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Uilson Nunes de Carvalho Júnior
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Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
O poeta Luís Vaz de Camões, in "Sonetos", citado acima, afirma que o mundo é composto
por mudanças – continuamente. A comunicação sempre teve um ofício importante na sociedade
pois, ao longo da história humana, a comunicação passou por diversas mudanças “tomando sempre
novas qualidades”, numa tentativa de aperfeiçoar a interação entre os sujeitos. Todavia, é nos anos
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Mestrando em Letras, estudos linguísticos, no Programa de Letras, da Universidade Federal de São Paulo, Unifesp
90 do século XX que a forma de interação entre os sujeitos é transformada cabalmente com o
advento da internet e o uso das novas tecnologias de telecomunicação apropriadas pela prática
social nas diferentes esferas das atividades humanas. Os sujeitos passaram a se comunicar em
tempo real, independente de qual fosse sua localização geográfica, por meio de mensagens de voz,
de imagens, de textos, por vídeos, numa verdadeira simbiose de linguagens. E, com o surgimento
do aparelho celular e dos smartphones2, esta interação passou a ser muito mais dinâmica,
porquanto não é mais estática na frente de um computador, e sim móvel, isto é trata-se de um
movimento desterritorializado. Se antes o indivíduo poderia acessar a rede mundial apenas em um
computador em local fixo, já por meio dos smartphones este acesso não se limita territorialmente,
desde que a rede esteja disponível no local de acesso.
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Segundo Manuell Castells (2017), atualmente, somos uma sociedade em rede, estamos
conectados continuamente, interagindo em rede, mesmo estando ao lado, ou perto, longe ou do
outro lado do planeta. Portanto, observa-se uma reconfiguração, recontextualização não só das
relações sociais, como também das práticas discursivas que têm de ser capazes de estabelecer
comunicação em diferentes mundos com vários sujeitos, organizados em redes, e muitos com uma
espécie de second life (segunda vida) extremamente ativa em mundos digitais. Todas essas
mudanças estabeleceram novas perspectivas discursivas que já estão em uso em diferentes
instâncias da linguagem. Nesse contexto tecnológico, nota-se que a linguagem no uso do aplicativo
WhatsApp é assinalada pela presença de profusas semioses em sua composição multimodal (como
apontamos anteriormente), provocando efeitos de sentido heterogêneos, que de alguma forma,
transmuda o próprio conceito do modo de comunicar-se e interagir; produzido pelos variados
meios de enunciar.
Esse aparato tecnológico faz com que diferentes áreas do conhecimento se debrucem
sobre ele para realizar pesquisas, estudos acadêmicos, numa tentativa de compreender o
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Os Smartphones surgiram em 1992 – Simon, da IBM.
fenômeno. Dentre as várias áreas do conhecimento que buscam entender o fenômeno das novas
tecnologias, encontra-se a Linguística. Por meio da utilização do Whatsapp, os sujeitos
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constroem socialmente seu discurso no âmbito digital. O discurso só é discurso se estiver
relacionado a um sujeito que se coloca ao mesmo tempo como fonte de referências pessoais,
temporais, espaciais (EU-AQUI-AGORA).
Desta forma propomos analisar um post de vídeo publicado na interação de um grupo
no aplicativo Whatsapp, constituído por familiares locados em quatro Estados brasileiros
(Bahia, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo) utilizando a categoria analítica – contexto –
com base na Análise do Discurso e Linguítica Textual.
Apresento um breve escopo da AD (doravante Análise do Discurso) e da LT (dorante
Linguística Textual) e o obejto de estudo – post vídeo no Whatsapp – e em seguida a proposição
analítica de observação do post de vídeo analisado na perspectiva contextual da AD e da LT,
ultimando as considerações finais e novos caminhos de junções linguísticas.
1. ANÁLISE DO DISCURSO
A língua, para AD é considerada opaca e heterogênea. O seu sentido não está impregnado
na palavra, porquanto é um elemento simbólico, não concluído e nem preciso, por isso sempre
incompleto; destarte o sentido pode escapar. Para Pêcheux (1993) a língua é a forma de
materialização da fala, contando com os planos material e simbólico; o discurso produzido pela
fala sempre terá relação com o contexto sócio histórico – “em outras palavras, um discurso é
sempre pronunciado a partir de condições de produção dadas.”
Como se verifica nas colocações de Pêcheux, a AD entende que “todo dizer é
ideologicamente marcado”. A formação discursiva é entendida como o posicionamento do
sujeito quando se filia a um discurso, sendo o processo de constituição do imaginário que está no
inconsciente, ou seja, o sistema de ideias que constitui a representação; a história representa o
contexto sócio histórico e a linguagem é a materialidade do texto gerando indicadores que
possibilitam pontuar o sentido que o sujeito pretende dar.
Dominique Maingueneau, professor da Université Paris- -Sorbonne (Paris IV), retoma as
discussões acerca das profusas concepções sobre discurso e análise do discurso atualmente. Para
ele, o termo discurso tem significados diferentes ao se opor entre: discurso e frase, unidade
transfrástica; discurso e língua, concebida como sistema e seu uso em contexto e discurso e texto.
O estudioso francês apresenta alguns encaminhamentos sobre as noções de discurso como: o
disrcuso é uma organização para além da frase, é uma forma de ação, é interativo, é
contextualizado, é ancorado por um sujeito, é regido por normas, é tomado em um interdiscurso
e é um construtor social de sentido.
Se faz necessário, então, diante do nosso objeto de estudo compreendermos que o
Whatsapp é um fenômeno linguístico constituído na e pela enunciação e desdobra-se em dois
planos discursivos (cf. 3LANDOWSKY, 1989, p. 222): o da enunciação como ato “pelo qual o
sujeito faz ser o sentido” e o do enunciado [discurso] como “objeto cujo sentido faz ser o sujeito”,
dado que sujeito e discurso se acham estreitamente ligados por meio do ato enunciativo; os
agentes sociais têm no App uma forma de relacionarem e interagirem por meio da língua(gem)
digital estabelecida pelos recursos multimodais de comunicação disponíveis, na qual o discurso
não é instituído, mas, constituído pelo simultâneo embricamento de esferas singulares, universais
e particulares presentes na formação discursiva dos discursos/enunciados evidenciados pelo
lugar social de onde emerge no app a enunciação dos sujeitos discursivos, assim como os
diversos modos da subjetividade enunciativa.
Conforme as considerações feitas, o discurso compreende uma série de implicações como
a interação, contexto, sujeitos, normas, espaço, tempo, sua relação com os discursos. Todas elas
são importantes para tratarmos essa nova forma de interação entre sujeitos por meio de suportes
de mensagens on-line.
O discurso na esfera digital, na cibercultura, é virtualizado; possibilitando efeitos de
sentidos diversos. Em uma plataforma de troca de mensagens, por exemplo, podemos ter no
mesmo grupo uma variedade significativa de interação entre os sujeitos – Texto, imagens, vídeo,
caracteres, emoticons, áudio ou um gif na troca de turno no discurso. Cada tipo recurso de
interação virtual mencionada (textos, imagens...) caracteriza um campo específico do discurso
digital e tem sua implicação particular no que tange ao que mobilizam discursivamente.
O discurso digital constituído por meio de emoticons, por exemplo, é um tipo de
enunciado que apenas ocorre em meios virtuais. Não enunciamos no mundo real emotions. No
2. LINGUÍSTICA TEXTUAL
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KOCH, Ingedore. Grunfeld. Villaça. (2002) Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez
diversas práticas sociais, bem como o conhecimento de outros textos que permeiam nossa cultura
– intertextualidade.
Observar os fenômenos de linguagem no aplicativo Whatsapp a partir dessa ótica seria
buscar sentidos instaurados na interação de uma atividade sociocomunicativa a partir de um
contexto essencialmente sociocognitivo, o que leva a concluir que o sentido de um texto é,
portanto, construído na interação texto-sujeitos (ou texto coenunciadores) e não algo que preexista
a essa interação, ou seja, o sentido se revolve entre texto e leitor, nos conhecimentos partilhados
entre produtor e receptor e ativados na atividade interpretativa.
3. ANÁLISES DO CORPUS
Os elementos linguísticos constituídos são muito ricos, e demandariam uma análise mais
detalhada do aplicativo e este não é nosso fito neste artigo. Desta forma nos deteremos no conteúdo
do vídeo, a fim de analisarmos neste espaço este fenômeno linguístico materializado.
Figura 1 - Post de Vídeo
Enunciador - 1
O vídeo é composto por um diálogo entre uma mulher e uma criança, sobre o
pronunciamento gráfico de um substantivo comum. Segue abaixo a transcrição do diálogo:
Mulher: Hadassa!
Hadassa: Oi...
Mulher: Cuscuz, é com S ou com Z?
Hadassa: ééé... eu não sei não. Aqui em casa é com ovo...
BIBLIOGRAFIA
KOCH, Ingedore V.; ELIAS, Vanda Maria. O texto na linguística textual. In: BATISTA,
Ronaldo de Oiveira (org.). O texto e seus conceitos. São Paulo: Parábola Editorial, 2016 (p.
31-44)
KOCH, Ingedore. Grunfeld. Villaça. (2002) Desvendando os segredos do texto. São Paulo:
Cortez.
KOCH, Ingedore. Grunfeld. Villaça. & TRAVAGLIA, Luiz Carlos (1989) Texto e Coerência.
São Paulo: Cortez.