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POST DE VÍDEO NO WHATSAPP:

UM OLHAR CONTEXTUAL POR MEIO LT E AD.

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Uilson Nunes de Carvalho Júnior

RESUMO: Tanto a Análise do Discurso quanto a Linguística Textual estudam a


linguagem e tem como objetos a língua, sujeito, texto, contexto e sentido. Todavia, possuem
peculiaridades em seus pressupostos adotados, que são diferentes, a fim de analisarem e definirem
o mesmo fenômeno. Em vista disto, este trabalho tem como fito verificar por meio da LT e AD,
no âmbito da categoria de análise “contextos”, a linguagem em um post de vídeo no aplicativo
Whatsapp, como também, identificar a possibilidade de alguma complementaridade analítica entre
as duas ciências. Os elementos linguísticos constituídos no objeto em análise (áudio, textos,
imagens, emoticons, figurinhas, vídeos etc) são muito ricos, e demandariam uma investigação mais
detalhada do aplicativo e esta não é nossa proposição no artigo. Desta forma nos deteremos no
conteúdo do vídeo, a fim de observarmos neste espaço este fenômeno linguístico aqui
materializado. Para tanto, utilizamos os estudos de Koch (2002) e Maingueneau (2011).

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Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,

Muda-se o ser, muda-se a confiança:

Todo o mundo é composto de mudança,

Tomando sempre novas qualidades.


Continuamente vemos novidades, ...

O poeta Luís Vaz de Camões, in "Sonetos", citado acima, afirma que o mundo é composto
por mudanças – continuamente. A comunicação sempre teve um ofício importante na sociedade
pois, ao longo da história humana, a comunicação passou por diversas mudanças “tomando sempre
novas qualidades”, numa tentativa de aperfeiçoar a interação entre os sujeitos. Todavia, é nos anos

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Mestrando em Letras, estudos linguísticos, no Programa de Letras, da Universidade Federal de São Paulo, Unifesp
90 do século XX que a forma de interação entre os sujeitos é transformada cabalmente com o
advento da internet e o uso das novas tecnologias de telecomunicação apropriadas pela prática
social nas diferentes esferas das atividades humanas. Os sujeitos passaram a se comunicar em
tempo real, independente de qual fosse sua localização geográfica, por meio de mensagens de voz,
de imagens, de textos, por vídeos, numa verdadeira simbiose de linguagens. E, com o surgimento
do aparelho celular e dos smartphones2, esta interação passou a ser muito mais dinâmica,
porquanto não é mais estática na frente de um computador, e sim móvel, isto é trata-se de um
movimento desterritorializado. Se antes o indivíduo poderia acessar a rede mundial apenas em um
computador em local fixo, já por meio dos smartphones este acesso não se limita territorialmente,
desde que a rede esteja disponível no local de acesso.

Os Apps, abreviação da palavra “applications”, ou aplicativos, ampliaram ainda mais este


processo comunicacional. Dentre os vários aplicativos oferecidos pelas tecnologias digitais, temos
o WhatsApp, um dos mais populares dentre eles, que permite criar grupos, enviar imagens, gifs,
vídeos, mensagens de áudio, emotions, arquivos, realizar chamadas de voz e por videoconferência,
tudo em real-time. Nesse aplicativo, há possibilidade de se valer dos diferentes gêneros discursivos
para estabelecer a comunicação com o co-enunciador.

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Segundo Manuell Castells (2017), atualmente, somos uma sociedade em rede, estamos
conectados continuamente, interagindo em rede, mesmo estando ao lado, ou perto, longe ou do
outro lado do planeta. Portanto, observa-se uma reconfiguração, recontextualização não só das
relações sociais, como também das práticas discursivas que têm de ser capazes de estabelecer
comunicação em diferentes mundos com vários sujeitos, organizados em redes, e muitos com uma
espécie de second life (segunda vida) extremamente ativa em mundos digitais. Todas essas
mudanças estabeleceram novas perspectivas discursivas que já estão em uso em diferentes
instâncias da linguagem. Nesse contexto tecnológico, nota-se que a linguagem no uso do aplicativo
WhatsApp é assinalada pela presença de profusas semioses em sua composição multimodal (como
apontamos anteriormente), provocando efeitos de sentido heterogêneos, que de alguma forma,
transmuda o próprio conceito do modo de comunicar-se e interagir; produzido pelos variados
meios de enunciar.

Esse aparato tecnológico faz com que diferentes áreas do conhecimento se debrucem
sobre ele para realizar pesquisas, estudos acadêmicos, numa tentativa de compreender o

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Os Smartphones surgiram em 1992 – Simon, da IBM.
fenômeno. Dentre as várias áreas do conhecimento que buscam entender o fenômeno das novas
tecnologias, encontra-se a Linguística. Por meio da utilização do Whatsapp, os sujeitos
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constroem socialmente seu discurso no âmbito digital. O discurso só é discurso se estiver
relacionado a um sujeito que se coloca ao mesmo tempo como fonte de referências pessoais,
temporais, espaciais (EU-AQUI-AGORA).
Desta forma propomos analisar um post de vídeo publicado na interação de um grupo
no aplicativo Whatsapp, constituído por familiares locados em quatro Estados brasileiros
(Bahia, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo) utilizando a categoria analítica – contexto –
com base na Análise do Discurso e Linguítica Textual.
Apresento um breve escopo da AD (doravante Análise do Discurso) e da LT (dorante
Linguística Textual) e o obejto de estudo – post vídeo no Whatsapp – e em seguida a proposição
analítica de observação do post de vídeo analisado na perspectiva contextual da AD e da LT,
ultimando as considerações finais e novos caminhos de junções linguísticas.

1. ANÁLISE DO DISCURSO

Os estudos da AD de linha francesa situam-se na conexão entre a organização


linguística e o lugar social de sua produção e circulação. Sem apenas se deter nos elementos
linguísticos, observa a materialidade da/na formação; isto é, lida com o sentido e não com o
conteúdo do texto, um sentido que não é traduzido, mas produzido; Como aponta Orlandi (1998,
p. 17), " ao passo “que tomar a palavra é um ato social com todas as suas implicações, conflitos,
reconhecimentos, relações de poder, constituição de identidade...”

A língua, para AD é considerada opaca e heterogênea. O seu sentido não está impregnado
na palavra, porquanto é um elemento simbólico, não concluído e nem preciso, por isso sempre
incompleto; destarte o sentido pode escapar. Para Pêcheux (1993) a língua é a forma de
materialização da fala, contando com os planos material e simbólico; o discurso produzido pela
fala sempre terá relação com o contexto sócio histórico – “em outras palavras, um discurso é
sempre pronunciado a partir de condições de produção dadas.”
Como se verifica nas colocações de Pêcheux, a AD entende que “todo dizer é
ideologicamente marcado”. A formação discursiva é entendida como o posicionamento do
sujeito quando se filia a um discurso, sendo o processo de constituição do imaginário que está no
inconsciente, ou seja, o sistema de ideias que constitui a representação; a história representa o
contexto sócio histórico e a linguagem é a materialidade do texto gerando indicadores que
possibilitam pontuar o sentido que o sujeito pretende dar.
Dominique Maingueneau, professor da Université Paris- -Sorbonne (Paris IV), retoma as
discussões acerca das profusas concepções sobre discurso e análise do discurso atualmente. Para
ele, o termo discurso tem significados diferentes ao se opor entre: discurso e frase, unidade
transfrástica; discurso e língua, concebida como sistema e seu uso em contexto e discurso e texto.
O estudioso francês apresenta alguns encaminhamentos sobre as noções de discurso como: o
disrcuso é uma organização para além da frase, é uma forma de ação, é interativo, é
contextualizado, é ancorado por um sujeito, é regido por normas, é tomado em um interdiscurso
e é um construtor social de sentido.
Se faz necessário, então, diante do nosso objeto de estudo compreendermos que o
Whatsapp é um fenômeno linguístico constituído na e pela enunciação e desdobra-se em dois
planos discursivos (cf. 3LANDOWSKY, 1989, p. 222): o da enunciação como ato “pelo qual o
sujeito faz ser o sentido” e o do enunciado [discurso] como “objeto cujo sentido faz ser o sujeito”,
dado que sujeito e discurso se acham estreitamente ligados por meio do ato enunciativo; os
agentes sociais têm no App uma forma de relacionarem e interagirem por meio da língua(gem)
digital estabelecida pelos recursos multimodais de comunicação disponíveis, na qual o discurso
não é instituído, mas, constituído pelo simultâneo embricamento de esferas singulares, universais
e particulares presentes na formação discursiva dos discursos/enunciados evidenciados pelo
lugar social de onde emerge no app a enunciação dos sujeitos discursivos, assim como os
diversos modos da subjetividade enunciativa.
Conforme as considerações feitas, o discurso compreende uma série de implicações como
a interação, contexto, sujeitos, normas, espaço, tempo, sua relação com os discursos. Todas elas
são importantes para tratarmos essa nova forma de interação entre sujeitos por meio de suportes
de mensagens on-line.
O discurso na esfera digital, na cibercultura, é virtualizado; possibilitando efeitos de
sentidos diversos. Em uma plataforma de troca de mensagens, por exemplo, podemos ter no
mesmo grupo uma variedade significativa de interação entre os sujeitos – Texto, imagens, vídeo,
caracteres, emoticons, áudio ou um gif na troca de turno no discurso. Cada tipo recurso de
interação virtual mencionada (textos, imagens...) caracteriza um campo específico do discurso
digital e tem sua implicação particular no que tange ao que mobilizam discursivamente.
O discurso digital constituído por meio de emoticons, por exemplo, é um tipo de
enunciado que apenas ocorre em meios virtuais. Não enunciamos no mundo real emotions. No

3 LANDOWSKY, E. La société réfléchie. Paris: Seuil, 1989.


entanto, os enunciados constituídos nesta esfera digital são peculiares no que tange à sua forma,
todavia, no cerne discursivo – possuem marcações clássicas da AD de sujeito, “espaço” e tempo.
As implicações, ao meu ver, se encontram no espaço onde ocorre este discurso. Mesmo
ocorrendo dentro de um gênero discursivo no ciberespaço é desterritorizado, porquanto ganham
outros efeitos de sentido, dependendo do sujeito histórico e social que estará do outro lado –
Interlocutor.
Diante disso, fica evidente que a interação verbal, no Whatsapp, é gerada pelo efeito
de sentidos originado pela sequência verbal e não verbal, pela situação, pelo contexto histórico
social, pelas condições de produção, e também pelos papéis sociais desempenhados pelos
interlocutores, haja vista que cada discurso define o estatuto que o enunciador deve se atribuir e
o que deve atribuir a seu destinatário para legitimar o seu dizer. A interação no Whatsapp, o
enunciador e o coenunciador precisam ser reconhecidos como sujeitos plenos ou preenchidos,
tanto por qualidades modais necessárias as suas competências comunicativas, quanto por valores
decorrentes das relações com o extralinguístico e com a sociedade. De acordo com Sobral (2009,
p. 44):

A interação [...] é condicionada pela situação pessoal, social e histórica dos


participantes e pelas condições materiais e institucionais – imediatas e mediatas
– em que ocorre o intercâmbio verbal. Todos esses elementos condicionam o
discurso, tanto por meio da interdiscursividade [...] como por meio da relação
dialógica entre os sujeitos do discurso.

Temos na interação verbal o princípio maior da língua, porquanto o sujeito, ao falar ou


escrever, deixa em seu texto marcas profundas de sua sociedade, seu núcleo familiar, suas
experiências, além de pressuposições sobre o que o interlocutor gostaria ou não de ouvir ou ler,
tendo em vista também seu contexto social. Este sujeito é o grande responsável pelo que diz em
suas relações sociais e históricas com outros sujeitos também responsáveis, formadores,
mediadores e extremamente dependentes da sociedade em que vivem. “A verdadeira substância
da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação
monológica isolada, nem pelo ato fisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da
interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal
constitui assim a realidade fundamental da língua.” (BAKHTIN, 2002, p. 123).
Na AD consideramos o Apps WhatsApp enquanto um mídium, isto é, uma mediação
que possibilita a interação. Para a AD, especialmente nas reflexões desenvolvidas por
Maingueneau sobre mídium, busca-se reconhecer as implicações desses suportes sobre o
discurso, considerando-se que ele imprime um certo aspecto aos conteúdos dos enunciados e
comanda em parte as filiações a que eles podem aderir, bem como condiciona o próprio texto e
modela o gênero do discurso (MAINGUENEAU, 2013, p. 81). Os efeitos gerados pelo mídium
não se restringem aos textos, mas são sentidos na organização institucional implicada por ele
de modo geral.
O mídium não é um simples “meio” de transmissão do discurso, mas impõe coerções
sobre seus conteúdos e comanda os usos que dele podemos fazer. O mídium não é um simples
“meio”, um instrumento para transportar uma mensagem estável: uma mudança importante do
mídium modifica o conjunto de um gênero de discurso (MAINGUENEAU, 2013, p. 82).
Quando tratamos de WhatsApp como um mídium, não basta levar em conta seu suporte
material no sentido estrito (mensagem de áudio, vídeo, texto, emoticons). É necessário também
considerar o conjunto do circuito que organiza a fala. O modo de transporte e de recepção do
enunciado condiciona a própria constituição do texto, modela o gênero. Ou seja, as condições
materiais, do discurso transforma radicalmente os conteúdos e a maneira de dizer.

2. LINGUÍSTICA TEXTUAL

A Linguística Textual é a área da Linguística responsável pelo estudo do texto do ponto de


vista de aspectos textualizadores considerados na produção e compreensão. A língua na LT, diante
da esfera digital (Whatsapp), pode ser, também, considerada, como o lugar de uma interação de
natureza cognitiva e social entre os sujeitos, segundo 4Koch (2002). Ou seja, na concepção
sociointeracional da linguagem, o texto (Whatsapp) passa a ser considerado o próprio lugar da
interação e os interlocutores são visto como sujeitos ativos que- dialogicamente- nele se
constituem e são constituídos.

Em se tratando do contexto, no interior da Linguística Textual, abrange não só o cotexto,


como a situação de interação imediata, a situação mediata e também o contexto sociocognitivo dos
interlocutores. Ele engloba todos os tipos de conhecimentos arquivados na memória dos actantes
sociais, que necessitam ser mobilizados por ocasião do intercâmbio verbal: o conhecimento
linguístico propriamente dito, o conhecimento enciclopédico, o conhecimento da situação
comunicativa e de suas “regras” (situacionalidade), o conhecimento superestrutural (tipos
textuais), o conhecimento estilístico, o conhecimento sobre os variados gêneros adequados às

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KOCH, Ingedore. Grunfeld. Villaça. (2002) Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez
diversas práticas sociais, bem como o conhecimento de outros textos que permeiam nossa cultura
– intertextualidade.
Observar os fenômenos de linguagem no aplicativo Whatsapp a partir dessa ótica seria
buscar sentidos instaurados na interação de uma atividade sociocomunicativa a partir de um
contexto essencialmente sociocognitivo, o que leva a concluir que o sentido de um texto é,
portanto, construído na interação texto-sujeitos (ou texto coenunciadores) e não algo que preexista
a essa interação, ou seja, o sentido se revolve entre texto e leitor, nos conhecimentos partilhados
entre produtor e receptor e ativados na atividade interpretativa.

Na LT entendemos que o Whatsapp seria um suporte, como podemos observar na


definição de suporte de Marcuschi (2008, p. 174) - “um locus físico ou virtual com formato
específico que serve de base ou ambiente de fixação de gênero materializado como texto”. A
primeira evidência que se impõe é que WhatsApp mobiliza diversos canais no ato da
comunicação - o verbal, não verbal, associado a signos linguísticos, áudio, vídeo, imagem etc; e
nele encontramos a materialização maturada de enunciados construídos socialmente – gêneros.

3. ANÁLISES DO CORPUS

O corpus selecionado para análise consiste em um vídeo de 13 segundos postado em um


grupo de WhatsApp familiar no dia 30 de agosto de 2018, às 18h51. Observaremos por meio da
AD e da LT os elementos discursivos com base no contexto da enunciação materializada no post.
O nome do grupo como do sujeito que compartilha o vídeo são renomeados – Grupo Família Feliz
– enunciador 1. Os sujeitos discursivos são de 4 estados brasileiros: Bahia, Pernambuco, Rio de
Janeiro e São Paulo. Na interação ocorrida neste post de vídeo temos sujeitos geograficamente
separados, no entanto, virtualmente ligados pelo digital – aqui temos o que Pierry Levy (1998) vai
chamar de desterritorialização.

Os elementos linguísticos constituídos são muito ricos, e demandariam uma análise mais
detalhada do aplicativo e este não é nosso fito neste artigo. Desta forma nos deteremos no conteúdo
do vídeo, a fim de analisarmos neste espaço este fenômeno linguístico materializado.
Figura 1 - Post de Vídeo

GRUPO FAMÍLIA FELIZ

Enunciador - 1

Print do post: tirado pelo autor do artigo

O vídeo é composto por um diálogo entre uma mulher e uma criança, sobre o
pronunciamento gráfico de um substantivo comum. Segue abaixo a transcrição do diálogo:

Mulher: Hadassa!
Hadassa: Oi...
Mulher: Cuscuz, é com S ou com Z?
Hadassa: ééé... eu não sei não. Aqui em casa é com ovo...

Segundo a LT – contexto são modelos mentais de situações coinunicativas sociais. Essas


situações não se distinguem apenas por informações sobre os ambientes ou os participantes e
suas ações, mas precisam necessariamente representar coisas como intenções, objetivos,
conhecimentos e outras propriedades mentais. (VAN DIJK, 2012). Aqui temos um modelo de
contexto no nível micro, o qual corresponde não apenas ao movimento discursivo, mas por ser
um acontecimento face a face e situado. No entanto, em termos das funções do contexto,
precisamos observar a continuidade temática e sua progressão textual imbricada no construto
subjetivo da criança, que estabelece uma coerência no aspecto socio-histórico-cultural em vez
do gráfico. O seu referente está construído na sua base social.
No aspecto da análise do discurso a compreensão dos sentidos, aqui pressupostos, com
base em seu cotexto e contexto conforme Orlandi (2000. p. 30), diz que:
Os dizeres não são como dissemos, apenas mensagens a serem decodificadas. São efeitos
de sentidos que são produzidos em condições determinadas e que de alguma forma estão
presentes no modo como se diz, deixando vestígios [...] São pistas para os sentidos assim
produzidos, em relação ao dizer com sua exterioridade, suas condições de produção. Esses
sentidos têm a ver com o que é dito ali mas também em outros lugares, assim como com o que
não é dito, e com o que poderia ser dito e não foi.
Em AD o contexto aponta para três fontes de informações (contextos), as quais fornecem
elementos necessários para a interpretação: o ambiente físico da enunciação ou contexto
situacional, o cotexto e o conhecimento de mundo.
No corpus, o post de vídeo no Whatsapp, com base na primeira categoria, todo o diálogo
entre o enunciador e o coenunciador ocorre no tempo presente do modo indicativo – ao se
valerem dos verbos – “é, sei e é.” Este presente aqui é dêitico, ou seja, só pode ser interpretado
em relação à situação de enunciação na qual está inscrita. E os verbos no presente têm uma
duração muito variável – neste post temos uma duração de apenas alguns minutos. No entanto,
virtualmente materializado no post de vídeo, tem uma duração instável, porquanto, a todo play
o vídeo se ressignifica e desta forma pode variar em semanas, meses e anos, ou seja
situacionalmente é indeterminado.
Um outro aspecto, que podemos notar no ato enunciador - é a assimetria fundante,
quando coenunciador faz a alusão ao referente substantivo “Cuscuz” pelo substantivo “Ovo.”
Este processo assimétrico conferiu uma reconstrução diferente das representações esperadas do
enunciador – “S ou Z”, produzindo no enunciado um tom cômico.
Quanto à categoria AD – cotexto – percebemos aqui a mobilização da memória discursiva
dos intérpretes na tentativa de colocar a unidade substantiva “cuscuz” em termos de sua grafia
correta, suscitado pelo fonema S ou Z. Mas, há quebra da progressão discursiva esperada, pelo
coenunciador se valer de sua competência enciclopédica (conhecimento de mundo) e não de sua
competência linguística (domínio da língua).
Neste ponto, entra a terceira categoria – conhecimento de mundo – são os saberes que
temos constituídos anteriores à enunciação. O coenunciador evidencia este aspecto do contexto
ao apresentar seu conhecimento empírico sobre o mesmo substantivo – cuscuz.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tanto AD como LT, no aspecto do contexto, apontam para o conhecimento linguístico


propriamente dito, o conhecimento enciclopédico, o conhecimento da situação comunicativa e
de suas “regras” (situacionalidade). Nesta perspectiva, o corpus em análise evoca o
conhecimento (competência) linguística (o) no que tange ao emprego do fomena correto, assim
como do conhecimento (competência) enciclopédio (a) esboçado na fala do coenunciador ao
quebrar a progressão discursiva mundando o referente fonético pelo referente empírico –
enciclopédico.
No escopo dos ambientes digitais, tanto a AD como a LT suas abordagens, ganham
outras categorias analíticas. O post de vídeo no aplicativo Whatsapp, se dá no ciberespaço, e a
plataforma aqui utilizada movimenta não apenas o post, mas diversos aspectos linguísticos
como sua própria classificação no plano do texto/discurso. Além disso, processos sociais
influenciam a construção de ambientes herdados de estruturas socioespaciais prévias. Para
Castells (2000, p. 442), espaço é tempo cristalizado. Por meio do WhatsApp, o espaço expande-
se fisicamente para o mundo inteiro, porquanto não depende necessariamente do estar próximo,
mas sim da presença dos sujeitos na rede virtual.
Podemos notar que tanto AD como a LT têm muito a contribuírem na análise dos
fenômenos linguísticos contemporâneos dentro da sua perspectiva, que ao meu modo de ver se
complementam no entendimento desta expansão do texto/discurso em ambientes digitais. É
possível, ainda, termos novas perspectivas analíticas a surgir por ser um espaço cheios de
desafios no aspecto da língua(gem) em uso no ciberespaço.

BIBLIOGRAFIA

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