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Escrito por: Renan Sargiani

Um problema que todos os alunos de Psicologia enfrentam durante e mesmo depois do


curso é como escolher uma abordagem em Psicologia. Para aqueles que são novatos e não
sabem do que estou falando a Psicologia é uma ciência composta por diferentes
abordagens (enfoques) ou formas de entender e investigar o comportamento e a mente.
Alguns dos exemplos mais famosos de abordagens psicológicas são: behaviorismo
(comportamentalismo), psicanálise (abordagem psicodinâmica), gestaltismo, humanismo e
cognitivismo. Assim, para novatos ou mesmo pessoas mais experimentes, escolher um
dentre tantos enfoques da Psicologia parece ser uma tarefa praticamente impossível. E por
esta razão resolvi escrever essas dicas para tentar ajudá-lo nesse processo.

1. Conhecer a si mesmo é o primeiro passo.


Os enfoques ou abordagens em Psicologia apresentam uma determinada forma de entender
o homem e sua relação com o mundo. Por esta razão, se você “acha que tem que ser
psicanalista” porque é a abordagem mais conhecida, mas você não concorda com a forma
como essa abordagem entende o homem e sua mente, muito provavelmente escolher essa
abordagem será frustrante. Por outro lado, ao tentar pensar sobre quais são seus gostos e
interesses, você pode também encontrar a abordagem que melhor explica aquilo que você
também pensa e acredita. Eu não estou falando que a abordagem tem que responder ao que
você já sabia, mas que ela têm que fornecer explicações que sejam coerentes com o que
você também pensa. O mais importante, portanto é saber dos seus interesses e depois
entender quais são as matrizes do pensamento psicológico de cada abordagem, isso é, qual
a visão de homem que está na base dessa abordagem e como eles utilizam procedimentos
para investigar esse homem, quais são as evidências e resultados que essa abordagem
fornece e como você pode se beneficiar desses conhecimentos e também contribuir para
que esses conhecimentos se desenvolvam ainda mais e ajudem mais pessoas.

2. Não existe uma abordagem certa ou errada.

É muito comum ouvir também a pergunta sobre qual a melhor a abordagem ou qual a
abordagem certa. Aliás, mesmos pacientes/clientes acabam perguntando qual a melhor
abordagem para eles. No entanto, a verdade é que não é possível falar em certo ou errado
quando falamos em ciência. Como já discuti em outro artigo (leia aqui) a Psicologia como
ciência deve utilizar o método científico para testar hipóteses e teorias e assim validar
algumas hipóteses e reformular quando elas não são mais adequadas. A ciência está em
constante transformação e assim, o que é bom para uma coisa, talvez não seja para outra.
Em vez de procurar uma abordagem certa é melhor buscar as melhores e mais atuais
evidências sobre um determinado assunto que te interesse. Hoje em dia a Psicologia
parece passar por um momento de transformação em que vemos a expansão de micro
teorias em vez de grandes teorias explicativas. Em outras palavras, atualmente é mais fácil
ver modelos teóricos que explicam coisas específicas em vez de todas as coisas, como, por
exemplo, teorias sobre o desenvolvimento da leitura, sobre depressão, sobre processos
grupais. Ao explicar coisas específicas as teorias acabam sendo mais eficazes do que
teorias mais generalistas como a de Piaget. No entanto, é claro que mesmo as microteorias
estão baseadas em uma visão de homem e portanto, em uma teoria mais generalista. O que
quero dizer é que nenhuma teoria consegue explicar 100% de um determinado assunto e
mais além disso várias teorias podem apresentar visões diferentes ou complementares
sobre um determinado fenômeno. Assim, a primeira dica que dei é uma das mais
importantes para te ajudar a conhecer melhor a si mesmo, seus interesses e como escolher
dentre a enorme variedade de opções que a Psicologia oferece no século XXI.

3. Não se case com teóricos!


Minha experiência em Psicologia sempre me levou a perceber que nós temos uma espécie
de necessidade de uma figura com a qual se identificar. É como se sempre precisássemos
de “um pai” para guiar nossas ações. Mas lembre-se ninguém é autossuficiente e infalível,
os grandes teóricos formularam bases teóricas bastante sólidas, mas não são verdades
absolutas ou “palavras da bíblia”.Não vou discutir aqui sobre as diferenças entre
conhecimento religioso, filosófico, científico e de senso comum. Mas em síntese o
conhecimento religioso seria advindo de palavras sagradas e que, portanto, não precisam
de confirmação, testes ou contestação. O conhecimento científico, por sua vez, depende da
contestação daquilo que se supõe ser verdadeiro, ou seja, se coloca a todo momento a
testes que buscam refutar ou encontrar evidências em favor das hipóteses. A Psicologia é
uma ciência, portanto, o que Freud falou não é imutável, o que Skinner falou tão pouco é
imutável, o que Piaget disse também não. Assim, antes de levantar a bandeira de um dos
grandes teóricos dizendo “eu sou freudiano”, “eu sou piagetiano”, “eu sou vygotskiano”,
lembre-se que você é você e não um seguidor de alguém. Você é uma pessoa que estuda
Psicologia e que deve portanto, se beneficiar do que existe de mais atual na ciência
psicológica para auxiliar as pessoas, seja na educação, na saúde, trabalho ou qualquer área
que a Psicologia pode contribuir de algum modo.

4. Conheça primeiro, critique depois.


Eu já vi muita gente com preconceitos e preconceitos sobre uma ou outra abordagem sem
nem ao menos saber direito o que é que esse enfoque tem a contribuir e a forma como se
trabalha. Não fique com ilusões de que apenas o que te falaram é a verdade completa, você
pode se surpreender muito ao ler sobre uma determinada abordagem. Para dar um exemplo
concreto o behaviorismo é talvez uma das abordagens mais criticadas e que os alunos têm
uma certa rejeição imediata. No entanto, se você questionar essas mesmas pessoas, muitas
delas nem sequer leram os textos básicos que explicam sobre essa teoria ou sabem as
diferenças entre behaviorismo metodológico e behaviorismo radical. Como eu já discuti
anteriormente a discussão fica apenas no nível superficial de “eu escolho Freud” e,
portanto não gosto do Skinner e vice-versa, como se escolher uma abordagem fosse
escolher um time de futebol. Para criticar algo é preciso conhecer. Você não pode falar que
o café de uma lanchonete é ruim se você não provou do café. Então prove as teorias! Leia,
questione, pergunte-se como poderia ser diferente. Aliás, lembre-se também que esses
grandes teóricos também tiveram que conhecer profundamente as outras teorias para
rejeitá-las e propor coisas novas. Da mesma forma que você deve conhecer a si mesmo,
tem que conhecer as teorias para fazer uma escolha.

5. Mude sempre que precisar.


Eu sempre digo que a ordem da vida é a mudança. Não tenha medo de mudar, se algo foi
suficiente por um momento, mas agora já não está mais atendendo a todas as suas
expectativas então mude! Tente coisas novas. Sempre é tempo de aprender o novo. Tem
uma frase do Barão de Itararé que resume essa minha ideia “Não é triste mudar de ideia;
triste é não ter ideias para mudar.” Aliás, se você ler sobre esses grandes teóricos que já
citei verá que eles tiveram que mudar suas ideias e concepções para criar novas ideias e
novos caminhos em Psicologia.

Concluindo…

Essas são algumas das minhas sugestões para que você faça uma escolha mais consciente
de uma abordagem da Psicologia, que é a meu ver uma ciência fascinante justamente por
essa multiplicidade de olhares sobre a realidade. Você tem alguma sugestão adicional?
Como você escolheu a sua abordagem? Deixe um comentário contando para nós, você
pode ajudar outras pessoas também.

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