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Resumo
Colonizada pelos portugueses, Timor-Leste vivenciou, entre 1975 e 1999, uma política de
“destimorização”, aplicada pelo dominador indonésio, que, no plano linguístico, represen-
tou a inclusão de uma nova forma, manifestada na imposição da língua indonésia, na mi-
nimização do uso da língua nacional, o tétum, e na proibição da manifestação em portu-
guês. Em 1999, a ONU chega a Timor-Leste a fim de garantir o restabelecimento da paz e de
iniciar a reconstrução do país. Com a independência e a constituição da República Demo-
crática de Timor-Leste, em maio de 2002, a língua portuguesa assume o estatuto de oficial,
ao lado da língua tétum. Acrescente-se a esse painel, as outras dezenas de línguas locais ali
faladas. Partindo do conceito de lusofonia, este estudo apresenta aspectos da situação atual
do português em Timor-Leste e perspectivas para a sua reintrodução, ilustrada com a expe-
riência do Projeto Universidades em Timor-Leste.
* Doutora em Letras pela Universidade de São Paulo, pós-doutora pelo Instituto de Ciên-
cias Sociais da Universidade do Minho (Portugal). Docente do Programa de Pós-Graduação
da Universidade Presbiteriana Mackenzie. (E-mail: rhbrito@mackenzie.br).
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difundiu sua língua e cultura, pela atuação de missionários e colonos
diante de povos contatados. Como primeiros “teorizadores” desse ideal
de “lusofonia”, é comum a referência ao Padre Vieira (por exemplo, nos
Sermões de S. Francisco Xavier, 1694), com o projeto messiânico do Quinto
Império, e a Fernando Pessoa, que o teria retomado e reformulado sécu-
los depois (em Mensagem, 1934, e, em especial, no Livro do Desassossego),
ao conceber a língua portuguesa como um espaço do futuro império es-
piritual, caracterizado pela universalidade: “a minha pátria é a língua
portuguesa.”1
Tratar do tema traz também aspecto de natureza semântica e eti-
mológica que subjaz ao substantivo abstrato lusofonia – que não pode ser
desprezado –, pois a forma luso remete tanto a lusitano, quanto ao que é
relativo a Portugal (além da alusão à Lusitânia, província romana perten-
cente à Hispânia, habitada pelos lusitanos).
1 A esse respeito, analisa Lourenço (2001, p. 183): “Creio que não terá escapado a ninguém
que fale português, ou se reclame de uma mítica lusofonia, o uso e o abuso que, a partir de
um dado momento – digamos, o da revolução de Abril –, tem sido feito da famigerada frase
de Pessoa ‘a minha pátria é a língua portuguesa’. Só podia ter inventado esta frase, destina-
da a tanto sucesso, quem imaginasse como hipótese viável – e era o seu caso – que também
teria outra pátria se noutra língua se exprimisse.”
2CIMEIRA CONSTITUTIVA DA COMUNIDADE DOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUE-
SA. Estatutos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Lisboa, 17 de julho de 1996.
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A lusofonia deve, na nossa perspectiva, ser compreendida como
um espaço simbólico linguístico e, sobretudo, cultural no âmbito da língua
portuguesa e das suas variedades lingüísticas, que, no plano geo-
sociopolítico, abarca os países que adotam o português como língua ma-
terna e oficial (Portugal e Brasil) e língua oficial (Angola, Cabo Verde,
Moçambique, São Tomé e Príncipe e Guiné-Bissau – que constituem os
Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) – e Timor-Leste.
Entretanto, não se pode restringir a lusofonia ao que as fronteiras nacio-
nais delimitam. Nesse modo de conceber a lusofonia, há que se conside-
rar as muitas comunidades espalhadas pelo mundo e que constituem a
chamada “diáspora lusa” e as localidades em que, se bem que nomeiem o
português como língua de “uso”, na verdade, ela seja minimamente (se
tanto) utilizada: Macau, Goa, Ceilão, Cochim, Diu, Damão e Málaca.
Além disso, a lusofonia é inconcebível sem a inclusão da Galiza (LOU-
RENÇO, 2001). Somam-se a isso outras regiões de presença portuguesa
no passado e/ou onde, relativamente, se fala português ainda hoje: na
África – Annobón (Guiné Equatorial), Ziguinchor, Mombaça, Zamzibar;
na Europa – Almedilha, Cedilho, A Codosera, Ferreira de Alcântara, Ga-
liza, Olivença, Vale de Xalma (Espanha).
Essa síntese do mundo lusófono – que se procura reunir na noção
de lusofonia (mesmo que miticamente) – pretende conciliar diversidades e
afinidades linguísticas e culturais com a unidade que estrutura o sistema
linguístico do português.
Tem-se, nessa breve descrição, a dimensão geográfica da língua por-
tuguesa a espalhar-se por espaços múltiplos, numa área extensa e descon-
tínua e, que, como qualquer língua viva, se apresenta internamente carac-
terizada pela coexistência de várias normas e subnormas. Essas divergem
de maneira mais ou menos acentuada num aspecto ou noutro, numa dife-
renciação que, embora não comprometa a unidade do sistema linguístico,
possibilita-nos reconhecer diferentes usos dentro de cada comunidade.
Assim se reconhecem, por exemplo, o “Português Europeu” e o “Portu-
guês Brasileiro” (e os muitos falares dentro de cada um), da mesma forma
que já se esboçam, felizmente, estudos descritivos acerca do português nos
demais espaços da CPLP: “se queremos dar algum sentido à galáxia lusó-
fona, temos de vivê-la, na medida do possível, como inextricavelmente
portuguesa, brasileira, angolana, moçambicana, cabo-verdiana ou são-
tomense” (LOURENÇO, 2001, p. 112).
Desse modo, é necessário ter clareza quanto aos papeis distintos que
a língua portuguesa forçosamente cumpre em cada localidade; pensar a
lusofonia é, igualmente, pensar na função que o português desempenha
em cada um dos contextos de sua “oficialidade” – é, por exemplo, língua
materna no Brasil, mas, ao mesmo tempo, é totalmente desconhecida em
muitos espaços moçambicanos ou timorenses. Assim sendo, do lado afri-
cano há considerações que concebem a lusofonia “como um conceito vago,
uma estratégia política e cultural sem qualquer correspondência com a
alma e o sentir dos povos africanos” (PACHECO, 2000); outros entendem
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que “o fato de Angola pertencer à Comunidade dos Países de Língua Por-
tuguesa (CPLP) e aos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa
(PALOP) poderia reforçar essa presença [do português no território] se
uma política linguística clara e consequente fosse aplicada perante o ensino
da língua portuguesa dum lado e das línguas autóctones do outro”
(KUKANDA, 2000, p. 112).3
A fim de compreender a situação atual da língua portuguesa no que
se denomina “espaço lusófono”, é preciso recorrer a informações acerca da
entrada do português nas diferentes colônias. Como se sabe, ao contrário do
que fizeram outros colonizadores europeus, nunca houve por parte de Por-
tugal uma relação entre expansão marítima e expansão linguístico-cultural.
A história é transparente nesse sentido, revelando a ausência de uma “polí-
tica de implantação linguística” e mostrando que a difusão que a língua
portuguesa alcançou deveu-se, sobretudo, à presença de mercadores, mari-
nheiros, navegadores, aventureiros, deportados e missionários, os quais,
por motivos e circunstâncias dos mais diversos, chegaram às novas terras.
Os compêndios relatam sobre a grande massa emigratória de por-
tugueses (principalmente a partir da conquista de Ceuta) para as terras
recém-descobertas, mas que ocorreu de modo um tanto assistemático. Foi
de tal forma intensa a dispersão dos portugueses pelo mundo que há refe-
rências preocupadas com o esvaziamento populacional do reino português
– Garcia de Resende (poeta e cronista do Humanismo), por exemplo, de-
monstrou-se apreensivo com a saída em larga escala dos portugueses do
reino, que, dificilmente, regressavam, acarretando em entraves para o de-
senvolvimento interno de Portugal.
Apesar disso, indicações oficiais quanto à atividade de colonização
de terras africanas apenas ocorrem no século XIX, às vésperas da Indepen-
dência do Brasil: “nas críticas circunstâncias em que nos achamos, é neces-
sário dar uma particular atenção aos nossos estabelecimentos de África e
ilhas adjacentes a Portugal” – assinala o Relatório sobre o Estado e Adminis-
tração do Reino, de Fernandes Tomás, apresentado às Cortes em 1821. Com
iminente ruptura com o Brasil, “recomendava-se uma concentração de
todos os esforços e de todos os meios em Portugal e nas possessões da
África e Ásia que lhe restariam” (ALEXANDRE, 1998, p. 61).
O início do século XX será marcado por divergências acerca de um
“programa” a ser adotado nas províncias de ultramar, que culminará com
a elaboração de um novo projeto de política colonial.
É da essência orgânica da Nação Portuguesa desempenhar
a função histórica de possuir e colonizar domínios ultra-
marinos e de civilizar as populações indígenas que neles
se compreendam, exercendo também a influência moral
que lhes é adstrita pelo Padroado do Oriente (ACTO CO-
LONIAL – Art. 2º).
3Outros comentários sobre lusofonia e percepções da lusofonia pelos diferentes povos: Brito e
Bastos (2006); Martins (2006); Namburete (2006); Fiorin (2010); Brito e Hanna (2010).
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Assim determina o artigo 2º do Acto Colonial (1930), no qual Sala-
zar apresenta o projeto político para as colônias e recupera a ideia da
vocação e do direito histórico de Portugal às atividades colonialistas: os
“domínios ultramarinos e Portugal denominam-se colônias e constituem
o Império Colonial Português” (art. 3º). De maneira centralizadora, as
colônias passam a estar totalmente integradas e subordinadas às necessi-
dades, às decisões administrativas e aos interesses da metrópole. No as-
pecto educativo e cultural, o artigo 24º do Acto considera como instituições
de ensino as missões religiosas, que atuariam como instrumento de civili-
zação e de influência nacional. Essas colocações ajudam a ilustrar o fato
de que apenas nesta altura é que preocupações (especificamente de or-
dem econômica) da metrópole para com as colônias não americanas co-
meçam a delinear-se.
5Sérgio Vieira de Mello foi morto em atentado ao escritório das Nações Unidas no Iraque,
no dia 19 de agosto de 2003, enquanto desempenhava suas funções como representante da
ONU.
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Nesse sentido, não se pode, também, ignorar que a língua portu-
guesa não é a língua da maioria da população timorense (em algumas
localidades, como no enclave de Oe-Cusse e Lautem há quem não a co-
nheça). Pode-se afirmar que é a segunda língua (depois do tétum, língua
nacional e veicular), e até, para alguns, a terceira língua, depois da local e
do tétum (além, é claro, da língua indonésia).
Contudo, na perspectiva do linguista Luiz Filipe Thomaz (2002, p.
143), é a língua portuguesa, ao lado da religiosidade, um dos fatores capa-
zes de viabilizar a concretização da unidade nacional timorense:
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A administração direta do território acontecerá com Celestino da
Silva, governador de 1894 a 1908, que, com a “mobilização dos arraiais
dos reinos aliados para submeter os régulos rivais” (BETHENCOURT,
1998, p. 204), tenciona ocupar militarmente o interior, instalando postos,
ligados por linhas telegráficas e por estradas. Desse modo, ainda que as
localidades estivessem sob o controle das autoridades tradicionais, o
controle efetivo estaria nas mãos dos chefes de posto. Em decorrência
dessa forma de administração, algumas revoltas ocorreram e foram re-
primidas com intervenção armada.
A reorganização das missões católicas em 1877 e a criação, em
1898, do Colégio de Soibada (dirigido por jesuítas até 1910) contribuiu
para a formação de professores-catequistas, cujo intuito era o de alfabeti-
zar, doutrinar e (porque não dizer) aculturar – as populações rurais. Em
1938, planeja-se criar em Díli um colégio-liceu semioficial, que foi arrui-
nado pelos japoneses durante a ocupação que fizeram ao território du-
rante a Segunda Grande Guerra (1942-1945), e que só volta a funcionar
em 1952.
É de se destacar, ainda, a presença dos chineses em Timor-Leste:
via de regra, os homens dominavam o português nas modalidades oral e
escrita, mas utilizavam o tétum como língua de comunicação cotidiana
com a população local. Mantinham escolas pelo país (18 primárias e 1
secundária), mesmo com a administração portuguesa exigindo, apenas, a
inclusão das disciplinas língua e cultura portuguesas.
Certo é que a língua portuguesa nunca chegou a tornar-se língua
normal de comunicação oral, nem língua de contato entre etnias diferen-
tes – papel que sempre coube ao tétum. Manteve, via de regra, o caráter
de língua clerical, administrativa e de cultura; embora sua função seja
relevante no plano interno, articulando a unidade cultural por meio de
uma pequena elite de letrados nativos e, no plano externo, procurando
associar a cultura local ao universo lusíada.
Vale lembrar, ainda, que o modelo de colonização portuguesa, em
que se destacam o processo de miscigenação com os timorenses (que
levou à assimilação de hábitos) e a conversão ao catolicismo, dentre ou-
tros aspectos, contribuíram para a incorporação natural de algumas pou-
cas estruturas morfossintáticas e de muitos elementos lexicais portugue-
ses ao tétum. É evidente que a administração colonial privilegiava o por-
tuguês como língua de instrução, ensinada nas escolas, veiculando con-
teúdos da cultura lusa, e que se empregava na modalidade escrita, em
atividades ditas culturais ou administrativas. Contudo, em termos de
comunicação espacial e entre pessoas de línguas maternas diferentes, o
tétum era usado nas situações cotidianas.
Antes da invasão indonésia ocorrida em 1975, a situação linguísti-
ca apresentava-se assim distribuída:
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a) línguas locais ou regionais – veículos de comunicação nas diver-
sas localidades, como o bunak, o kemak, o galole, o fataluko etc.;
b) língua veicular – o tétum, funcionando como elemento de inte-
gração;
c) língua administrativa – o português – única língua normalmen-
te escrita. O português também exercia certa função integradora,
pelo menos na camada dirigente e no ambiente letrado.6
Diversamente do que ocorreu em muitos países na época de des-
colonização, em 1975, Timor-Leste tinha certa unidade linguística, garan-
tida pelo uso do tétum. Além disso, apesar de criticar o colonialismo sa-
lazarista, tanto a Fretilin (Frente Revolucionária do Timor-Leste Inde-
pendente) quanto a Apodeti (Associação Popular Democrática Timoren-
se, favorável à indexação pela Indonésia) continuaram a “valorizar a
língua portuguesa como elemento ancestral e integrado na cultura nacio-
nal” (HULL, 2001, p. 37).
Durante o domínio indonésio, Timor-Leste sofreu um processo de
“destimorização” em diversos planos da vida da população, que, no âmbi-
to comunicativo, incluiu uma nova forma linguística, traduzida na imposi-
ção de uma variante do malaio, a bahasa (ou língua) indonésia, como língua
do ensino e da administração, na minimização do uso do tétum e na proibição
da expressão em língua portuguesa.
A partir de 1999, com a chegada das forças de paz da ONU, novas
línguas – em especial, e com sua força natural, o inglês (também língua da
vizinha Austrália) – começam fortemente a fazer parte do dia a dia timo-
rense. Como resultado, atualmente, o país se apresenta como um complexo
mosaico linguístico: além do tétum e das dezenas de outras línguas locais,
os timorenses falam a bahasa indonésia, procuram recuperar a memória do
português (no caso dos mais velhos) ou aprendê-lo (no caso das novas
gerações), e tentam expressar-se em inglês.
Timor-Leste acaba de sair de um período em que falar português
poderia significar a morte. Neste novo momento (comemoraram-se, em 20
de maio de 2010, 8 anos de independência) de país em reconstrução – das
estruturas físicas, da organização da Nação e da identidade do cidadão –,
não é por acaso que, por decisão do Congresso do Conselho Nacional de
Resistência Timorense, em 29 de agosto de 2000, o português é declarado
língua oficial. Na ocasião, disse o então líder da Resistência, Xanana Gus-
mão:7 “Tendo em mente a nossa história, nós devemos fortalecer a nossa
língua materna, o tétum, disseminar e aperfeiçoar o domínio da língua
portuguesa e manter o ensino da língua indonésia”. Mais adiante, já como
Presidente eleito da República Democrática de Timor-Leste, ao ratificar
Apesar desse papel que parece lhe caber, ainda muito pouco se tem
sistematizado acerca das peculiaridades do português falado em Timor-
Leste – o que se configura como mais um desafio para o momento atual em
que se busca a alfabetização de jovens e adultos no país: que português
será esse que uma parcela do povo timorense traz na memória?9
Nos últimos anos, quando a solidariedade internacional se voltou,
nos vários setores, para essa meia ilha no sudeste asiático, questões sobre a
legitimidade dessa ajuda se colocam. Uma delas envolve a “reintrodução”
da língua portuguesa. Seria uma nova forma de colonialismo? Por que,
sobretudo, portugueses e brasileiros, de diferentes maneiras, têm-se dirigi-
do para lá? Despertar o português significaria ameaçar as línguas locais?
Representaria o auxílio no resgate da identidade timorense ou a sua perda?
Na verdade, a função e a necessidade da revitalização da língua
portuguesa em Timor-Leste são temas constantemente discutidos pelos
timorenses. Compreende-se o português como elemento capital tanto para
a salvaguarda das línguas nacionais, quanto para a preservação da identi-
dade nacional, conforme acentua Hull (2001, p. 39):
10 A iniciativa foi apoiada pelo Governo Federal e pelo Ministério das Relações Exteriores
do Brasil e pela ABBA (Academia Brasileira de Belas Artes).
11 A Revista Pessoa, em seu número zero, lançada na Bienal do Livro de São Paulo (agosto de
2010), traz reportagem a respeito do Projeto, mostrando a atualidade da ação. Disponível
em: <www.revistapessoa.com.br>. Acesso em: 2 set. 2010.
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O “Projeto Universidades em Timor-Leste” foi realizado12 em
ação conveniada entre a Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM),
Universidade de São Paulo (USP) e a Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo (PUC-SP) – pelo lado brasileiro –, com o apoio da Univer-
sidade Nacional de Timor-Leste (UNTL) e do Instituto Nacional de
Linguística (INL), pelo lado timorense. Foi com o subprojeto Canção
popular e cultura brasileiras em Timor-Leste: hibridismo cultural e comunita-
rismo linguístico em execução e discussão, de nossa autoria e em coautoria
com Benjamin Abdala Junior (USP), com a contrapartida do linguista
timorense Benjamim Corte-Real, que a ação ocorreu entre agosto e de-
zembro de 2004.
Apoiando-se em investigação sociolinguística, aliada a debates
com Benjamin Corte-Real13 e Geoffrey Hull,14 o Projeto fundamenta-se
em estudos descritivos da situação linguística e cultural do país, a partir
de entrevistas, consultando-se indivíduos pertencentes a diferentes
faixas etárias, classes sociais, localidades, escolaridade, profissões e
sexo. Complementarmente, foram recolhidos e analisados textos produ-
zidos por timorenses e coletados elementos de natureza diversa, como
músicas, receitas, jornais, cartazes, panfletos etc. – o que forneceu sub-
sídios para análises contrastivas15 que evidenciaram especificidades
linguísticas e culturais de cada Distrito timorense.
Essa iniciativa, submetida à aprovação de instâncias governa-
mentais, educacionais e linguísticas timorenses, define-se como pro-
grama pedagógico-cultural para auxiliar na difusão e na sensibilização
para a comunicação e a expressão em português, em conformidade com
a política nacional de cooperação entre os países de língua portuguesa,
utilizando-se, neste caso, da canção popular brasileira como motivação
didática. Diante da proposta do Projeto, em documento de outubro de
2003, assim se expressou o Presidente Xanana Gusmão:
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segmentos, fazendo com que a clientela se ampliasse. Dessa forma, incluí-
ram-se alunos da Escola Primária Duque de Caxias;16 integrantes das Forças
de Defesa de Timor-Leste; funcionários do Ministério da Educação, Cultura,
Juventude e Desporto; Organização da Juventude e dos Estudantes de Ti-
mor-Leste e, ainda, docentes da Faculdade de Letras e Educação da UNTL.
Assim, as atividades desenrolaram-se em diversas instituições oficiais, esco-
lares e comunitárias, atendendo a cerca de 600 leste-timorenses. Cada turma
participava de dois encontros semanais, com duração de 1h40 cada um, mi-
nistrados por equipes de 3 monitores, que planejavam as atividades tendo
em vista o Descritivo de atividades módulo a módulo17 − material elaborado não
como um manual de instruções, mas como um norteador das ações didáticas
que garantisse a homogeneidade dos trabalhos, sem, contudo, limitar a cria-
tividade da equipe.
Partindo de uma concepção sociofuncional dos fatos da linguagem,
associando elementos musicais e linguísticos ao conjunto da cultura brasi-
leira, em atividades epilinguísticas, de operação e de reflexão sobre os tex-
tos e alguns fatos de língua, as atividades organizaram-se em 14 módulos,
formados por músicas brasileiras e textos em torno de temas como amor,
religiosidade, futebol, carnaval, saudade, esperança, tempo, loucura, cons-
trução poética, saudações e cumprimentos. As músicas foram selecionadas
considerando-se serem do interesse do público ou já serem conhecidas (e
indicadas!) por timorenses, às quais acrescentaram-se outras relacionadas
com os temas. Após os 7º e 14º módulos, foram realizadas avaliações parci-
ais (preparação e apresentação de trabalhos em cada turma) e uma avalia-
ção final (apresentação de coral, peças de teatro, jogral etc., apreciados pelo
público timorense no auditório da UNTL).
O contato com músicas e com textos de modalidades várias permi-
tiu a abordagem, ainda que indiretamente, de tópicos como os papéis da
cultura brasileira e da língua portuguesa no contexto mundial e em Timor-
Leste. Procurou-se apresentar a diversidade da música brasileira e as vari-
edades linguísticas, o conhecimento de outras culturas expressas via língua
portuguesa, aspectos da multiplicidade linguística de Timor-Leste, a im-
portância da comunicação, a relação entre língua e cultura e a problemática
tradução “palavra-por-palavra”. As aulas recorreram à reprodução origi-
nal das canções em CD player e à execução ao vivo, procurando sensibilizar
os alunos para o aprendizado do manuseio dos instrumentos musicais
utilizados, bem como para as atividades de composição musical e de ma-
nejo de recursos linguísticos básicos.
Também não se podia pensar numa atuação significativa sem esta-
belecer uma relação com a realidade da cultura local e desconsiderando a
visão de mundo que a modalidade do português timorense (e, naturalmen-
16 O nome da escola é uma homenagem ao patrono do Exército Brasileiro, uma vez que foi
“apadrinhada” por diversos contingentes brasileiros no período de 1999 a 2005, quando lá
estiveram, atuando como forças de paz das Nações Unidas.
17 De nossa autoria, juntamente com Rosemeire Faccina e Vera Busquets.
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te, a das línguas locais) revela. É impossível ignorar que as línguas são
fatos culturais e que o aprendizado de uma língua supõe, ao lado do seu
domínio, o conhecimento da cultura que a sustenta e o respeito à multipli-
cidade de olhares. Nesse sentido, são significativas as impressões do entro-
samento entre brasileiros e timorenses registradas no Relatório Avaliativo
do Projeto encaminhado pela UNTL:
O sucesso de fundo do projecto não deixa de ser o ter-se
promovido uma interacção cultural entre jovens da comu-
nidade e do espaço lusófonos, um principiar tentativo, mas
de evidente rendimento; o gerar-se de uma amizade e soli-
dariedade entre gente que nunca imaginava antes poder
cruzar-se. A electricidade que se sentiu no aeroporto, a-
quando da despedida dos estagiários serve de ilustração.
Foi uma singular e espontânea exibição de cantares e danças
tradicionais, assinalando uma camaradagem invejável entre
jovens de latitudes tão opostos mas unidos por um denomi-
nador comum que é o do seu passado histórico, a língua e a
cultura portuguesas. (Benjamim Corte-Real).
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Pensando no grande objetivo, ou seja, na sensibilização para a comu-
nicação em língua portuguesa, registrou-se que o fato de as turmas serem
constituídas por indivíduos de diferentes níveis de conhecimento, domínio e
uso da língua portuguesa não influenciou no resultado geral observado, no
que diz respeito à aproximação com a Língua Portuguesa, à simpatia pela
expressão em língua portuguesa, ao interesse pelo aprendizado da Língua
Portuguesa, à curiosidade pela cultura brasileira e pelas semelhanças com a
timorense e com a portuguesa, a certa desinibição para a expressão oral em
português, ao notável esforço para o registro escrito em português.
Percebe-se uma alteração na postura de muitos frente ao português,
que, afinal, “não é tão difícil assim” – como registram relatórios dos parti-
cipantes e de autoridades e depoimentos de alunos timorenses.
4 Para concluir
Uma língua não tem outro sujeito senão aqueles que a fa-
lam, nela se falando.
Ninguém é seu proprietário...
(Eduardo Lourenço, 2001, p. 123).
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considerados para o bom desenvolvimento de um programa sociocultural
e educativo que objetive a motivação para a aprendizagem de uma língua.
A fim de que se efetive a expansão do uso da língua portuguesa em
Timor-Leste e o fortalecimento da sua língua nacional, muito ainda há a ser
feito. Para tanto, conforme se discutiu na “Conferência internacional para o
futuro da língua portuguesa no contexto mundial”, realizada em Brasília
(março de 2010), governos e universidades podem contribuir para o pro-
cesso, por exemplo, assumindo papeis de membros ativos e cooperativos
na CPLP − Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e na sua vertente
cultural, a AULP – Associação das Universidades de Língua Portuguesa.
Como assinalou-se em Brito e Martins (2004), tendo sempre em
vista que, no âmbito da lusofonia, não se pode assumir uma posição –
ingênua – de “senhor” da língua portuguesa. Em Timor-Leste, como em
cada um dos outros espaços de sua oficialidade – Angola, Brasil, Cabo
Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe – a língua
portuguesa conhece e constrói a sua própria história. E, por isso, está
muito longe de poder ser tratado como um idioma uniforme. É com essa
perspectiva que se deve encarar o “desafio” da língua portuguesa em
Timor-Leste: está-se diante de mais uma variedade do português. E,
como tal, devemos atentar para a necessidade urgente de uma descrição
do português ali praticado (observando-se as influências que recebe do
contato com as demais línguas ali faladas) e incentivar a descrição e
sistematização da língua tétum, respeitando, sobretudo, as experiências
particulares, os valores diferentes, a especificidade cultural e a visão de
mundo que a sociedade timorense vem imprimindo na construção da
norma do português timorense, ao mesmo tempo em que reconstrói a sua
identidade como nação.
Por fim, cabe à chamada comunidade lusófona acreditar na força
do português e valorizá-la. Sendo a sexta língua mais falada no globo,
deve vê-la como uma forma de união e também, no caso aqui em desta-
que, percebê-la como um dos mecanismos de inserção dos timorenses no
mundo que se quer globalizado.
Topics for the understanding of the Current Linguistic Landscape of East Timor
Abstract
Colonized by the Portuguese, East Timor experienced a policy of "destimorization" between
1975 and 1999, carried out by the Indonesian ruler. At the linguistic level, it represented the
inclusion of a new form, manifested in the imposition of the Indonesian language, in order
to minimize the use of the national language, Tetum, and the prohibition of the Portuguese
language. In 1999, the UN arrives in East Timor with the purpose of maintaining peace and
initiating the reconstruction of the country. With the independence and the constitution of
the Democratic Republic of East Timor, in May 2002, the Portuguese language assumes the
status of official language alongside Tetum and dozens of other local languages spoken
192 Ciências & Letras, Porto Alegre, n. 48, p. 175-194, jul./dez. 2010
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there. Based on the concept of Lusophony, this study presents aspects of the current
situation of the Portuguese language in East Timor and the prospects for its reintroduction,
illustrated by the experience of the Universities Project in East Timor.
Referências
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