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PALAVRAS-CHAVE
Pimenta Malagueta, Alimentação, Interação e Influência africana e indígena
RESUMO
As culturas africana e indígena estão inseridas na sociedade brasileira de forma
tão profunda que se torna impossível delimitar suas influências. Assim, a interação entre
africanos e indígenas no uso dos temperos na cozinha, como a Pimenta Malagueta, pode
ser compreendida como um dos muitos pontos de aproximação e assimilação entre as
duas culturas. A pimenta malagueta fora difundida no mundo desde a época clássica até
meados do século XVII na região sul da Europa, sendo que a região norte continuou
utilizando este condimento alimentar. O Novo Mundo Americano usufruía a pimenta
malagueta capsicum a partir do índio, da mesma forma a malagueta africana passou a
ser comercializada nos portos brasileiros a partir do século XV. A malagueta, no Brasil,
deixa de ser apenas preparada pelas mãos indígenas para fazer parte da alimentação da
família brasileira, recebendo também o conhecimento milenar africano.
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Graduadas em História/UNISC e pós-graduandas em especialização em História do Brasil, na
Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC.
TODO TRABALHO DO HOMEM É PARA SUA BOCA: a origem da Pimenta
Malagueta
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CASCUDO, Luis da Câmara, História da alimentação no Brasil. Belo Horizonte Ed. Itatiaia; São Paulo:
Ed. da Universidade de São Paulo, 1983. (Reconquista do Brasil: nova série; v. 79-80).
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malagueta era utilizada erroneamente para a pimenta encontrada na América, que tinha
grande semelhança com a pimenta da costa da África.2
Na época moderna, período das grandes navegações, se atribui à difusão
intercontinental da pimenta, sobretudo aos primeiros difusores comerciais, os
portugueses, onde propriamente Portugal se chamara de o Império da Pimenta.
Percebemos que foram muitas controvérsias em relação à origem da pimenta malagueta,
eis que existia no Brasil Colônia uma espécie deste condimento, segundo relato da Nova
Gazeta da Terra do Brasil de 1515: “(...) eles tem também na terra uma qualidade de
especiaria, que arde na língua como pimenta, e, ainda mais, cria-se uma vagem, com
muitos grãozinhos dentro, sendo o grão do mesmo tamanho da ervilha” (ALVES
FILHO, 2000, p. 65).
A denominação malagueta, segundo Bueno (1966, p. 275), “(...) provém do nome
da costa africana chamada Costa da Malagueta”. A semelhança entre as pimentas
originárias da América com a pimenta da África criou uma certa confusão na época, que
segundo Cascudo, “(...) ao fruto da capsicum diz-se ‘Malagueta’, numa transferência de
prestígio porque a verdadeira Malagueta zingiberácea aposentou-se na simpatia negra”
(CASCUDO, 1983, p. 535).
A pimenta capsicum utilizada na culinária indígena conquistou o paladar africano
que se apropria deste condimento e passa a utilizá-lo na sua culinária em detrimento da
falta da malagueta da Costa da África. Cascudo explica que “(...) pelas qualidades
pungentes e ardentíssimas de seus frutos receberam estas plantas capsicum o nome de
pimenta, (...) pimenta do Brasil, depois pimenta da Espanha ou de Caiena e também
pimento, pimentão e malagueta” (Idem, p. 535). Assim o rareamento da antiga
malagueta africana no comércio, coincidiu com o crescente prestígio da capsicum.
Eis que surgem algumas indagações que podem propiciar novas pesquisas sobre a
malagueta. E uma delas é em relação ao motivo da queda na produção da pimenta
malagueta original Zingiberácea. Uma hipótese talvez seja não só pela introdução da
capsicun brasileira, possivelmente de melhor qualidade, como também a concorrência
com as pimentas de origem Hindu. De fato é uma hipótese, mas a questão é merecedora
de um aprofundamento teórico maior.
Contudo, o que realmente interessa nesta análise é verificar a importância da
2
Existiam no Brasil dois gêneros de pimenta, um proveniente da família das Anonáceas e outra das
Piperáceas, esta última sendo mais conhecida como capsicum.
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pimenta malagueta na alimentação brasileira, tendo como foco o africano difusor deste
tempero; percebendo que mesmo tendo o indígena se utilizado da pimenta em sua
alimentação, a comida brasileira deve a utilização da pimenta, a malagueta, ao africano
ou afro-brasileiro. Em Freire “(...) a contribuição africana afirmou-se principalmente
pela introdução do azeite-de-dendê e da pimenta-malagueta (...)” (1975, p. 453),
deixando claro que a técnica culinária do africano modificou comidas portuguesas e
indígenas.
Ou seja, temos claramente quase que destituído o papel do negro como o agente
no sentido de trazer o alimento.
Mas, o objetivo aqui é ressaltar a influência africana na alimentação do Brasil. E
se de fato possuímos a capsicum, e esta fora utilizada pelo indígena, sobretudo foi a
presença das mãos negras que difundiram o uso da pimenta malagueta (original ou não)
no Brasil, se tornando “(...) laje fundamental da comida afro-brasileira.” (Idem, p. 855)
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exerceu influência na alimentação brasileira, trazendo de sua terra uma culinária que se
adaptou aos produtos do país.
Assim, percebemos que mesmo havendo a escravidão isso não impediu que a
alimentação africana se expandisse. Talvez porque as negras e alguns negros tiveram
acesso à cozinha dos brancos, preparando alimentos. Segundo Fernandes: “Não
devemos esquecer que os negros eram portadores de saberes ancestrais, que não
deixavam de aplicar nas chácaras (hortas) que o português tanto apreciava: alfaces,
chicória, favas, abóbora, feijões, batata-doce e outros.” (2000, p.18)
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(...) uma salanácea, Capsicum, levada do Brasil pelos portugueses e que
conquistou indispensável e definitivo emprego na culinária africana, desde os
fins do séc. XVI. Ao fruto da Capsicum diz-se “malagueta”, numa
transferência de prestígio porque a verdadeira malagueta aposentou-se na
simpatia negra. (1898, p. 534)
APRECIAÇÃO CRÍTICA
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capsicum torna-se indispensável à gastronomia, sobretudo difundida da Bahia para o
Brasil como um todo.
Esta ligação alimentar com a tradição africana, nos permite pensar o quanto
fora forte à influência da África no Brasil, pois como concorda Gilberto Freyre “(...) o
escravo africano dominou a cozinha colonial, enriquecendo-a de uma variedade de
sabores novos” (Idem, p. 484)
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REFERÊNCIAS
ALVES FILHO, Ivan; GIOVANNI, Roberdo Di. Cozinha Brasileira. Rio de Janeiro:
Revan, 2000.
FREYRE, Gilberto de Melo, Casa-Grande & senzala. 12ª edição brasileira, 13ª edição
em língua portuguesa. [Brasília] Editora Universidade de Brasília, 1963.