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JEAN-PAUL AUFFRAY

INSTITUTO
PIAGET
Título original
L'Espace-Temps

Autor
Jean-Paul Auffray

Colecção
Biblioteca Básica de Ciência e Cultura,
sob a direcção de António Oliveira Cruz

Tradução
João C. Duarte

Capa
Dorindo Carvalho

Copyright
Flammarion, 1998 - Collection DOMINOS

Direitos reservados para Portugal:


INSTITUTO PlAGET, Av. João Paulo II, lo te 544, 2.0 -1900-726 Lisboa
Telef.: 837 17 25
E-mail: piaget.editor a@mail.telepac.pt

Fotocomposição e impressão
Gráfica Manuel Barbosa & Filhos, Lda.

ISBN: 972-771-187-1
Depósito legal: 139 637/99

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qualquer processo electrónico, mecânico ou fotográfico, incluindo fotocó-
pia, xerocópia ou gravação, sem autorização prévia e escrita do ed itor.
Jean-Paul Auffray. Após estudos superiores na Universidade de
Columbia de Nova Iorque, Jean-Paul Auffray efech1ou investiga-
ções em física teórica no prestigiado Courant Institute of Mathe-
matical Sciences fundado em Nova Iorque pelos matemáticos da
Universidade de Gõttingen emigrados nos Estados Unidos desde
a Segunda Guerra Mundial.
Cientista de formação, músico por tradição, literário por incli-
nação, historiador e filósofo por gosto, Jean-Paul Auffray é daqueles
que não hesita em «tocar tudo», convencido, que o conhecimento
se adapta mal a especializações categoriais que as restrições aca-
démicas lhes tentam impor.
O Espaço-Tempo, livro de história da ciência, é a sua primeira
obra para o grande público. Ele é igualmente o autor de L'Atome,
publicado em 1997 na mesma colecção.
A memória de Évariste Galois,
que morreu aos 20 anos
NOTA. - A primeira vez que aparecer urna palavra
pertencente a um vocabulário especializado,
explicitada no g lossário, será assinalada por
um*.
8
Prefácio

espaço e o tempo são as referências familiares no


O quadro das quais interpretamos aquilo que
apreendemos do mundo que nos rodeia, e em parti-
cular o movimento. É assim desde os primórdios da
humanidade. No entanto, isto não significa que o
homem tenha sempre concebido o espaço e o tempo da
mesma forma, ou que os tenha colocado ao mesmo
nível: o espaço remete para o local, portanto para os
problemas da nossa localização no Universo; o tempo
é aquilo que foge e nos faz lembrar a nossa condição
de mortais. Ele levanta a questão do depois, que está
no âmago das especulações da metafísica e da religião,
e não deixa de nos obcecar.
No entanto, para além desta diferença do que está
em jogo, bem depressa se tornou evidente que o espaço
e o tempo se encontravam ligados, quanto mais não
fosse através da questão do movimento. Pensemos nos
paradoxos de Zenão de Eleia, cujo eco se ouve ainda g
em Paul Valéry: «[. ..] esta flecha alada que vibra, que
voa, e que não voa!» Daí uma interrogação constante
quanto à possível identidade de estatuto do espaço e
do tempo: um e outro são realidades - será necessário
dar-lhes um valor absoluto? - ou são apenas rela-
tivos? ...
A questão está no centro das discussões da ciência
moderna nascente e da filosofia clássica, da Renascença
a Kant, do século xv ao século XVIII. Mas ainda será
preciso esperar mais de um século para que seja
demonstrado que existe mais que uma identidade de
estatuto: o espaço e o tempo devem conceber-se em con-
junto. Será a «invenção» do espaço-tempo, cujos méri-
tos foram atribuídos, de forma indubitavelmente dema-
siado exclusiva (como o veremos) a Albert Einstein.
Na primeira parte desta obra, tentaremos explicar
a invenção do espaço-tempo: no fim de que processo se
impôs ela como uma necessidade? E em que é que
consistiu exactamente? Em seguida ocupar-nos-emos
de um grande debate.
Com efeito, uma espectacular diferença de opinião
divide hoje os físicos sobre o papel que deve ser atri-
buído ao espaço-tempo na explicação dos fenómenos
da física: de um lado, os que, seguindo Einstein,
pensam poder «explicar tudo» apenas por meio das
propriedades presumidas do espaço-tempo; por outro,
os que - mais numerosos - estão a favor de um ponto
de vista fundamentalmente diferente.
Na segunda parte, examinaremos de perto a pro-
blemática que esta controvérsia levanta. Veremos no
quadro deste grande debate, como certas ideias que
puderam parecer «boas» se revelaram <ifalsas»; como
1o outras que pareciam «bizarras» encontram, no entanto,
um lugar na nossa compreensão do modo de fun-
cionamento da natureza. Descobriremos quarks*, cor-
das*, supersimetria* e outros ingredientes exóticos da
física contemporânea, e correremos o risco de tentar,
para terminar, formular uma nova concepção do
movimento no espaço-tempo.
Após termos efectuado este percurso, a nossa
maior recompensa seria ter feito sair o espaço-tempo
da abstracção das fórmulas e o termos domesticado o
suficiente para que ele consinta em lançar sobre todos
nós, tal como um génio familiar, algl!ma luz sobre o
funcionamento desse mundo misterioso que nos cerca.

11
Galileu
Observador atento dos fenómenos da natureza, Galileu foi um
dos primeiros a utilizar as matemáticas para a explicação das leis
da física. Este fresco, pintado em sua honra no Museo Zoologico de
Florença, representa a célebre experiência do plano inclinado, por ele
realizada em Pisa. Distingue-se em segundo plano a torre inclinada.
Fresco de Giuseppe Bezzuoli (1784-1855).
Tribuna di Galileo, Florença.
©Scala
12
O movimento partilhado

Um matemático experimenta no seu trabalho


a mesma impressão que um artista;
o seu prazer é igualmente grande e da mesma natureza
HENRI POINCARÉ

ciência, a história e a poesia são as três fadas


A que presidiram à invenção do espaço-
-tempo em 1905. Apesar disso, nunca é demasiado
insistir num ponto: esta invenção não teve a
intenção de «resolver» a questão do espaço e do
tempo, desvendando de uma vez por todas a sua
natureza, mas sim a de contribuir com uma res-
posta a um enigma mais prosaico: «Ü que é o
movimento?»
Não nos espantemos. Com efeito, por um
lado, o movimento implica simultaneamente o
espaço e o tempo: constitui uma síntese natural
das duas noções. Por outro lado, se existe uma
constante do pensamento ocidental, é de facto
a que conduziu a filosofia e a ciência a privile-
giar, como ângulo de ataque da interrogação
sobre o espaço e o tempo, a questão do movi-
mento. A tal ponto que é lógico que esta questã o 15
- aparentemente mais modesta mas de natureza
a permitir que se desvelassem mais conhecimen-
tos seguros - tenha progressivamente tomado o
lugar da primeira. Recordemos alguns marcos
essenciais.

De Aristóteles a Galileu
Esquematizando um pouco, o estudo filosófico
e científico do movimento toma forma verdadei-
ramente com Aristóteles (384-322 a. C.). Diver-
gindo num ponto essencial do seu mestre Platão,
que atribuía toda a realidade ao reino do mundo
supra-sensível (o mundo das Ideias), Aristóteles
pretendia, pelo contrário, conciliar o ser e o devir
no seio de cada elemento da natureza, apresen-
tando uma visão do mundo ordenada e hierar-
quizada. A sua teoria do movimento é o cerne
desse empreendimento. Ela atribui a cada objecto
um lugar que lhe é próprio, no qual ele está em
repouso quando aí se encontra, e para o qual
tende a voltar mal se encontre afastado. Nesta
concepção, o movimento e o repouso são pois
dois estados distintos: um objecto está ou em
movimento ou em repouso. Se está em movi-
mento, é porque, afastado do seu lugar, procura
voltar a ele; está absolutamente em movimento. Se
está em repouso, é porque ocupa o seu lugar;
está absolutamente em repouso. Cada coisa tem o
seu lugar, com uma hierarquia complexa dos
seres s ubindo do mais baixo até ao m ais alto.
16 Também n ão é d e espanta r que o pensamento
V

O movimento partilhado
«A pedra atirada do cesto da gávea cairá [na base do mastro]
seja de que maneira o barco se mova.» Giordano Bruno, Le Ban-
quet des cendres (1584).
Retomada por Galileu, esta ideia conduziu à observação que o
movimento partilhado por vários corpos e como nullo - não tem
efeito observável -, primeira formulação do princípio da relatividade.

aristotélico - aliado ao sistema astronómico de


Ptolomeu - tenha podido seduzir os teólogos
cristãos que, com São Tomás de Aquino, acaba-
ram por lhe conceder um valor quase oficial.
Nestas condições, atacar os dogmas cristãos, e
tornar a pôr em causa a concepção aristotélica de
um mundo finito onde tudo circula e se move de
maneira regular teve frequentemente a ver com
um mesmo empreendimento.
Vinte séculos depois de Aristóteles, o filósofo
italiano Giordano Bruno (1548-1600) quis que-
brar as grilhetas com que o pensamento escolás-
tico aprisionava o mundo, associando na sua 17
obra, de uma forma típica de muitos pensamen-
tos da Renascença, objectivos novos, e até profé-
ticos, a elementos extraídos do repertório da
magia e do hermetismo*. Ele ousou pensar até
ao extremo limite a infinidade do Universo, apo-
derou-se com entusiasmo da hipótese avançada
pelo astrónomo polaco Nicolau Copérnico (é a
terra que gira à volta do Sol, e não o inverso ... ),
e pôs radicalmente em causa o geocentrismo*.
Isto - entre outras coisas - valeu-lhe a morte em
1600, a língua pregada, numa fogueira prepa-
rada pela Inquisição.
Quase inclassificável filosoficamente, Bruno
representa, sob um ponto de vista científico, a
ligação entre Copérnico e Galileu. Em Le Banquet
des cendres (1584), Bruno põe o problema, que
posteriormente se tornou célebre, da pedra caindo
do alto do mastro de um navio em movimento.
Ele afirma: «A pedra atirada do cesto da gávea
voltará para baixo seja qual for o movimento do
barco.»
A exactidão desta afirmação só foi verificada
meio século mais tarde, quando o filósofo fran-
cês Gassendi (1592-1655), tendo reunido as con-
dições de experimentação necessárias, deixou
cair uma pedra do alto do mastro de uma galera
fretada especialmente no porto de Marselha.

De Galileu a Newton
No Diálogo sobre os dois grandes sistemas do
mundo, publicado em 1632, o cientista de Pisa,
18 Galileu (1564-1642), por seu turno, volta a pôr
em causa o aristotelismo e o sistema ptolemaico
evitando no entanto encontrar nisso um pretexto
para voos filosóficos à maneira de Bruno. Reto-
mando, não obstante, as observações deste último,
verifica que as aves numa gaiola se comportam
da mesma maneira, quer a gaiola esteja no cais de
Veneza, quer seja transportada a bordo de um
barco navegando num mar tranquilo. Conclui daí
que o «movimento partilhado» (o do barco) -
movimento dito partilhado porque é comum a
todos os que o partilham - não tem um efeito
observável: é como nulo («nulo por assim dizer»).
No ano seguinte, René Descartes (1569-1650)
envia para impressão o texto do seu tratado Le
Monde. Nele defende, entre outras coisas, sem o
mínimo propósito anticristão, uma física
antiaristotélica e adere à hipótese de Copérnico.
Tomando conhecimento das desgraças de Gali-
leu - que acabava de ser forçado a abjurar de
joelhos as suas explicações a respeito do movi-
mento da Terra, num contexto geral de inflexibi-
lidade da Igreja-, manda retirar imediatamente
o seu texto. Retomará estes elementos nos Prínci-
pes de la philosophie, publicado dez anos mais
tarde (1644). Nesta suma do seu pensamento,
que visa substituir, no uso escolar, os manuais de
inspiração escolástica, Descartes avança três
grandes ideias quanto ao movimento. Reve-
lar-se-ão fundamentais para a continuação da
nossa história.
Primeiro, enuncia Descartes, «Não há nada
de absoluto no movimento a não ser a separação
de dois corpos em movimento um em relação ao 19
outro, mas dizer que um dos corpos está em
movimento e que o outro se encontra em repouso,
isso é relativo e depende da nossa maneira de
conceber». Notemos, de passagem, o uso neste
texto da palavra «relativo». Em seguida, qual-
quer objecto em movimento transporta consigo
uma certa «quantidade de movimento». Final-
mente, noção essencial respeitante à estrutura do
espaço, «O espaço, ou o lugar interior, e o corpo
que está compreendido neste espaço, também só
são diferentes ... no nosso pensamento. Porque,
com efeito, a mesma extensão em comprimento,
largura e profundidade que constitui o espaço,
constitui o corpo». Numa palavra, o espaço, tal
como os objectos (Descartes chama-lhes os cor-
pos), tem três dimensões.
Doze anos depois da morte do filósofo fran-
cês em 1650, o matemático e físico inglês Isaac
Newton (1642-1727), inserindo-se, relativamente
a esta questão, na linha de uma tradição teológica
de origens judaicas que concebe o espaço como
um atributo de Deus, opõe às concepções relati-
vistas de Descartes - «Não há nenhum lugar
onde alguma coisa do mundo esteja firme e imó-
vel, senão na medida em que a paramos no nosso
pensamento» - a ideia de um espaço, de um
tempo e de um movimento absolutos: Newton
«absolve» o espaço e o tempo relativos ou vulga-
res de Descartes de toda a ligação com
as coisas que lhes são exteriores; reinventa, sob
uma outra forma, o espaço absoluto de Aristó-
teles «por si mesmo eterna e imutavelmente
20 imóvel»; e adopta, para o tempo, uma noção
1

/
/ L---------
/
/

As dimensões do espaço
Percepcionamos o espaço como tendo três dimensões: compri-
mento, largura e profundidade. Essas dimensões são uma reali-
dade ou simples fruto da nossa imaginação?

expressa pelo seu professor de matemática em


Cambridge, Isaac Barrow: Whether things move ar
are still Time pursues the even tenour of its way
(«Qualquer que seja o movimento das coisas, o
Tempo, esse, prossegue inexoravelmente o seu
curso regular e constante»).
Dado que Newton se tornou, graças à sua
descoberta e à sua formulação da atracção uni-
versal*, a maior glória científica do seu tempo,
seria necessária uma certa audácia para ousar
pôr em causa os elementos chave do seu pensa-
mento. Foi, no entanto, o que fez Leibniz
(1646-1716). Filósofo importante, preocupado em 21
conciliar os contributos de Descartes e a parte de
verdade que podia, segundo ele, veicular a tradi-
ção aristotélica, matemático sem par, publica um
ensaio no qual critica as ideias do físico inglês e,
no final da sua vida, estabelece por correspon-
dência uma controvérsia com Samuel Clarke
(1675-1729), um êmulo de Newton. Um corpo
em movimento deixa por vezes traços nos cor-
pos imóveis, observa ele. Os homens imagina-
ram que esse traço subsiste, mesmo que não haja
nenhum corpo imóvel para o receber; «mas isto é
somente ideal, e dá apenas como resultado que,
se existisse aí algo de imóvel, o traço poderia ser
desenhado nele», afirma. Leibniz conclui que o
espaço é desprovido de realidade: não é mais do
que a ordem das coexistências possíveis, da
mesma maneira que a duração não é mais do
que a ordem das sucessões possíveis. Espaço,
durações, números, são construções do nosso
espírito - entia mentalia. A hipótese segundo a
qual o espaço e o tempo são absolutos «é uma
ficção impossível».
Reencontraremos em breve estas ideias na
época moderna. Mas não sem que, entretanto,
elas tenham sido submetidas a um longo eclipse.
Com efeito, um século após Descartes, a con-
cepção newtoniana de espaço e tempo absolutos
é largamente aceite. Por exemplo, o suíço Leo-
nhard Euler (1707-1783) apresenta-a como a con-
dição necessária da validade «absoluta» das leis
do movimento (é o inverso que se revelará cor-
recto . .. ). Por seu lado, Kant (1724-1804) coloca o
22 espaço e o tempo do lado do homem, do sujeito
que percebe. Concebe-os como formas a priori da
sensibilidade, isto é, condições necessárias de
uma experiência humana que não incide nunca
sobre a realidade em si, mas sim sobre os fenó-
menos; ele nega a estas duas formas qualquer
realidade objectiva. A posição de Kant, noutros
aspectos de acordo com a física newtoniana,
assinala, sobre a questão que aqui nos interessa,
o longo divórcio futuro entre a filosofia e a ciên-
cia: a primeira, de Hegel a Heidegger passando
por Nietzsche, Bergson e muitos outros, interes-
sar-se-á sobretudo pelas relações da existência e
do tempo, abandonando completamente a refle-
xão sobre o espaço.

Da luz considerada
corno um movimento
As pesquisas sobre o movimento, tal como o
indicámos, estão a base da invenção do
espaço-tempo. Estas pesquisas aceleram-se e
seguem um caminho decisivo com a demonstra-
ção no Observatório de Paris em 1676, pelo
astrónomo Olaüs Rõmer (1644-1710), do facto
que a luz se propaga no espaço a uma veloci-
dade finita - numa palavra, que a luz está em
movimento.
Trabalhando ao lado de Rõmer na Academia
Real das Ciências de Paris, o holandês Christiaan
Huygens (1629-1695) retira da descoberta dos
seus colegas uma importante conclusão. No seu
Traité de la Lumiere (1690), afirma: «Não é possí- 23
vel duvidar que a luz não consista no movimento
de certa matéria.» E continua mais adiante:
«Agora, se examinarmos o que pode ser esta
matéria [ ... ], a que chamo Etérea, veremos que
não se trata da mesma que serve à propagação
do som.» Inspirando-se em ideias propostas por
Descartes, que já via na luz um movimento, ou
mais exactamente, uma tendência para o movi-
mento, propõe um modelo do seu éter*: «Quando
pegamos numa quantidade de bolas de tama-
nho idêntico, feitas de qualquer material
bastante duro, e as colocamos em linha, de
forma que elas se toquem, verificamos que,
quando batemos com uma bola idêntica contra
a primeira dessas bolas, o movimento passa
instantaneamente até à última, sem nos aperce-
bermos que as outras se tenham mexido.»
Demonstra que o movimento assim produzido
se propaga em ondas esféricas a velocidade cons-
tante através do meio e mostra que esta «teoria
ondulatória» permite explicar os fenómenos de
reflexão e refracção da luz.
Estas concepções já não são aceites hoje, sob a
forma imaginada por Huygens; mas. não deixam
por isso de constituir o ponto de partida mais
concretamente atribuível de uma das reflexões
que conduziram à invenção do espaço-tempo.
Com efeito, em 1873, um século depois de
Huygens, o britânico James Clerk Maxwell
(1831-1879) publica o seu Treatise on Electricity
and Magnetism. Nele declara o seguinte: «Em
vários locais deste tratado, foi feita uma tentativa
24 para explicar os fenómenos electromagnéticos
em termos de uma acção mecânica transmitida
de um corpo a um outro por intermédio de um
meio ocupando o espaço entre os corpos. » Partindo
desta ideia, demonstra que a luz pode ser con-
siderada, também, como um fenómeno que se
propaga nesse meio.
Apoia a sua demonstração em duas observa-
ções. Por um lado, a nova teoria está de acordo
com a teoria ondulatória de Huygens no que diz
respeito à existência de um meio capaz de conter
a energia* sob duas formas - potencial e cir1:ética.
Por outro lado, esta teoria introduz uma cons-
tante v. Ora, observa Maxwell, embora os méto-
dos utilizados para determinar o valor desta
constante sejam independentes dos métodos uti-
lizados para determinar a velocidade da luz, os
resultados dessas medidas sugerem que «V = e».
E conclui: isto não poderia ser uma simples coin-
cidência.
Hoje designamos a constante de Maxwell
pela letra e e chamamos-lhe «velocidade da luz
no vazio» ou, mais simplesmente, «velocidade
da luz». Não nos esqueceremos, contudo, que ele
tem ..uma dupla origem e portanto um duplo sig-
nificado.
Maxwell insiste, no seu Tratado, na existência
no espaço de um «meio» capaz de transmitir as
«ondas electromagnéticas» (a luz) bem como a
«acção à distância» da electricidade .e do magne-
tismo. As suas teorias empregam além disso a
noção de um «campo», que as célebres equações
que têm o seu nome descrevem com precisão a
estrutura e o comportamento. Maxwell não 25
ousou ir mais longe: a seus olhos, o éter constituía
a entidade física com a qual devíamos preocupar-
-nos, constituindo o «campo» apenas uma ferra-
menta matemática - certamente útil para a des-
crição da estrutura do éter - mas ele próprio des-
provido de «realidade» física.
Na viragem do século passado, admitia-se
geralmente, com Huygens e Maxwell, que a luz
é um fenómeno de tipo ondulatório, transmitido
através de um «éter» disperso no espaço.
Os físicos, dessa vez, esfregaram as mãos:
deveria ser possível pôr em evidência o movi-
mento da Terra em relação a este éter. A ideia é
muito simples: se a velocidade da luz no éter é e,
então a velocidade da luz, medida a partir de
um laboratório situado na Terra, deveria ser e + v
numa direcção, e - v na direcção oposta.
Aqui intervêm sucessivamente vários actores.
E o primeiro foi Albert Michelson.
Nascido em Strzelno na Prússia polaca em
1852, Michelson emigra para os Estados Unidos
com os pais aos 3 anos. Professor de Óptica na
Escola Naval de Annapolis, passa por Berlim em
1881, onde Schmidt e Haensch, ópticos célebres,
lhe constroem um instrumento de alta qualidade
que ele baptiza de interferómetro e que conta
utilizar para efectuar medidas de alta precisão
respeitantes a fenómenos ópticos.
Em 1887, Michelson instala o seu interfe-
rómetro no laboratório do seu colega e amigo
Edward Morley, professor de Química na Western
Reserve perto de Cleveland. Morley escreveu
26 ao seu pai, dois anos mais tarde: «Michelson e eu
empreendemos uma nova experiência: queremos
ver se a luz se desloca à mesma velocidade em
todas as direcções.» Três meses mais tarde,
Michelson envia uma mensagem desencora-
jada ao seu mentor em Inglaterra, Lord Strutt
Rayleigh, laureado com o Prémio Nobel da Física:
«Terminámos a nossa experiência. Resultado
decididamente negativo.»
O interferómetro não tinha detectado qual-
quer diferença na velocidade da luz, qualquer
que fosse a sua direcção.
Contudo, algumas semanas mais tarde, o físico
irlandês George Francis Fitzgerald fez uma
descoberta: é possível justificar o resultado nega-
tivo da experiência de Michelson e Morley, afirma
ele, por intermédio de uma hipótese simples mas
ousada, consistindo em supor que qualquer
corpo em movimento à velocidade v sofre um
encurtamento no sentido do seu deslocamento
proporcional ao factor V1 - v 2 / c 2 •
Fitzgerald explicita a sua ideia numa carta
dirigida em 1889 à revista americana Science, que
a publica de imediato. Mas, pouco depois, na
sequência de dificuldades financeiras, a Science
vê-se obrigada a interromper a sua publicação.
Fitzgerald julga que a sua carta não foi publi-
cada a tempo, e ... esquece-a.
Em 1892, o físico holandês Hendrik Antoon
Lorentz (1853-1928), que ignora todos os tra-
balhos de Fitzgerald, descobre por sua vez,
independentemente daquele, o «factor mágico»
V1 - v 2 / c 2 • Mas tendo tido conhecimento, pouco
depois, que Fitzgerald havia feito a descoberta 27
antes dele, reconhece imediatamente - acompa-
nhada de um elogio público - a prioridade do
irlandês. As coisas complicam-se quando Fitzge-
rald, que continua convencido que a Science
tinha falido antes da publicação da sua carta,
insiste em ceder a prioridade a Lorentz - que a
recusa.
Lorentz tinha uma vantagem sobre Fitzge-
rald: era nesta altura o especialista mundial das
teorias de Maxwell, ainda muito pouco conhe-
cidas dos físicos (devido, nomeadamente, às
dificuldades matemáticas que comportam). Por
isso prosseguiu com afinco o empreendimento
tão bem iniciado.
Em 1895, Lorentz publica uma formulação
alargada e simplificada da teoria de Maxwell.
Mas a nova teoria tem uma particularidade: as
suas equações descrevem a realidade num labo-
ratório «em repouso» imerso num éter «imóvel».
Põe-se imediatamente a questão de saber o que
acontece às equações quando o laboratório esti-
ver animado de um movimento uniforme em
r_e lação ao éter - o que deveria ser o caso para
um laboratório situado na terra.
Para responder a esta questão, Lorentz efec-
tua aquilo a que ele chama uma «mudança de
variável». A ideia é das mais simples: se x mede
as distâncias no laboratório «em repouso» ex' as
distâncias no laboratório em movimento em
relação ao éter à veloc;idade v, então passa-se de
um sistema para outro substituindo x, em todos
os lugares em que aparece nas equações, por
28 x' = x -vt.
Quando Lorentz efectua esta substituição de
variável, aparentemente muito natural, tem uma
s urpresa desagradável: as equações transfor-
madas contêm termos dependentes de v/c e v 2/c2
que não estavam presentes à partida. Conse-
quência: deveria ser possível utilizar estes ter-
mos para pôr em evidência o movimento da
Terra em relação ao éter - o que nunca ninguém
conseguiu ainda fazer!
Lorentz decide então modificar a sua teoria
para se desembaraçar pelo menos dos termos ·
mais incómodos, isto é, dos termos em v/c.
Surge-lhe uma ideia: talvez, diz para consigo,
não seja a teoria que convém modificar, mas
antes a fórmula utilizada para a substituição
de variável; talvez, diz para consigo, além da
substituição de variável para x, seja necessário
fazer uma igualmente para ... o tempo, t.
Introduz entã o a ideia de um «tempo local»
definido pela substituição da variável t' = t - vx/ c2.
A ideia parece extravagante pois implica
- afirma! - que o tempo poderia diferir de um
lugar para outro no espaço.
Extravagante ou não, a melhoria é imediata:
com esta substituição de variável, acrescentada à
respeitante a x, os termos em v/c desaparecem
d as equações transformadas.
Restam os termos em v 2/c 2, mais coriáceos.
É então que Lorentz se lembra do «factor
mágico» Vl - v 2 / c 2 • Quando o introduz nas suas
fórmulas, os termos em v 2/c 2 desaparecem por
seu turno. 29
E chegou Poincaré...
Henri Poincaré (1854-1912), matemático, físico
e filósofo, seguia muito de perto os trabalhos
científicos dos seus contemporâneos. Dotado de
uma espantosa capacidade de «tudo compreen-
der», o melhor geómetra da sua geração
deixou-nos estudos profundos dos trabalhos
deles. Além disso, nunca hesitou em dar a
conhecer o resultado das suas próprias reflexões.
No seu «ninho de águia» na rua Gay-Lussac
em Paris, Henri Poincaré segue de perto os
trabalhos de Lorentz. Franze o sobrolho: a hipó-
tese da contracção dos corpos, juntamente com a
do tempo local, não o satisfaz. Explica aos seus
alunos na Sorbonne:
«Esta estranha propriedade pareceria um ver-
dadeiro "toque final" dado pela natureza para
evitar que o movimento absoluto da Terra
pudesse ser revelado pelos fenómenos ópticos.
Isto não me pode satisfazer.» E dá a «conhecer o
seu sentimento»:
«Vejo como muito provável que os fenóme-
nos ópticos dependam apenas dos movimentos
relativos de corpos materiais em presença [... ] e
isso [ ... ] rigorosamente.»
Para dar toda·a dimensão do seu pensamento,
acrescenta esta previsão: «À medida que as
experiências se tornarem mais rigorosas, o prin-
cípio será verificado com maior precisão.»
Dois anos mais tarde, resume assim os esfor-
ços dos físicos em geral, e de Lorentz em parti-
30 cular, para ultrapassar a dificulda de: «Devo .
explicar [ ... ] porque é que não acredito, apesar
do que diz Lorentz, que observações mais preci-
sas possam alguma vez pôr em evidência mais
do que os deslocamentos relativos dos corpos
materiais. Fizeram-se experiências que deveriam
ter revelado os termos de primeira ordem; os
resultados foram negativos; poderá ter sido por
acaso? Ninguém o admitiu; p r ocurou-se uma
explicação geral, e Lorentz encontrou-a; mostrou
que os termos de primeira ordem deviam
anular-se, mas o mesmo não acontecia para os
de segunda ordem. Fizeram-se então experiên-
cias mais precisas; também foram negativas; isto
também não podia ser fruto do acaso; era neces-
sária uma explicação; foi encontrada; encontra-se
sempre; hipóteses é o capital que menos falta ... »
E interroga-se: O que é «esta singular coincidên-
cia que faz com que uma certa circunstância
venha justamente a propósito para anular os ter-
mos de primeira ordem, enquanto uma outra cir-
cunstância, completamente diferente, mas igual-
mente oportuna, se encarregaria de destruir os
de segunda ordem? N ão, é necessário encontrar
uma mesma explicação para uns e para outros, e
então tudo nos leva a pensar que esta explicação
será igualmente válida para todos os termos de
ordem superior, e que a anulação mútua desses
termos será rigorosa e absoluta».
Eis-nos no âmago do problema.

31
Poincaré inventa
o espaço-tempo

F UNDADO em 1855, o Instituto Politécnico de


Zurique é em 1895 uma (grande) escola
reservada aos estudantes que se destinam ao
ensino secundário. A secção VI, dirigida pelo
professor de Matemática Adolf Hurwitz, oferece
um cursus aos estudantes que desejam consa-
grar-se ao ensino das Ciências Matemáticas e
Físicas. Ao fim de quatro anos de estudos -
desde que tenha passado nos exames intermé-
dios e obtido o «certificado de saída», o aluno
recebe o diploma. Pode então, se o desejar,
apresentar uma tese na Universidade de Zuri-
que para aí obter os títulos de doutor ou de
assistente que lhe permitirão ascender ao ensino
superior. 33
Albert, Mileva e Michele ...
Permitamo-nos, para preguiçar um pouco
entre duas fórmulas, um pequeno d esvio, que
não será totalmente gratuito, pelo vivido e pelo
seu encanto anedótico. Em 1895, um certo Albert
Einstein, então com 16 anos, filho de Pauline e
Hermann Einstein, inventor e homem de negócios,
apresenta-se aos exames de admissão ao Institu-
to Politécnico. Chumba. Para se preparar melhor,
passa um ano no Luitpold-gymnasium em
Aarau, pequena localidade perto de Zurique. Sai
de Aarau um ano mais tarde, com 17 anos
e meio: acaba de ser admitido no Instituto Poli-
técnico.
À sua chegada a Zurique, tem a felicidade de
poder resolver, rapidamente e de maneira defini-
tiva, uma primeira equação: a da sua vida senti-
mental. É que - fenómeno notável naquela época -
uma rapariga está inscrita na sua classe ... e ainda
por cima, uma jovem nada vulgar.
De origem sérvia, é filha de um rico colector
de impostos do Império Austro-Húngaro;
chama-se Mileva Marie. Acaba de ser admitida
na secção VI-A após ter interrompido os estudos
de medicina. É três anos e meio mais velha que
Einstein, coxeia ligeiramente, o que não prejudica
nec essariam ente a sedução, fal a alemão e
francês com urna irresistível pronúncia eslava, e
canta com uma voz enfeitiçante canções do seu
país acompanhando-se com uma tamburitza, o
que não deixa de sensibilizar o jovem Einstein,
34 apaixonado por música.
E sobretudo... é sobredotada em Matemáticas,
disciplina na qual Einstein mostra por vezes
urna ligeira fraqueza. Como é que, nestas condi-
ções, poderia ele não esquecer uma eleita prece-
dente (Marie Winteler) e não se apaixonar?
Depois do amor, a amizade ... Uma noite, por
ocasião de um serão musical passado na família
Hüni em Zurique, Einstein conhece um jovem
que, tal como ele, gosta do violino. O mais velho
de uma família de origem judia espanhola
estabelecida em Trieste, tem 23 anos, chama-se
Michele Besso, e acaba de receber o diploma de
engenheiro no Instituto Politécnico com notas
espantosas: seis 6 em 6; cinco 5,5 em 6; nenhuma
nota abaixo da média. Os dois jovens simpa-
tizam imediatamente. Serão amigos para toda a
vida.
Julho de 1900: Einstein obtém o seu diploma.
Mileva, essa, chumba nos exames. Einstein, de
férias em Milão, escreve àquela que se tornou
sua noiva: «À noite, vou muitas vezes a casa de
Michele. Gosto muito dele, por causa da sua
sagacidade e da sua simplicidade.» No entanto,
apesar das suas qualidades, Michele Besso é um
pouco desorganizado. Encarregado pelo seu
patrão, Giovanni Barberis, de verificar uma ins-
talação de cabos na central eléctrica de Casale,
perto de Milão, perde o comboio, esquece as
ordens recebidas; perde-se em detalhes ...
Em 1901, Mileva está de volta ao Instituto
Politécnico. Embora não tivesse ainda obtido o
diploma, inicia urna tese sob a orientação do
professor Web er. Einstein escreve-lhe : «Apesar 35
dos [seus] conhecimentos extraordinariamente
vastos[ ... ], creio que Michele não é lá muito nor-
mal. Mas possui um espírito extremamente fino,
cuja actividade acompanho com prazer, por mais
desorganizada que seja.» Ao serão, têm juntos
conversas intensas incidindo sobre «separação
essencial do éter luminoso e da matéria», «a defi-
nição do repouso absoluto» ...
No início de Abril, Einstein descobre um
estudo do físico Paul Drude, publicado nos
Annalen der Physík, de que Drude se tornou o
editor. Entusiasma-se. Escreve a Mileva: «Embora
contenha negligências, [este estudo] está-me tão
próximo que eu mesmo o poderia ter escrito.
Drude é um tipo genial, disso não restam dúvi-
das.» Escreve uma carta detalhada dirigida
a Drude para «chamar a atenção dele» para cer-
tos «erros» contidos no seu estudo. Afirma
a Mileva: «Os argumentos são apresentados
de uma forma tão clara que [Drude] terá certa-
mente muita dificuldade em rebatê-los de forma
lógica.»
Ao voltar para casa dia 7 de Julho à noite,
encontra em cima da mesa uma carta um pouco
seca de Drude rejeitando as críticas que ele lhe
tinha dirigido. Fica furioso: «Daqui em diante,
não me diri girei mais a este tipo de indiví-
duo, atacá-lo-ei sem consideração, tal como ele
merece, publicando em revistas.» Tem aversão a
todos. Anuncia a Mileva a decisão «irrevogável»
que tomou: «Vou imediatamente arranjar um
emprego, por mais modesto que seja. Os meus
36 projectos científicos [ ... ] não me impedirão de
aceitar o emprego mais subalterno. Desde que
tenha arranjado um, caso-me contigo e levo-te
comigo ... »
Em Novembro de 1901, Einstein apresenta a
sua tese na Universidade de Zurique e submete
ao seu director, o professor Kleiner, dois artigos
que dela extraiu. Escreve a Mileva: «Não creio
que [Kleiner] ouse recusar a minha tese. Mas
penso que nada há de bom a esperar deste
homem atacado de miopia.» (Kleiner ousou, mas
isso é outra história.)
Enquanto espera, para passar o tempo, Eins-
tein ocupa-se com a leitura: «Ü tempo livre que
me sobra, consagro-o ao estudo da física teórica
de Voigt. Já aprendi muitas coisas lendo o seu
livro.»
Professor na Universidade de Gõttingen,
Woldemar Voigt tem 51 anos em 1901. A leitura
do seu livro Kompendium der theoretischen Physik
dá ideias a Einstein. Voigt, em 1887, ano da expe-
riência de Michelson e Morley, tinha na verdade
publicado um artigo, retomado no seu livro, em
que propunha - antes de todos! - a famosa fór-
mula determinada independentemente dois
anos mais tarde por Lorentz (facto que o próprio
Lorentz viria descobrir e confirmar alguns anos
depois)!
Einstein lança-se num novo projecto. Expli-
ca-o a Mileva: «Trabalho sem interrupção numa
electrodinâmica dos corpos em movimento
que promete tornar-se um artigo fundamen-
t al. .. » E ameaça: «Se [Kleiner] tiver a a udácia
de recusar a minha tese de doutoramento, 37
publico o texto preto no branco ao mesmo
tempo que a minha tese e ele será alvo da troça
de todos.»
A 19 de Dezembro, não aguentando mais, vai
a casa de Kleiner. Este, que se prepara para par-
tir de férias, acolhe-o calorosamente. Não, não
leu ainda os artigos que Einstein tinha submetido
à sua apreciação. Einstein diz-lhe: «Leve o tempo
que precisar, professor; por mim, não tenho qual-
quer pressa.» E expõe-lhe as suas ideias.
Impressionado, Kleiner aconselha o seu
aluno a publicá-las, «incluindo o método experi-
mental». Einstein escreve a Mileva: «Estou
encantado com o meu sucesso. Conto redigir
o artigo nas próximas semanas.»
Junho de 1902. Haller, director da Repartição
Oficial de Patentes de Berna, emprega Einstein
como técnico especialista de terceira classe, lugar
que ocupará durante sete anos.
Uma vantagem para ele: no exercício das
suas funções, tem acesso à literatura mundial
científica e técnica. E finalmente vai conseguir
realizar o seu sonho: casar com Mileva.

Onde reencontramos Poincaré ...


Em Berna, Einstein reata relações com dois
velhos camaradas, os irmãos Conrad e Paul
Habicht, e conhece Maurice Solovine, estudante
da universidade. Funda com eles um «grupo de
leitura» que baptizam de Academia Olympia.
Na altura certa para ir ao encontro de uma obra
38 essencial.
Com efeito, Henri Poincaré acaba de publicar
em Paris um pequeno livro intitu lado La Science
et l'Hypothese. Trata-se, diz-se, de uma obra desti-
nada ao «grande público». Por esse facto, tem
um sucesso imediato: é traduzida em várias lín-
guas, e vê-se por todo o lado, nos cafés e nos jar-
dins, gente de toda a espécie a debruçar-se sobre
as suas páginas ... «A leitura deste livro
prendeu-nos a respiração durante longas sema-
nas», dirá mais tarde Maurice Solovine. Reco-
nheçamos que havia razões para isso. O que
Poincaré avança neste livro é completamente
revolucionário.
La Science et l'Hypothese compõe-se de 24 capí-
tulos, seis dos quais tratam directamente
do tempo, do espaço e do movimento. Em qua-
tro parágrafos do capítulo VI, que pode-
riam dizer-se deixados para a posteridade, Poin-
caré apresenta os fundamentos da teoria que
será formulada três anos mais tarde por
Einstein.
Primeira afirmação: «Não existe espaço abso-
luto e apenas concebemos movimentos relati-
vos.» Segunda afirmação: «Não existe tempo
absoluto; dizer que duas durações são iguais, é
uma afirmação que, por si mesma, não tem qual-
quer sentido e só pode adquirir sentido por con-
venção.» Terceira afirmação: «Não temos a intui-
ção directa [ ... ] da simultaneidade de dois
acontecimentos que se produzem em dois locais
diferentes.» Quarta afirmação: «Poderíamos
enunciar os factos mecânicos referindo-os a um
espaço não euclidiano ... » 39
Poincaré manifesta igualmente o seu cepti-
cismo em relação ao éter: «E o nosso éter, existe
realmente?» E explica:
«Os antigos fluidos, calórico, electricidade,
etc., foram abandonados, quando nos apercebe-
mos que o calor não é indestrutível. Mas tam-
bém o foram por outra razão. Ao materializá-los
[ ... ]cavávamos entre eles uma espécie de abismo.
Foi necessário atulhar esse fosso quando tive-
mos um sentimento mais vivo da unidade da
natureza.»
Finalmente, Poincaré introduz no pensa-
mento físico um termo que vai fazer destroços:
«Por causa da relatividade e da passividade do
espaço,[ ... ] o estado dos corpos e as suas distân-
cias mútuas [ ... ] não dependem em nada da
posição absoluta inicial do sistema. É aquilo
a que eu poderia chamar, para resumir, a lei da
relatividade.»
Relatividade*, a palavra está lançada.

Einstein muda de opinião


Janeiro de 1903. Alguns dias após o seu casa-
mento com Mileva, Einstein escreve de Berna a
Michele: «Sou agora um homem casado e levo
uma vida bastante agradável com a minha
mulher. Ela ocupa-se praticamente de tudo,
cozinha bem e está sempre bem disposta.»
E explica-lhe as suas ambições: «Não vou preparar
o doutoramento [ ... ] toda esta comédia se está a
40 tornar fastidiosa.»
Seis meses mais tarde, intercede junto do seu
patrão para dar emprego a Michele na Repar-
tição de Patentes. Michele instala-se em Berna!
A vida dos dois amigos dá uma reviravolta.
Numa carta escrita de sua casa em Princeton
em 1952, Einstein evoca assim a recordação deste
período da sua vida:
«Todos os dias, ao voltarmos do escritório, dis-
cutíamos questões científicas. [ ... ] Em Berna, eu
tinha regularmente serões de leitura filosófica com
[Conrad] Habicht e [Maurice] Solovine nas quais
nos ocupávamos sobretudo de Hume.» E acres-
centa esta frase chave: «Esta leitura teve uma certa
influência no meu desenvolvimento, ao lado da de
Poincaré e de Mach.» A 27 de Janeiro de 1921, nove
anos após a morte de Poincaré, Einstein prestou
uma homenagem discreta ao mestre chamando-
-lhe, perante os membros da Academia das Ciên-
cias de Berlim, «o sagaz e profundo Poincaré».
1904. Einstein, que tinha renunciado a apre-
sentar uma tese de doutoramento, muda de ideias:
submete um novo texto a Alfred Kleiner, profes-
sor da Universidade de Zurique, o mesmo que,
três anos antes, tinha recusado a sua primeira
tese. E um ano mais tarde - em Março de 1905 -,
desencadeia no espaço de seis meses a famosa
avalanche de cinco publicações nos Annalen der
Physik que lhe conferirá a celebridade.

Uma nota histórica


Em Março de 1904, Lorentz apresenta o resul-
tado dos seus últimos trabalhos à Academia
de Ciências de Amesterdão. Nas semanas que se 41
seguem, Poincaré examina de perto a comunica-
ção e rectifica alguns erros menores que ela con-
tém. Depois embarca num paquete para visitar
os Estados Unidos. Convidado pelos cientistas
do mundo inteiro reunidos em congresso na
exposição de Saint Louis (Missuri), retorna diante
deles a conclusão a que o levou a sua retornada,
em 1902, da ideia galilaica segundo a qual um
movimento partilhado por vários corpos não
influi nesses corpos - e como nullo. Mas o como
nullo de Galileu apenas dizia respeito aos fenóme-
nos associados ao movimento, isto é, aos fenó-
menos da mecânica. Poincaré admite que pode
alargar-se este princípio a todos os fenómenos da
física. A declaração é retumbante: «As leis dos
fenómenos físicos devem ser as mesmas, quer
para um observador fixo, quer para um observa-
dor animado de um movimento de translação
uniforme ... », acrescentando: « ... de tal forma que
não ternos e não podemos ter nenhum meio de
discernir se somos, sim ou não, transportados
num tal movimento.» Ele baptiza o novo princí-
pio, proposto aos cientistas do mundo, «princípio
da relatividade», para o demarcar do princí-
pio galilaico, mais restrito, a que tinha chamado,
dois anos antes, <<princípio do movim.ento relativo».
No regresso à Europa, Poincaré encontra a
comunidade científica em plena ebulição: todos
os grandes teóricos - Abraham, Lorentz, Voigt,
Larmor e Langevin- esforçam-se, cada um à sua
maneira, por melhorar os resultados obtidos por
Lorentz através da sua espectacular «substitui-
42 ção de variáveis».
Poincaré, no terceiro andar do seu «poleiro»
da rua Gay-Lussac, aplica-se a escrever - d e um
jacto, como é seu hábito - uma comunicação
sobre o assunto, que transcreve em seguida, pra-
ticamente sem emendas. Mas o texto tinha mais
de 50 páginas. Ora, a Academia das Ciências,
para evitar ficar submersa em textos muito lon-
gos, impõe aos seus membros uma regra incon-
tornável: nenhuma comunicação apresentada
nas sessões - às segundas-feiras - pode ultrapas-
sar as cinco páginas.
Nos primeiros dias da Primavera, Poincaré
redige então uma curta nota (de cinco páginas)
na qual resume o essencial da sua comunicação
(que, para a história dos pequenos feitos, será
publicada alguns meses mais tarde nos Reconditi
du Circolo matematico di Palermo).
Poincaré apresenta a sua nota na sessão da
Academia de 5 de Junho. Ela é imediatamente
impressa. As provas são submetidas ao autor,
que as corrige. A nota é inserida no fascículo dos
Comptes rendus des séances de l'Académie relativo à
sessão de 5 de Junho de 1905, que, enviado pelo
correio, chega alguns dias depois aos correspon-
dentes da Academia, dispersos pelos quatro can-
tos do mundo e nomeadamente a um deles, a
Repartição de Patentes de Berna.
Acto fundador da teoria do espaço-tempo
sobre a qual assenta aquela a que hoje chama-
mos a «teoria da relatividade», esta comunicação
é mais fácil de compreender do que se poderia
imaginar, se nos dermos ao trabalho de a estudar
de perto. Ela expõe sucintamente - mas de 43
forma muito clara - o problema e revela a solu-
ção deste. O problema é o seguinte: «Parece que
a impossibilidade de demonstrar o movimento
absoluto [da Terra] é uma lei geral da natureza.»
O desafio é considerável: «A importância da
questão levou-me a retomá-la.» O resultado está
aqui: «Ü ponto essencial [ ... ] é que as equações
do campo electromagnético* não são altera-
das por uma certa transformação [ ... ] que é
a seguinte...»
A transformação em questão é a apresentada
por Lorentz na sua comunicação, resultado dos
trabalhos de cerca de vinte anos de Fitzgerald,
Voigt, Larmor e Lorentz. Poincaré atribui-lhe um
novo significado; mais precisamente, propõe
uma formulação concisa e elegante que lhe per-
mite mostrar, de forma luminosa e quase instan-
tânea, o sentido profundo que, até ali, tinha esca-
pado ... a todos.
Entremos nos detalhes.
Um observador observa um acontecimento.
Produz-se, segundo ele, à distância x no espaço,
no instante t no tempo. Um segundo observador
observa o mesmo acontecimento . Produz-se,
para ele, à distância x' no espaço, no instante t'
no tempo. Interessemo-nos pelo caso particular
em que o segundo observador se encontra em
movimento relativo em relação ao primeiro, à
velocidade uniforme v na direcção de x. Trata-se
de encontrar a transformação que permite passar
das medições (x, t) obtidas pelo primeiro obser-
vador, para as medições (x', t') obtidas pelo
44 segundo observador. Para respeitar o princípio
da relatividade, esta transformação deve ter uma
propriedade particular: ela deve ser tal que as
«equações do campo electromagnético» - as que
regem, nomeadamente, o movimento da luz -
não sejam alteradas pela transformação.
Segundo Poincaré, a transformação que res-
ponde a esta exigência é dada pelas fórmulas:
X= k(X + Ef), t'= k(t + EX)

Nestas fórmulas, e = v/c mede da velocidade


do observador em movimento quando a da luz é
considerada igual a 1, e k = 1 / Vl- E2 é o inverso
do famoso «factor mágico» de Fitzgerald e
Lorentz Vl - v 2 / c 2 •
Recordemos o que há de revolucionário nesta
transformação: ela faz depender x' de x e de t; da
mesma maneira, faz depender t' de t e de x .
Numa palavra, ela «mistura» o espaço e o
tempo.
Os livros de física já não apresentam a trans-
formação sob a forma concisa de Poincaré. É de
lastimar, pois esta forma tem uma dupla vanta-
gem: põe em evidência a simetria que existe
e deve existir, por um lado entre o tempo e o
espaço, e por outro entre os dois observadores.
A simetria é perfeita, consequência que tinha
escapado a Lorentz no espírito do qual o primeiro
observador media o tempo «verdadeiro» t,
enquanto o segundo apenas media o tempo
«local» t'.
A sua apresentação da transformação per-
mitiu imediatamente que Poincaré fizesse um
estudo matemático aprofundado dela. 45
Primeira constatação: «Ü conjunto de todas
estas transformações [ ... ] devem formar um
grupo ... »
Com esta pequena frase de ar inocente, Poin-
caré coloca de imediato a teoria nascente na
posição de uma grande teoria matemática que
ele é um dos poucos no mundo da época a domi-
nar, teoria chamada teoria dos grupos *, cujos
fundamentos devemos recordar brevemente.

O que devemos a Galois


Em Maio de 1832, em Paris, durante a noite,
um jovem de 20 anos, normalista, escreve febril-
mente à luz de uma vela:
«Meu caro amigo,
«Fiz em análise algumas coisas novas ... »
E explica essas coisas ao seu amigo, Auguste
Chevalier, à pressa e termina com estas palavras:
«Pedirás publicamente a Jacobi ou Gauss
para darem a sua opinião, não sobre a veraci-
dade, mas sobre a importância dos teoremas .
Espero que, depois disso, haja quem ache pro-
veitoso decifrar toda esta confusão. Abraço-te
efusivamente.»
Na madrugada de 30 de Maio, Évariste
Galois encontra aquele que, na véspera, o tinha
desafiado para um duelo. Atingido por uma bala
disparada a vinte e cinco pés, morre.
É comovente encontrar nos escritos de Galois
a sua primeira alusão à noção de «grupo».
46 (A totalidade dos escritos de Galois, morto aos
20 anos, cobre ao todo ... sessenta páginas.) Ela
encontra-se numa comunicação que dirigiu a 17
de Janeiro de 1831 à Academia das Ciências.
Galois interessa-se por uma equação cujas raízes
são a, b, e ... Chama então a atenção enunciando:
«não há nenhuma razão para que, numa função
com várias variáveis, uma variável ocupe uma
posição de preferência a qualquer outra». Tere-
mos então «permutações»: abc é uma permuta-
ção, bac é outra, etc. Galois chama «substituição»
a passagem de uma permutação a outra. Chega
finalmente a frase chave: «Quando quisermos
agrupar substituições, teremos que as derivar
todas de uma mesma permutação», seguida da
observação fundamental da teoria dos grupos:
«Se num grupo destes tivermos substituições S e
T, então teremos seguramente [também] a subs-
tituição ST.»
É exactamente neste sentido que o conjunto
das transformações estudadas por Poincaré for-
mam um grupo.
Com efeito, consideremos a transformação S
para a qual v/c tem o valor E e apliquemos-lhe
em seguida a transformação T para a qual v/c
tem o valor E'. Obteremos um resultado que
poderíamos ter obtido directamente aplicando a
transformação ST para a qual v/c tem o valor
(E+ E )/(l + EE').
1

A alguém que não fosse Poincaré, esta obser-


vação poderia parecer de interesse secundário.
Mas Poincaré sabia que qualquer grupo de
transformações do tipo considerado aqui implica
necessariamente pelo menos um «objecto» que 47
não é afectado pelas transformações do grupo -
que estas mantêm invariante . Poincaré di z:
«Para ir mais longe, torna-se necessário encon-
trar os invariantes do grupo» .
Procura-os e encontra-os.
O resultado fundamental é o seguinte: um
observador observa um acontecimento que estima
que se produz à distância l no espaço, no ins-
tante t no tempo. Calcula s segundo a fórmula
s 2 = F- c2 t 2 • Um segundo observador observa o
mesmo acontecimento. Para ele, produz-se à
distância l' no espaço, no instante t' no tempo.
Calculas' segundo a fórmula s' 2 = l' 2 - c2 t' 2 •
Regra geral, l e l' e t e t' terão valores diferen-
tes. Mas - e aqui é que está o resultado de Poin-
caré - s e s' terão .o mesmo valor, porque s é uma
invariante do grupo!
Empunhando este resultado, Poincaré dá
o passo decisivo: para acomodar o seu resul-
tado, ele imagina - ele inventa - um espaço
a «quatro dimensões» - o nosso espaço-tempo
de hoje.

O espaço-tempo inventado
De que se trata?
Percepcionamos o mundo que nos cerca num
quadro a quatro dimensões, em que três nos
parecem ser de uma e spécie - o espaço - e a
quarta de uma outra espécie - o tempo. Poincaré
coloca a seguinte questão: como é que, matema-
48 ticamente, se dá conta desta diferença?
Trigonometria hiperbólica
O coseno (eh) e o seno (sh) definidos a partir de uma hipér-
bole em vez de um círculo permitem converter a transformação
de Lorentz x' = k (x + Et), t' = k (t + EX) numa rotação do
espaço-tempo cujo ângulo e é dado pelas fórmulas ch0 =k, she =kE
que satisfazem a relação ch28 - sh2 8 = 1.

A resposta que ele dá é de uma enorme sim-


plicidade; compreendê-la e aceitá-la completa-
mente não deixa de pedir um pouco de reflexão.
Apoia-se, na verdade, numa noção que vai con-
tra a nossa herança cultural mais corrente.
Temos o hábito de medir as distâncias - tanto
no tempo como no espaço - por meio de núme-
ros ordinários - os números da aritmética da
nossa infância. Ora esses números têm uma
característica em que nós nunca pensamos, de tal
modo ela nos parece natural e evidente: são os
números cujo quadrado é positivo. Por exemplo, 49
2 x 2 = 4 é positivo; (-2) x (-2) = 4 é igualmente
positivo . Pois bem, diz-nos Poincaré, vai ser
nece ssário habituarmo-nos a uma novidade:
para satisfazer o princípio da relatividade, os
números de que nos iremos servir para medir as
distâncias ao longo de uma das quatro dimensões
do espaço-tempo devem ser números cujo
quadrado é negativo.
Existem esses números? perguntar-se-á; têm
que existir, senão o espaço-tempo tornar-se-ia
para sempre inexplicável. Mais ainda, sem tais
números, a equação x 2 + 1 = O não teria solução.
Qual é a solução? É o número cujo quadrado é
igual a -1. Chama-se a «unidade imaginária» e
designa-se pelo símbolo i. Com esta notação
temos portanto i2 = -1, o que dá i = V-1.
Note-se que a escolha do vocábulo «imagi-
nário» para qualificar os números cujo quadrado
é negativo é, historicamente, uma escolha pouco
feliz; com efeito, estes números não têm nada de
«imaginário ». Esta escolha corresponde a um
hábito ancestral que consiste em querer utilizar
uma palavra com conotação «pejorativa» para
qualificar aquilo que, à primeira vista, nos parece
«anormal». Opomos assim a mão esquerda à
mão direita, os números negativos aos positivos,
a antimatéria * à matéria, etc.
Para realizar o seu programa, Poincaré inventa
então um mundo a quatro dimensões em que
uma delas deverá ser medida por meio de
números cujo quadrado é negativo - os números
imaginários. É a esse mundo que hoje chamamos
50 o espaço-tempo.
Examinemos de mais perto a receita preconi-
zada por Poincaré para pôr de pé esta ideia.
Baseia-se numa pequena frase que aparece na
última secção da sua comunicação em que o
essencial é o seguinte: «Vejamos x, y, z, e t ~
como as coordenadas de um ponto P no espaço a
quatro dimensões ... »
Poincaré multiplica a coordenada de tempo t
pela unidade imaginária i. Obtém assim o resul-
tado pretendido: uma das quatro dimensões
é doravante medida por um número cujo qua-
drado é negativo - por um número imaginário.
Podemos imaginar facilmente a emoção que
Poincaré deve ter sentido no momento da sua
descoberta. Porque o conceito de um espaço-
-tempo a quatro dimensões vai revelar-se, ime-
diatamente, como sendo de uma incrível fecun-
didade ...
Para começar, a estrutura do espaço-tempo a
quatro dimensões permite resolver um mistério:
temos o sentimento irresistível que o tempo «Se
escoa» de maneira «regular e constante» - em
suma, a velocidade constante . Porquê? Eis,
talvez, a chave do mistério: consideremos um
móvel que se desloca no espaço ordinário à velo-
cidade v. Qual é a sua velocidade no espaço-
-tempo? A velocidades vulgares (quer dizer,
velocidades francamente inferiores à velocidade
da luz), a quadrivelocidade do móvel - a sua
velocidade no espaço-tempo - tem quatro com-
ponentes, das quais três são as de v, portanto
variáveis. Mas a quarta coordenada é, pelo
menos em velocidades vulgares, constante e 51
independente de v! Consequência: esta quarta
componente dá-nos a impressão de qualquer
coisa que se escoa a uma velocidade regular e
constante ... o Tempo!
Segundo resultado espectacular: através de
uma fórmula muito simples, é possível fazer
corresponder um ângulo à transformação
x' = k(x + Et), t' = k(t + EX). Esse ângulo define,
por seu turno, uma rotação dos eixos de coorde-
nadas do espaço-tempo. De uma assentada, o
sentido profundo da transformação e a razão do
seu sucesso explicam-se: existirá coisa mais natu-
ral que exigir que as equações represen-
tando as leis da natureza sejam invariantes sob o
efeito de rotações no espaço-tempo? Ou melhor,
- o que vem dar no mesmo - que elas sejam inde-
pendentes da orientação dos eixos de referência?

Um formalismo para o espaço-tempo


Pouco depois da publicação do texto de Poin-
caré, o matemático de origem lituana Hermann
Minkowski toma consciência da importância da
sua descoberta. Num pequeno livro publicado
em 1983, Banesh Hoffmann, um antigo colabora-
dor de Einstein em Princeton, escreve: «Quando
Einstein estava no Polytechnikum de Zurique,
não tinha assistido aos cursos de alguns profes-
sores, como os do matemático Hermann Min-
kowski. Mais tarde Minkowski foi nomeado pro-
fessor na famosa Universidade de Gottingen, na
52 · Alemanha; em 1907 [dois anos antes da sua
A

As geometrias
Em geometria descritiva, duas figuras são «iguais» se uma é a
perspectiva da outra. A geometria métrica está baseada na noção
de distância que satisfaz as três condições seguintes:
aa = O, ab = ba, ac :::; ab + bc.
No espaço-tempo o trajecto A-C corresponde ao maior tempo
para ir de A a C.

morte prematura com 45 anos] Minkowski mos-


trou que as equações da relatividade se integra-
vam perfeitamente numa estrutura a que chamou
o «espaço-tempo». E Hoffmann acrescenta:
«No artigo que publicou em 1905 [... ]Poincaré
tinha já abordado e desenvolvido os aspectos
quadridimensionais das equações relativistas.
Minkowski foi um pouco mais longe e é a ele
que se atribui, frequentemente, o crédito por
essa ideia.»
Inicialmente reticente em relação ao formalismo*
minkowskiano, que considerava como um sim-
ples «jogo», Einstein acabou por aderir a ele.
Escrevendo ao seu amigo Bessa, em 6 de Janeiro
de 1948, enuncia: «Ü mérito de Minkowski é o 53
de ter introduzido na relatividade a teoria tenso-
rial a quatro dimensões, sem a qual a formulação
matemática da teoria da relatividade geral teria
sido irrealizável. Não se tratava apenas de um
"jogo", mas sim de uma contribuição formal
importante.»
Debrucemo-nos sobre o formalismo de Min-
kowski.
A geometria projectiva está baseada na noção
de recta: em geometria projectiva, duas figuras
dizem-se iguais se uma é a perspectiva de outra.
A geometria métrica, essa, baseia-se na noção de
distância. Diz-se de um espaço em que se podem
medir as distâncias, que ele tem uma métrica.
A primeira utilização, implícita, de uma
métrica deve-se ao filósofo grego Pitágoras
(e. 570-480 a. C.).
Na ilha de Samos ao largo das costas da Ásia
Menor no Mediterrâneo, Pitágoras, no século VI
antes da nossa era, redescobre e demonstra um .
teorema conhecido dos babilónios há já mil anos.
A demonstração baseia-se nas seguintes observa-
ções: a gravidade define uma linha recta, vertical;
o horizonte define uma outra, horizontal. O ângulo
que fazem entre si estas duas rectas - ângulo recto -
tem a seguinte propriedade particular: todos os
triângulos que possuem um ângulo recto - os «tri-
ângulos rectângulos» - satisfazem o teorema
expresso pela relação bem conhecida, s2 = a 2 + b2 - o
famoso «teorema de Pitágoras» da nossa infância.
O teorema de Pitágoras permite exprimir a
distância entre dois pontos num plano. Será apli-
54 cável no espaço-tempo? Se sim, sob que forma?
Para poder responder utihnente a esta ques-
tão, aprendamos primeiro a escrever este teorema
sob uma forma mais geral. Para começar, designa-
remos os lados do triângulo rectângulo por x1 e x2 -
em vez de a e b. Além disso, para a continuação
da nossa análise, vai ser útil, e mesmo necessário,
interessarmo-nos pelo espaço-tempo numa escala
de distâncias muito pequenas. Seguindo a nota-
ção proposta por Leibniz, colocaremos um d antes
dos símbolos x1 e x2, indicando com isso que as
distâncias assim consideradas são infinitesimais
ou diferenciais - em resumo, tão pequenas quanto
possível. Finahnente, escreveremos o teorema sob
uma forma abreviada, ou seja:
ds 2 = ga.j3dxa.dx 13
O abreviar consiste no seguinte: quando um
índice aparece duas vezes na fórmula, conven-
ciona-se que se somam todos os valores que este
índice pode tomar, isto é, os valores 1 e 2 no
nosso caso.
Com esta convenção, e se dermos aos símbo-
los ga.I? os valores g 11 = g 22 = 1 e g 12 =g21 = O, a
nossa fórmula abreviada reproduz o teorema de
Pitágoras para um triângulo rectângulo tendo ds
como hipotenusa e dx1 e dx2 como catetos, como
se pode verificar facilmente aplicando a conven-
ção e substituindo os valores acima indicados
pelos gaj3· Com efeito, obtém-se ds 2 = (dx1)2 + (dx2)2.
Trata-se do teorema de Pitágoras. Os símbolos
ga.13 formam um quadro,
g1l g12
g21 g22 55
composto por quatro entradas ou «componen-
tes». Este quadro constitui a métrica do nosso
espaço. Passemos então ao espaço-tempo. Vamos
necessitar de quatro «dX» - sejam dx1, dx2, dx3 e
dx4 - e, para a métrica, de um quadro de dezas-
seis componentes, todas nulas com excepção das
quatro componentes diagonais tendo como valo-
res g 11 =g 22 =g 33 =1 e g 44 = -1 .
A grande descoberta deve-se a este -1 que
aparece no quadro; ele implica por si só a maio-
ria das propriedades do espaço-tempo que nos
parecem estranhas.
Uma dessas propriedades é a seguinte: sejam
dois acontecimentos que, no espaço e no tempo
vulgares, se produzem à distância l e no intervalo
de tempo t entre um e outro. O intervalo inva-
riante que separa estes dois acontecimentos no
espaço-tempo é dado pela fórmula de Poincaré.
5 = l2 - c t • Se 5 é igual a c t , o intervalo é igual
2 2 2 2 2 2

a ... zero.
No espaço vulgar, quando a distância entre
dois pontos é nula, diz-se que esses dois pontos
coincidem. Não se passa o mesmo com o
espaço-tempo: o intervalo entre dois pontos
pode ser nulo sem que os pontos coincidam.
A partir de cada ponto O do espaço-tempo,
podem traçar-se raios ao longo dos quais o inter-
valo medido a partir de O é nulo. Essas linhas
formam um cone chamado «cone de luz» de O.
Representam as trajectórias possíveis de sinais
luminosos emitidos a partir de O.
Antes de terminar com a questão da geome-
tria infinitesimal no espaço-tempo, voltemos um
56 pouco atrás. Consideremos uma transformação
de Lorentz para a qual E tem um valor muito
pequeno. A transformação neste caso toma a
forma simplificada, x' = x + Et, t' = t + EX ou
ainda dx = Et, dt = EX. É aquilo a que se chama
em teoria de grupos a transformação infini-
tesimal geradora do grupo. A simplicidade e a
elegância deste resultado não se inventam.

57
Dinâmica
no espaço-tempo

E M Leipzig, a 30 de Junho de 1905, vinte e


cinco dias após a apresentação da comuni-
cação de Poincaré à Academia das Ciências,
o professor Wilhelm Rõntgen, laureado com o
Prémio Nobel de Física e membro do Kuratorium
da revista Annalen der Physik, recebe pelo correio
um manuscrito cujo título o intriga. Encarrega o
seu assistente, o jovem físico russo Abram Joffe,
futuro membro da Academia das Ciências da
URSS, de o examinar. Joffe declara nos seus Sou-
venirs d' Albert Einstein que o original, destruído
depois, estava assinado «EINSTEIN-MARIC».
Nenhum historiador da ciência chegou a
determinar precisamente quando e como é que
Einstein redigiu esse artigo, poucas semanas
após a publicação da comunicação de Poincaré.
Interrogado sobre este assunto, o próprio Eins-
tein limitou-se a dizer que havia destruído as 59
suas notas e o manuscrito após a publicação da
sua tese de doutoramento no mesmo jornal e no
mesmo ano. Segundo a Senhora Trbuhovic-Gju-
ric, biógrafa de Mileva Einstein, o casal tinha
redigido o artigo em conjunto, no seu aparta-
mento de Berna, à noite, «à luz de um candeeiro
de petróleo». Esgotado com este esforço, Eins-
tein tinha depois adoecido. Mileva levou-o para
descansar em casa de seus pais em N ovi Sad,
depois para Kac na quinta onde, quando criança,
do alto de uma torre, ela tinha aprendido a
observar a natureza. Acrescente-se que Mileva,
que acabava de dar à luz o seu segundo filho, e
que tinha ficado seriamente afectada com o seu
insucesso nos exames finais do Instituto Politéc-
nico três anos antes, tinha renunciado a qualquer
ambição pessoal e desejava apenas promover
a carreira de seu marido.
Para situar correctamente o artigo de Einstein
no quadro do nosso estudo do espaço-te_m po,
voltemos um pouco atrás.
Em 1887, Voigt é o primeiro a descobrir a
famosa «transformação» que estudámos nos
capítulos precedentes. Infelizmente, a sua desco-
berta passa despercebida. Alguns anos mais
tarde, Lamor, e depois Lorentz, estabelecem por
sua vez a transformação, e Poincaré, em 1905,
dá-lhe a sua forma definitiva.
O artigo de Einstein apresenta uma quarta
derivação da transformação. Mas Einstein toma,
para chegar ao resultado, um caminho diferente
do adaptad o pelos seus predecessores e tira con-
60 sequências da transformação que Voigt e Lorentz
taque E t' taque
l
\ /
t'\\ /
/
\
\ ,: /
/
\ ' /
\ : I
', :'1/
tique tique
relógio «em repouso» relógio «em movimento»
t'2=f2+E2t12 em que t'=t/~

O atraso dos relógios


Um relógio em movimento parece funcionar mais devagar.
Habitualmente apresentado como misterioso, este fenómeno é,
na realidade, muito simples. O deslocamento do relógio alonga
o trajecto dos sinais luminosos. O efeito calcula-se em duas linhas
com a ajuda do teorema de Pitágoras.

não tinham descortinado. Levando em conta a


originalidade do raciocínio de Einstein, muitos
físicos decidiram considerar a sua análise corno
constituindo o ponto de partida para aquilo
a que se chamou mais tarde a teoria da relati-
vidade*.
Porquê esta designação?
Porque o artigo em questão tem como ponto
de partida o princípio da relatividade. Vimos
as circunstâncias que tinham levado Poincaré a
formular este princípio; Einstein enuncia-o em
termos equivalentes: «Não é apenas na mecânica
que nenhuma proprie dade dos fenómenos cor- 61
responde à noção de movimento absoluto, mas
também na electrodinâmica.»
No que diz respeito ao espaço-tempo, a situa-
ção é diferente.
Os dados históricos são os seguintes: em
1905, Poincaré admite como estabelecida a
transformação de Voigt-Lorentz e, para expli-
car o êxito dessa transformação, inventa o espa-
ço-tempo. Esta invenção, já o vimos, tem um
carácter muito preciso: um espaço a quatro
dimensões, em que uma deve ser represen-
tada por números cujo quadrado é negativo.
Einstein, no mesmo ano, estabelece a transfor-
mação de Voigt-Lorentz por uma nova via, mas
não chega, explicitamente, à invenção do
espaço-tempo. Os méritos do seu artigo são
grandes, mas ele passa ao lado da grande desco-
berta: não existe em sítio algum do artigo qual-
quer referência a um espaço a quatro dimensões -
o espaço-tempo.
E então que intervém Minkowski: estabelece
um formalismo matemático para o espaço-
-tempo ao qual, após algumas reticências, Eins-
tein adere. Equipado com esse formalismo,
o espaço-tempo torna-se o quadro em que os
físicos têm doravante de formular as suas teo-
rias. A teoria da relatividade é um exemplo disso.

Um relógio que atrasa


Desde que se convencionou definir o tempo
como sendo « O que os relógios medem», a relati-
62 vidade do tempo impõe-se por si mesma com
força e simplicidade. A demonstração utiliza um
relógio elementar consistindo numa fonte que
emite sinais luminosos dirigidos para um espe-
lho colocado a uma distância fixa. Quando
o sinal regressa à fonte, o relógio faz tiquetaque.
Se este relógio for colocado num móvel que se
desloca à velocidade v, o deslocamento do móvel
alonga o trajecto dos raios luminosos e portanto
aumenta o lapso de tempo contado pelos tiqueta-
ques; o relógio parece deslocar-se devagar.
Um simples cálculo baseado no teorema de
Pitágoras mostra que o segundo do relógio em
movimento é igual a
1; V1 - v2 ; c2
Reencontramos o famoso «factor mágico»
descoberto por Fitzgerald.
A relatividade do tempo aparece de uma
maneira igualmente natural no caso de um reló-
gio sujeito a uma aceleração. Se o relógio ele-
mentar estiver colocado no interior de um fogue-
tão que se afaste da Terra com a aceleração g, o
movimento do foguetão modifica o comprimento
dos trajectos dos raios luminosos no interior do
relógio.
O cálculo não é exactarnente o mesmo que no
caso precedente, mas é também muito simples.
O resultado é que o tempo no nariz do foguetão
parecerá passar mais depressa do que do lado
dos motores. Se o comprimento do foguetão for
d, o «segundo» do relógio acelerado é igual a
1 + gd/ c2, valor que evidentemente difere muito
pouco de 1 para acelerações vulgares, para as
quais gd<<c 2 • 63
A nota d e Poincaré e a comunicação que a
amplifica dão conta de três prognósticos que
constituem os pilares da dinâmica relativista.
Encontramos na nota, para começar, este espan-
toso prognóstico:
Regra de adição de velocidades.
Estou num comboio que se desloca à veloci-
dade u. Lanço um dardo à velocidade v. O dardo
tem a velocidade u + v em relação ao solo.
Não, segundo Poincaré. A regra de adição
não é a simples u + v, mas a fórmula ligeiramente
mais complicada (u + v)/(l + uv/c2 ). Em baixas
velocidades, a diferença é ínfima; torna-se
importante em altas velocidades. Em particular
seu= v =e, então u + v =(e+ c)/(l+l) =e.
A nota contém igualmente esta afirmação bri-
lhante: a força da gravitação propaga-se à veloci-
dade da luz. E sobretudo ...
Sobretudo, a nota e a comunicação apresen-
tam a lei da variação de massa em função da
velocidade, lei que conduziu, finalmente, à céle-
bre fórmula E = mc2 • Esta lei é dada por Poincaré
sob a forma lacónica D = V /h. Mas tudo se torna
claro quando se descobre que o símbolo h nesta
equação designa ... o «factor mágico» de Fitzge-
rald! A fórmula indica pois que a massa de um
objecto em moviinento aumenta na razão inversa
do factor mágico:
m' = m / Vl - v 2
/ c2

Confirmado experimentalmente com uma


enorme precisão, este resultado constitui uma
64 das aquisições incontornáveis da física moderna.
E o éter?
Na introdução do seu artigo de 1905, Einstein
tinha inserido esta pequena frase em relação ao
Ather: « ... a introdução de um «éter luminoso»
[na nova teoria] torna-se supérfluo ... » Esta obser-
vação levou os historiadores da ciência a afirmar
que ele tinha querido, com isso, «eliminar o éter»
da física. Não se trata disso. Com efeito, para
compreender o pensamento de Einstein, é conve-
niente ler a frase que se segue:
« ... toma-se supérfluo, porque a nossa concep-
ção [ ... ] não faz corresponder a um ponto do
espaço vazio[ ... ] um vector de velocidade.»
Numa palavra, porque não o éter? mas então
um éter cujos «pontos» ou moléculas não este-
jam sujeitos a movimento. Einstein confirmou,
ele próprio, esta interpretação do fundo do seu
pensamento. Conferência na Universidade de
Leyde, 5 de Maio de 1920:
«Um espaço sem éter é inconcebível, pois não
só a propagação da luz seria impossível nele,
como não haveria qualquer possibilidade de
existência [... ] para as distâncias espacio-tempo-
rais no sentido da física.» Escrevendo quinze
anos mais tarde, em Princeton, acrescentou:
«A única solução que se oferece é a de con-
siderar como admitido o facto de o espaço ter
a propriedade de transportar as ondas electro-
magnéticas, sem nos preocuparmos muito com
o significado desta afirmação.» Vê-se despontar
aqui a ideia que o campo - quer dizer, o éter - é
uma realidade física com o mesmo direito, e tal-
vez a mesma natureza, que ... o espaço-tempo. 65
Aceleração em direcção à glória
Em 1684, o físico Robert Hooke (1635-1703),
membro eminente da Royal Society de Londres,
difunde a ideia que os corpos se atraem mutua-
mente na razão inversa do quadrado da distân-
cia que os separa. Newton retoma a ideia e for-
mula a partir dela a sua teoria da gravitação
universal. O matemático francês Denis Poisson
(1781-1840) descobre, um século e meio mais
tarde, uma nova maneira de exprimir a ideia de
Hooke. A cada ponto do espaço, ele associa sim-
plesmente um número, que designa pelo símbolo cp
e chama «potencial da gravitação» nesse ponto.
Não é necessário conhecer n enhuma fórmula
matemática para seguir o resto do seu raciocínio.
Na ausência de toda e qualquer matéria, cp
satisfaz à equação dcp = O que exprime simples-
mente o facto que na a usência de matéria o
potencial da gravitação é como um mar chão,
«sem vagas». A presença da matéria «excita» o
potencial, a equação torna-se então dcp = 47rGp,
em que p representa a densidade da matéria e
em que G é uma constante universal, mais tarde
chamada constante de gravitação.
No final da sua nota de 1905, e mais completa-
mente na comunicação que a desenvolve, Poin-
caré interessa-se por esta questão: «Importava[ ... ]
procurar quais as modificações que [a nossa hipó-
tese] nos obrigaria a trazer às leis da gravitação.»
Às leis da gravitação ... É a questão que é
necessário considerar se quisermos ir a t é ao
66 fim do raciocínio. Poincaré demonstra como é
possível modificar a fórmula da atracção univer-
sal de tal maneira que ela seja afectada pela
transformação de Voigt-Lorentz «em conformi-
dade com o princípio da relatividade» e que
reencontremos a lei vulgar da gravitação - quer
dizer, a equação de Poisson - «sempre que as
velocidades [... ] sejam suficientemente pequenas
para que possamos desprezar os seus quadrados
face ao quadrado da velocidade da luz». Para
chegar a esse resultado, ele formula uma hipótese
que o vai tornar, uma vez mais neste domínio,
um visionário: «Fui [ ... ] levado a supor que a
propagação da gravitação não é instantânea, mas
se produz à velocidade da luz.»
Entramos aqui, com Poincaré, no domínio da
física do século XXI. Com efeito, os físicos estão
persuadidos que a hipótese de Poincaré será um
dia verificada ... - no dia em que os gravitões*, os
«mediadores» da gravitação, tiverem sido desco-
bertos. Mas ainda não chegámos lá.
Dito isto, quando transcreve a equação de Pois-
son para o quadro do espaço-tempo a quatro
dimensões, Poincaré depara com uma surpresa:
essa equação, embora tão precisa nos seus prog-
nósticos, não satisfaz o princípio da relatividade:
quando se aplica uma rotação aos eixos de referên-
cia do espaço-tempo, a equação muda de forma.
Portanto, vai ser preciso modificá-la. Mas como?
Os físicos começam imediatamente - e febril-
mente - esse trabalho.
Em 1908, nomeado privatdocent na Universi-
dade de Berna, Einstein abandona a Repartição
de Patentes. Um ano mais tarde, é nomeado pro- 67
fessor na Universidade de Zurique, e depois, em
1911, professor de Física Teórica na Universidade
alemã de Praga. Aí conhece o professor Georges
Pick, matemático brilhante, antigo assistente
do físico e filósofo Ernst Mach (e violinista ama-
dor...). Einstein adquire o hábito de se encontrar
diariamente com Pick para discutir com ele os
problemas da física que o preocupam. Como
admite numa carta ao seu amigo Grossmann,
debatia-se com dificuldades matemáticas que
ultrapassavam os seus conhecimentos nesta
matéria: «Estou exposto a dificuldades matemá-
ticas, que não consigo vencer. Ajuda-me, parece
que estou a enlouquecer.»
As suas conversas com Pick tiveram um
grande mérito: reforçaram a fé de Einstein
naquilo a que iria chamar mais tarde «a maior
.ideia da sua vida», a saber, o princípio de equiva-
lência. \.

O conceito de massa intervém em dois fenó-


menos distintos: a inércia (resistência ao movi-
mento) e a gravitação (atracção mútua dos cor-
pos). O barão magiar Loránd Eõtvõs demonstra
experimentalmente em 1909 a igualdade quase
perfeita das duas massas. Einstein diz para si que
esta igualdade não pode ser uma coincidência e
decide torná-la num novo princípio da física.
Poincaré tinha baseado parcialmente o princí-
pio da relatividade na observação de Galileu
segundo a qual o movimento partilhado e como
nullo. Einstein baseia o seu princípio de equi-
valência numa outra observação do mesmo
68 Galileu: a gravitação cria uma aceleração uniforme,
O desvio da luz pelo Sol
Durante um eclipse total do Sol, torna-se possível observar as
estrelas situadas na direcção do eclipse. O desvio gravitacional da
luz faz com que essas estrelas pareçam deslocadas das suas posi-
ções reais no céu.

o que arrasta esta consequência notável: os


objectos que são largados juntos do alto de uma
torre caem em direcção ao solo exactamente à
mesma velocidade (se ignorarmos o efeito da
resistência do ar).
A partir deste fenómeno surpreendente, Eins-
tein tira a seguinte conclusão: um homem em
queda livre no espaço está na situação de dizer
para si que está «em repouso» e que é a Terra que
está a subir em direcção a ele: esta explicação é
equivalente à primeira - a da «queda» livre. 69
Apoiando-se numa ideia antiga considerada
por Newton segundo a qual a energia tem inér-
cia, um certo Soldner, no início do século XIX,
tinha imaginado a seguinte experiência: uma
estrela emite luz. Imaginemos que no seu per-
curso em direcção à Terra esta luz passa na pro-
ximidade do Sol. Na medida em que possui inér-
cia, sofrerá uma atracção gravitacional do Sol e
inflectirá o seu percurso. Um cálculo tinha-lhe
permitido prever um desvio de 0,875" de arco na
orla solar. Mas como observar este desvio?
Einstein retoma a ideia e o cálculo em 1911.
Obtém o resultado 0,83" que publica num artigo
intitulado Über den Einflufl der Schwerkraft auf die
Ausbreitung des Lichter («Influência da gravitação
sobre a propagação da luz») e propõe um método
para verificar o prognóstico:
«Na medida em que as estrelas fixas, nas
regiões do céu próximas do Sol, se tornam visí-
veis durante os eclipses totais, é possível veri-
ficar pela experiência esta conclusão teórica.»
Em Postdam, perto de Berlim, o jovem astró-
nomo Erwin Freundlich-Finlay (1885-1964) inte-
ressa-se pela questão; reúne as fotografias dos
eclipses solares e submete-as «a medidas».
Em 1911, por ocasião de um congresso cientí-
fico mundial organizado em Bruxelas pelo
industrial belga Ernest Solvay, Einstein encontra
Marie Curie e, pela primeira vez, Henri Poin-
caré. Algumas semanas mais tarde, Marcel
Grossmann, tendo-se tornado presidente da
secção VIII do Instituto Politécnico de Zurique,
70 rebaptizado Escola Politécnica Federal (EPF),
propõe ao seu amigo um lugar na sua secção.
Marie Curie e Henri Poincaré enviam uma carta
de recomendação a favor de Einstein. Os termos
da carta de Poincaré merecem ser citados:
«Ü futuro mostrará cada vez mais qual é o
valor do Sr. Einstein, e a universidade que con-
tratar este jovem mestre pode estar segura de
colher muita honra disso.»
Em Julho do ano seguinte, em Paris, estando
a vestir-se, Poincaré tem uma vertigem. Morre,
deixando atrás de si uma reputação inigualável.
Ele foi, como o recordou Eric Bell, presidente da
Associação Matemática da América, «o último
cientista que abraçou [ ... ] todo o domínio das
matemáticas, puras e aplicadas».
Nomeado professor na EPF a 22 de Janeiro de
1912, Einstein reencontra aí Marcel Grossmann que
sucedeu ao seu antigo orientador de tese, Wilhelm
Fiedler, na cadeira de Geometria Descritiva. Gross-
mann explica-lhe uma antiga hipótese do matemá-
tico Bernard Riemann (1826-1866) segundo a qual
conviria dar ao espaço «uma forma segundo o seu
conteúdo» . A ideia encanta Einstein. Decide
lançar-se de conivência com o seu amigo num
grande empreendimento: descobrir «a boa» refor-
mulação da equação de Poisson, reformulação que,
no seu espírito, deveria incorporar necessaria-
mente, ao lado da ideia de Riemann, as que resul-
tavam do princípio de equivalência. Einstein conta:
«Grossmann entusiasmou-se imediatamente.
Passou em revista todas as obras publicadas e
cedo descobriu que o problema matemático em
questão já havia sido solucionado.» 71
Contudo, para que a nova teoria que esperava
vir a desenvolver tivesse probabilidade de ser
aceite, era imperativamente necessário que Eins-
tein a pudesse utilizar para fazer prognósticos
verificáveis. Deixando para Grossmann os pro-
blemas de ordem puramente matemática, con-
corda com ocupar-se desse aspecto das coisas.

Efeitos secundários da gravitação


Se concordamos com chamar fenómeno ele-
mentar da gravitação ao fenómeno segundo o
qual uma massa pode ser acelerada, então o pro-
grama de Grossmann-Einstein toma como ponto
de partida a seguinte ideia: o fenómeno elemen-
tar da gravitação deve estar em ligação invariante
com o intervalo elementar do espaço-tempo e
ser estritamente determinado por ele. O prin-
cípio de equivalência intervém da seguinte
forma: localmente, isto é, em toda a zona infini-
tesimal do espaço-tempo, o campo gravítico
deve anular-se.
A ideia é boa, mas este método apenas per-
mite anular - localmente - o efeito principal da
gravitação: aquele pelo qual dois objectos que se
atraem adquirem uma aceleração; não permite
anular - localmente - os efeitos secundários da
gravitação, efeitos que têm uma importância
capital, pois fazem com que a gravitação possua
características que lhe são próprias. Esses efeitos
aparecem claramente na experiência imaginária
72 seguinte: Se a deixarmos cair em queda livre de
Os efeitos secundários da gravitação
O fenómeno das marés e a contracção de volume sob o efeito da
gravidade não podem ser anulados colocando-os «em queda livre».
A relatividade geral atribui esses efeitos à curvatura do
espaço-tempo.

um avião em voo, uma esfera cai em direcção à


superfície da Terra como «atraída» por ela. Mas
examinemos as coisas de mais per to.
A força da gravitação varia inversamente ao
quadrado da distância; esta força deve portanto
ser ligeiramente superior do lado da «frente»
da esfera, próxima da Terra, do que do lado 73
«detrás». O efeito é ínfimo, mas é real: des-
prezá-lo seria desprezar um aspecto essencial
da gravitação. A gravitação tem pois como efeito
não apenas «puxar a esfera para baixo» - é o
efeito principal-, mas também o de a deformar,
transformando-a num elipsóide. É o efeito
«secundário» chamado «fenómeno das marés».
E não é tudo.
Marquemos quatro pontos sobre a face da
nossa esfera e sigamos de perto as suas trajectó-
rias. À partida, esses quatro pontos formam um
quadrado perfeito. Mas, à medida que a esfera se
aproxima da Terra, a sua forma alonga-se; o qua-
drado deforma-se; transforma-se progressiva-
mente num losango.
E ainda há mais.
Suponhamos que a esfera esteja cheia de
matéria. Esta matéria exercerá então uma força
de atracção sobre os pontos acima considerados,
força que, dirigida para o centro da esfera, terá
como efeito a contracção desta, sendo a redução
de volume proporcional à quantidade de matéria
contida na esfera, e juntando-se este segundo
efeito secundário ao efeito da maré atrás descrito.
Em geometria de Riemann, diz-se que é curvo
um espaço no qual os caminhos mais curtos
de um ponto a outro - as geodésicas* - não são
rectas. A curvatura diz-se positiva quando as geo-
désicas inicialmente paralelas se aproximam uma
da outra; negativa se as geodésicas se afastam.
Levar em conta os efeitos secundários da
gravitação incita assim a considerar uma noção
74 de curvatura do espaço-tempo. A teoria da rela-
tividade geral, que Grossmann e Einstein se vão
esforçar por desenvolver, procurará, pois, conci-
liar duas ideias principais: primeira, as leis da
natureza podem, e devem, ser as mesmas para
todos os observadores, qualquer que seja o seu
movimento; segunda, a gravitação não é uma
força; é a manifestação da estrutura do espaço-
-tempo tornado curvo pela matéria - e energia -
presente no seu seio.
Para realizar esse programa, a relatividade
admite a presença no espaço-tempo de um
campo de deslocamento* ao qual caberá a tarefa
de justificar os efeitos secundários da gravitação.
Mas - e esta é a ideia brilhante de Einstein e
Grossmann - não há que «inventar» um novo
campo para cumprir esta função. Einstein preci-
sa, numa carta a Besso de 10 de Agosto de 1954
(uma carta chamada por Besso E.'s langer Brief-
a «longa carta de Einstein»):
«[Nós] escolhemos como noção de partida a
métrica gaJ3 do espaço-tempo. Esta métrica for-
nece a possibilidade de definir o «campo de des-
locamento» que, para cada vector num ponto P,
determina um vector em qualquer ponto P' infi-
nitamente vizinho.»
Na notação de Minkowski, a métrica do
espaço-tempo tem dezasseis componentes que
podemos representar no quadro seguinte:
gll g12 g13 g14
g21 g22 gz3 gz4
g31 g32 g33 g34
g41 g42 g43 g44
75
No vazio, o espaço-tempo está «em repouso»;
as componentes da sua métrica são todas nulas,
à excepção das quatro componentes da «diago-
nal», g 1v g 12, g 13 e g 14 que são iguais a 1, 1, 1 e -1,
respectivamente (espaço-tempo de Poincaré).
A presença da matéria coloca o espaço-tempo
sob «tensão»; as componentes da métrica podem
então tomar valores não nulos. O problema
matemático é descobrir as equações que deter-
minam esses valores. Grossmann propõe a Eins-
tein substituir a equação de Poisson por uma
equação tensorial*. Faltava determinar sob que
forma escrever esta equação e, sobretudo, precisar
a natureza da deformação induzida no espaço-
-tempo pela presença da matéria (e da energia).
Uma folha de papel é intrinsecamente plana.
A superfície de uma esfera é intrinsecamente
curva. Por sorte, o grande perito no estudo
destas questões, o professor Elwin Chris-
toffel (1829-1900), tinha leccionado matemá-
tica ... na EPF! Grossmann propõe utilizar
os métodos d ele para definir a geometria do
espaço-tempo.
No entanto, mal tinham começado, estes tra-
balhos depressa foram interrompidos: mal se
tinha instalado na EFP, Einstein recebeu, de
facto, a visita de Plank e Nernst, vindos de Ber-
lim para lhe proporem um lugar... que ele n ão
podia recusar: o de membro remunerado da
prestigiada Academia das Ciências da Prússia
(fundada no século XVIII por Frederico o Grande,
e de que o francês Pierre Louis Moreau d e
76 M aupertuis tinha sido o primeiro presidente).
Para além disso, Einstein deveria vir a tornar-se
director do Instituto Kaiser-Wilhelm, em forma-
ção em Berlim!
Algumas semanas antes do início da Primeira
Guerra Mundial, Einstein parte portanto para
Berlim. Resigna-se, «de coração pesado», a aban-
donar o formalismo tensorial no qual tinha
depositado a sua esperança, mas que Grossmann
não conseguiu pôr a funcionar. E subitamente ...

Um clarão na noite
O matemático David Hilbert (1862-1943) - o
«Poincaré alemão» - anuncia que estabeleceu a
equação tensorial da relatividade geral. Nos dias
4, 11, 18 e 25 de Novembro de 1915, Einstein
apresenta aos seus colegas da Academia das
Ciências da Prússia uma exposição dos seus tra-
balhos em curso. Na última sessão, dia 25, anun-
cia-lhes que a formulação da nova teoria está
enfim completa e procede à leitura das equações
tensoriais.
Em Londres, o astrónomo britânico Arthur
Eddington (1882-1944) toma conhecimento por
intermédio de Lorentz, que passara o período
de guerra na Holanda a qual havia permanecido
neutra, que, nos primeiros dias do conflito,
Einstein, em Berlim, tinha assinado uma petição
intitulada Apelo aos Europeus convidando
os intelectuais a oporem-se com todas as forças
ao desencadear das paixões nacionalistas
na Europa. Quacre, objector de consciência e 77
pacifista irredutível, o próprio sir Arthur se
tinha recusado pegar em armas. Passionalmente
determinado a promover a reconciliação dos
povos após a louca aventura, concebeu um
audacioso estratagema.
Frank Dyson, astrónomo real de Inglaterra,
tinha anunciado um eclipse total do Sol para
27 de Março de 1919, eclipse que devia ser obser-
vável em certas regiões próximas do equador.
27 de Março de 1919, ilha do Príncipe, pos-
sessão portuguesa no Golfo da Guiné na África
ocidental... Narrativa de sir Arthur, organizador
e chefe da expedição britânica vinda para obser-
var o eclipse:
«Estava tudo a postos. Um metrónomo pre-
parava-se para registar os 302 segundos do
eclipse total.. . Quando a fase total começou, o
disco de sombra da lua tornou-se visível através
de uma nuvem. Foram obtidas dezasseis foto-
grafias, de dois a vinte segundos de exposição.
As primeiras chapas não mostravam estrelas;
mas a nuvem dispersou-se um pouco no fim .. .
Pudemos obter uma em que se via nitidamente a
imagem de cinco estrelas [da constelação das
Híades] que eram bastante convenientes para a
determinação pretendida.»
Alguns meses mais tarde, de regresso a Lon-
dres, Eddington e a sua equipa verificaram a
posição das estrelas antes e durante o eclipse.
Cinco dias antes da celebração do primeiro
aniversário do armistício de 1918, sir Joseph
Thomson convocou uma sessão extraordinária
78 da Royal Society em Londres. A seu convite, o
astrónomo real anunciou ao mundo que o valor
obtido pelos astrónomos britânicos para o des-
vio da luz na passagem do Sol - 1,61 segundos
de arco segundo uns, 1,98 segundo outros - estava
de acordo com o valor previsto pela nova teoria
do cientista alemão Einstein (1,75 segundo de
arco). Sir Joseph celebrou esta concordância
como constituindo «a maior descoberta rela-
cionada com a gravitação depois de Newton
ter enunciado os seus princípios». A imprensa
mundial retomou a declaração dos astrónomos
britânicos e amplificou-a. O «mito Einstein»
acabava de nascer.
Segundo a eminente física e historiadora da
ciência Françoise Balibar, Einstein aceitou
«entrar no jogo», considerando que o seu dever
era o «de não se furtar à súbita celebridade que
lhe caía nos ombros e de, pelo contrário, a uti-
lizar para fazer progredir as causas que tomava
a peito, e em primeiro lugar a da paz». O espaço-
-tempo ganhou assim a sua promoção e Einstein
a imortalidade, mas ...
Mas, quatro anos mais tarde, um «ilustre des-
conhecido», um certo Louis de Broglie, iria fazer
uma descoberta e voltaria repentinamente a pôr
tudo em causa...

79
O jogo das ideias
A gare de Perpignan (página anterior)
Centro do Uni verso segundo Salvador Dali, a estação de
Perpignan seria, ela também, uma singularidade do espaço tempo?
A imaginação dos poetas junta-se por vezes à dos cientistas.
Salvador Dali,
A gare de Perpignan.
Museu Ludwig, Colónia.
© DEMART PRO ARTE B.V.
Genebra, ADAGP, Paris 1996/
Deschames & Deschames.
82
A poesia é uma ciência exacta.

JEAN C OCTEAU

física, c_ada um é livre, a priori, de pensar


E M
o que qmser.
O importante é não se esquecer de inquirir de
tempos a tempos a natureza: t a l ideia, que me
parece boa, será realizável n a natureza?
Se não há dúvida que certas fadas assistiram
à invenção do espaço-tempo, também quiseram
rapidamente baralhar as pistas. A própria inven-
ção, já o vimos, assentava numa ideia muito sim-
ples (mas «er a necessário p e n sar nisso»): asso-
ciar os números cujo quadrado é negativo a uma
«quarta dimensão» do espaço. Uma vez imagi-
nado o espaço-tempo assim concebido, foi tenta-
dor utilizar a sua «métrica» para dar conta dos
fenómenos observados na natureza. M as este
caminho era o bom caminho? 83
Uma formidável cisão separa hoje os físicos
no respeitante à resposta que convém dar a esta
pergunta. Certamente, não foi a primeira vez
que o fenómeno se produziu, e a física não é a
única disciplina a ter sido teatro de uma tal
aventura. Mas o debate diz respeito ao nosso
assunto. Vamos, portanto, debruçar-nos sobre ele
e tentar, afinal, tomar partido - por um lado ou
por outro - esperando que as fadas sejam, desta
v ez ainda, conselheiras benevolentes.
Em particular, não hesitaremos, em formular
ideias originais em relação à maneira como as
partículas elementares se deslocam - talvez - no
espaço-tempo.
Mas, previamente, interessar-nos-emos por
«jogos» - jogos aos quais os físicos se entregam
de bom grado, de tal modo é verdade que a física,
se é uma ciência, é também uma arte.

84
O espaço-tempo
e o Universo

ATRIBUINDO à métrica do espaço-tempo um


..L-\.. papel «activo», a relatividade geral conse-
guiu dar conta do fenómeno da gravitação.
Conhecido esse resultado, e tendo terminado a
guerra, o jovem matemático de origem polaca
Theodor Kaluza pôs a si mesmo esta questão:
porquê parar aqui? Porque não procurar justifi-
car igualmente, através das equações tensoriais,
os fenómenos do electromagnetismo? Acrescen-
temos uma quinta dimensão ao espaço-tempo,
disse para si; mas, na medida em que não conhe-
cemos esta quinta dimensão, não permitamos
que a coordenada que a representa apareça
explicitamente nas equações ...
Kaluza lança-se ao trabalho; aperfeiçoa a
sua ideia; redige uma comunicação; envia-a a
Einstein. Einstein estuda a comunicação;
admira-se com a solução proposta pelo jovem 85
desconhecido; mete a comunicação numa gaveta,
onde a guarda ... dois anos.
Perdendo imediatamente o interesse por atin-
gir a glória, Kaluza desencoraja-se, abandona as
matemáticas e, como Rimbaud abandonando
Paris e a poesia, inicia uma nova profissão - ins-
talador de piscinas(!).
Em 1921, o seu artigo Zum Unitii.tsproblem der
Physik («Sobre o problema da unidade da física»)
é finalmente publicado. Kaluza apresenta nele
uma métrica para o espaço-tempo comportando
vinte e cinco componentes em vez de dezasseis.
Mas mostra-se poupado: arranja forma de a
quinta coordenada não aparecer explicitamente
nas fórmulas.
A partir desse esquema, obtém um resultado
espantoso: a nova teoria reproduz a relatividade
geral - que dá conta da gravitação; reproduz
também a teoria electromagnética de Maxwell -
que dá conta dos fenómenos da electricidade, do
magnetismo e da óptica!
Formidável resultado!
Cinco anos mais tarde, o matemático sueco
Oskar Klein consegue explicar porque é que a
quinta dimensão de Kaluza é invisível: as
dimensões que nós conhecemos estendem-se até
ao infinito, como as rectas (que nós utilizamos
para as representar). A quinta dimensão de
Kaluza, essa, assemelhar-se-ia a um pequeno cír-
culo fechado sobre si próprio - demasiado
pequeno para ser detectado. Infelizmente para
Kaluza e Klein, os seus resultados passaram
86 quase despercebidos, pois, entretanto ...
Entretanto ...
Entretanto, o físico francês Louis de Broglie
(1892-1987) tinha proposto a ideia, depressa veri-
ficada experimentalmente, que as partículas ele-
mentares da natureza - e nomeadamente o elec-
trão* - se comportam no espaço-tempo de uma
maneira um pouco bizarra: umas vezes como
corpúsculos, outras como ondas. Retomada e
desenvolvida por um grupo de físicos brilhantes,
esta ideia deu origem a uma nova formulação da
física: a mecânica quântica*.
Por outro lado, os físicos tinham detectado a
presença na natureza de duas forças: as forças que
hoje se chamam força de interacção fraca e força
de interacção forte. Recusaram-se a dar importân-
cia à teoria de Kaluza que incorporava apenas
duas das quatro forças da natureza e não levava
em conta as descobertas da mecânica quântica.
A ideia de Kaluza sofria de qualquer modo
de um defeito fatal: muitos objectos na natureza
possuem uma propriedade particular - a quirali-
dade*: são como as nossas mãos, quer direitas,
quer esquerdas. Isto é de tal forma importante
que uma das quatro forças - a da interacção
fraca - apenas intervém entre partículas esquer-
das (facto surpreendente, cuja origem não foi
ainda elucidada). Ora, a quiralidade não existe
- não pode existir - senão num espaço cujo número
de dimensões espaciais é ímpar. O espaço-
-tempo a cinco dimensões de Kaluza, compor-
tando quatro dimensões do tipo «espaço», não
consegue acomodar a quiralidade. 87
' ,

I
'

' ' '


'

I
'
/ '
/ '

A quiralidade
Num espaço a uma dimensão, as setas que apontam numa
direcção distinguem-se das setas que apontam na direcção oposta.
Esta distinção - esta quiralidade - desaparece no espaço a duas
dimensões. A distinção mão esquerda/mão direita que existe no
es paço-tempo desa pareceria se o espaço-tempo tivesse cinco
dimensões, quatro das quais de tipo espacial.

Em Berlim, Einstein explora com o matemá-


tico vienense Walther Mayer a ideia de urna teo-
ria que sujeitaria o espaço-tempo, já não à curva-
tura, mas à torção. (Dou um passo para a direita,
depois um passo para a esquerda; chego a um
certo ponto. Dou primeiro um passo para a
esquerda, depois um passo para a direita. Se
chego a um ponto diferente, o meu espaço é pro-
vido de torção.) Dez anos mais tarde, abandona
esta ideia e retorna a de Kaluza: «A astúcia [desta
vez], escreve ele ao seu amigo Besso, consiste em
introduzir no espaço-tempo quadridirnensional
vectores com cinco componentes ... » Uma astúcia
que, o próprio Einstein admite, não dá lugar infe-
88 lizmente a «nenhum progresso físico ».
No decurso dos últimos anos da sua vida,
Einstein fará, em Princeton, uma última tenta-
tiva para incorporar a electrodinâmica no forma-
lismo da relatividade geral, tentativa fundada,
desta vez, na noção de um espaço-tempo a ... oito
dimensões (quatro dimensões complexas).
Os esforços desenvolvidos por Einstein nos
últimos trinta e cinco anos da sua vida resu-
mem-se a isto: os fenómenos da natureza pare-
cem-nos complexos e a estrutura do espaço-
-tempo essencialmente «simples». Invertamos
os papéis. Tornemos responsáveis pelas comple-
xidades da natureza já não os fenómenos, mas
sim o espaço-tempo. Numa palavra, complique-
mos a estrutura do espaço-tempo para simplifi-
car os fenómenos. Com este espírito, podemos
considerar para o espaço-tempo toda a espécie
de propriedades exóticas: uma curvatura princi-
pal, a curvatura de Riemann; uma curvatura
secundária - «segmentária» (Hermann Weyl) ou
«homotética» (Élie Cartan) - produzindo varia-
ções de comprimento na passagem de um ponto
do espaço-tempo a outro; efeitos de torção (Car-
tan, 1923); a ideia de um «paralelismo absoluto»
(Einstein, 1928, Tullio Levi-Civita, 1929), e ainda
muitos outros artifícios ...
Estes esforços para forçar o espaço-tempo a
dar conta, por si só e a qualquer preço, das com-
plexidades do mundo físico fazem-me pensar no
número de Fernand Raynaud, Y a comme un
défaut, durante o qual o célebre cançonetista des-
crevia os esforços de um alfaiate para obrigar o
seu cliente a contorcer-se para se adaptar ao fato 89
mal cortado que ele tinha feito. «Há mil e urna
maneiras de instituir as leis da tribo, e cada uma
delas é a boa maneira», assegurava já Eddington.
Todavia, enquanto, em Berlim e depois em
Princeton, Einstein se obstinava em querer conci-
liar a electrodinârnica e a gravitação, os outros
físicos do mundo aperfeiçoavam a física numa
direcção completamente diferente: a da mecânica
quântica, a que prefiro chamar, no contexto deste
livro, a física das partículas.

Campos ou partículas?
Em relatividade geral, o espaço-tempo apare-
ce sob a forma de um campo, isto é, de urna enti-
dade cujas propriedades variam de um ponto
para outro de maneira contínua, e em que o
valor do campo num ponto define o campo nos
pontos vizinhos. Einstein tornou-se um adepto
irredutível desta noção: «o campo [ ... ] é para o
físico moderno tão real corno a cadeira em que
está sentado», escreveu um dia.
Teoria do campo, a relatividade geral descreve
pois a matéria sob ·a forma de urna espécie de
geleia amorfa desprovida de estrutura e sobre-
tudo sem «grurnos» . Na física das partículas, a
matéria é considerada, muito pelo contrário, sob
a forma de «grurnos» - as partículas. Nesta con-
cepção, as partículas trocam continuamente
entre si entidades de um tipo particular: os
«mediadores*». Essas trocas produzem os efeitos
90 que atribuímos convencionalmente às «forças».
Os mediadores das três forças unificadas até
hoje foram identificados e verificada a sua exis-
tência. O mediador da gravitação, o gravitão,
ainda não foi observado, mas toda a gente está
de acordo em pensar que o será um dia.
A relatividade geral atribui os efeitos aparen-
tes da gravitação à curvatura do espaço-tempo.
Não existe lugar para o gravitão em relatividade
geral. E não é tudo.
Na física das partículas, admite-se que o
espaço-tempo, mesmo «vazio», contém uma
certa quantidade de energia, a qual, segundo as
equações da relatividade geral, deveria produzir
um campo gravitacional detectável. Ora, não se
passa nada disso.
Existe portanto algo necessariamente inexacto
na nossa formulação da teoria. O físico ameri-
cano Richard Feynman (1918-1988), de quem
falaremos mais tarde, propôs esta explicação :
«Quando Einstein e outros tentaram unificar a
gravitação e a electrodinâmica, essas teorias
eram aproximações clássicas. Dito de outra
maneira, eram falsas.»
Portanto, está lançada a nossa discussão: em
física, pode bem ser que existam ideias que nos
agradam - e que talvez sejam falsas; e outras que
nos parecem bizarras - e que talvez sejam correctas.
Para entrar mais a fundo na nossa discussão,
interessemo-nos por um conceito que, por si só,
incarna o essencial dessas dificuldades.
No papel, o caminho mais curto para ir
de um ponto a outro é uma linha recta. Na
superfície de uma esfera, é um arco de círculo. 91
No espaço-tempo, e 1nais geralmente num
espaço curvo, o caminho mais curto é chamado
geodésica.
Por ocasião de uma conferência dada em
Princeton em 1921, Einstein definiu assim esse
conceito: «[No espaço ordinário] o movimento
de um ponto material que não esteja submetido
à acção de nenhuma força é [... ] rectilíneo e uni-
forme. A generalização natural, isto é, a mais
simples, da linha recta é [... ] a linha mais curta
(geodésica).»
Introduz então esta ideia fundamental que
está na base da concepção do movimento em
relatividade geral: «Admitiremos por conse-
guinte, em conformidade com o princípio de
equivalência, que o movimento de um ponto
material, que está sujeito apenas à influência da
inércia e da gravitação, é descrito pela equação
[da geodésica].»
A equação da geodésica, tal como Einstein a
escreveu, tem todas as marcas da simplicidade e
da elegância matemática que, para alguns físicos,
são as provas últimas da veracidade em física.
É compreensível que ela tenha seduzido Einstein.
Infelizmente para a sua teoria, as pesquisas expe-
rimentais e teóricas levadas a cabo durante um
século demonstraram que as partículas elementa-
res presentes na natureza não se comportam
corno pontos materiais deslocando-se ajuizada-
rnente ao longo de geodésicas no espaço-tempo.
Nestas condições, somos levados a perguntar
porque é que a relatividade geral conseguiu con-
92 servar o favor de numerosos físicos que a consi-
deram ainda hoje como uma das teorias mais
efectivadas da história da física.
A realidade das coisas é a seguinte.
Em escalas muito grandes - à escala cósmica
do universo -, a relatividade geral ensina-nos,
talvez, alguma coisa sobre a estrutura do
espaço-tempo: poderia estar provido de curva-
tura. À escala subatómica, em contrapartida, não
nos ensina nada - salvo talvez o seguinte: a
estrutura do espaço-tempo a esta escala não é
a descrita pela relatividade geral.

Buracos negros e compactação


O espaço-tempo teve um começo? Terá um
fim?
Sim, se acreditarmos nos especialistas. Eles
dizem que o espaço-tempo começou com um
big bang e que acabará provavelmente com
um «big crunch».
Alguns dizem também que poderia existir
uma diferença fundamental entre a estrutura
dessas duas singularidades do espaço-tempo.
Qual poderia ser a origem desta diferença?
A relatividade geral descreve dois tipos de
deformação do espaço-tempo: as distorções
devidas aos efeitos de maré e as contracções de
volume provocadas pela densidade da matéria e
da energia. Segundo o britânico Roger Penrose,
grande especialista contemporâneo dessas ques-
tões, na singularidade inicial - o big bang - ape-
nas teria interferido acelerações dirigidas para 93
o interior da «bola de fogo primordial», levando
assim a contracções no espaço-tempo, mas não a
distorções do tipo «efeito de maré». Por contraste,
a singularidade final - o big crunch - interviria
no fim dos tempos quando as distorções devidas
aos efeitos de maré se tornassem insustentáveis.
Pareceria que esta diferença fundamental de
estrutura entre a «singularidade do passado» e
as «singularidades do futuro» - singularidades
do tipo das que se encontram em particular no
estudo dos buracos negros*- apela a uma expli-
cação que a relatividade geral não era capaz de
nos fornecer. É um dos enigmas que a teoria
quântica da gravitação deverá um dia tentar
resolver.
Um segundo problema preocupa os especia-
listas: para acomodar as nossas concepções tra-
dicionais, se o espaço-tempo tem dez dimensões
como afirmam alguns (cf. p. 99), é necessário que
seis dessas dimensões sejam internas, isto é,
indetectáveis à nossa escala de observação. Tem
pois de se utilizar uma técnica matemática
para «compactar» as dimensões indesejáveis do
espaço-tempo.
A compactação e o estudo das singularidades
do espaço-tempo constituem domínios privile-
giados da física contemporânea. As matemáticas
- e a imaginação - são, por agora, os únicos
utensílios disponíveis para a sua exploração.
Abdus Salam, físico nascido na Índia, laureado
com o Prémio Nobel da Física, resumiu a evolução
das nossas ideias sobre o espaço-tempo desde a
94 invenção do conceito. Afirma ele: «A natureza é
simples se a contemplarmos do ângulo certo. »
E explica: «Por exemplo, penso que Deus criou
duas dimensões - uma de espaço e uma de
tempo. Mais tarde, houve «transição» para qua-
tro dimensões, mais seis dimensões internas.
Duas é o centro desta teoria e esse número não
passará a três.»
Isto faz-nos regressar ao nosso ponto de par-
tida: o da invenção do espaço-tempo - um espaço
cujas dimensões são de dois tipos, uma corres-
pondendo a números cujo quadrado é positivo,
e outra a números cujo quadrado é negativo.

95
Espaço-tempo
e partículas elementares

é um livro de história e de ciência. No


E STE
entanto, nada nos proíbe de nos interes-
sarmos por jogos.
Descreveremos aqui três «jogos» que estão na
base do nosso conhecimento da maneira como
funciona o espaço-tempo à escala subatómica, e
depois um quarto jogo abrindo novas possibili-
dades.

O jogo dos quarks


O físico Murray Gell-Mann inventa nos anos
60 o jogo dos quarks, concebido à partida como
uma simples brincadeira destinada a pôr em evi-
dência certas regularidades na organização das
partículas. Esse jogo joga-se com seis «cartas»
designadas cada uma por uma letra - u e d, se e, t
e b. Os quarks u e d, os mais difundidos na natu- 97
reza, são os únicos que nos vão interessar aqui.
O jogo dos quarks joga-se com as seguintes regras:
- nunca se observa um quark isolado;
- os quarks estão, ou associados dois a
dois, ou confinados em grupos de três, no
interior dos núcleos atómicos.

Para explicar este fenómeno do confinamento


dos quarks, John Schwarz e André Neveu, no
Instituto de Tecnologia da Califórnia, sugeriram a
ideia de que os quarks estão, irredutivelmente,
ligados uns aos outros no interior dos núcleos por
meio de algo que se assemelha a «cordas elásti-
cas» cuja tensão aumenta quando são esticadas.
Em 1947, esse modelo, ingénuo, dá lugar a
uma teoria mais elaborada na qual os quarks
estão ligados uns aos outros porque trocam
continuamente entre si gluões*, eles próprios
compostos de quarks. Mas Schwarz e o jovem
francês Joel Scherk, que infelizmente morreria
pouco depois, descobrem que a teoria aban-
donada das «cordas elásticas» pressagia a exis-
tência de uma partícula com as características
previstas ... para o gravitão! Excitados com esta
descoberta, lançam-se impetuosamente num
novo estudo desta teoria que parece poder expli-
car - em termos de partículas - a gravitação!

O jogo das cordas


Na teoria das cordas, diz-se que existe na
natureza um objecto elementar de muito pequenas
98 dimensões, a corda. A corda tem três caracterís-
ticas principais: possui um certo comprimento;
está submetida a uma certa tensão; e «vibra» no
espaço-tempo. Nesta concepção, cada uma das
partículas da física - incluindo os quarks - é
uma corda, sendo apenas o modo de vibração da
corda aquilo que distingue as partículas umas
das outras.
Hoje, categoricamente rejeitada por alguns
dos melhores físicos contemporâneos, literal-
mente «adorada» por outros, a teoria das cordas,
na sua principal versão, considera um espaço-
-tempo a ... dez dimensões. Porquê dez?

A supersimetria
Sabemos todos o que é que se entende por
simetria: a minha mão esquerda é a imagem
simétrica da minha mão direita. Quando a sime-
tria não é evidente - por exemplo quando não é
do tipo geométrico - falaremos de supersimetria.
Existe na natureza uma supersimetria que
assente nas partículas elementares da física?
Numerosos físicos pensam que sim. Definem o
grau N de supersimetria presente no universo e
dizem que se N =O, então o espaço-tempo pode-
ria ter... vinte e seis dimensões!
Mais modestamente, se N = 1, teria dez.
A que correspondem as dimensões suplementares?
Se a natureza é supersimétrica, então é pre-
ciso que o espaço-tempo também o seja. As
dimensões suplementares seriam as «superpar-
ceiras» das dimensões clássicas. 99
Esta versão da teoria das cordas goza do
favor dos especialistas. Um deles, o brilhantís-
simo Edward Witten, um dos sucessores de
Einstein no Institute for Advanced Studies
de Princeton, escreveu: «A teoria das cordas é
uma teoria do século XXI que caiu por acaso nas
mãos dos físicos do século xx ... Tentaremos tirar
o melhor partido possível disso.»
A supersimetria prevê a existência de uma
«parceira supersimétrica» para cada uma das
partículas elementares, parceiras com proprieda-
des estranhas, não tendo ainda sido detectada
nenhuma delas. Uma delas, por exemplo, seria o
monopólo magnético, ainda nunca visto - salvo
talvez uma vez , como o yeti, mas a observação
nunca foi confirmada. Uma outra poderia ser
um minúsculo «buraco negro» de acordo com
uma previsão devida ao jovem teórico Michael
Duff da universidade A & M do Texas.
A relatividade geral explica a gravitação por
meio da noção da curvatura no espaço-tempo.
A teoria das cordas apoia-se numa consideração
geométrica bastante diferente.
Se as partículas são pontos, as suas trajectó-
rias no espaço-tempo são geodésicas. Se elas são
cordas, as trajectórias assemelham-se a fitas
(a tubos, se as cordas forem anéis). O utensílio
matemático da teoria das cordas é pois a belíssiina
teoria das superfícies estudada sistematicamente
pela priineira vez por Riemann.
Esta teoria é de uma enorme beleza e de uma
grande riqueza. É em parte por esta razão que a
teoria das cordas, da qual ela é o núcleo, parece
100 tão atraente.
Duas observações pugnam a favor da teoria
das cordas aos olhos dos especialistas: tendo os
seus fundamentos na geometria, está em condi-
ções de prolongar a relatividade geral e incorpora
automaticamente a gravitação, na medida em
que, pelo menos, prevê a existência do gravitão.
Infelizmente, ainda nenhuma das suas previsões
pôde ser verificada.
Onde é que tudo isto nos leva? Segundo Shel-
don Glashow, professor em Harvard, laureado
com o Prémio Nobel da Física, a teoria das
cordas vai dominar a física durante o próximo
meio século «da mesma maneira que a teoria
de Kaluza-Klein dominou a física nos últimos
cinquenta anos, isto é, a nada».
Michael Green, um dos pais fundadores da
teoria das cordas, é de opinião contrária. Segundo
ele, a teoria das cordas «está destinada a per-
durar durante longos anos; o facto de ela ter a
ver com tantos ramos das matemáticas mostra
que contém verdades profundas».

O espaço-tempo fractal
Nascido em Varsóvia, em 1924, numa família
judia lituana, Benolt Mandelbrot emigra para
Paris doze anos mais tarde. Admitido na Escola
Normal Superior e no Politécnico após a Liberta-
ção, escolheu o Politécnico - em parte para fugir
ao ensino matemático dado, na Escola Normal
Superior, pelos adeptos do grupo semiclandes-
tino Bourbaki fundado em Paris após a Primeira 101
Guerra Mundial, juntamente com outros, pelo
seu tio, o matemático Szolem Mandelbrotj,
em reacção às concepções teóricas de ... Henri
Poincaré.
Dez anos mais tarde, Mandelbrot abandona a
França e instala-se nos Estados Unidos. Põe a si
mesmo uma questão: Qual é a dimensão de um
novelo de fio? Visto de longe, o novelo é um ponto,
cuja dimensão é zero; visto de mais perto, é uma
pequena esfera, portanto um objecto a três dimen-
sões; de mais perto ainda, distingue-se o fio de que
é feito, fio que parece apenas ter uma dimensão,
mesmo que se enrole sobre si mesmo e se enrede
até preencher o espaço. De mais perto ainda...
Mandelbrot propõe então a seguinte ideia: os
objectos da natureza não têm necessariamente
um número inteiro - 1, 2, 3 ... - de dimensões.
E introduz a noção de dimensão fractal*.
Esta noção revelou-se extremamente fecunda
para a descrição de todas as espécies de objectos
presentes na natureza - por exemplo, as nuvens
(como descrever o contorno de uma nuvem?).
Mas a sua utilização na física das partículas
demorou bastante.
Laurent Nottale, astrofísico no Observatório
de Paris, em Meudon, foi um dos primeiros a
interessar-se por este assunto . Segundo ele,
numa certa escala de observação - no nível suba-
tómico, mas também no nível cósmico! -, as
dimensões do espaço-tempo poderiam não ser
as que nós observamos à escala que nos é fami-
liar - o espaço-tempo tornar-se-ia fractal. Esta
102 ideia evoca uma outra ...
Michel Serres propôs esta ideia: «O tempo
não escorre, percola.» Imaginemos uma rede de
pontos ligados uns aos outros, aleatoriamente,
quer por um filamento isolante, quer por um
filamento condutor. Pode acontecer que pelo
menos um caminho ininterrupto permita passar
de uma ponta até à outra do reticulado através
de filamentos condutores. Nesse caso uma cor-
rente poderá atravessar a rede. Diz-se de uma
rede como esta que percola (do latim per [atra-
vés], e colare [coar]). A ideia é válida mesmo se a
rede é de dimensão fractal.
As concepções fractais permitirão fazer avan-
çar a física?

Recuar no tempo
A 18 de Outubro de 1883, um grupo de súb-
ditos britânicos - homens e mulheres - deixa o
hotel Alexandria a caminho do topo do Ben
Nevis, a montanha mais alta das ilhas Britânicas
na Escócia. Um tocador de flauta ao som de
Lochiel's awa' to France vai à frente. No cume, à
neve e ao vento, Lord Abinger inaugura o nov o
Observatório do monte Nevis. Onze anos mais
tarde, em Setembro de 1894, Thomson Rees
Wilson, estudante em Cambridge, faz um está-
gio de duas semanas no Ben. Uma manhã, cerca
das cinco horas, quando nascia o sol, observa
um fenómeno estranho: «A sombra do cume do
Ben estendia-se sobre uma nuvem até ao hori-
zonte. Na superfície da nuvem, no sítio em que a 103
sombra terminava, apercebi-me de anéis brilhan-
temente coloridos - a sombra do Ben "na sua
glória". Excitado perante esta visão, decidi tentar
reproduzir esses anéis no meu laboratório. »
Quando volta para Cambridge, Wilson
inventa a câmara de Wilson para o estudo dos
anéis «da glória».
Vinte anos mais tarde, uma partícula atravessa
uma câmara de Wilson no Instituto de Tecnolo-
gia da Califórnia. O acontecimento é registado
fotograficamente. Carl Andersen, que examina
o rasto de bolhas deixadas na câmara pela par-
tícula, descobre, com grande surpresa, que ele
corresponde ao rasto que poderia ser deixado
por um electrão dotado de uma carga positiva -
um positrão*.
Em 1940, Richard Feynman inicia estudos
superiores de Física na Universidade de Prince-
ton. Uma noite, o seu orientador de tese, John
Wheeler - apenas alguns anos mais velho que
ele -, telefona- lhe . Fala-lhe de uma ideia
que acaba de lhe ocorrer: o positrão descoberto
por Andersen na sua «câmara de Wilson» pode-
ria bem ser... «um electrão a recuar no tempo».
A ideia provoca em Feynman «uma impressão
indelével». Põe-se imediatamente ao tr abalho.
(O físico suíço Ernst Stückelberg tinha tido a
mesma ideia, mais ou menos ao mesmo tempo.)
Em 30 de Março de 1948, vinte dos maiores
físicos do século reúnem-se numa estalagem nas
montanhas de Pocono na Pensilvânia para a í
discutirem entre si os problemas da física. No
104 dia seguinte, Richard Feynman apresenta-lhes a
sua concepção do electrão que r ecua no tempo.
Mas, antes que ele tivesse podido acabar, o grande
Niels Bohr, galardoado com o Prémio Nobel,
prestigioso opositor de Einstein sobre a matéria
da nova física, tira-lhe o giz da mão. E explica no
quadro porque é que as ideias do seu jovem
colega são inaceitáveis ...
Conhecido por diagrama de Feynman, o dia-
grama apresentado por Richard Feynman nesse
dia constitui uma das mais brilhantes valoriza-
ções do conceito do espaço-tempo jamais imagi-
nadas desde a invenção do conceito.
A ideia teórica segundo a qual uma partí-
cula pode evoluir no tempo tanto num sentido
como no outro está longe de ser uma ideia
«extravagante». Ela é, pelo contrário, uma das
ideias mais poderosas que foram propostas na
física das partículas no decurso do século: efec-
tivamente ela explica de uma vez por todas as
propriedades observadas da antimatéria. Per-
mite compreender nomeadamente porque é que
a cada partícula de matéria corresponde uma
partícula de antimatéria que é a sua réplica per-
feita. E permite descrever eficazmente os pro-
cessos elementares nos quais intervêm as partí-
culas de antimatéria. Tomemos o caso de um
electrão que entra em colisão com um antielec-
trão - um positrão -, fenómeno observado cor-
rentemente e chamado «aniquilação». Na inter-
pretação convencional, as duas partículas
desaparecem subitamente do visor «de corpo e
alma», deixando como único traço da sua coli-
são dois fotões que vemos afastarem-se do local 105
Â= 00

t= t2 - --------

t=D --+---

O primeiro diagrama espaço-tempo


Desenhado pelo físico suíço Ernst Stiickelberg em 1941, este
diagrama mostra pela primeira vez (curvas B e C) duas partículas
dando meia volta no tempo. Os diagramas espaço-tempo desempe-
nham hoje um papel fundamental na teoria de partículas.

da colisão, transportando consigo a energia


combinada das partículas desaparecidas. Porquê
dois fotões?
Explicação baseada na ideia teórica de Feyn-
man: a colisão em questão não é a que ima-
ginamos; ela é a de um electrão com um fotão
recuando no tempo. No ponto de colisão as
partículas trocam as suas direcções de tempo,
após o que o electrão que observamos recua no
tempo.
É de notar que nada permite distinguir a priori
. um fotão vulgar de um fotão recuando no tempo
106 (antifotão).
Mas a interpretação convencional não gosta
de se alongar acerca deste facto notável, conten-
tando-se com dizer-nos, sem outra explicação,
que o fotão é a «sua própria antipartícula».
Inspirando-se no Sr. Jourdé3_in- que não sabia
«que falava em prosa», a maioria dos físicos pre-
ferem hoje dizer que o positrão é um antielectrão -
um electrão constituído por antimatéria. Pare-
cem ter dificuldade em concordar que o positrão
se parece estranhamente com um electrão vulgar
a recuar no tempo.
Simples imaginação? Sem dúvida ... a menos
que a natureza não se preste à brincadeira.
Mas, justamente, ela presta-se.
Recuar no tempo ... A ideia é muito simples.
Envio um sinal luminoso em direcção à lua.
Esse sinal afasta-se de mim, e nunca poderei
recuperá-lo; constitui o meu passado. Um obser-
vador na lua espera esse sinal. Ainda não o rece-
beu; para ele, ele constitui o futuro. Para recuar
no tempo, bastar-me-ia portanto poder recupe-
rar o meu sinal luminoso. É possível? À escala
das partículas, sim.
À volta desta ideia, Richard Feynman cons-
truiu, com alguns outros, urna teoria do
espaço-tempo que, devido à sua precisão, apre-
senta uma incontestável sedução. Para nos con-
vencermos disso basta considerar o exemplo
que ele nos dá: «A QED [abreviatura da expres-
são Quantum Electrodynamics] existe há mais
de cinquenta anos e foi constantemente posta
à prova. Posso afirmar hoje que não há qual-
quer diferença significativa entre a teoria e a 107
experiência. Para vos dar uma ideia [da pre-
cisão atingida pela QED], vou citar-vos um
número ... »
O número citado por Feynman respeita ao
seguinte facto: colocado num campo magnético, o
electrão comporta-se como um pequeno íman.
Diz-se que ele possui um momento magnético.
Esse momento magnético foi medido com uma
grande precisão. O seu valor, num certo sistema de
unidades, é igual a 1,00115965221 com uma incer-
teza de apenas ± 4 no último dígito. O valor teórico
calculado pelo método de Feynman dá o mesmo
resultado até aos dois últimos dígitos! Feynman
diz: «Se medíssemos a distância de Nova Iorque a
Los Angeles com a mesma precisão, a diferença
não ultrapassaria a espessura de um cabelo!»
Eis-nos prontos para jogar ao jogo inventado
por Feynman, a famosa QED.

OjogodaQED
Neste jogo, representa-se o espaço-tempo por
meio de dois eixos, um designado por «espaço»
e o outro por «tempo». Existem duas peças no
jogo: o electrão e o seu mediador, chamado
fotão. As «jogadas» autorizadas, tal como foram
enunciadas pelo seu inventor Richard Feynman,
são em número de três:
- um fotão dirige-se de um ponto do
espaço-tempo para outro;
- um electrão dirige-se de um ponto do
espaço-tempo para outro;
108 - um electrão emite ou absorve um fotão .
Nesta concepção, não há nem antipartículas,
nem antimatéria: os positrões são electrões vul-
gares ... recuando no tempo.
À lista das «jogadas» autorizadas é neces-
sário acrescentar as leis que regulam o desloca-
mento das «peças» - electrões e fotões - no espa-
ço-tempo.
Eis, na minha opinião, como devem ser enun-
ciadas essas leis:
- as partículas - electrões ou fotões - são
livres de evoluir no tempo tanto num
sentido como no outro;
- as partículas - electrões ou fotões - deslo-
cam-se transpondo passos.

Chamo a esta concepção a mecânica do


passo.
Esta, como vamos ver, permite compreender
e explicar em termos simples muitas coisas ...

A mecânica do passo
Encontrei Louis de Broglie pela última vez
alguns anos antes da sua morte em Louvecien-
nes em 1987. Evocando o futuro da física, ele rea-
firmou, nesse dia, a sua convicção que o dado
fundamental em física de partículas não podia
ser a amplitude, como se ensina oficialmente,
mas devia ser a fase.
Partilho esta convicção.
Vamos ver do que se trata.
Consideremos um sinal, por exemplo o
número 2, gravado sobre uma «roda da sorte». 109
A mecânica do passo
Uma fonte emite partículas, uma parede oferece-lhes dois cami-
nhos para atingir o alvo. No esquema da esquerda as partículas
chegam ao alvo em fase, o seu efeito é detectado. No esquema da
direita, os caminhos são de comprimentos diferentes, as partículas
atingem o alvo fora de fase, o seu efeito anula-se.

Sigamos com os olhos esse sinal quando a roda


se põe em movimento. Para melhor seguir
o movimento, associemos ao sinal, em pensa-
mento, um ângulo que tem o valor de Oº à par-
tida e o valor 360º no fim de uma volta completa
da roda. Podemos dizer que este ângulo mede
a fase associada à rotação da roda.
O que torna este assunto particularmente
apaixonante é o facto seguinte. Os físicos identi-
ficaram duas grandes classes de partículas na
natureza: aquelas cuja fase executa uma volta
completa - 360 º - quando a partícula dá um
passo; são os mediadores de forças. E aquelas
cuja fase apenas executa meia volta - 180º -
quando a partícula dá um passo; são as par-
tículas que constituem a matéria, propriamente
dita, (os electrões, por exemplo).
Eu diria que as primeiras avançam «saltitando»,
como certos pássaros; as segundas avançam com
110 o pé direito, depois com o pé esquerdo, etc.,
como os bípedes. O hipotético gravitão faria
parte de uma terceira família: avançaria mais
como uma roda quadrada. (Ponho isto no con-
dicional, porque nunca ninguém observou um
gravitão. Mas são esses os prognósticos da teoria.)
Dito isto, eis as duas «leis da natureza»
segundo a mecânica do passo : primeira, uma
partícula desloca-se percorrendo passos de com-
primento tanto maior quanto menor a quantida-
de de movimento que a partícula transporta;
segunda, quando duas partículas se encontram
num alvo, o seu efeito anula-se a não ser que
elas lá cheguem «em fase» uma com a outra.
O que dá à mecânica do passo toda a sua
força reside nesta observação: cada passo que
uma partícula percorre - seja ela qual for - repre-
senta sempre exactamente uma unidade de
acção. De que se trata?
Na véspera da sua partida para Berlim, em 15
de Abril de 1744, Maupertuis, nomeado presi-
dente da Academia das Ciências da Prússia por
Frederico, o Grande, fez na Academia das Ciências
de Paris, à laia de adeus, uma declaração que iria
torná-lo o descobridor de uma das noções mais
fundamentais da física:
«Meditando profundamente sobre esta maté-
ria, pensei que a luz, quando passa de um meio
para outro, abandonando já o caminho mais
curto, que é o da linha recta, poderia também
não seguir o do tempo mais rápido. Efectiva-
mente, que preferência deveria existir do tempo
sobre o espaço? A luz não podendo seguir sem-
pre pelo caminho mais curto, e pelo do tempo 111
mais rápido, porque iria ela por um desses cami-
nhos e em vez de um outro? Assim, ela não
segue nenhum dos dois; ela toma um caminho
que tem uma vantagem mais real: o cami-
nho que ela toma é aquele em que a quantidade
de acção é menor. » E ele dá esta definição para
a acção:
«Quando um corpo é levado de um ponto para
outro, é para isso necessário uma certa acção: esta
acção depende da velocidade do corpo e do espaço
que ele percorre; mas ela não é nem a veloci-
dade nem o espaço considerados separadamente.
A quantidade de acção é tanto maior, quanto
maior for a velocidade do corpo, e maior a distân-
cia que ele percorre; ela é proporcional à soma dos
produtos de cada um dos espaços pela velocidade
com que o corpo a percorre.»
Aplicando estas ideias, obtemos este pequeno
teorema da mecânica do passo, facilmente
demonstrado: a acção total gasta por uma partí-
cula no espaço-tempo é mínima para o trajecto
correspondente ao menor número de passos.
Com efeito, se a partícula percorre N passos,
a acção total dispensada, igual a N unidades, é
mínima quando N é o menor possível.
Este teorema inscreve-se na linha de uma
grande tradição da «escola francesa» da física: a
que começa com o «princípio do tempo mínimo»
descoberto por Pierre Fermat; que prossegue
com o «princípio da menor acção» formulado
por Maupertuis e desenvolvido nomeadamente
por Joseph Louis de Lagrange; para terminar no
112 «princípio do menor número de passos» da
mecânica do passo. Esses princípios dizem todos
o mesmo: as trajectórias mais interessantes em
física de partículas são aquelas para as quais a
acção gasta por uma partícula em movimento,
no sentido de Maupertuis, é mínima. A mecânica
do passo permite-nos compreender porque é
assim: as trajectórias de menor acção são as que
permitem às partículas ter uma maior oportuni-
dade de chegar em fase ao seu destino.
Para melhor apreciar o funcionamento da
mecânica do passo, interessemo-nos por um dia-
grama espaço-tempo em que uma partícula vai
do ponto A ao ponto B. Se a distância AB não for
um múltiplo inteiro do seu passo, a partícula
chega a B sem ter completado o seu último passo
(como um corredor cortando a meta no final da
corrida «entre dois passos»).
O que é que se conclui daqui?
O matemático e filósofo Jean Le Rond
d'Alembert (1717-1783) gostava de dar aos seus
alunos este conselho: «Sigam em frente; a fé virá;
só o primeiro passo é que custa», ao que acres-
centava: «Só o último passo é que conta.» O últirn.o
passo, efectivamente, determina o comporta-
mento da partícula no momento em que nos é
possível observá-la.
Com efeito, não conseguimos observar uma
partícula senão quando ela atinge um alvo, isto
é, na ocasião em que ela dá o último passo [do
trajecto] .
A teoria de Feynman e a teoria das cordas
que tenta substitui-la desembocam finalmente
nas observações que acabo de expor. Nestas 113
duas teorias, para calcular um efeito particular
- por exemplo o momento magnético do electrão -,
calcula-se a acção. (Na teoria das cordas, a acção
é proporcional à superfície da «fita» descrita pela
corda no espaço-tempo.) Se a acção não é igual
a um número inteiro de unidades, é porque a
partícula chegou ao destino sem ter podido com-
pletar o seu último passo. A fracção depois da
vírgula mede a fase à chegada ao alvo . Para
obter resultados correctos - é a grande descoberta
de Feynman -, devem ter-se em conta todas
as trajectórias possíveis como se a partícula as
tivesse utilizado a todas, mesmo se, finalmente,
apenas contribuíram para o resultado final as
que permanecem em fase à chegada ao alvo.
Toda a física quântica está baseada nesta análise.

A escolha
Chegámos finalmente ao fim da nossa discus-
são. A escolha é clara. Foi bastante bem definida
por Roger Penrose, um dos «grandes mestres»
contemporâneos da relatividade geral. Ele escre-
veu: «A partir do momento em que tentamos
unificar a mecânica quântica e a relatividade
geral de maneira correcta - dito de outro modo,
a partir do momento em que procuramos elabo-
rar uma teoria da gravitação quântica ... »
Alto aí! Eu digo que querer pôr a relativi-
dade geral e a mecânica quântica em pé de
igualdade é um erro. Digo que uma teoria da
114 gravitação quântica - ou mais precisamente uma
teoria quântica da gravitação - não deve tentar
prolongar a relatividade geral. Como a mecânica
analítica de Lagrange e a termodinâmica de
Helmholtz, Clausius e Clapeyron, a relatividade
geral é uma bela teoria, mas tem os seus limites.
Saibamos respeitá-los. Quanto à mecânica quân-
tica, aprendamos a reformulá-la na linguagem
da mecânica do passo: ela ganhará em simpli-
cidade e em clareza, qualidades que hoje lhe
faltam um pouco.

115
Anexos

117
Glossário

Antimatéria: às partículas constituindo a matéria


à escala subatómica correspondem antipartículas de
massa idêntica mas de carga oposta. O encontro
de mna partícula com a sua antipartícula desencadeia
a aniquilação das duas parceiras na colisão.
Atracção universal: segundo Isaac Newton, todos
os corpos presentes no universo se atraem mutua-
mente na razão inversa do quadrado da distância
entre eles. A gravitação dos corpos celestes e a gravi-
dade observada sobre a Terra são duas manifestações
da atracção universal. '

Buraco negro: região do espaço-tempo no seio


da qual o campo d e gravitação se tornou tão intenso
que nem a luz consegue escapar-se dele. Menos
conhecido, o oposto do buraco negro, o buraco branco,
explode cuspindo matéria.

Campo de deslocamento: utensílio matemático


utilizado em relatividade geral para permitir a passa-
gem - o deslocamento - de um ponto para outra (pas- 119
sagem que se torna complicada, matematicamente,
pelo facto de o espaço-tempo estar provido de cur-
vatura).
Campo electromagnético: segundo James Clerk
Maxwell existe permanentemente no espaço um
campo de forças capaz de transmitir influências
eléctricas e magnéticas. Para alguns, esse campo é
uma entidade física de pleno direito. Para outros,
constitui uma representação útil, mas superficial, da
realidade (as partículas).
Corda: segundo uma concepção teórica ainda não
demonstrada, as partículas elementares assemelhar-
-se-iam mais a «cordas» de pequenas dimensões, do
que a «pontos», como geralmente se supõe. Segundo
alguns, esta teoria pressagia a física do século XXI.

Electrão: partícula elementar leve, constituinte


essencial da matéria. Os electrões formam com os
seus associados, os neutrinos, uma família de seis
membros que correspondem simetricamente à família
dos quarks, constituída também por seis membros.
Esta simetria aparente constitui um dos grandes
enigmas da física contemporânea.
Energia: em todos os fenómenos da natureza,
encontra-se uma certa quantidade, E, que perma-
nece inalterada, quaisquer que sejam as alterações
sofridas por outra via pelo sistema considerado. Esta
quantidade é a energia, conceito difícil de definir
mais precisamente, aliás como o de massa que, após
a descoberta da famosa equação E = me' , lhe está
associado.
Éter: meio hipotético imaginado por Christiaan
Huygens, que se supõe preencher o espaço. A teoria
da relatividade transferiu o papel atribuído ao éter
na transmissão das ondas electromagnéticas para o
120 próprio espaço-tempo.
Formalismo: atitude filosófica que privilegia a
descrição matemática das coisas sobre a sua expli-
cação conceptual. O formalismo desenvolvido por
Hermann Minkowski para o espaço-tempo permitiu
a rápida divulgação da nova teoria.
Fractal: os objectos vulgares, o cubo por exemplo,
têm três dimensões; uma linha tem uma. Diz-se que
um objecto é fractal se o número das suas dimensões
não é um número inteiro. Segundo o astrónomo
francês Laurent Nottale, esse poderia ser o caso
do espaço-tempo, pelo menos em certas escalas de
investigação.

Geocentrismo: teoria segundo a qual a Terra é o


centro do universo. Por contraste, o heliocentrismo
concede esse privilégio ao Sol.
Geodésica: num espaço provido de curvatura,
chamam-se geodésicas às trajectórias corresponden-
tes aos percursos mais curtos para ir de um ponto a
outro. Essas trajectórias são rectas se a curvatura do
espaço é nula.
Gluão: mediador da interacção entre os quarks.
Os próprios gluões são constituídos por quarks, mais
precisamente por um quark e um antiquark. Como
eles abundam no interior dos núcleos atómicos,
podemos dizer, ao contrário do que se esperaria,
que somos constituídos por urna boa dose de anti-
matéria.
Gravitão: partícula ainda não observada que,
segundo a mecânica quântica, seria o mediador da
força de atracção universal.

Hermetismo: corrente filosófica inspirada nas


obras atribuídas a Hermes Trirnegisto, personagem
mítico da cultura grega, suposto fundador da magia e
da alquimia. 121
Mecânica quântica: a descoberta por Planck, em
1900, do quantum de acção, h, obrigou os físicos a
rever as suas concepções da maneira corno a natureza
funciona à escala atómica e subatómica. A mecânica
quântica conseguiu progressivamente «explicar
tudo» - excepto a gravitação. O debate levantado por
este problema é evocado neste livro.
Mediador: segundo a mecânica quântica, as partí-
culas elementares trocariam continuamente entre si
partículas de um tipo particular chamadas mediado-
res de força. Os gluões são os mediadores da força
que retém os quarks no interior dos núcleos atómicos.

Positrão: parceiro do electrão no dualismo maté-


ria/ antimatéria. No quadro das concepções expostas
neste livro, o positrão é um electrão que recua no
tempo.

Quark: partícula elementar que tem a particula-


ridade de nunca ter sido observada no estado livre.
Os quarks encontram-se associados três a três no
interior dos núcleos atómicos, ou dois a dois - um
quark e um antiquark - para formar nomeadamente
os gluões.
Quiralidade: característica de um objecto sus-
ceptível de existir sob duas formas, do tipo mão
esquerda/ direita. Para acomodar a quiralidade,
o espaço-tempo deve possuir um número ímpar de
dimensões do tipo espaço.

Relatividade: termo introduzido na física para


assinalar a impossibilidade verificada de pôr em evi-
dência - por qualquer procedimento que seja - um
movimento absoluto, isto é, definido a partir de
um sistema de referência, ele próprio não submetido
122 ao movimento.
Supersimetria: conceito segun do o qual a cada
partícula elementar corresponderia uma parceira
«supersimétrica». Esta noção está na base dos esfor-
ços teóricos contemporâneos que têm em vista a for-
mulação de uma teoria quântica da gravitação.

Tensorial: em relatividade geral, diz-se de uma


equação na qual intervêm tensores, objectos matemá-
ticos com dezasseis componentes, como o constituído
pela métrica do espaço-tempo.
Teoria da relatividade: depois da invenção do
espaço-tempo, foi necessário reformular as equações
da física em geral, e as da mecânica em particular,
para as pôr de acordo com as exigências da nova teo-
ria. O conjunto desse formalismo constitui a teoria da
relatividade, chamada geral ou restrita, conforme
inclua ou exclua a noção de curvatura do
espaço-tempo.
Teoria dos grupos: diz-se que um conjunto
de operações forma um grupo se o produto de duas
dessas operações é equivalente a uma operação per-
tencente ao conjunto considerado. A teoria fundada
sobre esta definição, devida inicialmente a Lagrange
e Galois, tornou-se um utensílio capital da física
matemática.

123
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de Agosto de 1887, citada em R. S. Shankland, Ameri-
can, Journal of Physics, n.º 32, 1964, p. 32.
P. 30: POINCARÉ, H., Électricité et Optique, 1901, reimpressão
Gabay, 1990, p. 536.
P . 39: POINCARÉ, H., La Science et l'Hypothese, 1902, Flamma-
rion, coll. «Champs», 1968, p. 182.
P. 35 e 36: EINSTEIN, A., e MARIC, M., Lettres d'anwur et de
science, trad. Élizabeth Kauffmann, Le Seuil, Paris, 1993,
p. 70-117.
P. 37: EINSTEIN, A., Lettres à Maurice Solovine, Gauthiers-
-Villars, 1956, p. Vill.
P. 39: POINCARÉ, H., La Science et l'Hypothese, op. cit., p. 111.
P. 39: Ibid., p. 112.
P. 39: Ibid., p. 112.
P. 39: Ibid., p. 180.
P. 39 e 40: Ibid., p. 180.
P. 39: Ibid., p. 98.
P. 40: EINSTEIN, A., Correspondance avec Michele Bessa
(1903-1955), trad. Pierre Speziali, Hermann, coll.
«Savoir», 1979, p. 3.
P. 40: Ibid., p. 272.
P. 41: EINSTEIN, A., Discours prononcé à l'Académie des sciences
de Berlin, 1921, trad. Maurice Solovine, Gauthiers-
-Villars, 1953, reimpressão Gabay, 1994, p . 17.
P. 42: POINCARÉ, H., La Valeur de la science, 1905, Flam-
marion, coll. «Champs», 1970, p. 127.
P. 42: POINCARÉ, H., La Science et lHypothese, op. cit., p . 129.
P. 43: POINCARÉ, H., Sur la dynamique de l'électron, nota e
comunicação, reimpressão sob o título La Mécanique
nouvelle, Gabay, 1989, p. 77.
P. 43: Ibid., p. 78.
P. 43: Ibid., p. 78.
P. 45: Ibid., p. 78.
P . 46: GALOIS, E., CEuvres mathématiques, 1846, Gabay, 1989,
p. 408.
P. 47: Ibid., p. 419.
P. 51: POINCARÉ, H., Sur la dynamique de l'électron, op. cit., p. 67.
P. 52: HoFFINANN, B., Histoire d'une grande idée, la relativité,
128 Belin, 1985, p. 141.
P. 53: EINSTEIN, A., Carrespandance avec Michele Bessa
(1903-1955), ap. cit., p. 231.
P. 61: EINSTEIN, A., Sur l'électradynamique des carps en mau-
ventent, 1905, trad. Maurice Solovine, Gauthier-Villars,
1925, reimpressão Gabay, 1989.
P. 65: EINSTEIN, A., Sur l'électrodynamique des carps, en mau-
vement, ap. cit., p. 3.
P. 65: EINSTEIN, A., et INFELD, L., L'Évalutian des idées en
physique, 1936, Flammarion, coll. e Champs», 1983,
p . 143.
P. 66 e 67: POINCARÉ, H., Sur la dynamique de l'électran, p. 80.
P. 66 e 67: Ibid., p. 80.
P. 66 e 67: Ibid., p. 80.
P. 68: SEELIG, C., Albert Einstein, Europa, 1952, p. 163.
P. 70: EINSTEIN, A., Annalen der Physik, n.0 35, 1911, citado em
P. Frank, Einstein, Flammarion, coll. «Champs», 1991,
p . 159.
P. 71: BEIL, E. T., Les Grands Mathématiciens, Payot, 1939,
p. 560.
P. 71: EINSTEIN, A., CEuvres chaisies, Le Seuil/ CNRS,
1989-1993, citado em F. Balibar, Einstein : la jaie de la
pensée, Gallimard, 1993, p. 59.
P . 73: EINSTEIN, A., Carrespandance avec Michele Bessa
(1903-1955), ap. cit., p. 305.
P. 77: EDDINGTON, A., citado em P. Frank, Einstein, Flam-
marion, coll. «Champs», 1991, p. 215.
P. 78 e 79: THOMSON, sir J.J., citado em P. Frank, Einstein,
Flammarion, coll. «Champs», 1991, p. 218.
P. 79: BALIBAR, F., Einstein : la jaie de la pensée, ap. cit., p. 74.

Segunda Parte
P. 88: EINSTEIN, A., Carrespandance avec Michele Bessa
(1903-1955), ap. cit., p. 162.
P. 89 e 90: EDDINGTON, A., Espace-Temps et Gravitatian, Her-
mann, 1921.
P. 89 e 90: EINSTEIN, A., e lNFELD, L., L'Evalutian des ídées en
physique, ap. cit., p. 142.
P. 91: FEYNMAN, R., QED. The Strange Theary af Líght and
Matter, Princeton University Press, 1985, p. 151. 129
P. 92: EINSTEIN, A., Quatre Conférences sur la théorie de la rela-
tivité faites à l'université de Princeton, 1921, Gauthier-Vil-
lars, 1925, reimpressão Gabay, 1994, p. 72.
P. 94: SALAM, A., em Superstrings. A Theory of Everything?,
op. cit., p. 175.
P. 100: WITIEN, E., em Superstrings. A Theory of Everything?,
ed. P.C.W. Davies et J. Brown, Cambridge University
Press, 1988, p. 102.
P. 101: GLASHOW, S., em Superstrings. A Theory of Every-
thing?, op. cit., p. 191.
P. 103: SERRES, M., Éclaircissements, François Bourin, 1992,
p . 90.
P. 104: BuRKE, J., Connections, Little, Brown, 1978, p. 39.
P. 107: FEYNMAN, R., QED. The Strange Theory of Light and
M.atter, Princeton University Press, 1985, p. 7.
P. 111: MAUPERTUIS, P.-L. M. de, Mémoire lu à lAcadémie royale
es sciences de Paris, 1714, reproduzido em É . Callot,
Maupertuis, Ie savant et le philosophe, Marcel Riviere,
1964, p. 64.
P. 113: ALEMBERT, J. Le Rond d', citado em E.T. Bell, Les
Grands M.athématiciens, op. cit., p. 13.
P. 114: PENROSE, R., L'Esprit, I'Ordinateur et les Lois de la
physique, InterÊditions, 1992, p. 378.

130
Índice remissivo

(As páginas em itálico remetem para ilustrações)

antielectrão, 105, 107 Einstein (Albert), 10, 34, 35,


antimatéria, 50, 105, 107, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 52,
109, 119, 122 53, 59, 60, 61, 62, 65, 67,
antipartícula, 107, 109, 119 68, 69, 70, 71, 75, 76, 77,
antifotão, 106 79, 85, 87, 88, 89, 90, 91,
atracção universal, 21, 67, 92, 100, 105, 126
119, 121 electrão, 87, 104, 105, 106,
107,108,114,120,122
big bang, 93 energia, 25, 70, 75, 76, 91,
big crunch, 93, 94 93,106, 120
buraco negro, 100, 119 espaço, 9, 10, 15, 20, 21, 22,
campo electromagnético, 23, 25, 26, 29, 39, 40, 41,
44,45,120 44, 45, 48, 51, 54, 56, 62,
cone de luz, 56 65, 66, 69, 71, 74, 80, 83,
cordas (teoria das), 98, 99, 87, 88, 92, 95, 102, 105,
100, 101, 113, 114 108,111,112,113,114,
corpos,17,19,20,22,25,30, 120,121,122
31,37,40,42,66,68,119 espaço-tempo, 10, 11, 15,
23,24,33,43,48,49,50,
dimensão,30,83,85,86,88, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 59,
102,103 60, 62, 65, 67, 72, 73, 74, 131
75, 76, 79, 80, 83, 84, 85, luz, 11, 23, 24, 25, 26, 27, 45,
86, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 46, 51, 56, 60, 64, 65, 67,
93, 94, 95, 97, 99, 100, 106, 69, 70, 79
107, 108, 109, 119, 120,
121, 122,123 massa,64,68,72, 119, 120
espaço-tempo fractal, 101 matéria, 24, 36, 50, 66, 68,
é ter,24,26,28,29,36,40, 74,75,76,90,93, 105, 110,
65,120 111, 119, 120, 122
mecânica do passo, 109,
fase, 78, 109, 110, 111, 113, 110,111,112,113,115
114 mecânica quântica, 87, 90,
física, 10, 11, 12, 19, 23, 26, 114, 115, 121, 122
37,42,45,64,65,67,68, mediador, 67, 90, 91, 108,
79, 83, 84, 86, 87, 90, 91, 110,121,122
92,93,94,99,101,102, métrica, 53, 54, 56, 75, 76,
103, 104, 105, 109, 111, 83, 85, 86, 99, 123
112,113,114,120,122, movimento, 9, 15, 16, 18, 19,
123,126 20,21,22,23,24,26,27,
formalismo, 52, 53, 54, 62, 28, 29, 30, 37, 39, 42, 44,
77, 89, 121, 123 45, 61, 62, 63, 64, 65, 67,
fotão, 106, 107, 108 75,92,110,111,113,122
movimento partilhado, 15,
geodésicas, 74, 92, 100, 121
17, 19, 42, 68
geometria,53,54,56,74,76,
101 núrnero,22,49,50,51,62,
g luão, 121
66, 83, 87, 89, 95, 102, 108,
gravitação, 64, 66, 67, 68,
109,112,114,121,122
70, 72, 73, 74, 75, 79, 85,
86, 90, 91, 92, 94, 98, 100,
ondas,24,25,65,87,120
101,114,115,119,122,123
gravitão, 91, 100, 101, 111,
partículas elementares, 84,
121
87,92, 97,99,100,120,122
grupos (teoria dos), 46, 47, Poincaré (Henri), 15, 30, 33,
123, 125
38,39,40,41, 42,43,44,
interacção, 87, 121 45, 46, 47, 48, 50, 51, 52,
53, 56, 59, 60, 61, 62, 64,
jogos, 84, 97 66, 67, 68, 71, 76, 77, 102
positrão,104,105,107,122
lugar, 11, 16, 20, 28, 29, 38, prinçípio de equivalência,
132 71,76,79,88,91,98 66, 71, 92
QED, 107, 108 tempo, 9, 10, 15, 20, 21, 22,
quark, 11, 97, 98, 99, 120, 23, 27, 29, 30, 37, 38, 39,
121, 122 44, 45, 48, 51, 52, 56, 62,
quiralidade,87,88, 122 63, 95,103,104,105
teorema de Pitágoras, 54,
relatividade, 40, 53, 54, 62, 55,61,63
63,73,75,77,85, 89,90, torção, 88, 89
91,92,93,94,100,101,
transformação, 44, 45, 47,
114,115,119,122, 123
49,52,56,57,60,62,67
relatividade (princípio da),
17, 42, 44, 50, 61, 67, 68
relatividade (teoria da), 43, Universo, 9, 18, 82, 85, 93,
54,62,74,86,120,123 99, 119, 121
relógio, 61, 62, 63
velocidade da luz, 25, 26,
substituição, 29, 42, 47 27, 51, 64, 67
supersimetria, 11, 99, 100, velocidades (adição de),
123 64

133
Índice

Prefácio...................................................................... 9

Uma exposição para compreender

O JOGO DA CIÊNCIA...................... ...................... 13


O movimento partilhado.................................... 15
Poincaré inventa o espaço-tempo...... ................ 33
Dinâmica no espaço-tempo ................................ 59

Um ensaio para refiectir

O JOGO DAS IDEIAS.............................................. 81


O espaço-tempo e o Universo .......................... 85
Espaço-tempo e partículas elementares . .. .. . . .. . . 97

Anexos ....................................................................... 117 135

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