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FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO: OBJETIVOS E PERSPECTIVAS*

STEFANY RETTORE GARBIN**

O livro Filosofia da Educação: Construindo a Cidadania, de Antonio Joaquim Severino


(1994), da coleção “Aprender & Ensinar”, é uma reposta para a situação problema em que se
encontra a educação. O livro apresenta métodos, atividades e conteúdos que explicam desde a
situação atual da educação, suas mediações e relações com poder, cultura, trabalho, cidadania,
até os rumos que a educação tende a seguir e quais os verdadeiros objetivos que os
educadores devem buscar. Severino é doutor em Filosofia e professor de Filosofia da
Educação na Universidade de São Paulo.
Em um primeiro momento o autor procura mostrar como se dá a formação dos
educadores. Ele aponta as necessidades de vários núcleos de aprendizagem para que o
professor compreenda o sentido de sua atuação. Por último, ele apresenta o núcleo filosófico,
nele estão presentes questões que as ciências da educação não abrangem: conhecimento,
valores e condição de existência humana. Severino critica a sua pouca ou nenhuma aparição
nos currículos de Licenciatura. Após uma explicação sobre a tridimensionalidade do processo
educacional, ele comenta que os atuais currículos de formação de educadores não são
suficientes para que sejam alcançados os objetivos na formação de educador.
Antes de mostrar os objetivos na formação e prática do professor, o autor relembra o
papel da própria Filosofia. Ele expõe as três principais correntes da disciplina e sua ação sobre
a educação. O caráter essencialista da Filosofia, que é forma metafísica de pensar e a visão da
educação como atualização das potencialidades humanas. Posteriormente, o caráter
naturalista, o modo científico de pensar e ensinar. E por ultimo, a inserção deste homem
metafísico e natural no contexto histórico e social. Onde o sujeito passa a ser objetivado e a
educação é vista como processo de formação de uma nova consciência. A partir disso, ele
propõe uma visão antropológica da Filosofia, sendo esta a busca da condição humana em seu
contexto histórico. Pois, segundo ele, não se pode pensar o homem como modelos da natureza
ou da metafísica, é preciso vê-lo sob mediações histórico-sociais. Assim o autor apresenta a
importância da filosofia da educação nas grades curriculares para o crescimento humano do
educador. Posto isso, ele retorna à tríplice tarefa da Filosofia: de formação política, cientifica
e filosófica. Para ele, o professor precisa ter extremo domínio destes conhecimentos para ser
capaz de educar.
No entanto, o autor pensa que é preciso compreender também as relações de mediação
que o homem estabelece. Ele sugere que pensemos o ser humano através de sua prática e
questiona a confusão que por vezes é feita, entre subjetivo e real. Dito disso, ele apresenta as
três faces das práticas dos homens: o agir sobre a natureza o relacionar-se com o semelhante,
a representação simbólica da realidade e a intencionalidade da própria prática. Sendo essa
última mediadora de todas as outras. Segundo ele, saber o que é o homem é caracterizá-lo
através das práticas que ele desenvolve nessas três dimensões. Mas ele aponta que, apesar de a
vida ser baseada na produção e na comunicação simbólica, para que elas se desenvolvam é
preciso também infra-estrutura econômica e social.
Para melhor compreendermos o lugar da educação nessas três dimensões apresentadas,
o autor as desenvolve nos capítulos seguintes.
Iniciando pelo agir sobre a natureza, ou seja, as relações de trabalho, o autor pensa que
o homem se caracteriza por aquilo que faz e produz. Ele argumenta que também a educação
estabelece relação com o trabalho, pois ela é uma forma de trabalho, uma preparação para
esse, e é mediada por trabalho. Esta ultima relação é de extrema importância, pois é através da
prática que se educa. Do impasse nessa relação ele aponta o surgimento dos problemas da
didática: que meios utilizar, que atividades fazer, como trabalhar. O autor nos leva então a ver
a educação não como uma relação método/prática, mas sim educador/educando.
Dada a importância das relações de prática do trabalho, o autor parte para uma visão
da educação como trabalho. Ele inicia explicando que, sendo uma forma de trabalho
assalariado e estando dentro do contexto histórico e social capitalista, os professores sofrem
as mesmas influências das outras profissões e precisam dominar o conhecimento teórico e
cientifico, pois isso lhes é cobrado tanto quanto em outras áreas. Mas o educador precisa
também de um compromisso político e de sensibilidade ética. Ele ressalta a importância da
Didática nos currículos de formação e como instrumento de trabalho, pois sem ela o
conhecimento do professor se torna inútil, já que ele não encontra meios de passá-los aos
alunos. Segundo o autor, o trabalho do educador tem por objetivo principal inserir o educando
no contexto de mediações histórico-sociais citadas anteriormente.
Além do trabalho, Antônio também afirma que o homem só existe à medida que se
efetiva em sociedade. Portanto, todas as relações estabelecidas por ele pressupõem um
contexto social. Porém há uma característica especifica da nossa sociedade no que diz respeito
à organização: o poder. Para o autor essa hierarquização acontece porque o poder econômico
transforma-se em poder político ao passo que domina os sujeitos produtores. Tendo o poder
político essa classe impõe também as suas ideologias. O autor coloca que a prática
educacional corre o risco de alienar e submeter seus participantes, pois a educação nada mais
é do que uma prática intencionalizada e tem ação sob a subjetividade do educando. É por
meio dela que o indivíduo se envolve dos conteúdos culturais de seu grupo, e é através da
escola que a sociedade reproduz a sua cultura. Segundo Severino, as escolas são aparelhos
ideológicos e é por meio dela que se perpetuam as ideologias. Desse modo, a escola acaba
reforçando os processos de dominação da sociedade. Mas confrontando esse reprodutivismo o
autor afirma que ao mesmo tempo em que a escola é um aparelho ideológico ela é também o
principal meio de contra-ideologia.
Para entendermos a importância dessa cultura simbólica, e as implicações que ela tem
na educação e vice-versa, Severino inicia explicando que a prática simbolizadora do homem
esta ligada as práticas produtivas e sociais, ao passo que dão sentido as ações humanas. O
conjunto de resultantes das atividades produtivas, sociais e simbólicas é a cultura. Também a
educação é mediada pela cultura simbólica. Ela prepara o aluno para a prática social e do
trabalho com o intuito de desenvolver a subjetividade do educando, para que ele incorpore e
crie cultura simbólica.
Ele dá atenção também ao papel político da educação. Ela pode ser vista a partir das
relações entre cidadania e democracia, que são extremamente ligadas e se perpassam. Ele
explica que nos tornamos cidadãos conforme o quanto podemos usufruir dos bens materiais,
simbólico e políticos. Já a democracia é a mesma exigência, mas do ponto de vista da
sociedade. Severino pensa que, sendo a educação a responsável por inserir jovens no trabalho,
na subjetividade e nas relações políticas ela é a principal mediadora dos processos de
construção da condição de cidadania e democracia. No entanto, o grande desafio dos
profissionais da educação é como fazer isso sem degradar, submeter à opressão e alienar os
alunos.
Severino também evidencia a relação entre individuo e o grupo. Ele relembra que a
educação só se torna eficaz se os sujeitos envolvidos nela tiverem consciência de que ela se
desenvolve como uma pratica político-social. Essa analise e especificação dessas relações é
papel das Ciências Sociais que fornecem subsídios para que o educador entenda a educação
em sua totalidade. O autor delimita então como papel da Sociologia da Educação evidenciar
as relações do processo educacional com os outros processos sociais, e como papel da
História da Educação compreender como o desenvolvimento educacional se desenvolve
estando articulado aos desenvolvimentos econômico, político e cultural. Sendo essas duas
áreas de extrema importância na formação dos educadores.
A seguir, ele aborda a questão da subjetividade dos indivíduos envolvidos no
processo educacional e mostra a importância dos conhecimentos da Psicologia para a
formação e para o trabalho do educador. Segundo ele, a Psicologia da Educação possibilita
um melhor entendimento do processo de desenvolvimento das crianças e adolescentes,
permitindo uma melhor interação entre professor e alunos. Porém o autor alerta que o
educando não deve ser manipulado. O papel da Psicologia é o de mediar o conhecimento dos
sujeitos enquanto pessoas subjetivas, mas cair no psicologismo educacional é ignorar seu
caráter político e sua atividade como trabalho. Segundo o autor, essa é uma tendência muito
freqüente no meio educacional.
Por fim, o autor aborda o papel ético da educação. Ele afirma que as relações práticas
não são mecânicas, elas são intencionais e é através de nossa subjetividade que
intencionalizamos nossas ações; estas perpassadas por valores. Esses valores são também
construídos coletivamente e só se legitimam aqueles que estiverem consolidando a dignidade
na esfera do trabalho da sociabilidade e da cultura. Logo a ética tem também referenciais
políticos, econômicos e sociais além dos conceituais. Assim, ele demonstra o evidente papel
ético da educação, que por ser mediadora das práticas dos homens deve consolidar-se como
investimento intencional na construção dessas mediações. Dessa forma a educação só se
legitima se for ética.
Severino termina afirmando que o papel da educação hoje é o de instaurar a cidadania,
sendo o homem construído conforme sua prática cabe a educação proporcionar as condições
para que ele estabeleça essas relações. Portanto, ela só se legitima como mediação para a
construção da cidadania.
A educação vive um momento problemático em sua aplicação. Ela é um dos poucos
setores que permaneceu com a mesma estrutura desde as Revoluções Tecnológicas e de
Informação. Portanto não se pode falar no futuro e nos objetivos da educação sem cautela.
Estão presentes nos atuais sistemas de ensino diversas formas e idéias de educação. A
educação tradicional que ainda está presente em nossa educação sem duvida permanecerá em
suas idéias universais: não há idade para educar, a educação acontece ao longo da vida e não é
neutra. Um dos acontecimentos recentes foi o da educação internacionalizada que trouxe a
uniformidade nos sistemas de ensino. Estamos diante também de uma teoria pensada há
muitos anos, mas mais aceita nesse momento: os paradigmas holonômicos, que correspondem
com o crescente individualismo da sociedade visando ensinar a totalidade do sujeito a partir
das suas particularidades.
Deve se visar formar o cidadão para que ele controle tanto o mercado quanto o
Estado, sendo a escola pública, estatal quanto ao seu financiamento e democrática e
comunitária quanto a sua gestão. A educação deve ser voltada para a transformação social e
não para a transmissão cultural. Através dessa pedagogia da práxis é que se pode oferecer um
referencial mais seguro nesse momento conturbado e problemático da educação em meio a
globalização e informatização. O autor compartilha dessas idéias ao mostrar ao longo do livro
as mediações e influencias que perpassam a educação, mas perde ao desconsiderar o contexto
e momento atual da educação. Dessa forma, ele deixa uma série de conceitos e objetivos para
a educação do individuo histórico social sem estabelecer uma aplicação ou relação clara com
o atual contexto deste.
Pensar a educação junto ao desenvolvimento e cidadania não é uma idéia recente. É
preciso atentar também para as ideologias presentes nesse discurso que busca muitas vezes
livrar outros sistemas responsáveis por gerar essas condições de dignidade. A educação teria o
papel de gerar oportunidades, ascensão social garantindo igualdade e oportunidade quando
esse discurso não sustenta ao passo que o desenvolvimento depende de vários fatores. Pensar
que somente a educação pode resolver os problemas sociais e proporcionar condições de
cidadania é idealismo. Porém os paradigmas educacionais não podem constituir uma desculpa
para a imobilidade. Assim não basta apenas conscientizar, é preciso buscar formas de
organizar-se.

* Produção de Resenha crítica a partir do livro Filosofia da Educação: construindo


cidadania, de Antonio Joaquim Severino, proposto pelo professor Everaldo Cescon na
disciplina de Filosofia da Educação.
** Aluna do segundo semestre do curso de Licenciatura em História da Universidade de
Caxias do Sul.

REFERÊNCIAS

SEVERINO, Antônio Joaquim. Filosofia da Educação: construindo a cidadania. São Paulo,


FTD, 1994.
GADOTTI, Moacir. Perspectivas Atuais da Educação. São Paulo em perspectiva, São Paulo,
Scielo, 2000. vol.14 n.2 Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-
88392000000200002&script=sci_arttext&tlng=en. Acesso em: 22 nov 2010.
RIBEIRO, José Martins. Educação e desenvolvimento: “um discurso renovado”. 2005.
Pedagogia em Foco, Rio de Janeiro, 2005. Disponível em:
http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/filos24.htm. Acesso em: 22 nov 2010.

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