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METODOLÓGICAS PARA A
EDUCAÇÃO DE SURDOS
ELIZIANE MANOSSO STREIECHEN
Caros alunos,
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Boa leitura!
Sumário
APRESENTAÇÃO
PALAVRAS FINAIS
REFERÊNCIAS
APRESENTAÇÃO
Este material, composto por seis capítulos, tem como objetivo
discutir o processo de ensino e aprendizagem de alunos surdos, de
modo a apresentar propostas didático-pedagógicas apropriadas ao
trabalho, em salas de aula, com esse público. Esse e-book foi elabo-
rado para a disciplina “Didática e Educação de Surdos”, que faz parte
da grade curricular do Curso de Especialização em Língua Brasilei-
ra de Sinais (Libras), na modalidade de Educação a Distância (EaD),
da Universidade Estadual do Centro-Oeste – Unicentro/Universidade
Aberta do Brasil (UAB).
5
No capítulo III, descreve-se o marco inicial da educação de sur-
dos no Brasil, com ênfase nas principais legislações que asseguram
os direitos educacionais deles no espaço escolar.
6
CAPÍTULO I - RESGATE HISTÓRICO DA
VIDA E DA EDUCAÇÃO DE SURDOS
Os relatos históricos sobre os surdos são bastante antigos. A Bí-
blia (2000), por exemplo, traz várias passagens com referências aos
surdos. “Porém o Senhor lhe disse: quem dá a boca ao ser humano?
Quem faz com que ele seja surdo ou mudo? Quem lhe dá a vista
ou faz com que fique cego? Sou eu, Deus, o Senhor.” (Êxodo, 4.11,
p. 42, grifo nosso); “Não amaldiçoe um surdo, nem ponha na frente
de um cego alguma coisa que o faça tropeçar [...]” (Levítico, 19.14, p.
84, grifo nosso); “Então os cegos verão e os surdos ouvirão” (Isaias,
35.5, p. 488, grifo nosso). Essas são apenas algumas passagens que
fazem menção aos surdos, mas há ainda muitas outras, tanto no
Antigo, quanto no Novo Testamento. A partir disso, afirma-se que os
surdos sempre existiram e, assim como eles, a língua de sinais, tam-
bém, embora nem um nem outro tenha recebido a devida conside-
ração e respeito que hoje têm e que a comunidade surda procura,
incansavelmente, ampliar ainda mais.
7
Em alguns países, como na Grécia, em que se venerava o intelec-
to, a inteligência e em Roma, em que se vislumbrava a beleza física
e a perfeição, as pessoas com deficiências eram vistas como aber-
rações, demonizadas, como uma espécie de maldição divina, que
não poderiam conviver com as pessoas ditas normais, portanto, elas
eram submetidas a castigos físicos, segregação, tortura e à morte.
8
Diferentemente de outros países, no Egito e na Pérsia, os sur-
dos eram venerados e adorados, pois acreditava-se que eram en-
viados dos deuses e levavam as preces a eles, que seriam atendidos
(STREIECHEN, 2017). Contudo, os surdos não podiam usufruir de di-
reitos, tais como a educação e tinham uma vida totalmente inativa.
(GOLDFELD, 1997).
9
famílias ricas eram educados. Os demais serviam de mão de obra
escrava ou perambulavam pelas ruas como mendigos, indigentes,
totalmente abandonados.
10
Thomas Praidwood abre a primeira escola para surdos, que ensina-
va aos surdos os significados das palavras e sua pronúncia de forma
a valorizar a leitura orofacial. (GOLDFELD, 1997).
11
O segundo evento ocorreu em Lyon, em 1879, que segundo
Moura (2000, p. 45):
12
CAPÍTULO II - O CONGRESSO DE MILÃO
Insatisfeitos por uma minoria (surdos) utilizar-se de uma língua (de
sinais) em que a maioria (ouvintes) não compreendia, em 1880, cerca
de vinte e sete países se reuniram em Milão, Itália, a fim de decidirem
o rumo da educação de surdos. Assim, no evento intitulado Congresso
Internacional de Educação de Surdos, realizado entre os dias 6 a 11 de
setembro de 1880, discutiram-se as seguintes resoluções:
13
na conversação com pessoas falantes, já que a fala e a leitura
labial se desenvolvem com a prática;
g) Considerando a idade do aluno e a experiência de professores,
declara-se que a idade mais favorável para admitir uma criança
surda na escola é entre os 8-10 anos, sendo que a criança deve
permanecer na escola um mínimo de 7-8 anos; nenhum edu-
cador de surdos deve ter mais de 10 alunos em simultâneo;
h) Com o objetivo de se implementar, com urgência, o método
oralista, há que reunir as crianças surdas recém-admitidas nas
escolas e instrui-las por meio da fala; essas mesmas crianças
deveriam estar separadas das crianças mais avançadas, que já
haviam recebido educação gestual, a fim de que não fossem
prejudicadas em seu aprendizado; os alunos antigos também
deveriam ser ensinados segundo o novo sistema oral.
Foram, portanto, discutidas e votadas oito resoluções, em que a
principal finalidade de todas elas era a de extinguir completamente
a língua de sinais para impor-se a metodologia oralista. Os principais
educadores de surdos, antes desse Congresso, eram surdos. Com a
metodologia oralista, esses professores não correspondiam aos ob-
jetivos, cujo alvo era o desenvolvimento da fala. Dessa forma, esses
profissionais surdos foram afastados de suas funções e substituídos
por professores ouvintes dentro das instituições de ensino (SCHELP,
2008). Assim, começou uma batalha árdua e sofrida do povo surdo
que perdurou por mais de um século (GOLDFELD, 1977; STROBEL,
2009; STREIECHEN, 2017).
14
Figura 1- Representação da expulsão dos professores surdos
das instituições
15
muitas gerações, o povo americano se lembrará com muita dor e so-
frimento do atentado terrorista que matou quase três mil pessoas. Da
mesma forma, passarão inúmeras gerações que o povo surdo não se
esquecerá do evento de Milão, visto que as consequências não foram
apenas o fracasso escolar, a evasão e um século sem comunicação
das pessoas surdas submetidas à metodologia oralista, mas principal-
mente o atraso que as decisões do Congresso provocaram na edu-
cação de surdos até os dias atuais. Se não tivesse ocorrido tal evento,
muito provavelmente hoje haveria uma sociedade bilíngue, comuni-
cando-se por meio da língua oral e da língua de sinais – um sonho
que aquece os movimentos da comunidade surda, atualmente.
16
CAPÍTULO III - A EDUCAÇÃO DE SURDOS
NO BRASIL E AS PRINCIPAIS LEGISLAÇÕES
No Brasil, a educação de surdos começou a ser pensada no ano
de 1855, com a vinda de um professor surdo francês, Hernest Huet,
trazido pelo Imperador D. Pedro II. Em 1857, Huet fundou, no Rio de
Janeiro, o Imperial Instituto de Surdos Mudos, conhecido atualmente
como Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), uma das prin-
cipais referências de escolas bilíngues para surdos.
17
Art. 3º A Libras deve ser inserida como disciplina curricular
obrigatória nos cursos de formação de professores para
o exercício do magistério, em nível médio e superior e
nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino,
públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos
sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios. (BRASIL, 2005, p. 1)
18
O referido Decreto assegura o direito do aluno surdo ser avaliado
de acordo com a sua língua 1 (L1), e não apenas por meio da Língua
Portuguesa (LP), considerada a língua 2 (L2) dos surdos, conforme
segue:
19
Decreto n. 5.626/2005
Lei n. 12.319
20
CAPÍTULO IV - ABORDAGENS
METODOLÓGICAS PARA A EDUCAÇÃO DE
SURDOS
Ao final da Idade Média e início da Idade Moderna, mais es-
pecificamente na Europa, a educação de surdos era uma função
atribuída aos próprios surdos, que se tornavam professores e cria-
vam diferentes técnicas de ensino para os surdos das famílias ricas.
Laurent Clerc, Hernest Huet são alguns exemplos de educadores de
surdos da França, mas existiram muitos outros.
21
4.1 Metodologia oralista
O principal objetivo da metodologia oralista vincula-se à rea-
bilitação da fala. Essa concepção enquadra-se no modelo clínico
terapêutico (GOLDFELD, 2002) que vê o surdo apenas como uma
orelha que não funciona, conforme descrito pela autora:
22
A partir da concepção clínica da surdez, as escolas transforma-
ram-se em salas de tratamento, que exigiam estratégias pedagógi-
cas terapêuticas (KALATAI, STREIECHEN, 2012), com a finalidade de
tornar o surdo um sujeito normal para ser integrado na comunidade
ouvinte. Segundo Moura (2000, p. 55), na metodologia oralista, “[...] o
surdo não é visto dentro das suas possibilidades e da diferença, mas
no que lhe falta e que deve ser corrigido de qualquer forma para
que ele possa se integrar e ser ‘normal’”.
23
Figura 2 – Técnicas oralistas Figura 3 – Exercício orafacial
Fonte: Timetoast.
24
Ao empregar a metodologia oralista nas escolas, os professo-
res obedeciam a um importante requisito: proibir o uso da língua
de sinais. Como a comunicação por meio da língua de sinais é algo
natural e espontâneo, os surdos não conseguiam deixar de levantar
as mãos cada vez que precisavam se comunicar. Dessa forma, algu-
mas medidas foram tomadas, tais como: amarrar as mãos dos sur-
dos para trás; sentar-se em cima das mãos; enfiar as mãos nos cír-
culos de uma caixinha de madeira e colocar argolas nas mãos para
que os surdos não conseguissem remover as mãos para sinalizar. Na
escola, caso o surdo sentisse sede, enquanto ele não pronunciasse a
palavra água, ele não tomava água. Se ele quisesse um brinquedo,
primeiro tinha que falar o nome do brinquedo, o que, normalmente,
não ocorria. Portanto ele não ganhava o brinquedo. As palmatórias
eram constates, pois havia uma crença, por parte dos educadores,
de que os surdos não falavam porque eram preguiçosos.
25
Como consequência das práticas oralistas, os surdos não apren-
deram a falar e, consequentemente, nem a ler e escrever. O máximo
que eles conseguiam era pronunciar palavras aleatórias, de forma
mecânica, sem saber o que elas realmente significavam. O oralismo
culminou em milhões de surdos analfabetos, com profundos trau-
mas e danos irreparáveis na vida. (STREIECHEN, 2017).
Oralismo
26
promissor para que o filho surdo chegasse o mais próximo da nor-
malidade e se, integrasse na sociedade. Nos séculos passados, aqui-
lo que era pregado nas escolas, normalmente, tornava-se lei dentro
das famílias. Assim, família e escola eram muito bem articuladas e,
com as parcerias, lutavam de todas as formas para que os surdos
tivessem sucesso no desenvolvimento da oralidade.
27
analfabetos. Nesse contexto, os educadores pesquisam outras formas
de adaptar o método oralista por meio de uma justaposição com ou-
tras técnicas, tais como o uso de mímicas, gestos e a própria língua
de sinais ou quaisquer recursos que contribuíssem para a comunica-
ção dos surdos. Esse modelo é conhecido como comunicação total.
Entretanto, o objetivo da comunicação total não era o de substituir o
método oralista, muito pelo contrário, ela surge com a finalidade de
complementar as estratégias oralistas em prol do desenvolvimento
da fala. “[...] essa filosofia também se preocupa com a aprendizagem
da língua oral pela criança surda.” (GOLDFELD, 1997, p. 35).
28
De acordo com Cotovicz; Streiechen; Antoszcyszen:
29
4.3 Metodologia Bilíngue
Para ser considerada como bilíngue, a pessoa precisa saber co-
municar-se por meio de dois códigos linguísticos. Assim, surge a se-
guinte questão: como é afirmar que os surdos são sujeitos bilíngues
quando a maioria deles não domina a linguagem oral, mas apenas a
língua de sinais? Para entender o conceito de bilinguismo que confi-
gura as pessoas surdas, mesmo que elas não dominem a da língua
oral, há que compreender o que significa ser bilíngue na visão dos
principais autores que estudam a questão. Para tanto, com respaldo
nos estudos efetuados por Streiechen (2014), traz-se o conceito de
bilíngue ou de bilinguismo, na perspectiva de alguns autores.
30
Para esse autor, existem graus de bilinguismo individual: em um ex-
tremo, estão os bilíngues equilibrados, fluentes nas duas línguas; no
outro extremo, os bilíngues precários, que sabem falar algumas pa-
lavras e expressões suficientes para se fazer entender; os semibilín-
gues que compreendem (ou que leem) uma segunda língua, mas
que não conseguem falá-la e existem muitos outros tipos entre os
extremos (MCCLEARY, 2009 apud STREIECHEN, 2014, p. 49).
31
[...] um surdo que escreve em português dá prova de
seu bilinguismo, que se manifesta de diferentes modos:
- pode apresentar-se como transcrição de uma frase
do português em sinais, de acordo com a sintaxe do
português; - pode apresentar-se como uma transliteração
(datilologia) representada pelas mãos e, nesse caso, o
nível fonético/fonológico da Libras se torna inútil. (BRASIL,
2014, p. 12).
32
A mesma autora, ao defender a metodologia bilíngue, destaca
que os surdos adquirem conhecimentos por meio do canal visual e
a mistura entre línguas, utilizadas na comunicação total, dificultava
a aquisição de conhecimentos pelos surdos, pois cada língua tem
características próprias e independentes, tornando-se assim impos-
sível falar ambas as línguas (sinalizada e oral), ao mesmo tempo, no
âmbito escolar. (LACERDA, 1998).
33
modalidade escrita. Se acaso fosse cobro que a segunda língua é a
Língua Portuguesa oral, retrocede-se e se cai nas armadilhas do ora-
lismo novamente.
34
o aprendizado de uma língua visual-sinalizada desde
tenra idade, possibilitando ao surdo o preenchimento
das funções linguísticas que a língua oral não preenche.
Assim, as línguas de sinais são tanto o objetivo quanto
o facilitador do aprendizado em geral, assim como do
aprendizado da língua oral.
35
É no encontro entre os pares surdos que a cultura se ramifi-
ca, a identidade se constrói e se fortalece. De acordo com Kalatai e
Streiechen (2012, p. 11)
36
A Pedagogia Surda requer, portanto, a presença dos professores
surdos nas escolas, sejam elas regulares ou bilíngues. Entretanto, na
visão de Kalatai e Streiechen (2012, p. 12):
37
CAPÍTULO V - PRINCIPAIS DIFERENÇAS
ENTRE A ESCOLA INCLUSIVA, ESPECIAL E
BILÍNGUE
No decorrer do tempo, a educação de surdos ocorreu em di-
ferentes espaços e, alguns deles, nem sempre levava em conta a
cultura linguística, o modo peculiar de adquirir os conhecimentos e,
principalmente, de escrever, do aluno. Nesse panorama, aponta-se
as três principais escolas, frequentadas pelos surdos.
38
No que diz respeito à perspectiva dos professores, a pesquisa-
dora faz uma denúncia ao afirmar que, com o advento da inclusão
(UNESCO, 1994) surgiu um refrão permanente que circula nos espa-
ços escolares: “[...] não fui preparado(a) para trabalhar com esse tipo
de aluno.” (STREIECHEN, 2018, p. 28). Com esse discurso, os profissio-
nais, por um lado, denunciam a falta de instrumentalização duran-
te a formação universitária e, por outro, é a principal estratégia de
alguns professores para se isentarem do compromisso de educar a
todos (STREIECHEN, 2018). A autora sublinha também que:
39
Percebe-se, assim, que a inclusão escolar é pensada de for-
ma equivocada e as ações inclusivas desfaz-se nos discursos que
querem justificar a falta de empatia nesse processo que pode du-
rar muito tempo, enquanto da escola o aluno participar. A autora
enfatiza ainda que:
40
Para se efetivar a inclusão escolar, acreditou-se, então,
que bastava permitir que todos tivessem acesso à sala
de aula. Entretanto, entrar no ambiente escolar, sentar-se
numa carteira, copiar do quadro ou do colega ao lado,
participar do lanche servido no recreio, nada tem a ver
com inclusão. Essas ações nunca foram, não são e não
devem jamais se tornar objetivo maior da educação.
41
Para o ingresso dos alunos surdos nas escolas comuns, a
educação bilíngue – Língua Portuguesa/Libras desenvolve
o ensino escolar na Língua Portuguesa e na língua de sinais,
o ensino da Língua Portuguesa como segunda língua
na modalidade escrita para alunos surdos, os serviços
de tradutor/intérprete de Libras e Língua Portuguesa e
o ensino da Libras para os demais alunos da escola. O
atendimento educacional especializado para esses alunos
é ofertado tanto na modalidade oral e escrita quanto na
língua de sinais. Devido à diferença linguística, orienta-se
que o aluno surdo esteja com outros surdos em turmas
comuns na escola regular (BRASIL, 2008, p. 17).
42
no. Muitos surdos, principalmente aqueles que residem nas zonas
rurais ou no interior dos municípios, ingressam na escola sem saber
a LS. Assim, de nada adiantará a presença do profissional tradutor e
intérprete de Libras para esse aluno. (STREIECHEN, 2017).
43
Nessa sala de aula - representada na figura 7 - que se diz inclusi-
va, há uma professora explicando o conteúdo via oralidade. Há, entre
ela e os alunos ouvintes, sentados mais próximos da docente, uma
conexão entre as ideias pois os ouvintes entendem e demonstram
a mesma admiração da professora. Isso está representado por meio
dos pontos de exclamação nos balões. Diferentemente dos alunos
ouvintes, na mente do surdo, há vários pontos de interrogação, o que
subentende que ele não entende nada do que está sendo explica-
do ali. Apesar disso, esse aluno deve permanecer nessa sala de aula
durante quatro horas diárias, vinte horas semanais, duzentos dias do
ano, em que há um professor que não “[...] se sente preparado para
lidar com ele.” (STREIECHEN, 2018, p. 28), para que sua presença seja
registrada no livro de chamada e não haja a reprovação por faltas.
44
Figura 8 - Sala de Recursos Multifuncionais - Surdez
45
realmente esse aluno consegue desenvolver-se linguística e cogniti-
vamente? Na sala em que ele apenas copia ou na SRM? E em qual
das salas ele passa a maior parte do tempo? Há um grande equí-
voco e uma incongruência desmedida nessa imposição do sistema
educacional que deixa uma criança passar um tempo precioso da
vida sem entender nada do que é dito ou explicado em um am-
biente que se diz inclusivo. Para Nóvoa (2007): “[...] a pior forma de
exclusão é deixar a criança sair da escola sem ter adquirido nenhu-
ma aprendizagem, nenhum conhecimento, sem as ferramentas mí-
nimas para se integrar e participar ativamente das sociedades do
conhecimento.” (p. 12).
46
5.2 Escola especial
Há uma década, as escolas especiais eram as principais institui-
ções responsáveis pela educação de surdos. Havia uma concepção
assistencialista vigorando nesses espaços. As técnicas eram voltadas
muito mais para a recuperação do surdo em direção à normalidade,
com estratégias oralistas, do que propriamente o trabalho acadêmi-
co, por meio da língua de sinais. Dessa forma, o tempo do surdo, nes-
sas instituições, era dividido na realização de exames audiômetros,
atendimentos com profissionais da fonoaudiologia, terapeutas ocu-
pacionais, otorrinolaringologistas, assistentes sociais, psicólogos entre
outros profissionais da saúde. Assim, o tempo para trabalhar com o
conhecimento e com a língua de sinais tornava-se bastante restrito.
47
Um pouco mais adiante, o documento elenca os motivos pelos
quais os surdos não devem ser considerados público alvo da educa-
ção especial.
48
desenvolvimento da identidade e fortalecimento da cultura, o que
se dá no encontro com seus pares surdos. É por isso que as escolas
especiais estão sendo substituídas por escolas bilíngues, que será
descrita na sequência desse texto.
49
Libras, integra as línguas envolvidas em seu currículo e
não faz parte do atendimento educacional especializado.
O objetivo é garantir a aquisição e a aprendizagem das
línguas envolvidas como condição necessária à educação
do surdo, construindo sua identidade linguística e cultural
em Libras e concluir a educação básica em situação
de igualdade com as crianças ouvintes e falantes do
português. Neste documento, a Educação Bilíngue Libras
- Português é entendida, como a escolarização que
respeita a condição da pessoa surda e sua experiência
visual como constituidora de cultura singular, sem,
contudo, desconsiderar a necessária aprendizagem
escolar do português. Demanda o desenho de uma
política linguística que defina a participação das duas
línguas na escola em todo o processo de escolarização
de forma a conferir legitimidade e prestígio da Libras
como língua curricular e constituidora da pessoa surda.
(BRASIL, 2014, p. 6).
50
Garantir a educação bilíngue de surdos em classes
bilíngues em escolas inclusivas (que não são escolas
bilíngues de surdos) de ensino comum em municípios
que baixa demanda de surdos, quando não houver escolas
polos multimunicipais na região. (BRASIL, 2014, p. 20).
51
O Relatório elenca metas que dizem respeito à operacionaliza-
ção na implantação da educação bilíngue. Há metas gerais e metas
referentes às línguas na educação bilíngue.
Quadro 1 - Metas para propostas de educação bilíngue
52
continuação...
13) Incluir como item de avaliação dos cursos de nível superior as condi-
ções de acessibilidade dos surdos no espaço universitário: presença de
tradutor e intérprete de Libras e Língua Portuguesa e disponibilização de
materiais, referências bibliográficas e tecnologias, acessíveis em Libras;
continua...
53
conclusão.
14) Inserir nos cadastros do INEP e nos formulários do Censo Escolar, a op-
ção de matrícula em escolas bilíngues de surdos em tempo integral, sejam
escolas bilíngues específicas (com creches, educação infantil, educação fun-
damental, ensino médio, educação de jovens e adultos e ensino profissiona-
lizante), escolas-polo, ou escolas multimunicipais, para que estas tenham as
mesmas condições de receber recursos, como as escolas indígenas;
18) Formar uma rede entre as escolas bilíngues de surdos em tempo inte-
gral por meio de plataforma nacional para suporte pedagógico entre as
escolas, interação entre gestores, professores e alunos surdos, e constitui-
ção de bancos de dados;
54
Seguem, agora, as dezenove metas referentes às línguas na edu-
cação bilíngue:
Quadro 2: Metas referentes às línguas na educação bilíngue
55
continuação...
10) Garantir que a Libras seja a língua de instrução dos estudantes surdos,
por meio de professores bilíngues fluentes na Libras, prioritariamente surdos;
56
conclusão.
19) Criar uma base de dados textual que forneça corpora reais para o co-
nhecimento de português como segunda língua, em textos, efetivamente,
produzidos, por sinalizantes de Libras. Esse material servirá para análise
linguística criteriosa e minuciosa de fatos de língua e de linguagem. Dessa
forma, diminui-se o impressionismo acerca do português L2 de surdos e
cria-se a Gramática Contrastiva Padrão do Português Escrito por Surdos.
57
b) A criança surda só inicia o aprendizado de uma língua escri-
ta após dominar a primeira língua ou língua 1 (L1), a Libras, no
caso das crianças brasileiras;
c) O aluno surdo não está necessariamente alfabetizado se ape-
nas copiar do quadro ou dos colegas e não associar o que es-
creve com o seu significado. A simples cópia e a reprodução de
palavras ou textos não garantem o conhecimento;
d) A presença do profissional tradutor e intérprete de língua de
sinais, em salas de aula comum, é fundamental para que o alu-
no surdo tenha acesso efetivo a todos os conteúdos, desde que
ele tenha domínio de tal língua;
e) O professor deve dirigir-se sempre ao surdo e não ao intérpre-
te ao explicar os conteúdos ou responder às dúvidas do aluno,
para que dessa forma crie-se o vínculo professor-aluno;
f) O surdo é aluno do professor e não do intérprete, portanto a
responsabilidade da aquisição do conteúdo é do professor;
g) As aulas devem ser enriquecidas com recursos visuais, uma vez
que o canal de aprendizagem do surdo é exclusivamente visual;
58
h) A avaliação de textos escritos pelos surdos considera a inferên-
cia de aspectos estruturais da língua de sinais e o surdo não é
avaliado por meio dos mesmos critérios utilizados com o aluno
ouvinte;
i) Incluir a filosofia bilíngue no Projeto Político Pedagógico da
escola, com a finalidade de criar ambientes de fato bilíngues,
para que toda a comunidade escolar se comunique por meio
da LS, em todos os espaços da escola;
j) Contratar professores surdos para atuarem na estimulação da
linguagem e no trabalho acadêmico com o aluno surdo.
Esses fatores servem como um norte para a criação de escolas
bilíngues e/ou classes bilíngues, ambientes em que, de fato, a educa-
ção bilíngue seja ofertada e a escolarização de surdos seja efetivamen-
te alcançada. Para isso, a realidade e o contexto de cada região brasi-
leira, na qual os surdos estão inseridos, precisam ser considerados.
59
CAPÍTULO VI - COMO O ALUNO SURDO
APRENDE?
Para que o ensino e a aprendizagem do aluno surdo se tornem
menos desafiadores e sejam efetivados, é preciso, primeiramente,
que o educador identifique e (re)conheça as singularidades de cada
aluno surdo, como, por exemplo: o histórico da surdez - se nasceu
surdo; se adquiriu a surdez após o nascimento; o grau de perda au-
ditiva (leve, moderada, severa, profunda), entre outros aspectos que
implicam no processo de ensino e aprendizagem. Antes de iniciar a
escolarização do aluno surdo, é preciso também realizar uma ava-
liação do seu nível linguístico. Se a criança for filha de pais ouvin-
tes, é bastante comum que ingresse na escola sem saber a LS. De
acordo com Quadros e Schmiedt (2006): “[...] a escola deve buscar
alternativas para garantir à criança acesso aos conhecimentos es-
colares na língua de sinais e o ensino da língua portuguesa como
segunda língua.” (p. 10).
60
O método silábico, embora questionado por alguns pensadores,
ainda é bastante utilizado na alfabetização com crianças ouvintes.
Esse método não traz resultados positivos com alunos surdos, visto
que depende dos sons (fonemas) das sílabas para formar as pala-
vras. Como o surdo não ouve, os fonemas, as sílabas e sua junção
não lhes trazem nenhum sentido e, portanto, a aprendizagem não
acontece. O máximo que o aluno surdo consegue desenvolver, por
meio desse método é a habilidade de escrever, tornando-se um co-
pista, porém, sem aprender a ler e a interpretar de fato.
61
[...] para uma pessoa ouvinte ocorre mentalmente a
‘visualização’ da palavra escrita e sua associação com o
som que as sílabas isoladas e agora reunidas representam.
Ao reler a palavra, imagina-se o som e seu significado.
Se a pessoa entrar em contato com a palavra em outra
ocasião, lendo-a novamente, ela fará a decodificação pela
rápida e sequencial montagem silábica, mentalizará o
som em seu inconsciente e associará a palavra ao que o
‘som mental’ quer dizer.
Com o aluno surdo isso não dá certo, pois, ele tem a imagem da
casa, na mente, mas o nome e a pronúncia não. Por isso, somente
mostrar as sílabas separadas e depois a palavra escrita, não é sufi-
ciente para que o aluno surdo aprenda a ler, pois esse código escrito
casa não tem significado para ele e a pronúncia casa ele não a ouve.
Assim, as mesmas autoras ressaltam:
62
Por isso, a didática e/ou as estratégias, a serem adotada com a
população surda, são pensadas a partir do canal principal responsá-
vel pela aquisição de conhecimentos: o canal visual.
63
PALAVRAS FINAIS
Esse texto teve como objetivo discutir e explicar o processo de
ensino e aprendizagem de alunos surdos, com ênfase nos modelos
metodológicos utilizados na educação de surdos, ao longo da histó-
ria. Dessa forma, diversos aspectos que contemplam a vida dos sur-
dos, desde a Idade Antiga à Contemporaneidade, foram descritos.
A partir disso, entende-se que a vida dos surdos sempre foi alvo do
ouvintismo, da influência do ouvinte que imperou, sobre a trajetória
do surdo, culminando em extermínio dessas pessoas do meio social,
Idade Antiga e a extinção da LS, Idade Moderna.
64
expressamente proibida e, com isso, além de não conseguirem se
comunicar, os surdos não conseguiram aprender a ler e a escrever,
uma vez que não tinham uma língua, efetivamente.
65
Nesse texto, discutiu-se, também, a importância da Pedago-
gia Surda, modelo metodológico que requer a presença do pro-
fessor surdo nas instituições educacionais, visto que é no encontro
surdo-surdo que a identidade surda se constitui, a cultura surda
se fortalece e a criança surda tem um modelo a seguir, o de uma
pessoa culturalmente igual no modo de ver, sentir, aprender e,
principalmente, de se comunicar.
66
REFERÊNCIAS
BÍBLIA SAGRADA. Nova tradução da linguagem de hoje. Barueri/São Paulo: Sociedade
Bíblica do Brasil. 2000.
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Libras - e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília,
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO-OESTE DO PARANÁ
UNICENTRO
Murilo Holubovski
Designer Gráfico
Jan/2020
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