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OS NOVÍSSIMOS

OS NOVÍSSIMOS

O JUÍZO PARTICULAR (segundo Santa Catarina de Sena)

O CÉU (segundo Dom Bosco)

O PURGATÓRIO (segundo os santos)

O PURGATÓRIO (segundo Santa Catarina de Gênova)

O PURGATÓRIO (segundo Dom Bosco)

O INFERNO (segundo Santa Teresa D'Ávila)

O INFERNO (segundo Santa Faustina)

O INFERNO (segundo aparições de Fátima)

O INFERNO (segundo Dom Bosco)

OS NOVÍSSIMOS

Os santos chamam de Novíssimos as coisas que nos sucederão no fim da vida, a morte
e o juízo, o destino temporário (o purgatório), e o destino eterno (o céu e o inferno).

1. O que é o juízo?

O Catecismo da Igreja Católica ensina que «a morte põe termo à vida do homem,
enquanto tempo aberto à aceitação ou à rejeição da graça divina, manifestada em
Jesus Cristo» «Ao morrer, cada homem recebe na sua alma imortal a retribuição
eterna, num juízo particular que põe a sua vida em referência a Cristo, quer através de
uma purificação, quer para entrar imediatamente na felicidade do céu, quer para se
condenar imediatamente para sempre».

Neste sentido S. João da Cruz fala do juízo particular de cada um dizendo que «ao
entardecer desta vida, examinar-te-ão no amor».

Diz o Catecismo da Igreja:

1021. A morte põe termo à vida do homem, enquanto tempo aberto à aceitação ou à
rejeição da graça divina, manifestada em Jesus Cristo. O Novo Testamento fala do
juízo, principalmente na perspectiva do encontro final com Cristo na sua segunda
vinda. Mas também afirma, reiteradamente, a retribuição imediata depois da morte de
cada qual, em função das suas obras e da sua fé. A parábola do pobre Lázaro e a
palavra de Cristo crucificado ao bom ladrão, assim como outros textos do Novo
Testamento, falam dum destino final da alma, o qual pode ser diferente para umas e
para outras.

1022. Ao morrer, cada homem recebe na sua alma imortal a retribuição eterna, num
juízo particular que põe a sua vida em referência a Cristo, quer através duma
purificação, quer para entrar imediatamente na felicidade do céu, quer para se
condenar imediatamente para sempre.

2. Quem são os que vão para o céu? Como é o céu?

O céu é “o fim último e a realização das aspirações mais profundas do homem, o


estado de felicidade suprema e definitiva.” S. Paulo escreve: Nem olho viu, nem ouvido
ouviu, nem passou pelo pensamento do homem as coisas que Deus tem preparado
para aqueles que o amam” (1Cor 2, 9).

Depois do juízo particular, os que morrem na graça e na amizade de Deus e estão


perfeitamente purificados vão para o céu. Vivem em Deus, veem-no tal como é. Estão
sempre com Cristo. São para sempre semelhantes a Deus, gozam da sua felicidade, do
seu Bem, da Verdade e da Beleza de Deus.

Esta vida perfeita com a Santíssima Trindade, esta comunhão de vida e de amor com
Ela, com a Virgem Maria, com os anjos e com todos os bem-aventurados chama-se
céu. Pela sua morte e ressurreição, Jesus Cristo «abriu-nos» o céu. Viver no céu é
“estar com Cristo” (cf. Jo 14, 3; Flp 1, 23; 1 Ts 4,17). Os eleitos vivem «n'Ele»; mas n'Ele
conservam, ou melhor, encontram a sua verdadeira identidade, o seu nome próprio.
(cf. Ap 2, 17)

Diz o Catecismo da Igreja:

1023. Os que morrerem na graça e na amizade de Deus e estiverem perfeitamente


purificados, viverão para sempre com Cristo. Serão para sempre semelhantes a Deus,
porque O verão «tal como Ele é» (1 Jo 3, 2), «face a face» (1 Cor 13, 12) (615):
«Com a nossa autoridade apostólica, definimos que, por geral disposição divina, as
almas de todos os santos mortos antes da paixão de Cristo [...] e as de todos os outros
fiéis que morreram depois de terem recebido o santo Baptismo de Cristo e nas quais
nada havia a purificar no momento da morte, ou ainda daqueles que, se no momento
da morte houve ou ainda há qualquer coisa a purificar, acabaram por o fazer [...]
mesmo antes de ressuscitarem em seus corpos e do Juízo universal – e isto depois da
Ascensão ao céu do nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo –, estiveram, estão e estarão
no céu, associadas ao Reino dos céus e no paraíso celeste, com Cristo, na companhia
dos santos anjos. E depois da paixão e morte de nosso Senhor Jesus Cristo, essas almas
viram e veem a essência divina com uma visão intuitiva e face a face, sem a mediação
de qualquer criatura».

1024. Esta vida perfeita com a Santíssima Trindade, esta comunhão de vida e de amor
com Ela, com a Virgem Maria, com os anjos e todos os bem-aventurados, chama-se
«céu». O céu é o fim último e a realização das aspirações mais profundas do homem, o
estado de felicidade suprema e definitiva.

1025. Viver no céu é «estar com Cristo». Os eleitos vivem «n'Ele»; mas n'Ele conservam,
ou melhor, encontram a sua verdadeira identidade, o seu nome próprio: «Porque a vida
consiste em estar com Cristo, onde está Cristo, aí está a vida, aí está o Reino».

1026. Pela sua morte e ressurreição, Jesus Cristo «abriu-nos» o céu. A vida dos bem-
aventurados consiste na posse em plenitude dos frutos da redenção operada por Cristo,
que associa à sua glorificação celeste aqueles que n'Ele acreditaram e permaneceram
fiéis à sua vontade. O céu é a comunidade bem-aventurada de todos os que estão
perfeitamente incorporados n'Ele.

3. O que é o purgatório?

Os que morrem na graça e na amizade de Deus, mas não de todo purificados, embora
seguros da sua salvação eterna, sofrem depois da morte uma purificação, a fim de
obterem a santidade necessária para entrar na alegria do céu. A Igreja chama
Purgatório a esta purificação final dos eleitos, que é absolutamente distinta do castigo
dos condenados.

Esta doutrina apoia-se também na prática da oração pelos defuntos, de que já fala a
Sagrada Escritura: «Por isso, [Judas Macabeu] pediu um sacrifício expiatório para que
os mortos fossem livres das suas faltas» (2 Mac 12, 46). Desde os primeiros tempos, a
Igreja honrou a memória dos defuntos, oferecendo sufrágios em seu favor,
particularmente o Sacrifício eucarístico para que, purificados, possam chegar à visão
beatífica de Deus. A Igreja recomenda também a esmola, as indulgências e as obras de
penitência a favor dos defuntos.

Diz o Catecismo da Igreja:

1030. Os que morrem na graça e na amizade de Deus, mas não de todo purificados,
embora seguros da sua salvação eterna, sofrem depois da morte uma purificação, a
fim de obterem a santidade necessária para entrar na alegria do céu.

1031. A Igreja chama Purgatório a esta purificação final dos eleitos, que é
absolutamente distinta do castigo dos condenados. A Igreja formulou a doutrina da fé
relativamente ao Purgatório sobretudo nos concílios de Florença e de Trento. A
Tradição da Igreja, referindo-se a certos textos da Escritura fala dum fogo purificador:

«Pelo que diz respeito a certas faltas leves, deve crer-se que existe, antes do
julgamento, um fogo purificador, conforme afirma Aquele que é a verdade, quando diz
que, se alguém proferir uma blasfémia contra o Espírito Santo, isso não lhe será
perdoado nem neste século nem no século futuro (Mt 12, 32). Desta afirmação
podemos deduzir que certas faltas podem ser perdoadas neste mundo e outras no
mundo que há-de vir».
1032. Esta doutrina apoia-se também na prática da oração pelos defuntos, de que já
fala a Sagrada Escritura: «Por isso, [Judas Macabeu] pediu um sacrifício expiatório
para que os mortos fossem livres das suas faltas» (2 Mac 12, 46). Desde os primeiros
tempos, a Igreja honrou a memória dos defuntos, oferecendo sufrágios em seu favor,
particularmente o Sacrifício eucarístico para que, purificados, possam chegar à visão
beatífica de Deus. A Igreja recomenda também a esmola, as indulgências e as obras de
penitência a favor dos defuntos:

«Socorramo-los e façamos comemoração deles. Se os filhos de Jó foram purificados


pelo sacrifício do seu pai por que duvidar de que as nossas oferendas pelos defuntos
lhes levam alguma consolação? [...] Não hesitemos em socorrer os que partiram e em
oferecer por eles as nossas orações».

4. O que é o inferno?

O inferno significa permanecer separado d'Ele - do nosso Criador - para sempre, por
nossa própria livre escolha. E é este estado de auto-exclusão definitiva da comunhão
com Deus e com os bem-aventurados que se designa pela palavra «Inferno».

Morrer em pecado mortal sem arrependimento e sem dar acolhimento ao amor


misericordioso de Deus é escolher este fim para sempre.

A doutrina da Igreja afirma a existência do Inferno e a sua eternidade. As almas dos


que morrem em estado de pecado mortal descem imediatamente, após a morte, aos
infernos, onde sofrem as penas do Inferno, «o fogo eterno». A principal pena do
inferno consiste na separação eterna de Deus, o único em Quem o homem pode ter a
vida e a felicidade para que foi criado e a que aspira.

Jesus fala muitas vezes da «geena» do «fogo que não se apaga» (630) reservada aos
que recusam, até ao fim da vida, acreditar e converter-se, e na qual podem perder-se,
ao mesmo tempo, a alma e o corpo. A principal pena do inferno consiste na separação
eterna de Deus.

As afirmações da Sagrada Escritura e os ensinamentos da Igreja a respeito do Inferno


são um apelo ao sentido de responsabilidade com que o homem deve usar da sua
liberdade, tendo em vista o destino eterno. Constituem, ao mesmo tempo, um apelo
urgente à conversão: «Entrai pela porta estreita, pois larga é a porta e espaçoso o
caminho que levam à perdição e muitos são os que seguem por eles. Que estreita é a
porta e apertado o caminho que levam à vida e como são poucos aqueles que os
encontram!» (Mt 7, 13-14).

Diz o Catecismo da Igreja:

1033. Não podemos estar em união com Deus se não escolhermos livremente amá-Lo.
Mas não podemos amar a Deus se pecarmos gravemente contra Ele, contra o nosso
próximo ou contra nós mesmos: «Quem não ama permanece na morte. Todo aquele
que odeia o seu irmão é um homicida: ora vós sabeis que nenhum homicida tem em si
a vida eterna» (1 Jo 3, 14-15). Nosso Senhor adverte-nos de que seremos separados
d'Ele, se descurarmos as necessidades graves dos pobres e dos pequeninos seus
irmãos. Morrer em pecado mortal sem arrependimento e sem dar acolhimento ao
amor misericordioso de Deus, significa permanecer separado d'Ele para sempre, por
nossa própria livre escolha. E é este estado de auto-exclusão definitiva da comunhão
com Deus e com os bem-aventurados que se designa pela palavra «Inferno».

1034. Jesus fala muitas vezes da «geena» do «fogo que não se apaga» reservada aos
que recusam, até ao fim da vida, acreditar e converter-se, e na qual podem perder-se,
ao mesmo tempo, a alma e o corpo. Jesus anuncia, em termos muitos severos, que
«enviará os seus anjos que tirarão do seu Reino [...] todos os que praticaram a
iniquidade, e hão-de lançá-los na fornalha ardente» (Mt 13, 41-42), e sobre eles
pronunciará a sentença: «afastai-vos de Mim, malditos, para o fogo eterno» (Mt 25,
41).

1035. A doutrina da Igreja afirma a existência do Inferno e a sua eternidade. As almas


dos que morrem em estado de pecado mortal descem imediatamente, após a morte,
aos infernos, onde sofrem as penas do Inferno, «o fogo eterno». A principal pena do
inferno consiste na separação eterna de Deus, o único em Quem o homem pode ter a
vida e a felicidade para que foi criado e a que aspira.

1036. As afirmações da Sagrada Escritura e os ensinamentos da Igreja a respeito do


Inferno são um apelo ao sentido de responsabilidade com que o homem deve usar da
sua liberdade, tendo em vista o destino eterno. Constituem, ao mesmo tempo, um
apelo urgente à conversão: «Entrai pela porta estreita, pois larga é a porta e espaçoso
o caminho que levam à perdição e muitos são os que seguem por eles. Que estreita é a
porta e apertado o caminho que levam à vida e como são poucos aqueles que os
encontram!» (Mt 7, 13-14):

«Como não sabemos o dia nem a hora, é preciso que, segundo a recomendação do
Senhor, vigiemos continuamente, a fim de que, no termo da nossa vida terrena, que é
só uma, mereçamos entrar com Ele para o banquete de núpcias e ser contados entre os
benditos, e não sejamos lançados, como servos maus e preguiçosos, no fogo eterno,
nas trevas exteriores, onde "haverá choro e ranger de dentes"».

5. Quando será o juízo final? Em que consistirá?

A ressurreição de todos os mortos, «justos e pecadores» (At 24, 15), há-de preceder o
Juízo final. Será «a hora em que todos os que estão nos túmulos hão-de ouvir a sua voz
e sairão: os que tiverem praticado o bem, para uma ressurreição de vida, e os que
tiverem praticado o mal, para uma ressurreição de condenação» (Jo 5, 28-29). Então
Cristo virá «na sua glória, com todos os seus anjos [...]. Todas as nações se reunirão na
sua presença e Ele separará uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas dos
cabritos; e colocará as ovelhas à sua direita e os cabritos à sua esquerda. [...] Estes irão
para o suplício eterno e os justos para a vida eterna» (Mt 25, 31-33.46).
O Juízo final terá lugar quando acontecer a vinda gloriosa de Cristo. Só o Pai sabe o dia
e a hora, só Ele decide sobre a sua vinda. Pelo seu Filho Jesus Cristo. Ele pronunciará
então a sua palavra definitiva sobre toda a história. Nós ficaremos a saber o sentido
último de toda a obra da criação e de toda a economia da salvação, e
compreenderemos os caminhos admiráveis pelos quais a sua providência tudo terá
conduzido para o seu fim último. O Juízo final revelará como a justiça de Deus triunfa
de todas as injustiças cometidas pelas suas criaturas e como o seu amor é mais forte
do que a morte (cf. Ct.8, 6).

A mensagem do Juízo final é um apelo à conversão, enquanto Deus dá ainda aos


homens «o tempo favorável, o tempo da salvação» (2 Cor 6, 2). Ela inspira o santo
temor de Deus, empenha na justiça do Reino de Deus e anuncia a «feliz esperança» (Tt
2, 13) do regresso do Senhor, que virá «para ser glorificado nos seus santos, e
admirado em todos os que tiverem acreditado» (2 Ts 1, 10).

Diz o Catecismo da Igreja:

1038. A ressurreição de todos os mortos, «justos e pecadores» (At 24, 15), há-de
preceder o Juízo final. Será «a hora em que todos os que estão nos túmulos hão-de
ouvir a sua voz e sairão: os que tiverem praticado o bem, para uma ressurreição de
vida, e os que tiverem praticado o mal, para uma ressurreição de condenação» (Jo 5,
28-29). Então Cristo virá «na sua glória, com todos os seus anjos [...]. Todas as nações
se reunirão na sua presença e Ele separará uns dos outros, como o pastor separa as
ovelhas dos cabritos; e colocará as ovelhas à sua direita e os cabritos à sua esquerda.
[...] Estes irão para o suplício eterno e os justos para a vida eterna» (Mt 25, 31-33.46).

1039. É perante Cristo, que é a Verdade, que será definitivamente posta descoberto a
verdade da relação de cada homem com Deus (636). O Juízo final revelará, até às suas
últimas consequências, o que cada um tiver feito ou deixado de fazer de bem durante a
sua vida terrena:

«Todo o mal que os maus fazem é registado – e eles não o sabem. No dia em que "Deus
virá e não se calará" (Sl 50, 3) [...]. Então, Ele Se voltará para os da sua esquerda: "Na
terra, dir-lhes-á, Eu tinha posto para vós os meus pobrezinhos, Eu, Cabeça deles, estava
no céu sentado à direita do Pai – mas na terra os meus membros tinham fome: o que
vós tivésseis dado aos meus membros, teria chegado à Cabeça. Quando Eu coloquei os
meus pobrezinhos na terra, constituí-os vossos portadores para trazerem as vossas
boas obras ao meu tesouro. Vós nada depositastes nas mãos deles: por isso nada
encontrais em Mim"» (637).

1040. O Juízo final terá lugar quando acontecer a vinda gloriosa de Cristo. Só o Pai sabe
o dia e a hora, só Ele decide sobre a sua vinda. Pelo seu Filho Jesus Cristo. Ele
pronunciará então a sua palavra definitiva sobre toda a história. Nós ficaremos a saber
o sentido último de toda a obra da criação e de toda a economia da salvação, e
compreenderemos os caminhos admiráveis pelos quais a sua providência tudo terá
conduzido para o seu fim último. O Juízo final revelará como a justiça de Deus triunfa
de todas as injustiças cometidas pelas suas criaturas e como o seu amor é mais forte do
que a morte (638).

1041. A mensagem do Juízo final é um apelo à conversão, enquanto Deus dá ainda aos
homens «o tempo favorável, o tempo da salvação» (2 Cor 6, 2). Ela inspira o santo
temor de Deus, empenha na justiça do Reino de Deus e anuncia a «feliz esperança» (Tt
2, 13) do regresso do Senhor, que virá «para ser glorificado nos seus santos, e
admirado em todos os que tiverem acreditado» (2 Ts 1, 10).

6. No final dos tempos Deus prometeu céu novo e uma nova terra. Que devemos
esperar?

A esta misteriosa renovação, que há-de transformar a humanidade e o mundo, a


Sagrada Escritura chama «os novos céus e a nova terra» (2 Pe 3, 13) (640). Será a
realização definitiva do desígnio divino de «reunir sob a chefia de Cristo todas as coisas
que há nos céus e na terra» (Ef 1, 10).

Para o homem, esta consumação será a realização final da unidade do género humano,
querida por Deus desde a criação e da qual a Igreja peregrina era «como que o
sacramento» (LG 1). Os que estiverem unidos a Cristo formarão a comunidade dos
resgatados, a «Cidade santa de Deus» (Ap 21, 2), a «Esposa do Cordeiro» (Ap 21, 9).
Esta não mais será atingida pelo pecado, pelas manchas (644), pelo amor próprio, que
destroem e ferem a comunidade terrena dos homens. A visão beatífica, em que Deus
Se manifestará aos eleitos de modo inesgotável, será a fonte inexaurível da felicidade,
da paz e da mútua comunhão.

«Ignoramos o tempo em que a terra e a humanidade atingirão a sua plenitude, e


também não sabemos como é que o universo será transformado. Porque a figura
deste mundo, deformada pelo pecado, passa certamente, mas Deus ensina-nos que se
prepara uma nova habitação e uma nova terra, na qual reinará a justiça e cuja
felicidade satisfará e superará todos os desejos de paz que se levantam no coração dos
homens(GS 39).

«A expectativa da nova terra não deve, porém, enfraquecer, mas antes ativar a
solicitude em ordem a desenvolver esta terra onde cresce o corpo da nova família
humana, que já consegue apresentar uma certa prefiguração do mundo futuro. Por
conseguinte, embora o progresso terreno se deva cuidadosamente distinguir do
crescimento do Reino de Cristo, todavia, na medida em que pode contribuir para a
melhor organização da sociedade humana, interessa muito ao Reino de Deus» (DS 39).

Diz o Catecismo da Igreja:

1043. A esta misteriosa renovação, que há-de transformar a humanidade e o mundo, a


Sagrada Escritura chama «os novos céus e a nova terra» (2 Pe 3, 13) (640). Será a
realização definitiva do desígnio divino de «reunir sob a chefia de Cristo todas as coisas
que há nos céus e na terra» (Ef 1, 10).
1044. Neste «mundo novo» (641), a Jerusalém celeste, Deus terá a sua morada entre
os homens. «Há-de enxugar-lhes dos olhos todas as lágrimas; a morte deixará de
existir, e não mais haverá luto, nem clamor, nem fadiga. Porque o que havia
anteriormente desapareceu» (Ap 21, 4) (642).

1045. Para o homem, esta consumação será a realização final da unidade do género
humano, querida por Deus desde a criação e da qual a Igreja peregrina era «como que
o sacramento» (643). Os que estiverem unidos a Cristo formarão a comunidade dos
resgatados, a «Cidade santa de Deus» (Ap 21, 2), a «Esposa do Cordeiro» (Ap 21, 9).
Esta não mais será atingida pelo pecado, pelas manchas (644), pelo amor próprio, que
destroem e ferem a comunidade terrena dos homens. A visão beatífica, em que Deus Se
manifestará aos eleitos de modo inesgotável, será a fonte inexaurível da felicidade, da
paz e da mútua comunhão.

1046. Quanto ao cosmos, a Revelação afirma a profunda comunidade de destino entre


o mundo material e o homem:

Na verdade, as criaturas esperam ansiosamente a revelação dos filhos de Deus [...] com
a esperança de que as mesmas criaturas sejam também libertadas da corrupção que
escraviza [...]. Sabemos que toda a criatura geme ainda agora e sofre as dores da
maternidade. E não só ela, mas também nós, que possuímos as primícias do Espírito,
gememos interiormente, esperando a adopção filial e a libertação do nosso corpo» (Rm
8, 19-23).

1047. Assim, pois, também o universo visível está destinado a ser transformado, «a fim
de que o próprio mundo, restaurado no seu estado primitivo, esteja sem mais nenhum
obstáculo ao serviço dos justos» (645), participando na sua glorificação em Jesus Cristo
ressuscitado.

1048. «Ignoramos o tempo em que a terra e a humanidade atingirão a sua plenitude, e


também não sabemos como é que o universo será transformado. Porque a figura deste
mundo, deformada pelo pecado, passa certamente, mas Deus ensina-nos que se
prepara uma nova habitação e uma nova terra, na qual reinará a justiça e cuja
felicidade satisfará e superará todos os desejos de paz que se levantam no coração dos
homens» (646).

1049. «A expectativa da nova terra não deve, porém, enfraquecer, mas antes ativar a
solicitude em ordem a desenvolver esta terra onde cresce o corpo da nova família
humana, que já consegue apresentar uma certa prefiguração do mundo futuro. Por
conseguinte, embora o progresso terreno se deva cuidadosamente distinguir do
crescimento do Reino de Cristo, todavia, na medida em que pode contribuir para a
melhor organização da sociedade humana, interessa muito ao Reino de Deus» (647).

No Juízo Particular, no instante final, quando a pessoa compreende que não pode fugir
das Minhas Mãos recupera a visão que a atormenta interiormente fazendo-a ver que
por própria culpa chegou a tão triste situação.
O JUÍZO PARTICULAR (segundo Santa Catarina de Sena)

Se o pecador se deixar iluminar e se arrepender, não por medo dos castigos infernais,
mas por ter ofendido a Suma e Eterna Bondade, AINDA SERÁ PERDOADO. Mas, se
ultrapassar o momento da morte nas trevas, no remorso, sem esperança no Sangue,
ou então, lamentando-se apenas pela infelicidade em que se acha - e não por ter Me
ofendido - irá para a perdição. Sobrevirá, pois, a repreensão pela injustiça e falso
julgamento.

Em primeiro lugar a repreensão da injustiça e do julgamento falso em geral, praticados


no conjunto de suas ações, durante a vida; depois, em particular, do último instante
quando o pecador considera seu pecado maior que a Minha misericórdia. Este é o
pecado que não será perdoado, nem aqui nem no além. O desprezo voluntário da
Minha misericórdia constitui pecado mais grave que todos os anteriores Filha, tua
linguagem é incapaz de descrever os sofrimentos desses infelizes condenados.

Sendo três os seus vícios principais - egoísmo, medo de perder a boa fama e orgulho -
aos quais se acrescentam a injustiça, a maldade e impureza, no inferno os pecadores
padecem de quatro tormentos principais. O primeiro é a ausência da Minha visão. Um
sofrimento tão grande que os condenados, se fosse possível, prefeririam sofrer o fogo
vendo-Me, que ficar de fora dele sem Me ver.

O segundo, como consequência, é o remorso que corrói o pecador privado de Mim,


longe da conversação dos anjos, a conviver com os demônios. Aliás, a visão do diabo
constitui o terceiro tormento. Ao vê-lo duplica-se o sofrer. Nestes (demônios), eles se
conhecem melhor, entendendo que por própria culpa mereceram o castigo. Assim, o
remorso os martiriza e jamais cessará o ardor da consciência. Muito grande é este
tormento, porque o diabo é visto no próprio ser; tão horrível é a sua fealdade, que a
mente humana não consegue imaginar. Se ainda o recordas, já te mostrei o demônio
assim como ele é; foi por um átimo de tempo. Quando retornastes ao sentido,
preferias caminhar por uma estrada de fogo até o juízo final que tornar a vê-lo. No
entanto, apesar do que viste ignoras a sua fealdade, especialmente porque, segundo a
justiça divina, ele é visto mais ou menos horrível pelos condenados, segundo a
gravidade das culpas.

O quarto é o fogo. Um fogo que arde sem consumir, sem destruir o ser humano. É algo
de imaterial, que não destrói a alma incorpórea. Na Minha justiça permito que tal fogo
queime, faça padecer, aflija; mas não destrua. É ardente e fere de modo crudelíssimo
em muitas maneiras, conforme a diversidade das culpas. A uns mais, a outros menos,
segundo a gravidade dos pecados. Destes quatro tormentos derivam os demais: o frio,
o calor, o ranger de dentes (Mt, 22,13) Grande é o ódio dos condenados, pois já não
amam o bem. Blasfemam continuamente contra Mim!

Queres saber por que já não podem desejar o bem? É porque, no fim desta vida,
vincula-se o livre arbítrio. Com o cessar do tempo, já não se merece mais. Quem
termina esta existência em pecado mortal, por direito divino fica para sempre apegado
ao ódio, obstinado no mal, a roer-se interiormente.
Seus sofrimentos irão aumentando sempre, especialmente por causa das demais
pessoas que por sua causa irão para a condenação. O homem justo (no mesmo Juízo)
ao encerrar sua vida terrena no amor, já não poderá progredir na virtude. Para sempre
continuará a amar no grau de caridade que atingiu até Mim.

Também será julgado na proporção do amor. Continuamente Me deseja,


continuamente Me possui; suas aspirações não caem no vazio. Ao desejar, será
saciado; ao saciar-se, sentirá ainda fome; distanciando-se assim, do fastio da saciedade
e do sofrimento da fome. Os bem-aventurados gozam da Minha eterna visão.

Cada um no seu grau, de acordo com a caridade em que vieram participar de tudo o
que possuo. Desfrutam na alegria e gozo - dos bens pessoais e comuns que
mereceram. Colocados entre os anjos e santos com eles se rejubilam na proporção do
bem praticado na terra.

Entre si congraçados na caridade os bem-aventurados de modo especial comunicam-


se com aqueles que amaram no mundo. Não penses que a felicidade celeste seja
apenas individual. Não! Ela é participada por todos os cidadãos da pátria, homens e
anjos.

Quando chega alguém à vida eterna, todos sentem sua felicidade da mesma forma
como ele participa do prazer de todos. Em seus anseios os eleitos clamam
continuamente diante de Mim em favor do mundo inteiro. Suas vidas haviam
terminado no amor fraterno; continuam no mesmo amor.

Aliás, foi exatamente por tal caridade que passaram pela porta que é Meu Filho Por
ocasião do Juízo Final, o Verbo encarnado virá com divina majestade para repreender
o mundo. Não mais se apresentará pobrezinho na forma como nasceu da Virgem, na
estrebaria, entre animais, para morrer depois no meio de ladrões. Naquela ocasião,
ocultei n'Ele o Meu poder e permiti que suportasse penas e dores como homem. A
natureza divina se unira a humana e foi enquanto homem que sofreu para reparar as
vossas culpas.

No juízo final, não será assim, pois virá com poder a fim de julgar. As criaturas
humanas estremecerão e Ele a cada um dará sentença conforme merecimento. Tua
língua não conseguirá exprimir o que se sucederá aos condenados. Para os bons, Jesus
será motivo de temor santo e alegria imensa. Os bem-aventurados continuam no céu,
eternamente, aquele mesmo amor com que encerraram a vida terrena. Eles em nada
se distanciam de Mim. Seus desejos estão saciados. Anseiam em ver-Me glorificado
por vós viandantes e peregrinos que sois em direção à morte. Aspirando por Minha
honra, querem vossa salvação e sempre rogam por vós. De Minha parte, escuto os
seus pedidos naquilo em que vós, por maldade, não opondes resistência à Minha
bondade. Os bem-aventurados desejam recuperar os seus corpos; todavia não sofrem
por sua ausência. Até se alegram, na certeza de que tal aspiração será realizada. A
ausência do corpo não lhes diminui o prazer, não é angustiante, não faz sofrer. Nem
julgues que a satisfação de ter o corpo após a ressurreição lhes traga maior bem-
aventurança. Se isso fosse verdade, seria sinal que a felicidade anterior era imperfeita,
enquanto não o reouvessem, e isso não pode ser. De fato, nenhuma perfeição lhes
falta. Não é o corpo que faz feliz a alma, mas o contrário.

Quando esta recupera o corpo no dia do juízo, participará ele da plenitude e da


perfeição da alma. Naquele dia, esta se fixará para sempre em Mim, e o corpo em tal
união, ficará imortal, sutil, leve. Deves saber que o corpo ressuscitado pode atravessar
uma parede, que o fogo e a água não o ofendem. Tal propriedade lhe advém, não de
uma virtude própria, mas por uma força que gratuitamente concedo à alma, que foi
criada à Minha imagem e semelhança num inefável ato de amor. Tua inteligência não
dispõe da capacidade necessária para entender, nem teus ouvidos para escutar, a
língua para narrar e o coração para sentir qual é a felicidade dos santos.

Ocupei-Me da felicidade dos santos para que entendesses melhor a infelicidade dos
condenados ao inferno. Aliás, outro tormento destes últimos, é ver quanto os bem-
aventurados são felizes. Tal conhecimento acresce-lhes a pena, da mesma forma como
a condenação dos maus leva os justos a glorificar Minha bondade. A luz é mais
evidente na escuridão, e a escuridão na luz. Conhecer a alegria dos santos é dor para
os réus do inferno. Os condenados aguardam com temor o dia do juízo final. Sabem
que então seus sofrimentos aumentarão. Ao escutar o terrível convite: "mortui, venite
ad judicium", a alma retornará ao corpo. Para os bem-aventurados será um corpo de
glória; para os réus um corpo para sempre obscurecido. Diante do Meu Filho, sentirão
grande vergonha. Também diante dos santos. O remorso martirizará a profundidade
do seu ser, quero dizer, a alma; mas também o corpo. Acusá-los-ão: o Sangue de
Cristo, por eles derramado; as obras de misericórdia, espirituais e corporais, do Meu
Filho, o bem que eles mesmos deveriam ter praticado em benefício dos outros,
segundo o Evangelho. Terá seu castigo a maldade com que trataram os irmãos, pois Eu
mesmo, compassivo, perdoara-lhes (Mt 18,33). Serão repreendidos pelo orgulho,
egoísmo, impureza, ganância; e tudo isso reavivará seus padecimentos.

No instante da morte, somente a alma é repreendida; no juízo final também o corpo,


por ter sido instrumento da alma na prática do bem e do mal conforme a orientação
da vontade. Todo bem e todo mal é feito através do corpo por este motivo, Minha
filha, os justos terão no corpo glorificado uma luz e um amor infinitos; já os réus do
inferno sofrerão pena eterna em seus corpos, usados para o pecado. Ao recuperar o
corpo diante de Jesus ressuscitado, os réus sentirão tormento renovado e acrescido: a
sensualidade sofrerá na sua impureza, vendo a natureza humana unida à divindade,
contemplando este barro adâmico - vossa natureza – colocada acima de todos os coros
angélicos, enquanto eles, os maus, estarão no mais profundo abismo. Os condenados
verão brilhar sobre os eleitos a liberalidade e a misericórdia, quais frutos do Sangue de
Cristo; saberão das dificuldades suportadas pelos bons e que agora se mostram em
seus corpos como frisos de adornos para as vestes. O valor de tais sofrimentos físicos
não provém do corpo, mas da riqueza da alma; é ela que dá o corpo o merecimento da
luta como companheira da prática das virtudes.

Tal exteriorização se verifica porque o corpo manifesta o resultado das batalhas das
alma, como o espelho reflete a face do homem. Ao se verem privados de tamanha
beleza, os habitantes das trevas verão surgir nos próprios corpos os sinais dos pecados
e terão maiores tormentos e confusão.

E ao soar aquela terrível sentença: "Ide, malditos, para o fogo eterno", suas almas e
corpos encaminhar-se-ão para a companhia de demônios, sem mais remédios nem
esperança.

Cada um a seu modo, se envolverá na podridão que viveu na terra, de acordo com as
ações que praticou: o avarento arderá na sua ganância dos bens que
desordenadamente amou; o maldoso, na sua ruindade; o impuro na imunda e infeliz
concupiscência; o injusto nas suas iniquidades; o rancoroso no seu ódio pelos outros.
Quanto ao egoísmo fonte de todos os males arderá como princípio causador de tudo
em sofrimentos insuportáveis.

O orgulho terá igual sorte. Assim, corpo e alma serão punidos em todos os vícios.
Sirvo-Me do demônio qual instrumento da Minha justiça para atormentar os que Me
ofendem.

Nesta vida o coloquei qual tentador, molestando os homens. Não para que estes sejam
vencidos, mas para que conquistem a vitória e o prêmio pela comprovação das
virtudes. Ninguém deve temer as possíveis lutas e tentações do demônio. Fortaleci os
homens, dei-lhes energia para vencer, no Sangue de Cristo. Demônio ou criatura
alguma conseguem dobrar a vontade. Ela vos pertence, é livre.

Vós é que escolheis o querer ou não querer alguma coisa. Eu disse que o demônio
convida os homens para a água-morta, a única que lhe pertence, cegando-os com
prazeres e satisfações do mundo. Usa o anzol do prazer e fisga-os mediante a
aparência de bem. Sabe ele que por outros caminhos nada conseguiria; sem o
vislumbre de um bem ou satisfação, os homens não se deixam aprisionar; por sua
própria natureza, a alma humana tende ao bem. Infelizmente, devido à cegueira do
egoísmo, o homem não consegue discernir qual é o bem verdadeiro, realmente útil ao
corpo e à alma.

Percebendo isto, o demônio, maldoso, apresenta-lhe numerosos atrativos maus,


disfarçados, porém sob alguma utilidade ou prazer. A certeza da Minha presença em
suas vidas é o conhecimento da Minha verdade. Tal conhecimento se realiza na
inteligência que é, o olho da alma; pupila de tal olho é a fé.

Pela iluminação da fé, eles distinguem, conhecem e seguem a estrada mensagem do


Verbo Encarnado. Sem a fé ninguém reconhece tal estrada, à semelhança daquele que
possuísse o olho, mas coberto por um pano. Sim, a pupila desse olhar é a fé; nada verá
quem cobrir sua inteligência com o pano da infelicidade, por causa do egoísmo. Tal
pessoa terá a inteligência, mas não a luz para conhecer.

Como afirmei antes, ninguém consegue seguir o caminho da verdade sem a luz da
razão - recebida de Mim com a inteligência - e sem a luz da fé, infundida na hora do
santo batismo, supondo que não destruais esta última com vossos pecados.
Fonte: Revelações de Deus Pai à Santa Catarina de Sena.

O CÉU (segundo Dom Bosco)

A noite de 22 de dezembro [de 1876] ficou memorável no Oratório. Foi um pouco


antecipada a hora da oração. Reuniram-se no locutório os estudantes, os artesãos e
todas as pessoas da casa. Dom Bosco tinha prometido falar no domingo anterior, mas
não pudera fazê-lo. Imagine-se a expectativa geral! Subiu à cátedra, saudado por
palmas entusiásticas, como acontecia sempre que dava daquele modo a "boa noite" à
comunidade inteira. Fez sinal de que ia falar e imediatamente fez-se completo silêncio.

Na noite em que estive em Lanzo, chegada a hora de repousar, aconteceu-me que tive
o seguinte sonho. É um sonho que não tem nenhuma relação com outros sonhos...

São coisas muito estranhas. Mas para meus filhos não tenho segredos; abro-lhes
inteiramente o coração. Pensai o que quiserdes desse sonho. Como diz São Paulo,
quod bonum est tenete [conservai o que é bom], se alguma coisa encontrais nele que
seja de proveito para vossa alma, sabei aproveitar-vos dela. Quem não quiser crer, que
não me creia, pouco importa; mas ninguém jamais zombe das coisas que vou dizer.

(Peço-vos, ainda, que não o conteis nem o comuniqueis por escrito aos que não são da
casa. Aos sonhos pode-se dar importância que sonhos merecem, e os que não
conhecem nossa intimidade poderiam formar juízos errôneos, vendo as coisas de
modo diferente do que são na realidade. Não sabem eles que sois meus filhos, e que
sempre vos digo tudo o que sei, e às vezes até mesmo o que não sei (risos gerais). Mas
o que um pai manifesta a seus filhos queridos para o bem deles, deve ficar entre o pai
e os filhos, e não passar adiante. E ainda por outro motivo: é que em geral, quando se
contam essas coisas fora, ou se desfiguram os fatos ou se conta apenas uma parte
deles, e esta mesma mal entendida; de onde nasce dano, pois o mundo desprezaria o
que não deve ser desprezado).

Deveis saber que ordinariamente os sonhos se têm dormindo. Ora, na noite de 6 de


dezembro, enquanto eu estava no meu quarto, não recordo bem se lendo, ou se
dando voltas pelo aposento, ou se me havia já deitado, comecei a sonhar.

Logo me pareceu estar sobre uma elevação de terreno, ou colina, à beira de uma
imensa planície cujos confins a vista não alcançava, pois se perdiam na imensidão; era
toda azulada como o mar calmo, embora o que eu visse não fosse água; parecia um
cristal límpido e luminoso. Sob meus pés, por trás de mim e dos lados via uma região à
maneira de um litoral à margem do oceano.

Largos e gigantescos caminhos dividiam aquela planície em vastíssimos jardins de


indescritível beleza, todos repartidos em bosquezinhos, prados e canteiros de flores,
de formas e cores variadas. Nenhuma das nossas plantas pode nos dar idéia daquelas,
embora tenham com elas alguma semelhança. As ervas, as flores, as árvores, as frutas,
eram vistosíssimas e de belíssimo aspecto. As folhas eram de ouro; os troncos e ramos,
de diamante, correspondendo todo o resto a essa riqueza. Seria impossível contar as
diferentes espécies; e cada espécie e cada indivíduo resplandecia com uma luz própria.

No meio daqueles jardins e em toda a extensão da planície eu contemplava


incontáveis edifícios de ordem, beleza, harmonia, magnificência e proporções tão
extraordinárias, que para a construção de um só deles me parecia não seriam
suficientes todos os tesouros da terra.

(Eu dizia para mim mesmo: "Se meus meninos tivessem uma destas casas, como
gozariam, que felizes seriam e com quanto gosto viveriam nela!" Isto pensava eu
vendo externamente os palácios. Qual não deveria ser sua magnificência interior)!

Enquanto contemplava extasiado tão estupendas maravilhas que adornavam aqueles


jardins, eis que chega a meus ouvidos uma música dulcíssima, de tão agradável e suave
harmonia que nem posso dela dar-vos adequada ideia. As músicas do Padre Cagliero e
de Dogliani nada têm de musical se comparadas àquela! Eram cem mil instrumentos,
produzindo cada qual um som diverso do outro, enquanto todos os sons possíveis
difundiam pelos ares suas ondas sonoras. A estes, somavam-se os coros de cantores.

Vi então uma multidão de pessoas que se encontrava naqueles jardins e se regozijava


alegre e contente. Uns tocavam, outros cantavam. Cada voz, cada nota, produzia
efeito de mil instrumentos reunidos, todos diferentes uns dos outros. Ao mesmo
tempo ouviam-se os diversos graus da escala harmônica, desde os mais baixos até os
mais agudos que se possam imaginar, mas todos em perfeita harmonia. Ah! para
descrever-vos tal harmonia não bastam comparações humanas.

Via-se, pelo rosto dos felizes habitantes do jardim, que os cantores não só
experimentavam extraordinário prazer em cantar, mas ao mesmo tempo sentiam
imenso gozo em ouvir cantar os demais. Quanto mais um cantava, mais se lhe acendia
o desejo de cantar, e quanto mais ouvia, mais desejava ouvir.

Era isto o que cantavam:

Salus, honor; gloria Deo Patri omnipotenti!.., Auctor saeculi, qui erat, qui est, qui
venturus est iudicare vivos et mortuos in saecula saeculorum [Saudação, honra e glória
a Deus Pai onipotente! Autor do século, que era, que é e que virá a julgar os vivos e os
mortos para todos os séculos dos séculos].

Enquanto ouvia atônito essa celestial harmonia, vi aparecer uma imensa multidão de
jovens, muitos dos quais eu conhecia, pois tinham estado no Oratório e nos outros
nossos colégios; mas me era desconhecida a maior parte. A multidão interminável se
dirigia a mim. À sua frente vinha Domingos Sávio, e logo atrás dele vinham Padre
Alasonatti, Padre Chiala, Padre Giulitto e muitos sacerdotes e clérigos, cada um deles
conduzindo uma seção de jovens.
Eu me perguntava a mim mesmo: "Estou dormindo ou estou acordado?" Batia as mãos
uma na outra e me tocava no peito, para certificar-me de que era realidade o que via.

Chegada diante de mim toda aquela multidão, parou à distância de oito ou dez passos.
Brilhou então um relâmpago de luz mais viva; cessou a música e fez-se um silêncio
profundo. Todos os jovens estavam tomados pela maior alegria, que lhes transparecia
no olhar, e em seus rostos se via a paz de uma felicidade perfeita. Olhavam-me com
um suave sorriso nos lábios e parecia que desejavam falar, mas não falavam.

Adiantou-se Domingos Sávio só, alguns passos, e ficou tão próximo a mim que se eu
tivesse estendido a mão certamente o teria tocado. Calava-se e me olhava sorrindo.
Que belo estava! Suas vestes eram realmente singulares. Caía-lhe até os pés uma
túnica alvíssima, coberta de diamantes e toda bordada de ouro. Cingia-lhe a cintura
uma ampla faixa vermelha recamada com tantas pedras preciosas que uma quase
tocava a outra; e se entrelaçavam em desenho tão maravilhoso, apresentando tanta
beleza de cores, que eu, ao vê-lo, me sentia fora de mim pela admiração. Pendia-lhe
do pescoço um colar de flores raras, mas não naturais; parecia como se as pétalas
fossem de diamantes unidos entre si sobre hastes de ouro; e assim era tudo o mais.
Essas flores refulgiam com luz sobre-humana mais viva que a do sol, que naquele
instante brilhava com todo o esplendor de uma manhã de primavera. Elas refletiam
seus raios sobre o rosto cândido e corado de modo indescritível, dando-lhe uma luz de
modo tão singular que nem se distinguiam bem suas várias espécies. A cabeça, tinha-a
cingida com uma coroa de rosas; os cabelos caíam-lhe sobre os ombros em ondulantes
cachos, dando-lhe um ar tão pulcro, tão afetuoso, tão encantador, que parecia...
parecia... um Anjo!

Ao pronunciar estas últimas palavras, parecia que Dom Bosco estava fazendo grande
esforço para encontrar as expressões adequadas; e o fez com um gesto indescritível e
um tom de voz que comoveu a todos; pareceu ter-se cansado nesse esforço para
encontrar os termos que exprimissem inteiramente sua ideia. Após breve pausa,
prosseguiu:

Também resplandeciam de luz todos os outros que o acompanhavam. Vestiam-se de


modos diversos, mas sempre maravilhosos; uns mais, outros menos ricos; uns de uma,
outros de outra forma; num, dominava determinada cor; noutro, dominava outra; e
cada uma das vestes tinha um significado que ninguém saberia compreender. Mas
todos tinham na cintura uma faixa vermelha.

Eu continuava a observar e pensava: Que significará isso? Como vim parar neste
local?... E não sabia onde me encontrava. Fora de mim, temeroso pela reverência que
tudo aquilo me inspirava, não me atrevia a dizer nada. Também os outros continuavam
silenciosos. Por fim, Domingos Sávio abriu a boca.

- Por que estás aí mudo e como que aniquilado? Não és mais aquele homem que de
nada tinhas medo, que enfrentavas intrépido as calúnias, as perseguições, os inimigos,
as angústias e os perigos de toda espécie? Onde está tua coragem? Por que não falas?
A duras penas respondi, quase balbuciando:

- Não sei o que dizer... Mas, não és tu Domingos Sávio?

- Sim, sou; já não me reconheces?

- E como te encontras aqui? – acrescentei, sempre confuso.

Sávio então respondeu com afeto:

- Vim aqui para falar-te. Tantas vezes nos falamos na Terra! Não recordas quanto me
amavas, quantas provas de amizade e quantas demonstrações de benevolência me
deste? E eu por acaso não correspondi a teus desvelos? Como era grande minha
confiança em ti! Por que, então, tremes? Coragem! pergunta-me alguma coisa.

Recobrando então ânimo, lhe disse:

- Tremo, porque não sei onde me encontro.

- Estás no local da felicidade – respondeu Sávio – onde se gozam todas as alegrias,


todas as delícias.

- É este, pois, o prêmio dos justos?

- Não, por certo. Aqui não se gozam os bens eternos, mas só, ainda que em medida
grande, os temporais.

- Mas então são naturais todas essas coisas?

- Sim, se bem que embelezadas pelo poder de Deus.

- E a mim, que me parecia que isto era o Paraíso! – exclamei.

- Não, não, não! – respondeu Sávio. Nenhum olho mortal pode ver as belezas eternas.

- E essas músicas – prossegui perguntando – são as harmonias de que gozais no


Paraíso?

- Não, não, já te disse que não!

- São sons naturais?

- Sim, são sons naturais, aperfeiçoados pela onipotência de Deus.

- E esta luz que sobrepuja a luz do sol, é luz divina? É a luz do Paraíso?

- É luz natural, embora avivada e aperfeiçoada pela onipotência divina.


- E não se poderia ver um pouco de luz divina?

- Ninguém pode vê-la enquanto não chegue a ver a Deus sicut est [como Ele é]. O
menor raio dessa luz tira na no mesmo instante a vida de um homem, porque não é
suportável pelas forças humanas.

- E poderia haver uma luz natural ainda mais bela do que esta?

- Se soubesses! Se visses somente um raio de luz natural elevada a um grau superior a


este, ficarias fora de ti.

- E não se pode ver ao menos um raio dessa luz de que falas?

- Sim, podes vê-lo; terás a prova do que te digo; abre os olhos.

Já os tenho abertos – respondi.

- Olha bem no fundo desse mar de cristal.

Levantei a vista, e apareceu de repente no céu, a uma distância imensa, uma


instantânea centelha de luz, sutilíssima como um fio, mas tão brilhante, tão
penetrante, que meus olhos não puderam resistir. Fechei-os e lancei um grito tão forte
que despertou o Padre Lemoyne (aqui presente), que dormia num quarto próximo.
Assustado, ele me perguntou na manhã seguinte o que me acontecera de noite, para
estar assim tão agitado. Aquele fiozinho de luz era cem milhões de vezes mais claro
que o sol, e seu fulgor bastaria para iluminar todo o universo criado.

Após alguns instantes, consegui abrir os olhos e perguntei a Domingos Sávio:

- E isso que vi, será talvez um raio divino?

Sávio respondeu:

- Não é luz divina, se bem que, comparada com a terrestre, seja tão superior em brilho.
Não é senão luz natural, assim avivada pelo poder de Deus. E ainda que imaginasses
uma imensa zona de luz semelhante à centelhazinha que viste lá no fundo rodeando
todo o mundo, nem por isso formarias para ti uma ideia dos esplendores do Paraíso.

- E vós, de que gozais, pois, no Paraíso?

- Ah! É impossível dizer-te. O que se goza no Paraíso nenhum homem mortal pode
sabê-lo enquanto não deixar esta vida e se reunir a seu Criador. Basta dizer que se
goza ao próprio Deus.

Entretanto, eu já me recobrara plenamente de meu primeiro aturdimento, e


contemplava absorto a beleza de Domingos Sávio, e com franqueza lhe perguntei:
- Por que tens essa veste tão alva e deslumbrante? Calou-se Sávio, sem dar mostras de
querer responder. Mas o coro retomou então suas harmonias e cantou, acompanhado
de todos os instrumentos:

Ipsi habuerunt lumbos praecinctos et dealbaverunt stolas suas in san guine Agni [Eles
tiveram os rins cingidos e purificaram suas vestes no sangue do Cordeiro].

- E por que – voltei a perguntar quando cessou o canto – essa faixa vermelha na tua
cintura?

Tampouco desta vez Sávio respondeu, mas antes fez sinal de que não queria fazê-lo.
Então, o Padre Alasonatti em solo se pôs a cantar:

Virgines enim sunt, et sequuntur Agnum quocumque ierit [São virgens e seguirão o
Cordeiro aonde quer que vá].

Compreendi então que a faixa encarnada, cor de sangue, era símbolo dos grandes
sacrifícios feitos, dos violentos esforços e do quase martírio sofrido para conservar a
virtude da pureza; e que, para manter-se casto na presença do Senhor, ele teria estado
pronto a dar a vida se as circunstâncias o houvessem requerido; e que também era
símbolo das penitências, que limpam a alma da culpa. A brancura e o esplendor da
túnica significavam a inocência batismal conservada.

Mas eu, atraído pelos cantos e contemplando todas aquelas falanges de jovens
celestiais ordenados atrás de Domingos Sávio, lhe perguntei:

- E quem são estes que te rodeiam?

E, dirigindo-me aos demais, lhes disse:

- Como é que estais todos tão refulgentes?

Sávio continuou calado, e todos os jovens se puseram a cantar:

Hi sunt sicut Angeli Dei in caelo [Estes são como Anjos de Deus no Céu].

Notava entretanto que Sávio parecia ter preeminência sobre aquela multidão, que a
respeitosa distância se encontrava, uns dez passos atrás dele; e então lhe disse:

- Diz-me, Sávio: sendo tu o mais jovem entre os muitos que te seguem e dos que
morreram em nossas casas, por que vais tu assim adiante deles e os precedes? Por que
és tu que falas e eles se calam?

- Eu sou o mais velho de todos.

- Não, muitos outros te superam em anos.


- Eu sou o mais antigo do Oratório – repetiu Domingos Sávio – porque fui o primeiro a
deixar o mundo e ir à outra vida. Além disso, legatione Dei fungor [ pro mandado de
Deus].

Essa resposta me indicava o motivo da visão. Ele era embaixador de Deus.

- Então – lhe disse – falemos do que neste instante mais nos importa.

- Sim, e pergunta-me logo o que ainda desejas saber. As horas passam, e poderia
acabar o tempo que me foi concedido para falar-te; e já não mais me poderias ver.

- Ao que parece, tens algum assunto de suma importância para me comunicares.

- Que irei dizer-te eu, miserável criatura? – disse Sávio com profunda humildade. –
Recebi do alto a missão de te falar, e por isso vim.

- Então – exclamei – fala-me do passado, do presente e do futuro de nosso Oratório.


Fala alguma coisa de meus queridos filhos, fala de minha Congregação.

- A respeito desta, muito teria que te comunicar.

- Revela, pois, o que sabes: fala-me do passado.

- O passado recai todo sobre ti.

- Terei feito alguma das minhas... [faltas]?

- Quanto ao passado, digo-te que tua Congregação já fez muito bem. Vês lá abaixo
aquele número interminável de jovens?

- Vejo-os – respondi. – Como são numerosos! E como parecem felizes!

- Pois olha o que está escrito na entrada do jardim.

- Está escrito Jardim Salesiano.

- Pois bem – prosseguiu Sávio – todos eles foram salesianos, ou foram educados por ti,
ou contigo tiveram alguma relação, foram salvos por ti ou por teus sacerdotes e
clérigos, ou por outros que encaminhaste pela via de sua vocação. Conta-os, se fores
capaz. Seu número, porém, seria cem milhões de vezes maior se maiores tivessem sido
tua fé e tua confiança no Senhor.

Lancei um suspiro, sem saber o que responder a tal reprimenda, mas disse de mim
para comigo: daqui para a frente procurarei ter essa fé e essa confiança. Depois,
perguntei:
- E o presente?

Sávio me apresentou um magnífico ramalhete que tinha nas mãos. Nele havia rosas,
violetas, girassóis, gencianas, lírios, sempre-vivas e, entre as flores, espigas de trigo.
Ofereceu-mo e disse:

- Observa!

- Vejo, mas nada entendo – respondi.

- Dá este ramalhete a teus filhos para que possam oferecê-lo ao Senhor quando chegar
o momento; procura que todos o tenham; a ninguém lhe falte nem o deixe tirar. Podes
estar certo de que com ele terão o suficiente para ser felizes.

- Mas, que significa esse ramalhete de flores?

- Consulta a Teologia; ela te dirá e te dará a explicação.

- A Teologia, estudei-a eu, mas não saberia como tirar dela o significado do que me
apresentas.

- Pois tens estrita obrigação de saber tudo isso.

- Vamos, tira-me da minha ansiedade, explica-me tu!

- Vês estas flores? Representam as virtudes que mais agradam ao Senhor.

- Quais são?

- A rosa é símbolo da caridade; a violeta, da humildade; o girassol, da obediência; a


genciana, da penitência e da mortificação; as espigas, da comunhão frequente; o lírio
indica a bela virtude da qual está escrito: Erunt sicut Angeli Dei in caelo, a castidade. E
a sempre-viva significa que todas essas virtudes devem durar sempre, ela simboliza a
perseverança.

- Ora bem, meu caro Sávio: tu, que durante toda a tua vida praticaste todas essas
virtudes, diz-me: o que foi que mais te consolou na hora da morte?

- Que te parece que possa ser? – respondeu Sávio.

- Foi talvez ter conservado a bela virtude da pureza?

- Não; não é só isso.

- Alegrou-te talvez teres a consciência tranquila?

- Isso é bom, porém não é o melhor.


- Por acaso teu consolo terá sido a esperança do Paraíso?

- Também não.

- Pois então! O haver entesourado muitas boas obras?

- Não, não!

- Então, qual foi teu consolo na última hora? – perguntei, entre confuso e suplicante,
vendo que não conseguia adivinhar seu pensamento.

- O que mais me confortou no transe da morte foi a assistência da poderosa e amável


Mãe do Salvador. Diz isto a teus filhos: que não se esqueçam de invocá-La em quanto
estão em vida. Mas, se queres que possa responder-te mais algo, apressa-te!

- Quanto ao futuro, que me dizes?

- Com respeito ao futuro, no próximo ano de 1877 terás que sofrer uma grande dor;
seis mais dois dos que te são mais caros serão chamados por Deus à eternidade. Mas
consola-te, pois serão transplantados do campo do mundo para os jardins do Paraíso.
Serão coroados. Não temas, O Senhor te ajudará e te mandará outros filhos
igualmente bons.

- Paciência! E no que se refere à Congregação?

- No tocante à Congregação, fica sabendo que Deus te prepara grandes


acontecimentos. No ano próximo surgirá para ela uma aurora de glória tão esplêndida,
que iluminará como um relâmpago os quatro cantos do mundo; do oriente ao poente,
do sul ao norte. Grande glória lhe está preparada. Tu deves zelar para que o carro no
qual vai o Senhor não seja afastado pelos teus fora de suas guias e de seus caminhos.
Se teus sacerdotes o souberem bem conduzir e se forem dignos da alta missão que
lhes foi confiada, esplêndido será o futuro, e infinitas serão as pessoas que salvarão.
Mas com uma condição: que teus filhos sejam devotos da Santíssima Virgem e saibam,
todos os que vivam em tua casa, conservar a virtude da castidade, tão agradável aos
olhos de Deus.

- Queria agora que me falasses algo sobre a Igreja em geral.

- Os destinos da Igreja estão nas mãos de Deus Criador. O que Ele determinou em seus
infinitos decretos não te posso revelar. Tais arcanos reserva-os Ele exclusivamente
para Si, e deles não participa nenhum dos espíritos criados.

- E sobre Pio IX?

- O que posso dizer-te é que o Pastor da Igreja não terá que sustentar ainda longos
combates nesta terra. Poucas são as batalhas que ainda lhe resta vencer. Dentro de
pouco será arrebatado de seu trono e o Senhor lhe dará a merecida recompensa. O
resto já é bem sabido. A Igreja não perece... Tens ainda algo que perguntar?

E quanto a mim? – lhe disse.

Oh! se soubesses por quantas vicissitudes terás ainda que passar!... Mas apressa-te,
porque muito pouco tempo me resta para falar contigo.

Estendi então com ardor as mãos para segurar aquele santo filho; mas suas mãos
pareciam aéreas e nada pude tocar.

Que loucura! Que estás fazendo? – me disse Sávio sorrindo.

Temo que te vás – exclamei —. Mas, não estás aqui com teu corpo?

Com o corpo, não. Recuperá-lo-ei no último dia.

Mas, que são, então, esses traços que me fazem ver em ti a figura de Domingos Sávio?

Quando por permissão divina uma alma separada do corpo aparece diante de algum
mortal, apresenta-se com a forma exterior do corpo que em vida animou, com todas
as suas feições exteriores, embora muito embelezadas, e assim as conserva até que
volte a unir-se a ele, no dia do Juízo Universal. Então o levará consigo para o Paraíso. É
por isso que te parece que tenho mãos, pés e cabeça; mas tu não podes segurar-me
porque sou puro espírito. Esta é só uma forma exterior pela qual me podes conhecer.

Compreendo – respondi – mas escuta. Ainda uma pergunta? meus jovens estão todos
no reto caminho da salvação? Diz-me alguma coisa para que possa bem dirigi-los.

Os filhos que a Divina Providência te confiou podem ser divididos em três categorias.
Vês estas três listas? Olha-as!

E me estendia uma.

Olhei a primeira; encabeçava-a a palavra invuinerati [ilesos], e continha o nome


daqueles aos quais o demônio não pôde ferir, e que não mancharam a inocência com
culpa alguma. Eram em grande número esses sadios, e os vi todos. A muitos já
conhecia, outros era a primeira vez que via, e certamente virão ao Oratório nos anos
futuros. Caminhavam direitos por um caminho estreito, apesar de serem alvo de
flechas, espadagadas e lanças que por todos os lados choviam sobre eles. Essas armas
formavam como que uma sebe ao longo das duas bordas do caminho, e os combatiam
e molestavam sem entre tanto feri-los.

Então Sávio me deu a segunda lista, cujo título era Vulnerati [feridos], ou seja, os que
haviam estado na desgraça de Deus mas, uma vez postos em pé, haviam curado suas
feridas arrependendo-se e confessando-se. Eram em maior número que os primeiros,
e haviam sido feridos no sendeiro da vida pelos inimigos que os flanqueavam durante
sua viagem. Li a lista e vi todos. Muitos iam curvados e desanimados.

Sávio tinha ainda na mão a terceira lista. Encabeçava-a a epígrafe: Lassati in via
iniquitatis [caídos na via da iniquidade]. Nela estavam escritos os nomes dos que
estavam na desgraça de Deus. Eu estava impaciente para conhecer o segredo, pelo
que estendi a mão. Mas Sávio me disse com vivacidade:

Não, espera um momento e ouve. Se abrires essa folha, dela sairá um tal mau cheiro
que nem tu nem eu poderemos suportar. Os Anjos têm que se retirar com asco e
horror, e o próprio Espírito Santo sente repugnância pela horrível hediondez do
pecado.

Mas como pode ser isso – observei – se Deus e os Anjos são impassíveis? Como podem
sentir o mau cheiro da matéria?

Quanto melhores e mais puras são as criaturas, tanto mais se acercam aos espíritos
celestiais; pelo contrário, quanto pior, mais desonesto e torpe é alguém, tanto mais se
afasta de Deus e dos Anjos, os quais, por sua vez, se afastam dele, que se converteu
num objeto de náusea e repugnância.

Passou-me então a terceira lista.

Toma-a – disse – abre-a e aproveita-te dela para o bem de teus jovens; mas não te
esqueças do ramalhete que te dei; que todos o tenham e conservem.

Isto dito, e depois de entregar-me a lista, retirou-se apressadamente, em meio de seus


companheiros, quase como se estivesse fugindo de algo.

Abri então a lista; não vi nenhum nome, mas no mesmo instante me foram
apresentados de chofre todos os indivíduos nela escritos, como se na realidade eu
visse suas pessoas. Com quanta tristeza os contemplei a todos! A maior parte eu
conhecia e pertencem ao Oratório e aos outros colégios. Vi muitos que parecem bons,
que parecem até os melhores dentre os companheiros, e sem embargo não o são!

Mas, no ato de abrir a folha, espalhou-se em redor um mau cheiro tão insuportável,
que imediatamente me vi assaltado por terrível dor de cabeça e por tais ânsias de
vômito que me parecia estar morrendo. Obscureceu-se entretanto o ar, e nisso
desapareceu a visão, nada mais eu vendo do maravilhoso espetáculo. Ao mesmo
tempo ziguezagueou um raio e ressoou um trovão no espaço, tão forte e terrível que
acordei sobressaltado.

O mau odor penetrou nas paredes e infiltrou-se em minhas vestes de tal forma que,
muitos dias depois, ainda me parecia sentir a pestilência. De tal modo é fétido ante os
olhos de Deus até mesmo o nome do pecador! Agora mesmo, só de recordar aquele
mau odor me vêm calafrios, sinto-me sufocado e se me revolve o estômago.
Em Lanzo, onde me achava, comecei a interrogar de cá e de lá alguns rapazes, e pude
certificar-me de que o sonho não me havia enganado. É, pois, uma graça do Senhor,
que me deu a conhecer o estado de alma de cada um de vós; mas disso nada direi em
público. Muitas outras explicações ainda haveria que dar, mas reservo-as para uma
outra noite. Por ora, só me resta desejar-vos uma boa noite.

O fato de, no sonho, ter visto como maus certos jovens que eram geralmente
considerados os melhores da casa, fez com que Dom Bosco de início suspeitasse ter
sido apenas uma ilusão. Foi por isso que, prudente mente, começou chamando alguns
para uma conversa particular; queria certificar-se bem da natureza do sonho. Por esse
mesmo motivo, não se apressou a narrar logo o sonho, mas esperou uns 15 dias. Só
falou quando se sentiu bem seguro de que a coisa provinha mesmo do Alto.

O tempo ainda haveria de lhe trazer outras confirmações das profecias ouvidas.

A primeira delas, e a mais importante, dizia respeito ao número de seus filhos que
morreriam no ano de 1877, discriminados em dois grupos: seis mais dois. Ora, naquele
ano efetivamente os registros do Oratório assinalaram com a costumeira cruz, sinal de
falecimento, os nomes de seis meninos e dois clérigos.

A segunda profecia anunciava para a Sociedade Salesiana, em 1877, uma aurora tão
esplêndida que faria luz sobre os quatro Cantos do mundo. Com efeito, naquele ano
fizeram entrada, no panorama da Igreja, a associação dos Cooperadores Salesianos e o
Boletim Salesiano. Eram duas instituições que haveriam de levar até os confins da
Terra o conhecimento e a prática do espírito de Dom Bosco.

A terceira profecia dizia respeito ao final não distante da vida de Pio IX. Este
efetivamente deixou de viver catorze meses decorridos do sonho.

A última profecia foi amarga para Dom Bosco: "Oh! se soubesses por quantas
vicissitudes terás ainda que passar!" Realmente, nos onze anos e dois meses que ainda
durou sua vida, lutas, fadigas e sacrifícios não lhe deram trégua até o último momento.

A delegacia de polícia de Borgo Dora era, quando do sonho, regida por um senhor que
tinha diversos conhecidos no Oratório. Tendo ouvido narrar o sonho, ficou muito
impressionado com a previsão das oito mortes. Durante todo o ano de 1877 observou
com atenção se a previsão realmente se cumpria. Quando soube que no último dia do
ano se realizara o oitavo óbito, resolveu abandonar o mundo, fez-se salesiano e
trabalhou muito, na Itália e também na América. Foi o Padre Angelo Piccono, cujo
nome permanece ainda na memória de muitos.

O PURGATÓRIO (segundo os santos)

A Justiça de Deus faz com que as almas do purgatório sofram para purificá-las,
santificá-las e torná-las dignas do esplendor da glória do Céu e da visão de Deus.
Sofrer é a condição das almas do purgatório. Desde que o pecado entrou no mundo, só
pela cruz Jesus nos salvou, e só pelo fogo do sofrimento (na luta contra o pecado e
carregando a cruz) chegamos ao céu. O purgatório foi chamado o oitavo sacramento
do fogo.

As almas do purgatório estão num estado de sofrimento que a nada se pode comparar
e nem se pode fazer uma ideia.

Santa Catarina de Gênova, chamada a teóloga do purgatório, a quem Nosso Senhor


revelou o sofrimento da expiação dos justos, diz que as penas do purgatório só tem um
termo de comparação: as penas do inferno.

Após uma visão do purgatório, exclamava: “Que coisa terrível é o purgatório! Confesso
que nada posso dizer e nem conceber que se aproxime sequer da realidade. Vejo que
os sofrimentos que as almas do purgatório padecem são tão dolorosos como as penas
do inferno”.

Santo Tomás de Aquino que a mesma coisa que Santa Catarina de Gênova, diz também
que as penas do purgatório ultrapassam a qualquer sofrimento deste mundo.

É o mais horroroso de todos os martírios.

Segundo os santos, as almas do purgatório sofrem tanto que não há na linguagem


humana que possa traduzir os tormentos terríveis que padecem. Santa Catarina de
Genova diz ser impossível traduzir na linguagem humana e o nosso entendimento não
pode conceber tal sofrimento. É preciso uma graça e uma iluminação especial de Deus
para compreender estas coisas, dizia ela.

São Gregório Magno reafirma a mesma verdade de outros santos: "as penas do
purgatório, apesar de serem passageiras, não são eternas, diz, são mais terríveis e
insuportáveis que todos os males desta vida".

Outro santo também diz: "Se o homem tivesse de suportar os tormentos do


purgatório, a dor o mataria num instante. Porém, a alma imortal, por sua natureza,
torna-se mais forte com a separação do corpo e, por isso, pode suportar tanto
sofrimento".

Há dois sofrimentos, duas penas principais no purgatório: a pena do dano ou


separação de Deus, e a pena do sentido.

A pena do dano

É a que sofrem as almas do purgatório por serem privadas da visão de Deus.

Não ver a Deus, cuja beleza infinita e bondade suprema elas compreendem agora de
modo tão claro e nítido leva a alma a sentir um martírio mais insuportável do que
todos os tormentos que possa padecer, mais do que o próprio fogo do purgatório.
Santo Tomás de Aquino tratando da pena do dano, confirmava esta verdade dizendo
ser mais insuportável, maior e mais terrível que a pena de sentido.

Aqui neste mundo, o apego às coisas da terra faz com que muitas vezes nos
esqueçamos de Deus e vivamos sem sentir e nem imaginar sequer o que seja estar
separado de Deus.

"Sentir um ímpeto de ir para Deus sem o poder satisfazer, isto, diz Santa Catarina de
Gênova, é o maior sofrimento que se possa imaginar, é propriamente o purgatório.
Este estado é um estado de morte, uma angústia inenarrável".

Sabeis o que é o suplício de quem está sufocado e não pode respirar? Que horror! A
alma está como sufocada, não pode respirar.

Tem-se visto neste mundo afeições tão profundas, almas que se amavam e não
puderam suportar a separação e morreram de dor. O que será então o purgatório?

O fogo do purgatório

Aprouve a Deus mostrar em espírito as sombrias moradas do Purgatório a algumas


almas privilegiadas, as quais revelariam os mistérios dolorosos que aí se passavam
para a edificação dos fiéis [1].

Foi deste número a ilustre Santa Francisca, fundadora das Oblatas, que morreu em
Roma, a 9 de março de 1440. Deus a favoreceu com grandes luzes a respeito do estado
das almas na outra vida. Ela viu o Inferno e os seus horríveis tormentos; viu também o
interior do Purgatório e a ordem misteriosa — quase como uma “hierarquia de
expiações” — que reina nesta parte da Igreja de Jesus Cristo.

Em obediência a seus superiores, que se viram obrigados a lhe imporem esta


obrigação, ela deu a conhecer tudo quanto Deus lhe havia manifestado; e suas visões,
escritas a pedido do venerável cônego Matteotti, seu diretor espiritual, gozam de toda
a autenticidade que se pode desejar nessas matérias.

A serva de Deus declara que, depois de ter suportado com horror indescritível a visão
do Inferno, saiu daquele abismo e foi conduzida por seu guia celestial até as regiões do
Purgatório. Ali não reinava nem o terror nem a desordem, nem o desespero nem a
escuridão eterna; ali a esperança divina difundia sua luz, de modo que, como lhe
disseram, este lugar de purificação também era chamado de “estadia de esperança”.
Ela viu ali almas que sofriam cruelmente, mas anjos as visitavam e assistiam em seus
sofrimentos.

O Purgatório, ela dizia, é dividido em três partes distintas, que são como que as três
grandes províncias daquele reino de sofrimento. Elas estão situadas uma abaixo da
outra, e são ocupadas por almas de diferentes ordens, estando estas mais
profundamente submersas quanto mais contaminadas e distantes estiverem da hora
de sua libertação.

A região mais baixa é repleta de um fogo violento, mas não tão obscuro quanto o do
Inferno; trata-se de um vasto mar de fogo, do qual são expelidas chamas imensas.
Inumeráveis almas encontram-se mergulhadas nessas profundezas: são aquelas que se
tornaram culpadas de pecados mortais, devidamente confessados, mas não
suficientemente expiados em vida. A serva de Deus então aprendeu que, por cada
pecado mortal perdoado, resta à alma culpada passar por um sofrimento de sete anos
[2]. Esse prazo não pode evidentemente ser encarado como uma medida definitiva,
mas como uma pena média, já que pecados mortais diferem em enormidade. Ainda
que as almas estejam envoltas pelas mesmas chamas, seus sofrimentos não são os
mesmos: eles variam de acordo com o número e a natureza dos pecados cometidos.

Neste Purgatório mais baixo a santa notou a presença de leigos e de pessoas


consagradas a Deus. Os leigos eram aqueles que, depois de uma vida de pecado,
tiveram a alegria de se converterem sinceramente; as pessoas consagradas a Deus
eram aquelas que não haviam vivido de acordo com a santidade do seu estado de vida.

Naquele mesmo momento, ela viu descer a alma de um sacerdote conhecido dela, mas
cujo nome ela não revela: o padre tinha a face coberta com um véu que escondia uma
mancha. Embora tenha levado uma vida edificante, este padre não havia sempre
observado com rigor a virtude da temperança, tendo procurado as satisfações da
mesa.

A santa foi conduzida então ao Purgatório intermediário, destinado para as almas que
haviam merecido um castigo menos rigoroso. Aí havia três distintos compartimentos:
um que lembrava um imenso calabouço de gelo, cujo frio era indescritivelmente
intenso; o segundo, ao contrário, era como um grande caldeirão de óleo e massa
fervente; o terceiro tinha a aparência de um lago de metal líquido semelhante a ouro
ou prata fundidos.

O alto Purgatório, que a santa não descreve, é a morada temporária das almas que
menos sofrem — com exceção da pena de perda [3] —, e estão muito próximas do
feliz momento de sua libertação.

Tal é, em substância, a visão de Santa Francisca Romana relativa ao Purgatório.

O que segue, agora, é um registro de Santa Maria Madalena de Pazzi, uma carmelita
de Florença, tal como vai relatado em sua biografia, escrita pelo pe. Cepare. Sua
revelação dá uma figura mais completa do Purgatório, ao passo que a visão
precedente não faz senão traçar os seus contornos.

Algum tempo antes de sua morte, que aconteceu em 1607, a serva de Deus, Maria
Madalena de Pazzi, estando uma noite com várias outras religiosas no jardim do
convento, foi arrebatada em êxtase e viu o Purgatório aberto diante de si. Ao mesmo
tempo, como ela deu a conhecer depois, uma voz lhe fez o convite para visitar todas as
prisões da Justiça divina e contemplar como são verdadeiramente dignas de
compaixão todas as almas detidas neste lugar.

Neste momento, ouviu-se ela dizer: “Sim, eu irei”, consentindo em empreender esta
dolorosa jornada. De fato, ela caminhou por duas horas em torno do jardim, o qual era
muito grande, fazendo pausas de tempos em tempos. A cada vez que interrompia o
passo, ela contemplava atentamente os sofrimentos que lhe eram mostrados. Ela foi
vista, então, apertando com força as mãos e pedindo compaixão, seu rosto tornou-se
pálido e seu corpo curvou-se sob o peso do sofrimento, em presença do terrível
espetáculo com o qual ela se confrontava.

A santa começou a lamentar em alta voz: “Misericórdia, meu Senhor, misericórdia!


Descei, ó Sangue Precioso, e libertai estas almas de sua prisão. Pobres almas! Sofreis
tão cruelmente e, no entanto, estais tão contentes e alegres. Os cárceres dos mártires,
em comparação com estes, eram jardins de deleite. Não obstante, existem outros
ainda mais profundos. Quão feliz sorte seria a minha, se não fosse obrigada a descer
para estes lugares!”

Ela desceu, no entanto, porque foi forçada a continuar seu caminho. Tendo dado
alguns passos, porém, ela parou aterrorizada e, suspirando, gritou: “Quê? Até
religiosos nesta morada sombria! Bom Deus, como eles são atormentados! Ah,
Senhor!” A santa não explica a natureza dos sofrimentos que tinha diante dos olhos,
mas o horror que ela manifestava ao contemplá-los fazia com que ela suspirasse a
cada passo que dava.

Daí ela passou a lugares menos obscuros. Eram as prisões das almas simples e de
crianças nas quais a ignorância e a falta de razão extenuaram muitas faltas. Seus
tormentos pareciam à santa muito mais suportáveis que os das outras pessoas. Nada
havia ali a não ser gelo e fogo. Ela notou que estas almas tinham consigo seus anjos da
guarda, os quais as fortificavam enormemente com sua presença; mas ela também via
demônios cujas formas pavorosas faziam aumentar seus sofrimentos.

Avançando um pouco mais o passo, ela viu almas ainda mais desafortunadas, e ouviu-
se ela gritar: “Ó, quão horrível é este lugar! Ele é cheio de demônios horrendos e
tormentos inacreditáveis! Quem, ó meu Senhor, são as vítimas dessas cruéis torturas?
Ai! Elas estão sendo perfuradas com espadas afiadas, elas estão sendo cortadas em
pedaços.” Foi-lhe revelado, então, que aquelas eram as almas cuja conduta havia sido
contaminada pela hipocrisia.

Avançando um pouco, ela viu uma grande multidão de almas que eram feridas, por
assim dizer, e esmagadas sob uma prensa; e ela entendeu que aquelas eram as almas
que se haviam apegado à impaciência e à desobediência durante suas vidas. Ao
contemplá-las, os olhares, os suspiros e toda a atitude da santa exprimiam compaixão
e terror.

Um momento depois sua agitação aumentou, e a santa soltou um grito terrível. Era o
cárcere dos mentirosos que agora se abria diante dela. Depois de o considerar
atentamente, ela gritou bem alto: “Os mentirosos são confinados em um lugar na
vizinhança do Inferno, e seus sofrimentos são excessivamente grandes. Chumbo
fundido é derramado dentro de suas bocas; eu os vejo queimar e, ao mesmo tempo,
tremer de frio.”

Ela foi então à prisão daquelas almas que haviam pecado por fraqueza, e ouviu-se ela
exclamar: “Ai! Eu havia pensado que os encontraria entre aqueles que haviam pecado
por ignorância, mas eu me enganei; vós queimais com um fogo mais intenso.”

Mais adiante, ela observou almas que se haviam apegado demais aos bens deste
mundo e haviam pecado por avareza. “Que cegueira”, ela disse, “ter buscado tão
ardentemente uma fortuna perecível! Aqueles a quem as riquezas não puderam saciar
o suficiente aqui são devorados com tormentos. Eles se fundem como metal na
fornalha ardente.”

Daí ela passou ao lugar onde as almas aprisionadas haviam se manchado com a
impureza. Ela as viu em um cárcere tão sujo e pestilento que a visão lhe deu náuseas, e
ela imediatamente deu as costas àquele espetáculo repugnante. Vendo os ambiciosos
e os orgulhosos, ela disse: “Vede aqueles que quiseram brilhar diante dos homens!
Agora estão condenados a viver nesta escuridão pavorosa.”

Foram-lhe mostradas, então, aquelas almas que haviam sido culpadas de ingratidão
para com Deus. Elas eram vítimas de tormentos indescritíveis e afogadas, por assim
dizer, em um lago de chumbo fundido, por haver feito secar, com sua ingratidão, a
fonte da piedade.

Finalmente, em um último cárcere, foram-lhe mostradas as almas que não se tinham


dado a nenhum vício em particular, mas que, por falta da devida vigilância sobre si
mesmas, cometeram todo tipo de faltas leves. A santa notou que estas almas
tomavam parte nos castigos de todos os vícios, em um grau moderado, porque as
faltas que elas cometeram apenas de tempos em tempos tornaram-nas menos
culpadas do que aqueles que as tinham cometido habitualmente.

Após esta última estação, a santa deixou o jardim, implorando a Deus que nunca mais
a fizesse testemunha de um espetáculo tão desolador: ela sentia que não tinha forças
para suportá-lo.

Seu êxtase continuou, no entanto, e conversando com Jesus ela falou: “Dizei-me,
Senhor, qual era o vosso desígnio em descobrir-me aquelas terríveis prisões, das quais
eu sabia tão pouco e agora compreendo ainda menos? Ah, agora eu vejo: quisestes
dar-me o conhecimento de vossa infinita santidade e fazer-me detestar cada vez mais
a mínima mancha de pecado, tão abominável aos vossos olhos.”

Referências: Extraído e levemente adaptado da obra “Purgatory: Explained by the Lives


and Legends of the Saints” (c. VI), Londres: Burns & Oates, 1893, pp. 11-16.
O PURGATÓRIO (segundo Santa Catarina de Gênova)

A voz de Jesus se faz sentir no íntimo da minha alma com extrema clareza:

Quero que se ore por estas santas almas do Purgatório, porque o meu Coração divino
arde de amor por elas. Desejo vivamente a liberação delas, para uni-las totalmente a
mim.

E as penas por quanto terríveis possam ser, são sempre incomparavelmente leves em
comparação à ofensa infinita que constitui o pecado.

O Purgatório é como uma prisão de luz e de fogo, constituído da Misericórdia divina: a


alma deve purgar-se da pena do seu pecado para poder entrar na beatitude eterna.

Vi com os olhos da alma um fogo que causava horror sem limite nem forma, que
queimava sem nunca variar, em um silencio absoluto... Vi neste fogo milhões de
pobres almas estreitas uma contra as outras, mas sem que pudessem se comunicar,
senão aquele mesmo fogo.

Este grande Purgatório é como o inferno, tirando-se a eternidade das penas e o ódio
perante Deus e das outras almas, e a desesperação.

Se não me engano, vi que elas neste estado eram mais purificadas que consoladas,
mais queimadas que iluminadas: é um estado terrível.

Vi, com os olhos da alma, um mar de fogo abrir-se na minha frente. Ele fazia rumor,
imensas chamas claríssimas se reproduzem e se desfazem incessantemente.

E aqui, milhões de almas estendem as mãos, submersas no fogo e nas chamas que se
levantam com um força impetuosa.

É como um movimento da alma, um início de caminho através do Céu, mas sem o


mínimo desejo pessoal; é como um lançar interior que a leva ou a empurra à Deus.
Veem certamente purificadas, através de muito sofrimento, mas também iluminadas,
assim as consola e permite a elas de glorificar Deus não somente abandonando-se ao
seu Puro Querer, mas assumindo uma quase iniciativa de agradecimento.

Frequentemente, depois do juízo particular, a alma vai no Grande Purgatório; ela fica
como tonta e sem forças, porque para ela é a descoberta do pecado, da sua gravidade,
dos seus efeitos, das suas implicações.

Neste período a alma é como se fosse paralisada: imóvel, ela contempla seja a justiça
de Deus que se exercita nela, seja a Misericórdia de Deus que valeu a faze-la salva.

Depois ela se coloca em movimento em direção a Deus, que a atrai, que a transporta
através do seu amor infinito; é aqui que ela passa no Médio Purgatório.
No Médio Purgatório, a alma se afronta com o Amor, mas contempla este Amor
infinito que a atrai. No Médio Purgatório, a alma sai de si mesma e descobre tudo
aquilo que significa a sua participação à Igreja.

É como o alto do Purgatório, um mundo de luz ardente e de paz. É o sofrimento do


amor levado ao seu paroxismo, um padecimento de amor, o júbilo total, mais suave,
unido ao sofrimento pior, o mais devastador.

É o reino do puro amor e do nu sofrimento; as almas seguem através da Jerusalém


celeste, se apresentam na frente do Rei.

Elas ficam mais ou menos um longo tempo, mas nunca como no Grande e Médio
Purgatório, porque a intensidade dos langores de amor da Entrada constitui uma
rápida e ulterior purificação.

Escutei as almas cantarem: Me liberais da morte. Conservais os meus pés do tombo,


para que eu caminhe à tua presença na luz dos viventes, ó Deus.

O PURGATÓRIO (segundo Dom Bosco)

Ontem à noite, meus caros filhos, havia-me deitado e, não conseguindo adormecer
logo, estava pensando na natureza e no modo de existir da alma; como ela era feita;
de que modo poderia encontrar-se e falar na outra vida, estando separada do corpo;
como faria para trasladar-se de um lugar a outro; como nos poderemos conhecer uns
aos outros depois de mortos, não sendo senão puros espíritos. E quanto mais pensava
nessas coisas, mais obscuro me parecia tal mistério.

Enquanto divagava por essas ideias e outras semelhantes, adormeci, e me pareceu que
estava na estrada que conduz a... (e nomeou a cidade) e que caminhava naquela
direção. Andei durante algum tempo, atravessei lugares para mim desconhecidos, até
que, em certo momento, ouvi que alguém chamava pelo nome. Era a voz de uma
pessoa parada na estrada.

- Vem comigo – disse – e poderás ver logo o que desejas!

Obedeci imediatamente. Mas a tal pessoa andava com a rapidez do pensamento, e eu


no mesmo passo que meu guia. Andávamos de maneira tal que nossos pés nem
tocavam o solo. Chegados por fim a uma certa região que eu desconhecia, o guia
parou. Erguia-se sobre uma preeminência do terreno um magnífico palácio de
construção admirável. Não sabia onde estava, nem sobre que montanha; nem me
recordo mais se estava realmente sobre uma montanha ou se estava no ar, sobre
nuvens. Era inacessível e não se via caminho algum para poder chegar até ele. Suas
portas eram de considerável altura.

- Sobe a esse palácio – me disse o guia.


- Como vou fazer? – observei eu – como fazer para subir? Aqui por baixo não há
entrada, e não tenho asas.

- Entra! – replicou ele com autoridade. E, vendo que eu não me movia, disse:

- Faz como eu: levanta os braços com boa vontade e subirás. Vem comigo.

E assim dizendo, levantou ao alto as mãos, dirigindo-as para o céu. Eu também abri os
braços, e me senti num só instante alçado pelos ares como uma nuvenzinha. Eis que
chego aos umbrais do palácio. O guia me acompanhara até lá.

- Que há aqui dentro? – perguntei.

- Entra, visita-o e verás. No fundo, num salão, encontrarás quem te ensinará.

E desapareceu, ficando eu só, como guia de mim mesmo.

Entrei no pórtico, subi as escadas e cheguei a um salão verdadeiramente régio.


Percorri salas espaçosas, aposentos riquíssimos de ornamentos e longos corredores.
Caminhava com velocidade acima da natural.

Cada sala brilhava com magnificência de tesouros espantosos, e naquela velocidade


percorri tantos aposentos que me foi impossível contá-los.

Mas uma coisa era mais admirável: para correr com a rapidez do vento, eu não movia
os pés; suspenso no ar com as pernas juntas, deslizava sem esforço como sobre um
cristal, mas sem tocar o pavimento.

Passando assim de um aposento a outro, vi finalmente no fundo de um corredor uma


porta. Entrei e me encontrei num salão grande, que superava em magnificência a
todos os demais. No fundo dele, sobre uma cadeira de espaldar alto, avistei um Bispo,
majestosamente sentado, em posição de quem se prepara para dar audiência.
Aproximei-me com respeito e fiquei admiradíssimo por reconhecer naquele prelado
um íntimo amigo meu, Era Dom ... (e disse o nome), Bispo de ..., falecido havia dois
anos. Parecia nada sofrer. Seu aspecto era radiante, afetuoso e de tão grande beleza
que nem sequer poderia exprimir.

- Oh! Senhor Bispo, vós por aqui? – perguntei, com grande alegria.

- Não me vê? – respondeu o Bispo.

- Mas, como isso? Ainda estais vivo? Não morrestes?

- Sim, morri.
- Se morrestes, como é que estais sentado aqui tão radiante e satisfeito? Se ainda
estais vivo, por caridade, esclarecei-me: na diocese de ... há já um outro Bispo, Dom ...,
em vosso lugar. Como é que se esclarece essa confusão?

- Esteja tranquilo; não se preocupe que já estou morto...

- Ainda bem que já está um outro em vosso lugar.

- Sei disso. E o Sr., Dom Bosco, está vivo ou está morto?

- Eu estou vivo. Não vedes que estou aqui em corpo e alma?

- Aqui não se pode vir com o corpo.

- Mas, sem embargo, aqui estou.

- É o que lhe parece; mas não é assim...

Eu me apressava em falar-lhe, fazendo perguntas e mais perguntas, sem receber


resposta alguma.

- Como pode ser que eu, que estou vivo, esteja aqui convosco, Senhor Bispo, que já
morrestes?

Tinha medo de que o Bispo desaparecesse, pelo que lhe roguei:

- Senhor Bispo, por caridade, não me deixeis. Necessito saber muitas coisas. Dizei-me,
Senhor Bispo, salvastes vossa alma?

O Bispo, vendo-me tão ansioso, disse: - Não se aflija tanto e fique calmo, que não
fugirei. Pode falar.

- Dizei-me, Senhor Bispo, estais salvo?

- Olhe-me; observe como estou robusto, cheio de louçania e brilho.

Seu aspecto me dava realmente a certeza de que estava salvo; mas, não me
contentando com essa impressão, repliquei:

- Dizei-me se estais salvo, sim ou não.

- Sim, estou em lugar de salvação.

- Mas já estais no Paraíso, gozando do Senhor? ou no Purgatório?

- Estou em lugar de salvação, mas ainda não vi a Deus e ainda necessito de que reze
por mim.
- E quanto tempo ainda devereis estar no Purgatório?

- Olhe aqui e leia! – disse, apresentando-me uma folha de papel.

Tomei na mão o papel; observei atentamente, mas, nada vendo escrito, disse-lhe:

- Nada vejo!

- Veja bem o que nele está escrito e leia!

- Já olhei com atenção e estou olhando novamente, mas nada posso ler porque nada
há escrito aqui.

- Veja com mais atenção!

- Vejo um papel com floreados vermelhos, azuis, verdes, cor de violeta, mas não
encontro letra alguma.

- São algarismos.

- Não vejo letras nem números.

O Bispo olhou o papel que eu tinha nas mãos e disse:

- Já sei porque o Sr. não vê nada; vire o papel ao contrário.

Examinei a folha com maior atenção, virei-a de todos os lados; mas nem de um lado
nem do outro nada consegui ler. Somente me pareceu ver, entre uma infinidade de
traços e desenhos, o número 2.

- O Sr., Dom Bosco, sabe por que é necessário ler ao contrário? – continuou o Bispo – É
porque os juízos do Senhor são completamente distintos dos do mundo. O que os
homens julgam sabedoria é tolice aos olhos de Deus.

Não tive coragem de insistir para que explicasse mais claramente, e disse:

- Senhor Bispo, não vos afasteis; quero perguntar-vos mais coisas.

- Pois pergunte, que lhe escuto.

- Eu me salvarei?

- Deve ter esperança nisso.

- Não me façais sofrer; dizei-me logo se me salvarei.


- Não sei.

- Pelo menos dizei-me se estou na graça de Deus.

- Não sei.

- E meus meninos, salvar-se-ão?

- Não sei.

- Mas, por favor, dizei-me, estou implorando.

- O Sr. estudou Teologia e portanto pode saber, pode dar-se a exposta a si mesmo.

- Mas, como? Estais em lugar de salvação e ignorais essas coisas?

- O Senhor as dá a conhecer a quem quer; e quando quer que elas sejam comunicadas,
dá ordem e permissão para tal. A não ser assim, ninguém pode comunicá-lo aos que
ainda vivem.

Eu me achava nervoso, na impaciência de fazer mais perguntas, e as fazia


apressadamente, com temor de que o Senhor Bispo se retirasse.

- Dizei-me algo para transmitir de vossa parte aos meus meninos.

- O Sr. sabe tanto quanto eu o que devem fazer. Tendes a Igreja, o Evangelho e as
outras Escrituras que tudo vos dizem. Diga-lhes que salvem suas almas, pois tudo o
mais de nada serve.

- Já sabemos que devemos salvar a alma. Mas, que devemos fazer para salvá-la? Dê-
me alguma recomendação especial para poder salvá-la, e que nos faça recordar de vós.
Eu o repetirei aos meus rapazes em vosso nome.

- Diga-lhes que sejam bons e sejam obedientes.

- Quem é que não sabe essas coisas?

- Diga-lhes que sejam puros e que rezem.

- Mas, explicai-vos em termos mais concretos.

- Diga-lhes que se confessem com frequência e façam boas confissões.

- Alguma outra coisa ainda mais concreta...


- Direi, já que quer. Diga-lhes que têm diante dos olhos uma neblina, e que quando
alguém chega a vê-la já está muito adiantada. Que afastem essa neblina, como se lê
nos Salmos: Nubem dissipa.

- Que neblina é essa?

- São todas as coisas mundanas, que impedem de ver as coisas celestiais como de fato
são.

- E que devem fazer para afastar essa neblina?

- Considerem o mundo exatamente como ele é: Mundus totus in maligno positus est
[mundo está todo posto no maligno]; e então salvarão a alma. Que não se deixem
enganar pelas aparências do mundo. Os jovens creem que os prazeres, as alegrias, as
amizades do mundo, podem fazê-los felizes e, portanto, não esperam se não o
momento de poder gozar desses prazeres. Mas recordem-se de que tudo é vaidade e
aflição de espírito, e tomem o hábito de ver as coisas do mundo não como elas
parecem, mas como realmente são.

- E essa neblina, como é principalmente produzida?

- Assim como a virtude que mais brilha no paraíso é a pureza, assim a obscuridade e a
neblina são produzidas principalmente pelo pecado de imodéstia e impureza. É como
uma negra nuvem densíssima que tolda a visão e impede os jovens de verem o
precipício rumo ao qual caminham. Diga-lhes, portanto, que conservem zelosamente a
virtude da pureza, porque os que a possuem florebunt sicut lilium in civitate Dei
[florescerão como o lírio na cidade de Deus].

- E que se requer para conservar a pureza? Dizei-me, e o direi aos meus caros jovens
de vossa parte.

- Recolhimento, obediência, fuga do ócio e oração.

- E que mais?

- Oração, fuga do ócio, obediência e recolhimento.

- Nada mais?

- Obediência, recolhimento, oração e fuga do ócio. Recomende-lhes estas coisas, que


elas são suficientes.

Teria querido perguntar-lhe muitas coisas mais, porém não me vinham à lembrança.
Assim é que, mal o Bispo terminou de falar, impaciente para vos transmitir aqueles
avisos deixei apressadamente o salão e corri para o Oratório. Voava com a rapidez do
vento, e num instante encontrei-me na porta de casa. Mas, ao chegar, parei e pensei:
- Por que não permaneci mais tempo com o Senhor Bispo de... Teria conseguido ainda
melhores esclarecimentos. Fiz mal em deixar escapar uma ocasião tão boa. Teria
aprendido muitas coisas interessantes.

E imediatamente voltei atrás com a mesma rapidez com que tinha vindo, temeroso de
não mais encontrar o Senhor Bispo. Entrei novamente no palácio e no salão.

Mas, que mudança se havia operado em poucos instantes! O Bispo, pálido como cera,
estava estendido sobre um leito e parecia um cadáver; em seus olhos brilhavam ainda
suas últimas lágrimas; estava em agonia. Só pelo ligeiro movimento do peito,
produzido pelos últimos alentos, se deduzia que ainda estava vivo. Aproximei-me com
grande preocupação e perguntei:

- Senhor Bispo, que vos aconteceu?

- Deixe-me! – respondeu com um gemido.

- Teria ainda muitas coisas que vos perguntar.

- Deixe-me só! Sofro imensamente.

- Que posso fazer por vós?

- Reze e deixe-me ir embora!

- Para onde?

- Para onde me conduz a mão onipotente de Deus.

- Mas, Senhor Bispo, rogo-vos que me digais o local.

- Sofro imensamente, deixe-me.

Eu repetia: - Mas ao menos dizei-me: que posso fazer por vós?

- Reze por mim.

- Uma só palavra: tendes algum encargo que eu possa fazer-vos no mundo? Não
quereis dizer nada para vosso sucessor?

- Vá ao atual Bispo de... e diga-lhe, de minha parte, tal e tal coisa...

As coisas que me disse não vos interessam, queridos jovens, e por isso as omito.

O Bispo acrescentou:

- Diga também a tais e tais pessoas, tais e tais coisas secretas...


(Também sobre esses recados Dom Bosco se calou. Mas tanto as primeiras quanto as
segundas, parece que se referem a avisos e remédios com respeito à sua antiga
diocese.)

- Nada mais?

- Diga a seus jovens que eu sempre os quis muito bem, e que enquanto vivi sempre
rezei por eles; ainda agora me recordo deles. Que rezem eles por mim.

- Tende certeza, Senhor Bispo, de que assim o direi. E começaremos imediatamente a


oferecer sufrágios por vossa alma. Mas quando o Senhor Bispo estiver no Paraíso,
lembre-se de nós.

O Bispo tinha tomado um aspecto ainda mais sofredor. Era um tormento vê-lo. Sofria
muitíssimo. Era uma agonia das mais angustiosas.

- Deixe-me – repetiu – deixe-me que vá para onde o Senhor me chama.

- Senhor Bispo! Senhor Bispo! – repetia eu cheio de indizível compaixão.

- Deixe-me! Deixe-me!

Parecia que expirava. Uma força invisível o arrastou dali para habitações mais
interiores, de modo que desapareceu.

Eu, com tanto sofrer, assustado e comovido, quis voltar atrás; mas, tendo batido com o
joelho num objeto qualquer daquelas salas, acordei e me encontrei de repente deitado
no meu quarto.

Como vedes, jovens, este é um sonho como todos os outros sonhos; e no que se refere
a vós, não tendes necessidade de explicações, porque todos o entendestes bem.

E Dom Bosco concluiu a narração dizendo:

Neste sonho aprendi tantas coisas a respeito da alma e do Purgatório como antes
jamais havia chegado a compreender; e as vi tão claramente que jamais as esquecerei.

Assim termina a narração de nossos apontamentos.

Parece que em dois quadros distintos o Venerável Dom Bosco quis expor o estado de
graça das almas do Purgatório e seus sofrimentos expiatórios.

Nenhum comentário fez acerca do estado daquele bom Bispo. Sabe-se, aliás, por
revelações digníssimas de fé e pelo testemunho dos Santos Padres, que pessoas de
santidade consumada, lírios de virginal pureza, carregados de méritos, fazedores de
milagres que nós hoje veneramos nos altares, por defeitos ligeiríssimos deveram
permanecer um tempo até prolongado no Purgatório. A Justiça Divina quer que, antes
de entrar no Céu, cada um pague até a última parcela de suas dívidas.

Nós que escrevemos isto, tendo perguntado algum tempo depois a Dom Bosco se
havia executado os encargos recebidos daquele Prelado, com a confiança com que nos
honrava, respondeu-nos:

Sim, executei fielmente o que me recomendou.

Observaremos também que a pessoa que transcreveu o sonho omitiu uma


circunstância que nós recordamos, talvez porque então não entendia seu sentido e
importância.

Dom Bosco havia perguntado a certa altura quanto tempo ainda viveria, e o Bispo lhe
havia apresentado um papel cheio de rabiscos entrecruzados parecidos com o número
8, mas sem dar explicação alguma desse mistério.

O INFERNO (segundo Santa Teresa D'Ávila)

1. Havia muito tempo que o Senhor me fazia muitas graças já referidas e outras ainda
maiores, quando um dia, estando em oração, achei-me subitamente, ao que me
parecia, metida corpo e alma no inferno. Entendi que o Senhor queria fazer-me ver o
lugar que os demônios aí me haviam preparado, e eu merecera por meus pecados.
Durou brevíssimo tempo. Contudo ainda que vivesse muitos anos, acho impossível
esquecê-lo.

A entrada pareceu-me um túnel longo e estreito, semelhante a um forno muito baixo,


escuro e apertado. O chão tinha aparência de uma água, ou antes, de um lodo
sujíssimo e de odor pestilencial, cheio de répteis venenosos. No fundo havia uma
concavidade aberta numa parede, como um armário, onde me vi, encerrada de
maneira muito apertada.

2. O tormento interior é tal, que não há palavras para o definir, nem se entende como
é realmente. Na alma senti tal fogo, que não tenho capacidade para o descrever. No
corpo eram incomparáveis as dores. Tenho passado nesta vida dores gravíssimas. No
dizer dos médicos são as maiores que se podem suportar, como, por exemplo, quando
se encolheram todos os meus nervos, e fiquei tolhida. Já não falo de outras muitas
dores de diversos gêneros e até algumas causa das pelo demônio. Posso afirmar que
tudo foi nada em comparação do que ali experimentei.

O pior era saber que seria sem fim, sem jamais cessar.

Sim, repito, tudo mais pode chamar-se nada em relação ao agonizar da alma: é um
aperto, um afogamento, uma aflição tão intensa, e acompanhada de uma tristeza tão
desesperada e pungente, que não sei como posso explicar semelhante estado!
Compará-lo à sensação de que vos estão sempre a arrancar a alma, é pouco. Em tal
caso, seria como se alguém nos acabasse com a vida. Aqui é a própria alma que se
despedaça. O fato é que não sei como descrever aquele fogo interior e aquele
desespero que se sobrepõem a tão grandes tormentos. Eu não via quem os provocava,
mas sentia-me queimar e retalhar. Piores, repito, são aquele fogo e aquele desespero
que me consumiam interiormente.

Em lugar tão pestilencial, sem esperar consolo, é impossível sentar-se, ou deitar-se,


nem há espaço para tal. Puseram-me numa espécie de fenda cavada na muralha. As
próprias paredes, espantosas à vista, oprimem, e tudo ali sufoca. Por toda parte trevas
escuríssimas. Não há luz. Não entendo como, sem claridade, se enxerga tudo,
causando dor nos olhos. Nesta ocasião o Senhor não quis que eu visse mais de tudo
aquilo que há no inferno.

Em outra visão, vi coisas horripilantes acerca do castigo de alguns vícios. Pareceram


muito mais horrorosas à vista. Como não sentia a pena, não me causaram tanto temor
como na primeira visão, na qual o Senhor quis que eu verdadeiramente sentisse
aquelas torturas e aquela aflição de espírito como se o corpo as estivesse padecendo.
Como foi isso, não sei, mas bem entendi ser grande graça do Senhor querer que eu
visse, com meus olhos, de onde sua misericórdia me havia livrado.

Verdadeiramente é nada ouvir discorrer, ou ainda meditar, sobre a diversidade dos


tormentos, como eu de outras vezes havia feito, embora raramente. A feição de minha
alma não é ser levada pelo temor. Lia que os demônios atenazam as almas e lhes
infligem outros suplícios. Tudo é nada a respeito da verdadeira pena, que é muito
diferente. Numa palavra, é tão diferente quanto o esboço o é da realidade. Queimar-se
aqui na terra é sofrimento muito leve em comparação com aquele fogo de lá.

4. Fiquei tão aterrorizada, e ainda agora o estou enquanto escrevo, apesar de terem
decorrido quase seis anos. De tanto temor, tenho a impressão de ficar gelada. Desde
então, ao que me recordo, cada vez que tenho sofrimentos ou dores, tudo o que se
pode passar na terra, me parece nada. Penso que em parte nos queixamos sem
motivo. Foi esta, repito, uma das maiores graças que o Senhor me fez. Valeu-me
imensamente, quer para perder o medo quanto às tribulações e contradições desta
vida, quer para me esforçar em padecê-las e a dar graças ao Senhor, por me ter
livrado, ao que agora me parece, de males tão perpétuos e terríveis.

O INFERNO (segundo Santa Faustina)

Hoje, conduzida por um Anjo, fui levada às profundezas do Inferno um lugar de grande
castigo, e como é grande a sua extensão. Tipos de tormentos que vi:
- Primeiro tormento que constitui o Inferno é a perda de Deus;
- O segundo, o contínuo remorso de consciência;
- O terceiro, o de que esse destino já não mudará nunca;
- O quarto tormento, é o fogo que atravessa a alma, mas não a destrói; é um tormento
terrível, é um fogo puramente espiritual, aceso pela ira de Deus;
- O quinto é a contínua escuridão terrível cheiro sufocante e, embora haja escuridão,
os demônios e as almas condenadas veem-se mutuamente e veem todo o mal dos
outros e o seu.
- O sexto é a continua companhia do demônio;
- O sétimo tormento, o terrível desespero, ódio a Deus, maldições, blasfêmias.
São tormentos que todos os condenados sofrem juntos. mas não é ó fim dos
tormentos. Existem tormentos especiais para as almas, os tormentos dos sentidos.
Cada alma é atormentada com o que pecou, de maneira horrível e indescritível.
Existem terríveis prisões subterrâneas, abismos de castigo, onde um tormento se
distingue do outro. Eu teria morrido vendo esses terríveis tormentos, se não me
sustentasse a onipotência de Deus.
Que o pecador saiba que será atormentado com o sentido com que pecou, por toda a
eternidade.

Estou escrevendo por ordem de Deus, para que nenhuma alma se escuse dizendo que
não há inferno ou que ninguém esteve lá e não sabe como é.

Eu, Irmã Faustina, por ordem de Deus, estive nos abismos para falar às almas e
testemunhar que o Inferno existe. Sobre isso não posso falar agora, tenho ordem de
Deus para deixar isso por escrito. Os demônios tinham grande ódio contra mim, mas,
por ordem de Deus tinham que me obedecer. O que eu escrevi dá apenas uma pálida
imagem das coisas que vi.; Percebi, no entanto, uma coisa: o maior número das almas
que lá estão é justamente daqueles que não acreditavam que o Inferno existisse.
Quando voltei a mim, não podia me refazer do terror de ver como as almas, sofrem
terrivelmente ali e, por isso, rezo com mais fervor ainda pela conversão dos pecadores;
incessantemente, peço a misericórdia de Deus para eles. "O meu Jesus, prefiro
agonizar até o fim do mundo nos maiores suplícios a ter que vos ofender com o menor
pecado que seja."

O INFERNO (segundo aparições de Fátima)

Nossa Senhora mostrou-nos um grande mar de fogo que parecia estar debaixo da
terra. Mergulhados nesse fogo, os demônios e as almas, como se fossem brasas
transparentes e negras ou bronze com forma humana, que flutuavam no incêndio

levadas pelas chamas; que delas mesmas saiam, juntamente com nuvens de fumo,
caindo para todos os lados, semelhante ao cair das fagulhas em grandes incêndios,
sem peso nem equilíbrio, entre gritos e gemidos de dor , desespero que horrorizava e
fazia estremecer de pavor. Os demônios; distinguiam-se por formas horríveis e
asquerosas de animais espantosos e desconhecidos, mas transparentes como negro
carvão em brasas.

Em seguida, levantamos os olhos para Nossa Senhora a que nos disse com bondade e
tristeza Vistes o inferno para onde vão as almas dos pobres pecadores. Para as salvar,
Deus quer estabelecer no mundo a devoção ao meu imaculado coração Imaculado
Coração. Se fizerem; salvar-se-ão muitas almas e terão paz: A guerra vai acabar mas, se
não deixarem de ofender a Deus, no reinado de Pio XI começará outra pior. Quando
virdes uma noite alumiada por uma luz desconhecida que é o grande sinal que Deus
nos dá de que vai punir o mundo de seus crimes, por meio da guerra, da fome e de
perseguições a Igreja e ao Santo Padre. Para a impedir ,virei pedir a consagração da
Rússia a Meu Imaculado Coração a comunhão reparadora aos primeiros sábados

O INFERNO (segundo Dom Bosco)

1. O inferno é um lugar destinado pela justiça divina para punir com suplícios eternos
os que morrem em pecado mortal.

A primeira pena que os condenados sofrem no inferno é a pena dos sentidos, que são
atormentados por um fogo que queima horrivelmente, sem nunca diminuir de
intensidade. Fogo nos olhos, fogo na boca, fogo em todas as partes.

Cada sentido sofre a própria pena;

Os olhos: Sofrem pela fumaça e pelas trevas e são aterrados pela vista dos demônios e
dos outros condenados.

Os ouvidos: Dia e noite, só escutam contínuos uivos, prantos e blasfêmias.


O olfato: Sofre enormemente pelo mau cheiro daquele enxofre e pez ardente que o
sufoca.

A boca: É atormentada por sede devoradora e fome canina: "Et Famem patiéntur ut
canes". O mau rico no meio daqueles tormentos, ergueu o olhar ao Céu e pediu, como
grande graça, uma pequena gota de água para mitigar a secura de sua língua e até essa
gota de água lhe foi negada

Por isso, aqueles infelizes, atormentados pelo fogo, choram, gritam e se desesperam.
Oh! inferno, inferno ! Como são infelizes os que caem nos teus abismos! - E tu que
dizes, meu filho? Se agora não podes conservar um dedo sobre a pequena chama de
uma vela, se não podes aguentar nem uma fagulha de fogo na mão sem gritar, como
poderás aguentar-te então entre aquelas chamas por toda a eternidade?

2. A Segunda Pena é a Pena nas potências da alma.

Considera além disso, meu filho, o remorso que experimenta a consciência dos
condenados. Eles padecerão um inferno na memória, na inteligência, na vontade.

MEMÓRIA: Recordarão continuamente ó motivo da sua perdição, isto é, por terem


querido, secundar alguma paixão. Esta lembrança é o verme que nunca morre: Vermis
eórum non móritur. Recordarão o tempo que Deus lhes deu para evitar a perdição, os
bons exemplos dos companheiros, os propósitos feitos e não cumpridos. Pensarão nos
sermões ouvidos, nos avisos do confessor, nas boas inspirações para deixar o pecado;
vendo que já não há remédio, lançarão gritos desesperados.
INTELIGÊNCIA: A inteligência conhecerá finalmente o grande bem que perdeu. A alma
separada do corpo, ao apresentar-se no tribunal Divino, entrevê a beleza de Deus,
conhece toda a sua bondade, chega quase a contemplar por um instante os cantos
harmoniosíssimos dos Anjos e dos Santos. Que dor verificar que perdeu tudo isso para
sempre! Quem poderá resistir a tais tormentos?

VONTADE: A vontade nada terá do que deseja, e ao contrário padecerá todos os males

3. Meu Filho, Tu que agora não te importas de perder o teu Deus e o paraíso
conheceras tua cegueira quando vires; tantos companheiros teus, mais ignorantes e
mais pobres do que tu triunfarem e gozarem no reino dos Céus, ao passo que tu serás
arrojado para longe daquela pátria feliz, do gozo do mesmo Deus, da companhia da
Santíssima Virgem e dos Santos. Eia pois, faz penitencia, não esperes para quando não
houver mais tempo: entrega-te a Deus.

Quem sabe se não é este o último chamado, e se não correspondes, quem sabe se
Deus não te abandona e não te deixa cair naqueles eternos suplícios! Oh! Meus Jesus,
livrai-me do inferno: A Poenis inférni libera me, Domine.

Dom Bosco teve um sonho no qual era conduzido por um Anjo ao inferno. Assustado
viu a condenação de vários alunos do seu oratório. Neste sonho existe uma verdadeira
catequese sobre a condenação de uma alma. Vale a pena dar uma lida.

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