Você está na página 1de 196

estudos históricos

EH64 Corporativismo
e neocorporativismo

ISSN 2178-1494
Estudos Históricos, volume 31, número 64, mai.-ago. de 2018. Rio de Janeiro: Centro de Pesquisa e
Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getulio Vargas, 1988
Quadrimestral
Resumos em português, inglês e espanhol
Editada e distribuída pela Editora Fundação Getulio Vargas
ISSN: 2178-1494.
1. História 2. Historiografia 3. Periódicos 4. Ciências Sociais 5. Economia e Sociedade.
I – : Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getulio Vargas
CDD 981.005
CDU 981(051)

E-mail: eh@fgv.br
Endereço na internet: http://www.fgv.br/cpdoc/revista
Endereço postal: Fundação Getulio Vargas/CPDOC
Secretaria da Revista Estudos Históricos
Praia de Botafogo, 190, 14º andar, Rio de Janeiro 22.523-900 RJ
H estudos históricos 64|Corporativismo e neocorporativismo
Rio de Janeiro, vol. 31, no 64, p. 125-319, maio-agosto 2018

Sumário

CORPORATIVISMO E NEOcORPORATIVISMO |129


CORPORATISM AND NEOcORPORATISM
CORPORATIVISMO Y NEOcORPORATIVISMO
Angela Moreira Domingues da Silva, Marco Aurélio Vannucchi e Paulo Fontes

Artigos

LA REPRESENTAcIÓN POlÍTIcA EN ESPAÑA DURANTE lA DIcTADURA DE PRIMO DE RIVERA |131


A REPRESENTAÇÃO POlÍTIcA NA ESPANHA DURANTE A DITADURA DE PRIMO DE RIVERA
POlITIcAl REPRESENTATION IN SPAIN DURING THE DIcTATORSHIP OF PRIMO DE RIVERA
Miguel Ángel Giménez Martínez

CORPORATISM AND THE BRITISH CONSTITUTIONAl HERITAGE: EVIDENcES FROM THE HISTORY OF IDEAS |151
O cORPORATIVISMO E O lEGADO cONSTITUcIONAl bRITÂNIcO: EVIDÊNcIAS DA HISTÓRIA DAS IDEIAS
El cORPORATIVISMO Y El lEGADO cONSTITUcIONAl bRITÁNIcO: EVIDENcIAS A PARTIR DE lA HISTORIA DE lAS IDEAS
Valerio Torreggiani

NA GÊNESE DA CONSTITUIÇÃO POlÍTIcA DE 1933: O IDEÁRIO cORPORATIVO E A ESTRUTURA EcONÔMIcO-SOcIAl


DO AUTORITARISMO PORTUGUÊS |173
IN THE GENESIS OF THE POlITIcAl CONSTITUTION OF 1933: THE cORPORATE IDEOlOGY AND THE EcONOMIc-SOcIAl STRUcTURE OF PORTUGUESE AUTHORITARIANISM
EN lA GÉNESIS DE lA CONSTITUcIÓN POlÍTIcA DE 1933: lA IDEOlOGÍA cORPORATIVA Y lA ESTRUcTURA EcONÓMIcA Y SOcIAl DEl AUTORITARISMO PORTUGUÉS
Paula Borges Santos

A INSTITUcIONAlIZAÇÃO DO “SOcIAl” NO ESTADO NOVO PORTUGUÊS: PREVIDÊNcIA cORPORATIVA E SEGUROS SOcIAIS


VOlUNTÁRIOS |197
THE INSTITUcIONAlIZATION OF THE “SOcIAl” IN THE PORTUGUESE NEW STATE: CORPORATIST WElFARE AND VOlUNTEER SOcIAl INSURANcES
LA INSTITUcIONAlIZAcIÓN DEl “SOcIAl” EN lO ESTADO NUEVO PORTUGUÉS: PREVIDÊNcIA cORPORATIVA Y SEGUROS SOcIAlES VOlUNTARIOS
Álvaro Garrido

CORPORATISM AND NEO-cORPORATISM: DEVElOPMENTS IN THE 20TH -cENTURY ITAlIAN lEGAl ORDER |219
CORPORATIVISMO E NEOcORPORATIVISMO: DESENVOlVIMENTOS NA ORDEM JURÍDIcA ITAlIANA NO SÉcUlO XX
CORPORATIVISMO Y NEO-cORPORATIVISMO: DESAROllOS EN El ORDEN JURÍDIcO ITAlIANO EN El SIGlO XX
Irene Stolzi
Ensaio bibliográfico

CORPORATIVISMO E NEOcORPORATIVISMO | 243


CORPORATISM AND NEOcORPORATISM
CORPORATIVISMO Y NEOcORPORATIVISMO
Cláudia M. R. Viscardi

Colaboração especial

THE cONcEPT OF VOcATIONAl ORDERS IN HUNGARY bETWEEN THE TWO WORlD WARS |257
O cONcEITO DE ORGANIZAÇÕES cORPORATIVAS NA HUNGRIA ENTRE AS DUAS GUERRAS MUNDIAIS
El cONcEPTO DE ORGANIZAcIONES cORPORATIVAS EN HUNGRÍA ENTRE lAS DOS GUERRAS MUNDIAlES
Péter Krisztián Zachar

CORPORATIVISMO Y POlÍTIcA SOcIAl EN ESPAÑA. ORÍGENES Y EVOlUcIÓN | 277


CORPORATIVISMO E POlÍTIcA SOcIAl NA ESPANHA: ORIGEM E EVOlUÇÃO
CORPORATISM AND SOcIAl POlIcY IN SPAIN: ORIGIN AND DEVElOPMENT
Miguel Ángel Perfecto

Entrevista

ENTREVISTA cOM RENATO BOScHI | 297


INTERVIEW WITH RENATO BOScHI
ENTREVISTA cON RENATO BOScHI
Concedida a Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca
Editorial

Corporativismo e neocorporativismo
Corporatism and neocorporatism
Corporativismo y neocorporativismo

Angela Moreira Domingues da SilvaI*

Marco Aurélio Vannucchi1* e Paulo FontesI*

Editores

S urgido em meio à ampliação da participação dos setores sociais subalternos na política


e à consolidação do capitalismo industrial, o corporativismo foi apresentado por seus
defensores como uma modalidade de representação de interesses e de organização societal
e estatal alternativa tanto à democracia liberal quanto ao socialismo. Propondo-se garantir
estabilidade social pela conciliação de classes, o corporativismo irradiou-se da Europa para o
restante do mundo (e a América Latina foi-lhe um terreno fértil) nas primeiras décadas do sé-
culo passado.1 Tema prestigiado pela historiografia e pela ciência política, tem conhecido, no
último decênio, um interesse renovado, que tem gerado livros, artigos e eventos acadêmicos

http://dx.doi.org/10.1590/S2178-14942018000200001

I
Escola de CIências Sociais da Fundação Getulio Vargas (CPDOC/FGV) – Rio de Janeiro – Brasil.

*Professores da Escola de CIências Sociais da Fundação Getulio Vargas (CPDOC/FGV) e Editores da Revista
Estudos Históricos. (angelamoreirads@gmail.com; marco.vannucchi@fgv.br; paulo.fontes@fgv.br)

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 129-130, maio-agosto 2018 129
Angela Moreira Domingues da Silva, Marco Aurélio Vannucchi e Paulo Fontes

no Brasil e no exterior. Um dos traços marcantes da nova produção sobre o corporativismo é


o debate sobre sua relação com regimes autoritários e democráticos. Arriscaríamos a afirmar
que a posição dominante, atualmente, entre os estudiosos é de recusa de uma associação ne-
cessária entre corporativismo e autoritarismo. Entre os argumentos mobilizados pelos acadê-
micos que comungam de tal posição está o exemplo escandinavo, que adotou formas corpo-
rativas para implementar, em um ambiente político democrático, Estados de bem-estar social.
O presente número de Estudos Históricos dispõe-se, assim, a contribuir para aprofundar
a reflexão em torno das experiências do corporativismo histórico (anterior à Segunda Guerra)
e do neocorporativismo (posterior à Segunda Guerra) no Brasil e na Europa. No primeiro artigo
da edição, Miguel Ángel Martínez investiga a introdução, por meio da Assembleia Nacional
Consultiva, da representação política de inspiração corporativa na Espanha da década de
1920, durante a ditadura de Primo de Rivera. O segundo artigo, de autoria de Valerio Tor-
reggiani, estuda a presença da modalidade corporativa de representação de interesses no
repertório político britânico da primeira metade do século XX. Em seguida, Paula Borges dos
Santos ilumina o debate em torno de soluções corporativas, nos âmbitos econômico e social,
durante a elaboração da Constituição portuguesa de 1933. Álvaro Garrido também trata do
corporativismo português, examinando o (frágil) aparato de seguridade social instaurado pela
ditadura salazarista. Por sua vez, Irene Stolzi acompanha o corporativismo no ordenamento
jurídico italiano, tanto no contexto fascista quanto no democrático dos anos 1980 e 1990.
Na seção Ensaio bibliográfico, Cláudia Viscardi recenseia a produção contemporânea
sobre corporativismo, em diálogo com a literatura clássica sobre o tema. Na seção Colabora-
ção especial, Péter Zachar explora a elaboração de um projeto, informado parcialmente pelo
ideário corporativo, de reforma social, econômica e política na Hungria do entreguerras. E Mi-
guel Ángel Perfecto traça uma genealogia das propostas corporativas na Espanha, ao mesmo
tempo que investiga sua implementação no país a partir da década de 1920.
O número encerra-se com uma entrevista concedida a Estudos Históricos por Renato
Boschi, um dos mais importantes estudiosos do corporativismo no Brasil.

Referência Bibliográfica

SCHMITTER, Philippe. Still the century of corporatism?. The Review of Politics, v. 36, n. 1, 1974.

130 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 130-130, maio-agosto 2018
Artigo

La representación política en España


durante la dictadura de Primo de Rivera
A representação política na Espanha durante a ditadura de Primo
de Rivera
Political representation in Spain during the dictatorship of Primo
de Rivera

Miguel Ángel Giménez MartínezI*

http://dx.doi.org/10.1590/S2178-14942018000200002

I
Universidade Autônoma de Madri – Espanha.

*PhD em história pela Universidade de Castilla-la Mancha e pesquisador do programa “Juan de la Cierva” na Universida-
de Autônoma de Madri. (miguelangelgimenezmartinez@gmail.com)

Artigo recebido para publicação em 26 de junho de 2017 e aprovado para publicação em 29 de maio de 2018.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 131-150, maio-agosto 2018 131
Miguel Ángel Giménez Martínez

Resumen
La dictadura de Miguel Primo de Rivera supuso el ensayo, por primera vez en España, de fórmulas representativas
alejadas del modelo liberal parlamentario. La asunción de postulados corporativos, fundamentados en una concep-
ción orgánica de la sociedad, permitió la creación de la Asamblea Nacional Consultiva, cuerpo llamado a colaborar
en las tareas de gobierno y ofrecer una salida constitucional a la dictadura. Esta asamblea llegó a alumbrar un
anteproyecto de Constitución en el que se preveían unas Cortes de tintes corporativos que, sin embargo, no llegaría
a aprobarse. Combinando la exégesis de textos jurídicos, la revisión de los diarios de sesiones y el contraste con las
aportaciones doctrinales, este artículo estudia la naturaleza, composición, organización y funciones de estos órga-
nos, así como el papel político que desempeñaron dentro del esquema de poder de la época.

Palabras clave: Corporativismo; Representación política; Parlamento; Dictadura; Primo de Rivera; España;
Siglo XX.

Resumo
A ditadura de Miguel Primo de Rivera representou, pela primeira vez na Espanha, a implementação de fórmulas
representativas distantes do modelo liberal parlamentar. A escalada de ideias corporativas, fundamentadas numa
concepção orgânica da sociedade, permitiu a criação da Assembleia Nacional Consultiva, criada para apoiar as
propostas do governo e oferecer uma saída constitucional para a ditadura. Tal assembleia chegou a possibilitar um
anteprojeto de Constituição no qual se previam cortes corporativas, as quais, no entanto, nunca chegaram a ser
aprovadas. Combinando a exegese de textos jurídicos, a revisão do direito de sessões e o contraste com as contri-
buições doutrinárias, este artigo estuda a natureza, a composição, a organização e as funções desses órgãos, assim
como o papel político que desempenharam dentro do esquema de poder da época.

Palavras-chave: Corporativismo Representação política; Parlamento; Ditadura Primo de Rivera; Espanha;


Século XX.

Abstract
The dictatorship of Miguel Primo de Rivera put into practice, for the first time in Spain, a representative system away
from the liberal parliamentary model. The acceptance of corporative principles, based on an organic conception of
society, allowed for creating the National Consultative Assembly, a non-legislative body destined to cooperate in
government tasks and provide a constitutional way out from dictatorship. An assembly that came to conceive a draft
constitution in which the Cortes was planned with a corporatist character. Combining the exegesis of legal texts, the
review of records of sessions and the contrast with doctrinal contributions, this article studies the nature, compo-
sition, organization and functions of these bodies, as well as the political rule they carried out within the structure
of power at that time.

Keywords: Corporatism; Political representation; Parliament; Dictatorship; Primo de Rivera; Spain;


20th century.

132 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 132-150, maio-agosto 2018
La representación política en España durante la dictadura de Primo de Rivera

La quiebra del régimen representativo liberal

E l golpe de Estado de 13 de septiembre de 1923 supuso la liquidación del régimen par-


lamentario en España y su sustitución por un directorio presidido por el general Miguel
Primo de Rivera e integrado por nueve vocales en representación de las ocho regiones mili-
tares y la Armada (Tusell, 1987, p. 230 y ss.). Un decreto dictado cuatro días después disolvió
las instituciones representativas previstas en la Constitución de 1876 —cortes, diputaciones,
ayuntamientos— y otorgó a Primo de Rivera la facultad de proponer directamente al rey
Alfonso XIII textos con valor de ley (García-Nieto, Donézar y López Puerta, 1973, p. 129). Eran
los primeros pasos de un nuevo régimen en el que no tendría cabida la representación popular
y que giraría en torno a la acción ejecutiva enérgica emprendida por el “cirujano de hierro”,
llamado a extirpar los problemas inmediatos que aquejaban al país.La dictadura de Primo
de Rivera se enmarca, así pues, dentro de los parámetros ideológicos del regeneracionismo,
que buscaba una reforma rápida y sustancial de las prácticas políticas —los considerados
“excesos” del parlamentarismo— para acomodarlas al espíritu de la Constitución. No se
buscaba, por lo tanto, la instauración de un régimen puramente fascista, pues aunque la Italia
mussoliniana sirvió de inspiración simbólica y en ambos casos existió el miedo a una revolu-
ción proletaria, la dictadura española no contaba con una ideología previamente definida ni
con un partido sólido que tomara el poder por la fuerza (Herr, 1977, p. 207; Ben-Ami, 1980;
Tusell y Saz, 1982; Sueiro, 1983, p. 195-198; Peloille, 2005). La influencia del fascismo italiano
en España de los años 1920 fue “marginal y sobrepuesta” (Gómez Navarro, 1991, p. 266)
y no significó más que un “revulsivo ideológico y sociopolítico” sobre el preexistente bagaje
contrarrevolucionario (Morodo, 1980, p. 10). En este sentido, resulta clara la distancia entre
el Partito Nazionale Fascista y la Unión Patriótica, que no fue sino una organización creada
desde el poder, carente de un programa coherente de gobierno, cuyos miembros abrigaban
el deseo de alcanzar un puesto ventajoso en la estructura del Estado (Gómez Navarro, 1985;
Martínez Segarra, 1992).
Primo de Rivera aprovechó en su favor el descrédito que durante la Restauración habían
alcanzado las Cortes y el régimen representativo liberal. Así, cuando los presidentes de los
últimos Congreso y Senado constitucionales —Melquíades Álvarez y el conde de Romanones,
respectivamente— visitaron al rey poco después del levantamiento militar para exigirle la
necesidad de reanudar las sesiones parlamentarias conforme a lo dispuesto en la Constitu-
ción de 1876, el dictador se permitió comentar: “El país no se impresiona ya con películas de
esencias liberales y democráticas; quiere orden, trabajo y economía” (apud. Pemán, 1929,
p. 30). Unas palabras que revelan el concepto autoritario de la política sostenido por el ge-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 133-150, maio-agosto 2018 133
Miguel Ángel Giménez Martínez

neral, quien consideraba imposible arrancar la corrupción del régimen precedente si no era
mediante un mando ejecutivo fuerte.
Sucede, sin embargo, que la autoridad ejercida sin control acaba por transformarse en
tiranía, peligro contra el que tienen su razón de ser las Cámaras representativas en su lucha
contra el poder personal. Para sustraerse a este riesgo, Primo de Rivera planteó su dictadura
como una solución de carácter transitorio, que se prolongaría durante el tiempo preciso para
“renovar” las instituciones del país. Pero ese planteamiento inicial fue traicionado por el pro-
pio dictador: la pasión por el poder le llevó a tratar de perpetuar su régimen buscando algún
grado de participación del pueblo en el Estado. Es decir, intentó que —en terminología de Sch-
mitt (1968, cap. 4º) — la “dictadura comisoria” se convirtiera en “soberana”, adentrándose
en un círculo vicioso de difícil salida que afecta a casi todas las dictaduras: cuando tratan de
introducir cauces representativos tienen que recurrir a vías de expresión propias de sistemas
liberales, con lo que sus regímenes se convierten en híbridos y queda comprometida la eficacia
ejecutiva que prometían.
Sin embargo, la representación es absolutamente necesaria para los gobernantes cuando
ya no pueden apoyar su poder en las armas, motivo por el cual los dictadores necesitan para
sí y para sus herederos algún grado de representación. De ahí que, pasado el tiempo en que
Primo de Rivera tenía decidido dejar el poder, considerase la posibilidad de introducir una
organización política estable a través de una Constitución plebiscitada, lo que a juicio de Sán-
chez Agesta (1974, p. 482) revela cómo sobre la dictadura “pesó el mito constitucional, como
supuesto de muchos de sus actos y como crítica de su propia existencia”.
Para preparar el terreno, Primo de Rivera sustituyó el 3 de diciembre de 1925 el directo-
rio militar por otro civil que no perdió las máximas prerrogativas, incluyendo las legislativas.
En esta misma línea se incardina el plebiscito celebrado entre el 10 y el 13 de septiembre
de 1926, con el que se pretendía demostrar el índice de popularidad de la dictadura. Como
explica Tuñón de Lara (1966, p. 157), “los Comités de Unión Patriótica y entidades oficiales
dispusieron unas simples hojas en las que estampasen su firma los españoles de ambos sexos.
Así fueron recogidas 6.697.164 firmas sin garantías ni comprobación en cuanto a la identidad
de los firmantes ni a la forma de expresar su opinión”.
Pero la iniciativa más importante para cumplir el propósito de “sustituir una dictadura
militar por otra civil y económica” (apud. Díaz-Plaja, 1965, p. 68-70) fue la creación de un
cuerpo unicameral “libre de la enrevesada filosofía y la humillante imitación del parlamenta-
rismo liberal” (Gaceta de Madrid, 4-XII-1925, p. 1.219). Poco se sabía sobre la convocatoria,
la elección y las facultades de la Cámara cuando Primo de Rivera lanzó la idea, pero la trayec-

134 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 134-150, maio-agosto 2018
La representación política en España durante la dictadura de Primo de Rivera

toria ideológica de las personas y colectivos que sostenían la dictadura hacía indicar que la
organización de la representación política tendría los ingredientes propios del corporativismo
(García Canales, 1977, p. 119-132; Fernández Sarasola, 2008, p. 900-906). Tradicionalistas,
católicos y mauristas, que rechazaban por igual el parlamentarismo liberal, aprovecharon la
indefinición de Primo de Rivera —cuya ideología era, a juicio de González Cuevas (2005, p.
101), una amalgama inclasificable de ideas hobbesianas, regeneracionistas y nacionalistas—
para poner en marcha su propio proyecto de representación política. En el campo carlista,
hombres como Vázquez de Mella (1999, p. 119) o Pradera (1941, p. 220) consideraban el
parlamentarismo incompatible con el “auténtico régimen representativo” que, a su juicio, se
edificaba sobre bases orgánicas. Una representación que presuponía la participación en el
Estado de “entidades naturales” tales como la familia o el municipio, desplazando cualquier
fórmula asociativa artificial, como los partidos políticos. Desde el catolicismo social, Bofarull
(1912, p. 117-137) reclamaba una representación orgánica de la sociedad más acorde con la
tradición aristotélico-tomista. Y desde el maurismo, una de sus principales figuras, Goicoechea
(1925, p. 69-70) proponía un “remedio higiénico” basado en la combinación de democracia
individualista y democracia orgánica.

La Asamblea Nacional Consultiva

T odos estos principios cristalizaron en el Decreto-Ley de 12 de septiembre de 1927 (Ga-


ceta de Madrid, 14-IX-1927, p. 1.498-1.501), por el que se creaba la Asamblea Nacio-
nal Consultiva, a la que debían acudir los representantes de las diferentes clases e intereses
de la nación. Una idea en la que insistiría el presidente de la Cámara, José Yangüas Messía,
para quien la composición de la asamblea habría de responder a “una concepción orgánica
en la que se advierte el propósito [...] de que concurran la representación del Estado, la del
elemento individual y la del elemento corporativo público y social” (Diario de Sesiones de
la Asamblea Nacional —en adelante DSAN—, 10-X-1927, p. 8-9). La institución puesta en
planta era, por lo tanto, de signo inequívocamente corporativo, una opción que a juicio de
Mirkine-Guetzévitch (1928, p. 796) se había escogido para “someter a España a esa disciplina
que la libre del virus democrático”.
El Decreto-Ley estipulaba en su art. 15 que la asamblea habría de contar con un máximo
de 375 y un mínimo de 325 integrantes, pero un decreto posterior (Gaceta de Madrid, 28-
IX-1927, p. 1.754) amplió el número de asambleístas a 400 al objeto de “dar representación
y encaje a los elementos representativos de las entidades culturales”. Por primera vez en la

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 135-150, maio-agosto 2018 135
Miguel Ángel Giménez Martínez

historia del parlamentarismo español (Giménez Martínez, 2017, p. 281) se permitió a las
mujeres —previa autorización de sus maridos, siempre y cuando estos no formaran parte de
la asamblea— integrar una cámara representativa: pertenecieron a ella un total de trece mu-
jeres, la mayoría relacionada con el mundo de la educación, la cultura o la beneficencia, como
Concepción Loring —primera mujer que hizo uso de la palabra en el hemiciclo—, María de
Maeztu o Micaela Díaz Rabaneda (Díaz Fernández, 2005). El art. 15 del Decreto-Ley obligaba
igualmente a los miembros de la asamblea a cumplir una serie de requisitos previos —ser
español, contar más de 25 años y estar libre de sentencia condenatoria— y establecía como
método de designación un orden acordado por el Consejo de Ministros, lo que anulaba de en-
trada cualquier posibilidad de que la Cámara pudiera servir de contrapeso al poder ejecutivo.
El art. 16 del Decreto-Ley especificaba cómo había de completarse la composición de la
asamblea: un representante municipal y otro provincial por cada una de las provincias, un re-
presentante por cada organización provincial de la Unión Patriótica, una serie de representan-
tes del Estado, una representación “por derecho propio” en virtud de las categorías y cargos
ejercidos y una serie de representantes de condición diversa ligados a la cultura, la producción,
el trabajo, el comercio y demás “actividades de la vida nacional”. A juicio de Morodo (1973, p.
86), Primo de Rivera introducía con todo ello una representación corporativa que consumaba
una ruptura, si bien no radical todavía, con el modelo parlamentario y su presupuesto doctrinal
y técnico: el sufragio individual, y ello porque la designación gubernativa —directa o indirec-
ta— sustituía a la elección popular.
La representación de las organizaciones provinciales de Unión Patriótica era ejercida por
sus presidentes provinciales, la mayoría de ellos antiguos políticos de los partidos turnistas
que “corrieron a alistarse en las huestes del vencedor, porque lo único que les interesaba era
estar siempre en auge” (Aunós, 1942, p. 302). Aunque el propio Primo de Rivera recomendó
una selección previa de los afiliados para evitar que Unión Patriótica se convirtiera en una
“agencia de ventajas y colocaciones”, no pudo evitar que la red caciquil de la Restauración se
infiltrara en la organización (González Calleja, 2005, p. 189-190).
La representación municipal se dilucidaba en unas elecciones de dos grados. En el prime-
ro, los alcaldes y concejales de la provincia designaban entre ellos a unos compromisarios que,
en segundo grado, elegían al correspondiente asambleísta. Los representantes provinciales
eran elegidos entre los miembros de la diputación respectiva (art. 17). Estos procesos elec-
torales distaban de celebrarse con transparencia. Primero, porque los concejales y diputados
provinciales eran nombrados indirectamente por el gobierno, a través de los gobernadores
civiles y delegados gubernativos —dichos nombramientos se basaban en la previa condición

136 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 136-150, maio-agosto 2018
La representación política en España durante la dictadura de Primo de Rivera

de figurar en las listas de adheridos a Unión Patriótica. El partido único pudo, gracias a los
“buenos servicios” de los gobernadores civiles, apoderase de la administración municipal y
provincial. Como concluye Ben-Ami (1984, p. 151), la mayoría, sino la totalidad, de los asam-
bleístas representantes de las provincias eran upetistas. Por otro lado, el general Martínez
Anido, ministro de la Gobernación, no dudó en emplear los viejos métodos de la época de la
Restauración para impedir que se introdujeran elementos políticos hostiles. En este sentido, la
vieja tesis de Linz (1972, p. 380), quien habla de la “gigantesca discontinuidad” de la clase
política de la dictadura respecto al régimen precedente, ha de ser matizada a la luz de los tra-
bajos de Tusell (1977) y, sobre todo, de Gómez Navarro, González Calbet y Portuondo (1980,
p. 169), quienes apuntan cómo el caciquismo persistió a todos los niveles y el proclamado
regeneracionismo de la dictadura quedó reducido en este aspecto a la nada.
La representación del Estado correspondía “a los directores generales y representantes
de Consejos, Patronatos u otros organismos que tengan categoría similar y el Gobierno desig-
ne”. Los titulares de estos cargos no podían renunciar al escaño; solo perdían la condición de
asambleístas cuando cesaban en la administración. Los ministros no podían formar parte de la
asamblea, pero sí “intervenir en la labor de ella”, razón por la cual tenían un puesto especial
y exclusivo en los salones de reuniones (art. 18). Los asambleístas “por derecho propio” se di-
ferenciaban de los representantes del Estado por el hecho de ostentar una serie de cargos que
otorgaban de forma automática la categoría de parlamentario, sin mediar el nombramiento
intermedio del Gobierno (art. 19): eran los capitanes generales del Ejército y la Armada y el
almirante jefe del Estado Mayor de la Armada; los presidentes del Consejo de Estado y de los
Tribunales Supremos de Justicia, de Guerra y Marina y de Hacienda Pública; el presidente de la
Diputación de la Grandeza; los arzobispos; los fiscales del Tribunal Supremo y de la Rota; los
gobernadores del Banco de España e Hipotecario y del Banco de Crédito Local; los presidentes
de los Consejos de Trabajo, Instrucción Pública, Superior de Fomento y Superior Bancario y
Ferroviario; los que en Madrid y Barcelona ocupaban el cargo de capitán general, gobernador
civil, obispo, presidente de la Diputación, alcalde, presidente de la Comisión organizadora de
Somatenes y rector de la Universidad; el presidente y secretario general del Comité Nacional
de la Unión Patriótica; y también los presidentes y vocales de la Comisión de Codificación
y los consejeros permanentes de Estado. Todos ellos hombres de perfil netamente estatal
y gubernamental, pues, a excepción de los jerarcas eclesiásticos, eran nombrados directa o
indirectamente por el gobierno. De hecho, como calculara Linz (1987, p. 571), el 40% de los
asambleístas representantes del Estado y ex officio eran oficiales de alta graduación, dato
significativo en un régimen impuesto por un golpe militar.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 137-150, maio-agosto 2018 137
Miguel Ángel Giménez Martínez

La representación de “actividades de la vida nacional” era la que dotaba de mayor perfil


corporativo a la asamblea, al integrar a personas designadas libremente por el gobierno, pero
con “ponderada representación” de las Reales Academias Española, de la Historia, de Bellas
Artes, de Ciencias Exactas, Físicas y Naturales, de Ciencias Morales y Políticas, de Medicina y
Jurisprudencia; la enseñanza en sus distintos grados; la agricultura, la industria y el comercio,
en su triple matiz patronal, técnico y obrero; la prensa y, en general, “todo cuanto pueda
representar manifestación o pugna de intereses ciudadanos” (art. 20). En la práctica, más
que la “vida nacional” en su conjunto, este grupo representaba a las clases dominantes y sus
intereses, es decir, se trataba de hombres de negocios, banqueros, industriales, comerciantes y
terratenientes (González Calbet, 1976, p. 64-68; Gómez Navarro, González Calbet y Portuon-
do, 1979). El mundo del trabajo quedó infrarrepresentado, aunque la dictadura nombró a siete
socialistas que finalmente declinaron la invitación por orden expresa de la Unión General de
Trabajadores (Juliá, 1997, p. 125-158; Andrés-Gallego, 1977, p. 155-177). Solo los represen-
tantes de los sindicatos católicos y libres acudieron a la llamada del dictador (Winston, 1985,
p. 226-292).
Con la intención de paliar el carácter netamente gubernamental de esta última repre-
sentación, Primo de Rivera impulsó la aprobación de un Decreto-Ley (Gaceta de Madrid,
30-VII-1929, p. 739) que preveía “el ensanchamiento del concepto de corporación” a fin
de otorgar asientos específicos en la asamblea a entidades en principio excluidas. De esta
manera, se reservaron seis escaños a los Colegios de Abogados y dos a los de Doctores de
Madrid y Barcelona; tres para la Real Academia de Jurisprudencia y Legislación; tres para la
Real Academia de Ciencias Morales y Políticas; uno para cada una de las Reales Academias
Española, de la Historia, de Bellas Artes, de Ciencias y de Medicina, respectivamente; once
para las universidades del país; cinco para la Unión General de Trabajadores; dos para la
Confederación de Sindicatos Obreros Libres; dos para la Confederación de Sindicatos Obre-
ros Católicos; uno para la Asociación pro-Sociedad de Naciones y otro para la Asociación
de Derecho Internacional.
Esta apertura de las bases representativas del régimen con la intención de atraerse a
la intelligentsia resultó, sin embargo, un completo fracaso, pues —con las señaladas excep-
ciones de Eugenio D’Ors y Ramiro de Maeztu— los intelectuales rechazaron el régimen de
Primo de Rivera (García Queipo de Llano, 1987, p. 476-483). Así, tanto la Unión General de
Trabajadores como la Real Academia de Jurisprudencia y Legislación —presidida por el ex
ministro Ángel Ossorio— renunciaron a los puestos que se les habían asignado; el Colegio de
Abogados de Madrid eligió a José Sánchez Guerra, Santiago Alba y Eduardo Ortega y Gasset,

138 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 138-150, maio-agosto 2018
La representación política en España durante la dictadura de Primo de Rivera

abiertos enemigos de la dictadura; la Universidad de Valladolid vio retirado su escaño cuando


el claustro eligió por unanimidad a Miguel de Unamuno; y en la Universidad de Oviedo triunfó
Melquíades Álvarez frente al candidato oficial.
La asamblea primorriverista se rigió por dos reglamentos: el primero, provisional, de 20
de septiembre de 1927 (Gaceta de Madrid, 21-IX-1927, p. 1.622-1.626); el segundo, defini-
tivo, de 5 de diciembre de 1928 (Gaceta de Madrid, 8-XII-1928, p. 1.557-1.563). Ambos eran
heterónomos, es decir, elaborados por el gobierno, lo que revela la falta de autonomía que su-
frió la Cámara para establecer su propia regulación interna. El propio Decreto-Ley de creación
de la asamblea negaba cualquier autonomía reglamentaria, al preceptuar en su art. 1 que la
actividad de aquélla había de quedar “encauzada y dirigida por el Gobierno”. De hecho, como
señala Fernández Sarasola (2012, p. 75-76), muchos aspectos aparecían tan detalladamente
en el Decreto-Ley que los reglamentos se limitaban a regularlos de forma muy exigua, cuando
no a reproducir lo contemplado en aquel texto.
Desde el punto de vista organizativo, tanto el presidente de la asamblea como dos de los
vicepresidentes y de los secretarios de la mesa eran elegidos por el gobierno (art. 11 del De-
creto-Ley), en clara ruptura con el modelo representativo liberal, que garantizaba la autonomía
parlamentaria en la designación de sus órganos directivos. El Ejecutivo invadía también las
competencias de la Cámara al decidir, de acuerdo con el presidente de ésta, el orden del día
de las sesiones plenarias. El presidente de la asamblea gozaba, por lo demás, de amplias com-
petencias: interpretar el reglamento, dirigir las discusiones, aplicar las sanciones disciplinarias,
distribuir los trabajos de las secciones, designar a los miembros de estas e incluso presidirlas
(art. 12 del Decreto-Ley, arts. 9-18 del Reglamento provisional, y arts. 17-27 del reglamento
definitivo). Se comprende cómo, con este perfil, la presidencia se convirtió un mero órgano de
control del Ejecutivo sobre los asambleístas (Torres Muro, 1987, p. 163).
Para su trabajo cotidiano, la asamblea fue dividida en dieciocho secciones que, a dife-
rencia de las vigentes en las Cortes del siglo XIX y hasta el reglamento del Congreso de 1918,
tenían atribuciones exclusivas para conocer de ciertos asuntos y su composición no dependía
del azar. Se trataba, por lo tanto, de un sistema que, a través de una terminología impropia,
venía a establecer un modelo de comisiones permanentes (Fraile Clivillés, 1975, p. 327). En
efecto, los miembros de las secciones no eran elegidos por los asambleístas, sino nombrados
discrecionalmente por el presidente de la Cámara (art. 18 del Decreto-Ley, arts. 37-48 del
reglamento provisional, y arts. 44-64 del reglamento definitivo). Junto a las secciones existía
una comisión de corrección de estilo y otra de gobierno interior, así como cuantas el presidente
de la asamblea considerara necesario crear, a propuesta del gobierno, para realizar investiga-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 139-150, maio-agosto 2018 139
Miguel Ángel Giménez Martínez

ciones (art. 5 del Decreto-Ley, arts. 49-50 y 90-96 del reglamento provisional, y arts. 105-113
del reglamento definitivo).
En torno al método de funcionamiento de la Cámara, el Decreto-Ley imponía restric-
ciones al desarrollo de las sesiones: solo podía haber cuatro plenos al mes, de seis horas de
duración cada uno, prorrogables a siete si así lo decidía el presidente de la asamblea (art. 10).
Se contemplaba un único período de sesiones, que comprendía desde octubre hasta julio del
año siguiente, respetándose las fiestas nacionales y religiosas, así como las vacaciones de
Navidad y Semana Santa (art. 6). Las sesiones podían celebrarse a puerta cerrada por decisión
del presidente de la Cámara o del gobierno, y los periodistas parlamentarios habían de remitir
las galeradas antes de su publicación a una oficina de censura establecida en el mismo palacio
de la Carrera de San Jerónimo.
En cuanto a sus facultades, la Asamblea Nacional Consultiva aparecía como un “pseu-
doparlamento” muy alejado de las Cortes del período precedente (Tamames, 2008, p. 210).
Ya el preámbulo del Decreto-Ley aclaraba que “no legislará, no compartirá soberanías; pero,
por encargo del Gobierno y aun por iniciativas propias, colaborará en su obra con carácter
e independencia garantizadas por su origen, por su composición y por sus fueros”. El art. 1
del mencionado texto concretaba que la función de la asamblea era “preparar y presentar
escalonadamente al Gobierno, en un plazo de tres años, y con carácter de anteproyectos,
una legislación general y completa, que a su hora ha de someterse a un sincero contraste de
opinión pública y, en la parte que proceda, a la Real Sanción”.
En los preceptos subsiguientes (arts. 2-5) se concretaban otras funciones complementa-
rias de la institución: el enjuiciamiento de la política general “desde el 1º de julio de 1909”,
la fiscalización de la acción del gobierno mediante la presentación de interpelaciones dirigidas
a sus ministros —quienes podían aceptarlas o rechazarlas en el plazo de ocho días—, la
proposición de medidas en el orden económico y la inspección a instancias del gobierno de
determinados servicios y organismos del Estado.
El art. 9 del Decreto-Ley establecía el iter que los citados anteproyectos habían de seguir
para su aprobación. El presidente de la Cámara, de acuerdo con el gobierno, encargaba a
las secciones el estudio o dictamen de los asuntos de su especialidad, aunque éstas también
podían tener iniciativas propias. Una vez aprobado por la mayoría de la sección un estudio o
dictamen, se elevaba al presidente de la asamblea, “quien lo pasará al Gobierno, quien resol-
verá sobre la toma en consideración y su pase al Pleno”. Suponiendo que un dictamen hubiera
sido del agrado del gabinete y pasara a discusión del pleno de la Cámara, una vez reunida
ésta, “la Presidencia, de acuerdo con el Gobierno, resolverá si ha de recaer votación y, en caso
afirmativo, por qué procedimiento”. En fin, se trataba de un procedimiento que reforzaba el

140 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 140-150, maio-agosto 2018
La representación política en España durante la dictadura de Primo de Rivera

férreo control del Ejecutivo y “parecía pensado para una Asamblea formada por los más deci-
didos opositores de la dictadura” (Gómez Navarro, 1991, p. 270).
Las limitaciones impuestas determinaron que los asuntos tratados por la asamblea carecie-
ran, por lo general, de interés para la vida del país y no influyeran decisivamente en la política
desplegada por Primo de Rivera. Las cuestiones estrictamente políticas apenas se trataron, salvo
alguna intervención aislada del tradicionalista Víctor Pradera en defensa de un regionalismo foral
enfrentado a la política centralista del Gobierno (DSAN, 16-I-1928, p. 243-260). En cuanto a los
debates sobre educación, los más importantes estuvieron dedicados al nuevo plan de estudios
de bachillerato, a propuesta de Pedro Sainz Rodríguez (DSAN, 29-X-1927, p. 16-26), y a la
reforma universitaria impulsada por el ministro Eduardo Callejo tras una enmienda firmada,
entre otros, por el conde de los Andes, Esteban Bilbao y Enrique Herreros de Tejada, quienes
pedían la adecuación de la educación superior estatal a los planes de las universidades priva-
das jesuitas y agustinas (DSAN, 15-II-1928, ap. 1º).
Se produjo en la Cámara un desplazamiento de las discusiones hacia temas de carácter
económico, social y técnico-jurídico. Dos ejemplos de ello lo constituyen los debates en torno a
los presupuestos de 1929 y el llamado “problema económico de España”, que dio lugar a diver-
sas intervenciones sobre el proteccionismo y el intervencionismo del Estado (DSAN, 16, 17, 18,
19 y 20-I-1928, p. 260-277, 304-320, 347-362, 381-404 y 406-452). Estos debates muestran
claramente la inoperancia de la Cámara, marcada por su propia naturaleza corporativa: los
representantes actuaban en función de unos intereses muy determinados, a los que se debían
y que intentaban defender, mostrando la dificultad de que se produjera una confluencia de
todas las sensibilidades. En este ambiente, en que prácticamente todas las intervenciones eran
una defensa de los más estrictos intereses de grupo, las palabras de los ministros, de algunos
asambleístas —como Vicente Gay o Antonio Flores de Lemus, economistas que hablaban
con independencia de intereses— e incluso del propio Primo de Rivera, resultaban aisladas y
fracasaron a la hora de centrar las discusiones para convertirlas en algo útil. Con razón pudo
decir Velarde Fuertes (1968, p. 92) que “la exteriorización de opiniones archiconocidas fue el
único resultado del acceso corporativo a la Asamblea”.
Otro de los aspectos negativos de la metodología de trabajo de la asamblea era la falta
de un plan de conjunto mínimamente organizado que evitara duplicaciones. Así, a veces la
Cámara ocupaba su tiempo en debatir cuestiones que paralelamente estaban estudiando
otros organismos del Estado —por ejemplo, mientras la Comisión General de Codificación re-
cababa datos para una modificación del Código Penal, la Cámara dedicó varias sesiones en el
mismo sentido (DSAN, 20-I-1928, p. 405). En otras ocasiones, la asamblea actuaba al dictado
de impulsos arbitrarios o frívolos del dictador (Maura, 1930, v. II: 77), consumiendo su tiempo

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 141-150, maio-agosto 2018 141
Miguel Ángel Giménez Martínez

en “problemas” que no preocupaban a la opinión pública, como la restauración del palacio


de Sada, en Sos (Zaragoza), lugar de nacimiento de Fernando el Católico (DSAN, 31-X-1928,
p. 84-92), o el límite adecuado para la sucesión ab intestato (DSAN, 24, 25 y 26-XI-1927, p.
84-105, 128-147 y 172-190).
Habida cuenta de esta inoperancia se explica por qué los contemporáneos de la asam-
blea no prestaron demasiada atención a sus debates por qué, cuando lo hicieron, no tomaran
a sus protagonistas en serio, provocando sátiras clandestinas como la recogida por Sainz Ro-
dríguez (1978, p. 85), atribuida a Luis de Tapia: “Y de cabrones, ¿qué?/ ¡Pues a montones/ han
ido a la Asamblea/ los cabrones!”. Era lógico, pues todos sabían que el gobierno controlaba
tanto la composición como el funcionamiento interno y que la Cámara solo era representativa
de un sector del país: el de los políticos que colaboraban con la dictadura y el de los intereses
dominantes en la sociedad. La asamblea, en consecuencia, no cumplió con la primera de las
funciones que le habían sido asignadas: la de “intervenir en la actualidad”. Nunca inspec-
cionó actuaciones ni enjuició gestiones de la administración. Los escasos intentos de crítica
a la política gubernamental, realizados principalmente por Sainz Rodríguez y Pradera, fueron
sofocados por el gobierno, teniendo incluso que intervenir el propio dictador, dada la falta de
autoridad de los ministros y directores generales para contestar.
El valor de la asamblea de Primo de Rivera reside, por lo tanto, no en sus potestades
efectivas, sino en el hecho de haberse erigido en foro en el que encontraron asiento antiguas
figuras del conservadurismo dinástico que la dictadura supo reciclar en su provecho: el conde de
Bugallal, Juan de la Cierva, Antonio Goicoechea, César Silió y tantas otras personalidades que
encarnaban no solo el poder político caciquil sino también el poder económico a través de su
presencia en numerosos consejos de administración (Tuñón de Lara, 1967, p. 120). El objetivo
era que la asamblea se convirtiera en un futuro en la base para la creación de un sistema auto-
ritario corporativo, evitando que el rey quedara desprovisto de un órgano deliberante en el que
estuvieran las “figuras prominentes” en caso de que el gobierno cayese (Ben-Ami, 1980, p. 121).
Los acontecimientos impidieron que pudiera cumplir este cometido, si bien la combinación de
corporativismo y democracia controlada que significó sirvió de inspiración técnica y operativa a
las cortes estatuidas por el franquismo en 1942 (Giménez Martínez, 2012, p. 73-81).

Las cortes del anteproyecto constitucional de 1929

L a asamblea no se concibió solo como órgano representativo, sino como instancia en-
cargada de elaborar una nueva legalidad constitucional que ofreciera una salida a la
dictadura, dada la inconveniencia de restaurar una Constitución, la de 1876, que el propio

142 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 142-150, maio-agosto 2018
La representación política en España durante la dictadura de Primo de Rivera

rey había violado al aceptar el golpe de Primo de Rivera y que en todo caso encarnaba un
sistema político caduco, propio de una sociedad agraria y caciquil en trance de desapare-
cer (Cambó, 1927, p. 192). La tarea corrió a cargo de la Sección Primera de la Asamblea,
integrada por quince hombres procedentes en su mayoría del tradicionalismo, el maurismo
y el catolicismo social, si bien los más influentes fueron Gabriel Maura y Antonio Goicoe-
chea, con algunas concesiones finales a Juan de la Cierva (García Canales, 1980, p. 41). La
sección primera aprobó un anteproyecto de Constitución en junio de 1928 y un año des-
pués, en mayo de 1929, ultimó una serie de leyes orgánicas complementarias. El conjunto
resultante fue un amplísimo código de medio millar de artículos que se proponía levantar
un nuevo Estado de carácter conservador, corporativo, intervencionista y antidemocrático
(Gómez Navarro, 1991, p. 294-295).
Así, el anteproyecto de Constitución declaraba a la Monarquía “sagrada e inviolable”
(art. 43), declaraba la religión católica como oficial del Estado, prohibiendo las manifestacio-
nes públicas de otros cultos (art. 11), y proclamaba un centralismo radical (arts. 1, 2, 8, 9, 87,
88 y 89). En el área económica, defendía un papel activo de la administración en la organi-
zación del sistema productivo (arts. 79 y 80) e incluso preveía el reconocimiento de algunos
derechos sociales, como la protección de la infancia y su educación (art. 24) o el seguro de
salud, vejez, enfermedad y accidentes (art. 28), que estaban en línea con lo dispuesto por el
Código del Trabajo de 1926, influido por el corporativismo fascista y la doctrina social de la
Iglesia (Varela Suanzes-Carpegna, 2012, p. 102). Los derechos ciudadanos eran enunciados de
forma genérica y podían ser suspendidos por el gobierno en caso de “evidente riesgo exterior
para la seguridad del Estado o de grave perturbación interior que amenace o comprometa la
paz general” (art. 72), hecho que llevó a decir a Zancada (1930, p. 106) que el Ejecutivo “por
su propia voluntad queda convertido en dictador, pudiendo hacer durar este estado excep-
cional cuanto tiempo quiera”. Desaparecían los conceptos liberales de soberanía nacional y
separación de poderes. La soberanía pasaba a tener un origen indefinido y solo se reconocía al
titular de la misma: el Estado, como “órgano representativo permanente de la nación” (art. 4).
En cuanto a la organización de los poderes, el art. 6 del anteproyecto aludía al “doble
principio de diferenciación y coordinación”, fórmula vacía de contenido en tanto el poder
del rey sobresalía sobre el resto de instituciones —al monarca correspondía iniciar cualquier
reforma constitucional (art. 102), era jefe del Ejecutivo, tenía libertad para nombrar y cesar a
sus ministros (arts. 69-70) y hasta de interferir en el poder judicial, al deber cuidar de que “en
su nombre se administre justicia pronta y cumplida” (art. 43).
La visión de la sociedad del anteproyecto era la de una trama con escalones sucesivos
en su organización: familia, municipio —entendido en el art. 87 como “asociación natural

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 143-150, maio-agosto 2018 143
Miguel Ángel Giménez Martínez

de personas y bienes”—, provincia y Estado, pero sin figurar dentro de él ningún esquema
de sindicatos, aportación que se hará ya en los años 1930. Esta visión general corporativa se
concretará en la existencia de unas cortes unicamerales y semiorgánicas, con un mandato de
cinco años de duración (art. 54), cuyos diputados serían elegidos por los españoles de ambos
sexos mayores de 25 años (art. 55). El número máximo de diputados sería de 412, repartidos
en tres grupos (art. 56), con 206 elegidos por sufragio universal directo, a razón de uno por
cada 100 mil habitantes; 30 vitalicios designados por el rey; y 176 elegidos en colegios espe-
ciales de profesiones o clases atendiendo a la siguiente distribución: 50 diputados elegidos
por las diputaciones provinciales y compromisarios de los ayuntamientos; 18 por las cámaras
agropecuarias; 18 por las cámaras de comercio y navegación; 18 por las cámaras de industria;
18 por las cámaras de propiedad; 18 por los colegios de abogados, procuradores de los tri-
bunales, médicos, farmacéuticos, ingenieros, doctores y otros para cuyo ejercicio se requiriese
título universitario; 18 por las “asociaciones profesionales obreras”; y 18 por los claustros
universitarios, reales academias y otros organismos de índole científica o artística.
Con ello, la Cámara adquiría tintes corporativos indudables, lo que hizo sacar la conclu-
sión al periódico El Debate —órgano de expresión de la Asociación Católica Nacional de Pro-
pagandistas— de que la aristocracia histórica sería sustituida por una “aristocracia cultural y
económica” (Ben-Ami, 1984, p. 159).
El art. 59 del anteproyecto, al disponer que “las Cortes se reunirán anualmente durante
un período que, en cada año natural, no será menor de cuatro meses”, otorgaba cierta auto-
nomía funcional al Legislativo. Correspondía al rey, sin embargo, convocar, disolver, suspen-
der y cerrar las sesiones. Además, a diferencia de lo que se había previsto para la asamblea
consultiva, el art. 61 reconocía expresamente la facultad de la cámara de elaborar su propio
reglamento y elegir tanto a su presidente como al resto de sus órganos de dirección. Este
mismo precepto hacía referencia a la capacidad de las cortes para examinar la validez de las
actas, la publicidad de las sesiones como norma y la necesidad de un quórum de la mitad más
uno de los diputados para adoptar resoluciones.
En el aspecto funcional, las cortes del anteproyecto tenían conferida la facultad legislati-
va, pero carecían de iniciativa en política exterior, defensa nacional, rebaja de contribuciones
o aumento de gastos presupuestarios (art. 62). No obstante, tenían reservadas atribuciones
en una veintena de materias enumeradas en el art. 63, entre las que destacan el examen de
los presupuestos y cuentas públicas, la inspección de las operaciones económicas, la fijación
bienal de las fuerzas militares, la determinación del régimen al que habían de someterse los
procesos electorales, la delimitación de las condiciones para el ejercicio de los derechos, el

144 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 144-150, maio-agosto 2018
La representación política en España durante la dictadura de Primo de Rivera

establecimiento de las bases para la organización de los distintos poderes del Estado y la con-
cesión de amnistías. Así pues, las facultades legislativas de la Cámara, aunque eran superiores
a las de la asamblea, no podían comparase con las de cualquier Parlamento liberal.
El anteproyecto no preveía que las cortes tuvieran autoridad para vigilar la actividad del
Ejecutivo ni que el gobierno tuviera que rendir cuentas ante ellas. Y ello porque, como recuerda
Tomás Villarroya (1981, p. 134), el art. 66 del anteproyecto procuraba establecer cierta sepa-
ración entre el gobierno y las cortes que favoreciese la estabilidad del primero: de una parte,
declaraba la incompatibilidad entre el cargo de ministro y la condición de diputado; de otra,
prescribía que las cortes no podrían adoptar acuerdos que significasen confianza o censura
respecto del gobierno. En todo caso, el rey (art. 52 in fine) o el Consejo del Reino —órgano
consultivo integrado por altos cargos del Ejército, la administración y la nobleza diseñado para
asesorar al monarca (arts. 44-53) — podían vetar cualquiera de sus iniciativas.
En principio se pensó en promulgar el anteproyecto de Constitución con la simple rúbrica
del rey. Sin embargo, el peligro de que este método convirtiera al texto en una simple carta
otorgada llevó a Primo de Rivera a optar por otro procedimiento: se requeriría a los ex presi-
dentes del consejo de ministros, a quienes hubieran presidido cualquiera de las dos Cámaras
constitucionales, y también a los que hubieran ostentado la presidencia del Consejo de Estado,
que aceptasen el cargo de asambleístas, de modo que la Constitución fuera sancionada por
una asamblea así reforzada.
Sin embargo, después de muchas dudas, todos ellos rechazaron el ofrecimiento: el conde
de Romanones, tal vez el más significado de los “viejos políticos” de la Restauración, era cons-
ciente de que el régimen de Primo de Rivera no sobreviviría mucho tiempo y decidió centrarse
en apoyar al rey para desvincularlo del fracaso en ciernes de la dictadura. En ese trace, durante
el verano de 1929, el dictador ordenó que el anteproyecto constitucional y las leyes anejas
se publicasen, levantándose excepcionalmente la censura de prensa para favorecer la toma
de posición de las diferentes sensibilidades políticas respecto a su contenido. Fue en ese mo-
mento cuando todos los sectores más o menos liberales, desde la derecha conservadora a la
izquierda más democrática y republicana, también la socialista, mostraron su común oposición
a los propósitos constituyentes de la dictadura (Álvarez Chillida, 1996).
En realidad, el anteproyecto no satisfacía a nadie, ni al propio Primo de Rivera, molesto
con los amplios poderes que se le concedían al rey en detrimento del gobierno y su presidente.
Todavía en el consejo de ministros celebrado el último día de 1929, el dictador planteó al rey
una salida alternativa: formar un gobierno presidido por un civil “de corte derechista” —tanto
Ben-Ami (1984, p. 342-343) como González Calleja (2005, p. 374) apuntan al conde de Gua-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 145-150, maio-agosto 2018 145
Miguel Ángel Giménez Martínez

dalhorce— y reunir una nueva asamblea de 500 miembros, mitad con carácter de senadores
y mitad de diputados, que preparara una nueva Constitución. Pero fue un esfuerzo inútil, así
que Alfonso XIII ya se planteaba decididamente la conveniencia de desembarazarse de Primo
de Rivera, habida cuenta de la acumulación y agravamiento de problemas en el país (García
Queipo de Llano, 1997, p. 116). Abandonado por su principal valedor, Primo de Rivera dimitió
el 28 de enero de 1930 y fue sustituido por el general Dámaso Berenguer, jefe de la casa
militar del rey.
A Berenguer se le encargó la tarea de arbitrar un retorno controlado a la Constitución de
1876, previa celebración de elecciones libres. Con ese objetivo, el 16 de febrero de 1930 disol-
vió la Asamblea Consultiva, anunciando la celebración de comicios para el restablecimiento de
las cortes conforme a lo preceptuado por el texto constitucional canovista. Pero para entonces
el apoyo a Alfonso XIII y a la Monarquía tout court como forma de Estado y de gobierno había
menguado de forma muy considerable. El desprestigio del régimen era completo y resultaba
irreversible el daño que el propio rey le había ocasionado al auspiciar y arropar a la dictadura.
Los meses siguientes fueron, así pues, “un plano inclinado hacia la República” (Seco Serrano,
1969, p. 173) en el que cristalizó el Pacto de San Sebastián suscrito por fuerzas republicanas,
socialistas y regionalistas para la creación de un comité revolucionario que coordinara esfuer-
zos en pro del derribo de la Monarquía.
Berenguer dimitió el 14 de febrero de 1931. Tras el intento fallido de entregar el gobierno
a José Sánchez Guerra y Melquíades Álvarez, el rey nombró presidente al almirante Juan Bau-
tista Aznar, que se apresuró a convocar elecciones municipales para el 12 de abril con la idea
de transmitir una imagen de normalidad constitucional. El Ejecutivo trató de conceder a los
comicios una dimensión estrictamente administrativa, pero los republicanos los convirtieron
en un juicio contra el régimen. Un hecho que adquiere sentido si se tiene en cuenta que solo
sistemas políticos tambaleantes y previamente deslegitimados se someten a estos plebiscitos
encubiertos, sintiéndose afectados por unas votaciones que saben les son particularmente di-
rigidas. Los resultados, globalmente considerados, dieron el triunfo a los concejales monárqui-
cos, pero de su análisis cualitativo se desprende el éxito innegable de los candidatos antimo-
nárquicos: 41 de las 50 capitales de provincia, en donde la acción del caciquismo apenas tenía
peso, tuvieron una mayoría de concejales republicanos y socialistas. En Madrid, los concejales
republicanos doblaban a los monárquicos y, en Barcelona, los triplicaban (Martínez Cuadrado,
1969, v. II, p. 851-857 y 998-999; Tusell, 1969, p. 182 y ss.). Las calles se llenaron entonces
de jubilosos manifestantes que pedían la inmediata proclamación de la República. Dos días
después, Aznar anunció la dimisión en bloque de su gobierno y Alfonso XIII huyó del país.

146 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 146-150, maio-agosto 2018
La representación política en España durante la dictadura de Primo de Rivera

Referencia bibliográfica

AGESTA, Luís Sánchez. Historia del constitucionalismo español. 3 ed. Madrid: Instituto de Estudios Políticos,
1974.
ANDRÉS-GALLEGO, José. El socialismo durante la dictadura (1923-1930). Madrid: Tebas, 1977.
AUNÓS, Eduardo. España en crisis (1874-1936). Buenos Aires: Librería del Colegio, 1942.
BEN-AMI, Shlomo. Hacia una comprensión de la dictadura de Primo de Rivera. Revista de Derecho Político de
la Uned, n. 6, p. 107-132,1980.

BOFARULL, Manuel de. Las antiguas Cortes. El moderno Parlamento. El régimen representativo orgánico.
Revista de Archivos, Bibliotecas y Museos, Madrid, 1912.

CALBET, María Teresa. Aproximación al estudio de la Asamblea Nacional Consultiva de Primo de Rivera, 1927-1930.
Madrid: Universidad Autónoma de Madrid, 1976.
CALLEJA, Eduardo González. La España de Primo de Rivera. La modernización autoritaria: 1923-1930. Ma-
drid: Alianza, 2005.
CANALES, Mariano García. El problema constitucional en la dictadura de Primo de Rivera. Madrid: Centro de Estu-
dios Constitucionales, 1980.
______. La teoría de la representación política en la España del siglo XX. Murcia: Universidad de Murcia, 1977.
______. Los intelectuales y la dictadura de Primo de Rivera. Madrid: Alianza, 1987.
CAMBÓ, Francisco. Por la concordia. Madrid: Compañía Iberoamericana de Publicaciones, 1927.
CHILLIDA, Gonzalo Álvarez. El fracaso de un proyecto autoritario: el debate constitucional en la Asamblea
Nacional de Primo de Rivera. Revista de Estudios Políticos, n. 93, p. 359-3751, 1996.
CLIVILLÉS, Manuel Fraile. Introducción al derecho constitucional español. Madrid: Rivadeneyra, 1975.
CUADRADO, Miguel M. Elecciones y partidos políticos en España, 1868-1931. Madrid: Taurus, 1969.
______. La dictadura de Primo de Rivera, 1923-1930. Barcelona: Planeta, 1984.
CUEVAS, Pedro Carlos González. El pensamiento político de la derecha española del siglo XX. Madrid: Tecnos,
2005.
DÍAZ-PLAJA, Fernando. La historia de España en sus documentos: el siglo XX. Dictadura y República, 1923-
1936. Madrid: Instituto de Estudios Políticos, 1965.
FERNÁNDEZ, Paloma Díaz. La dictadura de Primo de Rivera: una oportunidad para la mujer. Espacio, Tiempo
y Forma. Serie V, Historia Contemporánea, n. 17, p. 175-190, 2005.
FUERTES, Juan Velarde. Política económica de la dictadura. Madrid: Guadiana, 1968.
GARCÍA-NIETO, María Carmen; DONÉZAR, Javier; PUERTA, Luís Lópes. La dictadura, 1923-1930. Bases docu-
mentales de la España contemporánea. Madrid: Guadiana, 1973.
GOICOECHEA, Antonio. La crisis del constitucionalismo moderno. Madrid: Voluntad, 1925.
HERR, Richard. Ensayo histórico de la España contemporánea. Madrid: Pegaso, 1977.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 147-150, maio-agosto 2018 147
Miguel Ángel Giménez Martínez

JULIÁ, Santos. Los socialistas en la política española (1879-1982). Madrid: Taurus, 1997.
LARA, Manuel Tuñón de. Historia y realidad del poder: el poder y las élites en el primer tercio de la España
del siglo XX. Madrid: Edicusa, 1967.
______. La España del siglo XX. París: Librería Española, 1966.
LLANO, Genoveva Queipo de. El reinado de Alfonso XIII: la modernización fallida. Madrid: Historia 16, 1997.
LINZ, Juan J. Continuidad y discontinuidad en la élite política española: de la Restauración al régimen actual.
In: DÍAZ, E.; MORODO, R. (Eds.). Estudios de ciencia política y sociología: homenaje al profesor Carlos Ollero.
Madrid: Gráficas Carlavilla, 1972, p. 361-423.
MARTÍNEZ, Miguel Ángel. Historia del parlamentarismo español. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Cons-
titucionales, 2017.
______. Las cortes españolas en el régimen de Franco. Madrid: Congreso de los Diputados, 2012.
MAURA, Gabriel. Bosquejo histórico de la dictadura. Madrid: Tipografía de Archivos, 1930.
MELLA, Juan Vázquez de. Una antología política. Ed. y estudio preliminar de ARÓSTEGUI, Julio. Oviedo:
Principado de Asturias, 1999.
MIRKINE-GUETZÉVITCH, Boris. La nouvelle Constitution espagnole. L’Europe Nouvelle, n. 539, p. 796-798,1928.
MORODO, Raúl. Acción española: orígenes ideológicos del franquismo. Madrid: Túcar, 1980.
MURO, Ignacio Torres. Los órganos de gobierno de las Cámaras. Madrid: Congreso de los Diputados, 1987.
NAVARRO, José Luís Gómez. El régimen de Primo de Rivera: reyes, dictaduras y dictadores. Madrid: Cátedra,
1991.
______. La Unión Patriótica: análisis de un partido del poder. Estudios de Historia Social, n. 32-33, 1985,
p. 93-161.
______; CALBET, María Teresa González; PORTUONDO, Ernesto. Aproximación al estudio de las élites políti-
cas en la dictadura de Primo de Rivera. Cuadernos Económicos de Información Comercial Española, n. 10,
1979, p. 183-208.
______. La Asamblea Nacional Consultiva: poder económico y poder político en la dictadura de Primo de
Rivera. Estudios de Historia Social, n. 14, p. 157-188, 1980.
______. La Asamblea Nacional de Primo de Rivera. In: Política y sociedad: estudios en homenaje a Francisco
Murillo Ferrol. Madrid: Centro de Investigaciones Sociológicas/Centro de Estudios Constitucionales, v. II, 1987,
p. 559-582.
PELOILLE, Manuelle. Fascismo en ciernes. España, 1922-1930. Textos recuperados. Toulouse: Presses Univer-
sitaires du Mirail, 2005.
PEMÁN, José María (Ed.). El pensamiento de Primo de Rivera: sus notas, artículos y discursos. Madrid: Sáez
Hermanos, 1929.
PRADERA, Victor. El Estado Nuevo. Madrid: Cultura Española, 1941.
RODRÍGUEZ, Pedro Sainz. Testimonios y recuerdos. Barcelona: Planeta, 1978.

148 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 148-150, maio-agosto 2018
La representación política en España durante la dictadura de Primo de Rivera

SARASOLA, Ignacio Fernández. Parlamentarismo. In: SEBASTIÁN, Javier Fernández; FUENTES, Juan Francisco.
Diccionario político y social del siglo XX español. Madrid: Alianza, 2008, p. 900-906.
______. Reglamentos parlamentarios (1810-1977). Madrid: Iustel, 2012.
SCHMITT, Carl. La dictadura. Madrid: Revista de Occidente, 1968.
SEGARRA, Rosa Martínez. La Unión Patriótica. Cuadernos de la Cátedra Fadrique Furió Ceriol, n. 1, 1992,
p. 67-75.
______. La proyección constitucional de la dictadura. La Asamblea Nacional Consultiva (I). Boletín Informa-
tivo de Ciencia Política, n. 13-14, 1973, p. 83-89.
SERRANO, Carlos Seco. Alfonso XIII y la crisis de la Restauración. Barcelona: Ariel, 1969.
SUANZES-CARPEGNA, Joaquín Varela. Constituciones y leyes fundamentales. Madrid: Iustel, 2012.
SUEIRO, Susana. Las relaciones diplomáticas hispano-italianas durante la dictadura de Primo de Rivera
(1923-1930). Madrid: Universidad Autónoma de Madrid, 1983.
TAMAMES, Ramón. Ni Mussolini ni Franco: la dictadura de Primo de Rivera y su tiempo. Barcelona: Planeta,
2008.
TUSELL, Javier. La crisis del caciquismo andaluz (1923-1931). Madrid: Cupsa, 1977.
______; SAZ, Ismael. Mussolini y Primo de Rivera: las relaciones políticas y diplomáticas de dos dictaduras
mediterráneas. Boletín de la Real Academia de la Historia, vol. CLXXIX, n. 3, p. 413-483, 1982.
______. Sociología electoral de Madrid, 1903-1931. Madrid: Edicusa, 1969.
______. Radiografía de un golpe de Estado: el ascenso al poder del general Primo de Rivera. Madrid:
Alianza, 1987.
VILLARROYA, Joaquín Tomas. Breve historia del constitucionalismo español. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 1981.
WINSTON, Colin M. Workers and the Right in Spain, 1900-1936. Princeton: Princeton University Press, 1985.
ZANCADA, Práxedes. Los problemas constitucionales de España. Madrid: Compañía Iberoamericana de Pu-
blicaciones, 1930.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 149-150, maio-agosto 2018 149
Artigo

Corporatism and the British


Constitutional Heritage: Evidences from
the History of Ideas
O corporativismo e o legado constitucional britânico: evidências
da história das ideias
El corporativismo y el legado constitucional británico: evidencias
a partir de la historia de las ideas

Valerio TorreggianiI*

http://dx.doi.org/10.1590/S2178-14942018000200003

I
Università degli Studi della Tuscia. Viterbo, Itália.

*Possui doutorado em Storia dEuropa (XIX-XX sec.) pela Università degli Studi della Tuscia (2015). Atualmente é Professor
da Università degli Studi della Tuscia. (v.torreggiani@gmail.com)

Artigo recebido em 20 de janeiro de 2018 e aprovado para publicação em 22 de maio de 2018.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 151-172, maio-agosto 2018 151
Valerio Torreggiani

Abstract
This article challenges a historiographical understanding of corporatism as an appendix of fascist ideology by exami-
ning the elaboration and diffusion of corporatist cultures in Britain during the first half of the 20th century. The case
study seeks, on the one hand, to highlight the changing nature of corporatism by showing the different forms – fas-
cist and non-fascist – that it took in Britain in the given time period. On the other hand, the article connects British
corporatism with the European corporatist movement, as well as with the British constitutional heritage, underlining
the close entangling of national and transnational issues.

Keywords: Corporatism; Great Britain; British constitutional history; Representation of organized interests.

Resumo
O artigo contesta um entendimento historiográfico do corporativismo como apêndice da ideologia fascista por
meio da análise da elaboração e difusão de culturas corporativas na Grã-Bretanha na primeira metade do século
20. Este estudo propõe-se a destacar, de um lado, a natureza dinâmica do corporativismo, mostrando as diferentes
formas – fascistas e não fascistas – que ele assume na cultura inglesa no referido período. De outro lado, o artigo
estabelece as conexões com o movimento corporativo europeu e evidencia as particularidades do corporativismo
inglês, associando-o com a herança constitucional britânica e, finalmente, mostrando a estreita interligação entre
assuntos nacionais e transnacionais.

Palavras-chave: Corporativismo; Grã-Bretanha; História constitucional britânica; Representação dos interesses


organizados.

Resumen
El artículo pretende rechazar la comprensión historiográfica del corporativismo como apéndice de la ideología fascis-
ta mediante un análisis de la elaboración y difusión de las culturas corporativas en Gran Bretaña durante la primera
mitad del sigloXX. El estudio de caso tiene como finalidad afirmar, por un lado, la naturaleza dinámica del corporati-
vismo, mostrando las diferentes formas – fascistas y no fascistas – que asume en la cultura inglesa de este periodo,
así como las conexiones con el movimiento corporativo europeo. Por otro lado, el artículo pone en evidencia las
particularidades del corporativismo inglés, relacionándolo con el legado constitucional británico por fin demostrando
el estrecho vínculo entre asuntos nacionales e internacionales.

Palabras clave: Corporativismo; Gran Bretaña; Historia constitucional británica; Representación de los intere-
ses organizados.

152 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 152-172, maio-agosto 2018
Corporatism and the British Constitutional Heritage: Evidences from the History of Ideas

A fter a quite obsessive academic attention received during the 1980s, and an almost
silent disappearing from the scholarly radar occurred in the following decade, a recent
revival of corporatist studies have led to a proliferation of researches, international conferen-
ces and volumes exploring the flourishing vitality of the corporatist body of thought in contem-
porary history (Costa Pinto, 2014, 2017; Pasetti, 2016). Certainly, as recalled by Molina and
Rodhes, “the term Corporatism has been always characterised by ambiguity, imprecision, and
a liberal, rather undisciplined usage” (Molina and Rodhes, 2002: 306). However, a renewed
historical awareness has been revealing the nuances of a theory whose origins can be traced
back to the 19th century in different political and national cultures, well before the emergence
of inter-war fascism.
Following this historiographical trend, this article deals with the diffusion of corporatist
ideas in Britain in the first half of the 20th Century. However, two elements must be recalled
in order to present the particular case of study: first of all, the traditionally claimed endemic
relationship between fascism and corporatism has to be rethought, particularly assessing the
historical autonomy of the latter in respect to the former. Secondly, the transnational approach
appears to be best suited so that one can deeply understand corporatism and its international
diffusion, not for some alleged heuristic superiority of the transnational method, but simply
because the very history of corporatist theories was itself transnational (Pasetti, 2016: 24).
Surprisingly, among the several lists of corporatist authors and groups studied, there is still a
certain lack of interest for the British case, which received just episodic and irregular attention
(Shonfield, 1965; Beer, 1969; Carpenter, 1976; Ritschel, 1997; Stears, 2002). The country was
often seen as somehow immune to fascism, and thus to a fascination for an institutional
representation of economic interests. However, it is indeed in this perspective that assuming a
rigid equivalence between corporatism and fascism fails to take account of several projects for
the reorganization of society along corporatist lines promoted by non-fascist political subjects
in largely non-fascist culture.
The article examines a series of British corporatist cultures developed in the first half
of the 20th century with a twofold objective: first of all, going beyond the linguistic issue,
that is, proving their existence despite the names they adopt and understanding similarities,
differences and connections between British and European corporatist intellectuals; secondly,
investigating the relationship between the British corporatist ideas under examination and the
legal tradition of the United Kingdom will allow us to deeply comprehend the interpenetration
between national and trans-national issues in the developing of corporatist projects. Even-
tually, the thesis that will be tested is that in Britain corporatism was intended as a form of

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 153-172, maio-agosto 2018 153
Valerio Torreggiani

developing a new modern version of the medieval principle of the Government by Agreement
in order to overcome the juridical-political crisis of the Liberal State.

A Retrogressive progress: The British constitutional


heritage

T he British Constitution is like an old man who still wears clothes in the fashion of his
youth: what you see of him is the same; what you do not see is wholly altered” (Ba-
gehot, 1867: 68). It is hard to find a more accurate and synthetic description of the British
constitutional heritage than these words, written by Walter Bagehot in 1867.
A constitution is a set of fundamental laws on how a country is governed. Setting out the
structure of the State, as well as the principle governing the relationship between the individ-
ual citizen and the State, and between the different parts of the State, constitutions organize,
regulate and distribute powers. Although history has seen constitutions being codified in many
different ways, in contemporary era the most common resultant of a constitutional process is a
single legal document setting out, in one place, all the fundamental laws and principles on how
the State works. However, Britain had been following a very different path, basing its State func-
tioning on a multiplicity of legal documents, statuses, conventions, treaties and juridical decisions
produced along a broad period of time, collectively forming the British Constitution.
Paraphrasing Jeffrey Goldsworthy’s words, this progressively incremental constitutional
process unfolds the inner un-revolutionary character of English-speaking people –perhaps it
could be more accurate referring to the English élites – who appear to be permanently oriented
towards a sort of legally conservative approach to socio-economic, political and technological
changings (Goldsworthy, 2010: 2). In fact, even during explicitly revolutionary moments – such
as, for instance, the civil war of 1640s, the Glorious Revolution of 1688 or the American Revo-
lution of 1776 – the opposing parties strenuously claimed to defend the original and properly
understood Constitution. Nevertheless, these conflicts indeed provided important mutations
and advancements to the British constitutional corpus. In this sense, as recalled by A.V. Dicey
in 1885, “the idea of retrogressive progress is merely one form of the appeal to precedent’
(Dicey, 1885: 18), pointing out that in British legal history the “attempts at innovation have
always assumed the form of an appeal to preexisting rights” (Dicey, 1885: 19). Therefore, it
appears that the seamlessly British legal evolution shaped a constitution clothed with a prag-
matic political attitude moulded in a slow and quiet adaptation to historical changes through
a continuous interaction between tradition and innovation (Rebuffa, 1995: 30).

154 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 154-172, maio-agosto 2018
Corporatism and the British Constitutional Heritage: Evidences from the History of Ideas

From our point of view, it is important to highlight the consequences of a constitution


relying on practices and conventions, especially in relation to the Industrial Revolution, the
development of the bourgeois hegemony, and the emergence of a mass society. What stands
out for its importance is that in Britain the modern bourgeois’ citizen founds the very origins
of their civil rights and liberties, not in a detailed written official document precisely accounting
their rights and duties, but in a long evolution in full continuity with the medieval past and
the modern era.
In this lapse of time, in fact, rather between the Magna Charta of 1215 and the Bill
of Rights of 1689, we find the establishment and enforcement of the two juridical-political
realities that eventually characterised the entire British constitutional path: the idea of the
Rule of Law and the concept of Government by Agreement. If the former bore with itself
the legal guarantees Habeas Corpus and the Trial by Jury – essential for the development
of a modern capitalist economy –, it is the latter that seems to be a key element for our his-
toriographical discourse. In fact, as stated in the Magna Charta, the idea of Government by
Agreement refers to the definition of a formal normative agreement on how the country was
to be ruled: an agreement signed by all the forces existing within the nation, political as well
as economic; a contract enabling the different, opposing and potentially conflicting centres of
power to formally establish their zones of action, rather than their rights and duties to jointly
govern the public sphere. More than four centuries later, with the Bill of Rights of 1689, this
medieval agreement officially evolved in one of the bedrock of the British public law, that is,
the notion of the King in Parliament. After the Glorious Revolution, in fact, the concept of the
King in Parliament re-expressed the vital necessity of a permanent agreement between the
parts of the British nation, a nation threatened by internal fights, namely between landowner
aristocracy and market/productive oriented bourgeois. The political and economic interests of
the emerging capitalist modernity of the financial and commercial revolution were symbolical-
ly re-united by the famous triad of King, Lords and Commons. Since then, in order to enact a
specific legislation, all the identified parts of the nation had to come to an agreement, within
what became the privileged juridical locus of the decision-making process: the Parliament.
Thus, the British Constitution evolved through time always finding its benchmarks after
eras of profound transformations and conflicts, such as the early medieval period and the 17th
century Glorious Revolution, eventually reinforcing at all steps a harmonious conception of le-
gal and political order based on the idea of Government by Agreement. Basically, the political
and juridical milieu constantly reacts to a crisis by advancing without destroying – innovations
without revolutions – displaying a quiet and efficient adaptation of the rule-of-law to the

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 155-172, maio-agosto 2018 155
Valerio Torreggiani

changing socio-economic environment. As we will see shortly, the late 19th century, the Indus-
trial Revolution, with its major technological, socio-economic and political transformations,
dangerously threatened to jeopardize (once again) the ancient order, putting the very survival
of the bourgeois Liberal State at stake. In the transformation, a bunch of British intellectuals
tried to find a remedy for the crisis of the Liberal State by re-enforcing the old principle of the
Government by Agreement with corporatist elements, retrogressively finding the necessary
constitutional advancement in the medieval past.

Order, disorder and reorder

A lmost a decade ago, the British historian Richard Overy significantly titled his cultural and
intellectual history of inter-war Britain The Morbid Age, writing on the perceived crisis
of civilisation (Overy, 2009). Interestingly, what emerges from Overy’s description is a pervasive
collective anxiety, not confined to a particular political space, regarding the decline of the Liberal
political and legal tradition that Britain had done a good deal to build up in the first place.
Significantly, although explicitly prevalent in the inter-war years, the origins of this crisis
can be traced back to the period between the end of the 19th century and the beginning of the
20th, when the socio-economic and political consequences of the Industrial Revolution began
to erode the actual functioning and the ideal essence of the Liberal State. In this sense, this is
not an insular history: in fact, on the wave of the outburst of the social conflict and the emer-
gence of the associations of organized interests, the 20th century started in the whole Europe
with a rediscovery of the socio-economic and juridical collective dimension that legal Liberal
modernity had compressed. In the following decades, after the profound trauma of the Great
War and later of the Great Depression, an intense distrust for old-political discourses, as well
as for the traditional remedies for the economic problems, started to rise, becoming more and
more common and encompassing different political cultures, movements and parties.
The shock of 1914 was particularly severe, mainly as a consequence of the juxtaposition
of a pre-war illusion of indefinite progress with war and post-war socio-economic, political
and humanitarian disaster. The rupture with the past was evident, especially for what has
been self-called “the war generation” – among others, Oswald Mosley was a great supporter
of this literary and political trope –, leading to rethink the very meaning of freedom and civil
rights indeed. As R.H. Tawney cleverly summarized, the central disagreement of the age was
exactly what freedom means and how it was to be reconciled with the desire of social unity
(Stears, 2002: 24).

156 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 156-172, maio-agosto 2018
Corporatism and the British Constitutional Heritage: Evidences from the History of Ideas

Thus, alongside psychological and socio-economic fears brought to light by the Great
War, what was in crisis was the image of Liberal bourgeois society, rather than a society rely-
ing on two mutually exclusive and opposed spheres of sovereignty: the individual, in the field
of the dominium, rather than the domain of property and economic action; and the State,
in the field of the imperium, the domain of command and community. Whether the Liberal
culture recognized nothing in between of these two legal dimensions, at the turn of the cen-
turies, modern industrial societies were experiencing an increasingly crowded middle-zone,
composed by new political and economic organizations – such as parties, trade unions, agri-
cultural and commercial leagues, industrial associations – that basically lied outside the rigid
public-private Liberal dichotomy (Costa, 2001).
Well before World War I, and with an obvious hastening after it, a common sense of
impending and unavoidable transformation reached many areas of the public discourse, shap-
ing a series of concepts and metaphors concerning the idea of a Liberal State in crisis. The
widespread perception was indeed one of decline and fall: the deterioration of a model of
civil, political, juridical and economic cohabitation grounded on the 18th and 19th centuries’
principles of individual freedom and rights. In this sense, the rising collective dimension not
only started to demolish the authority of the old Liberal State, but also triggered a theoretical
reaction within the political, juridical and economic arenas aimed at challenging the tradi-
tional understanding of social relationships. Therefore, between the midst of the 19th century
and the first half of the 20th, a series of authors started condemning liberalism as the main
cause for turning society into a mass of atomistic self-seeking individuals after the rupture of
the pre-modern social bonds. In the whole Europe the medieval corporatist society began to
establish itself as an alternative model of organic organization for a harmonious and ordered
community, opposed to the chaotic and conflicting capitalist society as well as to the rising
socialist alternative (Black, 1984; Ornaghi, 1984).
In contemporary history, the corporatist model may be present in a variety of forms,
countries and culture areas. Nevertheless, all of the corporatist proposals recommend, quoting
Philippe Schmitter’s frequently cited words, “a system of interest representation in which the
constituent units are organized into a limited number of singular, compulsory, noncompetitive,
hierarchically ordered and functionally differentiated categories” (Schmitter, 1974: 93). The
final purpose of all the corporatist writers, although their proposals had different backgrounds,
tools and objectives, was to institutionally recover a series of public areas of society detached
from the power dimension of the State, eventually replacing the liberal individualistic so-
cio-economic order with a collectivist, status-based and hierarchical one, where individuals’
rights and duties reflect their status or function within the society.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 157-172, maio-agosto 2018 157
Valerio Torreggiani

As put again by Philippe Schmitter, a corporatist theoretical tendency can be defined as


a form of enacting an “institutional relationship between the system of authoritative deci-
sion-making and interest representation” (Schmitter, 1974: 87); or, as recalled more recently
by Sabino Cassese, as “a way in which political power can reframe in a society invaded by
social organizations which threat to jeopardize the traditional closed structure of the State”
(Cassese, 2012: 96); or again, as underlined by Irene Stolzi, as “an opportunity, not only to
reflect on trade unions and productive relations, but also, in more general terms, to provide
an account of relations between the individual, State and social organizations” (Stolzi, 2014:
151). Put in these terms, the well-known fascist-authoritarian inter-war corporatist experiment
appears to be just one of the several political discourses focusing on the representation of the
economic interests as a medium to build a new institutional architecture fitted to govern the
industrial society.
Focusing on the British reality, three political moments of corporatist elaboration were
identified. The first one is a multifaceted and manifold intellectual network – the so-called
New Age Circle – built up in 1907, where intellectuals and politicians coming from various
political cultures gathered together around the figure of Alfred R. Orage, director of “The
New Age”. The second one is represented by a minority group within the Conservative Party
led by Harold Macmillan who, after several initiatives – e.g. the Political and Economic Plan-
ning group (PEP), the Industrial Reorganisation League (IRL) – eventually drafted a legislative
proposal in October 1934, titled The Industrial Reorganisation Bill. The third group is British
Fascism, whose leader was Oswald Molsey, who established the British Union of Fascists (BUF)
in October 1932 in order to adapt the Italian corporatist model in the United Kingdom.

Divergent Affinities: A corporatist laboratory

I n 1907, Alfred R. Orage became the editor of the weekly review “The New Age”. Through a
tolerant and open-minded method of editorship, he soon established an informal network
of contributors – the New Age Circle –, formed by intellectuals coming from the whole po-
litical spectrum, such as Arthur J. Penty, architect and social thinker; G.D.H. Cole and Samuel
G. Hobson, two of the leading authors of Guild Socialism; G.K. Chesteron, Hilaire Belloc and
Maurice Reckitt, Catholic thinkers profoundly influenced by the Rerum Novarum of Pope Leo
XIII; and finally, Thomas E. Hulme, philosopher, scholar and translator of Nietzsche, Bergson
and Sorel, and Ramiro De Maeztu, an Anglo-Spanish intellectual later advocate of Primo de
Rivera and Francisco Franco. Since the informal nature of the network, it is impossible to iden-

158 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 158-172, maio-agosto 2018
Corporatism and the British Constitutional Heritage: Evidences from the History of Ideas

tify one single monolithic and coherent body of thought; rather, the circle symbolized a sort of
a junction-point where different philosophies were knitting together in debates, discussions
and disputes. However, although different, all of them appeared deeply involved in proposing
corporatist solutions for a representation of institutional interests. Generally, four key political
concepts seem to be working within the circle: ideas for a juridical personality of the socio-e-
conomic groups, spread by F.W. Maitland and J.N. Figgis; the social medievalist ideas of A.R.
Orage and A.J. Penty; Social Catholicism, defended by G.K. Chesterton and H. Belloc; and
finally, Guild Socialism, developed by G.D.H. Cole and S. G. Hobson.
Chronologically speaking, the first cultural experience that pre-dates some of the corpo-
ratist notions of the New Age Circle can be found in a different interpretation of the concept
of juridical personality. Originally formed within the German Romantic Movement, the idea
finds its way in Britain through the work of the historian and jurist Frederic W. Maitland and his
disciple, the catholic thinker John N. Figgis. Both of them found a major source of inspiration
in the ideas of the German thinker Otto Von Gierke and his most important work, the titanic
Das Deutsche Genossenschaftsrecht, published in four volumes between 1868 and 1913.
Undoubtedly, Maitland represents the key figure. He was one of the most important historians
of English and European comparative jurisprudence, who in 1900 translated the third part of
Von Gierke’s work with the title of The Political Theories of the Middle Age.
Generally, Maitland and then Figgis’ criticisms can be ascribed to the aforementioned
theoretical juridical tension researching a new equilibrium between individuals, State and so-
ciety in the light of the technological and sociological development triggered by the expansion
of Capitalism. Both of them challenged the notion of isolated individual as the juridical basis of
the society, arguing that the only real juridical person upon the national community that was
built up was the group, socially and economically determined. According to Figgis, for instance,
as he put in 1913, “the notion of isolated individuality is the shadow of a dream […] in the
real world, the isolated individual does not exist […] and his personality can develop only in
society” (Figgis, 1913: 88). Similarly, ten years before, Maitland stated that corporations are “a
real thoroughly person with a real will” (Maitland, 1900: 15), specifying that a socio-economic
group naturally possesses, per se, rights and duties with no need of other form of legal jus-
tifications from above. Affirming that “the corporation is […] a right-and-duty-bearing unit”
(Maitland, 1900: 15), Maitland was reshaping the first source of national sovereignty, which
has to be found neither in the individual nor in the State, but in the socio-economic group: a
fellowship of men united by a common interest or goal.
Almost in the same period, Arthur Penty and Alfred Orage were likewise developing a
new interpretation of socialism, inspired by the ideas of Nietzsche and Bergson, as well as

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 159-172, maio-agosto 2018 159
Valerio Torreggiani

by the thinking of William Morris and John Ruskin, two important British intellectuals of the
19th century. Six years after Maitland’s translation of Von Gierke, Penty published one of the
most important books for the corporatist thinking in Britain, titled The Restoration of the Gild
System. Partially resolving the semantic rebus, Penty described his proposals as grounded on
the concept of guild, using the medieval economic model as a solution to the industrial soci-
ety’s problems. Penty attacked socialist Collectivism in order to propose a different method to
achieve socialist objectives. In his opinion, the fundamental flaw of Marxist socialism was to
identify the main cause of the impoverishment of the working class in the capitalist economic
competition. A private ownership of the means of production and wage labor system, accord-
ing to Penty, was not bad in itself, but only in the socially disintegrating version of liberalism.
Instead, a properly regulated economic market, such as the medieval one, could rather be a
positive instrument of socio-economic, cultural and spiritual growth (Penty, 1906: 2-3).
The institution best suited to produce the required global changing in policy-making were
indeed the guilds that, in Penty’s words, “being social, religious, and political as well as indus-
trial institutions, […] postulated in their organization the essential unity of life” (Penty, 1906:
64). That perspective – clearly based on the class of producers, i.e. all the individuals in any
form involved in the production process, rather than the working class – found its way within
the New Age Circle and in Orage’s ideas. In Orage’s political perspective, the concept of social-
ism was experiencing a theoretical twisting, drifting away from its positivist roots and falling
into an ambiguous cultural dimension. As shown by the British historian Tom Villis, Orage’s
socialist tendency was part of a common European attempt to dissociate socialism from its
democratic and parliamentary overtones, freeing it from materialist and collectivist bias (Villis,
2006). In that respect, focusing principally on the moral question, Orage started soon to move
away from a Marxist analysis of the capitalist society, i.e. an analysis based on class relations
and social conflict, in order to embrace a strong nationalist agenda. During fifteen years – he
resigned as editor of “The New Age” in 1921 –, he wrote extensively on these issues, forging
a connection between a new notion of socialism and the idea of national welfare, with the
final aim to propose an institutional system where the government was not monopolized by a
single class, but rather shared among all parts of the nation.
Similarly and somehow consequentially, the New Age Circle resulted to be the hotbed
of a number of unorthodox thinking claiming for a corporatist reorganization of the society,
opposing what was perceived as crippling orthodoxies, both socialist and liberal. A prominent
position is certainly occupied by Guild Socialism, whose theoretical foundations were poured
in 1912-1914 on the pages of Orage’s review by S.G. Hobson and G.D.H. Cole, who sooner

160 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 160-172, maio-agosto 2018
Corporatism and the British Constitutional Heritage: Evidences from the History of Ideas

became the most important intellectual of the movement. Proposing a sort of pluralist, left
wing, anti-parliamentary but democratic corporatism, Cole presented his Guild Socialism as a
plea for functional representation and functional democracy as against so-called purely polit-
ical democracy, challenging the idea of traditional representative government and democracy.
Recalling Penty’s notion of industrial guild, in Cole’s hands (Guild) Socialism basically be-
came a way to order and balance; to force the several socio-economic groups existing within
the national community to cooperate: “true representation […] is always specific and function-
al […]. What is represented is never a man, the individual, but always certain purposes common
to group of individuals” (Cole, 1919: 106). While remaining attached to a certain kind of demo-
cratic idea, the social engineering proposed by Guild Socialism aimed at provoking a revolution
in the interpretation of the concept of democracy and sovereignty: the latter had to rest not in
an abstract geographically elected Parliament, rather within the guilds, i.e. in the natural forces
true expression of the modern industrial society (Cole, 1917, 1920). Thus, Cole’s aspiration was
to produce a new more reliable institutional architecture, decentralizing legislative powers into
several specific, functional, industrial organisms and transforming the decision-making process
in what Figgis defined “a society of societies” (Figgis, 1913: 49) in 1913.
Also late 19th century social catholicism advocated similar notions. Intellectuals such as
Giuseppe Toniolo, Emmanuel Von Ketteler, René de la Tour du Pin, and Pope Leo XIII were
tackling an ineffectual liberal system by proposing the resurgence of a Christian medieval-type
corporatist organization. Although supported by a minority, social catholicism had campaign-
ers also in Britain. Among them, one of the key figures was Henry E. Manning, Archbishop of
Westminster since 1865. At the turn of the centuries, Manning fulfilled a pivotal role within the
British Catholic world, spreading the continental European ideas of Social Catholicism elab-
orated by the aforementioned intellectuals, with whom he carried a regular correspondence.
In 1906, Manning founded in London the Christian Socialist League in order to develop
a political synthesis between catholic and socialist values and goals. Interestingly, among the
members of Manning’s League there were J.N. Figgis, Gilbert K. and Cecil Chesterton, and
Hilaire Belloc, all interested in a corporatist reorganization of the institutional system and later
contributors of “The New Age”. Furthermore, besides writing for “The New Age”, the Chester-
ton’s brothers and Belloc also started their own reviews, namely “The Eye Witness” and “The
New Witness” – transformed in 1925 in “The G.K.’s Weekly” – where they initiated to formu-
late a more recognizable version of British Social Catholicism, later labeled as Distributism. In
1926, a Distributist League was indeed established in London, advocating a widespread diffu-
sion of small proprietors politically organized in economic guilds, where the general economic

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 161-172, maio-agosto 2018 161
Valerio Torreggiani

order had to be guaranteed by the institutional interaction between organized industrial and
agricultural sectors.
Finally, concerning the New Age Circle, it has to be stated that it is almost impossible to
provide a single satisfying definition for the cultural and political space produced by the intel-
lectuals studied. The least that can be said is that the New Age Circle’s writers produced ideas
and theories that contained several themes, which have been seen as the distinctive character-
istics of the pan-European revolt against positivism, parliamentary democracy and liberalism: a
profound sense of cultural dislocation; a revolt against materialism and rationalism; a call for a
new elite and for a moral renewal of the society; a strong anti-parliamentary, anti-liberal and
anti-individualist feeling; and finally, the elaboration of proposals for a re-organization of the
society, deeply permeated by a corporatist atmosphere.

State and industry: Conservative variations on the


corporatist theme

A fter the First World War, a minority group within the Conservative Party started to de-
velop a corporatist legislative proposal. Although several authors and politicians con-
tributed to this political effort, a preponderant political figure led the entire process with his
ideas and charisma, i.e. the post-war Prime Minister Harold Macmillan. After fighting in the
war, Macmillan entered the House of Commons in 1924 and soon started to condemn the
betrayal perpetuated, in his opinion, by the entire British political élite in respect to the sense
of inter-class harmonic co-operation arose during the conflict. Macmillan’s analysis was then
strengthened by the several crisis punctuating the 1920s – such as the general strike of May
1926 and the economic world slump of 1929 –, which clearly demonstrated the flaws of a
declining liberal and capitalist order. Although always remaining strongly anti-socialist, Mac-
millan tried to find a cure for the maladies of his time by building a third way political proposal,
different from both liberalism and socialism, in order to regenerate a fragmented society by
renewing the socio-economic and political mechanism.
The first step in this direction was the publication in 1927 of a volume entitled Industry
and the State, co-authored with other young Conservative MPs, such as Robert Boothby and
Oliver Stanley. The main goal of Macmillan’s group was explicitly to elaborate an alternative
between (and beyond) socialism and liberalism in order to correct the main flaws of both
ideologies: as stated in the volume of 1927, “somewhere between the two extremes, between
Marxian socialism and complete ‘laissez-faire’, must lie the land in which exploration is not

162 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 162-172, maio-agosto 2018
Corporatism and the British Constitutional Heritage: Evidences from the History of Ideas

only profitable but essential” (Boothby et al, 1927: 20). In this grey area, the young Tories
hoped to find new theoretical justifications for the capitalistic society, correcting its manifest
social flaws and eradicating class struggle.
On a legal perspective, a tertium collective dimension beyond private and public was
identified as the institutional instrument to reconcile the (apparently) opposed needs of the
individual and the society. While liberalism, by stressing the role of the individual, ignores the
communal dimension of labour, socialism, by destroying private property, would eliminate the
most important input of production and progress. Instead, in Macmillan’s words, “the rights
of the individual and of the community exist side by side” (Boothby et al, 1927: 138) and,
far from being mutually exclusive, they represent two sides of the same coin. As it is distinctly
expressed in the book, “individualism and collectivism are indeed but two ways of looking at
the same thing – both necessary and each the complement of the other. […] Their reconcili-
ation is the need, which the theory of a social contract seems designed to meet” (Boothby et
al, 1927: 138). In fact, while the individual deserved a reward for his own productive effort,
society as a whole was entitled to receive all the benefits derived from the co-operative aspect
of that effort.
The new political system envisaged by Macmillan and his group of young Tories had the
goal to guarantee the expression of the needs and wishes of those directly engaged in the
productive system. It was a sort of economic democracy, in which the industrial world was
invested with the right to officially participate in the decision-making process concerning polit-
ical economy through sectorial economic agencies: “the object of Conservative policy […] – it
is stated in this volume – should rather be to create a system under which industry should be
as far as possible self-governing” (Boothby et al, 1927: 180).
Thereafter, in Macmillan’s mind, the economic crisis of 1929 represented the final act in
the failure of orthodox economic policies and in the decline of the capitalist system. After the
Great Slump, Macmillan intensified his efforts to elaborate a plan for constructing a corporatist
society. During these years, he worked hard to construct his peculiar third way, writing several
essays – the most important ones were The State and Industry and The Next Step, both writ-
ten in 1932 and unpublished, and Reconstruction, published in 1933 – and founding in 1933
with Henry Mond a pressure group called the Industrial Reorganisation League (IRL). There-
fore, the reflection started in the second half of the 1920s was further enhanced during this
period, always looking for a new kind of system. In that respect, Macmillan affirmed that he
believed the proper substitute for the individual to be not the State, but functional economic
groups, thus replacing individual initiative with a whole industry initiative (Macmillan, 1932).

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 163-172, maio-agosto 2018 163
Valerio Torreggiani

Henry Mond, like Macmillan, championed a corporatist reorganization of society, as


clearly stated in his book Modern Money published in 1932. However, more than Macmillan,
he was intensely fascinated and influenced by the Italian Corporatist State created in the
same years, which he described as a new guild system. Explicitly referring to this system, in
his volume, Mond proposed the establishment of a bicameral political scheme, in which an
elected, traditional Parliament had to be matched by an industrial Parliament formed by rep-
resentatives of the economic world with the power to debate and enact economic legislation
(Mond, 1932: 213).
In the same period, another unorthodox conservative study group on similar issues – the
Political and Economic Planning (PEP), established in 1931 – was emerging. Working in close
relations, the IRL and the PEP eventually drafted two extremely similar legislative proposals,
respectively called Industrial Reorganisation Bill and Self-Government for Industry Bill. Both
the proposals were based on the idea of establishing a form of industrial self-government.
According to the authors, each economic sector had to be reorganized in a single common
agency in order to satisfy its needs in continuous talks with other economic agencies as well as
with the Government. The entire economic policy of the country would be controlled by a Na-
tional Industrial Council, composed by the representatives of the various economic agencies.
The Parliament did not disappear from the political machinery proposed. However, it was
relegated to a minor role, namely to accept or refuse the economic legislation elaborated else-
where, with no power to modify or improve it. Westminster, in fact, was seen as a functional
agency itself, representative of the consumer category, the last piece of the legislative process
in economic matters. The resulting polycentric architecture based on functional groups intend-
ed to shape a democratic system profoundly different from liberal democracy, mainly because
it was founded not on individuals’ political choices, but rather on the concept of function and
productive unity. In fact, in this new kind of industrial democracy, individuals and their opin-
ions were no longer central to the representative system: in their stead there were the ideas,
needs, and necessities of the productive sectors and economic interests.
After being approved by the Conservative Party Conference, the Industrial Reorganisa-
tion League draft was debated in Parliament, firstly in the House of Lords during the sitting
of the 31st of October 1933, and then in the House of Commons, on the 3rd of April 1934.
Even though Macmillan formed a transversal front in supporting his bill, he was eventually
sustained only by the minority of the Conservative Party and by few MPs of Macdonald’s
National Labour group. Severe criticisms came, as expected, especially from the Labour Party,
but Macmillan’s proposal was criticised also by the Federation of British Industries, reluctant

164 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 164-172, maio-agosto 2018
Corporatism and the British Constitutional Heritage: Evidences from the History of Ideas

to fulfil a public role; by the liberal press, such as The Times and The Economist; and, finally,
by orthodox liberal academics, such as Friederich Hayek and Lionel Robbins. Moreover, the
majority of the Conservative Party eventually came to refuse the legislative bill promoted by
the Industrial Reorganisation League. A Conservative Party Committee set up in April 1934 in
order to study Macmillan’s proposal, chaired by Neville Chamberlain, drafted in April 1935 its
final report, rejecting the very idea of planning. The Committee’s report clearly distinguished
between the concept of industrial control, which had to be firmly refused, and the idea of
industrial assistance furnished by the Government in case of emergency, which was regarded
as the only possible kind of State intervention in the economic field (Ritschel, 1997: 144-231).
In the end, Macmillan’s attempt to enact corporatist legislation in Britain failed. The general
rejection of the bill put an end to the campaign for a corporatist-capitalist reorganization
scheme. The IRL’s bill was never published and the association was soon disbanded.

Importing a model: British fascism and Italian


corporatism

I n the same period, another important figure of the British corporatist world was emerging:
Oswald Mosley. After resigning from Macdonald’s Labour government of 1929, Mosley
firstly launched the New Party at the beginning of 1931, pursuing a generational approach
to the social and economic problems of his time (Worley, 2010). As pointed out in the first
article written after his resignation, What Am I Fighting For, Mosley believed that the Great
War was a decisive breaking point in world history and, therefore, both pre-war politicians and
ideologies were absolutely incapable of dealing with the major issues of the post-war world.
The electoral failure of the New Party at the elections of October 1931, and Mosley’s growing
fascination with a fascist-type ideology, led him into an intense transformation phase. After
dismissing the New Party at the end of 1931, Mosley travelled through Italy. In the first months
of 1932, he met Mussolini in person and, after his return to London, he founded the British
Union of Fascists in October 1932 (Lunn and Thurlow, 1980; Linehan, 2000; Derril, 2006;
Pugh, 2006; Howell, 2015).
Mosley spent the entire summer of 1932 writing the fundamental document of British
fascism, The Greater Britain, which was coupled by other publications specifically concerning
the Corporatist State, whose author was Alexander Raven Thomson, one of the most important
corporatist intellectuals of Mosley’s movement. The rationale behind the thinking of Mosley,
Thomson and the entire British fascist élite was basically to reproduce the Italian model in

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 165-172, maio-agosto 2018 165
Valerio Torreggiani

the United Kingdom. The central problem of the malfunctioning of the Liberal democracy was,
again, the lack of economic competences expressed by Westminster, defined as a “non-tech-
nical assembly in a vastly technical age” (Mosley, 1932: 29).
On the constructive side, in order to restore a well-functioning authority of the Govern-
ment and Parliament, Mosely proposed that “fascism would replace the present House of
Lords by a Second Chamber of specialists” (Mosley, 1932: 41). This Second Chamber had to be
the apex of a new institutional system grounded on industrial corporations, each one respon-
sible for a specific economic sector and formed by all the producers working in that sector. The
corporatist mechanism had to function as a way to introduce all the socio-economic organi-
zations, which were born outside the Liberal State, into a new Corporatist State through their
transformation in State institutions. As put by Thomson in 1935, all the “existing organizations
will be woven into the fabric of the Corporate State” (Thomson, 1935: 165).
The notion of the producer, as in the Italian fascism, symbolised the ideal reference im-
age, exemplifying the desire of overcoming class war in order to build a new harmonic society.
As put by Mosley “the producer, whether by hand or brain or capital, will be the basis of the
nation” (Mosley, 1932: 35). If the productive moment represented the common interest to
all the social classes, the Nation was regarded as a superior and metaphysical entity “with a
purpose, a life, and means of action transcending those of the individuals of which it is com-
posed” (Thomson, 1935: 165). After 1935-1936, Mosley’s British Union of Fascists became
progressively radical, starting to apply violent Nazi-style methods, as represented by the fre-
quent clashes with the opponents, such as the Battle of Cable Street in London’s East End in
October 1936. In this period, Mosley’s support started to further decline and in 1940 his party
was disbanded following the Defence Regulation 18B enacted by the Parliament as World War
II broke out.

Corporatism and the British constitution: Continuity


and change

T he present article was designed to investigate the diffusion of corporatist ideas in the
United Kingdom in the first half of the 20th century. The research has shown through the
entire period a surprisingly liveliness of ideas for established in Britain a corporatist interest re-
presentation system, although these proposals – with the exception of the fascist one – were
rarely labelled as “corporatist”. Assuming that the core of all the modern corporatist doctrines
is the institutionalisation of a representation of economic interests – variously modulated

166 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 166-172, maio-agosto 2018
Corporatism and the British Constitutional Heritage: Evidences from the History of Ideas

and proposed – one of the most interesting findings of the research was indeed proving the
existence of a multiple British political and economic debate that could be ascribed to the
European and global season of corporatist fascination. In fact, although different, all of the
theoretical experiences analysed shared a common interest in transforming producers’ organi-
zations from voluntary and private representative bodies in regulatory public agencies, partici-
pating and enforcing political decisions. Under corporatism, renewed socio-economic interests
organizations became the juridical and political organisms to build up a new institutional ar-
chitecture able to harmonise the different and conflicting interests existing within the Nation.
Certainly, British intellectuals formulated their corporatist proposals according to their
long-term political and juridical tradition and costumes. However, as in other parts of the
world, the cornerstone of the proposed industrial and institutional reorganization was classify-
ing and systematizing mass society, including all the socio-economic organisations developed
outside the boundaries of the old Liberal State in a new shaped decision-making process in
order to valorise their technical competences, as well as to ensure the end of class struggle.
Thus, in the first half of the 20th century, British corporatism appears to be one of the many
epicentres of the European and global corporatist theoretical space. In this sense, corporatism
can be interpreted as a polycentric family of corporatist correspondences that have to be ap-
preciated in their complex relationship of similarities and differences; in their different grades
of institutional development and theoretical sophistication; in their forms of convergence, di-
vergence and entanglement.
However, beyond the comparative perspective, another aspect deserves to be discussed.
Escaping the spectre of a short-term history led to an attempt to link the corporatist proposals
here presented with the peculiar British constitutional history. The result was surprisingly dense
of consequences for the general interpretation of the case study. In fact, it is indeed in relation
with the British unwritten constitution that the corporatist theories here analysed fully reveal
their complex net of historical connections with a particular juridical-political past.
As already recalled, Britain constitutional functioning is based on a peculiar complex of
laws, practices and conventions that have evolved through a long period of time. Paradoxically,
the British constitutional development is as rich as lacking of authentic constituent moments:
what stands out for its macroscopic importance, for instance, is the absence of a traumatic
fracture, such as the French Revolution was for the rest of Europe in 1789. Therefore, its un-
written nature gave life to a historical constitutional profile that seems to rely on a fluid and
flexible continuity between past and present (Bruschi, 2014: 19).
That model brings two relevant consequences on the theoretical side. The first one was
the refusal of the French revolutionary concept pair of “constituent power-general will”; while

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 167-172, maio-agosto 2018 167
Valerio Torreggiani

the second was the absence of the very notion of Ancien Régime, seen as an entire system
of practices, ideologies and conventions to eradicate (Fioravanti, 2016: 70). Thus, in Britain,
the possibility for a sovereign power to decide about the whole political system was always
regarded as artificial and potentially damaging the solidity of the society; therefore destabilis-
ing the social and political order. In this sense, the French revolutionary initiative to artificially
create a complete new order through the Constituent Assembly provoked in Edmund Burke a
sense of “disgust and horror” (Burke, 1790: 29) because the French Revolution indeed lacked
of the British “entailed inheritance” (Burke, 1790: 30), i.e. of an inner adaptive capacity for
historical development. In this sense, the British constitutional space was never at the mercy
of any new powers, but was protected by its own long history in continuity with its medieval
past, and not in contrast as in the rest of Europe.
Concluding, it is in the light of this strong medieval tradition that the corporatist British
proposals show their second nature and reveal themselves as political itineraries of cultural
continuities and discontinuities. In fact, if the British corporatist authors were – each one in
their own way – remarkably opposed to a glorious tradition of political and economic indi-
vidualism, claiming for a re-organization of the institutions along corporatist lines; they also
showed a (non) surprisingly dose of continuity with the British constitutional culture of which
they revealed to be, if carefully observed, truthful heirs. In fact, what they proposed was never
a constituent act or assembly, but rather a renewal of the old Government by Agreement
idea. In permanent dialogue with the past, they praised for the commitment (once again) of
all the various political and economic powers of the industrial society to cooperate in order
to permanently resolve the increasing tensions between the individual, the groups and the
community. In their opinion, in the light of the industrial revolution, what was lacking was a
satisfying identification of these powers. It is in this sense that, in their opinion, the industrial
society demanded the introduction of a fourth element in the constitutional equation along-
side King, Lords and Commons, in order to ensure a durable stabilization through a com-
petent, balanced and stable government. That element was the Industry, i.e. the economic
representation that had to join the traditional constitutional triad in order to establish a new
Government by Agreement.

168 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 168-172, maio-agosto 2018
Corporatism and the British Constitutional Heritage: Evidences from the History of Ideas

Bibliography

BAGEHOT, Walter. The English Constitution. London: Chapman & Hall, 1867.
BEER, Samuel. Modern British Politics: Parties and Pressure Groups in the Collective Age. London: Faber, 1969.
BLACK, Anthony. Guilds and Civil Society in European Political Thought from the Twelfth Century to the
Present. London: Methuen, 1984.
BOOTHBY, Robert et al. Industry and the State: A Conservative View. London: Macmillan, 1927.
BRUSCHI, Ugo. Rivoluzioni silenziose: l’evoluzione costituzionale della Gran Bretagna tra la Glorious Revolu-
tion e il Great Reform Act. Santarcangelo di Romagna: Maggioli, 2014.
BURKE, Edmund. Reflections on the revolution in France. Dublin: W.Watson, 1790.
CASSESE, Sabino. Lo stato fascista. Bologna: Il Mulino, 2010.
COLE G. D. H. Guild Socialism Re-Stated. London: Leonard Parsons, 1921.
______. Self-government in industry. London: G. Bell, 1917.
______. The Social Theory. London: Methuen & Co., 1919.
CORRIN, Jay P. Catholic Intellectuals and the Challenge of Democracy. Notre Dame (IN): Notre Dame Uni-
versity Press, 2002.
COSTA, Pietro. Civitas: storia della cittadinanza in Europa IV. L’età dei totalitarismi e della democrazia. Roma-
-Bari: Laterza, 2001.
COSTA PINTO, António. Corporatism and Fascism: the corporatist wave in europe and Latin America. London:
Routledge, 2017.
______. O corporativismo nas ditaduras da época do Fascismo. Varia Historia, v. 30, n. 52, 2014.
DANGERFIELD, George. The Strange Death of Liberal England. New York: Capricorn Books, 1935.
DICEY, Albert Venn. An Introduction to the Study of the Law of the Constitution. London: Macmillan, 1885.
DORRIL, Stephen. Blackshirt: Sir Oswald Mosley and British fascism. London: Viking, 2006.
FERRAL, Charles (Ed.). Modernist Writers and Reactionary Politics. Cambridge: Cambridge University Press,
2001.
FIGGIS, John Neville. Churches in the modern State. London: Longman, 1913.
FIORAVANTI, Maurizio. La Magna Charta nella storia del costituzionalismo. Quaderni Fiornetini per la Storia
de Pensiero Giuridico, v. 45, 2014.
GAGLIARDI, Alessio. Il corporativismo fascista. Roma-Bari: Laterza, 2010.
GOLDSWORTHY, Jeffrey. Parliamentary Sovereignty: Contemporary Debates. Cambridge: Cambridge Univer-
sity Press, 2010.
HOWELL, David. Mosley and British politics 1918-32. Basingstoke: Palgrave Macmillan, 2015.
JACKSON, Paul. Great War Modernism and “The New Age” magazine. London: Bloomsbury, 2012.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 169-172, maio-agosto 2018 169
Valerio Torreggiani

LINEHAN, Thomas. British Fascism 1918-1939: Parties, Ideologies, and Cultures. Manchester: Manchester
University Press, 2000.
LUNN, Kenneth; THURLOW, Richard C. (Ed.). British fascism: essays on the radical rights in interwar Britain.
London: Croom Helm, 1980.
MACMILLAN, Harold. Reconstruction: A Plea for a National Policy. London: MacMillan, 1933.
______. The Next Step. 1932. Unpublished..
______. The State and industry. 1932. Unpublished..
MATILAND, Frederic W.; H.A.L. Fisher (Ed.). The Collected Papers of Frederic William Maitland. Cambridge:
Cambridge University Press, 1911.
MARTIN, Wallace. The New Age Under Orage: chapters in English Cultural History. Manchester: Manchester
University Press, 1967.
MOLINA, Oscar; RODHES, Martin. Corporatism: The Past and Present of a Concept. Annual Review of Political
Science, v. 5, 2002.
MOND, Henry. Modern Money: a Treatise on the Reform of the Theory and Practice of Political Economy.
London: Martin Secker, 1932.
MOSLEY, Oswald. The Greater Britain. London: BUF, 1932.
NICHOLLS, David G. The pluralist State. London: Macmillan, 1975.
ORNAGHI, Lorenzo. Stato e corporazione: Storia di una dottrina nella crisi del sistema politico contempora-
neo. Milano: Giuffrè, 1984.
OVERY, Richard. The morbid age: Britain and the Crisis of Civilization, 1919-39. London: Allen Lane, 2009.
PASETTI, Matteo. L’Europa corporativa: una storia transnazionale tra le due guerre mondiali. Bologna: Bono-
nia University Press, 2016.
PENTY, Arthur J. The Restoration of the Gild System. London: Swan Sonneschein and Co., 1906.
PUGH, Martin. Hurrah for the Blackshirts: fascists and fascism in interwar Britain. London: Pimlico, 2006.
REBUFFA, Giorgio. Un’idea di costituzione – Walter Bagehot e la regina Vittoria. In: BAGEHOT, Walter. La
Costituzione inglese. Bologna: Il Mulino, 1995.
RITSCHEL, Daniel. The Politics of Planning: The Debate on Economic Planning in Britain in the 1930s. Oxford:
Oxford University Press, 1997.
SCHMITTER, Philippe. Still the Century of Corporatism? The Review of Politics, v. 36, n. 1, 1974.
SHONFIELD, Andrew. Modern Capitalism: The Changing Balance of Public and Private Power. London: Oxford
University Press, 1969.
STEARS, Marc. Progressives, Pluralists, and the Problems of the State. Oxford: Oxford University Press, 2002.
STOLZI, Irene. L’ordine corporativo: poteri organizzati e organizzazione del potere nella riflessione giuridica
dell’Italia fascista. Milano: Giuffrè, 2007.

170 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 170-172, maio-agosto 2018
Corporatism and the British Constitutional Heritage: Evidences from the History of Ideas

______. Private, public and collective: the twentieth century in Italy from fascism to democracy. In: RASK,
Mikael; THORNHILL, Chris (Ed.). Law and the formation of modern Europe: perspectives from the historical
sociology of law. Cambridge: Cambridge University Press, 2014.
TAYLOR, Gary. Orage and the new age. Sheffield: Sheffield Hallam University, 2004.
THOMSON, Alexander R. The Coming Corporate State. London: Action Press, 1935.
______. The Economics of British Fascism. London: Bonner, 1933.
VILLIS, Tom. British Catholics and Fascism: Religious Identity and Political Extremism Between the Wars.
London: Palgrave Macmillan, 2013.
______. Reaction and the Avant-Garde: the revolt against liberal democracy in the early twentieth-century
Britain. London: Tauris, 2006.
VON GIERKE, Otto. Political Theories of the Middle Ages. Translated with an introduction by F.W. Maitland.
Cambridge: Cambridge University Press, 1900.
WRIGHT, A.W. G.D.H. Cole and Socialist Democracy. Oxford: Clarendon Press, 1979.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 171-172, maio-agosto 2018 171
Artigo

Na gênese da Constituição Política de


1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo
português
In the genesis of the Political Constitution of 1933: the
corporate ideology and the economic-social structure of
Portuguese authoritarianism
En la génesis de la Constitución Política de 1933: la
ideología corporativa y la estructura económica y social del
autoritarismo portugués

Paula Borges SantosI*

http://dx.doi.org/10.1590/S2178-14942018000200004

I
Universidade Nova de Lisboa (NOVA FCSH). Lisboa, Portugal.

*Doutorada em História Contemporânea pela Faculdade de Ciências Socais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa
(NOVA FCSH). (paula.borges.santos@fcsh.unl.pt)

Artigo recebido em 1 de fevereiro de 2018 e aprovado para publicação em 8 de junho de 2018.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 173-196, maio-agosto 2018 173
Paula Borges Santos

Resumo
A institucionalização do Estado autoritário português teve como principal marco a promulgação da Constituição
Política de 1933. Aí se inscreveu o ideário corporativo, que, mais do que tendo um perfil estabilizador, projetou-se
como ideal animador do projeto estatal a construir. Envolvendo vários domínios públicos, teve, em toda a vigência
do regime, maior importância para o plano da economia. Contudo, permaneceu por estudar como se estruturou o
caráter econômico e social daquela Constituição e as negociações políticas que determinaram as opções inscritas
naqueles aspectos. Tomando como ponto de partida a reflexão de Jon Elster de que pouco se exploram os pro-
cessos de elaboração das constituições tanto em estudos sobre casos nacionais quanto em estudos de dimensão
comparativa, este artigo procura contribuir para essa temática. Procura-se clarificar como se construiu a dimensão
econômico-social da Constituição portuguesa de 1933, atendendo-se às suposições cognitivas dos criadores do
texto constitucional, isto é, às crenças que os agentes constituintes apresentaram e que estipularam como sendo os
arranjos institucionais capazes de produzir melhores resultados.

Palavras-chave: Estado; Autoritarismo, Constituição; Corporativismo; Organização econômica; Portugal.

Abstract
The institutionalization of the Portuguese authoritarian state had as its main landmark the promulgation of the
Political Constitution of 1933. in which the corporate ideology was inscribed More than having a stabilizing profile,
it was projected as an ideal of the state project to be built. Though with a wide regulatory range, the Constitution
influenced mainly the economic domain. It remains to be studied how the economic and social architecture of the
1933 Constitution was conceived or which political negotiations explain its final design. Taking Jon Elster’s state-
ment that the process of writing a constitution is little explored, both in national case studies and in comparative
ones, this article seeks to contribute toward filling in this gap. It will take in consideration the cognitive assumptions
of the creators of the Portuguese constitutional text of 1933, as well as their beliefs about the institutional arrange-
ments capable of producing better results.

Keywords: State; Authoritarianism; Constitution, corporatism; Economic organization; Portugal.

Resumen
La institucionalización del Estado autoritario portugués tuvo como principal marco la promulgación de la Constitu-
ción Política de 1933. En ella se inscribió el ideario corporativo que más allá del perfil estabilizador, se proyectó como
ideal inspirador del proyecto estatal que debía construirse. Aunque abarcó varios aspectos públicos, tuvo, durante
toda la vigencia del régimen, mayor importancia para el plano de la economía. Sigue sin estudiar cómo se estructuró
el cariz económico-social de aquella Constitución y, asimismo, qué negociaciones sirvieron de base para su elabora-
ción. A partir de la reflexión de Jon Elster — quien sostiene que apenas se han explorado los procesos de elaboración
de las constituciones, tanto en estudios de ámbito nacional como en los de perspectiva transnacional y comparada
—, este artículo busca contribuir al debate sobre el tema, aclarando la génesis de la dimensión económico-social
del texto constitucional portugués de 1933, a la luz de las suposiciones cognitivas de los sus autores, es decir, de
las concepciones manifestadas y concretadas por los agentes constituyentes, en cuanto arreglos institucionales
susceptibles de producir los mejores resultados.

Palabras clave: Estado; Autoritarismo; Constitución; Corporativismo; Organización económica, Portugal.

174 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 174-196, maio-agosto 2018
Na gênese da Constituição Política de 1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo português

Introdução: características gerais do processo


constituinte

A Constituição Política de 1933, que estruturou a fisionomia formal do regime autoritário


em Portugal ao longo de toda a sua vigência, definiu novas finalidades para o Estado,
em uma dinâmica que permitiu aos decisores políticos e a alguns juristas apoiantes do novo
projeto estatal defender que se desenrolava uma nova etapa constitutiva do direito público
em Portugal. De certa forma, esse discurso sinalizava um impulso revolucionário que suma-
riamente se condensava na proposta de fundação de uma “república unitária e corporativa”
e se pretendia estabelecer como alternativa à crise da democracia representativa, nos moldes
em que tinha sido impulsionada sob a atuação dos governos republicanos de 1910 a 1926.
Nesse ambiente, as condições políticas e práticas de elaboração daquela Constituição
não coincidiram com uma conjuntura de pacificação, mas, antes — em uma confirmação da
análise de Jon Elster sobre as condições reais de adoção de uma constituição (Elster, 2012:
149) —, com circunstâncias tumultuadas, de negociações duras entre correntes políticas em
luta pela liderança da chefia do Estado que só são possíveis de captar, atualmente, com al-
guma obscuridade, dado não existirem registros documentais que permitam reconstruir, com
detalhe satisfatório, a história do processo constituinte que forjou a Lei Fundamental de 1933.
Com efeito, a instabilidade política e as desinteligências quanto ao sentido da transformação
a efetuar no que se projetava ser a reforma constitucional, equacionada desde os primeiros
momentos do golpe militar de 28 de maio de 1926, de que um dos principais rostos foi
o do ministro da Justiça e dos Cultos, Manuel Rodrigues Júnior, determinaram a duração
dos trabalhos constituintes, justificando sua lentidão, ao contrário do que sustenta alguma
historiografia (Chorão, 2009: 528). Na realidade, a questão constitucional fora praticamen-
te herdada no momento de instauração da ditadura militar, já que pouco tempo antes, em
janeiro de 1926, o Congresso havia deliberado antecipar em cinco anos a revisão da Consti-
tuição de 1911. Em causa estava, especialmente, a reforma do próprio sistema parlamentar,
necessidade consensualizada entre o espectro de forças políticas (da Esquerda Democrata ao
Partido Republicano Nacionalista) e suportada pelas ideias de racionalização do Poder Legisla-
tivo, estabelecimento da representação dos interesses das classes profissionais, mediante uma
solução bicameral (com uma câmara eleita por sufrágio direto e outra por sufrágio orgânico)
e criação de um Poder Executivo com maiores atribuições.
É conhecido que a Constituição de 1933 resultou de um processo constituinte
relativamente longo, tendo em conta a média de preparação de constituições do século XIX
e três primeiras décadas do século XX, que não excederam os dois anos. Iniciado em meados

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 175-196, maio-agosto 2018 175
Paula Borges Santos

do ano 1930, tanto quanto se pode identificar, e concluído em fevereiro de 1933, tal pro-
cesso não seguiu nenhuma das variedades tipificadas de “montagem constituinte” (a saber:
convenções, legislaturas constituintes mandatadas, legislaturas constituintes autocriadas ou
assembleias legislativas autocriadas), tendo tido características de “gabinete”. Tratou-se, dito
por outras palavras, de um ato constituinte desencadeado pelo Poder Executivo, designada-
mente nos ministérios de Domingos de Oliveira e de António Oliveira Salazar, no qual teve
papel central este último, na qualidade de ministro das Finanças, primeiro, como presidente do
Conselho de Ministros, depois. Apesar disso, não se tratou de um caso em que a Constituição
tivesse sido essencialmente elaborada por uma única pessoa, como foi o caso da Constituição
prussiana de 1848. Ao trabalho de Salazar somaram-se contributos de personalidades de sua
confiança política, auscultadas no processo de redação do projeto constitucional, e aprecia-
ções de dois órgãos políticos, o Conselho Político Nacional e o Conselho de Ministros.1 Salien-
te-se que, estando o Congresso da República dissolvido por decreto de 9 de junho de 1926,
na sequência do golpe militar de 28 de maio desse ano, esse processo constituinte não passou
pelas câmaras legislativas, embora tenham sido várias as hipóteses ventiladas envolvendo sua
atuação, desde a reabertura do Congresso da República, com manutenção de sua composição,
até à convocação de eleições para reunião de uma assembleia constituinte (Araújo, 2007: 88).
Nesse aspecto, a Constituição de 1933 encerrou uma experiência constituinte singular em
Portugal, já que, ao longo de toda a história do constitucionalismo português, e apenas com a
exceção da Carta Constitucional de 1826,2 sempre os textos constitucionais foram produzidos
por assembleias constituintes. Aquela Constituição é fruto ainda de um dos poucos casos
existentes até 2000 de um processo constitucional com origem em um corpo constituinte que
não foi um órgão eleito. Tal também ocorreu na Itália, em 1946, e na Alemanha, em 1949,
embora com a significativa diferença de essas duas experiências constituintes terem estado
associadas ao fim do fascismo e do totalitarismo. Por seu turno, o texto constitucional de 1933
foi produzido no quadro de um sistema ditatorial que pretendia estabilizar-se a si próprio.
O problema fundamental com que, naquela época, Portugal se confrontava era o da
reorganização do Estado, capaz de ser suportada por várias forças políticas, com distintas
posições ideológicas, que, apesar de refletirem diferentes graus de compromisso e de
identificação, já constituíam uma esfera de apoio dos ministérios da ditadura militar. Ainda
que sem a obrigatoriedade de recorrer a um sistema que refletisse essa diversidade política
e ideológica, Salazar não descurou a necessidade de se rodear de alguma representação
das forças em presença. Tal encontra-se no perfil das personalidades envolvidas no proces-
so constituinte, e, usando novamente a terminologia de Jon Elster, elas não representavam
interesse(s), mas detinham (alegadamente) o conhecimento de interesse(s). Foram ouvidas

176 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 176-196, maio-agosto 2018
Na gênese da Constituição Política de 1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo português

figuras proeminentes do Integralismo Lusitano (como Afonso Lucas, Pequito Rebelo ou


Hipólito Raposo), para quem era importante a superação das formas representativas liberais;
vultos ligados a um pensamento decadentista e nacionalista (Quirino de Jesus); professores
de direito da Universidade de Coimbra, influenciados uns pela escola intervencionaista alemã
(José Albero dos Reis), outros pela doutrina do institucionalismo francês, sensíveis em maior
ou menor grau ao pensamento tomista e à doutrina social católica (Domingos Fezas Vital). O
envolvimento do Conselho Político Nacional, por meio de uma comissão encarregada de dar
parecer sobre o projeto constitucional, permitiu explorar sensibilidades ligadas a um naciona-
lismo presidencialista, como Martinho Nobre de Melo, profundamente envolvido na Cruzada
Nuno Álvares; ao republicanismo de orientação socialista, por intermédio do procurador-geral
da República, Francisco Henrique Góis; e a um nacionalismo personalista, singularizado em
Mário de Figueiredo. O Conselho de Ministros e o próprio presidente da República, também
consultados ao longo da preparação da Constituição, diversificaram esses perfis, dado aí pon-
tuarem políticos e militares que conservavam abertura a princípios liberais, conjugando-os
com o sentido da hierarquia e salvaguarda da autoridade dos órgãos titulares de poder do
Estado (ainda que admitindo a prevalência do Poder Executivo).
Até à submissão do projeto constitucional à discussão da opinião pública, em maio de
1932, por um breve período, foi seguido um regime de sigilo na negociação da Constituição.
Após esse período de consulta pública, regressou-se ao trabalho em regime de gabinete,
no mesmo restrito circuito da negociação inicial (envolvendo, de novo, os mais importantes
órgãos políticos do Estado), até ao momento do plebiscito da Constituição. Essa montagem
fechada do texto constitucional gerou um procedimento geral em forma de losango, em que
o debate nacional sobre os principais problemas constitucionais ocorreu a meio do processo.3
Contrariamente ao que havia sido a condução da questão constituinte por Manuel Rodrigues
Júnior, com diversas declarações à imprensa e divulgação de ideias, por exemplo, sobre o
desenho do sistema político-institucional a constitucionalizar, o isolamento do legislador cons-
tituinte, permitindo escassas notícias sobre o tema e acionando os mecanismos da censura
para restringir sua discussão pública, apontava agora para a intencionalidade de não só limitar
o impacto das decisões a tomar, como também de reduzir interferências suscitadas por egos
pessoais em clima de concorrência. Tal servia ainda a tática de amplificar a ideia de consen-
sualização sobre o que ficava inscrito no texto constitucional.
Apesar dessa configuração da negociação constituinte, o legislador cuidou de impedir o
sentimento de alienação popular e não rejeitou consolidar suas opções sobre a ideia de povo,
entendido como fundamento do movimento de todo o mecanismo institucional. Tal correspon-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 177-196, maio-agosto 2018 177
Paula Borges Santos

deu, no entanto, ao que Canales (Canales, 1977: 22), interpretando a teoria da representação
europeia nos primeiros anos do pós-Primeira Guerra Mundial, descreveu como sendo uma
forma de evitar convocar a soberania popular. Todos os membros do povo formavam uma
totalidade que se identificava como vontade superior, a vontade nacional, a qual, por sua vez,
era determinada por considerações superiores do interesse geral. Apenas a essa luz, aliás, po-
de-se entender a opção por plebiscitar a Constituição, o que veio a suceder em 19 de março de
1933. De fato, por essa via, era devolvido àquele sujeito político — tido como o conjunto dos
governados — o pronunciamento de maneira definitiva sobre o que constava na Constituição,
sem que tal assentasse na concepção meramente representativa da democracia. Partindo da
noção de associações naturais na sociedade — a família, a corporação e as autarquias locais
—, o povo era considerado o ente primário de formação da estrutura da nação que o Estado
organizava e, portanto, agente impulsionador da construção constitucional e também respon-
sável pela validação do ordenamento constitucional. Do ponto de vista do que se inscrevia na
Constituição formal, tal visão levava a considerar o direito dos cidadãos individuais (dos go-
vernados), ainda que sob elevada regulamentação, patente na remissão para leis especiais do
exercício de várias liberdades, na proibição de greve, na extensão do sufrágio ou na ausência
de referências aos partidos políticos.

A ordem social e econômica inscrita na primeira edição


do projeto constitucional

A dificuldade em satisfazer as aspirações das diferentes forças políticas exigiu que se


encontrasse um elemento de homogeneidade capaz de ser partilhado, o qual se pode
dizer que recaiu em uma concepção organicista de Estado. Todavia, as divergências no
modo de conceber sua fundamentação e sua concretização não trabalharam como fator efeti-
vo de coesão, e o modelo de Constituição produzido foi compósito, sem uma fisionomia clara
e bem-definida. Consultando as nove edições preparatórias do que veio a ser o texto final
da Constituição de 1933 (algumas delas contendo mais do que uma cópia com anotações
manuscritas4), fica claro que, desde a redação do primeiro esboço de estatuto constitucional,
houve a opção de desenvolver a ideia corporativa em um âmbito amplo de matérias, relacio-
nadas quer com as garantias fundamentais (Parte I do projeto constitucional e também do
texto final da Constituição), quer com a organização política do Estado (Parte II, igualmente
do projeto e da Constituição).
Por já ter sido um tema explorado em outras investigações (Araújo, 2007: 17-119), não
se discutem aqui as várias propostas sobre o desenho do sistema político concebidas para a

178 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 178-196, maio-agosto 2018
Na gênese da Constituição Política de 1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo português

Parte II do projeto constitucional, merecendo apenas que se saliente que a consulta das
várias edições demonstra como os títulos relativos aos órgãos de soberania (presidente da
República, governo e Assembleia Nacional), e ainda à Câmara Corporativa, foram dos mais
modificados, da primeira à última versão. Para as alterações introduzidas, designadamente
no tocante à natureza dos sufrágios, contribuíram algumas reações críticas das personali-
dades auscultadas. Assim, o legislador recuou no sufrágio misto para eleição da Assembleia
Nacional, optando por instituir o sufrágio direto. A eleição do presidente da República pas-
sou também a fazer-se por voto direto dos cidadãos com capacidade eleitoral, e não só dos
chefes de família. Não sendo aqui o lugar para discutir a teoria da representação política
que suportou essas escolhas, deve-se, contudo, sublinhar que o sufrágio direto, inscrito no
texto constitucional, passou a assentar-se em novos fundamentos, distanciados dos pura-
mente liberais. Estando o pensamento do legislador familiarizado com as teorias alemãs de
Gierke, Laband e Jellinek, mas próximo especialmente das teses institucionalistas de Mau-
rice Hauriou e Léon Duguit (Sousa, 1907: 30-38; Vital, 1940: 433), é plausível admitir-se
que, com a consagração do sufrágio, não se pretendesse exagerar o papel da eleição, vista
apenas como procedimento empírico de designação dos representantes do povo (Canales,
1977: 32-33). Essa posição ajuda a explicar o desvirtuamento dos atos eleitorais que o
Estado Novo seguiu na prática, criando eleições não concorrenciais. Aí, assistiu-se à desva-
lorização dos sufrágios, cuja função consistia apenas em conferir ao eleito uma investidura
em nome da soberania nacional.
Quanto à Parte I, o referencial organicista encontra-se nos preceitos dos Títulos I a XIV,
sobre a nação, a família, as corporações e as autarquias, as corporações morais e econômicas,
e a ordem econômica e social. Aí, tomava forma a consideração do cidadão em sua vida social,
em seus interesses econômicos e educativos, o que correspondia a uma regulação constitu-
cional que, depois da Constituição de Weimar, começara a influenciar o constitucionalismo de
pequenos Estados europeus e se caracterizava por um intervencionismo estatal e por uma ex-
tensão de direitos a determinadas instituições sociais ou a coletivos dotados de personalidade
(Mortati, 2010 [1946]: 49-52). Essa evolução captara a atenção de Salazar, que a apelidou
de “formação de um vínculo econômico e social de natureza constitucional”, sendo favorável
à introdução no texto da Lei Fundamental de “matérias de caráter econômico e social”, com
“desenvolvimento e semelhança neste ponto a constituições como a de Weimar”. O projeto
constitucional português deveria, todavia, ser original em relação a esse modelo, dando “mais
desenvolvimento e precisão” a “muitos problemas”, mas também dando outra ordem “mais
clara e superior” às matérias.5

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 179-196, maio-agosto 2018 179
Paula Borges Santos

Dentro desse espírito, o legislador constituinte atribuiu, logo na primeira edição do texto
constitucional, direitos:
• À família, considerada “elemento político primário” e com direito reconhecido a
educar os filhos. Sob especial proteção da Constituição era colocada a situação
econômica da família, fixando-se o compromisso de que os impostos seriam re-
gulados tendo em conta os encargos familiares, de se favorecer a constituição de
lares independentes e em condições de salubridade. Com caráter de diretiva para o
futuro, estabelecia-se que seria promovida a adoção do salário familiar, a proteção
à maternidade e a cooperação (do Estado com a família) na educação dos filhos (em
estabelecimentos de ensino tanto públicos quanto privados). A coesão familiar era
um valor a preservar, integrante da moralidade pública (católica), como indicavam
as disposições que exigiam que a família se assentasse no casamento, obrigatoria-
mente registrado (tal como se exigia ao nascimento dos filhos), e na diferença de
direitos estabelecidos para filhos legítimos e ilegítimos.
• À freguesia, aos municípios e agrupamentos de municípios, considerados como de-
tentores de direitos políticos.
• Às corporações morais e econômicas, cuja organização deveria ser promovida pelo
Estado, e onde tinham representação orgânica, para efeitos políticos, todos os ele-
mentos da nação. Cabia-lhes tomar parte na eleição do presidente da República,
dos membros das câmaras legislativas, dos conselhos de província e das câmaras
municipais. As corporações morais seriam especialmente políticas, científicas, literá-
rias e artísticas, técnicas, de assistência e de beneficência. Admitia-se poder a lei vir,
no futuro, a aceitar as de funcionários públicos. As corporações econômicas seriam
de proprietários urbanos e rurais, agricultores, industriais, comerciantes, de empre-
gados do comércio, indústria e agricultura, de artes e ofícios e de trabalhadores.

Reconheceu-se o direito à propriedade e à sua transmissão hereditária, nas condições


determinadas pela lei civil. Fixava-se ainda que a propriedade, a par do capital, tinha uma
função social, que podia sujeitar “o direito pleno do capitalista ou proprietário à condição do
emprego ou exploração em termos justos e conformes com as finalidades coletivas”. A repre-
sentação sindical era também reconhecida, considerando-se as associações sindicais de “por-
tugueses de ambos os sexos e de pessoas jurídicas portuguesas, e bem assim de federações e
confederações gerais e nacionais”. Aquelas associações, desde que legalmente reconhecidas,
tinham a possibilidade de celebrar contratos coletivos de trabalho. Todos os contratos, feitos
sem tais associações, seriam considerados nulos. Cabia ainda às associações sindicais regular

180 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 180-196, maio-agosto 2018
Na gênese da Constituição Política de 1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo português

a conflitualidade entre as entidades associadas, estimular e subsidiar suas iniciativas que


visassem a organizar a produção, instituir “estações de emprego”. Não se admitia o direi-
to à greve. Estabelecia-se que tribunais especiais de apelação, organizados como juízes de
arbitragem, julgariam os litígios relativos às relações coletivas de trabalho. Consagrava-se a
liberdade de escolha de profissão ou gênero de trabalho, indústria ou comércio. No entanto,
essa liberdade não era plena nem efetiva, já que ficava sujeita às restrições impostas pelo
bem comum e a exclusivos que o Estado e os corpos administrativos entendessem conceder. A
questão da liberdade sindical era aqui omitida, embora se depreendessem fortes limitações ao
direito de associação (totalmente assumidas na edição definitiva da Constituição), como era
manifesto na proibição do direito à greve.
No plano econômico (Título VIII: Da ordem econômica e social), naquela primeira edição,
o Estado assumia a responsabilidade de:

• Coordenar e regular a vida econômica na metrópole e nas colônias. Cabia-lhe ain-


da a fiscalização das relações de “circulação, distribuição e consumo de riqueza”.
Admitia-se que o Estado organizaria diretamente atividades econômicas, “se os
particulares não se resolvem a exercê-las por desvantagem de rendimento ou por
outros motivos”. Previa-se também que o Estado impusesse as “limitações adequa-
das” quando uma atividade privada custasse mais do que outras que rendessem
tanto ou mais do que ela.
• Defender o interesse coletivo em conflitos com terceiros, que em sua condução de
“explorações agrícolas, industriais e comerciais” revelassem “caráter parasitário”,
evitando “concorrências desregradas”. Admitia-se, na mesma linha, que as asso-
ciações e os interesses econômicos particulares pudessem ter de se subordinar às
“superiores necessidades nacionais”.
• Assegurar as políticas de preços (o menor preço) e salários (o maior salário), apon-
tadas a ideias de solidariedade e de justiça social (o maior lucro justo).
• Prover as “classes trabalhadoras”, especialmente “o menor e a mulher”. Esse as-
pecto articulava-se com o ponto anterior, na medida em que remetia à ideia de uma
distribuição de riqueza pelas classes envolvidas nas atividades produtivas. Não se
esclarecia, no entanto, qual a forma de intervenção do Estado ou de outras entida-
des para atingir aquela finalidade.
• Garantir a alimentação e a saúde pública, estabelecendo-se a criminalização de
ações que se fizessem contra elas.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 181-196, maio-agosto 2018 181
Paula Borges Santos

• Promover as instituições de solidariedade, previdência, cooperação, mutualidade e


assistência, não se esclarecendo se tal seria feito a título subsidiário ou se seria uma
intervenção principal do Estado.

Uma noção de igualdade distributiva, ainda que com sentido negativo, encontrava-se nas
disposições que determinavam que seriam impedidas, ou alvo de “tributações adequadas”, as
excessivas acumulações de lugares e cargos em sociedades, empresas comerciais e industriais.
Também se assumia organizar o crédito, visando à sua distribuição por todos os agentes da
vida econômica. Como limite à intervenção do Estado nesse domínio, determinava-se que
nunca poderiam ser objeto de consolidação forçada tanto a dívida flutuante do Estado quanto
os débitos por depósito efetuados nas caixas do Estado ou de estabelecimentos de crédito
que lhe pertencem. Essa disposição seria, em edições seguintes do projeto constitucional,
transferida para o título relativo às finanças do Estado.
É interessante notar que esse último título (à época Título XIII, futuro Título XIV), com-
plementar à estrutura econômica da Constituição, foi dos mais modificados logo na primeira
edição do projeto constitucional, adquirindo logo aí uma redação quase definitiva. Com efeito,
não voltou a sofrer alterações de redação senão na nona edição da Constituição, na qual se in-
troduziram referências às colônias e se atualizou o nome da câmara política. A documentação
revela que foi Salazar o autor dessas alterações, redigindo novos preceitos nas margens do
documento. A principal diferença envolveu a autonomia do ministro das Finanças. O projeto
inicial previa sua subordinação, em especial à Câmara dos Deputados e ao Congresso, mas
também ao Tribunal de Contas, mediante a obrigação daquele titular de apresentar àquela
Câmara o orçamento geral do Estado nos primeiros 15 dias de fevereiro; a permisão de o Con-
gresso reduzir ou rejeitar os créditos orçamentais que lhe fossem propostos; antes do encerra-
mento da sessão legislativa, a permisão de o Congresso autorizar o governo a cobrar receitas
do Estado e pagar despesas públicas na gerência futura, defendendo ainda, na mesma lei, os
princípios a que deveria subordinar-se o orçamento no tocante a despesas cujo quantitativo
não fosse determinado de acordo com leis preexistentes; a permisão de fazer depender da
aprovação do Poder Legislativo o orçamento para a nova gerência, obrigando, em caso de não
aprovação, o Conselho de Ministros a estabelecer um orçamento provisório para vigorar até
à entrada em execução do definitivo; a apresentação da conta anual de receitas e despesas
do Estado a submeter ao Congresso pelo titular das Finanças; a obrigação do Tribunal de
Contas de examinar a conta anual de receitas e despesas do Estado, dirigindo ao Conselho de
Ministros e ao Congresso o relatório de seu trabalho, cujas conclusões seriam posteriormente
apresentadas pelo governo ao Congresso.

182 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 182-196, maio-agosto 2018
Na gênese da Constituição Política de 1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo português

Salazar eliminou todas essas disposições, salvaguardando para o titular das Finanças
uma atuação independente do pronunciamento do Poder Legislativo. Recorrendo a uma sim-
plificação substantiva do número de preceitos nesse título, definiu que o orçamento geral do
Estado seria anualmente organizado e posto em execução pelo governo, admitindo apenas
que tal fosse feito em conformidade com a lei de autorização dada pela Câmara dos Deputa-
dos. Somente a cobrança de impostos estabelecidos por tempo indeterminado ou período que
ultrapassasse uma gerência ficava dependente da autorização do Congresso.

As principais modificações relativas à estrutura


econômica e social do primeiro projeto
constitucional

E ntre a primeira e a segunda edição do projeto constitucional, registra-se uma preocupação


do legislador de clarificar a redação da generalidade das disposições do Título VIII. Esse
trabalho não terá sido feito por Salazar, já que a letra manuscrita nessa edição, que introduz as
várias alterações, não é sua. Do que foi possível apurar, terá sido Quirino Avelino de Jesus seu au-
tor, pois a caligrafia corresponde àquela que forma outros escritos seus, encontrados nas pastas
nas quais estão arquivadas as várias edições do texto constitucional. A principal alteração feita
envolveu as associações sindicais, suprimindo-se as finalidades a que poderiam obedecer. Foi
ainda ponderada a hipótese de se eliminar o encargo que lhes cabia de celebração dos contratos
coletivos de trabalho; todavia, depois de ser cortado, voltou-se a decidir que “Fica”. Suavizaram-
-se as restrições a impor à acumulação de cargos em empresas comerciais e industriais. Por fim,
a última alteração textual substantiva envolveu a dívida flutuante do Estado, que deixava de ser
mencionada entre o que não podia ser objeto de consolidação forçada.
Bastante alterado por Salazar foi o Título V, dedicado às corporações morais e econômi-
cas. Todos os artigos aí contidos sofreriam uma reelaboração. Atenuava-se o papel do Estado
quanto à formação das corporações morais e econômicas, bastando indicar que apenas as
reconhecia, promovia e auxiliava, procedendo da mesma forma para com as associações sin-
dicais. Desaparecia a referência à possibilidade de constituição de corporações de funcionários
públicos. Mantinham-se os objetivos políticos, científicos, literários e artísticos, de assistência,
beneficência ou caridade, de aperfeiçoamento técnico ou solidariedade de interesses das cor-
porações. Inovava-se, contudo, ao determinar que seriam reguladas em sua constituição e
exercício pelas “normas especiais das leis associativas”.
Na edição seguinte do projeto constitucional, registram-se novas alterações de porme-
nor de redação no Título VIII, merecendo apenas assinalar que aí se abandonou a ideia de

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 183-196, maio-agosto 2018 183
Paula Borges Santos

criminalizar ações que atentassem contra a alimentação e a saúde públicas. Será na quarta
edição, que incluiu as emendas aprovadas em reunião de Conselho de Ministros de janeiro de
1932 e outras feitas na sequência de revisão do texto com essas emendas, que se encontram
modificações ao Título VIII dignas de nota. Abandonava-se o preceito que garantia que a
economia portuguesa obedeceria ao princípio da harmonização com outras nações, ainda que
podendo admitir modalidades especiais em relação a certos Estados. Dava-se nova redação
à disposição reguladora da relação do Estado com as atividades econômicas privadas. Reti-
rava-se a ideia de limitar as pouco rentáveis, substituindo-a pela ideia de favorecimento das
mais rendosas, com admissão da possibilidade de proteção e beneficio social a dispensar às
pequenas indústrias domésticas. Foi também eliminada a ideia de crimes e de penalizações de
ações que atentassem contra a alimentação e a saúde públicas. Sobre os tribunais especiais a
criar para litígios que envolvessem as relações coletivas de trabalho, caía a designação de que
seriam “de apelação”. Alteração substancial dava-se com a passagem da celebração dos con-
tratos coletivos de trabalho das associações sindicais para as corporações econômicas (opção
que ficaria inscrita no texto final da Constituição). Eliminava-se, em definitivo, o preceito que
previa a subordinação da organização do crédito à necessidade de sua distribuição por todos
os concorrentes da vida econômica.
Em matéria das finanças do Estado, no Título XIV, com redação já praticamente
estabilizada, introduzia-se um parágrafo único, que previa que cada uma das colônias viesse a
organizar seu orçamento. Em matéria de impostos, também se fixava que a lei determinaria a
matéria de incidência, a taxa e isenções a que houvesse lugar, admitindo-se reclamações e re-
cursos em favor do contribuinte. Mudanças significativas foram inscritas ainda no Título V, que
nessa edição passaria a ser o IV (como, aliás, veio a ficar na versão final do texto constitucio-
nal). Pela primeira vez, eliminava-se a ideia de que nas corporações morais e econômicas, bem
como nas associações ou organizações sindicais, teriam “representação orgânica, para efeitos
políticos, todos os elementos da Nação”. Retiravam-se também os objetivos políticos às cor-
porações, associações ou organizações. Por último, uma alteração substantiva: era eliminado
o preceito que admitia que as corporações ou organizações recenseadas tomassem parte na
eleição do presidente da República, câmaras legislativas, conselhos de província e câmaras
municipais. Na globalidade, todas as modificações feitas nessa versão do projeto constitucio-
nal comprovam o papel importante de modelagem dos conteúdos constitucionais que teve
o Conselho de Ministros, ao que acresce uma forte mitigação da dinâmica da representação
orgânica e um esvaziamento da dimensão política das corporações morais e econômicas.
Entre a produção da quarta e da sexta edição do projeto constitucional, haveriam de
decorrer dois escassos dias, o que indica que houve uma concentração do trabalho constituin-

184 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 184-196, maio-agosto 2018
Na gênese da Constituição Política de 1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo português

te no mês de fevereiro de 1932. Na elaboração da sexta edição, segundo os apontamentos


inscritos na documentação, Salazar trabalhou com Domingos Fezas Vital e Martinho Nobre de
Melo. São muitas as alterações em todo o articulado do texto constitucional, sobretudo em
títulos que não são analisados neste artigo. Ainda que não existam elementos que esclareçam
suficientemente o porquê desse labor mais intensivo do legislador, é plausível pensar que tal
se prendia à necessidade de submeter nova edição do projeto constitucional ao Conselho de
Ministros, como veio a ocorrer em 5 de março de 1932. Nas matérias que aqui se acompa-
nham, cumpre salientar uma modificação no artigo que reconhecia o direito de propriedade
e sua transmissão, particularizando-se que esta deveria ser por testamento ou herança (não
bastando, como até aí, dizer-se que seria por transmissão hereditária). Sobre as corporações
morais e econômicas, voltava-se atrás quanto a serem reguladas por “normas especiais das
leis associativas”, inscrevendo-se uma fórmula mais vaga que remetia simplesmente para sua
regulação por “normas especiais”. No título dedicado à família, às corporações e autarquias
como elementos políticos, assinalavam-se várias interrogações quanto à participação das
corporações em eleições, não sendo fixado quem elegeria o quê. No Título VIII, a par de
melhorias de redação, duas alterações substantivas foram feitas. Uma, que particularizava que
só as corporações econômicas, reconhecidas pelo Estado, poderiam celebrar contratos coleti-
vos de trabalho. Outra, que tornava mais clara a forma de intervenção do Estado na gerência
das atividades econômicas particulares, quando houvesse que financiá-las. Estipulava-se que
tal deveria ocorrer “para conseguir benefícios sociais superiores aos que seriam obtidos sem
a sua intervenção”. Em vésperas do Conselho de Ministros, Salazar e Fezas Vital voltaram a
introduzir alterações no texto constitucional, naquela que foi sua sétima edição. Aí se fixou
definitivamente a garantia do direito de propriedade e sua transmissão “em vida ou por morte,
nas condições determinadas pela lei civil”, abandonando-se os institutos da herança ou do
testamento. A oitava edição do projeto constitucional recolheu melhoramentos de redação.
Aparentemente, foi só um ano depois, entre 14 e 20 de fevereiro de 1933, que o le-
gislador constituinte, dessa vez por intermédio da dupla Salazar e Fezas Vital, voltou a fazer
correções ao projeto constitucional naquela que foi uma revisão de redação profunda e onde
se manifestam ainda muitas dúvidas que atravessam todo o articulado. Tratando-se da nona
edição, a verdade é que esta é composta por quatro versões. Assim, em sua primeira versão
(que envolveu as Partes I e II da Constituição), insere-se no Título IV, pela primeira vez, que o
Estado não reconhece as corporações ou organizações que “assentem ou admitam o princípio
da luta de classes”. Já no Título V se fixou em definitivo que as corporações morais e econômi-
cas tomariam parte na eleição das autarquias, conselhos de província e Câmara Corporativa.
Por sua vez, as juntas de freguesia elegiam as autarquias, e estas, os conselhos de província.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 185-196, maio-agosto 2018 185
Paula Borges Santos

Na Câmara Corporativa, haveria representação das autarquias locais. Na terceira versão (que
só envolveu a Parte I) da nona edição, modificou-se uma das disposições mais antigas do
projeto ao estabelecer que o capital e o trabalho (este último substitui a propriedade, que era
eliminada) desempenhavam uma função social, em “regime de cooperação econômica e de
solidariedade”. Também deixava de se referir que o trabalho era “elemento de cooperação da
empresa econômica, podendo ser-lhe associado”, para mencionar que, “quer simples, quer
qualificado ou técnico pode ser associado à empresa”.
Para a quarta versão da nova edição, que envolveria a revisão finalíssima das Partes I e II,
estava, contudo, reservada a alteração que condicionou todo o desenvolvimento do Estado Novo
e que tem merecido ampla atenção de todos os estudiosos que têm trabalhado o regime. Com
efeito, no artigo que aí ficou definitivamente identificado como artigo 5o, onde se lia o Estado
português “é uma República”, Salazar, por seu punho, acrescentou “unitária e corporativa”.
Tratava-se, na realidade, de uma precisão de última hora. Aquele artigo, que até então
fora sempre o número seis, tivera na primeira edição do projeto constitucional a seguinte
fórmula: “O Estado é organicamente democrático e representativo.” Na segunda edição, ser-
-lhe-ia dada nova redação: “A forma de governo do Estado é a república, organicamente
democrático e representativo.” Nas edições seguintes, haviam-se seguido pequenas reformu-
lações nessa redação. Todavia, na altura, existia um artigo 5o, redigido por Quirino de Jesus e
eliminado durante a produção da segunda edição da Constituição, no qual se lia:

O Estado é liberal, social e corporativo. Reúne, coordena e harmoniza na sua organização


política os cidadãos, com as suas garantias e direitos individuais; a sociedade, com os seus
interesses superiores, aos quais aqueles estão subordinados; e a família, as autarquias regio-
nais e locais e as corporações morais e econômicas, com as suas imunidades, resultantes da
natureza ou da lei.

Ao dar aquela redação final ao que ficou sendo o artigo 5o, Salazar aproximava-se do
espírito da fórmula sugerida por Quirino de Jesus, embora evitando ser prolixo. Ao fazê-lo, por
um lado, convocava o consenso existente entre os atores envolvidos no processo constituinte
quanto a conceber a organização do Estado à luz de uma concepção organicista. Por outro,
o uso do referencial corporativo como princípio ordenador servia-lhe para envolver as novas
adaptações feitas ao direito público português, constitucional em especial, em uma aura de
modernidade.6 Por outras palavras, tratava-se, em boa medida, de recorrer a uma etiqueta
política que começara a fazer furor na Europa (Espanha, França, Suíça, Áustria, Alemanha e
Itália), na composição de respostas à crise econômica de 1929 e à crise política da década de
1930, ainda que por meio dela exprimissem diferentes aspirações, como o apelo a uma coexis-

186 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 186-196, maio-agosto 2018
Na gênese da Constituição Política de 1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo português

tência pacífica entre capital e trabalho; o combate ao marxismo; o desenvolvimento de novas


formas de regulação econômica e social (Rosanvallon, 2007 [2004]: 328; Cuevas, 2013: 631-
637). Como Salazar haveria de mencionar, o corporativismo era o ponto de contato do “na-
cionalismo português” com sistemas políticos internacionais da época (Salazar, 1935: 334).7
Pode-se admitir, com facilidade, a partir do que o próprio governante revelara até então
serem suas ideias econômicas, que sua definição da República como corporativa não remetia
a uma posição teórica robusta. Como já foi sublinhado por Brandão de Brito, nesse domínio,
Salazar era no essencial um pragmático, defensor de uma doutrina heteróclita, buscando fun-
damentação para as reformas que preconizava nos fatos concretos da realidade nacional.8
Donde quer seus diagnósticos da debilidade estrutural do aparelho produtivo português, que
associava à persistência de um elevado deficit comercial e à “alta remuneração do trabalho”,
quer as soluções de reforma do sistema financeiro ou a defesa da solidez das instituições,
da natureza relativamente secundária da indústria, do papel fundamental da agricultura, da
correção dos canais de distribuição e da unificação do mercado interno, de diferenciação
salarial (por setores e regiões) e negociação generalizada entre patrões e trabalhadores vi-
sassem a atingir um único fim: introduzir na economia, pela intervenção estatal, “seguran-
ça” (defendendo-a tanto dos “excessos do capitalismo quanto do bolchevismo destruidor”),
subordiná-la às finanças e alcançar uma “mediania regular” (a nação deveria bastar-se a si
própria, produzindo o necessário para o consumo) (Brito, 1989: 39-54). Não surgindo tais
ideias ancoradas em um conceito fechado de corporativismo, com uma forte componente
normativa e ideológica.

Expansão e limites do referencial corporativo para o


legislador constituinte de 1933

S e, entre os atores envolvidos no processo constituinte, como antes se sublinhou, foi


consensual conceber a organização do Estado à luz de uma concepção organicista,
cumpre registrar que se observaram discordâncias entre si sobre a amplitude com que se
deveria consagrar essa ideia corporativa, designadamente quanto à sua dimensão econô-
mica e social. Um dos integralistas auscultados, Afonso Lucas, mostrou-se reticente quanto
a escrever-se uma “Constituição corporativista antes do País estar organizado em corpora-
ções”. Pugnou pela constituição de conselhos corporativos junto de cada ministério e, em
particular, de um Conselho Econômico, junto de um Ministério da Economia. Esses conse-
lhos deveriam vir a “dar uma efetiva Assembleia Nacional”. Lamentou que nada impedisse
a existência de “sindicatos marxistas e outras organizações socialmente nocivas”, defen-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 187-196, maio-agosto 2018 187
Paula Borges Santos

dendo que não se aceitassem “corporações ou agremiações que se baseiam no princípio da


luta de classes nem as que tendam à luta civil dos partidos, nem as que dependam de seitas
secretas”. Sua crítica envolvia ainda o que considerava ser a fraca afirmação do “caráter
social do regime”, dado que não se mencionava a “assistência aos mínimos”. Apesar de
ter outro posicionamento ideológico, também José Alberto dos Reis revelou insatisfação por
não se acentuar bastante o “caráter social” do texto constitucional. Discordava de se deixar
subentender a “oposição das classes em economia” e de “certo exagero de intervencionis-
mo de Estado na definição das suas funções econômicas”. Para Mário de Figueiredo, vários
preceitos do Título VIII tinham formulação demasiado vaga. Propunha eliminar referências
à livre concorrência, porque, ainda que fosse “inofensivo”, tinha um “ar individualista con-
trário às tendências do nosso tempo”. Mostrar-se-ia particularmente crítico da forma de
intervenção do Estado na gerência das atividades econômicas particulares, sugerindo que
incidisse na capacidade de fiscalização do Estado. Pretendia ver introduzido o princípio
da expropriação.9 Sem ser possível precisar a data desses comentários, é de admitir que
tenham resultado de consultas feitas sobre as propostas da segunda e quarta edições da
Constituição. Nenhuma das observações foi acolhida pelo legislador.
O principal autor da primeira edição de projeto constitucional, Quirino de Jesus, não
obstante as modificações a seu projeto, defendeu publicamente o sentido das opções fixadas,
evocando, em razão do seu argumento, autores com um pensamento tão diferenciado quanto
Le Play e Sorel (Jesus, 1932: 151-157).
As propostas de Martinho Nobre de Melo sobre o modo como o Estado deveria admi-
nistrar a economia e os recursos naturais do território português não tiveram acolhimento
direto no texto constitucional. Porém, é importante notar a sintonia de sua posição com a
do legislador sobre a relação do Estado com as entidades privadas, podendo admitir-se que
tenha tido aí alguma capacidade de influência (não tanto sobre Salazar — que manifestará,
especialmente em reunião do Conselho Político Nacional e em anos futuros, ter essa convicção
bastante arreigada, resistindo, por exemplo, a pressões de setores católicos para dotar obras
confessionais, educativas e assistencialistas, de apoio financeiro —, mas entre os demais
protagonistas constituintes). Defendia o antigo ministro que, nesse horizonte, a função do
Estado era de “auxílio e tutela”, completando a “iniciativa privada insuficiente, em um esforço
“supletivo” (Araújo, 2007: 202; Melo, 1925: 56). No Conselho Político Nacional, Melo, ao
contrário dos que julgavam precipitado aprovar a Constituição sem estarem organizadas as
corporações, como era o caso de Mário de Figueiredo, também secundou Salazar na determi-
nação de ser oportuno promulgar a Lei Fundamental (Araújo, 2007: 195-196).

188 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 188-196, maio-agosto 2018
Na gênese da Constituição Política de 1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo português

Considerações finais

E m síntese, do que fica exposto, pode-se concluir que houve forte variação nos preceitos
da estrutura econômico-social da Constituição entre o que foi sua primeira versão e a
última. As fontes disponíveis no momento de redação deste artigo não permitem esclarecer
satisfatoriamente como se processou a negociação no interior do núcleo constituinte sobre o
que firmar naquela dimensão da Constituição. Em especial, fica por clarificar o teor do debate
político travado no seio do Conselho de Ministros, sendo, porém, inequívoca sua importância
no processo e na construção de algumas opções (por exemplo, sobre o organismo que deteria
a competência da celebração dos contratos de trabalho, ou sobre a organização do crédito e
de sua distribuição).
A investigação conduzida concorre, no entanto, com o que foi possível averiguar para
matizar a ideia de Salazar como figura do legislador preponderante e sem contraditório. Re-
gistra-se nos contributos que deu para a construção do texto constitucional uma dicotomia,
que se refletia em sua própria condução, primeiro como acadêmico e depois como ministro:
maior firmeza no pensamento sobre as finanças do Estado do que sobre aspectos econômicos.
Não por acaso, as alterações que muito cedo introduziu nas disposições ditas financeiras não
sofreram modificações (a não ser no que envolvia o desenho do Poder Legislativo evocado
nesses preceitos, matéria em que, saliente-se, Salazar não fez nenhuma escolha ou imposição
relevante que seja hoje conhecida, parecendo antes que terá apostado na conciliação de posi-
ções dos constituintes). Destaque-se ainda sua postura comedida quanto a temas caros aos in-
teresses históricos da Igreja Católica e ao pensamento social da doutrina pontifícia, no tocante
à dimensão corporativa a construir, como o envolvimento do Estado na proteção material das
classes trabalhadoras, na promoção da assistência, na defesa da instituição familiar. Não sendo
possível afirmar, por falta de provas empíricas mais substantivas, que foi Salazar quem recusou
a consagração das fórmulas que explicitamente favoreciam ou exaltavam essas dimensões, é,
todavia, factível que não se ocupou de secundá-las e/ou fazer aprová-las a qualquer custo po-
lítico. Esse comportamento ganha coerência à luz do que veio posteriormente a ser sua política
para com a Igreja Católica, em que manifestou o entendimento de que cabia ao Executivo o
papel preponderante na regulação da expressão social do fenômeno religioso (Santos, 2016:
509-510), e é relevante para contestar o argumento, defendido por vários autores, de que a
modelagem da Constituição se fez com soluções sustentadas pelos setores católicos e integra-
listas (Schmitter, 1999: 109, 116, 166, 166 e 169; Rosas, 2012: 18-20).
Sobre os últimos, representados nas posições antes identificadas de Afonso Lucas e Pe-
quito Rebelo, seus contributos em matéria econômica não foram acolhidos pelo legislador.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 189-196, maio-agosto 2018 189
Paula Borges Santos

Pode-se afirmar, mesmo sem se conhecer o argumentário que correspondeu à decisão de não
aproveitar suas propostas, que não interessou ao “gabinete” constituinte seguir uma proposta
de corporativismo favorável a um padrão de elevada relação institucional entre centros de
tomada de decisão política e os interesses organizados (como pressupunham a criação dos
conselhos corporativos ou a instituição do Conselho Econômico). Posição curiosa teria Alfredo
Pimenta, que, apresentando as bases que adotaria para modificar a Constituição de 1911,
não dedicou uma linha à organização econômica e social, admitindo ainda que, do estatuto
constitucional apresentado pelo Ministério de Domingos de Oliveira, apenas aproveitaria o
Título I (Pimenta, 1932: 1 e 6).
Quanto aos católicos, note-se que vários dos constituintes eram sensíveis à cultura
católica (dos integralistas até aos professores Domingos Fezas Vital e José Alberto dos Reis,
este último maçônico), que conheciam com diferentes graus de aprofundamento, e alguns
tinham participação no Centro Católico Português (Mário de Figueiredo e o próprio Salazar),
mas nenhum pode ser considerado defensor ou porta-voz dos interesses específicos da Igreja
Católica naquele contexto. Também o cotejamento da imprensa católica sobre a recepção do
projeto constitucional ao longo do verão de 1932 e, mais tarde, do texto final da Constituição,
em fevereiro de 1933, revela um diminuto entusiasmo em relação à ideia corporativa, em boa
medida decorrente do que se denunciou ser sua artificialidade para a realidade portuguesa
e a alegada “falta de prática de vida associativa” (Guerra, 1932: 1). De tal modo que nem
chegariam à elaboração propostas concretas, úteis à construção da dimensão econômica e
social do texto constitucional. Apenas se registram duas exceções, uma que recaiu na defesa
da associação livre na profissão organizada, e ainda assim feita indiretamente, mais para citar
um projeto de reforma constitucional patrocinado em 1927 por d. Manuel II do que para con-
trapor ao assinalado no projeto constitucional (Sousa, 1932: 1), e outra, que solicitava maior
clareza sobre o que poderia vir a ser a intervenção do Estado no “serviço industrial”, exigindo
garantias que obstassem à nacionalização de indústrias, como a elétrica (Cerqueira, 1932:
6). Mais comuns foram as reações críticas ao intervencionismo estatal que se projetava no
texto constitucional, apoiadas na retórica da doutrina pontifícia sobre o papel do Estado e em
seu dever de cooperação com os privados. Foram ainda alvo de contestação a indefinição de
organização para o “sindicalismo nacional operário”, o reconhecimento de direitos aos filhos
ilegítimos e a opção por formas transitórias para enformar a representação orgânica enquanto
não se constituíssem as corporações (Couceiro, 1932: 8; Sousa, 1933: 1).10
Na evolução do que foi a elaboração da Constituição, em sua estrutura econômico-
-social, observa-se a mitigação de uma ambição inicial que abria caminho à participação

190 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 190-196, maio-agosto 2018
Na gênese da Constituição Política de 1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo português

contínua e estruturada dos interesses organizados nas áreas decisórias do Estado, isto é, na
elaboração de políticas e em sua implementação. As soluções adotadas por fim repousaram
em uma convergência em torno dos seguintes pressupostos, interligados entre si e de difícil
hierarquização: i) superação do princípio individualista e afirmação da prioridade do social;
ii) elevação da economia a interesse público, ou seja, a interesse do Estado; iii) consagra-
ção de uma ampla margem de intervenção do poder estatal na gestão da economia; e iv)
subordinação do interesse coletivo, interpretado e definido pelo Estado, a uma ideia de
finalidade espiritual da nação, também ela interpretada e definida pelo Estado e que andou
de par com a ideia da moral pública. Em boa medida, a noção de igualdade convocada no
articulado da Constituição, em várias de suas disposições — distinta do esquema habitual
do século XIX, que pressupunha que se buscava o tratamento idêntico dos indivíduos entre
a lei ou a justiça —, parece remeter a essa dimensão moralizante ao apontar para a criação
de condições necessárias que a todos beneficiassem. Nesse aspecto, como em outros, as
disposições constitucionais não requeriam uma resposta imediata, mas apontavam para
respostas teóricas que exigiam a renovação da estrutura econômica.
De fato, o caráter vago das normas econômicas da Constituição gerou uma situação que
só poderia vir a alcançar sentido positivo quando o sistema de relações econômicas atuasse
de maneira unitária. Do ponto de vista do sistema econômico que se pretendia criar, a solução
contemplada na Constituição apontava para uma economia mista, fórmula intermédia, entre
a economia liberal e um socialismo de Estado. Contudo, esteve-se longe de estabelecer uma
“economia corporativa” ou uma “organização corporativa da economia”. Por um lado, ga-
rantiu-se a propriedade privada (quer de meios de produção, quer de bens de consumo), mas
condicionada por um “interesse geral” representado pelo Estado. Por outro, as corporações
econômicas não foram dotadas de funções de disciplina da produção e do mercado (como
sugeriram os constituintes defensores da criação dos conselhos econômicos) — e aquelas
funções ficariam nas mãos do próprio Estado —, alcançando apenas funções limitadas no
campo das relações de trabalho (celebração dos contratos coletivos de trabalho).

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 191-196, maio-agosto 2018 191
Paula Borges Santos

Notas

1 Pode-se apresentar a hipótese de o fato de ter cabido a Salazar a gestão do dossiê da elaboração da nova
Constituição ter sido resultado do acaso das circunstâncias políticas. Por outras palavras, a saída de Manuel
Rodrigues Júnior do governo para a Faculdade de Direito de Lisboa, em 11 de abril de 1928, o rosto até
então mais empenhado nesse processo, teria exigido que outro governante se ocupasse de tal matéria. Ora,
o jovem ministro das Finanças, Oliveira Salazar, era, à epoca, figura discreta, com perfil mais acadêmico do
que político (cultivando uma postura não partidária), prestigiado pelo programa de equilíbrio orçamental que
procurava implementar (Rosas, 2012: 88-108). Dados ainda sua ligação com os meios universitários de direito
em Coimbra e Lisboa, sua influência na constituição do Ministério de Domingos de Oliveira e o entrosamento
estratégico que mantinha com o presidente da República, Óscar Carmona, não é estranho que tenha ficado
com o dossiê do processo constituinte, sendo, de certo modo, uma escolha natural para tal missão em um
Executivo dominado por figuras com perfis administrativos e militares.

2 Apesar da ausência de estudos históricos sobre os antecedentes da Carta Constitucional de 1826, sabe-se
que, em 1823, o duque de Palmela foi incumbido por d. João VI de criar uma comissão que deveria se ocupar
de redigir o projeto constitucional. Essa comissão chegou a se reunir; no entanto, desconhece-se a relação
entre o trabalho que terá realizado e o texto outorgado da Carta Constitucional (Canaveira, 1988).

3 Cria-se aqui a proposta “losango” na sequência de uma imagem convocada por Elster, que qualifica os
processos constituintes com montagem fechada, mas complementada por consultas públicas a montante e a
jusante como procedimentos gerais em forma de “ampulheta” (Eslter, 2012: 169).

4 Optou-se por mencionar, neste artigo, as edições do projeto constitucional a partir da numeração romana
que têm os documentos consultados no Arquivo Oliveira Salazar, depositado no Arquivo Nacional da Torre do
Tombo (Lisboa). Outra opção segue António de Araújo, que diz serem 13 as versões do estatuto constitucional. O
autor chega a esse número talvez por considerar autônomas todas as edições, mesmo aquelas que o produtor da
documentação considerou serem alterações dentro de uma edição. Na pasta, com a cota atual PT/TT/AOS/CO/
PC-5, existem as seguintes edições: I, sem data e com alterações manuscritas (esta tem outra cópia impressa que
contém já no corpo do texto aquelas alterações manuscritas); II, sem data e com alterações manuscritas (esta tem
outra cópia impressa com emendas, lendo-se na primeira página que servirá de base às provas distribuídas em
Conselho de Ministros); III, em que se lê “Edição a distribuir aos ministros. Servirá às discussões do CM [Conselho
de Ministros] (jan. 1932)”; IV, em que se lê “IV Edição: inclusão de emendas aprovadas pelo CM e outras feitas
em nova revisão. Para a imprensa em 14-II-32” (essa edição tem outra cópia impressa); V, em que se lê “V Edição:
Provas mandadas da imprensa em 15-II e novamente revistas. Depois de feitas estas emendas tirou-se a VI Ed.
[edição] de 16-II-32”; IV, em que se lê: “16-II-32 (para revisão com o Doutor F. [Fezas] Vital)” (essa edição tem
outra cópia impressa em que se lê: “Ed. de 16-II-32 (com as emendas da revisão com os Drs. F. Vital e Martinho
Nobre de Melo)”); VII, em que se lê: “Para o Conselho de Ministros de 5-III-1932. Emendas com o Dr. F. Vital;
VIII, em que se lê: “Ed. feitas as emendas da 7a Ed. presente ao Conselho de Ministros de 5-III”. Finalmente,
a IX edição, em que se lê: “Emendada e revista com o Dr. Fezas Vital de 14 a 20 de fevereiro de 1933. Texto
enviado à Imprensa Nacional”. Essa nona edição tem mais quatro versões diferentes. A segunda, em que se lê:
“II Revisão de 14 a 20/II: envolve apenas a II Parte da Constituição”. A terceira, em que se lê: “III Revisão de 14
a 20/II: envolve apenas a I Parte da Constituição”. A quarta, em que se lê: “IV Revisão de 14 a 20/II: envolve
toda a Constituição”. Por último, a quinta, em que se lê: “V Emendado na revisão do Conselho de Ministros de
22-II-1933: envolve toda a Constituição”.

192 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 192-196, maio-agosto 2018
Na gênese da Constituição Política de 1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo português

5 PT/TT/AOS/CO/PC-5: “Constituição” [manuscrito de Salazar], datado de 29 de dezembro de 1931.


6 Para maior desenvolvimento da ideia de que a ordem constitucional portuguesa firmada em 1933 acompa-
nhou alguns modelos constitucionais gerados no pós-Primeira Guerra Mundial em outros Estados europeus
(Alemanha, Áustria, Polônia, Estados Bálticos, França), consulte-se: Santos (2015: 77-82).

7 Essa interpretação afasta-se da proposta de Hermínio Martins, que, na literatura existente sobre o período
de constitucionalização do regime autoritário português, foi exceção ao avançar com uma leitura crítica so-
bre as diferenças na formulação desse artigo da Constituição de 1933 em relação ao projeto constitucional
submetido à opinião pública em 1932. O autor explicou a fórmula final do artigo 5o pela associação do
ideário corporativista com o autoritarismo de direita e o fascismo. Dando como exemplos da “espécie política”
democrático-corporativa a Constituição brasileira de 1934 (sustentando que continuou a vigorar no sistema
instalado em 1946, na ditadura que se lhe seguiu entre 1964-1985, e novamente na democracia depois de
1985) e a Constituição da IV República Francesa (1946), Martins advogou o “aborto” dessa possibilidade
para o caso português. Notando, sem argumentar razões, que Salazar nunca aceitaria tal combinação (dedu-
z-se que imputava as posições do governante a um pensamento autoritário tout court), salientou que “não
houve um concurso de forças político-militares para impor uma aproximação a este regime [democrático e
corporativo]” (Martins, 2018: 180-181).

8 A essa posição não era alheia a formação que tivera na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,
onde, no ensino da cadeira de economia, desde os anos 1890, apesar de serem estudadas as doutrinas
individualistas e socialistas, havia sido cultivado o interesse pela doutrina de List, que subordinava a vida
econômica aos objetivos político-nacionais, e pela escola histórica alemã, que defendia que o progresso da
economia só poderia ocorrer por via do estudo das instituições de cada povo em particular. Em sua passagem
por aquela faculdade, Salazar acompanhou ainda a aproximação da escola intervencionista de Wagner e
Schmoller, ensinada sobretudo por Marnoco e Sousa, que sustentava que ao Estado cabia promover o desen-
volvimento econômico, intelectual e moral da sociedade, sem indiferença perante a concorrência social, ainda
que sem exercer ingerência absorvente (Sousa, 1907: 12-19).

9 PT/TT/AOS/CO/PC-5B: “Correspondência sobre trabalhos preparatórios da Constituição Política [entre Sa-


lazar e Afonso Lucas, Mário de Figueiredo e José Alberto dos Reis]”, [1932].

10 Durante o período de debate constitucional, a preocupação da hierarquia eclesiástica (apoiada pela


Santa Sé) e de algumas personalidades do laicado foi a de tentar modificar o que ficaria inscrito no estatuto
constitucional sobre o regime das relações entre o Estado e a Igreja Católica. Católicos com algum tipo de par-
ticipação política preocuparam-se menos com o modelo de Estado a construir e mais com o protesto sobre o
estatuto público da Igreja Católica. Publicamente, apenas defenderam propostas concretas relativas à revisão
de vários aspectos da Lei de Separação (ensino privado, regime do casamento e do divórcio, bens eclesiásticos,
personalidade jurídica da própria Igreja Católica). Meses depois do plebiscito à Constituição, houve círculos
católicos que tentaram descortinar qual o espaço de atuação que podiam ter nos organismos corporativos,
sobretudo nos sindicatos. Em um segundo momento, após constatação de que o regime não permitia a
liberdade sindical e de que a cristianização dos organismos corporativos não seria facilmente tolerada pelo
Executivo, denunciaram o afastamento em relação ao modelo de um corporativismo de associação (Arquivo
Histórico do Patriarcado de Lisboa. Arquivo Cardeal Cerejeira (AHPL/ACC)/E/02/01/329 e 330).

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 193-196, maio-agosto 2018 193
Paula Borges Santos

Fontes primárias

A FUTURA Constituição. Novidades, p. 1, 24 fev. 1933.


ARQUIVO HISTÓRICO DO PATRIARCADO DE LISBOA. Arquivo Cardeal Cerejeira. Cotas atuais: PT/AHPL/AC-
C/E/02/01/329 e 330: cartas do bispo da Guarda dirigidas ao cardeal Cerejeira, em 9 e 14 de outubro de
1933; AHPL/ACC/R/01/03/007 e 008: questionário apresentado ao sr. subsecretário das Corporações [datado
de outubro de 1933, Lisboa, e assinado por Pe Boaventura Alves de Almeida]; [Memorando]: Resumo: A Igreja
em face da organização corporativa do Estado Português [7 de novembro de 1933, Lisboa, do Pe Boaventura
Alves de Almeida].
ARQUIVO NACIONAL TORRE DO TOMBO. Arquivo Oliveira Salazar. Correspondência Oficial, Correspondência
relativa aos trabalhos preparatórios da Constituição Política. Cotas atuais: PT/TT/AOS/CO/PC-5; PT/TT/AOS/
CO/PC-5A; PT/TT/AOS/CO/PC-5B.
CERQUEIRA, Belfort. Constituição. Razões de geral proveito. A Voz, p. 1 e 6, 24 jun. 1932.
COUCEIRO, Henrique Paiva. O projeto de Constituição. A Voz, p. 1 e 8, 19 jun. 1932.
GUERRA, Joaquim Mendes. À margem da nova Constituição. Para onde vamos? III. A Voz, p. 1, 26 jun. 1932.
JESUS, Quirino Avelino de. Nacionalismo português. Porto: Empresa Industrial Gráfica, 1932.
MELO, Martinho Nobre de. Para além da revolução. In: Ensaios de filosofia política: estudos morais e sociais.
Crítica e doutrina. Lisboa: Livraria Ferin, 1925.
PIMENTA, Alfredo. O meu projeto de Constituição. A Voz, p. 1 e 6, 23 jun. 1932.
SALAZAR, António de Oliveira. Discursos 1928-1934. Coimbra: Coimbra, 1935.
SOUSA, Fernando de. Lições de ontem: episódio que importa relembrar. A Voz, p. 1, 30 jul. 1932.
______. O texto da nova Constituição. A Voz, p. 1, 24 fev. 1933.

Referências bibliográficas

ARAÚJO, António de. A lei de Salazar: estudos sobre a Constituição Política de 1933. Coimbra: Tenacitas,
2007.
BRITO, José Maria Brandão de. Sobre as ideias económicas de Salazar. In: SILVA, A. E. Duarte et al. Salazar e o
salazarismo. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1989, p. 35-58.
CAENEGEM, R. G. Van. Uma introdução histórica ao direito constitucional ocidental. Lisboa: Fundação Ca-
louste Gulbenkian, 2009.
CANALES, M. Garcia. La teoría de la representación en la España del siglo XX. Murcia: Universidad de Mur-
cia/Publicaciones del Departamento de Derecho Político, 1977.
CANAVEIRA, Manuel Filipe Cruz. Liberais moderados e constitucionalismo moderado (1814-1852). Lisboa:
I.N.I.C., 1988.

194 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 194-196, maio-agosto 2018
Na gênese da Constituição Política de 1933: o ideário corporativo e a estrutura
econômico-social do autoritarismo português

CHORÃO, Luís Bigotte. A crise da república e da ditadura militar. Lisboa: Sextante, 2009.
CUEVAS, Pedro Carlos González. El nacionalismo autoritario (1898-1936). In: MOYA, A. Morales; AIZPURÚA,
J. P. Fusi; GUERREIRO, A. de las. Historia de la nación y del nacionalismo español. Barcelona: Fundación
Ortega-Marañón/Galaxia Gutenberg/Círculo de Lectores, 2013.
ELSTER, Jon. Forces and mechanisms in the constitution-making process. Duke Law Journal, v. 45, n. 2, p.
364-396, nov. 1995.
______. The optimal design of a Constituent Assembly. In: LANDEMORE, Hélène; ELSTER, Jon (Ed.). Collective
Wisdom: principles and mechanisms. Nova York: Cambridge University Press, 2012, p. 148-172.
GARRIDO, Álvaro. Queremos uma economia nova! Estado Novo e corporativismo. Lisboa: Temas e Debates/
Círculo de Leitores, 2016.
LA CONSTITUCIÓN de Weimar. La Constitución alemana de 11 de agosto de 1919. Madri: Tecnos, 2010.
MARTINS, Hermínio. Reflexões sobre as mudanças de regime em Portugal no século XX: um estudo transcro-
nológico e transnacional. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2018.
MESQUITA, Paulo Dá. Manuel Rodrigues Júnior e o perfil do processo penal português no século XX. Figuras
do Judiciário: séculos XIX-XX. Coimbra: Almedina, 2014.
MOREIRA, Vital. Direito corporativo: tópicos das lições do ano letivo de 1971-72 na Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra. Coimbra: Unitas/Cooperativa Académica de Consumo, 1973.
MORTATI, Costantino. Una valoración de conjunto sobre la experiencia de la Constitución de Weimar. La
Constitución de Weimar: La Constitución alemana de 11 de agosto de 1919. Madri: Editorial Tecnos, 2010.
ROSANVALLON, Pierre. El modelo político francés: la sociedad civil contra el jacobinismo, de 1789 hasta
nuestros días. Argentina: Siglo XXI, 2007 [2004].
ROSAS, Fernando. Pensamento e ação política: Portugal século XX (1890-1976). Ensaio histórico. Lisboa:
Notícias, 2004.
______. Salazar e o poder: a arte de saber durar. Lisboa: Tinta da China, 2012.
SANTOS, Paula Borges. A segunda separação: a política religiosa do Estado Novo (1933-1974). Coimbra:
Edições Almedina, 2016.
______. O modelo político do Estado autoritário português: a ideia corporativa na constitucionalização do
regime (1931-1933). Espacio, Tiempo y Forma, n. 27, p. 59-84, 2015.
SCHMITTER, Philippe C. O corporativismo e a política pública em Portugal durante o regime autoritário. Por-
tugal: do autoritarismo à democracia. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 1999.
SOUSA, Marnoco; REIS, José Alberto dos. A Faculdade de Direito e o seu ensino. Coimbra: F. França Amado,
1907.
VITAL, Domingos Fezas. Curso de direito corporativo. Lisboa: [s.n.], 1940.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 195-196, maio-agosto 2018 195
Artigo

A institucionalização do “social” no
Estado Novo português: previdência
corporativa e seguros sociais
voluntários
The institucionalization of the “social” in the Portuguese New
State: Corporatist welfare and volunteer social insurances
La institucionalización del “social” en lo Estado Nuevo
portugués: previdência corporativa y seguros sociales voluntarios

Álvaro GarridoI*

http://dx.doi.org/10.1590/S2178-14942018000200005

I
Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC) – Coimbra, Portugal.

* Atualmente é docente e coordenador do grupo de História da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra


(FEUC), onde leciona desde 1995. Investigador do CEIS20. (alvfrgarrido@gmail.com)

Artigo recebido em 1 de fevereiro de 2018 e aprovado para publicação em 19 de junho de 2018.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 197-218, maio-agosto 2018 197
Álvaro Garrido

Resumo
A retórica social dos fascismos contrasta com as modestas realizações dos sistemas de seguro social que implemen-
taram. Partindo de uma problematização sobre a natureza da política social dos fascismos, este artigo analisa a po-
lítica social do Estado Novo português (1933-1974), uma ditadura de tipo fascista. A abordagem usada assenta-se
em um eixo interpretativo pouco comum na historiografia: as relações históricas, tensas e hostis, entre o sistema de
previdência corporativa do Estado Novo e a tradição voluntária da economia social, fosse ela de raiz socialista ou
liberal. Destacam-se as tensões abertas entre as instituições corporativas (sindicatos nacionais e outras) e as orga-
nizações mutualistas do trabalho. O artigo analisa particularmente os dispositivos de previdência e assistência do
fascismo português entre os anos 1930 e o fim da Segunda Guerra Mundial. Um balanço crítico do sistema apoiado
nos debates coevos conclui o texto.

Palavras-chave: Seguros sociais; Previdência; Fascismos; Estado Novo; Corporativismo, Portugal.

Abstract
The social rhetoric of fascist contrasts with the modest achievements of the social security systems they have im-
plemented. Starting from a problematization of the political and social nature of the fascisms, this article analyses
the social policy of the Portuguese New State (1933-1974), a dictatorial regime with some fascist characteristics.
Its approach rests on an interpretative axis which is uncommon to historiography: the strained and hostile historical
relations between the corporatist system of welfare built up by the New State and the volunteer tradition of the
social economy, both coming either from a socialist tradition or from a liberal one. It highlights the tensions between
corporatist institutions (national trade unions and others) and the labor mutualistic institutions. The article examines
welfare and social assistance mechanisms of the Portuguese fascism between the 1930s and the end of World War
II. The text concludes with a critical review of the corporatist system, based on contemporary debates.

Keywords: Social insurances; Welfare; fascism; New State, Corporatism; Portugal.

Resumen
La retórica social de los fascismos contrasta con las modestas realizaciones de los sistemas de seguridad social que
estos han implementado. Partiendo desde una problematización sobre la naturaleza política y social de los fascis-
mos, este artículo analiza la política social del Estado Nuevo portugués (1933-1974), una dictadura de tipo fascista.
El abordaje utilizado asienta en un eje interpretativo poco común en la historiografía: las relaciones históricas, tensas
y hostiles, entre el sistema de previdencia corporativa del Estado Nuevo y la tradición voluntaria de la economía
social. Se destacan las tensiones abiertas entre las instituciones corporativas (sindicatos nacionales y otras) y orga-
nizaciones mutualistas de trabajo. El artículo analiza particularmente los dispositivos de previdencia y asistencia del
fascismo portugués entre nos años 1930 y el fin de la II Guerra Mundial. El texto concluye con un balance crítico del
sistema corporativo, basado en los debates contemporáneos.

Palabras clave: Seguros sociales; Bienestar; Fascismos; Estado Nuevo; Corporativismo; Portugal.

198 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 198-218, maio-agosto 2018
A institucionalização do “social” no Estado Novo português:
previdência corporativa e seguros sociais voluntários

A disputa do social no contexto dos fascismos

A retórica do “social” ocupou, obstinadamente, o discurso político dos fascismos. A in-


sinuação de um “verdadeiro socialismo”, capaz de inserir as classes trabalhadoras na
nação e de nacionalizar o trabalho, foi uma expressão comum na demagogia socialista dos
fascismos. Em seus fins instrumentais, a política social desses regimes autoritários e totalitá-
rios — fascismos em sentido amplo, como os designou Pierre Milza (2001) — articulou-se
com a ideia de uma “revolução social” capaz de enquadrar as massas, governar os interesses
e conter o movimento operário (Mosse, 1999: 11-36; Rosas, 2012: 25-46).
Apesar das diferenças dos regimes que fizeram parte da vaga de “fascismo genérico”
que varreu a Europa entre as duas guerras mundiais (Pinto e Martinho, 2008) — descontando
a persistência das ditaduras ibéricas de Franco e Salazar, que só caíram nos anos 1970 —,
todos recuaram em relação à herança social dos Estados-providência demoliberais.
A fim de garantir a ordem pública e uma paz social compulsiva, os fascismos impuseram
políticas sociais de tipo assistencialista (Giorgi, 2014: 93-108). Essa tendência foi ainda mais
forte nas ditaduras periféricas europeias, nas quais o pensamento social católico impregnou
as instituições corporativistas e os aparelhos autoritários de “nacionalização do trabalho”, em
uma clara combinação de ideias fascistas e social-cristãs (Pinto e Martinho, 2008: 40-42). De
modo a enquadrar o trabalho e os próprios lazeres — recorde-se o papel da Federação Nacio-
nal para a Alegria no Trabalho, criada em Portugal, em 1935, decalcada da Opera Nazionale
Dopo Lavoro, do fascismo italiano, e da Kraft durche Freude, nazi —, essas políticas sociais
hostilizaram quer o seguro social obrigatório, quer o mutualismo associativo, dados a inspira-
ção socialista do primeiro e o enraizamento popular e obreirista do segundo. Confirmando a
evidência de que “todos os fascismos foram corporativistas” (Manoilesco, 1934), os regimes
autoritários e totalitários que marcaram a Europa entre as duas guerras mundiais assumiram
uma contrarrevolução social que implicou liquidar o sindicalismo de classe e enquadrar a
economia no Estado, ou, pelo menos, alguns setores de atividade tidos por fundamentais.
A inibição político-administrativa do mutualismo livre (de base associativa e voluntária) e
do cooperativismo, bem como a vigilância repressiva de ambos, foi propósito complementar
da “nacionalização do trabalho” e da desproletarização das sociabilidades laborais (Garrido,
2016a: 26-43).
Antes de a ditadura de Salazar ter erguido suas estruturas vitais, a partir de 1933, a cons-
trução histórica de um Estado-providência desenhou-se no confronto entre diferentes formas
de acesso à justiça social ou uma proteção social mínima: i) o movimento mutualista volun-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 199-218, maio-agosto 2018 199
Álvaro Garrido

tário resultante da associação de artesãos e operários em associações de socorros mútuos e


organizações afins; ii) o paternalismo patronal de iniciativa católica ou de raiz filantrópica; e
iii) a via legal e pública do seguro obrigatório, modelo que a República instituíra em 1919 e
que os próprios republicanos começaram a demolir anos depois (Pereira, 1999: 45-61).
Até à Guerra de 1914-1918, em diversos países a mutualidade obrigatória — siste-
ma de seguros sociais definido pelo Estado segundo uma lógica previdente, mas ainda as-
sistencialista — constituíra a vanguarda das políticas sociais. Na conjugação dos seguros
obrigatórios com o seguro comercial e com a ação previdente das mutualidades, encontrara
a economia social sua expressão prática mais comum (Garrido, 2016a: 67-111; Singer, 2018:
7-16). Apesar das tensões entre o campo associativo voluntário e a proteção social garantida
por leis públicas, tratava-se de uma economia social cada vez mais instituída e afeita ao papel
do Estado como regulador das relações sociais. Salvos a especificidade e o sentido de autono-
mia do movimento cooperativo, essa tendência de estatização da economia social foi evidente
em diversas democracias liberais europeias, em especial nas primeiras décadas do século. Em
Portugal, as ideias e organizações mutualistas e cooperativas de natureza voluntária fizeram
seu caminho, mas esbarraram na ineficiência das instituições republicanas e na sanha antias-
sociativa da ditadura que se lhe seguiu.
Em julho de 1912, a Inglaterra de Lloyd George (1863-1945) publicara uma Lei do Segu-
ro Obrigatório, que incluía a cobertura dos riscos de doença e por falta de trabalho para ope-
rários fabris e empregados de comércio. A iniciativa do deputado britânico e futuro primeiro-
-ministro, um liberal-socialista vindo da advocacia, influenciou muito o reformismo legislativo
da República portuguesa em matéria de acidentes de trabalho. Na França, apesar da pujança
das mutualidades associativas que haviam se federado na prestigiada Mutualité, notou-se,
também, uma crescente aceitação do princípio do seguro obrigatório. Na Alemanha, há muito
havia seguros sociais imperativos contra os riscos de invalidez, velhice e acidentes de trabalho
desde os anos 1880.
No começo do século XX, em diversos países, além das teorias da administração racional
do Estado e do intervencionismo econômico e social que tanto se reforçou durante a Grande
Guerra, já era nítido o predomínio das ideias socializantes e solidaristas sobre o individualismo
jurídico da escola liberal e diante das correntes tradicionalistas que se ocupavam do “social”
(Castel, 2012: 455-477). Respectivamente, essas acepções da “questão social” entendiam
as relações de trabalho como matéria regulável por contratos entre indivíduos, ou a partir da
iniciativa paternal dos patrões.
A perspectiva liberal da sociedade não admitia que os efeitos sociais da pobreza das clas-
ses laboriosas fossem de algum modo prevenidos ou compensados. Nem tampouco reconhe-

200 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 200-218, maio-agosto 2018
A institucionalização do “social” no Estado Novo português:
previdência corporativa e seguros sociais voluntários

cia os riscos associados às crises cíclicas do sistema capitalista. Em todas as suas formas, em
especial nos acidentes de trabalho, o seguro social trouxe uma visão de conjunto da sociedade
assente no princípio da solidariedade coletiva.
O seguro social afirmou-se como uma novidade progressista, dado que implicava a cons-
trução jurídica dos deveres de proteção social que a própria sociedade, coletivamente, deveria
assumir em relação a cada indivíduo (Donzelot, 2001: 86-114). O corporativismo antidemocráti-
co oporia a essa visão socialista e social-cristã o princípio discricionário do “interesse nacional”.
Apresentando-se como doutrina social de “terceira via”, os corporativistas instituíram uma pro-
teção social paternalista e caritativa, subordinada a fins instrumentais de “ordem pública” e “paz
social”. Esconjurar a ameaça de dissolução social que pesava sobre as sociedades modernas
implicava inserir o “social” em uma ordem moral autoritária e refazer a nação dentro do Estado.

Estado Novo, corporativismo e política social

O Estado Novo português colheu no corporativismo o miolo ideológico e o aparato ins-


trumental de sua política social. Tratando-se de uma ditadura nacional de tipo fascista,
não fugiu aos intentos de liquidação da liberdade associativa do trabalho e de enquadramento
das classes e grupos socioprofissionais por meio de organizações inseridas no regime. Fê-lo
também por meio de obras sociais assistencialistas que, em parte, confiou a instituições de
natureza particular ou confessional. Nem o apego do ditador a uma versão acadêmica e so-
cializante da economia social2 — uma formulação alternativa à economia política liberal que
permitiria fazer do Estado um administrador da vida econômica e social — valeu ao mutualis-
mo associativo e ao cooperativismo qualquer reconhecimento ou incentivo.
Estritamente ligada à doutrina corporativista e a seus propósitos de inibição da liberdade
associativa e dos movimentos sociais do trabalho, a política social do salazarismo implicou
uma noção muito própria e deveras limitativa da economia social. Em rigor, condenou o mu-
tualismo associativo e o cooperativismo socializante a uma longa noite.
Como advertiu Pedro Teotónio Pereira,3 dirigindo-se a Salazar e aos representantes dos
trabalhadores presentes na grande plateia do Teatro S. Carlos, a 5 de junho de 1933, “nada de
útil podemos aproveitar do funcionamento das grandes máquinas estrangeiras da previdência
social; não são para as nossas posses nem para os nossos costumes” (Pereira, 1937: 57).
O artífice da organização corporativa e subsecretário de Estado das Corporações e Pre-
vidência deixou claro que a política do Estado Novo jamais faria cedências a um reformismo
social de sentido democrático:

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 201-218, maio-agosto 2018 201
Álvaro Garrido

As democracias parlamentares, que para cortejarem e seduzirem o proletariado se meteram


nas aventuras dos seguros sociais através de organismos burocráticos, vêm demonstrando pelo
absurdo dos próprios resultados a inviabilidade do método estatista e socializante. (Pereira,
1937: 57)

Dada a natureza autoritária do regime firmado na Constituição de 1933 — em que o


Estado Novo se definia a si próprio como “república unitária e corporativa” —, e perante
a vontade política de reprimir as liberdades cívicas e a tradição do mutualismo livre de raiz
operária e pequeno-burguesa, a herança social da República foi rasurada com violência. Desse
passado reformista recente, cuja obra principal residira nos seguros sociais obrigatórios e na
existência fugaz do Ministério do Trabalho, ficara um princípio de Estado-providência secular
que a ditadura de Salazar insistiu em diminuir.
A fim de erguer uma política social corporativista — antiassociativa e antidemocrática
por definição, ainda que conjugando princípios do catolicismo social autoritário e do fascismo
italiano —, havia de destruir, zelosamente, a herança socializante republicana. Para legitimar
a política social do Estado Novo, houve de denegrir, por meio da propaganda, um reformismo
social que, apesar de suas inconsistências, conseguira alguma penetração social. Em parte,
graças à conjugação dos seguros sociais obrigatórios com o movimento mutualista.
Em maio de 1928, uma das primeiras medidas do novo ministro das Finanças, Oliveira
Salazar, consistiu em suspender a aplicação de todas as leis sobre seguros sociais de 1919. A
sanha antirrepublicana e antissocialista se beneficiava do ambiente místico criado em torno
da propaganda das “finanças sãs” e da coligação das direitas que depressa se formara em
torno da “nova ordem” (Rosas, 2012: 74-182).
A pressa de Salazar em intervir no domínio dos seguros sociais tinha razões ideológicas
e outras, de sentido pragmático. O governo da ditadura considerava as leis republicanas “es-
tatizantes”, quase socialistas. Quer porque entendia que sua aplicação — a prática concreta
dos seguros, em especial na área dos acidentes de trabalho — levantava conflito de interes-
ses com algumas companhias de seguros, nomeadamente com a Fidelidade, que pertencia
à família Teotónio Pereira, na medida em que lhes subtraía prêmios, quer porque os seguros
obrigatórios seriam contrários a um verdadeiro sistema corporativo.
O protagonismo de Pedro Teotónio Pereira, um jovem matemático fascista e especiali-
zado em cálculo atuarial, na construção política da organização corporativa e do modelo de
previdência do Estado Novo ficara traçado em 1928, quando Salazar o chamou para auxiliá-lo
na revisão dos estatutos das companhias seguradoras. Até 1933, manteve-se ligado à Com-
panhia Fidelidade, saltando dos seguros privados para as Corporações e Previdência, em que
se manteve até 1936, trabalhando rente ao governo, muito próximo de Salazar.

202 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 202-218, maio-agosto 2018
A institucionalização do “social” no Estado Novo português:
previdência corporativa e seguros sociais voluntários

A retórica antissocial da ditadura, na verdade mais antissocialista do que “antissocial”,


seria desmentida quando o Estado Novo português tratou de impor e dar estatuto legal a uma
vasta organização corporativa da economia e das profissões. A dimensão social do sistema
corporativo (Patriarca, 1995, v. 1: 153-187), cuja primeira finalidade consistia em reprimir a
luta de classes, precisou, porém, das mutualidades e da ação complementar das misericórdias
no domínio da assistência social.
A propósito dessa relação hostil, mas cheia de expressões ambíguas, que o Estado cor-
porativo manteve com o movimento mutualista livre, atente-se para o que disse e escreveu,
outra vez, Pedro Teotónio Pereira:

Os nossos problemas de previdência social não poderão ser resolvidos por sugestões de escola
nem por imitação do alheio. Mas objectivamente, procurando integrá-los no movimento corpo-
rativo que se vai iniciar, aproveitando e animando, por outro lado, tudo o que de bom exista
— e alguma coisa é — nas nossas iniciativas de carácter privado; no nosso mutualismo popular,
por vezes tão interessante. (Pereira, 1937: 59)

A forma lacônica como o responsável das corporações invocava as mutualidades podia


criar-lhes algumas expectativas de coabitação com a “nova ordem”, mas não iludia a intenção
de condená-las ao desaparecimento ou, quando muito, a uma expressão residual. Segundo
a doutrina e os regulamentos do sistema corporativo, a previdência social e os organismos
do trabalho (os sindicatos nacionais e as Casas do Povo e dos Pescadores, “organismos de
cooperação social” subtraídos à lógica sindical) deveriam ocupar o espaço do mutualismo livre
e das associações de classe (Lucena, 2001: 245-250; Garrido, 2012: 7-29). O caso dos pesca-
dores foi dos mais invocados pela propaganda do Estado Novo, dado que nessas comunidades
de trabalho eram muito comuns as irmandades e os compromissos marítimos, organizações
solidárias (laicas e religiosas) que o novo regime asseverava substituir por organizações igual-
mente harmoniosas e fiéis a um ideal de cooperação cristã.
A crer no discurso governamental, as instituições de enquadramento do trabalho e a
organização corporativa em seu todo assumiriam fins de “equilíbrio social” e de “elevação
moral dos trabalhadores”. Teriam a vantagem de opor à fragilidade e dispersão das mutuali-
dades organismos corporativos de pertença obrigatória. As novas instituições sociais haviam
de expressar a virtuosa conjugação de uma “representação profissional orgânica” com uma
“previdência corporativa” contrária, quer ao individualismo, quer ao sectarismo de classe.
Em uma cartilha editada pelo Secretariado de Propaganda Nacional, em 1944, António
Júlio de Castro Fernandes (1903-1975) aclarava os fins do sistema corporativo, a “ordem
nova” que entendia de tipo fascista: “O corporativismo isolou o fenómeno sindical do so-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 203-218, maio-agosto 2018 203
Álvaro Garrido

cialismo, partindo da ideia de que o trabalho é um dever da vida, uma atitude humana, uma
capacidade do homem.” Sem hesitações, prosseguia o antigo fundador do movimento nacio-
nal-sindicalista que, em 1933, aderira ao Estado Novo:

Ao sindicalismo de sector, monopolista e internacionalista, opôs o corporativismo um sindicalis-


mo nacional de solidariedade entre os diversos elementos da produção. Ao princípio do vírus da
luta opôs o princípio da vacina da solidariedade. […] O sindicalismo nacional-corporativo é o
sindicalismo baseado no complexo de factores que formam a vida — é o sindicalismo realista.
(Fernandes, 1944: 52-53)

Essas exortações eram tão dogmáticas quanto instrumentais. Aos sindicatos nacionais
criados a partir de setembro de 1933 seria atribuída uma natureza associativa apenas for-
mal, declarada, aliás, no Estatuto do Trabalho Nacional e sugerida na própria Constituição,
concretamente no Capítulo III do Estatuto do Trabalho Nacional (“Do trabalho”) e no artigo
41 da Constituição de 1933. Afirmavam-se certezas para excluir alternativas. A engenhosa
construção do sistema corporativo, talhada para instituir a “paz social” e equilibrar interesses,
supunha dispensar e combater outras formas de associação dos trabalhadores, por mais enrai-
zadas que se soubessem, a exemplo do mutualismo laico e religioso. Dadas sua implantação
e popularidade no mundo do trabalho, as associações de socorros mútuos mereceram as
maiores atenções de enquadramento e repressão.

Organização corporativa e previdência social

A o instituir uma organização corporativa cuja base era habitada, separadamente, por
“organismos primários” do capital e do trabalho — compondo um primeiro nível de
sindicalização assimétrica das relações sociais —, o Estado concedia a esses organismos o
monopólio da representação da população ativa. Excluído da pirâmide corporativa ficava o
movimento mutualista, em sua maioria composto por pequenas associações de socorros mú-
tuos ligadas às sociabilidades laborais, e ficavam as associações de classe, cujo reconhecimen-
to legal e regulamentos vinham de 1891. Tal ostracismo não significa que o Estado não tenha
reservado às mutualidades algumas funções sociais complementares do modesto papel da
previdência corporativa. Quando assim foi, por lei ou por meio de pressões político-adminis-
trativas, o Estado agiu por cooptação.
Cautelar e violenta, essa dupla discriminação do associativismo livre, de tradição mutua-
lista e cooperativa, por um lado, e de natureza liberal, por outro, atingiu sobretudo o mundo
do trabalho. A partir de então, oficiosamente, só houve “trabalho nacional” e “sindicatos

204 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 204-218, maio-agosto 2018
A institucionalização do “social” no Estado Novo português:
previdência corporativa e seguros sociais voluntários

patrióticos”. Arquétipos de uma nova ordem laboral, os sindicatos nacionais foram induzidos
a colaborar com o Estado segundo normas antidemocráticas, de forma a estabelecer relações
sociais fortemente instituídas. A obrigatoriedade de homologação dos dirigentes sindicais, a
aprovação prévia e governamental dos Estatutos e a interferência repressiva em seus órgãos
legítimos foram práticas comuns aos sindicatos e associações de socorros mútuos.
Nesse como em outros casos, a eficácia repressiva do Estado recomendou o mínimo de
originalidade. As vivas realidades do mutualismo associativo e do próprio cooperativismo (de
produção e de consumo) foram levadas na torrente e capturadas pela institucionalização cor-
porativa. Só mais tarde o “Estado corporativo” nelas se apoiou para cumprir algumas funções
de proteção social e para compensar suas próprias fraquezas.
Nos anos 1930 e 1940, os inúmeros discursos que traduzem a política social do “Estado
corporativo” não escondem a intenção de desvincular o movimento mutualista de quaisquer
compromissos com a vida sindical. Daí que as associações de socorros mútuos, as mais obrei-
ristas das mutualidades, tenham merecido especiais atenções.
A insistente recriminação do modelo de seguros sociais obrigatórios de 1919 era a forma
mais simples e comum de invocar a “balbúrdia republicana” e de atingir a credibilidade de
suas instituições, denunciando a falácia das ideias de “progresso social” geradas no século
anterior. Por aqui começavam, invariavelmente, os preâmbulos das leis e os próprios relatórios
do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência (INTP).
Foram muitas as páginas de propaganda empenhadas em persuadir o trabalho e o ca-
pital, as elites econômicas e o burocrata sobre as vantagens da previdência corporativa como
pilar da “nova ordem”. À utopia da política social republicana opunham-se as realizações
progressivas e contínuas do Estado Novo.
O ataque de Pedro Teotónio Pereira ao sistema de seguros sociais de 1919 fustigava a
falta de bases técnicas de um sistema demasiado ambicioso e pouco efetivo na cobertura dos
riscos de doença, invalidez, velhice e acidentes de trabalho. Lembrando o contexto político
em que os seguros sociais obrigatórios haviam surgido em Portugal, o responsável das Cor-
porações e Previdência volta a censurar o reformismo social republicano, manifestando sua
preferência pela contrarrevolução social de tipo fascista que, em boa hora, chegara a Portugal:

Legislou-se fartamente nesse momento e através de uma espécie de frente popular, no género
dessas frentes antifascistas que andam agora muito em moda nos países onde as esquerdas
burguesas deram as mãos aos comunistas. No antigo Instituto de Seguros Sociais Obrigatórios
encontrei toneladas e toneladas de impressos para a execução de tais reformas, que afinal,
nunca chegaram a ser realizadas. (Pereira, 1937: 173)

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 205-218, maio-agosto 2018 205
Álvaro Garrido

No novo sistema de ordenamento das relações sociais e da previdência, o trabalho e


o capital estariam plenamente integrados no Estado. Prometiam-se uma economia nacional
corporativa e uma estrutura social assente em harmonias ancestrais, sabiamente interpretadas
por um Estado que instituíra a nação. Os membros dos organismos corporativos deveriam
contribuir para o financiamento de um sistema integrado e obrigatório de seguros sociais, a
previdência corporativa.
Na referida palestra que fez no São Carlos, em 1933, Pedro Teotónio Pereira explicou de
uma vez o que deveria ser a “nova previdência”:

Desligado da ideia duma caixa burocrática, complacente e passiva, deixando de tratar com o
Estado e com os dinheiros públicos — fáceis tentadores de abusos e de apetites ruins — o traba-
lhador passará a olhar a organização de previdência do seu agregado profissional como uma obra
sua, a que tem ligados o seu sacrifício, a sua responsabilidade e a sua esperança […]. Revestindo
sempre que seja possível carácter nitidamente profissional ou orientadas apenas no espírito das
associações mutualistas — de que possuímos já alguns exemplos do mais alto valor — as novas
instituições de previdência social vão tornar-se realidades fecundas. (Pereira, 1937: 59-60)

Não menos ambíguas eram as ideias anunciadas a propósito do novo modelo de seguros
sociais. O subsecretário de Estado das Corporações e Previdência Social prometia uma “remo-
delação completa” da legislação sobre seguros de acidentes de trabalho, que em boa medida
foi concretizada. Garantia que o auxílio na doença e na invalidez às classes menos favorecidas
seria “um dos primeiros objectivos da nossa acção social”. Advertia, porém, que esse trabalho
seria feito progressivamente, ou caso a caso. Só depois dos seguros sociais elementares viria
o seguro de reforma, coroando uma obra de previdência social cuja prioridade consistia em
“atender às necessidades mais instantes” (Pereira, 1937: 61).

O novo regime de proteção social — ideias e tensões

O pondo à luta de classes os imperativos de colaboração e harmonia social, de modo a


garantir o fomento da produção nacional e a ordem pública, o novo regime de prote-
ção social não implicava qualquer noção ou sistema de Estado-providência, nem mesmo de
tipo assistencialista.
O Estado Novo declarava prioritária uma política social de enquadramento dos grupos
socioprofissionais e dos interesses econômicos, mas não assumia responsabilidades diretas no
sistema de proteção social. Reservava a si próprio as tarefas de enquadramento e vigilância
da previdência corporativa no âmbito de um corporativismo que, retoricamente, dizia-se de
“associação”, afirmando que não queria ser “de Estado” (Lucena, 1976, v. 1: 160-177).4

206 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 206-218, maio-agosto 2018
A institucionalização do “social” no Estado Novo português:
previdência corporativa e seguros sociais voluntários

Curioso é verificar a divergência de posições das hostes socialistas e comunistas perante


a violência da ordem sindical imposta em setembro de 1933. O fim iminente do sindicalismo li-
vre suscitou, do lado socialista, uma estratégia de sobrevivência entrincheirada no movimento
cooperativo. “Dissolução” ou “integração” no sindicalismo nacional foi o pesado dilema a que
o regime obrigou as associações de classe. Nesse ano 1933, só em Lisboa, eram quase 100 as
associações representativas do trabalho, representando variadíssimos grupos profissionais. No
país, ao todo seriam mais de 500 (Patriarca, 1990: 23-58). Muitas, talvez a maioria, tinham
dirigentes e militantes socialistas.
Comunistas e anarcossindicalistas, reunidos nas respectivas centrais sindicais clandestinas,
a Comissão Intersindical (CIS) e a Confederação Geral do Trabalho (CGT), recusam-se a acatar as
leis que impõe a corporativização dos sindicatos de trabalhadores. Enfrentando o risco de violen-
ta repressão, avançam para a ideia de uma greve geral revolucionária (Patriarca, 2000: 34-87).
Apegados a seu sentido reformista, os socialistas evitam atuar à margem da lei, embora
critiquem com veemência a Constituição de 1933, o Estatuto do Trabalho Nacional e o decreto
dos sindicatos nacionais. Pouco antes de terminar o prazo atribuído pelo governo às associações
de classe para que se transformassem em sindicatos de insuspeito nacionalismo, o socialista
Alfredo Franco exorta o operário português ao associativismo, lembrando que “o cooperativismo
constituiu sempre um dos vértices do triângulo em que assentava a vida operária” (Patriarca,
1990: 36). Pouco escutado, o apelo do secretário-geral do Partido Socialista a uma cooperação
associativa de tipo econômico e educativo não impediu, porém, que a Federação das Associações
Operárias Socialistas (FAO) tenha participado no “comitê de unidade” que veio a organizar o 18
de janeiro de 1934, cujo desfecho repressivo seria trágico para o sindicalismo livre.
No campo católico, a Igreja aplaudiu o corporativismo e deixou clara sua defesa do sis-
tema. Uma ideia central do pensamento social católico português dos anos 1930 residia no
elogio das virtudes sociolaborais das corporações da Idade Média, argumento que a doutrina
corporativista acolheu com maior ou menor convição. Recusando a luta de classes e vincando
claras distâncias em relação a qualquer tipo de sindicalismo revolucionário, os católicos viam
na colaboração de classes, e no corporativismo em geral, uma fórmula superior de organização
da vida social e econômica. Contudo, insistiam em afirmar que não deviam intrometer-se na
política ou pronunciar-se sobre os modos de concretizar a “ordem corporativa”. Assim os
exortara Pio XI na encíclica Quadragesimo anno, na qual o pontífice invocou o que Leão XIII
escrevera, 40 anos antes, na Rerum novarum, sobre o respeito pelas formas de governo.
Perante as leis corporativas de “nacionalização do trabalho” promulgadas em setembro
de 1933,5 referindo-se ao decreto que instituíra os sindicatos nacionais, os sindicalistas cató-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 207-218, maio-agosto 2018 207
Álvaro Garrido

licos começaram por saudar os golpes de morte desferidos no comunismo e no liberalismo.


Exultaram-se também com a possibilidade de restauração das corporações, que consideravam
as mais genuínas organizações de uma economia social cristã.
As atitudes do campo sindical anterior à “ordem nova” foram muito diversas e por ve-
zes táticas. Nos primeiros anos da institucionalização corporativa, as questões do horário de
trabalho e as expectativas de adoção da figura do “salário familiar” — outro modelo colhido
junto dos católicos sociais belgas, que encontrou tradução na figura do “salário suficiente”,
expressa por diversos corporativistas portugueses — dominam o discurso.
À medida que o movimento sindical católico cria suas próprias experiências e expõe
umas poucas vozes críticas, o que sucede quando regressam a Portugal os primeiros
“homens de Lovaina”, em 1935,6 ganham relevo algumas práticas de sindicalismo católico,
cujas semelhanças com o patrimônio cooperativo da economia social são evidentes. A mais
conhecida e saliente dessas dinâmicas de sindicalismo católico surgira na Covilhã (Rezola,
1999: 88-93). Em fevereiro de 1932, os sindicatos católicos locais constituíram uma coo-
perativa de consumo, a “Cooperativa Renovação Social”, juntando-lhe outras organizações
e iniciativas que supunham a conjugação do imaginário cooperativista de Rochdale com a
filantropia social cristã. No caso da Covilhã, foi o movimento social católico dos operários
dos lanifícios e da construção civil que animou a criação dos sindicatos confessionais. Sua
ação social e cooperativa foi alimentada pela Voz dos Trabalhadores, jornal que atribuiu à
educação e à instrução um papel decisivo na formação integral dos operários. Apesar das
hesitações iniciais, a hierarquia católica reconheceu e exaltou a experiência sindical da
cidade serrana. A Igreja viu nesse exemplo um caminho de recuperação do ensino técnico
católico para as classes operárias. Nos anos 1930, consentida e apoiada pela hierarquia e
pela própria Ação Católica, a experiência de sindicalismo cooperativo da Covilhã animará a
criação de outros sindicatos católicos.

Os dispositivos de previdência e assistência

A Constituição de 1933 pouco dizia sobre as responsabilidades do Estado em matéria de


previdência social. Ao “Estado Novo corporativo” competia apenas favorecer e promo-
ver as instituições de solidariedade, previdência, cooperação e mutualidade (artigo 41). Ad-
vertia-se, porém, que o Estado não se comprometia a erguer um sistema de segurança social
por si financiado. De forma cautelar, a Constituição de 1933 deixou cair até mesmo a noção
republicana de “direito à assistência pública”, inscrita na Constituição de 1911.

208 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 208-218, maio-agosto 2018
A institucionalização do “social” no Estado Novo português:
previdência corporativa e seguros sociais voluntários

Mais claros, mas apenas programáticos, eram os princípios de política social que decor-
riam do Estatuto do Trabalho Nacional, o principal diploma do sistema corporativo português,
decalcado da Carta del lavoro do fascismo italiano. O Estatuto foi publicado a 23 de setembro
de 1933, juntamente com outros cinco decretos que instituíam e regulamentavam os Grêmios
obrigatórios, os sindicatos nacionais, as Casas do Povo, as Casas Econômicas e o próprio INTP.
Apoiado na prudência e no gradualismo da política social corporativa, o Estatuto do
Trabalho Nacional anunciava a realização progressiva dos fins de previdência que o Estado se
propunha. As entidades patronais e sindicais eram incumbidas de criar e gerir as respectivas
instituições de previdência. A essas pequenas caixas de seguro social das instituições corpo-
rativas reservava-se a proteção dos trabalhadores na doença, invalidez e velhice. De modo
a vincular os organismos a esses fins de seguro social, os contratos coletivos de trabalho
deveriam incluir normas que obrigassem à comparticipação financeira dos patrões e dos assa-
lariados. Podiam ser acordos, convenções ou contratos propriamente ditos, nos quais o Estado
negociava consigo próprio.
As bases gerais de organização da previdência foram definidas pela Lei no 1.884, de 16 de
março de 1935. A “nova previdência”, como a propaganda lhe chamou, era de tal forma um pilar
do sistema corporativo e um instrumento de ordenação das relações sociais que foi a primeira lei
aprovada pela Assembleia Nacional uma vez aprovada a Constituicão do regime, em abril de 1933.
As instituições de previdência podiam conhecer quatro tipos distintos. Nas de primeira
categoria, ficavam as caixas sindicais de previdência dos sindicatos nacionais e as caixas de
previdência das Casas do Povo e Casas dos Pescadores. Essa tríade de organismos tinha em
comum sua natureza de instituições corporativas do trabalho dotadas de fins de “representa-
ção profissional” e “previdência”.
Em uma segunda categoria, situavam-se as caixas de reforma ou de previdência propria-
mente ditas.
A terceira modalidade era reservada às associações de socorros mútuos, que, embora
reconhecidas por lei, seriam condenadas à extinção ou a uma vida difícil, estritamente regula-
mentadas e fiscalizadas por processos arbitrários.
Na quarta e última categoria, incluíam-se as instituições dedicadas à previdência social
do funcionalismo público, civil ou militar, bem como de outros servidores do Estado e dos
corpos administrativos (Lei no 1.884, de 16 de março de 1935).
A previdência corporativa destinava-se, sobretudo, aos trabalhadores do comércio, da
indústria e dos serviços, uma vasta camada popular e da pequena burguesia urbana que, em
teoria, ficava protegida contra os riscos de doença, invalidez, velhice, morte e de “desemprego

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 209-218, maio-agosto 2018 209
Álvaro Garrido

involuntário”. As indenizações ou subsídios por morte não tinham, porém, natureza geral, e a
cobertura do risco de desemprego ficou apenas no papel.
Segundo a doutrina e a lei, as instituições de previdência do sistema corporativo deve-
riam ser autônomas, mas de inscrição obrigatória. Tal princípio coincidia com a lógica com-
pulsiva da organização do “trabalho nacional”, embora repetisse a natureza obrigatória dos
seguros sociais que o Estado Novo tanto criticara à República. Apesar das diferenças de grau
relativamente ao modelo vertical de organização do trabalho adotado pelo fascismo italiano,
o Estado Novo português definiu sem hesitações esse propósito de institucionalição das re-
lações laborais em um plano nacional, ou seja, sob a direção do Estado evitando dinâmicas
pluralistas e de natureza classista.
As caixas sindicais de previdência eram exaltadas como “o tipo mais perfeito das institui-
ções de previdência do tipo corporativo” (Cartilha do corporativismo, 1940: 71). Talvez por-
que o financiamento das caixas sindicais e das caixas de reforma dependesse das quotizações
das empresas e dos trabalhadores. O equilíbrio financeiro das caixas — de umas e de outras
— assentava-se em um imperativo legal de estrito equilíbrio entre as receitas e as despesas,
replicando a ortodoxia financeira dos orçamentos de Estado. Essa gestão parcimoniosa era
garantida pela capitalização dos respectivos fundos de reserva e por reservas matemáticas
(Carreira, 1996: 55-81). Os rendimentos das quotizações cobriam, em geral, as prestações
a entregar aos beneficiários. Esse método simples e muito distante de qualquer modelo de
repartição permitiu acumular fundos avultados, que encheram os cofres das caixas sindicais.
Os rendimentos das contribuições arrecadadas eram aplicados em depósitos a prazo e em tí-
tulos do tesouro que financiavam as prestações dos beneficiários. Durante décadas, os fundos
retidos nas caixas contrastaram com a modéstia dos benefícios sociais realmente atribuídos
(Cardoso e Rocha, 2003: 122).
Anunciada como um grande edifício de política social para dignificação do “trabalho
nacional”, a previdência corporativa previa, também, a prestação de cuidados de saúde. Até
1946, essa função foi atribuída aos próprios sindicatos nacionais. Cada sindicato funciona-
va por si, conforme os protocolos estabelecidos com os hospitais e o zelo dos dirigentes, o
que resultava em cuidados de saúde geralmente precários e de natureza incerta. O protesto
popular e as greves dos anos da guerra terão convencido o governo a unificar o sistema,
criando a Federação das Caixas de Previdência e os Serviços Médico-Sociais. Principiou, então,
um programa nacional de construção de hospitais, cuja gestão foi entregue às Misericórdias.
Em 1951, os Serviços Médico-Sociais integravam apenas 335 mil beneficiários; em 1965, já
eram 2,6 milhões, um progresso significativo, mas muito aquém dos números de 1975, que

210 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 210-218, maio-agosto 2018
A institucionalização do “social” no Estado Novo português:
previdência corporativa e seguros sociais voluntários

atingiram os 7,3 milhões de beneficiários (Carreira, 1999: 184-187). Até 1974, os pescadores
tiveram serviços de saúde próprios — os postos médicos das Casas dos Pescadores —, e os
rurais pouco ou nada tinham, embora as Casas do Povo estivessem obrigadas a facultar-lhes
assistência médica elementar.
Não tardaram a surgir os regulamentos das duas primeiras espécies de instituições de
previdência. Certamente porque se tratava de completar o enquadramento repressivo dos
sindicatos de trabalhadores e de acautelar sua inserção no sistema de “trabalho nacional”.
Mais demorados foram os regulamentos de previdência das Casas do Povo e dos Pescadores.
No caso das primeiras, o governo deparou-se com resistências fortes e com a indife-
rença dos “interessados”. Talvez por isso, o legislador andou a acertar com o modo de fazer
previdência e de lidar com a grande massa dos trabalhadores rurais, procurando contrariar
pela força o “espírito imprevidente” dos camponeses. Em 1940, a inscrição dos trabalhadores
rurais nas Casas do Povo passou a ser obrigatória; as Casas passavam, elas próprias, a ser
instituições de previdência, devendo assumir funções de seguro social. Em sua retórica dou-
trinária, os corporativistas designaram-nas, muitas vezes, de “mutualidades rurais”, sugerindo
que nelas se mantivera intacto o princípio de associação.
Quanto às Casas dos Pescadores, embora o princípio da obrigatoriedade tenha sido aco-
lhido em sua lei criadora e no respectivo regulamento — ambos de 1937, talhados apressa-
damente, na sequência da greve dos bacalhoeiros desse ano —, a assistência social, moral e
religiosa foi sempre mais praticada e saliente do que a previdência (Garrido, 2012: 7-29). Daí a
insistente comparação das Casas dos Pescadores com os antigos “compromissos marítimos”,
mutualidades religiosas e associativas que haviam sido comuns no Algarve. As poucas que
havia foram extintas para dar lugar às Casas dos Pescadores.
Na área dos seguros de acidentes de trabalho e doenças profissionais, a ordem cor-
porativa também significou um recuo. Tratando-se de matérias sociais em que havia forte
herança republicana, o próprio Estatuto do Trabalho Nacional (artigo 49) inscreveu o princípio
de proteção às vítimas de acidentes de natureza profissional e previu a responsabilização das
entidades patronais. A nova lei reguladora dos seguros contra acidentes laborais e doença foi
publicada em julho de 1936 (Lei no 1.942, de 27 de julho de 1936). Saiu bem antes da lei
corporativa sobre contratos de trabalho e manteve-se em vigor até 1965.
Em uma cartilha de propaganda editada em 1940, justificavam-se as opções do Estado
corporativo em matéria de acidentes de trabalho, verberando a legislação de índole socialista
que, alegadamente, “antepunha o econômico ao social”: “O Estado corporativo resolveu o
problema com a nítida compreensão das realidades, abrangendo na protecção da lei todos os

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 211-218, maio-agosto 2018 211
Álvaro Garrido

casos em que o acidente é imputável ao risco do próprio trabalho” (Cartilha do corporativis-


mo, 1940: 53-54).
Procurando justificar a modéstia das indenizações previstas na lei e imputando a respon-
sabilidade aos patrões, salienta-se que “o seguro era um encargo da empresa”, ainda que as
entidades patronais pudessem transferir sua responsabilidade para as sociedades legalmente
autorizadas a realizar o seguro contra acidentes de trabalho. Na prática, a previdência assumiu
poucos casos e livrou-se dos que pôde, alegando incumprimento dos prazos de garantia e
outras irregularidades. Dado que muitos trabalhadores eram vítimas de acidentes e doenças
profissionais sem que estivessem protegidos por contratos de trabalho e porque as pequenas
empresas, até cinco trabalhadores, podiam tomar o risco por conta própria, inúmeras relações
de trabalho ficaram a descoberto.

Balanços críticos

E m que pesem a exaltação doutrinária da previdência corporativa e a ideia de que se trata-


va de uma política social de novo tipo, sua concretização foi lenta e cheia de assimetrias.
Variou consoante a delicadeza social dos universos de trabalho, o meio geográfico ou mesmo
a profissão e a atividade econômica. A “nova previdência” ficou distante das promessas dou-
trinais e revelou-se modesta nos benefícios de proteção social que realmente atribuiu.
Poucos anos volvidos sobre a publicação da lei de bases da previdência corporativa, a
pobreza de resultados do sistema já despertava controvérsia sobre o limitado alcance dos benefí-
cios e mesmo sobre o papel do Estado na eventual ampliação do sistema. Depressa se confirmou
que, em matéria de proteção social, o Estado Novo não quisera investir e fugira do prometido
abraço entre capital e trabalho. Daí a plasticidade da relação que manteve com as mutualidades
laicas e, sobretudo, religiosas, das quais precisou para compensar uma previdência muito pobre
e uma assistência bastante aquém das necessidades de manutenção da “ordem social”.
Ainda antes da guerra, mesmo dentro do regime não faltou quem questionasse os mo-
destos resultados dos sindicatos corporativos em matéria de previdência e de eficácia da
“contratação coletiva”. O triângulo corporativo em que se assentava a ordem socioeconômica
do Estado Novo acusou tremendas distorções entre o Estado, os patrões e os sindicatos.
A recusa de muitos patrões em dar cumprimento às oito horas de trabalho diárias e sua
negligência e má vontade relativamente ao que deviam descontar para a previdência dos tra-
balhadores suscitam atritos em diversos setores de atividade. Por seu ímpeto crítico ficou cé-
lebre a denúncia feita pelo padre Abel Varzim na Assembleia Nacional, em fevereiro de 1939.
Afirmou, então, que os sindicatos nacionais não estavam a realizar seus fins, não defendiam

212 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 212-218, maio-agosto 2018
A institucionalização do “social” no Estado Novo português:
previdência corporativa e seguros sociais voluntários

os interesses profissionais dos operários, nem tampouco praticavam o equilíbrio social para
que haviam sido criados.
Em geral, a expansão do sistema de previdência social criado em 1935 só foi realmente
encarada nos últimos anos do regime. O Estado só se apressou a aprofundar o sistema de pre-
vidência e a ampliar o universo de beneficiários quando pressionado por movimentos sociais
ou por mudanças significativas na demografia.
A taxa de cobertura da população ativa abrangida pela previdência persistiu muito baixa
até aos anos 1970. Em 1960, apenas 35,6% da população ativa podiam considerar-se dentro do
sistema; 10 anos depois, a taxa de beneficiários ativos já era de 60%. O número de pensionistas
da previdência registrava valores ainda mais modestos: em 1960, eram apenas 56 mil, e 10 anos
depois, contavam-se 187 mil, pela inclusão dos trabalhadores rurais. Criada a Segurança Social
pública, em 1975 já havia em Portugal cerca de 862 mil pensionistas (Carreira, 1999: 186).
No começo dos anos 1940, eram apenas nove as caixas sindicais de previdência em
funcionamento. E pouco mais de 100 as minúsculas caixas de previdência que funcionavam
no âmbito das Casas do Povo que, nesse ano, já excediam as 1.000. Em plena guerra, o Estado
chamou a si a criação de novas caixas de previdência, quer nos sindicatos da indústria e do
comércio, quer no mundo rural. A população abrangida por algum tipo de previdência aumen-
tou na sequência desses arranjos intervencionistas. Ainda assim, em 1950 a população ativa
coberta pelo sistema (indústria, comércio e serviços) não passava de 37% dos trabalhadores.
No caso dos trabalhadores da indústria, comércio e serviços, os seguros sociais eram
irrisórios. Quanto ao subsídio por risco de desemprego, até 1975 nunca foi atribuído. Por
bizarra, ficou conhecida a iniciativa do ministro Duarte Pacheco quando, em 1932, no primeiro
governo presidido por Salazar, propôs que as verbas do Fundo de Desemprego passassem a
ser aplicadas nos programas de obras públicas do Ministério para que fora nomeado (Pimen-
tel, 1999: 477-508). Contrariamente ao que se sugeria no Estatuto do Trabalho Nacional, o
desemprego ficou excluído da série de riscos sociais que deviam ser atenuados pela previdên-
cia social, eventualmente sob a forma de seguros. Na agricultura, a realidade era ainda mais
sombria: em 1960, só um quinto dos trabalhadores se beneficiava do sistema de proteção
social das Casas do Povo, que, em geral, traduzia-se em assistência médica (pouca ou rara),
seguro na doença e subsídio por morte.
De acordo com a lei basilar da previdência corporativa, a partir de 1935 foram pagos alguns
abonos de família sob a forma de complementos de salário. A prática foi muito restrita e apenas
surgiu por iniciativa de umas poucas empresas privadas e por impulso de organismos corpora-
tivos e de coordenação econômica ligados ao comércio de mercearias e à indústria seguradora.
Em 1942, o abono de família foi instituído para todos os trabalhadores por conta de outrem, do

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 213-218, maio-agosto 2018 213
Álvaro Garrido

comércio, indústria, profissões livres e quadros da organização corporativa. Na prática, apenas


beneficiou alguns trabalhadores, e só mais tarde seu regime de aplicação foi ampliado.
Volvidos os ensaios de regeneração do corporativismo a que se assistira nos anos 1950,
a política social do Estado Novo assumiria sem pudores seu ethos estatista, mas procuraria
fazer dele um recurso de modernização.
Nessa linha de pensamento, em 1962 seria aprovada uma importante reforma da pre-
vidência corporativa (Lei no 2.115, de 18 de junho de 1962). A nova lei atribuía ao pró-
prio Ministério das Corporações a competência de criar caixas de previdência e entregava os
principais domínios da política social, incluindo a previdência, a saúde e a assistência, a um
Conselho Social composto por uns poucos ministros. As medidas mais fundas destinavam-se
a esbater as assimetrias entre as prestações sociais atribuídas pelas diversas caixas sindicais
de previdência e a alterar o método de financiamento. Com esses fins, foi criado um regime
geral de prestações de âmbito nacional e distrital, conforme os riscos sociais em questão, e
principiou um sistema misto de financiamento, de capitalização e repartição, no sentido de
agilizar a distribuição das contribuições.
A inoperância do sistema de previdência corporativa e sua manifesta incapacidade para
elevar a condição humana dos trabalhadores portugueses começaram a suscitar críticas fre-
quentes durante a Segunda Guerra Mundial, seja pelas violentas greves que então se levan-
taram contra a fome de víveres e o custo de vida, seja por influência do plano Beveridge,
de 1942, cujo debate em Portugal foi intenso. Acresce o descrédito em que caíra o próprio
sistema corporativo, turvado por evidências de corrupção, cujos desmandos irritaram corpo-
rativistas insuspeitos, como Marcelo Caetano e outros. Nesse contexto exasperado, surgiram
reservas sobre o papel da previdência corporativa como instrumento de “paz social”.
No começo dos anos 1950, ergueram-se em Portugal diversas vozes reconhecendo no
modelo inglês de welfare State um desafio às responsabilidades do Estado na proteção social
e na produção de bens e serviços públicos. Não apenas para fins de equilíbrio e harmonia
social — discurso que os corporativistas também fizeram —, mas segundo fins de justiça
social redistributiva, ou seja, no sentido de diminuir desigualdades sociais resultantes do de-
sequilíbrio de rendimentos.
Os autores mais próximos do regime viram no plano dos trabalhistas britânicos uma
simples continuidade em face da tradição britânica de políticas sociais de combate à pobreza.
Argumentaram mesmo que seria impossível replicar a ousadia de Beveridge, porque nenhuma
economia do mundo poderia pagá-la.
Em outros setores de opinião, em especial por parte das oposições, mas também por
homens afetos ao regime, voltam-se a ouvir apelos à criação de um novo modelo de seguros

214 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 214-218, maio-agosto 2018
A institucionalização do “social” no Estado Novo português:
previdência corporativa e seguros sociais voluntários

sociais obrigatórios. E cresceram as críticas à ausência de responsabilidades diretas do Estado


em matéria de previdência social, dado que se tornara evidente que a organização corporativa
jamais seria capaz de fazê-lo. Na Seara Nova e na Revista de Economia do ISCEF, autores bem
identificados com o plano de reformas sociais apresentado por William Beveridge à Câmara
dos Comuns — trabalho solicitado por Winston Churchill, cuja coligação de governo seria
derrotada, após a guerra, em parte por os eleitores entenderem confiar a execução do plano
aos Trabalhistas — defendem as ideias de obrigatoriedade do seguro e de responsabilidade
do Estado perante a sociedade em matéria de direitos sociais.
Significativamente, o acolhimento da fervilhante experiência britânica de construção de
um Estado-providência moderno ocorre em paralelo com o debate, ainda que circunscrito às
instituições do Estado português, sobre o rumo da política social seguida até então e sobre o
vazio legal que o governo teria deixado arrastar em torno das questões da assistência pública.
Nesse como em outros temas de política social e econômica, a guerra apressou os legisladores.
Previdência e assistência foram, afinal, faces da mesma moeda; ambas foram concebidas
e regulamentadas como instrumentos de pacificação social. A análise das leis e dos orçamen-
tos é suficiente para provar que o Estado Novo não teve uma política de segurança social,
nem tampouco assumiu um sistema de assistência pública comparável ao que existira durante
a República. Assistência e previdência confundiam-se ostensivamente. Na agricultura como
nas pescas, a primeira tomou muitas vezes o lugar que a propaganda atribuiu à segunda.
Nos anos 1930, a implementação das Casas do Povo nas freguesias rurais mobilizara uma
campanha no Boletim do INTP, cuja retórica social não hesitou em chamar-lhes “mutualidades
rurais”. Embora dotadas de fins de previdência social, não tinham qualquer natureza mutua-
lista, dado que não tinham natureza associativa nem faziam socialização dos riscos.
Os paliativos proporcionados pela assistência social, pela política habitacional das ca-
sas econômicas e das “casas de renda limitada”, além de por um modesto programa de
construção de “casas para famílias pobres” — neste último caso, sem que os “chefes de
família” tivessem de ser filiados aos sindicatos nacionais ou funcionários do Estado —, foram
insuficientes para eliminar a pobreza do operariado urbano. Mas ajudaram a reprimir seus
movimentos em um quadro de severas limitações à atividade sindical.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 215-218, maio-agosto 2018 215
Álvaro Garrido

Notas

1 Como jovem professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, António de Oliveira Salazar
ensinou, além de economia e finanças, economia social. As matérias desse curso traduziam uma composição
eclética (por vezes pouco criteriosa) de ideias econômicas neoclássicas, do sociologismo jurídico de matriz
krauzista e da versão católica e moralista da velha economia social de Frédéric Le Play. Da economia social
moderna doutrinada pelos solidaristas franceses, em especial por Charles Gide e Léon Duguit, não há sinais
no ensino de Salazar.

2 Pedro Teotónio Pereira (1902-1972). Licenciado em matemáticas pela Universidade de Lisboa, especiali-
zou-se em cálculo atuarial na Suíça. Politicamente, pertenceu à segunda geração do movimento contrarre-
volucionário do Integralismo Lusitano e, a partir de 1928, colaborou com Salazar no Ministério das Finanças.
Entre 1933 e 1936, foi subsecretário de Estado das Corporações e Previdência Social, tornando-se, então, o
principal construtor do sistema corporativo do Estado Novo português. Prosseguiu nas tarefas políticas da
organização corporativa da economia e do “trabalho nacional” como ministro do Comércio e Indústria, entre
1936 e 1937. No final desse ano, foi nomeado “agente especial” do governo português junto do regime
franquista em formação durante a Guerra Civil da Espanha. Viria a fazer uma destacada carreira de diplomata
e embaixador. Nos anos 1960, chegou a ser apontado como delfim de Salazar.

3 Essa dicotomia teórica e o interminável debate sobre a natureza mais ou menos “associativa” do sistema
corporativo português — que, em rigor foi sempre antiassociativo — foram alimentados pelos próprios teó-
ricos internacionais do corporativismo a propósito dos desvios da experiência italiana e transportados para
a produção doutrinal portuguesa, dadas a criação tardia das corporações e as evidências estatizantes de um
sistema que se prometera “auto-organizado”.

4 Referimo-nos ao Estatuto do Trabalho Nacional aprovado pelo Decreto-Lei no 23.048, de 23 de setembro


de 1933, e aos restantes cinco diplomas da organização corporativa que trouxeram grandes implicações nesse
domínio e que manifestaram uma clara inspiração fascista, ainda que matizada por princípios e disposições do
pensamento social católico: Decreto-Lei no 23.049, sobre os grêmios, organismos corporativos das entidades
patronais; Decreto-Lei no 23.050, sobre os sindicatos nacionais; Decreto-Lei no 23.051, sobre as Casas do
Povo; Decreto-Lei no 23.053, que cria o Subsecretariado das Corporações e Previdência Social e o INTP.

5 Referimo-nos aos sacerdotes Francisco Pereira dos Santos, Abel Varzim e Manuel Rocha (Rezola, 1999:
88-93). Na Bélgica, esses padres tomaram contato quer com o movimento operário católico, quer com acadê-
micos e intelectuais do catolicismo social belga e francês. Salazar sempre receou que os católicos sociais de
Lovaina contaminassem a hierarquia católica portuguesa, as instituições sociais e os próprios crentes.

Referências bibliográficas

CARDOSO, José Luís; ROCHA, Maria Manuela. Corporativismo e Estado-providência (1933-1962). Ler Histó-
ria, n. 45, p. 111-135, 2003.
CARREIRA, Henrique Medina. Políticas sociais em Portugal. Lisboa: Gradiva, 1996.
______. Protecção social. In: BARRETO, António; MÓNICA, Maria Filomena (Coord.). Dicionário de história
de Portugal. Porto: Figueirinhas, 1999. v. IX, p. 184-187. Suplemento.

216 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 216-218, maio-agosto 2018
A institucionalização do “social” no Estado Novo português:
previdência corporativa e seguros sociais voluntários

CARTILHA do corporativismo. Lisboa: Secretariado de Propaganda Nacional, 1940.


CASTEL, Robert. Les métamorphoses de la question sociale. Paris: Gallimard, 2012.
DONZELOT, Jacques. L’invention du social. Paris: Éditions du Seuil, 2001.
FERNANDES, António Júlio de Castro. Temas corporativos. Lisboa: Secretariado de Propaganda Nacional,
1944.
GAGLIARDI, Alessio. Il corporativismo fascista. Bari: Laterza, 2010.
GARRIDO, Álvaro Garrido. Assistência e previdência no mar português: a acção social das Casas dos Pescado-
res (1933-1968). Ler História, n. 62, p. 7-29, 2012.
______. Cooperação e solidariedade: uma história da economia social. Lisboa: Tinta da China, 2016a.
______. Queremos uma economia nova! Estado Novo e corporativismo. Lisboa: Círculo de Leitores/Temas
& Debates, 2016b.
GIORGI, Chiara. Le politiche sociali del fascismo. Studi Storici, n. 1, p. 93-108, jan./mar. 2014.
LOFF, Manuel. O nosso século é fascista! O mundo visto por Salazar e Franco (1936-1945). Porto: Campo
das Letras, 2008.
LUCENA, Manuel de. Casas do Povo. In: BARRETO, António; MÓNICA, Maria Filomena (Coord.). Dicionário de
história de Portugal. Porto: Figueirinhas, 2001. v. VII, p. 245-2507.
______. O sistema corporativo português. Lisboa: Perspectivas & Realidades, 1976. 2 v.
MANOILESCO, Mihail. Le siècle du corporatisme. Paris: Félix Alcan, 1934 (Ed. bras. 1938. Tradução de Aze-
vedo Amaral).
MILZA, Pierre. Les fascismes. Paris: Éditions du Seuil, 2001.
MOSSE, George. De la Grande Guerre au totalitarisme: la brutalisation des sociétés européennes. Paris:
Hachette Littératures, 1999.
PASETTI, Matteo. L’Europa corporativa: una storia transnazionale tra le due guerre mondiali. Bolonha: Bono-
nia University Press, 2016.
PATRIARCA, Fátima. A institucionalização corporativa: das associações de classe aos sindicatos nacionais
(1933). Análise Social, v. XXVI, n. 110, p. 23-58, 1990.
______. A questão social no salazarismo, 1930-1947. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1995. 2 v.
______. Sindicatos contra Salazar: a revolta de 18 de janeiro de 1934. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2000.
PEREIRA, Miriam Halpern. As origens do Estado providência em Portugal: as novas fronteiras entre público e
privado. Ler História, n. 37, p. 45-61, 1999.
PEREIRA, Pedro Teotónio. A batalha do futuro: organização corporativa. Lisboa: Livraria Clássica, 1937.
PIMENTEL, Irene. A assistência social e familiar do Estado Novo nos anos 30 e 40. Análise Social, v. XXXIV,
n. 151-152, p. 477-508, 1999.
PINTO, António Costa (Ed.). Corporatism  and fascism: the  corporatist wave  in Europe. Londres: Routledge,
2017.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 217-218, maio-agosto 2018 217
Álvaro Garrido

______; KALLIS, Aristotle (Ed.). Rethinking fascism and dictatorship in Europe. Hampshire: Palgrave Mac-
millan, 2014.
______; MARTINHO, Francisco Carlos Palomanes (Org.). O corporativismo em português: Estado, política e
sociedade no salazarismo e no varguismo. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2008.
REZOLA, Maria Inácia. O sindicalismo católico no Estado Novo, 1931-1948. Lisboa: Editorial Estampa, 1999.
ROSANVALLON, Pierre. L’État en France de 1789 à nos jours. Paris: Éditions du Seuil, 1990.
ROSAS, Fernando. Salazar e o poder: a arte de saber durar. Lisboa: Tinta da China, 2012.
SCHMITTER, Philippe. Portugal: do autoritarismo à democracia. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 1999.
SINGER, Paul. Ensaios de economia solidária. Coimbra: Almedina, 2018.

218 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 218-218, maio-agosto 2018
Artigo

Corporatism and neo-corporatism:


developments in the 20th -century Italian
legal order
Corporativismo e neocorporativismo: desenvolvimentos na
ordem jurídica italiana no século XX
Corporativismo y neo-corporativismo: desarollos en el orden
jurídico italiano en el siglo XX

Irene StolziI*

http://dx.doi.org/10.1590/S2178-14942018000200006

I
Universidade de Florença, Itália.

* Doutorado em História do Direito pela Universidade de Siena, Itália (2002). Professora Associada da Universidade de
Florença, Itália. (irene.stolzi@unifi.it)

Artigo recebido em 26 de março de 2018 e aprovado para publicação em 30 de maio de 2018.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 219-242, maio-agosto 2018 219
Irene Stolzi

Abstract
The article seeks to analyze how the legal thought represented the idea of corporative and neo-corporative order in
the framework of the 20th-century in Italian history. The first part is dedicated to highlight the evolutions of historical
studies on fascist corporatism through a brief review of the main interpretations over the last decades. Then, the
paper describes three different lectures of fascist corporative order brought by the jurists between the twenties and
the forties: the vision of those who saw in corporatism the ideological and institutional answer for outlining the
identity of the new totalitarian state; the interpretation, typical of jurists with a liberal background, who attempted to
fit the corporatist phenomenon (and the 20th century in general) into traditional interpretative categories; and finally,
the minority view embraced by jurists having different backgrounds and ideological sensibilities, but nonetheless
convinced that the corporatist system should represent an opportunity to imagine types of relationships between
private and public, political and economic spheres that were remote both from 19th century individualism and the
new frontiers of totalitarianism. The second part tries to stress the so-called neo-corporatism, that is the season of
“social consultation” spanning the 1980s and 1990s to see whether and in which sense it is possible to connect this
experience both with the interwar corporatism and the democratic constitutional context.
Keywords: Corporatism; neo-corporatism; Fascism; Democracy; Legal history.

Resumo
O presente artigo se propõe a analisar como o pensamento jurídico representava a ideia da ordem corporativa e
neocorporativa no contexto histórico italiano do século XX. A primeira parte está dedicada à evolução da historio-
grafia do corporativismo fascista por meio de uma rápida revisão das principais interpretações das últimas décadas.
Em seguida, o estudo apresenta três concepções diferentes da ordem corporativa fascista em se tratando da cultura
jurídica entre os anos de 1920 e 1940: a visão daqueles que enxergavam no corporativismo a resposta ideológica
e institucional com a qual se poderia definir a identidade de um novo Estado totalitário; a interpretação, típica
dos juristas liberais, que buscava encaixar o fenômeno corporativista (e o século XX como um todo) em categorias
interpretativas tradicionais; e, finalmente, o ponto de vista de uma minoria compartilhada por juristas que, apesar
de suas premissas ideológicas e culturais diferentes, estavam convencidos de que o sistema corporativista deveria
representar uma oportunidade de se imaginar tipos de relações entre as esferas públicas e privadas, políticas e
econômicas, provenientes do individualismo do século XIX e das novas fronteiras do totalitarismo. A segunda parte
deste artigo busca salientar o assim chamado neocorporativismo, ou seja, o período de “consulta social” nos anos
de 1980 e 1990 para ver se e em que sentido seria possível conectar essa experiência com o corporativismo entre
guerras, bem como com o contexto constitucional democrático.
Palavras-chave: Corporativismo; Neocorporativismo; Fascismo; Democracia; História jurídica.

Resumen
El artículo intenta analizar cómo el pensamiento jurídico haya representado la idea del orden corporativo y neo-corpora-
tivo en el contexto de la historia italiana del siglo XX. La primera parte está dedicada a la evolución de la historiografía
del corporativismo fascista a través de una rápida revisión de las principales interpretaciones de las últimas décadas.
Luego, el ensayo expone tres diferentes concepciones del orden corporativo fascista con respecto a la cultura jurídica
entre los años 1920 y 1940: la perspectiva de quien ve en el corporativismo el dispositivo ideológico e institucional en
torno al cual se debe definir la identidad del nuevo Estado totalitario; la interpretación, típica de los juristas liberales, que
intenta reconducir el fenómeno corporativo (y, más en general, todo el siglo XX) dentro de las categorías interpretativas
tradicionales; y por último, el punto de vista minoritario de aquellos juristas que, desde diferentes premisas ideológicas y
culturales, estaban convencidos de que el sistema corporativo pudiera representar la oportunidad de imaginar relaciones
entre privado y público, esfera política y económica, alejadas tanto del individualismo decimonónico, como de las nuevas
fronteras del totalitarismo. La segunda parte intenta poner a prueba el presunto neo-corporativismo, es decir la tempora-
da del (?) de los años 1980 y 1990, para verificar si, y en qué sentido, es posible relacionarlo no solo con la experiencia
del corporativismo de entreguerras, sino también con el orden democrático constitucional.
Palabras clave: Corporativismo; Neocorporativismo; Fascismo; Democracia; Historia del derecho.

220 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 220-242, maio-agosto 2018
Corporatism and neo-corporatism: developments in the 20th-century Italian legal order

Fascist corporatism through its historiographical


interpretations

T hough few topics in historiography lend themselves as well as corporatism to compa-


rative studies, or studies concerned in any case with the international dissemination
of ideas and institutions that may be qualified as corporatist1, the focus of this article will
be limited to 20th-century Italy. It will seek to delineate the salient features of two different
periods in history, from both a historical and legal perspective: Italy’s corporatist experiences in
the fascist era and during the period of “social consultation” spanning the 1980s and 1990s,
often defined as neo-corporatism2. The article will then explore both the specific characteristics
of the two experiences and the reasons enabling a link to be created between them, highligh-
ting differences and similarities.
For a number of years, fascist corporatism has been a subject of renewed interest among
historians3. This interest has contributed to a significant reassessment of the role and weight
of this side of fascist policy, which, at least on paper, the regime exhibited as an important sign
of its originality and historical legitimacy: “the Fascist State – it was affirmed repeatedly – is
necessarily corporatist”. The issue of corporatism was basically shelved for a long time because
it was considered a radical failure, a design incapable of giving rise to authentically new ways
of conceiving the relationship between State and society, either in the realm of labour rela-
tions or in the complementary area of public regulation of the economy4. Therefore, what took
shape in the years of the regime was merely a superfetation of offices and bureaucracies, and
the only thing new about them was the name “corporatist”. Moreover, they seemed to have
contributed only to increasing the overall inefficiency of the Italian social, economic and insti-
tutional system. Thus, they were far from offering any prospects for a “third way”, an alterna-
tive system that could replace both liberalism and socialism; they were yet limited to renewing,
under a different guise, the alliance that already long existed between political power and the
Capitalist bloc, thereby enabling a perpetuation of the traditional equilibrium between classes.
The most recent historiographic literature – although without criticizing these more tra-
ditional interpretations - has now essentially addressed two aspects of corporatism from a
different perspective. Some studies have challenged, at least in part, the notion of failure,
arguing that although the corporatist experiment did not take off, as corporations never beca-
me – in Mussolini’s emphatic words – the “high command of the Italian economy”, this did
not mean that it left no traces in Italy’s political and economic life during the fascist regime
and after its fall (Cassese, 2010; Gagliardi, 2010). Another pillar of traditional interpretations
was also called into question, namely the idea that reflection on corporatism had given rise

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 221-242, maio-agosto 2018 221
Irene Stolzi

only to negligible theoretical proposals: alongside the many who continued to uphold tradi-
tional positions just naming them as corporatist, there were also authors who took the idea
of corporatism seriously, seeing it as an opportunity to supplant the 19th century liberal vision
of society. By the view embraced by many legal thinkers who lived during fascism and able to
influence historiographic interpretations, the legal science of that period could be divided into
two single large categories distinctly separate and internally homogeneous, highlighted by Sal-
vatore Pugliatti’s (1950) well-known reconstruction. On the one hand, there were the actual
Jurists, the only ones worthy of this name, obstinately loyal to liberal individualist ideology and
a formalistic and legalistic conception of juridical phenomena by which they had succeeded
in saving the legal order from succumbing completely to fascist influence. On the other hand,
there were the apologists, culturally mediocre persons, not even qualifiable as jurists, who
engaged in a noncritical celebration of fascism, and thus, deserved to be forgotten.
Now this view has also progressively lost ground. As may be easily surmised, this was a
reductive reconstruction, almost Manichean in nature, which oversimplified a singularly com-
plex universe actually not remained tied to a traditional individualist conception of society,
inasmuch not all jurists continued to adhere to a legalistic and formalistic vision of law, nor
did they always show to be sceptical towards the corporatist approach. On the contrary, in
corporatism, many of them saw a welcome sign of restored State authority, necessary above
all in order to govern a phenomenon like syndicalism, which in their view was dangerously apt
to produce conflicts and social unrest. From this perspective, Francesco Carnelutti’s thought
was emblematic, who can certainly not be accused of having fascist sympathies, yet after the
regime had fallen, he regretted the abolition of the 1926 syndical law and declared the choi-
ces of the fascist legislator to be preferable to those of the Republican Constitution, which,
by recognising the right to strike (Art. 40), opened the doors of the Italian legal order to an
authentic “act of war” (Carnelutti, 1949: 138).
Secondly, the rigid division of the theoretical realm into jurists and apologists failed
to consider the voice of an important minority of legal thinkers who viewed the corporatist
approach with interest, as it offered an opportunity to supersede the liberal idea of society, but
did not adhere to the totalitarian interpretations of corporatism itself.
Finally, reconstructions like Pugliatti’s denied that there was any theoretical substance in
the interpretations of corporatism adopted by the so-called regime jurists, who were all indis-
tinctly placed on the same level. Instead, a closer look from the recent historiography revealed
that the galaxy of regime jurists was not populated only by insignificant or noisy figures, but
also by some culturally robust ones (Alfredo Rocco, Giuseppe Bottai, Giuseppe Maggiore,

222 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 222-242, maio-agosto 2018
Corporatism and neo-corporatism: developments in the 20th-century Italian legal order

Sergio Panunzio and Arnaldo Volpicelli, just to mention a few), who engaged in debate over
the features that fascism and corporatism should have in order to bring about an authentically
revolutionary shift in Italian history.
In this regard, it is not easy to identify a dies a quo, the moment when these insights began
to be a matter of discussion among historians; it has been an uneven process, largely charac-
terised by the simultaneous presence of different types of interpretations. One cannot neglect
to mention Paolo Ungari’s pioneering work of some decades ago, Alfredo Rocco e l’ideologia
giuridica del fascismo (1963). However, for a long time, his book remained an isolated product
in the field of research; it was not until the mid-1980s5 that Italian legal historiography began to
probe into the many different ideas and theoretical aspects of legal thought in the fascist years,
bringing to light many complex possible technical and ideological combinations, elements of
continuity and breaks with the past. This did not imply a complete rejection of the interpretations
of traditional historiography, but rather, precisely, an awareness of the complexities, a readiness
to ask more questions and to explore different interpretative perspectives.

The totalitarian idea of corporatism

I shall limit myself to giving here a brief summary of the numerous interpretations spawned
by the corporatist proposal, focusing my attention on some aspects that are relevant as an
introduction to the discussion on neo-corporatism.
From this perspective, it is possible to identify three main interpretative fronts: firstly, that
of regime jurists convinced that corporatism should provide the ideological and institutional
tools for outlining the framework of the new totalitarian state; secondly, the interpretation, put
forward by the majority of legal theorists scientists from a liberal background, who attempted
to fit the corporatist phenomenon (and the 20th century in general) into traditional interpretati-
ve categories; and, finally, the minority view embraced by jurists having different backgrounds
and ideological sensibilities, but nonetheless convinced that the corporatist system should
represent an opportunity to imagine types of relationships between the private and public,
political and economic spheres that were remote both from 19th century individualism and the
new frontiers of totalitarianism.
Regarding the regime jurists, as previous noted, there were not only figures (though there
were plenty of those too) who devoted themselves to base celebratory rhetoric, but also by
authors who undertook a non-superficial, theoretically astute analysis of the features that the
Fascist State should have in order to represent an authentically new chapter in Italian history.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 223-242, maio-agosto 2018 223
Irene Stolzi

Moreover, it was not a horizon characterised by uniform perspectives: Alfredo Rocco and Ugo
Spirito, Giuseppe Bottai and Sergio Panunzio, Carlo Costamagna and Arnaldo Volpicelli, all
expressed different interpretations both of fascism and of corporatism. However, despite the
differences, for the purposes of this essay, it is possible to identify some common threads.
Above all, a common issue was the analogous evaluation of the crisis of the liberal State,
afflicted by an authentic “social phobia” (Panunzio, 1931: 171), which had neither wanted nor
known how to address the problem of the relationship with the modern, organised and con-
flict-ridden mass society. This was one of the reasons that made corporatism a particularly sui-
table theoretical and institutional foundation for defining the framework of a new power, not
interested only in keeping society under surveillance and stifling discordant voices, but also in
conquering it and making it embrace the fascist world view. Corporatism could go well beyond
the regulation of labour and economic relations and be a machine appointed in promoting a
tentacular reach of the State by transforming all social organisations into “fecund auxiliaries”
(Bottai, 1928: 398) of its power. Indeed, the totalitarian State was constantly committed to
“seeking a consensus that did not rely on a spontaneous, vacillating, elitist ‘public opinion’,
but rather relied on a complex organisation which, by influencing the everyday experience of
citizens, attempted to obtain their adhesion to the regime’s watchwords” (Costa, 2001: 270).
thus, a State that conquered society (also) by organising it. Then, corporatism could and should
aspire to become the instrument called upon to take the State everywhere, to transform society
into a militia actively devoted to the fascist cause.
Of no lesser importance was the role envisaged for the syndicates, governed by Law no.
563 of 1926, which constituted the first chapter in the process of implementation of corporatism.
It was considered by its author – Alfredo Rocco – as the “most profound transformation the
State had undergone since the French Revolution” (Rocco, 1926: 335), and it was included in a
legislative cycle that produced many of the so-called “exceptional Fascist laws” (s.c.: leggi fas-
cistissime). According to Rocco, this law had fulfilled a “very great political task” (Rocco, 1927:
30), not only and not so much because it had put non-fascist trade union organisations out
of action, but also (and even more importantly) because it had inaugurated a system of go-
verning the trade union phenomenon capable of guaranteeing the State a presence of varying
intensity that would enable it to balance the quality and quantity of its intervention. However,
many jurists from liberal backgrounds read it as a confirm of traditional 19th century images of
the legal order, just subjecting a phenomenon such as syndicalism, dangerously wont to produce
conflicts and social unrest, to State control, especially looking at the prohibition, under pain of
criminal prosecution, of strikes and lockouts6.

224 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 224-242, maio-agosto 2018
Corporatism and neo-corporatism: developments in the 20th-century Italian legal order

Actually, it inaugurated a whole new season in the relations between State and syndicates.
The legal recognition7, the right to conclude collective agreements8 or have recourse to the
magistracy of labour9 , and the strategic ambiguity of some legislative definitions,10 together
with the massive government presence in the life of Unions11, did not describe the indecisive
oscillation between the granting of autonomy and reaffirmed need of a controlling State (Stol-
zi, 2007: 33-35). They rather expressed the lucid choice of those who had understood that
governing the changing dynamics of the new society required sufficient room for manoeuvre;
thus, the State stood the sole arbiter of collective life, able manipulator of the pawns that
gravitated around its space. It remained alone, without, however, being isolated, precisely
because it had succeeded in creating channels for identifying and cataloguing the society
subjected to its power.
The attribution to the syndicates of such tasks as aiding, selecting and moralising mem-
bers was, thus, perfectly consistent with this approach: not only were they designed to com-
pensate for the suppression of the demands and conflictual aspects of trade unions, but also
deemed necessary, in a positive sense, to define the legal space of individuals on new bases.
On the one hand, in fact, States with a totalitarian vocation “show a constant concern for their
subjects, without precedents in the nineteenth century tradition” (Costa, 2001: 364), and the
quality and quantity of individual needs that the State took upon itself increased accordingly.
At the same time, and not contradictorily, this unprecedented extended

“attention to subjects is directly proportional to the delegitimisation of their space […] the oldest
and most tenacious idea of liberty, liberty as immunitas and protected space, gives way before an
order that in order to sustain itself and develop must be able to count of the ‘total’ willingness and
compliance of its subjects, on the inexistence or in any case transitoriness of areas of freedom. […]
Liberty thus […] ceases presupposing a plurality of options and becomes a tool for reinforcing a
common faith” (Costa, 2001: 365).

Corporatism as a ‘new way’

T he best way to introduce our discussion regarding the second front of the interpreta-
tions of corporatism is probably to refer to it as a different way of construing history
and, more in general, the relationship between historical eras; according to the advocates of
the totalitarian system, corporatism should have served as one of the vehicles for achieving a
clean break between past and future, one of the instruments called on to validate fascism as
the starting point of a truly new chapter in history, finally capable overcoming the long-time

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 225-242, maio-agosto 2018 225
Irene Stolzi

vice of western civilisation and rethinking the relationships between public and private, state
and society. In the eyes of these authors, this vice could be summed up in a single world:
individualism. Individualism meant that the West, since the fall of the Roman Empire, had no
longer been able to ensure the prevalence of the State and its power of cohesion over the
disintegrating force of individuals and groups.
For those who decided to take the corporatist paradigm seriously – without, however,
embracing its totalitarian implications – it was necessary to start off from a different reading of
the relationship between past and future. The needed to delineate a new model of coexisten-
ce, capable of rising to the challenges posed by 20th century mass society and redefining the
boundaries of state sovereignty, based on the idea that there were some positive outgrowths
of the past that the present neither could nor should call into question. These undoubtedly
included the distinction between private and public. Moreover, there was the conviction that
the private realm should continue to embody a space of individual freedom and autonomy, not
left entirely in the grip of the new power of groups and of the State.
In this case as well, there was no uniform theoretical horizon. Indeed, looking on this
side of the legal thought on corporatism, the civil law expert Enrico Finzi, the legal philosopher
Widar Cesarini Sforza, the commercial law specialist Lorenzo Mossa and the constitutionalist
Costantino Mortati, they all had different theoretical profiles wholly remote from one another,
as their backgrounds lay in different disciplines, and they also differed in their ideological sen-
sibilities. Yet, they were convinced that corporatism should represent an opportunity to include
in the jurists’ agenda (at least) two questions, long avoided and eluded: the question of the
so-called functionalisation of subjective rights and the question of the role of the collective
dimension of law, the dimension of organised interests (Stolzi, 2007: 301 ss).
There’s no time to highlight in detail these interpretations; just a word to say that their
vision of individual rights, as the reflection on social interests, was considered capable of
transforming the traditional idea of private sphere, and to make it possible constraints and
freedoms, rights and duties, autonomy and participation to coexist. This was the direction
taken by the theories on property rights, represented as a discretional power, free and restric-
ted at the same tame (Finzi, 1935) and on enterprise (Mossa, 1935); and this was the direction
also taken by their reflections on organised interests (Cesarini Sforza, 1942). Their reflections
on corporatism were along these lines: neither a mere façade behind which to perpetuate
traditional images of the legal order, nor a bizarre masquerade staged by fascism to justify its
historical novelty; rather an option worthy of attention to the extent in which it would constitu-
te a breakthrough, a means for combining autonomy and heteronomy, market and regulation,

226 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 226-242, maio-agosto 2018
Corporatism and neo-corporatism: developments in the 20th-century Italian legal order

private and public. The disillusionment with corporatism, as implemented, arose essentially
from the fact that this very mechanism, which could have represented a positive chapter in
Italian history, did not succeed in becoming anything more than an inefficient expression of a
suffocating, bureaucratic authoritarianism. In such a context, those who called for corporatism
and the references to it contained in the 1942 Civil Code to be maintained, following the Libe-
ration in the conviction that a democratic framework could instil new life into the corporatist
idea – an idea that seemed to be able to mitigate the excessive power of the “capitalist ruling
classes” (Mossa, 1951: 111), once the authoritarian character it had taken on in the years of
fascism had been expunged – remained isolated voices.
As we all know, things went quite differently: included among the few “parasitic creatu-
res” (Calamandrei, 1945: 58) that infested the Code, the references to corporatism were dele-
ted from the body of the new legislative text. In the view of many legal experts, the purging of
such references served to render the 1942 Code a mere update of the previous Code of 1865,
a further expression of a traditionally individualistic and voluntaristic conception of private law,
which fascism had attempted, unsuccessfully, to chip away at. This widespread interpretation
was not shared by one prominent figure of the 20th century legal community, Filippo Vassalli,
who, among other things, was the true deus ex machina of the Civil Code of 1942. Despite
remaining convinced, from the first decade of the 20th century to the 1960s, private law shou-
ld remain the law that gave individual complete freedom in choosing the ends of their own
actions, and maintaining, accordingly, that every conceivable relationship between private and
public that departed from their reciprocal non-interference represented a threat to liberty and
the individual, Vassalli lucidly assessed the transformations of the 20th century and judged that
the Code, ‘his’ code, would be able to keep abreast of them, by placing private law in constant
contact with the area of social and public interests, and extending its scope to areas (enterpri-
se, labour) unknown to the 19th century legislator.
Precisely because it was the result of the work of jurists who were able to read and
interpret their times, the Civil Code of 1942 should be considered a fully 20th century code.
This does not imply that it was a legal translation of the ideology of fascism, of a regime
that, in Vassalli’s view, never succeeded in fully appropriating the law for itself, civil law
in particular, and its refined technical intricacies, which only the expert hands of the jurist
– and not the politician – were able to manage and adapt to processes characterised by
increased intermingling between private and public, which constituted a hallmark of the
20th century legal experience as a whole, not only those aspects tied to authoritarian or
totalitarian regimes (Vassalli, 1947).

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 227-242, maio-agosto 2018 227
Irene Stolzi

Corporatism as the ‘same way’

H owever, Vassalli’s attitude remained an isolated one, no doubt dictated by the need to
defend his own job as a code drafter, but also supported by his profound conviction
that jurists should be able to interpret the relationship between different historical times and
give their own contribution to navigating the waters between continuity and change.
We, thus, introduce the discussion on the third – and last – front of legal reflection
on corporatism. Although, in this case as well, we see a significant variety and complexity
of positions, a common denominator can be found in what I have elsewhere referred to as
reductive arguments (Stolzi, 2007). Both in the private and public law realms, the prevailing
attitude was to try and fit, to reduce, the main novelties of the 20th century panorama into
the usual interpretative schemes, as if the jurists’ mission consisted solely in classification
and on insisting on the eternal validity of the traditional – and traditionally individualistic
– conception of law.
The interpretation of corporatism was no exception: never considered as an overall theory
concept capable of completely redefining the relationship between State and society, its as-
sessment was segmented, limited to individual parts. Not that this prevented an appreciation
of some of its manifestations – e.g. Carnelutti’s position on the syndical law – or rather of
that parts were the ones it was deemed possible to fit in with a traditional view of the legal
order, characterised, as such, by a clear separation between private-individual and public-state
matters. Whereas every reference to corporatism as a design intended to create a different
structuring of the legal and political realms was regarded with scepticism, even destined in
itself to fail due to subverting an image of the existing order (founded on the basic non-inter-
ference between society and state).
This way of approaching corporatism and the 20th century in general produced significant
consequences especially after the fall of fascism; in particular, such interpretations served as
a basis for portraying the regime as merely a parenthesis, a malignant tumour that could be
contained and circumscribed within the chronological limits of the regime, and then promptly
forgotten. That an author of Calamandrei’s calibre would suggest “let’s take up the path again
as if we had left it yesterday” (Calamandrei, 1950: 273-274) clearly expressed what was
perhaps the most common attitude among jurists, i.e. the idea that it was possible to confront
the period following the end of fascism by re-proposing 19th-century images of the legal order

228 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 228-242, maio-agosto 2018
Corporatism and neo-corporatism: developments in the 20th-century Italian legal order

and, with them, the idea of an abstract ‘technical’ legal knowledge, remote from the impure
terrain of politics13.
This persistence of a certain way of conceiving law and the jurists’ role beyond time and
the needs of the time in which it had arisen represented a characteristic of trait of Italian legal
thought in the first decade of Republican Italy. Perhaps the most eloquent evidence of this lies
precisely in the way in which the legal community approached the text of the Italian Consti-
tution of 1948. Belonging to the family of 20th-century democratic constitutions (Fioravanti,
2017), the Republican charter did not limit itself – unlike 19th-century liberal constitutions
– to specifying the State’s powers and establishing a limited catalogue of individual rights and
freedoms, but rather embraced the entire life of the community, outlining a notion of coexis-
tence that was defined on the basis of the relations among all the elements making it up and
which envisaged the private, collective and public, political, legal and economic dimensions
as being interconnected in the new republican life. Faced with such daunting prospects, a
large part of the legal community ventured interpretations aimed at reducing the impact of
the newborn constitution on the Italian legal system; the unity of the structure of the constitu-
tional text was undermined, in particular, by the distinction, introduced through decision case
law12 and echoed by many jurists, between preceptive constitutional rules and programmatic
rules, that is, between rules that were immediately applicable and rules that, by contrast, could
take on a normative value only if translated into specific legislation.
Apart from a few noteworthy exceptions14, it was not until the second half of the 1950s
– the establishment of the Constitutional Court in 1956 was decisive in this respect – that the
intimate coherence of the Republican Constitution was recognised, along with its function as
a fundamentally normative instrument, an authentic driving force of the life of the Republic.

Neo-corporativism in Italian democracy

T he question we need to ask ourselves at this point is therefore: where did the issue of
neo-corporatism come from? What link does it have with the interwar doctrine of corpo-
ratism and with the idea of coexistence enshrined in the Italian Constitution?
The term neo-corporatism was used in Italy and elsewhere (Vardaro, 1988) in reference
to trilateral agreements between the government, employers’ organisations and trade unions
which had a significant role over a fifteen-year period of Italian history, starting from the
beginning of the 1980s and up to the end of the millennium. The birth of such forms of social
concertation is usually tied to the so-called Scotti Protocol of 1983, whilst the last act of this

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 229-242, maio-agosto 2018 229
Irene Stolzi

model of relations between the state and trade unions is the so-called Christmas Pact of 1998.
Lying somewhere in the middle is the Ciampi-Giugni protocol, which attempted, albeit unsuc-
cessfully, to institutionalise practices of concerted action, that is, to make them an ordinary
tool for managing economic relations and guiding the main choices of industrial policy. The
meaning attributed to corporatism warrants clarification: although, starting from the 1960s,
the terms ‘corporatism/corporate’ were used to indicate processes towards an increasingly lo-
bby-based segmentation of society, and the consequent prevalence of particularistic interests
over the general interest, about concertation, the reference to corporatism has described – as
in the years of fascism – quite the opposite, i.e. an aspiration to guarantee the fulfilment of
some general interests through procedures that replaced conflict with bargaining among the
parties involved. Moreover, the role of the State was never envisaged as a mere arbitrator, a
simple mediator between the parties (lobbies), but rather as a subject called upon to make
a decisive contribution in discerning and defining what could be regarded as a general inte-
rest14. On the other hand, the prefix ‘neo-’, placed before the word corporatism, was meant
to indicate a significant change in course compared to the experience of fascism: democratic
corporatism was new first of all because it presupposed trade union pluralism; secondly, be-
cause it did not rule out the possibility of conflict between the parties or recourse to the typical
instruments of democratic conflict, such as strikes; finally, because an agreement was seen
as the hoped-for, but not mandatory, outcome of the bargaining, which the parties were not
obliged to participate in.
Reconstructing, from closer up, the context in which the practices of neo-corporatist
agreements and the objectives it was believed they could achieve were born and developed,
we basically note that those practices, too, arose from the perception of an ongoing crisis and
were an attempt to provide a response capable of creating a relationship among the many
different levels and players involved in the country’s economic policy.
Just a quick glance at the agreements in question to show, despite not having identical
contents, they are all similar for a particularly broad array of interventions. They do not limit
themselves, in particular, to addressing the aspects most directly tied to employment rela-
tionships (pay, working hours, retirement benefits, etc.), but include references to such aspects
within a broader policy framework aimed at holding together a number of different plans
(tax-related aspects; additional benefits for dependent children; the containment of prices and
fees for transport, electricity, and healthcare; the conditions for access to social safety net pro-
grammes; etc).What emerges, therefore, is a planning attempt that aims not only at achieving,
through State intervention, a truce among contenders, i.e. trade unions and employers, but

230 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 230-242, maio-agosto 2018
Corporatism and neo-corporatism: developments in the 20th-century Italian legal order

also involving them in the realisation of a shared future coexistence that would withstand the
impact of the simultaneous transformation of the economic and political systems. The second
half of the 1970s coincided, in fact, with the weakening of the driving force that had characte-
rised the “Glorious Thirty” and had enabled the country to undergo profound transformation
within a relatively short space of time16.
The fact that work occupied an important place in this trajectory of development of the
legal order is not surprising; indeed, the central importance attributed to work enables us to
address one of the questions posed at the start of this section, namely, the relationship be-
tween neo-corporatism and the Constitution. This is a question that can probably be answe-
red only by considering the role of work acknowledged by the Republican constitution; even
leaving aside the solemn incipit – Art. 1: “Italy is a democratic republic founded on labour”
– the Constitution links work to two key concepts of the democratic lexicon, freedom and
dignity (Art. 36). Considered a powerful vehicle of emancipation (not only economic) of the
person, and hence tied to the freedom to build one’s own destiny, work is simultaneously
regarded as an essential means of relating to the world and belonging to a democratic com-
munity. Art. 4 of the constitutional text states this in a crystal-clear manner: “The Republic
recognises the right of all citizens to work and promotes those conditions which render this
right effective”; the article then continues by indissolubly linking rights and duties, autonomy
and belonging: “Every citizen has the duty, according to personal potential and individual
choice, to perform an activity or a function that contributes to the material or spiritual pro-
gress of society.” Then, of course, work comes into the text of the Constitution also in its
collective, unionist dimension. Only that the provision in question, Art. 39, would become one
of the most hotly debated (and criticised) in the life of the Republic. Indeed, on one hand the
expression that opened the article – “Trade unions may be freely established” – marked a
clear break with fascism, on the other the rest of the article,17 which authorised only registe-
red trade unions to enter into collective agreements with erga omnes effects, opened some
issues. The obligation of registration – it was argued – risked placing trade unions under
State control, paving the way to solutions dangerously similar to the ones experienced during
the years of dictatorship.18 Despite being formally abolished, unlike so many norms and insti-
tutions that were transmitted from fascism to the republic largely intact, corporatism seemed
nonetheless capable of casting its authoritarian shadow over every proposal that envisaged
a stable link between public power and the rights of labour organisations in the new repu-
blican context. It was, thus, not by going through the registration procedure provided for in
Art. 39 – a procedure that was never implemented – that trade unions in Italy achieved the

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 231-242, maio-agosto 2018 231
Irene Stolzi

institutional stature that contributed to making them, at least for a certain number of years,
a major player when it came to economic policy choices.
Without a doubt, a decisive step in this process was the introduction of the Workers’
Statute (Act 300 of 1970), a legislative text that, for the first time, established a stable link be-
tween the individual and collective dimensions of employment relationships. That is, they were
seen as two complementary aspects, necessary in order to address both the problem of worker
protection in the workplace and the more general issue of the existing balance of power in
the realm of production. In the text of the Statute, considerable attention is focused on the
rights and freedoms of the individual in the workplace19, not depending on whether individual
workers join the union; at the same time, promoted the solid roots of trade unions within
enterprises as an essential means for the expression and protection of those same individual
rights and freedoms (Stolzi, 2014). Therefore, this type of legislation was deemed capable of
transforming trade unions into an effective countervailing power, an essential player in socioe-
conomic dynamics; however, such an objective – according to the vision adopted by the father
of the Statute, Gino Giugni – should not be pursued by wrapping trade unions in a protective
membrane constructed by the State, nor by relying on the recipe provided in Art. 39 (which
Giugni regarded as “illusory”), Giugni (1997: 124) rather by creating conditions that would
enable trade unions to grow and develop ‘from below’, as a typical, essential organisation of
the economic and social realms.
These brief notes, as background information on the subject of neo-corporatism, enable
us to formulate two observations.
The taboo of “collective”, the organisation of occupational interests, was overcome by
embracing the private-social conception of trade unions, which proudly declared their distance
from interwar notions of corporatism. Not only – as it is clear – from authoritarian or totalita-
rian visions of corporatism, but also from those associated with the second front of interpreta-
tion, as discussed in the previous paragraphs. Behind the emphasis on the collective dimension
of the law and on trade unions as a necessary and beneficial expression of organised interests,
it was not possible to find any trace of ideas resembling those of Mossa, Cesarini Sforza, or
Finzi. That scientific approach, for various reasons, tended to expire along with its authors, or
in any case did not exert any influence on the discussion among labour law specialists. Howe-
ver, it was precisely labour law that formed the theoretical and institutional context leading
to reflections on the role of trade union organisations, which would be essential in order to
define the contours of neo-corporatism. Underlying the vision of Giugni and, in general, of the
new generation of labour law specialists, there was an important process of methodological

232 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 232-242, maio-agosto 2018
Corporatism and neo-corporatism: developments in the 20th-century Italian legal order

renewal which had been triggered by a private notion of labour law, a sort of expansion of
the categories of private law in a social direction. From this starting point, trade unions sought
to take on a role as an essential element of the democratic dialectic, a necessary presence in
workplaces, but also, as a player that could attain a strong position in the legal system overall
and have a major impact on economic policy choices. Considerable headway in this direction
was achieved by a judgment of the Constitutional Court (no. 290 of 1972), which recognised
the legitimacy of political strikes, that is, of strikes “aimed at influencing governmental and
parliamentary decisions” (De Luca Tamajo, 2008: 105) as a means of “workers’ participation
in the political, economic and social organisation of the country” (De Luca Tamajo, 2008:
105). “The symbolic value of this acknowledgement was considerable, as it gave rise to a le-
gitimisation of trade unions exerting their power of protest outside a specific company setting
and an implicit recognition of their fundamental role in the overall constitutional balance”
(De Luca Tamajo, 2008: 105), so much so that this judgment of the Constitutional Court was
highlighted as playing a role in favouring the planting of the first “seeds of neo-corporatism”
(De Luca Tamajo, 2008: 114).
Then, this vision of the trade union as a social formation that, if placed in a position to
express itself, might succeed in gaining, with its own strength, an incisive role in legal and
political dynamics, works as long as it is sustained by a certain structuring of the economy and
production and of the political system. As long as a large part of wage earners are employed
in factories and the universe of white collar workers is characterised by serial tasks with a low
degree of specialisation; as long as many are working under the same roof and the workplace
also becomes the place of a common identity; as long as there are just a few types of employ-
ment contracts with relatively uniform characteristics which lend themselves to being negotia-
ted as a whole by trade unions; as long as the economy has a prevalently national dimension
and the national players (enterprises, State, trade unions) have a decisive role in it, one might
imagine a scheme of relationships that combines private citizenry represented by opposing
unions and a role consisting prevalently of mediation performed by the State.
However, when this framework of reference begins to crumble, the game becomes com-
plicated for everyone. The phenomena that, starting from the mid-1970s, have presented
themselves to the historian are,thus, many, contradictory, and are still largely ongoing: on
the one hand, new watchwords have begun to circulate – efficiency, productivity, flexibili-
ty – which do not have an identical meaning, but all seem to describe the need for greater
correspondence (also) between the organisation of work and evolution of the economic and
production systems; on the other hand, we are witnessing an increasing reliance on welfare-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 233-242, maio-agosto 2018 233
Irene Stolzi

-type measures in the State’s intervention (from the bailout of companies with public funds
to massive recourse to the wage supplementation fund), a trend that denotes the system’s
difficulty in coming up with answers capable of ensuring a real recovery of competitiveness for
both businesses and workers (Stolzi, 2015).
It is at this historical turning point, not coincidentally, that reliance on the so-called neo-
-corporative model of concerted action has gained ground. That the new types of relationships
between government and social partners fit into the framework of a “political exchange”,
which also reflects their need to reaffirm their (increasingly threatened) centrality, appears to
be beyond doubt. At the same time, reading this phenomenon in light of a single transition
– from the trade union’s economic role to its political role – risks being reductive. If, indeed,
we consider politics as the place for elaborating a certain vision of coexistence, and, of the re-
lationships deemed relevant for the purpose of producing that vision, trade unions express by
necessity a political vocation, whether it be tied to workers’ demands, or lays emphasis on its
different ‘post-conflictual’ role. If anything, a distinctive feature of neo-corporatist agreements
lies in the fact that they see the “work issue” as one of the decisive variables for defining the
overall equilibrium of a given socio-political and economic system: by placing work at the
centre of a web of interdependences and relationships (welfare, social safety net, cost of life,
contract types etc.), regarded as essential for defining the conditions of citizens in the legal
system, such agreements may perhaps be viewed as the extreme (last?) attempt to devise an
overall plan of national economic policy, as a response aimed at (re)creating, in view of (and
as a consequence of) the multiplication of the areas of crisis and regulatory demands, a per-
ception of time that is sensitive to the prospect of planning and of the future. The concerted
action has been relied for sure as a means of accompanying decisive phases in the life of the
legal system. An attempt to square the circle, which, since the second half of the 1970s, has
featured increasingly high on the country’s agenda, to find ways to curb public spending and
unemployment and at the same time re-launch business and job opportunities.
It is not surprising, therefore, that efforts at concertation resumed starting from the early
1990s: the end of the first Republic, the irreversible crisis of the old party system, together with
the challenging objectives laid down in the Maastricht Treaty – signed by Italy in 1992 – in
fact favoured the adoption of procedures considered capable of assuring a transition towards
new economic policy goals while avoiding (excessive) conflict. It was not only the “technical”
governments formed following the “Tangentopoli” bribery scandal that relied on concerted
action20 (Amato, Ciampi and in part the Dini government for pension reform); subsequent cen-
tre-left governments (Prodi, D’Alema, Prodi)21 also adopted this approach, whereas centre-ri-

234 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 234-242, maio-agosto 2018
Corporatism and neo-corporatism: developments in the 20th-century Italian legal order

ght governments sought to reaffirm the centrality/autonomy of government choices, tempered


and, at the same time, favoured, starting from the beginning of the new millennium by the
adoption of the so-called “method of social dialogue”. The latter was founded, precisely, on
seeking a dialogue, though not necessarily an agreement, with social partners, given that, in
the event of a lack of convergence, the government judged that it could act autonomously.22
What role the new political era that began in 2001 with the Berlusconi government
played in bringing about the breakdown of concertation, or whether that breakdown is tied,
more profoundly, to the increasing difficulty in imagining the lines along which the future
should be built, are questions that lie beyond the scope of this essay. It is certainly possible to
acknowledge a dual phenomenon: on the one hand, the notion of “work” risks losing its role
as the cornerstone of democratic citizenship; on the other hand, accordingly, the State and
trade unions, for different reasons, are experiencing a particularly critical period, which seems
to have impacted their very identity as indispensable representatives of economic power.
In this regard, it appears especially significant that the main Italian trade union orga-
nisation, the CGIL (Italian General Confederation of Labour), drew up, in 2015, a Carta dei
diritti universali del lavoro (Charter of Universal Labour Rights) which provides (Art. 28) for
a mechanism of trade union registration similar to the one envisaged by Art. 39 of the Consti-
tution. This is significant precisely because Art. 39 was long considered negatively by the trade
union organisations themselves, as they saw it as posing a threat of excessive public control
over their life and, for this, too close to the fascist idea of corporatism; whereas now, in the
current atmosphere of crisis and uncertainty, registration is considered a useful instrument
for certifying the trade union’s existence and ensuring it possesses a strong institutional role.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 235-242, maio-agosto 2018 235
Irene Stolzi

Notes

1 Mazzacane; Stolleis; Somma (Ed.), 2005; Pasetti, 2016; Costa Pinto (Ed.), 2016; Costa Pinto (Ed.), 2017.
2 Due to space, I will not examine the catholic corporatism, although it embodies a relevant chapter to come
into contact with the many different faces of the corporative galaxy along 19th and 20th centuries. Rooted
in a strong anti-statualistic view (especially in its Italian version, conditioned by the conflictual relationship
between Church and State during the political unification process), this side of reflections on corporatism
criticized, in most of their expressions, the State-based corporatism promoted by fascism. At the same time,
the interpretation of corporatism brought by the Regime represented a stimulus to reaffirm the differences,
but also to deepen the reflection on the role that the State should play in the contemporaneity. See: Cerasi,
2017; Pollard, 2017.

3 Costa, 1986; Mazzacane (Ed.), 2002; Santomassimo, 2006; Stolzi, 2007; Gagliardi, 2010; Cassese, 2010;
Cau, 2010. denis, 2007, p. 189-35.olution*. llo tansiero giuridico moderno, pp. tinuità dello Statoidica dell’

4 In the fascist period, references to corporatism alluded to an overall project of social, political and economic
reform, a project that was supposed to develop in two successive and interdependent phases. The first phase,
termed “union corporatism” – the only one, as we see in the next pages, which received an adequate norma-
tive and institutional expression – was based on the legal recognition of unions of workers and employers.
In contrast, the second, more authentically corporatist phase provided for the formation of corporations, that
is, organs of the state made up of elements drawn from unions, the administrative apparatus of the state,
and the National Fascist Party. Corporate groups were to be entrusted the task of promoting and realizing a
so-called third-way model of economic organization: that is to say, they were intended to promote a system of
economic-production relations capable of combining the continued respect for property and private initiative
with various patterns of public intervention in economic matters (from direct intervention intended to have
restricted scope, to the imposition of qualitative and quantitative results on production activities, which was
intended to become the general rule).

5 A syntesis of the main historiographical interpretations of fascism and their changings can be read in Stolzi, 2014.
6 Arts. 18 et seq. (lockouts were prohibited only if carried out “without a justified motive”).
7 As it is well known, the law did not expressly state that only Fascist syndicates would be granted recogni-
tion, but Art. 1 para. 3 established, among the conditions to be met in order to obtain recognition, that the
syndicate leaders would have to give “assurance of their competence, morality and secure national faith”.
Moreover, Rocco himself clarified the meaning of the legislative expression: “we have no difficulty – these
his own words – in declaring this very moment that recognition will be given to Fascist syndicates” (Rocco,
1926: 387). That this recognition represented a sort of wedge, a means of sanctioning the State’s entry into
the dynamics of labour relations and promoting the widespread expansion of its power, is confirmed by what
would today be called the representativeness required of Fascist syndicates, which was particularly low. On the
employers’ side, it was in fact sufficient that the syndicates asking for recognition employed 1/10 of the total
workers “employed by enterprises of the type for which the association was established, existing in the district
where the enterprise operates” (Art.1, para. 1); on the workers’ side, it was necessary that those who joined
the Fascist syndicate represented “at least one tenth of the workers in the category for which the association
was established, existing in the district where the association operates” (Art.1, para. 1). Since for each cate-

236 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 236-242, maio-agosto 2018
Corporatism and neo-corporatism: developments in the 20th-century Italian legal order

gory of workers and employers only one association could be recognised (Art. 6, para. 3), the provision was
clearly intended to ensure the survival of Fascist syndicates only.

8 Art. 10 authorised recognised syndicates to conclude collective labour agreements with erga omnes effect.
9 Arts. 13-17 settled magistracy of labour with jurisdiction over collective labour disputes.
10 It has been noted, for example, that the ambiguity in the definition of collective bargaining (regulatory vs.
negotiating aspects) could allow the executive ample space for manoeuvre, especially in cases referred to the
judicial authority. See: Jocteatu, 1979: 118; observations of a similar kind can be found in 1978: 64 and 80.

11 In my opinion, this is a decisive aspect of the legislative text in question; what was envisaged was not, in
fact, simply state direction of the life of syndical associations, but the possibility for the government authority
to intervene in every aspect of the life of institutions, fully confirming the idea of a regulatory system that
allowed wide margins in determining the amount of (illusions of) autonomy and outside interventions; merely
by way of example, see the provisions relating to the recognition of associations (Art. 4); the disciplinary power
exercised over them by federations and confederations (Art. 6); the appointment of presidents and secretaries
of associations to be approved by ministries (Art. 7); the supervision of the Prefect or Minister over the life of
associations (Art. 8); the revocation of recognition (Art. 9).

12 Corte di Cassazione; Sezioni Unite penali, 7th February, 1948. See: Gregorio, 2006.
13 See: Teti, 1990; Cappellini, 1999.
14 Finzi, 1950; Barile, 1951.
15 In this regard, Vardaro speaks of neo-corporatism as an instrument that was born and developed in the
context of a “reaffirmed centrality of the State” (Vardaro, 1988: 20). Tiziano Treu defines neo-corporatism as a
“child, but a polemical one, of conflictual pluralism” i.e. an idea of coexistence that does not reject the idea of
pluralism, but which, at the same time, sees the State as a strong decision-maker, not a mere arbiter between
the interests in play (Treu, 1988: 440).

16 From rules concerning individual dismissals of employees (1966), to the protection of working women
(1963/ 1971/ 1977), from the creation of child care facilities to the reform of family law (1971/ 1975), from
the introduction of divorce (1970) to fair rents (1968), from the Workers’ Statute (1970) to the establishment
of the national health service (1978), what took shape from the 1950s to the end of the 1970s was a set of
legislative provisions that attempted to realise an idea of coexistence consistent with the objectives of social
justice and economic development laid down in the Constitution.

17 “No obligations may be imposed on trade unions other than registration at local or central offices, accor-
ding to the provisions of the law. A condition for registration is that the statutes of the trade unions establish
their internal organisation on a democratic basis. Registered trade unions are legal persons. They may, through
a unified representation that is proportional to their membership, enter into collective labour agreements that
have a mandatory effect for all persons belonging to the categories referred to in the agreement”.

18 A warning to this effect was given, for example, in G.F. Mancini’s well-known lecture in Bologna in 1963.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 237-242, maio-agosto 2018 237
Irene Stolzi

19 Art. 1 provides that workers, without distinction as to political opinion, trade union affiliation or religious
faith, have the right, in the places where they work, to freely manifest their thought, in observance of the
principles of the Constitution and the provisions of the law in question; a similar approach may be seen in
all of the provisions of Title I of the law (Of the freedom and dignity of workers) aimed at strictly delimiting
employers’ activities of oversight and monitoring of workers through security guards (Art.2), the use of audio-
-visual systems (Art. 4), health check-ups (Art. 5) and personal inspections (Art. 6).

20 A Protocol on “incomes policy, combating inflation and the cost of labour” was issued on 31st July, 1992.
It made express reference to “an economic and financial situation that risks worsening further” and declared
that an “action to rein in inflation and a significant reduction in government debt” had to be pursued without
delay. “The objective – we read – is not only to get back in line with the parameters of the Treaty of Maastri-
cht” but also ”to save our development potentialities «in order to avoid jeopardising […] what Italian labour
has built over the decades and the prospects for economic security of a large part of the national community”.
Among other things, it provides for the abolition of the sliding pay scale system; the so-called Ciampi-Giugni
Protocol is dated 23rd July, 1993.

21 On 24th December 1996, a Pact for Employment was signed with the aim of “favouring active gover-
nance of employment dynamics and absorbing unemployment without triggering inflationary spirals”; an
outgrowth of this agreement is the so-called “Treu Package” (Law 196 of 1997), which will be touched upon
shortly. On 22nd December 1998, on the other hand, the so-called Christmas Pact was signed, under the
D’Alema government (see Martone, 2009: 16 ff.).– A “Protocol on welfare, work and competitiveness: toward
equity and sustainable growth” was signed under the second Prodi government on 23rd July 2007 – but this
falls outside the chronological scope of this essay.

22 A model that has a central role in the so-called White Paper on the Labour Market in Italy, behind which
lies the work of Marco Biagi, and which was presented in October 2001; moreover, the Treu Package (Art.
11, law 196 of 1997) aimed above all “to try to stem the centrifugal forces of autonomous trade unionism”
(Martone, 2009: 65), providing that “in the case of inaction or disagreement among the comparatively most
representative trade union organisations, the power to identify the possibility of temporary agency work shall
return to the legislative authority”.

Bibliography

BARILE, Paolo. La costituzione come norma giuridica: profilo sistematico. Firenze: Barbera, 1951.
BOTTAI, Giuseppe. Speech. [May 31st, 1928]. Speech delivered before the Senate of the Kingdom. In: Espe-
rienza corporativa. Roma: Edizioni del diritto del lavoro, 1929.
CALAMANDREI, Piero. Processo e giustizia. Rivista di diritto processuale, V, 1950.
______. Sulla riforma dei codici (1945). In: Costruire la democrazia: Premesse alla costituente. Firenze:
Vallecchi, 1955.
CAPPELLINI, Paolo. Il fascismo invisibile: Una ipotesi di esperimento storiografico sui rapporti tra codificazione
civile e regime. Quaderni fiorentini per la storia del pensiero giuridico moderno. v. 28, t. 1, 1999.

238 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 238-242, maio-agosto 2018
Corporatism and neo-corporatism: developments in the 20th-century Italian legal order

CARNELLUTTI, Francesco. Stato democratico: Stato corporativo (1949). In: Verso il corporativismo democra-
tico. Bari: Cacucci, 1951.
______. Sciopero e giudizio (1949). In: Discorsi intorno al diritto. Padova: Cedam, 1953.
CASSESE, Sabino. Lo Stato fascista. Bologna: Il Mulino, 2010.
CAU, Maurizio. Un nuovo ordine tra Stato e società. Recenti ricerche sul corporativismo. Storica, v. 48, p.
135-163, 2010.
CERASI, Laura. Rethinking italian corporatism: Crossing borders between corporatist projects in the late
liberal era and the fascist corporatist State. In: COSTA PINTO, António. (Ed.), p. 103-123, 2017.
COSTA PINTO, António (Ed.). A vaga corporativa: Corporativismo e ditaduras na Europa e America Latina.
Lisboa: F. Palomares Martinho, 2016.
______. Corporatism and Fascism: The corporatist wave in Europe. London/New York: Routledge, 2017.
COSTA, Pietro. Civitas - Storia della cittadinanza in Europa, IV: L’età dei totalitarismi e della democrazia.
Roma/Bari: Laterza, 2001.
______. Lo Stato immaginario: Metafore e paradigmi nella cultura giuridica italiana fra Otto e Novecento.
Milano: Giuffrè, 1986.
DE LUCA TAMAJO, Raffaele. Gli anni 70: dai fasti del garantismo al diritto del lavoro dell’emergenza. In:
ICHINO (Ed.). Il diritto del lavoro nell’Italia repubblicana. Milano: Giuffrè, 2008.
FINZI, Enrico. Riflessi privatistici della Costituzione. In: CALAMANDREI, Piero;LEVI, Alessandro. (Ed.). Commen-
tario sistematico alla costituzione italiana, v. 1, Firenze: Barbera, 1950.
______. Diritto di proprietà e disciplina della produzione. In: Atti del primo congresso nazionale di diritto
agrario. Firenze: Ricci, 1935.
FIORAVANTI, Maurizio. Art.2. Roma: Carocci, 2017.
GAETA, Lorenzo. Il lavoro e il diritto: un percorso storico. Bari: Cacucci, 2013.
GAGLIARDI, Alessio. Il corporativismo fascista. Roma/Bari: Laterza, 2010.
GIUGNI, Gino. La lenta liberazione dall’eredità del sindacalismo corporativo. In: FRANCESCHINI, Claudia;
GUERRIERI, Sandro;MONINA, Giancarlo (Ed.). In: Le idee costituzionali della Resistenza. Roma: Presidenza
del Consiglio dei Ministri, 1997.
GREGORIO, Massimiliano. Quale Costituzione? Le interpretazioni della giuspubblicistica nell’immediato dopo-
guerra. Quaderni fiorentini per la storia del pensiero giuridico moderno, v. 35, 2006.
JOCTEAU, Gian Carlo. La contrattazione collettiva – aspetti legislativi e istituzionali - 1926-1934, Annali –
Fondazione Giangiacomo Feltrinelli, 20, 1979-1980.
______. La magistratura e i conflitti di lavoro durante il fascismo – 1926/1934. Milano: Feltrinelli, 1979.
MANCINI, Federico. Libertà sindacale e contratto collettivo erga omnes (1963). Il Mulino. 3, 1964.
MARTONE, Michel. La concertazione nell’esperienza italiana. In: Europa e concertazione. Modelli a confron-
to. Padova: Cedam, 2009.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 239-242, maio-agosto 2018 239
Irene Stolzi

MAZZACANE, Aldo; STOLLEIS, Micheil; SOMMA, Alessandro (Ed.). Korporativismus in den sudeuropaische
Diktaturen. Frankfurt: Klosterman, 2005.
MAZZACANE, Aldo (Ed.). Diritto, economia e istituzioni nell’Italia fascista. Nomos: Baden Baden, 2002.

MOSSA, Lorenzo. L’impresa nell’ordine corporativo. Firenze: Sansoni, 1935.

______. Stato del diritto del lavoro in Italia. Nuova Rivista di diritto commerciale, diritto dell’economia,
diritto sociale, V, 1951.
PANUNZIO, Sergio. Stato e diritto: L’unità dello Stato e la pluralità degli ordinamenti giuridici. Modena: Società
tipografica modenese, 1931.

PASETTI, Matteo. L’Europa corporativa. Una storia transnazionale tra le due guerre mondiali. Bologna: Bono-
nia University Press, 2016.

PAVONE, Carlo. Alle origini della Repubblica: Scritti su fascismo, antifascismo e continuità dello Stato. Torino:
Bollati Boringhieri, 1995.

POLLARD, John. Corporatism and political Catholicism: the impact of Catholic corporatism in inter-war
Europe. In: COSTA PINTO, António (Ed.). p. 42-59, 2017.
PUGLIATTI, Salvatore. La giurisprudenza come scienza pratica. Rivista italiana per le scienze giuridiche, IV,
1950.

ROCCO, Alfredo, La trasformazione dello Stato – dallo Stato liberale allo Stato fascista. Roma: La Voce
anonima editrice, 1927.

______. Speech. [Nov. 1920]. Crisi dello Stato e sindacati. Inaugural address for the academic year 1920-
1921, read at the University of Padova. In: Scritti e discorsi politici, v.2, Milano: Giuffrè, 1938.

______. Speech. [Mar. 11th 1926]. Legge sulla disciplina politica dei rapporti collettivi del lavoro. Speech
delivered before the Senate of the Kingdom. In: La trasformazione dello Stato. Dallo Stato liberale allo Stato
fascista. Roma: La voce anonima editrice, 1927.
______. Speech. [Feb. 27th 1928]. Relazione sul disegno di legge sulla riforma della rappresentanza poli-
tica. Speech delivered before the Chamber of Deputy. In: Scritti e discorsi politici, v.3. Milano: Giuffrè, 1938.
ROSSI, Ernesto. I padroni del vapore. Bari: Laterza, 1957.

SANTOMASSIMO, Gian Pasquale. La terza via fascista: Il mito del corporativismo. Roma: Carocci, 2006.

STOLZI, Irene. Fascismo e cultura giuridica: persistenze ed evoluzioni della storiografia. Rivista di storia del
diritto italiano, v. 87, 2014.
______. Il diritto, i diritti. In: MUSSO, Stefano (Ed.). Storia del lavoro in Italia – il Novecento – 1945-2000: la
ricostruzione, il miracolo economico, la globalizzazione Roma: Castelvecchi , p. 335-377, 2015.
______. L’ordine corporativo: Poteri organizzati e organizzazione del potere nella riflessione giuridica
dell’Italia fascista. Milano: Giuffrè, 2007.

TETI, Raffaele. Codice civile e regime fascista. Milano: Giuffrè, 1990.

240 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 240-242, maio-agosto 2018
Corporatism and neo-corporatism: developments in the 20th-century Italian legal order

TREU, Tiziano. Liberalismo, corporativismo, pluralismo: quale futuro per il diritto del lavoro in Italia? In:
VARDARO, Gaetano (Ed.), 1988.

UNGARI, Paolo. Alfredo Rocco e l’ideologia giuridica del fascismo. Morcelliana: Brescia, 1963.

VARDARO, Gaetano (Ed.). Diritto del lavoro e corporativismi in Europa: ieri e oggi. Milano: Angeli, 1988.

VASSALLI, Filippo. Della legislazione di guerra e dei nuovi confini del diritto privato (1918). In: Studi giuridici.
Milano: Giuffrè, , v. 2, 1960.

______. Estrastatualità del diritto civile (1951). In: Studi giuridici, v.3, Milano: Giuffrè, 1960.

______. Motivi e caratteri della codificazione civile (1947). In: Studi giuridici, v. 3, Milano: Giuffrè, 1960.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 241-242, maio-agosto 2018 241
Ensaio Bibliográfico

CORPORATIVISMO E NEOCORPORATIVISMO
Corporatism and neocorporatism
Corporativismo y neocorporativismo

Cláudia M. R. ViscardiI*

http://dx.doi.org/10.1590/S2178-14942018000200007

I
Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Juiz de Fora – MG, Brasil.

* Professora titular da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e professora do Programa de Pós-Graduação em
História (PPGH) da mesma instituição. É bolsista de produtividade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientí-
fico e Tecnológico (CNPq) e pesquisadora da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig).
(claudiaviscardi.ufjf@gmail.com)

Artigo recebido em 1 de fevereiro de 2018 e aprovado para publicação em 8 de julho de 2018.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 243-256, maio-agosto 2018 243
Cláudia M. R. Viscardi

Resumo
Este artigo faz uma reflexão sobre a produção recente acerca do corporativismo e busca não só identificar as bali-
zas clássicas sobre as quais as discussões se apoiaram ao longo das décadas passadas, mas também propor uma
reflexão a respeito das abordagens mais novas sobre o tema no Brasil e suas conexões com o debate internacional.
O texto se divide em três partes. Na primeira, discute-se o conceito de corporativismo; na segunda, delineia-se o
debate nacional; por fim, identifica-se a emergência de abordagens mais atuais e de redes de pesquisa organizadas
em torno do tema. Foram priorizados artigos e capítulos de coletâneas para a redação do ensaio, obedecendo ao
formato assumido pelas produções mais modernas.

Palavras-chave: Corporativismo; Neocorporativismo; Debate intelectual; Redes de pesquisas.

Abstract
This paper is an analyses upon the recent production about corporatism, which seeks not only to identify the classic
supports on which the discussions have been based in the past decades, as well as to propose a reflection on the
most recent approaches on the subject in Brazil and its connections with the international debate. The article is
divided into three parts. In the first one the concept of corporativism is discussed; the second one delineates the
national debate; finally, the emergence of more recent approaches and research networks organized around the
theme are identified. Priority was given to articles and chapters of compilations, obeying the format assumed by the
most recent productions.

Keywords: Corporatism; Neocorporativism; Intellectual debate; Research networks.

Resumen
Este artículo hace una reflexión sobre la producción reciente acerca del corporativismo y busca no solo identificar los
faros clásicos en los que se apoyaron las discusiones a lo largo de las décadas pasadas, sino también proponer una
reflexión respecto a los enfoques más nuevos sobre el tema en Brasil y sus conexiones con el debate internacional.
El texto está dividido en tres partes. La primera discute el concepto de corporativismo, la segunda delinea el debate
nacional y, por último, la tercera identifica la emergencia de enfoques más actuales y redes de pesquisa organizadas
en torno al tema. Se priorizaron artículos y capítulos de colecciones para la redacción del ensayo, respetando el
formato asumido por las producciones más modernas.

Palabras clave: Corporativismo; Neocorporativismo; Debate intelectual; Redes de pesquisa.

244 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 244-256, maio-agosto 2018
Corporativismo e neocorporativismo

P retende-se, com este levantamento, examinar a produção recente, nacional e estrangeira


acerca do corporativismo. Tal desafio é por demais instigante em razão de algumas cons-
tatações prévias. A primeira é que o tema sempre foi e continua sendo objeto de investigação
de numerosos pesquisadores, nacionais e estrangeiros, o que alarga o espectro das análises
possíveis. A segunda é que a literatura sobre o assunto é bastante interdisciplinar, com predo-
mínio de cientistas políticos, historiadores e economistas, o que dificulta uma análise compa-
rativa homogênea. Por fim, o conceito passou por incessantes revisões, na medida em que seu
significado sofreu mudanças ao longo do tempo, o que demanda atenção para se evitarem
anacronismos. Em que pese os desafios citados, tentaremos propor ao leitor uma reflexão a
respeito de como o tema tem sido tratado pelo debate recente em curso.
Todo levantamento bibliográfico é muito arriscado. Por ser necessário fazer escolhas,
muitos autores importantes correm o risco de serem deixados de lado. Outra opção difícil diz
respeito à escolha entre livros, capítulos ou artigos. Inicialmente, pretendíamos apenas discutir
os primeiros. Mas, como se trata de um ensaio sobre obras mais recentes, os livros acerca do
tema se tornaram mais raros — até pela mudança que a literatura política tem passado, ao
priorizarem-se mais artigos de rápida produção e circulação do que as longas obras autorais,
cada vez mais difíceis de serem encontradas —, o que nos levou à eleição por coletâneas
e/ou artigos em periódicos mais qualificados. O número de autores a serem agregados na
discussão é limitado para expressar a pujança do tema. Tais riscos e desafios se somam aos
anteriormente elencados.
Para iniciar, faremos uma alusão aos trabalhos mais clássicos sobre o corporativismo que,
embora não sejam recentes, serviram de subsídios para as pesquisas posteriores. Em seguida,
tentaremos propor algumas correntes interpretativas construídas em torno do objeto pelo
debate desenvolvido no Brasil. Por fim, selecionamos e indicamos alguns autores que têm
buscado rediscutir o assunto em diálogo internacional.

Os conceitos clássicos de corporativismo

N este debate, não se justifica uma análise filológica do conceito nem de sua historicidade
para um período anterior àquele em que se tornou mais difundido: o das primeiras
décadas do século XX. Do sentido original, vinculado às corporações de ofício do medievo
restou apenas a ideia de que o corporativismo é uma organização societária que tem por base
um ofício ou uma profissão e que pode ser incorporada pelo Estado como uma modalidade
específica de representação de interesses. Portanto, o fato de a associação corporativa integrar

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 245-256, maio-agosto 2018 245
Cláudia M. R. Viscardi

o repertório de organizações disponíveis à sociedade civil mobilizada não garante, por si só,
a existência do corporativismo. Sindicatos, associações mutualistas, centrais sindicais ou fe-
derações de associações trabalhistas ou patronais, embora possam ser organizados em torno
de ofícios específicos, não são suficientes para qualificar um regime como corporativo. Outros
ingredientes se fazem necessários para o sucesso da receita. É preciso que tais corporações
atuem nos processos decisórios como representantes de suas respectivas categorias e que os
marcos legais de sua atuação sejam definidos pelo Estado. Da mesma forma, é preciso que
interfiram sobre os rumos dos acontecimentos, ou seja, que tenham capital político de efeito
real ou simbólico sobre eles.
Em alguns momentos específicos, as associações corporativas tiveram sua autonomia limi-
tada ou condicionada por interesses outros que não o de seus próprios membros e detiveram
o monopólio da representação de determinada categoria. O período em que todos esses ingre-
dientes estiveram disponíveis se deu, como experiência histórica, entre as décadas de 1920 e
1930, sendo que em alguns países — como no caso de Portugal —, a extensão foi maior.
A definição mais clássica do fenômeno, à qual a maioria dos escritos acerca do tema faz
referência, é a de Philippe Schmitter, que diz:

“O corporativismo pode ser definido como um sistema de representação de interesses no qual


as unidades constituintes são organizadas em um número limitado de categorias singulares,
compulsórias, não competitivas, hierarquicamente ordenadas e funcionalmente diferenciadas,
reconhecidas ou licenciadas (quando não criadas) pelo Estado, às quais é concedido monopólio
de representação dentro de sua respectiva categoria em troca da observância de certos contro-
les na seleção de seus líderes e na articulação de demandas e apoio” (1974: 43-44)1.

Tal definição se relaciona naturalmente às experiências autoritárias com as quais o cor-


porativismo esteve ligado, mas não esgota por si só o conceito, pois exclui aquelas ocorridas
em períodos democráticos. Daí a distinção do mesmo autor entre o corporativismo político,
relacionado ao conceito citado, e o social, que englobaria a representação corporativa autô-
noma e isenta do controle estatal.
Antes mesmo da associação feita por Schmitter entre o corporativismo e os regimes au-
toritários do entreguerras, o renomado jurista Hans Kelsen (2013) já havia afirmado na década
de 1920 que, ao contrário do que divulgavam seus teóricos, o corporativismo não tinha nenhu-
ma relação com os regimes democráticos, pois se encontrava fundamentado nas ditaduras, ao
esvaziarem os parlamentos em suas funções deliberativas. Essa visão se tornou predominante
para a maior parte dos acadêmicos que se debruçaram sobre o tema. No entanto, o conceito
já existia anteriormente à referência de Kelsen e ainda é utilizado hoje largamente com outro
significado, ou seja, distinto do de autoritarismo.

246 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 246-256, maio-agosto 2018
Corporativismo e neocorporativismo

Manoilescu, professor de economia da Escola Politécnica de Bucareste que teve sua obra
publicada em vários idiomas, inclusive em português, via o corporativismo como um modelo
de organização da sociedade civil em sua relação com o Estado e o mercado que consistiria
numa terceira via, alternativa às relações existentes nas sociedades autoritárias e/ou liberais.
O autor propunha, entretanto, uma separação do conceito de sua vertente autoritária ao dizer:
“Se todos os fascismos foram corporativistas, nem todos os corporativistas foram fascistas”
(apud Garrido, 2016: 192). Embora Manoilescu tenha reivindicado a separação entre formatos
corporativos de intermediação de interesses e estados autoritários, as experiências históricas
conectaram as duas coisas, associando a prática corporativa ao fascismo ou aos demais regi-
mes autoritários do entreguerras. Isso fez com que o conceito assumisse um caráter acentua-
damente pejorativo, sobretudo no Brasil.
As primeiras experiências corporativas brasileiras ocorreram no início da década de 1930,
não obstante as referências teóricas ao conceito tenham sido anteriores. Alberto Torres, já na
década de 1910, julgava o sistema representativo previsto pela Constituição de 1891 como
ineficaz e não adaptado à realidade brasileira. Seu livro O problema nacional brasileiro, pu-
blicado em 1912, apontava para a inadequação da importação do formato liberal, que teria
aprofundado as relações de poder local, características de nossa formação paternalista. Uma
das soluções por ele apontadas seria a representação corporativa. Era ela a única capaz de
eliminar os conflitos e auxiliar no processo de organização da sociedade por meio do trabalho,
libertando o país do mando das oligarquias regionais. Seu modelo, todavia, não conferia cará-
ter deliberativo às corporações, apenas consultivo.
Provavelmente por essa razão, Oliveira Vianna, cerca de vinte anos mais tarde, defenderia
o mesmo modelo. Ele previa a existência de conselhos responsáveis por auxiliar o governo na
tomada de decisões. É sabido que Vianna era leitor e admirador de Torres. Ao fim da década
de 1920, Vianna falava sobre a necessidade de rever o sistema representativo brasileiro —
como forma de superar o “insolidarismo” que nos caracterizava — por meio da abolição
dos partidos políticos e da participação das classes organizadas nos negócios públicos (apud
Medeiros, 1978: 172).
Outros teóricos autoritários dos anos 1930 defendiam a proposta corporativista, o que se
tornou mais fácil depois das experiências francesa, portuguesa e espanhola, além da italiana.
Tanto Francisco Campos quanto Azevedo Amaral apostaram na representação profissional
como meio de resolver os problemas que eles viam no funcionamento dos parlamentos. Cam-
pos teve efetiva intervenção sobre os formatos de participação corporativa criados no Brasil
antes, durante e depois do Estado Novo.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 247-256, maio-agosto 2018 247
Cláudia M. R. Viscardi

Não obstante, na década de 1970 o conceito foi novamente incorporado ao debate,


resultando em abordagens renovadoras, que, por sua vez, se dispunham a dar conta de novos
repertórios de ação coletiva, que escapavam às abordagens clássicas tradicionais. Tratava-se
das experiências corporativas de representação de interesses a ocorrerem nas sociedades de-
mocráticas ocidentais, especialmente nos países escandinavos e na Áustria, as quais passaram
a ser chamadas de “neocorporativas” para escaparem de sua associação com os regimes
autoritários. Surgia assim o conceito de “neocoporporativismo”, o qual se definia por ser um
modelo institucional por meio do qual organizações de interesse consolidadas cooperavam
entre si e com o Estado na definição de políticas públicas:

“[...] o ‘novo corporativismo’ da Europa Ocidental e do Norte permaneceu incorporado a um


sistema de democracia constitucional liberal, que prevê regras institucionais, a exemplo da liber-
dade de associação. É verdade que, com o ‘neocorporativismo’, a distinção liberal clássica entre
Estado e sociedade perdeu o foco. [...] Pode ser que, sob o aspecto funcional, o corporativismo
‘autoritário’ e ‘liberal’ tenham semelhanças fundamentais. Talvez essa semelhança esteja ape-
nas de certa forma obnubilada, devido ao fato de que o corporativismo liberal é um fenômeno
muito menos doutrinário do que sua versão clássica (Lehmbruch, 1977: 92-93).

Dessa forma, a representação corporativa se reapresentava em democracias liberais,


distintas dos regimes autoritários das décadas de 1930 e 1940, por não estar associada às
doutrinas autoritárias e/ou totalitárias pregressas. Ao fim e ao cabo, o que Lehmbruch quis
dizer é que a representação corporativa podia existir em diferentes contextos e que sua asso-
ciação com os regimes autoritários foi uma contingência do período do entreguerras que não
esgotou as diferentes possibilidades de ocorrência do fenômeno.
Com o neocorporativismo, o formato de representação se flexibilizava, podendo ser usa-
do como um modelo de relação entre atores políticos organizados na defesa de seus inte-
resses de corpo, em várias regiões do mundo e em qualquer período histórico. Perdeu, pelo
menos nas análises fora do Brasil, seu caráter pejorativo, derivado da associação com os re-
gimes autoritários. Segundo tais abordagens, o que transformava as relações corporativas em
autoritárias era o contexto no qual emergiam, e não seu modus operandi, o que faz com que
sua principal diferença em relação ao pluralismo estivesse na natureza dos atores envolvidos,
no contexto em que se dava a disputa pelo poder e nas formas internas de sua organização.
A aceitação do corporativismo como parte do repertório da sociedade civil organizada não
escapou ao olhar atento dos demais cientistas sociais, inclusive o dos neomarxistas Guillermo
O’Donnell, nos anos 1970, e Clauss Offe, nos anos 1980. Para Offe (1981), o corporativismo era
visto como uma das instituições — ao lado dos partidos e dos parlamentos — que compunham

248 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 248-256, maio-agosto 2018
Corporativismo e neocorporativismo

as mais variadas redes a conectar Estado e sociedade civil, conferindo uma dimensão pública à
prática política dos atores nelas envolvidos. Para O’Donnell (1976), em análise sobre os casos
latino-americanos, o corporativismo teria uma natureza bifronte, que poderia ser estatizante —
de matriz autoritária — ou privatista, a ocorrer em sociedades democráticas.
Duas variações complementares do conceito surgiram na década de 1980: o mesocor-
porativismo e o microcorporativismo. O primeiro, segundo abordagens de Wassenberg (1982),
consistia na ação de atores coletivos, não necessariamente vinculados às associações de
classe, a defenderem interesses próprios a determinados setores ou ramos da economia. Por
meio dele, atuariam diretamente com as agências estatais em benefício de suas respectivas
corporações. Como as negociações entre os agentes ocorreriam num nível intermediário de
poder — um setor específico da economia, uma região ou uma área de competência bem de-
finida —, o prefixo meso se justificava. O segundo, como o próprio conceito expressa, se refe-
re mais à defesa de interesse de um ator ou um pequeno conjunto de atores vinculados a uma
microunidade econômica, a exemplo de uma empresa, um setor específico do comércio ou
um banco. Ao contrário do macrocorporativismo, que tem por horizonte problemas nacionais,
o microcorporativismo se concentra na solução de problemas localizados, geograficamente
delimitados (Oliveira, 2004: 248).
Com o advento do neoliberalismo em boa parte das economias europeias e americanas,
o conceito perderia um pouco de sua pujança, em paralelo à desmobilização dos trabalhado-
res e de suas associações de interesse. O efeito imediato foi a perda do poder de barganha e
a redução das possibilidades de intervenção dos trabalhadores sobre a definição de políticas
públicas, sobretudo as econômicas e sociais. Mas tal esvaziamento se deu apenas no campo
político, uma vez que deixou de limitar-se à esfera do político, sendo usado para a compreen-
são das relações econômicas e de sua intervenção sobre a definição de políticas mais amplas.
Dessa forma, em vez de observarmos uma erosão do conceito no contexto do neoliberalismo,
ele se transmutou, uma vez que as negociações corporativas continuaram a ser realizadas em
nível micro ou intermediário. As crises econômicas que resultaram do neoliberalismo foram
respondidas igualmente por arranjos corporativos, conquanto seja incontestável que o equilí-
brio entre os atores tenha mudado em prejuízo dos trabalhadores.

Por onde passa o debate recente no Brasil

O debate acerca do tema no Brasil pode ser dividido entre os que enfatizam o caráter
desmobilizador e desestruturante do modelo de representação corporativa de inte-
resses e aqueles que o veem como uma alternativa que, apesar dos problemas, possa ter

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 249-256, maio-agosto 2018 249
Cláudia M. R. Viscardi

contribuído de alguma forma para o processo de organização dos trabalhadores. No primeiro


campo, destacam-se a maior parte das abordagens.
Ancorados em pesquisas precedentes, como as de Werneck Vianna (1978), Renato Bos-
chi (1979), Eli Diniz (1978), Alfred Stepan (1980), entre outras, autores que se tornaram pro-
tagonistas nos anos entre 1980 e 2000 aprofundaram as vinculações entre o corporativismo
e as experiências autoritárias brasileiras. Para eles, a experiência dos anos 1930 e 1940 foram
fundamentais para o processo de desmobilização dos trabalhadores e de atrelamento de suas
associações ao Estado, comprometendo sua autonomia e condicionando os limites de seu
desenvolvimento posterior. A contraposição de um sindicalismo mais autônomo, gestado no
âmbito do liberalismo oligárquico da Primeira República a outro com controle estatal sobre
a organização dos trabalhadores no pós-1930, revelaria o caráter desagregador e prejudicial
das experiências corporativas sobre o processo de formação da classe trabalhadora brasileira.
Para Costa (1999), embora conselhos e comissões de representação paritária tenham
tido papel proeminente na definição de algumas políticas públicas, o objetivo primordial de
tal representação, que era o da conciliação entre as classes, não se realizou, o que tornou a
experiência corporativa brasileira vazia de significado. Ademais, os interesses do capital foram
os que prevaleceram, na medida em que o corporativismo funcionou somente para os patrões,
que conseguiram, por meio de suas associações — mantidas autônomas —, obter vantagens
nos processos decisórios, algo que anteriormente já fora apontado tanto por Boschi (1979)
quanto por Diniz (1978). Aos trabalhadores, que tiveram suas associações tuteladas pelo Es-
tado, restou um modelo predatório. Valendo-se da divisão de Schimitter, classificou o modelo
corporativo dos empresários como tendo sido societal e o dos trabalhadores, estatal.
Alguns anos mais tarde, especificamente em 2007, ocorreu na Universidade Federal de
Juiz de Fora (UFJF) um evento alusivo aos oitenta anos do Estado Novo cujos resultados fo-
ram publicados na Revista Locus. Dois artigos acerca do tema do corporativismo expressam
a vertente à qual nos referimos: o de Adalberto Cardoso e o de Alexandre Fortes. Cardo-
so acentua as eventuais influências fascistas sobre a legislação trabalhista e constitucional
brasileira; insere a experiência corporativa, ocorrida entre 1939 e 1943, como portadora de
caráter repressivo e com vocação totalitária, o que na prática era a essência do corporativismo
fascista; deixa antever que a proposta de Vianna, de um corporativismo societal, por meio do
qual os trabalhadores atuariam diretamente dentro do Estado na defesa de seus interesses,
de caráter autoritário, assumiu, na prática, uma face ainda mais totalitária, ao se tornar expe-
riência — em suas palavras, protototalitarista — cujo fim único era desmobilizar e reprimir as
organizações dos trabalhadores.

250 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 250-256, maio-agosto 2018
Corporativismo e neocorporativismo

Na mesma trilha, Fortes (2007) atribui os limites dos avanços democráticos do pós-
1945 à experiência corporativa que lhe antecedeu, ao ter servido de base para a emergência
do fenômeno populista, e à fragilidade da organização dos trabalhadores, que no pré-1930
caminhava a passos largos. Em texto que critica o conceito de trabalhismo e reitera o caráter
fascista da legislação trabalhista brasileira, Fortes realça o caráter exclusivamente negativo de
nossa breve experiência corporativa.
Há, no entanto, uma abordagem alternativa que, sem menosprezar o impacto desmo-
bilizador da experiência corporativa, ressalta o espaço conferido aos trabalhadores para que
conseguissem fazer valer seus interesses. Nos anos 1980, Fábio Wanderley Reis (1989) reivin-
dicava o aumento do corporativismo para o bem da consolidação da democracia brasileira,
que então renascia após a ditadura militar. Em texto seminal, Reis destacava que, ao contrário
do que ocorria na ciência política europeia ou mesmo no restante da América Latina, o concei-
to de corporativismo no Brasil era visto como incongruente com os avanços democráticos. Para
ele, não só a experiência pregressa teria resultado em ganhos para os trabalhadores, como seu
aprofundamento poderia melhorar os processos de democratização em curso.
Gomes, em A invenção do trabalhismo (1988), ao fim da mesma década, trouxe à tona
trabalhadores ativos, em luta pela ocupação de espaços de poder, mesmo nos contextos de
mais dura restrição à autonomia de suas organizações. A obra integrava uma renovação no
campo da historiografia do trabalho, que primava pela contestação da tese que ressaltava a
fragilidade dos trabalhadores brasileiros frente ao Estado. O poder das organizações sindicais,
suas rupturas e continuidades em relação aos movimentos da Primeira República, bem como
seu papel como artífices da cidadania ao longo de toda as décadas de 1930 e 1940, conferiam
um caráter menos totalitário e desmobilizador ao modelo corporativo varguista. Gomes reitera
que um dos instrumentos mais conhecidos da prática corporativa no Brasil, a instituição do
imposto sindical, possibilitou, inclusive, que os sindicatos alargassem suas bases, por meio da
filiação em massa de trabalhadores, os quais, interessados em usufruir da rede assistencial
por eles montada, subsidiada pelos recursos da contribuição compulsória, a eles se filiavam.
Em 2007, foi publicada a coletânea O corporativismo em português, que reuniu pesqui-
sas sobre o salazarismo e o varguismo, de forma comparativa, com destaque para a organiza-
ção das instituições autoritárias e corporativas (Martinho e Pinto, 2007). Os textos alusivos ao
Brasil se colocam ao mesmo lado no debate ao destacarem a participação da sociedade civil
brasileira no projeto trabalhista, seja por meio da valorização de representação no âmbito do
Estado, seja em seus contatos diretos com a presidência da República, seja por meio de seus
intelectuais que almejavam uma participação mais ativa no regime ou dos trabalhadores que,
mesmo em meio a um regime autoritário, conseguiam integrar algumas esferas de um Estado
que tinha por norte a ampliação da cidadania social.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 251-256, maio-agosto 2018 251
Cláudia M. R. Viscardi

A ideia, até então difundida, de que o modelo autoritário brasileiro fora uma variação
menor do fascismo italiano daria lugar a análises que levavam em conta as especificidades das
experiências periféricas. Por sua vez, a ideia de que o povo se submetia ao regime estado-no-
vista como vítima do arbítrio deu lugar a uma participação mais autônoma dos atores sociais,
por meio de suas organizações em participação no Estado.
Na mesma direção, mais recentemente, caminharia Bruno Reis, ao contestar a oposi-
ção entre corporativismo e pluralismo, a diferença entre corporativismo estatal e social, e ao
defender que o corporativismo é um sistema eficaz de representação de interesses em socie-
dades democráticas. Na sua ausência, predominariam os lobbies, os quais reservam parcelas
de poder significativas a empresários em detrimento dos interesses dos trabalhadores. Dessa
forma, ampliar a representação corporativa poderia contribuir para a melhor administração
dos conflitos distributivistas, e não o contrário (Reis, 1995).
Em dossiê organizado pela revista Estudos Ibero-Americanos sobre o tema do corpora-
tivismo, Valéria Lobo (2016) se soma ao grupo de autores que não avaliam a ordem sindical
corporativa como necessariamente responsável pelas dificuldades de concretizar a democracia
brasileira. A autora ressalta que as organizações corporativas existem em sociedades democrá-
ticas e que a ruptura com elas não implicou necessariamente na retomada de uma organização
autônoma por parte das associações sindicais, como ocorreu em alguns países europeus no
segundo pós-guerra. Ao contrário, foram as estruturas neocorporativas que conferiram alguma
base de consentimento, que tornou possível os arranjos sociais democráticos. Por essa razão, sem
descurar do papel interventor e desmobilizador empreendido pelo Estado por sobre o movimento
sindical brasileiro, a heteronomia resultante não impediu que os trabalhadores formulassem
estratégias alternativas de mobilização e reação em prol de suas conquistas.
Como se pode observar, as abordagens mais recentes sobre o tema compartilham de uma
interpretação capaz de reconhecer alguns ganhos para os trabalhadores em meio às nossas expe-
riências corporativas, relativizam seu impacto sobre a organização dos trabalhadores e, sobretudo,
buscam analisar nossas experiências não como desvios ou manifestações periféricas do fascismo
ou de outras experiências corporativas europeias, mas como construções específicas, inseridas e
adaptadas ao processo de formação de nossa classe trabalhadora, em sua relação com o Estado.

O que há de novo

C abe destacar a contribuição alternativa para o debate feita por Eduardo Noronha
(2000). Segundo ele, o modelo corporativo só é útil para a análise de casos típicos.
Naqueles em que a ele se misturam certas práticas pluralistas, como é o caso do Brasil re-

252 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 252-256, maio-agosto 2018
Corporativismo e neocorporativismo

cente, ele perde seu caráter explicativo. Por essa razão, Noronha sugere que devemos pensar
as relações entre capital e trabalho por meio de outra chave explicativa, que se fundamenta
no predomínio do legislado sobre o contratado. Ao contrário dos países democráticos do Oci-
dente, no Brasil predominou uma forte regulamentação do mercado de trabalho por parte do
Estado, mesmo quando não se fez necessário. Tal contingência confere aos poderes Legislativo
e Executivo um protagonismo maior do que os agentes diretamente envolvidos nas negocia-
ções. Dessa forma, o autor propõe uma abordagem alternativa e específica à do predomínio
do corporativismo nas relações trabalhistas.
O tema do corporativismo, na quase totalidade dos estudos, se refere às relações entre
as esferas do capital e do trabalho em sua interação com o Estado. As abordagens sobre os
profissionais liberais ou os de classe média passam ao largo das análises. Não é esse o caso
do trabalho de Marco Vannucchi (2016). O autor inovou ao tratar o corporativismo de classe
média, que em muito se diferenciava das demais análises focadas nas associações represen-
tativas de trabalhadores e empresários. Tendo por objeto advogados, dentistas e médicos,
Vannucchi reitera que as referidas categoriais escaparam ao monopólio da representação,
previsto pelo modelo, na medida em que suas associações competiam com os sindicatos pelas
mesmas bases, com êxito significativo para as primeiras. As associações de classe se tornaram
mais representativas de interesses do que os sindicatos, o que de algum modo fragilizou a ca-
tegoria como um todo. Quanto ao Estado, teve sua margem de manobra ampliada em relação
a elas, na medida em que podia usar pragmaticamente de uma ou outra representação, com
base em seus interesses e afinidades.
Nos últimos anos ocorreu a retomada do tema no Brasil, sobretudo com a inserção de vá-
rios historiadores brasileiros em redes internacionais de pesquisa especificamente voltadas para
a discussão dos temas das direitas, dos regimes autoritários ou do próprio corporativismo, como
é o caso da Netcor, da Rede Direitas e da Rede Lusófona de Pesquisa.2 A promoção de eventos
e publicações conjuntas expressa o vigor do debate internacional. Seu produto mais recente foi
a publicação de A vaga corporativa, em Portugal e no Brasil, uma coletânea que reúne estudos
sobre as experiências corporativas na Europa e na América Latina, como as de Itália, Áustria,
Portugal, Espanha, França, Brasil, Argentina e Colômbia (Pinto e Martinho, 2016)3.
O esforço dos cientistas sociais em retomar o conceito de forma renovada, todavia, não
foi suficiente para que ele perdesse sua carga majoritariamente pejorativa, pelo menos no
Brasil. Dissociar o corporativismo das experiências nazifascistas é um caminho interessante
para que sejam levadas em conta nossas peculiaridades e nossas formas específicas de apro-
priação de ideias difundidas globalmente. Por outro lado, incorporar nas análises as relações
de continuidade e ruptura dos trabalhadores em relação ao seu passado recente — no qual os

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 253-256, maio-agosto 2018 253
Cláudia M. R. Viscardi

limites de manifestação da cidadania eram sobejamente estreitos e foram ampliados de forma


significativa, a despeito dos controles nos processos de recrutamento — contribuiu para uma
análise menos politizada do tema. Há que se destacar que, com a introdução da representação
corporativa no Brasil, a ausência total de representação dos trabalhadores no Parlamento deu
lugar a uma expressiva participação; a mudança do código eleitoral e a criação da Justiça
Eleitoral garantiram a ampliação do contingente eleitoral e a tão almejada “verdade das ur-
nas”. A ampliação das políticas sociais e o reconhecimento dos trabalhadores como atores
importantes do jogo político, de alguma forma, podem ser considerados avanços em direção
à ampliação dos direitos. Os estudos recentes caminham nessa direção.
É interessante acompanhar o ressurgimento das discussões sobre a representação corpo-
rativa num momento em que as instituições representativas liberais voltaram a ser objeto de
críticas. A apatia, as denúncias de corrupção por parte da classe política e a insuficiência dos
canais de representação de interesses certamente têm relação com a retomada dos estudos
de formas alternativas de representação, mesmo que fora do âmbito do modelo liberal. A
expectativa é que tais incursões teóricas sirvam para a proposição de saídas que excluam as
soluções autoritárias, que normalmente resultam da desqualificação das experiências parla-
mentares. Ruim com elas, o terror esteve sempre presente quando delas abrimos mão.

254 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 254-256, maio-agosto 2018
Corporativismo e neocorporativismo

Notas

1 Corporatism can be defined as a system of interest representation in which the constituent units are orga-
nized into a limited number of singular, compulsory, noncompetitive, hierarchically ordered and functionally
differentiated categories, recognized or licensed (if not created) by the state and granted a deliberate repre-
sentational monopoly within their respective categories in exchange for observing certain controls on their
selection of leaders and articulation of demands and support.

2 Rede de investigação, direitas, história e memória. Disponível em: <https://direitashistoria.net/>. Rede in-
ternacional conexões lusófonas: ditadura e democracia em português. Disponível em: <http://rededepesquisa.
wixsite.com/conexoeslusofonas>. International Network for Studies on Corporatism and Organizes Interests
(Netcor). Disponível em: <https://netcor2015.wordpress.com/>.

3 A mesma obra publicada em Lisboa foi publicada também no Brasil, no mesmo ano, pela Editora FGV do
Rio de Janeiro, com o título A onda corporativa.

Referências bibliográficas

BOSCHI, Renato R. Elites industriais e democracia. Rio de Janeiro: Graal,1979.


COSTA, Vanda Maria Ribeiro. A armadilha do Leviatã: a construção do corporativismo no Brasil. Rio de Janeiro:
Eduerj, 1999.
DINIZ, Eli. Empresariado, estado e capitalismo no Brasil: 1930-1945. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
FORTES, Alexandre. O Estado Novo e os trabalhadores: a construção de um corporativismo latino-americano.
Locus – Revista de História (Juiz de Fora), vol. 13, n. 2, 2007.
GARRIDO, Álvaro. Cooperação e solidariedade: uma história da economia social. Lisboa: Tinta da China,
2016.
GOMES, Ângela M. de C. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: Iuperj/Vértice, 1988.
KELSEN, Hans. The Essence and Value of Democracy. Lanham: Rowman and Littlefield Publishers, 2013.
LEHMBRUCH, G. Liberal Corporatism and Party Government. Comparative Political Studies, vol. 10, n. 1,
1977.
LOBO, Valéria M. Corporativismo à brasileira: entre o autoritarismo e a democracia. Revista Estudos Ibero-A-
mericanos (Porto Alegre), v. 42, n. 2, p. 527-552, 2016.
MARTINHO, Francisco P.; PINTO, António C. (Orgs.). A vaga corporativa: corporativismo e ditaduras na Europa
e na América Latina. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais/Universidade de Lisboa, 2016.
______. (Orgs.) O corporativismo em português: estado, política e sociedade no salazarismo e no varguismo.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007.
MEDEIROS, Jarbas. Ideologia autoritária no Brasil (1930/1945). Rio de Janeiro: FGV, 1978.
MONOILESCU, Mihail. Um século de corporativismo: doutrina do corporativismo integral e puro. Rio de
Janeiro: José Olympio, 1938.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 255-256, maio-agosto 2018 255
Cláudia M. R. Viscardi

NORONHA, Eduardo G. O sistema legislado de relações de trabalho no Brasil. Revista Dados (Rio de Janeiro),
v. 43, n. 2, 2000.
O’DONNELL, Guillermo. Sobre o corporativismo e a questão do Estado. Cadernos do DCP, n. 3, p. 1-54, 1976.
OFFE, Clauss. The Attribution of Public Status to Interest Groups: Observations on the West German Case. In:
BERGER, Suzanne. Organizing Interests in Western Europe. Cambridge: S Berger. Cambridge Univ. Press,
1981.
OLIVEIRA, Nelson. Neocorporativismo e política pública: um estudo das novas configurações assumidas pelo
Estado. São Paulo: Loyola, 2004, p. 248.
REIS, Bruno P. W. Corporativismo, pluralismo e conflito distributivo no Brasil.  Dados (Rio de Janeiro), v. 38,
n. 3, p. 417-457, 1995.
REIS, Fábio W. Estado, política social e corporativismo. Análise & Conjuntura, vol. 4, n. 1, p. 87-94, 1989.
SCHMITTER, Philippe C. Still the Century of Corporatism? Review of Politics, n. 36, 1974.
STEPAN, Alfred. Estado, corporativismo e autoritarismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.
VANNUCCHI, Marco Aurélio. O corporativismo dualista: conselhos profissionais e sindicatos no Brasil, 1930-
1964. Revista de estudos Ibero-Americanos (Porto Alegre), v. 42, n. 2, p. 471-499, 2016.
VIANNA, Luiz W. Liberalismo e sindicato no Brasil. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
WASSENBERG A. Neo-Corporatism and the Quest for Control: the Cuckoo Game. In: LEHMBRUCH, Gerhard;
SCHMITTER, Philippe C. (Eds). Patterns of Corporatist Policy Making. Londres: Sage, 1982.

256 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 256-256, maio-agosto 2018
Colaboração Especial

The concept of vocational orders in


Hungary between the two world wars
O conceito de organizações corporativas na Hungria entre as
duas guerras mundiais
El concepto de organizaciones corporativas en Hungría entre las
dos guerras mundiales

Péter Krisztián ZacharI*

http://dx.doi.org/10.1590/S2178-14942018000200008

I
Universidade de Ciências Aplicadas Kodolányi János. Hungria.
*Historiador Húngaro e Professor da Universidade de Ciências Aplicadas Kodolányi János.(zacharpeter@gmail.com).

Artigo recebido em 31 de janeiro de 2018 e aprovado para publicação em 28 de maio de 2018.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 257-276, maio-agosto 2018 257
Abstract
The recent study examines the philosophical background and thoughts of Hungarian Christian thinkers on a new
state order between the two World Wars in Hungary. On the basis of historical sources and Hungarian literature, the
author gives an insight into the political conditions and discussions of this time which emerged from the interpreta-
tion of papal encyclicals. The author also takes a deeper look at the theories of Vid Mihelics, Béla Kovrig and espe-
cially László Varga S.J. The article focuses on the creation of different organizations of vocational order in Hungary
and the governmental attempts to initialize a new political and socio-economic system.

Keywords: History of Hungary; Catholic social thought; Solidarism; Subsidiarity; Corporative ideas; National
Organization of the Vocational Order of Hungarian Workers.

Resumo
O estudo recente examina os fundamentos filosóficos e os pensamentos dos pensadores cristãos húngaros sobre
uma nova ordem estadual estatal entre as duas guerras mundiais na Hungria. Com base em fontes históricas e
na literatura húngara, o autor dá uma visão das condições políticas e das discussões desse tempo emergentes
da interpretação das encíclicas papais, e faz uma análise mais profunda das teorias de Vid Mihelics, Béla Kovrig e
especialmente László Varga S.J. O artigo enfoca a criação de diferentes organizações corporativas na Hungria e as
tentativas governamentais de inicializar um novo sistema político e socioeconômico.

Palavras-chave: História da Hungria; Pensamento social católico; Solidariedade; Subsidiariedade; Ideias corpo-
rativas; Organização Nacional do Corporativismo dos Trabalhadores Húngaros

Resumen
El reciente estudio examina el trasfondo filosófico y los pensamientos de los pensadores cristianos húngaros sobre
un nuevo orden de Estado entre las dos guerras mundiales en Hungría. Con base en fuentes históricas y de la
literatura húngara, el autor ofrece una visión de las condiciones políticas y discusiones de este tiempo surgidas de
la interpretación de las encíclicas, y papales, profundiza en las teorías de Vid Mihelics, Béla Kovrig y especialmente,
László Varga S. J. El artículo se centra en la creación de diferentes organizaciones corporativas en Hungría y los
intentos gubernamentales de comenzar un nuevo sistema político y socioeconómico.

Palabras clave: Historia de Hungría; Pensamiento social católico; Solidaridad; Subsidiariedad; Ideas corporati-
vas; Organización Nacional del Corporativismo de los Trabajadores Húngaros.
The concept of vocational orders in Hungary between the two world wars

The concept of vocational orders in Hungary between


the two world wars

I nterwar Europe became a breeding ground for a race of various concepts from the point
of view of intellectual history. A commonality of different political ideas popular during the
era was that they wished to radically break away from the overloaded forms of liberalism that
had become almost hegemonic by the end of the 19th century and the patterns of plutocratic
Manchester Capitalism resulting from liberalism. Serious criticism was voiced regarding indi-
vidualism and the homo oeconomicus driven by market and profit maximization from the last
third of the 19th century. At the same time, the ideas of community and social cohesion gained
more emphasis, and questions of ethics and morals were re-explored by European intellectuals.
Meanwhile, private profit was mostly contrasted with public good: all the moral, intellectual and
economic goods “which are essential for the community of society and the members of this
community, that is, the subsistence of smaller communities and individuals. According to this,
public good is not the summary of private goods, but more than that” (Mihelics, 1940: 49). In
the eyes of several contemporary thinkers, public good was violated by individualism, leading
Europe and the socio-economic system of the continent into crisis.
Therefore, the need to create a new political and socio-economic system emerged, and
became a postulate. Anti-liberalism became a negation of modern parliamentarism, anti-ca-
pitalism turned into the search for social justice, but in one way or another. There was a wide
range of proposals in that direction, including attempts to build extremist, national and in-
ternational socialist dictatorships, organize fascist state rule, and the establishment of a new
society based on vocational orders that was close to corporative ideas, but was not an étatist
state system. The prominent ideologues of the era were convinced that this new state order
would enable society to get rid of the ’liberalistic’ approach to state, and, at the same time,
the ‘total state’ represented by Bolshevism (national socialism), fascism, or national socialism
(Hitlerism). The focus of the analysis, that is, the idea of vocational orders, did not constitute
a uniform ideology that could be described by general criteria. Contemporary intellectuals
looking for answers (economists, philosophers, historians, sociologists, clerics) could base their
concepts on several early antecedents and forerunners reaching back to the “organic society
approach” by Saint Thomas Aquinas. (See in detail: Zachar, 2014: 67-119). A common charac-
teristic of theories emerging in the era was that they did not approach the structure of the sta-
te from the aspect of the individual, but that of social groups. However, there was a wide range
of concepts: certain theories even included the final elimination of democracy as a possibility,
while others depicted the new type of state as the completion of participatory democracy. The

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 259-276, maio-agosto 2018 259
Péter Krisztián Zachar

latter thought, based primarily on the social teachings of the Catholic church, recommended
the creation of a new socioeconomic order based on subsidiarity, also providing space for de-
mocratic elements (Kék, 2013: 37-45). Its determinant documents were the Rerum novarum
encyclical on the condition of the working classes, issued by Pope Leo XIII on 15 May 1891,
and the Quadragesimo anno encyclical issued by Pope Pius XI, timed for the 40th anniversary
of the great predecessor. These papal statements resulted in a more detailed elaboration of the
system based on vocational orders, and several attempts to put the idea of solidarism and the
idea of vocational orders into practice.
The appearance of these ideas in the Hungarian academic discourse around the turn of
the century can be clearly noticed. Hungary was a part of the Austro-Hungarian Monarchy at
the time, having undergone considerable development and modernization. The population of
the dualist state increased from 35 million to 50 million during the peaceful years following
1867, and the country was one of the great powers according to its territorial and economic
power. This increase in population also included the change of the Hungarian population from
15.5 million to almost 21 million. The feudal system of the Hungarian kingdom finally broke
up, and new social groups such as a wealthy entrepreneurial bourgeoisie and an industrial
working class emerged, while the agricultural community decreased as a result of economic
changes. Contemporary Hungary was basically characterized by a dual, so-called “congested
social structure”, which involved a coexistence of several modern layers of a new embourgeoi-
sing society (labour class, bourgeois middle class, capitalist upper middle class) and the society
of a world preceding the so-called bourgeois era (peasantry, small and medium landowners,
landed gentry). The two social worlds were in constant interaction, and they had a significant
influence on each other: the former nobility became the bourgeois middle class through eco-
nomic processes and cultural changes, and became enterpreneurs and intellectuals, but, at the
same time, its traditional lifestyle and mentality served as an example to follow for the newly
forming bourgeois world (Halmos, 2010). Through the political debates and escalating crises
of the “Belle Époque” and as a result of the fertilizing effect of embourgeoisement, the new
Western forms of literature, fine arts and music spread within Hungary within a very short time
around the turn of the century. This also created a favourable environment that served as a
breeding ground for scientific discoveries and the quest for modern alternatives. Thus, West-
-European and American development tendencies in the era found a direct way into scientific
discourse and professional arguments. In this respect, Hungary was not behind the states
serving as the epicentre of development.
At the same time, the successes of the economy system of dualism in Hungary catching
up with Western levels of development, and the belated, still forceful embourgeoisement see-

260 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 260-276, maio-agosto 2018
The concept of vocational orders in Hungary between the two world wars

med to initially hide problems that Western European societies faced at an early stage. As
contemporary Hungarian political thinking basically related to attitudes towards the dualist
state system (the government supported the common state, and the opposition rejected it),
ideological parties and political ideologies appeared in public life with a delay. Similarly to
the Western model, the Marxism-based socialist teaching was the first to attempt to establish
an organized framework, but in Hungary it could only launch its “missionary activity” among
industrial workers with a delay, at a slower pace. The Hungarian political right, and, especially,
the Catholic church were aware of its centuries of history and wealth-power status, thus did
not wish to respond to the dangers of socialist activism in the Hungarian conditions of the
era, and the challenges of liberalism that put wide groups into crisis. As a result, the church
did not take a formal position on workers and social issues for quite long, and the expansion
of political Catholicism in Hungary only started in the late 1870’s (Gergely, 2007). However,
it must also be noted that several members of the clergy possessed up-to-date information
on the new ideas spreading in the Western part of the continent. This is demonstrated by the
fact that the famous book by Bishop Wilhelm Emmanuel Ketteler (Die Arbeiterfrage und das
Christenthum) was translated into Hungarian in the year it was published in Germany: priest
and teacher Gyula Katinszky (1841-1913) published it in Hungarian in 1864 and dedicated
the work to the Archbishop of Eger. It is also relevant that the early romantic vocational order
concepts of Adam Heinrich Müller and Franz von Baader became known in Hungary (Kovács
K., 2007 and Adriányi, 1995). In addition to the ideas of Cardinal Archbishop János Simor
(1813-1891), the breakthrough was a result of the work of two outstanding Catholic priests,
Ottokár Prohászka and Sándor Giesswein. The Hungarian public and the Catholic political field
got to know the new principles related to Pope Leo XIII, and the new Christian social ideas
through their works.
Priest, scientist, diocesan, preacher, philosopher Ottokár Prohászka (1858-1927) trans-
lated the Rerum novarum encyclical and searched for a solution primarily on the pages of
the Új Magyar Sion newspaper and his writing Keresztény szociálista akció (Christian social
action) published in 1894: he rejected the socialist ideology based on Marxism, but embraced
social sensitivity stemming from the Christian love of neighbour, and requested it above all
(Prohászka, 1894: 66-67, 72-73). He strongly rejected the dark sides and abuses of Man-
chester capitalism. In his article titled Liberalizmus utópia (Liberalism – a utopia) published in
1896, he accepted that the achievements of political liberalism, that is, the ideas of citizenship
and equality before the law are basically similar to the Catholic approach, but he thought that
the unscrupulous and enslaving ideology of liberal capitalism had a devastating influence on
moral and intellectual life (Prohászka, 1896: 2-5).

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 261-276, maio-agosto 2018 261
Péter Krisztián Zachar

Both Prohászka and his contemporary Sándor Giesswein (1856-1923) were likely to see
the overcoming of the liberal conservative political fault line in the newly forming, church-mo-
tivated trend, and they also expected the reform of the economic organization and the capita-
list system from it. Therefore, they also tried to introduce modern Catholic politics: Prohászka
did not only translate the encyclical into Hungarian, but also initiated the organization of the
Catholic People’s Party, which was intended to protect church interests on the political stage.
Then the establishment of Christian labour associations, the promotion of social reform efforts
and the approach towards democratic ideas started under the leadership of Giesswein. This
was also reflected in the development of Giesswein’s personality – he visited several European
countries, knew eight languages by the age of 22, and his personality combined the characters
of a pastor, a scholar, and a politician. In this regard, his ideology was modern and traditiona-
list at the same time. He adhered to his views and insisted on pursuing moral political activity:
“[…] he was not a mass politician, even if he wished to convince masses of people. He did
not want to convince masses for himself and the party, but for a purely noble idea” (Sáfrány,
2004). His editorial Mit akarunk mi, keresztényszocialisták (What do the Christian-socialists
want), published on 7 May 1905, served as the basis of a new political programme issued on
the pages of Igaz Szó in November 1905, which also drew on the teachings of Rerum nova-
rum and the Christian social efforts explained by Austrian reformer Karl von Vogelsang (1818-
1890). Vogelsang was one of the outstanding figures of Austrian thinking on vocational orders
and Christian Socialism, as Gergely (1977: 21) stated: “the theoretical father of the bourgeois
anti-capitalistic Christian social movement that originated in Austrian conditions and promo-
ted an organic Christian social order”. Ludwig Reichhold (1968: 22) describes Vogelsang as
the “European Anti-Marx”, based on his efforts to “solve the labour class completely in the
owners’ class”. The National Christian Social Party in Hungary (Országos Keresztény-Szocia-
lista Párt) was organized based on his former Austrian program (László T., 2005: 54-59 and
Zachar, 2014: 82-85). With that, social issues, societal reforms, and the need to restructure
economy also became topics of Hungarian public political discourse from that point. More and
more politicians thought that the access to subsistence, healthy life and cultural development
must be available for all members of the society, and these rights can only be guaranteed
through work as a human obligation (Egresi, 2008: 24-30).
These questions have become especially acute after World War I. Hungary was struck by
a socialist coup (the Aster Revolution) in 1918, and a communist takeover (called Republic of
Councils or Soviet Republic) in 1919; then a civil war situation followed. In the meantime, a
significant part of the country was invaded by Romanian, Serbian and Czechoslovakian troops,
preparing the country for the territorial division of the former Hungarian Kingdom. This was fi-

262 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 262-276, maio-agosto 2018
The concept of vocational orders in Hungary between the two world wars

nally implemented by the Treaty of Trianon in 1920 (Vizi, 2014: 11-40). Based on its provisions,
economic isolation and protectionist economic policies followed in Central Europe, especially
in the new nation-states formed on the ruins of empires. The punitive economic and financial
measures of these “peace diktats” further aggravated the situation, leading to a decrease in
export, a deficiency of productive capital, and unemployment.
We often find the same attributes and almost identical expressions in the various descrip-
tions of crisis symptoms, even if they were written by scholars and thinkers who were not in
contact with each other, or even had opposite political views. The famous Hungarian historian,
Gyula Szekfü, might have expressed the zeitgeist of a whole generation in his legendary work
Három nemzedék (Three Generations, 1920: 5). about the decline of European politics:

“It is as if humanity fell to the depths from the proud heights of its millennium-long intellectual
evolution. It is no wonder that teachings on the terminal decline of European culture spread if
more and more of us face this possibility – the cruelest possibility of all that may reach Western
society: our civilization may be in the period of terminal decline just like Greek and Roman
civilizations were in the fourth and fifth centuries.”

Philosophers of the crisis basically saw the way out in some new faith and the resulting
reforms of the existing regime or its replacement by another system, as opposed to aliena-
tion, emerging barbarian tendencies, the rampage of overwhelming relativism and concrete
crisis symptoms varying by country. The professional and political public of various countries
agreed that the key to managing crises was not individualistic, disintegrating societies, but the
strengthening of the community level. Another basic premise they mentioned was that it was
insufficient to manage symptoms by the “surface treatment” of social tensions and economic
and social problems, and more in-depth solutions were needed. This meant the establishment
of a completely new political and socio-economic system in each case.
As Hungary had lost lots of its territory and the country had become poorer, there was
no time to waste regarding national problems in the situation following the Treaty of Trianon.
Because of the traumas experienced, the communist persecution of the church and atheism,
the new clerical intelligentsia tried to exert political influence relying on the bureaucratic elite
committed to Christian socialism (Bácsfainé, 2009: 14). The political elite led by Prime Minis-
ter István Bethlen and Governor Miklós Horthy announced a conservative Christian political
programme including key elements such as the recovery of economy and the implementation
of active social policies. They considered papal encyclicals as guidelines for their work, since
they were regarded as no other than “the Magna Charta, the constitution of Christian social
policies and social ideology”, said papal prelate József Vass, Minister of Welfare and Labour, in

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 263-276, maio-agosto 2018 263
Péter Krisztián Zachar

connection with the creation of the social policies associated with his name. (Gergely, 1993:
40.) As a result, social policies in Hungary have undergone development that was also signifi-
cant at a European level (In detail: Tomka, 2003). The Ministry of Welfare and Labour was lead
by priests during its existence of twelve years, and they regularly used Christian social ideology
based on papal encyclicals as a reference. József Vass cited the Rerum novarum encyclical,
inter alia, in the parliamentary debate on the compulsory insurance regarding old people,
disabilities, widowhood and orphanhood (László, 2005: 224-225).
However, the initial successful steps were halted in Hungary by the Great Depression
of 1929, and the strengthening extremist (rightist and leftist) agitation resulting from the
financial crisis. Under these circumstances, in his political programme from 1932, Prime Mi-
nister Gyula Gömbös announced the adoption of certain Italian corporative models that had
proved successful. Therefore, representatives of the Catholic church also felt it important to
make their voices heard. They also found the guidance of the encyclical by Pope Pius XI im-
portant, and active social discourse regarding vocational orders distinct from corporatism (and
opposing corporatism) followed in Hungary. During the bishops’ conference held in October
1931, Prince-Archbishop Jusztinián Serédi (1884–1945) proposed that the episcopate (lead
by the Bishop of Csanád, Gyula Glattfelder) also take a stand regarding private property and
market economy. Given the political conditions of the era, the Hungarian Bishop’s Conference
primarily focused on the Christian interpretation of wealth and private property in its circular,
and therefore, according to Ormos (2012: 93) and Petrás (2013: 9), the circular could only
be regarded as a “soft echo” of papal teachings. At the same time, the episcopate accepted
the presence of vocational orders in Hungary and gave its support to the domestic promotion
of ideas published in the papal encyclical. Hungarian Catholic priests also thought that the
harmful socialist and liberal influence could be eliminated based on the new papal directions,
and the opposition of social layers could be eliminated by the cooperation of Christian organi-
zations of occupational fields (Gergely, 1995: 189-193).
The appearance of such organizations took place in Hungary within a short period of
time in the 1930’s. Similarly to Western models, the first organizational framework was Actio
Catholica (AC), which appeared in public at the XXVI National Catholic Congress in October
1933, whose organizational structure was only finalized by 1936 (Gianone, 2010). It was ac-
tive according to governing principles such as “Christ and family” and “Youth and Christ and
village”. The launch of these programmes catalysed the establishment of further organizations,
so several layer organizations based on vocational orders (which protected their independen-
ce and only accepted theoretical guidance) were created under the umbrella organization

264 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 264-276, maio-agosto 2018
The concept of vocational orders in Hungary between the two world wars

of Actio Catholica: young people graduating from school became members of the National
Association of Catholic Young Workers (KIOE), or the National Body of Catholic Agricultural
Youth Societies (KALOT), which was founded in 1935, and according to Balogh (1998), built
a significant tradition and an outstanding historical role ever since. Then, in 1936, the Alliance
of Catholic Girl Societies (KALÁSZ) was established under the patronage of Bishop Lajos Sh-
voy, which also focused on rural environment. Urban girls graduating from school may have
become members of KLOSZ, and then Working Girls (DLO), while school students may have
joined ILKA. We may consider folk high schools as the most important aspect in the life of each
organization, which was primarily organized by KALOT (László, 2005: 217-220).
How many people could these organizations really reach? There are very different pro-
jections and the exact number of members can no longer be determined with certainty. From
the very different information on the number of participations of KALOT, in our opinion, Ferenc
Babóthy’s account of membership is close to the truth: according to him, 631 local groups
existed involving 100,000 members at the time KALOT was dissolved in 1946 (Kovács, 2005).
Bishop Shvoy estimated the membership of KLOSZ, DLO, and KALÁSZ to 100,000 – 120,000
on 18 December 1941, explaining the mistakes of the so-called levente youth education in his
speech in the upper house of parliament (Bácsfainé, 2009: 20). As a result, these organizations
of vocational order were certainly strongly influencing the Hungarian population.
If we take a closer look at the day-to-day work of these organizations, between 1939
and 1941, “Secular people for Christ’s Kingdom” (Világiak Krisztus Országáért) was the mo-
tto of the work programme of Actio Catholica for two years. In this context, it was important
to strengthen the organization and establish strong leading groups including secular people.
This was in line with the organization of labour groups that had already started before, but
regained its momentum at the time. Jövünk, the paper of the Christian social trade union
– following the measures of the Hungarian Conference of Catholic Bishops regarding this –
launched the so-called Encyclical (Enciklika) movement in 1934, which aimed to promote the
objectives of papal encyclicals in assemblies and conferences. Therefore, they presented Chris-
tian social actions from Rerum novarum, and vocational orders from Quadragesimo anno as
two complementary ideas. The patron of the movement was Count Gyula Zichy, Archbishop of
Kalocsa, and its most important leader was János Tobler, member of the parliament, the head
of Hungarian Christian trade unions.
As – according to Vida (1990: 78-79) – the Christian social trade union movement was
weak, the organization of industrial workers’ groups was carried out by the organization cal-
led Parish Labour Groups (EMCS), and from 1937 by the Parish Labour Department (EMSZO).

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 265-276, maio-agosto 2018 265
Péter Krisztián Zachar

However, the most influential labour organization in the late 1930’s was Hungarian Workers’
National Vocation Organization (Hivatásszervezet, HSZ) that became a national body from
1939. According to its own wording, the aim of EMSZO was not else than “the victory of
vocational order-based economy as explained in Quadragesimo anno, as compared to the
current capitalist economic system” (Gergely, 1977: 188). The organization promoted the abo-
vementioned aims in its official paper (titled Új Szociális Rend, later Új Rend). The editor of
the monthly paper was Ferenc Bihari, and its publisher was József Freesz; both leading figures
of the movement. The paper often published writings on the new principles of social and
economic organization by Hungarian thinkers of vocational orders, especially articles by father
László Varga S. J. Nevertheless, EMSZO sought to educate workers culturally and spiritually in
upcoming years, while Hungarian Workers’ National Vocation Organization (HSZ) as a natio-
nal body represented the cause of the development of the economic and social situation of
workers (Bihari, 1938).
The support from the church, their interpretation of vocational orders, and the sensation
of international tendencies within Hungary served as an inspiration for the prominent intellec-
tuals of laic Catholic social science. This is well demonstrated by the fact that the most impor-
tant Hungarian Christian social thinkers of vocational orders were invited to the archbishop’s
vicar conference in Budapest in spring 1939: József Freesz, head pastor of the EMSZO centre,
Farkas Heller, university professor, Károly Huszár, former prime minister, head of the social
section of AC, Béla Kovrig, university professor for social sciences, József Közi-Horváth, pastor,
central secretary of AC, Vid Mihelics, university private professor, Ferenc Mikos, judge of the
general court, János Tobler, member of the parliament, national chairman of Christian socialist
trade unions, László Varga S. J., college professor, and István Vida, central secretary of EMSZO
discussed the realization of a system based on vocational orders in Hungary.
When we examine ideologies in Hungary, we may agree with the explanation of the era
stating that “the circle of Catholic intellectuals committed to reforms undertook nothing less
than the application of Catholic social catechism to Hungarian conditions, in order to make
Catholic suggestions that are clearly different from the criticism of the state from both right
and left” (Petrás, 2013: 10). In the meantime, new journalistic organs were born (Korunk
Szava, Vigilia, Új Kor), and countless books and studies were published (especially by two
church-based companies, Magyar Szemle Társaság and Szent István Társulat), which, again,
underlines the thesis I have mentioned before, that is, the intellectuals of contemporary Hun-
gary could be placed in the mainstream of European ideologies and new views, and kept
pace with the development tendencies of the era. The views and ideas emerging in Europe

266 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 266-276, maio-agosto 2018
The concept of vocational orders in Hungary between the two world wars

produced a quick response –and in some cases serious criticism– in Hungarian Christian-con-
servative intellectual circles.
Ideologies spreading Europe-wide at the time included the universalist concept of
Othmar Spann (1878-1950). Spann was as a consequence of his thoughts on a new state
(Spann, 1921) one of the most influential thinkers of the 1920’s and 1930’s dealing with
economics and social philosophy in the German speaking parts of Europe. His new order
deprived the structure of the organic “true state” of faith and church teachings and had a
fundamental influence on the creation of the Austrian “Ständestaat” concept (Zachar, 2014:
135-142). His ideas were discussed and documented in various debates in Hungary, but they
did not leave a mark in the work of the thinkers of the Hungarian Christian conservative side.
On the one hand, Hungarian solutions were mostly based on the corporative Italian state and
the Austrian and Portuguese attempts somewhat different from it. On the other hand, they
aimed to promote the implementation of the “social order” in connection with religious life,
based on papal encyclicals and solidarist teachings (mostly by Gustav Gundlach and Oswald
Nell-Breuning).
If we examine relevant contemporary documents and events, it becomes clear that we
may regard Jesuit father László Varga (1901-1974) as the most significant Hungarian thinker
of vocational orders. His thoughts are extremely significant imprints of Hungarian interwar
theorizing as he always strove to give professional, precise and practical guidance based on
facts of reality in order to resolve the social and economic crisis of the era. The focus of his
ideas was the construction of a society based on vocational orders. He repeatedly gave voice
to his opinion that the necessity of changes may not go unnoticed following the publication
of Quadragesimo anno: the papal encyclical forces all thinkers open to reforms to express
their standpoint regarding the spiritual, social, economic and societal problems mentioned
in the encyclical (Varga, 1933). The search for solutions made it clear that the ways taken
before had come to a dead end. The realization of socialist teachings abolished the significant
driving force in economy that was created by the entrepreneurial character including initiative
and organizational skills. According to the views of László Varga, this made effective produc-
tion impossible. However, on the other hand, unlimited capitalism did not possess the moral
powers that could have preserved human character and initiative within a rapidly improving
world of technology (Varga, 1941). During the search for the way out, it also expressed the
clear rejection of revolutionary solutions and dictatorial efforts. It also professed its faith in a
strong state, whose role is to serve the nation as its most important organization of law, power
and welfare. Society takes precedence in all issues, but it is further divided into smaller com-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 267-276, maio-agosto 2018 267
Péter Krisztián Zachar

munities which strive to achieve partial aims besides common good. As Strausz (2011: 190)
stated: the state therefore does the right thing if “it organizes economic society (or the society
of those operating in economy) in a way that it serves national public interests independently,
by directing itself according to social justice.”
Regarding the structure and role of the state, father Varga clearly depicted a strong public
authority responsible for public good, still within certain limits. According to him, the state was
“nothing else than the public entity of social justice based on self-government” as a result of
its fragmentation. The state actually becomes a servant of society through its help in making
individuals achieve their aims more easily and completely, while public good is also realized.
However, the state – in order to satisfy the theory of subsidiarity and maintain peace and com-
mon good – may not extend its responsibilities to tasks and issues that belong to individual
citizens or smaller communities, because it would lead to the creation of a totalitarian regime
(Varga, 1941: 19-23).
This all can only be achieved with the economic order defined by Quadragesimo anno,
by the equality of work and capital, and the construction of the “society of work”. In a so-
ciety divided by families and working associations, then by the state, the reconciliation of
individual freedom and public interests becomes possible, the class struggle is terminated,
and social responsibility is no longer a private issue, but – through solidarity – a public matter
(Varga, 1941: 25-31). Summarizing the traditional ideas of solidarism based on the works of
ethicist and economist Heinrich Pesch S.J., László Varga’s expectation was that social justice
becomes the primary governing principle of national economy instead of the dictatorship of
free competition and capital. By this, a fair distribution of incomes can be realized, and class
struggle is replaced by the cooperation of various professions, besides the supervision and
control of state power (Varga, 1933: 20-21). In this system, market economy does not give
up on individual initiative, and provides an opportunity for individuals with outstanding skills
to develop their talents, also stimulating enterprise in society. Following the footsteps of the
Fribourg Union, Rerum novarum and Quadragesimo anno, László Varga also declares that
profits and gains acquired in a fair and honest way are not morally questionable, and they are
necessary in economy. However, he also emphasizes the dual nature of wealth and the social
responsibility stemming from it (Varga, 1941: 65-67). In his research on the works of pater
Varga, Rigó (2013: 20-57) found out that the most important consequence of the introduction
of the vocational order system for Varga was in the fact that in contrast to capitalism, where
profit has become the only norm of economic activities, the framework of the vocational order
system only involves private interests as a force inspiring people to enterprise and work, while

268 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 268-276, maio-agosto 2018
The concept of vocational orders in Hungary between the two world wars

the basic governing principle is the interest of public good, the law of social justice. Varga also
strived to realize his beliefs on the stage of everyday politics.
Other prominent figures worth mentioning besides father Varga include Vid Mihelics
(1899-1968) sociologist, journalist, editor, university professor, member of the parliament and
Béla Kovrig (1900–1962) sociologist, politician, university professor. Their common political
programme was to convince society to find the Christian social order that would protect and
further develop the Hungarian state apparatus, even in times of extremist ideas, in midst of
unlimited liberalism, Stalinist Bolshevism, Hitler’s National Socialism and European authorita-
rian tendencies. “And what is the essence of this vocational order system?”, wrote Mihelics
in 1940, in the shadow of World War II. “The restoration of the appropriate order in the
relationships of individual and community, minor communities and society, society and state,
to make a people again out of the masses, whose activities, especially political and economic
ones, are directed by its natural leaders in the name of social justice” (Mihelics, 1940). There-
fore, it is indispensable to create a state apparatus with the objective of public good, and, at
the same time, ensure the operation of small communities, social groups, and vocational order
organizations. In other words, the modern state “must not exceed the degree of intervention
necessary to remedy matters and avert dangers”. On that account, the state supplemented
by vocational order structures “may only limit the rights and freedom of citizens to an extent
required by the interests of public good. After all, public good is one carried by the state, and
it is not the ultimate goal of citizens, but a tool for the achievement of the absolute human
aim” (Mihelics, 1933: 31-32).
The thoughts of Mihelics and Kovrig on the separation of the dimensions of vocational
orders and the mostly corporative and authoritarian state system were extremely far-reaching;
especially in the light that the communist power set up in Hungary after 1945 did everything
to conflate fascist corporatism and nazi totalitarian social control structures with the Christian
thought of vocational orders, which was basically against those two ideas (Strausz, 2011: 180).
Mihelics and several other Catholic thinkers (for example, vocational order authors gathering
around Korunk Szava) distanced themselves from corporatism on a theoretical basis, which
was ”an individual intellectual achievement” (Petrás, 2013: 18). The new way for them was
the balancing of interests and social reforms, whose tool was the idea of vocational orders,
which they clearly distinguished and distanced from former corporatist or totalitarian efforts.
One of the most exciting segments of the Hungarian debate was the practical implemen-
tation of theories, which was different from other European models in many ways. However,
the limitations of the present study do not allow a detailed analysis of the governmental alter-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 269-276, maio-agosto 2018 269
Péter Krisztián Zachar

natives of social and economic reorganization. I believe that the essential elements of these
ideas coming up three times during the governments of Gyula Gömbös, Béla Imrédy and Pál
Teleki have been sufficiently documented by Péter Strausz in his latest works (2010: 83-122).
These three attempts proved each unsuccessful.
The first attempt is connected to the Gömbös-government. After gaining power in 1932,
Gyula Gömbös wanted to replace the traditional conservative‐liberal parliamentary govern-
ment with a new, modern, dynamic political and socio-economic system. It was called a “sel-
f-sustaining” (öncélú) anti-libertarian, in other words authoritarian state: Gömbös believed
that political power must be centralized and the authority of the Hungarian parliament and
some other branches of government curtailed. Therefore, Gömbös was an advocate of a new
state-order that was inspired by Italian-style corporatism. His ideas were summarized in the
National Work Plan or the 95 points in its final version. Gömbös called for state intervention
in economics and finance; he wanted to reform labor relations based on the Italian Carta del
Lavoro; socialist trade unions were to be banned and should be replaced by a new form of
economic corporations. In April 1935, the cabinet discussed a bill for the creation of professio-
nal corporations (chambers) as statutory bodies of interest protection in the field of production
and employment. But, because of his unexpected death in 1936 and the emerging opposition
of the traditional conservative politicians, the reform attempts of Gömbös ended without the
creation of a new corporatist economic or political structure (Macartney, 1956-57).
The second failed attempt to change the politicalsocio-economic system of Hungary
came from prime minister Béla Imrédy. Although he was considered a moderate financial ex-
pert, a Christian pragmatist with excellent connections in the international money market and,
therefore, a reasonable choice to stop the rise of the Hungarian National Socialists led by Fe-
renc Szálasi, Imrédy came out with a corporatist program to transform Hungarian society and
economy in 1938. His program was inspired by a visit to Benito Mussolini in the summer of the
same year. The Duce advised Imrédy to come up with a new political program with solid social
reforms, the development of corporatist organizations or the introduction of the program of
“Dopolavoro”, the Italian fascist leisure organization. In the following Imrédy announced a
sweeping social program, including the redistribution of large estates, the transformation of
the economic structure and the formation of a new mass-movement called Movement of Hun-
garian Life, with which he intended to replace the government party just like in Italy or Aus-
tria (Cornelius, 2011). But again: the prime ministers plan of groundbreaking reforms of the
Hungarian political system had run into very harsh opposition. It was again István Bethlen, the
leader of the opposition conservatives, who organized a cross-party voting coalition against

270 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 270-276, maio-agosto 2018
The concept of vocational orders in Hungary between the two world wars

Imrédy’s government. After losing a vote of no confidence on a point of procedure, Imrédy


resigned from the government in November 1938.
The third governmental attempt to introduce a new state-order in Hungary emerged
with the outbreak of the military conflicts: after the beginning of WWII the government led
by Pál Teleki focused on keeping away Hungary from the war. One aspect of this endeavor
was to bring a social and governmental reform into the field of administration and economy.
But this reform was not inspired by the Italian-style corporatism at all. The real thinktanks
of the planned Teleki-reform were the different organizations and intellectuals devoted to
a new, Christian and social vocational order. Teleki’s main advisors during the preparation
of a new state order were the above mentioned Christian thinkers of the interwar period:
Béla Kovrig, Vid Mihelich, László Varga or István Vida. But in the end this third attempt also
vanished due to the far-right politicians in Hungary, who tried to make the new model their
own and who tried to monopolize the discussions about the initiation of vocational orders
in Hungary (Strausz, 2011).
In addition, the three attempts involved the evolution of three basically different con-
cepts in interwar Hungary. Despite the definition of the concepts at a high level, the overall
reorganization of economy and society based on vocational orders or corporative ideas was
not implemented in Interwar-Hungary (Csonka-Magyarország, Smaller Hungary as it was cal-
led by many politicians after the Trianon Treaty). The only actual practical solution of the era
was proposed by the Vocation Organization of Szeged, which only existed for a short time,
but displayed great social organizing force (its official name in Hungarian was Szegedi Ipari
Munkavállalók Hivatásszervezete, then, as a national organization, Magyar Dolgozók Orszá-
gos Hivatásszervezete /National Organization of the Vocational Order of Hungarian Workers).
What makes the question even more interesting is that the most important figures of the
initiating efforts of Hungarian Catholic vocational order organizations mentioned in Qua-
dragesimo anno in Hungary were Jesuit priests graduating from sociological programmes of
German and Austrian universities. They provided the most important figures of the Hungarian
interpretation of the idea of vocational orders, and they also undertook the task of the prac-
tical realization of theories published by Pope Pius XI. As Rigó and Zachar (2013: 125-146)
show us: the young Jesuits of Szeged gathering around Varga László S. J., and members of the
lower clergy sympathizing with them, especially Jenö P. Kerkai, and later on, Gyula Glattfelder,
Bishop of Csanád, also took part in the promotion, launch and support of the organization. Its
operation was independent of parties and denominations. Therefore, it became a new kind of a
national trade union within five years, counting almost 100,000 members and 20 secretariats

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 271-276, maio-agosto 2018 271
Péter Krisztián Zachar

in cities and counties. The significance of the organization is well proved by the fact that it
was dissolved two times during the era of dictatorships: the nazi government made a decision
to terminate Vocation Organizations during 1944, and the communist power took a similar
position in 1945.
If we consider the abovementioned tendencies and examine the Hungarian version of the
modern age discourse on state and economy, as well as the social issues related to them, we
can say without exaggeration that the Hungarian scholasticism of the first half of the twen-
tieth century not only kept pace with developments in Europe, but greatly contributed to the
broadening and deepening of the debate. As I have pointed out, the idea of social and econo-
mic reorganization on a new basis was not limited to a narrow circle of people who could be
labeled as right-wing, reactionary, or fascist. These ideas formed a widespread ideology which
could become a part of political “mainstream”. Considering the social dimension, we can state
that they served as a reference for political thinking, including the socialist labour movement,
political Catholicism, and extreme national socialist ideologies. It was a need to create a strong
state with social justice and a hierarchical society ruled by an elite of virtue. The social teaching
of the Catholic church greatly contributed to the creation of a modern market economy and
state apparatus model in European history after 1945. In this sense, the four basic principles
also expressed in Hungarian Vocation Organization documents in interwar efforts proved to
be decisive: the theory of personality, that is, human dignity is the decisive factor as opposed
to individualism and totalitarianism; the theory of solidarity, that is, individuals are present in
socio-economic processes together with others, and therefore share responsibilities as well;
the theory of subsidiarity, that is, the self-government of individuals and small groups in mat-
ters that can be handled this way more easily than by the whole community; and the theory of
public good, that is, the state is a partner in the development of social groups, and with its help
particular interests can be overshadowed as opposed to the interests of the entire community.
Father László Varga, Béla Kovrig and Vid Mihelics renewed the interwar state concept
from the aspect of Catholic vocational orders and subsidiarity. They had images of the future
with optimism and belief in the essential goodness of man. They detected fatal errors in the
principles of liberalism and capitalism which had to be corrected. Their new concept of voca-
tional orders was an attempt to create a modern version of a historical concept of a united
society in which the various components each play an important part just as various parts of
the body serve specific roles in the life of a body. However, this is quite consistent with Mon-
tesquieu’s views on the separation and balancing of powers (that is, checks and balances).
They included the role of public good and civil society in political thinking and also pointed

272 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 272-276, maio-agosto 2018
The concept of vocational orders in Hungary between the two world wars

out the importance of two new powers: economy and media. This attitude is indicative of the
religious, social and practical political views of authors relying on solidarism and Christian
social ideas, providing the mainstream of Hungarian thinking on vocational orders, who at-
tempted to protect their concept from unbounded libertarian and totalitarian ideas (being an
inherent danger). All in all, we can state that Hungarian thinkers took a basically important
step towards a re-interpretation of vocational orders and its application in a modern Christian
democratic framework – their ideology was an independent intellectual product, but it was
established in line with similar contemporary Western European trends. However, this Christian
humanistic alternative for Hungary fell during World War II in the struggle with the nazi regime
and some years later in the struggle with the Stalinist totalitarian system. The thought leaders
of the vocational order ideology either left the country immediately or were forced by the
gradually strengthening dictatorship to go in exile, first internal then external. There was no
space left for Christian democratic political activity in this part of Central Europe languishing
under Soviet occupation.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 273-276, maio-agosto 2018 273
Péter Krisztián Zachar

Bibliography

ADRIÁNYI, Gábor. A szociális kérdés a német és a magyar katolikus egyházban 1891 eött. Magyar Egyház-
történeti Vázlatok. Budapest. v. 7, n. 1-2, p.167-176, 1995.
BÁCSFAINÉ HÉVIZI, Józsa. Prohászkai lelkülettel – a hit szárnyain: Új kihívások és megoldási kísérletek a
székesfehérvári egyházmegyében és a budafoki egyházközségek életében (1930-1970). Handwritten, PhD
dissertation, PPKE, 2009.
BALOGH, Margit. A KALOT és a katolikus társadalompolitika 1935-1946. Budapest: MTA Történettudományi
Intézete, 1998.
BIHARI, Ferenc. Az EMSZO mozgalom eszmei iránya: Magyar Kultúra, n. 4, 1938.
BOTOS, Katalin. Gazdaság és etika. A katolikus társadalmi tanítás gazdaságetikája történeti perspektívá-
ban. In: Tantörténet és közgazdaságtudomány. Ünnepi dolgozatok Mátyás Antal professzor születése 80. és
tanári pályájának 50. évfordulója alkalmából. BEKKER Zsuzsa. Budapest: Aula. p. 257-271, 2003.
CORNELIUS, Deborah S. Hungary in World War II. Caught in the cauldron. Fordham University Press, 2011.
EGRESI, Katalin. Szociálpolitika Magyarországon. Nézetek, programok és törvények 1919-1939. Budapest:
Napvilág Kiadó, 2008.
FRENYO, Zoltán. Egy magyar katolikus gondolkodó. Mihelics Vid életmüve. Budapest: Magyar Egyháztörté-
neti Enciklopédia Munkaközösség, 2002.
______. Mihelics Vid keresztény társadalomfilozófiája. In: Megidézett reneszánsz. A Hanák Tibor szüle-
tésének 75. évfordulója tiszteletére rendezett nemzetközi konferencia anyaga. Ed. VERES Ildikó. Miskolc,
p. 209-223, 2006.
GERGELY, Jenö. A politikai katolicizmus Magyarországon (1890-1950). Budapest: Kossuth, 1977.
______. A keresztényszocializmus Magyarországon 1924-44. Gödöllö: Typovent, 1993.
______. Prohászka Ottokár,a napbaöltözött” ember. Budapest: Gondolat, 1994.
______. Szociális enciklikák és a magyar katolicizmus. In: Ministerio. Nemzetközi történész konferencia
elöadásai. 1995. május 24-26. BÁRDOS István – BEKE Margit. Esztergom – Tatabánya: Esztergom-Budapest
Érsekség, Komárom-Esztergom Megye Önkormányzata, Kultsár István Társadalomtudományi és Kiadói Alapít-
vány, p.185-197, 1998.
______. A keresztény szindikalizmus története a XIX-XX. Században: A Keresztény Szakszervezetek Nem-
zetközi Szövetsége. Budapest: MTA-ELTE Pártok, Pártrendszerek, Parlamentarizmus Kutatócsoport, 2007.
GIANONE, András. Az Actio Catholica története Magyarországon 1932-1948. Budapest: ELTE BTK Történe-
lemtudományi Doktori Iskola, 2010.
HALMOS, Károly. A polgárság pénzügyi, gazdasági és társadalmi karrierje a kiegyezéstöl a második világ-
háborúig: Gazdaság- és társadalomtörténeti korrajz. In: Szenvedély és tudás: Bedö Rudolf mügyüjteménye.
MOLNOS Péter. Budapest: Kieselbach Galéria, p. 286-293, 2010.
KAPOSI, Zoltán. Magyarország gazdaságtörténete 1700-2000. Budapest – Pécs: Dialóg Campus, 2010.
KARPELES, Benno. Klassenkampf, Fascismus und Ständeparlament. Wien: Typographische Anstalt, 1933.

274 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 274-276, maio-agosto 2018
The concept of vocational orders in Hungary between the two world wars

KÉK, Emerencia. A hivatásrendiség elüzményei a katolikus egyház szociális tanításában a Rerum novarum
és Quadragesimo anno enciklikák alapján. In: Gazdaság, társadalom, hivatásrendiség a 20. századi Euró-
pában. ZACHAR Péter Krisztián. Budapest: L’Harmattan, p.37-45, 2013.
KOVÁCS K., Zoltán (Ed). Félbemaradt reformkor, 1935-1949: törekvések Magyarország keresztény humanista
megújítására, a haza és a szegénység szolgálatában. A Katolikus Szemlében megjelent tanulmányok és a
2005-ben kiegészített, átdolgozott írások gyüjteménye. Budapest: Püski, 2005.
______. A magyar katolikus egyház és a szociális kérdés. In: Az élö hagyomány. Barankovics István és a
magyarországi kereszténydemokrácia öröksége. Budapest: Barankovics István Alapítvány – Gondolat, 2007.
LÁSZLÓ T., László. Egyház és állam Magyarországon 1919-1945. Budapest: Szent István Társulat, 2005.
MACARTNEY, Carlile Aylmer. October fifteenth. A history of modern Hungary 1929-1945. Edinburgh: Edin-
burgh University Press, 1956-1957.
MIHELICS, Vid. Keresztényszocializmus. Budapest: Magyar Szeme Társaság, 1933.
______. A pápai enciklikák és a szociális fejlödés: Szociális szemle. Budapest, vol. 1, n. 2, p.49-55, 1939-
1940.
______. A korforduló veszedelmei: Nemzeti Újság, augusztus 18, 1940.
MÓZESSY, Gergely. Prohászka Ottokár életútja 1-2. SZEM v. II, n. 4, 2005 – v. III, n. 1, 2006.
ORMOS, Mária. Katolicizmus a világválság sodrában. A pápaság és a magyar egyház, különös tekintettel
a pécsi egyházmegyére 1929-1933. In: A 20. század egyház- és társadalomtörténetének metszéspontjai.
Tanulmányok a pécsi egyházmegye 20. századi történetéböl. Ed.: BÁNKUTI Gábor – VARGA Szabolcs – VÉR-
TESI Lázár. Pécs: Pécsi Püspöki Hittudományi Föiskola, 2012.
PETRÁS, Éva. Társadalmi tanítás és szociális kérdés. Az egyház társadalmi tanításának recepciója a katolikus
értelmiség körében: Egyháztörténeti szemle. Budapest, v. 14, v. 2, p.3-19, 1931–1944.
PROHÁSZKA, Ottokár. Keresztény szociálista akció. (1894) In: PROHÁSZKA Ottokár: Kultúra és terror. A társa-
dalmi kérdés. Prohászka Ottokár Összegyüjtött Munkái. XI. kötet. Ed.: SCHÜTZ Antal. Budapest: Szent István
Társulat, 1927.
______. A liberalizmus utópia. (1896) In: PROHÁSZKA Ottokár: Korunk lelke. Prohászka Ottokár Összegyü-
jtött Munkái. X. kötet. SCHÜTZ Antal. Budapest: Szent István Társulat, 1928.
REICHHOLD, Ludwig. Scheidewege einer Republik. Österreich 1918-1968. Wien: Herder, 1968.
RIGÓ, Balázs. A szociális igazságosság Varga László S. J. munkásságában. In: Történelem és politika régen
és ma. Tanulmányok. Ed.: STRAUSZ Péter – ZACHAR Péter Krisztián. (Modern Minerva Könyvek 6.), Budapest:
Heraldika Kiadó, p.20-57, 2013.
______ – ZACHAR, Péter Krisztián. Hivatásrendiség másképp : A szegedi Hivatásszervezet mint szakszer-
vezet. In: Gazdaság, társadalom, hivatásrendiség a 20. századi Európában. Ed.: ZACHAR Péter Krisztián.
Budapest: L’Harmattan Kiadó, p.125-146, 2013.
SÁFRÁNY, Attila. Giesweinn Sándor emlékezete. Vigilia. vol. 69, n. 6, 2004.
SPANN, Othmar. Der wahre Staat: Vorlesungen ueber Abbruch und Neubau der Gesellschaft. Leipzig: Quelle
& Meyer, 1921.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 275-276, maio-agosto 2018 275
Péter Krisztián Zachar

STRAUSZ Péter. Korporáció vagy hivatásrend? Az érdekképviseleti rendszer átalakításának kérdése Európá-
ban és Magyarországon 1926-1940. Múltunk. Politikatörténeti folyóirat. v. LV, n. 1, p. 83-122, 2010.
______. Szociális érdekegyeztetés és gazdaságirányítás : Útkeresés a két világháború közötti Magyaror-
szágon. In: A gazdasági és társadalmi érdekérvényesítés stratégiái és szervezeti modelljei a 20. században.
DOBÁK Miklós. Budapest: L’Harmattan, p.165-216, 2011.
SZABÓ, Ferenc S. J. Prohászka Ottokár élete és müve, 1858-1927. Budapest: Szent István Társulat, 2010.
SZEKFÜ, Gyula. Három nemzedék. Egy hanyatló kor története. Budapest: Élet, 1920.
SZOLNOKY Erzsébet. Szociális igazságosság és keresztény szeretet: Giesswein Sándor a magyar keresztény-
szociális és kereszténydemokrata gondolkodás megalapozója. Budapest: Éghajlat Könyvkiadó, 2003.
TOMKA, Béla. Szociálpolitika a 20. századi Magyarországon európai perspektívában. Budapest: Századvég,
2003.
VARGA, József. Keresztényszociális mozgalmak Magyarországon: Távlatok. A magyar jezsuiták folyóirata.
v. 3, n. 12-13, p. 447-490, 1993.
VARGA, László. Új társadalmi rend felé. Budapest, 1933.
______. Szociális reform és hivatásrendiség. (Nemzeti Könyvtár 40-41.) Budapest, 1941.
VIDA, István. A munkásmozgalom másik oldala: keresztény szakszervezeteink. In: Félbemaradt reformkor –
Miért akadt el az ország keresztény humanista megújítása? Válogatás a Katolikus Szemle írásaiból. Rome:
Ugo Detti, 1990.
VIZI, László Tamás. Ninety years of Trianaon crisis-management. In: New approaches in a complex world.
International relations, history and social sciences. BILTSIK B. – MARENGO A. – POSTA N. – ZACHAR P. K.
Budapest: L’Harmattan, p.11-40, 2014.
ZACHAR Péter Krisztián. Gazdasági válságok, társadalmi feszültségek, modern válaszkísérletek Európában
a két világháború között. Budapest: L’Harmattan, 2014.

276 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 276-276, maio-agosto 2018
Colaboração Especial

Corporativismo y Política Social en


España. Orígenes y Evolución

Corporativismo e Política Social na Espanha: Origem e Evolução


Corporatism and Social Policy in Spain: Origin and Development

Miguel Ángel PerfectoI*

http://dx.doi.org/10.1590/S2178-14942018000200009

I
Universidade de Salamanca – Espanha.
*Licenciado em Filosofia e Letras (Seção de História) pela Universidade de Salamanca en 1972. Doutor em
História Contemporânea em 1982 com a tese “Origem e Evolução da Ideia Corporativa na Europa. Sua In-
fluência no Esquema Teórico do Corporativismo de Primo de Rivera”. (1926-1930). (maperfecto@me.com).
Artigo recebido em 20 de janeiro de 2018 e aprovado para publicação em 18 de junho de 2018.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 277-296, maio-agosto 2018 277
Resumen
En el último tercio del siglo XIX, se difunden en España dos propuestas que servirán de base al nacimiento de la
legislación social: el organicismo como concepción filosófica sustentadora de un armonicismo social y la noción del
Estado tutelar que interviene en el campo económico-social. En España, la propuesta corporativa se reflejará a fines
del siglo XIX en tres grupos diferentes: liberal krausista, conservador y católicos sociales.

Durante el siglo XX, estos planteamientos llegarán a convertirse en un proyecto político-social de alcance durante
la dictadura del general Miguel Primo de Rivera (1923-1930). El proyecto corporativo del ministro Eduardo Aunós
estaba influido por el catolicismo social, el movimiento krausista y los nacionalismos antiliberales de la Europa
de su tiempo como acción francesa de Charles Maurras. Este modelo de intervencionismo social de Estado fue
acogido mayoritariamente por la derecha española durante la Segunda República e igualmente por los pequeños
grupos fascistas.

Palabras-clave: Corporativismo; Política social; España.

Resumo
Nas últimas décadas do século XIX, difundiram-se na Espanha duas propostas que serviram de base para o surgi-
mento da legislação social: o organicismo como concepção filosófica mantenedora de uma harmonia social e a ideia
do Estado tutelar que intervinha no campo econômico-social. Na Espanha, a proposta corporativa se refletiu no fim
do século XIX em três grupos distintos: liberal krausista, conservador e católicos sociais.

No século XX, tais abordagens se tornaram um projeto político-social de largo alcance durante a ditadura do general
Miguel Primo de Rivera (1923-1930). O projeto corporativo do ministro Eduardo Aunós estava influenciado pelo
catolicismo social, pelo movimiento krausista e pelos nacionalismos antiliberais da Europa daquele tempo como uma
ação francesa de Charles Maurras. O modelo de intervencionismo social de Estado foi usado em sua maioria pela
direita espanhola durante a Segunda República e também pelos pequenos grupos fascistas.

Palavras-chave: Corporativismo; Política social; Espanha.

Abstract
In the last two decades of the 19th century, two ideas which would serve as a basis for the arise of the social legis-
lation in Spain spread: organicism conceived as a philosophical conception that would preserve social harmony and
the idea of tutelar State which interfered in the socio-economic field. By the end of the 19th century, the corporate
proposal reflected itself in three distinctive groups: Krausist liberals, conservatives, and social catholics.

In the 20th century, those approaches became a large-scale sociopolitical project during the dictatorship of general
Miguel Primo de Rivera (1923-1930). Minister Eduardo Aunós’ corporate project was influenced by social catho-
licism, the Krausist moviment, as well as the antiliberal nationalisms present in Europe at that time, as Charles
Maurras’ French movement. The model of social interventionism was mainly used by the Spanish right-wing during
the Second World War and also by smaller fascist groups.

Keywords: Corporatism; Social policy; Spain.


Corporativismo y Política Social en España. Orígenes y Evolución

E n el último tercio del siglo XIX, se difunden en España dos planteamientos que servirán
de base al nacimiento de la legislación social: el organicismo como concepción filosófica
sustentadora de un armonicismo social y la noción del Estado tutelar que interviene en el
campo social y económico. Estos dos elementos se integrarán junto con las alternativas del
catolicismo social en los orígenes doctrinales del corporativismo español.
La sustitución en el gobierno español del Partido Conservador por el Liberal, en los años
80 del siglo XIX, supuso el comienzo de un proceso de reformas sin precedentes que abar-
caron el campo jurídico —la aprobación de los códigos de leyes, juicio por jurados—, la am-
pliación de las libertades —de imprenta de 1883, de asociaciones de 1888, sufragio universal
masculino en 1890— y, por supuesto, el campo social —creación de la Comisión de Reformas
Sociales en 1883.
El debate sobre el intervencionismo o no del Estado en cuestiones sociales, en línea con
las propuestas teóricas europeas de aquellos años, y la política social de la Alemania bismar-
ckiana, creadora del estado social, se reflejarán en tres grupos diferentes: liberal-republicano
krausista, conservador y católicos sociales.
La nueva sensibilidad sobre la llamada cuestión social en España tiene que ver con una
serie de factores desde la crisis económica de los 80 en el campo, la extensión de la industria-
lización y sus consecuencias sociales, la expansión del anarquismo y el socialismo que con-
dujeron al nacimiento del sindicalismo moderno y el nacimiento del Partido Socialista Obrero
Español, en 1879, o las grandes huelgas y manifestaciones de comienzos de los 90 que con-
movieron y alarmaron a la burguesía industrial española.
El grupo liberal-republicano krausista, impulsor junto con el catolicismo social y el con-
servadurismo del nacimiento de la política social en España, estaba integrado por una bur-
guesía intelectual vinculada a la universidad, centrada sobre todo en el campo del Derecho,
Medicina e Ingeniería. Por otra parte, su actividad no se reducirá al ejercicio de la profesión
—la mayoría ejercerá, además, diversos cargos políticos durante el período y actividades de
difusión de las ideas a través de los mecanismos característicos del siglo XIX: la Academia de
Ciencias Morales y Políticas, Ateneos, prensa, etc. En definitiva, el grupo krausista representa-
ba a las élites burguesas del poder establecido que se acercaron al mundo obrero desde una
óptica paternalista y de desconfianza.
El pensamiento de este grupo intelectual reformador se nutría mayoritariamente de la
filosofía krausista, introducida en España por Julián Sanz del Río (1814-1869), catedrático de
Historia de la Filosofía de la Universidad Central de Madrid, a partir de la obra de un filósofo
postkantiano, el alemán Karl Ch. Krause (1781-1832), y de su discípulo Ahrens.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 279-296, maio-agosto 2018 279
Miguel Ángel Perfecto

Esta filosofía se extendió mediante seguidores como Francisco Giner de los Ríos —fun-
dador de la Institución Libre de Enseñanza—, Gumersindo de Azcárate, Vicente Santa María
de Paredes, Adolfo Posada y muchos otros que jugarán un papel fundamental en la cons-
trucción de un modelo de reformismo social y educativo de raíz liberal de gran influencia en
España, de ahí el nombre del movimiento español conocido como krausismo.
Para el krausismo, la sociedad es un organismo, un conjunto de órganos ordenados
sistemáticamente que constituyen y representan una unidad vital. De donde se deduce que
la solidaridad es un factor sustancial en la sociedad humana, una solidaridad que se expresa
mediante la cooperación pacífica de todos sus miembros para el cumplimiento de las distintas
finalidades sociales.1
El organicismo krausista rechaza el automatismo social de raíz biologicista, defendiendo,
en cambio, la libre iniciativa para transformar las instituciones sociales, por ello el krausismo
se inscribe dentro del liberal-republicanismo reformador.
El krausismo español inspiró y participó en todos los proyectos de reformas sociales y de
legislación obrera que se llevaron a cabo en España a partir de unos principios que ponían el
énfasis en las reformas frente a la revolución, en una concepción armónica en las relaciones
de capital y trabajo, en la defensa del sistema económico capitalista, en la necesidad de una
reforma integral mediante la educación del hombre y la sociedad, y, finalmente, en una actitud
moralizante respecto a la clase obrera.
Dentro de esta corriente muy relevante en la España del último tercio del siglo encontramos
a Eduardo Pérez Pujol (1830-1894), catedrático de Derecho Romano desde 1856 y más tarde
rector de la Universidad de Valencia, entre 1869 y 1873, ciudad en la que permaneció hasta su
muerte. Pérez Pujol había tomado contacto con el grupo krausista madrileño en los años 50 y se
adscribió desde entonces a esa filosofía social reformadora con posiciones liberales, participando
en el proceso revolucionario iniciado en 1868 y más tarde en una serie de actividades sobre la
llamada “cuestión social” que sirvieron de base a la Comisión de Reformas Sociales y a la pri-
mera encuesta social española de 1884, que permitió conocer la vida, el perfil y las opiniones de
una serie de agentes sociales y económicos en la España de fin de siglo.
Pérez Pujol fue uno de los precursores que defendieron la restauración modernizada de
los gremios como alternativa armonicista a los conflictos sociales. En ese empeño por acabar
con las raíces del conflicto social, defendió la necesidad de la intervención tutelar del Estado,
incluso la formación de un Parlamento corporativo.
Ya en 1872 publicó un discurso titulado “La cuestión social en Valencia”, en lo que de-
sarrollaba las líneas maestras de un reformismo social basado en la superación del conflicto

280 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 280-296, maio-agosto 2018
Corporativismo y Política Social en España. Orígenes y Evolución

social mediante el armonicismo social, es decir, el principio de solidaridad del Estado y las
instituciones que forman la sociedad, la constitución de los jurados mixtos como fórmula de
cooperación voluntaria de patronos y obreros para resolver sus diferencias; la creación de so-
ciedades cooperativas de producción, consumo y crédito —propuesta directamente inspirada
en el inglés Robert Owen—; la beneficencia privada y la instrucción obrera. Y, junto a ello, la
modernización de los antiguos gremios medievales.
Para él, los gremios debían ser sociedades voluntarias integradas por empresarios, ofi-
ciales y obreros para promover la concertación de los intereses industriales, creando un clima
de armonía entre “fabricantes y obreiros”.
El gran reto del gremio era solucionar la llamada “cuestión social” a través del estableci-
miento de cauces orgánicos entre trabajadores y empresarios. De esta manera, los excesos de
la industrialización, el trabajo de mujeres y niños y, en definitiva, la miseria de unos y el fasto
de otros encontrarían una respuesta adecuada consiguiendo la consolidación del orden social.
Ahora bien en su pensamiento, los gremios no cumplirían únicamente una función de
articulación social, protección de los obreros y eliminación de los conflictos sociales, sino que
transformarían la vida política sobre la base de una estructuración gremial del Parlamento, es
decir, el sufragio corporativo.
De esa forma, toda persona que tuviera una profesión, un trabajo o una propiedad podría
elegir a los diputados que correspondieran a su gremio. “El Estado”, decía Pérez Pujol, “es el
órgano de relaciones del individuo con la sociedad como de las instituciones sociales entre sí
[...] la sociedad ha de ser siempre producto de la asociación voluntaria. [...] El Estado, tutor
al presente de la sociedad en limitados órdenes, no debe olvidar que su poder es transitorio”
(Romeu Alfaro, 1979, p.176 y ss).
En 1889, Pérez Pujol matizaba su propuesta defendiendo la existencia de un Parla-
mento bicameral: el Congreso de los Diputados elegido por sufragio universal y el Senado
por sufragio corporativo.
Él fue importante no sólo como inspirador de los movimientos de reformas sociales de los
años 80 y 90 del siglo XIX, origen de la primera legislación social española, sino también por la
recuperación de algunos de sus planteamientos corporativos en la década de los 20 por parte
del ministro de Trabajo de la dictadura de Miguel Primo de Rivera (1923-1930) y, más tarde,
ministro de Justicia en la dictadura de Francisco Franco, Eduardo Aunós, autor intelectual del
primer proyecto gubernamental de un sistema corporativo, próximo al modelo fascista, que
influyó en el modelo franquista (Aunós, 1944, p. 59 y ss.).
La Comisión de Reformas Sociales creada en 1883 para tratar la situación de la clase
obrera —e integrada mayoritariamente por liberal-krausistas—, se esforzó, afirma la profeso-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 281-296, maio-agosto 2018 281
Miguel Ángel Perfecto

ra Dolores Velasco, en “afianzar los estudios sociales. [...] Defensora de un intervencionismo


más social que estatal, otorgaba al Estado la función tutelar de amparar a los débiles y corregir
los desequilibrios sociales” (Velasco, 1997, p. 149).
Su gran trabajo fue la primera encuesta social de España realizada en 1883 con las
aportaciones de todo tipo de asociaciones, desde las obreras y patronales hasta los grupos
católicos y las organizaciones de agricultores, pasando por ayuntamientos e instituciones po-
líticas y sociales, así como por la Iglesia católica.
Se pretendía con ese trabajo apoyar una política de reformas sociales de los liberales
españoles que gobernaban en aquellos años, si bien los resultados fueron bastante escasos.
En cualquier caso, este grupo se mantendría como el principal asesor gubernamental en ma-
teria social e influiría en el nacimiento del estado social en España en el primer tercio del siglo
XX. El objetivo del grupo era rectificar los abusos del capitalismo mediante reformas sociales.
Sin embargo, pretendían un cambio de valores en la sociedad sin tocar las estructuras desde
la posición intermedia de unos intereses tan dispares como los de la oligarquía y el mundo
obrero y propiciador de una armonía imposible o utópica (Velasco, 1989, p. 32).

Las propuestas sociales del conservadurismo español

J unto con el krausismo, el conservadurismo español representado por su líder Antonio Cá-
novas del Castillo y sobre todo por los llamados regeneracionistas conservadores como
Francisco Silvela, Eduardo Dato —autor de las primeras leyes sociales a comienzos del siglo
XX— y Antonio Maura se unirán a la corriente intervencionista en el campo social.
Para una parte del conservadurismo español era importante revisar los supuestos del
liberalismo individualista en línea con las propuestas teóricas que se discutían en la Europa de
entonces, desde la revisión de la economía clásica a cargo de la escuela histórica alemana —
los “socialistas de cátedra”— y la extensión de las políticas proteccionistas hasta la corriente
“solidarista” de raíz francesa que defendía el principio de la “solidaridad natural” frente al de
“la lucha por la vida”, justificando así un nuevo concepto de Estado como elemento activo al
servicio de un ideal social.
Por otra parte, sobre este grupo conservador influyen hechos tan notables como la recep-
ción de la encíclica de León XIII Rerum Novarum, en 1891, si bien la repercusión inicial de ella
no fue muy grande ni entre los políticos conservadores ni en el campo católico. Como señala
el profesor Montero:

282 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 282-296, maio-agosto 2018
Corporativismo y Política Social en España. Orígenes y Evolución

La reforma social en España se plantea y avanza muy estrechamente vinculada al reformismo


social europeo. Una minoría de la élite gobernante e intelectual española conoce las leyes e
instituciones sociales que se están implantando en Alemania, Francia, Bélgica, y participa en las
instancias internacionales promotoras de la reforma social (1997, p. 61).

El conservadurismo de fines del XIX es decididamente partidario del Estado intervencio-


nista en el campo social y económico, y algunos de sus miembros, como Silvela, son igualmen-
te defensores del sufragio corporativo.
El intervencionismo conservador expresado por Del Castillo gira en torno a tres aspectos:
en primer lugar, el proteccionismo económico; en segundo, la necesidad de una legislación
social obrera en el marco de la libertad de contratación; por último, la necesidad de una con-
tención de las acciones revolucionarias mediante la defensa del orden público.
Desde este ángulo, el intervencionismo estatal en forma de leyes obreras cumple el ob-
jetivo político conservador de contrarrestar la revolución socialista haciendo concesiones a los
obreros para atraerlos a posiciones moderadas, aunque esas concesiones se alternarán con
la represión.
El intervencionismo estatal se inscribirá, desaparecido el líder Del Castillo dentro de lo
que se ha denominado el regeneracionismo conservador expresado por Silvela, Dato y Maura.
Los tres plantearon dos propuestas importantes en el campo conservador español: 1) la nece-
sidad de reformar el sistema político ahogado por el caciquismo y la corrupción mediante la
reforma de la ley electoral y de la administración local, y 2) la exigencia de una política social
del Estado que limitara las posiciones revolucionarias del movimiento obrero de entonces.
Por lo que se refiere al primer punto, el sistema político español de la restauración se
basaba esencialmente, como es conocido, en el control caciquil del poder por camarillas de
los dos partidos del turno, conservadores y liberales, en colusión de intereses con la nobleza
terrateniente y la burguesía industrial, la cual propiciaba una amplia corrupción política.
La crisis desencadenada por la pérdida de las últimas colonias españolas en la guerra his-
pano-norteamericana de 1898 creará un ambiente favorable en la opinión pública española
para las reformas políticas y sociales. Por ello, estos dirigentes conservadores intentarán reali-
zar reformas con el fin de transformar el sistema político para evitar desde arriba la revolución
desde abajo, en frase conocida de Maura. Eso explica, además de la propia recepción del
positivismo, el culto por la moral política y el énfasis en la necesidad de acercar la política al
ciudadano. Tanto Silvela como Maura entendieron la regeneración como una dignificación de
la política más que como una verdadera modernización y democratización de la sociedad
(Cortina, 2006, p. 154 y ss).

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 283-296, maio-agosto 2018 283
Miguel Ángel Perfecto

Efectivamente, la mayoría de los conservadores españoles no era partidario de una re-


forma democrática del sistema político y social, entre otras razones, porque, dado su pensa-
miento corporativista, tendían a reforzar la representatividad con el sufragio corporativo y una
reordenación social nueva. Además, su estrecha vinculación con la ideología católica les impe-
día el avance y la comprensión de un mundo en trance de secularización, mientras el miedo al
crecimiento del movimiento obrero les hacía mantener un sentido represivo del orden público.
Los intentos de reformas políticas sobre todo en la administración local y en el régimen
electoral que llevaron a cabo los políticos citados anteriormente, el programa de descentrali-
zación administrativa que defendieron y el intento de introducir lo que se llamó la “represen-
tación de los intereses”, es decir, el sufragio corporativo, fueron los elementos más destacados
de este conjunto de reformadores conservadores a fines del siglo XIX y comienzos del XX.
Sobre el sufragio corporativo como alternativa al universal, decía Silvela:

Con el sufragio universal se gobierna pero con el sufragio universal no se administra […] el ciu-
dadano tiende a no valorar su derecho de voto y con facilidad lo vende por nada. En cambio, un
mandato de un círculo, corporación o centro supone para el mandatario una mayor obligación,
un seguro contra el fraude [...] utilizar para la construcción de los municipios, dentro del sistema
electoral, el elemento colectivo, los gremios (Portero, 1997, p. 55).

En cuanto a las reformas sociales que pusieron en marcha como gobernantes, fueron el
resultado del trabajo previo desarrollado por intelectuales krausistas y, en menor medida, por
católicos sociales, conservadores y liberales, con una presencia reducida de sus verdaderos
protagonistas: obreros y patronos.
El trabajo preparatorio se encauzó a través de la Comisión de Reformas Sociales y el
Instituto de Reformas Sociales, creado en 1903, un organismo que dependía del Ministerio
de la Gobernación, lo cual demuestra que en el fondo lo que subyacía en el reformismo social
español era paternalismo, beneficencia y miedo a los grupos obreros.
En la política de reformas sociales podemos señalar tres fases. La primera, entre 1883 y
1903, caracterizada por el análisis y debates sobre el hecho y las causas de la cuestión social,
estuvo dirigida por la Comisión de Reformas Sociales.
La segunda, entre 1903 y 1917, se inicia con la creación del Instituto de Reformas Sociales,
en 1903, cuya misión era preparar la legislación de trabajo, cuidar de su ejecución y favorecer la
acción social y gubernativa, y sigue en 1908, con la creación del Instituto Nacional de Previsión,
que tenía doble finalidad: difundir la necesidad de una previsión popular, en forma de pensiones
de retiro, y administrar la mutualidad voluntaria de asociados subsidiada por el Estado.

284 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 284-296, maio-agosto 2018
Corporativismo y Política Social en España. Orígenes y Evolución

El tercer período, entre 1917 y 1926, responde a la necesidad de dar una respuesta a
la creciente conflictividad social y a la propia crisis del sistema de la restauración— fruto de
ello fue la creación por Dato del Ministerio de Trabajo, en 1920, que agrupó al Instituto de
Reformas Sociales y al de Previsión con el fin de tener un mayor control gubernamental de las
acciones de ambos organismos.
El creciente enfrentamiento que se manifestó entre los intereses de obreros y patronos
dentro del Instituto de Reformas Sociales inducen a pensar que esa sea la razón de la susti-
tución, en 1924, de este instituto por un nuevo organismo, el Consejo de Trabajo, con repre-
sentación patronal y obrera, pero mucho más controlable por el gobierno. Esta etapa culmina
con la construcción de un modelo corporativo basado en comités paritarios, en 1926, en la
dictadura de Rivera.
Del intervencionismo estatal moderado subsidiario de épocas anteriores, tal como habían
defendido krausistas, conservadores y católicos, se pasará a un intervencionismo pleno, en el
que el Estado y sus instituciones deciden en el campo económico y social. Con las leyes sobre
accidentes de trabajo de 1900, sobre mujeres y menores del mismo año y sobre descanso
dominical de 1904 se inaugura la legislación obrera en España, preparada y elaborada por el
Instituto de Reformas Sociales, que se convierte en el instrumento de los liberales krausistas
para encauzar las reformas sociales con el apoyo declarado de conservadores y católicos.
En este mismo período destaca la aprobación de las leyes de conciliación y arbitraje
industrial y de tribunales industriales de 1908, germen del futuro modelo corporativo de la
dictadura de Rivera.
A pesar del crecimiento de la legislación social desde comienzos de siglo —sólo entre
1900 y 1910 se aprueban 531 disposiciones de carácter social y laboral—, su virtualidad fue
escasa por el propio rechazo y boicot de los empresarios españoles e igualmente por la actitud
de oposición de los sindicatos y el partido obrero, lo cual llevó a la inoperancia de la legislación
social española, como se muestra en las Memorias anuales de la inspección de trabajo que
publicaba el Instituto de Reformas Sociales a partir de 1906 y en las que se constataba el
grado de incumplimiento inicial de las leyes sobre el trabajo (Lopez, 1997, p.126).

Las alternativas del catolicismo español: catolicismo


político y acción social

L a restauración de la monarquía borbónica en 1875 en la persona de Alfonso XII fue aco-


gida con bastantes esperanzas por los católicos españoles tras el período revolucionario
iniciado en septiembre de 1868 caracterizado, según la prensa católica, “por la progresiva
violación de todos los derechos de la Iglesia” (Benavides, 1978, p. 13).

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 285-296, maio-agosto 2018 285
Miguel Ángel Perfecto

Sin embargo, Del Castillo necesitaba negociar la permanencia del nuevo régimen con
los grupos liberales que habían participado en los inicios de la Revolución de 1868. Uno de
los pilares del nuevo régimen político era no caer en errores de regímenes anteriores creando
un sistema pragmático y flexible que permitiera gobernar a conservadores y liberales sobre la
base de la tolerancia y los derechos individuales. Pero para los católicos la unidad católica era
irrenunciable y en consecuencia se opusieron a la libertad religiosa.
Pese a las presiones de la jerarquía católica y el propio Vaticano, Del Castillo mantuvo
en su proyecto de Constitución, dentro de una declaración de confesionalidad del Estado, una
tolerancia restringida hacia las demás religiones.
La aprobación de este proyecto que se convirtió en la Constitución de 1876 agudizó la
división de los católicos españoles: por un lado, se situaron los católicos carlistas, que recha-
zaban la propia monarquía borbónica por liberal y añoraban la monarquía absoluta con unión
del Altar y el Trono —este grupo contaba con un órgano de expresión de indudable influencia,
el “Siglo Futuro”, y el apoyo de una parte de la jerarquía eclesiástica— y, por otro, se situaban
los católicos integristas, escindidos del carlismo en 1888, que ponían el acento no en la vuelta
a la monarquía tradicional, sino en una concepción estrictamente confesional de la política y
el poder según la cual todas las acciones debían estar subordinadas a la norma religiosa y a
la institución eclesial.
Por último, había una minoría católica prestigiosa que aceptaba el régimen constitucio-
nal liberal y proponía crear un partido católico, la Unión Católica de Alejandro Pidal y Mon,
similar al Zentrum alemán, como medio para defender mejor los derechos e intereses de la
Iglesia, partido que constituyó un sonoro fracaso.
La división de los católicos respecto a la actitud a adoptar ante al régimen liberal fue
notable a pesar de los llamamientos papales a la unidad —ello explica la organización de
congresos católicos a partir de los años 90 con la finalidad de ofrecer una plataforma unitaria
a católicos de distintas tendencias. En estos congresos participaban los tres sectores del catoli-
cismo español: los integristas, encabezados por Ramón Nocedal —el grupo más numeroso—;
los unionistas, de Alejandro Pidal; y los carlistas, representados por el marqués de Cerralbo.
En realidad, los congresos católicos de fines del XIX representaron una posición defensiva
y confusa respecto al liberalismo y a lo que se denominaba el mundo moderno y las nuevas
ideologías obreras. Esto se explicita en el reglamento del congreso en el que se propone
“defender los intereses de la religión, los derechos de la Iglesia y del Pontificado, difundir la
educación e instrucción cristianas, promover las obras de caridad y acordar los medios para la
restauración moral de la sociedad”.

286 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 286-296, maio-agosto 2018
Corporativismo y Política Social en España. Orígenes y Evolución

La propaganda y acción social del catolicismo español se orientó a defender y pedir al


Estado una legislación adecuada sobre sus intereses dominantes: la defensa y protección de la
familia, el descanso dominical, la institución del gremio como instrumento de armonía social, la
defensa de la propiedad —sobre todo de la agraria— y la organización corporativa.
Como señala Montero, uno de sus más destacados especialistas, “el catolicismo social es
en una gran medida una prolongación de la lucha contra el liberalismo. La verdadera clave de
la superación del conflicto social está en la doctrina de la Iglesia. Reforma social y reconquista
cristiana [...] son tareas coincidentes (1984, p. 58).
Las coordenadas teóricas del catolicismo español del momento se movían en torno a tres
parámetros esenciales: la consideración de la propiedad como derecho natural, la afirmación de
la desigualdad humana y la nostalgia de los gremios medievales. La aceptación de esa existencia
“natural” de ricos y pobres lleva a dos cuestiones importantes defendidas por los católicos es-
pañoles, cuya finalidad era limar el escándalo social de los ricos: en primer lugar, el rechazo del
afán desmedido de las riquezas y la importancia de la caridad cristiana, punto de partida de la
llamada función social de la propiedad, y, en segundo, la defensa teórica de la pobreza.
En cuanto a la nostalgia de los gremios medievales, se mantenía como una constante en
los planteamientos eclesiásticos sobre la llamada “cuestión social”.
El gran problema del catolicismo político y social español del siglo XIX y comienzos del
XX fue, por consiguiente, enfrentarse a las consecuencias sociales y económicas de la indus-
trialización y a los nuevos desafíos derivados del laicismo, la democratización política y el
auge del intervencionismo estatal a partir de unos presupuestos teóricos fosilizados que les
impedían comprender las nuevas realidades sociales, políticas y culturales.
En consecuencia, muchos católicos con sensibilidad social se encontraron, por un lado,
coartados por las presiones conservadoras de la jerarquía eclesiástica y, por otro, sometidos
a un pensamiento integrista que lastraba un mejor acercamiento a las nuevas realidades
sociales y culturales.
La acción social de la Iglesia española se llevó a cabo mediante asociaciones mixtas
de patronos y obreros que recordaban, y no por casualidad, los viejos gremios medievales
arrumbados por el liberalismo y el capitalismo.
Estas asociaciones mixtas recibieron el nombre de círculos obreros y su principal impul-
sor, aunque no el único, fue el jesuita Antonio Vicent, quien se implicó en dicha tarea a partir
de la publicación de la encíclica Rerum Novarum.
En la formación de los círculos obreros tuvieron un papel importante las experiencias
social-católicas francesas —marqués de La Tour du Pin, Albert de Mun, etc.—, el pensa-

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 287-296, maio-agosto 2018 287
Miguel Ángel Perfecto

miento social alemán y austríaco —monseñor Ketteler, barón de Volgesang—, los congresos
católicos celebrados en Lieja y Malinas a comienzos de los 90 y, por supuesto, la propia
Rerum Novarum.
La cuestión fundamental para el catolicismo social español era determinar las causas del
conflicto social, y, en este sentido, siguiendo el magisterio de León XIII, el padre Antonio Vicent
las redujo a tres: la apostasía religiosa de las naciones que han abandonado los principios
católicos; el individualismo liberal, destructor de los antiguos gremios medievales, enemigo del
origen divino del poder e impulsor del constitucionalismo y parlamentarismo; y, finalmente, el
socialismo, una ideología atea que rechaza la propiedad privada en favor de la colectiva y que
está en contra del concepto tradicional de familia.
Para remediar la situación se crean los círculos de obreros, integrados por dos tipos de
socios: los numerarios —es decir, obreros en activo— y los protectores, propietarios, indus-
triales, etc. El gobierno del círculo estaba a cargo de una junta formada por representantes
de los socios numerarios y protectores con un consiliario nombrado por el obispo del lugar. En
cuanto a sus fines, eran cuatro: religioso, instructivo, económico y recreativo.
La extensión de los círculos obreros y los debates sobre la acción social católica llevados
a cabo en los distintos congresos católicos de fines del siglo XIX plantearon la necesidad de
una unión nacional de círculos, que tuvo lugar en 1893, en Valencia. En esta ciudad y al hilo
de las orientaciones realizadas por la encíclica leonina se funda el Consejo Nacional de las
Corporaciones Católicas, integrado por todos los presidentes de los consejos diocesanos.
Tres años después, en 1896, se elige un nuevo consejo nacional en una asamblea cele-
brada en la capital de España que estaba compuesto, entre otros, por el nuncio de Su Santidad
y los arzobispos de Valencia y Madrid, junto con el marqués de Comillas, como presidentes
honorarios, y el duque de Sotomayor —asesorado por Vicent— como presidente efectivo.
Como puede comprobarse por los nombres de los dirigentes del consejo nacional, éste
resultó ser un organismo controlado por la aristocracia y la alta burguesía española junto al
episcopado, en el que los obreros tutelados eran considerados menores de edad.
En 1901, un católico social, Maximiliano Arboleya, canónigo de la catedral de Oviedo,
que defenderá el sindicalismo cristiano puro, comentaba:

Diríase que esos centros no tienen más objeto que ilustrar al obrero en cuestiones religiosas, darle
una instrucción más completa en su arte, hacerle más sufrido y resignado con las injusticias de
que es objeto. [...] A los obreros de nuestros círculos se les habla de religión, de moralidad, de
resignación, de sus obligaciones [...] pero casi nunca se les habla de sus legítimos derechos (1901).

288 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 288-296, maio-agosto 2018
Corporativismo y Política Social en España. Orígenes y Evolución

El crecimiento de las organizaciones socialistas en España a comienzos del siglo XX y la


constitución en 1910 del sindicato anarquista CNT revelaron la insuficiencia de la alternativa
católica, la cual llevó a su propio creador, Vicent (1904, p. 14), a subrayar el fracaso de los
círculos con las siguientes palabras: “En la práctica, ¿qué hemos obtenido en tantos círculos
católicos? [...] En realidad, ha sido muy poca cosa [...] los patronos han reclamado siempre la
absoluta libertad de contratación, y los obreros han rechazado unirse con los patronos para
conseguir el gremio cristiano”.

El proyecto corporativo de la dictadura de Rivera

L a dictadura de Rivera no fue un mero interregno entre la restauración y la Segunda Re-


pública, sino un período en el que se debatieron, elaboraron y experimentaron todo un
conjunto de proyectos sociales y políticos, tanto de raíz autóctona como europea, que influye-
ron decisivamente en los años posteriores, época republicana y franquista. Si la dictadura de
Rivera es la consecuencia del colapso del sistema de la restauración, conviene recordar que
éste se produce en el marco de una crisis generalizada del modelo político, social y económico
liberal, lo que explicaría las discusiones sobre nuevos modelos sociales alternativos al liberalis-
mo que se extienden por España y toda la Europa dentro de lo que se definió como un intento
de refundar la Europa burguesa.
Bien es verdad que aunque Rivera y los grupos que lo apoyaron pretendieran crear a
partir de 1926 no sólo un modelo de corporativismo social, sino un modelo de corporativismo
político cuyo reflejo será el proyecto constitucional de 1929, lo cierto es que no se daban las
condiciones sociales y políticas para la realización de un proyecto político autoritario y nacio-
nalista en aquellos años.
Como dijo su ministro de Trabajo, Aunós: “En aquella España de 1926 una estructura
corporativa totalitaria hubieses chocado contra los prejuicios liberaloides de la burguesía [...]
y de las clases obreras desorganizadas y sometidas al vasallaje de ideologías antinacionales
(1935, p. 136 y ss).
No obstante, durante el período dictatorial se forjaron los argumentos doctrinales que
serviran de base a la derecha radical en el período de la Segunda República: exaltación del
mito del jefe y del papel del Ejército, estructuración jerárquica de la unión patriótica concebida
como un movimiento político de tipo nacional al margen de los partidos políticos, teorías
corporativas políticas y sociales y, sobre todo, un concepto de Nación-Patria dotada de una
dirección moral por medio de un Estado coordinador y director de la economía y la vida social.
Como afirmaba Rivera en su manifiesto al país:

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 289-296, maio-agosto 2018 289
Miguel Ángel Perfecto

Fracasado el sistema parlamentario en su forma actual [...] el gobierno y la unión patriótica


tienen la concepción de un Estado de nueva estructura [...] célula principal de la nación ha de
ser el municipio, y de él, la familia, con sus rancias virtudes y su moderno concepto ciudadano.
Núcleo, la provincia, y vértebra principal que dirija todo el sistema, el Estado (1929, p. 34 y ss.).

En definitiva, la dictadura de Rivera supuso un experimento político nuevo, pues aun


incorporando determinados elementos del pensamiento tradicionalista y católico español —
antiparlamentarismo, defensa de la familia y de la religión, rechazo de la lucha de clases y de
las ideologías obreras, corporativismo social y político—, introduce conceptos modernizantes,
como el papel del estado nacional autoritario, coordinador y regulador de las actividades
económicas y sociales.
La dictadura destruyó el sistema político liberal, impidiendo la estabilización política y
social en un sentido democrático, e inició una propuesta corporativa y autoritaria que superase
el viejo modelo liberal oligárquico.
El corporativismo primorriverista fue obra de Aunós, subsecretario y más tarde ministro
de Trabajo, miembro de una familia conservadora acomodada de Lérida, de formación krausis-
ta, que había sido secretario del nacionalista catalán Francesc Cambó.
Aunós recibe la doctrina organicista a través de una triple fuente: el krausismo, el na-
cionalismo catalán y el catolicismo social francés y español. Su cultura francesa le condujo
igualmente al conocimiento de los intelectuales nacionalistas y antiliberales, como Charles
Maurras, que le facilitó el camino en la defensa de un nuevo Estado antiparlamentario y antili-
beral. Aunós fue igualmente un gran estudioso de todas las fórmulas autoritarias y totalitarias
que se extendían en la Europa de entreguerras. Sus relaciones personales con el gran teórico
del corporativismo italiano Giuseppe Bottai prueban ese hecho, igual que sus lecturas e in-
fluencias de la Carta de Carnaro-obra del poeta fascista Gabriele D’Annunzzio-, los escritos
del nacionalista Alfredo Rocco o de los escritores alemanes como O. Spann u Otto Gierke,
inspiradores del nuevo derecho alemán, tras la asunción del poder por Hitler.
Su proyecto corporativo pretendía resolver uno de los grandes problemas de las élites
gobernantes europeas: la resolución del conflicto social mediante fórmulas de armonía que
redujeran los efectos del problema social y desactivaran al movimiento obrero organizado.
El experimento corporativo primorriverista se inicia con el decreto-ley de organización
corporativa nacional, de 26 de noviembre de 1926, y culmina con el decreto-ley sobre orga-
nización corporativa de la agricultura, de 12 de mayo de 1928. El esquema doctrinal del cor-
porativismo primorriverista parte de la necesidad de solucionar la llamada “cuestión social”
mediante la intervención del Estado en los problemas sociales, encuadrando la clase obrera y
patronal en estructuras —no sindicales— de conciliación obligatoria.

290 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 290-296, maio-agosto 2018
Corporativismo y Política Social en España. Orígenes y Evolución

Se ha especulado mucho sobre la influencia católico-social en la estructura corporativa


española a partir de las propias declaraciones de Aunós sobre las aportaciones del catolicismo
social francés y español a su proyecto, pero un estudio completo de los textos corporativos
escritos por los hermanos Aunós, sus relaciones personales, así como la trayectoria posterior
en la República y el franquismo, no nos permite afirmar el carácter católico-social del corpo-
rativismo primorriverista.
Como hemos defendido en otros ensayos, el proyecto corporativo de la dictadura obede-
ce a otros supuestos ideológicos. Si para el catolicismo social del siglo XX el principio básico
era la subsidiaridad del Estado, el modelo primorriverista se basa, al contrario, en la preemi-
nencia del Estado en la vida social y económica. “Corresponde al Estado una función ética en
la que el moderno estado social tiende a superar los supuestos del estado liberal y abstencio-
nista” (Aunós, 1930, p. 48 y ss).
El modelo de estado corporativo de Aunós partía de la idea de la estructuración del
país como una organización de “productores” por parte de un Estado fuerte que armoniza
intereses y controla todas las actividades humanas, desde las más espirituales hasta las más
predominantemente manuales.
Dicho Estado se caracterizaría por el sentido de la disciplina, impuesta por un gobierno
fuerte. La jerarquía, entendida como estructuración social de la ciudadanía, y la ordenación
funcional, es decir, la sujeción de todos los organismos al Estado que coordinaría y planifi-
caría la vida económica y social, atenderían al predominio de los intereses colectivos sobre
los individuales.
El armazón del corporativismo social de Aunós comenzaba con el comité paritario, or-
ganismo de derecho público con funciones delegadas del Estado estructurado como una aso-
ciación mixta de patronos y obreros, con un presidente y un secretario designados por el
Ministerio de Trabajo.
Sin embargo, no había dependencia entre las instituciones paritarias y las agrupaciones
sindicales y patronales. Estas se limitaban por ley a elegir a sus miembros en dichos comités
que se convertían después en funcionarios públicos.
El comité paritario disponía de funciones legislativas, ejecutivas y judiciales en el ámbito
laboral, sobre todo la fijación de los pactos colectivos de trabajo, que regulaban las relaciones
de trabajo en determinado sector industrial.
Dichos pactos colectivos se diferenciaban de los acuerdos entre patronos y sindicatos
por su generalidad, ya que afectaban a todos los obreros y a todos los patronos del sector,
estuvieran o no representados en el comité y por su obligatoriedad, dado que era el Estado

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 291-296, maio-agosto 2018 291
Miguel Ángel Perfecto

el que concedía una eficacia generalizada a los acuerdos celebrados. Por encima del comité
funcionaban jerárquicamente las comisiones mixtas y los consejos de corporación que aseso-
raban al Ministro de Trabajo.
Entre las razones de esta peculiar estructura se encontraba el carácter marginal del sindi-
calismo en el modelo corporativo de Aunós, como éste subrayó repetidamente, y la inexisten-
cia de unos sindicatos del régimen.
Por eso se insistió en la superación del sindicalismo, “residuo del liberalismo” en el mar-
co el nuevo Estado Corporativo, en consecuencia, sería éste quien asumiría la defensa de los
obreros, armonizando sus intereses con el interés general del Estado.
En 1928 se aprobó el decreto-ley de Organización Corporativa de la Agricultura, que
pretendía dar cabida, según decía el preámbulo del decreto, a una institución mixta que agru-
para a todos los intereses agrarios procurando armonizar el criterio de unidad con el de la
variedad típica de la organización social de la tierra. La organización se estructuraba en tres
grandes corporaciones, a su vez formadas por comités paritarios, como en la industria: la de
trabajo rural, que agrupaba a patronos y obreros agrícolas; la de propiedad rústica, formada
por propietarios y arrendatarios, colonos y aparceros; y, finalmente, la de la industria agrícola,
integrada por productores de materias primas y los representantes de las industrias agrarias.

Fascismo y nacional sindicalismo en los años 30 del


siglo XX

E n la Segunda República, junto a la acción española, heredera directa del laboratorio de


ideas de la dictadura de Rivera, se desarrolla el fascismo español en su doble vertiente:
literario, representado por el escritor de la generación del 27 Ernesto Jiménez Caballero, y po-
lítico, de Ramiro Ledesma Ramos, Onésimo Redondo y Rivera. De los tres impulsores originales
del fascismo español, Ledesma y sus juntas de ofensiva nacional-sindicalista (JONS), Redondo
y las juntas de acción castellana y Rivera y la falange española, el mejor preparado intelectual-
mente y el que elaboró la mayor parte de la ideología fascista fue Ledesma.
Un elemento clave de su ideología es la concepción corporativa basada en el rechazo a la
lucha de clases y el control total de la economía por el Estado, representante del bien común.
Ledesma diseña un modelo que denominó nacional-sindicalismo en torno a un fuerte naciona-
lismo económico industrial y agrario dirigido por un Estado nacional totalitario que integraría
a obreros y empresarios en organismos sindicales, los cuales, coordinados jerárquicamente, se
constituirían en corporaciones.

292 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 292-296, maio-agosto 2018
Corporativismo y Política Social en España. Orígenes y Evolución

A este respecto, Ledesma y, más tarde, Rivera pretendieron unir el nacionalismo con el
sindicalismo. De hecho, en su defensa del sindicalismo nacional, el máximo dirigente obrero
de las JONS, Nicasio Álvarez de Sotomayor, subrayaba que

la corporación de sindicatos es letra muerta si no los une y los impulsa un espíritu juvenil y
nacional de superación. [...] Sin ese sentido nacional que ha de agrupar fuerte y amorosamente
a todos los ciudadanos [...] las energías individuales se dispersarían o anularían en los choques
enconados entre los mismos miembros de la nación (apud Gallego, 2005, p.173).

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 293-296, maio-agosto 2018 293
Miguel Ángel Perfecto

nota

1 A la filosofía social krausista se la define como “racionalismo armónico” y pretendía conciliar “la analítica
de Kant, las aspiraciones reformadoras y humanitarias de Fichte, el panteísmo de Schelling y el sistema de
nociones universales —categorías— de Hegel”. In: LÓPEZ MORILLAS, J. J. El krausismo español. Ciudad de
México: 1956, p.31.

Fuentes

AUNÓS, E. Estudios de derecho corporativo. Madrid, 1930.


______. La política social de la dictadura. Madrid, 1944.
______. La reforma corporativa del Estado. Madrid, 1935.
MARTÍNEZ, M. A. Liberales, socialistas y católicos ante la cuestión social. Valladolid, 1901.
RAMOS, R. L. Escritos políticos: 1933-1934. Madrid, 1985.
RIVERA, M. P. de. El pensamiento de Primo de Rivera. Madrid, 1929.
VICENT, A. Boletín del Consejo Nacional de las Corporaciones Católico-Obreras. Madrid, 1904.

Referencias bibliográficas

ALFARO, S. R. R. Eduardo Pérez Pujol: vida y obra. Valencia, 1979.


BAÑOS, F. V. Burguesía y cultura: los intelectuales españoles en la sociedad liberal. Madrid, 1980.
BUSTILLO, J. C. Sindicalismo católico-agrario en España. Madrid, 1978.
CASTILLO, J. El sindicalismo amarillo en España: aportación al estudio del catolicismo social español. Madrid, 1977.
CORTINA, M. S. La España liberal (1868-1917). Madrid, 2006.
CREMADES, J. L. G. El reformismo español: krausismo, escuela histórica, neotomismo. Barcelona, 1969.
DÍAZ, E. La filosofía social del krausismo español. Madrid, 1973.
FARRÉ, J. F. A. La derecha española contemporánea. Sus orígenes. El maurismo. Madrid, 1986.
FERNÁNDEZ, E. Q. La filosofía del derecho de K. Ch. Krause. Madrid, 2000.
GALLEGO, A. Pensamiento y acción social de la Iglesia en España. Madrid, 1984.
GALLEGO, F. Ramiro Ledesma Ramos y el fascismo español. Madrid, 2005.
GARCÍA. M. Á. P. Corporativismo y catolicismo social en la dictadura de Primo de Rivera. Studia Historica,
n. 4, vol. II, Salamanca, 1984, p. 123-149.
______. El corporativismo en España: desde los orígenes a la década de 1930. Pasado y Memoria, n. 5,
Universidad de Alicante, 2006, p. 185-218.

294 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 294-296, maio-agosto 2018
Corporativismo y Política Social en España. Orígenes y Evolución

______. Introducción al pensamiento político y económico-social de Eduardo Pérez Pujol. Revista Provincia
de Salamanca, n. 3, mayo-jun. 1982, Salamanca, p. 27-47.
______. Regeneracionismo y corporativismo en la dictadura de Primo de Rivera. In: TUSELL, J.; MONTERO, F.;
MARÍN, J. M. A. (Eds.). Las derechas en la España contemporánea. Madrid, 1997, p. 177-196.
GARCÍA-NIETO, J. N. El sindicalismo cristiano en España. Bilbao, 1960.
GUILLEM, A. El orígen del estado de bienestar en España: 1876-1923. Madrid, 1980.
JIMÉNEZ, J. L. R. La extrema derecha española en el siglo XX. Madrid, 1997.
MOLLEDA, M. D. G. Los reformadores de la España contemporánea. Madrid, 1966.
MONTERO, F: Conservadurismo y cuestión social. In: ______; TUSELL, J.; MARÍN, J. M. (Eds.). Las derechas en
la España contemporánea. Madrid, 1997.
______. De la beneficencia a la reforma social. Los orígenes de la política social del Estado: estado de la cues-
tión, fuentes y archivos. Espacio, Tiempo y Forma-Historia Contemporánea, t. 7, serie V, Uned, Madrid, 1994.
______. El catolicismo social en España: balance historiográfico. L’Histoire religieuse en France et en Espag-
ne, Madrid, 2004, p. 389-409.
______. El primer catolicismo social y la Rerum Novarum en España: 1889-1902. Madrid, 1983.
______. Los católicos españoles y los orígenes de la política social. Studia Histórica, v. II, n. 4, Universidad de
Salamanca, Salamanca, 1984, p. 41-61.
MONTOYA, A. Ideología y lenguaje en las primeras leyes laborales de España. Madrid, 1975.
MORENA, J. I. P. La institucionalización de la reforma social en España (1883-1924): la comisión y el Instituto
de Reformas Sociales. Madrid, 1988.
PALOMEQUE, M. C. Derecho del trabajo e ideología. Medio siglo de formación ideológica del derecho es-
pañol del trabajo: 1873-1923. Madrid, 1980.
PECHARROMAN, J. José Antonio Primo de Rivera: retrato de un visionario. Madrid, 2003.
PORTERO, F. El regeneracionismo conservador: el ideario político de Francisco Silvela. In: TUSELL, J; MONTERO,
F.; MARÍN, J. M. (Eds.). Las derechas en la España contemporánea. Madrid, 1997.
SANZ DE DIEGO, Rafael M. La Iglesia española y el reto de la industrialización. In: VlLLOSLADA, R. G. Historia
de la Iglesia en España, Madrid, 1979, p. 624 y ss.
SERRANO, C. S. Perfil político y humano de un estadista de la restauración: Eduardo Dato a través de su
archivo. Madrid, 1978.
THOMAS, J. M. José Antonio: realidad y mito. Madrid, 2017.
TORIBIO, J. M. C. Catolicismo social y político en la España contemporánea: 1870-2000. Madrid, 2003.
______. El P. Antonio Vicent y los orígenes del catolicismo social en España. In: ______. Estudios sobre la
Iglesia española del XIX. Madrid, 1973, p. 265-287.
______. Escritos del P. Vicent: socialismo y anarquismo. Madrid, 1972.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 295-296, maio-agosto 2018 295
Miguel Ángel Perfecto

______. Los estudios sobre las falanges: revisión y perspectivas. Ayer, n. 71, Madrid, 2008.
URIGÜEN, B. Orígenes y evolución de la derecha española: el neo-catolicismo. Madrid, 1986.
VELASCO, M. D. C. La comisión de reformas sociales: 1883-1904. Política social y conflicto de intereses en la
España de la restauración. Madrid, 1989.

296 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 296-296, maio-agosto 2018
Entrevista

Entrevista com Renato Boschi1


Interview with Renato Boschi
Entrevista con Renato Boschi

Marco Aurélio VannucchiI*


Marcio Grijó VilaroucaI*

Entrevista concedida
em 12 de dezembro de 2017 no Rio de Janeiro

http://dx.doi.org/10.1590/S2178-149420180002000010

1
http://lattes.cnpq.br/9643705017969785
Fundação Getulio Vargas/FGV, Escola de Ciências Sociais e do Programa de Pós-Graduação em
I

História, Política e Bens Culturais (PPHPBC), Rio de Janeiro – RJ, Brasil


*
Professores da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getulio Vargas (CPDOC/FGV).
(marco.vannucchi@fgv.br, marcio.grijo@fgv.br)

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 297-320, maio-agosto 2018 297
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

A trajetória acadêmico-profissional de Renato Boschi confunde-se com o processo de


institucionalização da ciência política no país, para o qual ele deu importantes contribuições.
Mineiro nascido em 1947, Boschi integra uma geração de cientistas sociais brasileiros que
complementaram sua formação no exterior, cursando a pós-graduação em universidades es-
tadunidenses e europeias. Desde a década de 1970, é professor de instituições prestigiadas,
como o Instituto Universitário de Pesquisas do Estado do Rio de Janeiro (Iuperj), a Universi-
dade Federal de Minas Gerais (UFMG) e, mais recentemente, o Instituto de Estudos Sociais
e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp-Uerj). Também manteve uma
intensa atividade institucional, tendo sido diretor do Iuperj e presidente da Associação Nacio-
nal de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), entre outras funções diretivas.
Renato Boschi é reconhecido como um dos principais especialistas nas relações entre o Estado
brasileiro e o empresariado, sendo autor de uma extensa obra, que inclui os livros Corpora-
tivismo e desigualdade: a construção do espaço público (Boschi, 1991) e Variedades de
capitalismo, política e desenvolvimento na América Latina (Boschi, 2011).

Renato, é um prazer entrevistá-lo. Para começar, você poderia falar um pouco sobre o
meio social em que nasceu? Em que ano e onde você nasceu? O que seus pais faziam?

Por acaso, hoje é dia do aniversário da cidade em que eu nasci: Belo Horizonte. E nasci
em 1947. Meu pai era filho de família italiana, e minha mãe, de família mineira, da Zona da
Mata de Minas. Enfim, cresci em Belo Horizonte, estudei sempre em escolas públicas, que,
naquela época, eram muito boas.

Seu pai fazia o quê?

Meu pai era comerciante. Ele tinha uma cadeia de revendedora de pneus. Mas eu perdi
o pai muito cedo. Perdi o pai com 15 anos. Já era uma família grande de seis filhos, então
tivemos de nos virar. Eu fui o primeiro que tive de me virar. Logo em seguida, meu irmão co-
meçou a trabalhar em banco. E eu, na época, que já estava bem adiantado em curso de inglês,
fiz uma didática de inglês, porque já tinha me formado, tinha Lower Cambridge, depois fiz o
Proficiency, fui dar aula de inglês na mesma escola onde eu havia me formado.

Você tinha quantos anos?

Eu tinha 17 anos quando comecei a dar aulas de inglês, nesse mesmo colégio onde me
formei e também na Cultura Inglesa. A partir daí, tive uma carreira acadêmica, fiz vestibular na
Faculdade de Ciências Econômicas, que era onde funcionava o curso de sociologia e política
na época. Porque havia dois cursos: havia o curso de sociologia e política, que tinha uma repu-

298 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 298-320, maio-agosto 2018
Entrevista com Renato Boschi

tação melhor, porque tinha gente formada fora, com treinamento na Flacso e com ênfase em
metodologia quantitativa, metodologia de survey etc., e havia o outro curso, que era o curso
de ciências sociais, na Faculdade de Filosofia. Então, eu fiz esse primeiro curso. Até o ponto em
que houve a reforma universitária e, no último ano, eles fundiram os dois cursos.

Você entrou na faculdade em que ano?

Eu entrei em 1965 e me formei em 1968. Eu poderia ter ficado em Belo Horizonte para
fazer o mestrado, porque havia um programa, que era financiado pela Fundação Ford, que estava
recém-começando. O Fábio Wanderley Reis e o Antonio Octávio Cintra, que tinham sido meus
professores na graduação, foram os criadores do programa. Mas aqui no Rio, também, havia o
programa do Iuperj, que estava recém-começando. Em 1968, eu fui para Los Angeles (foi a pri-
meira vez que viajei para o exterior) participar de um seminário chamado Ucla – Brazil Student
Leader Seminar. E lá estava estudando na época o Bolívar Lamounier, fazendo seu doutorado.
Ele estava voltando para dirigir o Iuperj, Então, ele me convidou para vir para cá, inclusive, para
dirigir um survey. Porque, naquela época, havia um processo de remoção de favelas, então eu fiz
o estudo de algumas comunidades que iam ser removidas e outras que permaneceram. E esse foi
meu primeiro trabalho, também, que foi objeto de minha dissertação de mestrado.

Como foi sua experiência de estudante durante a ditadura em Belo Horizonte?

Pois é. Desde o colégio, eu tinha uma participação política intensa. Eu pertencia à Ação
Popular (AP). E fui para a faculdade também como militante desse grupo. Então, a situação
não foi nada fácil, obviamente. Eu me dispunha a esconder gente em casa, tive colegas que
foram presos… Teve até uma experiência interessante. Nós estudávamos, um grupo, sempre
juntos. O Olavo Brasil fazia parte desse grupo. E aí anunciaram que a polícia estava chegando
ao apartamento onde estudávamos. Eu e um colega fomos para a varanda e fechamos a
cortina. E a polícia levou todos os outros presos. Inclusive, as meninas foram torturadas; a ex-
-mulher do Olavo foi torturada. Enfim, foi uma situação muito dura. E depois, tive outra expe-
riência que foi também extremamente traumática para mim. Em certo sentido, eu passei ileso,
não me aconteceu nada pior, não fui preso, não fui nada disso. Mas meu irmão logo abaixo,
ele era do diretório acadêmico da Faculdade de Ciências Econômicas. E pelo simples fato de
ser do diretório acadêmico, ele, sim, foi levado preso e teve o direito de estudar cassado. Então,
todo esse período foi muito traumático do ponto de vista da minha experiência pessoal.

E do ponto de vista acadêmico? Como era o curso nesse período? O que vocês liam,
as grandes influências?

Nós líamos de tudo, a começar por funcionalismo. Para você ter uma noção, quando eu
estava no primeiro ou no segundo ano de sociologia, nós tivemos a visita de nada mais, nada

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 299-320, maio-agosto 2018 299
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

menos do que Talcott Parsons, que foi visitar a faculdade e deu curso. Então, tivemos uma
formação muito diversificada. E, em certo sentido, para os mais radicais, os marxistas mais
radicais, eles viam essas atividades como atividades assim, digamos, de certo entreguismo, de
submissão ao imperialismo norte-americano. Mesmo porque o curso de pós-graduação estava
sendo organizado e financiado pela Fundação Ford, então era tudo objeto de crítica daqueles
grupos mais radicais. Mas eu não fazia parte desse grupo mais radical. Nossa turma era muito
pequena. Éramos pouquíssimos alunos. Se me lembro bem, éramos uns nove alunos, que
passamos no vestibular. Porque tinha matemática no vestibular. Nas ciências sociais, não tinha
matemática no vestibular. Então, era um vestibular um pouco mais puxado. Um dos meus
colegas, por acaso, era o Henfil, a quem chamávamos de Henriquinho. E ele também militava,
aliás, no mesmo grupo que eu militava. E as lideranças intelectuais, naquele período, eram o
Fábio Wanderley, o Antonio Octávio Cintra, que tinham sido formados na Flacso, no Chile, na-
quele programa que tinha também sido recém-criado no Chile e que era um pouco visto como
um desvio funcionalista (como se falava na época) pelo fato de que enfatizava a metodologia
quantitativa. Mas não era nada disso, porque tínhamos um aprendizado de teoria sociológica
muito diversificado, a mesma coisa no que diz respeito à teoria política. Havia muita ênfase
em história econômica. Francisco Iglesias foi meu professor. Enfim, acho que foi uma formação
bastante diversificada. Ao mesmo tempo, na Faculdade de Ciências Econômicas, havia um
concurso que selecionava alunos para serem alunos de tempo integral. Na minha turma, éra-
mos dois que tínhamos essa bolsa. E tínhamos uma sala com alguns outros pesquisadores, ao
lado dos professores. E, à noite, eu saía para dar aula de inglês na Cultura Inglesa e no colégio
onde eu estudei em Belo Horizonte, o Colégio Estadual de Minas Gerais. Essa era minha rotina.

Eu fiquei curioso com sua militância na AP. Ela se inicia, então, no secundário? Como
você se aproxima desse grupo?

Inicia-se no colegial. Na época de faculdade, a militância ficou mais intensa. O que mais
posso dizer? Foi um período de intensa mobilização e participação. Eu me lembro de participar
de passeatas e a polícia reprimir e acabar com a passeata com jatos d’água. Isso era muito
comum. E tínhamos também as reuniões em pequenas células. Teve uma época que, para
contornar o problema da repressão, foram criadas algumas células, e nós participávamos,
mas sem ter conhecimento das demais para que não houvesse o risco de, se fôssemos presos,
delatar, porque havia tortura. Eu, felizmente, passei ao largo disso.

Pelo que entendi, sua entrada na área de ciências sociais foi dada por essa socializa-
ção política prévia. Mas havia alguma leitura teórica de autores antes de seu ingres-
so na graduação?

Sim. Lemos clássicos no colégio. Lemos, além de outras obras, A democracia na América,
O príncipe. Era uma formação bastante sólida em comparação à que se tem hoje. Tive ciências

300 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 300-320, maio-agosto 2018
Entrevista com Renato Boschi

sociais, foram cinco anos seguidos de latim, foram sete anos de francês, com literatura fran-
cesa, foram seis anos de inglês também. Eu me lembro da professora, que chegava à aula, no
primeiro dia, sem ninguém saber nada, já falava tudo em inglês, você tinha que seguir. E esse
foi o método que depois eu segui, com a mesma professora, dona Solange Ribeiro de Oliveira,
quando fiz didática de inglês na Faculdade de Filosofia. Porque eu fiz didática para poder
lecionar inglês. Tivemos espanhol também.

E, em 1969, você chega ao Rio para fazer mestrado?

Aí, resolvi e me desloquei para o Rio. Mas minha vida toda, minha trajetória, desde então
até hoje, é marcada por idas e vindas entre Belo Horizonte e Rio. Mais tarde, na década de
1990, fiz concurso para professor titular na UFMG, então eu ia e voltava. E me lembro que,
naquela época, ainda tinha voos para a Pampulha. Eu saía daqui, onde eu morava, pegava o
avião no Santos Dumont, descia na Pampulha, ia a pé para o campus, que era bem pertinho, e
no final do dia voltava. Acredite ou não, eu fazia isso umas três vezes por semana. Às vezes, eu
ficava, porque tinha família lá, minha mãe morava lá. Eu me lembro de ter ficado assim nesse
trânsito um bom período de tempo.

E aí você começa a fazer o mestrado com Simon Schwartzman. Não é isso?

É. Simon foi meu orientador. Você vê, era o pé na terrinha, porque Simon é de Belo Hori-
zonte também. E ele foi meu orientador, mas, na verdade, eu trabalhei quase que de maneira
independente, porque eu estava fazendo esse survey e utilizei os dados desse survey para a
dissertação de mestrado.

Eu queria que você falasse um pouco sobre esse survey.

Quando eu vim para cá, o Iuperj ainda funcionava na praça XV [de Novembro, no Centro
do Rio de Janeiro]. Depois é que foi transferido para uma casinha, um prediozinho ali na [rua]
Paulino Fernandes, em Botafogo. Mas, quando eu vim, na maior parte do tempo eu fiquei ali.
E esse survey foi um convênio, se me lembro bem, com a Prefeitura. E era sobre a questão
das remoções de favelas. E eu trabalhei sobre isso no mestrado. Aproveitei os dados, porque o
survey tinha um questionário muito grande. O que interessava era conhecer a percepção dos
moradores das favelas acerca do governo e de intervenções governamentais, porque o que
estava em questão era isso, era a questão das remoções. E tinha também a questão da violên-
cia, que ainda estava muito restrita, mas era também uma temática. Uma das comunidades
que investiguei ficava na Lagoa, no parque da Catacumba. A outra era a da praia do Pinto, no
Leblon. Tinha também a do morro do Pavão-Pavãozinho, em Copacabana, e outra na Tijuca,
no morro do Borel.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 301-320, maio-agosto 2018 301
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

Como era o mestrado nessa época? Tinha de fazer muitas disciplinas? O foco era a tese?

Tinha muito mais disciplinas. Olha, eu posso estar enganado, mas acho que tivemos 21
disciplinas no mestrado.

Em dois anos?

Em dois anos. E tínhamos professores de fora, que vinham dar aula. Foi daí que eu
parti para o doutorado, fiz o doutorado fora. Porque, já nessa época, o Peter McDonough,
que era da Universidade de Michigan, e o Philip Converse, que também era, me conven-
ceram, e não precisou muito, que eu fosse fazer o doutorado lá. O Philip Converse foi meu
orientador formal, porque ele era do Departamento de Ciência Política, a que meu programa
era vinculado. Mas aí eu tive um desvio comportamental que marcou minha trajetória e
que eu reputo como tendo sido extremamente positivo. O Philip Converse era uma pessoa
extremamente liberal, deixava que fizéssemos o que achássemos melhor, era um excelente
orientador desse ponto de vista, deixava você fazer suas escolhas. Em Michigan, formamos
um grupo em que fazíamos uma crítica de dentro da própria ciência política americana. Era
um grupo um pouco radical do ponto de vista deles e formado basicamente por estudantes
latino-americanos e estudantes de outros países. O cerne dessa crítica era que a perspectiva
funcionalista, behaviorista etc. não tinha uma consideração do Estado; na verdade, tratá-
vamos de sistema político. Não existia Estado, não se falava em Estado. Então, tínhamos
um grupo de reflexão, nos reuníamos cada hora na casa de um e fazíamos outras leituras.
Leituras mais informadas, não pelo marxismo, mas numa perspectiva mais histórica e que
achávamos que era fundamental em análises políticas, principalmente considerando o papel
do Estado. E então o tal desvio. Porque o Philip Converse era meu orientador, mas eu fui
fazer um curso sobre a formação dos Estados nacionais com ninguém mais ninguém menos
do que Charles Tilly, que era excelente.

Aí você encontrou o Estado.

Aí eu encontrei o Estado, a formação dos Estados nacionais. E Philip também era uma
pessoa muito aberta, uma formação muito diversificada, tinha um viés de considerar a histó-
ria. O Tilly teve uma influência decisiva na minha formação. O Chuck, como o chamávamos, fez
parte da minha banca, junto com o Philip Converse, que nunca deixou de ser meu orientador
formalmente, mas que me deixou fazer o que eu queria. A ênfase do meu trabalho de douto-
rado não foi sobre a formação do Estado nacional [temática estudada por Tilly] no Brasil, mas
sobre as relações entre os grupos empresariais e o Estado no Brasil. Nessa época, teve outro
acidente extremamente positivo de percurso. Quando voltei, a Eli Diniz estava começando a
trabalhar sobre esse tema também, e nós juntamos as bagagens.

302 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 302-320, maio-agosto 2018
Entrevista com Renato Boschi

Isso foi na sua volta ao Brasil?

Foi na minha volta ao Brasil. Ela tinha sido minha colega no mestrado, mas estava fa-
zendo o doutorado na USP [Universidade de São Paulo], e eu, em Michigan. Então, tivemos a
oportunidade de receber um financiamento de pesquisa da Finep [Financiadora de Estudos e
Projetos] para tratar desse tema do empresariado, e ela focalizou o período 1930-1945, e eu,
o período mais recente, pós-1964. Enfim, discutimos com a literatura da época, com Fernando
Henrique [Cardoso], se o empresariado era forte ou fraco.

E como você chegou a esse tema no doutorado? Porque você, aparentemente, dá


um salto grande entre o comportamento político dos moradores de favela para as
relações entre o empresariado e o Estado.

Eu fui para Michigan para aprender e fiz também vários cursos de metodologia quantitati-
va, survey etc. Tinha esse meu orientador, o Philip Converse, que dirigia, era membro do Institute
for Social Research (ISR), da Universidade de Michigan, e fazia pesquisa desse tipo, então eu tive
uma formação muito minuciosa em metodologia quantitativa, incluindo estatística. E quando eu
descobri a perspectiva histórica, foi ótimo. Nossa! Uma coisa diferente poder falar com menos
rigor (no sentido matemático) e menos precisão, porque aquilo era tudo preciso, com coeficiente
e correlação, isso e aquilo. Eu me lembro de passarmos horas no núcleo de computação da uni-
versidade, gastávamos horas naquele núcleo de computação para poder rodar uma meia dúzia
de tabelas. Era uma coisa hercúlea, uma tarefa hercúlea. Então, essa brecha para estudos de
natureza histórica, para mim, foi absolutamente fundamental na minha formação. E igualmente
rigorosa, do ponto de vista analítico e de bases documentais. Para o trabalho do curso, ganhei
uma bolsa e fui fazer pesquisa na Torre do Tombo, em Lisboa, minha primeira viagem à Europa,
sobre o papel do ciclo do ouro e dos diamantes na formação do Estado no Brasil.

E estou entendendo que muito graças ao Tilly, mais do que à própria universidade.

Foi graças ao Tilly. O programa de ciência política era muito quantitativista, muito beha-
viorista, e foi por isso que nos rebelamos, havia esse grupo que se rebelava e contestava essa
abordagem. Você tinha de ter um major e dois minors; um major que era, no meu caso, poli-
tical behavior, e eu tinha metodologia, o segundo, e política comparada, que era o terceiro. O
máximo, então, que você tinha era política comparada. E com aquelas comparações de siste-
ma político latino-americano em relação aos países ditos modernizados e desenvolvidos. E ao
mesmo tempo ocorreu, novamente, durante aquele período, um processo que foi traumático.
Eu lembro que estava fazendo um passeio pela Europa, naquela minha primeira viagem, com
a minha então esposa, e estava em Portugal, em plena ditadura salazarista, aquela coisa assim
repressiva, nos postes da avenida da Liberdade havia caveiras, símbolos nazistas, havia coisas

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 303-320, maio-agosto 2018 303
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

assim, assustadoras, era um negócio impressionante. E aí tivemos a notícia do golpe no Chile.


E tinha um casal de colegas chilenos, nossos amigos de Michigan, que haviam recém-regres-
sado ao Chile e lá estavam. Voltamos para os Estados Unidos e recebemos esse casal, que
conseguiu sair, não sem sofrer os horrores da repressão. Ele foi preso e tudo mais.
Depois esse colega participou do governo de transição pós-Pinochet, tendo até sido
ministro do governo de transição no Chile mais tarde. E eu me lembro que foi uma expe-
riência muito traumática, muito emocionante, eu e minha ex-esposa esperando esse casal.
Eles voltaram do Chile para Chicago, e de Chicago, de trem, para Michigan, então fomos
esperá-los na estação. Ai! Foi duro. Porque dali também foi a carta do baralho, foi tudo, um
atrás do outro.

As democracias caindo e as ditaduras se instaurando.

É, onde ainda não tinham sido implantadas, como no caso do Brasil. No Chile, a novida-
de foi a adoção de políticas extremamente liberais, com a adoção de reformas de mercado e
uma reforma previdenciária radical. Nosso regime autoritário manteve uma orientação mais
estatista e desenvolvimentista. Esse pêndulo entre políticas neoliberais e políticas de natureza
mais desenvolvimentista tem me movido como tema de pesquisa hoje. Quer dizer, eu procuro
sistematizar isso agora, por exemplo, tratando de investigar a adoção de políticas de cunho
mais desenvolvimentista versus políticas de cunho mais neoliberal com a difusão, de repente,
desse neoliberalismo exacerbado para tudo quanto é lado, num mundo globalizado e atraves-
sado pelos circuitos financeiros para além de fronteiras nacionais.

Mas tem uma explicação para isso?

Não sei. Eu tentei sistematizar do ponto de vista da adoção de políticas. Ainda ontem, lá
no Iesp, tivemos essa discussão sobre desenvolvimentismo, e há uns economistas falando so-
bre a importância da política macroeconômica como determinante fundamental, isso e aquilo,
mas na dimensão política você tem um conjunto de outros fatores que eu acho que são difíceis
de serem sistematizados. Eu estava discutindo a possibilidade e a tendência, em períodos mais
recentes, de uma orientação de cunho social-democrático durante os governos do PT [Partido
dos Trabalhadores], do ponto de vista da adoção de políticas de redistribuição de renda, de
inclusão social etc. durante esses governos, e depois o oposto disso, com o governo atual e a
adoção de uma série de medidas de caráter excludente, como a própria mudança na legislação
trabalhista, que, do meu ponto de vista, favorece os empregadores e retira direitos dos traba-
lhadores. Eu não vejo como isso vai resolver o problema do desemprego, por exemplo, tendo
contratos temporários; na verdade, você pode estimular uma alta rotatividade nos postos de
trabalho. Isso não vai resolver o problema do desemprego de uma maneira mais permanente.

304 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 304-320, maio-agosto 2018
Entrevista com Renato Boschi

Fora o fato de que, no âmbito da política, o que estamos experimentando agora é certo arbí-
trio do Judiciário, que assumiu o protagonismo. Até agora, os cientistas políticos chamavam o
modelo político de presidencialismo de coalizão. Na minha opinião, há um novo modelo políti-
co em curso, que chamo de “justicialismo de exceção”. Porque o Judiciário toma medidas que
são controversas, contraditórias, quer dizer, dois pesos, duas medidas para casos semelhantes,
lado a lado a outras de caráter autoritário, extrapolando e ferindo preceitos constitucionais,
com jurisprudência convenientemente “ajustada” ao caso.

Você acha que esse novo sistema se consolidou ou ainda está lutando para se con-
solidar? Ele pode ser revertido?

Eu acho que pode e deve ser revertido. Não é possível operar à margem da Constituição,
com uma elite governante francamente golpista, operando sob o espectro de pretensões ainda
mais golpistas e ilegítimas. Na minha opinião, por exemplo, essa discussão sobre semipresi-
dencialismo ou qualquer coisa que o valha é uma tentativa de aprofundar ainda mais o golpe
do ponto de vista de limitar o exercício da representação direta pelos eleitores. Eu vejo com
muito maus olhos essa discussão, inclusive porque torna a política uma atividade desvalori-
zada pelos cidadãos.

Não parece que seja uma situação de um equilíbrio ainda muito instável, essa proe-
minência do Ministério Público, do Judiciário, do Supremo?

Eu acho que tem uma série de fatores. Essa discussão sobre a corrupção é uma dis-
cussão que é uma bandeira (e não é que eu seja contra, eu acho que você tem, sim, que
combater a corrupção) que a classe média compra com muita facilidade. Por outro lado, a
classe média não tolera programas políticos que redistribuem renda para baixo por temer
que isso acabaria afetando seus interesses, quando, ao contrário, na verdade fortalece o
mercado que tanto preza. A classe média tem um papel importante na determinação de
eventos com profundas consequências políticas, como foi o caso em movimentos que im-
plicaram rupturas dos processos democráticos em vários contextos. No fundo, as classes
médias são um fiel na balança dos acontecimentos políticos, embora, como se sabe, possam
se constituir em massa de manobra para outros interesses organizados. Não há manifes-
tações coletivas puramente espontâneas. As recentes manifestações que tiveram papel de-
terminante no golpe, com o protagonismo de grupos como o MBL [Movimento Brasil Livre]
e todas as manifestações correlatas, contaram, ademais, com financiamento de fundações
norte-americanas. Eles saíram às ruas, botaram bandeiras nas janelas e essa coisa toda para
derrubada do regime, com mobilização das classes médias urbanas, tudo com uma indução
e apoio velado de outros atores. Essa fundação americana, Atlas, dos irmãos Koch, sabemos
que ela injetou dinheiro aqui para poder fazer essa mobilização contra o governo Dilma. A

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 305-320, maio-agosto 2018 305
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

bandeira da corrupção é uma bandeira que mobiliza muito. Então, sem querer incorrer em
simplificações, eu não vejo como esse sistema, esse justicialismo de exceção possa perdurar
durante muito tempo. E assim eu espero. Ontem, na discussão que tivemos no Iesp, o Fabia-
no [Santos] enfatizava a necessidade de que todas essas questões devessem ser resolvidas
no âmbito do Congresso. De fato, é o que tem que ser. Porque ter um Judiciário que está
atuando quase com funções executivas e tomando medidas de exceção, que são, na minha
opinião, extremamente controversas… assim não dá.

Podemos voltar um pouco ao seu doutorado, Renato? Você estudou o empresariado


industrial no pós-1964, já então consolidado política e economicamente…

É. A discussão fundamental, naquele período, era o debate com a tese do Fernando


Henrique sobre se o empresariado era fraco ou forte, consciente dos seus interesses ou não,
se era organizado ou não. E, tanto no meu caso quanto no caso da Eli [Diniz], contestamos
um pouco a visão de que o empresariado era muito fragmentado e um ator político de menor
relevância; mostrando que eles atuavam através de suas organizações de classe, podemos
chegar à CNI [Confederação Nacional da Indústria], à Fiesp [Federação das Indústrias do Es-
tado de São Paulo] e à dimensão do corporativismo. Aliás, era um corporativismo diferenciado
segundo setores sociais: para o trabalho, era uma coisa, para o empresário, era outra. Porque o
monopólio da organização e da representação deveria se aplicar como uma regra a quaisquer
grupos, mas, na verdade, se aplicava à classe operária, e não se aplicava ao empresariado.
Então, é isso que eu discuti na minha tese. O que chamava a atenção era essa possibilidade de
organização à margem do sistema corporativo estatal. Uma criação de associações extracor-
porativas, a organização dos interesses do empresariado em termos de associações paralelas
[às entidades corporativas].

Algumas formadas já antes do golpe de 1964, não?

Sim. Havia algumas associações industriais criadas no período pós-1930 e ao longo do


processo de industrialização. Mas a proliferação de associações paralelas, lado a lado às orga-
nizações corporativas da era Vargas, foi no período pós-1964. Até à década de 1950 já havia
algumas tantas associações, e estas se multiplicaram posteriormente, tornando mais densa a
representação e a atuação do empresariado.

E a atuação delas, concentrava-se em algum órgão específico do Estado? Como se


estabeleciam essas relações?

Sim. Núcleos como o CDE e CDI, que funcionavam como arenas de intermediação e
definição de políticas, com a participação de atores do setor privado. Como anteriormente co-

306 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 306-320, maio-agosto 2018
Entrevista com Renato Boschi

mentado, pode-se observar certa flexibilização do corporativismo de Estado. As categorias que


costumam tentar enquadrar isso falam em corporativismo estatal e corporativismo societal.
Desse ponto de vista, acho que houve uma intensificação do papel de associações, além das
industriais e das trabalhistas, ou de um associativismo que se deu à margem do corporativis-
mo estatal stricto sensu, com associações de bairro, esse tipo de coisa. Coisa que eu estudei
também e analisei em A arte da associação. Na verdade, passando por empresários, classes
médias e mesmo comunidades de favelas, para mim, tem um veio que une todos os temas com
os quais eu trabalhei. Fui estudar essa questão dos conselhos, da participação de associações
de vizinhança, orçamento participativo, esse tipo de coisa, exatamente como uma variante do
corporativismo estatal. Para a existência de um corporativismo de base societal, é preciso ter
também arenas onde haja negociação, onde haja a tramitação daquele tipo de interesses. E
foram criados conselhos e outras arenas para a canalização de diferentes interesses ao Estado.

Você acha que o corporativismo pode conviver com a democracia?

Claro que sim. Na origem, o corporativismo, a Carta del Lavoro, tem uma origem ca-
tólica, na verdade, sem conexão com uma perspectiva autoritária. Depois é que os governos
autoritários, fascistas, o adotaram como uma forma de estruturação da sociedade. Passou a
ser uma modalidade de organização dos interesses, hierárquica, piramidal. Mas eu acho que
pode, sim, conviver com democracia. Tanto é que tem um sistema de representação que se
pode caracterizar como corporativo, que é um sistema oficial, no âmbito de todas as confe-
derações, as federações de indústria, de comércio, disso, daquilo, que são variantes desse
corporativismo ou sua própria expressão, e convivendo com o regime democrático.

Como você pensa a relação entre o Estado e o empresariado industrial nesse perío-
do que você estudou? Ele estava ali representado? Ele era o Estado?

Não. Aí é fazer um reducionismo quase de cunho marxista. O Estado como o representante


do interesse da classe dominante, da burguesia. O Estado representa, sim, os interesses da
classe dominante, se é que você pode tomar também esse empresariado como a classe domi-
nante, mas obviamente é mais do que isso. E não se trata tampouco de identificar o interesse
desse grupo como sendo um projeto nacional, porque, com a crescente globalização, a finan-
ceirização, principalmente em períodos mais recentes, falar de um projeto nacional vai ficando
cada vez mais complicado. Não. Eu não acho que se possa reduzir uma coisa a outra [Estado
e empresariado industrial]. Há uma autonomia muito grande do Estado. E tanto é que esses
projetos de natureza desenvolvimentista e intervencionista, dos quais, inclusive, o empresa-
riado se beneficiou, ocorreram durante a ditadura militar. Não existe uma correlação perfeita
entre projetos neoliberais e projetos desenvolvimentistas e a natureza do regime político.
Então, não se pode reduzir uma coisa a outra. Pelo contrário, eu acho que tem uma separação

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 307-320, maio-agosto 2018 307
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

muito clara, ainda que o protagonismo da classe empresarial fosse grande. É por isso que eu
estava contestando essa ideia da fraqueza do empresariado que aparece na tese do Fernando
Henrique, porque acho que o empresariado sempre soube, setorialmente ou não, se organizar,
se organizar em termos de associações de classe, sejam elas as corporativas, sejam as extra-
corporativas, que é outro nome que damos quando falamos das [entidades] paralelas. E esse
protagonismo foi extremamente grande agora, nesse último episódio, da derrocada do regime,
ainda que a Dilma [Rousseff] estivesse dando incentivo às indústrias.

Não é paradoxal isso, não?

A política explica, mas também os economistas falam sobre a adoção de uma política
macroeconômica que era incompatível (com os interesses de diferentes grupos econômicos). Eu
não vou entrar por aí porque, realmente, não é a minha esfera. Mas acho que essa visão de que
o governo estava resvalando para uma posição que no fundo poderia prejudicar os interesses
empresariais foi uma razão forte para o apoio do empresariado a essa intervenção. Incentivos,
eles vieram, vieram, sim, mas não sei se vieram no momento adequado ou se vieram já como
uma muleta, uma coisa para segurar algo que já estava bastante explosivo, mas contido.

Agora, esse contexto de 2015, 2016, a atuação do empresariado não revela certa
diversificação do modo de atuação política do empresariado?

Eu estudei um pouco isso também, mas muito no começo. Atividade de lobby, grupos
que tratam de influenciar diretamente as políticas públicas através de pressão no Congres-
so. E, claro, você observa, e eu não analisei sistematicamente se é um fenômeno mais re-
cente, mas a representação direta, a participação direta de empresários no próprio processo
eleitoral e na representação política é um fato. Atualmente, o Congresso tem uma bancada
empresarial de peso. Mas não saberia, realmente, não saberia lhe dizer com certeza se isso
é uma tendência, se não é uma tendência. O certo, que eu acho, é que você tem de fato um
protagonismo crescente do empresariado como força organizada, e aquele pato da Fiesp
expressa isso como um fator de mobilização, mobilização social. A que se atribuir isso eu
não posso dizer com certeza […]. Mas há que se considerar também, e aí eu acho que é
um processo mais recente, essa tendência à desindustrialização, à perda da participação
relativa da indústria na economia, que hoje, pelas estatísticas, não chega a 9%; então, você
tem um processo de desindustrialização, porque os ganhos auferidos com investimentos
no mercado financeiro são muito mais imediatos. Muito mais imediatos, de curto prazo e
assegurados. Não estou dizendo que isso é a causa da desindustrialização, porque lado a
lado você tem também uma reprimarização, no sentido de que a exportação de produtos
primários passa a compor a pauta de exportação. Mas, de fato, o papel da indústria na
economia diminuiu muito. O que gera certo paradoxo, inclusive porque esse protagonismo

308 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 308-320, maio-agosto 2018
Entrevista com Renato Boschi

político, o pato da Fiesp, com todo o significado que ele teve, é lado a lado a essa perda de
importância relativa da indústria na economia. Todo mundo investe no mercado financeiro.
E isso torna mais difícil também algo que discutíamos — o Bresser Pereira fala muito nisso,
e eu não sei até que ponto se pode chegar a elaborar um projeto dessa natureza —, que
os projetos desenvolvimentistas foram projetos nacionais, foram projetos de nação. E que
seria importante apostar num projeto de nação. Acho também importante, mas hoje você
está perdendo também um pouco a ideia de nação com a internacionalização e, principal-
mente, com a privatização também de recursos — o pré-sal, as mudanças na Petrobras, na
Eletrobras —, as coisas que estão sendo leiloadas nesse governo (a palavra certa é essa),
você está perdendo um pouco a possibilidade, nesse contexto de financeirização, de elabo-
rar um projeto nacional, um projeto de país, como o Bresser defende com muita ênfase. Eu
gostaria de acreditar que isso fosse de fato possível. Mas a orientação é crescentemente
num outro sentido, no sentido de projetos que ultrapassam as fronteiras nacionais, pelo fato
de que você tem esses processos, que se dão no âmbito mundial, pautados pelos circuitos
financeiros. Aí, você pode perguntar: sim. Mas e a China? A China investiu fortemente num
projeto nacional, é completamente diferente. A China é outra realidade.

Você está sugerindo que talvez o nacional-desenvolvimentismo esteja superado


como projeto de país?

Eu não acho que esteja superado. Acho que, como projeto de país, sua retomada se torna
cada vez mais difícil, porque há fronteiras que estão permeadas por outro tipo de dinâmica.
Acho que, por exemplo, nos Estados Unidos, o governo teima em querer investir pesadamente
na recuperação da economia, na geração de emprego através de incentivo a indústrias locais
etc., que eu não sei se isso vai resultar a longo prazo, porque a natureza do sistema produtivo
também mudou. Então, há a informatização de tudo, e isso tudo libera mão de obra. O siste-
ma globalizado é diferente. As fronteiras nacionais são distintas, e você, portanto, definir um
projeto de país é mais complicado nesse sentido. Não acho que seja impossível nem que não
deva ser feito. Até acho. Eu gostaria de acreditar que isso é possível, mas está crescentemente
mais complicado avançar nessa direção. […] E os empresários, esses que ainda estão organi-
zados, que ainda fazem parte da indústria que resta, jamais tiveram, e agora menos ainda, um
projeto mais de longo prazo. É tudo curto-prazismo. É amanhã…

E a questão da corrupção, que todo mundo identifica apenas com elite política e
sistema político? E os empresários, por que eles não entram nessa equação?

Não, não. Eu acho que os empresários entram. Mudou-se de uma preocupação das re-
lações entre Estado e sociedade para um modelo em que se têm as relações entre Estado e
grandes empresas. É isso que apareceu, que ficou evidenciado com toda essa trama recente.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 309-320, maio-agosto 2018 309
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

Passou a ter uma relação promíscua e extremamente imbricada entre interesses de grandes
empresas e Estado, sem o menor escrutínio público, sem a menor accountability. Então, acho
que, certamente, nesse contexto, vai voltar ou deve voltar a importância de segmentos da
sociedade civil como forma de contestar ou fazer face a essa nova modalidade de relação, de
interação entre o Estado e as empresas. E aí, por exemplo, o libelo da corrupção aparece como
uma bandeira, para falar do lado positivo disso, esquecendo a dimensão negativa que essa
coisa tem, e conservadora. Mas há aí um viés para a mobilização de segmentos da sociedade
civil; que eu acho que, neste momento, é o que pode arrestar de alguma maneira essa nova
modalidade de sistema político.
Mas, certamente, em outros países da América Latina, com graus diferentes, há também
relações que são muito próximas, entre grandes grupos empresariais e o Estado. Em contextos
diferentes. Porque, no nosso governo, ainda que se possa dizer que ele é um rabicho da chapa
que foi eleita, não é propriamente o caso. O programa de governo sufragado nas urnas foi ou-
tro. Na Argentina, há um governo eleito que implementou, está implementando um programa
neoliberal cada vez mais radical, mas que foi um governo eleito, e já está enfrentando reações.
O que não vejo, na verdade, é a adoção dessa ou daquela plataforma com este ou aquele tipo
de regime, embora a perspectiva desenvolvimentista, tal como a definimos, classicamente,
historicamente, tenha sido o resultado ou tenha ocorrido em governos de natureza autoritária;
mas ela ocorreu também em governos democráticos, no caso dos governos Lula. Enfim.

Você acha que essa modalidade de interação promíscua deriva, de alguma forma, do
nacional-desenvolvimentismo? É algo mais recente?

Teria que pensar sobre isso. Porque há também, quando se adotam projetos de natureza
mais, digamos, voltados ao mercado, neoliberais, há também relações promíscuas. […] Na
verdade, creio que há algo que é histórico, e isso está na nossa veia desde a época do Império,
da Proclamação da República, e por aí vai, que é um tipo de Estado em que as relações com as
classes dominantes sempre foram muito a razão de ser da política. Isso eu acho que sempre foi
assim. E, portanto, outros formatos, e a expansão progressiva da participação política, da ci-
dadania etc., quase que sempre foram concessões da classe dominante. Isso, vendo assim, de
uma maneira muito de longo prazo, muito impressionista. Ou seja, que o processo de forma-
ção de nosso Estado, o Estado brasileiro, ele é muito imbricado com os interesses de determi-
nados setores dominantes. Casa-grande e senzala… Na formação dos Estados europeus, por
exemplo, houve um projeto que alargou e teve uma perspectiva de inclusão, ainda que pro-
gressiva, é claro. Há a Revolução Francesa, há vários outros processos em que a contestação
ocorreu e foi expandindo, digamos, a natureza do Estado como representante da base cidadã,
e não apenas de um grupo dominante, como é historicamente, com raras exceções, o caso do
Brasil. E que está por trás, eu acho, dessas rupturas, desses intentos golpistas, porque, cada vez

310 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 310-320, maio-agosto 2018
Entrevista com Renato Boschi

que há uma expansão, há uma reação de contração. E também há outros aspectos, que dizem
respeito, e eu tenho que apelar a fatores externos — mas eu acho que o fato de estarmos
numa zona de influência do imperialismo americano também, acho que faz uma diferença
fundamental. Haja vista, por exemplo, o caso da Venezuela. A tentativa de minar um governo
popularmente eleito por tentativas de reverter o processo político quando existe um governo
de natureza mais popular. Pode-se até falar que os grupos chavistas recorreram a mecanismos
restritivos, cada vez mais restritivos, mas foram governos majoritariamente eleitos; que acho
que foram sendo forçados a adotar esses mecanismos, digamos de exceção, como uma reação
a essa pressão que vem de fora e se materializa em setores da direita. Além, é claro, dos inte-
resses estratégicos dos Estados Unidos naquela região que interferem no sentido de definir os
rumos do processo político segundo sua conveniência.

Como avaliar a atual trajetória de perda de capacidades estatais, um termo que


você usa, com as ações do governo atual em relação ao BNDES [Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social], CEF [Caixa Econômica Federal], BB [Banco do
Brasil] e Petrobras?

Eu acho que pode haver, aí sim, um processo de desconstrução do potencial do Estado.


Acho que isso é claro. São esferas muito diferentes, todas passando por uma perda relativa de
suas respectivas capacidades, construídas ao longo do tempo. E acho que há um processo em
curso de perdas de capacidade estatal, sim.

Como compatibilizamos essa percepção da diminuição da capacidade estatal com


uma percepção simultânea de fortalecimento de algumas corporações estatais, de
parte da burocracia estatal, que engloba o Ministério Público e a Polícia Federal,
por exemplo?

Acho que é bastante paradoxal, embora estejamos falando de intervenções, como no caso
da Polícia Federal, de intervenções arbitrárias. Mas é porque as pessoas não enxergam isso. As
próprias elites empresariais, não sei se elas enxergam isso como sendo detrimental para o futuro
do país, a médio e a longo prazo. Mas isso tudo aí faz parte do que tenho chamado — essas inter-
venções, esse papel, essas prerrogativas da Polícia Federal, até mesmo do Supremo, ou de outros
órgãos, o Ministério Público etc. —, isso tudo aí faz parte do que tenho chamado desse novo mo-
delo do justicialismo de exceção, em que você parte de instituições representativas e passa para
instituições de cunho deliberativo e que assumem, crescentemente, um papel executivo, inclusive.
É o que temos observado nessas intervenções, que elas têm implicações. Não estou dizendo só a
Polícia Federal ocupar a Universidade Federal de Minas Gerais, de Santa Catarina, e por aí vai. Es-
tou falando de uma série de outras atividades ou de decisões que partem do Judiciário e que têm
implicações para a perda crescente de capacidades estatais. O modelo está todo desequilibrado.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 311-320, maio-agosto 2018 311
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

Renato, deixa eu voltar um pouco. Quando você termina seu doutorado, você já es-
tava vinculado ao Iuperj. É isso?

Foi.

Como era o Iuperj em 1973, 1974, quando você entrou?

Era muito pouca coisa, na verdade, porque éramos poucos naquela ocasião. Wanderley
estava nos Estados Unidos, o César Guimarães, também, ainda estava nos Estados Unidos,
então era um grupo bem, bem pequeno, e que fomos tentando levar aquilo. E com a partici-
pação desses professores de fora, como o Peter McDonough, que participou dos cursos aqui.

Basicamente professores americanos.

Tinha os professores americanos, tínhamos eu, o Olavo. Agora, não me lembro. Era uma
turminha pequena. Olavo fez o doutorado também lá em Michigan. Só que ele veio depois.
Eu me lembro, na época, tínhamos esse programa, tinha o Luiz Antonio Machado, que ti-
nha também recém-retornado dos Estados Unidos, mas que não era política, era sociologia,
mas era um programa ainda, acho que não era diferenciado ainda em termos de sociologia
e ciência política. Era uma pós-graduação. Funcionava ali em Botafogo, o programa foi se
consolidando com muito esforço, superando dificuldades financeiras e políticas. Por exemplo,
fomos objeto, também, de muita intervenção policial. Vigiavam na porta, teve denúncia contra
alunos e também o corpo docente, tudo que você possa imaginar ocorreu ali. E foi uma época
muito difícil para se consolidar um programa, numa situação de exceção. Então, eu voltei dos
Estados Unidos com toda a parte, digamos, formal dos cursos, dos exames e tudo mais termi-
nada, e comecei a trabalhar na definição do projeto de tese e da pesquisa que levou à tese.
E eu voltei para defender o doutorado em 1978. Acho que foi. É, eu voltei, passei um tempo,
inclusive porque levei material empírico para terminar a tese lá em Ann Arbor. E me lembro que
foi, assim, uma verdadeira odisseia, porque era um gelo do cão — assim, que forma aquelas
paredes de neve dessa altura, que você tem que andar no meio daquelas paredes de neve
para chegar ao campus, mas assim, enfrentando e contando os dias nos dedos para poder
terminar de escrever tudo direitinho. E, a cada capítulo, eu entregava para o Converse, para
o Tilly, eles faziam as observações, eu voltava; e, enquanto refazia aquele capítulo, entregava
outro. Porque eu escrevi a tese praticamente quase toda lá nos Estados Unidos.

Nesse período final.

Aí, já foi o segundo filho, que estava por nascer. Então, assim, a angústia, de repente, de
o menino nascer e eu por lá, sem ter defendido a tese. Tudo meio traumático. Tive tempo de
terminar e defender a tese e ainda participar de um seminário internacional na Suécia antes
desse segundo filho nascer. Mas acho que é meio no trauma que conseguimos resolver as

312 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 312-320, maio-agosto 2018
Entrevista com Renato Boschi

coisas, essas coisas que você fica empurrando com a barriga, tal como tese de doutorado. Mas,
depois disso, eu voltei a Michigan como professor convidado, certo período. Não. Antes disso,
passei cinco anos na Califórnia. Foi um período grande na Califórnia, porque minha ex-esposa
estava fazendo o doutorado dela, e eu fiquei com uma bolsa Fulbright, e fui também como
pesquisador visitante e como professor em Stanford. Dei aula em Stanford. Foi um período
muito vivo. Tanto que organizávamos lá um grupo pró-democracia de brasileiros.

Isso foi no final da década de 1970?

Foi em 1981. Nós — nós, que estou falando, é a família — novamente para os Estados
Unidos. Eu me lembro que meu filho era pequenininho, ele não aprendeu a falar português,
aprendeu a falar inglês. A mãe foi na frente e eu fiquei com as crianças. E depois fomos eu
com a minha filha Silvia, que tinha já uns sete anos, e o Pedro, que era pequenininho, e ele
aprendeu a falar em inglês, foi a primeira língua dele, praticamente, e foi alfabetizado lá e
tudo. E depois, quando voltou, ficava sofrendo bullying dos primos e de todo mundo, porque
ele falava com sotaque americano, porque lá ele só falava inglês, ele entendia português, mas
só falava inglês. A Silvia, não, porque ela já foi para lá alfabetizada. Mas, então, passamos esse
período longo na Califórnia, que foi muito produtivo. Eu tinha uma sala lá no Centro de Estu-
dos Latino-Americanos em Stanford, apesar de morar em Santa Cruz, que era na baía, no mar.

Você teve muita experiência no sistema acadêmico norte-americano. O que lhe cha-
mou atenção?

Acho que, talvez, em primeiro lugar, você tem um compromisso, que hoje eu vejo cada
vez menos, menor, dos próprios estudantes com as obrigações. Lá, o pessoal leva muito a sério.
E talvez até por outra razão. Porque é um ambiente muito competitivo, muito competitivo. Se
você tira A plus e o outro tira A minus, você já faz uma estratificação na turma. Mas acho que
essa seriedade com o trabalho é uma das características. E, ao mesmo tempo, as regras são
muito claramente definidas, as pessoas cumprem essas regras; não tem um jogo de vamos
negociar prazo, esse tipo de coisa, que ocorre aqui muito, e tendemos até a ser lenientes. Por
exemplo, eu, lá na pós-graduação do Iesp, às vezes sou leniente com isso, porque não faz mui-
to parte da nossa cultura acadêmica. Agora, gostei muito também de lecionar lá. Gostei muito.
Eu lecionei não apenas em Stanford, como também em Michigan. Eu voltei, fui como professor
convidado em Michigan e em Duke como professor convidado. Depois, dei aula também em
Nova York, no Graduate Center, da NYU, como Fulbright Scholar.

O que você lecionou nessas instituições?

Variou. Mas, por exemplo, em Nova York, dei um curso sobre Brasil, um curso de política
sobre o Brasil. Em Michigan, dei política comparada latino-americana. E em Stanford, nem estou

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 313-320, maio-agosto 2018 313
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

lembrando. Mas, enfim. Foi algo também relacionado com Brasil, com América Latina, política
comparada, movimentos sociais, esse tipo de coisa que estava em voga na época. Em Duke
também. Depois, dei uma guinada para a França. E lá continuo até, deixa ver… Ganhei uma
cadeira de estudos brasileiros na École de Hautes Études de Paris, a Chaire Brésil. Então, lecionei
lá, mas você tinha que dar aula, era uma coisa que era renovada por quatro anos. E tinha que
dar, pelo menos era, na época, a definição da obrigatoriedade da cadeira, você tinha que dar
aula numa universidade do interior da França. Não podia ficar em Paris. Uma vez cumprido esse
compromisso, aí sim. Mas, então, o que aconteceu? Eu fui para Toulouse. E dei aula em Toulouse.
E fiquei, morei em Toulouse durante seis meses, fiquei morando ali, fiz grandes amigos. E depois
retornei, quatro anos sucessivos, dando aulas em Toulouse, durante um mesmo período curto, dei
aula lá no Instituto de Ciência Política. A primeira vez foi no campus da universidade mesmo, da
Toulouse-Le Mirail, em sociologia, mas depois foi no Instituto de Ciência Política. E depois disso
fiquei retornando a Paris para a École, onde eu sempre leciono, assim, por um período curto, ou
participando de ciclos de conferências. Na verdade, a primeira vez foi um curso mais formalizado,
sobre a política e a sociedade brasileiras. A École ainda funcionava ali no Boulevard Raspail.

E você continua com esse vínculo?

Continuo com esse vínculo. E a cada ano eu vou. Quem me convida sempre é o Afrânio
Garcia, que na época geria todas essas atividades relativas a Brasil na École. Hoje, já não
tanto, pois ele se aposentou. Mas ainda assim mantenho um vínculo de amizade e acadê-
mico bastante forte com ele, participando do ciclo de conferências sobre o Brasil, que ele
ainda organiza. Eu o trouxe agora, recentemente, como professor convidado aqui no Iesp. E
com bolsa pelo INCT, que eu coordeno. Podemos falar um pouco sobre isso também. Então,
mantenho esse vínculo. Gosto muito de ir para Paris a cada ano. Não passo sem isso. Tive
alguma atividade também na Itália, em Siena, pois dos professores que pertence à nossa
rede do INCT, da Universidade de Siena, organizou uma conferência ali. Então, estive lá
também e gostei muito.

A universidade europeia lhe parece muito diferente da americana?

Completamente. O que é diferente? Não estou dizendo quanto ao grau de compromisso


dos estudantes. Mas é muito mais flexível. A definição do programa, a grade curricular, tudo
isso. Pelo menos, tal como vivenciei. Não sei a quantas anda agora. Mas é uma formação
muito mais flexível desse ponto de vista.

Agora é interessante, porque, no Iuperj, você experimentou e certamente foi prota-


gonista tanto da consolidação da pós-graduação em ciência política no país quanto
do próprio Iuperj. O que você poderia falar desse processo?

314 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 314-320, maio-agosto 2018
Entrevista com Renato Boschi

Há toda uma trajetória institucional sobre a qual não falamos. Do ponto de vista
internacional, tive muita militância, por incrível que pareça, na ciência política também,
mas mais na área de sociologia. Porque eu participava de um comitê, que era de sociologia
econômica, na Associação Internacional de Sociologia. Depois, fui presidente desse comitê.
E fui do comitê executivo. Então, cheguei a ser vice-presidente da Associação Internacional
de Sociologia. Tive essa participação institucional para fora. Eu adorava tudo isso, porque,
na época, não podia ver um avião que eu entrava. Hoje, não faço a menor questão, prefiro
ficar aqui quietinho, ou vou para Paris e fico lá quietinho. Mas eu viajava muito. Com isso,
viajei para tudo quanto é parte que você possa imaginar, porque cada hora um congresso
ou curso era num lugar. Por outro lado, aqui também, porque fui presidente da Anpocs. Isso
foi numa fase, inclusive, de criação e consolidação da Anpocs, inicialmente um processo
capitaneado por Wanderley Guilherme, Olavo Brasil e outros. Na verdade, participei de todo
um movimento de criação dessa associação que foi precedido por uma série de seminários,
e enfim, finalmente, acabei tendo essa participação institucional que foi extremamente rele-
vante, acho, do ponto de vista não só da ciência política, mas de consolidação das ciências
sociais. Na época, não havia todas essas associações, a associação nacional disso e daquilo.
A Anpocs foi uma das pioneiras. Foram alguns anos aí. Eu tentei fazer uma coisa diferente
quando presidi a Anpocs, que era tirar o congresso de Caxambu, porque todo ano era em
Caxambu. Mas não deu certo. Trouxe aqui para Petrópolis, porque eu achava muito enfado-
nho ir para Caxambu todo ano. Tanto que parei de ir. Mas não funcionou. As pessoas não
acharam bom, aqui no Quitandinha, não sei, por alguma razão não acharam muito bom.
Então, foi um intento que não deu muito certo, porque, logo em seguida, voltou o congresso
anual para Caxambu.

E tenho a impressão de que tem outra mudança aí que você viveu, nesse período,
em relação ao fomento à pesquisa e à pós-graduação, porque, pela narrativa da sua
trajetória, fica muito clara a importância do financiamento americano. Isso foi dimi-
nuindo de importância, e cada vez mais o Estado brasileiro foi assumindo o financia-
mento de pesquisa e o da pós-graduação. Isso parece que é algo impactante, não?

Claro. Bom, eu participei também de comitês, de CNPq [Conselho Nacional de Desen-


volvimento Científico e Tecnológico], Capes [Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior], Faperj [Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro], dessas
coisas todas. Esses financiamentos americanos eram muito direcionados para projetos e áreas
que a Fundação Ford definia como prioridade. Em certo momento foi isso, foi a consolidação
de programas de ciência política. Mas, depois disso, participei de comitê do CNPq, comitê da
Capes, do conselho superior da Faperj e tudo mais. Como diretor do Iuperj, por dois manda-
tos, eu tinha de também correr atrás de financiamento para pesquisa, para tudo isso. Então,

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 315-320, maio-agosto 2018 315
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

foi algo que me mobilizou bastante. Minha participação institucional como diretor do Iuperj
foi uma experiência gratificante, ainda que difícil. Foi pouco antes da transição, da crise lá e,
finalmente, da transição, da ruptura com a Candido Mendes.

Isso significa que o Estado brasileiro também, vamos dizer assim, aumentou sua ca-
pacidade de atuação, os recursos estatais, não no sentido financeiro, mas no sentido
de atuação na área de pesquisa e formação?

Certamente. Embora, agora, eu acho que está passando por um refluxo. Então, não é
uma coisa que você possa ter como estabelecido. Depois que você faz PEC [Proposta de
Emenda Constitucional] de gasto público e esse tipo de coisa, ciência e tecnologia vão para
as calendas. Acho que é um erro fatal, porque, uma das coisas que acho que explica muito
do potencial chinês, ou mesmo se você pensa em países que estavam lado a lado ou pari
passu com o Brasil em determinado momento, como a Coreia, que avançaram, o fizeram por
questão de inovação tecnológica. E você tem que ter investimento em ciência e tecnologia. É
tão simples quanto isso. E nós ficamos para trás, ficamos para trás em relação a esse boom
da Coreia, com toda a coisa eletrônica e tudo mais, em que a Coreia saiu na frente. Então,
não é garantido. Acho que é uma coisa pela qual temos que continuar lutando, infelizmente,
por causa da redução de gastos e do regime de meta fiscal — uma coisa que às vezes não se
aplica aos próprios países desenvolvidos. É verdade. Deficit fiscal e dívida pública, em certos
países europeus, são bastante altos. Na Itália, por exemplo.

Ou nos Estados Unidos. Uma superdívida pública.

Ou nos Estados Unidos. Eu estava com a Itália na cabeça, que é o dobro do PIB [produto
interno bruto], algo assim. Ou foi até recentemente. Então, você descuidar disso é, realmente,
um suicídio. Um suicídio nacional, se fosse falar em projeto nacional.

Renato, eu tenho visto muito essa moda de utilizar o conceito de populismo. Foge
um pouco da lógica do corporativismo, de formas de associar ou agregar preferên-
cias entre público e privado.

Não. Eu acho. Agora, uma das coisas que preocupam o Bresser Pereira, eu falo Bresser
Pereira porque tenho uma ligação muito forte com o Bresser. E partilhamos muita coisa. E
ele enfatiza muito essa questão do câmbio como sendo fator, então você tem o populismo
cambial. Populismo cambial é você ter uma moeda valorizada que permite à classe média
viajar para Miami e Disney World. Populismo tem uma conotação pejorativa, acho um conceito
muito impreciso, que não explica nada. Defender os interesses das classes baixas, redistribuir
renda, tudo acaba sendo caracterizado como populismo.

316 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 316-320, maio-agosto 2018
Entrevista com Renato Boschi

Importar. Consumir produtos.

É claro, no caso do populismo cambial. Escapa totalmente a qualquer noção de


corporativismo, de interesses organizados. Acho que a classe média tem um papel muito chave
nessa determinação dos processos políticos, porque tende mais para um lado do que para o
outro. Ela, geralmente, tem uma tendência conservadora. Mas é fundamental, assim, do ponto
de vista do pêndulo.

Mas, na sua opinião, houve uma avaliação ruim da classe média das escolhas feitas
ultimamente, uma avaliação de cenários equivocada?

É. Eu acho que talvez vão chegar a essa conclusão em breve, porque as medidas de
restrição fiscal, a PEC dos gastos públicos, tudo isso, eu acho que vai afetar o poder de compra
da classe média. Eventualmente, isso vai chegar lá, portanto. A outra coisa também é você
ter desvalorização salarial, quer dizer, impedir a valorização salarial. Isso aí, é claro que afeta
os que os que vivem de salário mínimo, que não é propriamente o caso da classe média; mas
você acaba chegando lá. É o que chamo de a autofagia do mercado, porque, em nome do
mercado, você acaba eliminando as possibilidades de que o mercado funcione. […] Eu não
sei se tem lógica. Acho que uma das bandeiras da classe média, uma das coisas que a classe
média não tolera, acho que já falei aqui, é a redistribuição de renda para baixo. Simples-
mente, ela não tolera isso, que os pobres estão ficando iguais. Estão comprando carro, estão
comprando seus aparelhos de tevê, viajando de avião. Temos uma sociedade extremamente
elitista, fundada na concentração de renda e na desigualdade social extrema.

Você poderia falar um pouco sobre aquele projeto, que você mencionou que coorde-
na, do INCT, sobre variedades de capitalismo, sobre desenvolvimento?

Claro. É um projeto bastante interessante. Interessante, e acho que importante também.


Não é só na minha avaliação. Tanto é assim que, na renovação dos INCTs, recentemente, ele
estava no topo de todos os INCTs da área de humanas. É um INCT cuja concepção é um pou-
co a de unir ou de discutir a questão de perspectivas econômicas, a formulação de políticas
públicas e desempenho econômico, desenvolvimento. É o INCT PPED, que tem o mesmo nome
do instituto da UFRJ [Universidade Federal do Rio de Janeiro] (Políticas Públicas, Estratégias e
Desenvolvimento) do qual é vice-coordenadora a minha colega Ana Célia Castro. É o Progra-
ma de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Estratégia de Desenvolvimento. O INCT é isto:
engloba oficialmente, além da UFRJ e da Uerj, de que fazemos parte, a Universidade de Juiz de
Fora e a de Campinas. Então, são quatro instituições. E com uma adição de membros recentes,
mas não oficialmente, como instituição participante, que é a UnB [Universidade de Brasília]. E
temos promovido uma série de atividades, que são, julgo eu, relevantes e interessantes, como

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 317-320, maio-agosto 2018 317
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

seminários para discutir políticas; agora fizemos um seminário internacional, no final do ano
passado, em que trouxemos pessoas de alguns países, dos Brics, para discutir. No Brasil, esse
tema também é uma das preocupações, essa questão dos Brics, porque virou uma sigla que, às
vezes, tentam também desmontar, mas que na verdade teve seu protagonismo internacional.
E tivemos um projeto grande, que foi financiado pelo Ipea [Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada], e fizemos análises de todos os países dos Brics. Eu viajei para todos os Brics na
época em que ainda estava entrando em avião [risos].

China incluída?

China incluída. Fui três vezes à China. Agora, organizaram um seminário na China, nova-
mente, em Beijing, e queriam que eu fosse, mas é uma viagem cansativa, que evito enfrentar. É
muito longe, muito avião. Fiquei estressado uma das vezes que fui, que quase perdi a conexão;
fui pela África do Sul, com uma hora e meia de intervalo entre um voo e outro, cheguei aqui
completamente estressado [risos]. Não quero isso de jeito nenhum! Mas foi uma boa chance
de termos uma análise comparativa do desempenho dos Brics, o significado disso, em determi-
nadas áreas de políticas públicas. Por exemplo, a política industrial na Rússia, enfim, a política
de ciência e tecnologia na China, e por aí vai. Inovação, principalmente com uma ênfase muito
grande sobre a questão da inovação. Enfim, acho que foi e é um projeto bastante interessante
e bem-sucedido e que saiu publicado em livro. Estamos organizando outro seminário inter-
nacional no começo do ano que vem, aqui no Rio, tentando trazer gente de fora para discutir
essas temáticas, além das pesquisas individuais. Porque não é só conferência. Há os projetos
individuais, que compõem o conjunto das atividades do INCT. E são cento e tantos pesquisa-
dores, na verdade, desse conjunto de instituições, com diversas graduações. Tem pesquisador
sênior, isso e aquilo, e tem os doutorandos também, que participam. Então, é uma atividade
que reputo bem relevante no conjunto das atividades que empreendemos. Que eu continuo,
ainda, empreendendo [risos]. Não sei quando vou parar.

Renato, eu queria que você falasse um pouco sobre a situação da Uerj.

Eu vejo com muita preocupação. Porque, e não são informações que estou trazendo da
minha própria lavra, são informações que a direção da casa e que vimos discutindo, porque exis-
te certo intento privatizante, por um lado, que acho que é preocupante, e, por outro, existe tam-
bém uma situação financeira que é bastante crítica. Até na reunião que tivemos foram discutidas
algumas estratégias, algumas informações que foram passadas, o reitor tem todo o interesse em
manter o programa. Porque nós somos um programa à parte, que não está lá, que não funcio-
na lá no Maracanã, mas ele tem todo o interesse em manter. Mas os salários estão atrasados,
os pesquisadores seniores, como eu mesmo e alguns outros, vivem de bolsas da Faperj, e que
também estão pela hora da miséria, e com atrasos e tudo mais. Então, a situação é preocupante.

318 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 318-320, maio-agosto 2018
Entrevista com Renato Boschi

Estamos numa situação precária, do ponto de vista dos funcionários também, que se alternam.
A vigilância se alterna, a Secretaria de Pós-Graduação funciona duas vezes por semana. Está
tudo assim. A biblioteca, também, não abre todo dia. É muito preocupante a situação. Mas
estamos enfrentando. Não queremos deixar esse investimento ir por água abaixo, certamente.
Somos um programa de excelência nas duas áreas, então, seis e sete, se não me engano. Seis em
sociologia, sete em ciência política. Ou algo parecido. Não sei da última avaliação. Então, temos
todo um empenho em manter isso e lutar pela sobrevivência do programa. Faz parte também da
minha ansiedade [risos]. Eu tenho um número grande de orientandos que acho que é a minha
razão de ser, aquela garotada. Que eles estão ficando cada vez mais jovens, como você estava
salientando. Não somos nós que estamos ficando mais velhos [risos]. Mas tem uma turma muito,
muito boa de orientandos. Eu tenho, continuo mantendo — para falar de algo que não é o INCT,
mas que é apenas dentro da casa — o meu núcleo de pesquisa, que é o Neic — Núcleo de
Estudos sobre Empresariado, Instituições e Capitalismo —, e que enfim, tenho dois orientandos
de doutorado que me ajudam a levar o negócio para frente, é tudo atualizado. Se vocês olharem
no site do Neic, vocês vão ver que tem carta de conjuntura, tudo, tudo atualizadinho. Então, um
conjunto de atividades, que trazem angústia, mas trazem satisfação. Acho que não existe muito
satisfação sem angústia também.

Mais alguma coisa, Renato, que você gostaria de acrescentar?

Talvez fazer, neste momento, um tributo à minha companheira Eli Diniz, que se afastou
das atividades e, enfim, com quem eu tenho encontrado pouco. Bem que eu gostaria…

Uma parceria muito importante para a ciência política brasileira.

Certamente. Essa foi e é uma excelente parceira intelectual, amiga, companheira, tudo,
enfim. E o pior é que vai passando o tempo, cada vez menos você vê, você acaba não tendo
a chance de ver. E hoje eu já tenho outros parceiros também, que são ex-alunos, ex-orien-
tandos e que têm trabalhado e escrito junto comigo, como o Flávio Gaitán, que é argentino.
Eu, por acaso, tenho uma trupe de sul-americanos que se agregam ao meu redor, uruguaios
e argentinos.

Você tem uma vocação internacionalista. Eu já reparei [risos].

Não. Ou pelo menos sul-americana, no que diz respeito a essa coisa de orientação. E
que hoje são professores lá na Universidade da República, que voltaram para Buenos Aires
e outros locais. Mas o Flávio, por exemplo, se transformou de ex-orientando em um parceiro.
Nós fazemos análises, ele fala sobre a Argentina, eu falo sobre o Brasil, comparamos de lá,
comparamos de cá, e vamos levando.

Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 319-320, maio-agosto 2018 319
Marco Aurélio Vannucchi e Marcio Grijó Vilarouca

Referências Bibliográficas

BOSCHI, Renato R. (Org.). Corporativismo e desigualdade: a construção do espaço público no Brasil. Rio de
Janeiro: Iuperj/Rio Fundo, 1991.
BOSCHI, Renato R. Variedades de capitalismo, política e desenvolvimento na América Latina. Belo Horizonte:
UFMG, 2011. 376 p.

320 Estudos Históricos Rio de Janeiro, vol 31, nº 64, p. 320-320, maio-agosto 2018

Você também pode gostar