra.

  VEIGA, 1912, pp. 46-47


(448)

  ibid. pp. 160-161


(449)

268
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

A partir destes testemunhos, Veiga tentou apurar a sua veracidade, referindo ter pro-
curado na Junta de Paróquia de Midões uma cópia, de 1809, de uma sentença proferida
pelo Santo Oficio de Coimbra, confirmando a existência de «um pequeno recolhimento
de mulheres (…) de que hoje pequenos vestigios aparecem», fundado pelo padre António
da Fonseca e que se localizaria em Midões «em um sitio chamado Torre», onde existe uma
fonte que o povo costumava designar como Fonte do Paço
Na tentativa de encontrar um corpus documental este autor refere que após a extin-
ção do cenóbio a família Pinto Caldeira aproveitou a capela do Mosteiro para sua capela
particular, tendo construído um passadiço, para ligar a capela à casa da família, dando
assim crédito ao que se escreveu no Agiologio Lusitano, apresentando como possível fun-
dadora Maria Borges, elemento da referida família. No mesmo sentido, cita a sentença
de 17/06/1799, pela qual o capelão António da Fonseca, que pretendeu fundar uma
congregação feminina, fora condenado pela prática de actos lascivos com pessoas do sexo
feminino. No entanto não se explicita se chegou a fundar, nem se a mesma corresponderia
ao Convento de Midões(450).
Veio em favor desta tese, a obra de Augusto Pinho Leal que a partir da documentação
consultada aponta a existência, em 1697, de «um pequeno mosteiro, ou hospício, do
sexo feminino», fundado por uma familiar do Conde da Borralha, e extinto pouco tempo
depois (Vol. V, p. 210).
Uma nova hipótese foi apontada por Marco Daniel Duarte (2009, p.77), partindo das
referências a um templo romano encontradas na ermida de S. Sebastião, no Couto: «Será
que no período cristão terá sido preponderante para a escolha da localização do Mosteiro,
a partir do princípio que o referido Mosteiro se localizava naquele lugar?».
No seu entender «O que se escreve, portanto, sobre o convento de Midões assenta,
assim, numa forte tradição oral, o que se revela prova mais frágil, ainda que importante para
a reconstituição da recordação do lugar e da comunidade que nele habita» (2009, p. 122).
A Literatura, através de Camilo Castelo Branco, reconfigura estas informações relativas
à eventual existência de um cenóbio, centrando a sua acção neste território no conto «O
Santo de Midões», que integra a colectânea Quatro horas inocentes (Lisboa, 1872).
Naquele conto, o escritor romanceia as visões místicas do capelão António da Fonseca,
no ano de 1648, de cuja inspiração resultou a fundação da congregação feminina, em
número de 13 freiras.
A obra integra-se no contexto de acesa crítica ao clero de então. Por esse motivo, Camilo
caricaturiza as Ordens Religiosas e ao processo de selecção das noviças; escolhidas entre a
nata da fidalguia da região (Midões, Tábua e Bobadela), denunciando o comportamento
desviante do fundador da congregação.
Uma das religiosas é identificada pelo nome de D. Helena Pereira, filha de Gonçalo
Pereira de Midões, a qual denuncia as gravidezes das monjas como não sendo obra divina,

  VEIGA, 1912, pp. 172-176


(450)

269
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

antes obra do padre Fonseca, facto que estaria na origem do processo contra o «Santo
de Midões». Julgado pelo Santo Ofício de Coimbra, relata Camilo com fina ironia a sua
condenação: «a santa inquisição ouviu este Santo António de Midões, admoestou-o três
vezes a que confessasse tudo (aparecia-lhes ainda diminuto aos juízes!) e condenou-o a não
confessar, a não dizer missa, a não trabalhar, a não sair de casa, a comer, beber, dormir,
e vestir à custa da inquisição; e … («ó refinada maldade!) condenaram padre António a
pagar as custas do processo!»(451).
Na ausência de certezas sobre a história deste convento, torna-se extremamente difícil
correlacioná-lo com o que vem mencionado no testamento medieval de D. Muna ao
Mosteiro de Lorvão, no ano de 951-955.
Porém, se levarmos em consideração a tradição local e a narrativa de Camilo Castelo
Branco é admissível a existência de uma pequena casa conventual feminina em Midões,
extinta nos finais do séc. XVII. Desconhece-se, no entanto, quem o fundou, em que data,
que regra monástica seguia e o que motivou a sua extinção.
O escritor terá tido acesso à sentença que condenou o clérigo de Midões, dado que
cita parte da mesma. No mesmo sentido terá tido acesso à cópia de 1809, e dela colhido
a opinião impressa pelo copista da sentença, no prefácio, onde «relacionou a decisão
condenatória e o referido padre António da Fonseca como sendo o capelão fundador e
principal responsável pela extinção do convento»(452).
A ter existido esta comunidade religiosa, teria o seu espaço edificado na artéria de
Midões com o apropriado nome de Rua do Convento (vide foto 117). António Veiga iden-
tifica, inclusive, e por meio de fotografia, os vestígios que na sua óptica correspondem, à
antiga casa conventual. tendo Saraiva anotado que: «Há fotografias que nos mostram a
sua frontaria, com uma cruz de pedra a encimá-la»(453).
Os vestígios conotados com a casa conventual encontram-se, actualmente, em ruína,
exceptuando uma casa de habitação que ostenta, num dos cunhais, uma pilastra de boa
execução e fora do contexto do edificado na área, na sequência de muros rebocados. Algo
que encaixa na reflexão de Marco Daniel Duarte: «O facto de as estruturas em ruínas
apresentarem vários espaços fechados, alguns desprovidos de cobertura, paredes-mestras
de grandes dimensões e um cuidado sistema de suporte do vigamento leva a pensar que
ali se levantou uma construção de traçado erudito»(454).
Uma nova hipótese, próxima à de António Veiga, foi levantada em 2007 por Sandra
Lourenço, segundo a qual o mosteiro se terá erguido no Esporão, no local de um pequeno
templo hoje arruinado (vide foto 118):

(451)
  DUARTE, 2009, p. 126
(452)
 DUARTE, op.cit. p. 126; VEIGA, pp. 172-176
(453)
  VEIGA; 1912, p. 167; SARAIVA, 1986, p. 27
(454)
  DUARTE, 2009, p. 127

270
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

«O aparelho original da capela de St.ª Luzia, bem como a presença de silhares e colunas
reaproveitados em algumas das fachadas deste pequeno núcleo habitacional, faz-nos colocar
a hipótese de neste local ter sido erigido o edificio religioso referido nos documentos do
ano de 969 [951-955]»(455).

2. CAPELAS DESAPARECIDAS
Na sua Monografia de Midões, o padre José da Costa Saraiva afirmava: «Só numa área
de 500 metros, nas cercanias da Igreja Paroquial, chegou a haver onze edifícios de culto,
o que atesta a religiosidade deste povo»(456).
Dos seus trabalhos de pesquisa concluíra do desaparecimento de alguns templos: Capela
de S. José, em Touriz; Capela do Senhor dos Passos (em Midões, onde hoje se situa o pa-
lácio do Visconde de Midões) e outra à saída para a Vila do Mato, de ignorada invocação.
Em Midões, sabemos que desapareceu a Capela de Santo Estêvão, instituída por
Estêvão de Miranda Brandão Castelo Branco, da família Mirandas Brandões, de Midões.
Estêvão, nascido a 1657, foi fidalgo cavaleiro da Casa Real e pediu licença à Câmara
Eclesiástica de Coimbra, em 1710, para construir o templo junto às suas casas. Casou em
Aveiro, a 25/07/1694 com Jerónima Soares de Albergaria e faleceu na Póvoa de Midões
a 30/09/1730. A antiga imagem de Santo Estêvão do séc. XVI existente na actual Igreja
Matriz de Midões, será proveniente desta capela(457). a qual tinha uma confraria com o
mesmo nome.
Amândio Nunes Monteiro, na sua monografia sobre Touriz relembra o património
desaparecido na povoação: a já referida Capela de S. José, na Rua do Cabo onde na pri-
meira metade do séc. XX ainda se observavam ruínas, bem como, nos finais do séc. XIX,
no local conhecido como Olival da Capela «…os restos, bem visíveis e conservados, de
um antigo templo de boas dimensões. Foi pena não os terem recuperado e resguardado
convenientemente, para que pudessem ser devidamente estudados por arqueólogos
qualficados»(458). Neste caso talvez os vestígios fossem da capela instituída no séc. XVII
por António Tavares Leitão e sua mulher, Luísa do Amaral de Azevedo, descendente dos
Amarais de Touriz(459).
No mesmo sentido, o da destruição de património, relembra, também, as alminhas
que existiam à entrada do Esporão e, em especial, o Pelourinho.

(455)
  LOURENÇO, 2007, p. 157
(456)
  SARAIVA, 1986, p. 43
(457)
  GONÇALVES, 2006, Vol. II, p. 457
(458)
  MONTEIRO, 2005, p. 13
(459)
 GONÇALVES, op.cit, vol. I, p. 331

271
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

As memórias paroquiais de 1758 referem vários templos, desaparecidos ou de difícil


identificação: Capela do Espírito Santo, localizada na Vida de Midões e a Capela de Nossa
Senhora da Graça, situada no Casal da Senhora.
A capela do Casal da Senhora, dedicada a Nossa Senhora da Graça, terá sido demolida
nos finais de 1747, como consta da documentação do Bispado. Do seu processo, consta
a declaração apresentada à Câmara Eclesiástica pelos mordomos da Senhora da Graça «e
todo o povo do Cazal da Senhora da Graça», freguesia de Midões alegando não poderem
reedificar a capela devido aos poucos recursos económicos, pedindo em simultâneo que
fosse substituída pela capela de Nossa Senhora do Campo(460). No requerimento dirigido
ao Provisor do Bispado, apresentado pelos mordomos, tornam-se claras as razões da ruína
e incapacidade de reedificação:
«…porq’ a cap.ª da Sr.ª da Graça com a força deste Inverno se arrunhou e abrio a
parede e os supp.tes por serem pobrissimos e por todos serem o n.º de outo moradores e
se acharem vexados pellas mt.as fintas q’ p.ª as obras da Igr.ª tem pago não podem para-
mentar e reedificar a d.ª cap.ª da Sr.ª da Graça mas sm se querem obrigar só a da Sr.ª do
Campo pois só esta p.ª os Supp.tes he necc.a.». A terminar, os mordomos solicitavam que
a imagem da Senhora da Graça fosse para a Capela da Senhora do Campo.
Esta situação, decorre no tempo do vigário João de Sousa Machado, que em informação
dirigida ao Bispado e datada de 29/10/1747, atesta a verdade do requerimento, pelo que
o provisor Manuel dos Reis e Sousa analisa o caso, dando razão ao exposto e avalizando
a trasladação da imagem.
Sobre a Capela do Senhor dos Passos sabemos que a 20/08/1768 João Soares Garcia,
de Midões, apresentou requerimento ao Bispado para que o dito templo, erigido pelos
moradores da freguesia, fosse consagrado. Nela se encontrava a imagem do Senhor Ecce-
Homo, «a que se concorre com exemplar devoção»(461).
Neste processo consta a informação do então vigário de Midões, João de Sousa
Machado, datada de 13/06/1758, que faz remontar a capela ao tempo em que teve na
paróquia como coadjutor o Padre Jacinto Alvares (Prior de Covas), médico do concelho,
José Mendes de Fonseca, os quais mandaram fazer a referida imagem com «coazi a al-
tura de hum homê», os quais requereram a sua bênção, metendo-a numa «cazinha sem
tenção alguma de ser capella», para a qual concorreram os Mordomos de S.to Estevão.
Ausentando-se o cura e o médico referidos, o suplicante continuou a tratar com grande
devoção da referida casa até que devido aos muitos milagres decidiu fazer uma capela com
todas as condições.
No entanto, em 1768 a capela corria o risco de ser demolida por ordem do Bispado,
pois fôra edificada sem licença, valendo o despacho do Provisor do Bispado, que «por

  AUC – Cabido, Instituições Pias, Doc. Nº 26


(460)

  AUC – Cabido, Instituições Pias, Doc. N.º 5


(461)

272
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

FOTO 94 - O pelourinho manuelino de Midões FOTO 95 - Pelourinho do Coito

273
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 96 - A antiga Casa da Câmara Municipal de Midões

FOTO 97 - A Casa do Juiz, em Midões

274
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

FOTO 98 - Cemitério de Midões, via principal

FOTO 99 - Cemitério de Midões, jazigo dos Viscondes do Vinhal

275
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 100 - A Fonte da Caricha, Midões

FOTO 102 - A zona de Valverde, em Midões, antes da construção da fonte e jardim, anos 30? séc. XX

276
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

FOTO 101 - Carta aos midonenses para aformoseamento da


zona de Valverde, Midões, 7-11-1919 (AJFM) FOTO 103 - O chafariz e jardim de Valverde

277
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 104 - O Coreto do Outeiro de S. Miguel

FOTO 105 - Casa dos Sousas Machados e Capela do Senhor Jesus da Vitória

278
279
FOTO 106 - Casa do Ribeirinho, onde viveu o 1º Visconde de Midões, postal de princípio do séc. XX
Capítulo VII  PATRIMÓNIO
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 107 - Casa do Ribeirinho (em cima a capela e em baixo a fachada)

280
Capítulo VII  PATRIMÓNIO

piedade» redime os suplicantes dos excessos cometidos e das penas em que incorriam
obrigando-os a juntar escritura de dote com 8.000 reis.
A 04/09/1887 a Junta de Paróquia deliberou pedir à Junta Geral ou Comissão
Executiva, licença para demolir «uma pequena capella que ha muito está profanada, e
que está no local denominado O Senr.º dos Passos»(462). Por não ser competente na maté-
ria o pedido seria apresentado à CM Tábua em Dezembro do dito ano tendo em vista a
«prompta e imediata demolição». Em Fevereiro de 1888 o pároco da freguesia confirma
a urgência e necessidade da demolição, de preferência antes da Páscoa.
Nos livros da Junta da Paróquia de Midões, surge, também, a referência de 20/10/1882
à intenção de «venda do assento e largo da extincta Capella de S. Thiago no lugar do
Coito»(463), que seria concretizada a 04/11/1883, por 4500 reis, tendo como destino a
construção de um curral(464).
No Esporão ainda se vêem as ruínas de uma velha capela, dedicada a Santa Luzia
(vide foto 118), de planta rectangular, com belas cantarias e uma torre sineira de gra-
nito. A 09/05/1926 a JFM autorizou, por unanimidade as senhoras D. Maria José da
Cunha Magalhães e sua irmã, do Esporão, para «concertarem à sua custa a capela da sua
povoaçao»(465).
De facto são visíveis os indícios de algumas reconstruções de que o templo terá sido alvo.
Na fachada sudeste ainda conserva o aparelho original num troço de 6 m. E, nas fachadas
de algumas casas é visível o aproveitamento dos silhares de granito, alguns dos quais com
encaixes para portas ou janelas, bem como fustes de colunas. Dizem os moradores que
várias colunas da antiga capela foram levadas por desconhecidos.
No adro da Igreja Matriz existiu um coreto onde se aplicou em Agosto de 1928 um
gradeamento de ferro(466)

3. O PELOURINHO DE TOURIZ
Foi, durante séculos, testemunho da antiguidade concelhia da povoação. Localizava-
-se no chamado páteo, posteriormente, rectificado para Pátio das Cantigas, em frente da
residência do Agostinho, o simpático Ramalhão. A sua destruição contará mais de 80 anos:
«Nos anos 30 construiu-se no local uma casa de habitação e, como o Monumento
prejudicava, em parte, a visibilidade duma das janelas, o proprietário não esteve com

(462)
  AJM - Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1883-1893, fl. 38v.
(463)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1878-1883, fl. 44
(464)
  AJM - Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões, 1883-1893, fl. 2
(465)
  AJM – Livro das Sessões da Junta de Freguesia de Midões, 1918-1937, fl. 42
(466)
  ibid. fl. 50v.

281
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

meias medidas e mandou destruir o pelourinho, perante a passividade dos habitantes da


povoação que sofreram em silêncio a demolição daquele marco centenário que os identifica
com os seus antepassados»(467).
A estrutura do pelourinho, pela descrição existente, parece similar ao de Midões: «…
constituído por um alto pilar [com altura aproximada de três metros] com a forma qua-
drada e com as quatro quinas vivas em granito aparelhado. Com grandes blocos, colocados
uns em cima dos outros, com as juntas em esquadria muito certinhas, impressionava pelo
rigor com que tinha sido construído. A base era constituída por três degraus que o cir-
cundavam, tendo por coroamento uma cimalha um pouco saliente [um pinôco facetado
em jeito de pirâmide], o que lhe conferia um seguro equilíbrio»(468).

4. A CASA DOS FERREIROS (TOURIZ)


Até final do séc. XIX a casa pertenceu à família Gama Lobo, de Canas de Senhorim,
cujo feitor, Eduardo de Brito, da Ribeira, faleceu em 1956. Esta família vendeu a casa por
50 contos ao primeiro Visconde de Vinhal, Dr. Agostinho Borges de Figueiredo e Castro,
com todas as propriedades que lhe pertenciam.(469). Considerada a mais rica da região,
com os seus extensos e fertéis terrenos prolongando-se pela margem do Rio de Cavalos,
desde a Quinta do Rio até junto da sua foz e de Travanca de Lagos ou Rio Seia, além
de inúmeras fazendas rústicas existentes nos concelhos de Oliveira do Hospital, Tábua,
Arganil e Carregal do Sal.
Desta casa apenas existe o monumental portão, do qual foi retirado o brasão que o
encimava, algumas paredes em ruínas, vestígios ténues do palácio e cocheiras que lhe
ficavam anexas. A Capela dos Ferreiros, existente no interior da Igreja Matriz de Oliveira
do Hospital foi por elas mandada construir.
Nos Galvões, extremo Sul da povoação, consta ter existido um palácio, onde residia um
fidalgo de apelido Galvão, com vastas propriedades que se prolongavam até às margens
do Rio de Cavalos.

(467)
  MONTEIRO, 2005, p. 52
(468)
  ibid. pp. 52 e 65
(469)
  MONTEIRO, 2005, p. 49

282
VIII

Famílias e
Personalidades
Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

A
nalisamos neste capítulo algumas famílias com relevância na história de Midões,
actualizando a tradição historiográfica local, designadamente, as obras de
António Duarte d’Almeida Veiga (1912), de José da Costa Saraiva (1986) de
Marco Daniel Duarte (2009) e Amândio Nunes Monteiro (2005).

1. D. PAZ
Figura quase lendária de Midões, a quem se deve o foral que tornou Midões um
município, após o coutamento outorgado por D. Afonso Henriques. Era, na época, Juiz
de Midões, e desenvolveu um intenso trabalho diplomático para conseguir da Abadessa
Marinha Gomes a carta de foral. Apesar dos pesados encargos foi uma verdadeira carta
de alforria, libertando a povoação do poder dos senhores(470).

2. D. GONÇALO PEREIRA DE MIDÕES


Personalidade e família referenciada por Camilo Castelo Branco na obra «O Santo de
Midões» (1872). De acordo com Saraiva, possuía um solar com capela, que era a «mais
antiga Casa de Midões»(471). Veiga refere não só a existência da casa solarenga, adiantando
também que seria familiar do Santo Ofício e que uma sua descendente teria casado com

  SARAIVA, 1986, p. 25
(470)

  ibid. p. 55
(471)

285
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

um descendente de Lopo Soares de Albergaria, nobre governador da Índia entre 1515-


1518. Segundo o mesmo autor neste enlace entroncam várias famílias da região: Monteiros
Soares d’Albergaria (Midões), Soares d’Albergaria (Vila do Mato), o Visconde de Oliveira
do Conde entre outras(472).

3. SEBASTIÃO D’ALBUQUERQUE PINTO TAVARES FREIRE CASTELO BRANCO


O solar desta família é conhecido por Casa dos Sousas Machados ou Casa do Coronel,
imóvel que no princípio do séc. XX pertencia ao Visconde do Ervedal da Beira – Sebastião
Tavares d’Albuquerque Pinto Freire Castello Branco - por via matrimonial com D.
Bernarda Umbelina Cardoso Freire da Cunha e Sousa, natural de Midões.
D. Bernarda era filha de Narciso de Sousa Machado, familiar do Santo Oficio de
Coimbra e de D. Maria Bernarda Cardoso Freire de Andrade, de Travanca de Lagos.
Aquele Narciso, neto de Marcos Lopes de Sousa, fidalgo antigo e morador que foi na sua
Torre de Midões, teve como progenitores Manuel Nunes Bael e Maria da Assumpção,
os quais administravam dois vínculos em Midões: um instituído por seu tio Domingos
Machado de Sousa e outro por seu irmão e vigário de Midões, Afonso de Sousa Machado.
Domingos de Sousa Machado foi advogado da Casa da Suplicação por Carta Régia de
1705 e a ele se deve a construção da Casa dos Sousas Machados. D. Bernarda Umbelina
terá falecido durante as invasões francesas tendo seu marido deixado Midões e fixado
residência em Ervedal onde por herança também possuía casa.
Da descendência do casal destaca-se o filho mais velho, o já referido, herdeiro dos
vínculos de seus pais, fidalgo da Casa Real, que entrou na vida militar em 1809 e foi
coronel do regimento de milícias de Arganil. Habitou, em Midões, a Casa dos Sousas
Machados pelo menos até 1828.
Foi um militar de relevo durante a Guerra Peninsular, distinguido com a medalha
de Fidelidade ao Rei e à Pátria, concedida por D. João IV, a Cruz da Torre e Espada e a
Comenda de Cristo. No contexto das Guerras Liberais foi apoiante de D. Miguel após
a Convenção de Évora-Monte retirou-se para Ervedal uma vez que em Midões ficaram
preponderantes os Abreus Abranches que haviam apoiado os liberais.
Sebastião Castelo Branco faleceu solteiro e nomeou seu herdeiro o sobrinho Sebastião
Carlos da Costa Brandão e Albuquerque, primeiro Visconde do Ervedal, que foi Juiz do
Supremo Tribunal de Justiça e deputado em duas legislaturas.
Nos princípios do século XX a Casa do Coronel era habitada por D. Maria da Conceição
de Albuquerque da Costa Brandão, filha do segundo Visconde do Ervedal, Sebastião de
Albuquerque Pinto Tavares da Costa, e de sua esposa, D. Maria da Conceição Albuquerque
Pimentel Vasconcelos. D. Maria Brandão terá casado em Coimbra a 17/09/1924.

  VEIGA, 1912. p. 146


(472)

286
Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

4. ROQUE RIBEIRO D’ABRANCHES CASTELLO BRANCO (VISCONDE DE MIDÕES)


Morador na Casa do Ribeirinho. Nasceu a 15/07/1770, em Midões, filho de Luís
Ribeiro de Abreu Castello Branco, fidalgo-cavaleiro da Casa Real, Cavaleiro da Ordem
de Cristo e pertencia ao Santo Ofício, e de D. Teresa Leonor de Vasconcelos Sotomaior
de Mendonça, da Casa de Santa Eulália, junto a Seia (vide foto 119).
Foi senhor das casas de Midões, Cabanas, Travanca de São Tomé, Várzea de Cavalos,
Travanca de Lagos, Arganil, S. Martinho da Cortiça e Pombeiro. Casou com Rosa Inácia de
Araújo e Azevedo, a 08/09/1806, irmão do primeiro Conde da Barca, António de Araújo
e Azevedo (1754-1817), de cujo enlace não resultaram herdeiros legítimos. Bacharel em
Direito pela Universidade de Coimbra.
Devido à sua ligação com a causa liberal foi perseguido no período da governação
miguelista e seus bens confiscados. Membro da Junta da Revolução Vintista que preparou
a Revolução de 24/08/1820, foi distinguido pela acção na causa do Liberalismo sendo
declarado pelas Cortes como «Benemérito da Pátria». Foi Perfeito da Província da Beira
Alta em 1833, par do Reino no ano de 1834 e deputado em várias legislaturas.
Personalidade reconhecida ao mais alto nível, por despacho real de D. Maria II, de
23/10/1837, como Visconde de Midões. Naquele diploma justifica-se a atribuição do
título: tendo «particular consideração os serviços prestados à Liberdade Constitucional
desde o anno de 1820 (…) attendendo tambem á sua illustre linhagem (…) os longos, e
perigosos sacrifícios, com que durante o doomínio do Usurpador provou a sua inabalável
fidelidade ás Instituições Liberaes, e à Legitimidade, soffrendo nesses annos de continua
perseguição, e o sequestro, e delapidação da sua grande fortuna»(473).
Não teve descendência legítima do casamento, mas legitimou diversos filhos, suceden-
do-lhe o primogénito César Ribeiro Abranches Castello Branco, nascido a 02/10/1803,
segundo Visconde de Midões, por decreto de 21/06/1870, e carta de 25/6/1870, que
renovaram o título na sua pessoa.
Tal como o pai César Castello Branco formou-se também em Direito, na Universidade
de Coimbra em 1824, sendo nomeado em 1827 Juiz de Fora de Oeiras. De convictas ideias
liberais, tal como o pai, foi demitido por D. Miguel mas reintegrado em 1833, iniciando
um percurso regular na administração judicial portuguesa, apenas interrompido para
servir a nação como deputado. Em 1881 a sua carreira culminou com a nomeação para
Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, ocupando o cargo até 1885.
Casou tardiamente a 28/7/1852 com sua prima e sobrinha D. Amélia Ribeiro Flamínia
de Vasconcelos Abranches, filha do seu tio paterno António de Vasconcelos Abranches de
Castello Branco, de cujo enlace nasceu uma filha D. Maria dos Prazeres Ribeiro Abranches,
que casou com Silvério Coelho Paes do Amaral, de Beijós, os quais tiveram vários filhos,
sendo de destacar Francisco Coelho Ribeiro Abranches, que foi prior de Alcobaça, cujas

  Diario das Cortes Geraes Extraordinárias, e Constituintes da Nação Portuguesa, nº 238, 21/11/1837, p. 1299
(473)

287
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

qualidades lhe mereceram distinções várias: Pregador Régio e Cavaleiro da Real Ordem
de S. Tiago.
Foi membro do Conselho de Sua Majestade, Fidalgo da Casa Real, Comendador da
Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa a 05/05/1852, Cavaleiro da Ordem
de Cristo e condecorado com a medalha das Campanhas da Liberdade.
Após a sua saída do Supremo Tribunal de Justiça fixou-se em Midões, tendo falecido
no seu palacete a 05/03/1889.
Outro filho do primeiro visconde de Midões foi Aristides Ribeiro Abranches Castello
Branco, que também seguiu a vida da magistratura sendo Juiz do Supremo Tribunal de
Justiça. Também ele uma vítima do absolutismo, tendo cumprido 6 anos de reclusão.
O tio de César Castello Branco, António Castello Branco teve outro filho, Roque
Ribeiro d’Abreu Abranches, vereador e substituto do Juiz de Direito, casado com D. Maria
da Piedade Gambôa, do Fundão, os quais eram os donos da Casa do Ribeirinho nos
princípios do século XX.
Estes tiveram duas filhas: D. Modesta Alice Gâmboa Abranches Ferreira, que casou com o
Dr. Jaime Adolfo Rodrigues Ferreira, médico pela Faculdade de Paris e especialista em doen-
ças do coração, e D. Guilhermina Júlia de Gamboa Abranches, que casou primeira vez com
o Dr. Alfredo Ferreira Jordão Christino, médico pela Faculdde de Coimbra e, em segundas
núpcias, com o Dr. Alberto Carlos de Pinho, advogado e notário de quem tem uma filha.
Na década de 80 os donos da casa eram D. Modesta. D. Maria Júlia, D. Júlia e José
Roque Vieira de Abranches Jordão.

5. FAMÍLIA PINTO CALDEIRA (OU OS DA BORRALHA)


A sua casa fica implantada próximo do edifício que se presume ter sido o antigo Convento
de Midões. António Veiga refere que o ascendente mais antigo do Conde da Borralha a
habitar a referida casa foi Manuel Homem de Abreu Mascarenhas, algures no séc. XVI.
Casou com D. Maria da Costa Godinho, tendo as propriedades da família sido her-
dadas por uma das filhas do casal, D. Lucrécia Joana de Abreu Castello Branco, que se
consorciou com seu primo, João Pereira de Mascarenhas.
Segundo Veiga (1912, p. 159) uma filha deste casal, que não identifica, instituiu um
morgadio ligado ao património que o casal anterior possuía em Midões, e foi a última
familiar a habitar a casa.
Uma das irmãs da senhora foi D. Maria Caetana de Abreu Mascarenhas, que se casou
com José Pinto Macedo, 7º Senhor da Casa da Borralha. Uma das suas netas, D. Josefa
Margarida Pinto herdou a Casa da Borralha e o património que a família detinha
em Midões, tendo casado com Gonçalo Caldeira Leitão Cardoso d’Abranches Brito
Moniz, avós do actual Conde da Borralha. O seu pai, Francisco Caldeira Pinto Cardoso
d’Abranches de Brito Moniz foi 1º Visconde da Borralha.

288
Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

6. FAMÍLIA SOARES DE ALBERGARIA


Tem o seu solar próximo da Casa dos Sousa Machados, conhecido como Casa dos
Soares de Albergaria ou Casa do Capitão-Mor. António Veiga levanta dúvidas quanto à
proveniência desta família: ou são descendentes de Lopo Soares de Albergaria, Governador
da Índia, ou têm um ascendente comum.
Nos finais do séc. XIX o palacete seria habitado por José Bernardino Monteiro Cabral
Soares de Albergaria, Capitão-Mor de Midões. Este teve pelo menos dois filhos: José
Roque Soares d’Albergaria, que faleceu em Almeida, devido aos seus ideais liberais, e Luís
Monteiro Soares d’Albergaria, que casou com D. Ludovina da Silva Carvalho, filha de
José da Silva Carvalho, ministro de D. Pedro IV e de D. Maria II. Deste casal nasceram
Guilherme Monteiro Soares d’Albergaria e José Monteiro Soares d’Albergaria, ambos
juízes de primeira instância.
Neste palacete existiu uma capela, dedicada a Nossa Senhora da Luz, instituída e ad-
ministrada pelo referido José Bernardino Monteiro Cabral, que a 09/07/1810 apresentou
súplica ao Bispado de Coimbra para que lhe fosse concedida licença para nela celebrar
missas(474). Pelo referido processo se constata que a capela evoluiu a partir de um oratório
particular de seus antepassados, a qual dispunha de autorização antiga para celebrar a
missa. Contudo, um grande incêndio consumira o oratório, capela, documentos e parte
das casas, provocado pelos invasores franceses, tendo o administrador reedificado o templo.
Ainda sobre esta capela se pode ler que «tem a sua entrada e servidão por huâ especei
de galeria», que dava entrada para a entrada do palacete e unida à rua pública. Na infor-
mação prestada pelo vigário de Midões, a 21/06/1810, compara a entrada para a capela
com a «Salla dos Actos da Universidade». A escritura de doação de bens e hipoteca da
capela foi lavrada a 14/06/1810, a licença concedida pelo Bispo de Coimbra, D. Francisco
de Lemos de Faria Pereira Coutinho para a reedificação data de 12/07/1810 e o auto de
vistoria de 18/01/1811.
Na Vila do Mato encontra-se outro ramo desta família, que tinha como figura cimeira,
no princípio do séc. XIX, José Soares de Albergaria. Tendo casado em data incerta, teve
uma filha, Angelina, que se consorciou com um primo, Miguel Soares de Albergaria, de que
houve vasta descendência, da qual se destaca Inácia, casada com Afonso de Albuquerque,
que nos finais do séc. XIX ou princípios do XX, andava a restaurar a casa senhorial que
havia pertencido a Gonçalo Pereira de Midões.
Nos anos 80 do séc. XX, a descendente desta família era Ana Linhares.

  AUC – Instituições Pias, Cx. XIII, Doc. N.º 6


(474)

289
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

7. FAMÍLIA FONSECA MAGALHÃES


Com solar próximo do da Família Veiga exerceram significativa influência em Midões.
A partir de documentos que António Veiga teve oportunidade de consultar para a sua obra
(1912), actualmente com paradeiro desconhecido, conhecem-se informações preciosas
sobre esta família.
A 23 de Março de 1648 um membro desta linhagem, Isabel Antunes, solteira, fi-
lha de António Afonso e Isabel Antunes, instituiu, por testamento, um morgadio em
Midões. Através daquele documento são legados vários bens a diversas confrarias da terra
(Santíssimo Sacramento, Santo Estêvão, Nossa Senhora do Rosário, Jesus e S. Sebastião),
bem como a elementos da família e criados.
Segundo a mesma fonte o morgadio foi instituído em toda a «fazenda de raiz e pão
de senso», deixando-se explícito que os bens incorporados não pudessem ser vendidos ou
trocados, devendo estar sempre na posse de uma única pessoa que os administraria de forma
vitalícia, identificando-se como primeira morgada Maria Antunes da Costa, sobrinha da
instituidora em segundo grau e filha de Maria Antunes e Pedro Sengo, ambos de Midões.
Foi testamenteiro o Vigário de Midões, Pedro Ribeiro Furtado.
Este morgadio veio a ser disputado judicialmente no séc. XVIII entre Agostinho Ribeiro
Pinto e Manuel da Fonseca Magalhães, com desfecho favorável a este último: primeiro
com sentença favorável do Juiz Ordinário de Midões, posteriormente confirmada, em
27/05/1776 por sentença do Tribunal da Relação do Porto. Nesta época seria um dos
administradores do morgadio Geraldo Soares d’Albergaria.
De acordo com o Tombo da Junta de Paróquia de Midões, consultado por António
Veiga, o possuidor do morgadio, em data incerta, foi Luís Soares de Albergaria, o que atesta
uma ligação a outra poderosa família, os Soares de Albergaria, dentro de uma política de
consórcios que privilegava os individuos mais influentes.
O último morgado da casa foi José Soares Fonseca Magalhães, irmão de Rodrigo da
Fonseca Magalhães, ministro de D. Maria II. Foi casado com Francisca, filha de Joaquim
Brandão, tio paterno de João Brandão, de cujo enlace nasceu Maria da Glória Fonseca
Magalhães que casou com seu primo direito do lado materno, José Augusto da Silva
Coelho.
O seu filho Aníbal Augusto da Fonseca Magalhães Coelho residiria no solar por volta
de 1912 «na parte mais moderna da habitação, por que a antiga, tendo sido destruída
pelos parciaes de D. Miguel, só conservava as paredes e a cosinha».(475)

  VEIGA, 1912, p. 192


(475)

290
Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

8. AGOSTINHO BORGES DE FIGUEIREDO E CASTRO (VISCONDE DO VINHAL)


Esta família, residente no Esporão, foi considerada por António Veiga, entre as mais
distintas da região. O primeiro Visconde do Vinhal foi Agostinho Borges de Figueiredo e
Castro, agraciado com o título a 19/12/1889, por carta do rei D. Carlos.
Seu avô terá vivido na última metade do séc. XVIII, sucedendo-lhe no morgardio,
em 1817, seu filho Domingos Borges de Cardoso, que abandonou a carreira militar, para
administrar os bens da família. Casado, teve além do visconde uma filha de nome Maria
Glória.
A imprensa da época (1907) identificava o Visconde do Vinhal como «abastado pro-
prietário e opulento capitalista do Esporão».(476) Não deixou descendência, vindo a ser
sua herdeira a sobrinha Ana da Cunha Freire Magalhães, que casou com Basílio Augusto
Soares da Costa Freire, professor de medicina na Universidade de Coimbra.
Uma das filhas deste casal casou com José Caeiro da Matta.

9. JOSÉ CAEIRO DA MATTA


Natural do Vimieiro-Estremoz, vila alentejana localizada entre Arraiolos e Estremoz,
onde nasceu em 1883. Foi jurista, professor, diplomata e distinto estadista (vide foto 120).
Casou no Esporão-Midões, com Maria da Glória da Freire Caeiro da Mata, filha do
catedrático da Faculdade de Medicina, Professor Basílio Freire, falecida em Setembro de
1938 com 47 anos. Deste consórcio nasceu Basílio Freire Caeiro da Matta, engenheiro e
segundo Visconde do Vinhal.
Lente universitário da Faculdade de Direito, na Universidade de Coimbra, onde regeu
várias cadeiras (1907-1919) e, posteriormente, da Universidade de Lisboa onde leccionou, a
partir de 1920, as cadeiras de Direito Internacional Privado, Estatística, Finanças e História
do Direito Português e onde veio a ser nomeado reitor em 1929(477). Jubilou-se em 1953.
Desempenhou no governo de António Salazar diversos cargos políticos: Presidente do
Conselho Superior de Instrução Pública, deputado (1908-1910), Ministro da Educação
Nacional (1944) e dos Negócios Estrangeiros (1933-1935; 1947-1950). Representou
Portugal em várias conferências internacionais desde 1922, fazendo parte da delegação
portuguesa à Sociedade das Nacões (1936-1938), e presidido à reunião de Washington
para a assinatura do Pacto do Atlântico, em 1949 (vide foto 121). Membro vitalício do
Conselho de Estado.

  DUARTE, 2009, p.416


(476)

  «O Prof. Caeiro da Mata: figura de alto relevo nacional faleceu anteontem em Lisboa» In A Comarca de
(477)

Arganil, Ano LXIII; n.º 5500, 05/01/1963, p. 1

291
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Fora das ocupações governamentais: sócio efectivo da Academia das Ciências,


Presidente da Academia Portuguesa de História na década de 50 e presidiu à Comissão
Nacional para as Comemorações do V Centenário da Morte do Infante D. Henrique
(1960). Autor de vasta obra na área do Direito, afirmou-se, também como administrador
de empresas: desde 1922 no Banco de Potugal, mas também nas Companhias de Seguros
Sagres e de Petróleos de Angola.
O seu mérito foi reconhecido nacional e internacionalmente: Grã-Cruz e Chanceler
da Ordem de Santiago, Grã Cruz das Ordens de Cristo, da Instrução Pública, da Legião
de Honra de França, de Leopoldo I da Bélgica, da República de Espanha, de Orange e
Nassau dos Países Baixos, do Mérito da Hungria, da Coroa do Carvalho do Luxemburgo,
da Coroa da Roménia, da Coroa da Itália, do Cruzeiro do Sul do Brasil, Real do Nilo do
Egipto, da República da Colômbia, de Pio XII, entre outros reconhecimentos.
O casal ofereceu, nos princípios de 1930, o terreno para a construção do Hospital de
Tábua, bem como o terreno necessário para a construção da Escola Primária de Touriz e
um subsídio para a sua construção. Também cedeu, nos princípios de 1938, o terreno para
a construção das sedes do Club Desportivo Tabuense e Bombeiros de Tábua.
Proferiu, em 1934, um discurso na Sociedade das Nações e publicou «Le Différen
Luso-Alemand» e, três anos depois, a 19/11/1937 a obra «Ao Serviço de Portugal». Em
1939 foi nomeado sócio e membro correspondente da Academia de Direito de Munique.
Faleceu na sua casa de Benfica, em Lisboa, a 3/01/1963, tendo sido sepultado no
jazigo da família em Midões.

10. BASÍLIO FREIRE CAEIRO DA MATTA


Basílio Francisco José de Magalhães Freire Caeiro da Matta, nascido em 1912, foi
o segundo Visconde do Vinhal. Filho do ministro e diplomata José Caeiro da Mata,
Engenheiro mecânico no Instituto Superior Técnico de Lisboa, foi Provedor da Santa
Casa da Misericórdia de Tábua (1972).
Casou com D. Margarita Rosália Gonzalez-Fierro Viña, natural de San José de Gijón,
«Dama de Graça Magistral da O. Soberana de Malta», filha de Ildefonso Gonzalez Fierro
e de Florentina Vino Campa, de cujo enlace não houve descendência.
A 27/09/1959 foi inaugurado, em Touriz, o Largo Engenheiro Basílio Freire Caeiro da
Matta, gesto simbólico que retribuiu a cedência de «algumas centenas de metros quadrados
de terreno para ampliar o largo existente e de que a povoação passou a usufruir»(478).A obra
foi paga integralmente pela Comissão de Melhoramentos e a inauguração foi plena de
êxito: assistiram à cerimónia o Professor Caeiro da Matta, pai do homenageado e antigo

  MONTEIRO, 2007, p. 151


(478)

292
Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

ministro, Rui Ulrich, Ministro das Obras Públicas, o Governador Civil de Coimbra, o
Presidente e Vice-Presidente da CM Tábua, respectivamente, Desembargador Francisco
Taborda e Coronel Correia Nobre, e várias forças vivas dos concelhos vizinhos(479).
O painel de azulejos atribuindo o nome ao largo foi colocado na moradia do Sr. Nunes,
tendo sido descerrado pelo MOP, seguido de discursos de circunstância.
Em 1973 tencionou estabelecer uma fundação com o nome de sua mãe tendo como
sede o solar do Esporão, e como principais valências ajudar os mais carenciados, idosos
e crianças. A esta fundação desejava anexar os bens de Tábua, Oliveira do Hospital e de
Arraiolos.
Basílio da Matta ofereceu, em Maio de 1980, o imóvel designado de Pombal e 11.000
m2 de terreno à Santa Casa da Misericórdia de Tábua, tendo como objectivo a cons-
trução de edifícios de apoio a idosos e crianças, ou seja: «um lar de Terceria Idade, um
Lar de Infância e uma creche».(480) Ao Parque de Jogos de Vila do Mato, inaugurado a
07/09/1986 se atribuiu o seu nome, o mesmo sucedendo a 14/10/1989 com o Parque
Desportivo de Touriz.
Foi sócio benemérito da Associação Recreativa Casalense, a quem doou terreno para a
sede, tendo sido homenageado a 31/08/2001. Faleceu em 1996 sem descendência.

11. JOÃO VICTOR DA SILVA BRANDÃO


João Brandão há muito que ultrapassou as fronteiras da história local. Natural da fre-
guesia de Midões, tornou-se personagem incontornável do mundo regional e do imaginário
nacional (vide foto 122). Figura que não reúne consenso, com o imaginário histórico a
mitificá-lo entre a ideia de herói ou criminoso, sendo epítetos mais divulgados o de «terror
da Beira» ou «Zé do Telhado das Beiras».
O avô paterno de João Brandão, José Brandão, serralheiro, terá vindo de Pombeiro ou
de Aldeia Nova(481) fixando-se em Midões onde contraiu matrimónio com Maria Rosa.
Deste enlace nasceram dois filhos: José Joaquim Brandão e Manuel Rodrigues Brandão.
Manuel Rodrigues Brandão, ferreiro e proprietário casou-se com Antónia Rita, e foram
residentes no Casal da Senhora, numa casa que ainda existe. Deste consórcio nasceram
sete filhos, dos quais se destacou, pela sua acção João Victor da Silva Brandão, nascido a
01/03/1825 (vide foto 123).
João Brandão casou em 1863, na Candosa, actual sede de freguesia do Município
de Tábua, com D. Ana Eugénia de Jesus Correia Nobre, onde ainda se preserva, na

(479)
  MONTEIRO, 2007, p. 152
(480)
  DUARTE, 2009, p. 275
(481)
  SARAIVA, 1986, p. 72; COSTA, 2001, p. 31

293
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

actualidade, a casa da sua família. Um enlace com um elemento de uma família respeitada
da região, com prestígio.
A organização familiar iria contextualizá-lo na área política liberal, não só por in-
termédio do seu pai, mas também pela escolha dos padrinhos, em baptismo realizado
a 26/03/1825: Roque Ribeiro de Abranches Castello Branco, figura ilustre da região,
fervoroso liberal e futuro Visconde de Midões e sua esposa – provando-se assim a forte
ligação entre as famílias dos Brandões e dos Abreus Abranches, cimentada pelos ideais
políticos do liberalismo.
João Brandão frequentaria a escola do professor Bento Inácio Duarte de Almeida, mais
tarde seu inimigo político e aprende latim na residência do padre Joaquim Miranda, em
Cabanas.
O contexto da sua emergência como guerrilheiro ao lado de seu pai, remete-nos para
as lutas liberais que marcaram a vida do país na primeira metade do séc. XIX, opondo os
partidários dos dois filhos do monarca D. João VI, D. Miguel e D. Pedro IV. Luta não só
de irmãos mas sobretudo de ideologias, dividindo o país político e social em dois blocos:
os Miguelistas vinculados ao Antigo Regime e ao Absolutismo; D. Pedro IV, defensor do
Ideal Liberal a questionar o modo de governação do país, fortemente contagiado pelos
ventos oriundos da Revolução Francesa de 1789.
Uma situação que se agravaria com a morte em 1826 do pai dos irmãos litigantes,
pois o seu filho primogénito varão, D. Pedro, era, desde 1822 o primeiro imperador
do Brasil, facto que levantava importantes questões quanto à soberania portuguesa em
relação ao Brasil.
Quando se procurou resolver a situação entre as duas ideologias através da Carta
Constitucional, D. Miguel regressa a Portugal, jura o diploma mas reune as Cortes e faz-
-se aclamar Rei Absoluto.
É neste contexto de divisão ideológica que no Casal da Senhora, o pai de João Brandão,
Manuel Rodrigues Brandão, toma o partido dos liberais, recorrendo à força das armas. O
pequeno tem, nessa altura, 10 anos de idade e assiste ao confisco dos bens do pai pelos
seus ideais liberais durante o governo miguelista, e à prisão de vários elementos da família,
incluindo a própria mãe.
Nas biografias existentes sobre João Brandão, definem o pai como desrespeitador das
instituições judiciais, pactuando com a situação alguns juízes, até que um dia foi colocado
em Midões um juiz que ao opor-se às práticas pagou com a vida tal audácia ficando o
crime impune(482). A mitografia chega a ligar João Brandão a planos de casamento com a
mãe do que viria a ser presidente da República Portuguesa entre 1919 e 1923, António
José de Almeida (1866-1929)
Manuel Brandão, após a vitória liberal de 1834, dedica-se à política e, segundo a histo-
riografia, domina a vida da região, pelo caciquismo, violência e ajuda dos filhos, exigindo

  DUARTE, 2009, p. 298


(482)

294
Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

indemnizações aos apoiantes do Absolutismo pelos anos em que foi perseguido, dado que
o Estado não tinha condições para assegurar essas indemnizações.
Perseguições que se estenderam às quadrilhas miguelistas, como a dos Garranos, tradi-
cional inimiga dos Brandões e liderada por António da Costa Macário, alfaiate, conhecido
como «Caca» e que para alguns foi acto louvável e reconhecido pelo Governo.
Os Garranos continuaram as suas acções criminosas mesmo após o fim da Revolta
da Serra, tendo sido perseguida pelas autoridades e por Manuel Brandão e seus filhos
perdendo, a 21/04/1840, um número muito elevado de elementos, em Lagares da Beira.
Mais tarde, um dos seus membros, conhecido como «Tendeiro» denunciou a Manuel
Brandão o esconderijo da mesma, em Vila do Mato. Então, Manuel Brandão, auxiliado
pelos seus filhos Roque e João, e por 12 soldados do destacamento de Infantaria 9, sedeado
em Midões, cercou a quadrilha e os seus elementos mortos. Consta que Caca se terá sui-
cidado e que os corpos foram cremados no «Outeiro do Caca» situado em Vila do Mato.
No entanto, um dos momentos mais marcantes envolvendo João Brandão aconteceu
em 1842, quando o Juiz da Comarca de Midões, Nicolau Baptista de Figueiredo Pacheco
Telles, natural de Aguieira (Águeda), foi assassinado a 28/08/1842, tendo sido acusado
juntamente com seu pai e outros familiares. Este magistrado fora nomeado por Costa
Cabral para a Comarca de Midões e, embora tenha conseguido resultados importantes,
ganhou também numerosos inimigos.
Terá sucumbido ao entrar na sua residência, vitimado por tiros disparados, defendem
alguns, de uma casa fronteira à do juiz e, à data pertença do ex-professor primário de
João Brandão, Bento Inácio Duarte de Almeida. Um momento extremamente sensível,
pois denegriu a imagem de Midões a nível nacional chegando a debate no parlamento.
Uma época efervescente e uma região em polvorosa, de tal forma que o juiz nomeado
para assegurar a instrução do processo, Dr. Guerra Bordalo, recusou-se a tomar posse,
tendo o mesmo sido instaurado pelo Dr. Manuel Vilela de Sousa Barbosa, acusando
Manuel Brandão da autoria do crime, João Brandão e outros familiares. João Brandão
apresentou-se no tribunal de Tábua mas foi absolvido de todas as acusações, tal como seu
irmão, provando-se terem sido os verdadeiros autores Augusto Pereira Dias, sargento do
Regimento de Infantaria 9, à data estacionado em Midões, e um dos soldados hospedado
na residência de Bento Inácio de Almeida – ambos nunca acusados ou julgados por terem
emigrado para Brasil ou África(483).
Já na década de 40, e no âmbito das rivalidades entre cartistas e setembristas surgem
milícias e batalhões, com novos crimes, lutas e violências, destacando-se o Batalhão de
Midões, milícia na qual se integrava João Brandão e elemento fundamental na sua fun-
dação, solicitada após reunião com o Duque de Saldanha tendo como objectivo enfrentar
os opositores da Carta Constitucional.(484) Este batalhão foi colocado na dependência do

  COSTA, 2001, p. 60
(483)

  DUARTE, 2009, p. 305


(484)

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Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

de S. João de Areias e teve João Brandão como seu comandante. O referido batalhão, de
inspiração cartista, perseguiu setembristas e patuleias, chegando a perseguir familiares do
próprio comandante, como o primo José Brandão, setembrista e então administrador
em Midões.
Este batalhão recebeu altos louvores pelos seus serviços: D. Maria II reconheceu o
comandante e demais praças, em documento de 18/09/1837, pelo desempenho no Sobral
em apoio à Sub-Divisão Militar de Castelo Branco(485); e, a 20/01/1850 um documento
por mandato régio reconheceu a qualidade dos seus serviços «enquanto chefe daquele
batalhão e enquanto elemento importante no combate aos desestabilizadores do concelho
de Midões»(486).
João Brandão, apesar das suspeitas que recaíam sobre o seu carácter foi também um
homem com intervenção política, sendo nomeado vereador da Câmara Municipal de
Midões entre 1849-1854 (vide fotos 124A e 124B), onde se comportou com plena dig-
nidade. De facto, chega a assumir a presidência da CM Midões, em diversos momentos,
se bem que de forma esporádica:
- Entre 06/06/1851 e 02/01/1852, com a renúncia do Bacharel António Abílio Gomes
da Costa, que alega não poder continuar na vereação para poder continuar a exercer
clínica no concelho em plena surto de epidemia(487).
Enquanto vereador apresenta a proposta, a 08/01/1852, aprovada pela vereação para
que se demolissem «…todos os corrais que se achão construídos na Rua do Lairinho, desde
a esquina da caza de Luiza Souza athe á esquina da caza terria de Maria Rozaria»(488). No
projecto de orçamento para 1853 são também suas as propostas de elevação dos salários a
funcionários da Câmara Municipal (escrivão, empregado do relógio), ao Administrador
do concelho e seu Secretário.
- A 23/05/1852 volta a assumir a presidência da Câmara Municipal de Midões, após
renúncia do presidente em exercício António Ribeiro Castelo Branco, com argumentos
pouco claros:
«…tendo de viver d’ora avante uma grande parte do anno na sua Caza de Varzia de
Cavallos, Freguesia de Lobão e Concelho de Tondella, não lhe era possivel servir por mais
tempo nem de membro nem de Prezidente da Camara Municipal de Midões»(489).
João Brandão, na qualidade de vereador quase sempre fica com o pelouro do fiscal,
enquanto que a partir de Dezembro de 1853 faz parte da Junta de Repartidores do
Concelho. Já depois da extinção do concelho, João Brandão surge como presidente da

(485)
  DUARTE, 2009, p. 305
(486)
  COSTA, 2001, p. 61
(487)
  AMT – Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fl. 72v.
(488)
  ibid. fl. 75v.
(489)
  ibid. fl. 81

296
Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

FOTO 108 - Palácio de Valverde

FOTO 109 - Palácio das 4 Estações, postal de princípios do séc. XX

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Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 111 - P
 alácio das 4 Estações,
FOTO 110 - Palácio das 4 Estações na actualidade pormenor

FOTO 113 - M
 uro cenográfico do Solar do Esporão,
FOTO 112 - Solar do Esporão com brasão dos Viscondes do Vinhal

298
Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

FOTO 114 - Casa de João Brandão, postal de princípios do séc. XX

FOTO 115 - A casa onde viveu João Brandão (Casal da Senhora), na actualidade

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Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 116- Capela de Nossa Senhora das Dores, Midões

FOTO 116 - Vestígios do antigo convento FOTO 117 - Vestígios do antigo convento.

300
Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

FOTO 118 - Ruínas Capela de Santa Luzia - Esporão

FOTO 119 - Roque Ribeiro d'Abranches Castelo Branco, 1.º Visconde de Midões

301
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 120 - José Caeiro da Matta FOTO 121 - José Caeiro da Matta assinando o Pacto do Atlântico, 1959

FOTO 122 - João Brandão

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Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

FOTO 123 - Assento de Baptismo de João Brandão [AUC]

FOTO 124A - Assinatura de João Brandão (livro da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854)

FOTO 124B - Assinatura de João Brandão (livro da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854) FOTO 126 - Amândio Nunes Monteiro

303
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

FOTO 125 - Monografia de Midões, de António Duarte d'Almeida Veiga, 1911

FOTO 125A - Casa de João Duarte d'Almeida ou de Lino da Veiga (antepassados de António Duarte d'Almeida Veiga)

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Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

CM Midões para os anos 1854-1855 e, em simultâneo, como presidente da Junta de


Paróquia de Midões(490).
Tal como havia acontecido com as elites militares, também os poderes políticos reco-
nhecem a acção de Brandão: a 15/01/1850 recebeu um louvor enviado pelo Governador
Civil de Coimbra, Tomás de Aquino Martins da Cruz, pela perseguição e morte ao
criminoso Estanislau Xavier de Pina, em Lourosa, concelho de Oliveira do Hospital, a
08/01 do mesmo ano.(491)
Ao chegarmos à década de 60 o seu nome continua associado a crimes e problemas
com a justiça. A 19/08/1860 João Brandão apresenta-se perante as autoridades para res-
ponder às acusações do homicídio do ferreiro João Nunes, cujo julgamento termina com
absolvição dos réus por falta de provas.
A 11/07/1861 o cerco aperta-se. O Ministro da Justiça profere um discurso na Câmara
dos Deputados dando conta de uma ordem enviada ao procurador régio junto da Relação
do Porto para que informasse os seus delegados de Seia, Arganil, Coimbra e, particular-
mente, Tábua, que o Governo se encontrava empenhado na captura do «Criminoso João
Brandão»(492).
Mas o momento decisivo pela viragem na vida de João Brandão acontece em 1866,
ao ser acusado do assassinato do padre José da Anunciação Portugal, residente em Várzea
da Candosa, feitor do Visconde de Almeidinha, João Carlos do Amaral Osório e Sousa
(1822-1890) e administrador das suas propriedades.
João Brandão foi preso a 07/05, em Lourosa, e levado para a cadeia de Tábua, espaço
que corresponde, na actualidade, à Biblioteca Municipal de Tábua a qual tem o seu nome
desde a inauguração a 20/07/2001.
As coincidências detectadas pelos seus biógrafos fornecem elementos dignos de uma
novela policial com o desfecho a ocorrer em Sexta-Feira da Paixão. Para alguns tudo não
passou de uma bem orquestrada armadilha, pois João Brandão estivera no dia do assassinato
em Avô, a assistir às cerimónias da Semana Santa. Defendem que a investigação não foi
cuidada, pois Brandão, embora tenha contactado o padre, estava o mesmo já moribundo
às 11h00 de Sábado. E, acrescentam que a governante da casa, Rosa Oliveira, identificara 3
autores do crime mas não foi ouvida, antes levada para Aveiro, território onde a influência
do Visconde de Almeidinha era muito grande(493).
A 31/05/1869 inicia-se o julgamento em que João Brandão é acusado do crime.
A 4/06 o Tribunal de Tábua, por decisão do Juiz Manuel Celestino Emídio, condena-o

(490)
  AMT – Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854, fls. 97-97v.
(491)
  SARAIVA, 1986, p. 62
(492)
  AHP - Acta da Câmara dos Deputados, 11/07/1861, p. 1764
(493)
  DUARTE, 2009, p. 310

305
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

à pena de morte comutada por trabalhos públicos até ao fim da vida, passada em exílio
na África Oriental(494).
O réu recorre da sentença para a Relação do Porto constando que teve de marchar
sob escolta militar e algemado, tendo o povo procurado consolá-lo e despedir-se dele por
onde passava, rejeitando as fugas que os soldados lhe permitiam por confiar na justiça dos
homens(495). Aquele tribunal confirma a sentença a 19/08/1870 tendo o Supremo Tribunal
decidido de igual forma a 19/08/1870.
A 09/10/1870 João Brandão embarca para África, fixando-se em Catumbela, terras de
Angola, onde foi estimado pelos locais e trabalhou com denodo: a canalização de águas da
cidade de Moçâmedes e a estrada de Benguela ao Lobito foram obras suas(496) .
Em 17 de Novembro de 1880 falece, em circunstâncias pouco claras, eventualmente
envenenado a mando de um sócio(497), tendo sido sepultado à beira da estrada que vai
da Catumbela para o Bailundo, local onde durante muitos anos os locais romavam ao
túmulo, sinal de veneração e amizade.
No entanto, alguns autores defendem que esta tese foi difundida pelas autoridades
para desviar a atenção do que realmente terá sucedido: perseguido pelo novo Governador
de Angola, João das Neves Ferreira Júnior, por ordem das suas inimizades da Metrópole
foi denunciado pelo seu sócio conhecido como Braga e assassinado, desarmado, no lugar
de Caata, perto de Balombo, pelo comandante da força perseguidora, um elemento de
alcunha Viseu. Decapitado, foi a sua cabeça transportada para Benguela. Versão esta
que circulava em Angola nos anos 40/50 e acreditada por César Santos, contabilista e
agricultor, natural de Vide, concelho de Seia, que privou com pessoas que contactaram
com João Brandão e que escreveu uns apontamentos sobre João Brandão, intitulado O
Desventurado de Midões(498).
De todas as obras existentes sobre João Brandão a mais próxima em termos cronológicos
à sua época é a de António Veiga (1912). Este investigador refere que contactou directa
e indirectamente com pessoas que conheceram João Brandão e que após uma pesquisa
fria e imparcial podia concluir que a maioria das situações que rodearam a vida de João
Brandão está contaminada por «traços de lenda». Contudo, admite que grande parte dos
crimes foi praticada por pessoas ligadas a ele sem a sua anuência.
Apesar de condenado e preso, o nome de João Brandão continuou a provocar receios
ou a ser invocado: ora porque corria o boato de se ter evadido e regressado, ou porque
alguém tinha relações de parentesco, ou simplesmente porque a fama dos crimes de Midões
haviam ficado no consciente colectivo das populações.

(494)
  SARAIVA, 1986, p. 81
(495)
  ibid. p. 81
(496)
  ibid. p. 82
(497)
  ibid. p. 81
(498)
  ibid. p. 82

306
Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

O próprio João Brandão contribuiu para perpetuar o seu mito «com a representação
hagiográfica que construiu sobre si próprio numa curiosa e bem escrita obra autobiográfica
(tendo em consideração a limitada formação literária do autor), bem ao gosto romântico
da época, feita na cadeia do Limoeiro»(499).
A sua memória está muito marcada na região dado que existe parentela da sua descendên-
cia. Os testemunhos recolhidos no final dos anos 80 parecem corroborar a ideia de um homem
temível: «O meu pai, que Deus o tenha, me contava que o João Brandão e o seu bando ia na
casa do meu avô (Francisco Sebastião), e às vezes pernoitava lá na aldeia. Como o meu avô
era um grande proprietário e possuía muitos bens, o João Brandão pedia comida e dinheiro
para ajudar na guerra e o meu avô dava-lhe, mas isto porque tinha medo dele (Cristina)» (500).
Muitos responsabilizam os Brandões e, em particular, João Brandão pela ascensão de Tábua
em detrimento de Midões(501). Ocupa lugar de destaque na cultura popular, seja em lendas,
em contos ou em cantigas. o seu nome foi atribuído à Biblioteca Municipal de Tábua. Medida
alvo de crítica por parte de alguma imprensa local e de certos meios culturais e intelectuais.

12. ANTÓNIO DUARTE D’ALMEIDA VEIGA


Escrivão notário em Benavente, onde possuia alguns bens. Casou com Cristina Amélia
Torresão Neves, natural de Samora Correia. A este funcionário da administração judicial
se deve o primeiro grande estudo sobre Midões, a mais relevante fonte de informações
sobre o passado de Midões, à qual estava ligado por laços familiares e sentimentais. Uma
obra em que patenteia algumas das preocupações da nova historiografia (vide foto 125).
Na sua obra, o próprio António Veiga situa a Casa dos Veigas, próximo à Casa dos
Fonsecas Magalhães, construída pelo seu bisavô paterno, João Pires Ferreira, em 1730,
filho de um farmacêutico, com antepassados ligados à arrematação de impostos.
Uma das filhas de João Pires foi Teresa Maurícia Ferreira, casada com José Maria da
Costa Veiga, filho de António Vaz da Costa Veiga e Maria Luísa, do Couto. Aqueles tiveram
vários filhos, entre os quais António Xavier da Costa Veiga, que residente em Alcobaça,
recebeu de D. Luís o título de Barão da Costa Veiga. Do enlace com D. Emília Inácia da
Conceição, nasceu António Xavier da Costa Veiga, que sucedeu ao pai no título.
O primeiro barão da Costa Veiga teve uma irmã, Ana Máxima Delgado, casada com
Diogo d’Almeida Loureiro Castello Branco, que eram possuidores da casa da família em
Midões quando António Veiga editou a sua obra.

(499)
  DUARTE, 2009, p. 320
(500)
  RODRIGUES, 1990, p. 42
(501)
  António de Miramar - «O Concelho de Tábua – Hontem e hoje – Os Brandões IX.» In Comarca de Taboa,
nº 10, 01/02/1930, p. 1-2

307
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Os pais do historiador foram José Maria da Costa Veiga (falecido em Benavente a


12/11/1905), que casou com Maria dos Prazeres Duarte d’Almeida (falecida antes de
1905). Teve como avós paternos Crisóstoma Maurícia Veiga e Bernardo José Delgado.
A mãe do autor era neta materna de José Joaquim Brandão. A casa da família é conhe-
cida como Casa de João Duarte d'Almeida ou de Lino da Veiga (vide foto 125A).

13. LUÍS ABRANTES DA COSTA


Conhecido como Tio Luís Serralheiro, era mestre na arte de trabalhar o ferro.
Aprendeu a profissão em Lisboa e voltou para Touriz pela mão do 1º Visconde de Vinhal,
Dr. Agostinho Borges de Figueiredo, que nos primeiros anos do séc. XX o convidou para
executar as tarefas de serralharia para o Solar do Esporão, tendo feito parte do acordo
a construção de uma oficina em terreno seu no Pinhal de Laija, com casa para habitar.
A sua oficina foi uma escola de serralharia na região onde fizeram aprendizagem dezenas
de artifícies. Dela saíram vários exemplares de genuína serralharia portuguesa encontrando-
-se exemplares por toda a região do Planalto Beirão e Beira Serra. São de salientar: os dois
monumentais portões do Solar do Esporão e outros colocados em solarengas casas de
Midões, Tábua e Oliveira do Hospital.
Gentil, carinhoso, bem-falante, também conhecido como serralheiro filósofo pelos
conhecimentos acumulados. Fez parte da comissão que em 1930 tomou a iniciativa de
construir o edifício escolar de Touriz, oferecendo o gradeamento do muro da frente, o
portão e todos os trabalhos necessários para a conclusão da obra.

14. DR. HENRIQUE DE ALMEIDA


Médico de Clínica Geral, especializado em Pediatria. Natural de Midões onde exerceu
actividade, tinha residência e casou com D. Eugénia da Piedade de Gamboa Abranches
d’Almeida (1901-1993), de quem teve 4 filhos.
Situacionista, fez parte de várias comissões para melhoramentos na freguesia: em 1925,
no angariar de donativos para as obras de reparação da Capela de S. Miguel; entre 1919-
1937, um dos principais impulsionadores do aformoseamento urbanístico de Valverde,
com a construção de fonte e jardim.
Foi, também, um dos impulsionadores da Casa do Povo de Midões e defensor acérrimo
da devolução a Midões da sua autonomia administrativa e judicial.
No entanto, o seu maior legado, em Midões, foi a construção da escola primária,
inaugurada em 1937, para a qual afectou recursos próprios e diligenciando com sucesso
vários apoios estatais e particulares.

308
Capítulo VIII  FAMÍLIAS E PERSONALIDADES

15. PADRE JOSÉ DA COSTA SARAIVA


Nasceu no Porto em 1924, com raízes familiares em Nogueira do Cravo-Oliveira do
Hospital. Ordenado Sacerdote na Sé Nova de Coimbra a 05/04/1947, paroquiou Arganil
e foi Capelão Militar.
Nomeação para a paróquia de Midões por decreto episcopal de 10/10/1984 onde se
manteve até Setembro de 1987, tendo publicado em 1986 uma excelente obra: Monografia
de Midões.
O seu labor enquanto escritor de talento, levou-o a publicar centenas de crónicas no
jornal «A Comarca de Arganil», tendo reunido muitas em livro, como a série «Encruzilhadas
da Vida». No Semanário Portuense «A Ordem» publicou de Maio a Setembro de 2007
uma série de artigos sobre a Doutrina Social da Igreja, abordando temas como a Missão
da Igreja, a Família, o Trabalho, Ambiente ou Promoção da Paz.
A última paróquia onde exerceu foi em Canidelo (Vila Nova de Gaia). Faleceu a
02/12/2009, estando sepultado em Nogueira do Cravo.

16. AMÂNDIO NUNES MONTEIRO


Nascido em Touriz a 25/12/1919, autodidacta, radicado em Lisboa e autor de dois
volumes que constituem a monografia de Touriz, Histórias de um Povo (vide foto 126).
Obteve o curso na Escola Comercial Veiga Beirão, foi bolitineiro-ciclista dos correios,
Carteiro Central de 3ª classe e Carteiro-Cobrador. Trabalhou na Estação Central Telegráfica
do Terreiro do Paço e na Estação dos Correios de Lisboa-Norte, nas Picoas. Colaborador
do jornal Os Olivais, da Junta de Freguesia de Santa Maria dos Olivais.
Casou com Maria José Afonso dos Santos Monteiro, na Vila do Sardoal, a 18/10/1947.
Praticou ciclismo entre 1938-1950, e foi o primeiro natural de Touriz a praticar despor-
to legalmente oficializado, inscrito pela União Velocipédica Portuguesa, antecessora da
Federação Portuguesa de Ciclismo(502). Entre as provas em que participou destaca-se a IX
Volta a Portugal em Bicicleta no ano de 1946.
Foi fundador da ANAP – Associação Nacional dos Aposentados e Reformados dos
Correios e Telecomunicações de Portugal. Faleceu a 24/09/2012.

  MONTEIRO, 2007, p. 209


(502)

309
Fontes
e
Bibliografia
FONTES E BIBLIOGRAFIA

ESTUDOS
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de autor, Novelgráfica-Viseu, 2016
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Historica, Leges, 1856-1868
BEJA, Filomena; SERRA, Júlia; MACHÁS, Estella; SALDANHA, Isabel - Muitos Anos
de Escolas, Vol. I, Edifícios para o ensino infantil e primário até 1941, Ministério da
Educação-Direcção Geral de Administração Escolar, Lisboa, 1990
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DUARTE, Marco Daniel – Tábua: História, Arte e Memória, Câmara Municipal de Tábua,
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GONÇALVES, Osório Eduardo – Raízes da Beira. Genealogia e Património: da Serra da
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LEAL, Augusto Soares d’Azevedo Barbosa de Pinho – Portugal Antigo e Moderno:
Diccionário Geográphico, Estatístico, Chorográphico, Heráldico, Archeológico, Histórico,
Biográphico & Etymologico de Todas as Cidades, Villas e Freguesias de Portugal e Grande
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LOURENÇO, Sandra Alves – O povoamento Alto Medieval entre os rios Dão e Alva,
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Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

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FONTES E BIBLIOGRAFIA

PUBLICAÇÕES PERIÓDICAS
Comarca de Taboa, nº 10, 01/02/1930
A Comarca de Arganil: Ano XXXIII nº 1960, 11/7/1933; Ano XXXVI, n.º 2271,
14/08/1936; Ano XXXVII n.º 2310, 01/01/1937, n.º 2400, 23/11/1937; Ano XLIII,
n.º 2936, 09/04/1943; Ano XLV, n.º 3124, 27/02/1945, n.º 3139, 24/04/1945; Ano
XLVII, n.º 3325, 07/03/1947; Ano LVIII, nº 4815, 14/06/1958; Ano LXIII; n.º 5500,
05/01/1963; Ano XC, N.º 9548, 05/07/1990; Ano CII, n.º 11.270, 16/09/2002;
15/10/2008
A Verdade: Ano 1.º, n.ºs 2, 12/08/1909; n.º 3, 19/08/1909; n.º 4, 26/08/1909; n.º 5,
02/09/1909; n.º 7, 16/09/1909; n.º8, 23/09/1909; n.º 13, 28/10/1909
Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. XVII, Editorial Ld.ª, Lisboa-Rio de
Janeiro

FONTES IMPRESSAS
Documentos medievais portugueses. Documentos régios. I, tomos I e II. Documentos dos
Condes Portucalenses e de D. Afonso Henriques. A.D. 1095-1185. Lisboa, Academia
Portuguesa da História, 1958-1962
Diario das Cortes Geraes Extraordinárias, e Constituintes da Nação Portuguesa, 1837-1838
Diário da Câmara dos Deputados da Nação Portuguesa, 1822-1910
Estatutos da Irmandade do Santissimo Sacramento da Freguesia de Midões, Coimbra,
Typographia das Instituições Cristãs, 1890, 25 pp.

FONTES MANUSCRITAS

Arquivo Nacional da Torre do Tombo

- Cabido da Sé de Coimbra: 1ª Incorporação: Documentos Particulares, M.30, N.º


1246; M.38, Nº 2181; Livro Preto da Sé de Coimbra
- Memórias Paroquiais, vol. 23, n.º 141
- Ordem de Cister, Mosteiro de Lorvão, Antiga Colecção Especial, mç. 1, n.º 5
- Leitura Nova: Livro de Forais Novos da Beira

Arquivo da Universidade de Coimbra

315
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Cabido
- Instituições Pias, Cx. V, Doc. 26; Cx. XII, Docs. 41, 42, 43; Cx. XIII, Docs.1,2, 3, 4
- Livro de registo das confirmações das igrejas do Bispado de Coimbra, 1574-1598
- Livro de registo dos benefícios e colações das igrejas do Bispado de Coimbra, 1589-1593
- Registo de colações no Bispado de Coimbra, 1762-1779

Câmara Eclesiástica
Cx. 12, Doc. 12, Cx. 24, Doc. 3, 9

Fundo do Governo Civil


- Documentos relativos a obras publicas de melhoramentos rurais e urbanos do distrito,
1850-1894 (cx.)
- Inventários de Paróquias e Freguesias, 1838-1854 (cx).
- Registo dos Diplomas dos Professores de Instrução Pública, 1835-1841, 1841-1861,
1861-1881;
- Registo das cédulas passadas a professores, 1845;
- Cadastro de professores, 1843/45;
- Descritivo das cadeiras de instrução primária, sexo feminino no distrito, década 60-70,
séc. XIX,
- Mapa descritivo das cadeiras de instrução primária, sexo masculino no distrito, década 70;
- Mapa descritivo das cadeiras de instrução primária, sexo masculino no distrito, séc.
XVIII e XIX;
- Mapa descritivo das cadeiras de instrução primária, sexo feminino no distrito, década
70 e dados anteriores, séc. XIX;
- Mapa descritivo das cadeiras de instrução primária, sexo feminino no distrito, década
70 e dados posteriores, séc. XIX;
- Movimento dos professores e professoras de instrução primária no distrito de Coimbra,
1888;
- Movimento dos professores e professoras de instrução primária no distrito de Coimbra,
1894
- Reformas Administrativas, 1841-1854, Cx. 466

Paroquiais de Midões
- Mistos, 1565-1699
- Baptismos, 1734-1899

Arquivo da Junta de Freguesia de Midões (AJM)

316
FONTES E BIBLIOGRAFIA

- Livro das Sessões da Junta de Paróquia de Midões: 1862-1871; 1871-1877; 1878-1883;


1883-1893; 1893-1897; 1897-1902; 1905-1911; 1911-1918
- Livro da Receita e Despesa da Junta de Paróquia de Midões, 1873-1925
- Livro da Receita e Despesa da Confraria do Senhor e Santissimo da Vila de Midões,
1802-1850
- Livro da Receita e Despesa da Confraria de Santo Estevão da Vila de Midões, 1802-1839
-Tombo dos bens da Confraria de Santo Estevâo, 1808-1840
- Livro das Derramas Paroquiais e sua aplicação, 1868
- Livro das Actas das Sessões da Junta de Freguesia de Midões: 1918-1937; 1937-1953;
1953-1960; 1961-1968; 1968-1978; 1978-1983; 1983-1987; 1988-1999; 2000-2006;
2007-2014, 2014-2016
- Livro de Actas das Sessões da Assembleia de Freguesia de Midões: 1977-1986; 1986-1990
-Livro da Receita e Despesa da Junta de Freguesia, 1937-1959

Arquivo Municipal de Tábua

Concelho de Midões
- Livro dos Autos e Acordãos do Concelho de Midões, 1826-1834
- Livro das Sessões e Acordãos da Câmara Municipal de Midões, 1838-1839
- Livro das Actas das Sessoes e Acordaos da Câmara Municipal de Midoes, 1839-1840
- Livro das Sessões da Camara do Coito de Midões, 1828-1834
- Livro das Actas, Sessões e Acordãos da Câmara Municipal da Vila de Midões, 1841-1848
- Livro das Actas das Sessões da Câmara Municipal de Midões, 1849-1854
- Livro do Recenseamento dos Eleitores e Elegiveis do Concelho de Midões, 1851-1852
- Livro da Receita e Despesa do Concelho de Midões, 1849-1854
- Livro das Actas das diversas eleições no Concelho de Midões, 1844-1852
- Livro da Caixa da Câmara Municipal de Midões, 1848-1849
- Tombo dos Bens do Concelho de Midões, 1777
- Tombo do Concelho de Midões, 1850
- Livro de Registo de Leis e Ordens do Concelho de Midões, 1827-1829
- Livro de Registo de Posses e Diplomas do Concelho de Midões, 1841-1887

Administração Concelho de Midões


- Livro de Registo de Testamentos da Administração do Concelho de Midões, 1836-1843
- Livro de Registo de Testamentos, Administração Concelho Midões e Administração
Concelho de Tábua, 1850-1857
- Livro de Registo de Passaportes, 1840-1858

Comarca de Midões
- Livro da Matrícula dos Jurados da Comarca de Midões, 1851-1853

317
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

- Livro da Matricula dos Jurados no Julgado de Midões, 1841-1849


- Livro do Recenseamento dos jurados da Comarca de Tábua, 1867-1884

Expostos
- Matrícula dos Expostos do Termo de Midões, 1803-1845
- Matrícula dos Expostos do Termo de Midões, 1845-1849

Arquivo do Centro Paroquial de Tábua

- Livro da Receita e Despesa da Irmandade do SS de Midões 1889-1935


- Livro Actas das Sessões da Irmandade do Santíssimo Sacramento de Midões, 1911-1912,
- Livro da Receita e Despesa da Irmandade de Santa Ana. de Vila do Mato, 1886-1887
- Livro do Tombo da Corporação Fabriqueira Paroquial da Freguesia de Midões, 1927-
2004
- Livro de actas da Conferência de S. Vicente de Paulo, 1936-1937

318
Apêndice
(Documentos e Tabelas)
APÊNDICE (DOCUMENTOS E TABELAS)

DOCUMENTO I
951-955/969 – Mónia doa em testamento ao mosteiro de Lorvão todas as herdades que
possui entre os rios Mondego e Alva, especialmente Midões e Touriz (Tábua) e Friúmes
(Penacova).
Publ: Portugaliae Monumenta Historica, Academia Real das Ciências de Lisboa, 1867,
Vol. I, fac. I, p. 63; Livro Preto, Cartulário da Sé de Coimbra, Arquivo da Universidade de
Coimbra, 1999 Docs. 56 e 56-C, pp. 93-96; António Duarte d’Almeida Veiga - Midões
e o seu velho município (transcrição do latim e tradução por Dr. José António d’Azevedo
Borralho Júnior, de Benavente), pp. 59-64; António Nunes – As Terras de Tábua na Idade
Média, Município de Tábua, 2016, pp. 123-124 (transcrição em latim)

Tradução de latim para português:


Muna dá ao convento de Lorvão todos os seus bens. Extraímos da cópia autêntica do sé-
culo XII, outrora no arquivo do Mosteiro de Lorvão, e, presentemente guardada na biblioteca
publica. Acrescentamos do livro dos registos de varias notas explicativas tiradas do Livro Preto
da Sé de Coimbra, assim chamado, onde se encontra esta carta.
Aos senhores invencíveis e triunfadores santos mártires Santo Mamede e Santo Pelágio, de
cujos mártires de Cristo a basilica é situada no logar muito falado (ou conhecido) perto do
monte de Lorvão, no território de Coimbra. Eu pois indigna e mesquinha Muna oprimida pela
grandeza dos meus pecados e não impelida por qualquer desesperação, e não só pela consciência
serena o meu estado de criminosa, como, por tal motivo, precise reconciliar-me com o Senhor,
por isso foi isto escripto. Votai e entregai a Deus Nosso Senhor. Assim, eu acima nomeada,
Muna, em meu perfeito juízo, completa disposição e perfeito entendimento de vontade de
paz, apraz-me fazer a minha carta de testamento em favor do mesmo lugar e dos vossos santos
altares de toda a minha herança presente e que de futuro possa adquirir. Outrossim vos dou,
e ao santo convento as propriedades que possuo no predicto lugar entre o Mondego e o Alva.

321
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Em primeiro lugar dou-vos toda a minha villa chamada de Midões, com os seus mosteiros,
com as suas honras (?) e com os seus termos antigos, e toda a outra minha villa de Touriz, e
dou-vos as mesmas villas com as suas honras em todo o seu contorno. Em primeiro Iugar pelo
rio de Cavalos até sua entrada no Mondego, e do outro lado pela villa de Travanca, ce dali
por onde aquela archana (?) entra no Mondego. Dou-vos também o seu porto com a barca de
Midões, e acrescento a outra minha villa que se chama Flamianes que está situada na margem
do Alva com os seus arredores, limites antigos e mosteiros com suas honras e uma biblioteca. E
tudo que indiquei vos concedo inteiramente por interesse de minha alma e de meus pais e em
favor da iluminação dos vossos altares e esmolas (?) dos pobres, e assim finalmente o queremos,
e indubitavelmente afastamos a ideia de que assim se não faça por que quando alguém venha
ou vier tentar contra esta minha disposição ou decreto para o anular, seja em primeiro lugar
excomungado, e seja tido como estranho a todo o ajuntamento cristão e pelo corpo e sangue
de Nosso Senhor Jesus Cristo seja tido como cúmplice de Judas traidor para que o seu corpo
não seja enterrado, ou o amaldiçoem desde o dia em que se prepare para invocar o diabo e
seja condenado no quadruplo a vosso favor, e pague um talento de oiro. E este meu feito tem
a minha plena aprovação. Feita esta carta de testamento aos 22 de janeiro. Na era de 1007
((503)), Eu Muna esta carta testamento que mandei fazer a corroboro com as minhas mãos.
Com as minhas mãos a corroboro.

Seguem-se as assinaturas dos bispos, príncipes, e funcionários que constam da trans-


crição em latim.

  Corresponde a 969 da era vulgar


(503)

322
APÊNDICE (DOCUMENTOS E TABELAS)

DOCUMENTO II

1131, 20 de Março: Carta a favor do mosteiro de Lorvão, a qual são coutados o


mosteiro de Sperandei (c. Viseu) e as villae de Sabugosa (c. Tondela), Treixedo (c. Santa
Comba Dão) e Midões (c. Tábua), e se faz doação ao dito mosteiro de toda a propriedade
reguenga situada no couto de Rio de Asnos

Publ: Documentos Medievais Portugueses I (Tomos I e II),. Documentos Régios, pp. 154-
156, nº 132; António Nunes – As Terras de Tábua na Idade Média, Município de Tábua,
2016, pp. 135-137 (transcrição em latim)

Em nome da Santa Trindade, Pai e Filho e Espírito Santo, Trindade para sempre una,
pelos séculos dos séculos.
Eu, D. Daniel de Lorvão, o escolhido do Infante Afonso, gloriosíssimo imperador
de Espanha, neto e cônsul de D. Henrique e da rainha Teresa, filho de Deus, príncipe
providente de todas a província de Portugal, impelido a nenhuma necessidade e a ne-
nhuma perturbação, incorrida anteriormente, mas com garantida e benigna vontade,
vosso devoto, abade e monge de São Mamede de Lorvão, escrevo o testamento, isto é, o
couto assinado para quatro de vossas vilas referidas do mosteiro, que se chama Esperança
de Deus com suas adjunções, a vila de Sabugosa, vila de Treixedo, terra de Sene, a vila
de Midões, que são testamento de São Mamede de Lorvão.
Faço esta Carta de Couto, em reparação da minha alma e pela alma de meu pai,
D. Henrique e pela alma de minha mãe, D. Teresa; e pelo serviço que me realizaste e
hás-de realizar para sempre, porque me tenhais dado cento e vinte marabitinos de ouro;
e ainda, enquanto viverdes, sempre tenhais memória de mim nas vossas orações, nas
vossas missões e nas orações do mosteiro. E têm terrenos adjacentes da referida vila do
território de Viseu, ao tomar, de inicio, este couto do mosteiro de Esperança de Deus,
através da entrada de Carriza e ainda pelo Lombo, do modo como divide o riacho
de Asim com a vila de Souto, pela estrada que fica entre Ferronidum e Keygeyrum. E
avança na direção da estrada que divide Santa Comba com Masgalos (Couto de Cima);
ainda, do modo como divide com Portela e atravessa o riacho de Asim entre a vila de
Daide e o riacho de Asinis, e impele para a estrada de Daide Maiore e a atravessar
pelo casal de Godino Gunsaluj; e ainda pela encosta e do modo como atravessa a terra
do velho Cleit com o campo de Nodeyro e conclui interiormente pela herdade que foi
de Arias Mennediz; do modo como divide com a Vila Cova e avança pelo Lombo entre
Magarelos e Tábua e atravessa o riacho de Asim e ainda pelo Monte de Boi até à Pedra
Redonda, e ainda para que habitemos de início.
E o couto de Sabugosa começa por aquela antiga Arcanam do campo entre Sabugosa
e São Miguel de Outeiro e chega à ribeira de Sabugosa pelo lombo entre ambos vales
e impele naquela estrada e prossegue a antiga via secreta pelo monte para aquele do

323
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

modo como divide Sabugosa com Parada e atravessa junto ao riacho de Asinis até à
ponte, a continuar no caminho inativo junto ao monte para a estrada de Santa Maria
de Canas e atravessa junto ao riacho de Sabugosa que divide com a Varzea de Frades
e ainda junto à água de Suario Ferrario e junto ao monte que se situa entre Fravegas
e Sabugosa até donde iniciamos primitivamente.
E o couto de Trexedo inicia no Monte Maurraz, continua junto à Arcanam, do
modo como divide com Tonda, junto à ponte da ribeira Adone e continua junto ao
fruimen, junto ao castro Terrenium e junto ao lombo do modo como divide com Santa
Comba com Trexide, junto da estrada de Genestosa, a continuar pela estrada junto à
pedra rugudeyra e até pela carreira que continua para Tondam até ao Monte Mauraz
onde começamos primeiramente.
O couto inicial junto à porta de Midões e ainda pela estrada até junto da
Pousadouro, e caminha junto a esta estrada até junto ao forno térreo, junto ao vale
e do curral, junto do lago e desce junto do campo para a vinha de Vermudo Miguel,
continua junto à estrada até junto da ponte do rio de Cavalos e prossegue pelo caminho
inativo pelo próprio riacho até abranger; junto ao vale que divide Midões com Teorize
e até junto à Arcanam que fica entre Midões e Travanca e que segue para o riacho de
Sena, e pelo próprio riacho desce até ao Mondego e segue junto ao Mondego até junto
ao lugar que começámos.
Faço isto de minha própria vontade, com a minha mente sã, espírito integro e da
melhor autoridade, nem remorso, para que por este dia ou tempo seja de meu juizo
retirado e no vosso domínio seja tradição e confirmação para sempre.
E se alguém que faça, não acredito que algum homem venha ou virá, tanto eu como
seu vizinho ou estrangeiro, que as referidas precauções vir a querer penetrar violenta-
mente os domínios, seis mil soldos a restituir-vos, e seja condenado pelo poder real ou
pelos vossos sucessores; e ainda quanto prejuízo vier a fazer, recompense quatro vezes
mais pela Santa, também ao cuidado da Igreja Matriz o que for segregado, e com Judas
traidor, seja punido pelo Senhor, com a sentença de ser anátema pra sempre.
Realizada series de cauções a 20 de Março de 1131.
Eu, Afonso, já referido, com esta própria mão assino e confirmo e faço o sinal.
[…]

[Tradução de latim para português (Dr. Frederico Serôdio)]

324
APÊNDICE (DOCUMENTOS E TABELAS)

DOCUMENTO III

1169, Novembro, 13 (Lafões) – D. Afonso Henriques outorga à Sé de Coimbra metade


do Couto de Midões (c. Tábua), uma vez que a outra metade havia sido dada anteriormente
ao mosteiro de Lorvão (c. Penacova)
Publ: Livro Preto da Sé de Coimbra, pp. 102-104, nº 60; As Terras de Tábua na Idade
Média, Município de Tábua, 2016, pp. 135-137 (transcrição em latim)

CAUTUM VILLE MIDONIS QUOD FECIT ADEFONSUS REX DOMNO MICHAELI


COLINBRIENSI EPISCOPO

O Couto da vila de Midões que fez D. Afonso ao Senhor Bispo de Coimbra, D.


Miguel
Em nome da Santa e individua Trindade Pai e Filho e Espírito Santo, amén.
Eu, Afonso, rei da divina Província de Portugal, sobrinho do ilustre imperador de
toda a Espanha, D. Afonso, filho de D. Henrique e de D. Teresa, impelido por nenhu-
ma necessidade, mas movido pela pronta e benevola vontade e amor diivino, vos tinha
garantido, D. Miguel, bispo de Coimbra, e seus sucessores e canónicos da sé de Santa
Maria de Coimbra, faço este couto sobre a metade da vila de Midões, que é metade, por
direito e poder, da sede referida, pois a outra metade já outrora junto dos seus limites
pertence ao mosteiro de Lorvão, pela remissão da minha alma.
Os limites desta metade da sede de Santa Maria são, e assim os ordenamos delimitar,
isto é, pela parte de Aquilões, na porta do rio Mondego que chamam porta de Midões,
debaixo da ponte da pedra destruída, onde termina a parte do mosteiro de Lorvão, e
aí, a saber, na referida porta, inicia o termo da metade da sede de Santa Maria, do
modo como separa através do meio do rio com Ulveira do Conde; da parte de Aquilões,
vindo em sentido oposto a África para ambos coutos da sede do mosteiro, que começam
em simultâneo pelo próprio porto; assim, do modo como caminha através da própria
via perigosa para outros ambos coutos, que são fixos naquele outeiro que se chama
Pousadouro, pelo que homens e mulheres, cansados de hostilidade, aí descansam; assim,
como se sobem numa linha reta através das planícies, até junto de ambos os coutos que
são fixos em simultâneo, na vila Varzeana de Forno Tegularum e caminha a direto
junto à estrada, e leva à queles outros coutos que são em simultâneo fixos, perto da
estrada, dos quais se vê uma pedra desordenada, por outro lado em simultâneo parece
haver homens, como uma estátua; na verdade, do modo como caminha para ambos
coutos que estão em linha reta, dividindo a meio pela extensão, até que alcança aquela
grande pedra nativa que fica junto à porta dos cavalos, e aí junto segue em linha reta
para outro couto da sé, do modo como separa Tuiriz e Vila Plana e Covas; ainda, do

325
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

modo como se estende do Oriente para Ocidente, pelo meio caminho, percorrendo do
rio de Cavalos até aquele porto, onde a ribeira de Covas desagua no rio Cavalos; e
como desagua no Candanosa, pelo meio caminho, e assim segue aquele couto que está
no meio do rio, no local onde fica aquela pedra na direcção de África que chamam de
Aquilas, oposto aquele monte que se chama Monte Acutus; e pelo mesmo referido couto,
do modo como avança da ribeira de Cavalos para Ocidente, até ao outro couto que
fica no término entre Tábua e Midões. Do modo como divide o rio entre outra Varzea
até ao couto que fica acima da foz da Varziela, onde desagua a Varziela na ribeira
de Cavalos; e sobre como segue o rio de Cavalos para outro couto que está a meio da
estrada daquele Porto, que chama o porto das Paredes, para com outro porto que vinha
de Tábua para Oliveira de Currelas.
E do modo como do mesmo porto corre água, como percorre para aquele estreito
que fica a meio do percurso do Rio de Cavalos, e fica sobre aquela presa de moinho que
está na parte inferior; ainda pela aquele estreito supra referida, do modo como desagua
para Aquilão, em direcção pela encosta do Monte, em ascenção para aqueles penedos da
costa do Monte. E subo para cimeira da lomba daquele monte que está sobranceiro do
Mondego. E da parte de cima entre o Mondego e Cavalos, onde se situa aquele couto
que sobranceia cada uma das partes. E daí desce entre o Mondego e Aquilão que fica
na encosta do Monte. E desce para aquele couto que fica na encosta Mondego por onde
aquele leito seco do vale de Martinho desagua no Mondego aí pelo meio do percurso
do Rio Mondego. Assim deste modo sobe de ocidente para oriente por meio do vale do
Mondego a direito. E por aquela Varzea, incluindo nela que atravessa para os primeiros
coutos superiores da Sé e do Mosteiro que ficam no referido porto de Midões e até ao leito
do rio que divide Oliveria do Conde da parte de Aquilões, e Midões da parte de Austral.
Ainda, o couto da metade da referida vila de Midões, para honra de Deus e da
Virgem Santa Maria, faço e confirmo de boa vontade, mente sã, com espírito integro,
comas estradas e campos com suas caraterísticas, com suas margens e suas águas, fontes,
montes, pastagens e prados, vales, bosques, terrenos limpos e incultos, e com tudo o que
aí existe para serviço do homem. Assim está concluído, com estes termos, a referida carta.
Para que, a saber, alguém tenha nossos direitos, ou se algo recaia ao poder régio,
desde esse dia até agora do nosso direito e de tudo com poder régio, para todo e sempre
seja tirado. E em vosso domínio seja tradição e assim confirmado agora e para sempre.
Ao saber, na verdade, que faço isto para remedio da minha alma, dos meus parentes e
a favor do bom serviço que sempre me fizestes. Na maior consideração que seja confiado
em nossa memória para sempre com vossas orações.
Se alguém que não permitimos levar de modo algum, nem acreditamos, viesse
como vizinho ou estrangeiro, e cuja dignidade ou pessoa, alguém fizesse que os referidos
coutos viessem presumidamente roubar ou penetrar violentamente, faça-vos aceitar 6
mil sólidos em moeda e é obrigado a restituir ao poder régio; e o quanto terá tomado
da abundância, reúna quatro vezes mais. Além disso, pela comunhão da Santa Mãe

326
APÊNDICE (DOCUMENTOS E TABELAS)

Igreja e pelo concelho dos fiéis seja separado, ferindo com espada pela excomunhão, e seja
deixado no fogo interminável do inferno, com o diabo e seus anjos, com castigo eterno.
Realizada com estas coutos limitados e confirmada, junto de Lafões, em 13 no-
vembro do ano 1169. Eu, D. Afonso, rei de Portugal, com consentimento dos meus
filhos, naturalmente, com o rei Sancho e a rainha Urraca e ainda Teresa, na presença
de testemunhas idóneas, este carimbo, com minha mão própria, assino e confirmo***
E por isso Eu, Rei Sancho, esta carta, que meu pai mandou escrever, assino e confir-
mo. E ainda, Rainha Teresa, esta carta, que meu pai mandou escrever, assino e confirmo
(sinal rodado) Rei Afonso*; Rei Sancho, seu filho*; Rainha Teresa, sua filha
Os que estiveram presentes:

Pedro [Feigion] notário do rei, notificou.

[Tradução de latim para português (Dr. Frederico Serôdio)]

327
APÊNDICE (DOCUMENTOS E TABELAS)

DOCUMENTO IV

1257, Julho – Acordo entre a abadessa do Mosteiro de Lorvão, D. Marinha Gomes, e


o concelho de Midões, sobre os foros que os moradores desse lugar e couto do mosteiro
devem pagar

Publ: Portugalia Monumenta Historica, Leges, p. 674 (transcrição em latim); António


Duarte d’Almeida Veiga - Midões e o seu velho município (transcrição do latim e tradução
por Dr. José António d’Azevedo Borralho Júnior, de Benavente), pp. 120-125; António
Nunes – As Terras de Tábua na Idade Média, Município de Tábua, 2016, pp. 142-143
(transcrição em latim)

Em nome de Deus. Saibam todos os homuns tanto presentes como futuros que eu
D. Marina de Gomes, por graça de Deus abadessa de Lorvão, conjuntamente com a
minha vontade e desejos vos concedo carta de fôro do concelho de Midões, contanto que
nos seja dada em renda cada ano da mesma vilIa supra, a oitava parte do pão, vinho,
linho e legumes: = e além disto, como fogaça, cinco alqueires de centeio ou de outro
pão qualquer que haja, e quatro alqueires de trigo, aquele que tiver vinhas e casal ou
fazenda pequena murada, e aquele que tiver casa sem vinha dará uma galinha e dez
ovos, ou tendo vinhas sem casa e trabalhando nelas dê cinco alqueires e uma quarta
do vinho, tendo só vinha dará o que quiser; aquele que tiver porco dará o corazil(504), e
vendendo-o dará uma galinha, porém se pagar a dinheiro não dê nenhum fôro em géne-
ro; e se matar porco que valha dez soldos dará o corazil; vendendo-o dará uma galinha;
de porco que comprar não dê foro, mas se o comer dê corazil. O mordomo …(505)?... E
aquele que quiser vender a sua herança, venda-a ficando o comprador obrigado a este
fôro e dê-nos a oitava parte, do preço da venda, mas não venda nem a militares, nem
a ordenados(506) nem a freiras. As penas são(507): por homicídio vinte morabitinos(508) e
por deitar esterco humano na boca de outrem vinte morabitinos(509) e aquele que atirar
ferro(510) paga dez morabitinos; e fizer a alguém sangue sobre os olhos paga também dez

(504)
  Manta de toucinho
(505)
  Este período que se refere à cobrança do pão nas eiras e á sua divisão é, ao que parece, absolutamente
intraduzível, pelo menos para os simples latinistas. Os curiosos eruditos poderão resolver o problema no
original que fica atrás. Já a restante tradução é bastante livre mas não pode deixar de ser, embora procuremos
cingir-nos, quanto possível á letra
(506)
 Eclesiásticos
(507)
  As penas em que incorrem os criminosos
(508)
  O morabitino valia 400 réis da actual moeda
(509)
  Este crime que aparece em todos os forais parece ser comum naqueles tempos, e ser considerado gravíssimo,
pois é equiparado a homicídio.
(510)
  Ferirem com?

329
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

morabitinos. E aquele que negar multa ao mordomo, pague-lhe a mesma multa em


dobro; e aquele que quebrar (desmentir?) o testemunho do mordomo perde dois mora-
bitinos: de casa arrombada sessenta soldos(511), quem ameaçar o mordomo perde vinte
morabitinos: aquele que puxar de cutelo com ira pague dois soldos, e perca este dinheiro
com o cutelo. Para aplicar estas penas convença-se o mordomo inquirindo os homens
bons e mesmo os que o não são. De portagem de um boi dê um dinheiro(512), de besta
carregada de pescado dê um soldo se vender o peixe todo, e se o não vender entenda-se
com o mordomo; por carga de burro seis dinheiros, de carga de vinho uma quarta, carga
de sal sobre besta cavalar um almude (?), de burro um alqueire, de portagem de boi
para trabalho, um soldo, e por boi que quiserem matar seis dinheiros; vaca outro tanto,
e por coiro (?) outro tanto, e pela pele de cordeiro feito cinco dinheiros, pele de cabrito
feita quatro dinheiros, e outra compra qualquer em morabitinos quatro dinheiros; e de
porco dois dinheiros; e de outra compra algum dinheiro, e de besta cavalar dois soldos; e
de burro um soldo; e por penhora de casa grande dê um morabitino e quatro dinheiros,
e aquele que se revoltar(513) pague quatro dinheiros. Todos os homens de Midões façam
uma estrada de carro para Lorvão ou para outro lugar qualquer de maneira que possa
no mesmo dia chegar a sua casa com palavra na boca e carta na mão: e do porto e do
barco dê uma fogaça(514) e uma galinha. E todo aquele que se oponha ao que dispõe
esta nossa carta seja maldito, e entregue ainda ao inferno e condenado em quinhentos
morabitinos pela parte roubada a Deus. Foi feita esta carta no mês de julho da era
de M.C. C. e noventa c cinco (que corresponde a era de Cristo de 1257). Estiveram
presentes o irmão Matheus provedor do mosteiro, Dom Mendo Dom Egídio monges de
Alcobaça, João Pedro e João ou….capelães do mosteiro, e o juiz de Midões Dom Paz,
e João ... e Pedro… que são as testemunhas.

(511)
  O soldo valia sessenta e tantos reis
(512)
  O dinheiro de ouro valia 625, o de prata 62, e o de cobre 5 reis aproximadamente
(513)
  Contra a penhora?
(514)
  Um presente

330
TABELA A – MAGISTRATURAS DE MIDÕES, 1687-1855
Data Juiz Ordinário Vereadores Procurador Escrivão
1687 - Domingos Henriques Antonio Francisco
- Luis Alverez
1721 António Cabral Soares de Bernardo do Amaral Freire
Albergaria Sarmento
1777 Joze Soares de Oliveira Joze Pedro
1788 Id. - Manoel Rodrigues Cardozo Antonio Pereira Id
- Luis Francisco Saraiva
1790 Joze Garcia - Luis Antunes Simões Antonio Nunes
- Joze Rodrigues
1816 José Maria da Costa Veiga Joaquim Joze de Lemos
1821 - Antonio Antunes Martins
1826 - Dr. Aristides Ribeiro de Joze Ramos Joze Ferrão Joaquim Joze de Lemos
Abranches Castelo Branco Joze da Crus

331
- Dr. Cezar Ribeiro de Abranches Joze Thomas (vereador mais velho)
Castelo Branco
1827 - Dr. Aristides Ribeiro de Bernardo Anriques (Val de Gaios) Manoel Madeira da Fonceca Id.
Abranches Castelo Branco Antonio Pereira (Val de Coiso) (Povoa)
(Midões) Joze Thomas (vereador mais velho)
- Joze Maria da Costa Veiga
1828 - Dr. Luis Monteiro Soares de Francisco Madeira (Póvoa) - Antonio de Brito Id.
Albergaria Cabral Fortunato Dunhão - Antonio Feliciano (Midões) Joze Antonio da Costa
- Joze Ramos Ascenso (Casal da
Senhora)
1829 Joze Ramos (Casal da Senhora) - Francisco da Cruz (Midões) Gaudencio Joze Martinz (Póvoa) - Joze Antonio da Costa
- Joze Francisco (Casal da Senhora) - Antonio Maria da Costa Veiga
1830 Fortunato Denhão - Joze Castanheira Joze Francisco Ramos Id.
-Luiz Rodrigues
APÊNDICE (DOCUMENTOS E TABELAS)
Data Juiz Ordinário Vereadores Procurador Escrivão
1831 Luis Antonio Felleciano (Midões) - Joam Francisco (Póvoa) Joam Soares Garcia (Casal de Id.
Bel. Sebastiam de Albuquerque - Francisco Marques (Póvoa) Vasco)
Pinto Tavares Castelo Branco (Vila
de Midões)
1832 Luis Borges (lugar da Póvoa) - Francisco Antonio Botelho António Francisco Ramos (Casal da
(Póvoa) Senhora)
- Joze Monteiro (Casal da Senhora)
1833 Gaudencio Joze Martins (Póvoa) - Antonio Gomes Moço (Val de Joze Ramos (Casal da Senhora)
Taipa)
- João de Moura (Val de Gaios)
1834 Joze Francisco Ramos - Luis Garcia (Casal da Senhora) Joze Borges (Vasco) António Maria da Costa Veiga
- Antonio Madeira (Quinta de
Baixo)
- Francisco Roiz Brandão
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332
DATA Presidente da CMM Vice Presidente Vereadores Procurador Fiscal Escrivão
1835 Bento Ignacio Duarte Id.
d’Almeida?
1837 Antonio da Cunha Id.
Costa Oliveira Azevedo
1838 Domingos Borges de Joze da Rocha (Vil do Efectivos (Camaristas) Luis Alberto de Amaral Id.
Figueiredo Cardozo Mato) - Ricardo Antonio da Costa Veiga (Póvoa) (Covas)
(Esporão) - João Nunes Martins (Póvoa)
-Antonio de Chaves (Póvoa)
Bernardo Couto (Oliveirinha)
Bernardo Joze Delgdo (Vila de Midões)

Substitutos:
- Luis Duarte (Vargia)
- Joze Rodrigues Villa Cham (Vil do Mato)
- Luis de Almeida (Candosa)
-Antonio de Alcantra (Cadoiço)

333
- Joze da Crus (Vila de Midões)
1839 Bernardo Joze Delgado Joze Soares de Efectivos: Antonio Chaves
(Vila de Midões) Albergaria Pereira (Vil - Antonio Rodrigues Brandão (Vila de Midões) Meirelles (Póvoa)
do Mato) - João Nunes
- Luis Borges
- Manoel Ignacio (Póvoa)
- Antonio Maria da Costa (Pòvoa)
Substitutos:
Antonio Ribeiro Dias (Póvoa)
Antonio Soares (Póvoa)
Manuel Nunes (Percelada)
LUis Duarte (Vargia)
JOam Dantas (Balocas)
Antonio de Souza Faria (Vargia)
Antonio de Brito (Vargia)
APÊNDICE (DOCUMENTOS E TABELAS)
DATA Presidente Vice-Presidente Vereadores Tesoureiro Procurador Fiscal Secretário
1840 - Antonio da Cunha Domingos Borges Efectivos: Joze Ramos Jozé Da Cruz Id.
Costa Oliveira Azevedo de Figueiredo - Antonio Coelho (Casal da
- Domingos Borges de Cardozo - Antonio Joaquim de Oliveira Senhora)
Figueiredo Cardozo - Antonio Britto (Varzia)
- Antonio da Cunha
- Antonio Soares Antunes
Substitutos:
- Antonio de Alcantra (Cadoiço)
- Alexandre de Souza Nrago
- Luiz Joze da Costa (Oliveirinha)
- Maximo Tavares
- Manoel Coelho Junior
- Francisco Botelho
Manoel Joze Ignacio
1841-1842 -Bento Ignacio Duarte - Joze Soares de Albergaria -José da Cruz - Francisco Id.
de Almeida - Antonio Maria da Costa Veiga (Vila de Midões) Rodrigues Brandão Antonio Jose
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334
-Domingos Borges de - João Lourenço de Abreu Mesquita - Luis Soares da Fonseca
Figueiredo - Domingos Borges de Figueiredo d’Albergaria (30/6/1842)
Antonio Maria da (Vila de Midões,
Costa Veiga 27/7/1842)
1843-1844 Bento Ignacio Duarte - Luiz Borges Id. Id.
d’Almeida - Manoel Ignacio de Gouveia
- Manoel Joaquim Borges de
Figueiredo
1845 - Joze Joaquim Brandão Antonio Ignacio, Antonio Xavier Joze da Crus Id.
-Bernardo do Couto, Delgado
-Antonio de Vasconcellos Abranches
Castello Branco
1846 - Jose da Cruz -Domingos Borges de Figueiredo Id.
- Joze Soares da -João Lourenço d’Abreu -Bernardo
Fonseca Magalhaes do Couto
-Luiz Borges
DATA Presidente Vice-Presidente Vereadores Tesoureiro Procurador Fiscal Secretário
1847 - Joze Soares de Domingos Borges - Bernardo do Couto Luis Borges Ambrozio Sanches
(Comissão Albergaria de Figueiredo - João Lourenço da Fonseca
Municipal) - Domingos Borges de De Abreu Mesquita
Figueiredo
1848-1849 - Bento Fortunato de - Francisco Rodrigues Brandão Bernardo Jose -Bernardo Joze Id.
Oliveira de Carvalho - Ricardo Antonio da Costa Veiga Delgado Junior Delgado José Maria da Costa
- Francisco Rodrigues - Antonio Pinto de Almeida (Póvoa) (Vila de Midões) - Joze da Cruz Veiga
Brandão - Manoel Joaquim Borges
- Joze da Cruz (Midões)
1850-1851 -Francisco Rodrigues - João Victor da Silva Brandão Bernardo Joze - Bel. Antonio José Maria da Costa
Brandão (1850) - Joze da Cunha da Costa Veiga Delgado Soares de Albergaria Veiga
-Dr. António Abilio - Antonio Joaquim Botto; - Francisco
Gomes Costa - José da Cruz Rodrigues Brandão
-João Victor da Silva - Domingos Borges de Figueiredo - João Victor da
Brandão Silva Brandão
-Manoel Joaquim Borges

335
1852-1853 Antonio Ribeiro de - Ambrozio Sanches da Fonceca Id. - João Victor da Id.
Abranches Castello - Manoel Joaquim Borges Silva Brandão
Branco - Joze da Cunha da Costa Veiga
- João Victor da Silva - Joze da Cruz
Brandão
- Manuel Joaquim
Borges
-Joze Soares da Fonseca
1854-1855 João Victor da Silva - Joze da Cunha da Costa Veiga
Brandão - Joze da Cruz
- Antonio de Chaves Murellos
- Antonio Ignacio
Fontes: Livros dos Autos e Acórdãos do Concelho de Midões, 1826-1838; Livro das Sessões e Acordãos da Câmara Municipal de Midões, 1838-1839 LIvro das Actas das
Sessoes e Acordaos da Câmara Municipal de Midoes 1839-1840; 1841-1848; 1849-1854; Livro das Actas das diversas eleições no Concelho de Midões 1844-1852; Livro
da Matricula dos Jurados da Comarca de Midões, 1851-1853; Livro da Câmara de Midões, 1788-1792; Livro de Registo de Posses e Diplomas do Concelho de Midões,
APÊNDICE (DOCUMENTOS E TABELAS)

1841-1887; Tombo dos Bens do Concelho de Midões, 1777


APÊNDICE (DOCUMENTOS E TABELAS)

TABELA B – POSTURAS DO CONCELHO DE MIDÕES, 1850


Titulo 1º
Capitulo 1.º
«Da repressão do dano causado por animais»
Art.º 1º - Todo o animal que for encontrado em dentro de terreno tapado com parede ou qualquer
tapume pagara a seu dono por cabeça --------20 reis.
Art.º 2.º - Todo o animal que for encontrado fazendo dano na seara, pomar, vinha horta ou mata
pagara a seu dono por cabeça ----30 reis.
Art.º 3.º Toda a cabeça de gado que for encontrada em lugar plantado de arvoredo ou semeado com
semente de pinheiros castanheiros ou sobreiros nos primeiros 12 anos depois da sementeira ou plantação
pagara seu dono por cada cabeça – 40 reis.
§1.º Exceptuam-se os casos dos artigos antecedentes em que o transgressor provar não ter havido dolo
nem negligencia.
Art.º 4.º - Todo o gado que for encontrado em olival carvalhal ou souto no tempo dos frutos pendentes
pagara seu dono por cabela—40 reis.
Art.º 5 – Todo o porco boi ou besta que for encontrado pelas ruas estradas ou campos divagando sem
pastor mesmo sem fazer dano pagara seu dono por cabeça-100 reis.
Art.º 6.º - O que caçar com matilha de cães em propriedades tais e em tempos tais que a sementeira e
as colheitas dos frutos sejam por isso prejudicados pagara – 200 rs.
Art.º 7.º - De toda a cabeça de gado de fora do concelho que for encontrado nos logradouros públicos
deste concelho pagara seu dono por cabeça ----- 40 rs.
Titulo 2.º
«Da repressão do dano causado pelos homens»
Art.º 1.º - Quem for encontrado conduzindo ramos de carvalho ou castanheiros ou sobreiro pagara
por molho ou ramos – 150 e por carrada – 2400 rs
Art.º 2.º - Quem conduzir carvalho ou castanheiro ou sobreiro cortados «por o pe piquenos» pagara
por cada um – 100 rs.
Art.º 3.º - O que conduzir pinheiro cortado pelo pé pequeno pagara por cada um – 60 rs.
Art.º 4.º - O que conduzir molhos de cavacas de carvalho, sobreiro ou castanheiro pagara por molho
e oliveiras – 800 rs.
Art.º 5.º - O que conduzir molho de cavacas de pinho pagara por molho – 400 rs.
Art.º 6.º - O que for encontrado com paus ou estacões de empar videiras fora de suas fazendas sendo
secos pagara por cada um – 100 rs.
Art.º 7.º - Aqueles cujos pátios ou casas forem encontrados os objectos mencionados nos artigos an-
tecedentes encorrem nas penas dos respectivos artigos.
Art.º 8.º - Os transgressores das posturas dos artigos antecedentes deste título serão absolvidos das
penas neles marcados provado que os ditos objectos foram trazidos de suas fazendas ou que lhes foram
vendidos ou dados.
Art.º 9 – Para a execução dos artigos antecedentes poderão os zeladores mexer molhos e carradas além
de verificarem as transgressões das posturas antecedentes deste título.
§1.º Também poderá entrar qualquer zelador nas casas e pátios dos habitantes deste concelho acom-
panhado ou de outro zelador ou de duas testemunhas para servirem de prova /no caso da entrada/ à
transgressão da postura.
Art.º 10º - O que for encontrado com cesto ou vaso em qualquer predio frutífero seja seara horta
pomar vinha ou m arvoredo frutífero como olival soito carvalhal etc. só por esse facto pagará – 100 rs.
§1.º Se for encontrado à saída do prédio com fruto ou hortaliça pagará – 240 rs.

337
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

§2.º - Se para praticar o furto tiver subido arvore pagará – 240 rs.
§3.º - Se no acto de praticar o furto tiver deteriorado o prédio como derrubado pedras ou rompendo
tapumes e balados; ou se tiver danificado as plantas cortando ou cobrando ramos às arvores ou cortando
pela aste corveias? ou outras plantas de jardinagem pagará – 1200 rs.
Art.º 11.º - Os transgressores do artigo antecedente só poderão ser absolvidos mostrando que o seu fim
só era apanhar ervas do monte porque se conhecera por as circunstâncias que acompanharem o encontro.
Art.º 12.º - Aquele que for encontrado com algum produto de campo que não possa ter um prédio
seu pagará – 200 rs.
§1.º Exceptua-se o caso de ser encontrado com as ervas chamadas =caldo do monte= ou com cepos
ou raízes de árvores anteriormente cortados chamados vulgarmente =tocos= porque neste caso não
tem lugar a multa.
§2.º Artigo 12 obriga aos indivíduos de fora do concelho só no caso de serem encontrados fora das
estradas e neste caso sendo desconhecidos o fim da pena cominada no artigo serão conduzidos a cadeia
e aí retidos até pagarem a multa não podendo a prisão exceder a 3 dias.
Art.º 13.º - Os transgressores do artigo antecedente são absolvidos provando que os objectos encon-
trados lhe forão dados ou vendidos.
Art.º 14.º - Aquele que fizer secar arvore alheia macerando-a serrando-a ou por outro qualquer modo
que seja pagara – 4000 rs.
Art.º 15º - Aquele que golpear ou tirar bocado de casca a árvore sendo frutífera pagará-1200 sendo
infrutífera pagará – 600 rs.
Art.º 16.º - Aparecendo alguma árvore descascada a roda do tronco pisada ou macerada no pé ou tronco,
esgalhadas ou mal tratadas ou ramos que nascem dos pés das árvores e nas cachopeiras como costumam
fazer os maus vizinhos, só por este facto ficarão os donos dos prédios vizinhos que não distarem da
árvore mais de 12 passos obrigados cada um a pagar – 1200 rs.
§1.º E não poderão ser absolvidos se não provando que foi outro o deliquente ou mostrando a sua
inocencia pela continua e exemplar conduta de sua vida a tal respeito ou por qualquer outro meio.
Art.º 17 º - Aquele que abanar estaca ou aluir árvore plantada de novo pagará – 1200 rs.
§1.º Se a inspeção ocular mostrar claramente que a árvore foi abanada ou aluída e esta estiver próxima
a estrema no caso de se queixar seu dono, o dono da estrema que não distar mais de 5 passos da árvore
ainda mesmo que não tenha sido visto abaná-la ou aluí-la pagará 1200. E só poderá ser absolvido nos
casos de provar que foi outro delinquente ou mostrar a sua inocência por exemplar conduta de sua
vida a tal respeito ou por outro qualquer meio.
Art.º 18.º - Aquele que depois de ter arrancado cepos ou tocos nas matas e não arrasar as covas que
para tal fim tiver feito pagará – 60 rs.
Art.º 19.º - Aquele que saltar valado parede ou tapume alheio e neste acto danificar a mesma parede,
valado ou tapume pagará – 60 rs.
Art.º 20.º - Aquele que por qualquer forma fizer morrer algum animal alheio domestico fora do acto
de lhe causar dano pagará: por cão – 3000 rs; por gato – 100 rs; por perú ou pato – 600 rs; por galo
ou galinha – 200 rs; por pombo – 60 rs.
Título 3.º
«Da policia das estradas e aquedutos públicos»
Art.º1.º - Aparecendo na estrada na rua aquedutos públicos entulhos ou qualquer material para eles
lançado que lhe dificulte o transito das águas e dos viandantes, o dono do prédio que contesta com a
rua aqueduto ou estrada assim embaraçada pagará – 1000 rs.
§1.º Exceptua-se porem o caso das estrumeiras nos povos aonde se costume estrumar…
Art.º 2.º - Os individuos de que trata o artigo antecedente só serão absolvidos provando que os trans-
gressores foram outros

338
APÊNDICE (DOCUMENTOS E TABELAS)

Art.º 3.º - Aquele que fizer covas poços ou valados contíguos á estrada de forma que esta não fique
deles separada por marachão ou parede pagará – 1200 ficando alem disso obrigado a por o caminho
no antigo estado
Art.º 4.º - Aquele que na sua fazenda a borda da estrada tiver silvas arbustos arvores ou ramos destas
inclinados sobre a estrada de forma que o trânsito desta seja embaraçado tanto a pé como a cavalo
pagará dono ou cazeiro – 200 rs.
Art.º 5.º - Aquele cujo carro boi ou besta for encontrado em estrada ou rua parado dificultando o
trânsito ou andar sem guia que o conduza pagará por cada um – 200 rs.
Art.º 6.º - Aquele em cuja fazenda forem desaguar «agolheiros» boeiros agoeiros ou como lhe queiram
chamar por onde as águas se derivam das estradas encontrando-se estes tapados ou entupidos pagará
dono ou cazeiro – 120 rs.
Título 4.º
«Sobre a polícia de fontes e saúde publica»
Art.º 1.º - Aquele que lançar ou atirar com qualquer coisa para dentro da fonte pagará – 400
Art.º 2.º - Aquele que lavar nas pias da fonte ou atirar com alguma coisa para dentro delas pagará – 200
Art.º 3.º - Aquele que despejar tanques de fontes ou tanques ou poços contíguos aos nascentes das
fontes aonde os povos tem posse de lavar pagará – 480
§1.º Exceptua-se o caso de incêndio ou de mandado de autoridade para a sua limpeza
Artº4.º - De todo o animal que aparecer desenterrado 24 horas depois da sua morte sendo boi, burro,
cavalo, muar, pagará seu dono – 1000
§1.º Se for porco, cabra, ovelha ou cão ou animal de menor tamanho pagará seu dono – 240
Título 5.º
«Disposições Gerais»
Art.º 1.º - As posturas obrigam igualmente homens e mulher, obrigam aos pais pelos filhos aos amos
pelos criados de servir podendo estes descontar nas coletadas ou multas que tiverem pago por negli-
gência deles
Art.º 2.º - Quando os transgressores ou seus responsáveis não tiverem por onde paguem a importância
das multas serão conduzidos à cadeia e ali retidos por 3 dias e não excederá a multa a 3.000 reis
Art.º 3.º - À excepção das posturas sobre impostos do município ficam revogadas todas as outras do
que aqui se não faz particular menção
Capítulo 2.º
«Instruções para os zeladores»
Art.º 1.º - Haverá pelo menos em cada povoação deste concelho que tenha 10 fogos um zelador para
guardar os campos.
Art.º 2.º - Os zeladores são zeladores em todo o concelho e por isso podem acoimar não só no seu
lugar ou freguesia mas também em todo o concelho. Serão acreditados pelo seu juramento sem mais
alguma prova excepto nos casos adiante mencionados.
Art.º 3.º - Ficam obrigados a auxiliarem-se mutuamente para fazerem guardar as posturas
Artº 4.º - no caso do furto clandestino de hortaliças frutas telhas madeiras ou outro qualquer objecto
poderão entrar nas casas suspeitas para poder descobrir o furto e apreendê-lo mas não poderão por si
sós fazer esta deligência, e será preciso para ela ter lugar ou reunião de 2 zeladores ou de 1 só zelador
com 2 pessoas que presenciem o facto e sirvam de prova.
Art.º 5.º - Todo o zelador que for convidado por outro zelador ou outra qualquer pessoa para praticar
as deligências do artigo antecedente e as não for praticar pagará – 200 rs.
§1.º Esta multa pode ser acusada ou pelo zelador ou pela pessoa convidada mas no primeiro caso é
preciso uma testemunha e no segundo duas que presenciassem o convite.

339
Freguesia de Midões  UMA HISTÓRIA MILENAR (951-2017)

Art.º 6.º - A pessoa ou pessoas que sendo convidada pelo zelador para as buscas do art.º 4.º para pre-
senciar qualquer infração de postura se a isso se recusar pagará – 200 rs.
§1.º - O zelador porém não poderá acusar esta multa sem uma testemunha que presenciasse o convite.
Art.º 7.º - Aquele que insultar espancar ameaçar ou injuriar de qualquer forma o zelador no exercício
de suas funções pagará – 300 rs.
§1.º O delinquente porem sem a prova de uma testemunha alem da fé do zelador. E não poderás er ab-
solvido se não provando a sua defesa o ter sido provocado pelo zelador ou outro motivo justo e atendível.
Art.º 8.º - Cada zelador dará ao menos uma coima por mês e se a não der sinal da sua negligência só
por esta comissão será condenado pelo respectivo Juiz Eleito no principio do mês seguinte na quantia
de – 1200
§1.º Exceptua-se o caso de impossibilidade de a dar.
Art.º 9.º - Os oficiais da Câmara podem também exercer as funções de zeladores e bem assim os
escrivães dos Juizes Eleitos
Art.º 10.º - O zelador que fizer avenças com os habitantes do concelho esta sujeito às penas de açoites
e um no de degredo para fora da Vila e Termo na forma da Ordenação Livro 5.º, Titulo 73 §1.º
Art.º 11.º - O zelador e mais pessoas que reunirem as suas atribuições presenciando alguma infração
de postura e não acusam pagará – 300 rs.
§1.º Esta multa lhe poderá ser acusada por qualquer cidadão dando uma testemunha para prova da
negligência do zelador.
Titulo 6.º
Instruções para os Juizes Eleitos
Art.º 1.º Aos Juizes Eleitos compete também na forma do art.º 144…fazer goardar nas suas freguesias
as posturas municipais e por isso
Art.º 2.º - Cada Juiz Eleito fará com seu escrivão pelo menos mensalmente uma correição aos pesos e
medidas e se encontrar pesos pouco exactos e não aferidos ou conhecer que alguém compra ou vende
por medidas que não sejam aferidas pelos padrões do concelho, ou que alguém tem pesos dobrados logo
lhes imporá a multa conforme a Ordenação Livro 1.º Titulo 1.º §32§40§54 cuja multa é de 280 reis
Art.º 3.º - Outrossim pelo menos uma vez cada mês fará uma correição às estradas, ruas e aquedutos
públicos procedendo contra os transgressores das posturas do Título 3.º
Art.º 4.º - Outrossim todos os meses fará correição às fontes públicas procedendo contra os transgres-
sores das posturas do Título 4.º
Art.º 4.º - O Juiz Eleito nas correições que fizer aos caminhos e fontes em cada limite de cada povoação
deve fazer-se acompanhar de pessoas da mesma povoação munidas de instrumentos necessários para a
reparação de qualquer deterioração que não seja filha de negligência ou acção dos homens, por exemplo
de um sacho para avivar algum agolheiro ou levantar alguma pedra caída, uma roçadoura ou machada
para cortar algum ramo inclinado sobre a estrada de um vaso para despejar e limpar a fonte etc.
Art.º 5.º - Aqueles que se recusarem a acompanhar os Juizes Eleitos nas correições de caminhos e fontes
com os instrumentos que ele lhes indicar pagarão 120 rs.
§1.º E só poderão ser absolvidos provando que o Juiz não destribuiu este serviço por torno e igualdade
pelos vizinhos da povoação.
Artº 6.º - Outrossim na mesma correição que fizerem pelos povos os Juizes Eleitos inquirirão se os
zeladores ou rendeiros das coimas fizeram avença com as partes ou com os que fizeram os danos antes
de serem as coimas julgadas. E se acharem que as fazem prendam-nos logo e remetam-nos ao Juiz de
Direito ou Ordinário para procederem contra eles ordinariamente tudo na forma da Ordenação Livro
1.º Título 68 §14 e serem condenados a açoutes e degredados para fora da Vila e Termo Ordenação
Livro 5,º Titulo 63 §1
§1.º O Juiz Eleito não pode obstar a que alguém acompanhe a correição e convide para assistir a ela o
Rendeiro das Coimas e na falta deste o Oficial da Câmara ou um Vereador.

340
APÊNDICE (DOCUMENTOS E TABELAS)

Art.º 7.º Na forma da Ordenação Livro 1.º Titulo 68 §15 O Juiz Eleito que no seu oficio e nas correi-
ções antecedentes não fizer cumprir as posturas e não impuser as multas competentes pagará por cada
uma que devia impor – 2400
§1.º Os Rendeiros das Coimas poderão acusar esta multa perante o Juiz de Direito ou Ordinário e
as provará com uma testemunha e qualquer particular as poderá acusar tendo de as provar com duas
testemunhas.
Art.º 8.º - Cada Juiz Eleito até o primeiro Domingo de cada mês apresentará à Câmara um relatório do
que encontrou de notável na correição do mês antecedente das multas que deu, nomes dos multados e
das alterações que tenham aparecido nas estradas e fontes etc. e em artigo separado dará também uma
relação das coimas que sentenciou no mês antecedente = sua importância, nome do condenado, nome
do acusador e motivo da acusação
Art.º 9.º - O Juiz que não satisfizer ao determinado no artigo antecedente na época marcada além das
penas em que incorre pelo artigo seguinte pagará – 1400 rs. e será logo debitado para com a Camara
nesta quantia pela qual o Fiscal o demandará no Juízo Superior no caso de ele não entrar com ella na
Recebedoria.
§1.º O Juiz Eleito só será absolvido desta pena apresentando recibo da entrega do relatório mensal
passado pelo Escrivão da Câmara o qual neste caso sofrera no seu ordenado o abate de quantia igual
a esta multa.
Art.º 10 O Juiz Eleito que cada mês além das multas impostas nas correições mensais não sentenciar
pelo menos tantas coimas quantos são os zeladores da sua freguesia para tantos = 1300 = quantas forem
as coimas que faltarem para fazer um soma de coimas igual a que lhe devem acusar os zeladores na
forma do art.º 8.º das instruções para os Zeladores, e esta quantia que será liquidada a vista do relatório
mensal ser-lhe-á lançada em débito para com a Câmara e por ela será demandado no Juizo Superior
§1.º O Juiz Eleito só poderá ser absolvido da pena deste artigo provando a excepção do §1.º do art.º
8.º das instruções aos zeladores ou a injustiça das coimas acusadas.
Art.º 11.º - O Juiz Eleito a quem chegar a noticia algum dos casos do art.º 16 e 17 do Titulo do dano
causado pelos homens ou seja pelo presenciar ou por alguém lho fazer saber imediatamente se dirigirá
ao lugar do delito e verificará a pessoa sobre quem recaia multa que deve impor.
§1.º O Juiz Eleito que não cumpra este artigo pagará uma multa que lhe será acusada pela Câmara seus
oficiais rendeiros ou por qualquer pessoa com uma testemunha da quantia de – 1500 rs.
Art.º 12.º - O Juiz Eleito que nas correições fizer ou consentir que se faça aos habitantes deste concelho
exigências que não estão marcadas nas leis ou posturas pagará por cada exigência acusada pela Com.ª
ou por qualquer cidadão com uma testemunha – 1500 rs.
Art.º 13.º - O produto de todas as multas será aplicado duas partes para a Municipalidade e uma para
quem a requerer ou acusar.

[Fonte – AMT: Livro das Actas das Sessões da CM Midões, 1849-1854, fls. 23-31]

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