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FORMAÇÃO DO ATOR.
A partir de evidências cientificas, entendemos que a atividade física (moderada e/ou intensa) e
a necessidade de reservas físicas e energéticas, caracterizam a importância da preparação física
para atores e bailarinos de espetáculos teatrais. Outro fator determinante para este trabalho é
a necessidade de aprofundar o conhecimento do próprio corpo para ser melhor utilizado como
matéria prima para execução das atividades teatrais. Encontramos na bioenergética de Lowen
uma base forte para este estudo, constatando nesta técnica conceitos e atividades pertinentes
não somente ao trabalho do ator, mas a saúde do ser humano em geral. Assim, com foco no
trabalho do ator de teatro, esse estudo, pautado em revisão bibliográfica, evidenciou conceitos
de consciência corporal em suas vertentes, sendo elas físicas e metafísicas, tratando de sua
estrutura mecânica em harmonia com sua estrutura energética para alcançar resultados
expressivos mais contundentes. Apoiando-se na terapia bioenergética que trata o ser humano
de uma forma holística e que não o dissocia da natureza e nem fragmenta suas partes físicas e
espirituais, o estudo abordou a importância desta consciência holística do corpo, isto dentro de
um trabalho mais profundo, mais amplo e mais significativo deste instrumento rico e cheio de
possibilidades chamado corpo humano. À luz da literatura verificamos dimensões ainda um
tanto quanto desconhecidas do nosso corpo, dimensões com as quais, vamos perdendo contato,
à medida que deixamos a infância e se fechando para o mundo adulto. O crescimento como ser
social, educado e civilizado, neste contexto, representa danos para a saúde e para a harmonia
corporal. A naturalidade corporal é o que, segundo este estudo, devemos reencontrar
ABSTRACT
From scientific evidence, we understand that physical activity (moderated and/or severe) and
the necessity for physical and energy reserves, characterize the importance of physical
preparation for actors and dancers of various theatrical presentations. Another key factor in
this work is the need to deepen the knowledge of the body to be better used as a raw material
for theatrical activities. We found in the Lowen‟s bioenergetics a strong base for this study,
noting in this technical concepts and activities relevant, not only to the work of the actor, but
the health of the human being in general. Than, with a focus on the work of the actor in the
theater, this study, based on literature review, showed concepts of body awareness in its tracks,
and they are physical and metaphysical, in the case of its mechanical structure in harmony with
its energy structure to achieve significant results of expression. Supporting the bioenergetic
therapy that treats the human being in a holistic way and not dissociate it of nature neither even
splinter physical and spiritual parts, the study has catched the importance of this holistic
awareness of body, thus within a deeper, broader and more significant work of this rich and full
of possibilities instrument called human body. In the light of the literature we found dimensions
still somewhat unknown of our body, dimensions which we lose contact, as we let the childhood
and close for the adult world. The growth as a social, polite and civilized being, in this context,
represents damage to health and the body harmony. The body naturally is what, according to
this study, we should meet again.
Keywords: Body; bioenergetics; awareness; actor.
INTRODUÇÃO
2 REVISÃO DE LITERATURA
Sabemos que o contato com o teatro exige uma série de exercícios como
treinamento e potencialidade de certas capacidades exigidas. Podemos citar exercícios vocais e
de musculatura facial e respiratória, com controle diafragmático e de vias aéreas, estas são
elementos de melhora do alcance vocal durante espetáculos e ensaios teatrais. O treinamento
deve ser periódico para estimular e aperfeiçoar as funções daquela especifica parte do corpo
para seu melhor desempenho. “Para o desempenho da voz, além da laringe e cordas vocais que
produzem o som chamado voz, se recrutam uma gama de músculos, órgãos onde o corpo serve
como uma caixa de ressonância amplificadora” (RAMOS, 2009, p.01).
A parte vocal é um dos exemplos que podemos citar como uma das áreas mais
afetadas quando se remete a falta de preparação física de atores. Com relação a este fator o
mau uso das partes físicas envolvidas durante a execução do som vocal pode trazer distonias,
rouquidão, entre outros, ocasionadas por calos, nódulos e inflamações. Estes problemas estão
diretamente ligados à falta de treinamento das melhores formas de execução vocal no teatro e
também a problemas posturais durante estas execuções.
Bertherat (1976) nos faz refletir a ter consciência de nos mesmos como ser único
em todas nossas vertentes. Somos unidade e não partes fragmentadas de um ser, cada
característica nossa interfere em outra e vice-versa. Não podemos então nos segmentar e
ignorar alguns destes segmentos.
O esquema corporal ou imagem corporal pode ser considerado como
uma intuição de conjunto ou de um conhecimento imediato que
temos do nosso corpo em posição estática ou em movimento, na
relação de suas diferentes partes entre si, sobretudo nas relações com
o espaço e os objetos que nos circundam (LE BOULCH, 1983, p.37).
Não devemos ignorar nosso corpo, devemos estar atentos à todas nossas ações e
consequentemente suas reações, extraindo o máximo dos sentidos. “Um ator pode e deve
tornar-se um “expert” em corporalidade, através da tomada de consciência das sensações físicas
dos seus próprios movimentos, analisando os efeitos em sua própria movimentação”. (BENTO,
2009, p.2)
Grout (2013) coloca que, segundo a física quântica, a energia invisível, ou campo
energético, é a força básica que governa o mundo material, o esquema que forma a realidade.
Para ela, nossas expectativas, opiniões e crenças agem de comum acordo com o universo que é
feito de partículas de energia.
Lowen (1970) afirma que o ser humano se dissociou de seu corpo em favor do ego,
do status social e do poder, assim essa cultura de civilização do homem faz com que ele viva de
forma a favorecer a suas realizações sociais, mecanizando suas ações corpóreas, esquecendo
assim do que seria natural: a busca natural pelo prazer, favorecendo assim a sabedoria e as
necessidades do corpo. “Quando estamos identificados com uma atividade, fluímos livre e
espontaneamente. O prazer é este fluxo de sentimentos” (LOWEN, 1970, p.23).
Grout (2013, p.46) escreve sobre o fato de sermos energia, de que a matéria que
nos compõe é apenas uma mínima parte do todo que realmente somos. A parte física, visível, a
qual podemos perceber com os cinco sentidos é somente um elemento do todo. Grout (2013)
ainda vai mais longe, ao afirmar que podemos controlar essa energia, a parte espiritual,
metafísica tem muito mais poder em nossas ações do que a matéria e que podemos, sim
dominar nossa existência através do controle dessa energia chamada “campo infinito de
possibilidades” unicamente com a nossa mente.
Aprendemos no teatro que, como atores, devemos deixar de lado tudo que
desaprendemos durante a vida para voltar a sermos crianças. A expressão “desaprender” está
muito bem inserida neste conceito, justamente por entender que à medida que vamos
envelhecendo, nosso corpo começa a se adaptar com as respostas cognitivas que as ações do
dia a dia nos impõem, e ações simples como andar, deitar, expressões do rosto e todas as
contrações musculares necessárias para os movimentos, começam a não ser mais naturais,
vamos nos condicionando ao meio e isso prejudica o nosso corpo e saúde como um todo,
justamente pela repreensão de emoções citadas acima. O que acontece na sociedade moderna
é que somos fadados ao conceito de mundo que nos redime a autômatos funcionando de acordo
com a realidade racional e este conceito foi nos limitando com o evoluir da história moderna do
mundo. Crema (1988) simplifica esta explicação quando conceitua a sociedade pós-idade média,
com seu boom tecnológico científico, como fator que determina nosso condicionamento da
vivencia da realidade. “A ciência desvinculou-se da mística, da filosofia, da ética e da estética,
da poesia e, de um certo modo, da própria vida” (CREMA,1988, p.22).
O mundo passou a ser percebido como uma máquina gigantesca e nós humanos
como parte desta engrenagem. Para Crema (1988) só no século XX a ciência começou, mesmo
que de forma tímida, a desvelar um universo vivo, dinâmico, interligado, sistêmico, denominado
holístico, o que “transcende o modelo mecanicista (...) é a interdependência e correlação dos
conceitos de mente e matéria” (CREMA 1988, p. 51). Na matéria se revela energia e esta energia
de traduz por consciência. Crema (1988) exemplifica claramente esta visão holística, quando se
refere a um conceito grego para denominar a Terra, o “Conceito de Gaia”. Este conceito,
segundo o autor, foi reproposto por W. Golding: “nesta concepção, nós, os humanos, somos
células de um dos tecidos do organismo de Gaia que, por sua vez, pode ser entendida como uma
célula do Universo Vivo” (CREMA 1988, p.21).
Para que o ator possa explorar todas as suas fontes de criatividade e expressão, ele
deve se conhecer profundamente e esta exploração é gradativa de acordo com o
autoconhecimento que tem.
Este autoconhecimento vem sendo trabalhado com mais afinco na atualidade, pois
as companhias e grupos de teatro estão tendo uma consciência maior de que resultados
melhores podem ser obtidos no palco com atores mais conscientes de seu material físico,
emocional e espiritual.
Temos o poder de nos controlar com o pensamento, e isso afeta até mesmo nossa
saúde. Para Grout (2013) os nossos cérebros estabeleceram um falso padrão de percepção de
que coisas inevitáveis podem controlar nossa vida, incluindo as enfermidades:
- Por que não, então, nos propormos a exercícios que nos tomam por completo,
buscando nesta energia de que somos formados, os meios necessários para executar as ações
artísticas e físicas no palco?
- Por que não trabalhar nossa mente para colher desta energia universal, que esta
em tudo e a qual tudo pertence, todas as possibilidades para resultados fantásticos no palco ou
mesmo na vida?
- Por que não abordar todos esses exercícios como forma de sistematizar o ator em
uma abordagem completa de seu corpo físico e mental?
É preciso ter acesso a áreas mais profundas do nosso ser para que este
conhecimento seja cada vez mais latente, e consequentemente usarmos este material
físico/energético em maior escala. Entendendo conceitos de bioenergética o ator pode ter mais
domínio e maior segurança em suas ações em cena, além do mais, a concepção de que ele pode
executar um movimento que, com atividades da antiginástica, lhe dará maior amplitude,
precisão e fluidez.
O ator tem que se entender, conhecer seus limites, suas habilidades, suas forças
físicas, sua intensidade, sua amplitude. O ator deve saber o momento certo de utilizar cada
característica sua, cada defeito, cada qualidade, tanto no físico como no geral. O ator deve
estimular cada expressão, saber os níveis a que pode chegar e como pode chegar de acordo com
a necessidade do espetáculo. O ator deve conhecer os meios energéticos que o deixa em
sintonia com a plateia, que o conecta com ela, meios estes que são mais do que unicamente os
visuais ou sonoros, visto que somos tomados por esta energia holística infinita, um “infinito
campo de possibilidades”, como é colocado por Grout (2013).
Sabemos que, para este processo de autoconhecimento tão importante nesta área,
conceitos e filosofias vêm se desenvolvendo ao redor do mundo. O Ioga, considerado por
especialistas como uma filosofia e ciência, objetiva este equilíbrio e esta aproximação do corpo
físico com o corpo energético.
Ioga é o caminho prático e natural para a integração da nossa essência
interior com o mundo exterior e com o próprio Universo. Trata-se de
uma filosofia e de uma ciência. E dentro dessa ciência existe uma
metodologia, onde estão inseridos os exercícios, que visam o
equilíbrio psicossomático, com reflexos positivos em todo o
organismo, afirma Claudio Duarte (SP), professor da modalidade há 35
anos e presidente da Associação Brasileira de Ioga.( ACHÔA, 2008,
p.01).
Esta filosofia milenar proveniente da Índia é um dos exemplos que podemos citar
como forma de prática pautada nos conceitos de bioenergética. Técnicas de meditação e
relaxamento, algumas delas muito usadas no teatro, também se baseiam na ponte “corpo,
mente e natureza”. (BAPTISTA, 2002, p.113)
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS:
A preparação física se faz necessária para todo objetivo que tenha o corpo como
foco de trabalho. Para o ator no palco não se faz diferente, as reservas físicas de energia e
resistência são intensamente necessárias para as execuções cênicas.
No palco, em cena, o ator utiliza do seu corpo com instrumento para seu trabalho.
A manutenção deste instrumento em boa forma para funcionamento das ações inerentes a
profissão requer uma disciplina imprescindível, pois se sabe dos efeitos nocivos que o tempo,
alimentação, clima, emoções e sedentarismo provocam no corpo humano.
No entanto o estudo nos chama a atenção que, para o ator, todo seu processo de
construção de personagem e a sua boa performance está intimamente relacionado a capacidade
de autoconhecimento, tanto físico, quanto espiritual. Para melhor resultado em cena, no palco,
o ator deve ter acesso ao seu corpo de forma mais completa possível, e quando falamos em
corpo, referimo-nos ao ser completo, de toda a energia que o compõe, parte visível e invisível,
e as características e detalhes que muitas vezes nos passam despercebidos.
Como fonte de criatividade completa em nossas mãos, não abrindo mão de nada
que nosso corpo pode nos oferecer e principalmente sabendo a maneira certa de utilizar tudo
isso, poderemos ter melhores resultados, não somente na execução dos trabalhos teatrais, não
somente para atores, mas para os seres humanos em geral, podendo isto ser um fator
determinante para nossa evolução individual e para a evolução da humanidade como sociedade.
Esta prática terapêutica criada por Lowen visa adaptar o corpo dando a este a
possibilidade de retomar seu lugar na natureza. Com práticas que visam descongestionar os
caminhos de energia pelo corpo, irá promover uma reestruturação física de forma a retomar a
harmonia e o ritmo natural da energia da vida por nosso corpo. Só depois de nos entendermos
como criaturas formadas de toda esta energia que transcende o conceito material e, só depois
que tivermos consciência da limitação patológica que o corpo humano está submetido, é que
poderemos transformar esta realidade, tendo contato íntimo com nossos corpos em todas as
suas escalas, físicas, mentais e espirituais.
Quanto mais se conhece a sua matéria prima, quanto mais contato se tem com ela,
maior resultado o artista terá. Para o ator essa matéria prima é o seu próprio corpo que é
emocional, físico, social, energético e espiritual. Relacionamos assim a questão dessa tomada,
onde dotado de capacidades de autoconhecimento total, explorando todas as possibilidades
criativas e expressivas que seu corpo lhe dispõe, seu resultado em cena será muito mais
significativo.
A questão levantada foi sobre a necessidade de que utilizamos atividades que nos
promovam inteligência em todos os aspectos, sendo eles emocionais, psíquicos ou físicos.
Encontramos nos autores estudados parâmetros de conhecimento para que se elabore
atividades que nos proporcionem um contato maior com nós mesmos e com esta bioenergia
circulante. Uma jornada de autoconhecimento que nos brinda como uma evolução, não
somente nas atividades artísticas, mas principalmente como seres deste infinito poder que nos
foi dado e que cabe só a nós acessá-lo.
REFERÊNCIAS:
ACHÔA, Y. Ioga, benefícios do corpo e alma. Revista viva saúde. 2008. Editora Escala.
Disponível em :http://revistavivasaude.uol.com.br/Edicoes/5/artigo31051.asp/ . Acessado em:
15/08/2014.
BAPTISTA, M.R; DANTAS, E.H.M. Yoga no controle de stress. Fitness & Performance Journal,
v.1, n.1, p.12-20, 2002.
CREMA, R. Introdução à visão holística: breve relato de viagem do velho ao novo paradigma.
SUMMUS EDITORIAL. 1988. SÃO PAULO/SP.
LOWEN, A. Prazer, Uma abordagem criativa da vida. Edição integral. São Paulo: Circulo do livro
S/A, 1970.
BERTHERAT, T. O corpo tem suas razões, antiginástica e consciência de si. 5ª edição. São Paulo:
Martins Fontes, 1976.