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JUNHO 2018 | hbrbr.com.

br 17 GÊNERO 76 LIDERANÇA

Como gerir Como CEOs


o #MeToo de sucesso
Joan C. Williams e
Suzanne Lebsock abordam o
84 ESTRATÉGIA
segundo ato
Reduzir o da gestão
Rodney Zemmel, Matt Cuddihy
portfólio de e Dennis Carey

marcas? Editores

Chekitan S. Dev

COMO
CRIAR UMA
ORGANIZAÇÃO
REALMENTE FLEXÍVEL
A EXPANSÃO DAPÁGINA
ABORDAGEM
66
AGILE
JUNHO 2018

17
FOCO
COMO GERIR
O #METOO
19 CULTURA ORGANIZACIONAL
E AGORA?
As mídias sociais criaram um momento
notável para as mulheres, mas será que a
cultura do assédio chegou realmente ao fim?
Joan C. Williams e Suzanne Lebsock
42 COMPORTAMENTO
QUEM É ASSEDIADO E COMO?
Pesquisas longitudinais expõem a
prevalência e os motivos do assédio.
Heather McLaughlin
48 GESTÃO DE RISCO
26 COMUNICAÇÃO
ADAPTAÇÃO À NOVA PAISAGEM DE RISCO
QUEBRANDO O SILÊNCIO No tribunal da opinião pública, as exigências
Como tornar a conversa sobre legais não são tão importantes quanto a
assédio mais fácil para todos. percepção de que os resultados foram justos.
Chai R. Feldblum e Victoria A. Lipnic Elizabeth C. Tippett
33 PESQUISA 54 GESTÃO DE PESSOAS
QUE PENSAM SEUS COLABORADORES O MAU COMPORTAMENTO PODE
SOBRE O ASSÉDIO? PERGUNTE A ELES SER EVITADO
Guia prático de pesquisa com funcionários. Gerencie funcionários de alto risco e elimine
Andrea S. Kramer e Alton B. Harris os problemas antes que eles apareçam.
James Campbell Quick e M. Ann McFadyen
39 COMPORTAMENTO
COMO FAZER COM QUE OS 57 ENTREVISTA

HOMENS SE MANIFESTEM O TRABALHO APÓS #METOO:


Uma cartilha para homens que SUAS PERGUNTAS RESPONDIDAS
querem ser aliados. Mesa-redonda de P&R com especialistas da HBR.
Michael Kimmel Pela equipe da Harvard Business Review

4 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


ARTIGOS
OPERAÇÕES
Desenvolvimento
agile em escala
Como partir de um pequeno
número de equipes e chegar
às centenas.
Darrell K. Rigby, Jeff Sutherland
e Andy Noble

66
LIDERANÇA
Como CEOs de sucesso
abordam o segundo

65
ato da gestão
Começar a todo vapor funciona,
mas só até certo ponto.
Rodney Zemmel, Matt Cuddihy
e Dennis Carey

76
RADAR 12 SUCESSÃO
Encontre a função certa
para ex-fundadores
Novas ideias e A ruptura está longe de ser uma
pesquisas em andamento solução que vale para todos MAIS
O custo real de ser o último da fila.

EXPERIÊNCIA
84 ESTUDO DE CASO
Reduzir o portfólio de marcas?
Após uma grande fusão, uma empresa
Administre seu hoteleira global deve decidir se mantém
crescimento profissional ou se incorpora as redes adquiridas.
Chekitan S. Dev

SEÇÕES 8 Carta ao leitor


89 Resumo da edição
MIRAGEC/GETTY IMAGES; DUSTIN AKSLAND

HBR BRASIL FIQUE CONECTADO CONOSCO


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JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 5


CARTA AO LEITOR
NÃO HÁ
Pelo que lemos na imprensa, vemos nas mídias sociais e
escutamos nas conversas entre amigos e no trabalho, parece que
foi assim, de repente, que reformulamos a questão de gênero.

VOLTA
Bastou a atriz americana Alyssa Milano tuitar a hashtag #MeToo.
Contudo, só parece. A igualdade de gênero, que caminha
lado a lado com o im do assédio sexual, é uma questão que vem
sendo tratada com crescente atenção há muitos anos. Acontece
que, como pontiicou Victor Hugo, nada é tão poderoso quanto
uma ideia cuja oportunidade de lorescer chegou. Foi o que se
viu naquela tarde de domingo em outubro do ano passado. Até
aquele momento não havia sido suiciente que a chanceler da
Alemanha ou a chefe do FMI fossem mulheres. Não bastara que
General Motors, IBM, Lockheed Martin, PepsiCo e tantas outras
empresas fossem dirigidas por mulheres. Tampouco parecia
fazer muita diferença que mais de 60% dos universitários do
mundo fossem mulheres e que as mulheres controlassem a
maioria das decisões de compra de bens de consumo.
O que vemos hoje não é o im do sexo, da sedução ou da
diferença entre os gêneros. “O que vemos é o im de uma cultura
de trabalho em que as mulheres são tratadas, insistente e
incessantemente, como oportunidades sexuais”, airmam Joan
C. Williams e Suzanne Lebsock em seu artigo “E agora?”, que
abre o Foco desta edição (pg. 19).
Como tornar a conversa sobre assédio mais fácil para todos é
o tema do artigo desenvolvido por Chai R. Feldblum e Victoria A.
Lipnic, ambos da Equal Employment Opportunity Commission,
nos EUA. Num guia passo a passo eles sugerem como os
empregadores podem agir para pôr im ao assédio nas empresas.
Leia o artigo na página 26.
Andrea S. Kramer e Alton B. Harris, casal de advogados que
há mais de 30 anos se dedica a promover a paridade de gênero,
apresentam um guia para a elaboração de pesquisa sobre a
cultura organizacional capaz de identiicar o que, realmente,
pensam os funcionários de empresas em relação a três aspectos:
civilidade, preconceito de gênero e conduta sexual imprópria
(pg. 33).
Ainda que o gap da paridade de gênero continue, tenha
certeza de que o movimento #MeToo veio para acelerar o seu im.
Não há volta.

OS EDITORES

8 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


Design & Negócios

apresenta
ied.edu.br

Fazer melhor
Como o design de serviços pode gerar valor percebido
nos negócios a partir da experiência do consumidor.
Victor Falasca Megido, diretor geral do IED Brasil

O design de serviços está chegando ao coração das 2 ‡ Cocriação


estratégias de inovação das organizações em todo o mundo. de soluções
Em nossas conversas com lideranças, o tema é recorrente, mas a $ EXVFD SRU SRVV£YHLV VROXªHV PXLWDV YH]HV VLJQLŕFD
pergunta é sempre a mesma: o que o design de serviços pode cocriar com os consumidores e demais stakeholders envolvidos.
fazer pelo meu negócio em termos concretos? É algo inerente aos processos do design envolver os agentes
Para aprofundar a discussão, conversei com José Mello, participantes para pensar junto e agir de forma colaborativa.
designer com 25 anos de trajetória, na maior parte em grandes 1HVWHSRQWRDMRUQDGDPDSHDGDŸDSUHVHQWDGDHRVSUREOHPDV
corporações de diversos setores, como Pirelli, Liberty Seguros e são evidenciados. O que pode ser feito diferente e como?
Itaú Unibanco. Ele coordena o One Year em Service Design do A partir daí, são compiladas hipóteses de soluções. Isso evita
Instituto Europeu de Design – IED São Paulo. que respostas prontas sejam tiradas da cartola ou da prateleira.
0HOOR GHŕQH Ä1R ŕQDO WXGR Ÿ XP VHUYLR QD O¨JLFD GH Outro aspecto importante dessa abordagem é o engajamento
mercado atual. Cada vez mais, a percepção de valor depende gerado pela coparticipação. As pessoas que deverão implementar
da qualidade das interações. O que compramos é um benefício. se sentem parte da solução e não somente do problema. Desse
Por isso, as empresas estão migrando de uma lógica de venda movimento deve surgir o líder interno do projeto, papel fundamental
de produtos para uma visão de oferta de serviços. A partir da na continuidade de qualquer processo de mudança.
abordagem do design, as soluções são projetadas, buscando
entregar uma experiência ao consumidor que seja excepcional 3 ‡ Prototipagem de soluções
HJHUHLGHQWLŕFD™RFRPDPDUFDÅ 7RGDVROX™RÄEDODGHSUDWDÅOHYDPXLWRWHPSRHDVFKDQFHV
$ ÄMRUQDGD GR XVX—ULR RX GR FRQVXPLGRU Å Ÿ XPD ERD de que dê errado são grandes. A alternativa é compor um
escolha para iniciar projetos de design de serviços de modo conjunto de ações pontuais e assertivas a partir das hipóteses
a obter resultados expressivos e mensuráveis. Segundo Mello, de soluções levantadas, algo capaz de gerar enorme impacto.
o desenvolvimento de uma iniciativa desse gênero pode ser 1R HQWDQWR HVVDV SURSRVWDV SUHFLVDP VHU WHVWDGDV SDUD
descrito em três etapas principais: serem refutadas ou validadas a partir da prototipagem. O maior
Q¯PHURSRVV£YHOGHKLS¨WHVHVŸYHULŕFDGRSDUDPLQLPL]DURULVFR
1 ‡ Entendimento da Jornada do Usuário da inovação. As metodologias de design permitem que isso seja
O primeiro passo é realizar um mapeamento de todos os feito a baixo custo e com rapidez. Em ambiente controlado, os
pontos de interação entre esse consumidor e a empresa para resultados falam por si.
compreender como essas relações funcionam. O principal O que mais pode surpreender, além dos resultados diretos, é a
REMHWLYR Ÿ LGHQWLŕFDU H PHOKRUDU RV FKDPDGRV Äpain pointsÅ mudança de atitude, com base em uma cultura da experimentação
SRQWRVFU£WLFRV HDRPHVPRWHPSRH[DOWDURVDVSHFWRVSRVLWLYRV e da inovação, transformando a forma de trabalhar.
SDUDTXHVHMDPPHOKRUSHUFHELGRVFROKHQGRÄERDVSU—WLFDVÅ 8PDGDVP—[LPDVGDFXOWXUDGHLQRYD™RŸÄ3HQVHJUDQGH
Se é para criar algo totalmente novo, a jornada é projetada a &RPHFH SHTXHQR $MD U—SLGRÅ $WXDU QD H[SHUL QFLD GR
partir da transformação desse usuário, ou seja, que impacto a marca consumidor é crucial para a percepção de valor de qualquer
deseja ter sobre ele. Há uma combinação de técnicas empregadas produto ou serviço. O design oferece respostas com uma
SDUD HVVD ŕQDOLGDGH TXH Y™R GHVGH HQWUHYLVWDV LPHUV™R DWŸ R abordagem testada e capaz de oferecer resultados palpáveis
acompanhamento de usuários reais durante o ciclo, por exemplo. e de forte impacto. Por que não?
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Volume 96, Número 06, Junho 2018 Editores

JORNALISTA RESPONSÁVEL
Roberto Müller Filho
ENCONTRE A FUNÇÃO CERTA
PARA EX-FUNDADORES 12
Todo ano milhares de organizações
sem fins lucrativos devem substituir
um fundador que está deixando
a empresa. A sabedoria popular
defende a ruptura.
JUNHO 2018

“A ruptura está longe


de ser uma solução
para todos.”
página 12

ILUSTRAÇÃO DE OVADIA BENISHU


JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 11
RADAR ENCONTRE A FUNÇÃO CERTA PARA EX-FUNDADORES

SUCESSÃO ATENDIMENTO AO CLIENTE


ENCONTRE A FUNÇÃO CERTA PARA EX-FUNDADORES RESPONDER A MENSAGENS
ENVIADAS PELO TWITTER
Todo ano milhares de organizações será proveitoso; o fundador está
sem ins lucrativos devem substituir disposto a exercer uma nova função;
um fundador que está deixando a
empresa. A sabedoria popular defende
a ruptura. Assim, o sucessor fará uso
e o sucessor está propenso a trabalhar
com o fundador. O relacionamento
não é fácil, mas várias atitudes podem
VALE A PENA
Usuários do Twitter publicam todos os tipos de opinião,
de um poder desimpedido e livre melhorar a chance de sucesso. mas um tipo de tweet é particularmente comum:
de interferência — a mesma lógica As empresas devem deinir reclamações sobre serviços ruins de atendimento ao
adotada por empresas de capital aberto. claramente a função do fundador, cliente. Algumas empresas respondem; outras, não. Com o
intuito de melhor entender como essa decisão afeta futuras
Porém um novo estudo descobriu limitando-a a áreas especíicas de
compras dos consumidores, pesquisadores angariaram
que ganhos consideráveis podem ser grande interesse e expertise, como mais de 400 mil tweets ligados a serviços de atendimento
obtidos quando se mantêm envolvidos manter o vínculo com inanciadores; ao consumidor enviados a empresas aéreas ou a
os fundadores de organizações sem providenciar coaching para auxiliar operadoras de telefones celulares dos EUA de março de
ins lucrativos: o sucessor pode não o fundador e o sucessor a navegar 2015 a abril de 2016, identificando aqueles que motivaram
só se beneiciar das capacidades e do por esse novo relacionamento; uma resposta da empresa. Em seguida, eles entrevistaram
alguns dos clientes responsáveis pelos tweets juntamente
conhecimento do líder que está de estabelecer um processo de resolução
com um grupo de controle cujos membros não haviam
saída, mas a lealdade de funcionários, de conlitos; dar sequência à transição tido interação com o serviço de atendimento ao cliente.
do conselho e de inanciadores pode da lealdade das partes interessadas, Entre os consumidores que enviaram mensagens para as
ser mais facilmente mantida. começando, talvez, com funcionários empresas aéreas, os que receberam resposta disseram
Pesquisadores analisaram 106 e membros do conselho e chegando que pagariam, em média, quase US$ 9 a mais por uma
organizações sem ins lucrativos; até aos fundadores; e criar uma passagem no futuro com aquela empresa do que os
membros do grupo de controle — e como mostra o gráfico,
avaliaram também mais de 500 separação inicial para evitar confusão
quanto mais rápida a resposta da empresa, maior o valor
fundadores, sucessores, conselheiros e permitir que o sucessor possa se que os consumidores estão dispostos a pagar. ■
e outros a respeito de casos de acomodar ao novo cargo.
sucessão e conduziram 49 entrevistas Ademais, o estudo descobriu que US$ 19,83
detalhadas. Descobriram que, transições que pareiam um fundador
em transições voluntárias, uma em uma função permanente com
quantidade bem maior de conselhos um sucessor interno renderam os
VALOR ADICIONAL QUE OS CLIENTES DE EMPRESAS AÉREAS ESTÃO DISPOSTOS A PAGAR (US$)

encontra uma posição para o melhores resultados em relação ao


fundador em vez de planejar uma desempenho inanceiro e à sucessão
ruptura total — e a grande maioria dos de mandato. “A ruptura está longe
entrevistados dessas organizações de ser uma solução que vale para
relatou efeitos positivos. todos”, escrevem os pesquisadores.
Isso deve ser colocado em prática, “Ao considerarem a possibilidade
alertam os estudiosos, somente se de redeinir a posição do fundador,
quatro condições forem preenchidas: os conselheiros estariam sendo
o fundador não só deseja como é capaz sensatos, principalmente quando US$ 8,53
de se manter envolvido; o conselho o sucessor vem de dentro da
percebe que manter o fundador organização.” Embora o estudo
não tenha pesquisado transições
corporativas, os pesquisadores
airmam que as condições
exigidas para o fundador de
US$ 3,19
US$ 2,33
entidade sem ins lucrativos
permanecer na empresa podem
ser aplicadas a qualquer
organização liderada por seu
fundador.
HBR Reprint F1806A–P
SOBRE A PESQUISA
“Making founder
successions work”, de Jari
Tuomala, Donald Yeh e
Katie Smith Milway. 60 MINUTOS 21-59 MINUTOS 6-20 MINUTOS ATÉ 5 MINUTOS
(Stanford Social OU MAIS
TEMPO DE RESPOSTA
Innovation Review, 2018.) FONTE WAYNE HUANG ET AL.

12 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


OPERAÇÕES PRODUTIVIDADE
A ADMINISTRAÇÃO DO PROBLEMA
O CUSTO REAL DE SER O ÚLTIMO DA FILA DO “TEMPO OCIOSO”
A maior parte dos proissionais reclama que são
Imagine que você está no caixa de uma mercearia com cinco pessoas à sua frente.
Logicamente, não deve fazer diferença se há ou não alguém atrás de você — seu tempo de muito ocupados. Mas uma nova pesquisa entre
espera só é influenciado pelo tempo que será gasto para atender as cinco pessoas à sua proissionais das mais diversas ocupações,
frente. Mas uma nova pesquisa mostra que as pessoas não gostam de ficar no último lugar da como gestores, advogados e médicos, aponta
fila — e que isso é má notícia para qualquer negócio que exija que seus clientes formem filas, um problema diferente: 78% dos trabalhadores
independentemente de a empresa ser física ou virtual.
Em um estudo com 284 clientes de uma mercearia, consumidores que estavam no fim da airmaram ter “tempo ocioso” — períodos
fila eram quatro vezes mais propensos a mudar de fila do que clientes que contavam com ao de espera até que uma atividade possa ser
menos uma pessoa atrás de si (isso é um problema para a loja porque aqueles que trocam executada, como quando um funcionário
de fila normalmente acabam esperando mais e ficam menos satisfeitos com a experiência). de atendimento ao cliente aguarda um
Em um experimento com 301 participantes que podiam ver sua posição numa fila virtual, as telefonema — ao menos uma vez por semana,
pessoas que passaram a maior parte do tempo no último lugar da fila ficaram 19% menos e 22% disseram passar por isso diariamente.
satisfeitas do que as demais em relação ao tempo de espera — incluindo participantes que
esperaram muito mais, mas não se encontravam no fim da fila. Em outro experimento online Isso causa um problema para gestores além
no qual somente alguns participantes sabiam se estavam no fim da fila, as pessoas que da questão de pagar aos funcionários que
tinham consciência de que estavam na última posição eram quatro vezes mais propensas a estão desocupados: faz com que as pessoas
sair da fila — o que, em situação real, significaria perda nas vendas. Essa tendência, dizem os trabalhem mais lentamente de propósito.
pesquisadores, pode surgir da ausência de um alvo para que “uma comparação social inferior” Em um estudo conduzido em laboratório,
seja feita, levando a pessoa no fim da fila a pensar: “Se ninguém está disposto a esperar mais pesquisadores deram aos participantes tarefas
do que eu, vale a pena continuar na fila?”.
De acordo com uma estimativa, os americanos passam em média 118 horas por ano em de digitação que levavam muito menos
fila, por isso a administração de filas é um fator de satisfação importante. A maioria dos tempo do que o período atribuído para tal
gestores prioriza a rapidez para reduzir o tempo de espera das pessoas. Esse estudo apresenta atividade e os izeram permanecer ociosos
uma estratégia adicional: olhar para o fim da fila. “Intervenções que envolvam, distraiam ou depois de terminarem as tarefas. Assim que os
obscureçam a posição relativa de alguém que se encontra no fim da fila e ressaltem a posição participantes perceberam que enfrentariam
relativa quando não está em último lugar podem ajudar a motivar indivíduos a continuar na um período de ociosidade ao terminar, eles
fila”, afirmam os pesquisadores. ■
diminuíram o ritmo (pesquisadores chamam
isso de “dead time efect” [efeito do tempo
ocioso, em tradução livre]; é o oposto do já

RAZÕES PARA NÃO MUDAR DE FILA totalmente estabelecido “deadline efect”


[efeito do inal de prazo, em tradução livre],

E M U M A MUDAR UMA OU
um termo que designa os trabalhadores que
Ir de repente para
aumentam o ritmo conforme se aproxima o
outra fila não é

SIMULAÇÃO
ONLINE COM MAIS VEZES
necessariamente
contraproducente:
muitos ambientes
prazo). Em experimentos complementares,
pesquisadores demonstraram que mudar
regras a respeito da inatividade — por
de espera reais exemplo, permitir que os empregados
PARTICIPANTES QUE AUMENTAVA,EMMÉDIA, contêm sinais naveguem na internet enquanto esperam
ESPERAVAM PARA visuais, como a
a próxima atividade — evita a diminuição

O TEMPO TOTAL DE
relativa rapidez do
RESPONDER A caixa, que podem de ritmo. “É provável que os gestores não
estejam a par da verdadeira extensão do
UMA PESQUISA, ajudar os clientes

AS PESSOAS ESPERA DAS PESSOAS a fazer escolhas


estratégicas
tempo ocioso dos funcionários, uma vez que
é do interesse destes mascará-lo”, airmam

EM MAIS DE
a respeito de
(EM QUALQUER POSIÇÃO) quando a mudança
os pesquisadores. “De modo ideal, nossa
MUDARAM DE FILA,

50.
pesquisa irá chamar a atenção para o problema
significará
para que soluções possam ser criadas.” ■

%
EM MÉDIA,
economia de
tempo. Contudo o

1,27
estudo demonstra SOBRE A
que as pessoas PESQUISA
mudam mesmo “The downside of
quando tais sinais downtime: the
não existem — e prevalence and
work pacing
sem eles, não
consequences of
mudar de fila idle time at work”,
VEZ, E ALGUMAS parece ser a
melhor estratégia.
de Andrew Brodsky
MUDARAM UMA DÚZIA e Teresa M. Ambile
(Journal of Applied
DE VEZES OU MAIS. Psychology, em
breve).
FONTE “LAST PLACE AVERSION IN QUEUES”, DE RYAN W. BUELL

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 13


Você está
pronto para
a Era da
Transformação?
ey.com/consulting

ImYflge]d`gjYh]j_mflY$e]d`gjYj]khgklY&
E melhor se torna o mundo de negócios.
Estamos em uma nova era.
Onde o lado positivo da disrupção
pode criar oportunidades ilimitadas.
Onde as melhores perguntas ajudam
a encontrar as melhores respostas.
œ 9Afl]da_ˆf[aY9jlaÕ[aYdYZj]
mais portas para o humano?
œ Sua estratégia mergulha no
Digital ou só toca a superfície?
œ Você muda as pessoas ou
Ynakƒg\gljYZYd`g7
œ G[aZ]jYlYim]]kl€kmYhgjlY
gmb]fljgm7
A Era da Transformação pede respostas
im]kkmj_]e\Yke]d`gj]k[gf]p“]k&
Nossos consultores estão conectados
[ge]kl]fgngemf\gh]dY]ph]jaˆf[aY
_dgZYd$[jaYlana\Y\]]YdaYf…Yk]kljYl†_a[Yk&
Ng[ˆ]klhjgflghYjYYhjpaeYem\Yf…Y7 © 2018 EYGM Limited. Todos os direitos reservados.

Nós estamos.
Viva a Era da Transformação com a EY.
JUNHO 2018
oco
COMO GERIR
O #METOO
A ONDA INTERNACIONAL DE ACUSAÇÕES DE ASSÉDIO SEXUAL
PODE MUDAR PARA SEMPRE A FORMA COMO HOMENS E
MULHERES TRABALHAM JUNTOS. MAS A MUDANÇA NÃO DIZ
RESPEITO APENAS AOS HOMENS, NEM APENAS ÀS MULHERES
— E SIM A TODOS NÓS. JOAN C. WILLIAMS E SUZANNE LEBSOCK
JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 17
FOCO COMO GERIR O #METOO

19 CULTURA ORGANIZACIONAL
E AGORA?
26 COMUNICAÇÃO
QUEBRANDO O SILÊNCIO
33 PESQUISA
QUE PENSAM SEUS
COLABORADORES SOBRE O
ASSÉDIO? PERGUNTE A ELES
39 COMPORTAMENTO
COMO FAZER COM QUE OS
HOMENS SE MANIFESTEM
42 COMPORTAMENTO
QUEM É ASSEDIADO E
COMO?
48 GESTÃO DE RISCO
ADAPTAÇÃO À NOVA
PAISAGEM DE RISCO
54 GESTÃO DE PESSOAS
O MAU COMPORTAMENTO
PODE SER EVITADO
57 ENTREVISTA
O TRABALHO APÓS
#METOO: SUAS
PERGUNTAS RESPONDIDAS

18 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


E AGORA?
AS MÍDIAS SOCIAIS CRIARAM UM MOMENTO NOTÁVEL
PARA AS MULHERES, MAS SERÁ QUE A CULTURA
DO ASSÉDIO CHEGOU REALMENTE AO FIM?
JOAN C. WILLIAMS E SUZANNE LEBSOCK
Diga adeus ao mundo onde os homens podem tratar o local de
trabalho como uma festa da faculdade ou uma sessão de pornograia.
Desde que Harvey Weinstein, produtor de Hollywood, foi acusado
de má conduta sexual em outubro de 2017, surgiram alegações
similares sobre quase uma centena de poderosos. São nomes que
você provavelmente conhece, na mídia, tecnologia, hotelaria,
política e entretenimento. O momento é um divisor de águas para a
igualdade e segurança no local de trabalho: 87% dos americanos
apoiam a política de tolerância zero ao assédio sexual.
Isso é bom não apenas para as mulheres, mas tam- Farrow e Woody Allen. Sim, esse Woody Allen — aque-
bém para a maioria dos homens. Frequentemente, a le que se casou com a filha de sua namorada de longa
cultura de assédio sexual desenfreado no local de tra- data e é acusado de ter abusado sexualmente da outra
balho é prejudicial também para eles. Esses homens filha. “A agressão sexual foi uma questão que tocou
insatisfeitos, assim como as mulheres maltratadas, minha família”, disse Farrow, para quem essa expe-
precisam decidir se vão interferir e como fazer isso riência foi o motivo fundamental da reportagem.
sem pôr em risco a carreira. Repetindo: não é uma briga entre homens e mu-
Ainda assim, muitos homens ficam desmotivados lheres. Trata-se de saber se um pequeno subgrupo de
com o número cada vez maior de quedas causadas pe- homens predatórios deve interferir na capacidade
las acusações. Recentemente, as demissões sumárias das pessoas de participar e fazer aquilo que se espera
de executivos poderosos e celebridades geraram a pre- delas: trabalhar.
ocupação de que qualquer homem possa ser acusado Desde a década passada, diversas mudanças nos
e levado à ruína. Metade dos homens (49%) diz que conduziram a este momento surpreendente. Algumas
esse furor fez com que repensassem seu próprio com- foram tecnológicas: a internet permite que as mulhe-
portamento em relação às mulheres. Eles se pergun- res façam acusações públicas, passando por cima das
tam se a estupidez imatura de ontem pode destruir pessoas que, tradicionalmente, engavetavam suas his-
sua carreira hoje. tórias. Outras mudanças foram culturais: um estereó-
Esta, porém, não é uma briga entre homens e mu- tipo centenário — o da vadia mentirosa e vingativa —
lheres. Um dos jornalistas que deram o furo sobre a his- teve seu poder esvaziado pelas feministas, que cunha-
tória de Weinstein foi Ronan Farrow, filho de Mia ram a expressão “tachar de vadia”, para reverter a

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 19


FOCO COMO GERIR O #METOO

AS AUTORAS

acusação aos homens que atacam as mulheres dessa


JOAN C. WILLIAMS E
maneira. Igualmente importante é o fato de que as
mulheres hoje ocupam cargos de poder na imprensa,
SUZANNE LEBSOCK
nas empresas, no Congresso e em Hollywood para não
precisar mais seguir o “clube do bolinha”. Em vez dis- Joan C. Williams é professora apreensivos e à procura de works for women at work ofe-
so, elas podem, por exemplo, forçar a renúncia de Al emérita de Direito e orientação. Williams e rece, sem pudor, conselhos
diretora-fundadora do Center Lebsock fornecem isso. objetivos em uma cartilha
Franken ou revelar as histórias de Harvey Weinstein.
for WorkLife Law do Hastings O trabalho de Williams de instruções para mulheres
O resultado de todas essas mudanças é o que os College of the Law, na sobre classes sociais inclui ambiciosas”. Após seu suces-
cientistas sociais chamam de cascata de normas: uma California University. É uma “What so many people don’t so, Sheryl Sandberg e LeanIn.
série de tendências de longo prazo que produzem das principais especialistas get about the U.S. working org pediram a Williams que
uma súbita mudança nos costumes sociais. Não há em desigualdade social. class”, ensaio sobre as elei- criasse vídeos curtos sobre
como voltar atrás. O ambiente de trabalho agora é Suzanne Lebsock é ções de 2016 publicado na as estratégias apresentadas
professora emérita de História HBR.org e lido mais de 3,7 no livro. Os vídeos foram bai-
muito diferente do que era há um ano. Falando clara-
da cátedra do Conselho de milhões de vezes. Em segui- xados quase um milhão de
mente, hoje, se você assediar ou agredir sexualmente Governadores da Rutgers da, publicou o livro White vezes e são apresentados
uma colega, empregada, chefe ou contato comercial, University, onde foi cofunda- working class: overcoming pela Virgin Airlines como
seu trabalho estará em risco. dora do programa de class cluelessness in Ameri- entretenimento noturno.
pós-graduação em história ca (Harvard Business Review Eles são, literalmente,
das mulheres e de gênero com Press). Escreveu o premia- vistos em todo o mundo.
COMO O MOVIMENTO #METOO MUDA O TRABALHO melhor avaliação. do Unbending gender: why Os livros de Lebsock in-
Hoje, por mais comuns que essas demissões tenham Ao abordar este momento family and work conflict and cluem The Free Women of
se tornado, sabemos que estamos apenas começando desafiador da gestão, what to do about it (Oxford Petersburg (W.W. Norton,
a arranhar a superfície da cultura do assédio. Em You Williams e Lebsock esperam University Press, 2000). Seus 1984), que ganhou o Prêmio
promover uma mudança amplamente lidos relató- Bancroft, e A Murder in Vir-
can’t change what you can’t see: interrupting racial & duradoura. “Imagine o que rios, como “The three faces ginia (W.W. Norton, 2003),
gender bias in the legal profession, estudo sobre advo- significaria libertar a energia of work-family conflict” (em vencedor do Prêmio Francis
gados realizado pela Center for WorkLife Law (que total das mulheres para o coautoria com Heather Bou- Parkman. Foi contempla-
Joan dirige) para a American Bar Association e pres- trabalho e a vida”, diz shey), influenciou políticos, da com bolsas do Woodrow
tes a ser lançado, os pesquisadores descobriram que Lebsock. “E ser capaz de ir jornalistas e ativistas. Wilson International Center
o assédio sexual é prevalente. Oitenta e dois por cen- além do assédio para outras O guia de carreira para mu- for Scholars e do Radcliffe
questões de justiça para as lheres de 2014 de Williams Institute for Advanced Study,
to das mulheres e 74% dos homens relataram ouvir mulheres, como paridade (escrito em parceria com sua entre outras instituições. Ela
comentários sexistas no trabalho. Vinte e oito por salarial.” filha, Rachel Dempsey) foi lecionou na University of Nor-
cento das mulheres e 8% dos homens relataram ter Embora queiram que to- elogiado pelo New York th Carolina at Chapel Hill e na
sido tocados, ou recebido proposta sexual ou român- dos leiam o artigo, decidi- Times Book Review: “Combi- University of Washington, em
tica indesejada no trabalho. Sete por cento das mu- ram escrever “E agora?”, nando habilmente a pesqui- Seattle. Em 1992, foi premia-
lheres e menos de 1% dos homens relataram ter sido especificamente para os ho- sa sociológica com um esti- da com uma bolsa de “gênio”
mens. Muitos homens estão lo narrativo informal, What pela MacArthur Foundation.
subornados ou ameaçados com retaliação profissio-
nal caso não se envolvessem sexualmente. Quatorze
por cento das mulheres e 5% dos homens disseram
que perderam oportunidades de trabalho por causa
do assédio sexual, atraso nas promoções, menos Uma pesquisa com cerca de 500 funcionárias de hotel
apoio, atribuições menos frequentes de tarefas im- em Chicago revelou que 49% delas já depararam com
portantes, preconceito contra os pais e maior inten- um hóspede que cometeu ato obsceno. As zeladoras
ção de sair. Os três tipos mais agudos de assédio (ex- que trabalhavam no turno da noite e as trabalhadoras
cluídos os comentários machistas) foram associados rurais tiveram diiculdade para se defender de supervi-
à redução de renda, rebaixamento na carreira, perda sores predatórios. E funcionárias de restaurante pas-
de clientes, perda de espaço no escritório e desliga- sam por isso de três formas. Um relatório de 2014, inti-
mento de comitês importantes. tulado apropriadamente “Piso de Vidro”, divulga os re-
Não é só na área jurídica que esses padrões são ob- sultados de uma pesquisa com 688 funcionários de
servados. De acordo com um estudo recente realizado restaurantes de 39 estados: quase 80% das funcioná-
por pesquisadores da Oklahoma State University, Uni- rias foram assediadas por colegas; quase 80% foram
versity of Minnesota e University of Maine, as mulheres assediadas por clientes e 67% por gestores — para 52%
que sofreram assédio sexual tinham probabilidade 6,5 delas, o assédio era semanal. As funcionárias conside-
maior de mudar de emprego do que as mulheres que raram o assédio do cliente especialmente irritante por-
não sofreram. “Pedi demissão e fiquei sem emprego. que não queriam perder a gorjeta. Não admira que qua-
Vou comer só arroz e viver sem luz elétrica se for preci- se 37% das queixas de assédio sexual prestadas por
so”, disse uma mulher entrevistada para o estudo. mulheres à Equal Employment Opportunity Commis-
As mulheres com salário baixo, que muitas vezes sion em 2011 advinham do setor de restaurantes.
trabalham para pagar as contas, e as mulheres em situ- O fato de que as histórias finalmente se tornaram
ação ilegal nos Estados Unidos são as mais vulneráveis. públicas revela como o assédio sexual subverte a

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carreira das mulheres: as atrizes Ashley Judd e Mira Tal comportamento já não é visto como mera ques-
Sorvino tiveram mais dificuldade de conseguir um pa- tão de “olhar torto”. Historicamente, tem sido difícil
pel depois de rejeitarem o voraz Weinstein. Depois que vencer processos de assédio sexual, mas uma mudan-
Gretchen Carlson reclamou do ambiente hostil de tra- ça rápida nas percepções do público pode mudar isso.
balho, foram-lhe atribuídas menos entrevistas de alta Agora, 78% das mulheres dizem que estão mais pro-
repercussão no Fox&Friends e, de acordo com sua pensas a protestar se forem tratadas de forma injusta
queixa penal, teve cortada sua participação semanal por motivo de gênero. E quase a mesma porcentagem
em Culture Warrior, quadro de alta audiência do pro- de homens (77%) dizem que estão mais propensos a
grama The O’Reilly Factor. Quando se espalhou a notí- protestar se perceberem que a mulher foi tratada in-
cia de que o juiz da Nona Corte Alex Kozinski assediava justamente. É um novo tempo por um motivo simples:
sexualmente as oficiais de justiça, muitas mulheres as pessoas agora acreditam nas mulheres.
abriram mão de tentar a vaga nesse tribunal, embora
ele forneça a jovens advogados boas condições de con-
seguir uma vaga como funcionário da Suprema Corte TUDO ESTÁ MUDANDO
dos Estados Unidos — a mais almejada no âmbito do O indicador mais forte de que estamos passando por
Judiciário. Quando Lauren Greene, ambiciosa funcio- uma cascata de normas foi quando o líder da maioria
nária do Congresso americano, reclamou do assédio se- no Senado, Mitch McConnell, defendeu as mulheres —
xual do chefe, o deputado Blake Farenthold, a carreira quatro delas na época — que izeram revelações sobre
política dela foi para o espaço. Hoje, ela trabalha meio o candidato ao senado Roy Moore. “Acredito nas mu-
período como assistente em uma construtora de casas. lheres”, disse McConnell.
Uma questão muitas vezes ignorada é que algumas A declaração contrasta gritantemente com o trata-
vítimas de assédio sexual são homens. Em 2016, quase mento conferido a Anita Hill, que em 1991, perante o
17% das queixas de assédio sexual registradas na Equal Comitê Judiciário do Senado, prestou testemunho de
Employment Opportunity Commission (EEOC) foram assédio sexual contra Clarence Thomas, então nome-
de homens. Alguns são perseguidos por mulheres, ado para a Suprema Corte. Os senadores submete-
mas muitos são assediados por outros homens, alguns ram-na a uma inquisição humilhante, que foi acom-
heterossexuais, outros gays. Em 1998, a Suprema Cor- panhada atentamente por uma extasiada audiência Historicamente,
te dos EUA determinou que um roustabout (funcioná- nacional de televisão. Outra ex-funcionária esperava
rio de área) de uma plataforma de petróleo fora vítima nos bastidores para descrever como Thomas também
até mesmo as
de assédio por colegas de uma tripulação de oito ho- a havia assediado sexualmente. Mas ela nunca foi alegações
mens, que se sentiram ofendidos pelo que definiam chamada para testemunhar. Em vez disso, Hill supor- comprovadas de
como machismo insuiciente. Recentemente, o Metro- tou o bullying de um comitê exclusivamente masculi-
politan Opera suspendeu o antigo maestro James Levi- no. Após as audiências, as críticas contra Hill torna- assédio sexual
ne depois que vários homens o acusaram de abusos re- ram sua vida na Oklahoma University tão difícil que prejudicam
lativos a masturbação ocorridos entre o fim dos anos ela abandou o cargo e a estabilidade no emprego —
1960 até a década de 1980, quando suas vítimas ti- uma lição clara sobre os riscos enfrentados por qual-
a carreira.
nham entre 16 e 20 anos de idade. quer um que ousasse denunciar o assédio sexual.

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FOCO COMO GERIR O #METOO

Uma pesquisa recente da National Public Radio sugeriu que as vítimas de assédio respondessem “Me
(NPR) mostra de forma dramática a mudança repen- Too” a um tweet em outubro, 12 milhões de mulheres
tina: 66% dos americanos acham que as mulheres escreveram postagens com #MeToo no Facebook. Em
que relataram assédio sexual cinco anos atrás foram, vez de se distanciarem dos que reagem contra o assédio
na maioria dos casos, ignoradas. Apenas 26% acham sexual, como acontecia no passado, atores e atrizes
que as mulheres são ignoradas hoje. Em que ponto trajaram preto na cerimônia do Globo de Ouro de 2018
começamos a acreditar nas mulheres? O que mudou? para sinalizar sua solidariedade.
E quais são as implicações para os homens? Converter indignação em ação, entretanto, requer
A descrença — ou, na melhor das hipóteses, a des- ir além das hashtags para novas normas de conduta no
consideração — para com as mulheres remonta ao anti- local de trabalho. É um momento precário, e muita
go estereótipo que mencionamos anteriormente, que coisa pode dar errado. Pense no que teria acontecido
considera as mulheres fundamentalmente irracionais, se o Washington Post, ao receber uma acusação dramá-
vingativas, ardilosas e excessivamente sexuais. tica, mas falsa, de uma mulher contra Roy Moore, não
Uma versão antiga desse estereótipo aparece no Gê- tivesse agido com admirável rigor e descoberto a ver-
nesis, na qual Eva comete o primeiro pecado e depois dade. O propósito dela era enganar o jornal para que
arrasta Adão e o resto da humanidade junto com ela pa- publicasse uma história falsa e, assim, lançar dúvidas
ra todo o sempre. Ao longo dos séculos, diversos autores sobre todos os meios de comunicação que noticiavam
Há uma grande da tradição judaico-cristã expuseram o mal feminino. as alegações contra Moore. Porém, até agora, as coisas
Entre eles, dois frades alemães — autores do clássico estão correndo bem, e os primeiros sinais são de que o
diferença entre compêndio sobre as bruxas The Malleus Maleficarum local de trabalho está de fato mudando.
“gosto deste (O martelo das feiticeiras, Record, 1991), de 1486 — se
vestido” e “você destacam pelo vívido estilo da prosa: “O que é a mulher,
além de um inimigo da amizade, um castigo inescapá- A DEMISSÃO É O NOVO ACORDO
fica sexy nesse vel, um mal necessário, uma tentação natural, uma cala- No passado, as empresas geralmente pagavam, de mo-
vestido”. midade desejável, um perigo doméstico, um prejuízo do discreto, para resolver as queixas de assédio sexual
atraente e um mal da natureza pintado com cores boni- contra um malfeitor poderoso e tentava limitar os da-
tas!”. O que mais nos interessa é talvez a afirmação de nos por meio de acordos de confidencialidade. Inci-
que a mulher “é uma mentirosa por natureza”. dentes na Fox deram origem a pelo menos sete acor-
Embora no século XIX mais imagens positivas de dos (alguns contra a Fox, outros contra funcionários da
mulheres tenham surgido, o estereótipo da “vadia Fox). Segundo consta, Weinstein supostamente pagou
mentirosa e vingativa” era útil demais para desapare- oito desses acordos. Apesar de receberem grandes so-
cer. Ele foi imposto a grupos inteiros de mulheres, es- mas, as reclamantes foram forçadas a deixar a empre-
pecialmente as afro-americanas, como amplamente sa, e muitas sofreram interrupção na carreira.
demonstrado por pesquisadores, e às mulheres da Agora está icando mais difícil justiicar os acordos
classe trabalhadora pressionadas a fazer sexo com os feitos na surdina. As demissões sem cerimônia e os
chefes. Era usado para isolar e humilhar estudantes pedidos forçados de demissão de homens famosos
do ensino médio que, de repente, se viam representa- demonstram que as empresas estão se afastando des-
das como “fáceis”. Sempre que os homens, e às vezes sa estratégia. Provavelmente ainda serão realizados
os meninos, exploravam as mulheres — ou muitas ve- acordos em determinadas ocasiões, como uma pri-
zes as meninas —, o estereótipo da “vadia mentirosa meira ofensa leve ou ambígua, ou uma situação con-
e vingativa” fornecia as palavras para justificar seu sensual que, no entanto, viole os padrões da empresa.
comportamento: ela quis, pediu, mereceu. Mas longas sequências de casos graves resolvidos por
Lamentavelmente, o estereótipo persiste. Ele é a acordos serão cada vez mais vistas como tergiversa-
causa subjacente do receio dos homens de serem tam- ção do diretor para com a empresa. Os conselhos ges-
bém prejudicados por falsas alegações. Alguns icaram tores nunca toleraram fraudes inanceiras e violações
tão assustados que agora se recusam a se encontrar (ou do Foreign Corrupt Practices Act e provavelmente
fazer uma refeição) a sós com colegas do sexo femini- adotarão os mesmos padrões para o assédio — demis-
no. Quando Roy Moore foi acusado de agressão sexual, são sem pagamento de indenização.
membros da equipe de campanha disseram que ele foi É importante reconhecer que a maioria das demis-
vítima de uma “caça às bruxas”, uma forma tradicional sões foi em empresas cujo departamento jurídico e
e reveladora de desacreditar as vítimas. RH são sofisticados, com orientação do conselho e
Os movimentos #MeToo e Time’s Up mostram que com o envolvimento da alta gestão ou da diretoria, ou
as mulheres não podem mais ser silenciadas com a ame- de ambos. Não devemos deduzir que todas as evidên-
aça de que serão tachadas de vadias. Quando um gestor cias foram divulgadas. As empresas têm um forte mo-
da Google disse uma obscenidade a uma das engenhei- tivo para não divulgá-las e assim evitar que o ex-
ras, ela transmitiu a frase para o mundo via Twitter. Nas funcionário as use como munição em processos de
primeiras 24 horas depois que a atriz Alyssa Milano difamação ou demissão injusta. Isso é o que as em-

22 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


presas fazem quando demitem alguém por justa cau- preservar o assédio sexual como prerrogativa porque
sa, e é isso que estão fazendo agora. sentem que sua masculinidade está em jogo. Mas essa
Alguns temem que as pessoas sejam demitidas deinição de masculinidade — apenas uma entre outras
muito rápido e sem o devido processo legal. Uma possíveis — é tóxica e desatualizada. É hora de mudar.
questão muitas vezes negligenciada é que o devido
processo não é exigido de empregadores privados,
mas apenas públicos. O que as pessoas querem, e é O LOCAL DE TRABALHO HOJE
apropriado, são procedimentos justos que revelam a Praticamente todas as mulheres e a maioria dos ho-
verdade. As empresas devem seguir os mesmos proce- mens estão agora alinhados contra essa marca tóxica
dimentos que usam quando um funcionário é acusado de masculinidade. Ninguém pede aos homens que
de qualquer tipo de má conduta grave. Normalmente deixem de ser homens ou que as pessoas deixem de
ele é colocado em licença enquanto uma investigação ser seres sexuais. O que aconteceu é que um pequeno
é realizada. Na maioria dos casos, embora nem todos, grupo de homens está sendo obrigado a abandonar o
é o que vem ocorrendo nos casos de assédio sexual. estereótipo de que “homens de verdade” precisam
Avaliações de credibilidade são, evidentemente, ser implacavelmente sexuais, desconsiderando o
importantes. Como quaisquer seres humanos — ho- contexto ou se há consentimento.
mens ou mulheres —, as mulheres mentem. Por isso, Uma suposição razoável é que as relações de traba-
é preciso aplicar os métodos padrão que sempre usa- lho devem ser sobre o trabalho. Algumas organizações
mos para avaliar a credibilidade. Esses métodos são proíbem o namoro por esse motivo. Se a sua não o faz,
falhos, mas é o que temos. Se eles cumprem sua fun- lembre-se de que você não deve tentar um envolvimen-
ção em todos os outros contextos, servirão também to romântico ou sexual se não for bem recebido. Decidir
nos casos de assédio sexual. se a aproximação deve ser feita ou não é motivo de mui-
À medida que entramos nessa nova era, vale lembrar ta ansiedade, especialmente em ambientes de trabalho
do pensamento reconfortante de alguém que passou a desgastantes, onde as pessoas namoram colegas por-
vida refletindo sobre como descobrir a verdade, o emi- que passam tanto tempo no espaço proissional que há
nente pesquisador Roger Park (colega de Joan). Referin- poucas oportunidades de conhecer outras pessoas.
do-se ao assédio sexual, ele diz: “Os homens têm moti- A única maneira de saber com segurança o que a
vos para praticá-lo e mentir, enquanto as mulheres não outra pessoa quer é perguntar a ela. Alguns homens
têm motivação para mentir, considerando que se trata parecem ter dificuldade de discernir se uma mulher
de uma provação”. Historicamente, mesmo alegações está interessada. Charlie Rose e Glenn Thrush acha-
comprovadas de assédio sexual prejudicam a carreira. vam que os sentimentos que nutriam pelas mulheres
Isso, assim como o grande número de pessoas que cortejavam eram recíprocos, mas elas diziam que
com histórias semelhantes, fornece alguma garantia não eram. Esse não é um problema difícil de resolver.
de que os relatos de assédio são verdadeiros. Pelo me- Se ela é uma colega de trabalho e você gostaria que ela
nos 42 mulheres izeram acusações contra Weinstein fosse algo mais, faça o seguinte: imagine-se dizendo a
e pelo menos dez contra Ken Friedman, o restaura- uma amiga de longa data que gostaria de levar o rela-
teur de Nova York. Pelo menos uma dúzia de pessoas cionamento para uma direção diferente. Ao falar com
fizeram acusações contra Kevin Spacey. Esses núme- ela dê-lhe a chance de responder que prefere continu-
ros conferem credibilidade às alegações. ar como amiga. Ninguém sairá prejudicado. E se sua
Os empregadores que desejam criar processos para colega disser não, mas na verdade quer dizer sim? Bem,
lidar com o assédio podem começar com as políticas neste caso, ela vai ter de arcar com as consequências.
padrão de assédio sexual. A Sociedade de Recursos Dê espaço a ela. Deixe-a mudar de ideia se quiser.
Humanos tem uma, outras estão disponíveis gratuita- Todos sabem que acordos e networking cruciais são
mente online. O treinamento organizacional deve ex- feitos durante almoço, jantar e bebendo. Nada de erra-
plicitar o que é aceitável, que varia de empresa para do em socializar assim. Mas, se você socializa com cole-
empresa. Algumas empresas talvez queiram adicionar gas de trabalho, precisa entender que não pode se com-
detalhes à luz de eventos recentes. Por mais surpreen- portar de maneira inadequada. Roy Price deixou o cargo
dente que pareça, algumas pessoas precisam ser avisa- de diretor da Amazon Studios depois que Isa Hackett,
das de que pornograia, beijos, massagem nas costas e produtora da empresa, acusou-o publicamente de fazer
nudez não são apropriados no ambiente de trabalho. propostas indecentes e dizer-lhe obscenidades num tá-
Como isso é possível? O juiz Kozinski pode nos dar xi a caminho de uma confraternização da empresa e du-
uma pista. Em um jantar com as oiciais de justiça, ele rante o evento, na presença de outros. Nellie Andreeva,
mencionou os seios “voluptuosos” de uma mulher de comentarista de Hollywood, observou que, em um
topless em um ilme, de acordo com um dos presentes. mundo pós-Weinstein, o comportamento de Price teria
Quando uma mulher no jantar reagiu negativamente, prejudicado a capacidade da Amazon de atrair produto-
Kozinski respondeu que, bem, ele era homem. ras. Ele teria caído no “ostracismo absoluto”, disse uma
Alguns homens têm necessidade urgente de fonte anônima a Andreeva.

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FOCO COMO GERIR O #METOO

Você ainda pode elogiar seus colegas. Mas há uma Lições claras surgem também para as mulheres.
grande diferença entre “eu gosto deste vestido” e “vo- Se um colega de trabalho tentar levar a relação prois-
cê fica sexy dentro dele”. E se ela realmente fica sexy? sional para o lado sexual e você não tem interesse, se-
Lembre-se, ela entrou para ser sua colega, não sua na- ja clara. Se você depara com brincadeiras sexuais que
morada. Trate-a como colega, a menos que, por mútuo a deixam desconfortável, diga: “Isso me deixa des-
consentimento, vocês mudem o relacionamento. confortável”. Se você quiser desestimular o mau
Não deixe o pêndulo balançar longe demais para o comportamento de alguém preservando seus relacio-
outro lado, evitando as mulheres completamente e de namentos de negócios, leia o artigo de Joan “What
modo bizarro. Isso é desnecessário, injusto e ilegal: pri- works for women at work”. Por exemplo, uma mu-
va as mulheres de oportunidades simplesmente porque lher cujo colega propôs começar um caso disse:
são mulheres. Você não pode se recusar a ter reuniões a “Conheço sua esposa. Ela é minha amiga. Você é casa-
portas fechadas com mulheres, a menos que você se re- do. Não há a menor hipótese. Portanto, o assunto
cuse a ter reuniões a portas fechadas com homens. Caso morre aqui”. De fato, o assunto não foi retomado.
contrário, as mulheres terão acesso negado a todas as Mas é nosso conselho final que sinaliza uma mu-
informações conidenciais que são compartilhadas ape- dança “tectônica”: se você for assediada sexualmen-
nas a portas fechadas, e isso é violação da lei federal. te, denuncie. Há um ano talvez não teríamos aconse-
Seguindo adiante, os aliados masculinos continu- lhado isso de forma tão abrangente e direta.
arão a desempenhar um papel importante no assédio: O que vemos hoje não é o fim do sexo, da sedução
se você vir algo, diga algo. É preciso coragem, mas vo- ou da diferença entre os gêneros. O que vemos é o fim
cê pode tratar do assunto com leveza. Se você está em de uma cultura de trabalho em que as mulheres são tra-
um grupo de homens e alguém diz “Como é sexy” em tadas, insistente e incessantemente, como oportunida-
referência a uma colega que está passando, diga sim- des sexuais. A maioria das pessoas, quando vai traba-
plesmente: “Eu não penso nela dessa maneira. Penso lhar, quer trabalhar. E agora elas podem fazer isso.
nela como uma colega, e creio que é assim que ela
gostaria de ser tratada”. HBR Reprint R1806A–P Para pedidos, página 10

OS LIMITES LEGAIS
Muitos dos casos de assédio sexual que viraram manche- piada vulgar no trabalho, convidou uma colega para sair,
te envolvem comportamento criminoso. O assédio sexual ou se divertiu com sua mão boba em uma festa de Natal
e ofensas relacionadas são definidos de formas diferentes (ou conhece alguém que o tenha feito), apostamos que
em estados americanos. Para citar apenas um exemplo, a você tem pensado muito sobre assédio sexual ultimamente.
lei de Nova York proíbe “tocar com violência as partes se- O direito do trabalho tem uma abordagem sóbria e equili-
xuais ou outras partes íntimas de outra pessoa com o pro- brada que protege totalmente os direitos dos homens acusa-
pósito de degradá-la ou abusar dela ou com o propósito de dos de assédio sexual. Ele define dois tipos de assédio sexual:
gratificar o desejo sexual do assediador”. O texto acrescen- Assédio do tipo “toma lá dá cá”. Sob a lei federal, fazer
ta que isso “inclui apertar, agarrar ou beliscar”. Não deve- dos favores sexuais uma condição para qualquer oportu-
ria surpreender que tal comportamento seja inaceitável. nidade de trabalho é ilegal. Para ganhar uma ação com
Os senhores sabem que não se deve convidar nenhuma essa alegação, a mulher deve provar que alguém com au-
mulher para conversar sobre trabalho para depois recepcio- toridade sobre ela ameaçou prejudicá-la profissionalmen-
ná-la de roupão de banho e praticar atos obscenos. Alega- te, a menos que ela se envolvesse em um comportamento
damente, foi isso – entre outras coisas — que fizeram Charlie sexual — ou prometeu a ela uma promoção, um aumen-
Rose e, de acordo com várias mulheres, Harvey Weinstein. to ou outro benefício se ela o fizesse. O congressista John
A masturbação em contextos de trabalho, prática adota- Conyers pagou milhares de dólares a uma funcionária que
da por Louis C. K., não só é inaceitável, mas também ilegal. relatou ter sido demitida por rejeitar seus avanços sexu-
Uma pessoa não deve enfiar a língua na garganta de alguém ais. De acordo com relatos publicados na revista New York,
durante uma discussão sobre as perspectivas de empre- Roger Ailes vinculou, repetidas vezes, as perspectivas de
go, como relataram duas mulheres a respeito de Michael emprego ao sexo: “Se você quiser estar entre os poderosos
Oreskes, da National Public Radio (NPR). Você não deve (big boys, no original), você tem de transar com os pode-
beijar e lamber uma colega, como fez o ator Andy Dick. rosos, disse ele a uma mulher interessada em um contra-
Os homens não saem de casa com a expectativa de que sua to com o Comitê Nacional Republicano em 1989. Nos anos
virilha será agarrada no trabalho. Nem as mulheres. Isso não 1960, ele teria dito a uma moça assustada de 19 anos que
deveria ser assustador ou confuso. Mas dá para entender por “nenhuma garota consegue emprego aqui, a menos que se-
que os homens têm medo: a maioria dos casos de assédio ja cooperativa”, depois de agarrá-la e beijá-la à força. Cin-
sexual não envolve agressão sexual, e se você já contou uma quenta anos depois, conta a apresentadora de TV Gretchen

24 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


Carlson, Ailes a rebaixou e finalmente a demitiu porque ela mas não o fez. Ela saiu, processou e ganhou: ela deixou cla-
se recusou a fazer sexo com ele. A Fox fez um acordo de ro que o comportamento não era bem-vindo e que se sentia
US$ 20 milhões de dólares para resolver o caso de assédio pessoalmente ofendida. O tribunal considerou que qualquer
contra Carlson. Mas ampliou o contrato de Bill O’Reilly de- pessoa razoável teria percebido que o ambiente era hostil e
pois que ele fez um acordo de US$ 32 milhões para resolver que a hostilidade era generalizada.
um caso de assédio sexual contra ele. Acordos com essas Esse exemplo extrapola tanto o que a maioria dos homens
somas vultosas não são feitos, a menos que algo realmente entende como apropriado que eles têm pouco a temer. Ain-
errado tenha acontecido. da assim, a exigência de que a autora prove que ela, pes-
Para os homens preocupados com o assédio do tipo “to- soalmente, percebeu o ambiente como hostil acrescenta
ma lá dá cá”, a solução mais simples é não namorar nin- outra camada de proteção. Com isso, as mulheres precisam
guém que você supervisiona. Se fizer isso, tenha certeza de demonstrar que existe um sentimento pessoal, não apenas
que é consensual e lembre-se de que, independentemente demonstrar que o avanço não é bem-vindo. “Isso me deixa
de vocês ficarem juntos ou terminarem o namoro, quando desconfortável”, “Estamos no trabalho” é o suficiente.
há problemas no local de trabalho você deve se compor- Não há problema em socializar com colegas e namorá-los.
tar exatamente como faria se nunca tivesse havido envol- Mas a lei relativa à “retaliação” exige que um colega seja
vimento. Se você não consegue fazer isso, não namore nin- capaz de recusar um convite sem sofrer consequências.
guém supervisionado por você. Tudo isso se aplica, é claro, A maneira mais fácil para uma empresa perder um pro-
não apenas aos homens, mas também às mulheres. cesso de assédio sexual é a reclamante provar que rejeitou
Ambiente de trabalho hostil. Aqui, novamente, a lei é um avanço ou se queixou de um ambiente hostil e sofreu
bastante protetora para os acusados de assédio sexual. retaliação.
Para atender à definição legal, a conduta deve ser indese- Um novo exemplo bastante didático vem da Uber. O ges-
jável, o ambiente considerado hostil por uma pessoa ra- tor de Susan Fowler convidou-a, pelo site de bate-papo
zoável, a própria reclamante deve percebê-lo como hostil, da empresa, para sair. Ela tirou uma foto da tela e a mos-
e o comportamento que torna o ambiente hostil deve ser trou para o RH, que lhe propôs escolher: ou ela se transfe-
severo ou generalizado. ria para outra equipe, ou ficava. Mas, se ficasse, diziam os
Além disso, as reclamantes raramente ganham casos funcionários do RH, seu chefe poderia fazer uma avaliação
contra ambientes hostis baseados em um único incidente ruim de desempenho, e eles não poderiam fazer nada.
“grave”. Quase invariavelmente, elas precisam provar que Eis o problema: dar a alguém uma avaliação ruim porque
o comportamento é “generalizado”. ela foi rejeitada é retaliação, o que é ilegal. Fowler não que-
Quão generalizado? Muito. Em um caso da Suprema Corte ria ser transferida, porque o projeto de sua equipe combina-
de 1993, o chefe de uma funcionária fez comentários como va muito bem com suas habilidades específicas, mas deci-
“você é mulher, não sabe nada”, “precisamos de um homem diu fazê-lo. Felizmente, ela encontrou outro grande desafio
como gestor da área de aluguéis” e “mulher burra”, e per- profissional, mas, infelizmente, deparou novamente com um
guntou a ela, na frente de colegas de trabalho, se ela queria comportamento machista, que reportou ao RH. Um dia, seu
“ir para o Holiday Inn” para negociar um aumento. Ele pedia chefe a chamou e ameaçou demiti-la caso não parasse de
às mulheres que pegassem moedas direto do bolso da calça fazer queixas. Isso também é retaliação — e é ilegal.
dele, jogava objetos no chão e lhes solicitava que os pegas- —Joan C. Williams
sem. Quando a reclamante protestou ao chefe contra sua
conduta, ele disse que estava brincando e prometeu parar, HBR Reprint R1806A–P Para pedidos, página 10

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FOCO COMO GERIR O #METOO

COMUNICAÇÃO desconfortável — serão necessários um


esforço concentrado e um compromisso

QUEBRANDO O SILÊNCIO
da liderança em proteger o direito de
todos os funcionários a um local de
trabalho livre de assédio ilegal.
Como tornar a conversa sobre assédio mais fácil para todos Por sorte, temos um roadmap. Como
Chai R. Feldblum e Victoria A. Lipnic codiretores da Select Task Force on the
Study of Harassment in the Workplace
(Força-Tarefa Selecionada para o Estudo
sobre o Assédio no Local de Trabalho,

N
a Equal Employment Em poucos meses, a cultura mudou,
em tradução livre), sugerimos os cinco
Opportunity Commission e cada vez mais mulheres estão de-
passos que os empregadores devem
(EEOC, ou Comissão para nunciando. Desde que o magnata de
adotar para acabar com o assédio.
Oportunidades Iguais de Hollywood Harvey Weinstein foi acu-
Essas recomendações derivam do
Emprego, em tradução sado de assédio sexual, uma profusão
trabalho da Força-Tarefa Select,
livre), é nossa responsabilidade garantir de mulheres (e homens) veio a público
incluindo lições aprendidas com
que os locais de trabalho sejam seguros contar histórias mantidas em segredo
pessoas que testemunharam perante
para todos, sabendo que o assédio havia muitos anos.
ela conversas entre seus membros e
sexual é um problema generalizado. Nas mídias sociais, pais, filhas, amigas
uma extensa revisão da literatura
Ele está em todos os setores, em todas e colegas estão compartilhando suas
sociológica, psicológica e econômica.
as classes socioeconômicas e em todos experiências pessoais. As visitas de
O ponto culminante de todas essas
os níveis hierárquicos das organizações. pessoas que buscam informações
atividades, desenvolvida durante um
Estudos mostram que 60% a 70% das sobre assédio no site de nossa
ano, foi o relatório de 2016, disponível
mulheres foram vítimas de assédio agência triplicaram.
online. Ele inclui listas de verificação
sexual no trabalho em algum momento Claramente é um caminho sem volta.
que os empregadores podem usar para
de sua carreira. A forma como falamos sobre assédio
implementar as cinco etapas, que
Lamentavelmente, poucas dessas sexual está mudando. Embora seja um
descreveremos agora em detalhes.
mulheres se manifestam. Oitenta triunfo ter chegado a este momento, o
e cinco por cento dos funcionários próximo momento — no qual tomamos
que sofrem assédio não prestam medidas concretas — é ainda mais
queixa em nossa agência e 70% importante. Para chegar a ele — em que
não fazem denúncia interna a seus falar não gera medo de retaliação ou
empregadores. vergonha e não falar seria incomum e

26 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


q prioridade no atendimento ao cliente
1º PASSO: DEMONSTRE LIDERANÇA ou satisfação do cliente
ENGAJADA E COMPROMETIDA q trabalho monótono ou tarefas de
Muitas vezes ouvimos falar de líderes que baixa intensidade
consideram os acordos de assédio apenas
um custo dos negócios e chegam até a q isolamento físico
reservar dinheiro no orçamento para essa q gestão descentralizada
possível despesa. Esses executivos certifi-
cam-se de que o departamento de recursos q tolerância ou incentivo ao consumo
humanos realize apenas os treinamentos de álcool
necessários para atender aos requisitos q ocorrência de discurso grosseiro fora
legais. Essa situação precisa mudar. Os do local de trabalho
líderes de empresa não devem apenas
assumir um papel de alta visibilidade ao
Nas notícias recentes sobre assédio, é
comunicar quais comportamentos não serão
possível observar esses fatores em cena.
tolerados no local de trabalho, mas também
Por exemplo, muitos incidentes ocorreram
transmitir um senso de urgência sobre a
em Hollywood, na mídia e no Congresso
prevenção do assédio.
— onde existem enormes disparidades de
Não se engane: as palavras importam. “Quando executivos C-level fazem
poder. Nas indústrias de varejo e restauran-
Mas só palavras não é suficiente. Os análise crítica e rigorosa dos
tes, as empresas estão muito distantes
funcionários devem acreditar que os líderes supervisores que se omitiram em
fisicamente e, muitas vezes, organizacional-
são sinceros. Os valores e sentimentos que reportar casos de assédio ou de sua
mente, dos funcionários de linha de frente
eles comunicam devem se refletir em suas forma de abordagem em relação a
e dos supervisores de primeira linha, o que
ações. Isso implica participar de treinamen- funcionários envolvidos em assédio,
talvez explique por que também esses
tos contra o assédio, em vez de apenas fazer isso se traduz em aumento do moral
setores têm muitos problemas de assédio.
os comentários de abertura; estabelecer e da produtividade de toda a força
A presença de um ou mais fatores de risco
políticas e procedimentos claros e testá-los de trabalho. Todo mundo percebe o
não significa necessariamente que o assédio
para garantir que funcionam; realizar que o C-level percebe.
está ocorrendo na organização. Mas
investigações imediatas e imparciais;
avaliá-los e tratá-los é um bom começo
e tomar medidas corretivas rápidas e Heidi Olguin, CEO e fundadora da
para os líderes, qualquer que seja o local Progressive Management Resources,
proporcionais para resolver qualquer
de trabalho. consultoria em conformidade e pesquisa.
conduta indevida.
Uma boa prática é fazer pesquisas
Precisam também prestar atenção aos
anônimas sobre o espaço profissional para
fatores de risco que aumentam as chances
detectar a possível ocorrência e intensidade
de assédio. Em nosso trabalho na força-
do assédio. Os militares dos EUA já realizam
tarefa, identificamos 12:
essas pesquisas regularmente, e militares
q uma força de trabalho homogênea já nos disseram que consideram essas
pesquisas úteis, especialmente se forem
q uma minoria de funcionários que não es- feitas para obter uma linha de base quando
tão em conformidade com os estereótipos um novo comandante assume o comando
da sociedade ou com as normas do local e, novamente, um ano depois, para ver se
de trabalho algo mudou.
q diferenças culturais e de linguagem Em breve, o governo federal pode seguir
os passos dos militares. Legislação apresen-
q muitos funcionários jovens tada no Congresso na esteira da discussão
q um subconjunto de funcionários de pública sobre assédio sexual, incluindo
“alto valor” assédio nos corredores do Congresso,
exigiria que o órgão legislativo realizasse
q disparidades significativas de poder uma pesquisa anônima e confidencial com
entre os funcionários seus membros e funcionários a cada dois

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 27


FOCO COMO GERIR O #METOO

anos para avaliar a prevalência do assédio Outros funcionários que se sentem descon-
sexual em seus espaços e as ações fortáveis com a tolerância aos maus-tratos
corretivas. podem sair.
Quando ocorre um incidente de assédio,
o castigo deve ser proporcional. Muitas
2º PASSO: EXIJA UMA PRESTAÇÃO DE vezes ouvimos dizer que, mesmo em casos
CONTAS RESPONSÁVEL E CONTÍNUA graves, apenas sanções leves são impostas,
Durante nossa pesquisa, muitos funcionários o que passa a mensagem de que o empre-
nos relataram casos de empresas que não gador não está preocupado em evitar o
fazem quase nada quando ficam sabendo de mau comportamento. Por outro lado, se
alguma transgressão. Também isso precisa todas as formas de conduta indesejada
mudar. A falta de atitude da empresa sugere resultarem em rescisão de contrato, as
que o assédio será tolerado. É preciso que pessoas poderão relutar em denunciá-las
uma prestação de contas seja feita: os porque não querem que o colega de trabalho
funcionários precisam perceber que o mau seja demitido — querem apenas que cesse
comportamento não se sustenta e que todos a má conduta.
os cúmplices serão responsabilizados. De fato, vê-se agora uma reação de
Indivíduos que se envolvem em assédio pessoas que assumem que toda queixa
devem ser disciplinados, assim como os resultará na demissão de um suposto
gestores que respondem de forma inade- agressor. É por isso que nosso relatório
quada a relatórios ou observações de adverte contra o uso da expressão “política
má conduta. de tolerância zero”. Deve haver tolerância
Os funcionários percebem a pessoa que zero para o assédio, mas isso não significa
trata mal os colegas e sai ilesa. Especial- que todos os assediadores devam ser
mente quando se trata do que chamamos de disciplinados da mesma maneira — ou
“o assediador superstar” — o indivíduo tido seja, ser demitidos.
como insubstituível na empresa, seja um É importante que os funcionários saibam
“Há vários anos, trabalhei em uma sócio poderoso de escritório de advocacia, que a responsabilidade se estende também
empresa que me perguntou se eu um cirurgião aclamado de um hospital, ou aos gestores de nível médio e aos superviso-
tinha um curso novo para ser um diretor de cinema famoso. Por muito res da linha de frente. A avaliação dos
aplicado aos gestores já treinados. tempo, os líderes optaram por demitir ou gestores deve ir além dos objetivos princi-
Quando perguntei qual era o objetivo, pagar às vítimas em vez de disciplinar ou pais. As avaliações de seu desempenho
fui informada de que várias pessoas demitir os agressores. Mas a pesquisa também devem focar o estabelecimento de
continuavam contando piadas de mau mostra que, a longo prazo, os custos — uma cultura de equipe respeitosa e respos-
gosto e fazendo comentários tanto de finanças quanto de reputação — tas adequadas aos relatos ou observações
inapropriados. Fiquei contente por de manter um assediador superstar sem de assédio. Eles realizaram investigações e
ser útil, mas me pareceu que a controle excedem em muito os benefícios. tomaram medidas corretivas? Garantiram
questão não era qual treinamento A maioria dos empregadores sabe que que não houve retaliação contra as pessoas
deveria ser feito em seguida, mas sim incorrerão em custos legais se tiverem de que denunciaram assédio ou se apresenta-
por que esses tomadores de decisão lutar contra uma queixa e, muitas vezes, ram como testemunhas?
não lidaram a contento.) com os chegar a um acordo. Mas a maioria não Se a empresa tem um departamento
problemas de comportamento e compreende a extensão total do prejuízo de recursos humanos, a responsabilidade
com a dificuldade de seguir padrões para a empresa. Os custos indiretos podem se estende também a ele. Às vezes,
claros desses indivíduos.” ser muito maiores do que os custos diretos ouvimos funcionários dizer “o RH não é
de litígios e acordos legais. Para os alvos de amigo. Sua única preocupação é proteger
Stephen M. Pasko, autor de 8 Fundamentals assédio e para as testemunhas, eles incluem o empregador”. Os líderes precisam deixar
of a civil treatment workplace aumento do absenteísmo, redução da claro para o pessoal do RH que proteger
[8 Fundamentos de um local de trabalho produtividade e efeitos adversos à saúde a empresa significa responder às queixas
em tratamento civil] física e mental. O maior custo é a rotativida- de maneira rápida e apropriada, e não
de de emprego, e não apenas entre os alvos. varrê-las para debaixo do tapete ou culpar

28 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


a pessoa que acusa. Por sua vez, o RH q uma garantia firme de que os funcionários
precisa do forte apoio da liderança da que fazem denúncia ou fornecem informa-
empresa ao investigar alegações de assédio. ções relacionadas, bem como testemu-
Elogiar as pessoas que fazem a coisa certa nhas e outros funcionários que participam
ajuda a reforçar a responsabilidade. de uma investigação, serão protegidos de
Recompensar gestores de nível médio e qualquer retaliação “Se os empregadores se
supervisores de linha de frente para criar comprometerem com a criação e
q um processo claramente descrito que implementação de planos de
uma cultura de respeito e lidar com as fornece vários caminhos acessíveis para
queixas de forma responsável transmite a prevenção de assédio no local de
fazer denúncia trabalho, o problema diminuirá, pois
ideia do que é importante para a liderança
da empresa. Recompensar a equipe de RH q uma garantia de que o empregador pro- haverá sistemas claros e acessíveis
por respostas rápidas e profissionais é outro tegerá a confidencialidade das queixas de correção. Os empregadores devem
passo importante. de assédio na medida do possível considerar os seguintes ingredientes,
Finalmente, a comunicação é fundamental. necessários para um plano efetivo de
q um processo para investigações rápidas, prevenção de assédio: (1) elaboração
É uma boa prática avisar à pessoa que completas e imparciais das denúncias
apresentou queixa que a investigação foi de uma política abrangente, incluindo
concluída e que a ação corretiva (se neces- q uma garantia de que o empregador toma- procedimentos claros de denúncia e
sário) foi tomada. Nada na lei federal de rá medidas corretivas imediatas e propor- posição firme — e aplicada com
direitos civis proíbe o empregador de fazer cionais quando ficar determinado que o firmeza — contra a retaliação;
isso. Ouvimos dizer que algumas empresas assédio ocorreu e que agirá em caso de (2) implantação e comunicação de
estão preocupadas em ser processadas por comportamentos que não configuram as- tal política; e (3) treinamento
difamação, mas se uma investigação sédio do ponto de vista legal, mas que po- regular, interativo e dinâmico sobre
constatar que ocorreu assédio, isso não deve dem levar a isso se não forem controlados o que a política significa no dia a dia
ser motivo para uma ação por difamação. da empresa e de seus funcionários.”
Em alguns casos, os empregadores negocia- Esses são seis requisitos básicos. Hoje,
Sindy Warren, diretora da Warren &
ram acordos de confidencialidade com os todos os empregadores devem inteirar-se Associates LLC, empresa de consultoria
assediadores que foram demitidos. Uma de sua política antiassédio para verificar se de emprego
consequência negativa desse tipo de acordo eles estão contemplados. Se sua empresa
— que os empregadores devem avaliar ainda não elaborou sua política empresarial,
cuidadosamente — é que ele elimina a agora é uma boa hora de fazê-lo.
oportunidade de enviar uma mensagem Lembre-se de que é essencial redigir
clara a toda a força de trabalho de que as políticas em palavras simples e claras,
a organização está empenhada em evitar em todos os idiomas usados no local de
o assédio. trabalho. Na EEOC, temos uma política
interna de quatro páginas contra o assédio,
que é distribuída a todos os funcionários.
3º PASSO: ELABORE POLÍTICAS Temos também procedimentos detalha-
FORTES E ABRANGENTES dos para denúncia, investigação e ação
O poder das políticas empresariais não deve corretiva, que são compartilhados com
ser subestimado. Pesquisas mostram que todos os gestores e estão disponíveis a
funcionários em locais de trabalho sem todos os funcionários em nosso site interno.
políticas preventivas e procedimentos Os procedimentos da EEOC refletem
definidos relatam os mais altos níveis a estrutura de nossa agência federal.
de assédio. Procedimentos de outras organizações
Com base em nossa própria pesquisa, podem ser adaptados à sua estrutura
recomendamos que uma política contra particular, mas os princípios básicos
o assédio inclua: permanecem os mesmos.
q uma explicação clara e simples das
condutas proibidas, com exemplos

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FOCO COMO GERIR O #METOO

problema, ele não deve ser descartado ou


4º PASSO: ESTABELEÇA PROCEDIMENTOS banalizado. Aqueles que recebem a queixa
CONFIÁVEIS E ACESSÍVEIS PARA A devem dizer “obrigado por tomar a iniciati-
va, obrigado por compartilhar sua história
DENÚNCIA e obrigado por me dar a oportunidade
Para que as políticas antiassédio sejam
de investigar o que aconteceu e corrigir
efetivas, as empresas precisam de procedi-
os erros”.
mentos sólidos para denúncia e investigação
A privacidade tanto da pessoa que faz a
de condutas impróprias. Como acabamos de
denúncia quanto do suposto assediador
observar, recomendamos que ofereçam aos
deve ser protegida, tanto quanto possível.
funcionários vários canais para fazer sua
Naturalmente, uma investigação minuciosa
denúncia. Sem dúvida, os funcionários
exigirá que algumas pessoas sejam informa-
devem ter liberdade para ir até o RH, mas
das sobre a queixa, mas, fora isso, o
deve ficar claro que podem recorrer a outras
empregador deve manter sigilo sobre ambas
pessoas da empresa que são canais
as partes envolvidas. Essas partes talvez
legítimos e reconhecidos.
conversem com outras pessoas sobre os
Não há como superestimar a importância
incidentes em questão, e essa é sua
de fornecer aos supervisores e gestores as
prerrogativa, mas o empregador deve
habilidades necessárias para responder às
respeitar a confidencialidade.
queixas. Gestores e supervisores são o
Sistemas para lidar com o assédio devem
coração do programa de prevenção de
fornecer respostas em tempo hábil e
qualquer empregador. Como declarou Fran
investigações justas. É essencial reservar
Sepler, especialista no assunto, perante a
os recursos adequados para receber as
força-tarefa: “Se eu tivesse recursos
denúncias e fazer as investigações e para
limitados para melhorar o clima de qualquer
transmitir a expectativa de que todos devem
empresa, investiria 95% deles em gestores
participar plenamente das investigações.
intermediários. São eles que fazem a
Os investigadores devem ser bem treinados
diferença no dia a dia das pessoas e das
e neutros, especialmente se forem funcioná-
empresas. Quando treinamos gestores de
rios da empresa. Se o empregador dispõe
nível médio, não os treinamos apenas para
de recursos, pode contratar um investigador
identificar e atacar o comportamento
externo — uma estratégia particularmente
problemático. Ensinamos procedimentos de
útil quando o alvo é uma superestrela. Além
eficiência comprovada sobre o que devem
disso, a boa investigação deve documentar
fazer e dizer ao funcionário que os procura
todas as medidas tomadas, elaborar um
para discutir um problema. Explicamos que
relatório baseado em diretrizes para avaliar
não é apropriado dar a entender que o
a credibilidade e comunicar a determinação
empregado é culpado. Ensinamos-lhes
final a todas as partes relevantes.
respostas emocionalmente inteligentes e
O processo deve garantir que os funcio-
enfatizamos a importância de um ambiente
nários que denunciam assédio (seja uma
rico em feedback, para que as pessoas se
experiência própria ou observada) não sejam
acostumem a se manifestar e a escutar o
punidos por isso. O medo de retaliação é o
indivíduo que relata um problema. Acima de
maior obstáculo para a denúncia. Garantir
tudo, mostramos as métricas que acompa-
que não haverá retaliação é tarefa difícil se
“O treinamento de compliance não nham o monitoramento adequado e o
a cultura atual do local de trabalho tolera
muda sua cabeça. Ele serve para que tratamento de reclamações”.
o assédio. Mas as pessoas que se manifes-
você mantenha o emprego.” A pessoa que recebe uma queixa deve
tam devem ser protegidas. A melhor forma
sempre levá-la a sério, mesmo se não
Jonathan A. Segal, sócio da Duane Morris de evitar o problema é tomar medidas
trabalha no RH. Afinal, sem uma investiga-
LLP e membro da Select Task Force disciplinares imediatas contra os envolvi-
ção, não há como saber se a denúncia é
dos na retaliação.
verdadeira. Quando alguém relata um

30 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


de conformidade não deve ser excessiva-
5º PASSO: FORNEÇA TREINAMENTO mente legalista. Deve simplesmente expli-
CUSTOMIZADO, REGULAR E INTERATIVO car, em termos claros e acessíveis, que
comportamentos a empresa não tolera,
PARA A EMPRESA mesmo que não cheguem ao nível de Em resposta a um número significativo
Ouvimos muitas reclamações sobre de alegações de assédio, o
assédio ilegal. Além disso, os empregado-
treinamentos contra assédio. Os emprega- Departamento de Água e Energia de
res não devem presumir que o treinamento
dores e departamentos de RH costumam Los Angeles (LADWP) estabeleceu uma
vai mudar as crenças dos funcionários.
vê-lo como uma mera formalidade para estratégia proativa para oferecer uma
Em vez disso, o objetivo deve ser mudar
cumprir as leis ou para proteger os empre- salvaguarda à dignidade pessoal de
a forma como eles agem, de modo a
gadores de possíveis riscos. Os funcionários seus funcionários e capacitá-los a
controlar as condutas consideradas
costumam vê-los como desvio de seu ajudar a evitar a má conduta e a
indesejáveis pelo empregador.
“trabalho real” e se ressentem da sugestão discriminação em seu local de trabalho.
Os funcionários devem sair do treinamento
implícita de que podem se comportar de
de conformidade sabendo claramente o que q 0 -"%81 DPNFÂPV DPN VN USFJOBNFOUP
maneira inadequada. Em nossa experiência,
fazer caso sejam submetidos a comporta- obrigatório de oito horas para todos os
embora alguns programas de treinamento funcionários, com foco no respeito mútuo no
mento indesejado; quem são os vários
sejam simplesmente mal elaborados, quase local de trabalho. Isso incluiu discussões sobre
indivíduos a quem eles podem prestar
todos passam mais tempo discutindo diferenças individuais relacionadas a raça,
queixa; que outras medidas, se for o caso, gênero e cultura; melhores formas de resolução
padrões legais do que os funcionários
o empregador tomará para ajudá-los; que de conflitos interpessoais; papéis e expectativas
podem fazer para criar um ambiente de
procedimentos a empresa adotará quando dos funcionários e líderes; e visão geral das leis,
trabalho livre de assédio.
a queixa tiver sido feita; e como relatar políticas e procedimentos em prol da igualdade
Detalhamos essas (e outras) críticas em e de mais oportunidades de emprego.
qualquer retaliação contra eles ou testemu-
nosso relatório de 2016. Infelizmente, em
nhas do assédio. q &N TFHVJEB IPVWF USFJOBNFOUP PCSJHBUÎSJP
alguns casos, o relatório foi mal interpretado
O segundo tipo de treinamento foca a para todos os executivos e supervisores,
como uma proposição de que o treinamento concentrado nas implicações práticas das leis
“civilidade no local de trabalho” para
não funciona. trabalhistas, no qual se forneceram
fomentar um clima em que o comporta-
Não é nada disso. É verdade que muito do ferramentas e técnicas para lidar com
mento rude, inadequado ou abusivo seja comportamentos inadequados.
treinamento feito até aqui não tem sido
cortado pela raiz. Esse treinamento
particularmente eficaz, mas ele funciona se q 0 -"%81 DSJPV VNB oFRVJQF EF DPSSF¾Pp
ensina os funcionários a ser respeitosos
é bem planejado e se a empresa já tem a para responder rapidamente à má conduta e
com os colegas e lhes fornece as habili- fornecer coaching individual e treinamento
liderança, a responsabilidade, as políticas
dades para criar uma cultura saudável. em grupo.
e o sistema de denúncia e investigação
Os funcionários aprendem a fornecer
necessários. O LADWP continua fornecendo
feedback sobre comportamentos que
Acreditamos que três tipos de treinamento treinamento regular contra assédio e
não são bem-vindos e a responder de
podem ser eficazes para impedir o assédio. discriminação para os funcionários de
forma adequada caso recebam esse
O primeiro é o que chamamos de “treina- todo o departamento. Nos primeiros três
feedback.
mento de conformidade”. anos após o início da iniciativa, o número
Os gestores aprendem a lidar com reclama-
Esse treinamento deve explicar claramente de reclamações internas aumentou
ções e a treinar funcionários problemáticos.
que condutas são inaceitáveis com exemplos — talvez porque os funcionários
O terceiro tipo de treinamento foca a
realistas adaptados ao local de trabalho. tivessem adquirido maior compreensão
“intervenção da testemunha”. Sabemos
(Por exemplo, treinamento para mecânicos de seus direitos e dos canais adequados
que muitas pessoas ficam desconfortáveis
automotivos ou motoristas de caminhão não para fazer denúncias. Desde então, as
quando observam situações de assédio,
deve usar exemplos de funcionários de queixas caíram 70%, bem como a
mesmo que não sejam vítimas diretas. Mas
escritório ou de varejo, e os exemplos de gravidade dos comportamentos
alguns funcionários não veem isso como um
treinamento não devem ser caricaturas relatados. De acordo com Renette
problema. Outros não sabem qual seria a
extremas ou irreais.) Sempre que possível, o Anderson, diretora do Equal
resposta apropriada, e quase todos temem
treinamento deve ser interativo e ao vivo, em Employment Opportunity Services, no
retaliação em caso de envolvimento.
vez de baseado na web, a fim de envolver LADWP, “muito disso se deve ao nosso
O objetivo do treinamento de testemunhas
totalmente a atenção dos funcionários. compromisso firme e tenaz com nossos
é motivar os funcionários a intervir e tomar
Apesar de ser usado como um mecanismo esforços de treinamento”.
uma atitude caso sejam testemunhas de
contra reclamações legais, o treinamento

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 31


FOCO COMO GERIR O #METOO

assédio e fornecer-lhes as habilidades e a juntos, será possível melhorar as coisas,


confiança necessárias para isso. Mas, se a para que ninguém precise dizer novamente
cultura organizacional não incentivar nem “eu também”.
apoiar essa intervenção, nada feito. Assim,
HBR Reprint R1806A–P Para pedidos, página 10
os líderes devem promover um senso
coletivo de responsabilidade para manter o Sobre os autores: Chai R. Feldblum ocupa
local de trabalho livre de assédio e garantir um cargo comissionado na Equal Employment
que não haja retaliação contra ninguém que Opportunity Commission, nos EUA. Victoria A.
Lipnic é a presidente em exercício da EEOC.
assuma essa responsabilidade.
A EEOC anunciou recentemente que está
oferecendo seu próprio treinamento para os
empregadores que desejam promover o
respeito no local de trabalho. Um módulo
é projetado para gestores e supervisores, e
outro para funcionários de linha. O treina-
mento é interativo e ao vivo e ensina
habilidades com eficácia comprovada a
ser usadas no local de trabalho.

A RESPONSABILIDADE É DE TODOS
Todos nós temos um papel a desempenhar
para acabar com o assédio no local de
trabalho. Todos que fazem parte da
empresa, desde o CEO até os recém-con-
tratados, precisam apoiar ativamente os
colegas que sofrem assédio e fazer tudo
o que for possível para evitá-lo. Com
esse objetivo, nossos escritórios planejam
fazer parcerias com outras organizações
para lançar uma campanha de divulgação
e educação.
Não é fácil mudar a cultura organizacional.
Padrões de comportamento se estabelecem
com o tempo, e as pessoas que questionam
esses padrões ou a eles se opõem podem
ser isoladas ou intimidadas. Mas é possível
mudar a cultura com esforço estratégico
e persistente. O fenômeno #MeToo e a
campanha Time’s Up são notáveis catali-
sadores para a reforma. Mas precisamos
de ainda mais. E aqui oferecemos um
roteiro para ações realistas que trarão
mudanças sustentáveis.
Este é o momento em que todos devem
se reunir para fazer algo diferente e
dramático. Estamos otimistas de que, se
todos os envolvidos — empregadores,
funcionários, governo, grupos de defesa de
direitos, entidades comunitárias, filantropos,
a mídia e as pessoas comuns — trabalharem

32 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


PESQUISA desenvolvemos enquanto trabalháva-
mos com as principais organizações
QUE PENSAM SEUS COLABORADORES empresariais e realizávamos centenas
de workshops e debates moderados,
SOBRE O ASSÉDIO? PERGUNTE A ELES focados na questão de gênero nos
Estados Unidos.
Guia prático de pesquisa com funcionários Embora acreditemos que esse tipo de
Andrea S. Kramer e Alton B. Harris pesquisa possa ser de grande valia,
alertamos que os gestores e líderes só
devem realizá-la se estiverem totalmen-
te comprometidos em tratar de forma

S
e a sua empresa leva a sério de trabalho. O primeiro passo vital,
rápida e completa o comportamento
— como deveria — a então, é obter uma imagem exata de
inadequado na empresa. Uma vez
iniciativa de acabar com o sua cultura. Como? Pergunte aos seus
realizadas, essas pesquisas criarão
assédio sexual, precisa funcionários diretamente. Eles veem
expectativas de que ações corretivas
abordar o problema de desigualdade nas oportunidades de
serão tomadas. E poderão atrair
forma abrangente. Isso significa carreira? Os colegas ou supervisores são
publicidade indesejada ou ser usadas
reconhecer que o assédio sexual faz rudes uns com os outros? Há conduta
contra a empresa em futuros litígios.
parte de um contínuo de comportamen- sexual inapropriada? Os funcionários
Esses riscos, no entanto, são superados
tos interconectados que vão do se sentem desconfortáveis ou inseguros
substancialmente pela oportunidade de
preconceito de gênero e do desrespeito no trabalho?
criar ambientes de trabalho livres de
até a agressão acionável legalmente. A melhor maneira de descobrir tudo
má conduta sexual, preconceito de
Todos esses tipos de conduta inadequa- isso é providenciar uma pesquisa
gênero e desrespeito.
da devem ser abordados coletivamente, cuidadosamente projetada para os
porque a probabilidade de que ocorra o funcionários. Neste artigo, oferecemos
assédio sexual é muito maior nas alguns princípios-chave para criar uma, 1º PASSO: COMUNIQUE-SE
empresas em que ocorrem casos no junto com um modelo de pesquisa que
lado menos “severo” desse espectro. você pode adaptar (e que incorpora
COM OS FUNCIONÁRIOS
Informe aos seus funcionários que
Não há uma solução universal para algumas das recomendações para
você está tomando uma iniciativa para
eliminar comportamentos inadequados pesquisas que a EEOC fez em sua
entender o quão justo, cortês e seguro
relacionados a gênero. Os melhores proposta para a execução da lei do
é o local de trabalho. O objetivo é
programas abordam especificamente as assédio, de 2017). Nossos conselhos
incentivar respostas engajadas e
características da cultura de cada local são baseados em insights que

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 33 


FOCO COMO GERIR O #METOO

completamente sinceras à pesquisa.


Por esse motivo, ela deve ser anônima e SE AS MEDIDAS QUE VOCÊ TOMAR FOREM VISTAS
COMO UM ESFORÇO PARA “PROTEGER”
administrada por um terceiro, não por seu
departamento de RH. Os funcionários não
acreditarão que o sigilo das respostas será
mantido se a pesquisa for conduzida
internamente, e sem o anonimato as
AS MULHERES PELA SUA VULNERABILIDADE,
respostas terão menor probabilidade de
ser honestas. A INICIATIVA TERÁ EFEITO CONTRÁRIO.
É crucial que os funcionários acreditem
que a gestão considera um local de trabalho
imparcial e livre de assédio uma prioridade dido em quatro partes: preconceito ou procedimentos de má conduta se-
e que é sincero seu compromisso com esse de gênero, desrespeito, conduta sexual xual. Uma pergunta inadequada em uma
objetivo. Isso só acontecerá se a alta gestão imprópria e ambiente geral no trabalho. entrevista de emprego é igualmente inade-
endossar abertamente a iniciativa, comuni- Todas as quatro áreas são importantes, quada em uma pesquisa sobre o ambiente
car a toda a equipe de gestão a importância então, por favor, seja o mais sincero de trabalho.
de apoiá-la e conversar periodicamente possível. q Mantenha o foco no levantamento. Resista
com todos os funcionários sobre ela. Os funcionários também devem ser à tentação de usá-lo como uma oportuni-
Os funcionários também precisam informados de que apenas o administrador dade para perguntar aos funcionários de
acreditar que o resultado final serão terceirizado verá os resultados brutos da forma mais ampla sobre sua experiência,
políticas melhores para todos. Este ponto pesquisa e fornecerá uma análise desses expectativas e planos futuros.
deve ser enfatizado ao máximo. Se os pas- resultados à gestão. Depois que a gestão
sos que você toma para combater compor- receber o relatório, os funcionários devem q Faça pesquisa curta e inequívoca — não
tamentos impróprios relacionados a gênero ser informados da natureza e do cronograma deve demorar mais de dez minutos para
são vistos apenas como esforços para das próximas etapas. ser terminada. Use alternativas verdadei-
“proteger” as mulheres por causa de Sugerimos que você enfatize que, como a ras e falsas, de múltipla escolha ou per-
sua vulnerabilidade, a iniciativa terá pesquisa é anônima, sua empresa não pode guntas abertas, mas em nossa experiên-
resultado negativo. investigar ou remediar acusações específicas cia, a abordagem mais útil é incorporar
A primeira carta endereçada a todos os feitas pelos entrevistados — a menos que os uma escala. Desenvolva uma série de de-
funcionários da empresa pode começar com incidentes sejam relatados separadamente clarações para as quais os participantes
uma declaração como esta: de acordo com os procedimentos existentes devem indicar seu grau de concordância,
Estamos coletando informações confiden- na empresa. Incentive seus funcionários a numa escala de 1 (discordo totalmente) a
ciais para entender melhor o ambiente de usar esses procedimentos, se apropriado. 7 (concordo totalmente). Para declarações
trabalho de nossa empresa. Nosso objetivo que pretendem examinar a frequência de
é garantir que todos os funcionários sejam comportamentos específicos, use escala
respeitados e recebam oportunidades e
2º PASSO: PLANEJE SUA PESQUISA de 1 (muito frequentemente) a 4 (nunca).
Seja começando com a avaliação que
recursos iguais em um ambiente livre de
fornecemos neste artigo ou criando suas
desrespeito em que nenhuma conduta
sexual imprópria seja tolerada.
próprias perguntas, adapte sua pesquisa à 3º PASSO: AVALIE
cultura e ao ambiente de sua empresa. Deixe claro que o objetivo é apenas determi-
O questionário que você receberá em breve
Tenha em mente que é necessário: nar se alguns de seus funcionários acreditam
é o primeiro passo para atingir esse objetivo.
que há problemas relacionados a gênero no
Contratamos uma empresa terceirizada q Evite perguntas que possam ser usadas local de trabalho e quais são tais problemas.
para realizar uma pesquisa de maneira — ou dar a impressão de que serão usa- Nenhuma pesquisa sobre ambiente de
estritamente anônima. Suas respostas e das — para identificar os participantes. trabalho precisa de avaliação estatística
sua identidade serão cuidadosamente Por exemplo, título, idade, tempo de casa, além de uma simples tabulação.
mantidas em sigilo. responsabilidades e localização no local Tenha em mente que a pesquisa não é um
A empresa entrará em contato com você de trabalho. fim em si mesmo, mas uma ferramenta para
individualmente e detalhará os procedimen-
q Não pergunte sobre situação conjugal identificar se você precisa de novas políticas,
tos para preservar o anonimato.
ou doméstica, preferência sexual, filhos práticas e procedimentos para eliminar
O questionário que você receberá é divi-
ou envolvimento prévio em investigações comportamentos inadequados e proteger

34 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


seus funcionários contra o assédio sexual.
MODELO PARA PESQUISA SOBRE Por isso, responda a todas
Os resultados podem indicar que etapas as perguntas com a maior
adicionais são necessárias: talvez reunir AMBIENTE DE TRABALHO honestidade possível.
grupos focais, conduzir entrevistas pes- Complete a seguinte pesquisa
soais, ou promover mesas-redondas.
Como seu objetivo é garantir que você tem
sobre sua experiência na empresa 1. Qual das seguintes opções
um local de trabalho receptivo, solidário XYZ, sem se referir a experiências descreve seu gênero?
e produtivo, o trabalho real começa quando em empresas anteriores. q .BTDVMJOP
você tem uma imagem clara do ambiente Esta pesquisa só terá valor se q 'FNJOJOP
atual de sua empresa. A seguir uma obtivermos uma visão precisa q 0VUSPT FTQFDJЯDBS

sugestão de modelo que você pode q 1SFЯSP O¾P EJ[FS
adotar para elaborar sua pesquisa: de nosso ambiente de trabalho.

PRECONCEITO DE GÊNERO
2. Sinto-me valorizado(a) pela organização. 4. As pessoas com quem trabalho me 6. Atribuições e oportunidades de melhoria
(1) Discordo totalmente tratam com respeito e consideração. de carreira são oferecidas de modo
(2) Discordo (1) Discordo totalmente desproporcional aos homens.
(3) Discordo ligeiramente (2) Discordo (1) Discordo totalmente
(4) Nem concordo nem discordo (3) Discordo ligeiramente (2) Discordo
(5) Concordo ligeiramente (4) Nem concordo nem discordo (3) Discordo ligeiramente
(6) Concordo (5) Concordo ligeiramente (4) Nem concordo nem discordo
(7) Concordo plenamente (6) Concordo (5) Concordo ligeiramente
(7) Concordo plenamente (6) Concordo
(7) Concordo plenamente
3. Acredito que minhas oportunidades
de sucesso na carreira são afetadas 5. Meus pontos de vista são encorajados e
negativamente pelo meu gênero. bem-vindos por meus supervisores e
(1) Discordo totalmente líderes seniores, sem levar em conta
(2) Discordo meu gênero.
(3) Discordo ligeiramente (1) Discordo totalmente
(4) Nem concordo nem discordo (2) Discordo
(5) Concordo ligeiramente (3) Discordo ligeiramente
(6) Concordo (4) Nem concordo nem discordo
(7) Concordo plenamente (5) Concordo ligeiramente
(6) Concordo
(7) Concordo plenamente

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 35 


FOCO COMO GERIR O #METOO

CIVILIDADE
7. Meus colegas de trabalho são corteses 10. Estou ciente de que ocorre 13. Todos as pessoas da empresa
e amigáveis. comportamento de intimidação são valorizadas.
(1) Discordo totalmente no local de trabalho. (1) Discordo totalmente
(2) Discordo (1) Discordo totalmente (2) Discordo
(3) Discordo ligeiramente (2) Discordo (3) Discordo ligeiramente
(4) Nem concordo nem discordo, (3) Discordo ligeiramente (4) Nem concordo nem discordo
ou não tenho opinião (4) Nem concordo nem discordo (5) Concordo ligeiramente
(5) Concordo ligeiramente (5) Concordo ligeiramente (6) Concordo
(6) Concordo (6) Concordo (7) Concordo plenamente
(7) Concordo plenamente (7) Concordo plenamente

8. Estou ciente de que ocorrem fofocas 11. Líderes seniores que são abusivos,
desagradáveis e negativas no local de desrespeitosos ou hostis sofrem as
trabalho. consequências pelos seus atos.
(1) Discordo totalmente (1) Discordo totalmente
(2) Discordo (2) Discordo
(3) Discordo ligeiramente (3) Discordo ligeiramente
(4) Nem concordo nem discordo (4) Nem concordo nem discordo
(5) Concordo ligeiramente (5) Concordo ligeiramente
(6) Concordo (6) Concordo
(7) Concordo plenamente (7) Concordo plenamente

9. Estou ciente de que ocorre tratamento 12. Sou criticado pelo meu estilo de
abusivo, desrespeitoso ou hostil comunicação ou aparência pessoal.
aos funcionários. (1) Com muita frequência
(1) Discordo totalmente (2) Com alguma frequência
(2) Discordo (3) Com pouca frequência
(3) Discordo ligeiramente (4) Nunca
(4) Nem concordo nem discordo
(5) Concordo ligeiramente
(6) Concordo
(7) Concordo plenamente

36 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


CONDUTA SEXUAL IMPRÓPRIA
14. Sofri ou testemunhei uma conduta física 19. Fui objeto de conduta que 23. Eu ficaria confortável em relatar a
indesejada de colegas no local de considero assédio sexual. conduta sexual imprópria de um
trabalho ou fora do local de trabalho. (1) Com muita frequência colega de trabalho.
(1) Com muita frequência (2) Com alguma frequência (1) Discordo totalmente
(2) Com alguma frequência (3) Com pouca frequência (2) Discordo
(3) Com pouca frequência (4) Nunca (3) Discordo ligeiramente
(4) Nunca (4) Nem concordo nem discordo
20. Aqui os gestores toleram conduta (5) Concordo ligeiramente
15. Testemunhei ou ouvi piadas, insinuações, sexual imprópria ou fazem vista grossa. (6) Concordo
brincadeiras ou comentários sexuais (1) Discordo totalmente (7) Concordo plenamente
ofensivos no local de trabalho. (2) Discordo
(1) Com muita frequência (3) Discordo ligeiramente 24. Eu ficaria confortável em relatar a
(2) Com alguma frequência (4) Nem concordo nem discordo conduta sexual imprópria de um
(3) Com pouca frequência (5) Concordo ligeiramente supervisor.
(4) Nunca (6) Concordo (1) Discordo totalmente
(7) Concordo plenamente (2) Discordo
16. Ouvi falar ou fui testemunha de (3) Discordo ligeiramente
transmissão eletrônica de material 21. Sinto-me inseguro no trabalho por causa (4) Nem concordo nem discordo,
sexualmente explícito ou de comentários da conduta sexual inadequada de alguns ou não tenho opinião
desse teor por parte de colegas de indivíduos. (5) Concordo ligeiramente
trabalho. (1) Discordo totalmente (6) Concordo
(1) Com muita frequência (2) Discordo (7) Concordo plenamente
(2) Com alguma frequência (3) Discordo ligeiramente
(3) Com pouca frequência (4) Nem concordo nem discordo
(4) Nunca (5) Concordo ligeiramente
(6) Concordo
17. Recebi ligações telefônicas, mensagens (7) Concordo plenamente
de texto, ou contato via mídias sociais
sexualmente inadequados de um colega 22. Vi oportunidades de carreira serem
de trabalho. alocadas favoravelmente com base
(1) Com muita frequência em interações sexuais existentes ou
(2) Com alguma frequência esperadas.
(3) Com pouca frequência (1) Discordo totalmente
(4) Nunca (2) Discordo
(3) Discordo ligeiramente
18. Testemunhei ou ouvi diretamente (4) Nem concordo nem discordo
perguntas inapropriadas de (5) Concordo ligeiramente
natureza sexual. (6) Concordo
(1) Com muita frequência (7) Concordo plenamente
(2) Com alguma frequência
(3) Com pouca frequência
(4) Nunca

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 37 


FOCO COMO GERIR O #METOO

AMBIENTE GERAL DO LOCAL DE TRABALHO


25. Minha produtividade foi afetada por 27. Espera-se que as estrelas da 29. As políticas e processos da empresa
comportamento inadequado relacionado empresa sigam o mesmo padrão de relativos à proibição e denúncia
a questões de gênero no local de trabalho. comportamento relativo ao gênero de comportamentos inadequados
(1) Discordo totalmente seguido pelos outros funcionários. relacionados a gênero são fáceis
(2) Discordo (1) Discordo totalmente de entender e de seguir.
(3) Discordo ligeiramente (2) Discordo (1) Discordo totalmente
(4) Nem concordo nem discordo (3) Discordo ligeiramente (2) Discordo
(5) Concordo ligeiramente (4) Nem concordo nem discordo (3) Discordo ligeiramente
(6) Concordo (5) Concordo ligeiramente (4) Nem concordo nem discordo
(7) Concordo plenamente (6) Concordo (5) Concordo ligeiramente
(7) Concordo plenamente (6) Concordo
26. Já considerei deixar meu emprego (7) Concordo plenamente
por causa de comportamento impróprio 28. Experimentei ou testemunhei
relacionado a questões de gênero comportamento inadequado relacionado
no local de trabalho. a gênero por terceiros (como clientes,
(1) Discordo totalmente vendedores e fornecedores) associados
(2) Discordo à nossa empresa.
(3) Discordo ligeiramente (1) Com muita frequência
(4) Nem concordo nem discordo (2) Com alguma frequência
(5) Concordo ligeiramente (3) Com pouca frequência
(6) Concordo (4) Nunca
(7) Concordo plenamente

Sobre os autores: Andrea S. Kramer é sócia HBR Reprint R1806A–P Para pedidos, página 10
legal da McDermott Will & Emery. Alton B.
Harris é sócio do escritório de advocacia
Nixon Peabody. Marido e mulher, ambos se
dedicam a promover a igualdade de gênero
no local de trabalho há mais de 30 anos.
São autores de Breaking through bias:
communication techniques for women
to succeed at work (Bibliomotion, 2016).

38 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


COMPORTAMENTO pressão, às vezes sem ser notadas.
Neste caso, 25 anos de conversas
privadas em ebulição abriram caminho
COMO FAZER COM QUE OS HOMENS SE MANIFESTEM para a reação generalizada de hoje
contra o assédio. O segundo elemento
Uma cartilha para homens que querem ser aliados
de toda revolução são os precipitantes
Michael Kimmel — eventos cruciais que, rapidamente,
aceleram as mudanças. Um precipitante
foi o lançamento do vídeo Access
Hollywood, em 2016, no qual Donald

N
o início de novembro de resposta deu o tom: nos 25 anos Trump se gaba de beijar mulheres e lhes
1991, um mês após Anita seguintes, sempre que uma mulher se passar a mão. Depois de sua eleição
Hill depor sobre o assédio levantava para acusar publicamente para a presidência dos EUA, apesar
sexual que sofreu de homens como Bill Cosby ou Bill Clinton dessa evidência muitas mulheres ficaram
Clarence Thomas, de agressão sexual, ela geralmente incrédulas e furiosas.
candidato à Suprema Corte, minha mãe acabava se tornando ré no tribunal Finalmente, há eventos desencadea-
me convidou para jantar. Depois de uma da opinião pública, acusada de falta dores que provocam enorme explosão,
refeição longa e agradável, ela me de credibilidade. como a rápida sucessão de revelações
contou que histórias como as de Hill Mas, fora essa narrativa pública, sobre Roger Ailes, Bill O’Reilly e Harvey
eram muito comuns. Quando minha algo começou a mudar: mulheres Weinstein. Aparentemente pela
mãe estava na pós-graduação, seu como minha mãe começaram a falar primeira vez, as histórias de abuso
orientador a apalpou. Ela deixou a em particular sobre suas experiências contra mulheres não foram recebidas
escola no dia seguinte e interrompeu dolorosas. Mães contaram aos filhos, com ceticismo — as pessoas acredita-
seu doutorado por 30 anos. esposas ao marido, mulheres aos ram nelas. E assim começou o #MeToo,
Nos anos 90, ninguém acreditou em amigos, filhas aos pais. E as pessoas uma espécie de prestação pública de
Hill quando, corajosamente, ela se acreditaram nelas. contas — tão pública que as mulheres
manifestou. Em vez disso, ela foi Os cientistas sociais que estudam que se manifestaram foram eleitas pela
difamada pelo Comitê Judiciário do movimentos falam, frequentemente, revista Time como as personalidades
Senado como uma mulher desprezível, sobre os três elementos da revolução. do ano de 2017.
“um pouco louca e um pouco sórdida”, Primeiro vêm as pré-condições estrutu- Estamos em novo momento. Para
como disse o agora arrependido David rais — mudanças institucionais de longo muitos, particularmente os homens,
Brock em seu artigo vilipendioso. Essa prazo que, lentamente, aumentam a ele é assustador e desconfortável.

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 39 


FOCO COMO GERIR O #METOO

Os homens estão se sentindo vulneráveis e Alguns homens, no entanto, podem não trabalham; a presunção de que as mulheres
com medo de acusações falsas (ou talvez perceber que massagear ocasionalmente um não vão denunciá-los ou começar uma briga;
verdadeiras). Temem que comportamentos ombro de mulher, chamá-la de “querida” ou e o apoio presumido ou tácito — quando
antigos sejam reavaliados sob novas regras. “meu anjo”, ou fazer comentários sugestivos é ninguém censura o mau comportamento
Eles me dizem que estão pisando em ovos. também errado. Homens mais velhos tendem — de outros homens.
Por causa disso, em vez de participarem da a se enquadrar nessa categoria. É surpreen- Recentemente, esse segundo motivo
conversa, muitos estão quietos. E, no dente lembrar que há apenas duas gerações foi eliminado. Houve uma onda de resistên-
entanto, a inação não é necessariamente a os escritórios pareciam muito com o mundo cia das mulheres. Elas estão falando alto e
melhor abordagem — há coisas importantes de Don Draper em Mad men. As salas com sem parar.
que os homens podem fazer e dizer para janelas e portas eram ocupadas por homens,
apoiar as mulheres. e as mulheres ficavam reunidas na área das
Minha experiência de estudar a masculini- secretárias, no centro do escritório, uma
QUE PODEMOS FAZER?
Agora é a hora de eliminar o terceiro fator.
dade e trabalhar com empresas na questão espécie de curral grosseiro. O acesso sexual
Quando os homens permanecem em
do assédio sexual levou-me a focar a forma a elas era considerado um privilégio.
silêncio, isso pode ser visto como um sinal
como os homens podem agir para resolver Talvez seja por isso que os homens na casa
de que concordamos com o assediador, de
esse problema no local de trabalho. Para dos 60 que são acusados de se comportar
que achamos que o comportamento é
fazermos isso efetivamente, devemos mal 30 anos atrás às vezes parecem
aceitável e de que não vamos interferir.
responder a quatro perguntas: Por que os desnorteados. Eles podem achar que estão
Homens são cúmplices de uma cultura que
homens assediam as mulheres? Eles não sendo julgados segundo padrões contempo-
permite o assédio sexual, por isso cabe a nós
sabem que isso é errado? Como eles râneos por coisas que fizeram quando, na
falar, de forma ativa e espontânea, e fazer
escapam? E, finalmente, que podemos sua percepção, as regras eram diferentes.
com que os perpetradores saibam que não
fazer a respeito? Os dados refletem isso: de acordo com uma
concordamos com o que eles fazem.
análise recente de The Economist, “os
Vou dizer algo que se apoia em minha
entrevistados mais jovens eram mais
POR QUE OS HOMENS ASSEDIAM propensos a pensar que um determinado
experiência de várias décadas promovendo
a igualdade de gênero nas empresas: os
AS MULHERES? comportamento havia passado dos limites
homens, na esmagadora maioria, não
Esta é fácil de responder. Os homens fazem do que seus pares mais velhos”.
querem ser vistos como babacas. Não
isso porque acham que podem. Não é Isso não absolve os mais jovens de seu mau
queremos deixar as mulheres descon-
verdade que sejam dominados pela luxúria comportamento, nem é motivo para perdoar
fortáveis e nem dizer coisas ofensivas.
a tal ponto que não conseguem se conter, os homens mais velhos que são acusados.
Isso fornece uma visão um pouco mais
como algumas pessoas já disseram. Ainda assim, é importante falar mais sobre
positiva da ansiedade masculina atual, que,
Geralmente, a pessoa se sente no direito esses problemas geracionais, por exemplo,
para a maioria das pessoas, está relacionada
de ter acesso às mulheres porque ocupa como eles influenciam nosso modo de refletir
com o medo de ser denunciado por assédio.
posição de poder. Esses assediadores do sobre a maneira como tratamos as mulheres.
Mas ela também pode estar relacionada com
sexo masculino são encorajados a agir pelo
o desejo de não ser inconveniente e com as
seu privilégio e autoridade e pelo fato de
que seus alvos estão em posição mais fraca
COMO ELES ESCAPAM ILESOS? dúvidas sobre a forma correta de agir.
Assentimento de cumplicidade. Pense Mas podemos agir de maneira positiva. Este
e vulnerável.
novamente sobre o vídeo Access Hollywood. é um cenário que, suspeito, é muito comum:
O que teria acontecido se Billy Bush, o Adeline está sentada em uma reunião. Ela é
ELES NÃO SABEM QUE É ERRADO? apresentador do programa na época, a única mulher na sala. Rob também está na
Todos sabem que apalpar nádegas ou órgãos respondesse a Donald isso é repugnante reunião e faz um comentário machista. A sala
genitais femininos, fazer comentários — para não dizer ilegal! Ou se os outros fica em silêncio. A atenção de todos foca em
obscenos ou forçar mulheres a se envolver homens no ônibus tivessem dito isso é Adeline: ela vai fazer alguma coisa, dizer
em atividade sexual é errado. Não se trata nojento. E se o irmão de Harvey Weinstein, alguma coisa? Oh, Deus, lá vai ela, muitos
de um limite dúbio e negociável. Nós Bob, tivesse segurado os ombros dele e dos homens dizem para si mesmos. Os olhos
sabemos. “Elas deixam que você faça isso” gritado Harvey, pare com isso! Vou expul- ficam arregalados. Ela vai chamar sua
é a citação mais reveladora do vídeo Access sá-lo da empresa se você não parar! atenção e fazer todo mundo se sentir mal. E
Hollywood. Trump está dizendo, na verdade, O assédio sexual persiste por três motivos: Adeline precisa decidir se ela vai dizer alguma
você vê que grande celebridade eu sou? o senso de direito que alguns homens coisa e causar insatisfação geral, ou se é ela
Veja o que eu posso fazer. sentem em relação às mulheres com quem que vai engolir o sapo e ficar insatisfeita.

40 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


Após a reunião, Fabrice, um dos colegas de Uma empresa global de seguros para a
Adeline, chama-a de lado e pede desculpas qual prestei consultoria desenvolveu um
por Rob. “Sinto muito pelo que ele disse”, treinamento informal para “aliados mascu-
diz Fabrice. “Não gostei nada disso.” linos”, no qual ensinava homens a desen-
Fabrice acha que está oferecendo apoio, volver estratégias de apoio mútuo. Não
mas, na verdade, está introduzindo outro se esperava que eles “resgatassem” as
dilema para Adeline. Ela acena educada- mulheres, mas que desafiassem outros
mente e agradece, ou diz “onde você homens. Os homens desenvolveram diversas
estava quando precisei de você?”. abordagens, como apoiar-se mutuamente
Homens, que podemos fazer de diferente? quando um filho adoecia ou quando sur-
A resposta óbvia é que podemos nos gia um problema de família. Logo, os
manifestar em reuniões e dizer que não funcionários do sexo masculino começa-
nos sentimos confortáveis com esse tipo ram a conversar mais abertamente sobre
de declaração. Mas normalmente não sua experiência, família e esforços que
fazemos isso. Por que não? envidaram para equilibrar sua vida. Um
Temos medo de que, se o fizermos, ano depois, relataram níveis mais altos de
seremos marginalizados, expulsos do satisfação no trabalho. Embora ainda não
“Clube do Bolinha”. Os homens sabem que se saiba como essas mudanças afetarão
fazer a coisa certa pode ter seu preço, e a a questão do assédio sexual no mundo
maioria de nós não quer colocar em risco o corporativo, o fato de os homens desen-
que temos. Por isso, traímos as mulheres na volverem linguagem e normas comparti-
sala, abandonamos a ética e nos esquivamos lhadas os ajudará a enfrentar uns aos
desconfortavelmente. outros e apoiar os que se manifestam.
Mas pense naquele momento em que Então, qual é o rumo a ser tomado agora?
Rob fez seu comentário. Certamente, havia Após décadas aceitando o assédio sexual
pessoas na reunião que estavam olhando como o statu quo, precisamos tirar um
para os lados, rindo de nervoso, ou mexendo pouco do peso dos ombros das mulheres.
nos objetos sobre a mesa. Eles também não Não é responsabilidade apenas delas
gostaram, mas tinham muito medo de agir. protestar e impor a igualdade no local de
Homens, esta é sua chance. Após a trabalho. Devemos chamar a atenção de
reunião, não peça desculpas a Adeline. outros homens por comportamentos
Fale com um dos outros caras que pareciam machistas porque isso é errado e porque
desconfortáveis: mina a confiança e a eficiência das mulheres
“Sabe, Mateo, eu detesto quando Rob no local de trabalho.
diz essas coisas”. Isso sim é ser um aliado, homens: tomar
“Eu também”, diz Mateo. partido e fazer a coisa certa. Sabemos como
Essa é a sua oportunidade: “A próxima fazê-lo e, na maior parte do tempo, sabemos
vez que ele fizer isso, vou dizer alguma fazer isso bem. Companheirismo, trabalho
coisa. Mas, logo que eu terminar, diga em equipe e camaradagem são essenciais
você também que não gostou. Posso na fraternidade, na trincheira ou na equipe
contar com você?”. esportiva. Agora, precisamos aprender a
Sabemos que pode ser assustador para o nos unir no trabalho — e no que é certo.
indivíduo se arriscar a ser marginalizado por
HBR Reprint R1806A–P Para pedidos, página 10
se manifestar, mesmo que fique envergonha-
do depois por não fazer a coisa certa. Mas,
Sobre o autor: Michael Kimmel é professor
quando dois homens chamam a atenção para emérito da cátedra Suny Distinguished Professor
o machismo, isso abre espaço para mais de sociologia e estudos de gênero da Stony Brook
homens entrarem em cena. E o comporta- University, onde fundou o Center for the Study of
mento que faz as mulheres se sentirem des- Men and Masculinities. É autor de Angry white
confortáveis e sozinhas provavelmente cessa. men (Nation Books, 2013).

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 41 


FOCO COMO GERIR O #METOO

COMPORTAMENTO
QUEM É ASSEDIADO E COMO?
Pesquisas longitudinais expõem a prevalência e
os motivos do assédio. Heather McLaughlin

A
qui estão cem mulheres
jovens. Quantas você
acha que serão assedia-
das sexualmente até os
31 anos de idade? Não
pense apenas nos casos de que você
ouviu falar no noticiário. Sim, as
alegações sobre Harvey Weinstein,
Roger Ailes, Charlie Rose, Matt Lauer
e muitos outros homens famosos e
poderosos são perturbadoras, mas
a onda de revelações que se seguiu é
igualmente importante. Milhares de
outras mulheres quebraram o silêncio
e compartilharam publicamente suas
histórias no #MeToo. Agora está claro
que o assédio sexual atinge policiais,
trabalhadoras da construção civil,
contadoras, professoras do jardim
de infância e trabalhadoras de todas é ainda mais alto, devido à natureza médio até o fim da casa dos 30 anos.
as ocupações e setores do mundo. da coleta de dados e ao fato de que As perguntas sobre assédio sexual
Então, mais uma vez, quantas dessas o assédio é altamente subnotificado, foram incluídas nas pesquisas feitas
cem mulheres serão assediadas como veremos abaixo. Mas os dados com participantes em três ocasiões:
sexualmente até 31 anos? Pelo menos sobre ele existem sim. E os dados quando eles tinham entre 25 e 26 anos,
46%. Isso é surpreendente? É mais que temos indicam 46%. 29 e 30 e 30 e 31 anos. A iniciativa
do que você imaginava? Menos? Um O número e as estatísticas nas foi a investigação mais abrangente
dos aspectos perniciosos do assédio tabelas a seguir vêm do Youth sobre o assédio sexual no local de
é a dificuldade de saber exatamente Development Study, que entrevistou trabalho já feita em um estudo
o que e em que proporção está mais de mil pessoas — homens e longitudinal, apesar de sua limitação
ocorrendo e quem o pratica. Eu mulheres — de St. Paul, Minnesota, geográfica. Aqui estão algumas de
suspeito que o número, na verdade, desde o primeiro ano do ensino suas descobertas:

PREVALÊNCIA DE ASSÉDIO PORCENTAGEM DE


Aos 25 anos de idade, uma em cada MULHERES QUE SOFREM
ASSÉDIO SEXUAL
três mulheres havia sido assediada
sexualmente e, à medida que Em três idades diferentes
cresciam, esse número aumentava
progressivamente, para quase uma
em duas. As duas últimas pesquisas 50% 46%
perguntaram se as mulheres sofreram 43%
assédio sexual no ano passado. 34%
Pode-se projetar com segurança
que se os dados abrangessem todos
os anos até o fim da casa dos 20
ou de toda a sua vida, o índice
seria ainda maior.
25–26 29–30 30–31
NOTA ESTIMATIVA INCLUI APENAS AS MULHERES QUE
RESPONDERAM A TODAS AS TRÊS ETAPAS DA COLETA DE DADOS. © HBR.ORG

42 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


TIPOS DE ASSÉDIO PORCENTAGEM DE MULHERES QUE SOFREM UM OU
Entrevistadas de 30 a 31 anos de idade MAIS TIPOS DE ASSÉDIO EM UM ÚNICO ANO
foram questionadas se haviam
passado por uma ou mais situações de
assédio no último ano. Mais de um
terço respondeu sim. Geralmente,
quanto mais severo era o
comportamento, menor era sua
frequência. Por exemplo, olhar
malicioso era mais comum do
que o toque indesejado. Mas os PORCENTAGEM DE MULHERES QUE SOFREM DIFERENTES TIPOS DE ASSÉDIO
números em todos os tipos de assédio
foram incrivelmente altos para o A Olhar fixa ou B Fazer comentários C Tentar falar D Mostrar
período de um ano. maliciosamente sugestivos sobre sexo imagem ofensiva

21% 20% 19% 8%

E Convidar para sair F Tentar iniciar uma G Tocar sem


repetidamente relação sexual consentimento

6% 5% 5%

DINÂMICA DE PODER RELAÇÃO DO ASSEDIDOR COM O ALVO


O cenário típico de assédio que Em um estudo, dos quase
vemos nos noticiários envolve uma 400 assediadores denunciados Supervisor
clara dinâmica de poder por mulheres, os colegas foram
organizacional: chefe e subordinado. responsáveis por três vezes
Por isso, pode surpreender que mais incidentes relatados
a maioria dos casos de assédio do que os supervisores.
envolva uma relação lateral: Colega Cliente

Alvo
© HBR.ORG

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 43


FOCO COMO GERIR O #METOO

um colega de trabalho que não detém FREQUÊNCIA DOS TIPOS DE ASSÉDIO Supervisor
poder oficial sobre o alvo. O assédio Colega
ainda é um crime com raízes no poder, B
A Olhar fixa ou maliciosamente
mas é importante analisar as dinâmicas B Fazer comentários sugestivos B A
laterais para entender quem está C
C Tentar falar sobre sexo Cliente
assediando as mulheres e como. G
D Mostrar imagem ofensiva A F D
E B
E Convidar para sair repetidamente
C
F Tentar iniciar uma relação sexual A C
F
G
G Tocar sem consentimento
G D
E D
NOTA AS RESPONDENTES RELATARAM Alvo F
E
MAIS DE UM ASSEDIADOR. HBR.ORG

FREQUÊNCIA A MAIORIA DOS TIPOS DE ASSÉDIO OCORRE VÁRIAS VEZES POR ANO
O assédio sexual no trabalho está longe Porcentagem de mulheres assediadas que disseram ter sofrido assédio:
de ser uma experiência isolada. Dada a
regularidade desses episódios, torna-se Uma vez
evidente que existe uma cultura maior
de assédio. Não são apenas algumas Duas ou três vezes
maçãs podres que abusam do poder. Quatro vezes ou mais
Os dados das entrevistadas de 30 a 31 0 25 50 75 100
anos mostram que a maioria dos alvos
© HBR.ORG
sofreu vários incidentes de assédio,
enquanto a minoria sofreu apenas um.
Isso era verdade para todos os tipos PORCENTAGEM DE MULHERES ASSEDIADAS QUE SOFRERAM ASSÉDIO
de assédio.

Quatro vezes ou mais

Duas ou três vezes

Uma vez 10 48 42 12 36 52 5 28 68
A Olhar fixa ou B Fazer comentários C Tentar falar
maliciosamente sugestivos sobre sexo

34 28 38 11 47 42 31 19 50 25 40 35
D Mostrar imagem E Convidar para sair F Tentar iniciar uma G Tocar sem
ofensiva repetidamente relação sexual consentimento

NOTA DEVIDO AO ARREDONDAMENTO, O SOMATÓRIO PODE NÃO SER DE 100%

44 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


SUBNOTIFICAÇÃO QUEM É NOTIFICADO DE ASSÉDIO

Algumas pessoas expressaram Porcentagem Um colega


ceticismo sobre a recente onda de de trabalho
de mulheres
assédio: por que as mulheres não se assediadas que Um supervisor
manifestaram antes? Os dados — neste apontaram: Uma agência
governamental
caso, da pesquisa realizada quando as
entrevistadas tinham 29 a 30 anos — Outros
apoiam a afirmação de que muitas são Ninguém
assediadas, mas poucas prestam queixa. 0 25 50 75 100
Quando os alvos contavam a alguém,
a tendência era relatar em segredo a
um colega ou amigo, em vez de alguém
em posição de resolver o problema.
(Note-se que a lista de tipos de QUEM É NOTIFICADO DE ASSÉDIO
assédio varia um pouco aqui por causa Porcentagem de mulheres assediadas que apontaram:
das mudanças no design da pesquisa Um colega Um supervisor Uma agência Outro Ninguém
no ano em que isso foi perguntado.) de trabalho governamental
As muitas razões pelas quais o assédio Fazer comentário ofensivo
não é denunciado foram exploradas sobre outras pessoas
Fazer comentário ofensivo
em profundidade. Uma delas é que sobre você
nem sempre os alvos admitem ou Fazer perguntas pessoais
reconhecem certas situações como
Olhar fixa ou maliciosamente
assédio, apesar de se sentirem
constrangidos. Só uma porcentagem Mostrar imagem ofensiva
surpreendentemente baixa de pessoas
Tocar sem consentimento
de 30 a 31 anos que disseram ter sofrido 0 25 50 75 100
assédio acreditava que as situações
eram realmente de assédio. NOTA RESPONDENTES DENUNCIARAM O ASSÉDIO PARA MAIS DE UMA PESSOA/AGÊNCIA. © HBR.ORG

Mesmo aquelas que sofreram


assédio diversas vezes minimizaram a
seriedade ou a inadequação de algumas
interações. Os números indicam que
isso pode ser especialmente verdadeiro DIFERENÇAS DE GÊNERO EM SITUAÇÕES DE ASSÉDIO SEXUAL
para os homens. Ao mesmo tempo, Porcentagem de pessoas que sofreram uma ou mais situações de assédio: 36%
as mulheres amiúde enfrentam
comportamentos como assobio ou 25 50 75 100
comentários e gestos inadequados em
locais fora do trabalho, o que talvez Homens Mulheres
explique por que muitas não os rotulam 2% 11%
como uma forma ilegal de discriminação
quando ocorrem no trabalho. Talvez Consideraram que a situação era de assédio sexual.
mais delas o façam agora, neste
momento cultural particular, mas eis
um caso que os pesquisadores ainda
precisam explicar. Embora pareça que dinâmica muda. Se esse momento do assédio sexual são altos para alvos e
as atitudes sobre o que constitui assédio extraordinário realmente inaugura uma empregadores. A revista Time elegeu as
e a aceitação cultural de falar sobre nova norma cultural e mudanças mulheres que quebraram o silêncio como
isso estejam mudando, não sabemos ao sistêmicas, deve haver uma queda as personalidades do ano de 2017. Talvez
certo se tal mudança é permanente, ou dramática no número de casos que não 2018 seja o ano das transformações.
se ainda faltam dados a coletar, o que são relatados e um aumento significativo
HBR Reprint R1806A–P Para pedidos, página 10
vai levar mais alguns anos. na porcentagem de pessoas que
Será crucial aproveitar esses dados caracterizam determinados Sobre a autora: Heather McLaughlin é
para fazer perguntas adicionais em comportamentos como assédio. As professora assistente na Oklahoma State
pesquisas futuras para verificar se a empresas devem mudar, pois os custos University.

CONTINUA NA PÁGINA 48

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 45 


Navegando
num mundo
fragmentado
Ecoando um dos temas discutidos no Fórum Econômico A maioria deles, no entanto, vê o mundo se movendo em
Mundial deste ano, a 21ª pesquisa com o CEO da PwC fala direção oposta, rumo a um sistema de múltiplas crenças,
sobre como as empresas estão navegando em um mundo regras e leis, blocos de comércio regionais e aumento da
cada vez mais fragmentado. Questionados sobre uma série guerra fiscal, além de crescente nacionalismo e adoção de
de tendências nas esferas política, econômica e comercial, os modelos econômicos distintos. Na esteira de movimentos
CEOs revelaram posições dissonantes, evidenciando que nos recentes como o Brexit, a saída do governo americano das
afastamos cada vez mais de pontos de vista unânimes. negociações de acordos comerciais e do acordo climático
de Paris, e os riscos para a manutenção do Conselho de
Analisando as opiniões em cada região, percebe-se que o
Cooperação do Golfo, essa percepção chama a atenção, mas
mundo está se afastando da ideia de um mercado global único
está longe de surpreender.
e integrado, pelo menos nas esferas física e geopolítica. Já no
que se refere ao ciberespaço e à integração corporativa, ainda
estamos caminhando para um modelo global. Em termos de
capitalização de mercado, muitas empresas, especialmente
de tecnologia, superam países inteiros e para os CEOs esta
tendência continuará.

O mundo pede novas leituras.


www.pwc.com.br/imperativos-negocios
Enquanto especialistas e formuladores de políticas das Isto é particularmente verdadeiro na América Latina,
principais potências econômicas do mundo continuam enquanto a América do Norte contraria o consenso global
analisando o contexto dentro de suas respectivas com quase 40% dos CEOs apoiando o uso de métricas
fronteiras, o modelo de inovação global adotado há algum financeiras tradicionais. Ainda assim, 57% deles concordam
tempo pelas grandes multinacionais - baseado no livre que o mundo está se movendo na direção de métricas
fluxo de informações, recursos e talentos para além das multifacetadas. Definir essas métricas e capturar os dados
fronteiras geográficas - está em risco. A maioria (52%) para medi-las com precisão será um item prioritário na
dos entrevistados na pesquisa Global Innovation 1000, da agenda nos próximos anos.
PwC, acredita que a tendência nacionalista na economia
Considerando a percepção dos líderes empresariais, é difícil
terá significativo impacto nas iniciativas de P&D de suas
concluir se caminhamos para o aumento ou redução da
empresas, fazendo com que o atual modelo interdependente
desigualdade. O resultado da pesquisa revela uma clara
e integrado dê lugar a polos isolados.
divisão, embora algumas regiões pendam para um dos lados.
Um aspecto no qual a fragmentação é bem-vinda, no Entre os CEOs da Europa, Oriente Médio e África predomina
entanto, é a forma como mensuramos a prosperidade. Os a opinião de que o crescimento econômico é cada vez mais
CEOs das diversas regiões e países reconhecem que o mundo concentrado, beneficiando poucos em detrimento de muitos.
está se afastando da medição baseada em indicadores Já os líderes do Pacífico asiático têm opinião contrária.
financeiros (como PIB, por exemplo) e adotando métricas
multifacetadas (como indicadores de qualidade de vida).

Igualdade ou desigualdade?
Crescimento concentrado beneficiando poucos Crescimento generalizado beneficiando muitos

46% Global 48%

62% Oriente Médio 31%

60% África 39%

58% CEE 37%

51% Oeste Europeu 45%

49% América do Norte 49%

47% América Latina 51%

35% Ásia-Pacífico 56%

Fonte: 21ª Pesquisa Anual Global de CEO da PwC

PwC Brasil @PwCBrasil @PwCBrasil PwC Brasil PwC Brasil


FOCO COMO GERIR O #METOO

GESTÃO DE RISCO Cada vez mais as queixas de assédio

ADAPTAÇÃO À NOVA PAISAGEM DE RISCO


terminam no tribunal da opinião
pública, que não tem regras de
No tribunal da opinião pública, as exigências legais não são tão procedimento ou estatuto de limita-
ções. Bastam alguns tweets negativos
importantes quanto a percepção de que os resultados foram justos. para a imagem da empresa sofrer danos
Elizabeth C. Tippett reais, tanto externos quanto internos.
Este momento parece repleto de
perigos — e, de certa forma, ele é.
Danos de reputação decorrentes de

P
or três décadas, os dores para reduzir o litígio e as um escândalo de assédio podem ser
empregadores tinham um expectativas dos funcionários catastróficos e difíceis de consertar.
manual claro para respon- sobre o que era justo e correto. Não fazer nada não é uma opção. Mesmo
der ao assédio no local de Quando os alvos relutavam em falar que sua empresa escape do escrutínio
trabalho: Investigue publicamente e os funcionários eram público, ainda há riscos e custos
prontamente. Responda sensatamente. disciplinados em segredo, a indignação internos com os quais se deve lidar.
Discipline reservadamente. Os riscos se restringia a fofocas e conversas Neste novo cenário, gerir implica
enfrentados pelas empresas em relação confidenciais. Isso deu aos empregado- reavaliar o modo como sua organização
ao assédio eram principalmente de res uma falsa sensação de segurança responde — não apenas ao assédio
ordem legal: situações problemáticas e permitiu que eles respondessem de sexual, mas também ao assédio com
podem terminar em ação judicial. Mas maneira privada e — com muita base em raça, religião ou nacionalidade
as ações judiciais, apesar de todas as frequência — mantivessem os assedia- — e examinar como você aborda
dores de cabeça envolvidas, podem ser dores na folha de pagamento. questões mais amplas de igualdade.
gerenciadas. Para surpresa de muitos empregado- Seus funcionários e clientes estão
Embora, aparentemente, o manual res, tudo isso foi revelado nos últimos prestando atenção na forma como
parecesse ser efetivo, ele não o era de meses. A mídia se tornou um enge- todos são tratados no local de trabalho,
fato. Com o tempo, surgiu um descom- nheiro de obra pronta, criticando as e este é o momento de você saber se
passo entre os esforços dos emprega- decisões passadas dos executivos. está adaptado à nova realidade.

48 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


inovar abordagem, e os programas antias- empregadores pode explicar por que, em
NOVAS EXPECTATIVAS DESAFIAM sédio tornaram-se mera formalidade para alguns escândalos públicos recentes, vários
ANTIGAS MEDIDAS proteção legal. funcionários relataram experiências de
De muitas maneiras, o guia para responder assédio ou agressão, enquanto as empresas
às queixas de assédio antecede as próprias insistiam que não recebiam nenhuma
queixas, de acordo com as pesquisas dos
COMO RESPONDER AOS queixa. Ao anunciar a demissão de Matt
sociólogos Lauren Edelman, Frank Dobbin e NOVOS RISCOS Lauer, por exemplo, a NBC declarou que não
Erin Kelly. Após a aprovação do Título VII do Processos de denúncia, treinamento havia recebido nenhuma denúncia formal até
Civil Rights Act (Lei dos Direitos Civis) de antiassédio, políticas escritas — todas essas aquela semana, ao mesmo tempo que alguns
1964, os empregadores do governo começa- coisas costumavam ser rotineiras, até funcionários relatavam à revista Variety a
ram a adotar políticas e procedimentos tediosas. Agora, de repente, uma estrela indiferença da empresa. Tanto as declara-
internos para prevenir a discriminação com corporativa com uma história de comporta- ções da rede de TV quanto as da revista
base em raça, sexo, nacionalidade e religião. mento duvidoso se torna uma bomba-relógio podem ser verdadeiras. Se os funcionários
Nos anos 1970, essas práticas começaram a para sua marca, e todos os aspectos dos não têm confiança em um sistema, eles
se espalhar pelo setor privado. processos de conformidade — desde não o usam.
Já em 1979, profissionais de RH incitaram contratação e treinamentos até práticas Quando as denúncias formais não são
as empresas a estimular a consciência sobre disciplinares — estão sendo submetidos levadas a sério ou os funcionários acham
o problema em toda a organização e a a novo escrutínio e olhar crítico. que fazê-las prejudicará suas perspectivas
desenvolver e divulgar internamente Este é um momento importante para rever de carreira, eles deixam de denunciar o
procedimentos para denúncias confiden- a forma como a sua empresa aborda o assédio. Mas é muito provável que, informal-
ciais, bem como a instituir treinamento assédio, para garantir que não seja mera mente, eles compartilhem suas preocupa-
antiassédio e resposta rápida às queixas, formalidade. Isso significa identificar e ções com amigos e colegas, e o mau
mesmo que uma sólida base legal para comunicar claramente a cultura, as normas comportamento se tornará um “segredo
esses procedimentos ainda não tivesse e os padrões de comportamento que você aberto” difícil de gerenciar. Ou um funcioná-
sido desenvolvida. gostaria de promover, e demonstrar que, rio assediado pode decidir levar sua história
A Suprema Corte dos EUA só reconheceu o se esses padrões forem violados, você para a mídia.
assédio como uma forma de discriminação estará preparado para agir com rigor. Oportunidade. Agora é um bom momento
em 1986, após o caso Meritor Savings Bank Essa abordagem não só inspira confiança para fazer uma pesquisa com os funcionários
vs. Vinson. Foi então que o guia de conformi- nos funcionários, como também pode sobre os processos internos da empresa,
dade — uma combinação de políticas, ajudar a empresa a responder rapidamente incluindo os relacionados à tomada de
procedimentos e treinamento — ganhou em caso de crise. decisões. Se as respostas revelarem uma
força, apesar de evidências limitadas de que, Em seguida, vamos analisar os riscos do insatisfação generalizada, vale a pena
nos tribunais, ele protegia os empregadores. antigo guia, bem como as oportunidades envolvê-los na criação de um sistema
Então, em 1998, Faragher v. Cidade de Boca proporcionadas pela abordagem voltada melhor.
Raton deu aos empregadores uma nova para os valores. Analise sua investigação e processos
maneira de reduzir o risco de denúncias Risco: seus funcionários não consideram disciplinares em relação aos de outras
dispendiosas, permitindo-lhes, em alguns justo o processo de denúncia. Processos empresas. Empresas de conformidade como
casos, evitar a responsabilidade se tivessem internos de denúncia não se limitam à a Convercent e a Navex Global possuem
tomado medidas razoáveis para prevenir investigação formal que o RH faz em ferramentas para que as empresas possam
ou lidar com o assédio. resposta a uma queixa de assédio. Eles fazer um benchmarking de seu índice de
Em teoria, a decisão sobre o caso de também incluem o processo de tomada denúncia, índice de comprovação e sanções
Faragher parecia encorajar práticas de de decisão associado a eles. Os funcioná- disciplinares em comparação com as médias
prevenção eficazes. Mas, na verdade, fez rios perceberão se, rotineiramente, as do setor. Embora as médias não identifiquem
o oposto. A pesquisa de Lauren Edelman recomendações do departamento de RH erros sistemáticos que todos cometem, o
descobriu que os tribunais tendem a dar e do departamento jurídico forem vetadas benchmarking ainda pode ajudá-lo a
crédito aos empregadores mesmo quando por gestores ou departamentos poderosos. identificar falhas em seus sistemas.
seu processo de investigação e suas medi- Os gestores de RH recuarão e reservarão Risco: As mulheres e outros grupos
das corretivas são questionáveis. Como sua influência para as batalhas que sub-representados não são contratados,
resultado, os empregadores tiveram pouco podem ganhar. promovidos e pagos em igualdade de
incentivo para avaliar seus programas ou A falta de confiança nos processos dos condições. O Título VII do Civil Rights Act

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 49 


FOCO COMO GERIR O #METOO

— lei federal que proíbe o assédio — protege regularmente ajuda a identificar eventuais gramas usados em contextos reais de
amplamente o direito dos funcionários à efeitos discriminatórios resultantes do receio emprego. Além disso, embora haja evidên-
igualdade de oportunidades. Ele abrange de denunciar o assédio. cias de que os programas de treinamento
oportunidades informais como tutoria, Risco: suas políticas de privacidade transmitem informações com êxito, há
networking e acesso a clientes. Em empre- não refletem a realidade atual. Quando os poucos indícios de sua capacidade de alterar
sas onde os degraus mais altos são ocupa- alvos de assédio se manifestam publicamen- atitudes ou comportamentos de forma
dos principalmente por homens brancos, a te, os empregadores geralmente ficam favorável. Quando, em 2016, a Equal
incapacidade de fornecer essas oportunida- calados. O medo de ações judiciais relacio- Employment Opportunity Commission
des informais para mulheres e outros grupos nadas à privacidade por parte do acusado revisou a literatura empírica sobre treina-
sub-representados fornece material para pode impedir que o empregador revele os mento contra assédio, ela se recusou a
processos de discriminação. resultados de alguma investigação em tomar uma posição sobre “se o treinamento
Em 2010, 5.600 mulheres representantes andamento e a resposta disciplinar da [...] é ou não uma ferramenta eficaz na
de vendas processaram a farmacêutica organização. Mas o silêncio público pode prevenção do assédio”.
Novartis. Alegaram que sua carreira estava ser interpretado como inação ou indiferen- Um problema é que o conteúdo dos
paralisada nos degraus inferiores da ça do empregador. programas pode ser datado. Recentemente,
hierarquia empresarial por causa de um Os direitos legais dos funcionários à concluí um projeto de pesquisa que envolveu
“clube de meninos [...] cujos funcionários do privacidade no local de trabalho não são a revisão do material de 74 desses programas.
sexo masculino cuidavam uns dos outros à fixos. Seu escopo depende, em grande parte, A maioria deles era recente, mas analisei
custa das mulheres”. Elas argumentaram que das expectativas deles, que são criadas também material das décadas de 1980 e
foram mais excluídas do que os homens de pelas promessas e comportamento do 1990 para ter uma linha de base histórica.
um importante programa de treinamento. empregador. Se você deixar os funcionários A experiência foi semelhante a observar
A Novartis fez um acordo de US$ 175 milhões usarem seu próprio cadeado nos armários uma série de atualizações de softwares
com as mulheres depois de perder um do escritório, eles terão maior probabilidade ruins, nos quais os desenvolvedores
processo no tribunal do juri. de ter seu direito à privacidade respeita- corrigem bugs aqui e ali sem nunca rever
Mas não é preciso fazer um “clube de do no que diz respeito a esses armários. a arquitetura subjacente. Até mesmo o
meninos” para criar um ambiente discrimi- Da mesma forma, se as práticas e polí- material atual se baseia fortemente em
natório. Nos dias de hoje os homens que ticas do empregador presumem que o conteúdo antigo e se adéqua a um gênero
evitam as mulheres para se proteger de RH nunca divulgará um caso de má con- estilizado que, aparentemente, remonta
alegações de assédio devem rever sua duta, o empregador fica mais vulnerável a meados da década de 1990.
conduta. Não oferecer oportunidades às a queixas relacionadas à privacidade por Oportunidade. Os empregadores devem
mulheres por medo de, inadvertidamente, parte dos infratores. atualizar o material de treinamento,
assediar uma colega de trabalho não Oportunidade. Assim como os emprega- desenvolver programas internos adaptados
constitui uma defesa legal. Pelo contrário, dores alertam rotineiramente que o e-mail à cultura e às necessidades do local de
isso pode ser considerado uma evidência de da empresa não é privado, eles devem trabalho e entregá-los aos líderes da
que a pessoa teve a intenção de discriminar. também avisar os funcionários de que eles empresa. E solicitar conteúdo mais inovador
Oportunidade. O assédio pode ser um sinal não têm direito à privacidade quando se e envolvente para treinadores externos.
de questões mais amplas, relativas a poder e trata de má conduta documentada ou das Se quiserem levar a sério os programas,
igualdade no local de trabalho, que sua ações disciplinares resultantes. Em última devem medir sua eficácia e depois com-
empresa deve abordar. Sua empresa contrata instância, essa postura sinaliza responsabili- partilhar as descobertas.
e promove funcionários e lhes paga igualmen- dade mútua: você fornecerá um processo Risco: Suas políticas de assédio forne-
te? Examine suas estatísticas internas de justo, mas os funcionários podem esperar cem pouca orientação significativa.
emprego para verificar se há disparidade de consequências reais por ações antiéticas. Quando, em 2003, a professora de direito
oportunidades. Segundo as pesquisas, a Risco: suas práticas de prevenção não Vicki Schultz analisou as políticas de assédio
maneira mais eficaz de identificar o problema funcionam. Surpreendentemente, há poucas dos empregadores, descobriu que eles
e mobilizar recursos para resolvê-lo, caso evidências de que os programas de treina- adotavam a abordagem “tudo e mais um
ele exista, são as forças-tarefas. Comprovou- mento contra assédio sejam eficazes. Como pouco”. Políticas padronizadas proibiam uma
se também que a contratação de funcionários a cientista social Vicki Magley observou, a ampla faixa de condutas sexuais com base
especificamente dedicados às iniciativas de maioria dos estudos de eficácia de treina- em regulamentações governamentais
diversidade reduz as disparidades ao longo do mento envolve apenas programas simulados emitidas em 1980 — seis anos antes de o
tempo, e revisar as estatísticas de diversidade criados por pesquisadores, em vez de pro- Supremo Tribunal definir o assédio como

50 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


uma forma de discriminação. Assim como
o conteúdo para treinamento contra as-
QUANDO AS OPORTUNIDADES
sédio, as políticas de assédio frequentemen- SUPERAM O RISCO
te acabam sendo o produto de novas cama- As políticas de assédio precisam mudar,
das empilhadas sobre material antigo e ul- sim, mas a recente enxurrada de revelações
trapassado. indica que nosso foco precisa ser mais
Pode parecer mais seguro proibir tudo, amplo. A oportunidade neste momento é
mas essas políticas draconianas têm custos de eliminar o mau comportamento comum
ocultos. Se a política inclui uma longa lista no local de trabalho e fornecer oportunida-
de condutas proibidas, mas a empresa não des reais e significativas para todos.
toma medidas contra as violações menores, Além do amplo benefício inerente a todo
isso se torna um problema. O funcionário local de trabalho em que todos possam
que presta queixa se sente traído, o funcio- prosperar, o compromisso duradouro com
nário infrator se sente encorajado, e nin- a igualdade pode ser benéfico em ocasiões
guém sabe quais são os reais limites da de crise. Em agosto passado, a Google
empresa. Com o tempo, a incerteza sobre (full disclosure — divulgação para fins de
as regras reais — não as escritas — enfra- transparência —, representei a Google
quece a política, o processo de denúncias quando trabalhei em um escritório de
e a cultura da empresa. advocacia há vários anos) se viu no meio de
As políticas também não influenciam o uma controvérsia pública envolvendo o
comportamento dos funcionários quando engenheiro James Damore, que fez circular
são apresentadas em juridiquês incompreen- um memorando no qual atribuía parcialmen-
sível. A boa política não apenas comunica, te a baixa representação de mulheres na
em linguagem clara, as expectativas sobre área de tecnologia a diferenças biológicas.
o comportamento, mas também explica A empresa demitiu Damore, e o CEO emitiu
por que ela é importante. uma declaração pública explicando por que
Oportunidade. A lei do assédio é na a posição do engenheiro era contrária aos
verdade bastante limitada — a conduta valores fundamentais da Google.
deve ser severa ou frequente para constituir Mas, ao contrário do escândalo de assédio
assédio, e deve ser baseada no sexo, da Uber ou dos escândalos mais recentes
nacionalidade ou outras características envolvendo Harvey Weinstein e outros, a
pessoais da vítima. Isso significa que as briga com Damore não provocou um colapso
empresas têm mais flexibilidade do que da imagem da empresa. Isso porque a
imaginam para criar uma política de assédio Google já vinha se dedicando a abordar
customizada às suas práticas, valores e questões de equidade e o fez de forma
cultura. Uma boa forma de começar é transparente, orientada por dados e em
revisar o histórico de assédio da empresa. conformidade com sua cultura. Na verdade,
Quando a ofensa justificava uma interven- a crise deu-lhe a oportunidade de contar
ção, como a empresa explicou ao funcioná- aos seus funcionários — e ao público — a
rio que o comportamento estava errado e história mais ampla sobre seus valores.
qual foi o efeito no local de trabalho? Que todos nós possamos ter a mesma
Assumindo que práticas passadas são falta de sorte.
consistentes com os valores e aspirações da
empresa — e atendem às definições legais HBR Reprint R1806A–P Para pedidos, página 10
mínimas —, os resultados da revisão podem
guiar a iniciativa para elaborar uma nova Sobre a autora: Elizabeth C. Tippett é professora
política mais customizada. As proibições de associada da University of Oregon School of Law.
condutas inaceitáveis devem ser feitas em Ela faz pesquisa sobre práticas de emprego, ética
oportunidades informais, junto com nos negócios e tomada de decisão.
lembretes sobre a importância da inclusão.
CONTINUA NA PÁGINA 54

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 51 


O MOMENTO É
DE EMPREENDER

Um dos mais destacados o empreendedorismo está se tornando uma saída


para o desemprego no brasil. o senhor enxerga a
empresários do País, Carlos Wizard possibilidade de isso virar um grande movimento nos
Martins fala ao UM BRASIL sobre as próximos anos?

perspectivas do empreendedorismo Felizmente, nós estamos conseguindo ver a luz no fim do


no atual momento de recuperação túnel. A economia brasileira é cíclica, nem sempre está no
topo, nem sempre fica no abismo. Em um período que varia
da economia brasileira. Ele de três a cinco anos, a economia faz sucesso, atrai investi-
aborda ainda a responsabilidade dores internacionais e, lamentavelmente, é seguido por um
social dos empresários e o período recessivo – como o que passamos hoje. O emprego
está retomando, a indústria começa a ter uma reação, as
seu projeto de criar uma nova
empresas preveem um cenário melhor, e tudo isso gera um
geração de empreendedores otimismo favorável ao ambiente econômico.

Entrevista Thais Herédia então este é o momento de empreender no brasil?


Independentemente do estilo do empreendedor [por opor-
tunidade ou necessidade], o momento é favorável ao em-
preendedorismo porque nós estamos justamente saindo
do fundo do poço, entrando em um cenário que aponta
para uma retomada, e tudo isso gera expectativa. Por isso, o que não pode faltar na visão de um empreendedor?
estou, ao lado da minha família, lançando o projeto Aloha, A empresa é o reflexo nítido da mente do seu gestor. Se a
que irá qualificar, treinar, orientar, motivar e premiar 10 pessoa vem da área tecnológica, ela vai criar o melhor sis-
mil novos empreendedores. Faremos isso por meio de um tema de controle, de relatórios. Se a pessoa veio da área de
modelo moderno de distribuição, que é o marketing do re- RH, ele vai criar um “convento de freiras”, onde todo mundo
lacionamento, e já temos hoje, em apenas quatro meses de trabalha em paz e harmonia. Se o indivíduo vem da área
operação, 5 mil empreendedores. de contabilidade, vai contabilizar cada entrada, cada saída,
não desperdiçará nem um centavo. Agora, um profissio-
recém-chegado, o aloha hoje funciona como um nal de vendas talvez não entenda nada de sistema, nada
termômetro. como tem sido a resposta do mercado? de RH e nada de contabilidade, mas a empresa dele vai
Sinceramente, penso que sucesso somente é sucesso quan- vender, e é justamente essa empresa que terá sucesso no
do compartilhado. Então, eu assumi como projeto pessoal mercado. Porque o que não pode faltar em uma empresa
formar uma nova geração de empreendedores no Brasil. são as vendas. Quem não tem essa habilidade natural vai
Quem não tem R$ 1 milhão, mas tem R$ 1 mil pode parti- focar naquilo que é a sua competência, mas tem que ter ao
cipar do projeto Aloha, que dá uma fonte de renda extra seu lado profissionais para assumir essa tarefa importante.
e pode se tornar um negócio muito lucrativo em médio e Ninguém jamais fez algo grandioso sozinho. Todos aqueles
longo prazos. Por isso que eu digo que é um projeto de qua- que venceram foram capazes de se cercar de profissionais
lificação, orientação, treinamento e, acima de tudo, forma- qualificados e íntegros.
ção de novos empreendedores.
o caminho da recuperação econômica passa pelo
empreendedorismo?
São dois países: o da pobreza, da desgraça, da carência, da
limitação; mas também o Brasil do desenvolvimento, da ri-
queza, que gera oportunidades. A prova maior disso é que
temos 30 novos milionários por dia no Brasil. Isso não está
acontecendo na Argentina, no Chile, no México, mas acon-
tece aqui. Então, a grande pergunta que deveríamos fazer
é: qual desses “brasis” eu vou viver?

SINCERAMENTE,
PENSO QUE SOBRE UM BRASIL
UM BRASIL é uma plataforma multimídia composta por

SUCESSO entrevistas, debates, documentários e publicações que


abordam soluções para os problemas do País em seus mais
diferentes aspectos, de forma plural e apartidária. Um ambiente
SOMENTE É de ideias feito por gente do mundo todo que pensa no Brasil.

SUCESSO QUANDO Acesse o aplicativo


WWW.UMBRASIL.COM
de QR Code pelo

COMPARTILHADO.
celular e assista
às entrevistas @CanalUMBRASIL
FOCO COMO GERIR O #METOO

GESTÃO DE PESSOAS pergunta: “Por que o assédio persiste e


ocorre em tantos locais de trabalho? E,

O MAU COMPORTAMENTO PODE SER EVITADO mais importante, o que pode ser feito
para evitá-lo? Depois de 30 anos, há
Gerencie funcionários de alto risco e elimine os problemas antes algo que não estamos percebendo?”.
que eles apareçam. James Campbell Quick e M. Ann McFadyen Não há solução fácil, mas as evidências
mostram que o assédio sexual pode ser
evitado. No entanto, as diretrizes de
treinamento recomendadas pela EEOC
precisam mudar. Novas e diferentes

O
recente tsunami de são relatados. Uma razão é que a abordagens devem ser exploradas. E é
histórias sobre assédio definição legal de assédio sexual exatamente nisso que temos trabalhado.
sexual na mídia sinaliza a raramente é compreendida. Para Em busca de insights, encontramos o
necessidade premente de complicar ainda mais a questão, modelo de vigilância de prevenção em
redefinição cultural no nenhum consenso foi formado em torno três estágios adotados há muito tempo
local de trabalho e de implementação, das definições leigas de assédio sexual, pelos funcionários públicos americanos
por parte das organizações, de novos que diferem da definição legal e para evitar epidemias. Acreditamos que
processos e novos treinamentos. mudaram ao longo dos anos. Até uma abordagem semelhante baseada
Líderes e gestores não podem arcar mesmo os homens e as mulheres em dados pode efetivamente impedir o
com os custos de manter o statu quo. diferem no entendimento da definição. assédio no local de trabalho. O novo
Mas, antes, eles precisam entender o Até a Comissão de Oportunidades modelo que desenvolvemos para ajudar
problema, e isso não é tão fácil quanto Iguais de Emprego está frustrada. A as empresas é baseado em grande
parece. O assédio sexual é uma forma EEOC reconheceu o assédio sexual como parte no modelo da saúde pública.
de comportamento disfuncional no uma forma de discriminação por mais de Uma chave do nosso modelo é o foco
ambiente de trabalho — e um fenômeno quatro décadas. Sete em dez empresas em funcionários de alto risco. A maioria
crônico com uma longa história. têm treinamento preventivo. No entanto, das organizações tem relativamente
Pesquisas indicam que mais de 70% em 2016, a EEOC concluiu que o assédio poucos deles. Com base no que vimos em
das mulheres passaram por isso no no local de trabalho permanecia sendo nosso trabalho, estimamos que 1% a 3%
trabalho, mas muitos incidentes não um problema contínuo e lançou a dos indivíduos dentro das organizações

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Muitas vezes, você consegue prever
O trajeto até a agressão sexual contém muitos sinais de alerta. Usando uma abordagem de três estágios baseada no modelo de
saúde pública para prevenção de epidemias, as empresas podem identificar possíveis problemas antes que eles descambem em
total violência.
DANO EMOCIONAL CAMINHO SEM VOLTA VIOLÊNCIA FÍSICA

1 DETECÇÃO DE RISCOS 2 IDENTIFICAÇÃO DE MÁ CONDUTA 3 LIDANDO COM


EMPREGADOS PERIGOSOS

INCIDENTES PRÉVIOS
NO HISTÓRICO DE TRABALHO
IMPRÓPRIO:
APELOS DO TIPO “TOMA LÁ DÁ CÁ”
VIOLAÇÕES DO • MÍDIA SOCIAL
CÓDIGO DE CONDUTA COMPORTAMENTO DE RETALIAÇÃO
• LINGUAGEM TOQUE
FREQUÊNCIA DO ESTUPRO
COMPORTAMENTO AVANÇOS CONSTANTES
• PIADAS ABUSO SEXUAL
ISOLAMENTO SOCIAL • COMENTÁRIOS COMPORTAMENTO ABUSIVO
NO TRABALHO OU MANIPULATIVO
• GESTOS

OLHAR MALICIOSO

TÁTICAS DE PREVENÇÃO
E VIGILÂNCIA

Estabelecer políticas empresariais claras Diagnóstico por um psicólogo Contenção do perpetrador


clínico organizacional
Levantamento de sinais de alerta Cuidado com as vítimas
antecipados por parte do RH Canais seguros para denúncia:
Perdão para os outros e
Observação por parte dos gestores RH, departamento jurídico
para o ego
das interações de seus funcionários Modificação do comportamento Resiliência e recuperação
por meio de orientação corretiva
Triagem para levar a pessoa em risco
aos especialistas certos
© HBR.ORG

têm o potencial de fugir das normas e se Aqui está o que acontece em cada um deles: de linguagem com conotação sexual.
tornar disfuncional ou perigoso. E embora seja Fase 1. Nesta fase, as empresas apresentam Geralmente, os diálogos não são sedutores
difícil monitorar os assediadores sexuais no fatores de risco ou condições favoráveis ao por natureza, mas, sob a superfície, são
processo de contratação, é possível identifi- assédio sexual, como ambiente de trabalho hostis, com o objetivo de humilhar e colocar
cá-los e lidar com eles dentro de determinada com alta proporção de homens ou no qual as as mulheres “em seu lugar”. Histórias ou as
população de trabalhadores antes que eles posições de poder e supervisão são predomi- chamadas piadas de mau gosto são também
representem uma ameaça para os demais. nantemente ocupadas por homens. Essas sinais de alerta para um ambiente de
Assim como nas epidemias, os piores casos condições não significam que o assédio sexual trabalho no qual o assédio sexual de maior
de assédio sexual raramente ocorrem de é inevitável, mas aumentam a probabilidade intensidade poderá ocorrer.
forma inesperada. Uma cadeia de aconteci- de surgirem problemas. Homens que agem Estágio 3. Esta é a fase do ataque sexual
mentos ou condições quase sempre os respeitosamente em ambientes com mais extremo, como o estupro. Os processos
precede. Compreendê-los é fundamental restrições culturais podem se desviar das relativos a esses casos podem chegar à
para cortar a má conduta pela raiz. normas quando seu poder e influência não esfera federal e drenar energia individual
Nosso modelo trata dos três estágios que são controlados ou monitorados. e organizacional, tempo e dinheiro. Eles
geralmente ocorrem quando empregados de Estágio 2. Aqui observamos o assédio não devem, em absoluto, ser ignorados
alto risco se tornam assediadores sexuais. sexual de baixa intensidade, como o uso ou colocados de lado.

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FOCO COMO GERIR O #METOO

Se o comportamento dos funcionários empresas para impedir o assédio sexual. comprovado por uma revisão da pesquisa
chegar a esse estágio, o custo será extrema- Por isso, elas devem ensiná-los a criar uma por nós realizada. O treinamento de
mente alto. As organizações dos EUA, cultura na qual todos os indivíduos são civilidade em toda a empresa também pode
particularmente, têm mais a perder do que tratados com respeito e o poder é usado com ser uma nova oportunidade para combater
suas congêneres em todo o mundo, porque moderação. E todos os gestores e superviso- o assédio sexual, de acordo com a EEOC.
podem ser responsabilizadas por denúncias res devem observar as interações dos seus A intercessão terciária é necessária
de assédio sexual no local de trabalho tanto subordinados com os colegas e identificar o quando falham a prevenção primária e a
quanto as pessoas envolvidas. Em todo caso, que possa exigir ação corretiva. secundária e ocorre um incidente de assédio
os custos diretos incluem rotatividade, A prevenção secundária tem como alvo sexual de alta intensidade. As empresas
absenteísmo, licença médica, baixo desempe- formas de assédio sexual de baixa intensidade, devem estar preparadas para o pior e agir
nho e litígio. Os custos indiretos incluem que devem ser reprimidas antes que qualquer imediatamente para minimizar qualquer
queda de motivação e moral e problemas de dano grave seja causado. A prevenção sofrimento ou dano incorrido, tratando a
insatisfação, além de fatores que comprome- secundária concentra-se em identificar e todos os envolvidos de forma justa. Recomen-
tem a qualidade das relações de trabalho, tais eliminar o desrespeito e o bullying. Esses damos uma abordagem em quatro etapas:
como desconfiança, desrespeito e animosida- comportamentos negativos muitas vezes
q Contenção. Contenha o indivíduo perigoso
de. Muitas pessoas pagam o preço. O assédio causam absenteísmo, atrasos, acidentes e
envolvido no comportamento de assédio.
sexual afeta negativamente não apenas o violações de segurança mais altas, por isso as
alvo, mas também o agressor, as testemu- empresas devem monitorar seus dados a esse q Cuidados. Forneça ajuda aos alvos do
nhas, os clientes, os fornecedores, os respeito, junto com os relatórios dos supervi- assédio e às pessoas que foram expostas
prestadores de serviço e outros stakeholders. sores sobre colegas e funcionários, em busca a ele, como testemunhas ou colegas
de sinais de que as pessoas não estão sendo próximos do alvo.
tratadas respeitosamente.
QUE FAZER PARA IMPEDIR O ASSÉDIO SEXUAL Em um mundo ideal, todas as pessoas
q Perdão. Isso não significa absolver o
Nosso modelo tem um conjunto de transgressor ou esquecer o ocorrido. A
associadas a uma empresa — funcionários,
intervenções para cada um dos três estágios. ideia é perdoar as pessoas por permitirem
supervisores, prestadores de serviços e até
Quando aplicadas sistematicamente, tais a ocorrência do assédio. Kim Cameron, da
mesmo clientes e testemunhas — ficariam à
medidas reduzem ou eliminam o assédio Michigan University, escreveu incisivamen-
vontade para relatar qualquer comporta-
sexual. O melhor momento para intervir é te sobre o motivo pelo qual o perdão é
mento inaceitável que observassem. A
sem dúvida a primeira etapa, em que a essencial para a recuperação após os
responsabilidade da empresa é fornecer um
iniciativa da empresa terá o impacto mais danos ou prejuízos no local de trabalho.
ambiente que as faça se sentir assim. Um
amplo e ajudará a erradicar as condições
passo importante é a criação de pelo menos q Resiliência. A organização deve se
que podem resultar em má conduta.
três canais seguros para denúncias de recuperar da tragédia do incidente.
A prevenção primária de assédio sexual
assédio: um na área de RH, um na área legal
pode ser pensada como a estrutura funda-
e um na área de bem-estar do empregado. O agressor sexual destrói vidas e deixa um
mental de sua política. É a base de todas as
Serão necessários profissionais treinados longo legado de sofrimento. E no local de
outras intervenções. Começa com uma
para ajudar a diagnosticar, avaliar e fazer trabalho o assédio sexual é um problema de
declaração clara proibindo todas as formas
a triagem de casos de assédio. Fornecer saúde ocupacional que não surge de forma
de assédio sexual e vinculando-as explicita-
feedback direto para os transgressores é isolada. Em geral resulta de eventos
mente a mecanismos de execução da
fundamental. Eles precisam ser repreendi- cumulativos e, portanto, é previsível e pode
conformidade. O departamento de RH deve
dos por se desviarem do código de conduta ser evitado. O assédio sexual no local de
rastrear sistematicamente a empresa em
da empresa, mas igualmente ter a oportuni- trabalho não é casual e, com mecanismos
busca de sinais de alerta, como violações de
dade de pedir desculpas por seu comporta- adequados de vigilância e prevenção, pode
código de conduta ou incidentes anteriores
mento e de se ajustar. O treinamento ser eliminado por completo.
nos históricos de trabalho individuais. A
individual em comunicação interpessoal,
prevenção primária inclui treinamento e
sobre como respeitar os outros e como Sobre os autores: James Campbell Quick é
educação abrangentes em todos os níveis da professor emérito da cátedra John e Judy Goolsby-
comunicar claramente os limites pessoais,
hierarquia, mas especialmente na primeira -Jacqualyn A. Fouse, University of Texas, Arlington, e
geralmente corrige casos de baixa intensida-
linha de supervisão. Como afirma a EEOC, professor da Alliance Manchester Business School,
de. A EEOC sugere também que o treinamen- Manchester University. M. Ann McFadyen é
gestores de nível médio e supervisores de
to de intervenção para testemunhas pode professora associada de gestão estratégica da
primeira linha, quando treinados corretamen-
ajudar a evitar o assédio sexual, o que foi University of Texas, na Arlington College of Business.
te, podem ser o recurso mais valioso das
HBR Reprint R1806A–P Para pedidos, página 10

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ENTREVISTA Quero ajudar a combater o abuso,
que sei que existe, mas não quero me
O TRABALHO APÓS #METOO: envolver em processos penosos ou
prejudicar minhas oportunidades
SUAS PERGUNTAS RESPONDIDAS de carreira. Que posso fazer?
Mary C. Gentile, Ph.D., é professora
Mesa-redonda de P&R com especialistas da HBR
da University of Virginia Darden School
Pela equipe da Harvard Business Review of Business, consultora sênior do Aspen
Institute Business & Society Program,

A
A recente prestação de perguntas de leitores sobre como e autora de Giving voice to values:
contas pública sobre o trabalhar — e gerenciar — nesse novo how to speak your mind when you
assédio sexual no local ambiente. Ouvimos pessoas que foram know what’s right.
de trabalho deixou muita testemunhas de assédio, que foram elas Antes de mais nada, é importante
gente abalada, e por um mesmas assediadas, que fizeram reafirmar a si mesma o seu desejo e
bom motivo. Afinal, como Joan Williams treinamento antiassédio, e algumas que compromisso de deter o abuso
e Suzanne Lebsock escrevem em nunca fizeram treinamento. Elas fizeram continuado. Identificar e valorizar seus
“E agora?”, o ambiente de trabalho perguntas sobre como deter o abuso, próprios valores é uma maneira de
de hoje mudou muito após as revela- como atenuar os danos à carreira, como fortalecer a sua determinação. Seus
ções do #MeToo. abordar o assédio em pequenas próximos passos dependem de qual é,
Quão diferente exatamente, é algo que empresas e como falar sobre assédio exatamente, a situação. Se você é o alvo
está resumido em sua poderosa sexual de forma mais aberta. do abuso, provavelmente tomaria
conclusão: trabalhadores que estão Para respondermos a essas perguntas, medidas diferentes do que se o abuso
sendo assediados sexualmente devem consultamos especialistas da HBR em fosse com outras pessoas e não está
denunciar o abuso. Ponto. “Talvez não negócios e governo, direito, gestão e claro quão grave ou generalizada é a
tivéssemos dado esse conselho de sociologia. O conselho deles é que, situação. Sua empresa provavelmente
maneira tão abrangente e direta um ano quando se trata de assédio, é importan- tem políticas e procedimentos em vigor
atrás”, escrevem Williams e Lebsock. te verificar as políticas da empresa, que você pode pesquisar, e advogados
Nas últimas semanas, a ProPublica e a criar aliados e redes de contato, e poderão fornecer as orientações legais.
Harvard Business Review coletaram defender a si próprio e uns aos outros. No entanto, deixe-me focar no que

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FOCO COMO GERIR O #METOO

pode não fazer parte das políticas organiza- apropriado é resposta rápida, proporcional Publicar denúncias online pode ter
cionais e dos procedimentos legais: ofereça e calculada para evitar danos futuros. No implicações legais e, certamente, suscita
apoio aos alvos do abuso. Diga-lhes que entanto, quando o empregador demite questões de privacidade dos alvos de abuso,
podem contar com você, que não estão alguém por conduta imprópria, isso não põe bem como questões de confiabilidade das
sozinhos. Ajude-os a acessar os recursos fim às obrigações desse empregador. Acima informações. Dito isso, há muitas maneiras
organizacionais e legais que existem, a de tudo, ele deve garantir que não haja de ajudar. Por exemplo, se você está
ensaiar respostas e comportamentos que nenhum tipo de retaliação de nenhuma das empregado na empresa em questão, em
possam usar para interromper interações partes envolvidas. Mesmo que haja uma vez de simplesmente afastar candidatos
abusivas no momento em que ocorrem. forte ação corretiva, mesmo que os em potencial, você pode tentar ser uma
Se o comportamento não está limitado a funcionários não se sintam seguros em força para uma mudança positiva.
um indivíduo específico, mas é um fenômeno relatar suas preocupações. Portanto, poupar Construir uma voz habilidosa e capacitada
aceito culturalmente, seja uma defensora de os que fizeram as denúncias ou participaram dos funcionários em torno dessa questão
relações de trabalho respeitosas e profissio- da investigação que resultou em demissão faz com que seja mais difícil manter esse
nais participando de grupos de funcionários protege não apenas a eles, mas também a comportamento nas sombras. Aqueles
ou criando um novo; chamando a atenção credibilidade do empregador e a viabilidade que abusam não poderão mais confiar
para bons comportamentos; ou defendendo cultural do procedimento de reclamação. na cumplicidade silenciosa.
treinamentos baseados em ações em que os No mínimo, o empregador deve: (1) Se você não está mais na empresa, ainda
funcionários não são simplesmente orienta- assegurar aos que fizeram denúncias ou existem maneiras de ser prestativo. Por
dos sobre políticas, mas têm a chance de participaram de investigações de que ele exemplo, você pode compartilhar perguntas
fazer um roteiro e ensaiar maneiras efetivas não vai tolerar retaliação de nenhum tipo, que podem ser feitas nas entrevistas. Eles
de expressar preocupações em face de de ninguém, nem se envolver em nenhuma, podem perguntar sobre o histórico de
comportamentos abusivos — sejam eles os e que qualquer preocupação sobre retalia- avanço da organização (especialmente em
alvos, seja outra pessoa. Desenvolver uma ção deve ser reportada imediatamente; e relação a mulheres, minorias, LGBTQ etc.);
voz capacitada e habilidosa para os (2) fazer verificações periódicas de possíveis sobre feedback de desempenho, tanto
funcionários em torno dessa questão torna alegações ou evidências de retaliação com formal quanto informal; sobre o compromis-
mais difícil que esse comportamento os funcionários que relataram preocupação so da empresa para com aprendizado
continue nas sombras. Quem abusa já não ou participaram de investigações. A contínuo e desenvolvimento de liderança;
poderá confiar na cumplicidade silenciosa. liderança deve ser lembrada do amplo e assim por diante. Os candidatos podem
Converse com colegas e gestores confiáveis escopo do que pode ser considerado solicitar aos entrevistadores um exemplo
da empresa sobre formas de reforçar retaliação ilegal. Retaliar não se limita a recente de um “erro” que levou a novos
comportamentos apropriados. Uma demitir o funcionário ou negar-lhe promoção aprendizados ou a melhores práticas.
abordagem eficaz é a iniciativa dos líderes por ter feito reclamação. Pode incluir E procure dentro da empresa pessoas
seniores de compartilhar suas “histórias alterações nos termos e condições de seu conhecidas por apoiar esse tipo de iniciativa:
de aprendizado”, em que eles descrevem cargo, como atribuir-lhe tarefas mais difíceis encoraje-as a se engajar em algumas das
como foram testados e responderam com ou menos gratificantes. Resumindo, os estratégias internas acima e ajude-as a
respostas positivas a condutas inadequadas líderes precisam saber que não devem interromper qualquer abuso em curso de
cujo alvo foram eles mesmos ou outras retaliar quem fez denúncia ou participou que possam estar cientes (ou de que são
pessoas. de investigação. alvos), seja por meios organizacionais, seja
por meios legais. Esta é mais uma maneira
Tive de demitir alguém por má conduta Que dívida tenho para com as mulheres significativa de agir de acordo com seus
sexual. Que mais devo fazer? que no futuro procurarem emprego nesta valores.
empresa? Devo postar denúncias online?
Jonathan A. Segal é sócio da Duane Morris
Como devo proteger minha carreira de
LLP no Grupo de Práticas de Emprego, Gentile: Enquadrar esta questão como
pessoas de cuja ajuda eu talvez precise
Trabalho, Benefícios e Imigração. Ele “dívida pessoal” posiciona suas escolhas
no futuro para conseguir recomendações
forneceu treinamento para juízes federais potenciais como um fardo, como algo
ou referências?
sobre assédio e outras formas de preconcei- imposto de fora e possivelmente uma fonte
to. Segal foi nomeado para a Select Task de culpa. Muitas vezes, é mais útil e mais Elizabeth C. Tippett é professora associada
Force da EEOC contra o Assédio: capacitador enquadrar a pergunta como da University of Oregon School of Law. Ela
Para começar, nem toda má conduta uma aspiração, ou seja, “Que quero fazer? pesquisa práticas de emprego, ética de
sexual deve resultar em demissão. O mais Como posso ser útil?”. negócios e tomada de decisão.

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É ilegal o empregador retaliar reclamações agência governamental apropriada ou até Athena: como e por que os homens devem
de assédio ou discriminação fornecendo uma mesmo entrar com uma ação judicial (na tutorear as mulheres):
referência negativa do funcionário a um qual a lei não exija que, primeiro, uma Primeiro, devemos nos perguntar se seu
potencial empregador futuro. queixa administrativa seja prestada na traje é um problema para ela ou para os
Dito isso, a melhor maneira de proteger agência governamental). Na questão de outros. Certamente, a maioria das empresas
sua carreira é cultivar uma ampla rede de assédio, a lei federal dos EUA exige que, em tem políticas e normas formais e/ou
pessoas dentro e fora da empresa que primeiro lugar, o funcionário preste queixa informais relacionadas ao traje de trabalho.
estejam familiarizadas com seu trabalho e administrativa. Mas algumas leis estaduais Se ela não está seguindo a política formal,
com o valor que você agrega: clientes, e municipais permitem que ele vá à então seria apropriado alguém conversar
mentores não oficiais, colegas de outras Justiça sem prestar queixa administrativa. sobre isso com ela. No entanto, em muitos
áreas, pessoas de setores sem fins lucrativos Embora existam numerosas opções, há casos, as mulheres são julgadas por um
com quem você trabalhou como voluntário e uma constante: o funcionário não deve padrão masculino que não tem nada a ver
líderes de outras divisões. Quanto mais forte sofrer retaliação de ninguém e de nenhuma com elas ou com o seu trabalho. Muito
for sua rede, menos vulnerável você ficará à forma porque, de boa-fé, manifestou provavelmente, a forma como se veste é algo
retaliação porque não precisará depender da preocupação em casos de discriminação ou que a faz se sentir profissional e competente
recomendação de alguém que quer cortar assédio. As proteções legais nestes casos no local de trabalho. Além disso, frequente-
sua cabeça. não são tão claras, mas em seus códigos de mente as mulheres são sujeitas à percepção
conduta ou em suas políticas ou procedi- de que, se elas se comportarem (e se
Tenho conhecimento de assédio e de mentos muitos empregadores fornecem vestirem) de uma forma que realce sua
atividade antiética e ilegal de contratação proteção contra retaliação. Essa proteção feminilidade, então elas não são competen-
em determinada empresa. Seus especia- é do interesse deles, mesmo que não haja tes e recebem feedback negativo. No
listas têm algum conselho a me oferecer obrigação legal. Embora nem todas as entanto, se elas se vestem de modo mais
sobre como devo conciliar meus direitos e preocupações éticas tenham mérito, os masculino, recebem feedback negativo
minhas obrigações? empregadores querem promover uma por não ser femininas — uma contradição
cultura em que os funcionários se sintam sem escapatória. Se o traje dela não viola
Segal: Como advogado, levo as regras éticas
à vontade para manifestar preocupações a política, talvez você precise parar e refle-
muito a sério, então preciso deixar claro que
éticas sem medo de retaliação. Afinal, tir sobre seu desconforto e não responsabili-
a minha resposta não deve ser interpretada
algumas preocupações têm mérito, e a zá-la por isso.
como um conselho legal. Isso posto, posso
queixa ajuda o empregador a corrigir o
sugerir três opções. Primeiro, embora o
erro ético. Meu colega foi demitido depois de uma
funcionário não tenha obrigação de fazê-lo,
investigação de assédio sexual, mas
se o caso envolve conduta de assédio, ele
Recentemente, um colega de trabalho minha experiência profissional com ele
pode informar a pessoa que o deixa
foi demitido depois de ser acusado de sempre foi muito boa, e acho que ele é
desconfortável sobre seu desconforto.
assédio sexual. Nosso RH mantém essas inteligente. Posso ser uma referência
Considere dizer: “Quando você faz X, isso
coisas em segredo (não divulga quem, o para ele?
me deixa desconfortável. Por favor, pare”.
que, onde etc.), então ninguém conhece
Geralmente, recomenda-se que a outra Segal: Inicialmente, os funcionários devem
os detalhes. Mas esse colega comentou
pessoa responda: “Obrigado por me avisar. verificar a política de referência do emprega-
comigo o incidente numa ocasião em que
Não vou fazer isso de novo”. A segunda dor antes de fornecer qualquer referência.
nos vimos ocasionalmente. Hoje percebi
opção, disponível em todos os casos, é fazer Alguns funcionários tentam evitar restrições
que a acusadora volta e meia usava
uma reclamação interna. O funcionário deve nessa área dizendo que é uma referência
perfume, maquiagem e roupa inadequada
selecionar a pessoa de contato identificada “pessoal”. Isso pode levar à responsabilida-
à sua função e local de trabalho. Minha
no procedimento de denúncia com quem ele de “pessoal”, como demonstra a resposta a
pergunta: até que ponto um colega,
se sente mais à vontade. A maioria dos esta pergunta.
subordinado etc. deve ser confrontado
procedimentos de denúncia fornece, ou pelo De modo geral, nem os empregadores nem
por essa falta de adequação?
menos deveria fornecer, múltiplas opções os empregados têm o dever de fornecer
aos funcionários para relatar suas preocu- David G. Smith, Ph.D., é professor de referência substantiva. No entanto, se uma
pações. A terceira opção é apelar para sociologia do Departamento de Segurança referência substantiva inclui uma declaração
recursos internos. Isso pode incluir contratar Nacional da Naval War College, nos EUA. falsa, então o empregador e/ou empregado
um advogado para escrever uma carta em Ele é coautor de Athena rising: how and why pode ser responsabilizado pela referência.
nome do funcionário, prestar queixa na men should mentor women (Insurreição de Neste caso, o argumento seria que, ao não

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FOCO COMO GERIR O #METOO

abordar a má conduta, o fornecedor da federal de discriminação sexual, e o cultura em que as pessoas sintam que são
referência omitiu um fato relevante que o empregador pode ser processado por isso. tratadas com justiça e igualdade. Assédio
potencial empregador gostaria de saber e, A não assinatura dos EUA desse amplo sexual é contra a lei. Há um motivo para
dessa forma, a omissão foi uma deturpação. acordo internacional que contempla os essa lei. E, assim, qualquer pessoa que
Se o funcionário para quem a referência foi direitos dos trabalhadores não tem impacto gerencia outras pessoas é responsável por
dada se envolve em conduta de assédio em sobre os direitos assegurados ao funcionário defender essa lei. Na verdade, esqueça a
seu novo emprego, o novo empregador pode pela lei federal. gestão, somos responsáveis uns pelos
alegar danos decorrentes do assédio, outros. O RH é legalmente responsável pelo
acusando o empregador anterior e/ou Se você já foi alvo ou testemunha de acompanhamento, isso é verdade. Mas isso
funcionário que forneceu a referência assédio, deve procurar primeiro o RH? não cabe apenas ao RH. Todos devem ser
brilhante sem revelar o problema envolvido. Por que ou por que não? responsáveis por isso. Todo mundo.
Patty McCord é fundadora da Patty McCord
Estou ciente de uma carta internacional Trabalho para um pequeno negócio.
Consulting e ex-diretora de talentos da
de direitos dos trabalhadores (ou algo Não há RH. Que devo fazer?
Netflix.
parecido) assinada por 60 países que
A abordagem mais eficaz contra o assédio Karen Firestone é presidente e CEO da
estipula que nenhum trabalhador pode
sexual é confrontá-lo na hora. Se você Aureus Asset Management, empresa que
ser demitido sem justa causa. Os EUA
observar alguém que se comporta de atua como consultora financeira para
não assinaram o acordo. Assim, os
maneira inadequada — por exemplo, olha famílias, indivíduos e instituições sem fins
trabalhadores do país podem ser demi-
para o seu corpo e não para os seus olhos —, lucrativos. Ela é autora de Even the odds:
tidos por razões nefastas, como não
uma resposta apropriada seria: “Ei, você sensible risk taking in business, investing,
prestar serviços sexuais aos superiores.
poderia me olhar no olho quando conversa- and life (Bibliomotion, abril de 2016).
Por que não se fala em mudar isso?
mos? Isso está me deixando desconfortável”. Se ninguém na sua empresa discutiu
Chai R. Feldblum é comissário da U.S. A outra pessoa talvez diga: “Oh, Deus, nem políticas de assédio, vale a pena perguntar a
Equal Employment Opportunity Commission. percebi que estava fazendo isso. Sinto qualquer pessoa da gestão com quem você
É verdade que não há nenhuma lei federal muito”. Então, não fará isso de novo. Isso se sente mais confortável, seja homem ou
segundo a qual os empregadores devem ter é incrivelmente eficaz. mulher, se há um executivo que seria
“justa causa” quando demitem funcionários. Não temos coragem de dizer essas coisas responsável por responder a perguntas
O status de emprego padrão para a maioria porque não praticamos. É muito difícil. sobre um possível mau comportamento no
dos trabalhadores nos Estados Unidos é o É muito desconfortável. É muito estranho. escritório. Vale também perguntar se a
que se chama de “à vontade”. Isso significa E, em alguns casos, há uma dinâmica de empresa tem um documento sobre política
que o empregador pode demitir o indivíduo poder. Se você tem um colega de trabalho de assédio sexual, e se nele é mencionada
por qualquer motivo, com ou sem causa. do sexo masculino que está no comando e a pessoa a quem prestar queixa. Apenas
Há algumas exceções a essa regra, e os sempre faz isso e, como toda mulher, você indagar sobre o assunto fará a gestão
trabalhadores podem conseguir proteções se sente ameaçada, então você deve relatar reconhecer que esse é um tópico que não
melhores, individual ou coletivamente, por o fato a outra pessoa. pode ser ignorado, apesar do pequeno
meio de contratos, quando possível, mas a Mas você precisa acreditar que essa tamanho da empresa.
regra geral é que os empregadores podem pessoa vai ouvir você. O ideal é que você Se há apenas homens no topo e você não
contratar e demitir conforme desejarem. tenha um departamento de RH no qual sabe quem é o ponto de referência sobre má
No entanto, existem leis federais e confia, que vai ouvir você e tomar as conduta sexual, quem você procuraria? Eu,
estaduais que proíbem a demissão de medidas apropriadas para resolver sua novamente, escolheria a pessoa de maior
funcionário por determinados motivos. queixa. É perfeitamente razoável procurar ranking na empresa com a qual você se
Qualquer decisão de rescindir o contrato o RH. Também é perfeitamente adequado sente confortável. Se você já relatou o
do empregado (ou tomar qualquer outra procurar alguém na gestão. O RH faz parte incidente a um colega, e está preocupado
medida) com base em raça, sexo, origem desse time. O que eu não quero ver como por achar que será muito difícil descrever a
nacional, cor, religião, idade, deficiência ou resultado do movimento #MeToo é que nós acusação sob pressão, promova uma reunião
informação genética é expressamente passemos a fazer disso um problema do RH. com o colega e o executivo em quem você
proibida por lei federal. Assim, por exemplo, Não é. Você deve ser capaz de ir a qualquer confia. Relate o fato num e-mail e envie-o a
se um empregador demite uma funcionária pessoa no comando e dizer-lhe o que está esse executivo, assim terá o registro como
porque ela não presta serviços sexuais a um acontecendo, e todos devem se sentir garantia. Espera-se que a gestão de
superior, isso constitui clara violação da lei igualmente responsáveis por manter uma pequenas empresas lide com esses casos

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com o grau de compreensão e respeito que gênero no local de trabalho. Marido e Como fazer com que toda a liderança da
merecem. mulher, são coautores de Breaking through empresa admita a necessidade de mudar
Vale mencionar que, em minha pesquisa bias: communication techniques for women a cultura do assédio sexual e da discrimi-
recente com 57 empresas de pequeno porte, to succeed at work. nação no local de trabalho em vez de
concluí que o RH não é necessário para Mesmo nas empresas mais bem intenciona- tratar a questão como apenas mais um
erradicar e prevenir o assédio sexual. Mas os das, o RH ou o departamento jurídico podem risco corporativo?
líderes precisam: (1) estar conscientes dos não ser os melhores locais para receber e
Harris e Kramer: As lideranças corporativas
fatores que produzem uma cultura tóxica de investigar alegações de assédio sexual. Esses
têm razão em se preocupar com o risco à
trabalho, como ter executivos predominan- departamentos têm múltiplas responsabilida-
reputação representado por alegações de
temente homens, camadas hierárquicas de des, algumas das quais podem dificultar a
assédio sexual. Mas elas deveriam se
poder dentro da empresa e falta de resposta realização de uma investigação minuciosa que
preocupar muito mais com o ambiente
a alegações anteriores; (2) estabelecer vá até as últimas consequências. Além disso,
cultural do local de trabalho. Onde reina o
políticas claras que descrevam o que o pessoal nesses departamentos pode ter
preconceito de gênero, a falta de cortesia
constitui assédio sexual, quais comporta- relacionamentos pessoais com uma ou ambas
e o comportamento sexual inadequado, a
mentos não serão tolerados e o que os as pessoas envolvidas, ou ter contribuições a
probabilidade de ocorrência de assédio
funcionários devem fazer se presenciarem dar em suas futuras avaliações de desempe-
sexual é muito maior, mas nesses ambientes
má conduta ou forem alvos de uma; e (3) nho. Portanto, em nossa opinião, para que os
é provável também que as taxas de rotativi-
impor essas regras, designando papéis funcionários realmente sejam capacitados a
dade de pessoas sejam altas, a gestão sênior
claros para funcionários, chefes e colabora- denunciar os assediadores, a empresa deve,
tenha poucas mulheres e os níveis de
dores. Na minha empresa, eu disse a todos em primeiro lugar, acionar um investigador de
inovação e criatividade sejam baixos.
que eles devem falar imediatamente comigo denúncias terceirizado que não tenha nenhum
Quando os gestores seniores entenderem
ou com meu segundo em comando em caso vínculo com a empresa. O investigador
os verdadeiros custos de um ambiente
de queixa. Se isso acontecesse, eu tentaria independente receberia todas as denúncias
profissional que não seja agradável para as
entender o incidente entrevistando todos de assédio; realizaria uma investigação
mulheres ambiciosas, eles certamente
os envolvidos, e provavelmente pediria ao rápida, completa e justa de cada uma; na
passarão a liderar iniciativas para mudar
assediador que tirasse uma licença até nos medida do possível, garantiria a confidenciali-
esse clima. É a diferença entre jogar na
inteiramos da situação como um todo. dade; e, sem dourar a pílula, relataria suas
defesa e jogar no ataque: tratar o assédio
Depois, eu tentaria resolver o problema descobertas para a gerência sênior.
sexual apenas como um risco de negócio é
internamente. Se isso não fosse possível, Independentemente de a empresa recorrer
uma estratégia de defesa dispendiosa.
buscaríamos um advogado externo. a um investigador externo, a capacitação
Avaliar com precisão a cultura do local de
Finalmente, ter mulheres na alta gerência efetiva dos funcionários depende de sua
trabalho e agir para livrá-lo do preconceito,
reduz o risco de assédio sexual no trabalho, confiança no compromisso da alta gestão de
da falta de cortesia e da conduta sexual
mas não o elimina, é claro. ter um local de trabalho livre de comporta-
indesejada é uma estratégia de ataque cujos
mento sexual inadequado. Isso significa que
benefícios compensam os custos.
Como capacitamos os indivíduos dentro os funcionários devem ter motivos para
das empresas para denunciar os assedia- acreditar que a alta gestão disciplinará os
Qual a responsabilidade do gestor que
dores quando o RH/departamento legal/ transgressores sem levar em conta seu
testemunhasse assédio sexual perpetrado
etc. não agem ou não podem agir? status dentro da organização e protegerá o
contra um funcionário seu por alguém mais
denunciante contra retaliações e consequên-
Alton B. Harris é sócio da Nixon Peabody e poderoso que esse gestor, mas de outra
cias profissionais adversas. A gestão sênior
Andrea S. Kramer é sócia da McDermott empresa? Digamos que o CEO da empresa
deve deixar claro seu compromisso nesse
Will & Emery. Ambos trabalham há mais de 1 esteja visitando a empresa 2 e, durante
sentido.
30 anos na promoção da igualdade de a visita, assedia sexualmente uma

NEM TODA MÁ CONDUTA SEXUAL DEVE RESULTAR EM DEMISSÃO.


O MAIS APROPRIADO É RESPOSTA RÁPIDA, PROPORCIONAL E
CALCULADA PARA EVITAR DANOS FUTUROS.
JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 61 
FOCO COMO GERIR O #METOO

MESMO NAS EMPRESAS MAIS BEM-INTENCIONADAS, O RH OU O


DEPARTAMENTO JURÍDICO PODEM NÃO SER AS MELHORES ÁREAS
ÀS QUAIS ATRIBUIR A RESPONSABILIDADE DE RECEBER E INVESTIGAR
AS ALEGAÇÕES DE ASSÉDIO SEXUAL.
funcionária na presença de um executivo um exemplo: um funcionário faz um O treinamento contra o assédio é mais
da empresa 2. Em um mundo ideal, isso comentário sexualmente sugestivo. Um eficaz se o instrutor for homem ou for
não aconteceria, e o executivo da empresa comentário isolado não chega necessaria- mulher?
2 tentaria defender a funcionária, mas mente ao nível de assédio.
Smith: O método, o conteúdo e o público-
a dinâmica de poder torna isso difícil.
alvo do treinamento contra o assédio sexual
O que o executivo da empresa 2 deve Qual é o treinamento padrão do RH sobre
podem influenciar mais a mudança do local
dizer ao CEO da empresa 1? consentimento sexual e assédio sexual?
de trabalho do que o gênero do instrutor.
Comecei a trabalhar com software em
Segal: Esta pergunta ilustra o importante Mas o gênero do instrutor implica várias
1991 e nunca recebi nenhum treinamento.
papel das testemunhas e dos líderes que influências e processos sociais nos quais é
recebem treinamento sobre suas obrigações Harris e Kramer: O consentimento, ou a importante ficar atento. O mais importante
como testemunhas. Neste caso, se o falta dele, é um fator fundamental do a considerar é a competência. Porém,
executivo da empresa 2 testemunhar a assédio sexual. Não importa sua natureza, dependendo do conteúdo, as instrutoras
conduta questionável do CEO da empresa 1, comentários de natureza sexual no local de podem, de início, ser percebidas como
ele terá de reagir na hora, deixando claro que trabalho não caracterizam assédio, a menos menos competentes por causa de seu
ela não é aceitável, que não deverá continuar, que sejam indesejados ou inoportunos. gênero. Mulheres e homens são igualmente
e, assim, os que estão por perto saberão que Como disse a EEOC, distinções essenciais suscetíveis a esse preconceito inconsciente.
ele não a aprova tacitamente. Em seguida, o devem ser traçadas entre “avanços sexuais As instrutoras sabem disso por experiência
executivo da empresa 2 deve conversar em com convite ou sem convite, mas bem-vin- própria e, para compensar, podem se
particular com o CEO e deixar bem claro quais dos, e ofensivos mas tolerados ou rejeitados esforçar para provar a si mesmas. Segundo,
serão as consequências da repetição desse por completo”. Desde 1991, o treinamento de pesquisas mostram que, quando as
comportamento. A funcionária, por sua vez, RH tem feito grandes progressos ao traçar mulheres realizam treinamento de assédio
será informada com toda a clareza de que a essas distinções. A Califórnia, por exemplo, sexual, ativam-se os estereótipos que
empresa a apoia inteiramente. exige que todas as instituições de ensino enfatizam os preconceitos inconscientes
Se na empresa 2 o indivíduo que testemu- superior que recebem verbas estaduais sobre as mulheres serem menos competen-
nhar tal comportamento não for um adotem um “padrão de consentimento tes e terem menos status. No entanto, nas
executivo, ele talvez se sinta desconfortável afirmativo” para determinar se houve sessões lideradas por homens, eles acharam
em responder de imediato em virtude da consentimento mútuo para a atividade as mulheres mais simpáticas. Da mesma
diferença de poder. Mesmo assim, a pessoa sexual. Um consentimento afirmativo forma, pesquisas recentes demonstram que
deve relatar o incidente a um executivo da envolve “um acordo positivo, consciente quando as mulheres enfatizam o comporta-
empresa 2, para que ele converse com o e voluntário para envolvimento sexual”. mento de valorização da diversidade, elas
CEO da outra empresa. É importante que o O consentimento não pode ser presumido são punidas de alguma forma, em grande
procedimento de denúncia contra o assédio pelo silêncio, pela falta de protesto ou pela parte devido à percepção de que fazem
deixe claro que indivíduos que não são alvos incapacidade de resistir. isso por interesse próprio.
diretos — mas o presenciam ou dele são Agora, a maioria dos treinamentos de RH
informados — sejam encorajados a denun- reconhece que o consentimento explícito Qual é a melhor maneira de proteger as
ciá-lo. Eu uso a palavra “assédio” e não deve preceder qualquer insinuação, avanço, mulheres e educar os homens? Eu sou
“assédio ilegal”, porque muitos comporta- solicitação ou contato sexual no local de homem. Há algo que eu possa fazer?
mentos de assédio podem não ser “suficien- trabalho. “Achei que ela queria” nunca é
Smith: Eu acho que precisamos abraçar uma
temente ruins” para ser ilegais, mas ainda uma justificativa aceitável para conduta
cultura mais ampla de inclusão e alianças.
são inaceitáveis e inapropriados. Aqui está sexual indesejada.

62 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


Neste momento, um dos muitos desafios em ajuda ou encorajamento para ser assim
nossa sociedade é criar um local de trabalho também no trabalho e em público. Alguns
onde os homens não se sintam inibidos para são motivados pelos objetivos de negócio ou
se expressar e conversar sobre quem são e de liderança. Certamente, há claras
sobre o que não são. Por exemplo, quando evidências de que ter conselho e equipes de
se trata de abordar o comportamento liderança sênior compostos de homens e
machista no trabalho, eles são menos mulheres impacta positivamente os lucros e
propensos a argumentar porque podem a viabilidade de longo prazo das empresas.
achar que esse não é o seu lugar. E eles são Líderes e gestores homens também podem
mais propensos a superestimar o nível de achar que tudo de que precisam para
aceitação do machismo por parte de seus realizar o trabalho é conhecer os efeitos
colegas homens, não dizendo nada porque negativos mais amplos de ambientes de
acham que são os únicos que consideram trabalho hostis. E se tudo isso não for
isso ofensivo. suficiente, os homens que trabalham com
Em nossa pesquisa sobre relações de mulheres e as orientam em empresas onde
tutoria entre gêneros, discutimos a “síndro- predomina a diversidade de gêneros
me masculina relutante”, uma série de possuem redes mais diversificadas, maior
razões pelas quais os homens evitam acesso a informações e habilidades interpes-
orientar as mulheres ou mesmo trabalhar soais aprimoradas.
com elas. Por exemplo, uma razão está
relacionada à ansiedade que alguns HBR Reprint R1806A–P Para pedidos, página 10
experimentam quando consideram a
possibilidade de relacionamento profissional
com mulher no trabalho. Quando crescem,
os homens recebem roteiros para se
relacionar com sua mãe, irmã, esposa,
namorada e filha — mas não para relaciona-
mento profissional e não sexual com mulher
no trabalho. Às vezes, para lidarem com a
ansiedade, eles se apoiam em roteiros
sociais aparentemente positivos (por
exemplo, o cavaleiro de armadura brilhante)
que acabam sabotando ou minando as
mulheres no âmbito profissional. Quando
estão em um espaço seguro e mais vulnerá-
vel, os homens conversam entre si sobre
essas preocupações e dificuldades. O
desafio organizacional é criar esses espaços
e oportunidades nos quais os homens
possam se envolver e se apoiar mutuamente
por meio dessas conversas.
Finalmente, a motivação para abordar esse
conteúdo e ter essas conversas pode ser
encontrada em vários lugares. Alguns
homens se sentem compelidos a relacionar
as questões que as mulheres têm no
trabalho com uma mulher importante em
sua vida (esposa, filha). Não raro eles são
fortes, aliados sinceros em casa e na vida
particular em geral, mas podem precisar de

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 63 


JUNHO 2018
rtigos

DESENVOLVIMENTO COMO CEOS DE SUCESSO


AGILE EM ESCALA 66 ABORDAM O SEGUNDO
Como partir de um ATO DA GESTÃO 76
pequeno número de Começar a todo vapor
equipes e chegar às funciona, mas só até
centenas. certo ponto.

ILUSTRAÇÃO DE MANUELA SCHEWE-BEHNISCH/EYEEM/GETTY IMAGES


JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 65 
DESENVOLL
AGILE EM
ESCALA COMO PARTIR DE UM PEQUENO NÚMERO
DE EQUIPES E CHEGAR ÀS CENTENAS
DARRELL K. RIGBY,
JEFF SUTHERLAND
E ANDY NOBLE

66 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


MANUELA SCHEWE-BEHNISCH/EYEEM/GETTY IMAGES

LVIMENTO
DESENVOLVIMENTO AGILE EM ESCALA

HOJE, A MAIORIA DOS LÍDERES EMPRESARIAIS


JÁ ESTÁ FAMILIARIZADA COM EQUIPES DE
INOVAÇÃO AGILE (ÁGIL, EM TRADUÇÃO
LIVRE). ESSES PEQUENOS GRUPOS
EMPREENDEDORES SÃO PROJETADOS PARA
FICAR PRÓXIMOS AOS CLIENTES, ADAPTANDO-
SE RAPIDAMENTE ÀS MUDANÇAS. QUANDO
IMPLEMENTADOS CORRETAMENTE, QUASE
SEMPRE PROPORCIONAM AUMENTO DA
PRODUTIVIDADE E DO MORAL DA EQUIPE,
LANÇAMENTO MAIS RÁPIDO, MELHOR
QUALIDADE E MENORES RISCOS DO QUE
AS ABORDAGENS TRADICIONAIS.
Como seria de se esperar, os líderes que tiveram ex- a Netlix, nasceram ágeis e se tornaram mais fortes à
periência com equipes ágeis ou delas ouviram falar medida que cresceram; e empresas que, como a Ama-
têm algumas dúvidas fundamentais. E se fossem im- zon e a USAA (empresa de serviços inanceiros para a
plementadas dezenas, centenas, ou até milhares de comunidade militar), estão fazendo a transição de hie-
equipes ágeis em toda a empresa? Será que segmen- rarquias tradicionais para empresas mais ágeis. Junto
tos inteiros conseguiriam operar assim? Implementar com as muitas histórias de sucesso, há algumas decep-
práticas ágeis em larga escala pode melhorar o desem- ções. Por exemplo, nos últimos cinco anos uma grande
penho corporativo tanto quanto os métodos ágeis me- empresa industrial tentou inovar como uma startup
lhoram o desempenho individual da equipe? enxuta, mas ainda não colheu os resultados inancei-
No mercado tumultuado de hoje, em que empresas ros esperados por investidores ativistas e pelo conse-
estabelecidas lutam freneticamente contra a concor- lho de administração, e, recentemente, vários execu-
rência de startups e outros insurgentes, a perspectiva tivos seniores renunciaram.
de uma empresa adaptável e em rápida transforma- Nossos estudos mostram que as empresas podem
ção é muito atraente. Porém transformar isso em re- adotar práticas ágeis em larga escala e que isso cria be-
alidade não é fácil. E nem sempre as empresas sabem nefícios substanciais. Mas os líderes precisam ser re-
quais funções devem ser reorganizadas em equipes alistas. Nem todas as funções devem ser organizadas
ágeis multidisciplinares e quais não devem. E, não ra- em equipes ágeis — de fato, os métodos ágeis não são
ro, centenas de novas equipes ágeis são estranguladas adequados para algumas atividades. Porém, quando
pela lenta burocracia. você começa a lançar dezenas ou centenas de equipes
Estudamos o uso massivo da metodologia agile em ágeis, não dá para deixar de lado as outras partes da
centenas de organizações, incluindo empresas peque- empresa. Se, constantemente, as suas unidades ágeis
nas que gerenciam todo o empreendimento com mé- recém-convertidas forem frustradas por procedimen-
todos ágeis; grandes empresas que, como a Spotify e tos burocráticos ou pela falta de colaboração entre as

68 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


equipes de operação e de inovação, o atrito organiza- quando eles se comportam como uma equipe ágil. Isso
cional produzirá faíscas, o que redundará em colapsos signiica visualizar várias partes da organização como
e resultados ruins. Mudanças devem ser implementa- seus clientes — pessoas e grupos cujas necessidades
das para garantir que equipes ágeis sejam compatíveis diferem, provavelmente são mal compreendidas, e
com as funções que não operam dessa maneira. evoluirão à medida que a prática ágil se instala. A equi-
pe executiva deine prioridades e cria uma sequência
de oportunidades para melhorar as experiências des-
SER ÁGIL PARA TORNAR-SE UM LÍDER ÁGIL ses clientes e promover seu sucesso. Líderes mergu-
Para quem não está familiarizado com a metodolo- lham no assunto para resolver os problemas e remover
gia ágil, segue um breve resumo. As equipes ágeis são as restrições, em vez de delegar esse trabalho aos su-
mais adequadas para lidar com a inovação — ou seja, bordinados. Como qualquer outro grupo ágil, a equipe
a aplicação prática da criatividade para aprimorar pro- de liderança ágil tem um “dono da iniciativa” respon-
dutos e serviços, processos ou modelos de negócios. sável pelos resultados gerais e um facilitador que trei-
Elas são pequenas e multidisciplinares. Confrontadas na os integrantes e ajuda a mantê-los engajados.
com um problema grande e complexo, elas o dividem A Bosch, líder global de tecnologia e serviços com
em módulos, desenvolvem soluções para cada com- mais de 400 mil associados e operações em mais de
ponente por meio de prototipagem rápida e ciclos es- 60 países, adotou essa abordagem. Conforme os líde-
treitos de feedback e integram as soluções em um todo res começaram a perceber que a gestão tradicional de
coerente. Elas valorizam mais a adaptação à mudança cima para baixo já não era eicaz em um mundo globa-
do que a adesão a um plano, e se responsabilizam por lizado e em rápida evolução, a empresa tornou-se uma
resultados (como crescimento, lucratividade e ideli- das primeiras a adotar a metodologia agile. Mas dife-
dade do cliente), não por produtividade (como linhas rentes áreas de negócios exigiam abordagens diferen-
EM RESUMO
de código ou número de novos produtos). tes, e a primeira tentativa da Bosch de implementar
A AMBIÇÃO
Para equipes ágeis, o campo é fértil em qualquer o que chamou de “organização dupla” — na qual no- Saltar de um punhado de
situação em que os problemas são complexos, as so- vas empresas eram geridas com equipes ágeis enquan- equipes de inovação ágil
luções não são claras, os requisitos do projeto prova- to funções tradicionais eram deixadas de lado — com- em desenvolvimento de
velmente mudarão, uma estreita colaboração com os prometeu o objetivo de uma transformação holística. software, por exemplo,
usuários inais é viável, e as equipes de criação supe- Em 2015, membros do conselho de gestão, liderados para dezenas, até centenas,
em toda a empresa, fazendo
rarão os grupos de comando e controle. Operações de pelo CEO Volkmar Denner, decidiram adotar uma da metodologia agile
rotina, como manutenção de fábrica, compra e conta- abordagem mais unificada para as equipes ágeis. O a forma padrão de operar.
bilidade, são áreas menos fecundas. Os métodos ágeis conselho atuou como uma comissão de coordenação
formam introduzidos primeiro nos departamentos de e, para orientar a iniciativa, nomeou Felix Hieronymi, OS DESAFIOS
TI e agora são amplamente usados no desenvolvi- engenheiro de software que se tornou especialista ágil. Descobrir onde começar,
mento de software. Com o passar do tempo, eles se A princípio, Hieronymi esperava gerenciar a tarefa quão rápido avançar e até
que ponto ir, decidindo
disseminaram em funções como desenvolvimento de da mesma forma que a Bosch gerenciava a maioria dos quais funções podem e
produtos, marketing e até RH (ver Incorporando a agi- projetos: com uma meta, uma data prevista de con- devem ser convertidas em
lidade, HBRBR, maio de 2016; e O RH torna-se ágil, clusão e relatórios de status regulares para a direto- equipes ágeis e quais não
HBRBR, abril de 2018.) ria. Mas essa abordagem parecia inconsistente com os devem, e evitando que a
As equipes ágeis trabalham de maneira diferente princípios ágeis, e as divisões da empresa eram muito burocracia atrapalhe as
que fazem a conversão.
das burocracias da cadeia de comando. Elas são, em céticas quanto a outro programa organizado central-
grande parte, autogovernadas: os líderes seniores in- mente. Então a equipe acelerou a marcha. “A comis- A SOLUÇÃO
formam aos membros da equipe onde inovar, mas não são de coordenação se transformou em uma comissão Os líderes devem usar
como. E as equipes trabalham próximas aos clientes, de trabalho”, disse Hieronymi. “As discussões icaram métodos ágeis e criar
externos e internos. A ideia é que isso coloque a res- muito mais interativas.” A equipe compilou e classi- uma classificação de
ponsabilidade pela inovação nas mãos daqueles que icou uma lista de prioridades corporativas, que era oportunidades para
definir prioridades e
estão mais próximos dos clientes, o que reduz as ca- atualizada regularmente, e buscou remover, de for- dividir a trajetória em
madas de controle e aprovação, acelera o trabalho e ma constante, as barreiras da empresa para ganhar pequenas etapas. Os
aumenta a motivação das equipes. E ainda libera os lí- agilidade. Os membros se espalharam para envolver fluxos de trabalho devem
deres seniores para fazer o que só eles podem fazer: os líderes da divisão no diálogo. “De projeto anual a ser modularizados e, em
criar e comunicar visões de longo prazo, deinir e se- estratégia evoluiu para um processo contínuo”, diz seguida, integrados com
perfeição. Funções que
quenciar prioridades estratégicas e construir as capa- Hieronymi. “Os membros do conselho dividiram-se não foram reorganizadas
cidades organizacionais para alcançar esses objetivos. em pequenas equipes ágeis e testaram várias abor- em equipes ágeis devem
Quando os líderes não têm experiência e não en- dagens — algumas com um ‘dono do produto’ e um aprender a operar com
tendem a abordagem ágil, talvez tentem implementar ‘mestre ágil’ — para lidar com problemas difíceis ou valores ágeis. O processo
o desenvolvimento ágil em larga escala da mesma ma- trabalhar em tópicos fundamentais. Um grupo, por de orçamento anual tem
de ser complementado
neira como izeram em outras iniciativas de mudan- exemplo, elaborou os dez novos princípios de lideran- com uma abordagem de
ça: por meio de planos e diretrizes de cima para bai- ça lançados em 2016. Eles pessoalmente experimenta- financiamento semelhante
xo. O histórico mostra que os resultados são melhores ram a satisfação de aumentar a velocidade e a eicácia. à do capital de risco.

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 69


DESENVOLVIMENTO AGILE EM ESCALA

É impossível ter essa experiência lendo um livro. Hoje, e internos. Elas geralmente podem ser divididas em
a Bosch opera com uma combinação de equipes ágeis uma dúzia de experiências importantes (por exem-
e unidades tradicionalmente estruturadas. Mas relata plo, uma das principais experiências de um cliente de
que quase todas as áreas adotaram valores ágeis, cola- varejo é comprar e pagar por um produto), que, por
boram mais efetivamente e se adaptam com maior ra- sua vez, pode ser dividida em dezenas de experiências
pidez a mercados cada vez mais dinâmicos. mais especíicas (escolher um método de pagamento,
usar um cupom, resgatar pontos de idelidade, con-
cluir o processo de pagamento e receber um recibo).
COMO FAZER FUNCIONAR A METODOLOGIA AGILE O segundo componente examina as relações entre es-
Como outras empresas ágeis avançadas, a Bosch tem sas experiências e os principais processos de negócio
visão ambiciosa. De acordo com os princípios ágeis, (melhorias no caixa para reduzir o tempo de ilas, por
no entanto, a equipe de liderança não planeja todos exemplo), com o objetivo de reduzir a sobreposição
os detalhes antecipadamente. Os líderes reconhecem de responsabilidades e aumentar a colaboração en-
que ainda não sabem quantas equipes ágeis serão ne- tre equipes de processos e equipes de experiência do
cessárias, com que rapidez elas devem ser adicionadas cliente. O terceiro se concentra no desenvolvimento
e como as restrições burocráticas podem ser resolvi- de sistemas de tecnologia (como melhores aplicativos
das sem criar caos na organização. Por isso, geralmen- para pagamento móvel) para melhorar os processos
te, lançam uma primeira leva de equipes ágeis, cole- que apoiarão as equipes de experiência do cliente.
tam dados sobre o valor que as equipes criaram e as A classiicação de um negócio de US$ 10 bilhões po-
restrições que enfrentam e decidem se, quando e co- de identiicar de 350 a mil equipes em potencial — ou
mo dar o próximo passo. Isso permite que elas pon- mais. Esses números parecem assustadores, e os exe-
derem o valor de aumentar a agilidade (em termos de cutivos seniores muitas vezes relutam em considerar
resultados financeiros, resultados de clientes e de- tantas mudanças. (“Que tal se tentarmos duas ou três
sempenho dos funcionários) em relação aos custos dessas coisas para ver como elas funcionam?”) Mas o
(em termos de investimentos inanceiros e desaios valor de uma taxionomia é que ela encoraja a explora-
organizacionais). Se os benefícios superam os custos, ção de uma visão transformacional, ao mesmo tempo
os líderes continuam a aumentar a escala das práticas que divide a jornada em pequenas etapas que podem
ágeis — implantando outra leva de equipes, desblo- ser pausadas, viradas ou interrompidas a qualquer
queando restrições em partes menos ágeis da organi- momento. Também ajuda os líderes a identiicar res-
zação e repetindo o ciclo. Caso contrário, podem fazer trições. Por exemplo, depois de identiicar as equipes
uma pausa, monitorar o mercado e explorar formas que você pode lançar e os tipos de pessoa de que vo-
de aumentar o valor das equipes ágeis já estabeleci- cê precisa, é necessário perguntar: temos essas pesso-
das (por exemplo, estabelecendo prioridades mais ra- as? Se sim, onde estão? Uma classiicação revela suas
cionais de trabalho ou atualizando as capacidades de lacunas de talentos e os tipos de pessoa que você de-
prototipagem) e diminuir os custos de mudança (di- ve contratar ou reciclar para preenchê-las. Os líderes
vulgando sucessos da metodologia ágil ou contratan- também podem perceber como cada equipe em po-
do entusiastas experientes). tencial se encaixa no objetivo de oferecer uma melhor
Para iniciarem esse ciclo de testes e aprendizado, experiência aos clientes.
as equipes de liderança costumam empregar duas fer- A USAA tem mais de 500 equipes ágeis em opera-
ramentas essenciais: uma classiicação de equipes em ção e planeja adicionar mais 100 em 2018. A classii-
potencial e um plano de sequenciamento que relete cação é totalmente visível para todos na empresa. “Se
as principais prioridades da empresa. Primeiro, vamos você não tem uma boa classiicação, você acaba com
ver como cada um pode ser empregado e depois ex- redundância e duplicação”, disse o COO Carl Liebert.
plorar o que é mais importante para lidar com iniciati- “Quero entrar em um auditório e perguntar ‘quem é
vas ágeis em larga escala e longo prazo. dono da experiência de mudança de endereço deste
Crie uma classificação de equipes. Assim como cliente?’. Quero uma resposta clara e segura de uma
as equipes ágeis compilam uma lista de pendências a equipe que seja a dona dessa experiência, seja para um
ser resolvidas no futuro, as empresas que conseguem cliente que liga para nós, faz login em nosso site de um
implementar um desenvolvimento ágil em larga es- laptop ou usa nosso aplicativo para dispositivos mó-
cala geralmente começam criando uma classiicação veis. Não quero dedos apontados para ninguém. Nem
completa de oportunidades. Seguindo a abordagem respostas que comecem com ‘é complicado’.”
modular da metodologia ágil, elas podem dividir a A classiicação da USAA vincula as atividades das
classiicação em três componentes — equipes de ex- equipes ágeis às pessoas responsáveis pelas unida-
periência do cliente, equipes de processos de negócios des de negócio e pelas linhas de produtos. O objetivo
e equipes de sistemas de tecnologia — e integrá-las. é garantir que os gestores responsáveis por partes es-
O primeiro componente identiica todas as experiên- pecíficas do P&L (demonstrativo de perdas e lucros,
cias que podem afetar signiicativamente as decisões, em inglês) entendam como as equipes interfuncio-
comportamentos e satisfação dos clientes externos nais inluenciarão seus resultados. Líderes seniores da

70 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


empresa atuam como gestores gerais em cada
linha de negócio e são responsáveis pelos seus TRANSIÇÕES
resultados. Mas esses líderes dependem de
equipes interorganizacionais focadas no clien-
te para executar grande parte do trabalho. A
REPENTINAS
empresa também depende de recursos tecno-
lógicos e digitais disponibilizados aos donos da SÃO DIFÍCEIS. É
MELHOR ADOTAR
experiência. O objetivo, neste caso, é garantir
que os líderes de negócio disponham de todos
os recursos necessários para entregar os resul-
tados com os quais se comprometeram. A in-
tenção de fazer uma classiicação é deixar cla- AS PRÁTICAS ÁGEIS
EM ETAPAS: CADA
ro como envolver as pessoas certas no trabalho
certo sem criar confusão. Esse tipo de víncu-
lo é especialmente importante quando estru-
turas organizacionais hierárquicas não estão
alinhadas com os comportamentos do cliente. UNIDADE COMBINA
AS OPORTUNIDADES
Por exemplo, muitas empresas têm estruturas
e P&Ls independentes para operações online e
oine, mas os clientes querem experiências in-
tegradas sem interrupções, do tipo omnichan-
nel. Uma classificação clara que implanta as
equipes interorganizacionais certas torna esse
DE IMPLEMENTAÇÃO
alinhamento possível.
Faça a transição em etapas. Com a classi- COM SUAS
CAPACIDADES.
icação pronta, a equipe de liderança estabele-
ce prioridades e uma sequência de iniciativas.
Os líderes devem considerar vários critérios,
como importância estratégica, limitações orça-
mentárias, disponibilidade de pessoal, retorno
do investimento, custo de atraso, níveis de ris-
co e interdependência entre equipes. Os mais
importantes — e os mais negligenciados — são,
de um lado, os pontos problemáticos percebidos pelos Mas as transições Big-Bang são difíceis. Elas exi-
clientes e funcionários e, de outro, as capacidades e res- gem total comprometimento da liderança, cultura
trições da empresa. Eles determinam o equilíbrio certo receptiva, praticantes ágeis talentosos, experientes e
entre a velocidade do lançamento e o número de equi- capazes de formar centenas de equipes sem compro-
pes que a empresa pode manipular simultaneamente. meter outras áreas, e manuais de instrução altamente
Empresas que precisam mudar radicalmente dian- prescritivos para alinhar a abordagem de todos. Exi-
te de ameaças estratégicas urgentes têm adotado, em gem também alta tolerância de risco, juntamente com
algumas unidades, implementações do tipo Big-Bang planos de contingência para lidar com falhas inespe-
ou tudo-ao-mesmo-tempo-agora. Por exemplo, em radas. O ING continua a aperfeiçoar os detalhes con-
2015, a ING Netherlands antecipou a crescente deman- forme expande a prática ágil em toda a organização.
da dos clientes por soluções digitais e o aumento das Para empresas sem esses recursos, é melhor ado-
incursões de novos concorrentes digitais (as “fintechs”, tar a metodologia ágil em etapas: cada unidade combi-
empresas de tecnologia no setor de serviços inancei- na as oportunidades de implementação com suas ca-
ros). A equipe de gestão decidiu mudar agressivamen- pacidades. No início de sua iniciativa ágil, o grupo de
te. Dissolveu as estruturas organizacionais de suas tecnologia avançada da 3M Health Information Syste-
funções mais inovadoras, incluindo desenvolvimen- ms lançava oito a dez equipes mensalmente ou bimes-
to de TI, gestão de produtos, gestão de canal e marke- tralmente. Agora, dois anos depois, mais de 90 equi-
DORLING KINDERSLEY/GETTY IMAGES

ting — ou seja, praticamente aboliu todos os empre- pes estão em operação. O Laboratório de Sistemas de
gos. Em seguida, criou pequenos “esquadrões” ágeis e Pesquisa Empresarial da 3M começou mais tarde, mas
determinou que quase 3.500 funcionários se candida- lançou 20 equipes em três meses.
tassem às 2.500 vagas reprojetadas desses esquadrões. Seja qual for o ritmo ou o destino inal, os resulta-
Cerca de 40% das pessoas precisaram aprender um no- dos devem começar a aparecer com rapidez. Resulta-
vo trabalho, e todos tiveram de mudar profundamente dos inanceiros podem demorar um pouco — Jeff Be-
sua mentalidade (ver Experimento de uma equipe: o caso zos acredita que a maioria das iniciativas leva cin-
de um banco, HBRBR, abril de 2018). co a sete anos para pagar dividendos para a Amazon

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 71


DESENVOLVIMENTO AGILE EM ESCALA

IPES o ritmo, então essas áreas foram as

ERANÇA próximas. Uma vez que a linha de


frente da empresa evoluía veloz-

SAM
mente, era o momento de a retaguar-
da dar o salto. Então a SAP implantou
a metodologia ágil no grupo que tra-

IR VALORES balhava com sistemas internos de TI.


Muitas empresas cometem o er-

POR TODA
ro de buscar vitórias fáceis. Elas
colocam equipes em incubado-
ras externas. Intervêm para criar

RESA, soluções fáceis para obstáculos


sistêmicos. Essa superproteção au-

NDO AS
menta as chances de sucesso de
uma equipe, mas não produz o
ambiente de aprendizado ou as

QUE NÃO mudanças organizacionais neces-


sárias para aumentar a escala de
dezenas ou centenas de equipes.

SE ORGANIZAM EM As primeiras equipes ágeis da em-


presa carregam o fardo do destino.

EQUIPES ÁGEIS.
Testá-las, assim como testar qual-
quer protótipo, deve refletir con-
dições diversas e realistas. Como a
SAP, as empresas de maior suces-
so concentram-se em experiên-
cias vitais do cliente que causam as
—, mas mudanças positivas no comportamento dos maiores frustrações entre os silos funcionais.
clientes na resolução de problemas das equipes forne- Ainda assim, nenhuma equipe ágil deve ser imple-
cem sinais precoces de que as iniciativas estão no ca- mentada a menos que esteja pronta para começar. Es-
minho certo. “A adoção da metodologia ágil já possibi- tar pronta não signiica que ela deve ter sido planeja-
litou a entrega acelerada de produtos e o lançamento da em detalhes e ter sucesso garantido. Signiica que
de um aplicativo beta seis meses antes do planejado”, a equipe deve:
diz Tammy Sparrow, gerente sênior de programa da —XfgTeYbVTWTX`h`TZeTaWXbcbegha\WTWXWXaXZ‰
3M Health Information Systems. cio de alto risco;
Os líderes de divisão podem determinar o sequen- —fXeeXfcbafyiX_cbeeXfh_gTWbfXfcXV„ƌVbf.
ciamento da mesma forma que qualquer equipe ágil. —fXeVbaƌyiX_cTeTgeTUT_[TeWXYbe`TThg‹ab`T¸
Comece com as iniciativas que, potencialmente, ofe- guiada por claros direitos de propriedade, com re-
recem mais valor e aprendizado. A SAP, empresa de cursos adequados, e com um pequeno grupo de es-
software empresarial que lançou o processo há uma pecialistas multidisciplinares entusiasmados pela
década, foi uma das primeiras a implantar o desen- oportunidade;
volvimento ágil em larga escala. Primeiro, seus líde- —gXeVb`ceb`\ffbVb`TTc_\VT}bWXiT_beXfce\a
res expandiram as práticas ágeis em suas unidades de cípios e práticas ágeis;
desenvolvimento de software — um segmento alta- —fXeVTcTV\gTWTcTeTVb_TUbeTeXfgeX\gT`XagXVb`
mente focado no cliente onde eles podiam testar e re- os clientes;
inar a abordagem. Eles formaram um pequeno grupo —fXeVTcTmWXVe\Tecebg‰g\cbfeyc\WbfXV\V_bfWX
de consultoria para treinar, fazer coaching e incorporar feedback rápido;
a nova maneira de trabalhar, e criaram um rastreador —fXeTcb\TWTcbeXkXVhg\ibffXa\beXfdhX_\WTe}bVb`
de resultados para que todos pudessem acompanhar os impedimentos e impulsionarão a adoção do tra-
a evolução das equipes. “Mostrar exemplos concretos balho da equipe.
de ganhos de produtividade impressionantes da práti- Seguir essa lista ajudará você a planejar uma se-
YAMADA TARO/GETTY IMAGES

ca ágil gerava cada vez mais incentivo da empresa”, diz quência para obter o maior impacto possível para os
Sebastian Wagner, que na época era um gestor de con- clientes e para a empresa.
sultoria nesse grupo. Nos dois anos seguintes, a empre- Domine iniciativas ágeis de larga escala. Muitos
sa implantou a metodologia ágil em mais de 80% de su- executivos não conseguem conceber que pequenas
as organizações de desenvolvimento, criando mais de equipes ágeis possam enfrentar projetos de larga es-
duas mil equipes. O pessoal de vendas e o de marketing cala e de longo prazo. Mas, em princípio, não há limi-
perceberam que era necessário se adaptar para manter te para o número de equipes ágeis que você pode criar

72 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


ou para o tamanho da iniciativa. Você pode estabele- ágil, desde se recusar a trabalhar em um cronograma
cer “equipes de equipes” que trabalham em iniciativas ágil (“desculpe, por seis meses não conseguiremos
relacionadas — uma abordagem que pode aumentar chegar ao módulo de software de que você precisa”)
em muito a escala. O negócio aeronáutico da Saab, por até bloquear os fundos para grandes oportunidades
exemplo, tem mais de 100 equipes ágeis operando no que exigem soluções desconhecidas.
software, hardware e fuselagem para construir o caça Assim, uma equipe de liderança que pretende au-
Gripen — um item de US$ 43 milhões que, certamen- mentar a escala das necessidades ágeis, deve incutir
te, é um dos produtos mais complexos do mundo. A valores e princípios ágeis em toda a empresa, até mes-
coordenação é diária e feita por meio de reuniões de mo as áreas que não se organizam em equipes ágeis. É
equipe de equipes (todos de pé). Às 7h30, cada equipe por isso que os líderes da Bosch desenvolveram novos
ágil da linha de frente promove uma reunião de 15 mi- princípios de liderança e se espalharam por toda a em-
nutos para identiicar impedimentos, alguns dos quais presa: eles queriam garantir que todos compreendes-
não podem ser resolvidos por essa equipe. Às 7h45, os sem que as coisas seriam diferentes e que a agilidade
impedimentos que exigem coordenação são escalados estaria no centro da cultura da empresa.
para uma equipe de equipes, na qual os líderes traba- Arquiteturas operacionais. A implementação do
lham para resolver ou escalar ainda mais os proble- desenvolvimento ágil em larga escala requer a modu-
mas. Essa abordagem continua, e às 8h45 a equipe de larização e, em seguida, a integração perfeita do luxo
ação executiva tem uma lista das questões críticas a de trabalho. Por exemplo, a Amazon pode implemen-
resolver para que que se continue avançando. A Aero- tar o software milhares de vezes por dia porque sua ar-
náutica também coordena suas equipes em ritmo co- quitetura de TI foi projetada para ajudar os desenvol-
mum de três semanas intensas, um plano mestre de vedores a fazer lançamentos rápidos e frequentes sem
projeto que é tratado como um documento vivo, e o comprometer os sistemas complexos da empresa. Mas
trabalho conjunto entre partes tradicionalmente dís- muitas outras empresas de grande porte, independen-
pares da organização — por exemplo, colocar pilotos temente da rapidez com que conseguem escrever o
de teste e simuladores com equipes de desenvolvi- código dos programas, podem implantar software ape-
mento. Os resultados são notáveis: a IHS Jane’s, edi- nas algumas poucas vezes por dia ou por semana — é
tora especializada em assuntos militares, considerou assim que a sua arquitetura funciona.
o Gripen o avião militar mais econômico do mundo. Com base na abordagem modular para desenvol-
vimento de produtos desenvolvida de modo pioneiro
pela Toyota, a Tesla projeta meticulosamente interfa-
COMO IMPLANTAR A METODOLOGIA ces entre os componentes de seus carros para permitir
AGILE EM TODA A EMPRESA que cada módulo inove de forma independente. Assim,
Expandir o número de equipes ágeis é um passo im- a equipe de para-choques pode mudar qualquer coisa
portante para aumentar a agilidade dos negócios. Mas desde que mantenha interfaces estáveis com as partes
é igualmente importante a forma como essas equipes afetadas. A Tesla também está abandonando os tradi-
interagem com o resto da empresa. Até mesmo as em- cionais ciclos de lançamento anuais em favor de res-
presas ágeis mais avançadas — Amazon, Spotify, Goo- postas em tempo real ao feedback dos clientes. O CEO
gle, NetBI, Bosch, Saab, SAP, Salesforce, Riot Games, Elon Musk diz que a empresa faz cerca de 20 mudanças
Tesla e SpaceX, para citar apenas algumas — operam de engenharia por semana para melhorar a produção
combinando equipes ágeis e estruturas tradicionais. e o desempenho do Modelo S. Exemplos incluem no-
Para garantir que as funções burocráticas não atrapa- vas baterias, segurança atualizada e hardware de piloto
lhem o trabalho das equipes ágeis ou deixem de adotar automático e software que ajusta automaticamente vo-
e comercializar as inovações desenvolvidas por essas lante e assento para facilitar a entrada e a saída.
equipes, essas empresas pressionam, constantemen- Nas empresas ágeis mais avançadas, arquiteturas
te, por mudanças maiores, pelo menos, nas quatro inovadoras de produtos e processos estão atacando al-
áreas abaixo. gumas das restrições organizacionais mais espinho-
Valores e princípios. Uma empresa hierárquica sas com o objetivo de aumentar ainda mais a escala. A
tradicional geralmente pode acomodar um pequeno Riot Games, desenvolvedora do League of Legends, um
número de equipes ágeis espalhadas pela organização. bem-sucedido jogo eletrônico do gênero multiplayer
Os conlitos entre as equipes e os procedimentos con- online battle arena (arena de batalha multijogador onli-
vencionais são resolvidos ou contornados por meio ne), está redeinindo as interfaces entre equipes ágeis e
de intervenções pessoais. Quando uma empresa lança funções de suporte e controle que operam convencio-
várias centenas de equipes ágeis, esse tipo de acomo- nalmente, como instalações, inanças e RH. Brandon
dação improvisada não é mais possível. Equipes ágeis Hsiung, líder de produto para essa iniciativa em desen-
avançarão em todas as frentes. As estruturas tradicio- volvimento, diz que ela envolve pelo menos dois pas-
nais da organização defenderão ferozmente o statu sos principais. Um é mudar a deinição das funções de
quo. Como em qualquer mudança, os céticos produ- seus clientes. “Seus clientes não são seus chefes funcio-
zirão todo tipo de anticorpo para atacar a metodologia nais, nem o CEO nem o conselho de gestão”, explica ele.

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DESENVOLVIMENTO AGILE EM ESCALA

“Seus clientes são as equipes de desenvolvimento que líder da equipe que toma as decisões, de acordo com o
eles atendem, as quais, em última instância, atendem que é melhor para os jogadores da Riot.”
nossos jogadores.” A empresa instituiu pesquisas Net Algumas empresas, e algumas pessoas, podem não
Promoter de satisfação do cliente para veriicar se eles aceitar essa relação de vantagens e desvantagens e
recomendariam as funções a outras pessoas e deixaram contestar a implementação. Reduzir o controle é sem-
claro que, às vezes, os clientes insatisfeitos poderiam pre assustador — até que você faça isso e descubra que
contratar fornecedores externos. “É a última coisa que as pessoas icam mais felizes e as taxas de sucesso tri-
queremos, mas é preferível garantir que nossas funções plicam. Em uma recente pesquisa da Bain com cerca
desenvolvam capacidades de classe mundial que pos- de 1.300 executivos globais, o enunciado sobre gestão
sam competir em um mercado livre”, diz Hsiung. que recebeu mais apoio foi: “Os líderes empresariais
A Riot Games também reformulou o modo como de hoje devem coniar e capacitar as pessoas, não co-
suas funções corporativas interagem com suas equi- mandá-las e controlá-las”. (Apenas 5% discordaram.)
pes ágeis. Alguns membros de funções corporativas Aquisição de talentos e motivação. Empresas
podem ser incorporados em equipes ágeis, ou uma que estão adotando o desenvolvimento ágil em lar-
parte da capacidade de uma função ser dedicada a so- ga escala precisam adquirir estrelas e motivá-las pa-
licitações de equipes ágeis. Alternativamente, depois ra tornar as equipes melhores. (Trate suas estrelas de
de colaborarem com as equipes para estabelecer cer- forma injusta, e elas correrão para uma startup atra-
tos limites, as funções podem ter pouco envolvimen- ente.) Elas também precisarão liberar o potencial re-
to formal com elas. Hsiung diz: “Silos como imóveis presado de membros mais convencionais da equipe e
e aprendizado e desenvolvimento podem publicar i- criar compromisso, coniança e responsabilidade con-
losoias, diretrizes e regras e depois dizer: ‘Essas são junta pelos resultados. Não há uma forma prática de
nossas diretrizes. Desde que você opere dentro delas, fazer isso sem mudar os procedimentos do RH. As em-
qualquer loucura é permitida — faça o que acredita ser presas já não podem contratar apenas especialistas.
o melhor para nossos jogadores’”. Agora, precisam de equipes colaborativas que aliem
Nas empresas que implementaram o desenvolvi- conhecimento e entusiasmo. Não é possível avaliar se
mento ágil em larga escala, os organogramas das fun- as pessoas atingem objetivos individuais. Agora, é pre-
ções de suporte e das operações de rotina geralmente ciso analisar seu desempenho em equipes ágeis e nas
parecem muito com os anteriores, embora, frequen- avaliações que os membros da equipe fazem uns do
temente, tenham menos níveis de gestão e interva- outros. As avaliações de desempenho anuais normal-
los de controle mais amplos à medida que os supervi- mente mudam para um sistema que fornece feedback
sores aprendem a coniar e a capacitar as pessoas. As e coaching relevantes em poucas semanas ou meses.
maiores mudanças estão na maneira como os departa- Programas de treinamento e coaching encorajam o de-
mentos funcionais operam. As prioridades funcionais senvolvimento de habilidades multifuncionais cus-
icam, necessariamente, mais alinhadas com as estra- tomizadas para as necessidades de cada funcionário.
tégias empresariais. Se uma das prioridades-chave da Títulos de trabalho importam menos e mudam com
empresa é melhorar a experiência mobile dos clientes, menor frequência quando as equipes são autogeridas
isso não pode ser o número 15 na lista de prioridades e há menos níveis hierárquicos. Trajetórias de carreira
das inanças ou na lista de contratações do RH. E de- mostram como os donos de produtos — os indivíduos
partamentos como o jurídico podem precisar de capa- que deinem a visão e são os titulares dos resultados
cidade extra para lidar com solicitações urgentes de de uma equipe ágil — podem continuar seu desenvol-
equipes ágeis de alta prioridade. vimento pessoal, expandir sua inluência e aumentar
Com o tempo, mesmo as operações de rotina com sua remuneração.
estruturas hierárquicas provavelmente desenvolverão É possível que as empresas também precisem reno-
mentalidades mais ágeis. É claro que o departamen- var seus sistemas de remuneração para recompensar as
to inanceiro sempre administrará o orçamento, mas realizações do grupo, e não as individuais. Elas neces-
não precisa continuar questionando as decisões dos sitam de programas de reconhecimento que celebrem
donos de iniciativas ágeis. “Nosso CFO sempre trans- as contribuições de imediato. Para reforçar os valores
fere a responsabilidade para as equipes ágeis capaci- ágeis, reconhecimento público é melhor que bônus
tadas”, informa Ahmed Sidky, chefe de gestão de de- conidencial em dinheiro —inspira a pessoa a melho-
senvolvimento da Riot Games. “Ele diz ‘Eu não estou rar ainda mais e motiva os outros a emular os compor-
aqui para administrar as inanças da empresa. Você, tamentos elogiados. Os líderes também podem recom-
como líder de equipe, é que deve fazer isso. Estou aqui pensar os participantes nota “A”, envolvendo-os nas
em uma função consultiva’. Na organização do dia a oportunidades mais vitais, fornecendo-lhes as ferra-
dia, os parceiros da área inanceira são incorporados mentas mais avançadas e maior liberdade possível e co-
em todas as equipes. Eles não controlam o que as equi- nectando-os com os mentores mais talentosos da área.
pes fazem ou deixam de fazer. Eles atuam com um co- Ciclos anuais de planejamento e orçamento.
ach inanceiro que faz perguntas difíceis e fornece co- Em empresas burocráticas, as sessões anuais de estra-
nhecimento aprofundado. Mas, em última análise, é o tégia e as negociações de orçamento são ferramentas

74 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


poderosas para alinhar a empresa e
firmar o compromisso de aumen-
tar as metas. Praticantes ágeis co-
meçam com diferentes suposições.
Eles percebem que as necessidades
do cliente mudam com frequên-
cia e que insights inovadores po-
dem ocorrer a qualquer momento.
Na visão deles, os ciclos anuais res-
tringem a inovação e a adaptação:

EMPRESAS QUE IMPLEMENTAM


projetos improdutivos queimam
recursos até que seus orçamentos
acabem, enquanto inovações críti-
cas esperam na fila para competir
por inanciamento no próximo ciclo O DESENVOLVIMENTO ÁGIL EM
LARGA ESCALA OBTÊM GRANDES
orçamentário.
Em empresas com muitas equi-
pes ágeis, o sistema de financia-
mento é diferente. Os financiado-
res reconhecem que, em dois terços
das inovações bem-sucedidas, o
MUDANÇAS EM SEUS NEGÓCIOS.
conceito original mudará signifi-
cativamente durante o processo
de desenvolvimento. Eles sabem que as equipes po- cliente. Por fim, as melhorias são mensuráveis nos
dem abandonar alguns recursos e lançar outros antes resultados — não apenas melhores resultados inan-
do próximo ciclo anual. Como resultado, os procedi- ceiros, mas também maior idelidade do cliente e en-
mentos de inanciamento evoluem até se parecer com gajamento dos funcionários.
os de um capitalista de risco. Geralmente, os capita- A abordagem de teste e aprendizado da metodo-
listas de risco veem as decisões de inanciamento co- logia ágil é geralmente descrita como incremental e
mo oportunidades de comprar opções para novas des- iterativa, mas não se deve confundir processos de de-
cobertas. O objetivo não é criar, de imediato, um negó- senvolvimento incrementais com o pensamento in-
cio em grande escala, mas encontrar um componen- cremental. A SpaceX, por exemplo, pretende usar a
te crítico da solução inal. Isso leva a muitos fracassos inovação ágil para levar pessoas para Marte até 2024,
aparentes, mas acelera e reduz o custo do aprendi- com o objetivo de estabelecer uma colônia autossus-
zado. Essa abordagem funciona bem em empreen- tentável no planeta. Como isso vai acontecer? Bem,
dimentos ágeis e melhora muito a velocidade e a ei- as pessoas da empresa realmente não sabem... ain-
ciência da inovação. da. Mas entendem que isso é possível, e têm algumas
etapas em mente. Elas pretendem melhorar sobrema-
EMPRESAS QUE IMPLEMENTAM o desenvolvimento ágil neira a coniabilidade e reduzir as despesas, em parte
em larga escala obtêm grandes mudanças em seus ne- reutilizando foguetes como se faz com os aviões. Elas
gócios. O aumento de escala muda a combinação de preferem melhorar também o sistema de propulsão
trabalho de modo que a empresa passa a inovar mais para lançar foguetes que possam transportar pelo me-
em relação às operações de rotina. Ela se torna mais nos 100 pessoas. Elas planejam descobrir uma forma
capaz de interpretar as mudanças de condição e as de reabastecer no espaço. Algumas das etapas incluem
prioridades, desenvolver soluções adaptativas e evi- levar as tecnologias atuais ao limite e, em seguida, es-
tar as crises constantes que atingem as hierarquias tra- perar que surjam novos parceiros e novas tecnologias.
dicionais. Inovações disruptivas passam a ser menos Assim é a metodologia ágil na prática: grandes am-
perturbadoras e mais parecidas com negócios adap- bições e progresso passo a passo. Ela mostra o cami-
tativos comuns. O aumento da escala também traz nho a seguir mesmo quando — como acontece com
valores e princípios ágeis para as operações de negó- frequência — o futuro é incerto.
cio e funções de apoio, mesmo se muitas atividades HBR Reprint R1806B–P Para pedidos, página 10
rotineiras forem mantidas. Isso leva a maior eiciên-
cia e produtividade em alguns dos grandes centros DARRELL K. RIGBY é sócio do escritório de Boston da
de custo da empresa. E melhora a arquitetura opera- Bain&Company. Ele lidera as práticas globais de inovação e
cional e o modelo organizacional para aperfeiçoar a varejo e é autor de Winning in turbulence. JEFF SUTHERLAND é
cocriador da versão Scrum da inovação ágil e CEO da Scrum
coordenação entre equipes ágeis e operações de ro- Inc., empresa de consultoria e treinamento. ANDY NOBLE é sócio
tina. As mudanças são implementadas online mais ra- do escritório da Bain em Boston, especializado em varejo e
pidamente e respondem melhor às necessidades do organização.

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 75


T
odo líder sabe da importância dos primeiros
100 dias ou do primeiro ano no cargo — o perío-
do no qual é preciso avaliar e diagnosticar, for-
mular uma visão e uma estratégia e conquistar as pri-
meiras vitórias que geram confiança e legitimidade.
Dezenas de livros e artigos oferecem orientação sobre co-
mo os CEOs em seus últimos meses devem abordar sua
principal responsabilidade: ajudar a selecionar e formar
um sucessor para, depois, fazer uma sucessão tranquila.
Mas pouca atenção tem sido dedicada ao perío-
do entre essas duas fases. Como os CEOs podem
aproveitar ao máximo os anos intermediários de
seu mandato? Como obter os primeiros sucessos?
Como continuar tendo impacto? De que forma mudar
suas prioridades? Devem passar tempo com diversos
stakeholders? Envolver a organização de diferentes
maneiras? Como evoluir seu mindset (modelo mental,
em inglês) e seu jeito de trabalhar?
Com o objetivo de encontrar respostas, identi-
ficamos 146 CEOs de grandes empresas que deixa-
ram o emprego entre 2011 e 2016, depois de pelo me-
nos seis anos de casa — o tempo médio para um

COMO CEOs DE SUCESSO


ABORDAM O SEGUNDO
ATO DA GESTÃO
COMEÇAR A TODO VAPOR FUNCIONA, MAS SÓ ATÉ CERTO PONTO.
RODNEY ZEMMEL, MATT CUDDIHY E DENNIS CAREY
executivo-chefe do S&P 500 —, o que signiica que os
CEOs do nosso grupo tiveram permanência acima da
média. Em seguida, identificamos um subconjunto
cujas empresas superaram outras de seu setor quando
eles estavam no leme, ou que tiveram alto desempe-
nho de retorno total ao acionista. Conduzimos entre-
vistas detalhadas e estruturadas com 22 deles. Pergun-
tamos, por exemplo, como suas prioridades, mindsets
e abordagem de liderança haviam evoluído; em quais
movimentos estratégicos e organizacionais eles
haviam se concentrado na fase intermediária da ges-
tão; e o que gostariam de ter feito de forma diferente.
(Itai Miller e Harish Soundararajan nos ajudaram na
identiicação dos CEOs e na análise das respostas.)
Muitos de nossos entrevistados disseram não ha-
ver dividido conscientemente sua gestão em fases,
mas, depois de reletir sobre nossas perguntas, reco-
nheceram que ela tinha atos distintos, como uma pe-
ça teatral. E ficou claro que, assim como no teatro,
um primeiro ato de impacto não necessariamente ga-
rante o sucesso do segundo ato. “Existem diferenças

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MIRAGEC/GETTY IMAGES

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COMO CEOs DE SUCESSO ABORDAM O SEGUNDO ATO DA GESTÃO

signiicativas entre as fases iniciais da gestão do CEO, a marca na empresa. No médio prazo, à medida que as
fase intermediária e as etapas posteriores”, disse John coisas se tornam mais estáveis, a empresa corre o ris-
Chambers, CEO da Cisco (1995-2015), impressão esta co de voltar ao que Ellen Kullman, ex-CEO da DuPont
compartilhada por muitos outros líderes. “Meu estilo (2009-2015) chama de “o antigo normal”. Tendo as-
de gestão evoluiu em cada um dos estágios e tive de sumido a liderança durante a crise inanceira global,
me reinventar em cada um deles.” Kullman instituiu mudanças de portfólio e operação,
No início da fase intermediária — em geral após dois mas quando a crise passou, o ritmo das mudanças
ou três anos —, os CEOs de alto desempenho tomaram na empresa diminuiu. Ela então visitou fábricas e es-
uma decisão deliberada de redeinir sua abordagem, critórios em todo o mundo para reforçar a nova visão
fazendo uma nova investigação do contexto da em- e formou um grupo de planejamento corporativo
presa, reavaliando sua própria agenda e continuando a com o objetivo de empreender avaliações internas de
avaliar ativamente a empresa e a estratégia. “As empre- cada atividade. Nos anos intermediários como CEO,
sas tendem a ser câmaras de eco”, disse Frank Blake, Kullman dizia: “Você precisa incutir nas pessoas a von-
ex-CEO da Home Depot (2007-2014). “Você não conse- tade de focar nas transformações e alertá-las de que,
gue corrigir o rumo se não lembrar honestamente onde se não se mexerem, serão atropeladas”.
errou e, mais importante, por que errou.” Vários CEOs acharam difícil manter o ímpeto dos pri-
Encontramos cinco temas essenciais para o suces- meiros anos. “Reconheci que estava começando a jogar
so nos anos intermediários dos líderes: a importân- na defesa”, disse Paul Sagan, ex-CEO da Akamai Tech-
cia de redefinir as ambições para evitar a perda de nologies (2005-2013). “Há o risco de ser cauteloso por-
impulso; a necessidade de atacar os silos e proces- que, em tese, quanto mais sucesso você obteve, mais
sos que não funcionam; o imperativo de rejuvenes- você vai perder se exagerar na dose.” No entanto, espe-
cer talentos de liderança; a importância de construir cialmente em setores de alto crescimento como tecno-
mecanismos internos e externos para ideias disrupti- logia — onde basta um ciclo ruim de produto para per-
vas e discordantes; e a necessidade de lançar mão de der a liderança —, a reinvenção constante é essencial.
capital de liderança em iniciativas ousadas que possam É uma boa ideia rever os negócios regularmente co-
mo se fosse pela primeira vez. Há um famoso episódio
EM RESUMO em que Gordon Moore e Andy Grove, que lideraram a In-
tel nas décadas de 1980 e 1990, imaginaram que seriam
O PROBLEMA demitidos pelo conselho e se perguntaram o que fa-
Os novos CEOs geralmente se
concentram na implementação ria um novo CEO. Sua resposta surpreendente (mas acer-
de uma agenda e na conquista tada): esqueça os chips de memória — a tecnologia que
de alguns ganhos iniciais. havia deinido o negócio. Na mesma linha, Steve Burd,
Mas, frequentemente, essas ex-CEO da Safeway (1993-2013), contou que o conse-
iniciativas de abertura são
lho sugeriu que ele fosse trabalhar numa segunda-feira
seguidas por um segundo ato
que apresenta um estilo de como se fosse seu primeiro dia. “Isso me fez rejeitar a
operação diferente e um orientação existente, pegar uma folha de papel em bran-
novo conjunto de metas. co e desenvolver a próxima etapa da estratégia de cresci-
mento”, disse ele. Burd formulou um novo plano — fo-
A PESQUISA cado na reforma das lojas para melhor se ajustar ao estilo
Os autores identificaram 146
CEOs de empresas de grande de vida dos consumidores e no reposicionamento da
capitalização que saíram durante empresa em relação aos concorrentes —, fez uma gran-
o período entre 2011 e 2016 e ajudar a empresa a ter sucesso no de aquisição e lançou vários produtos derivados.
tiveram mandatos mais longos do longo prazo. À medida que ampliam suas aspirações e as de seu
que a média. Eles identificaram Além de reconhecerem esses pessoal, os CEOs devem se proteger contra o esgota-
um subgrupo de alto desempenho
e conduziram entrevistas temas especíicos, os líderes po- mento organizacional. “Segundo um princípio antigo,
estruturadas com 22 deles. dem encontrar valor em algo mais quando a grande engrenagem no topo da organização
simples: entender sua gestão co- faz meia-volta, as pequenas engrenagens precisam gi-
AS DESCOBERTAS mo uma série de capítulos, em rar quatro vezes”, disse Sandy Cutler, ex-CEO da em-
Durante seu segundo ato, CEOs de vez de um período ininterrupto. presa de gestão de energia Eaton (2000-2016). “As or-
sucesso trabalham para aumentar ganizações precisam ser cuidadosas no topo para não
o nível de ambição da empresa,
atacam silos e processos que mudar constantemente o plano de jogo.” Na Eaton,
não funcionam, rejuvenescem MANTENHA cujos negócios têm ciclos longos de produto, os pla-
talentos, criam mecanismos para SEMPRE ALTO O nos das unidades eram “certificados” em intervalos
discordância e investem capital NÍVEL DE AMBIÇÃO regulares de acordo com um conjunto central de pro-
político em apostas de longo No início da gestão, que pode cessos e benchmarks chamados Eaton Business Sys-
prazo. Com isso se beneficiam
ao ver seu mandato como uma ser um período tumultuado, os tem. “Eles sabiam quantos anos havia entre suas cer-
série de capítulos, em vez de CEOs tendem a abordar as ques- tiicações”, disse Cutler. “Nós deinimos tudo para que
um intervalo único. tões mais urgentes e a deixar sua as pessoas pudessem fazer planejamento plurianual

78 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


em termos de oportunidades de executivos de inanças não é apenas entregar números,
melhoria, recursos e gastos de ele lembrou os gestores. “O trabalho de vocês é ajudar
capital para evitar mudanças de seus colegas de negócio a obter as informações neces-
regras a cada 18 meses.” sárias para entender o que acontece no negócio deles.”
Em suma, pensar de forma É fácil para os novos líderes, que estão focados na
ambiciosa signiica continuar fa- perspectiva mais ampla, não prestar atenção nos prin-
zendo movimentos estratégicos cipais processos internos. Assim, à medida que os CEOs
que permitirão à empresa acom- entram no segundo ato, consertar as falhas no “siste-
panhar as mudanças em seu am- ma operacional” — o que pode signiicar qualquer coi-
biente — sem ter de fazer um per- sa, desde estabelecer procedimentos consistentes para
pétuo movimento de mudança. avaliação de talento até a sistematização da abordagem
orçamentária — deve se tornar uma prioridade. John
Lundgren, ex-CEO da Stanley Black & Decker (2004-
ATAQUE OS SILOS 2016), trabalhou com sua equipe para reinar e forma-
E PROCESSOS QUE lizar o sistema operacional da empresa, com ênfase na
NÃO FUNCIONAM medida do desempenho individual e na vinculação da
Os novos CEOs geralmente reco- remuneração a métricas-chave, como aumento de mar-
nhecem problemas organizacio- gem de lucro e ciclo de conversão de caixa. “Demos as
nais desde o início e fazem mu- ferramentas aos gestores”, disse ele. “Os objetivos eram
danças na estrutura e nos talentos a eiciência operacional e a eliminação da complexida-
envolvidos para lidar com eles. No de.” Demorou para fazer com que os sistemas fossem
entanto, quando se trata de abor- assimilados. Lundgren contou que um diretor do con-
dar práticas arraigadas — a forma de trabalhar mais selho lhe disse: “Você saberá que eles estão funcionan-
ampla e profundamente enraizada da empresa —, des- do quando, andando pela fábrica, você perguntar ao
cobrimos que os líderes dedicam mais tempo a elas du- primeiro supervisor de linha qual foi o capital de giro
rante a fase intermediária. naquela semana e ele for capaz de lhe responder”.
Tom Watjen contou que, quando chegou para as John Chambers observou que, na fase intermediá-
reuniões de alto nível na Unum, empresa de seguros ria de sua gestão, a Cisco criou “guias” para processos
na qual foi CEO (2003-2015), viu que seus 30 executivos como F&A. “Ser capaz de repetir de maneira rápida e
principais formavam “panelinhas” com seus colegas fácil um processo nos permitiu avançar rapidamente e
regionais e funcionais — “como em uma festa do ensi- em larga escala”, disse ele. Isso permitiu que Chambers
no médio”, disse ele. Foi essencial incutir coniança en- e sua equipe de ponta entrassem no processo de tran-
tre os grupos para que compartilhassem ideias e se con- sação em momentos bem mais esparsos. “Essa jogada
centrassem na competição externa, e não na interna.
“Mas você não pode simplesmente enviar um memo-
rando com a instrução ‘vocês precisam conversar en-
tre si’”, disse Watjen. “Você tem de encontrar pessoas
para quem é natural trabalhar em negócios diferentes.”
Os CEOs às vezes descobrem que, para impulsionar
as grandes iniciativas de mudança em seus primeiros
anos, precisam de bons assistentes. Mas, quando esses
assistentes são bem-sucedidos, eles se tornam defensi-
podia ser realizada com enorme velocidade — podería-
vos, até mesmo territoriais, com relação a suas vitórias,
mos decidir pela aquisição de uma empresa na quin-
criando dinâmicas que, a médio prazo, podem gerar
ta-feira e anunciá-la na segunda de manhã”, disse ele,
desconiança entre as diferentes partes da organização
acrescentando: “Agora, o CEO nem precisa se envolver,
e reforçar os silos. Para quebrar as barreiras e eliminar
exceto para se encontrar com o outro CEO”.
agendas conlitantes, vários líderes adotaram mecanis-
Esse ajuste ino operacional, embora vital para o de-
mos como estruturas de pagamento focadas em metas
sempenho da empresa, é praticamente invisível para o
corporativas gerais e não em resultados individuais.
público externo, até mesmo os investidores. O impacto
Para pôr abaixo os silos que separavam os três prin-
não aparece rapidamente no preço das ações nem cons-
cipais negócios da Unum, Watjen aproveitou a fase in-
titui uma “vitória” visível, o que pode explicar em parte
termediária para fazer uma “polinização cruzada” de
por que muitos CEOs deixam a tarefa em andamento.
ideias e experiências. Mudou executivos de unidade
e trabalhou para conectar as funções corporativas às
necessidades de cada negócio. Por exemplo, incenti-
vou a criação de métricas, como alocações de capital
REJUVENESÇA O TALENTO
A maioria dos novos CEOs reformula ou reorganiza a
e estruturas de despesas, que incentivaram as unida-
equipe de liderança. Líderes com sucesso de longo prazo
des de negócios a aumentar a eiciência. O papel dos

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 79


COMO CEOs DE SUCESSO ABORDAM O SEGUNDO ATO DA GESTÃO

COMO OS CEOs TEMPO MENOR QUE O ANTERIOR O MESMO MAIS

GASTAM SEU TEMPO ESTRATÉGIA /


MOVIMENTAÇÃO ESTRATÉGICA 6 31 63
NO SEGUNDO ATO P&D /
Os 22 CEOs entrevistados mudaram as INVESTIMENTOS DE LONGO PRAZO 31 69
prioridades quando chegaram ao meio de seu MUDANÇA
mandato. Quase 90% disseram que passaram ORGANIZACIONAL 33 33 33
mais tempo no planejamento de sucessão do F&A /
que antes; quase 80% dedicaram mais tempo TRANSAÇÕES 19 63 19
ao planejamento mais amplo de talentos; e AVALIAÇÕES DE
quase 70% se concentraram mais em P&D e DESEMPENHO DE NEGÓCIO 25 69 6
investimentos de longo prazo. Notavelmente, INTERAÇÕES COM
esses CEOs permaneceram atentos à STAKEHOLDERS EXTERNOS 44 56
atualização da estratégia e à capitalização INTERAÇÕES COM
de oportunidades. Embora o tempo gasto O CONSELHO 33 33 33
em análises de desempenho de negócios não PLANEJAMENTO
tenha mudado radicalmente, eles focaram em DE SUCESSÃO 12 88
questões diferentes durante essas avaliações: PLANEJAMENTO
mais na direção de longo prazo do que no AMPLO DE TALENTOS 23 77
desempenho atual.
NOTA POR CAUSA DO ARREDONDAMENTO, ALGUMAS CATEGORIAS NÃO SOMAM 100%

reconhecem que os ajustes devem continuar na fase in- Frits van Paasschen, ex-CEO da Starwood Hotels &
termediária. De fato, alguns entrevistados izeram mais Resorts (2007-2015), relembrou um momento ocorrido
mudanças executivas nessa fase do que no início. dois anos e meio após o início de sua gestão, quando,
“Um erro que muita gente comete é icar compla- depois de ter estabelecido um foco mais global e digi-
cente com a avaliação de talentos”, observou Edward tal, sentiu a necessidade de rever sua equipe de lideran-
Breen, ex-CEO da Tyco International (2002-2012), em- ça. Foi uma espécie de “processo de recrutamento”, ele
presa de sistemas de segurança. No primeiro ou se- disse, durante o qual ele se perguntou: “Essa pessoa
gundo ano, um líder se concentra em construir o time vai ajudar a nos levar adiante, considerando a estraté-
certo. Na fase do meio, “você conhece todo mundo, gia atual?”. Líderes naturalmente hesitam em tirar as
até as famílias”, ele disse. “Mas as pessoas passam por pessoas de suas posições, mas muitos dos entrevista-
fases diferentes, e determinada pessoa pode deixar dos lamentaram esperar demais para fazer mudanças.
de ser a pessoa certa ou ter perdido a energia.” Breen Durante o período intermediário, vários CEOs nota-
fez com que a Tyco avaliasse os principais líderes anu- ram a importância da transição de uma função predo-
almente. Ele perguntava a si mesmo: “Eu tenho uma minantemente de direção para uma de apoio e mento-
equipe que pode vencer o Super Bowl?”. O processo ria, a im de liberar o potencial latente da equipe. Em
foi formalizado e implantado em cascata por toda a essência, foi como se mudassem de capitão de time para
empresa, e todos os anos os líderes de todos os níveis coach. Van Paasschen, por exemplo, reunia-se frequen-
atuavam nas avaliações. A Tyco empreendeu também temente com líderes juniores que trabalhavam em pro-
avaliações operacionais mensais, o que Breen consi- jetos de longo prazo — não apenas para fornecer orienta-
derou uma excelente maneira de mensurar o grau de ção, mas também para mostrar a eles que podiam contar
ambição e os níveis de energia de sua equipe. com o seu apoio. Ele começou a trazer funcionários de
alto potencial em viagens às propriedades da Starwood
no exterior para expô-los às operações e fornecer opor-

VÁRIOS CEOs tunidades de interação informal. E ele promoveu uma


comunicação mais informal. “Passamos do progresso e

MUDARAM DA avaliações de KPI para uma conversa mais parecida com


a do coaching — ‘Como vai? ’; ‘De que você precisa?’.”
A maioria dos conselhos diz que eles começam a

FUNÇÃO DE DIREÇÃO desenvolver planos de sucessão de liderança — uma


parte importante do rejuvenescimento de talentos —

PARA UMA DE APOIO assim que um novo CEO entra na empresa. Mas em
nossa experiência e na de muitos líderes que entrevis-
tamos, o esforço realmente ganha força na fase inter-

E MENTORIA. mediária do CEO. Em meados de sua gestão como CEO


da McCormick & Company, fabricante de temperos e

80 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


aromatizantes, Alan Wilson fato, muitos líderes que entrevistamos mudaram as
(2008-2016) realizou uma pessoas que abordavam para pedir feedback durante a
avaliação detalhada de talen- fase intermediária em um esforço consciente para am-
tos um nível abaixo do CEO. pliar sua visão periférica. “A ideia é icar exposto e de-
“Para mim, era um proces- senvolver o reconhecimento de padrões em novas áre-
so de cinco anos”, ele disse. as”, disse o ex-CEO do eBay John Donahoe (2008-2015),
“Com relação às experiên- que passava pelo menos meio dia por semana com líde-
cias e habilidades que as pes- res fora de seu setor e círculo imediato. Em particular,
soas precisam desenvolver, ele procurou os empreendedores, trazendo seus insi-
é preciso pensar duas joga- ghts para o eBay enquanto os ajudava com suas preo-
das adiante. As pessoas que cupações de liderança. Brian Chesky, cofundador da
você identiica nos primeiros Airbnb, por exemplo, deu conselhos a Donahoe sobre
anos não são necessariamen- design, desenvolvimento de produtos e inovação, e
te aquelas que irão longe.” Donahoe ajudou Chesky em seus problemas de gestão.
“O resultado foi uma orientação mútua”, disse Donahoe.
Dito isso, a necessidade de mais colaboração externa e
CONSTRUA a busca por ideias disruptivas não signiicam carta branca
MECANISMOS para gastar tempo externamente. Vários CEOs alertaram
PARA IDEIAS que esse tipo de busca pode diluir o foco nos negócios.
DISRUPTIVAS E “Muitas vezes, as pessoas fazem a volta da vitória”, disse
DISCORDANTES Richard Anderson, ex-CEO da Delta Air Lines (2007-2016).
No segundo ato, os CEOs se “Quando você adiciona as mesas-redondas, câmaras de
preocupam em se tornar previsíveis ou em se fechar comércio, corretoras e palestras, de repente você se torna
para ideias novas. “Depois de três ou quatro anos, as CEO de meio período.” Anderson fez duas perguntas ao
pessoas entendem como você responde em diferentes escolher seus compromissos externos: Como isso ajudará
cenários”, disse Frank Blake, ex-CEO da Home Depot. a mim e à Delta? Quais são as alternativas de como gastar
“Todo mundo sabe o que você quer ouvir, então é isso
que eles dizem.” Assim como muitos outros com quem
falamos, ele se esforçou para evitar essa armadilha.
Por exemplo, no início de seu mandato, Blake havia
fechado diversos formatos de lojas com desempenho in-
satisfatório. As pessoas continuaram apresentando no-
vas ideias de formato, mas ele tendia a rejeitá-las. No
meio do seu mandato, os funcionários pararam de fazer
essas recomendações. Blake reconheceu que isso era um meu tempo? Toda semana ele revia os compro-
problema e tomou medidas para enfatizar sua abertura missos do ano com sua secretária. “Você tem
a ideias de todos os tipos. Ele começou a dedicar mais duas coisas: seu prazer e seu tempo”, disse ele.
tempo à comunicação interna promovendo reuniões e “Fiquei ótimo em administrar o calendário.”
jantares com funcionários da loja. Para estimular a fran-
queza, ele perguntava: “Parece que X não está indo mui-
to bem. O que você acha que está acontecendo?”. Com USE CAPITAL DE
frequência, diz ele, a pessoa dava um feedback franco. LIDERANÇA EM
Outros CEOs também encontraram maneiras de se INICIATIVAS CORAJOSAS
conectar com as raízes da empresa. Um deles se apoiava E DE LONGO PRAZO
em um gestor de projeto que estava conectado a redes Para alguns empreendimentos de vulto, co-
informais dos funcionários. Edward Ludwig, ex-CEO mo grandes aquisições sem retorno rápido,
da empresa de tecnologia médica Becton, Dickinson só um líder experiente pode reunir o apoio
(2000-2011), nos disse que reunia uma dúzia de pessoas necessário. Tendo usado seus primeiros anos
de coniança do nível abaixo de seus subordinados dire- para construir credibilidade junto ao conse-
tos, dava-lhes um resumo de duas páginas da estratégia lho, investidores e funcionários — e ter con-
da empresa e pedia contribuições honestas. “Você pre- iança em sua própria liderança —, os CEOs
cisa cercar-se de pessoas que estão dispostas a lhe dizer de sucesso podem realizar iniciativas estraté-
a verdade e a criar mecanismos pelos quais elas possam gicas arrojadas. “É sua função gastar o capital
lhe dizer a verdade”, disse ele. Tão importante quanto político e de liderança que você construiu pa-
isso “é demonstrar que você pode agir de maneira inte- ra assumir mais riscos”, disse John Donahoe.
ligente e não vai atirar no mensageiro”. “Finja que lhe sobram apenas três anos. O
É essencial que os CEOs busquem novas fontes de que você quer realizar? E que coisas você po-
consultoria nos diversos estágios de seu mandato. De de fazer de maneira única?”

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 81


COMO CEOs DE SUCESSO ABORDAM O SEGUNDO ATO DA GESTÃO

Vários CEOs izeram grandes apostas estratégicas descreveu as distintas fases na vida do adulto. Pro-
ou concluíram negócios transformadores em seus cesso similar se observa durante o mandato do CEO.
anos intermediários. Joe Papa, ex-CEO da farmacêuti- “Quando penso no meio do mandato versus o início,
ca Perrigo (2006-2016), contou que teve uma epifania vejo que as prioridades ficaram mais claras”, disse
ao dirigir para o trabalho e ver que um caminhão de John Russell, ex-CEO da Consumers Energy (2010-
entrega da Perrigo fazia o trajeto rumo a um cliente. 2016). “Quando você assume como CEO, muitas coisas
“Percebi que a questão central era como colocar mais precisam ser feitas. Você puxa e empurra as alavancas
produtos no caminhão, e isso me forçou a pensar so- o tempo todo. Depois de dois ou três anos, icou muito
bre como fazer isso”, disse ele. Essa percepção levou à claro para mim onde estavam essas alavancas e como
aquisição da PBM Holdings, uma fabricante de fórmu- usá-las com mais eicácia.”
las infantis, que Papa considera um dos negócios mais Como nossas entrevistas comprovam, o segundo
bem-sucedidos da Perrigo. “Fui capaz de fazer coisas ato do CEO não é apenas o momento de colher o que
mais ousadas no terceiro ano, porque tinha uma me- foi semeado nos primeiros anos — nem de continuar
lhor compreensão da verdadeira fonte de nossa vanta- fazendo o que trouxe sucesso em alguma outra época.
gem competitiva”, disse ele. Os líderes devem ter para com a empresa e para com

PEDIAM FEEDBACK EM UM
ESFORÇO PARA AMPLIAR SUA
VISÃO PERIFÉRICA.
Susan Cameron, que foi CEO da Reynolds American o mercado em que atuam uma visão renovadora e
por dois mandatos (2004-2011 e 2014-2017), usou a par- continuar evoluindo sua estratégia e a forma como
te do meio de sua primeira gestão para introduzir pro- abordam sua equipe. Eles não podem tirar o pé do ace-
dutos como cigarros sem fumaça e adquirir uma em- lerador, mas sim pressionar com mais força.
presa de terapia de reposição de nicotina. “No meio do Novos CEOs que veem seu mandato como uma
mandato você tem a oportunidade de conceber um em- série de capítulos e calibram sua abordagem para cada
preendimento diferente e depois fazer algumas aliena- fase provavelmente prosseguirão de maneira metó-
ções e aquisições para apoiar isso”, disse ela. “Uma vez dica. “No começo, eu achava que precisávamos fazer
que você tenha desenvolvido coniança em si mesma e tudo em dois ou três anos, mas depois percebi que
em sua equipe de ponta e esteja satisfeita com o plano a jornada é mais longa”, disse Brett White, ex-CEO
de negócios e o modelo operacional, você precisa so- da corretora imobiliária CBRE (2005-2012). “Então,
nhar e criar estratégias sobre o que poderia ser.” desenvolvi mais paciência. Em geral, é uma evolu-
De fato, descobrimos que quanto maior o tempo de ção, não uma revolução.” Ter paciência pode tornar
casa do CEO, mais ele ou ela tende a desviar a atenção sua empresa mais bem-sucedida — agora e depois
para as apostas que envolvem retornos de prazo mais de sua saída — do que as empresas de outras pes-
longo, mas podem ajudar a empresa a se antecipar às soas que tratam o trabalho como um único período
tendências e a se envolver com um conjunto mais am- não diferenciado.
plo de stakeholders. “Para Geoffrey Moore, é importan- HBR Reprint R1806C–P Para pedidos, página 10
te ter certeza de que os planos de longo prazo sejam re-
latados aos níveis mais altos da organização”, disse Paul RODNEY ZEMMEL é sócio-gestor da McKinsey em Nova York
Sagan, ex-CEO da Akamai. Para garantir que tais iniciati- e na região nordeste dos EUA, onde aconselha CEOs e
vas não fossem deixadas de lado por prioridades de cur- outros executivos seniores em questões de alta gestão. MATT
to prazo, ele explicou: “Tomei providências para que as CUDDIHY é sócio associado da McKinsey em Boston e líder das
apostas de longo prazo fossem reportadas a mim”. práticas de saúde e estratégia. DENNIS CAREY é vice-presidente
da Korn Ferry, onde é especialista em recrutamento de CEOs
e do conselho diretivo, e coautor (com Ram Charan e Dominic
EM SEU LIVRO SEMINAL Passagens — Crises previsíveis Barton) de Talent wins: the new playbook for putting people
da vida adulta (Círculo do livro, 1974), Gail Sheehy first (Harvard Business Review Press, 2018).

82 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


ESTUDO DE CASO 84
Reduzir o portfólio
de marcas?

E periência
JUNHO 2018

APÓS UMA GRANDE FUSÃO,


UMA EMPRESA HOTELEIRA
GLOBAL DEVE DECIDIR SE
MANTÉM OU SE INCORPORA
AS REDES ADQUIRIDAS. 84

ILUSTRAÇÕES DE MIGUEL MONTANER


JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 83
ESTUDO DE CASO
REDUZIR O PORTFÓLIO DE MARCAS?
APÓS UMA GRANDE FUSÃO, UMA EMPRESA
HOTELEIRA GLOBAL DEVE DECIDIR SE MANTÉM
OU SE INCORPORA AS REDES ADQUIRIDAS.
CHEKITAN S. DEV

O código de vestimenta mais


descontraído, ainda que proissional,
deixou Troy Freeman perplexo.
Como antigo CEO do grupo Otto Hotels & Resorts, agora a segunda CHEKITAN S. DEV é
maior empresa de hotelaria do mundo, ele já izera as malas para cente- professor de
marketing estratégico
nas de viagens de trabalho, mas como terno não era uma opção, ele esta- e de gestão de marcas
va enfrentando muito mais diiculdades. da School of Hotel
Seu voo para Carmel partia logo cedo, onde encontraria sua recém-am- Administration da Cornell
pliada equipe executiva para discutir a estratégia sobre o portfólio da University’s SC Johnson
empresa. A mediadora, Caroline Dvorjak, era professora de marketing e College of Business.
Os estudos de caso
experiente consultora. ficcionais da HBR
O Otto Hotels & Resorts acabara de efetuar a compra, no valor de US$ 9 apresentam problemas
bilhões, da Beekman Hotels, o que signiicava que agora o grupo contava enfrentados por líderes de
com aproximadamente 4.800 hotéis e pouco mais de 1 milhão de acomo- empresas reais e oferece
dações em cem países. Contudo, como a maioria das grandes redes, pou- soluções de especialistas.
Este é baseado no caso
cos desses estabelecimentos eram de sua propriedade; na verdade ele os “Marriott Starwood
franqueava e gerenciava. A maior parte dos imóveis pertencia a empresas Merger: Brand Portfolio
ESTUDO DE CASO independentes que licenciavam a marca Otto. O acréscimo das oito mar- Architecture”, ensinado
NOTAS DE AULA cas pertencentes à Beekman aumentava para 21 o número atual de empre- na Cornell.
Em 2015, a indústria
sas sob o comando do grupo Otto. A dúvida na cabeça de todos, especial-
hoteleira global abrangia
aproximadamente 16 mente na dos investidores, era como Troy administraria o portfólio bem
milhões de quartos em maior, em termos de posicionamento, faixa de preço e localização, sobre-
mais de 200 países: tudo com a sobreposição entre marcas já existentes e as adquiridas.
38% na Europa, 36% nas Durante as discussões do acordo, a diretoria do grupo Otto pedira a
Américas, 32% na Ásia
Troy que não se posicionasse sobre a estratégia da empresa depois da fu-
Pacífica, 4% no Oriente
Médio e na África. são. Ele dissera durante a reunião sobre os ganhos da empresa que o gru-
po “provavelmente” não precisava de todas as marcas, mas rapidamente
adicionara que não havia planos imediatos de reduzi-las. Ainda assim,
as pessoas estavam especulando e, agora, com o processo de compra
A compra do Starwood
inalizado, era hora de os gestores tomarem algumas decisões.
pelo Marriott, por cerca de
US$ 13 bilhões, finalizada Troy expulsou seu cachorro Tanker para fora da cama, pois queria dar
em 2016, tornou-se a uma olhada na roupa que havia separado. “Tem muita coisa aqui, Tank”,
maior transação da disse ele em voz alta. E riu. Ele precisou reorganizar seu guarda-roupa pa-
história da indústria ra participar de uma reunião na qual deveria encontrar uma maneira de
hoteleira; superou a
fazer a mesma coisa com as marcas do grupo Otto.
compra do Fairmont, do
Raffles e do Swisshotel, O celular de Troy tocou e ele viu que acabara de receber um e-mail de
feita pela Accor, por Meena Nair, CFO do grupo Otto. Caroline havia pedido a todos os 12 exe-
US$ 3 bilhões, em 2015. cutivos convocados para a reunião que enviassem um resumo de uma

84 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


página de suas opiniões acerca do para Khalil e para a Piper se essa fosse
portfólio do grupo — a ideia era evi- a decisão.
A indústria hoteleira não tar as políticas de bastidor que costu- “Porém”, prosseguiu Kent, “a ana-
é a única a enfrentar o mam surgir nessas situações — e este logia feita por Meena a respeito do Four
desafio de reduzir ou não era o da Meena. Seasons não se sustenta. O Regent es-
seu portfólio de marcas. Em uma eloquente argumentação tava na mesma faixa de preço, mas em
Grandes empresas de
em favor de manter as 21 marcas, ela uma área totalmente diferente. A situa-
bens de consumo como
a Procter & Gamble e a fazia referência à fusão do Four Sea- ção não era nem de longe tão complica-
Unilever, empresas de sons e do Regent. Ela airmava que era da quanto a nossa. E, com o tempo, ele
bebidas como a Diageo e possível que cada marca do Otto se passou a usar o nome Four Seasons.”
organizações alimentícias, mantivesse nadando em sua própria Khalil o interrompeu: “Para mim, é
como a Nestlé, tiveram
“raia”. Mudanças seriam dispendiosas, mesmo uma questão de recurso. Neste
dificuldades em situações
parecidas. e a Otto poderia cumprir a promessa de momento estamos colocando nossos
fusão sem elas. Ela e sua equipe pro- recursos em 21 grupos diferentes. E se
jetavam US$ 200 milhões de econo- passássemos a colocar em apenas 15 ou
mia anual, maior poder de negociação 10? Conseguiríamos fazer muito mais
com agências de viagem virtuais como com as marcas bem-sucedidas”.
Expedia e Priceline e a capacidade de “Ou você só quer um grupo Estratégias multimarcas
aumentar as receitas graças às vendas maior?”, perguntou Troy, sorrindo. em empresas possuidoras
complementares e às taxas de ocupa- “Claro que quero. Mas juro que isso de diversas marcas em
ção impulsionadas por um sistema de não tem a ver somente com a Piper. Tem uma mesma categoria
podem sofrer com a
reservas mais amplo — portanto, não a ver com a Otto como um todo. Se você deseconomia de escala.
haveria necessidade de reduções. observar como estão se saindo as mar- O grupo Otto levou em
Mas, ainda assim, ela parecia ser cas da Beekman, não está bom. Se as conta todos os custos
minoria no debate. Kent Brockman, incorporarmos do modo como estão, eventualmente ocultos?
CMO da Otto, e Khalil Salem, o gerente elas vão enfraquecer o portfólio. Está na
de marcas da Piper, a maior e mais lu- hora de acabar com o sofrimento deles.”
crativa marca da Otto, enviaram ha- “E dar suas propriedades para vo-
via poucas horas argumentos em cê?”, indagou Troy. Ele estava icando
prol da reorganização. irritado. O grupo Otto não teria com-
prado a Beekman para incorporar um
conjunto de marcas fracas de desem-
UM GRUPO MAIOR penho insatisfatório.
Assim que Troy passou pela seguran- “Exatamente! Ou podemos vender
ça na manhã seguinte, avistou Kent e as marcas mais fracas e usar o dinheiro
Khalil na ila da Starbucks. Ele não sa- para promover as marcas mais fortes.”
O desempenho dos hotéis bia que ambos estariam no mesmo voo. “Isso é possível”, disse Troy, pro- Alguns especialistas
é comumente medido Foi uma surpresa agradável. curando não alterar o tom de voz, argumentam que se livrar
pelo chamado índice Khalil e Kent eram aliados próximos “mas e se os novos proprietários com- de marcas deficitárias,
RevPar, calculado pela desde que Khalil ascendera para o car- petirem conosco e roubarem uma fa- decadentes, fracas ou
multiplicação do preço mesmo ligeiramente
go mais alto da Piper, cinco anos antes. tia do mercado? ” lucrativas para beneficiar
médio diário de um
quarto por sua taxa de Quando Caroline comentou que gos- Kent parecia notar a irritação de investidores significa que
ocupação ou pela divisão taria de evitar politicagens, Troy ime- Troy e disparou: “Não acho que ne- os recursos liberados
de sua receita total de diatamente pensou nos dois. Eles sem- nhum de nós diria que devemos nos podem ser utilizados para
hospedagem pelo número pre viram aquele negócio como uma livrar de todas as marcas da Beekman, impulsionar as marcas
de quartos disponíveis remanescentes e torná-
forma de expandir as marcas existen- certo?”. Khalil balançou a cabeça em las mais atraentes para
no período estudado.
tes da Otto. concordância. “Eles têm algumas boas os consumidores, o que
“Seja como for, acho que você sabe bandeiras. Só que é muito difícil admi- atende às expectativas
l nossa posição”, disse Kent. nistrar tantas. Deixar cada um nadar em de diversos investidores.
quer economizar. Rick e os sua raia pode fazer sentido do ponto de
embros da Beekman querem vista inanceiro, mas não aos olhos dos
a marca.” Ele se referia a nossos clientes. Nosso estudo mostra
rrero, o gerente da Eventar, que a maioria das pessoas não faz dife-
ede da Beekman e a empresa rença entre marcas. Piper ou Evenstar,
ecida com a Piper, por isso ela para elas é tudo a mesma coisa.”
vo a ser incorporado. Rick “Está certo”, disse Troy, “vamos
fato defendido sua marca, deixar de lado os esforços lobísticos
bém dissera que estava dis- por ora. Podemos discutir isso com
ar um passo atrás e trabalhar o grupo depois.”

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 85


ESTUDO DE CASO REDUZIR O PORTFÓLIO DE MARCAS?

Khalil claramente tinha mais coisas propósito. O grupo Otto precisava con-
a dizer, mas ele entendeu a mensagem. servar o maior número possível de
estabelecimentos.
“Acho que os proprietários vão im-
“Bandeira” é um jargão
hoteleiro para marca.
EM CARMEL plorar para icar”, Kent replicou. “Eles
Os assentos escolhidos na mesa de con- economizarão em compras, reservas
ferência reletiam a posição dos partici- e taxas de agenciamento e, em última
pantes em relação à questão do portfó- instância, terão maior poder de pre-
lio. Os gerentes da Beekman estavam ços, pois controlamos grande parte dos
todos de um lado. Eles tinham interes- quartos em seus mercados.”
se pessoal na decisão, claro — queriam “Essas são as vantagens alegadas,
manter o emprego —, mas também ex- mas ainda não se transformaram em
puseram sólidos argumentos corpo- realidade”, disse Meena.
rativos contra os cortes; para eles, isso “Ainda é cedo”, respondeu Troy.
eliminaria importantes fontes de ren- E ela continuou: “Tudo bem, então
da. Meena sentou-se com eles, bem ao vamos falar sobre o preço das ações. A
lado de Rick. última pesquisa mostrou que, na maio
Do outro lado estavam Kent, Khalil, parte dos casos, portfólios escassos
outros gerentes da Otto e Anita Dineen, prejudicam o valor”.
COO do grupo que apoiava a restrutura- “Mas os investidores têm respondi
ção para facilitar o trabalho de sua equipe. do muito positivamente à aquisição”,
Caroline deu início à reunião. Pediu disse Kent. De fato, o setor cresceu
a todos que resumissem seus pontos 80% desde a concretização do negócio,
rincipais para que ela os registrasse na e a Otto encabeçou o aumento. “É evi-
usa em forma de palavras-chave. dente que eles não estão preocupados
“Precisamos de uma arquitetura de com a consolidação.”
ca que os clientes, donos de ho- “Certo”, comentou Khalil. “Além do
u mesmo nossos empregados não mais, são estudos sobre bens de con-
m confusa”, comentou Anita. sumo, uma situação completamente
e temos está uma bagunça.” diferente.”
ue temos é uma escala, que é “Mas não os consideraria irrelevan-
exatamente o que queríamos com es- tes”, disse Caroline entrando na briga.
te negócio”, respondeu Meena. “Mas “Devemos aprender com outros seto-
estou feliz que você tenha trazido os res. Isso posto, existem indícios que
proprietários. Não conversamos ainda comprovam os dois lados aqui: casos
sobre o impacto que isso acarreta.” Rick que indicam ser um erro gigantesco
e seus colegas assentiram, e Caroline acabar com marcas que valem milhões
a encorajou a falar mais. de dólares, e outros que mostram que, Programas de fidelidade
acrescentam outro
“Há somente uma quantidade li- quando se tenta administrar um port- complicador. Quando você
mitada de lugares onde podemos abrir fólio tão grande de marcas similares, is- põe fim a uma marca,
outro Piper”, disse Meena. Em alguns so leva, inevitavelmente, ao fracasso. corre o risco de perder
casos, a Otto havia cedido aos donos A pesquisa não vai decidir por você.” clientes que eram leais a
dos hotéis Piper exclusividade para de- “Acho que já sabíamos disso”, co- ela, e, como mostram as
experiências pós-fusão de
terminados mercados, e esses contra- mentou Troy. empresas aéreas, não é
tos os impediam de instalar outra ban- “Porém uma coisa que a pesquisa tarefa fácil fazer com que
deira da Piper nessas áreas. nos mostra com clareza é que é melhor consumidores migrem de
Rick manifestou-se: “Sim, ouvi- tomar uma decisão o quanto antes”, um programa para outro.
mos muitos proprietários nervosos. continuou Caroline. “Os investidores
Se acabarmos com a marca Evenstar, estão esperando para ver o que você vai
eles podem pôr im à parceria que têm fazer, e você tem uma equipe entusias-
Como os hotéis são conosco e se associar ao Hilton ou a mada…” — isso provocou risos — “…
geralmente propriedade outro concorrente. Nós vamos perder que aguarda suas ordens.”
de uma entidade e são estabelecimentos”. Todos concordaram, mas Troy
comercializados por
Fez-se silêncio na sala por um mo- icou imaginando se eles iriam apoiá-lo
outra, decisões acerca
da eliminação de uma mento. Todos sabiam que esse era um independentemente da decisão
marca costumam ser assunto espinhoso para Troy e para que tomasse.
complexas. Proprietários a diretoria. A compra da Beekman ti- “Então”, disse Kent, “você ainda
que investiram na marca nha como objetivo uma rápida esca- segue sendo a Suíça ou está pronto pa
existente podem se opor VEJA COMENTÁRIOS NA
lada, e perder hotéis destruiria esse ra escolher um lado?” RÓXIMA PÁGINA
a mudanças.

86 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


A OTTO DEVE NÃO HÁ NECESSIDADE de o grupo Otto redu-
zir seu portfólio. Na verdade, ter um con-
para que você possa ter duas marcas que
seus clientes adoram.

MANTER TODAS AS junto tão grande e variado de marcas só


beneiciará a empresa, pois lhe permitirá
Depois que a fusão estiver inalizada, o
grupo Otto deve se concentrar em oferecer

SUAS 21 MARCAS dominar o mercado tanto nas grandes cida-


des como nas pequenas. A soma das 21 ban-
um nicho próprio para cada marca. Acredi-
to no poder das marcas; acredito também

OU REDUZIR O deiras é maior do que as partes — ter marcas


adicionais proporcionará ainda mais valor
que as pessoas podem ser iéis a várias de-
las ao mesmo tempo. No entanto, Troy e

PORTFÓLIO? do que os quartos de hotel e as proprieda-


des que o grupo Otto adquiriu do Beekman.
sua equipe também devem se lembrar de
que, para muitos clientes, os hotéis são co-

OS ESPECIALISTAS A distribuição hoteleira é uma das prin-


cipais estratégias que ajudam as empresas
mo uma commodity; essas pessoas não vão
se importar se estão se hospedando em

RESPONDEM desse ramo, como a Otto, a prosperar. So-


mente um número limitado de hotéis pode
fazer parte de qualquer mercado, e ter mais
um Piper ou em um Evenstar caso o preço
seja justo.

estabelecimentos aumenta as chances de o


cliente decidir hospedar-se em um de seus SOMENTE UM NÚMERO LIMITADO
hotéis. Se um Piper já existe em determina-
da cidade ou em saída de rodovia, a empre-
DE HOTÉIS PODE FAZER PARTE DE
sa pode trabalhar com os seus atuais donos QUALQUER MERCADO, E TER MAIS
na região para incluir um Evenstar. Por que ESTABELECIMENTOS AUMENTA AS
você vai icar parado vendo um concorrente CHANCES DE O CLIENTE DECIDIR
construir ali? Ou, pior ainda, por que deixar
de fora os donos de hotel já estabelecidos e
SE HOSPEDAR EM UM DE SEUS
forçá-los a se associar com um concorrente? ESTABELECIMENTOS.
A mesma lógica se aplica à experiên-
cia de compras online dos clientes. Quanto
mais marcas da Otto aparecerem nos resul- O grupo Wyndham tem 20 marcas de
tados de pesquisas feitas pelo usuário em hotel e, em vez de desintegrá-las, a organi-
sites como o Expedia ou em um sistema de zação acha maneiras de torná-las atraen-
reserva corporativa, maiores as chances de tes para diferentes tipos de consumidor.
o consumidor escolher um deles. Pense na O grupo hoteleiro procura também ter o
maneira como as empresas de bens de con- maior número possível de estabelecimen-
sumo levam em conta os espaços nas pra- tos. Se você estiver passando pela rodovia
teleiras — a ideia é maximizar o número de Interestadual 95, queremos que veja um
suas marcas vistas pelo público. de nossos hotéis — um Days Inn, um Super
Não concordo com a analogia “cada um 8, um Howard Johnson, ou um Microtel
em sua raia”. Claro, as marcas não devem — em cada uma das saídas e em todos os
trombar umas com as outras; o nado deve pontos de cada cruzamento.
ser sincronizado. Se o Piper e o Evenstar são Troy deve se preocupar menos em criar
similares, encontre uma maneira de dife- confusão e mais em criar uma narração
renciá-los — crie certa distância entre eles para seu portfólio e um programa de ide-
lidade que claramente transmita para seus
hóspedes os benefícios de gastar seu di-
nheiro no Otto. Isso dará aos clientes um
motivo para escolher qualquer uma de su-
as marcas em vez de uma dos concorren-
tes, mesmo que isso signiique gastar um
pouco mais ou dirigir mais quilômetros.
Khalil, Kent e Rick precisam parar de
NOAH BRODSKY É CHIEF brigar internamente sobre quais marcas
são mais fortes e quais não são. Em vez
BRAND OFFICER DO WYNDHAM. disso, devem aprender a permitir que to-
ANTERIORMENTE, ELE das elas coexistam. Está na hora de apon-
ADMINISTROU O PROGRAMA DE tar os canhões para o lado de fora, de con-
VANTAGENS DO WYNDHAM E FOI centrar-se nos concorrentes. Se izerem is-
VICE-PRESIDENTE DE MARCAS so, todos icarão em melhor situação.
DOS HOTÉIS SHERATON.

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 87


ESTUDO DE CASO REDUZIR O PORTFÓLIO DE MARCAS?


COMENTÁRIOS DA
COMUNIDADE HBR.ORG
ANNICK DESMECHT ADMINISTRA SUA PRÓPRIA
EMPRESA DE CONSULTORIA. ANTERIORMENTE Unam-se onde quer que
TRABALHOU NA SAMSONITE, WWRD, PROCTER & esteja o crescimento
GANBLE E MCKINSEY. A equipe de Troy está
se comportando muito
territorialmente. Meena
está concentrada nos
ACHO QUE TROY e sua equipe devem en- o grupo Otto queira oferecer as maiores fa-
orçamentos; Anita,
frentar este problema de maneira diferen- tias para suas marcas mais caras (ainda que
pensando em simplificar
te. Em vez de considerarem o portfólio não ofereçam as maiores receitas) e assim
as operações; e a ideia
existente — que provavelmente foi rapi- criar uma associação positiva de marcas
de Khalil é construir um
damente montado por meio de aquisições junto aos consumidores. Administrada cor-
império, mas o que o move
menores ao longo de várias décadas — e retamente, isso ainda pode criar um efeito
é muito mais o ego do que
decidir o que reduzir, eles devem pegar halo para suas outras marcas.
a análise. Troy precisa
um papel em branco, esboçar uma nova Quando ingressei na Samsonite, logo
alertá-los de sua agenda
arquitetura de marcas fundada nas neces- depois de três empresas de capital privado
em comum: crescimento.
sidades atuais dos clientes e, com base ne- terem comprado a empresa, seu portfólio
Em vez de brigarem entre
la, mapear as marcas que possuem. incluía outras sete marcas; algumas eram
si, devem se concentrar nos
O tamanho desta fusão é uma ótima inteiramente nossas, ao passo que outras
hóspedes, proprietários e
oportunidade para reavaliar tanto o mer- nós licenciávamos. A Samsonite era a mais
empregados porque, em
cado quanto o negócio em si. Que seg- conhecida dos consumidores, mas as pes-
última instância, eles é que
mentos a empresa quer atender? O que as soas pareciam ter problemas em distin-
vão determinar se a fusão
pessoas querem de seus hotéis? Uma pes- gui-la da American Tourister, outra de nos-
será bem-sucedida.
quisa assim deve fundamentar a elabora- sas marcas. Decidimos direcionar global-
Jonathan Knowles
ção de um portfólio que aborde o espec- mente a Samsonite para um público de
CEO, Type 2 Consulting
tro mais amplo possível de consumidores maior poder aquisitivo, o que signiicou
inais, com uma grande variedade de fai- tirá-la de varejistas que vendiam seus pro- Reduzir o catálogo
xas de preço (tendo como base seu novo dutos em uma faixa de preço mais baixa. A A indústria de hotelaria
tamanho, o Otto pode operar em todos os equipe de vendas dos Estados Unidos acha- tem experimentado uma
níveis: mais caros, intermediários e mais va que haveria uma reação negativa, e al- explosão de redes. Possuir
baratos), localizações (algumas marcas po- gumas lojas realmente chegaram a cogitar mais marcas sob um
dem se concentrar nos executivos globais barrar a American Tourister caso não con- comando neste ambiente
em viagem, outras nos representantes co- seguissem comprar produtos da Samsonite. não é uma estratégia
merciais em viagem regional pelos Esta- Mas foi a decisão correta, porque com isso vencedora; ela dilui a fatia
dos Unidos) e motivos para escolher deter- o preço da Samsonite em todo o mundo de mercado de cada uma
minada acomodação. subiu, e, por im, o mesmo ocorreu com das marcas. O grupo Otto
Cada uma das 21 marcas precisa então o valor da empresa. deve ter como meta reduzir
deinir sua razão de existir dentro da nova Se marcas são administradas como feu- seu portfólio em 25%.
estrutura. Isso de alguma maneira inluen- dos individuais, isso leva a conlitos inter- Giulio Stix
cia positivamente as decisões de compras nos. Quando passei a trabalhar na Water- Diretor de equipe de vendas
de seu público-alvo? Ou é somente um no- ford Wedgwood (atualmente WWRD), por Belmond - Itália e Mallorca.
me em cima da porta? As marcas com os exemplo, cada marca possuía seu próprio
Mantenha, por ora,
maiores lucros devem ser cultivadas. Ou- CEO, CFO, diretor de estoque e até partes do
as marcas
tras podem ser substituídas sem o risco de prédio — com diferentes cartões de acesso!
O grupo Otto deve manter
perder clientes. E, claro, algumas devem É isso que Troy quer evitar, talvez colocando
todas as 21 marcas e, com o
ser descartadas. todas as marcas que lidam com clientes pa-
passar do tempo, reavaliar
Minimizar a sobreposição neste novo recidos sob uma mesma equipe de liderança
o desempenho delas sob
portfólio é essencial, por isso é provável para que todos comecem a trabalhar juntos.
a nova direção. Reduzir
que existam menos marcas depois deste Em última instância, a Otto precisa de
agora pode mostrar para
exercício. Várias podem acabar tornan- um portfólio uniforme que tenha um nú-
o mercado que Troy não
do-se submarcas de uma bandeira mais mero menor de bandeiras , mas mais va-
pensou com cuidado no
importante. Mas não faz sentido manter liosas. E Caroline está certa ao airmar que
processo pós-fusão.
todas, pois não há muitos benefícios em seus líderes devem agir rapidamente. Inves-
Saqib Shakil
competir consigo mesmo. tidores, donos de hotel e empregados têm
Analista sênior
As marcas remanescentes no portfólio de saber o quanto antes o que esperar da
Vanguard
possivelmente não receberão o mesmo in- empresa recém-fundida.
vestimento em marketing. É provável que HBR Reprint R1806D–P Para pedidos, página 10

88 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


RESUMO DA EDIÇÃO JUNHO 2018

FOCO
COMO GERIR O #METOO
A onda internacional
de acusações de assédio
sexual pode mudar para
sempre a forma como
homens e mulheres
trabalham juntos. Mas a
mudança não diz respeito
apenas aos homens, nem
apenas às mulheres —
e sim a todos nós.
pág. 17 E AGORA?
As mídias sociais criaram um momento notável para as mulheres,
mas será que a cultura do assédio chegou realmente ao fim?.
Diga adeus ao mundo onde os homens podem tratar o local de trabalho
como uma festa da faculdade ou uma sessão de pornografia. Desde que
Harvey Weinstein, produtor de Hollywood, foi acusado de má conduta
sexual em outubro de 2017, surgiram alegações similares sobre quase
uma centena de poderosos. São nomes que você provavelmente conhece,
na mídia, tecnologia, hotelaria, política e entretenimento. O momento
é um divisor de águas para a igualdade e segurança no local de trabalho:
87% dos americanos apoiam a política de tolerância zero ao assédio sexual.

QUEBRANDO QUE PENSAM SEUS


O SILÊNCIO COLABORADORES
Como tornar a conversa
sobre assédio mais fácil
SOBRE O ASSÉDIO?
para todos. PERGUNTE A ELES
Guia prático de pesquisa
com funcionários.

HBR Reprint R1806A–P

JUNHO 2018 HARVARD BUSINESS REVIEW 89 


ARTIGOS ESTUDO DE CASO
OPERAÇÕES LIDERANÇA

COMO FAZER COM


QUE OS HOMENS
SE MANIFESTEM
Uma cartilha para homens
que querem ser aliados.

DESENVOLVIMENTO COMO CEOs DE REDUZIR O PORTFÓLIO


AGILE EM ESCALA SUCESSO ABORDAM DE MARCAS?
QUEM É ASSEDIADO
Darrell K. Rigby, Jeff
Sutherland e Andy Noble
O SEGUNDO Chekitan S. Dev | pág. 84

E COMO? pág. 66 ATO DA GESTÃO Como antigo CEO do grupo Otto Hotels
& Resorts, agora a segunda maior
Rodney Zemmel, Matt
Pesquisas longitudinais Quando corretamente im- Cuddihy,e Dennis Carey empresa de hotelaria do mundo,
expõem a prevalência e plementadas, as equipes de pág. 76 ele já fizera as malas para centenas
os motivos do assédio. inovação agile quase sempre de viagens de trabalho, mas como
apresentam maior produtivi- Todos os líderes sabem da terno não era uma opção, ele estava
dade, acesso mais rápido ao importância de seus primei- enfrentando muito mais dificuldades.
mercado, melhor qualidade ros cem dias ou dos primei- Seu voo para Carmel partia logo
e menor risco que as abor- ros anos (o primeiro ato) na cedo, onde encontraria sua recém-
dagens tradicionais. E se função — o período durante ampliada equipe executiva para
uma empresa tivesse de lan- o qual precisam avaliar e discutir a estratégia sobre o portfólio
çar dezenas, centenas ou até diagnosticar, formular uma da empresa. A mediadora, Caroline
ADAPTAÇÃO À NOVA milhares de equipes agile? visão e uma estratégia e Dvorjak, era professora de marketing
e experiente consultora.
PAISAGEM DE RISCO Segmentos inteiros da em-
presa conseguiriam apren-
obter as primeiras conquis-
tas. Inúmeras são as orien- O Otto Hotels & Resorts acabara
No tribunal da opinião der a operar dessa forma? tações sobre como os CEOs de efetuar a compra, no valor de
pública, as exigências legais Por mais atraente que nos meses finais (tercei- US$ 9 bilhões, da Beekman Hotels,
não são tão importantes essa perspectiva seja, ro ato) no desempenho de o que significava que agora o grupo
quanto a percepção de que transformá-la em realidade suas atividades deveriam contava com aproximadamente 4.800
os resultados foram justos. pode ser desafiador. Mui- abordar suas principais hotéis e pouco mais de 1 milhão de
tas vezes, as empresas têm responsabilidades: ajudar acomodações em cem países. Contudo,
dificuldade em saber quais a desenvolver e selecionar como a maioria das grandes redes,
funções devem ser reorga- o sucessor e depois sua- poucos desses estabelecimentos eram
nizadas em equipes agile vemente entregar o poder. de sua propriedade; na verdade ele
os franqueava e gerenciava. A maior
O MAU multidisciplinares e quais
não devem. E não é raro
Mas pouca atenção foi da-
da ao tempo intermediário. parte dos imóveis pertencia a empresas
COMPORTAMENTO lançar dezenas de novas
equipes agile somente para
Como os CEOs se compor- independentes que licenciavam a marca
Otto. O acréscimo das oito marcas
PODE SER EVITADO vê-las estranguladas pela
tam durante esse segun-
do ato? pertencentes à Beekman aumentava
Gerencie funcionários de lentidão da burocracia. Os autores entrevistaram para 21 o número atual de empresas
alto risco e elimine os Os autores, que estuda- longamente ex-CEOs de alto sob o comando do grupo Otto. A dúvida
problemas antes que eles ram a expansão da inova- desempenho. Entre outras na cabeça de todos, especialmente
apareçam. ção agile em centenas de coisas, perguntaram-lhes na dos investidores, era como Troy
empresas, revelam o que como suas prioridades, administraria o portfólio bem maior,
aprenderam sobre a forma mentalidade e abordagens em termos de posicionamento, faixa de
como implantá-la eficaz- evoluíram no segundo ato. preço e localização, sobretudo com a
mente. Os próprios líderes Cinco temas surgiram co- sobreposição entre marcas já existentes
e as adquiridas.
O TRABALHO devem utilizar as metodolo-
gias ágeis e criar uma taxo-
mo fundamentais para o
sucesso. Os líderes devem HBR Reprint R1806D–P
APÓS #METOO: nomia de oportunidades pa-
ra estabelecer prioridades
continuar a aumentar o ní-
SUAS PERGUNTAS e escalonar a jornada em
vel de ambição da empresa,
atacar os silos e processos
RESPONDIDAS pequenos passos. As áreas
de atividade deveriam ser
interrompidos, rejuvenescer
talentos, criar mecanismos
Mesa-redonda de P&R com moduladas e depois perfei- para reavivar ideias dissi-
especialistas da HBR tamente integradas. As fun- dentes e disruptivas e gas-
Pela equipe da Harvard ções que não fossem reor- tar seu capital de liderança
Business Review ganizadas em equipes ágeis acumulado em ações auda-
aprenderiam a operar com ciosas de longo prazo.
os valores agile. HBR Reprint R1806C–P
HBR Reprint R1806B–P

90 HARVARD BUSINESS REVIEW JUNHO 2018


e fi ci ên ci a

(substantivo feminino)
   

1 Do latim EFFICIENTIA. Competência,


habilidade de produzir o efeito desejado.

2 Característica inerente às empresas em


constante transformação e que têm a percepção
dos benefícios e soluções que um serviço em
nuvem bem gerenciado e alinhado à estratégia
do seu negócio pode trazer. Mudança na forma
tradicional de pensar os recursos de TI, incluindo
o capital investido, para aumentar velocidade,
escala, produtividade e facilidade.

Termos relacionados: acelerar a transformação digital,


cloud transformation, tecnologia em nuvem,
implementação estratégica dos benefícios digitais,
arquitetura da informação.

O mundo pede novas leituras.


www.pwc.com.br/imperativos-negocios

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O termo “PwC” refere-se à PricewaterhouseCoopers Brasil Ltda. de firmas membro da PricewaterhouseCoopers, ou conforme o contexto
determina, a cada uma das firmas membro participantes da rede da PwC. Cada firma membro da rede constitui uma pessoa jurídica
separada e independente. Para mais detalhes acerca do network PwC, acesse: www.pwc.com/structure

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