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A EVOLUÇÃO
do PENSAMENTO SOCIAL:
Comte, Durkheim, Weber e Marx

Elaine Linhares de Assis Guerra1

O Positivismo e o surgimento da Sociologia

Auguste Comte (1789-1857) criador do Positivismo, utilizou conceitos e leis da


Física e das ciências naturais, principalmente da biologia, para explicar os
fenômenos sociais. Seu objetivo era criar uma teoria cientifica que pudesse
explicar a sociedade. Sua intenção era estabelecer uma sociedade-modelo onde
a ORDEM seria a base e o PROGRESSO o fim almejado. Para Comte a
sociedade humana só poderia ser organizada a partir de uma ordem.

Os positivistas acreditam que a humanidade passou por três estados de


concepção de mundo:

a) Teológico: caracterizado pela aceitação de magias e misticismos, que


levavam o homem a crer que divindades e demônios agiam sobre suas
vontades. Esta fase poderia ser caracterizada pelo politeísmo ou pelo
monoteísmo. Ex: Maias, Aztecas, comunidades indígenas, etc.
b) Metafísico: nesta fase o homem procurou descobrir a natureza última
das coisas e da realidade através de abstrações racionais. O homem
começa a se libertar das forças explicativas de natureza religiosa. É uma
fase de transição entre o primeiro estado (teológico) e o terceiro (positivo).

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Texto elaborado para fins didático e de uso exclusivo dos alunos da disciplina de Sociologia do Centro
Universitário UNA.
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c) Positivo: caracterizada pela explicação da realidade de forma científica,


ou seja, através de experimentações, observações, hipóteses e leis
comprovadas.Valoriza-se o raciocínio dedutivo e matemático.

Para Comte, a Europa, no século XIX, encontrava-se no Estágio Positivo e por isto
era desenvolvida, superior e evoluída.

Comte utilizou-se das ciências naturais para ganhar o reconhecimento científico


que precisava e com isto criou um campo novo no conhecimento científico e deu a
ele o nome de sociologia. Desta trajetória, registra-se duas grandes influências
que tornaram-se correntes de pensamento que marcaram todo o pensamento
social produzido desde então. São elas:

a) Organicismo: concepção científica que faz comparação entre o corpo


dos seres vivos e o corpo social (sociedade). A sociedade passa a ser
vista como uma totalidade composta de partes com funções ou papeis
diferentes, mas sobretudo interdependentes.
b) Darwinismo social: corrente de pensamento que prevê a utilização
das leis da evolução do biólogo inglês Charles Darwin. O evolucionismo
positivista considerava que toda sociedade evolui de um estágio simples
para outro mais complexo. Neste sentido, por ser a Europa já
industrializada no séc. XIX, o branco europeu foi considerado pelos
positivistas como uma espécie humana superior . Crentes de que toda
sociedade evolui lenta e gradualmente, o darwinismo social sustentava que
a Europa tinha uma missão civilizadora para cumprir: contribuir com o
processo de evolução de suas colônias, consideradas pelo espírito
positivista como comunidades primitivas.

Comte percebia que as sociedades se modificavam continuadamente e


ininterruptamente. Para ele as mudanças na sociedade eram regidas por dois
movimentos:
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a) ESTÁTICO: que representa as alterações dos valores sociais. Este


movimento enfatiza a moralidade social, ou seja a ORDEM social;
b) DINÂMICO: representa as mudanças científicas, tecnológicas e
materiais. Era visto como resultado do PROGRESSO nas sociedades.

De suas concepções sobre movimento da sociedade, Comte construiu o lema do


Positivismo: “ORDEM E PROGRESSO”. Em sua visão, a ordem deveria
prevalecer sobre o progresso. Tal fato, para os positivistas, explicava as crises
vividas pela Europa, pois esta deixou-se levar pelos avanços tecnológicos e
descuidou-se da ordem moral necessária para sustentar a nova realidade
implantada após a revolução industrial (progresso).

Enfim, suas idéias acabaram incentivando e explicando várias ações dos países
capitalistas desde a segunda metade do século XIX e alguns traços de seu
pensamento encontram-se presente entre nós até os dias atuais. Talvez o
positivismo tenha influenciado no sentimento de inferioridade que até hoje
sentimos em relação à Europa e até na classificação dos países em termos de
desenvolvidos e não desenvolvidos. Outras influências são sentidas na percepção
sistêmica que ainda fundamenta análises sociais, políticas e organizacionais
presentes até hoje.

A contribuição de Durkheim

Durkheim (Espinal/Alsácia, 1858-1917) foi um sociólogo que contribuiu de forma


significativa para a consolidação da Sociologia como ciência. De certa forma,
Durkheim pode ser considerado um pensador positivista. Na medida em que
Durkheim vai elaborando em suas obras os conceitos de coerção social,
solidariedade, consciência coletiva ou representações coletivas, torna-se
explícita sua preocupação com a manutenção da ordem social, o que reforça a
tese de que ele é um positivista.
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Em síntese, a obra sociológica de Durkheim é um exemplo de obra não perecível,


aberta não a reformulações, mas a continuidades. A obra de Durkheim –
respondendo a preocupações da sociedade e da Sociologia de sua época –
constitui um modelo do produto sociológico, cujo consumo não se esgota ou se
limita à sua leitura e apenas à sociologia, pois suas teses influenciaram a
Pedagogia, o Direito, etc.

Durkheim adotava alguns elementos da teoria da evolução e acreditava no


progresso da sociedade, ou seja, em seu desenvolvimento para uma sociedade
posterior mais evoluída. Como a conjuntura política e econômica de sua época
indicava crises e conflitos, Durkheim procurou criar um sistema moral e científico
para solucionar os problemas das sociedades industrializadas que viviam uma
situação de caos social.

Em sua obra, Durkheim destacava que os Fatos Sociais são os objetos de estudo
da Sociologia. Na sua concepção, a ciência deveria ser pautada pela neutralidade
e objetividade científica. Estes fatos sociais são identificados por possuírem 3
características:

a) Coercitividade: são capazes de impor condutas, maneiras de ser, pensar


e agir;
b) Generalidade: envolvem a maior parte da sociedade ou um número
significativo de pessoas;
c) Exterioridade: os fatos ocorrem independente da vontade dos indivíduos.
São maneiras de pensar e sentir definidas fora das vontades individuais e
por isto possuem poder sobre as consciências individuais.

Para Durkheim, a sociedade é um todo composto de partes integradas que


ganham vida própria (princípio Organicista visto no Positivismo). O organismo
social não pode ser encarado como um somatório de consciências individuais. Na
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sociedade há uma combinação e associação das particularidades de cada um em


uma totalidade chamada de Consciência Coletiva. Esta nova realidade é
representa a sociedade presente em cada um dos seus membros. São idéias,
crenças, sentimentos e hábitos comuns aos membros de um grupo. A
CONSCIÊNCIA INDIVIDUAL representa o que há de pessoal em cada um de nós,
mas a CONSCIÊNCIA COLETIVA é que dá forma a uma sociedade e se torna
responsável pela coesão entre seus membros. Ela também é responsável pela
conformidade de todas as consciências individuais às regras morais da
sociedade. A CONSCIÊNCIA COLETIVA é uma espécie de “estrutura psíquica”
da sociedade. Seus elementos são internalizadas por cada um dos membros de
um grupo. Esta "internalização" ocorre por um processo educativo conhecido
como Socialização. Estas maneiras comuns de sentir e pensar são transmitidas
pela sociedade aos indivíduos porque são externas a eles.

Nas sociedades mais complexas e geralmente de maior porte, a consciência


coletiva não se apresenta de maneira única ou uniforme. Ela assume a forma de
Representações Coletivas. Estas representações traduzem normas morais que
prescrevem como um sujeito deve conduzir-se em determinadas circunstâncias.
Elas envolvem uma noção de dever, de obrigação, ou seja, do que seria certo ou
errado que é adotada por cada grupo, segmento ou classe social. Estas normas,
regras e valores são de certa forma impostos, mas também são desejáveis. Para
cumprir regras morais somos capazes de ultrapassar nossa natureza individual.
Desta forma, nós “sacralizamos” as regras morais e nos devotamos a elas. Este
devotamento pode ser explicado pela importância desta moralidade. A integração
dos homens à vida social depende dos fatos morais. A moral é a fonte da
solidariedade, do controle do egoísmo, da regulamentação da vida social. Os
conflitos e desordens sociais são resultantes de anomia moral. Este estado de
ANOMIA ocorre em sociedades baseadas na divisão do trabalho, cujas
instituições ou órgãos sociais não funcionam de forma interdependente e cujas
regras sociais e morais estejam muito vagas ou excessivamente flexíveis.A
anomia seria mais comum nas grandes cidades.
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As sociedades capitalistas constituídas após processo de industrialização são


sociedades mais complexas e apresentam configurações espaciais de maior
porte. Nestas estruturas sociais há uma elevada divisão do trabalho e a
consciência coletiva ou representação coletiva apresenta-se também fragilizada.
As manifestações da individualidade são melhor toleradas, pois o poder de
coerção dos fatos sociais é menor sobre cada consciência individual. A coesão
(união) social é garantida pela interdependência das partes (pessoas diferentes)
que formam uma totalidade (coletividade). O elo que une as pessoas está
exatamente na existência de um elemento integrador, que seria uma divisão do
trabalho. O laço que une as pessoas neste tipo de sociedade chama-se
SOLIDARIEDADE ORGÂNICA .

Já as sociedades pré-capitalistas, normalmente identificadas como as


comunidades de pequeno porte, os vínculos que prendem os indivíduos entre si
são fortes e mais duradouros. O indivíduo não se pertence, ele é apenas um
“objeto” nas mãos da sociedade fortalecida e bastante coercitiva. A Consciência
Coletiva é forte: as idéias, crenças e sentimentos são comuns a todos indivíduos
da sociedade. O elo que liga uns aos outros é a semelhança entre eles, pois a
divisão do trabalho existente é simples e elementar. Podemos dizer que estas
sociedades possuem uma moralidade muito forte. A coesão social nestas
“hordas” é chamada de Solidariedade Mecânica.

Estas duas formas de solidariedade social evoluem em razão inversa: enquanto


uma progride, a outra se retrai. Porém, cada uma delas cumpre a função de
assegurar a coesão social.

Weber e a ênfase na história e na individuação

Max Weber (Erfurt / Alemanha, 1864-1920) foi em sociólogo alemão que


considerava que a compreensão dos fenômenos sociais dependia da
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investigação sobre seu sentido histórico e social. Ele era indiferente em relação
ao Positivismo e seguiu a trajetória do pensamento alemão, que ainda não tinha
sido contagiado pela necessidade de teorias que explicavam a consolidação do
capitalismo. Weber enfatizava a perspectiva histórica para a compreensão da
realidade rejeitando a visão positivista que reduzia a história a uma lei geral
(Teoria da Evolução) que regia a evolução linear da humanidade rumo a
sociedade capitalista, considerada o ápice da evolução social. Weber não só
recusava a explicação do evolucionismo positivista como valorizava a história de
cada sociedade, ou seja o processo histórico particular vivido por cada uma.

Conceitos Fundamentais

Enquanto o objeto de estudo da sociologia durkheimiana são os fatos sociais ,


para Weber é a AÇÃO SOCIAL. Para entender as ações sociais devemos
compreender suas causas, seu sentido, seu desenvolvimento e seus efeitos
através dos estudos dos usos, costumes e interesses que movem os indivíduos.
Assim, Weber definiu AÇÃO SOCIAL como conduta humana dotada de sentido
para quem a executa, tendo em vista a ação ou reação do(s) outro(s). Toda ação
social tem uma motivação. Ao agir, o sujeito leva em conta a reação do(s)
outro(s) que, tanto pode ser passada, presente ou futura.

Para compreender as ações sociais, Weber estabelece um modelo teórico de


desenvolvimento das condutas racionais. Com este modelo ele analisa o caráter
da conduta dos indivíduos na sociedade. Na perspectiva weberiana o "eu' não é
determinado pela sociedade, mas sim determinante. A base deste modelo está
centrada no uso de um instrumento de investigação chamado de TIPO PURO ou
TIPO IDEAL . Weber elaborou 4 Tipos Ideais de ação social:

a) AÇÃO RACIONAL COM RELAÇÃO A FINS: O objetivo da ação é


previamente definido. O sujeito da ação avalia os meios para alcançar seus
fins. Ex:
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- ação econômica/ trocas no mercado ( modelo típico de ação racional)


- conduta científica de investigação

b) AÇÃO RACIONAL COM RELAÇÃO A VALORES: O sujeito orienta-


se por suas convicções levando em conta sobretudo a fidelidade a certos
valores (dignidade, honestidade, crença moral, religiosa, política ou
estética). Ao escolher o caminho a seguir na ação, o sujeito, mesmo
reconhecendo que ele possa não ter facilidade, vantagens ou ganhos
imediatos com sua conduta, prioriza seu apego aos valores. Weber
enfatiza que se o apego ao valor ou crença for demasiadamente forte, o
procedimento ou conduta pode apresentar até certa irracionalidade.

c) AÇÃO TRADICIONAL: a ação do sujeito tem como motivação um


costume já arraigado. Não há neste caso uma motivação racional, apenas
age-se “como sempre se fez”. Esta ação está na fronteira da ação social
com sentido, pois esta ação é quase uma reação “opaca” aos hábitos e
costumes. Ex: batizar filhos sem comprometimento com a crença religiosa,
apenas porque todo mundo batiza os filhos

d) AÇÃO AFETIVA: Neste caso a ação também não tem motivação


racional, ou seja, ela é inspirada nas emoções imediatas do sujeito (ódio,
medo, paixão, etc.). Não se avalia o meio adequado para se alcançar os
fins propostos. Esta ação também está na fronteira da ação social com
sentido, pois pode ser uma mera “descarga” consciente de um estado
emocional.

Weber esclareceu que raramente encontramos na realidade concreta uma ação


social que é exclusivamente orientada por apenas um destes tipos ideais.
Normalmente o indivíduo tem mais de uma motivação que dá sentido à sua ação
e assim um , dois ou mais tipos podem aparecer juntos.
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A Teoria Weberiana da Dominação

Weber procurou entender porque algumas relações sociais tornam-se persistentes


e duradouras. O que pode fazer com que o conteúdo de certas ações se
mantenham ao longo dos tempos? A resposta para esta questão foi encontrada
por Weber nos estudos sobre a legitimidade. Nesta trajetória, podemos destacar
a existência de formas diferentes de domínio ou influência. São elas:

a) PODER: significa a probabilidade de impor a vontade própria sobre


a vontade dos demais (evidencia-se a existência de uma resistência dos
dominados). Para isto pode-se usar da violência, propaganda, demagogia e
enganos ou sugestões.
b) DOMÍNIO LEGÍTIMO : ocorre quando os dominados, por si só, sem
nenhuma imposição, adotam a obediência, aceitam o domínio
reconhecendo a legitimidade do dominador . Existem diversos motivos de
submissão ou princípios que garantem a influência legítima: interesses,
costumes ou afetos. Normalmente, os textos de Weber traduzidos para o
português nomeiam este domínio legítimo de AUTORIDADE.

Weber construiu 3 Tipos Puros ou Tipos Ideais de domínio legítimo:

a) DOMÍNIO OU AUTORIDADE TRADICIONAL: baseada na


santificação de costumes. Um dos exemplos citados por Weber é o
Patriarcado
b) DOMÍNIO OU AUTORIDADE CARISMÁTICA: baseada na
autoridade do carisma nato, de uma liderança individual . Como exemplos
podemos citar os Profetas, governantes demagogos, plebiscitários
c) DOMÍNO OU AUTORIDADE LEGAL: baseada na crença em
regras racionalmente criadas, no reconhecimento da validade de um
estatuto legal. Ex: domínio dos chefes nas burocracias
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Para Weber , a realidade social aparece como um complexo de estruturas de


dominação. Estas estruturas são definidas como a capacidade de dar aos valores
o sentido que interessa ao agente que exercerá a dominação. Com certeza, a
existência de domínio legítimo gera relações sociais mais estáveis e
equilibradas. A existência de uma ordem legítima orienta as ações dos indivíduos
na sociedade e evita os conflitos sociais.

A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo

Weber procurou desvendar as especificidades que provocaram o capitalismo no


Ocidente. Para ele, o capitalismo não poderia ser entendido apenas como uma
conseqüência da racionalidade presente nas empresas na contabilidade e no
Direito. Esta racionalidade aparentemente sustentava uma teia de produção e
relações criadas após a industrialização. A tudo isto deveríamos, em sua opinião,
somar uma ideologia e uma ética própria.

A presença significativa de protestantes entre os empresários capitalistas e


entre os trabalhadores qualificados dos países industrializados sugeriu a Weber a
possibilidade de existir uma afinidade entre certos valores determinantes para o
capitalismo e a ética calvinista. Para os protestantes, algumas máximas adotadas
eram fundamentais ao crescimento do capitalismo. Entre elas, podia-se citar:
tempo era dinheiro, o bom pagador é dono da bolsa alheia, o trabalho valoriza o
homem, etc.

De forma geral, os protestantes condenavam o ócio, o luxo, a perda de tempo, a


preguiça. Além disto, o dever de um indivíduo protestante para com o aumento de
seu capital era tomado como um fim em si mesmo. Para estarem seguros quanto à
salvação de suas almas, ricos e pobres deveriam trabalhar sem descanso. O
resultado desta ética era: operários disciplinados, vocacionados para o trabalho e
empresários dispostos a um enriquecimento racional, pois “a prosperidade era o
prêmio de uma vida santa.”
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Diferente dos católicos, os protestantes não consideravam a usura e a ambição


pecados. O mal não se encontrava na posse de riquezas, mas no seu uso para o
prazer, para o luxo e o gozo espontâneo. A combinação da ética que restringia o
consumo e liberava o desejo de enriquecimento acabou por promover a
acumulação capitalista e a compulsão para a poupança.

Até os dias atuais notamos a utilização das teses weberianas nos estudos que
procuram definir traços de uma cultura ou uma identidade para os protestantes.

Karl Marx e sua contribuição para a sociologia

Karl Marx (1818-1883) e seu discípulo Friedrich Engels (1820-1895) elaboraram uma
doutrina sobre a realidade social que visava o fim da desigualdade social e da exploração
do homem pelo próprio homem. Marx se colocou abertamente contra a sociedade de
classes presente no capitalismo. Esta sociedade se caracterizaria pelo domínio e
exploração da classe burguesa sobre o proletariado. Marx partiu das idéias defendidas
pelos economistas ingleses, Adam Smith e Ricardo para compreender as leis que regiam
o mundo capitalista. Seu interesse em investigar o sistema capitalista tinha como intuito
conhecer o inimigo para destruí-lo. Ele utilizou também a filosofia de Hegel,
principalmente suas teses sobre a dialética para alcançar seus objetivos.

Em termos metodológicos, Marx trouxe para a ciência social o Materialismo Histórico e


Dialético. Para os materialistas, a história da filosofia tem uma tradição idealista. Hegel
era um idealista, pois considerava que a realidade era definida pela RAZÃO
(pensamento). A idéia dos homens era o ponto de partida para aqueles que queriam
conhecer os seus feitos ou ações. Os materialistas não concordavam com o idealismo.

O materialismo considera a matéria um dado primário. A realidade material é a fonte da


consciência dos indivíduos. A consciência é então vista como um reflexo da matéria. O
materialismo dialético considera que os fenômenos materiais devem ser vistos como
processos ao mesmo tempo determinantes e determinados pelas idéias ou concepções
dos homens.
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O materialismo dialético baseia-se em um raciocínio lógico: cada fenômeno tem, na


aparência, uma identidade e na sua essência, uma contradição. Cada fenômeno contém
em si uma inquietação, um movimento. Este movimento é o resultado das contradições,
dos conflitos entre as partes antagônicas que formam a essência dos fenômenos. Marx
utilizou a dialética para descobrir as contradições que fazem parte da vida social. Todo
fenômeno, ao ser estudado, deve ser submetido à crítica. Deve-se negar a aparência e
buscar a sua essência. Só assim é possível desvendar sua verdadeira identidade, que
pressupõe sua própria negação fatal.

O materialismo histórico é o método de investigação que aplica os princípios da dialética


na História. Trata-se de uma explicação da História pelos fatos materiais ou econômicos.
Assim, a História não é feita pelos grandes homens, pelos heróis ou pelas grandes idéias.
Para Marx, a História é feita pelos fatos materiais e pela luta de classes. A História é dada
pela maneira que os homens produzem e reproduzem as condições de sua existência. As
relações materiais (econômicas) que os homens estabelecem entre si, o modo como
produzem os meios de vida, formam a base de todas as outras relações (sociais,
políticas, etc.). A História é então dividida em Modos de Produção, ou seja, é a maneira
como os homens produzem bens e serviços que definem como são os homens. É a forma
como eles produzem os bens materiais necessários à suas vidas que nos permite
compreender a história de uma sociedade.

Marx destaca que os homens transformam a natureza através do trabalho e para isto
estabelecem relações entre si. É assim que eles produzem suas vidas e suas idéias. É
através do TRABALHO que os homens fazem a sua história e constroem a sociedade em
que vivem. Usando o Materialismo Histórico, Marx dividiu a estrutura da sociedade em 2
níveis: a) Infra-estrutura: base econômica da sociedade (esfera da produção); e b)
Superestrutura: base política e ideológica da sociedade. A INFRAESTRUTURA
engloba a relação entre proprietários e não proprietários dos meios de produção e a
SUPERESTRUTURA engloba a estrutura jurídico- política da sociedade. Aí se localizam
o ESTADO e o Direito. O ESTADO é apropriado pela classe dominante e utilizado por ela
para consolidar sua dominação. A cultura e o modo de vida de uma sociedade refletem os
valores da classe dominante. Para Marx, o existir humano decorre do agir, pois o homem
se auto produz através do trabalho. Mas a relação entre o homem e a natureza e entre o
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pensar e o agir é dialética. Marx chama de praxis a ação humana de pensar a realidade
(a união dialética entre a teoria e a prática). A ação do homem é sempre ação refletida.

Assim, no pensamento materialista, as relações de produção são fundamentais, pois


revelam como os homens se organizam, como dividem o trabalho e como produzem. As
relações de produção dependem do estágio de desenvolvimento das forças produtivas
(água, terra, matéria prima, máquinas, ferramentas de trabalho, tecnologia, etc.) e das
relações de produção. Cada Modo de Produção é definido pela forma como as forças
produtivas se organizam em relações de produção num dado momento histórico. Se as
Forças Produtivas se desenvolvem muito, elas entram em contradição com as Relações
de Produção existentes. Surgem então divergências e a necessidade de novas formas de
divisão do trabalho. Estas divergências e contradições manifestam-se na forma de
LUTA DE CLASSES.

Para compreender o conceito de classe social no pensamento de Marx temos que nos
recordar que em sua concepção os homens estabelece relações entre si durante o
processo de produção. Destas relações de produção e a partir da produção do
excedente, alguns indivíduos, mesmo não produtores, se apropriam de parcela do que é
produzido socialmente . Esta apropriação gera os conceitos de classe, de exploração, de
opressão e de alienação. Assim, o conceito de classe não está relacionado com o nível de
renda, o consumo, a escolaridade, a origem ou linhagem familiar dos indivíduos. Para
Marx só existem duas classes sociais significativas: de um lado, os proprietários dos
meios de produção e do outro lado, os que só possuem trabalho. Estes últimos passam a
constituir uma classe dominada pelos primeiros, pelos proprietários da capital. Estas duas
classes fundamentais, no caso do Modo de Produção Capitalista, são chamadas de
burguesia e proletariado. Os burgueses, que constituem a classe dominante, possuem
uma consciência de sua situação de classe proprietária e assim estabelecem seu
domínio, ou seja, pensam, agem, produzem idéias, regulamentam a produção e exercem
a exploração, a opressão e provocam a alienação da classe dos trabalhadores.

Para compreendermos o conceito de exploração e alienação, voltaremos ao estudo do


modo de produção. Analisando o Modo de Produção Capitalista, Marx observa que ele
pode ser caracterizado pela produção de mercadorias. Mercadoria é tudo que
produzimos tendo em vista um valor de troca. O valor de uma mercadoria é dado pelo
tempo de trabalho socialmente necessário para produzi-la. No capitalismo, o proletariado
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vende ao capital a mercadoria que é capaz de produzir, ou seja, sua força de trabalho. O
valor da força de trabalho é dado pela subsistência do trabalhador e a reprodução da sua
capacidade de trabalhar. Na concepção de Marx, o salário deveria ser capaz de manter
o trabalhador e sua família. Porém, Marx ressalta que, ao produzir mercadorias, o
trabalhador cria mais valor do que recebe em seu salário . Daí surgiu o conceito de Mais-
Valia. Na teoria de Marx existem dois tipos de Mais-Valia: a Mais-Valia Absoluta e a Mais-
Valia Relativa.

A Mais-Valia Absoluta resulta da extensão da jornada de trabalho, que gera um aumento


da produção para o capitalista, mas o trabalhador não é remunerado por este acréscimo
de valor. A Mais-Valia Relativa resulta do aumento da produtividade do trabalhador,
geralmente em função de inovação tecnológica. Não há também neste caso, aumento de
salário. De forma geral pode-se afirmar que o proletariado produz a Mais-Valia no
momento da produção das mercadorias. Esta Mais-Valia, ou valor excedente produzido
pelo trabalhador, é apropriado pela Burguesia, ou seja, pelo capitalista que é o dono dos
meios de produção. Na visão de Marx, é através da apropriação da mais-valia que o
capitalista consegue acumular e concentrar riquezas em suas mãos. Assim, além dos
lucros que este pode obter no mercado com a venda dos bens e serviços produzidos, ele
também obtém um ganho no momento da produção destas mercadorias.

Segundo Marx, o proletariado é incapaz de romper com a exploração do trabalho, ou seja,


com a extração de sua mais-valia, por se encontrar alienado. Sua alienação tem origem
na esfera econômica, pois o produto produzido pelo trabalhador não pertence a ele. O
trabalhador também não é proprietário das ferramentas que usa para trabalhar, da
tecnologia, da criatividade incorporada na produção e até da capacidade de gerir sua
própria força de trabalho. É por este motivo que Marx afirma ser a mercadoria uma
realidade autônoma que determina a vida dos homens no capitalismo. A mercadoria
possui um fetichismo, pois é capaz de esconder uma relação de dominação e de
exploração. Ela é capaz de submeter o homem às relações de mercado. No mercado, os
homens se desumanizam, se tornam "coisificados". Isto porém não é percebido em
função da existência da alienação e de uma ideologia que atende aos interesses da
classe dominante. É ela que sustenta sua dominação. A ideologia impede o proletariado
de ter consciência de sua própria submissão. Ela é capaz de camuflar a luta de classes.
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Para Marx, o Estado tem a função de perpetuar as relações de dominação. Ele situa-se
na chamada superestrutura social. Assim, só aparentemente o Estado visa o bem
comum. Na verdade, ele está a serviço da classe dominante. Ele foi apropriado pela
classe dominante e organiza-se e age conforme seus interesses.

No Modo de Produção Capitalista, o proletariado deve destruir este Estado Liberal


Burguês. Só assim ele se livrará da dominação do capital. O Novo Estado do Proletariado
surgirá pela luta de classes. Após derrubada da burguesia e de seu domínio na
sociedade capitalista, Marx previa a construção de um novo Estado que representaria um
período de transição e se caracteriza pela Ditadura do Proletariado. A esta fase Marx dá
o nome de SOCIALISMO. Esta é a fase de fortalecimento da classe proletária. O
Socialismo se caracteriza pela existência de uma burocracia repressiva. Na visão
marxista, ela seria necessária para evitar o aparecimento da contra-revolução. Só depois
de superado os interesses da antiga classe dominante (burguesia) é que a sociedade
estaria preparada para o Comunismo. Assim não seria mais necessária a presença de um
Estado totalitário. No Comunismo não existiria mais classe social. Não existiria também
luta de classes, pois não existiria desigualdade, dominação, exploração e conflitos.

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