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A CONSCIÊNCIA CORPORAL E A BIOENERGÉTICA COMO CONSTITUINTE DO TRABALHO E

FORMAÇÃO DO ATOR.

Fábio Serafim da Silva


Me. Anselmo Alexandre Mendes – UEM-UNICESUMAR – Maringá-PR – Brasil
profanselmo1@gmail.com
RESUMO

A partir de evidências cientificas, entendemos que a atividade física (moderada e/ou intensa) e
a necessidade de reservas físicas e energéticas, caracterizam a importância da preparação física
para atores e bailarinos de espetáculos teatrais. Outro fator determinante para este trabalho é
a necessidade de aprofundar o conhecimento do próprio corpo para ser melhor utilizado como
matéria prima para execução das atividades teatrais. Encontramos na bioenergética de Lowen
uma base forte para este estudo, constatando nesta técnica conceitos e atividades pertinentes
não somente ao trabalho do ator, mas a saúde do ser humano em geral. Assim, com foco no
trabalho do ator de teatro, esse estudo, pautado em revisão bibliográfica, evidenciou conceitos
de consciência corporal em suas vertentes, sendo elas físicas e metafísicas, tratando de sua
estrutura mecânica em harmonia com sua estrutura energética para alcançar resultados
expressivos mais contundentes. Apoiando-se na terapia bioenergética que trata o ser humano
de uma forma holística e que não o dissocia da natureza e nem fragmenta suas partes físicas e
espirituais, o estudo abordou a importância desta consciência holística do corpo, isto dentro de
um trabalho mais profundo, mais amplo e mais significativo deste instrumento rico e cheio de
possibilidades chamado corpo humano. À luz da literatura verificamos dimensões ainda um
tanto quanto desconhecidas do nosso corpo, dimensões com as quais, vamos perdendo contato,
à medida que deixamos a infância e se fechando para o mundo adulto. O crescimento como ser
social, educado e civilizado, neste contexto, representa danos para a saúde e para a harmonia
corporal. A naturalidade corporal é o que, segundo este estudo, devemos reencontrar

Palavras-chave: Corpo; bioenergética; consciência; ator

ABSTRACT

From scientific evidence, we understand that physical activity (moderated and/or severe) and
the necessity for physical and energy reserves, characterize the importance of physical
preparation for actors and dancers of various theatrical presentations. Another key factor in
this work is the need to deepen the knowledge of the body to be better used as a raw material
for theatrical activities. We found in the Lowen‟s bioenergetics a strong base for this study,
noting in this technical concepts and activities relevant, not only to the work of the actor, but
the health of the human being in general. Than, with a focus on the work of the actor in the
theater, this study, based on literature review, showed concepts of body awareness in its tracks,
and they are physical and metaphysical, in the case of its mechanical structure in harmony with
its energy structure to achieve significant results of expression. Supporting the bioenergetic
therapy that treats the human being in a holistic way and not dissociate it of nature neither even
splinter physical and spiritual parts, the study has catched the importance of this holistic
awareness of body, thus within a deeper, broader and more significant work of this rich and full
of possibilities instrument called human body. In the light of the literature we found dimensions
still somewhat unknown of our body, dimensions which we lose contact, as we let the childhood
and close for the adult world. The growth as a social, polite and civilized being, in this context,
represents damage to health and the body harmony. The body naturally is what, according to
this study, we should meet again.
Keywords: Body; bioenergetics; awareness; actor.
INTRODUÇÃO

O teatro nasceu da necessidade do homem de se expressar, de se comunicar, de


representar, de festejar sua existência, assim, podemos citar que as primeiras ações teatrais
ocorreram no berço da humanidade onde tribos pré-históricas já observavam os animais e os
imitavam, além de celebrar suas conquistas (na caça ou nas lutas) adorando seus deuses por
meio de encenações. Ainda que não fosse espetáculo, já era expressão teatral.

Na antiguidade o teatro se desenvolveu como algo sagrado, em cerimonias, como


ligação entre o homem e suas energias superiores e ao longo da história ele se tornou uma forma
de expressão artística e social.

Com base na premissa de que o conhecimento do corpo em todas as suas vertentes


e possibilidades pode expandir resultados expressivos no palco, levando-se em conta de que o
ator de teatro utiliza-se de seu corpo como material de seu trabalho, este estudo vem levantar
questões de como este profissional pode explorar suas vertentes físicas e psicossomáticas,
aflorando a ideia da otimização do seu desempenho com o aprimoramento das habilidades de
utilização deste material físico.

Entendendo o ator como instrumento de seu próprio trabalho e tomando este


como criatura dotada de características físicas, psíquicas e bioenergéticas, estudaremos o
“humano ator” (GRIFO NOSSO) como fonte de expressões, de criatividade e de informação
visual, buscando encontrar meios de potencializar suas características, desenvolvendo as
mesmas de acordo com as necessidades das ações dramáticas. Este estudo segue o modelo de
pesquisa bibliográfica, como parâmetro de revisão de literatura onde serão utilizados artigos,
livros, sites entre outras ferramentas, os quais abordam preceitos do teatro, bioenergética e
suas ligações.

2 REVISÃO DE LITERATURA

2.1 CAPACIDADES FÍSICAS QUE SÃO NECESSÁRIAS PARA A ATIVIDADE DO ATOR

Sabemos que o contato com o teatro exige uma série de exercícios como
treinamento e potencialidade de certas capacidades exigidas. Podemos citar exercícios vocais e
de musculatura facial e respiratória, com controle diafragmático e de vias aéreas, estas são
elementos de melhora do alcance vocal durante espetáculos e ensaios teatrais. O treinamento
deve ser periódico para estimular e aperfeiçoar as funções daquela especifica parte do corpo
para seu melhor desempenho. “Para o desempenho da voz, além da laringe e cordas vocais que
produzem o som chamado voz, se recrutam uma gama de músculos, órgãos onde o corpo serve
como uma caixa de ressonância amplificadora” (RAMOS, 2009, p.01).

A parte vocal é um dos exemplos que podemos citar como uma das áreas mais
afetadas quando se remete a falta de preparação física de atores. Com relação a este fator o
mau uso das partes físicas envolvidas durante a execução do som vocal pode trazer distonias,
rouquidão, entre outros, ocasionadas por calos, nódulos e inflamações. Estes problemas estão
diretamente ligados à falta de treinamento das melhores formas de execução vocal no teatro e
também a problemas posturais durante estas execuções.

A consciência do próprio ator poderá evitar estes transtornos, quando o mesmo


pode evitar movimentos que dificultem a execução e principalmente passar a utilizar o
diafragma como principal fonte de força em momentos de potencialização vocal. Temos que
ressaltar também a importância de outras capacidades físicas como o equilíbrio, flexibilidade,
força, capacidade aeróbica, que podem, não só evitar problemas de saúde vocal como também
melhorar a estabilidade nas ações cênicas.
2.2 CONSCIÊNCIA CORPORAL E A SUA IMPORTÂNCIA PARA O ATOR

A relação do equilíbrio físico, mental e emocional com resultados para o nosso


cotidiano vem aguçando a curiosidade através dos anos, e este assunto pode ser abordado em
qualquer área a ser trabalhada. Podemos citar exemplos no esporte onde um atleta poderá ter
resultado inferior, quão forte estiver seu emocional ou psicológico abalado, tanto que o
psicólogo é um profissional imprescindível no esporte de alto rendimento na atualidade. Isso
nos remete a importância de trabalhar o ser humano nessas três dimensões: corpo físico, corpo
psíquico e corpo espiritual. Uma cosmovisão holística do ser que abordaremos nos próximos
capítulos.
Nosso corpo somos nós. É a nossa única realidade perceptível. Não
opõe à nossa inteligência, sentimento, alma. Ele inclui e dá-lhe abrigo.
Por isso, tomar consciência do próprio corpo é ter acesso ao ser
inteiro... pois, corpo, espírito, psíquico e físico e até a força e fraqueza,
representam não a dualidade do ser mais sua unidade. (BERTHERAT,
1976, p.14).

Bertherat (1976) nos faz refletir a ter consciência de nos mesmos como ser único
em todas nossas vertentes. Somos unidade e não partes fragmentadas de um ser, cada
característica nossa interfere em outra e vice-versa. Não podemos então nos segmentar e
ignorar alguns destes segmentos.
O esquema corporal ou imagem corporal pode ser considerado como
uma intuição de conjunto ou de um conhecimento imediato que
temos do nosso corpo em posição estática ou em movimento, na
relação de suas diferentes partes entre si, sobretudo nas relações com
o espaço e os objetos que nos circundam (LE BOULCH, 1983, p.37).

Isto é, o corpo seria um esquema completo, correlacionando suas partes como um


conjunto, trabalhando em prol do desempenho que são nossas ações, além da nossa importante
relação com o meio. Bertherat (1976) nos convida a não considerar o corpo como uma máquina
e que estamos a sua mercê, na verdade devemos tê-lo como uma matéria flexível, maleável,
perfectível e que temos o poder de moldá-la ao nosso dispor.

O corpo entendido como unidade psicofísica, pode ser definido como


material primário, pois é nele que os materiais secundários e terciários
estão contidos, e será sobre ele que tais materiais atuarão; a ação
física será o material secundário (...) o ritmo e o aspecto ético são aqui
classificados como materiais terciários, pois são procedimentos e/ou
elementos constitutivos da ação física (...)” (BONFITTO, 2009, p 20).

Esta pluralidade das várias dimensões do “eu humano”, partindo do princípio do


trabalho do ator no palco, devem estar interligadas e organizadas. Stanilavski já dizia: “Para
atingir nosso objetivo precisamos contar, além do auxilio da natureza, com uma técnica
psicológica bem trabalhada, com um enorme talento e com grandes reservas físicas e nervosas.”
(STANISLAVSKI,1991, p.46).

Não devemos ignorar nosso corpo, devemos estar atentos à todas nossas ações e
consequentemente suas reações, extraindo o máximo dos sentidos. “Um ator pode e deve
tornar-se um “expert” em corporalidade, através da tomada de consciência das sensações físicas
dos seus próprios movimentos, analisando os efeitos em sua própria movimentação”. (BENTO,
2009, p.2)

Temos que conhecer nosso material de trabalho para conseguir o máximo de


resultados dele e no caso do ator este material é seu corpo, suas infinitas possibilidades.
Acessando áreas desconhecidas do nosso corpo, poderemos então nos descobrir com uma gama
maior de possibilidades de ação cênica.
Antonin Artaud comenta que essa linguagem convida a dirigir-se não
apenas ao espírito, mas também aos sentidos, atingindo assim
“regiões ainda mais ricas e fecundas da sensibilidade em pleno
movimento”. Ele lembra a poesia para colocar que esses elementos
não verbais da consciência têm importância fundamental. Que estão
intimamente ligados à própria matéria e substância da poesia: a
emoção humana. Esta emoção pode ser transmitida por palavras, mas
não é em si mesma verbal. Todas essas emoções são experimentadas
como sensações corpóreas: Toda emoção tem bases orgânicas. É
cultivando sua emoção em seu corpo que o ator recarrega sua
densidade voltaica. Saber, antecipadamente, quais pontos do corpo é
preciso tocar significa jogar o espectador em transes mágicos. É dessa
espécie preciosa de ciência que a poesia, no teatro, há muito se
desacostumou (TOLENTINO, 2013, p.01 - p. 02).

Conforme Tolentino (2013) Artaud chama a atenção para a necessidade de reger


nossas funções orgânicas de acordo com ativação desta energia denominada “emoção”. É ela
que vai provocar a transmissão das informações dramáticas através do corpo, ou até mesmo
encontrar nas próprias funções corpóreas o ponto certo para ativá-las.

2.3 BIOENERGÉTICA E A TOMADA DA CONSCIÊNCIA CORPORAL

Para desenvolver qualquer trabalho com o ator é preciso tomar os conceitos de


educação física, dado que o corpo é nosso material. Assim sendo todos os trabalhos físicos
devem abordar o indivíduo como um todo, sem fragmenta-lo, como afirma Souza (1992, pág.
30) em seu trabalho “A busca do autoconhecimento através da consciência corporal: uma nova
tendência”.
Deve dar condições ao aluno de identificar em seu corpo o registro de
suas emoções, para que possa lidar com elas, percebendo-as,
compreendendo as, aceitando-as ou não, ou ainda tentando modificá-
las dentro de suas possibilidades (SOUZA, 1992, p.18).

O ser humano então se caracteriza como uma unidade complexa de energia e é


este conceito que o insere na natureza, como parte dela que a completa. Assim como suas partes
físicas, mentais e espirituais completam a unidade geral humana, o ser humano é uma das peças
que completam a natureza (SANTANA, 2014).

Grout (2013) coloca que, segundo a física quântica, a energia invisível, ou campo
energético, é a força básica que governa o mundo material, o esquema que forma a realidade.
Para ela, nossas expectativas, opiniões e crenças agem de comum acordo com o universo que é
feito de partículas de energia.

A Bioenergética procura entender as energias da vida e sua base vem da física


quântica. Levando em consideração de que no universo tudo é constituído de energia, acredita-
se que a respiração é o principal fator que liga todas as energias no ser humano, englobando
todos os processos físicos, principalmente os musculares. “O ato de respirar é o mais importante
e essencial para a manifestação da vida no ser humano. Logo ao nascer ele já se expressa no
mundo através da respiração, ativando todo o funcionamento do seu corpo.” (SANTANA, 2014,
p.01). Podemos então compreender o conceito de bioenergética como o estudo que aborda a
energia da vida, trabalhando os elementos que a compõem.
A bioenergética é uma terapia criada por Alexander Lowen, que se
baseou nos estudos de Wilhelm Reich, permitindo ao Homem
reconectar-se com seu corpo, aproveitando ao máximo seu potencial.
Ao se reencontrar consigo mesmo, nesta jornada de
autoconhecimento, o indivíduo atinge o objetivo almejado, ou seja, ele
liberta suas tensões agudas, permanentes, bem como suas emoções,
sentimentos contidos, formas cristalizadas de ver o mundo, além de
impulsionar o movimento imprescindível para a vida (SANTANA, 2014,
p.01).

Conforme Santana (2014) a respiração de cada um é diferente, pois cada um


reproduz, desde a infância, os padrões de respiração para reprimir sentimentos diante das
situações que nos são impostas durante a vida. Isso faz com que tencionamos cada vez mais a
musculatura envolvida e nossas expressões espontâneas se vão, fazendo com que dissimulemos
que sentimos.

Constatou-se que as emoções reprimidas e não expressas pelo homem criam


tensões pela musculatura do corpo gastando uma quantidade enorme de energia do nosso
próprio sistema vital, sendo que pouco a pouco essas tensões começam a bloquear funções
emocionais essenciais, como amor, sexualidade, alegria, prazer e relaxamento. “Todo espasmo
muscular crônico é uma limitação da liberdade de movimento e expressão do indivíduo”
(LOWEN, 1970, p.42).

Lowen (1970) afirma que o ser humano se dissociou de seu corpo em favor do ego,
do status social e do poder, assim essa cultura de civilização do homem faz com que ele viva de
forma a favorecer a suas realizações sociais, mecanizando suas ações corpóreas, esquecendo
assim do que seria natural: a busca natural pelo prazer, favorecendo assim a sabedoria e as
necessidades do corpo. “Quando estamos identificados com uma atividade, fluímos livre e
espontaneamente. O prazer é este fluxo de sentimentos” (LOWEN, 1970, p.23).

Grout (2013, p.46) escreve sobre o fato de sermos energia, de que a matéria que
nos compõe é apenas uma mínima parte do todo que realmente somos. A parte física, visível, a
qual podemos perceber com os cinco sentidos é somente um elemento do todo. Grout (2013)
ainda vai mais longe, ao afirmar que podemos controlar essa energia, a parte espiritual,
metafísica tem muito mais poder em nossas ações do que a matéria e que podemos, sim
dominar nossa existência através do controle dessa energia chamada “campo infinito de
possibilidades” unicamente com a nossa mente.

Aprendemos no teatro que, como atores, devemos deixar de lado tudo que
desaprendemos durante a vida para voltar a sermos crianças. A expressão “desaprender” está
muito bem inserida neste conceito, justamente por entender que à medida que vamos
envelhecendo, nosso corpo começa a se adaptar com as respostas cognitivas que as ações do
dia a dia nos impõem, e ações simples como andar, deitar, expressões do rosto e todas as
contrações musculares necessárias para os movimentos, começam a não ser mais naturais,
vamos nos condicionando ao meio e isso prejudica o nosso corpo e saúde como um todo,
justamente pela repreensão de emoções citadas acima. O que acontece na sociedade moderna
é que somos fadados ao conceito de mundo que nos redime a autômatos funcionando de acordo
com a realidade racional e este conceito foi nos limitando com o evoluir da história moderna do
mundo. Crema (1988) simplifica esta explicação quando conceitua a sociedade pós-idade média,
com seu boom tecnológico científico, como fator que determina nosso condicionamento da
vivencia da realidade. “A ciência desvinculou-se da mística, da filosofia, da ética e da estética,
da poesia e, de um certo modo, da própria vida” (CREMA,1988, p.22).

O mundo passou a ser percebido como uma máquina gigantesca e nós humanos
como parte desta engrenagem. Para Crema (1988) só no século XX a ciência começou, mesmo
que de forma tímida, a desvelar um universo vivo, dinâmico, interligado, sistêmico, denominado
holístico, o que “transcende o modelo mecanicista (...) é a interdependência e correlação dos
conceitos de mente e matéria” (CREMA 1988, p. 51). Na matéria se revela energia e esta energia
de traduz por consciência. Crema (1988) exemplifica claramente esta visão holística, quando se
refere a um conceito grego para denominar a Terra, o “Conceito de Gaia”. Este conceito,
segundo o autor, foi reproposto por W. Golding: “nesta concepção, nós, os humanos, somos
células de um dos tecidos do organismo de Gaia que, por sua vez, pode ser entendida como uma
célula do Universo Vivo” (CREMA 1988, p.21).

Na prática da bioenergética, o sujeito aprende a expressar o que sente através da


respiração. Ao fortalecer, por exemplo, a respiração, os músculos se contraem, movimento
condicionado que se manifesta na tentativa de conter um sentimento, do qual se perde o
domínio, vindo assim a ser expresso na forma de um pranto, de um grito, um sinal de temor ou
uma risada. A seguir, a musculatura se solta, a pessoa respira com calma e ela é tomada por um
sentimento de paz. Desta forma, deixando que suas emoções se revelem livremente, o homem
vê atitudes e sentimentos programados serem modificados.

Segundo Lowen (1970) o estresse emocional também provoca contrações


musculares, pois a emoção é uma carga energética que faz pressão para ser liberada. As tensões
físicas são mais curtas, já as emocionais têm duração longa, persistindo, tornando-se assim
inconscientes em nossos corpos.

2.4 A IMPORTÂNCIA DE ATIVIDADES QUE PROMOVAM O DOMÍNIO FÍSICO,


MENTAL E BIOENERGÉTICO PARA O BOM DESEMPENHO NO TRABALHO E PARA A SAÚDE DO
ATOR

Para que o ator possa explorar todas as suas fontes de criatividade e expressão, ele
deve se conhecer profundamente e esta exploração é gradativa de acordo com o
autoconhecimento que tem.

Este autoconhecimento vem sendo trabalhado com mais afinco na atualidade, pois
as companhias e grupos de teatro estão tendo uma consciência maior de que resultados
melhores podem ser obtidos no palco com atores mais conscientes de seu material físico,
emocional e espiritual.

Temos o poder de nos controlar com o pensamento, e isso afeta até mesmo nossa
saúde. Para Grout (2013) os nossos cérebros estabeleceram um falso padrão de percepção de
que coisas inevitáveis podem controlar nossa vida, incluindo as enfermidades:

“O vírus da nossa consciência limitou a habilidade de usarmos a sabedoria de


nossos corpos (...) a nossa crença na inevitabilidade da deterioração do corpo parece real porque
acreditamos que ela fosse real por muito tempo” (GROUT, 2013, p 124,).

O que percebemos durante a prática teatral é que atividades de aquecimento e


relaxamento, muito comuns no meio, eram tratadas de forma fragmentada, por exemplo,
exercícios para a voz, exercícios para relaxamento facial, exercícios para a respiração, exercícios
de alongamento, entre outros, sendo estes totalmente separados dos exercícios relacionados
às emoções do ator. Estas atividades não condizem com conceito de bioenergética, citado
anteriormente, que toma o homem como uma unidade que se completa com todas estas partes
em um ser só. E isso não deixa de ser um reflexo de como tratamos nosso corpo em geral, o que
nos remete a noções da educação física tradicional que fragmenta o trabalho do corpo de forma
dual, separando o físico do metafísico.
A maioria dos exercícios é feita de forma parcial, localizada,
trabalhando apenas o físico sem preocupar-se com os demais aspectos
que compõem o ser humano. Neste tipo de atividade, muitas vezes o
aluno limita-se a imitar o gesto proposto, reprimindo cada vez mais a
criatividade e as expressões (MACHADO, 1992, p.24).

Pautados nos conceitos estudados alguns questionamentos se tornam relevantes:

- Por que não, então, nos propormos a exercícios que nos tomam por completo,
buscando nesta energia de que somos formados, os meios necessários para executar as ações
artísticas e físicas no palco?

- Por que não trabalhar nossa mente para colher desta energia universal, que esta
em tudo e a qual tudo pertence, todas as possibilidades para resultados fantásticos no palco ou
mesmo na vida?

- Por que não abordar todos esses exercícios como forma de sistematizar o ator em
uma abordagem completa de seu corpo físico e mental?

Bertherat (1976) propõe com seu método de “antiginástica” esta abordagem


holística do corpo. Segundo ela vamos retesando nossa musculatura, articulações, ligamentos e
outras partes físicas, fator ocasionado pela mecanização e repreensão das emoções que
adquirimos durante a vida. Com sua “antiginástica”, soltamos nossa musculatura e liberamos
uma energia reprimida que não conhecíamos.

É preciso ter acesso a áreas mais profundas do nosso ser para que este
conhecimento seja cada vez mais latente, e consequentemente usarmos este material
físico/energético em maior escala. Entendendo conceitos de bioenergética o ator pode ter mais
domínio e maior segurança em suas ações em cena, além do mais, a concepção de que ele pode
executar um movimento que, com atividades da antiginástica, lhe dará maior amplitude,
precisão e fluidez.

O ator tem que se entender, conhecer seus limites, suas habilidades, suas forças
físicas, sua intensidade, sua amplitude. O ator deve saber o momento certo de utilizar cada
característica sua, cada defeito, cada qualidade, tanto no físico como no geral. O ator deve
estimular cada expressão, saber os níveis a que pode chegar e como pode chegar de acordo com
a necessidade do espetáculo. O ator deve conhecer os meios energéticos que o deixa em
sintonia com a plateia, que o conecta com ela, meios estes que são mais do que unicamente os
visuais ou sonoros, visto que somos tomados por esta energia holística infinita, um “infinito
campo de possibilidades”, como é colocado por Grout (2013).

Sabemos que, para este processo de autoconhecimento tão importante nesta área,
conceitos e filosofias vêm se desenvolvendo ao redor do mundo. O Ioga, considerado por
especialistas como uma filosofia e ciência, objetiva este equilíbrio e esta aproximação do corpo
físico com o corpo energético.
Ioga é o caminho prático e natural para a integração da nossa essência
interior com o mundo exterior e com o próprio Universo. Trata-se de
uma filosofia e de uma ciência. E dentro dessa ciência existe uma
metodologia, onde estão inseridos os exercícios, que visam o
equilíbrio psicossomático, com reflexos positivos em todo o
organismo, afirma Claudio Duarte (SP), professor da modalidade há 35
anos e presidente da Associação Brasileira de Ioga.( ACHÔA, 2008,
p.01).

Esta filosofia milenar proveniente da Índia é um dos exemplos que podemos citar
como forma de prática pautada nos conceitos de bioenergética. Técnicas de meditação e
relaxamento, algumas delas muito usadas no teatro, também se baseiam na ponte “corpo,
mente e natureza”. (BAPTISTA, 2002, p.113)

Em suma, o conceito de corpo bioenergético não é um totalmente novo, talvez para


o ocidente seja uma percepção do sujeito mais nova, mas no oriente isso já é tratado há milênios
e os trabalhos que associam a bioenergia com o estado de consciência e o corpo físico são,
conforme as evidências apresentadas, a forma do desenvolvimento integral e harmonioso do
ser humano dentro de sua real complexidade e profundidade.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Evidenciamos ao longo da literatura que uma rotina frequente de preparação física


interfere de forma significativa nos efeitos físicos e até psicológicos e emocionais quanto ao
desempenho dos atores, ou mesmo dançarinos, em seus espetáculos. Os resultados ficam além
da boa performance como atores e atrizes, caracterizando a nítida necessidade do ser humano
de cuidar da saúde por meio de atividades físicas além das do cotidiano.

A preparação física se faz necessária para todo objetivo que tenha o corpo como
foco de trabalho. Para o ator no palco não se faz diferente, as reservas físicas de energia e
resistência são intensamente necessárias para as execuções cênicas.

No palco, em cena, o ator utiliza do seu corpo com instrumento para seu trabalho.
A manutenção deste instrumento em boa forma para funcionamento das ações inerentes a
profissão requer uma disciplina imprescindível, pois se sabe dos efeitos nocivos que o tempo,
alimentação, clima, emoções e sedentarismo provocam no corpo humano.

Ficou evidente também, a importância do controle que um indivíduo tem de suas


ações biomecânicas, com exercícios específicos e que esta pode ser um fator decisivo no
desempenho de um ator no palco.

No entanto o estudo nos chama a atenção que, para o ator, todo seu processo de
construção de personagem e a sua boa performance está intimamente relacionado a capacidade
de autoconhecimento, tanto físico, quanto espiritual. Para melhor resultado em cena, no palco,
o ator deve ter acesso ao seu corpo de forma mais completa possível, e quando falamos em
corpo, referimo-nos ao ser completo, de toda a energia que o compõe, parte visível e invisível,
e as características e detalhes que muitas vezes nos passam despercebidos.

Como fonte de criatividade completa em nossas mãos, não abrindo mão de nada
que nosso corpo pode nos oferecer e principalmente sabendo a maneira certa de utilizar tudo
isso, poderemos ter melhores resultados, não somente na execução dos trabalhos teatrais, não
somente para atores, mas para os seres humanos em geral, podendo isto ser um fator
determinante para nossa evolução individual e para a evolução da humanidade como sociedade.

De acordo com a literatura estudada, compreendemos que nosso corpo físico e


espiritual (bionergético) ainda são tratados de forma dual nos diversos aspectos ao longo da
vida. Fator que contribui para os reveses da saúde física e mental que assola a sociedade nos
dias atuais. Como busca a reversão deste quadro clínico que se tornou a falta de contato com
nossas dimensões corpóreas, se faz necessária a promoção de atividades que nos retomem este
contato integral com nosso corpo e com toda a bioenergia da vida, nos dando uma maior
consciência do material energético-físico que temos e dando ao ator, assim como à todos, maior
gama de possibilidades de autoconhecimento e expressão.

Esta prática terapêutica criada por Lowen visa adaptar o corpo dando a este a
possibilidade de retomar seu lugar na natureza. Com práticas que visam descongestionar os
caminhos de energia pelo corpo, irá promover uma reestruturação física de forma a retomar a
harmonia e o ritmo natural da energia da vida por nosso corpo. Só depois de nos entendermos
como criaturas formadas de toda esta energia que transcende o conceito material e, só depois
que tivermos consciência da limitação patológica que o corpo humano está submetido, é que
poderemos transformar esta realidade, tendo contato íntimo com nossos corpos em todas as
suas escalas, físicas, mentais e espirituais.

Quanto mais se conhece a sua matéria prima, quanto mais contato se tem com ela,
maior resultado o artista terá. Para o ator essa matéria prima é o seu próprio corpo que é
emocional, físico, social, energético e espiritual. Relacionamos assim a questão dessa tomada,
onde dotado de capacidades de autoconhecimento total, explorando todas as possibilidades
criativas e expressivas que seu corpo lhe dispõe, seu resultado em cena será muito mais
significativo.

A questão levantada foi sobre a necessidade de que utilizamos atividades que nos
promovam inteligência em todos os aspectos, sendo eles emocionais, psíquicos ou físicos.
Encontramos nos autores estudados parâmetros de conhecimento para que se elabore
atividades que nos proporcionem um contato maior com nós mesmos e com esta bioenergia
circulante. Uma jornada de autoconhecimento que nos brinda como uma evolução, não
somente nas atividades artísticas, mas principalmente como seres deste infinito poder que nos
foi dado e que cabe só a nós acessá-lo.

REFERÊNCIAS:

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