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Reflexões sobre a Tutela Cautelar na Arbitragem
Publication Marcelo Dias Gonçalves Vilela
Revista Brasileira de Mestre em Direito Comercial pela UFMG, Professor Titular deDireito Processual Civil e
Arbitragem Arbitragem do Centro Universitário Newton Paiva em Belo Horizonte/MG, Membro do Comitê
Brasileiro de Arbitragem, Advogado-Sócio de Portugal, Vilela, Behrens e Aguiar Advogados
S/C.
Jurisdiction
Brazil Introdução
O crescimento da utilização da arbitragem no Brasil, sobretudo após a Lei n° 9.307/96,
vem demandando dos profissionais que militam em tal campo um estudo harmonizador
Bibliographic reference dos institutos de direito processual de modo que a aplicação desses não se contraponha
às características próprias da arbitragem como a celeridade e a informalidade. E, por
'Reflexões sobre a Tutela outro lado, não exorbitem o poder jurisdicional que é atribuído aos árbitros pela
Cautelar na Arbitragem', manifestação de vontade das partes ao celebrar a convenção de arbitragem.
Revista Brasileira de
Arbitragem, (© Comitê As tutelas de urgência, nelas incluindo os provimentos antecipatórios de mérito e as
Brasileiro de Arbitragem medidas acautelatórias, devem ser estudas à luz do processo arbitral. O presente estudo,
CBAr & IOB; Comitê entretanto, prende-se à análise exclusiva das medidas cautelares, partindo-se da
Brasileiro de Arbitragem previsão legal contida no art. 22, § 4°, da Lei n° 9.307/96, procurando delimitar os poderes
CBAr & IOB 2005, Volume II dos árbitros e a interface cooperativa com o Poder Judiciário, o qual possui o monopólio
Issue 7) pp. 30 - 44 da utilização das medidas de coerção e execução.
P 30
P 31
1 Natureza Jurisdicional da Arbitragem. Cautelaridade
Para se enfrentar o tema das medidas cautelares em sede arbitral, fazse necessário, por
pressuposto, afirmar o perfil jurisdicional da arbitragem no Brasil, sobretudo após a Lei n°
9.307/96.
A natureza jurisdicional da arbitragem decorre do ato de vontade das partes que optam
por submeter o conflito a particulares (jurisdição convencional) em detrimento da
jurisdição estatal, sendo que a decisão proferida não pode ser atacada em seu mérito
perante o Poder Judiciário, não se subordina a prévia homologação judicial para sua
eficácia e tem aptidão para a formação de coisa julgada. Não se pode mais, portanto, falar
em monopólio da jurisdição pelo Estado. (1)
A arbitragem não viola o art. 5°, inciso XXXV, da Constituição da República de 1988 (“a lei
não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”), dispositivo
responsável pela instituição do princípio da inafastabilidade do controle do Poder
Judiciário. Não se tem, na arbitragem, qualquer imposição à parte para que se submeta à
solução de árbitro(s) em detrimento da atuação do juiz estatal. Para que haja a
instauração do juízo arbitral, afastando-se a primazia do Poder Judiciário, será
indispensável a manifestação de vontade das partes litigantes, observados os critérios
objetivo e subjetivo de arbitrabilidade previstos na Lei n° 9.307/96. (2) O que se extrai do
Texto Constitucional é que a lei não poderá impor à parte a exclusão da jurisdição estatal
(Poder Judiciário). Entretanto, poderão os jurisdicionados optar por subtrair do Poder
Judiciário o conhecimento do litígio, entregando a particulares, de confiança de ambos, a
apreciação e a decisão do litígio.
Admitir que a norma infraconstitucional venha a prever formas de composição dos
conflitos, mesmo atribuindo a tais decisões a imutabilidade de seu mérito e efeito de
P 31 coisa julgada material, independentemente de prévia homologação judicial, não viola a
P 32 garantia constitucional de inafastabilidade do Poder Judiciário. Está garantido ao
cidadão o acesso ao Poder Judiciário para a tutela da pretensão fundada na violação aos
princípios constitucionais do processo – em especial o contraditório e a ampla defesa –,
ocorrida no procedimento que culminou com a sentença arbitral (ação de nulidade da
sentença arbitral).
Importante destacar que a opção pela arbitragem implica submeter o juízo de mérito
(processo de conhecimento) a árbitro(s), sendo que a decisão obtida ao final do processo
arbitral terá o status de título jurisdicional. Entretanto, não havendo o cumprimento
espontâneo da sentença arbitral por qualquer das partes, a execução do título (art. 584, VI,
do CPC) far-se-á perante o Poder Judiciário.
Dentro desse contexto, há de se examinar se o(s) árbitro(s) possui(em) ou não poder
jurisdicional para conhecer e apreciar eventuais medidas cautelares que se façam
necessárias durante o processo arbitral.

2 Tutela Cautelar. Natureza. Competência do Juízo Arbitral já Constituído para

1
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Concedê-la
A atividade jurisdicional, seja exercida pelo Estado por meio do Poder Judiciário, seja
pelo(s) árbitro(s), tem por escopo a solução da lide deduzida pelas partes. É resposta ao
exercício do direito de ação, constitucionalmente assegurado aos cidadãos,
consubstanciado no direito público, subjetivo e abstrato, a uma sentença de mérito sobre
determinada controvérsia ou a obtenção do bem previsto em título executivo.
Para atingir o provimento jurisdicional final (objetivo da atividade de substituição da
vontade das partes para fazer atuar a lei diante de um conflito) que dê resposta à
pretensão das partes deduzidas em juízo, faz-se indispensável assegurar às partes o
devido processo legal por meio de um procedimento informado pelos princípios do
contraditório, da ampla defesa, do tratamento isonômico, da independência e
imparcialidade do julgador e da fundamentação das decisões. O princípio do
contraditório não se resume à bilateralidade da audiência, mas assume um conteúdo
mais denso e abrangente referente à garantia de participação das partes em contribuição
para o provimento jurisdicional em simétrica paridade, (3) realizando no plano processual
o princípio da igualdade, basilar na formação no Estado Democrático de Direito.
O desenvolvimento de qualquer procedimento de natureza jurisdicional, inclusive o
processo arbitral, indubitavelmente, está associado ao fator tempo. O contraditório impõe
o encadeamento de atos processuais, praticados pelas partes e pelo(s) julgador(es), sejam
postulatórios, instrutórios ou decisórios. Mesmo na arbitragem, em que vige a
informalidade e a celeridade, é inegável que o procedimento projeta-se no tempo, como
conseqüência do necessário contraditório.
P 32
P 33
Ainda que o efeito da tutela jurisdicional deva retroagir ao momento do início do
procedimento (postulação da parte), não se pode desconsiderar que, durante o desenrolar
deste, podem ocorrer: (a) a mutação de circunstâncias e elementos fáticos (ligadas aos
sujeitos processuais, às provas a serem produzidas e ao estado do bem litigioso) que
podem dificultar ou até mesmo impossibilitar que a prestação jurisdicional justa se
efetive; ou (b) a prática de atos por uma das partes tendente a frustrar o cumprimento
espontâneo da futura decisão de mérito ou a sua execução forçada.
Nesse sentido, indispensável a disponibilização às partes de meios processuais para que
assegurem a conservação de tais elementos sem que, contudo, seja atropelado o devido
processo legal. Essa atividade acessória é necessária para garantir o resultado útil da
tutela jurisdicional de conhecimento ou de execução, pois, ao mesmo tempo, resguarda a
potencialidade integral de um futuro provimento e evita que, diante da urgência criada,
haja uma abreviação indevida do procedimento em violação ao devido processo legal.
Nesse contexto, insere-se a tutela cautelar. Como a denominação bem espelha, trata-se
de uma medida de acautelamento para se evitar potenciais entraves à construção ou
mesmo à execução do provimento jurisdicional. Nas palavras de PONTES DE MIRANDA, (4)
a cautelar tende a assegurar a pretensão e não a satisfazer e a liberar.
A cautelaridade deve ser entendida como uma exigência da atividade jurisdicional, pois
não se pode desconsiderar a modificação de elementos ou fatos durante o processo, nem
mesmo pode este ser abreviado, em seus atos essenciais, para atender a situações
urgentes. O tempo de construção da decisão que compõe a lide há de ser valorizado e
respeitado na perspectiva de atividade jurisdicional desenvolvida em Estado
Democrático de Direito, em que a efetiva participação das partes é condição de
legitimação da atividade de composição da lide. Valores estes, frise-se, presentes no
processo arbitral.
A tutela cautelar tem a função de dar utilidade ao processo de conhecimento ou
executivo, na medida em que não declara ou realiza o direito, mas previne que o
reconhecimento ou a execução deste possa vir a se frustrar. Assim, podem-se diferenciar
as tutelas jurisdicionais funcionalmente, pois não se confundem a atividade e a cognição
(processo de conhecimento, seja perante o juiz ou perante os árbitros), a satisfatividade
(processo de execução) e a cautelaridade (medidas acessórias de segurança que podem
se fazer necessárias no curso do processo de conhecimento ou de execução).
Não se pode dissociar o poder jurisdicional cognitivo – que o árbitro recebe quando as
P 33 partes optam pelo juízo arbitral – do poder jurisdicional cautelar. Estes são inseparáveis,
P 34 já que se admitir que o árbitro estaria impedido de conceder medidas assecuratórias
da correta instrução processual ou do provimento final seria cercear o próprio poder
jurisdicional para o exame do mérito. (5)
Assim, desnecessária, no direito brasileiro, qualquer menção, na redação da convenção de
arbitragem (cláusula compromissória ou compromisso arbitral), à outorga de poderes aos
árbitros para concederem medidas cautelares conexas à questão meritória que lhes foi
submetida.
Por outro lado, ainda que se admita a autonomia da vontade das partes para a redação da
convenção de arbitragem, inválida será a previsão que pretenda cindir o poder
jurisdicional do árbitro retirando-lhe o poder de conceder medidas cautelares. A opção
pelo juízo arbitral implica, necessariamente, a outorga de poderes jurisdicionais para a
tutela cautelar. Causaria perplexidade à parte interessada se, durante o processo arbitral,

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pretendendo a produção antecipada de provas, fosse obrigada a requerer esta perante o
Poder Judiciário, que apreciaria a conveniência ou não de tal produção.

3 Permissivo Legal que Legitima a Concessão de Medidas Cautelares Pelo(s)


Arbitro(s). Adequada Interpretação
A Lei n° 9.307/96 faz referência à medida cautelar no processo arbitral apenas no art. 22, §
4° (“Ressalvado o disposto no § 2°, havendo necessidade de medidas coercitivas ou
cautelares, os árbitros poderão solicitá-las ao órgão do Poder Judiciário que seria
competente para julgar a causa”).
Cumpre remarcar, primeiramente, a infelicidade na redação de tal dispositivo legal, haja
vista que pode induzir o intérprete da lei à falsa idéia de que as medidas cautelares
devem ser requeridas necessariamente perante a jurisdição estatal. (6)
O árbitro é competente para deferir medidas cautelares durante o procedimento arbitral
P 34 visando a assegurar o resultado útil do processo. Ao contrário do juiz estatal que possui
P 35 poderes jurisdicionais permanentemente, o árbitro exerce a jurisdição (é “juiz de fato e
de direito”) limitadamente à demanda referente à qual foi investido pela convenção
arbitral. Não possui o árbitro, entretanto, poderes para impor (executar) coativamente
suas próprias decisões. Por isso afirmar que o árbitro tem jurisdictio e não imperium. (7)
Adequado afirmar, nesse caso, que existe um fracionamento da jurisdição, uma vez que
cabe ao árbitro decidir acerca da medida cautelar, (8) estando afeto ao Poder Judiciário o
cumprimento da medida decretada, em havendo resistência manifestada por uma das
partes.
Não possuindo poderes de coerção, deverá a jurisdição arbitral socorrer-se da jurisdição
estatal para que obtenha o cumprimento da decisão proferida. Ou seja, caberá ao Poder
Judiciário praticar os atos materiais para a concretização da medida cautelar deferida
pelo(s) árbitro(s). (9)
Com tais esclarecimentos, pode-se compreender que o legislador, no § 2° do art. 22, em
verdade, está se referindo às hipóteses em que, seja durante a instrução processual, seja
em sede de tutela cautelar incidental, uma das partes resista a cumprir a decisão
proferida pelo(s) árbitro(s). (10) Se houver cumprimento espontâneo pela(s) parte(s) da
medida cautelar deferida, não haverá sequer interveniência do Poder Judiciário.
P 35 Daí por que caberá ao(s) árbitro(s), e não à parte interessada, requerer ao Poder Judiciário
P 36 que determine o cumprimento da decisão (solicitar a medida cautelar, na linguagem
do texto legal), utilizando-se dos meios processuais coercitivos. A jurisdição estatal, em tal
hipótese, age de forma complementar à jurisdição convencional (arbitral).
Ademais, a cautelaridade deve ser compreendida como uma exigência da atividade
jurisdicional, na medida em que se coloca como um instrumento importante para
assegurar a correta e eficaz prestação jurisdicional. Assim, não apenas às partes interessa
a concessão da medida cautelar, mas também ao órgão jurisdicional arbitral, responsável
pela atividade de julgar e compor os litígios, que pode inclusive concedê-la exofficio.

4 Poder Geral de Cautela do Árbitro


Admitido o interesse do órgão jurisdicional na obtenção de resultado útil quanto a sua
atividade, seja para assegurar o não-desaparecimento das circunstâncias fáticas, seja
para assegurar o cumprimento de eventual decisão condenatória, é inegável que o árbitro
tem poder jurisdicional para conceder medida cautelar independentemente de
requerimento da parte. Cumpre ao(s) árbitro(s) zelar pelo atingimento de resultado útil às
partes com a decisão proferida. E, assim, é-lhe(s) deferido o poder geral de cautela.
O poder geral de cautela não se confronta com o princípio da imparcialidade do julgador
(árbitro), basilar ao próprio conceito de jurisdição. A medida cautelar não se confunde
com a tutela de mérito do conflito, uma vez que se coloca no papel de assegurar a máxima
eficácia da atividade jurisdicional. A cautelaridade não traz consigo qualquer juízo acerca
do mérito, mas apenas garante que haja o devido processo legal com a atuação efetiva
das partes em contraditório (p. ex., a medida cautelar que determina a produção
antecipada de provas). Ou, ainda, qualquer que seja o resultado da demanda, possa haver
a geração de todos os efeitos próprios da tutela principal requerida pelas partes.
Observe-se que, quando a medida cautelar é concedida de ofício pelo árbitro, esta o é em
caráter incidental ao processo arbitral. O(s) árbitro(s) não pode(m) conceder medida
cautelar em caráter preparatório. Isso se deve ao fato de lhe(s) faltar poder jurisdicional
até o momento em que aceita(m) atuar (quando, de fato, se inicia o processo arbitral).
Importante destacar que o poder geral de cautela não se manifesta apenas com a
iniciativa de concessão de medida cautelar pelo árbitro. Observa-se ainda este na
possibilidade de o(s) árbitro(s) modificar(em) ou substituir(em) a medida requerida pela
parte ou mesmo já deferida em momento anterior (p. ex., cautelar preparatória ajuizada
perante o jurisdição estatal).
Portanto, o árbitro, ao conceder a medida cautelar de ofício, cumpre o seu papel
jurisdicional adotando a(s) providência(s) que assegure(em) as potencialidades da
adequada instrução probatória e/ou futura decisão quanto ao mérito do litígio submetido

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à arbitragem.
P 36
P 37
5 Competência do Árbitro Para a Concessão de Autelares Acessórias à Tutela de
Conhecimento e Assecuratórias à Futura Execução. Efeito Negativo da Convenção
de Arbitragem
A doutrina processual sempre classificou as medidas cautelares tendo em vista o objetivo
de acautelamento (segurança) visado em relação ao processo principal.
Sobretudo em relação às medidas cautelares nominadas (específicas), arroladas no
Código de Processo Civil, estabeleceu uma classificação tendo em vista sua finalidade e o
bem jurídico a ser protegido: a) tutelas cautelares que visam à proteção de bens, sejam
quando estes se prestam a garantir futura execução, seja ainda evitar o perecimento ou
deterioração do próprio bem que é objeto do litígio principal. São elas o arresto (art. 813),
o seqüestro (art. 822), a caução (art. 826), o arrolamento de bens (art. 855), a busca e
apreensão (art. 839), o atentado (art. 879), medidas de conservação da coisa (art. 888, I); b)
tutelas cautelares que visam à proteção da prova produzida ou a ser produzida no
processo principal de conhecimento. São as seguintes: produção antecipada de provas
(art. 846), justificação judicial (art. 861), exibição de documento, coisa ou escrituração
comercial (art. 844), protestos, notificações e interpelações (art. 867); c) tutelas cautelares
que visam a proteger a pessoa, seja para garantir a própria sobrevivência, seja ainda para
resguardar a própria integridade física até que seja proferida a decisão definitiva no
processo principal. Destacam-se, entre estas, alimentos provisionais (art. 852), separação
de corpos entre os cônjuges (art. 888, VI), guarda de filho e regulamentação de direito de
visita (art. 888, VII), depósito de menor castigado (art. 888, V), interdição e demolição de
prédio para resguardar a saúde, a segurança ou outro interesse público (art. 888, VIII).
Como se vê, é falsa a idéia de que a cautelaridade tem por finalidade única e exclusiva a
preparação do futuro processo de execução. Pelo contrário, em diversas hipóteses (nestas
incluído o rol extenso de cautelares inominadas), como já alertara PONTES DE MIRANDA,
(11) a medida cautelar fazse necessária para assegurar a instrução durante a tutela de
conhecimento, assegurando a correta produção probatória.
P 37
P 38
No âmbito da arbitragem, tendo em vista que o(s) árbitro(s) não detém(êm) poder
jurisdicional de execução (executio), questão a ser enfrentada diz respeito à competência
deste(s) para examinar e conceder medidas cautelares que visem à proteção de bens que
garantam uma futura execução e que, portanto, não guardem uma correlação direta com o
processo de conhecimento para o qual são competentes, mas com eventual execução
forçada que se seguirá, para qual são incompetentes.
Talvez o raciocínio mais apressado conduza à conclusão de que o(s) árbitro(s) não
possa(m) conhecer de requerimento das partes acerca de medidas cautelares que tenham
por finalidade a garantia da futura execução. Se não possuem poder jurisdicional para a
execução, não podem, via de conseqüência, deferir medidas cautelares que a apóie.
Entretanto, tal conclusão é equivocada.
Melhor solução a tal questão obtém-se por meio da adequada interpretação dos efeitos
negativo e positivo da celebração da convenção de arbitragem. Seja pela cláusula
compromissória, seja pelo compromisso arbitral, optam as partes, livremente, por
submeter ao juízo arbitral litígio que envolva direito patrimonial disponível.
Portanto, a convenção de arbitragem exclui a competência do Poder Judiciário para atuar
no processo de conhecimento, em que haverá a afirmação do direito – formação de título
executivo em se tratando de tutela condenatória. Assim, até a obtenção do
pronunciamento jurisdicional acerca do mérito da controvérsia no âmbito do processo
arbitral, não há competência do Poder Judiciário – não há título. Este apenas terá
competência após encerrado o processo perante o(s) árbitro(s), seja para conhecer de
demanda que vise à anulação da sentença arbitral (art. 33 da Lei n° 9.307/96), seja para a
execução forçada do título executivo jurisdicional.
Desde a instauração do processo arbitral com a aceitação da nomeação pelo(s) árbitro(s),
(12) até a decisão final com a prolação da sentença, a jurisdição é exclusivamente
convencional. O princípio da competência-competência comprova essa afirmação, uma
vez que o árbitro ou o tribunal arbitral é o competente para dizer sobre sua própria
investidura, imparcialidade e sobre a validade da convenção que deu origem à
arbitragem. A jurisdição estatal apenas pronuncia-se acerca de tais questões em sede de
pedido de anulação de sentença (seja via embargos do devedor, seja via ação autônoma).
Somente após a obtenção do título jurisdicional, com a formação da coisa julgada arbitral,
encerrada a jurisdição convencional (arbitral), é que o Poder Judiciário torna-se
competente para apreciar medidas cautelares que resguardem a uma eventual execução
forçada.
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O efeito negativo da celebração da convenção de arbitragem, excluindo a jurisdição
estatal, abrange inclusive o poder para conceder medidas cautelares, mediante

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requerimento da parte ou de ofício, que visem a assegurar a eficácia do cumprimento
espontâneo ou futura execução que possa se fazer necessária em função do título que se
formará no processo arbitral.
É impossível fragmentar a competência para a apreciação de pedido de medidas
cautelares tendo em vista a sua finalidade, sobretudo porque o Poder Judiciário somente
passará a ter competência após a formação do título jurisdicional. E, como já se afirmou, a
medida cautelar, ao contrário da antecipação de tutela, (13) não atinge o mérito,
assegurando (tutela de segurança) apenas a potencialidade de uma satisfatividade futura
(decorrente do inadimplemento da parte frente ao disciplinado no provimento
jurisdicional de cognição). Eventual medida cautelar de arresto que se faça necessária,
quando ainda submetida a questão de mérito ao(s) árbitro(s), deverá ser requerida a
este(s) e não ao Poder Judiciário.

6 Atuação do Poder Judiciário em Cooperação com O Juízo Arbitral


A atuação colaborativa e harmônica entre a jurisdição estatal e a jurisdição convencional
é de fundamental importância para a eficácia do processo e da decisão arbitral.
A cooperação do Poder Judiciário com o juízo arbitral pode se dar em três graus distintos:
caráter subsidiário, caráter complementar e caráter controlador. (14)
A atuação da jurisdição estatal em caráter subsidiário ao juízo arbitral se dá quando não
se mostra suficiente e eficaz a manifestação da vontade das partes para a instituição da
arbitragem, fazendo-se indispensável a atuação do Poder Judiciário, como ocorre na ação
de execução específica da cláusula compromissória vazia, prevista no art. 7° da Lei n°
9.307/96.
Já a cooperação em caráter complementar se dá quando se faz necessária a intervenção
do Poder Judiciário diante da inexistência de poder jurisdicional do árbitro para executar
coercitivamente suas decisões (quando uma das partes resiste ao cumprimento
espontâneo); para atingir a esfera de interesse de terceiros não vinculados à convenção de
arbitragem (condução de testemunha renitente ou a solicitação de exibição de
documentação a terceiros); ou ainda quando não tem competência para decidir acerca de
P 39 determinada matéria que é prejudicial ao exame do mérito no processo arbitral
P 40 (questão envolvendo direito indisponível que interfira na decisão arbitral – art. 25 da Lei
n° 9.307/96).
Por fim, o caráter controlador da intervenção do Poder Judiciário refere-se à competência
para conhecer e julgar as ações que visem à anulação da sentença arbitral, seja via
embargos à execução, seja via ação autônoma, ajuizadas no prazo decadencial de noventa
dias. Na verdade, nessa hipótese, a jurisdição estatal atua como guardiã das garantias
constitucionais ao processo (como a observância do contraditório e da ampla defesa, a
imparcialidade do julgador, a motivação dos atos decisórios, o princípio da
voluntariedade do juízo arbitral como exceção à primazia da jurisdição estatal) e da
estrita observância pelos árbitros dos limites contidos na convenção de arbitragem.
No caso das medidas cautelares, verifica-se que o Poder Judiciário atua em caráter
complementar, seja para executar materialmente as medidas cautelares incidentais que
encontram resistência de qualquer das partes ao seu cumprimento (15) ou que dependam
de ato de terceiro não vinculado à convenção de arbitragem, seja para conhecer e julgar
as medidas cautelares urgentes (preparatórias) quando ainda não há o processo arbitral,
(16) não obstante exista cláusula compromissória a potencializá-lo.
O cumprimento da medida cautelar já deferida pelo juízo arbitral deverá ser requerida
pelo árbitro ou presidente do tribunal arbitral diretamente ao órgão jurisdicional estatal
que seria competente para apreciar a questão de mérito se esta não estivesse submetida
à jurisdição convencional. Deverá ser apresentado um requerimento, instruído com a
cópia da convenção de arbitragem, de seu aditamento, se houver, (17) e da decisão
fundamentada que deferiu a medida de cautela que se requer cumprimento. (18)
P 40
P 41
O juiz não tem competência para modificar a medida cautelar proferida pelo árbitro e
apenas poderá deixar de determinar o seu cumprimento se entender que tal medida é
ilegal, caso em que deverá fundamentar a sua decisão.

7 Medida Cautelar Preparatória


Não obstante seja pela celebração da convenção de arbitragem que as partes optam por
subtrair do Poder Judiciário a apreciação de conflito, presente ou futuro, envolvendo
direitos patrimoniais disponíveis, é também certo que a investidura dos árbitros apenas
ocorre quando estes aceitam a indicação das partes dando início ao processo de
arbitragem.
Assim, há hipóteses em que a parte, apesar de vinculada ao juízo arbitral potencializado
pela presença de cláusula compromissória em determinado contrato, necessita da tutela
jurisdicional cautelar imediatamente ainda antes da instituição do tribunal arbitral ou da
nomeação de árbitro único.
Identificada a necessidade de tutela de urgência para que se assegure o resultado útil (e

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com menor prejuízo às partes) da tutela principal a ser submetida à jurisdição
convencional, quando ainda não instaurado o juízo arbitral, é possível às partes requerer
ao Poder Judiciário a concessão de medida cautelar.
Aliás, tal entendimento decorre de interpretação adequada do direito de ação assegurado
constitucionalmente, pois se deve garantir ao cidadão o acesso à tutela jurisdicional
tempestiva. Assim, se não constituído o juízo arbitral, é competente a jurisdição estatal
para conhecer de medidas cautelares.
A ação cautelar preparatória deverá ser ajuizada perante o juízo que seria competente
para apreciar a questão de mérito se esta não estivesse afeta à jurisdição arbitral.
7.1 Limite da competência do Poder Judiciário (jurisdição estatal)
Questão interessante decorrente da fixação de competência do Poder Judiciário para a
apreciação de medidas cautelares preparatórias refere-se ao limite de tal competência
face à instituição, posteriormente, do juízo arbitral.
Como já afirmado anteriormente, iniciado o processo arbitral cessa o poder jurisdicional
do Poder Judiciário para conhecer da demanda entregue (submetida) ao(s) árbitro(s),
inclusive quanto à possibilidade de concessão de medidas cautelares.
Assim, tão logo tome ciência do início do processo de arbitragem, deve o órgão do Poder
Judiciário, declarando a sua incompetência para prosseguir no feito, remeter os autos da
medida cautelar ao novo juízo competente: o juízo arbitral.
P 41
P 42
Não se trata, ressalte-se, de hipótese de extinção do processo cautelar sem julgamento do
mérito, mas apenas da transferência do processo então instaurado perante a jurisdição
estatal para a jurisdição arbitral.
Assim, o árbitro ou o tribunal arbitral é que passa a ser competente para examinar a
medida cautelar, podendo, inclusive revogar decisão liminar anterior, mesmo que
concedida por órgão jurisdicional estatal de segunda instância (p. ex., medida cautelar
obtida por meio do provimento de agravo de instrumento interposto contra decisão de
primeira instância que negara medida liminar).
Além da revogabilidade (incluída a modificação, substituição ou revogação propriamente
dita) ser característica própria das medidas cautelares, que devem sempre se ajustar da
melhor maneira possível ao seu objetivo que é assegurar o desenvolvimento efetivo do
processo principal ou assegurarlhe o resultado útil às partes litigantes, não está(ão)
vinculado(s) o(s) árbitro(s) à decisão de qualquer órgão jurisdicional estatal, possuindo
jurisdição diversa, não sujeita a qualquer hierarquia.
Registre-se acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG, (19) no julgamento do
Agravo de Instrumento n° 410.533-5, (20) relatado pelo Desembargador ALVIMAR DE ÁVILA,
no mesmo sentido da posição aqui defendida. Consignou o relator em voto aprovado por
unanimidade pela turma julgadora:
“(…) recomenda-se ao M.M. Juiz monocrático que, comunicado da instauração do juízo
arbitral, remeta os autos (aos árbitros) para a apreciação da manutenção ou não da tutela
cautelar de sustação de protesto concedida, sendo que eventual manutenção ou não
deverá ser comunicada por ofício, para que seja expedida ordem de revogação ao cartório
de protesto de título competente.”
Tal caso se refere à ação cautelar de sustação de protesto de duplicata extraída de um
contrato que continha cláusula compromissória. O juiz de primeiro grau de jurisdição,
tomando conhecimento da arbitragem em curso, suspendeu o processo cautelar por um
ano, com fundamento no art. 265, IV, do Código de Processo Civil. Em sede de agravo de
instrumento, o TJMG, acertadamente, entendeu que a competência dos árbitros estendia-
se não apenas sobre a questão de mérito que envolvia a emissão da duplicata, mas
também sobre a medida cautelar preparatória então em curso perante a jurisdição
estatal.
P 42
P 43
Conclui-se assim que, tão logo o tribunal arbitral comece a funcionar, a competência para
a medida cautelar passa a ser do(s) árbitro(s) que poderá(ão) inclusive alterar a decisão
cautelar antes proferida pelo órgão do Poder Judiciário.
7.2 Eficácia da medida cautelar preparatória. Instauração do processo arbitral
O Código de Processo Civil trata da eficácia da medida cautelar tendo em vista o tempo
de sua execução ou ainda a sua utilidade.
A medida cautelar deferida em caráter preparatório tem sua eficácia até o trânsito em
julgado do processo principal (art. 807 do CPC), ou até o cumprimento da decisão se esta
estiver a garantir a futura execução. Entretanto, providência cautelar perde a sua eficácia
se não houver o ajuizamento da ação principal no prazo máximo de trinta dias contados
da data de sua efetivação (art. 806 do CPC). O termo a quo para a contagem do prazo é o
momento do cumprimento da medida cautelar concedida por meio de provimento
antecipatório (liminar) ou em conseqüência da sentença proferida no processo cautelar.

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Há a presunção legal de que, não havendo a propositura da ação principal após a
obtenção da tutela preventiva, não há mais interesse da parte (art. 808, I, CPC). A cessação
de eficácia da decisão não implica a extinção do processo cautelar, mas a revogação da
medida liminar anteriormente concedida.
Quando concedida medida cautelar preparatória pelo Poder Judiciário, e havendo
convenção de arbitragem, caberá à parte requerente, no prazo decadencial de trinta dias
de sua efetivação, comprovar judicialmente a sua iniciativa visando à instauração do
processo arbitral.
Diferentemente do Poder Judiciário em que o processo é instaurado por iniciativa
exclusiva de uma das partes, em se tratando da existência de convenção de arbitragem, a
instauração do processo arbitral depende de atitudes de ambas as partes.
Havendo cláusula compromissória completa (cheia), em que estão presentes todos os
elementos para a instituição da arbitragem, poderá uma das partes dar início à
arbitragem, independentemente da eventual resistência de uma das partes (art. 5° da Lei
n° 9.307/96), sendo de fácil comprovação tal fato para evitar a cessação de efeitos da
medida cautelar preparatória.
Por outro lado, se a cláusula compromissória for vazia, carecendo de complementação,
pelas partes, dos elementos necessários à instituição do juízo arbitral, deverá a parte
interessada em instituir a arbitragem comunicar à outra a sua intenção designando data
para reunião para que as partes discutam e avencem o compromisso arbitral viabilizador
do processo arbitral (art. 6° da Lei n° 9.307/96). Não havendo consenso, ou não
comparecendo a parte convocada, será necessário o ajuizamento de ação de execução
específica da cláusula compromissória para que haja a instituição do processo arbitral por
meio da atuação do Poder Judiciário (art. 7° da Lei n° 9.307/96).
P 43
P 44
Assim, na hipótese de cláusula compromissória vazia, deverá a parte requerente da
medida cautelar preparatória comprovar que, no prazo de trinta dias, notificou a parte
contrária acerca da sua intenção em iniciar a arbitragem. Isso é suficiente para evitar a
cessação dos efeitos da medida cautelar deferida liminarmente.
Se necessário o ajuizamento de execução específica da cláusula compromissória, a
medida cautelar preparatória manterá sua vigência. Ainda que a ação cautelar
preparatória venha a ser julgada definitivamente antes da instituição do processo
arbitral, (21) o(s) árbitro(s), tão logo investido(s) de poderes jurisdicionais, e desde que a
parte interessada demonstre a alteração das circunstâncias fáticas sobre as quais se
fundou a apreciação da medida assecuratória, poderá(ão) reexaminar a pertinência e
oportunidade da manutenção de tal medida.

Conclusões
Diante dos argumentos acima articulados, verifica-se que pode-se extrair as seguintes
conclusões:
(a) a tutela cautelar é compatível com o processo arbitral, sendo uma exigência do
próprio exercício da jurisdição;
(b) é o árbitro ou o tribunal arbitral competente para conceder medidas cautelares,
requeridas pelas partes ou deferidas de ofício, pertinentes ao mérito da questão que
lhe foi submetida;
(c) diante do efeito negativo da celebração da convenção de arbitragem, o poder
jurisdicional do árbitro ou tribunal arbitral estende-se tanto a medidas cautelares
que visam a resguardar a correta instrução processual quanto àquelas medidas
assecuratórias da futura execução do julgado;
(d) cabe ao(s) árbitro(s) requerer(em) ao Poder Judiciário o cumprimento da medida
cautelar por ele(s) deferida(s), na hipótese de resistência ao cumprimento por uma
das partes ou por terceiros, sendo vedado o juiz reformar, ou modificar por qualquer
forma, o provimento cautelar arbitral;
(e) é competente o Poder Judiciário para conhecer das medidas cautelares urgentes,
antecedentes à instituição da arbitragem, devendo a parte requerente comprovar,
no prazo decadencial de trinta dias, que buscou dar início ao processo arbitral;
(f) após instituída a arbitragem, passa o árbitro ou o tribunal arbitral a ser competente
para apreciar a medida cautelar preparatória, podendo inclusive revogar ou
modificar a medida anteriormente concedida.
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References

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1) Examinando esta questão em outra oportunidade, afirmei que “(…) o conceito de
jurisdição não implica no monopólio da atividade jurisdicional pelo Estado em todas
as suas etapas, mas exige a presença obrigatória do Estado (poder jurisdicional
estatal) como instância máxima garantidora do cumprimento das garantias
constitucionais do Processo. (…) O Estado é ainda indispensável como detentor do
poder de coerção e execução de decisões, formadas em regular contraditório entre as
partes, com força vinculativa, mesmo que proferida por terceiros não investidos da
condição de juiz, nas hipóteses em que a lei autoriza, com a atribuição de efeito de
título executivo judicial, como o fez a Lei n° 9.307/96. (…) Os elementos
caracterizadores da jurisdição, na concepção de Chiovenda, mantêm-se irretocados.
Ou seja, a jurisdição qualifica-se como uma atividade de substituição da vontade das
partes (seja através do árbitro, seja através do juiz), com o objetivo de fazer atuar o
direito, devendo esta ser provocada pelas partes (princípio da demanda. Apenas não
se confunde a tutela jurisdicional com o monopólio da jurisdição, uma vez que a lei
pode atribuir poder a terceiro para que profira decisão jurisdicional. Ou seja, admite-
se uma decisão da qual não se autoriza a interposição de qualquer recurso ao Poder
Judiciário, salvo quado esta fira princípios do Processo, o que conduzirá a sua
anulação (VILELA, Marcelo Dias Gonçalves. Arbitragem no direito societário. Belo
Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 64-66).
2) “Art.1° As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir
litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.”
3) Cf. GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro:
Aide, 1992, p. 127.
4) PONTES DE MIRANDA. Comentários ao código de processo civil. Rio de Janeiro: Forense,
t. XII: arts. 796-889, 1976, p. 7.
5) É também o entendimento de Pedro A. Batista Martins ao afirmar que: “(…) Cabe ao
julgador privado adotar todas as providências cabíveis ao efetivo exercício da
jurisdictio, abrangendo, naturalmente, os remédios cautelares, vez que de natureza
incidental, acessório e, conseqüentemente, necessários ao justo deslinde da
controvérsia. Mesmo que não constasse expresso na lei de arbitragem, a concessão de
medida cautelar ou coercitiva seria poder implícito à função desempenhada pelo
árbitro, já que a ele cabe julgar a questão posta e buscar viabilizar o resultado final
pretendido” (BATISTA MARTINS, Pedro; FERREIRA LEMES, Selma Maria; CARMONA,
Carlos Alberto. Aspectos fundamentais da lei de arbitragem. Rio de Janeiro: Forense,
1999, p. 363-64).
6) O art. 1.086 do Código de Processo Civil (revogado pela Lei n° 9.307/96) vedava ao
árbitro o poder jurisdicional para a concessão de medidas cautelares (“Art. 1.086. O
juízo arbitral pode tomar depoimento das partes, ouvir testemunhas e ordenar a
realização de perícia. Mas lhe é defeso: I – empregar medidas coercitivas, quer contra
as partes, quer contra terceiros; II – decretar medidas cautelares). Entretanto, mesmo
na vigência de tal artigo, já entendia parte da doutrina que seria incompatível separar
o poder jurisdicional para o processo de conhecimento do poder jurisdicional para a
concessão de medidas cautelares. Cf. CARMONA, Carlos Alberto. A arbitragem no
processo civil brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 108-109.
7) “Embora juiz e, portanto, detentor de jurisdição, o árbitro não é um juiz estatal, nem é
juiz permanente e com poderes jurisdicionais amplos como os magistrados do
aparelhamento judiciário oficial. Prova mais evidente da limitação imposta ao
detentor da jurisidição arbitral está na falta de poder para fazer executar seus
próprios julgamentos. Só ao juiz estatal cabe manejar a execução forçada e outros
expedientes coercitivos, como as medidas cautelares. Diz-se, por isso, que o árbitro
tem jurisdictio, mas não tem imperium. Enquanto o juiz estatal tem a jurisdictio e o
imperium, o árbitro só conta com a jurisdictio.” (THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Arbitragem e terceiros – Litisconsórcio fora do pacto arbitral – Outras intervenções de
terceiro. In: MARTINS, Pedro A. Batista, ROSSANI GARCEZ, José Maria. Reflexões sobre
arbitragem: in memoriam do Desembargador Cláudio Vianna de Lima. São Paulo: LTr,
2002, p. 245)
8) Neste sentido, cite-se Alexandre Freitas Câmara, que afirma que: “não me parece
crível que, estando instaurado o processo arbitral, não possa o árbitro, juiz de fato e
de direito, prover acerca da segurança da efetividade de sua própria decisão. A
autoridade judiciária não é a mais indicada a conceder medidas tendentes a
assegurar a efetividade da tutela jurídica a ser prestada pelo árbitro, através de sua
decisão. Cabe, pois, ao árbitro prover acerca de medidas cautelares, típicas ou
atípicas, que se façam necessárias. Impossibilitado que está de usar a força, porém,
não poderá o árbitro atuar as medidas por ele deferidas. Tal atuação, portanto, será
da competência da autoridade judiciária que seria competente para a apreciação da
causa se a mesma tivesse sido submetida ao Judiciário” (CÂMARA, Alexandre Freitas.
Arbitragem. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 100-101).
9) “Despido de imperium, o árbitro não pode ordenar a execução das decisões que tomar,
sempre que, para tanto, se torne imprescindível o uso da força. Assim, tanto uma
decisão definitiva (sentença) quanto uma decisão provisória cautelar ou provisional
(alinhamo-nos àqueles que reconhecem ao árbitro poderes para tanto) têm validade e
obrigam desde o momento em que são proferidas. Todavia, a execução forçada se
condiciona ao apoio do juiz estatal, único titular do poder de imperium.” (VALENÇA
FILHO, Clávio de Melo. Poder Judiciário e Sentença Arbitral. Curitiba: Juruá, 2002, p. 48)

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10) Neste sentido, Carlos Alberto Carmona: “Surgindo então a necessidade de adotar-se
providência cautelar, o árbitro será instado pela parte interessada a manifestar-se
sobre o cabimento da medida; julgando-a pertinente – e o contraditório, sempre
necessário, poderá ser diferido por conta da urgência na concessão da medida –
oficiará ao juiz competente para que dê cumprimento às providências cautelares por
ele, árbitro, deliberadas (desde que haja resistência da parte em face de quem tais
medidas foram manejadas)” (CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um
comentário à Lei n° 9.307/96. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2004. p. 247).
11) Existe, além da pretensão à tutela jurídica (Rechtsschutzansprunch) à cognição
completa (à sentença, em sentido estrito) e da pretensão à tutela jurídica à execução,
a pretensão à tutela jurídica à segurança, que é ou à segurança quanto ao fato, ou à
segurança à pretensão (Anspruchssicherung). A exibição delivro, as vistorias e
inquirições adperpetuamreimemoriam são asseguradoras do fato, aí, mais
estritamente, da prova; o arresto, o seqüestro, a busca e apreensão, asseguradoras da
pretensão, talvez só da prestação, o que é comum a todas elas é que o devedor não se
libera, por elas, da obrigação, nem se satisfaz ao credor. Não se profere decisão que
tenha efeitos diretos de liberação ou de satisfação. Só se assegura. Ou se assegura
prova do fato, ou se assegura a pretensão, portanto à prestação a ser exigida, de
futuro. Não se alude à execução forçada. O que importa é a distinção entre “executar”
e “assegurar” (PONTES DE MIRANDA. Comentários ao código de processo civil. Rio de
Janeiro: Forense, t. XII: arts. 796-889, 1976, p. 14).
12) Lei n° 9.307/96, art. 19: “Considera-se instituída a arbitragem quando aceita a
nomeação pelo árbitro, se for único, ou por todos, se forem vários”.
13) Nesta, permite-se à parte, atendidos os requisitos previstos em lei, a obtenção de
provimento jurisdicional que lhe permita desfrutar, em momento anterior à prolação
da sentença, da satisfatividade da tutela pretendida, resguardada a possibilidade de
reversibilidade.
14) A classificação é trazida pela Professora Ana Maria Chocron Giraldez, que apresenta o
caráter subsidiário, complementar e revisor da jurisdição estatal. (GIRALDEZ, Ana
Maria Chocron. Los principios procesales en el arbitraje. Barcelona: Bosch, 2000, p. 195-
216). Entretanto, entende-se mais adequado referir-se ao caráter controlador,
afastando a idéia de que o Judiciário pode interferir no juízo de mérito do árbitro.
15) “Todavia, deve-se diferenciar a competência do árbitro para conhecer do pedido das
partes, ou, ainda, agindo de ofício (diante do poder geral de cautela), conceder a
medida cautelar, do cumprimento coercitivo de tal medida. Há que se firmar o
entendimento de que o árbitro, por ser juiz de direito e de fato, tem competência para
apreciar a medida cautelar, devendo apenas recorrer ao Poder Judiciário para
requerer o cumprimento desta. Ao magistrado, titular da jurisdição estatal, não cabe
manifestar-se sobre o mérito da medida cautelar (pertinência e conveniência), mas,
apenas e simplesmente, determinar o seu cumprimento, fazendo um prévio juízo
acerca da legalidade da medida.” (VILELA, Marcelo Dias Gonçalves. Arbitragem no
direito societário. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 139-140.)
16) Seja porque uma das partes resiste à instauração do juízo arbitral, seja porque há
divergência das partes no suprimento de lacunas da cláusula compromissória vazia,
seja ainda porque não escolhido(s) o(s) árbitro(s) pelas partes ou não manifestada a
aceitação destes quanto à nomeação.
17) Lei n° 9307/96, art. 19, parágrafo único: “Instituída a arbitragem entendendo o árbitro
ou o tribunal arbitral que há necessidade de explicitar alguma questão disposta na
convenção de arbitragem, será elaborado, juntamente com as partes, um adendo,
firmado por todos, que passará a fazer parte integrante da convenção de arbitragem”.
18) Precisa a posição de Alexandre Freitas Câmara nesse sentido: “(…) é de se afirmar que
o ato pelo qual o árbitro (ou o presidente do tribunal arbitral) requisitará ao juízo a
prática dos atos necessários à efetivação das medidas de urgência é análogo a uma
carta precatória (assim como se dá nos casos de auxílio judicial à instrução
probatória). Desse modo, deverá o árbitro, ao conceder a medida de urgência, e
depois dar às partes ciência do conteúdo de seu provimento, deprecar ao órgão do
Poder Judiciário a prática para os atos de império necessários à efetivação de sua
decisão (…)” (CÂMARA Alexandre Freitas. Das relações entre a arbitragem e o Poder
Judiciário. In: Revista Brasileira de Aribtragem, Porto Alegre: Síntese, Curitiba: Comitê
Brasileiro de Arbitragem, v. 2, n. 6, p. 18-28, abr./jun. 2005).
19) A decisão foi tomada pela Quarta Câmara Civil do extinto Tribunal de Alçada de Minas
Gerais (hoje unificado ao Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais).
20) O acórdão, originado do julgamento ocorrido em 27 de agosto de 2003, foi assim
ementado: “Agravo de instrumento. Cautelar de sustação de protesto. Juízo arbitral.
Instauração. Não obstante a eleição da arbitragem como meio de solução de conflitos,
a ação cautelar de sustação de protesto, se ainda não instaurado o juízo arbitral,
providenciará a remessa dos autos para a devida apreciação da manutenção ou não
da tutela concedida (…)”.
21) Nesse caso, a arbitragem será instituída por força da sentença proferida na ação de
execução específica da cláusula compromissória.

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