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EMENTA
PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA.
EXPORTAÇÃO DE MERCADORIAS SEM PROVA DO INGRESSO DOS VALORES
CORRESPONDENTES NO PAÍS. EVASÃO DE DIVISAS. ATIPICIDADE.
1. A não-comprovação de ingresso, no país, de valores que supostamente
deveriam ter ingressado, em virtude de exportação de mercadorias efetivamente operada, não
constitui conduta omissiva típica.
2. Se por evasão, nas palavras de Rodolfo Tigre Maia, se deve entender "a
saída clandestina do país" de moeda ou divisa para o exterior, não se pode ter por
configurado o delito previsto no art. 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86 quando o
agente, ao proceder à exportação de mercadorias, não efetua a operação de câmbio
correspondente. Hipótese em que os dólares não saíram, mas deixaram de entrar em
território nacional. A utilização da interpretação extensiva é perfeitamente aplicável em
Direito Penal (Damásio de Jesus. in Direito Penal, 1º vol. São Paulo: Saraiva, 1992,
pp.35/6). Esse recurso hermenêutico, contudo, não pode ser levado a um limite tal que não
mais se distinga da analogia em desfavor do réu.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial
provimento ao recurso criminal em sentido estrito, tão-somente para afastar a declaração de
extinção de punibilidade do denunciado Guillermo Francisco Noverasco, mantendo a
rejeição da denúncia, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de outubro de 2007.
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RELATÓRIO
É o relatório.
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VOTO
Tenho que a decisão recorrida deve ser mantida. Com efeito, somente por
interpretação extensiva do tipo penal em exame poderia se chegar ao resultado típico
pretendido pelo órgão ministerial, já que a descrição objetiva do art. 22, parágrafo único,
primeira parte, da Lei nº 7.492/86 prevê apenas a saída de divisas do país. Decorre daí, que o
simples ingresso de valores no território nacional não se enquadra na hipótese de crime
contra o sistema financeiro nacional. Se é assim, muito menos se pode cogitar como típico o
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"A forma equiparada prevista no parágrafo único do referido artigo diz o seguinte: "incorre
na mesma pena quem a qualquer título promove, sem autorização legal, a saída de moeda ou
divisa para o exterior, ou nele mantiver depósitos não declarados à repartição federal
competente". Essa forma de evasão importa a retirada da divisa de dentro para fora do País.
A descrição do tipo penal é clara nesse sentido. Promover a saída de moeda ou divisa para o
exterior. Ora, impedir que a moeda entre no território nacional não é conduta típica,
poderia ser equiparada, mas isso por meio de um raciocínio de interpretação extensiva ou
analógica do tipo penal, o que é vedado em malam partem.(...) Como bem ressaltou o
julgador 'o fato da não contratação de câmbio pode ensejar sanções de natureza
administrativa, mas é penalmente atípico'. Poder-se-ía dizer que essa forma de atuar
importa a mesma conseqüência, ou seja, a quebra da integridade do Sistema Financeiro
Nacional, porque se manda riqueza para fora do País, e o valor que deveria integrar o
Sistema Financeiro não entra no País, portanto, prejudica sua integridade. Na realidade,
esse prejuízo até pode acontecer, mas ele não foi previsto na descrição do art. 22 da Lei nº
7.492/86."
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De fato, se por evasão, nas palavras de Rodolfo Tigre Maia, deve-se entender
"a saída clandestina do país" de moeda ou divisa para o exterior, não se pode ter por
configurado o delito previsto no art. 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86 quando o agente,
ao proceder à exportação de mercadorias, não efetua a operação de câmbio correspondente.
Os dólares não saíram, mas sim deixaram de entrar em território nacional. O professor
Damásio de Jesus entende que a utilização da interpretação extensiva é perfeitamente
aplicável em Direito Penal (Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 35). Esse recurso
hermenêutico, contudo, não pode ser levado a um limite tal que não mais se distinga da
analogia em desfavor do réu. Nesse sentido, reporto-me à valiosa doutrina de Andrei
Zenkner Schmidt e Luciano Feldens (O Crime de Evasão de Divisas: A Tutela Penal do
Sistema Financeiro Nacional na Perspectiva da Política Cambial Brasileira. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2006, p. 226-7):
"(...) O primeiro diz com a constatação sobre se o não-ingresso de moeda ou divisa é conduta
que possa ser equiparada à sua saída, hipótese que, acaso afirmada, solucionaria a questão
em favor da primeira parte do dispositivo legal estudado. É dizer: ao não repatriar a
contraprestação financeira da mercadoria exportada, o sujeito ativo (exportador) teria
deixado de fazer ingressar a correspondente moeda ou divisa, incidindo, pois, nos limites do
tipo. Resta-nos negar a hipótese, porquanto não permitida tamanha extensão da tipicidade
em face do princípio da taxatividade da lei penal, corolário lógico do princípío da legalidade
(art. 5º, inc. XXXIX, da Constituição), precisamente no ponto que assevera inexistir crime
'sem lei anterior que o defina'. Parece claro que sob os postulados dogmáticos que
sobrepairam o Direito Penal incriminador não se é de considerar como legalmente definida
uma conduta que apenas por equiparação pode ser tipicamente alcançada. Atente-se: e por
uma equiparação que não é legal, a exemplo do que legitimamente ocorre no ambiente da
própria Lei 7.492/86 (art. 1º, parágrafo único, e art. 25, § 1º), mas por uma equiparação que
em nada se diferencia da analogia. Parece-nos inexistir qualquer dúvida quanto à lesividade
(à política cambial) da conduta sob exame, a qual, sob esse aspecto, em nada se diferencia
daquela consubstanciada em uma evasão (saída) de moeda ou divisas propriamente dita.
Nada obstante, o problema reconduz-se aos limites da tipicidade formal: o tipo, para além da
perda de moeda ou divisas, requer que esta conduta se tenha dado pela saída do território
nacional ao exterior. Indubitavelmente, trata-se de uma proteção legal de única mão e,
portanto, imperfeita. Sucede que por tal imperfeição não responde o cidadão. Ainda que
inegável a lesividade decorrente de sua conduta, esta não se subsume formalmente à hipótese
normativa.
O segundo problema refere-se à possibilidade de atribuir-se à elementar divisa um sentido
que nela se faça compreender a mercadoria destinada à exportação. Se respondida
afirmativamente, a questão estaria solucionada nos limites da 1ª parte do parágrafo único,
porquanto ao promover a saída de mercadorias o exportador não estaria senão promovendo
a saída de divisas, complementando-se, pois, a exigida relação subsuntiva. Trata-se, aqui, de
buscar o significado técnico de um elemento normativo do tipo; esse o núcleo da questão.
Como vimos, entretanto, uma tal equiparação não é de ser feita. Ainda que seja inegável a
existência de prejuízo à política cambial brasileira, os limites do tipo insculpido na 1ª parte
do parágrafo único não albergam essa hipótese. Uma tal incongruência, entretanto, não nos
parece o bastante para fazer enquadrar as mercadorias exportadas no conceito de divisas, o
qual, se não é unívoco, tampouco permite, notadamente para efeitos penais, que se lhe
agreguem sentidos substancialmente dissociados daqueles decorrentes de suas linhas
conceituais gerais. Em sede de Direito Penal, a interpretação acerca da restrição de direitos
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De outra banda, cabe salientar que a decisão ora recorrida foi ratificada por este
Colegiado ao apreciar a irresignação ministerial no tocante à co-denunciada Andréia Soares
Silveira (RSE nº 2004.71.00.011010-1/RS, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJ de
10/05/2006), nos termos do acórdão abaixo transcrito:
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