Você está na página 1de 179

0

FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ


UNIVERSIDADE DE FORTALEZA – UNIFOR
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS - CCJ
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
CONSTITUCIONAL

ESTADO DEMOCRÁTICO E ORÇAMENTO PÚBLICO:


ANÁLISE FILOSÓFICA E POLÍTICA

HOLMES CORDEIRO NETO

Área de Concentração - Direito Constitucional Público e Teoria Política

Linha de pesquisa - Estado Democrático de Direito no Brasil

Fortaleza
Agosto/2015
1

HOLMES CORDEIRO NETO

ESTADO DEMOCRÁTICO E ORÇAMENTO PÚBLICO:


ANÁLISE FILOSÓFICA E POLÍTICA

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em Direito como
requisito parcial para obtenção do título
de Mestre em Direito Constitucional, sob
a orientação da Professora Pós-Doutora
Maria Lírida Calou Araújo e Mendonça

Fortaleza
Agosto/2015
2
3

HOLMES CORDEIRO NETO

ESTADO DEMOCRÁTICO E ORÇAMENTO PÚBLICO: UMA


ANÁLISE FILOSÓFICA E POLÍTICA

BANCA EXAMINADORA

________________________________________________
Prof.ª Maria Lírida Calou de Araújo e Mendonça, Pós-Drª.
Orientadora - Universidade de Fortaleza

________________________________________________
Prof. Carlos César Sousa Cintra, Dr.
1º Examinador - Universidade Federal do Ceará

________________________________________________
Prof. Antônio Jorge Pereira Júnior, Dr.
2º Examinador - Universidade de Fortaleza
4

Aos meus pais, Cláudio (em memória) e


Vera. Ao meu irmão, amigo e companheiro
de todas as horas, Paulo Cesar. Aos meus
filhos, Fernanda e Nelson e netos, Breno,
Paulo Netto e Pedro David. Aos amigos
Ivancleto e Ewerton.
5

AGRADECIMENTOS

A Deus, pela vida.

Aos professores que participaram da banca de seleção para o programa de mestrado

(turma XV). Espero haver correspondido ao voto de confiança.

À professora doutora Maria Lírida, pela paciência, compreensão, incentivo, palavra

certa na hora certa e na exata medida - uma nordestina, exemplo de mulher.

Ao professor doutor Carlos Cintra, que me acompanha há mais de 15 anos, a quem

admiro pelo espírito cristão, humildade e dedicação.

Ao professor doutor Antônio Jorge, homem de fala mansa e exemplo de respeito ao

próximo.

À professora doutora Gina Pompeu, por instigar desafios desde o primeiro e-mail.

Aos professores doutores Eduardo Dias, Filomeno, Humberto Cunha, Martônio e

Rosendo que de fato professam conhecimentos.

Aos amigos Ana Paula, Cândido Alexandrino, Jahyra, Jovina, Mary Andrade, Roberto

Girão e Vicente, minha sincera gratidão.

Os amigos da coordenação do PPGD - Ana Lima, Ana Paula, Fabiano, Luis Carlos,

Nadja e Sônia, pela sempre gentil atenção e dedicação.

Ao demais professores e amigos do PPGD.


6

“Democracia é oportunizar a todos o mesmo ponto


de partida. Quanto ao ponto de chegada, depende
de cada um.”

Mário Quintana
7

RESUMO

Esta dissertação investiga a modelagem orçamentária impositiva no Brasil introduzida com a


edição da Emenda Constitucional nº 86/2015, ante a realidade do modelo presidencialista de
coalizão. Para tanto, a pesquisa parte da problematizacao proposta de questionar a
necessidade da adoção de um modelo de orçamento (supostamente) impositivo, como
alternativa política para minimizar os efeitos da crise política e a assimetria entre o Poder
Legislativo e Executivo nacional. Houve, entretanto, necessidade de aprofundar a pesquisa no
contexto histórico da formação do Estado moderno e da História da Filosofia para
compreender a separação das funções do Estado, e as atribuições de competências
constitucionais de cada Poder. Ademais, a pesquisa questiona a exacerbada abertura de
créditos adicionais ao orçamento, bem como a contingência presidencial na liberação de
despesas decorrentes de emendas parlamentares incluídas no orçamento, a despeito do PLOA.
Destarte, a pesquisa tem como objetivo principal investigar o conteúdo da Emenda
Constitucional, cotejada à política de coalizão no modelo presidencialista brasileiro. A
metodologia utilizada para a dissertação cotejou aspectos históricos e a filosofia do Estado,
bem como aspectos legais, doutrinários e jurisprudenciais da modelagem orçamento-
programa, confrontando às alterações introduzidas pela referida EC. A dissertação está
dividida em quatro partes: a primeira contempla a formação do Estado moderno; a segunda a
separação dos poderes, assim como as competências dos poderes; terceiro a modelagem
orçamentária vigente; quarto o orçamento supostamente impositivo, a abertura de créditos
adicionais e as emendas parlamentares ao orçamento. Com fulcro no Estado Democrático,
conclui-se que a Emenda Constitucional não inovou, porém retirou uma parcela do poder
discricionário do chefe do Poder Executivo no contingenciamento da emendas parlamentares,
a despeito do posicionamento do STF, em sentido contrario.

Palavras-chave: Direito financeiro. Orçamento público. Orçamento impositivo. Emendas


parlamentares. Presidencialismo de coalizão.
8

ABSTRACT

This dissertation is to investigate the scope imposing budget modeling in Brazil introduced
from the enactment of Constitutional Amendment No. 86/2015, before the reality of the
presidential coalition model. To this end, the research part of the questioning proposed to
question the need to adopt a budget model (supposedly) imposing, as a political alternative to
minimize the effects of the political crisis and the asymmetry between the legislature and
national executive. However, there was need for further research in the historical context of
the formation of the modern state and the philosophy of history to understand the separation
of state functions, and duties of constitutional powers of each branch. In addition to research
questions the exacerbated opening additional credits to the budget as well as the presidential
contingency in the release of expenses resulting from parliamentary amendments included in
the budget despite the PLOA. Thus, the research aims to investigate the contents of the
constitutional amendment, collated to coalition politics in the Brazilian presidential model.
The methodology used for the dissertation collated historical aspects, and state philosophy, as
well as legal, doctrinal and jurisprudential program-budget of modeling, confronted with the
changes introduced by the constitutional amendment. The dissertation is divided into four
parts: the first involves the formation of the modern state; the second separation of powers, as
well as the skills of powers; third current budget modeling; the fourth supposedly imposing
budget, the opening of additional credits and parliamentary amendments to the budget. With
fulcrum in the democratic state it is concluded that the constitutional amendment does not
innovated, but withdrew a portion of the discretion of the head of executive power in the
curtailment of parliamentary amendments, despite the Supreme Court's position in the
opposite direction.

Keywords: Financial law. Public budge. Imposing budge.. Parliamentary amendments.


Presidential coalition.
9

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Orçamento tradicional e orçamento-programa............................................. 118

Quadro 2 – Características principais dos níveis de mensuração.................................... 119

Quadro 3 – Fase centrípeta.............................................................................................. 148

Quadro 4 – Fase centrífuga.............................................................................................. 149

Quadro 5 – Créditos adicionais autorizados no ano de 2014 na União........................... 175

Quadro 6 – Créditos adicionais autorizados no ano de 2015 na União........................... 177


10

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Principais componentes do PLOA de 2015................................................... 126

Tabela 2 – Principais componentes do LOA de 2015...................................................... 127

Tabela 3 – Projeção do crescimento real do PIB em 2015.............................................. 129

Tabela 4 – Revisão da meta de superávit primário na LDO de 2015.............................. 129

Tabela 5 – Cotes na LOA de 2015................................................................................... 130

Tabela 6 – Número de ministérios, por governo............................................................. 150


11

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

a.C – Antes de Cristo

ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias

ADI/ADIn – Ação Direta de Inconstitucionalidade

CADH – Convenção Americana sobre Direitos Humanos

CCJ – Comissão de Constituição e Justiça

CF/1988 – Constituição Federal promulgada em 5 de outubro de 1988

CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito

DAS – Direção e Assessoramento Superior

d.C – Depois de Cristo

DJ – Diário da Justiça

DL 200/67 – Decreto-Lei 200, de 25 de fevereiro de 1967

EBAPE – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas

EC – Emenda à Constituição

FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização


dos Profissionais da Educação

LDO – Lei de Diretrizes Orçamentárias

LOA – Lei Orçamentária Anual

LRF – Lei de Responsabilidade Fiscal

MP – Medida Provisória

NES – Cargos de Natureza Especial

OBZ – Orçamento Base Zero

OEA – Organização dos Estados Americanos


12

ONU – Organização das Nações Unidas

OP – Orçamento Participativo

OSPF – Órgãos Setoriais de Programação Financeira

PEC – Proposta de Emenda à Constituição

PIB – Produto Interno Bruto

PNRS – Planos Nacionais, Regionais e Setoriais

PPA – Plano Plurianual

PPBS – Planning programming budgeting system

RCL – Receita Corrente Líquida

SIAFI - Sistema Integrado de Administração Financeira

STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça

STN – Secretaria do Tesouro Nacional

UG – Unidade de Gestão

UNB – Universidade de Brasília

UO – Unidade Orçamentária
13

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................................................... 14
1 ESTADO, FILOSOFIA E DEMOCRACIA............................................................... 21
1.1 Destaque sobre a embriogenia do Estado............................................................. 22
1.2 Pensamento filosófico do Estado e a soberania.................................................. 23
1.3 Estado democrático e humanista de Direito......................................................... 35
2 A SEPARAÇÃO DAS FUNÇÕES ESTATAIS À LUZ DA HISTORIOGRAFIA
CONSTITUCIONAL BRASILEIRA.......................................................................... 49
2.1 A ideia de separação dos poderes na Modernidade............................................. 52
2.1.1 Constituição imperial de 1824.................................................................... 58
2.1.2 A Constituição republicana de 1891........................................................... 59
2.1.3 A Constituição liberal com tendências sociais de 1934............................. 60
2.1.4 A Carta política do Estado Novo de 1937.................................................. 61
2.1.5 A Constituição democrática de 1946.......................................................... 62
2.1.6 Carta política militar de 1967 e a Emenda n 1/1969º................................ 62
2.1.7 A Constituição do Estado Democrático de Direito de 1988....................... 63
2.2 Das atribuições de competências........................................................................ 71
2.1.1 Poder Executivo.......................................................................................... 73
2.1.2 Poder Legislativo....................................................................................... 77
2.1.3 Poder Judiciário......................................................................................... 83
3 ANTECEDENTES HISTÓRICOS E ASPECTOS GERAIS DO ORÇAMENTO.... 88
Historiografia do Orçamento Público.................................................................. 91
3.1.1 A experiência inglesa.................................................................................. 92
3.1.2 A experiência francesa................................................................................ 93
3.1.3 A experiência estadunidense....................................................................... 94
3.1.4 A experiência brasileira.............................................................................. 95
3.2 As modelagens orçamentárias no Brasil............................................................... 107
3.2.1 Princípios orçamentários previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal.... 111
3.2.2 Consensos e divergências doutrinarias a respeito do Orçamento Público 112
4 ANÁLISE DO ORÇAMENTO E DOS CRÉDITOS ADICIONAIS NO MODELO
121
PRESIDENCIALISTA BRASILEIRO.......................................................................
4.1 Execução e cumprimento das metas no orçamento-programa brasileiro............. 124
14

4.1.1Componentes do PLO,A por Orçamento..................................................... 125


4.1.2 Análise dos planos e metas do Governo Federal....................................... 128
4.1.3 Abertura de créditos adicionais ao orçamento anual................................ 131
4.1.3.1 Abertura de créditos suplementares........................................................ 132
4.1.3.2 Abertura de créditos extraordinários...................................................... 133
4.2 O orçamento supostamente impositivo................................................................ 135
4.2.1 Conteúdo específico extraído da Emenda Constitucional.......................... 136
4.2.2 Ângulos de observação do Orçamento Impositivo..................................... 137
4.2.2.1 Aspectos econômicos............................................................................... 140
4.2.2.2 Aspectos sociais....................................................................................... 143
4.2.2.2 Aspectos jurídicos.................................................................................... 144
4.3 Presidencialismo de coalizão no Brasil................................................................ 146
CONCLUSÕES............................................................................................................... 155
REFERENCIAS.............................................................................................................. 161
ANEXO I......................................................................................................................... 175
14

INTRODUÇÃO

A experiência política se confunde com a própria história do homem - Ser inquieto e


em constante transformação. Quanto mais o homem se questiona, mais se transforma, como
esclarece Zilles (2005), em sua Teoria do Conhecimento e Teoria da Ciência. Nesse contexto é
que se insere a ciência, fruto das inquietações, e de contínuas conjecturas e refutações
(POOPER, 2003), na formação do saber científico. Com efeito, a pesquisa atenta para o rigor
científico e para o nexo na obtenção e análise dos dados, assim como na maneira de
apresentá-los na dissertação.

A pesquisa aborda o Estado democrático e o orçamento público, por um viés


filosófico, jurídico e político, que decorre da inevitável interdisciplinaridade do tema. Pouco
se vêem as questões orçamentárias examinadas e mostradas pelas Ciências Sociais, integrando
aspectos culturais, descritos com origem na História da Filosofia.

Estes são, de fato, indispensáveis para balizar e evidenciar, com fidelidade científica,
a formação das instituições como as conhecemos hoje. Portanto, não se pode pretender
alcançar um fenômeno humano dissociado do contexto cultural, espaçotemporal, da mesma
forma como, também, não é possível examinar um fenômeno na atualidade, sem uma
contextualização política e jurídica.

Considera-se que as relações humanas são disciplinadas política e juridicamente,


com esteio na intersubjetividade entre os indivíduos. Na obra Critica da Razão Pura (2004),
Kant estabeleceu o limite entre a Ciência e a ação, a Ciência e a Política e à política como
ação; isto é, entre a Política como atividade humana, que encontrou oposição na teoria do
mínimo ético de Jellinek (2000), para quem o Direito deve conter um mínimo de conteúdo
moral capaz de preservar a harmonia em sociedade.

A questão foi, temporariamente, solucionada por Del Vecchio (1979), para quem o
Direito decorre da intersubjetividade. Para compreender a extensão do Direito, entretanto, se
torna indispensável conhecer a Filosofia, a História, a Sociologia, a Hermenêutica do Direito,
bem como suas teorias, que lhe definem os contornos, ficando a cargo da Epistemologia
15

jurídica dar o tom na cientificidade do Direito.

Como se sabe, o Direito é uno em sua essência (metafísica), enquanto os ramos do


Direito, como o Constitucional, Civil, o Penal, etc. determinam sua existência (física),
corporificada nas constituições e códigos. Serão empregadas neste texto duas concepções,
metafísica e física de Direito para responder às proposituras da pesquisa. Ademais, para que
uma investigação acadêmica possa ser científica, requer, além do método, uma utilidade, sem
a qual não se justificaria tanto esforço.

Na atualidade, o Estado se insurge, constitucionalmente, como um ente político com


poder de intervir no domínio econômico, normatizando, regulando, fiscalizando e fomentando
a atividade econômica. Há quem defenda, no entanto, a ideia e considere não ser esta uma
atribuição típica dos Estados modernos.

Estes reconhecem no Estado um ente que se atém a cuidar da coisa pública, deixando
para a atividade privada e a livre concorrência as relações de natureza econômica particular,
ficando as questões de natureza legais a cargo das agências setoriais reguladoras. Do outro
lado, está o Estado totalitário, autoritário, que concentra o poder político e econômico, público
e privado na pessoa do Estado, detentor único de patrimônio e capital.

O Estado brasileiro, por sua tradição constitucional – republicana -, possui


legitimidade para agir como regulador da atividade privada, estando a Administração Pública
adstrita ao principio da legalidade. Neste cotejo, o caput do art. 170 da CF/88 reconhece como
fundamento da ordem econômica: a livre iniciativa e o valor social do trabalho.

A ordem econômica está fulcrada nos princípios da soberania nacional, da


propriedade privada, da função social da propriedade livre concorrência, defesa do
consumidor e do meio ambiente, redução das desigualdades regionais e sociais, busca pelo
emprego, tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte, ou o livre exercício da
atividade econômica lícita ou não vedada por lei.

Cabem ao Estado a tutela e a organização da economia, como uma característica do


capitalismo moderno, seja por critérios econômicos, seja por motivos da máxima de proteção
de parcela da sociedade – trabalhadores, consumidores etc. Assim, percebe-se o Estado na
condução das questões econômicas e normativas do mercado.

Destaque-se o Texto Constitucional, em seu art. 219, ao estabelecer que “o mercado


interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o
16

desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem-estar da população e a autonomia


tecnológica do País, nos termos de lei federal”, que em conjunto com o sistema de normas
jurídicas; direta ou indiretamente, contribuem para o desenvolvimento da economia no País.
Deste modo, a Constituição de 1988 (art. 173 e 174) norteia a intervenção estatal na
economia, seja como agente econômico, seja como agente normativo-regulador (funções de
fiscalização, de fomento e de planejamento), isto é, ofícios próprios do Estado.

Neste sentido, as finanças públicas são compreendidas como a atividade econômica


do Estado, consistindo no poder-dever para captação de recurso (receitas), assegurando a
manutenção da administração e das políticas de Estado, ou seja, as despesas – aplicações das
receitas. O artigo 165 da Constituição indicou que a Lei complementar deve dispor sobre as
finanças públicas, dívida interna e externa, dentre outras que serão debatidas na dissertação.

Ainda nesta linha, insurge o orçamento público, como um mecanismo rigoroso de


regulação das receitas e despesas públicas, constituindo um sistema orçamentário complexo
em sua ordenação, podendo ser dividida em três entidades normativas distintas, porém inter-
relacionadas, a saber: o PPA, a LDO e a LOA. É o que no Direito Financeiro se denominou de
orçamento-programa.

A elaboração desta modelagem orçamentária está prevista com prerrogativa privativa


do Poder Executivo (atividade vinculativa), que estima receitas e aloca despesas (principio da
universalidade) para cada exercício financeiro (princípio da anualidade). Assim, cabe ao
Poder Legislativo examinar, emendar, deliberar e aprovar os projetos de leis orçamentárias
(PPA, LDO e LOA), enviando para promulgação presidencial.

Tecidas essas observações preliminares, passa-se a versar sobre o tema. Observa-se


que, recentemente, o Congresso Nacional brasileiro aprovou o Orçamento (supostamente)
Impositivo, decorridos 15 anos de sua primeira propositura, com a PEC nº 22/2000, arquivada
e sucedida pelas PECs nºs 169/2003, 385/2005 e 465/2005, apensadas à PEC nº 565/2006,
convertida na EC nº 86, de 17 de março de 2015.

As mudanças são recentes e, por este motivo, ainda não se encontram estudos
aprofundando o teor da Emenda. A situação é agravada em razão da quantidade de PECs
acostadas ao projeto discutido e aprovado no Congresso Nacional. O exame da Emenda é
parte essencial da pesquisa, que inclui a leitura dos demais projetos de emendas.

Alguns autores se destacam entre os que já trataram do orçamento impositivo,


contudo com abordagens diferentes desta, dentre eles Edilberto Carlos Pontes Lima (2003),
17

Roberto Bocaccio Piscitelli (2006), James Giacomoni (2012) e Regis Fernandes de Oliveira
(2013). Encontram-se, ainda, alguns artigos acadêmicos e científicos sobre o tema, dispersos
na Web, principalmente sobre o presidencialismo ministerial de coalizão. Sobre a modelagem
impositiva, no entanto, há são poucos estudos.

Por certo que, uma mudança na modelagem orçamentária do País requer sucessivas
análises, até que sejam esgotadas as reflexões e debates acerca dos efeitos e alcances de tais
alterações, o que justifica a atualidade e necessidade da pesquisa acadêmica. Alem de atual o
estudo evidencia um aspecto relevante para o aperfeiçoamento das instituições nacionais,
especialmente as que afetam diretamente o Estado Democrático no Brasil.

Feitas estas considerações, parte-se para a problematizacao: quais mudanças seriam


necessárias no Texto Constitucional para a implantação de uma modelagem orçamentária
impositiva no Brasil? Este é o ponto central que baliza a pesquisa, entretanto, há necessidade
de detalhá-la melhor: quais seriam os efeitos da implantação do orçamento impositivo na
organização burocrática e nas instituições do País? Neste contexto de organizações e
instituições, o orçamento impositivo seria compatível com o regime presidencialista de
coalizão? O que, efetivamente, foi instituído desde a Emenda constitucional em destaque?

Formuladas as indagações de partida da pesquisa, cabe esclarecer que o projeto de


pesquisa não previu quaisquer hipóteses ou conjecturas, tampouco expectativas de resultados,
mas, tão somente, objetivos e métodos para efetivá-la.

Erigidas a relevância e a problematizacao da pesquisa, busca-se definir os objetivos


do estudo, no contexto social e político, assim como as motivações que levaram à aprovação
do orçamento (supostamente) impositivo, possibilitando sua análise no modelo
presidencialista brasileiro.

O objetivo geral da pesquisas é analisar, interdisciplinarmente, o orçamento público,


com destaque na modelagem impositiva, que se insere na política de coalizão no modelo
presidencialista brasileiro.

Ademais, para alcançar este escopo foram traçados os seguintes objetivos específicos
para a pesquisa:

a) entender o contexto histórico da formação do Estado moderno, assim como a


história do pensamento filosófico nesse período, que potencializa compreender os Estados
como são conhecidos na atualidade;
18

b) examinar a universalização dos Direitos Humanos na realidade internacional e


verificar de que forma estes direitos são incorporados ao ordenamento jurídico interno, e os
mecanismos de controle de compatibilização das normas internacionais no Estado
Democrático de Direito;

c) conhecer a historiografia e os aspectos que levaram os Estados a adotar a


separação dos poderes, como solução para frear o poder excessivo concentrado nas mãos do
soberano, bem como as etapas evolutivas do pensamento filosófico da separação tripartite;

d) investigar o instituto do sistema de pesos e contrapesos no Direito comparado;

e) conhecer e compreender o desenvolvimento do “sentido de pertence” no Estado


democrático brasileiro, como manifestação do povo, pelo povo, para o povo, confrontando-o
com o individualismo-histórico, que caracteriza o pensamento político no País;

f) analisar, à luz da Democracia representativa brasileira - de tradição patriarcal,


clientelista e patrimonialista - de que forma seria possível reduzir as desigualdades e assegurar
minimamente os objetivos do Estado, consoante é previsto na Constituição de 1988;

g) aprofundar o conhecimento sobre as competências e funções dos Poderes no


Estado brasileiro, especialmente em relação às questões de finanças públicas, orçamento
público, créditos adicionais e emendas parlamentares;

h) compreender, de que forma corre a coalizão política no presidencialismo


brasileiro, bem como os possíveis reflexos neste modelo da Gestão Pública, com origem na
aprovação do orçamento (supostamente) impositivo em 2915.

Parametrizados e enumerados os objetivos específicos, agora se faz necessário, em


razão da natureza cientifica da pesquisa, estabelecer os critérios metodológicos indispensáveis
à consecução de resultados. Assim, utilizou-se na pesquisa uma metodologia do tipo
bibliográfica, partindo de um referencial teórico, constituído por textos legais, doutrinas e
jurisprudências, bem assim, utilizando textos mais específicos de cada temática, disponíveis
em livros, artigos científicos, periódicos, teses e dissertações cotejadas para responder à
problematização proposta.

Por se tratar de uma pesquisa que privilegia aspectos sociais, políticos, históricos e
de filosofia do Estado, e em razão do elevado grau de subjetividade, a abordagem da
dissertação é qualitativa, adequada aos estudos sociais, como no caso circunstancial, em que
se estudam o Estado Democrático e o Orçamento Público. Quanto aos fins, a pesquisa é
19

descritivo-exploratória. Inicia com o aprofundamento na formação do Estado moderno e da


soberania, para, em seguida, examinar a formação do Estado Democrático e Humanista de
Direito, seguindo a tendência de uma nova Hermenêutica Constitucional e do Direito, à luz da
universalização dos Direitos Humanos.

Neste cotejo, são identificados alguns autores que compartilham esta ampliação do
sentido de Estado, cujo escopo é a necessidade de leitura dos diplomas legais com suporte na
universalidade de direitos, ou prevalência da interpretação do Direito, desde a necessidade de
efetivação dos Direitos fundamentais. Em seguida, a pesquisa busca, com a leitura dos
clássicos da Ciência Política e do Estado, conhecer e evidenciar a separação dos poderes do
Estado, partindo da história do pensamento filosófico absolutista (baseado no Direito divino
do soberano, uma espécie de jusnaturalismo), passando pelo iluminismo (com prevalência dos
juscontratualistas), até chegar à moderna (juspositivistas) concepção da separação das funções
do Estado, com suas peculiaridades nos Brasil.

Neste ponto, com amparo na leitura dos textos constitucionais, desde a Carta
imperial até a Cidadã de 1988, procura compreender o processo de consolidação dos Poderes
do Estado no Brasil. Neste momento, a doutrina representa um relevante meio facilitador da
apreensão de aspectos culturais e políticos que contribuíram para aquelas configurações de
Poderes.

Ultrapassada a fase inicial, o estudo é concentrado na historiografia do orçamento,


nos caminhos percorridos por este, tanto no Direito comparado, quanto no constitucionalismo
brasileiro, destacando a atual modelagem orçamentária, possibilitando conhecer e
compreender as mudanças que estão sendo propostas no Congresso Nacional. Nesta etapa, a
pesquisas se integra ao Direito Constitucional Financeiro; para demonstrar os aspectos
normativos das finanças oficiais e do Orçamento Público no Estado Democrático, contudo
sem perder de vista a historiografia dos diversos temas, que consubstanciam a apresentação
do trabalho científico. Neste processo histórico, o constituinte de 1987/1988 optou por uma
seção para abordar sobre finanças (arts. 163 e 164) e uma subseção para o Orçamento Público
da União (arts. 15 a 169).

Abordados aos aspectos gerais do Orçamento Público a investigação continua, estão,


sobre a temática da impositividade orçamentária: sua origem, as principais características, a
doutrina e estudos sobre o assunto. Na sequência, verificam-se os dispositivos acrescidos após
a promulgação da EC nº 86/2015, bem como as questões que orbitam ao redor da EC, como
20

os créditos adicionais e as emendas parlamentares constitucionalmente constituídas, bem


como as possíveis incompatibilidades com o modelo presidencialismo brasileiro, fruto de uma
evolução cultural. Concluídos os estudos, fichamentos e escolha das partes imprescindíveis,
adentra-se na etapa de elaboração do texto dissertativo para, ao final, delinear as conclusões,
observando a realização dos objetivos e respondendo à problematizacao proposta neste
capítulo introdutório.

A Dissertação está dividida em cinco capítulos, incluindo, conforme determina a


ABNT, a conclusão. No primeiro capítulo são abordados os estudos realizados sobre o Estado
Democrático e Humanista de Direito. No segundo capitulo estão contidos os resultados dos
estudos sobre a tripartição dos poderes do Estado. O terceiro capítulo versa sobre a história e
os aspectos gerais do orçamento no direito comparado e no Brasil, ao passo que a quarta seção
cuida das questões centrais da pesquisa, como a execução e cumprimento do orçamento-
programa e o orçamento (supostamente) impositivo no Brasil – os componentes do PLOA por
orçamento, a flexibilidade dos planos e metas do Governo Federal, a abertura de créditos
adicionais ao orçamento anual, o conteúdo extraído da EC, e os olhares sobre o orçamento
impositivo. Seguem-se as conclusões, acompanhadas da bibliografia em que se assentou, sob
o prisma teórico, este texto. Cabe ressaltar, que a intelecção dos capítulos depende da
compreensão dos anteriores, à exceção desta, que é introdutória.
21

1 ESTADO, FILOSOFIA E DEMOCRACIA

Este segmento representa o primeiro objetivo específico delimitado no excerto


introdutório desta dissertação, com o propósito de facilitar a compreensão do conteúdo do
tema em análise, assim como constrói uma base sólida para as seções subsequentes. O
capítulo aborda a embriogenia do Estado, a formação de seu pensamento político-filosófico,
para, ao final, apresentá-lo como o Estado Social Democrático que é. Esse modelo influencia
a Hermenêutica Jurídica contemporânea, bem como a leitura que se faz de todo o
ordenamento jurídico nacional, à luz da Constituição da República Federativa do Brasil,
inaugurada em 1988.

Imperativo é esclarecer a indissociável relação entre as Ciências Política e Jurídica


observada no poder político do Estado – soberano, exclusivo, único, indivisível e indelegável
– que funde dois outros, os poderes Econômico e Ideológico. Aquele poder estabelece uma
relação entre governantes e governados, acolhido por sua longa tradição. Destarte, a noção de
Estado representa um encadeamento, um produto histórico, que cria a própria sociedade, a
qual, segundo Bobbio (2007, p.53-54), tem duas fontes principais - a história das instituições
políticas e a história das doutrinas políticas - significando que o Estado necessita ser
examinado e estudado por distintas perspectivas – da História, da Filosofia, da Política, da
Economia, do Direito, dentre tantos outros aspectos. Neste sentido, optou-se pela construção
de degraus que possibilitem ao capítulo final examinar com lucidez e clareza o Estado Social
Democrático de Direito e o orçamento público.

Outrossim, vale aqui destacar o pensamento de Marco Túlio Cícero, em 44 a.C., "é
justo e conforme à natureza humana haver autoridade civil com poder temporal para reger os
homens [...]”. Para o Pensador romano, havia necessidade de um Poder capaz de conter o
ímpeto humano. Cícero justifica sua afirmação com amparo em dois princípios: “primeiro,
que o homem é um animal social, que tende naturalmente e com toda a razão para viver em
sociedade [...], segundo, que na sociedade perfeita é necessário que haja um poder a que
pertença o governo da coletividade [...]. Sem isso haveria nela a maior confusão".
22

1.1 Destaque sobre a embriogenia do Estado

Sempre que se aborda a embriogenia do Estado, como o conhecido no século XXI, é


imperativo se revisitar, primeiramente, não os antecedentes históricos, mas as causas
originárias deste Estado. Dessarte, constata-se que o Estado não decorre somente de um
processo histórico e de desenvolvimento, como expresso antes. Sua origem é mais profunda e
remonta à sociedade natural, que está na natureza humana racional das pessoas que a
constituem. Esta causa natural é uma força instintiva, uma tendência “ainda insuficiente para,
por si mesma, coagir os homens a constituírem uma sociedade” nas palavras de Becker (2002,
p. 155), mas tal instinto necessita atuar positivamente, pela ação, pois depende unicamente da
vontade dos homens como animal social racional que é. Becker (2002, p.156) adverte para a
noção de que a “natureza leva os homens a criarem a sociedade política, mas é a vontade dos
homens que realiza esta criação”.

Assim, o criador do Estado, a que Becker chamou de Ser Social, é o ser humano,
que, por instinto e irracionalidade por natureza, atrai os homens a uma sociedade política do
tipo gênero, entretanto se os homens agem por um ato consciente também racional, dirigindo-
se para uma determinada sociedade política, esta não se configura como causa natural,
portanto, deve ser entendida como espécie daquele tipo gênero.

Ademais, cabe ressaltar que, uma vez criado este Ser Social (Estado), não se mantém
por si, mas tão somente num processo criativo com seu criador, “numa perpetua reafirmação
de sua própria unidade”. Portanto o Estado nasce por uma relação natural e sobrevive por ele
mesmo - utilizando a força natural imanente no fato da existência real do Ser Social - que
transfigura aquela relação natural, em relação de direito com o surgimento da personalidade
jurídica.

Portanto, as pessoas agrupadas em sociedade natural constituem a sociedade política,


a qual, por sua vez, por meio do Direito Positivo, dentro de certa coerência de existência,
criam o Estado, como uma organização estável destinada a atingir os fins a que se propõe o
Bem Comum, isto é, o Ser Social existe para realizar o Bem Comum. Assim, Becker (2002, p.
155) enfatiza que a embriogenia do Estado é uma espécie de “solidariedade psicológica” entre
as pessoas, porque “aquela atividade continua e relacionada ao Bem Comum é sustentada e
alimentada pela inteligência e pela vontade dos indivíduos humanos”.

É este Bem Comum que sustenta e alimenta esta relação entre as pessoas e que se
pode chamar de relação constitucional (no sentido de constituir) do Estado, distinto dos seres
23

que o constituíram. Becker adverte para o fato de que o Estado não age como o centro
gravitacional dessas relações, mas coordena e atua como um fenômeno de natureza espiritual
da sociedade Assim, as pessoas orbitam na periferia, enquanto no centro está o Bem Comum.
Deste modo, o Estado não atua nesse vínculo de constituição nem como pólo ativo, nem
passivo, pois aquele é a própria relação constitucional.

1.2 Pensamento filosófico do Estado e a soberania

As transformações ocorridas do século XIV ao XVI, com o advento do capitalismo


mercantil - associado aos conflitos religiosos entre o catolicismo e o protestantismo, de poder
entre a aristocracia e a burguesia e de produção entre camponeses e senhores feudais -
desencadearam uma progressiva suplantação do regime de produção feudal, assim como
acentuaram a centralização e o fortalecimento do Estado Absolutista1, na tentativa de tonificar
e encastelar o Estado soberano defendido por Thomas Hobbes (2004).

Neste âmbito de mudanças, o mestre florentino Maquiavel2 vivia a angustiante crise


de seu tempo, a dúbia relação entre a moral e a religião. Maquiavel escreve em sua obra mais
conhecida, O Príncipe, em que percebe a forma de conquista e manutenção do poder. Assim
inicia o capítulo I da obra, acentuando que, “Todos os Estados, todos os domínios que
imperaram e imperam sobre os homens, foram e são repúblicas ou principados” (1996, p. 46),
mas nesse estágio de evolução, ainda não se trata do Estado como organização política.

Maquiavel busca a preservação do Estado na figura do Príncipe e não na do território


e no povo, ou na soberania. O autor (1996, p.130-137) adverte para a noção de que o príncipe
novo não pode acatar todas as coisas com base nas quais os homens são tidos como bons,
sendo com frequência forçado a agir contra a lealdade, a caridade, a humanidade, contra a
religião, para manter o poder. Um príncipe deve agir de modo a vencer e conservar o poder. O
príncipe na conservação do poder poderá praticar a crueldade, e quando pratica o bem, deve
fazê-lo aos poucos, para ser lembrado; quando praticar a crueldade ou a maldade deverá fazê-
lo de uma só vez para ser temido, pois, de acordo com o autor, é melhor ser temido do que

1
Com as revoltas sociais dos camponeses, pela recusa do pagamento de impostos feudais e pelo crescimento das
cidades e do comércio, os feudos foram sendo minados pouco a pouco. A partir do século XIV, ocorreu um
processo de centralização e concentração das forças armadas e do monopólio da violência, da cobrança de
impostos para manter também o exercito e a estrutura jurídica. A centralização e a concentração desses poderes e
instituições caracterizam o estado moderno, que tem várias formas até hoje (BONAVIDES, 2004d, p.32-33).
2
Niccolò di Bernardo dei Machiavelli (1469-1527).
24

amado.

Com efeito, Bobbio (2007, p.50-54), tratando da impropriedade de usar a expressão


Estado, exemplifica com o caso de Maquiavel, o qual, por vezes, se utilizou da palavra
Estado, não para designar o Estado-sociedade, mas o Estado-máquina, e ressalta que, “após
Maquiavel, o Estado pode ainda ser definido como societas civilis, [...]”, assim como a
definição se mostrava “[...] cada vez mais incongruente e desviante”. Bobbio enfatiza que a
palavra “Estado” poderá ser encontrada em diversos escritos da Antiguidade e da baixa Idade
Média com semânticas diferentes e para designar aspectos distintos da vida do homem com os
homens, e o que se havia assimilado era a ideia de estado de natureza. Bem lembrou Bobbio
que “o contraste entre os estados e o príncipe, especialmente para estabelecer quem tem o
direito de imposição fiscal, constitui grande parte da história do desenvolvimento do Estado
moderno”.

Neste sentido, o Estado poderia significar a máquina estatal, o poder, o domínio do


príncipe sobre seus súditos. Diferentemente de Maquiavel, Hobbes utilizara a palavra
“Estado” em sua semântica atual, e identifica três formas de governo - a monarquia,
democracia ou governo popular e aristocracia, assim como as distorções das formas de
governo acima - a tirania, oligarquia ou anarquia (2004, p.140).

Cabe ressaltar que, como homem de sua época, Jean Bodin3 entendia que este poder
absoluto do monarca adivinha de Deus, ficando conhecido como o teórico do Direito divino
dos reis. Para Jean Bodin, entretanto, a soberania é uma síntese de três aspectos: “soberania
como o poder de influencia elevada e eminente; o poder normativo e legislativo senhorial;
poder senhorial de gerir a administração pública”(2011, p.196).

O Príncipe é soberano4, assim como “o poder outorgado ao tenente do Príncipe é


chamado de soberania”, cabendo frisar que este poder é sempre exercido em termos de
direito, isto é, segundo a lei. Para Bodin5, o poder soberano pode se impor coativamente sobre
os indivíduos, mas nos limites da lei. Assim, para distinguir o príncipe soberano dos demais

3
Jean Bodin (1530-1596).
4
Utilizou-se desta teoria para asseverar a legitimação do poder do homem sobre a mulher, bem como o poder da
monarquia sobre a gerontocracia [...] a investidura do Império, que prestam fé e homenagem ao Império, em
suma que são súditos naturais do Império, originários de terras sujeitas ao Império: como poderiam ser
absolutamente soberanos? Como poderia ser soberano aquele que reconhece a justiça de uma maior? [...] O que
mais se pode desejar de um Príncipe soberano?(2011, p.291).
5
Gerontocracia é o governo dos mais velhos, dos anciãos.
25

homens, e torná-lo superior, Bodin descreve as cinco marcas da soberania: o poder de dar a lei
a todos em geral e a cada um em particular; o poder de declarar a guerra e tratar a paz; o poder
de instituir os primeiros oficiais [...] todos os magistrados; o poder em última alçada; o poder
de conceder graças aos condenados por sobre as sentenças e contra o rigor das leis(2011, p.
298-314).

Com base nos contratualistas, poder-se-á identificar uma mudança de paradigma no


significado de Estado: Hobbes6 procura a origem do Estado, identificado com Estado
absoluto, cujo “contrato constitutivo desse Estado é um contrato de renúncia e de
transferência dos próprios direitos naturais em favor de um terceiro - o soberano” (2004, p.
132). Logo para Hobbes “não se tem liberdade de resistir à força do Estado [...]”, portanto
“[...] essa liberdade priva a soberania dos meios para proteger-nos, sendo, portanto destrutiva
da própria essência do Estado”. Esta visão de Estado torna-se evidente no pensamento
hobbesiano, quando trata da liberdade do homem, porque “fica abolida ou limitada ao poder
do soberano de vida e morte”(2004, p.160-167).

Hobbes atribui aos homens características (egoísmo, ambição e crueldade) que os


levaria a uma guerra sem fim, levando-os à própria destruição, por este motivo os homens
celebram um pacto (acordo) que impede essa destruição, visando a sua preservação. Assim a
multidão unida em uma só pessoa se chama Estado, ou civitas. Esta é a criação do grande
Leviatã - um deus imortal - (o Estado) que nada mais é do que um homem artificial, “de maior
estrutura e força que o homem natural”, e a soberania é a alma artificial desta criatura.

Neste contexto, a finalidade do Estado para Hobbes era a segurança pessoal que não
existe no Direito (lei) natural, assim como não existe no homem, nem na família, nem nas
grandes multidões, que somente pode ser assegurada por este homem artificial, isto é,
somente um poder acima das individualidades poderia garantir a segurança de todos.

Enquanto, para Hobbes o pacto resulta em um Estado absolutista, para Locke7 o


contrato é corolário de um Estado liberal, capaz de assegurar os direitos naturais do homem.
Podem ser destacados como Estados absolutistas a França, a Itália, a Inglaterra e Portugal, e
os fatos que contribuíram para a sua derrocada foram a Revolução Gloriosa, de 1688/1689, o
Iluminismo e a Revolução Francesa, de 1789. Como se pode constatar, esta passagem do

6
Thomas Hobbes (1588–1679).
7
John Locke (1632-1704).
26

Estado absoluto para o Estado liberal não foi pacifica, porém marcada por profundas
transformações no modo de ver e ser do homem e da sociedade, em especial, do Estado.

Neste momento, é mister fazer breve contextualização da obra “Dois tratados sobre
o governo”. Locke se dedicou, no primeiro livro, a refutar as ideias de Sir Robert Filmer e no
segundo foi levado por Filmer a expressar-se como liberalista e acabam sendo mal
interpretado. Por este motivo, muitos entendem tratar-se de contraposição ao pensamento
hobbesiano. Foi sob a influência de Filmer, porém, que Locke apresentou suas crenças na
liberdade e na igualdade de todos os homens e sua concepção de Estado8. Locke(2005, p.433-
434) acentua que a liberdade somente poderá ser atingida por meio da lei, pois “[...] o fim da
lei não é abolir ou restringir, mas conservar e ampliar a liberdade, pois onde não há lei, não há
liberdade”.

E continua, mais adiante “[...] presume-se que saiba até que ponto essa lei deve ser
guia e até que ponto fazer uso de sua liberdade, e assim chega a obtê-la”. Para o autor no
estado de natureza todos os homens estão “[...] em perfeita liberdade para regular suas ações e
dispor de suas posses e pessoas do modo que julgarem acertado, dentro dos limites da lei da
natureza [...]” (2005, p.382). Isto é, assegurar os direitos naturais do homem, direito à vida, à
liberdade e à propriedade privada, reconhecendo no trabalho o princípio de toda propriedade,
garantido pelo direito de resistência.

O Estado, como criação garante os direitos naturais, era dotado de um poder


(derivado) soberano, de tal forma aparelhado para a coação incondicional. O Estado estava
apto a exercer um poder de polícia (sucessor do jus politiae, o qual abrangia uma série de
normas postas pelo príncipe) que se restringia à valorização daquela liberdade e das
crescentes estruturas criadas durante o Estado Liberal - destinada a manter a ordem, a
tranquilidade e a salubridade pública (MEDAUAR, 2004, p. 331-341).

Em meio a esta realidade de profundas transformações sociais, Montesquieu9


concentrou seus escritos sobre a questão da estabilidade dos governos, retomando a
problemática de Maquiavel sobre a manutenção do Poder. Neste sentido, exprime a salvação
do povo pela lei suprema (2010, p. 508). Não é qualquer lei, mas leis e instituições criadas

8
Nesses últimos tempos, brotou entre nós uma geração de homens dispostos a adular os príncipes com a opinião
de que têm eles um direito divino ao poder absoluto, [...] porquanto também eles, segundo o sistema desses
homens, nascem escravos salvo um único, e estão submetidos, pelo direito divino, ao herdeiro legítimo de Adão
(2005, p.205).
9
Charles-Louis de Secondat, Baron de La Brède et de Montesquieu (1689-1755).
27

pelos homens para reger as relações entre os homens, isto é, o espírito das leis, ou melhor, o
espírito entre as leis e as coisas (organização comercial, relações de classes, organização e
instituições do Estado), buscando explicar essas coisas com suporte em leis da Ciência
Política (ALBUQUERQUE, 2011, p.116). Ainda sobre a lei, quando Montesquieu (2010,
p.31) se refere ao sufrágio e à participação do povo no governo, ressalta que “[...] é lei
fundamental da democracia que só o povo faça as leis”.

Na segunda metade do século XVIII, a burguesia se utilizava dos ideais e da filosofia


política do liberalismo (pelo mesmo em tese) que se opunha a qualquer tipo de
monopolização do poder. Surgiam os primeiros mecanismos destinados a garantir a liberdade
e a propriedade individual. Portanto, o ideal da tripartição dos poderes do Estado fazia parte
de um controle (oposição) de poder concentrado nas mãos do monarca, a que Montesquieu
(2010) chamou de “técnica de acautelamento do poder”, assimilada e adotada pelo
liberalismo: a “separação dos poderes do Estado”, ou sistema de moderação conhecido por
“freios e contrapesos”. Outrossim, aponta para a existência de duas fontes de poder político:
“o rei” e “o povo” (ALBUQUERQUE, 2011, p.120).

No mesmo conduto, Montesquieu (2010, p. 27-32), ao descrever as três espécies de


governo (republicano, monárquico e despótico), também o fez em relação ao funcionamento
da democracia no Estado: “[...] o governo republicano é aquele em que o corpo do povo, ou
somente parte do povo, tem o poder soberano [...]” para ele “Quando na república o corpo do
povo tem o poder soberano, temos a democracia”, e que este “povo, na democracia, é, sob
certos aspectos, o monarca; sob outros, é súdito”.

Para Montesquieu (2010, p. 508), “A lei política destrói o Estado deve-se decidir pela
lei política que o conserva, que se torna cada vez um direito das gentes”, portanto, para ele o
imperativo da “separação do poder” funcionava como freio ao poder estatal, e somente a lei
(produção legislativa) seria capaz de conter a concentração desse poder, daí por que o império
da lei, a separação dos poderes e a enumeração por lei das garantias dos direitos individuais.

Ao discorrer sobre a divisão feita por Sólon10 do povo de Atenas em quatro classes,
Montesquieu (2007, p.30-31) descreve o Estado popular, cujo povo é dividido em classes e

10
Sólon 638 – 558 a.C.- Considerado pelos antigos um dos sete sábios da Grécia antiga. Iniciou a reforma das
estruturas social, política e econômica em Atenas. Como profundo conhecedor das leis, artículos a reforma
legislativa: abolição da escravidão por dívidas; reforma timocrática ou censitária - a participação não era mais
por nascimento, mas censitária, através do Conselho de 400; reforma do sistema de pesos e medidas
(BONAVIDES, 2004d, p. 379-381).
28

“foi na maneira de fazer esta divisão entre classes que os legisladores se assinalaram; e
sempre dependeu disso a duração da democracia e a sua prosperidade”. Montesquieu aborda o
“direito de voto” de algumas classes na república e “como a lei fundamental” deve estabelecer
o modo de exercer o direito de voto, de forma que todo cidadão saiba como “servir a pátria”.
A seguir adverte “que o voto deve ser público” e “[...] ao tornarem secretos os sufrágios,
destruíram tudo”.

Ao mesmo tempo em que Montesquieu tratava da estabilidade dos governos,


Rousseau11 (2012, p. 29) exprimia seu pensamento baseado no ideal de liberdade. Para
Rousseau, a liberdade natural é a liberdade na ausência de lei, e a liberdade civil consiste na
submissão à lei - o homem civil obedece somente às leis que dá a si mesmo. Para o autor, o
contrato social era um ato coletivo de renúncia aos direitos naturais, tendo consequência
direta no Estado democrático, para quem a renúncia difere tanto de Hobbes, quanto de Locke.
A renúncia para Rousseau não se dá em favor de um terceiro, soberano ou não, mas “a
renúncia por um em favor de todos” (2012, p. 39), que representa a vontade geral, portanto de
a pessoa si mesma, como parte do todo. Não se confunde com a liberdade do Estado
(garantidor) de Locke, tampouco com o de servidão no Estado de Hobbes.

Para ele haveria liberdade no Estado, uma “forma associativa, que defenda e apoie
com toda a força coletiva a pessoa e os bens de cada um dos membros e por meio da qual
cada um, unindo-se livremente a todos, obedeça somente a si mesmo e permaneça livre como
antes” (2012, p. 26). Para Rousseau, a liberdade civil era baseada na submissão à lei. Não se
trata de liberdade perante uma instituição formal, mas uma participação consciente e de
acordo com a lei do Estado, que consiste no arcabouço do Estado Democrático.

Para Rousseau, a legitimação decorrente do pacto social se estende para a máquina


ou uma comunidade política que se realiza pela vontade geral, o corpo administrativo do
Estado como órgão limitado pelo poder do povo. Rousseau reconhece a necessidade de
representantes escolhidos pelo povo, isto é, o exercício da vontade geral mediante a
representação significa uma verdadeira sobreposição de vontades, mas os representantes
(legisladores) necessitam conhecer a vontade do povo e não exprimi-los à servidão. Nesse
estádio de evolução, o Estado já se configurava como organização política, composta por um
território, um povo, mas a soberania estava concentrada no povo – soberania popular.

11
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778).
29

Com a consciência da liberdade do homem perante o Estado, a França avançara na


direção de uma democracia direta na busca por uma vontade geral (estatal), e não aquela
vontade individual, como difundida pela burguesia. Sob outro prisma, o Estado de Direito
forjado pelo ideal liberalista de conquista de liberdade a todo custo não conseguira constituir
uma democracia, de sorte que o princípio liberal, arcabouço do governo de uma classe, deu
lugar ao princípio democrático, com o governo de todas as classes, na busca por um modelo
de representação substituindo aquela implantada pela burguesia (marcada por discriminações
e privilégios).

Do jusnaturalismo ao juspositivismo, ocorreu o embotamento da racionalidade, na


tentativa de uma prevalência da legalidade com base no pensamento iluminista dos séculos
XVII e XVIII. O jusnaturalismo teve como arcabouço uma ideia de justiça universal válida,
combustível para as revoluções liberais, que atingiu o apogeu com as constituições escritas e
as codificações, enquanto o juspositivismo equiparou o Direito à lei e separou do Direito a
Filosofia, abandonando por completo os debates sobre temas como a justiça e a legitimidade,
considerados conteúdos metafísicos.

O Estado de Direito do século XVIII é fruto de uma profunda contradição, pois, nas
palavras de Bonavides (2007, p.42-43), “A burguesia acordava o povo, que então despertou
para a consciência de suas liberdades políticas [...]”, ou seja, “[...] a escola do direito natural
da burguesia racionaliza o problema delicadíssimo do poder [...]” e “fez, pretensiosamente, da
doutrina de uma classe a doutrina de todas as classes”.

Com se observa, não existe a priori uma definição ou conceito único de Estado de
Direito, todavia seria possível afirmar suas características preponderantes, pois, nele se
destacam o império da lei, a divisão dos poderes do Estado e a existência de enunciados e
garantias de direitos individuais, portanto, uma conquista da civilização de influência
liberalista. Assim, tem-se que, dependendo da concepção o Estado de Direito, admitirá
significações diferentes, sem, contudo, perder sua essência e características.

Vale ressaltar que, durante esta fase, algumas características foram sendo observadas
e cotejadas, tornando possível identificar a origem do Estado de Direito. Como mostrado por
José Afonso da Silva (2002, p.112-115), o Estado de Direito remonta aos ideais liberais e
exprime características marcantes que diferem das demais associações: primeiro a submissão
ao império da lei, resultado da produção do Parlamento que representava o povo, ou a
vontade do povo. A segunda era a divisão dos Poderes do Estado, independentes e harmônicos
30

entre si - Legislativo, Executivo e Judiciário - como forma de assegurar a independência


legislativa dos demais poderes para produção de leis - como expressão da vontade do povo
dotado do poder originário. A derradeira característica é o enunciado e garantia dos direitos
individuais, frutos da Revolução Francesa, incorporados pelo Estado de Direito como forma
de preservar direitos conquistados a duras penas, ao longo da história da humanidade.

Cada um desses cânones revela um Poder superior ao próprio Estado de Direito,


associado ao modelo de Estado liberal clássico (cuja interferência estatal na vida privada dar-
se-ia para regulá-la negativamente, portanto, de predomínio abstencionista). Isto conduz à
existência de um poder discricionário implícito e velado, capaz de interferir na vida privada,
ou, nos casos de ordem pública, subvertendo o poder originário e exclusivo da lei de regular
as relações e o Direito.

Na America, partiu-se de uma vontade de unificação das 13 colônias britânicas, o que


resultou na independência do jugo inglês, em 1776, e na elaboração da Constituição dos
Estados Unidos da América em 1787. Hamilton12, procedente de família de comerciantes,
Madison13, oriundo de plantadores de tabaco, da Virginia, e John Jay14, procedente de
comerciantes, foram três importantes personagens que se destacaram na elaboração da
Constituição do norte e na criação do Federalismo estadunidense, fortemente influenciado
pelo pensamento da separação de poderes e o sistema de freios e contrapesos de Montesquieu.

Da mesma forma, foram influenciados pelo pensamento rousseauniano de soberania


popular e democracia, bem como o princípio republicano e a facção das forças políticas que
atuavam no Estado. A recém-criada Constituição aboliu o regime confederativo (o qual cada
colônia independente elaborava a própria Constituição), unificou o Estado em uma Federação,
com a descentralização do poder, buscando assegurar maior representatividade política de
cada Estado, dando-lhes autonomia financeira, administrativa e política. A expressão
federalismo nasceu com a Constituição dos EUA de 1787, baseado na coletividade política
autônoma.

As profundas mudanças ocorridas desde o pensamento racionalista do século XVIII


levaram ao total abandono do Direito natural, da legitimidade e da justiça, de natureza
metafísica, para a rigidez do pensamento positivista do século XIX, ou seja, de uma sociedade

12
Alexander Hamilton (1755-1804).
13
James Madison, Jr. (1751-1836).
14
John Jay (1745-1829).
31

civil garante da vontade geral para uma sociedade positivada, partindo da ideia de que mesmo
o contrato social, positivado, era insuficiente para assegurar a liberdade e a igualdade
conquistada a duras penas. Com efeito, outras forças passaram a interagir no Estado, com o
sistema capitalista, expresso por John Stuart Mill15, com o pensamento econômico político,
que consistia numa crítica ao direito pós-industrialização inglesa do século XIX.

Destarte, o século seguinte à Revolução Francesa foi marcado por movimentos de


anarquistas, socialistas utópicos, socialismo científico, socialismo cristão e pelo marxismo, os
quais modificaram o arquétipo do Estado Liberal, com destaque quanto à sua origem na teoria
de Rousseau. Premido pela Revolução Russa de 1917, o Estado Liberal evoluiu para o Social,
com a Constituição Mexicana de 1917 e a Alemã de Weimar de 1919; restou claro porque não
bastava ao Estado garantir ao cidadão direitos como a liberdade de pensamento se este não
tinha educação suficiente para elaborar as próprias ideias.

No século XIX, John Stuart Mill já antecipava a necessária justiça social, onerando
os mais abastados em detrimento dos mais pobres, mas a soberania popular somente teve
origem no Estado Democrático de Direito, pós-guerra fria, quando passou a existir uma
soberania jurídica estatal, já indicada por Kelsen (2003, p.215-217) em sua teoria da norma
fundamental.

Poder-se-ia assinalar que, da norma fundante do Estado de Kelsen (2003, p. 221)


para o constitucionalismo garante da unidade política e da soberania popular, há um
esvaziamento da política - ambiente de debate dos interesses do Estado - e o fortalecimento do
Poder Judiciário ao assumir a função de protagonista do debate e da prática constitucional.

No inicio do século XX, ocorreram na Europa profundas mudanças de paradigma


com a divulgação da obra de Konrad Hesse (1991) “A forca normativa da Constituição,” que
atribui normatividade às Cartas Magnas, isto é a Constituição adquire o status de norma
jurídica. Esta ideia surgiu da refutação expressa por Konrad Hesse às duras críticas à
Constituição feitas por Ferdinand de Lassalle (2011), na obra “O que é uma Constituição”,
publicada em 1862.

Para Lassalle (2011, p.29), “essa16 é, em síntese, em essência, a Constituição de um


país: a soma dos fatores reais do poder que regem um país”. Escritas numa folha de papel,

15
John Stuart Mill, de1806 a1873.
16
Referindo-se “aos fatores do poder e as instituições jurídicas, com base numa “Folha de Papel”.
32

“dá-se-lhes expressão escrita e, [...] incorporados a um papel, não são simples fatores reais de
pode [...]”. Lassalle rejeitava os movimentos burgueses na França e o lassez-faire, pensamento
fisiocrático dominante à época.

E tratando, no capítulo III, O Poder do Povo é invencível, Lassalle (2011, p.43) se


reporta às expressões de poder representadas pelo Absolutismo, Revolução Francesa e
Revolução Burguesa alemã para demonstrar que o poder do povo é muito superior ao do
Exército, fazendo três conclusões práticas.

Por sua vez, Hesse, contrapondo-se às crítica de Lassalle, exprime suas reflexões
sobre a obra do primeiro. De forma resumida, para Hesse os fatores reais do poder formam a
Constituição real do país. A Constituição escrita, esse pedaço de papel (nas palavras de
Lassalle), terá que sucumbir diante dos fatores reais de poder dominantes no País. Atribuiu à
Constituição uma força superior à força das normas jurídicas, pois a normatividade se
submete à realidade fática, isto é, a força condicionante da realidade e a normatividade da
Constituição que não podem ser separadas. Para Hesse (1991, p.16), a “Constituição adquire
força normativa na medida em que logra realizar essa pretensão de eficácia”.

Como enfatizado por Friedrich Müller, em entrevista a Lima e Albuquerque (2006, p.


22), “uma constituição (no caso brasileiro, a de 1988) não é somente uma simples lei
constitucional. Ela é o fundamento obrigatório da ordem jurídica na política, na sociedade e
na vida de todos no país”. Esta ordem jurídica, entretanto, baseada na Constituição, vem
acompanhada de uma crise entre os poderes do Estado, não somente no Brasil, mas, em
essência, no Estado Democrático de Direito.

Neste crescente desequilíbrio e grande assimetria entre os poderes, houve a crise de


representatividade, expondo a fragilidade do Parlamento, que não consegue acompanhar o
dinamismo da sociedade e as demandas do Poder Executivo, deixando espaço para o Poder
Judiciário atuar. Nesta analise, contatou-se que, nos séculos XVIII, XIX e XX, ocorreu uma
radical e abrupta transformação das sociedades consideradas ocidentais saídas do absolutismo
monárquico para uma constituição de Estados-nação, que promoveu mudanças de ordem
conceitual e estrutural, bem como de funcionamento no Direito, assim como na maneira de
ver, ser e viver do homem e no ambiente em que vive.

Retomando a questão do significado de Estado, cabe aqui ressaltar a anotação feita


por Carl Schmitt (1994, p. 42), ao advertir para a diversidade de significações da expressão
“Estado de Direito”, bem como das palavras “Estado” e “Direito”. Para ele, há um Estado de
33

Direito feudal, um Direito natural, um Direito racional, um Direito histórico - da mesma


forma como o Estado popular, o Estado de polícia, o Estado jurídico de Kant, o Estado ético-
cultural de Hegel e o Estado constitucional de Montesquieu, Estado social, Estado econômico
e Estado democrático, cujos sentidos semânticos possuem significados diferentes, desde um
prisma, onde se vê a decomposição do incolor em várias cores, também admitem imprecisões
as quais dificultam ainda mais a compreensão.

Ressalte-se que não se pretende dizer que haja uma só terminologia correta, mas este
significado de Estado de Direito representa uma evolução na Teoria do Conhecimento, e
admite esta variedade de configurações ao longo do tempo. Para José Afonso da Silva (2002,
p. 115), esta doutrina “converte o Estado de Direito em mero Estado Legal”, e em verdade
“destrói qualquer ideia de Estado de Direito”.

Ademais, no final do século XIX, os movimentos sociais já apontavam para a


insuficiência dos ideais da burguesia, pois a sociedade buscava consolidar uma consciência
coletiva de justiça social. Estavam superados o individualismo e o abstencionismo do Estado
liberal e as injustiças do passado. As conquistas liberalistas, todavia, não poderiam ser
esquecidas ou suprimidas, mas havia uma necessidade de ampliação daqueles direitos
individuais, uma mudança no modo de ver e ser em sociedade, transpondo o individualismo
(Direito liberal) em favor de direitos sociais, bem como a realização de uma justiça social.
Para Eros Grau (2012, p. 21), a cisão entre a sociedade civil e o Estado só ocorreu com a ideia
de intervenção. Ao intervir, o Estado entrou no “campo que não é seu, campo estranho a ele, o
da sociedade civil - isto é, o mercado”.

Para o autor, o declínio do liberalismo (imperfeições e injustiças) é bastante “[...]


evidente na passagem do século XIX para o século XX associado à impossibilidade do
mercado se autorregular desencadeou a superação de novas necessidades pelo Estado”, cuja
função passou a ser “de se organizar juridicamente diante deste novo “Poder” econômico”.
Ademais, torna-se evidente a inviabilidade do capitalismo liberal, “[...] com a instituição do
monopólio estatal na emissão de moeda - poder emissor -, na consagração do poder de polícia
e, após, nas codificações, bem como na ampliação do escopo dos serviços públicos”. Neste
estádio o Estado intervencionista já havia assumido o papel de agente regulador da economia
(GRAU, 2012).

Nesta concepção, Estado e sociedade baseiam-se em determinadas suposições sobre


a natureza do Universo, isto é, Estado e sociedade fazem parte da ordem natural do Universo,
34

que é uma criação divina. Na perspectiva de Burke17 (2014, 19), “Deus criou um Universo
ordenado, governado por leis eternas”. Neste sentido, Bonavides oferece valiosa contribuição
que possibilita conhecer e compreender a origem e formação do Estado, exprimindo a
“construção do Estado jurídico, como cuidavam os pensadores do direito natural” em especial
os racionalistas, como Kant, cujo núcleo central do pensamento gravitava ao redor da
liberdade ilimitada do homem em sociedade, devendo o Estado primitivo figurar como
verdadeiro servo do individuo, mas de relevância para “organização da liberdade no campo
social”. O Estado é armadura, defesa e proteção da liberdade (BONAVIDES, 2007, p. 40-62).

Para o constitucionalista paraibano (2007, p. 206-207), o “Estado Social é, de


natureza, dialético”, pois é resultado de “[...] um processo histórico de cuja inteligência se faz
indeclinável [...]” para a compreensão do presente, teve início na “[...] Grande Revolução
filosófica, política e social gerada pelas luzes da racionalidade do século XVIII”, associada a
“[...] hegemonia do terceiro estado18 [...]” (a burguesia) e com a ideologia “[...] socialista a
formação do quarto estado19 [...]” (a classe operária) e o “[...] consenso democrático”
forjaram o Estado Social ante uma nova concepção de liberdade.

Portanto, nem a Revolução Francesa (não foi pela guilhotina que ocorreram as
transformações históricas, mas pelo Estado de Direito, a legitimidade republicana, o
constitucionalismo, o regime representativo, as liberdades políticas, os direitos individuais, a
majestade da pessoa humana), nem a Revolução Russa (não foi somente pela ditadura do
proletariado, nem pela burocracia soviética, ou pelo absolutismo de Stalin, nem os campos de
concentração foram capazes de corporificar o Estado social democrático) isoladamente, são
reconhecidas como forças motrizes de tão profundas transformações, em tão curto espaço de
tempo, mas, sim, o processo histórico que passou a ser considerado o “centro de gravidade de
todo o processo de libertação civil e social do Homem e razão de ser da nova ordem jurídica e
constitucional da Sociedade” (BONAVIDES, 2007, p. 210-211).

17
Edmund Burke (1729 – 1797).
18
O terceiro Estado - consiste no Poder político da burguesia, fruto da Revolução Francesa, que implanta na
França o Estado liberal-democrático. Trata-se de um Poder progressista e necessário á liberdade humana. À
exceção da Inglaterra que preservou a monarquia, portanto a nobreza se mistura com a burguesia para a
formação do terceiro estado (BONAVIDES, 2004d, 145-160).
19
O quarto estado - consiste no Poder da classe operária, nasce da Revolução Industrial, produto político do
Poder soviético, que cria a ditadura do proletariado e burguesia soviética e antecede à democracia social
(BONAVIDES, 2004d, 299-300).
35

Muito embora a Constituição dos Estados Unidos de 1787 tenha sido a primeira,
historicamente, seguida da Francesa Revolucionária de 1789, o advento do primeiro Estado
constitucional cunhado das ruínas do feudalismo, cuja noção de povo, herança do
jusnaturalismo, foi a mola impulsionadora da ação revolucionaria francesa, que incorporou o
espírito de nação e tomou consciência do seu destino, propagando a imortalidade do povo, e a
nação sintetiza a vocação de perpetuação. Nasce o Poder legítimo e inconteste do povo,
cotejado ao recuo do “direito da força” que cede lugar à “força do Direito”, e constitui
elementos, dentre outros aspectos históricos já mencionados, que antecipam a pré-
compreensão do Estado constitucional contemporâneo (BONAVIDES, 2004d, p.34-37).
Destarte, a conversão do Estado absolutista em Estado constitucional decorre da “força do
Direito”, isto é, da lei.

Bonavides (2004, p. 37) esclarece que o Estado constitucional ostenta três distintas
modalidades essenciais: o Estado constitucional da separação dos poderes, o Estado
constitucional dos direitos fundamentais e o Estado constitucional democrático, que
correspondem, respectivamente, ao Estado Liberal, o Estado Social e o Estado Democrático-
participativo. Não se pode acreditar, entretanto, que o Estado tenha ou possa parar de evoluir,
tampouco tenha perdido sua identidade como Estado de legalidade, apesar das crises por que
passa. Tal como o Homem, o Estado está em constante evolução e em perene transformação
dentro de uma dialética teleológica da sociedade. Para Adam Smith o soberano deveria tratar
da justiça, da segurança, das estradas, pontes, portos e canais, da educação da juventude, alem
de cuidar da imagem e respeitabilidade de seu cargo (GIACOMONI, 2012, p.21).

No Brasil, a conversão do Estado social de arbítrio (representado pelo governo


militar desprovido de legitimidade) pelo Estado social de Direito foi marcado pela
Constituição de 1988, dotada de força normativa plena, todavia é assimilada pela assimetria, a
crescente judicialização, a crise de legitimação e a evolutiva normatividade em bases
constitucionais.

A primeira e principal característica do Estado Constitucional de Direito consiste da


pluralidade de fontes normativas, para depois admitir outras características, como a
positivação, não somente legal senão constitucional, e de direito internacional dos direitos e
garantias fundamentais (dando como exemplo os §§ 2º e 3º, do art. 5º da Constituição
brasileira de 1988). A segunda característica é a subordinação da produção legislativa
ordinária à Constituição do Estado, bem como ao Direito Internacional em matéria de direitos
humanos. A terceira repousa na superação da democracia formal (das maiorias, o tipo de
36

normas de direitos abstratos, tais como o direito de ir e vir) pela democracia substancial
(material, como a democratização dos bens econômicos).

Portanto, nesta realidade, agravada com os movimentos de oposição ao capitalismo


exacerbado descrito por Lênin (2010, p. 47-60) com “o imperialismo dos detentores do capital
monetário” e a hegemonia em associação à necessidade de assegurar direitos e garantias
sociais, e sob forte influência das constituições do México (1917) e da Alemanha (Weimar-
1919), as quais introduziram em seus textos capítulos para tratar de direitos econômicos e
direitos sociais. Assim, ficou latente a positivação do Direito econômico, como “um sistema
de valores, orientados para um ideal de justiça, dinamicamente estruturado em instituições e
preceitos que demarcaram esferas de liberdade individual e organizaram os campos de
coercitiva subordinação ao interesse coletivo” (VIDIGAL, 1977, p.7), e não mais o cáustico
duelo entre os interesses econômicos e os sociais.

1.3 Estado democrático e humanista de Direito

É crescente a pressão dos organismos internacionais nos Estados-nacionais,


especialmente em matéria de direitos humanos, mesmo quando tais normas estão
expressamente inventariadas no ordenamento jurídico doméstico. O grau de intervenção
internacional é cada vez maior, em todos os Estados, bem como a crescente capacidade
coercitiva desses organismos; em especial, nos Estados democráticos, onde tais direitos já são
largamente disciplinados, assim como são fiscalizados pelos diversos agentes sociais e pelo
Poder Judiciário, que neste quadro têm atuação cada vez mais marcante.

O Estado brasileiro introduziu no seu ordenamento jurídico o § 3º, do art. 5º, CF/88 -
uma verdadeira mudança de paradigma que se deu após a edição da Emenda Constitucional nº
45/2004. Pela dicção da EC, os tratados internacionais sobre direitos humanos que forem
aprovados em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por um quorum qualificado
de três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas
constitucionais; desta feita adquirem o status de EC, passando a compor o bloco de
constitucionalidade, ou seja, passam a integrar formalmente o conjunto das normas
constitucionais (MAUÉS, 2013).

No Brasil, os juízes/tribunais já realizavam, minimamente, um controle de


convencionalidade material (§ 2ª, do art. 5º, da CF) dos tratados de direitos humanos
ratificados pelo Estado brasileiro antes da edição da EC nº 45/2004. Nesta fase, todos os
37

tratados internacionais possuíam o mesmo nível hierárquico na pirâmide kelseniana das


normas jurídicas, portanto fossem elas de direitos humanos ou não, possuíam o mesmo status
de Lei Ordinária (SARLET, 2006). Vê-se a interpretação feita pelo STF com a leitura do
acórdão na ADI 1480 MC20, com transcrição parcial.

Vale destacar o fato de que a expressão controle de convencionalidade nasceu na


França com a Decisão nº 74-54 DC, de 15/01/1975, do Conselho constitucional, e
posteriormente a Corte Interamericana de Direitos Humanos passou a exigir que o Poder
Judiciário, dos Estados-partes signatários da Convenção Americana de Direitos Humanos
(CADH), exerça o controle de convencionalidade das normas jurídicas internas, aplicando-as
no caso concreto (MARINONI, 2013). Assim, os Estados-partes do Pacto de São José da
Costa Rica se obrigam a controlar a constitucionalidade e a convencionalidade das leis com o
ordenamento jurídico doméstico de cada pais. O termo é reconhecido em vários idiomas com
suporte na mesma raiz - convencionalidad, konventionalität, convenzionalitá, conventionality,
conventionnalité etc. (ESPAÑA, 2014).

A normatividade emergente dos tratados internacionais, no sistema jurídico do


Estado, no que concerne à hierarquia das fontes, ocupa igual plano e mesmo grau de eficácia
em que se posicionam as leis ordinárias internas. O STF (na Carta Rogatória nº 8279 -
República Argentina, Ministro Celso de Mello - Presidente, j. 04/05/1998) compreendeu que a
“[...] precedência dos atos internacionais sobre normas infraconstitucionais de direito interno
somente ocorrerá, não em virtude de uma inexistente primazia hierárquica, mas, sempre, em
face da aplicação do critério cronológico (lex posterior derrogat priori) [...]”.

Portanto, no julgamento RHC 79785, j. 29/03/200821 sob a relatoria do ministro

20
O primado da Constituição, no sistema jurídico brasileiro, é oponível ao princípio pacta sunt servanda,
inexistindo, por isso mesmo, no direito positivo nacional, o problema da concorrência entre tratados
internacionais e a Lei Fundamental da República, cuja suprema autoridade normativa deverá sempre prevalecer
sobre os atos de direito internacional público. Os tratados internacionais celebrados pelo Brasil - ou aos quais o
Brasil venha a aderir - não podem, em consequência, versar matéria posta sob reserva constitucional de lei
complementar. É que, em tal situação, a própria Carta Política subordina o tratamento legislativo de determinado
tema ao exclusivo domínio normativo da lei complementar, que não pode ser substituída por qualquer outra
espécie normativa infraconstitucional, inclusive pelos atos internacionais já incorporados ao direito positivo
interno.(ADI 1480 MC, Relator(a): Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgado em 04/09/1997, DJ 18-05-
2001).
21
A Constituição do Brasil e as convenções internacionais de proteção aos direitos humanos: prevalência da
Constituição que afasta a aplicação das cláusulas convencionais antinômicas. [...] alinha-se ao consenso em torno
da estatura infraconstitucional, na ordem positiva brasileira, dos tratados a ela incorporados. [...] mesmo em
relação às convenções internacionais de proteção de direitos fundamentais, preserva a jurisprudência que a todos
equipara hierarquicamente às leis ordinárias. (BRASIL, 2003, p. 343-360).
38

Sepúlveda Pertence, a orientação do STF, à luz da Constituição e da Convenção Americana de


Direitos Humanos, vê-se a prevalência da Constituição que afasta a aplicação das cláusulas
convencionais antinômicas. “[...] alinham-se ao consenso em torno da estatura
infraconstitucional, na ordem positiva brasileira, dos tratados a ela incorporados [...]” mesmo
em relação às convenções internacionais de proteção de direitos fundamentais, preservando a
jurisprudência que a todos equipara-se, hierarquicamente, às leis ordinárias, na ordem positiva
brasileira.

Outro aspecto jurídico importante reside em esclarecer que, no Estado brasileiro, os


tratados, em sentido lato, denotam um elevado grau de complexidade procedimental até serem
ratificados pelo chefe do Poder Executivo, e cuja natureza jurídica, segundo entendimento
corrente do STJ e STF, é de “ato subjetivamente complexo”. Isso significa dizer que desde a
fase internacional, fase nacional, até a ratificação pelo Decreto presidencial os tratados
tramitam inúmeras vezes pelos Poderes Executivo e Legislativo, inclusive pela Comissão de
Constituição e Justiça (CCJ) do Congresso Nacional, antes de ingressar no ordenamento
jurídico interno.

Outrossim, a constitucionalização do Direito intensifica a compatibilidade vertical


das normas jurídicas internas com a Constituição, mediante o controle jurisdicional da
constitucionalidade (difuso e concentrado), deixando de considerar as possíveis
incompatibilidades entre os textos normativos internos e os internacionais vigentes no País.
Ante o crescimento dos números de tratados ratificados pelo Estado brasileiro, torna-se
imperativo o exame da convencionalidade das leis com os tratados e convenções.

A tese era da paridade dos tratados e convenções internacionais e as leis internas


brasileiras, no sentido de meras leis ordinárias e não leis complementares. Essa tese vinha
sendo ratificada pelo STF desde os anos 1970 até a emblemática decisão do caso da prisão
civil do depositário infiel em 2008.

Assim, os tratados e convenções internacionais comuns (que não tratam de direitos


humanos) não estão sujeitos ao controle de convencionalidade, mas sim adquirem (com base
na decisão do STF no caso da prisão civil do depositário infiel - RE 466.343. j. 03/12/2008) o
status normativo de supralegalidade, ou seja, acima das normas infraconstitucionais, mas
abaixo da Constituição. Apesar do avanço, porém, a compatibilização vertical do
ordenamento interno com os tratados e convenções internacionais ainda está longe de ser
resolvida. A consequência prática da decisão foi o efeito paralisante da validade da norma
39

jurídica doméstica pelo tratado internacional.

Ao decidir pela tese da supralegalidade dos tratados internacionais de direitos


humanos, causa um retrocesso. Há, pelo menos, duas linhas doutrinárias divergentes, no
reconhecimento de uma controvérsia entre os constitucionalistas sobre o retrocesso ou não
desde a decisão: a primeira afirma não haver qualquer retrocesso e que existe a possibilidade
de tantos níveis hierárquicos, quantos forem necessários.

Rezek (2014, p.103-104) e Piovesan (2013, p.73-81) já sustentavam a estatura


constitucional dos tratados em matéria de direitos humanos, com fundamento em cláusula
aberta de recepção contida no §2º, art. 5º, da Constituição, portanto com a decisão voltam
automaticamente ao status dos tratados e convenções comuns e não como já havia sido
reconhecido pela doutrina na interpretação do referido parágrafo.

A questão acima é ainda mais radicalmente por Torres (2009, p. 31), no sentido de
que “a norma internacional prevalece sobre a norma constitucional posterior, mesmo naquele
caso em que uma norma constitucional posterior tente revogar uma norma internacional
constitucionaliza [...]”, tese esta compartilhada pela minoria vencida dos ministros do STF no
julgamento que declarou a supralegalidade da CADH e paralisou a eficácia do inciso LXVI,
do art. 5º, da Constituição Federal de 1988.

Outro ponto de vista doutrinário a ser analisado é o defendido por Sarlet (2013, 101-
103), ao reconhecer que a questão está longe de ser resolvida. Alerta para o fato de que a
hierarquia Constitucional entre os tratados incorporados (aqueles equivalente a EC) e o Texto
constitucional ainda pode ser declarada inconstitucional em casos de conflito com as cláusulas
pétreas da Constituição (limites matérias explícitos e implícitos na Carta Política), uma
possibilidade real de conflito. Sarlet adverte sobre a desvantagem da implementação do § 3º,
do art. 5º, em relação ao sistema das normas “materialmente constitucionais dos direitos
assegurados nos tratados, em função especialmente da abertura expressamente consagrada no
art. 5º, § 2º, da CF, por si só [...] já asseguram a hierarquia constitucional aos tratados em
matéria de direitos humanos [...]”.

Para o autor, o art. 5º, § 3º, “não seria apenas desnecessário, mas, admitindo-se uma
sentença numa ADI da emenda pelo simples fato de contrastar com os limites materiais ao
poder de reforma da Constituição, até mesmo desvantajoso”(2013, p.103). Portanto, bastaria o
status materialmente constitucional da norma infraconstitucional para que os aplicadores do
Direito “exigissem uma exegeses sistêmica pautada por uma adequada ponderação dos
40

interesses (valores) em pauta, sempre privilegiando [...] uma solução mais favorável à
garantia da dignidade da pessoa [...]”.

Neste sentido, Mendes (2013, 215-216) sintetiza a discussão doutrinária e


jurisprudencial, apontando quatro correntes principais: a primeira reconhece a
supraconstitucionalidade dos tratados e convenções em matéria de direitos humanos; a
segunda reconhece o caráter de norma constitucional; a terceira o status de lei ordinária e a
quarta, que atribui o caráter de supralegalidade. Vê-se que em nenhum momento Mendes
(2013, p. 215-221) menciona a tese da convencionalidade, reduzindo a questão à (1)
supraconstitucionalidade, (2) constitucionalidade, (3) infraconstitucionalidade e à (4)
supralegalidade. Menciona, todavia, o reconhecimento pelo STF, de uma hierarquia ínsita em
preceitos inequívocos, baseado no art. 102, III, “b”, que dispõe sobre a competência do STF
para “[...] declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal”.

Para Mendes, o STF reconheceu, explicitamente, o controle de convencionalidade


dos tratados, entretanto adverte para a “sempre possível aplicação inadequada dos sentidos
possíveis da expressão “diretos humanos” que poderia abrir uma via perigosa para uma
produção normativa alheia ao controle de sua compatibilidade com a ordem constitucional
interna” (2013, p.218).

Assim, ressalta-se a competência do STF para “[...] exercer o controle da


regularidade formal e do conteúdo material desses dispositivos internacionais em face da
ordem constitucional interna”, e que não se poderia desconsiderar a possibilidade de “[...] uma
declaração de inconstitucionalidade no âmbito do Direito Internacional”. Ademais, Mendes
atenta para casos famosos como Maastricht aplicado na Alemanha e na Espanha (MENDES,
2013, p.219), em que os tribunais evitaram declarar a inconstitucionalidade das normas
internacionais pactuadas.

Esse status constitucional material se justifica pelo fato de os direitos humanos serem
o resultado de incessantes tensões que marcaram a história da humanidade e de uma gradual
evolução desses direitos nos ordenamentos jurídicos internos, assim como dos tratados e
convenções internacionais. O constituinte de 1988 resolveu abrir o “sistema jurídico nacional
consagrando o valor positivo da democracia e o valor positivo dos direitos humanos”
(BONIFÁCIO, 2008, p.131-180) e não somente como indicado na pirâmide kelseniana das
normas jurídicas.
41

Como aventado anteriormente, ainda que minimamente, antes da edição da EC nº


45/2004, o STF já reconhecera o status materialmente constitucional dos tratados e
convenções internacionais de direitos humanos por força do § 2º, do art. 5º, da CF, muito
embora não fossem comumente citados nas decisões por juízes/tribunais, sobretudo porque
estes estão acostumados à realização do controle de constitucionalidade das leis, mas não o
controle de convencionalidade destas. Para uma parcela dos constitucionalistas, o controle de
constitucionalidade já inclui o de convencionalidade, mas não é a mesma coisa.

É possível que se faça confusão entre o controle de constitucionalidade (difuso e


concentrado) como sua instrumentalização, ou seja, por meio do processo jurisdicional de
controle das leis (art. 102, I, “a”). Também é fato que não existe um procedimento para a
realização do controle de (in)convencionalidade, que alarga ainda mais este temor de
reconhecimento da necessidade de realização do controle de convencionalidade material
vertical das leis. A questão é tão evidente que juízes/tributais, ex officio, declararam a
(in)convencionalidade de uma norma interna conflitante com uma norma internacional de
direitos humanos, pelo controle difuso (concreto) e a Corte constitucional no controle
concentrado da convencionalidade em tese.

Cabe aqui esclarecer que os países adotantes de somente o controle de


constitucionalidade difuso, aberto de controle das leis, como no caso argentino, peruano,
dominicano, boliviano, mexicano, seguindo o modelo estadunidense, leva a regra para o
controle de convencionalidade de compatibilização material vertical das normas
internacionais de direitos humanos.

O mesmo ocorre por, exemplo, com o Paraguai e com o Uruguai, cujo controle de
constitucionalidade é concentrado, fechado e reservado a uma só Corte Suprema; também o é
o controle de convencionalidade. Nesta matéria, o Brasil e o Chile adotam um sistema misto
de controle difuso e concentrado das leis, ou seja, tanto juízes/tribunais podem reconhecer a
constitucionalidade/inconstitucionalidade de leis como o concentrado na Corte constitucional.

Além do clássico controle de constitucionalidade difuso e concentrado, adverte


Mazzuoli (2013b, p.4-5), “[...] deve ainda existir (doravante) um controle de
convencionalidade das leis.” podendo, estes tratados e convenções internacionais, passarem a
ser utilizados com “[...] paradigmas de controle das normas infraconstitucionais”, um
instrumento de interpretação e aplicação do Direito, baseado numa hermenêutica-jurídica
cotejada e ampliada pelos tratados e convenções internacionais.
42

Portanto, no Brasil, com o advento do § 3º, do art. 5º, da CF, os tratados e


convenções internacionais de direitos humanos aprovados nas condições estabelecidas pelo
novo texto se submetem, por parte do Poder Judiciário, ao controle de convencionalidade das
leis, que consiste em compatibilizar verticalmente a produção normativa doméstica com os
tratados de direitos humanos.

Assim, Mazzuoli (2013b, p. 20-21) aponta para quatro situações que podem vir a
ocorrer no ordenamento interno. Primeiramente, no caso de lei anterior conflitante com a
Constituição posterior, “[...] o fenômeno jurídico é o da não recepção e consequente
invalidade material da norma a partir daí”. A segunda é no caso em que lei posterior conflita à
Constituição. Assim a norma já nasceu eivada pela inconstitucionalidade que pode ser
declarada pela via difusa ou concentrada de controle de constitucionalidade. A terceira ocorre
nos casos em que uma “[...] lei anterior conflita com um tratado ratificado pelo Brasil e já em
vigor no país, ela é revogada de forma imediata”. A quarta sucede quando uma lei posterior
conflitar com um tratado, posteriormente ratificado, tem-se que tal norma é inválida, apesar
da vigência e, consequentemente, totalmente ineficaz.

Não é o que se vê, porém como identifica Barbosa (2013, p. 168) sobre decisões
recentes em que o STF atribuiu supremacia do Texto Constitucional em conflito com tratados
internacionais ratificados pelo Governo brasileiro, como no caso GATT (RE-114.784) e no
conflito com a Convenção de Varsóvia (RE-391.032).

Vê-se que, apesar de ratificada pelo Estado brasileiro, a norma internacional para
produzir efeitos internos (ser valida e eficaz) requer estar compatível com ordem jurídica
interna (a Constituição), ou seja, na contramão das decisões proferidas nos tribunais
internacionais que determinam a compatibilização dos ordenamentos nacionais às normas
internacionais de direitos humanos ou não.

Consoante Mazzuoli (2013a), “o respeito à Constituição faz-se por meio do controle


de constitucionalidade das leis”, enquanto a observância e o respeito aos tratados de direitos
humanos se fazem pelo controle de convencionalidade das leis e o “respeito aos tratados
comuns faz-se por meio do controle de supralegalidade das leis”. Trata-se de uma dupla
compatibilidade vertical, primeiramente com a Constituição e sem seguida com os tratados
internacionais vigentes no País.
43

Para Mazzuoli (2013b, p. 23), os direitos e garantias constitucionais expressos na


Constituição brasileira compõem o “núcleo intangível da Constituição”, protegido e
inalcançável pelas emendas tendentes a aboli-lo, todavia pode ser ampliado e aprimorado, no
sentido de avançar nas conquistas asseguradas, e os direitos e garantias implícitos na
Constituição “são aqueles que provêm ou podem vir a prover do regime e dos princípios por
ela [Constituição] adotados”, nos termos do art. 5º, § 2º, da CF/88. As discussões travadas
pela doutrina nacional e internacional sobre a questão do nível hierárquico das normas de
Direito Internacional recepcionadas e ratificadas pelos Estados-membros, ainda estão longe de
chegar a um denominador comum ótimo - pelo menos no Brasil - que satisfaça inteiramente
as dificuldades anteriormente apontadas em Rezek (2014), Piovesan (2013), Torres (2009),
Sarlet (2013) e Mendes (2013)

Para melhor desenvolver as controvérsias em comum, identificam-se duas discussões


básicas: na primeira, a Constituição reconheceu que “Os direitos e garantias expressos nesta
Constituição não excluem outros decorrentes do regime ou dos princípios por ela adotados, ou
dos tratados internacionais em que [...] seja parte” (BRASIL, 2014a) uma obediência implícita
na Constituição, destarte materialmente constitucional e não supralegal. Portanto, a
Declaração Universal dos Direitos do Homem (de 1948), o Pacto Internacional de Direitos
Civil e Políticos (de 1966) e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São
José da Costa de 1969), neste sentido, seguem ostentando o nível hierárquico da legislação
ordinária e não materialmente constitucional. A segunda discussão é sobre a validade da
Norma Constitucional paralisada por dispositivos de um tratado internacional de direitos
humanos, declarada supralegal. A norma continua em vigor, mas perde a validade e eficácia
no plano do ordenamento jurídico interno; portanto, uma norma que não possui a garantia de
validade, que passa a ter uma vigência impedida de produzir efeitos jurídicos, ab-rogando as
normas infraconstitucionais em contrario.

Assim, é imperativo divulgar, entre os aplicadores do Direito, a necessidade de se


fazer, sempre que possível, na busca pelo aperfeiçoamento do controle jurisdicional das leis
por meio do dialogo de fontes entre o Direito nacional (normas, constitucionais,
infraconstitucionais, doutrina e jurisprudência) e o internacional (tratados, convenções e
decisões das Cortes internacionais) à luz do primado internacional do pro homine, ou seja,
primazia da norma mais favorável ao principio da dignidade da pessoa humana.
44

Neste sentido, a Súmula Vinculante nº 25, do STF, é um exemplo claro da adoção de


mecanismos de Direito internacional, na solução da lide, em que o caso concreto foi
produzida à luz do Pacto de São José da Costa Rica (CADH), culminando na perda da
validade e eficácia de parte do inc. LXVII, do art. 5º, da Constituição federal de 198822, e
como consequência imediata vinculação da ilicitude da prisão civil de depositário infiel,
qualquer que seja a modalidade do depósito. Seja pela via da constitucionalidade, seja pela
convencionalidade, o controle jurisdicional das leis (constitucionais ou infraconstitucionais)
se fortalecerá e repercutirá diretamente na tese do neoconstitucionalismo, a qual, dentre outras
características, desenvolve a ideia de um bloco de constitucionalidade que compatibiliza e se
utiliza do ordenamento jurídico internacional e doméstico para a interpretação e aplicação do
Direito.

Marinoni (2010, p.39-56) antevê maiores embates e confrontos entre juízes/tribunais


na realização do controle difuso de constitucionalidade tendo em vista a crescente repercussão
do Direito Internacional nas sociedades do século XXI, e que, ano após ano, o Brasil procura
estreitar relações internacionais com vizinhos, parceiros comerciais, elevando a troca de
conhecimentos científicos e tecnológicos. Em contrapartida, é exigido maior controle
governamental das políticas humanistas (redução dos níveis de pobreza extrema, redução das
desigualdades sociais, melhoria na educação e nos níveis de escolaridade, melhoria nos
índices de desenvolvimento humano (IDH) e combate à corrupção na Administração Pública).

Some-se a isso o fato de que o Poder Legislativo se omite de legislar diante dos casos
mais polêmicos da sociedade pós-moderna, e dos hardcases, elevando cada vez mais a
necessidade de atuação do Poder Judiciário (o chamado ativismo judicial) na solução dos
casos envolvendo direitos fundamentais (mínimo existencial, direito à saúde, educação etc.) e
dos casos lacunosos pela ausência de norma jurídica interna. Apesar das críticas, o ativismo
judicial se justifica e se torna imprescindível ante essa situação e perante o caso concreto.

22
STF Súmula Vinculante nº 25 - PSV 31 - DJe nº 27/2010 - Tribunal Pleno de 16/12/2009 - DJe nº 238, p.1, em
23/12/2009 - DOU de 23/12/2009, p.1. Ilicitude - Prisão Civil de Depositário Infiel - Modalidade do
Depósito - É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito. Referências:
- Art. 5º, LXVII e § 2, Direitos e Deveres Individuais e Coletivos - Direitos e Garantias Fundamentais -
Constituição Federal - CF - 1988. - Art. 7º, § 7º, Direitos Civis e Políticos - Deveres dos Estados e Direitos
Protegidos - Convenção Americana Sobre Direitos Humanos - Pacto de São José da Costa Rica - D-000.678-
1992. - Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (art. 11). Precedentes: - RE 562051 RG, - RE
349703, - RE 466343, - HC 87585, - HC 95967, - HC 91950, - HC 93435, - HC 96687 MC, - HC 96582, - HC
90172, - HC 95170 MC.
45

A tese dos direitos humanos, como “núcleo intangível”, expressos ou implícitos na


Constituição brasileira decorre do princípio hermenêutico internacional pro homine, segundo
o qual, em qualquer que seja a situação, deve haver a prevalência da dignidade da pessoa
humana, como “fundamento ético anterior ao direito e à sua positivação na ordem jurídica,
representado no valor do homem em si e na sua existência [...]”(BONIFÁCIO, 2008, p. 174-
175).

Trava-se um dialogo de fontes, entre o Direito interno e o Direito internacional


(critério hermenêutico de solução de antinomias), conjugando fontes na busca pela primazia
da norma mais favorável em matéria de direitos humanos, como no caso da paralisação dos
efeitos (validade) do inc. LXVII, do art. 5º, da Constituição de 1988 (da prisão civil do
depositário infiel) onde prevaleceu a norma mais favorável - a liberdade da pessoa
(MAZZUOLI, 2003b, p. 30).

Nesta antinomia, não se busca a norma anterior ou posterior, interna ou externa,


constitucional ou não, mas a norma mais adequada para o caso concreto, realizando não
somente o controle de constitucionalidade e o controle de convencionalidade, mas todos os
meios necessários na busca e preservação da dignidade da pessoa humana, bem como
assegurar os direitos a liberdade e a igualdade.

Nesse controle normativo, no caso de controle abstrato (concentrado), o STF


examina a convencionalidade da norma, confrontando com os tratados e convenções
internacionais de direitos humanos vigentes no País, elevados à categoria de emenda
constitucional. Tanto o STF como os juízes/tribunais, no entanto, podem fazer o controle
concreto (difuso) de convencionalidade da norma, confrontando a ordem jurídica interna com
os tratados e convenções internacionais de direitos humanos, pois elevado ao plano
constitucional (ALVES, 2013, p. 332-333).

De forma objetiva, os juízes/tribunais brasileiros não utilizam o controle de


convencionalidade (difuso ou concentrado), assim como não são invocados pelos advogados
(públicos ou privados), tampouco pelo Ministério Público. Muito embora possa ser deflagrada
de ofício - a exemplo do controle difuso de constitucionalidade - os juízes/tribunais não
utilizam os tratados e convenções internacionais de direitos humanos (principalmente na
busca da melhor solução para o caso concreto) como fonte formal e material de Direito para
as decisões.
46

Não se pode deixar de mencionar o art. 7º dos Atos das Disposições Constitucionais
Transitórias, que estabelece a “formação de um tribunal internacional de direitos humanos”,
mas tal dispositivo chegou tarde, pois a proposta de criação da Corte Interamericana de
Direitos Humanos foi formulada pelo Brasil e aceita décadas antes (PEREIRA, 2014). Vários
Estados-membros da CADH adotam distintos posicionamentos quanto à adoção de sistemas
de controle das leis. No Brasil, a Corte constitucional já reconhece e admite o controle de
convencionalidade que ultrapasse ao clássico controle de constitucionalidade das leis,
instrumentos de compatibilização do ordenamento internacional com a ordem jurídica
doméstica.

Na busca de melhor compreender a Teoria do Controle de Convencionalidade,


atente-se para os ordenamentos de outros Estados que adotam diferentes controles de
constitucionalidade. Far-se-á breve análise do controle de convencionalidade na Argentina e
no México, em distintos níveis de evolução nos sistemas de controles (de constitucionalidade
e convencionalidade) das leis que adotam o sistema difuso de controles. É certo dizer que
níveis de controle jurisdicional das leis decorrem das peculiaridades e complexidades sociais
de cada Estado.

O Estado que esteve sobre um regime ditatorial mais violento vai exibir mecanismos
de proteção, mais rígidos, do ordenamento doméstico, como o caso brasileiro, argentino e
chileno. Isto reverbera não somente nas constituições, mas, também, no ordenamento
infraconstitucional e no processo legislativo de produção de normas.

Neste sentido, a Argentina, fortemente influenciada pelo modelo da União Européia,


possui uma Constituição que exprime características bem peculiares, adota a
supraconstitucionalidade dos tratados e convenções internacionais. No Preâmbulo da Reforma
de 1994, destaca que Sancionada por el Congreso General Constituyente el 1° de mayo de
1853, reformada y concordada por la Convencion Nacional ad hoc el 25 de septiembre de
1860 y con las reformas de las convenciones de 1866, 1898, 1957 y 1994, ou seja, as reformas
modificam e ampliam o texto original de 1853, como a Constituição estadunidense.
47

No art. 5º23 do texto reformado de 1994 se infere que cada província deve decretar
sua Constituição sob o sistema representativo republicano, de acordo com os princípios,
declarações e garantias da Constituição; e assegurar a sua administração da justiça, regime
municipal e educação primária. Nestas condições, o Governo Federal deve garantir a cada
província o pleno exercício das suas instituições; diferentemente do Brasil, não adotou uma
Corte ou Tribunal Constitucional, portanto, o controle de constitucionalidade é exercido pela
Corte Suprema de Justiça, órgão máximo do Poder Judiciário argentino, a que levou juristas e
doutrinadores argentinos a afirmarem uma unanimidade em reconhecer a falta de
monitoramento do controle de constitucionalidade. Alegam que tal situação era mais evidente
antes da reforma constitucional de 1994, que recepcionou o Pacto de São José da Costa Rica
com status de norma constitucional. O constituinte da reforma constitucional de 1994,
recepcionou a CADH com status de norma constitucional, evidenciado na leitura do art. 3124,
da Constituição Argentina.

Diferentemente dos demais, o Estado Mexicano adotou um controle difuso de


constitucionalidade e convencionalidade, apto à realização do controle interno das leis com os
tratados e convenções internacionais, assim como com as decisões das cortes internacionais.
Reconhecidamente, um bloco de constitucionalidade /convencionalidade no qual a própria
Constituição ou a jurisprudência nacional pode validamente ampliar seus instrumentos
internos por via dos tratados, convenções, declarações e instrumentos internacionais assim
como informes, recomendações, observações gerais e demais resoluções dos organismos e
tribunais internacionais de que o México é parte (MAC-GREGOR, 2013, 549-651).

Em outras palavras tem-se que países como Argentina (art.73), República


Dominicana (art.74.3) e México (arts. 1º e 133) reconhecem a hierarquia constitucional dos
tratados internacionais de direitos humanos. Já Bolívia (art. 256), Equador (art. 424) e
Venezuela (art. 23) reconhecem o caráter de supraconstitucionalidade, sempre que mais
favoráveis; outras, como Argentina, Bolívia, Chile, Equador, Guatemala, Colômbia, Paraguai,

23
Art. 5º.- Cada provincia dictará para sí una Constitución bajo el sistema representativo republicano, de acuerdo
con los principios, declaraciones y garantías de la Constitución Nacional; y que asegure su administración de
justicia, su régimen municipal, y la educación primaria. Bajo de estas condiciones el Gobierno federal, garante a
cada provincia el goce y ejercicio de sus instituciones. (ARGENTINA, 2014).
24
Art. 31.- Esta Constitución, las leyes de la Nación que en su consecuencia se dicten por el Congreso y los
tratados con las potencias extranjeras son la ley suprema de la Nación; y las autoridades de cada provincia están
obligadas a conformarse a ella, no obstante cualquiera disposición en contrario que contengan las leyes o
constituciones provinciales, salvo para la provincia de Buenos Aires, los tratados ratificados después del Pacto de
11 de noviembre de 1859. (ARGENTINA, 2014).
48

Peru, República Dominicana, Venezuela e México reconhecem sua especificidade nesta


matéria. Outrossim, Peru (art. 4º, dos Atos das Disposições Transitórias), Equador (art. 417),
República Dominicana (art. 74.4) e México (art. 1º, § 2º) recepcionam os princípios pro
homine ou favor libertatis como critérios hermenêuticos nacionais.

Já o Brasil (art. 5º, § 2º), Bolívia (art. 13, II), Colômbia (art. 94), Equador (art. 417),
Panamá (art. 13, II), República Dominicana (art. 74.1) e Uruguai (art.72) incorporam
cláusulas abertas de recepção de outros direitos conforme a normatividade convencional.
Outros possuem cláusulas constitucionais para a interpretação dos direitos e liberdades
consoante os instrumentos internacionais em matéria de direitos humanos, como a Bolívia
(art. 13,IV), Colômbia (art.93), Haiti (art.19) e México (art. 1º, § 2º). Em todas estas
situações, no entanto, nestes Estados, as normas convencionais adquirem o caráter
constitucional (MAC-GREGOR, 2013, p. 595).

Apenas quando todos os juízes e tribunais dos Estados-partes da Convenção


Americana de Direitos Humanos controlarem a convencionalidade das leis internas, seguindo
a interpretação que faz da Convenção a Corte Interamericana, é que se poderá chegar à
maturidade de um jus commune interamericano, com a aplicação uniforme do Direito
Internacional e dos direitos humanos em todos os Estados, consoante é previsto no art. 4º da
Constituição da República de 1988.
49

2 A SEPARAÇÃO DAS FUNÇÕES ESTATAIS À LUZ DA


HISTORIOGRAFIA CONSTITUCIONAL BRASILEIRA

Nas seções anteriores, examinou-se a transformação do Estado até sua configuração


no século XXI - sua embriogenia, os diversos modelos estatais e de soberania até o Estado
Social Democrático de Direito. Neste capítulo, está expressa a segunda fase da pesquisa, com
enfoque primordial na formação, consolidação e atual ideia da "separação de poderes do
Estado". Para tanto, adota-se o mesmo critério do capítulo anterior, um enfoque histórico,
filosófico, político, econômico e jurídico acerca do tema. Sob esta perspectiva, aprofunda-se a
ideia de separação dos poderes até a modernidade, bem como se perscruta a "separação dos
poderes" no Estado brasileiro desde a Constituição de 1824 até a promulgação da vigente
Constituição da República Federativa do Brasil.

Em seguida, contextualizar-se-á a problematização com uma análise da consolidação


e amadurecimento destas instituições no Brasil, não significando afirmar que tenham atingido
um estado ideal, mas que permanecem em constante transformação e desenvolvimento, assim
como a sociedade e o próprio Estado. Demonstrar-se-á, por conseguinte, que a maneira
individualista de ver, pensar e agir na sociedade brasileira do século XXI consiste na possível
causa das crises de representatividade e credibilidade nas instituições, tendo em vista os
escândalos e comissões parlamentares de inquérito (CPI) como a dos "anões do orçamento"
(1993), do "Judiciário" (1999), dos "bingos" (2005), dos "correios" (2005), e do "mensalão"
(2005).

Igualmente, ao final do ano de 2014, e início de 2015, as denúncias oferecidas pelo


Ministério Público Federal na "Operação Lava-Jato", como ficou conhecida, atribui-se como
uma das possíveis causas da corrupção a falta da capacidade de cada cidadão de se subordinar,
ou mesmo sacrificar o seu egoísmo natural e os interesses individuais, em favor do interesse
geral ou coletivo. Segundo Oliveira Vianna (1987), tal ocorre pela ausência de um sentimento
de pertença e de interesse coletivo nacional, portanto da carência de espírito coletivo e de
educação democrática.
50

Registre-se a estreita relação entre democracia representativa, suas instituições e os


papeis que devem desempenhar numa sociedade, cuja realidade exprime alta complexidade e
diferencia em termos de convívio cotidiano da própria sociedade e os poderes estatais, que por
vezes violam o processo democrático de constituição dos espaços públicos. Assim, veem-se
cada vez mais as ações ofensivas no comportamento das instituições, que abalam a
independência e a harmonia desses poderes, positiva ou negativamente.

Em certa medida, tem-se a excessiva atividade legiferante do Poder Executivo, no


uso de medidas provisórias e decretos, por vezes invadindo a competência legislativa
Constata-se, ainda, a crescente inércia e até recusa do Poder Legislativo no enfrentamento de
questões difíceis, que dividem a opinião pública, bem como aquelas cotidianas de sua
competência, deixando espaços para a atuação mais urgente de outro Poder do Estado; assim
se verifica uma crescente intervenção do Poder Judiciário em temas que podem ser
confundidos com as competências dos outros poderes.

O crescente aumento e a complexidade das demandas decorrem do próprio


desenvolvimento da atividade humana - muitas das vezes resultado da exclusão social
ensejada pelo sistema econômico vigente - que tenciona os poderes do Estado a assegurar os
níveis a dignidade e cidadania que beira a barbaria, buscando reduzir os conflitos e a
desobediência civil.

Por outro lado, a desigualdade social acarreta aumento na atuação dos organismos
não governamentais nas respostas mais imediatas das necessidades mínimas, ampliando a
rede de solidariedade que ultrapassa as fronteiras dos Estados alcançando dimensão
internacional. Há quem discorde, entretanto, da necessidade dessas organizações de
solidariedade, atribuindo ao Estado o “dever de agir” e garantir o “mínimo existencial”, no
malgrado a educação, saúde e moradia.

Em verdade, esta corrente de solidariedade aos necessitados ou assistencialismo pela


própria sociedade não é nova, remonta aos primeiros registros históricos da humanidade - a
assistência à criança, ao idoso, ao doente, que variava - e era maior com a proximidade
territorial do local de nascimento do necessitado e menor quanto mais distante estivesse este
de suas origens. Esta é a grande diferença. Estes organismos atuam em lugares que não os de
origem, mas numa dimensão internacional. Vê-se muito forte a solidariedade interna de cada
comunidade, nação e povo para reaver a cidadania e a dignidade dos desassistidos.
51

Cabe ressaltar algumas das circunstâncias apontadas como responsáveis pela crise do
projeto democrático apresentadas por Friedrich Müller (2003) com reflexo direto nos Poderes
do Estado brasileiro. Primeiro, o povo ativo (uma cidadania ativa) ou participação coletiva
direta; segundo, a densidade qualitativa que deixou a política “refém das práticas
metodológicas, das referencias tecnológicas, das estatísticas, das probabilidades e das
valorações macro e microeconômicas”; terceiro, a densidade quantitativa que consiste no
volume e diversidade de “questões postas à solução, que implicou em uma atividade full time
e profissional da política que exclui o cidadão”.

Para Weber (2002, p.56) a política é “[...] a liderança, ou a influencia sobre a


liderança de uma associação política, e, daí hoje, de um Estado”, e este “[...] é aquela
comunidade humana que pretende com êxito, o monopólio do uso legítimo da força física
dentro de um determinado território”. Neste sentido, faltou (o político vocacionado) uma
liderança verdadeiramente carismática para mobilizar a sociedade colonial/imperial que
promovesse à integração nacional, rompendo com o individualismo e o patriarcalísmo
dominantes. Somente o líder carismático, segundo Weber, seria capaz de obter êxito à frente
do Estado, pois possui, por parte da sociedade, apoio e legitimação para seus atos.

Acrescente-se a esta última circunstância apontada por Müller o fato de que, desde o
período imperial, a população está à margem e excluída dos acontecimentos políticos (a
exemplo da Independência, e da Proclamação da República) em razão de sua formação social
e econômica que promoveu o isolamento do homem - individualizando-o. Neste contexto
histórico, só a pessoa valia sem necessidade da sociedade; o individualismo que prevalece
sobre a comunidade como descreve Oliveira Viana25. De certo, na contramão do que afirmou
Aristóteles, III séculos aC.: “o homem é um animal político” (zoon politikon) e está destinado
a viver em sociedade. Isto é, a natureza fez o homem um animal como qualquer outro, mas, ao
lhe impelir ao convívio uns com os outros, o transformou no único animal político.

Assim, confrontando a natureza do homem, vê-se que a formação do povo brasileiro


se processou dentro do mais extremo individualismo familiar, que foi repassado aos seus
descendentes, isto é, esta característica de “despreocupação com o interesse coletivo, pela

25
No Brasil, só o indivíduo vale e, o que é pior, vale sem precisar da sociedade - da comunidade. Estude-se a
história da nossa formação social e econômica e ver-se-á como tudo concorre para dispersar o homem, isolar o
homem, desenvolver, no homem, o indivíduo. O homem socializado, o homem solidarista, o homem dependente
de grupo ou colaborando com o grupo não teve, aqui, clima para surgir, nem temperatura para desenvolver-se.
(2014, v.i, p.141,)
52

ausência de espírito público, de espírito de bem comum, de sentimento de solidariedade


comunal e coletiva e pela carência de instituições corporativas em prol do interesse do
"lugar", da "vila", da "cidade"26, neste contexto, no século XIX, Tobias Barreto (1977, p.59-
63) já alertava para esta falta de espírito comum27.

O autor tentou decifrar o caráter brasileiro, e o que mais lhe saltou aos olhos foi “a
falta de coesão social, o desagregamento dos indivíduos [...] que os reduz ao isolamento
absoluto, [...] de uma poeira impalpável e estéreo”, ou seja, “certas anomalias que acanham e
entorpecem as nossas relações políticas e sociais”, a que Barreto chamara de “defeito do
caráter nacional”, ao mesmo tempo em que José Bonifácio advertia para o mesmo fato com
expressão “caráter geral dos brasileiros”.

Somente um estudo com a profundidade do realizado por Oliveira Vianna (2014)


para cientificamente justificar a ausência histórica de participação popular nas questões
publicas. Desde a redemocratização do Estado brasileiro após o Estado Novo o processo de
politização atingiu a classe média brasileira dos anos 1950 e 1960, mas foi bruscamente
interrompido pela “ditadura militar”. Esta politização tomou nova dimensão na segunda
metade dos anos 1980 com a reconquista das liberdades e a redemocratização do País. Aos
poucos, os privilégios deixam de existir somente nos estamentos superiores da sociedade e
atingem as classes menos favorecidas que estão mais conscientes de seus direitos - aprendidoa
com a experiência, ou seja, a duras penas.

O objetivo do sistema político é de impedir o poder concentrado na mão de um, ou


de poucos, mas, independentemente do modelo adotado em cada Estado, o que se busca é a
efetivação do controle, visto que as pessoas detentoras do poder tendem a abusar ou a usurpar
dessas atribuições. Há, portanto, em tese, independência e harmonia que consistem num
equilíbrio.

26
O urbanismo colonial não era um movimento espontâneo do povo; surgia em conseqüência de uma política: --
a política administrativa da Coroa, que procurava estabelecer a ordem e a legalidade no meio da desordem e da
anarquia colonial. (VIANA, 2014, v.i. p.142)
27
Egoístas somos nós, e a nossa sociedade, onde os homens não dobram o sentimento da vida própria com o
sentimento da vida comum; e por isso não podem resistir nem protestar contra a tirania das coisas e a pressão das
circunstâncias [...] (BARRETO, 1977, p. 90).
53

2.1 A ideia de separação dos poderes na Modernidade

A despeito de Isaías capítulo 33 versículo22 - “Pois o Senhor é o nosso juiz, o Senhor


é o nosso legislador, o Senhor é o nosso rei; é ele que nos vai salvar” -, antecedeu à teoria da
separação dos poderes se desenvolveu acompanhando as transformações e as necessidades da
sociedade em distintas épocas, mas esta moderna ideia remonta aos séculos XVII e XVIII. Na
Grécia antiga, no entanto, Aristóteles já abordava a existência de três poderes por ele
descritos, como: paterno sobre o filho, do senhor sobre o escravo e do governante sobre o
governado.

Em outro contexto, mas ainda tratando do Poder, Marco Túlio Cícero28, o romano,
em 57 aC., já refletia sobre a justiça atrelada a um Poder vinculado ao Direito. Outrossim,
destacava a necessidade deste Poder por meio da prestação jurisdicional para que houvesse
uma igualdade na realização da justiça. Isto revela a existência de poderes, a que ele
denominava de Magistrados, Pessoas (no sentido de povo) e o Senado, fazendo clara distinção
entre o Direito universal e o civil (os esclarecimentos do tradutor às questões formuladas pelo
pensador romano), a Justiça e o Estado29.

Somente, porém, com a exposição feita por Montesquieu (2010, p.168) para justificar
a separação dos poderes, ao afirmar que “Para que não se possa abusar do poder é preciso que,
pela disposição das coisas, o poder freie o poder” identificando que “há em cada Estado três

28
Para Cícero (1985, 289), a justiça está ligada ao poder. É preciso que haja uma organização de poder conforme
ao direito (justa imperium), para que a igualdade da justiça se realize, vez não se tratar apenas de virtude moral,
mas de prestação jurídica, institucionalizada, portanto. Em primeiro lugar, a igualdade é considerada como um
critério de equilíbrio entre os três poderes tradicionais: magistratus, populus e Senatus. No Império, essa trilogia
aparece do ponto de vista das forças sociais, a aristocracia e o povo, cujo momento de unidade se dá na pessoa
do Imperador.
29
Entre nós existiram homens ilustres que se dedicaram a interpretar esse direito para o público e a resolver
casos jurídicos; no entanto, anunciando grandes projetos, consagraram-se a miudezas. Porque nada existe de
mais importante que o direito do Estado e nada tão insignificante – por mais necessário que seja ao povo – que a
tarefa dos que se dedicam a consultas jurídicas. Não quero dizer que tais especialistas ignoravam o direito
universal, mas, ao tratarem do denominado direito civil, só o fizeram na medida em que consultavam o desejo de
prestar serviços ao povo, o que, sob a ótica teórica, é insuficiente, ainda que necessário sob o aspecto prático.
Para que assunto me chamas e a que me convidas? Será para escrever livretes jurídicos sobre as calhas d‟água,
ou as paredes divisórias, ou redigir formulários de julgamentos? Tais assuntos são batidos e, segundo creio,
inferiores à nossa expectativa. CÍCERO, DL I, 4, p. 44. No original, “Egone? Summos fuisse in ciuitate
nostra uiros, qui id interpretari populo et responsitare soliti sint, sed eos magna professos in paruis esse
uersatos. Quid enim est tantum quantum ius ciuitatis? Quid autem tam exiguum quam est munus hoc eorum qui
consuluntur? Quam est [populo] necessarium, nec uero eos, qui ei muneri praefuerunt, uniuersi iuris fuisse
expertis existimo, sed hoc ciuile quod uocant eatenus exercuerunt, quoad populo praestare uoluerunt; id autem
in cogniti tenue est, in usu necessarium. Quam ob rem quo me uocas, aut quid hortaris? ut libellos conficiam de
stillicidiorum ac de parietum iure? An ut stipulationum et iudiciorum formulas conponam? Quae et conscripta a
multis sunt diligenter, et sunt humiliora quam illa quae a nobis exspectari puto”.
54

tipos de poderes [...]” vê-se sua indiscutível contribuição na sistematização do conceito da


divisão dos poderes.

Cabe aqui destacar o fato de que, neste período - Estado absolutista - já havia regras
jurídicas, mas imperava a insegurança nas relações jurídicas, pois há registros da existência de
pelo menos três ordens jurídicas, uma para os nobres, a segunda para o clero e outra para o
terceiro Estado - faltava uma ordem jurídica que unificasse as relações mercantis dificultadas
pelos privilégios, monopólios e favores reais.

Esta fase ofereceu todas as “pré-condições para a formação da base ideológica e


política justificadora da eclosão das revoluções burguesas” (CLÈVE, 2011, p. 29). Portanto,
entre as revoluções burguesas é possível situar historicamente a Americana de 1776
(independência das treze colônias, posteriormente a formação da Federação em 1787), a
Francesa de 1789 e a Inglesa de 1688. Este movimento hegemônico favorecera a formação da
teoria constitucional (SALDANHA, 1982).

Antes mesmo de Montesquieu, contudo, Locke (2005, p.503-528) já havia abordado


a separação (orgânica-pessoal) dos poderes do Estado ao afirmar ser Poder Legislativo “[...]
não apenas o poder supremo da sociedade política, como também é sagrado e inalterável
[...]”. O Poder Executivo dividia-se em dois distintos, mas não frequentemente separados, a
que Locke chamou de Poder Executivo (propriamente dito) e o Poder Federativo da
Sociedade Política.

O primeiro exercia a administração e cumpria as leis e o segundo era encarregado de


decidir as controvérsias internas das comunidades e fora dela. Bobbio ressalta (1997, p.236)
que a teoria política lockeana não trata de uma teoria de separação e de equilíbrio, mas da sua
separação e subordinação, que foi concebida como um “pré requisito da rule of law: para que
a lei seja imparcialmente aplicada, é necessário que não seja, os mesmos homens que a fazem,
a aplicá-la”(LOCKE, 2005, p.513).

Cabe ressaltar que Locke percebe a necessidade de que a última palavra fosse sempre
do monarca, isto é, do Poder Executivo. Foi, porém, no ideal liberal dos federalistas
Hamilton, Madison e Jay (1984, p. 401-404) que a separação de poderes passou a representar
um sistema de freios e contrapesos, adotado na Constituição estadunidense de 1787, grande
difusora também responsável pelo sucesso da obra de Montesquieu. Estes propuseram ser
necessária certa independência entre estes poderes para que “a cada um seja garantido o
controle constitucional dos demais”, deixando sua marca no constitucionalismo que se
55

implantava. Seu pensamento é ao mesmo tempo uma barreira ao absolutismo do soberano, da


aristocracia e do povo, o que ocasionaria violações das liberdades individuais, assim como
servira como um forte argumento para o governo liberal.

Da mesma forma, o pensamento de Rousseau sobre a vontade geral e a soberania


popular é fruto de uma gradual evolução desde a soberania de Bodin (2011, p. 298), no século
XVI, ao afirmar que “[...] a primeira marca do Príncipe soberano é o poder de dar a lei a todos
em geral e a cada uma em particular”. No século XVII Hobbes (2004, p.132-139) assevera
que o homem abandona seu estado de natureza para celebrar o pacto social capaz de fazer
cessar a guerra de todos contra todos, depositando no soberano, instituindo o Estado.

Para o autor, “Estado instituído é quando uma multidão de pessoas concorda e pactua
que a qualquer homem ou assembleia de homens [...]” deverão autorizar e acatar todos os seus
atos, estabelecendo regras de convívio social e de subordinação política “[...] a fim de
viverem em paz uns com os outros e serem protegidos do restante dos homens”.

Deste pacto (contrato) surge o soberano, que se conserva fora dos compromissos e
isento de obrigações. Assim, no estado absoluto de Hobbes “[...] o soberano é conferido
mediante o consentimento do povo reunido”. No mesmo século, Locke (2005, p. 498-499)
critica a divindade dos príncipes, bem como a soberania no Estado. Para o autor, “a soberania
repousa na população”, muito embora admita a supremacia do “Estado que tem que respeitar
as leis naturais e as leis civis”.

É no discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens que


Rousseau (2007) constata haver uma subordinação da vontade individual à vontade geral, ou
de um grupo de indivíduos, e que o corpo soberano (o povo) surge a partir do contrato social.
Desta maneira tanto é ao mesmo tempo parte ativa e passiva do processo de elaboração de
leis. Assim, tudo converge para a realização da vontade geral, pela soberania popular.

Para Rousseau (2012, p. 20-21), a representação política não está no nível de


soberania “No momento em que um povo se dá representantes, não é mais livre, não mais
existe”, e ao abordar a escravidão adverte que: “renunciar à própria liberdade é renunciar à
qualidade de homem [...]” e completa o pensamento [...] “renúncia tal é incompatível com a
natureza do homem, pois rouba às suas ações toda a moralidade que m tira a seu querer toda a
liberdade”.
56

Como ressalta Weffort (2006a, p.198), o exercício da vontade geral, para Rousseau,
por meio da representação, significa uma sobreposição de vontades, mas reconhece a
necessidade de representantes no plano de governo, um parlamento capaz de vigiar o Poder
Executivo, “por sua tendência a agir contra a autoridade soberana” - a população. A soberania
deve ser “[...] compreendida sempre como uma pilar da construção do Estado
moderno”(SALDANHA, 1969, p.144).

Atente-se para a teoria da Autolimitação do Estado na Teoria do Estado de Jellinek


(2000, p. 373), que interpretou o principio da divisão dos poderes como divisão de soberania
do Estado. Para ele, soberania era o Estado como um todo, como “entidade titular de grau
máximo do poder político”. Contrario ao pensamento de Jellinek, no Brasil, a entidade de
grau máximo do poder político é atribuída ao povo, detentor do poder originário.

Outra abordagem que se faz necessária é a adotada por Karl Loewenstein (1986, p.
62), para quem a separação de poderes clássica está ultrapassada diante da realidade imposta
pelo Welfare State. Para Loewenstein, tem-se uma nova divisão tripartite: a decisão política
conformadora fundamental, a execução da decisão política e o controle político. A decisão
política fundamental estaria atribuída aos órgãos do governo e aos órgãos do parlamento.

A execução da decisão política cabe os órgãos que levam à prática as decisões


políticas fundamentais a cargo de todos os órgãos do Estado. Por fim, o ponto central de sua
teoria, o policy control, ou controle político que tem a função de moderar e limitar o poder
político, que, levará aos arranjos constitucionais que atribuam responsabilidade política aos
seus detentores.

Neste cenário mundial do século XIX, no Brasil, também havia uma grupo de
intelectuais que discutiam a separação dos poderes do Estado, mas nenhum como Tobias
Barreto (considerado o primeiro pensador político brasileiro, além de abolicionista e
republicano e um dos maiores interpretes do caráter nacional). Uma de suas criticas mais
debatida foi o enfretamento contra a divisão de poderes - para ele uma abstração - e a questão
da soberania popular - elemento imanente ao Estado.

Em seus primeiros escritos políticos Tobias Barreto (1977, p.50-51) ataca a


monarquia, e não perdoa quem defende ser essa a forma de governo no país; “[...] profliga a
aristocracia nacional, pregando a democracia total e pura; nega a existência entre nós de uma
soberania popular e da representatividade do povo, com um único soberano, verdadeiro e
absoluto, o próprio imperador”.
57

Barreto destaca a necessidade de uma soberania nacional concentrada no povo e não


no soberano ou no Estado. Observe-se que a toda a discussão passa inevitavelmente pela
soberania como elemento do Estado que identifica a origem do poder político, originário,
interno e externo, independente do modelo totalitário, democrático, unitário, central, federal,
ou qualquer outro.

2.1.1 Constituição imperial de 1824

Os antecedentes históricos da separação dos poderes no Brasil remontam à volta da


família Real para Portugal em razão “dos desdobramentos da Revolução Liberal do Porto,
que, em Portugal, exigia que o rei renunciasse aos seus poderes absolutos e jurasse de
antemão a Constituição que se queria elaborar”(MORAES, 2003, p.167).

Destarte, a separação de poderes esteve em todas as constituições brasileiras desde a


Constituição de 1824, que inaugurou o constitucionalismo no Estado, consagrando a divisão e
a harmonia dos poderes políticos em meio a criticas, preservando os direitos dos cidadãos. O
pensamento político de Benjamin Constant30 serviu de inspiração para a primeira Constituição
brasileira que acolheu e discutiu o Poder Moderador (real/neutral), por ela recepcionada.

No período imperial, havia quatro poderes31: o Poder Legislativo, o Poder


Moderador, o Poder Executivo, e o Poder Judicial (FERREIRA, 2006). E o art. 98 dispunha
sobre a independência, o equilíbrio e a harmonia dos outros poderes, conferindo ao Imperador
toda a organização política. O quarto poder recebeu severas criticas por parte dos pensadores
políticos da época, em especial as formuladas por Tobias Barreto (1977, p.82) que ironiza,
enfatizando haver nas “[...] teorias correntes relativas ao supremo poder do Estado, um
sedimento de ortodoxia, uma dose de fé católica nos milagres da Constituição e na
superioridade moral da realeza”32.

30
Benjamin Constant identificara cinco poderes numa monarquia constitucional: 1º o poder real; 2º o poder
executivo; 3º o poder representativo da duração; 4º o poder representativo da opinião pública; 5º o poder
judiciário (2005, p. 18-30).
31
Art.10, da Constituição Política do Império do Brazil.
32
A divisão dos poderes de um Estado é uma abstração. É um trabalho subjetivo que a ciência faz, mas que
objetivamente, isto é, no mesmo organismo do Estado, não tem realidade. Os poderes políticos, para que
funcionem, precisam de unidade de ação, o que repugna a divisão; e num organismo onde há divisão, não pode
haver funções coordenadas. Repito: a tal divisão é toda subjetiva. Quem quer que se aplique ao estudo do Estado,
pode descobrir quantos poderes políticos distintos queira (1977, p. 138).
58

Barreto (1977, 140) afirmava que esta soberania “não é um direito, é um fato”, e
fundamentava seu posicionamento no artigo 11 da Constituição: “Assim é que no Estado
brasileiro o sujeito da soberania, ex-vi, é o Imperador com a Assembleia Geral, numa espécie
de poder coletivo [...]”. O autor adverte para o fato de que na Constituição Imperial com
respeito à divisão e a harmonia dos poderes, o Poder Moderador foi instituído para manter o
equilíbrio e a independência entre os demais poderes, mas, para o constituinte, era a garantia
das garantias da preservação do status quo.

2.1.2 A Constituição republicana de 1891

Findos o período imperial e uma das últimas monarquias da América Latina, foi
proclamada a República dos Estados Unidos do Brasil, em 1889, e em 1891 foi promulgar a
primeira Constituição republicana no Brasil33, após a extinção definitivamente do quarto
poder (Moderador), consagrando a separação dos poderes em: Poder Legislativo (bicameral),
Poder Executivo e Poder Judiciário34. Este modelo foi recepcionado pelas demais
constituições brasileiras.

Rui Barbosa, um monarquista até a antevéspera da Proclamação da República, foi


um dos cinco nomeados para elaborar do anteprojeto da Constituição, inspirada no
presidencialismo dos EUA, e fortemente influenciado pelo ideal liberal dos federalistas e
teoria política de Benjamin Constant de quem era profundo admirador.

Com o rompimento com o velho regime imperial, seria natural (como ocorreu com
os demais Estados independentes) que se atribuíssem maiores poderes aos representantes do
povo (ao Poder Legislativo) do que a qualquer outro. O Poder mais fortalecido foi o
Judiciário, que passou a controlar os atos legislativos e da Administração Pública.

Assim, prevaleceram o pensamento político e a visão das instituições de Benjamin


Constant (2005, p.33), que atacava forte e frequentemente a França revolucionária burguesa35

33
O sistema de separação de poderes na Constituição brasileira de 1891 cujo texto foi revisado por Ruy Barbosa
- grande leitor e profundo conhecedor dos escritos dos federalistas norte-americanos.
34
O art. 15, da Constituição republicana de 1891 estabelecia: “são órgãos da soberania nacional os Poderes
Legislativo, Executivo e Judiciário, harmônicos e independentes entre si”.
35
Os principais argumentos com os quais se ataca na França a instituição do júri repousa na falta de zelo, na
ignorância, no descaso, na frivolidade dos franceses. Não é a instituição, é a nação que se acusa; mas quem não
perceber que uma instituição pode, nos seus primeiros tempos, parecer pouco conveniente a uma nação, em
virtude da falta de costume e tornar-se conveniente e salutar, se for intrinsecamente boa, porque a nação adquire,
59

e protestava contra o despotismo das assembleias, recusando-se a entrar no que “chamava de


horrível via da onipotência parlamentar” (2005, p. 15) e para quem uma “assembleia cuja
forca é ilimitada, é mais perigosa que o povo”, em seguida citando Aristides de Atenas.

Para o autor político, depois do “poder neutral na pessoa do rei”, o Poder Judiciário é
único capaz de preservar as instituições e assegurar a justiça. Ademais Constant alertava para
necessidade “toda corporação política, em nosso século, de se prender a prerrogativas
constitucionais e determinadas [...]” (2005, p. 228).

2.1.3 A Constituição liberal com tendências sociais de 1934

O cenário que marca a passagem do milênio, do século XIX para o século XX, e os
avanços tecnológicos que chegam ao acesso dos mais abastados, em especial nos anos de
1920 e 1930, culminando com o crash da Bolsa de Nova York, em 1929, e a revolução
constitucionalista em São Paulo, em 1932, provocou a eleição de uma Assembleia
Constituinte que elaborou e promulgou a Constituição liberal de 1934. Os ideais desta
Constituição já haviam sido defendidos por Barbosa em sua campanha civilista, que passou a
fazer parte do programa do Partido Liberal, especialmente quanto à unidade da Magistratura,
que decorre da unidade do próprio Direito.

No contexto político e de separação de poderes, a Constituição adotou um sistema


quase que quadripartite, extinguindo o bicameralismo e criando uma Câmara de Deputados
para exercer o Poder legiferante e um Senado Federal com função de coordenação política e
dos Poderes federais, a que muitos chamaram de “a volta do Poder moderador”. Com isso, há
uma perda de independência dos demais Poderes, que passam a ser coordenados e
harmonizados pelo Senado Federal. Apesar dos avanços, esta constituição foi efêmera, pois
vigorou por apenas três anos (IGLÉSIAS, 2006).

pela própria instituição, a capacidade que tinha – digo isso unicamente das instituições fixas e legais, e não dos
costumes e dos usos que as leis não podem alterar. Sempre me recusarei a crer que uma nação não se preocupe
com o primeiro dos seus interesses: a administração da justiça e a garantia a dar à inocência acusada (2005, p.
265)
60

2.1.4 A Carta política do Estado Novo, de 1937

Com o advento do Estado Novo e o golpe de Estado de Getúlio Vargas, foi outorgada
a Carta de 1937, nos moldes fascista e autoritário, resultado do momento totalitário. A
Constituição retoma o sistema tripartite, somente na aparência, pois retirou a independência
do Legislativo e do Judiciário, e delegou poderes ao Executivo para paralisar as atividades do
Poder Legislativo e de revisão das decisões do Poder Judiciário (originalmente a revisão das
decisões36 que tratassem de declarações de inconstitucionalidade eram de competência do
Legislativo, mas, estando em recesso, esta caberia ao Poder Executivo).

A Carta totalitária previa o impedimento aos juízes e tribunais de conhecerem os atos


praticados durante o estado de emergência ou estado de guerra37. Para José Afonso da Silva
(2002, p.82), na Carta de 1937 “[...] muitos dispositivos permaneceram letra morta”, pois se
tratou de uma ditadura com a concentração dos Poderes Executivo e Legislativo nas mãos do
Presidente da República, que governou por meio de decreto-lei.

No preâmbulo38, a Constituição de 1937 se apresenta como atendendo a uma


“legitima aspiração do povo brasileiro [...]” em meio a invasão comunista e “[...] notória
propaganda demagógica procura desnaturar em luta de classes [...]”, pregando a
decomposição das instituições civis e políticas, no interesse da paz política e da ordem social,
da segurança, do bem-estar e da prosperidade do País, foi decretada a Carta do Estado novo.

36
Art 96 - No caso de ser declarada a inconstitucionalidade de uma lei que, a juízo do Presidente da República,
seja necessária ao bem-estar do povo, à promoção ou defesa de interesse nacional de alta monta, poderá o
Presidente da República submetê-la novamente ao exame do Parlamento: se este a confirmar por dois terços de
votos em cada uma das Câmaras, ficará sem efeito a decisão do Tribunal.
37
Art.170 - Durante o estado de emergência ou o estado de guerra, dos atos praticados em virtude deles não
poderão conhecer os Juízes e Tribunais.
38
ATENDENDO às legitimas aspirações do povo brasileiro à paz política e social, profundamente perturbada
por conhecidos fatores de desordem, resultantes da crescente a gravação dos dissídios partidários, que, uma,
notória propaganda demagógica procura desnaturar em luta de classes, e da extremação, de conflitos
ideológicos, tendentes, pelo seu desenvolvimento natural, resolver-se em termos de violência, colocando a
Nação sob a funesta iminência da guerra civil; ATENDENDO ao estado de apreensão criado no País pela
infiltração comunista, que se torna dia a dia mais extensa e mais profunda, exigindo remédios, de caráter radical
e permanente; ATENDENDO a que, sob as instituições anteriores, não dispunha, o Estado de meios normais de
preservação e de defesa da paz, da segurança e do bem-estar do povo; Sem o apoio das forças armadas e
cedendo às inspirações da opinião nacional, umas e outras justificadamente apreensivas diante dos perigos que
ameaçam a nossa unidade e da rapidez com que se vem processando a decomposição das nossas instituições
civis e políticas; Resolve assegurar à Nação a sua unidade, o respeito à sua honra e à sua independência, e ao
povo brasileiro, sob um regime de paz política e social, as condições necessárias à sua segurança, ao seu bem-
estar e à sua prosperidade, decretando a seguinte Constituição, que se cumprirá desde hoje em todo o Pais:
61

2.1.5 A Constituição democrática de 1946

Com o fim da II Grande Guerra Mundial, começaram nos paises Aliados


(vencedores) movimentos em prol da redemocratização dos Estados nacionais, inclusive no
Brasil com a publicação da Lei Constitucional nº 9, de 28/02/1945, com seis artigos,
modificando o cenário político e convocando eleição direta majoritária e proporcional tanto
para a União quanto para os Estados-membros39. Instalou-se a Assembleia Nacional
Constituinte em 02/02/1946, que promulgou uma nova Constituição da República dos Estados
Unidos do Brasil, no dia 18/09/1946.

A nova Constituição, de ideologia democrática, privilegiava os direitos e garantias


individuais, a ordem econômica e social, assim como a família, a educação e a cultura. Nessa
Constituição, a nova ordem democrática impunha a perda de prerrogativas do Poder
Executivo e o fortalecimento do Legislativo e Judiciário, bem como a total separação entre os
poderes, que passa a ser vista como exercício de distintas funções do Estado, com harmonia e
independência, diminuindo a hipertrofia do Poder Executivo da ordem anterior e fortalecendo
o equilíbrio político (SILVA, 2002, p. 88-89).

O Poder Legislativo volta à configuração bicameral, com a Câmara dos Deputados e


o Senado Federal com a competência para a elaboração de leis e controle dos atos do
Executivo. O Poder Judiciário recuperou sua competência e os cidadãos adquiriram o direito
ao Mandado de Segurança. Com a vigência da Constituição de 1946 reafirmaram-se a
independência, a harmonia e o equilíbrio entre os Poderes do Estado brasileiro, com
repercussão na democracia e no Welfare State (ZANCANER, 2009, p. 39-40).

2.1.6 A Carta política militar de 1967 e a Emenda nº 1/1969

No período que antecedeu o golpe de 31 de março de 1964, que instaurou o regime


militar no Brasil, o País experimentou um momento único de sua história com a publicação da
EC nº 4, de 1961, que instituiu o sistema parlamentarista de governo, o qual retirava poderes

39
Art. 4º. Dentro de noventa dias contados desta data serão fixadas em lei, na forma do art. 180 da Constituição,
as datas das eleições para o segundo período presidencial e Governadores dos Estados, assim como das primeiras
eleições para o Parlamento e as Assembleias Legislativas. Considerar-se-ão eleitos e habilitados a exercer o
mandato, independentemente de outro reconhecimento, os cidadãos diplomados pelos órgãos incumbidos de
apurar a eleição. O Presidente eleito tomará posse, trinta dias depois de lhe ser comunicado o resultado da
eleição, perante o órgão incumbido de proclamá-lo. O Parlamento instalar-se-á sessenta dias após a sua eleição.
62

do Poder Executivo, que passaram a ser exercidos por um Conselho de Ministros, restando ao
Presidente da República algumas atribuições elencadas no art. 3º40, da referida Emenda
(BRASIL, 1961), portanto uma representativa mudança no sistema político e na separação dos
Poderes do Estado. Nos primeiros anos do regime militar, ficou mantida a Constituição de
1946, com alterações que ampliaram os poderes do Poder Executivo, retirados pela EC nº 4,
de 1961.

Este foi o tempo necessário para que fossem deflagradas as inconsistências do novo
regime e a Constituição democrática de 1946, quando foi editado o Ato Institucional nº 4, de
1966, que convocou o Congresso Nacional para se reunir extraordinariamente, de 12 de
dezembro de 1966 a 24 de janeiro de 1967, para discussão, votação e promulgação do projeto
de Constituição apresentado pelo Presidente da República - um novo texto nos moldes da
Carta de 1937 (BRASIL, 1966).

A Carta Política de 1967 tinha como características principais o autoritarismo, a


centralização, a exacerbação dos poderes do Executivo e a questão da segurança nacional.
Esta permitia que o Poder Executivo legislasse sobre tudo, bastando, para tanto, invocar a
“urgência”, o “interesse público relevante41” e, no dia 15 de março de 1967 o governo
divulgou o Decreto-Lei nº 314, estabelecendo a Lei de Segurança Nacional (PONTES DE
MIRANDA, 1970b).

40
Art. 3º Compete ao Presidente da República: I - nomear o Presidente do Conselho de Ministros e, por
indicação deste, os demais Ministros de Estado, e exonerá-los quando a Câmara dos Deputados lhes retirar a
confiança; II - presidir as reuniões do Conselho de Ministros, quando julgar conveniente; III - sancionar,
promulgar e fazer publicar as leis; IV - vetar, nos têrmos da Constituição, os projetos de lei, considerando-se
aprovados os que obtiverem o voto de três quintos dos deputados e senadores presentes, em sessão conjunta das
duas câmaras; V - representar a Nação perante os Estados estrangeiros; VI - celebrar tratados e convenções
internacionais, ad referendum do Congresso Nacional; VII - declarar a guerra depois de autorizado pelo
Congresso Nacional ou sem essa autorização, no caso de agressão estrangeira verificada no intervalo das sessões
legislativas; VIII - fazer a paz, com autorização e ad referendum do Congresso Nacional; IX - permitir, depois de
autorizado pelo Congresso Nacional, ou sem essa autorização no intervalo das sessões legislativas, que fôrças
estrangeiras transitem pelo território do país, ou por motivo de guerra, nêle permaneçam temporariamente; X -
exercer, através do Presidente do Conselho de Ministros, o comando das Fôrças Armadas; XI - autorizar
brasileiros a aceitarem pensão emprego ou comissão de governo estrangeiro; XII - apresentar mensagem ao
Congresso Nacional por ocasião da abertura da sessão legislativa, expondo a situação do país; XIII - conceder
indultos, comutar penas, com a audiência dos órgãos instituídos em lei; XIV - prover, na forma da lei e com as
ressalvas estatuídas pela Constituição, os cargos públicos federais; XV - outorgar condecorações ou outras
distinções honoríficas a estrangeiros, concedidas na forma da lei; XVI - nomear, com aprovação do Senado
Federal, e exonerar, por indicação do Presidente do Conselho, o Prefeito do Distrito Federal, bem como nomear
e exonerar os membros do Conselho de Economia (art. 205, § 1º).
41
Art. 58 - O Presidente da República, em casos de urgência ou de interesse público relevante, e desde que
não resulte aumento de despesa, poderá expedir decretos com força de lei sobre as seguintes matérias: I -
segurança nacional; II - finanças públicas. Parágrafo único - Publicado, o texto, que terá vigência imediata, o
Congresso Nacional o aprovará ou rejeitará, dentro de sessenta dias, não podendo emendá-lo; se, nesse prazo,
não houver deliberação o texto será tido como aprovado,
63

A resposta dos militares às crescentes manifestações populares (ocorridas após a


publicação da Carta de 1967 e da Lei de Segurança Nacional) veio com a publicação da
Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969, contendo 200 artigos, e a Carta
Política passa a vigorar com a nova redação, instalando um novo ordenamento jurídico no
País. Isto desencadeou protestos ainda mais violentos como atos terroristas e o sequestro do
Embaixador dos EUA, considerados atos subversivos.

Naquele momento, os poderes do Executivo eram ilimitados. O próprio Preâmbulo já


estabelecia tais poderes com a decretação, desde aquela data, do recesso do Congresso
Nacional, autorizando o Poder Executivo Federal a legislar sobre toda e qualquer matéria,
inclusive editar emendas constitucionais. Não havia o que se falar sobre a separação dos
poderes se todos eles estavam sujeitos à prévia apreciação do Poder Executivo, e até o seu
declínio na segunda metade da década de 1970, com a revogação do AI nº 5, em 1978, e o
movimento das “Diretas Já” nos anos de 1983 e 1984.

Em março de 1985, após a primeira eleição indireta de um civil a Presidência da


República, assumiu o vice, José Sarney, no lugar de Tancredo Neves, que faleceu antes da
posse, e logo foi aprovada a EC nº 26/1985 que convocou os membros do Congresso para se
reunirem em de 1º de fevereiro de 1987 em Assembleia Nacional Constituinte, livre e
soberana(SILVA, 2009, p.88-89).

2.1.7 A Constituição do Estado Democrático de Direito de 1988

Com a promulgação da Constituição Federal, de 1988, a separação dos poderes


passou a ser considerada fundamento do Estado Democrático de Direito, e se operou como
um “princípio estruturante da ordem política-constitucional” (SILVA, 2002, p.94). Esta
tripartição de poderes do Estado não lhe retira a unicidade e a indivisibilidade, uma vez que
aquela separação consiste numa técnica de distribuição de funções internamente dentro do
mesmo ente político (ROCHA, 1995, p.12).

Nos primeiros anos de vigência da nova ordem jurídica constitucional, muito se


debateu sobre os fundamentos, objetivos e direitos fundamentais individuais e sociais, além
da dogmática tradicional produzida com a legislação e os postulados liberais. Os juristas
brasileiros partiram do caráter normativo dos princípios constitucionais e dos demais
dispositivos axiomáticos do texto, buscando promover uma reconciliação não positivista do
Direito e da Moral com a dogmática tradicional positivada na Constituição.
64

Neste sentido, já se tinha com clareza a “normatividade dos princípios e sua


vinculação com a moral”, assim como crescia a recusa de qualquer tentativa de subsunção na
aplicação do Direito. Sobre a temática, Canotilho (1991, p.176-180) apresenta uma tipologia
de princípios e regras. Para o autor, são princípios jurídicos fundamentais aqueles “[...]
historicamente objetivados e progressivamente introduzidos na consciência jurídica e que
encontram uma recepção expressa ou implícita no texto constitucional”.

Cabe ressaltar que estes “pertencem à ordem jurídica positiva e constituem um


importante fundamento para a interpretação, integração, conhecimento e aplicação do direito
positivo”. Canotilho destaca que estes princípios jurídicos fundamentais são “relevantes nos
casos limites (Estado de Direito e de Não Direito e Estado Democrático e ditadura etc.)”.

A Constituição Cidadã42 preordenou a realização de um plebiscito (realizado no dia


25/08/1993) para que o povo decidisse sobre a forma e o sistema de governo. O resultado das
urnas foi uma República Presidencialista, mantendo-se a tradição iniciada com a primeira
Constituição republicana presidencialista.

Quando se fala em separação dos poderes do Estado, tem-se em mente uma


separação horizontal de poderes (de órgãos e funções); refere-se a uma repartição horizontal
ou a uma diferenciação funcional (legislativa, executiva e judiciária) com delimitação
institucional de competências e as relações de controle e interdependência recíproca entre os
vários órgãos soberanos do Estado (CANOTILHO, 1991, p. 700).

Tratando da Constituição Portuguesa, o autor exprime o modelo português de


separação e interdependência dos órgãos soberanos e de controles das funções contra os
possíveis abusos e desvios. Isso aponta para uma interdependência institucional e funcional e
não para uma independência absoluta entre os poderes, diferente da Constituição brasileira
(art. 2º) que trata de “poderes independentes e harmônicos entre os si”. O dispositivo
constitucional suscita a necessidade de instituições capazes de promover o consenso e evitar a
paralisia política, que seria o mal maior.

Ao abordar o tema da separação dos poderes, José Afonso da Silva (2002, p. 109-
111) define separadamente independência e harmonia, e ao final destaca: para que esta
harmonia ocorra entre os três poderes e se desenvolvam a bom termo “[...] há de haver

42
Expressão utilizada por Ulisses Guimarães no dia 5 de outubro de 1988, com a Constituição na mão esquerda
e a mão direito no peito proclamou o preâmbulo, em seguida referiu-se a ela como: nossa Constituição Cidadã.
65

consciente colaboração e controle recíproco (que, aliás, integra o mecanismo) para evitar
distorções e desmandos”. Esta colaboração e integração imanente ao sistema revela um grau
de interdependência.

Cabe ressaltar mais uma vez os federalistas (HAMILTON; MADISON;JAY, 1984, p.


401-404) que propuseram ser necessária certa independência entre os poderes do Estado para
que “a cada um seja garantido o controle constitucional dos demais”. Observe-se não se tratar
de uma separação de poderes, nem uma divisão de poderes, mas uma separação de funções,
com o objetivo de melhor realizar o fim a que se propõe o Estado, por seus órgãos e
instituições.

A ideia de separação de poderes nas Constituições portuguesa e brasileira é tênue.


Vê-se que a primeira adota uma concepção pura da separação de poderes como poderes-
funções, enquanto a segunda perfilha uma concepção mais realista de divisão de poderes,
como a separação de órgãos, ou ainda um sistema de poderes e competências. Jorge Miranda
(2010, p.76) aborda a questão nas Constituições Portuguesas de 1933 e 1976 cuja “[...]
diferença consiste, como se sabe, em que a atual Lei Fundamental, e não a de 1933,
expressamente proclamava a separação e a interdependência de órgão de soberania como
principio geral de organização do poder político”.

Isto é, a Constituição portuguesa adota o princípio da separação e da


interdependência de órgão de soberania, portanto, há um entrelaçamento da Presidência da
República com e o Governo, pois ambos integram o Poder Executivo Em contrapartida ao
Parlamento, entretanto o Primeiro-Ministro é, essencialmente, o chefe do governo da
República (MIRANDA, 2010, p.36-37). Para Mendes e Branco (2012, p.167) a vinculação
dos poderes do Estado brasileiro, como fundamentos, constitui-se em “[...] parâmetros de
organização e de limitação dos poderes constituídos”, portanto é a sua (dos direitos
fundamentais) constitucionalização que “impede que sejam considerados meras
autolimitações dos poderes constituídos - dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário
[...]” assim os “atos dos poderes constituídos devem conformidade aos direitos fundamentais
e se expõem à invalidade se os desprezarem”.

Noutro sentido, a análise feita pela Suprema Corte no Brasil adotou o entendimento
de que a separação de poderes pressupõe o princípio da simetria (MENDES e BRANCO,
2012, p.872-875) Assim, em regra, as questões políticas não são passíveis de apreciação pelo
Judiciário por serem de competências privativas e exclusivas do Legislativo e Executivo,
66

portanto cabe ao Judiciário aplicar a autocontenção, a ponderação e o princípio democrático


para saber se deve ou não se pronunciar sobre eventual violação constitucional. Neste
contexto, o STF43 já se manifestou reiteradamente sobre a prerrogativa exclusiva do chefe do
Poder Executivo nos atos de esfera política, como o de sancionar ou vetar projeto de lei
aprovado pelo Legislativo, incabível a atuação do Judiciário.

Em diversas situações, o Judiciário tem exercido a ponderação judicial e


interferência em demandas de competência privativa e exclusiva do Executivo e do
Legislativo, apontando para esta interdependência de afetação, mesmo que somente para
reafirmar a competência constitucional exclusiva e privativa. No caso do controle da
relevância e urgência para a edição de Medida Provisória pelo Executivo44, em recente
julgamento (Recurso Extraordinário)45, a Suprema Corte manifestou-se por uma
jurisprudência no sentido de que, “conquanto os pressupostos para a edição de medidas
provisórias se exponham ao controle judicial”, pois não se trata de questão meramente
política, mas de determinar a relevância e urgência caso a caso, mas que o Judiciário somente
poderá manter ou anular o ato presidencial.

O STF tem atuado como legislador negativo46, como foi no caso da Emenda
Constitucional nº 03/93 que dispunha sobre a inconstitucionalidade do Imposto Provisório
sobre Movimentação Financeira - IPMF. Originalmente, uma Emenda constitucional proposta
pelo Poder Executivo ao Legislativo, que aprovou um texto (apesar de aprovado pela
Comissão de Constituição e Justiça do Congresso Nacional, a quem compete o exame da

43
ADPF nº 1, DJ. 07/11/2003.
44
ADIN nº 1397-1, DJ. 27/06/1997
45
RE 592377 / RS. DJ 19/03/2015. Ementa: CONSTITUCIONAL. ART. 5º DA MP 2.170/01. CAPITALIZA
ÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA
EDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA. SINDICABILIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. ESCRUTÍNIO
ESTRITO. AUSÊNCIA, NO CASO, DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA NEGÁ-LOS. RECURSO
PROVIDO. 1. A jurisprudência da Suprema Corte está consolidada no sentido de que, conquanto os
pressupostos para a edição de medidas provisórias se exponham ao controle judicial, o escrutínio a ser feito neste
particular tem domínio estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa presidencial apenas quando atestada a
inexistência cabal de relevância e de urgência. 2. Não se pode negar que o tema tratado pelo art. 5º da MP
2.170/01 é relevante, porquanto o tratamento normativo dos juros é matéria extremamente sensível para a
estruturação do sistema bancário, e, consequentemente, para assegurar estabilidade à dinâmica da vida
econômica do país. 3. Por outro lado, a urgência para a edição do ato também não pode ser rechaçada, ainda
mais em se considerando que, para tal, seria indispensável fazer juízo sobre a realidade econômica existente à
época, ou seja, há quinze anos passados. 4. Recurso extraordinário provido.
46
Reconhecimento, Poder Judiciário, Relevância, Urgência, Medida Provisória ADI 162 (TP), RE 217162
(2ªT), ADI 2150 (TP), AI 489108 Agr (2ªT), ADI 4627 (TP), RTJ 190/139, RTJ 165/173, RTJ 145/101. RTJ
165/174. Apreciação, Urgência, Relevância, Medida Provisória, Excepcionalidade em ADI 1397 MC (1ªT),
ADI 2213 MC (TP), ADC 11 MC(TP), ADI 4049 MC (TP), ADI 2527 MC (TP), ADI 162 MC (1ªT), ADI 1753
MC (1ªT). Controle de Constitucionalidade, Emenda Constitucional - ADI nº 939.
67

constitucionalidade dos projetos antes de encaminhados a apreciação e votação) em apoio ao


Governo, para o aumento de receitas tributárias e o efetivo controle que o imposto promovia
nas movimentações financeiras - última e inatingível “caixa de Pandora”.

Cabe aqui ressaltar que, há dois séculos, Ruy Barbosa47, enquanto ministro da
Fazenda (1889/1891), já alertava para a judicialização de questões políticas, distinguindo duas
categorias: uma altamente política e outra puramente política, ambas fora do domínio judicial,
entretanto uma vez formalmente revestida de um pleito, esta passa a competência do Tribunal,
desde que o ato praticado pelos poderes do Estado fira a Constituição, ou direitos nela
consagrados. Assim, na ordem vigente, a competência constitucional de cada função, quanto
à forma está dividida em: competências exclusivas, competências concorrentes e
competências complementares ou, como indicado por Canotilho (1991, p.693) “competências
exclusivas, competências concorrentes e competências-quatro”. Ou ainda como é expresso
por Jose Afonso da Silva (2002, p.478) em competência material - que pode ser exclusiva ou
comum, cumulativa ou paralela; e competência legislativa - que pode ser exclusiva, privativa,
concorrente e suplementar.

Outras classificações são identificadas na doutrina brasileira para as competências:


para Mendes e Branco a classificação é a indicada pela Constituição, ou seja, competência
geral da União; competência de legislação privativa da União; competência relativa aos
poderes reservados dos Estados; competência comum material da União, dos Estados-
membros, do Distrito Federal e dos Municípios; competência legislativa concorrente;
competências dos Municípios.

Considerando-se a classificação de Canotilho, a primeira competência consiste na


atribuição a um só órgão, e cuja capacidade jurídica de exercer unicamente em certas
atribuições, em determinado campo; a segunda é atribuída, a igual título, a vários órgãos, isto

47
[..]de uma vez com o equívoco, definindo (que)... uma questão pode ser distintamente política, altamente
política, segundo alguns, até puramente política, fora dos domínios da justiça, e, contudo, em revestindo a forma
de um pleito, estar na competência dos tribunais, desde que o ato, executivo ou legislativo, contra o qual se
demande, fira a Constituição, lesando ou negando um direito nela consagrado. [...] Noutras palavras: a violação
de garantias constitucionais, perpetrada à sombra de funções políticas, não é imune à ação dos tribunais. A estes
compete sempre verificar se a atribuição política, invocada pelo excepcionante, abrange nos seus limites a
faculdade exercida. Em substância, exercendo atribuições políticas e tomando resoluções políticas, move-se o
poder legislativo num vasto domínio, que tem como limites um círculo de extenso diâmetro, que é a Constituição
Federal. Enquanto não transpõe essa periferia, o Congresso elabora medidas e normas que escapam à
competência do Poder Judiciário. Desde que ultrapasse a circunferência, os seus atos estão sujeitos ao
julgamento do Poder Judiciário, que, declarando-os inaplicáveis por ofensivos a direitos, lhes tira toda a eficácia
jurídica (OBRA COMPLETA, 1947).
68

é, a capacidade jurídica de exercer determinadas atribuições com outras entidades e em


determinadas atividades; a terceira consiste na atribuição de competência, quanto à definição,
a um órgão e quanto à execução, a outro. Portanto, os arranjos quanto à atribuição de
competências dependem da vontade do povo por meio da Constituição, na qual cada função
encontra sua origem e sua limitação, com o poder político (CANOTINHO, 1991, p.692).

No exercício de suas atribuições, cada função não se limita à sua competência


exclusiva, exercendo, por vezes, as funções dos outros poderes. O exemplo típico ocorre
quando a função judiciária compete à jurisdição, à administração de seu pessoal e seu
orçamento. À função executiva compete, além da atribuição constitucional de governar e
administrar, a de julgar e aplicar medidas disciplinares administrativas. À função legislativa
compete a produção legislativa, além da administração de seu pessoal e a orçamentária, bem
como a de julgar os casos de cassação de mandatos de seus membros (parlamentares ou
congressistas).

Tem-se uma relação de entrelaçamento preservando a independência e harmonia de


cada Poder, ao mesmo tempo em que cria um entrelaçamento entre as diferentes funções, não
se admitindo que uma função usurpe suas atribuições e competências invadindo a de outra
função. Tudo isto decorre do sistema de freios e contrapesos, essencial ao equilíbrio entre as
funções legislativa, executiva e judiciária; é, ao mesmo tempo, o mecanismo que cria a
interdependência de cada uma das funções. Assim, competência exclusiva não poderá ser
delegada ou usurpada, sob pena de violação ao principio fundamental da separação harmônica
e independente entre os poderes.

A história recente do Brasil, desde a independência até o momento atual, releva uma
experiência cíclica e de alternância na dogmática separação dos poderes. Ora prevalece a
concentração de poderes nas mãos do chefe do Poder Executivo, e consequente mitigação dos
demais poderes; ora - em oposição ao regime anterior - retiram-se poderes do chefe de Estado
e se restabelece o equilíbrio entre os poderes, mas com preponderância do Legislativo na
representação soberana da vontade geral. E ainda há momentos nesta história em que o
Executivo e o Legislativo, perdendo a credibilidade e a confiança do povo, produzem uma
hipertrofia do Poder Judiciário, único, institucionalmente obrigado a resolver os clamores e
demandas da sociedade.
69

A função de maior evidencia nos Estados, independentemente da época, sempre foi o


Poder Executivo. Quando se pensa na Inglaterra, por exemplo, logo vêm à mente as figuras da
Rainha e do seu primeiro-ministro. O mesmo acontece em qualquer outro Estado, a livre
associação do chefe de Estado ou do chefe de Governo, como no caso da Monarquia
parlamentarista britânica, ou nas republicas parlamentaristas, como a Alemã, cuja Chefia de
Estado cabe ao Presidente Joachim Gauck e a Chefia de Governo fica a cargo da primeira-
ministra Angela Merkel. Nos Estados que adotam a República presidencialista, a associação é
ainda mais imediata, pois as atribuições de Chefe de Estado e de Chefe de governo estão
concentradas na mesma pessoa, o que facilita a fixação, como no caso brasileiro, com o ex-
presidente Luis Inácio Lula da Silva ou a atual Presidenta Dilma Rousseff.

Antes mesmo dos escritos políticos e filosóficos sobre a separação de poderes do


Estado, e, até mesmo, antes da criação do Estado, desde os mais primitivos, na mais
longínqua Antiguidade havia a figura do líder, fosse ela exercida pela força ou pela integração
e harmonia da tribo, ou do clã, mas a figura daquele que comandava ou fazia com que se
aplicasse o comando. Para melhorar a compressão, vale relembrar Max Weber (2002, p. 56)
que buscou conhecer e explicar o funcionamento das organizações burocráticas modernas,
desde a observação, entabulando três formas de manifestação da autoridade e que se poderia
chamar de lideranças: a tradicional, a carismática e a racional-legal. Há quem sustente que tal
classificação se aplica a qualquer organização, mesmo as mais primitivas.

A primeira autoridade é baseada na cultura e na tradição, e poderia ser representada


pelas figuras do patriarca, dos anciãos, do líder do clã, do senhor feudal, ou ainda pela figura e
autoridade paterna na família. Trata-se de uma autoridade encontrada em qualquer
organização humana, por mais embrionária e primitiva que seja. A segunda consiste num traço
pessoal do individuo, portanto, personalíssimo, já que se baseia no carisma, estando fora da
esfera racional, por ser próprio ao indivíduo, que poderia ser representada pelo herói, pelo
líder, pelo profeta, pelos grupos revolucionários e partidos políticos, e por ser uma autoridade
legítima, estável e continua, atrai a lealdade e a vontade de permanecer ligado à pessoa e
ideais da pessoa do líder. E a terceira, que tem origem na regra, na norma e na lei, resulta de
delegações de regulamentos, portanto racional-formal e sua legitimidade decorre da lei em
sentido lato. Não se trata de uma subordinação espontânea, mas decorrente de uma figura de
autoridade.
70

Assim, o que se conhece, na atualidade, como um poder do Estado, já foi no passado


um só poder que concentrava todas as possíveis funções de uma sociedade, até a gradual
formação da pólis e das Cidades-Estado na Grécia antiga. Estas eram politicamente
independentes. Como se constata a questão do poder não foi processo linear no
desenvolvimento da civilização ocidental. Observe-se que Clèmerson Clèves (2011, p.25)48 já
destacava que Aristóteles “não desconhecia o fato de que o Estado desempenhava distintas
funções” e Platão propusera formas de governo mediante limitação de poder, pois este via de
regra era concentrado. Vê-se que, quanto menor a participação popular (do demos) nas coisas
do Estado e na política, maior será a tendência de hipertrofia do Poder Executivo, e quanto
mais democrático for o Estado, mais forte tende a ser o Poder representativo do povo, o
Legislativo.

A existência do primeiro justifica a necessidade e existência do segundo, como forma


de manter o equilíbrio e a segurança das instituições. Deste modo é que os “arranjos
institucionais” atuais necessitam dispor de mecanismos de coordenação e interdependência
que permitam ultrapassar as barreiras impostas por qualquer rigidez na divisão dos poderes,
praticamente impossível e inviável tal rigidez (PIÇARRA, 1989, p.13).

Parte-se do pressuposto de que o poder político é indivisível, e que o povo, que não
se divide, é seu titular, exceto em face do da ação do Poder Constituinte, conferindo poderes
diferentes a órgão encarregados de exercer diferentes funções. Outrossim, o Poder político
soberano consubstancia relações de força de classes sociais diferentes e grupos antagônicos;
“relação sem forma definida, mas que, de qualquer modo se condensa e, por vezes,
materializa-se, dando origem a instituições, praticas sociais, convenções, aparatos funcionais,
como, inclusive, o Estado e o Direito. Logo não pode ser dividido”(CLÈVE, 2011, p. 31).

Seguindo o pensamento de Karl Loewenstein (1986, p.61-62): “[...] na sociedade de


massa não há como manter a distinção entre legislativo (função legislativa) e administração
(função executiva) [...]”, pois “Não são funções separadas ou separáveis, mas sim diferentes
técnicas do political leadership. [...] uma vez que o governo lidera politicamente os dois
poderes”. Talvez, não com o intuito de justificar, mas de certa forma explica as dificuldades

48
A ideia da divisão das funções estatais segundo o critério funcional foi esboçada pela primeira vez por
“Aristóteles (que não desconheceu o fato de que o Estado desempenha distintas espécies de funções), Platão e
Políbio propuseram formas de governo com a ambição de alcançar o equilíbrio político mediante a limitação do
poder. Também Heródoto e Xenofonte preocuparam-se com a questão. Muito mais tarde, Maquiavel e Althusius,
para citar apenas dois, incursionaram, outra vez, sobre tão importante tema”(CLÈVES, 2011, p.25).
71

de conciliação das atribuições de competências delegadas pela Constituição Federal de 1988,


que deflagra cíclicas crises de alternância de hipertrofia e de mitigação entre os poderes do
Estado. E, ainda, há de se atentar para o fato de que, “o direito positivo dos Estados ocidentais
jamais impediu a ocorrência de importantes interferências de poder para poder, respeitantes
quer ao exercício de atividades de controle sobre os demais, quer a pratica de atos deveriam
ser produzidos por outro poder”(CLÈVE, 2011, p. 36).

Ademais, o Estado é uma organização carente de vontade própria, que necessita da


manifestação na vontade humana. Deste modo, o Estado é constitucionalmente supremo, mas
administrativamente dependente: o primeiro incumbido do poder político que compõe o
Governo, representado pelo Direito constitucional, enquanto o segundo representa a ordem
hierárquica da Administração Pública encarregada de operacionalizar a Administração Estatal,
representado pelo Direito administrativo.

A tarefa do jurista da atualidade é adaptar o pensamento de Montesquieu à nova


realidade constitucional e social, o que requer aprimorar os poderes do Estado para responder
às crescentes demandas da sociedade do século XXI, bem como o imperativo
aperfeiçoamento dos mecanismos de controle social do Estado para torná-lo mais intenso,
seguro e eficaz assegurando maior participação na experiência política e na res pública.

2.2 Das atribuições de competências

A ordem jurídica constitucional instituída em 1988 reservou, no art. 2º, a tripartição


dos poderes/órgãos funções como um princípio fundamental da República, como cláusula
pétrea (art. 60, § 4º, III) no Estado brasileiro e cujas funções foram elencadas nos art. 44
(Legislativo), art. 76 (Executivo) e art. 92 (Judiciário), assim como a norma fundante delegou
atribuições a cada função. Nas palavras de José Afonso da Silva (2002, p. 107): “Disso
decorrem três características fundamentais do poder político: unidade, indivisibilidade e
indelegabilidade”, ficando-lhes vedadas interferência entre poderes.

Na ordem prática do exercício das funções de Estado, porém, os órgãos possuem


atribuições típicas e atípicas, cuja tipicidade se dá em razão da preponderância, sem, contudo,
invadir as atribuições uns dos outros, e que somente poderão ocorrer nos casos previstos no
próprio Texto Constitucional, portanto, verdadeiras exceções ou incompatibilidades ou
72

atribuições atípicas, porém constitucionalmente autorizadas. Tais exceções49 estão positivadas


na Constituição de 1988, no art. 50 (dispõe sobre a autorização para o Congresso Nacional
convocar ministros de Estado para prestar informações, e outros), art. 56 (dispõe sobre a
investidura de deputado e senador em cargos no Governo sem perda de mandato), art. 62
(dispõe sobre a legiferância do Presidente da República por medida provisória) e art. 68
(dispõe sobre poder do Presidente da República para elaborar leis delegadas, cuja autorização
deverá ser delegada pelo Congresso Nacional).

Tais exceções à indelegabilidade legislativa já existiam antes mesmo da Constituição


de 1988. A Constituição Imperial, em seu inc. XII, do art. 102, delegava atribuições ao
Imperador para “[...] expedir os Decretos, Instruções e Regulamentos adequados à boa
execução das Leis”, seguidos pelas demais constituições em diferentes termos e mais
fortemente nas Cartas de 1937, 1967 e EC de1969.

Não obstante a Constituição Federal de 1988 tenha formalmente adotado o clássico


modelo da tripartição de poderes, constata-se, ainda, que a sua rigidez foi materialmente
abandonada, pois o constituinte originário conferiu aos tribunais a prerrogativa de elaborar
seus regimentos (art. 96, I, “a”), além de outorgar a ambos a iniciativa legislativa no que
concerne a determinadas matérias, na forma e nos casos previstos no Texto Constitucional
(art. 61) sobre a iniciativa para propor leis complementares e ordinárias.

49
Art. 50. A Câmara dos Deputados e o Senado Federal, ou qualquer de suas Comissões, poderão convocar
Ministro de Estado ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República para
prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado, importando crime de
responsabilidade à ausência sem justificação adequada. (“Caput” e Parágrafo§2º com redação dada pela
Emenda Constitucional de Revisão nº 2, de 1994)
Art. 56. Não perderá o mandato o Deputado ou Senador: [...]
Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com
força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. (“Caput” do artigo com redação dada
pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001).
Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao
Congresso Nacional. § 1º Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso
Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei
complementar, nem a legislação sobre: I - organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a
garantia de seus membros; II - nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais; III - planos
plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos. § 2º A delegação ao Presidente da República terá a forma de
resolução do Congresso Nacional, que especificará seu conteúdo e os termos de seu exercício. § 3º Se a
resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional.
73

2.2.1 Poder Executivo

A ordem jurídica constitucional instituída em 1988 reservou atribuições e definiu o


“papel majoritário conferido ao Executivo - o de assegurar o bem-estar da comunidade e
condições dignas de sobrevivência aos cidadãos”. Dentre estas atribuições estão contemplados
poderes, faculdades e prerrogativas diversas, cuja notoriedade é a função da chefia de Estado,
de Governo e de administrar (ZANCANER, 2009, p. 47) com o auxilio dos ministros de
Estado. A Constituição Cidadã estatui no art. 76 que o “Poder Executivo é exercido pelo
Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado” E, no art. 84, estabelece as
competências privativas do Presidente da República, evidenciando o modelo de
presidencialismo.

Diferentemente do sistema parlamentarista, no qual a Chefia do Governo está a cargo


de um membro do Poder Legislativo, que se mantém pela maioria do parlamento, isto é, o
governo decorre da autoridade e confiança do Parlamento, seja pelo apoio da maioria, seja
pela tolerância parlamentar em relação aos governos minoritário(MORAES, 2003), no
sistema presidencialista, a chefia do Estado e do Governo está concentrada numa só pessoa,
no Presidente eleito direta ou indiretamente.

No caso brasileiro, o Presidente da República é eleito pelo voto direto, portanto tem-
se uma legitimação democrática, cuja autoridade e confiança advêm do povo pelo sufrágio,
mas que também necessita de apoio do Congresso para governar. O Presidente da República
conta para o exercício da função não somente com o apoio dos ministros de Estado, como
também do Vice-Presidente da República, do Conselho da República e do Conselho de Defesa
Nacional.

Assim, são prerrogativas do Poder Executivo a direção da Administração Pública


federal, com poder para expedir regulamentos, regulamentos autorizados (quando o
regulamento exorbita da autorização concedida em lei ao Executivo, cumpre o Judiciário
negar-lhe aplicação) e de Decretos autônomos (introduzido pela EC 32/2000). Estas
prerrogativas, em sua maioria são previstas no art.8450 da CF, as quais muitas ultrapassam as

50
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: I - nomear e exonerar os Ministros de Estado; II
- exercer, com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da administração federal; III - iniciar o
processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Constituição; IV - sancionar, promulgar e fazer
publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução; V - vetar projetos de lei, total
ou parcialmente; VI – dispor, mediante decreto, sobre: (Inciso com redação dada pela Emenda Constitucional nº
32, de 2001)a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa
74

atribuições de executor e operacionalizador de leis, como o inciso XXVI, que autoriza a


legiferância do Executivo na edição de medidas provisórias (art.62), com força de lei e
elaborar leis delegadas (art.68).

Outra modalidade de atribuição do Poder Executivo consiste na interação com o


Congresso Nacional, diferentemente do modelo descrito em O espírito das leis, de
Montesquieu, pois, na realidade democrática e constitucional, é atribuição do Presidente
participar ativamente no processo legislativo, que vai desde a propositura de projetos de leis,
sancionando, promulgando, fazendo publicar ou vetando (veto político e veto jurídico)51,
remeter mensagens e planos ao Congresso Nacional sobre políticas públicas, encaminhar
anualmente o plano plurianual (PPA), o projeto de lei de diretrizes orçamentárias (pLDO) e as
propostas de orçamento anual (pLOA), bem como apresentar, inclusive, propostas e projetos
de emendas constitucionais (PECs) (ALMEIDA FILHO, 2014, p. 49-57).

nem criação ou extinção de órgãos públicos; (Alínea acrescida pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)b)
extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos; (Alínea acrescida pela Emenda Constitucional nº 32, de
2001)VII - manter relações com Estados estrangeiros e acreditar seus representantes diplomáticos; VIII - celebrar
tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional; IX - decretar o estado de
defesa e o estado de sítio; X - decretar e executar a intervenção federal; XI - remeter mensagem e plano de
governo ao Congresso Nacional por ocasião da abertura da sessão legislativa, expondo a situação do País e
solicitando as providências que julgar necessárias; XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se
necessário, dos órgãos instituídos em lei; XIII - exercer o comando supremo das Forças Armadas, nomear os
Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, promover seus oficiais-generais e nomeá-los para os
cargos que lhes são privativos; (Inciso com redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999)XIV -
nomear, após aprovação pelo Senado Federal, os Ministros do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais
Superiores, os Governadores de Territórios, o Procurador-Geral da República, o presidente e os diretores do
Banco Central e outros servidores, quando determinado em lei; XV - nomear, observado o disposto no art. 73, os
Ministros do Tribunal de Contas da União; XVI - nomear os magistrados, nos casos previstos nesta Constituição,
e o Advogado-Geral da União; XVII - nomear membros do Conselho da República, nos termos do art. 89, VII;
XVIII - convocar e presidir o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional; XIX - declarar guerra,
no caso de agressão estrangeira, autorizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele, quando ocorrida no
intervalo das sessões legislativas, e, nas mesmas condições, decretar, total ou parcialmente, a mobilização
nacional; XX - celebrar a paz, autorizado ou com o referendo do Congresso Nacional; XXI - conferir
condecorações e distinções honoríficas; XXII - permitir, nos casos previstos em lei complementar, que forças
estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente; XXIII - enviar ao
Congresso Nacional o plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias e as propostas de orçamento
previstas nesta Constituição; XXIV - prestar, anualmente, ao Congresso Nacional, dentro de sessenta dias após a
abertura da sessão legislativa, as contas referentes ao exercício anterior; XXV - prover e extinguir os cargos
públicos federais, na forma da lei; XXVI - editar medidas provisórias com força de lei, nos termos do art. 62;
XXVII - exercer outras atribuições previstas nesta Constituição. Parágrafo único. O Presidente da República
poderá delegar as atribuições mencionadas nos incisos VI, XII e XXV, primeira parte, aos Ministros de Estado,
ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União, que observarão os limites traçados nas
respectivas delegações.
51
O Veto é político quando o Executivo entende que o projeto de lei é contrario as políticas públicas
desenvolvidas pela sua administração ou contrária ao interesse público. O Veto é jurídico quando o Executivo
entender, preventivamente, que o projeto de lei submetido à sua sanção/veto é inconstitucionalidade.
75

Sendo assim, no exercício democrático constitucional do sistema do check and


balances - responsável pela harmonia entre os poderes - o Executivo exerce o “poder-
controle” sobre os demais poderes do Estado, por meio de uma flexibilização funcional do
poder político. A Constituição estabelece hipóteses, segundo as quais o Poder Executivo e o
Poder Legislativo se controlam. Igualmente, a Constituição estabelece situações de controle
do Poder Executivo sobre o Poder Judiciário, como quando da escolha e nomeação de
ministros dos tribunais e juízes, bem como a possibilidade de concessão de anistia, após
trânsito em julgado da decisão de última instância, e a concessão de indulto ou comutação de
pena.

A intromissão de um poder no outro, todavia, tem como consequência a hipertrofia


de um e a mitigação do outro, violando a harmonia entre eles. É o que ocorre quando o Poder
Executivo abusa no uso de medidas provisórias, seja no alto grau de gerenciamento do
processo legislativo, decompondo as competências do Congresso Nacional, impedido suas
deliberações, ou controlando a agenda legislativa, confiscando a legiferância do parlamento
(CLÈVE, 2011).

Outro aspecto é apresentado por Limongi e Figueiredo (1998) ao advertirem para a


radical alteração nas bases institucionais do sistema político nacional com a promulgação da
Constituição de 1988, e um dos aspectos apontados pelos autores é “em relação à Constituição
de 1946, os poderes legislativos do Presidente da República foram imensamente ampliados”
preservando inalteradas “[...] as inovações constitucionais introduzidas pelas Constituições
escritas pelo regime militar com vista a garantir a preponderância legislativa do Executivo
[...]”.

No sentido político, o modelo presidencialista brasileiro recai sobre a coligação e


aliança partidária, a que Abranches (2014) denominou de “presidencialismo de coalizão”. Este
sistema requer do chefe do Governo uma ótima capacidade de negociação e persuasão dos
agentes políticos relevantes, em razão da necessidade de colaboração e cooperação entre os
poderes, para uma contínua condução da administração, visando aos interesses nacionais e à
governabilidade. Assim, a coalizão, pelo menos em tese, se baseia em levar a cabo barganha
entre os interesses do Poder Executivo e do Poder Legislativo.

Em síntese, é o poder de coalizões partidárias que sustenta o Governo, formando uma


maioria no Congresso Nacional para apoiar a agenda presidencial, mas isto só é possível se o
Poder Executivo realizar seu papel de apaziguador das forças políticas antagônicas. Portanto,
76

para o exercício regular de suas competências previstas na Constituição, o Presidente


necessitará de apoio político no Congresso Nacional para governar, da mesma forma como em
qualquer outra função executiva no Estado Democrático de Direito. Como se constata, o
Presidencialismo de coalizão consiste em uma ambivalência no sistema político centrado na
figura do chefe do Executivo, hoje comprometida, em razão da falta do diálogo mínimo,
incapaz de negociar e persuadir os agentes políticos. Isto é, abandona-se a etapa de
negociação, partindo para uma relação conflituosa e disputa de poder entre o Executivo e
Legislativo.

Neste modelo presidencialista, a coalizão não se limita à atuação concentrado na


figura do presidente da República. Esta pode ser exercida internamente nas casas legislativas,
pelos presidentes da mesa do Senado Federal ou da mesa da Câmara dos Deputados, e ainda
pelas lideranças partidárias. Estes passam a orientar o comportamento de deputados e
senadores segundo uma visão majoritária, retirando-lhes a liberdade individual de escolhas.

De tempos em tempos, os especialistas em Ciência Política retomam os debates sobre


a instabilidade política e a ingovernabilidade no sistema presidencialista brasileiro. A
discussão aufere repercussão com os efeitos do presidencialismo sobre as configurações
partidárias e as alianças para a formação do Governo. A governabilidade estrutura-se e
sustenta-se em suporte nos laços entre os Poder Legislativo e Executivo, com a formação de
uma maioria parlamentar.

Em outra visão, Meneguello (IPEA, 2010, p.129) expressa alguns fatores


característicos do sistema político de coalizão: primeiro uma lógica partidário-parlamentar
com o concurso dos partidos aliados ao Governo em troca de pastas no primeiro escalão e
ministérios; o segundo fator é a existência de grandes partidos na composição do governo, que
nasce durante as campanhas políticas majoritárias com a formação de alianças; terceiro
consiste na composição das equipes políticas com a cooperação e apoio dos governos
estaduais.

Partindo da análise da literatura da Ciência Política, nacional e internacional, no


Brasil, se percebe com clareza uma falência dos ideais e raciocínio pluralista, bem como o
acelerado enfraquecimento dos partidos políticos, cujos ideais institucionais já não
representam um programa, mas meras conveniências, para a preservação do poder político.
Neste sentido, políticos abandonam seus ideais partidários para fazer parte do Governo, na
busca do poder, o que agrava ainda mais a crise se representação e a descrença do Legislativo.
77

Assim, sempre que deputados e senadores são licenciados de seus mandatos para assumir
ministérios e fazer parte do Governo, tem-se a transfiguração do Presidencialismo de coalizão
em um regime de cooptação – o Presidencialismo a qualquer custo.

A solução para a crise de representação e de governabilidade poderá estar na


realização de uma reforma política que seja capaz de reestabecer a credibilidade e a
identificação dos eleitores com seus elegidos, encerrando um ciclo de crise de
representatividade no Estado brasileiro. Outrossim, em sentido jurídico, Mendes e Branco
(2012,p.169-170) ressaltam a necessidade de vinculação do Poder Executivo aos direitos
fundamentais, sob pena de nulidade dos atos praticados com ofensa ao sistema desses direitos,
portanto, a atividade discricionária da Administração Pública não pode ir de encontro aos
limites impostos pelos direitos fundamentais, que necessitam ser utilizados na interpretação e
aplicação pela Administração Pública como cláusulas gerais e conceitos jurídicos
indeterminados.

2.2.2 Poder Legislativo

O Poder Legislativo está disciplinado nos arts. 44 a 75 da Constituição de 1988,


cujas funções e atribuições ultrapassam a concepção clássica de mero elaborador de lei. O
Legislativo tornou-se ao longo de sua história um poder impopular, dado o elevado grau de
desconfiança em seus membros e culmina na crise de representatividade e falta de
identificação dos eleitores com seus representantes eleitos. Desde a Constituição Imperial, o
Estado brasileiro adota a sistemática da bicameralidade, com exceção da Constituição de
1934, que perfilhou o sistema unicameral, passando o Senado a exercer a função de
fiscalização, a que alguns autores atribuem ser o retorno do Poder Moderador, extinto com a
Proclamação da República.

A Constituição de 1988 (art. 44) preconiza o exercício da função legislativa a


senadores e deputados, sendo a Câmara uma casa de representação do povo, enquanto o
Senado representa as unidades federativas, e cada casa possui próprio regimento, normas
infraconstitucionais e órgãos diretivos, bem como ambas as casas elegem suas mesas
diretoras, ou seja, o ordenamento jurídico nacional permite que cada casa legislativa se
organize observando os limites constitucionais.
78

Neste sentido, o art. 51 da Constituição Federal estatui as funções privativas da


Câmara dos Deputados52, além das já apresentadas, a instauração de processo contra o
Presidente, Vice-presidente da República e Ministros de Estado. Igualmente, compete o
julgamento político e a fiscalização das contas do Poder Executivo, caso não apresentada ao
Congresso Nacional no prazo de sessenta dias da abertura da sessão legislativa, bem como
eleger membros do Conselho da República.

Superada a questão da elaboração do Regimento e a formação da Mesa Diretora,


muito embora consideradas funções atípicas do Legislativo, compete privativamente ao
Senado Federal53 processar e julgar os crimes de responsabilidade cometidos pelo Presidente,

52
Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos Deputados: I - autorizar, por dois terços de seus membros, a
instauração de processo contra o Presidente e o Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado; II -
proceder à tomada de contas do Presidente da República, quando não apresentadas ao Congresso Nacional
dentro de sessenta dias após a abertura da sessão legislativa; III - elaborar seu regimento interno; IV – dispor
sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e
funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros
estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias; (Inciso com redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de
1998); V - eleger membros do Conselho da República, nos termos do art. 89, VII.
53
Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da
República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do
Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles; (Inciso com redação dada pela
Emenda Constitucional nº 23, de 1999)II - processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os
membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da
República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade; (Inciso com redação dada pela
Emenda Constitucional nº 45, de 2004)III - aprovar previamente, por voto secreto, após argüição pública, a
escolha de: a) magistrados, nos casos estabelecidos nesta Constituição; b) Ministros do Tribunal de Contas da
União indicados pelo Presidente da República; c) Governador de Território; d) presidente e diretores do Banco
Central; e) Procurador-Geral da República; f) titulares de outros cargos que a lei determinar; IV - aprovar
previamente, por voto secreto, após argüição em sessão secreta, a escolha dos chefes de missão diplomática de
caráter permanente; V - autorizar operações externas de natureza financeira, de interesse da União, dos Estados,
do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios; VI - fixar, por proposta do Presidente da República, limites
globais para o montante da dívida consolidada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; VII
- dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo poder público
federal; VIII - dispor sobre limites e condições para a concessão de garantia da União em operações de crédito
externo e interno; IX - estabelecer limites globais e condições para o montante da dívida mobiliária dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios; X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada
inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal; XI - aprovar, por maioria absoluta e por
voto secreto, a exoneração, de ofício, do Procurador-Geral da República antes do término de seu mandato; XII -
elaborar seu regimento interno; XIII - dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação,
transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da
respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias; (Inciso com
redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)XIV - eleger membros do Conselho da República, nos
termos do art. 89, VII. XV - avaliar periodicamente a funcionalidade do Sistema Tributário Nacional, em sua
estrutura e seus componentes, e o desempenho das administrações tributárias da União, dos Estados e do Distrito
Federal e dos Municípios. (Inciso acrescido pela Emenda Constitucional nº 42, de 2003)Parágrafo único. Nos
casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a
condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com
inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais
cabíveis.
79

Vice Presidente, Ministros de Estado, da mesma forma os membros do Conselho Nacional de


Justiça, do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o
Advogado-Geral da União.

Cabe ressaltar que o julgamento realizado pelo Senado não é jurídico, mas sim
político-administrativo, limitado à perda do cargo, sem prejuízo das sanções judiciais. Ainda
é função atípica do Legislativo, mas privativa do Senado, a aprovação de autoridades
indicadas pelo Presidente da República para o exercício de cargos e funções públicas; da
mesma forma atípica é a autorização do Senado para as operações externas de natureza
financeira, tanto da União como dos municípios.

Dentre as funções típicas do Senado Federal está fixar o limite global da divida de
todos os entes da Federação, mediante proposta do Presidente da República; dispor sobre o
limite para operações de credito interno e externo de todos os entes federados, bem como da
Administração Pública indireta; dispor sobre a concessão de garantia da União em operações
de crédito interno e externo; estabelecer limites e condições para dívidas mobiliárias dos
estados, Distrito Federal e municípios.

A mais evidente e cristalina atividade típica do Senado Federal é a legiferância,


especialmente aquela para suspender a execução de norma declarada inconstitucional pelo
Supremo Tribunal Federal, que poderia ser tida como típica ou não. Há juristas defendendo-a
como função típica, pois estaria o Senado legislando, ainda que negativamente. Outra função
atípica do Senado é proceder à avaliação, periodicamente, do desempenho da administração
tributária dos entre federados via emenda constitucional, como no caso da Emenda
Constitucional nº 37/2002, que fixou as alíquotas mínima e máxima para o imposto sobre a
prestação de serviços de qualquer natureza.

José Afonso da Silva (2002, p.523) entende tratar-se de uma interferência


inconstitucional na autonomia das entidades federativas por via de emenda constitucional. O
autor questiona: avaliar para quê? Não se diz – mas certamente não há de ser apenas para
avaliação em si, mas, no mínimo, para propor soluções a problemas porventura constatados.

Da mesma forma, a Constituição de 1988 estabelece as competências privativas do


Congresso Nacional, que podem ser exercidas em sessões em conjunto ou separadamente.
Assim, além das prerrogativas da Câmara e do Senado Federal, há aquelas que somente
80

podem ser exercidas pelas duas casas legislativas. Tais funções estão previstas no art. 4954 da
Constituição. Em seções separadas, resolver sobre tratados, acordos e atos internacionais de
caráter oneroso para o Estado brasileiro; autorizar o Presidente da República a declarar
guerra, a celebrar a paz, a permitir que forças estrangeiros transitem pelo Território Nacional
ou nele permaneçam temporariamente; autorizar o Presidente e o Vice presidente a se
ausentarem do pais por mais de 15 dias consideradas funções típicas do Poder Legislativo,
pois impõem normas de conduta positiva. Também são havidas como funções típicas positivas
a aprovação pelo Congresso Nacional do estado de defesa e a intervenção federal, autorizar o
estado de sítio ou suspendê-las e negativamente ao sustar os atos do Presidente da República
que exorbitem o poder regulamentar.

São tidas como funções atípicas do Legislativo as atribuições do Congresso Nacional


que disponham sobre a mudança temporária da sede, por se tratar de uma competência
administrativa, pois não guarda qualquer relação com o poder de legislar. Assim também são
atípicas: julgar as contas prestadas pelo Presidente da República, e apreciar os relatórios sobre
a execução dos planos de Governo; fiscalizar os atos da Administração Pública direta e
indireta; zelar pela preservação de sua competência legislativa em face do poder legiferante de
outros poderes; e a escolha dos membros do Tribunal de Contas da União.

54
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados,
acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional; II -
autorizar o Presidente da República a declarar guerra, a celebrar a paz, a permitir que forças estrangeiras
transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente, ressalvados os casos previstos em lei
complementar; III - autorizar o Presidente e o Vice-Presidente da República a se ausentarem do País, quando a
ausência exceder a quinze dias; IV - aprovar o estado de defesa e a intervenção federal, autorizar o estado de
sítio, ou suspender qualquer uma dessas medidas; V - sustar os atos normativos do Poder Executivo que
exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa; VI - mudar temporariamente sua sede;
VII - fixar idêntico subsídio para os Deputados Federais e os Senadores, observado o que dispõem os arts. 37,
XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I; (Inciso com redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de
1998) VIII – fixar os subsídios do Presidente e do Vice-Presidente da República e dos Ministros de Estado,
observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I; (Inciso com redação dada pela
Emenda Constitucional nº 19, de 1998) IX - julgar anualmente as contas prestadas pelo Presidente da República
e apreciar os relatórios sobre a execução dos planos de governo; X - fiscalizar e controlar, diretamente, ou por
qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta; XI - zelar pela
preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes; XII - apreciar os
atos de concessão e renovação de concessão de emissoras de rádio e televisão; XIII - escolher dois terços dos
membros do Tribunal de Contas da União; XIV - aprovar iniciativas do Poder Executivo referentes a atividades
nucleares; XV - autorizar referendo e convocar plebiscito; XVI - autorizar, em terras indígenas, a exploração e o
aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais; XVII - aprovar, previamente, a
alienação ou concessão de terras públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares.
81

Da mesma forma que a Câmara e o Senado, o Congresso Nacional possui Regimento


Comum que disciplina a atuação legislativa dos congressistas nas sessões conjuntas. São
matérias de competência atípica do Poder Legislativo as que dizem respeito à auto-
organização, conforme incs. I, II e III, do § 3º, do art. 57. A competência do Congresso
Nacional em sessão conjunta também engloba funções típicas, como as previstas no inc. IV,
do § 3º, do art. 5755, da Constituição de 1988, que estabelece a apreciação do veto
presidencial a projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional que reflete com precisão o
espírito da separação de poderes, um espelho fiel do sistema de pesos e contrapesos que deve
harmonizar a coexistência entre os Poderes.

Assim, o Congresso Nacional, em decisão final, poderá, em sessão conjunta e por


maioria absoluta de seus membros, derrubar o veto do chefe do Poder Executivo. Cabe aqui
destacar com Pontes de Miranda (1970, p.586) que, na vigência da Constituição de 1967,
durante o regime militar, o veto só poderia ser derrubado por dois terços do Congresso
Nacional.

Há ainda outras situações e normas referentes à função típica legislativa que


demanda sessão conjunta do Congresso Nacional: relativas a votação, discussão e
promulgação de emendas constitucionais, bem como a discussão e votação do Orçamento e a
delegação (via Resolução) de poderes ao Executivo para legislar, por meio de Lei Delegada56,
em contrário à Medida Provisória, pois quem efetivamente legisla é o Poder Legislativo. Em
síntese, quando o chefe do Poder Executivo legisla por meio de lei delegada, o faz não em seu
nome, mas em nome do Poder Legislativo (SILVA, 2002, p.522-524).

55
Art. 57. O Congresso Nacional reunir-se-á, anualmente, na Capital Federal, de 2 de fevereiro a 17 de julho e
de 1º de agosto a 22 de dezembro. (“Caput” com redação dada pela Emenda constitucional nº 50, de 2006)
(...)
§ 3º Além de outros casos previstos nesta Constituição, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal reunir-se-ão
em sessão conjunta para: I - inaugurar a sessão legislativa; II - elaborar o regimento comum e regular a criação
de serviços comuns às duas Casas; III - receber o compromisso do Presidente e do Vice-Presidente da República;
IV - conhecer do veto e sobre ele deliberar.
56
Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao
Congresso Nacional. § 1º Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso
Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei
complementar, nem a legislação sobre: I - organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a
garantia de seus membros; II - nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais; III - planos
plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos. § 2º A delegação ao Presidente da República terá a forma de
resolução do Congresso Nacional, que especificará seu conteúdo e os termos de seu exercício. § 3º Se a
resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional, este a fará em votação única, vedada
qualquer emenda.
82

O Poder Legislativo brasileiro adota o principio partidário para a distribuição de


direitos parlamentares, isto é, os lideres representam suas bancadas, observando o princípio da
proporcionalidade partidária. Assim, o Regimento da Câmara57, por exemplo, ao receber um
requerimento de urgência, poderá submetê-lo a sessão plenária se for apresentado por dois
terços dos membros da Casa, ou um terço dos membros da Casa ou dos lideres de legendas
que representem este número, ou dois terços dos membros da comissão competente para
apreciar o mérito da proposição. Neste contexto, vê-se que os Regimentos da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal adotam a apreciação por acordo de lideranças em questões
circunstanciais autorizadas pela Constituição Federal, assim como as lideranças partidárias é
que decidem pela votação nominal ou simbólica.

Em outras palavras, pode-se dizer que, no sistema político brasileiro, o Presidente da


República tem prerrogativas constitucionais para iniciar, unilateralmente, o processo
legislativo em matérias específicas como em matéria tributária, orçamentária da União,
organização do Estado, sobre efetivos das forças armadas, sobre políticas externas, sendo-lhe
facultado o pedido de urgência na votação de matérias de interesse ou de medidas provisórias.
Assim, a agenda legislativa passa a ser partilhada entre o Legislativo e Executivo. Como
assevera Abranches[...], o Brasil retorna ao conjunto das nações democráticas, sendo o único
caso presidencialista de coalizão (1988; p. 27). Neste sentido, vê-se que o próprio Texto
Constitucional estabelece maior rigor para apresentação de emendas constitucionais ao
Congresso Nacional do que ao Presidente da República.

Por vezes, a coalizão governamental é pressuposto para a governabilidade e, para que


exista de fato, requer que o chefe do Poder Executivo faça concessões aos interesses dos
parlamentares dentro do próprio Parlamento, concessões que configuram acomodações de
correligionários partidários e da base de sustentação na estrutura burocrática e política, para a
obtenção de maior apoio no Congresso Nacional com o propósito de fazer uma maioria de
parlamentares para aprovação de suas propostas.

Assim, parlamentares das mais diversas facções políticas são contemplados com
ministérios, secretarias, presidências de autarquias, fundações, agências reguladoras e outros
cargos importantes dentro do governo e, com isso, cedem às pressões do Executivo passando

57
O art. 154 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados estatui sobre o requerimento de urgência. Ao que
Limongi e Figueiredo advertem para a urgência urgentíssima, que, se aprovada, implica a apreciação imediata da
matéria. Para ser apreciado, o requerimento precisa ser submetido pela maioria dos deputados ou por lideres que
representem este número e requer aprovação em plenário por maioria absoluta (1998, p.98).
83

a barganhar entre seus correligionários no Congresso Nacional apoio para aprovação dos
projetos de iniciativa do Executivo. Portanto o Estado brasileiro não veda a participação de
parlamentares em outro Poder, em especial no primeiro escalão do Poder Executivo, o que é
expressamente vedado no presidencialismo dos Estados Unidos58 “[...] and no Person holding
any Office under the United States, shall be a Member of either House during his
Continuance in Office” (USA, 1787).

Com efeito, o Poder Legislativo perde cada vez mais autonomia legislativa e poder
para a Chefia do Executivo, uma vez que os representantes perdem a capacidade de intervir
nas políticas públicas, pela falta de consenso interno, que dão lugar às concessões, uma
anomalia que agrava ainda mais a crise de representatividade. Isto é, a crescente falta de
identificação dos eleitores com seus congressistas eleitos. Assis (2012, p.35) considera “o
presidencialismo de coalizão59 à brasileira, em verdade, legitima uma relação de subserviência
do Parlamento aos interesses do próprio Executivo”. Vê-se a fragilidade da separação dos
poderes e da própria democracia sob a óptica do processo legislativo brasileiro.

2.2.3 Poder Judiciário

Como anteriormente exposto na seção 2.1, com destaque para o pensamento de


Cícero, sobre a justiça e a existência de um Poder (magistratus) capaz de realizar a igualdade
de tratamento por meio da justiça, torna-se latente a relevância dos magistrados na efetivação
da justiça, ainda, no Império Romano de antes de Cristo.

58
A Constituição norte-americana dispõe na seção 6, do artigo I: Os Senadores e Representantes deverão receber
uma Compensação por seus Serviços, a ser acertada por Lei, e paga pelo Tesouro dos Estados Unidos. Eles
deverão em todos os Casos, exceto Traição, Ilicitude e Brecha da Paz, ser liberados de Prisão durante sua
Presença na Sessão das suas respectivas Câmaras, e ao ir e retornar das mesmas; e por qualquer Discurso ou
Debate em qualquer Câmara, eles não deverão ser questionados em qualquer outro Lugar. Nenhum Senador ou
Representante pode, durante o período para o qual foi eleito, ser nomeado para qualquer cargo público do
Governo dos Estados Unidos que tenha sido criado ou cuja remuneração for aumentada nesse período; e
nenhuma pessoa ocupando cargo no Governo dos Estados Unidos poderá ser membro de qualquer das Câmaras
enquanto permanecer no cargo. (Traduziu-se e grifou-se).
59
“O Brasil é o único país que, além de combinar a proporcionalidade, o multipartidarismo e o ‘presidencialismo
imperial’, organiza o Executivo com base em grandes coalizões. A esse traço peculiar da institucionalidade
concreta brasileira chamarei (...) ‘presidencialismo de coalizão’ (...). É um sistema caracterizado pela
instabilidade, de alto risco e cuja sustentação baseia-se, quase exclusivamente, no desempenho corrente do
governo e na sua disposição de respeitar estritamente os pontos ideológicos ou programáticos considerados
inegociáveis, os quais nem sempre são explícita e coerentemente fixados na fase de formação da coalizão. O
Brasil retorna ao conjunto das nações democráticas, sendo o único caso presidencialista de coalizão”
(Abranches, 1988; p. 22/27).
84

Feita esta oportuna consideração sobre a justiça e o Poder Judiciário, e retomando os


poderes no Estado brasileiro, observa-se que no modelo presidencialista brasileiro a agenda
legislativa fica (durante boa parte da historia do Brasil) comprometida e, é por vezes,
controlada pelo Poder Executivo, aumenta a inoperância parlamentar em sua função típica,
legiferante, deixando de atender às necessidades da sociedade, restando tão somente a tutela
jurisdicional do Estado, pelo Poder Judiciário.

Isto enseja um aparente, mas necessário ativismo judiciário, uma vez que este não
pode se negar ao exame do que lhe é demandado. Em razão da ausência de políticas públicas
(atuação Executiva) que atendam as necessidades básicas e mais essenciais dos cidadãos, e
ante a impossibilidade de o Parlamento intervir nessas políticas públicas, só resta à sociedade
buscar o Poder Judiciário para a satisfação de suas necessidades e interesses mais imediatos.

O constituinte de 1987/1988 estabeleceu a organização e os órgãos do Poder


Judiciário: o Supremo Tribunal Federal (art.103), como corte constitucional, guardiã da
Constituição, responsável para decidir em última instância as questões envolvendo matéria
constitucional; o Superior Tribunal de Justiça (art. 105), cuja competência originária é o
reexame em grau de recurso ordinário e especial; os tribunais regionais federais e os juízes
federais (arts. 108 e 109, respectivamente), os tribunais e juízes do Trabalho (art. 114); os
tribunais e juízes eleitorais (art. 121 e Lei nº 4.737/1967); os tribunais e juízes militares (art.
124); os tribunais e juízes dos estados (art. 125) cujas competências estão estabelecidas nas
constituições estaduais, conforme observado acima da Constituição Federal. Acrescente-se
aos já mencionados o Conselho Nacional de Justiça, criado pela Emenda Constitucional nº
45/2004, a quem compete o controle da atuação administrativa e financeira do Poder
Judiciário e o cumprimento dos deveres funcionais dos juízes conferidas pelo Estatuto da
Magistratura.

Destarte, este avanço na atuação do Poder Judiciário requer um aumento


significativo da responsabilidade política da magistratura, que demanda maior controle das
decisões judiciais, não como limitador da atividade jurisdicional, mas no controle
hermenêutico dessas decisões, compatíveis com a ordem jurídica e a nova hermenêutica
constitucional. Não se pode perder de vista o fato de que, no Estado Democrático de Direito, o
Judiciário assume papel combativo às violações dos preceitos constitucionais, o que é
fundamental para a efetivação do “controle hermenêutico das decisões proferidas de forma
consistente, segundo critérios de integração da jurisprudencial”(STRECK, TASSINARI,
LIMA, 2013, p.752-753).
85

Assim, o excesso de atividade legiferante pelo Poder Executivo, associado à inércia e


omissão do Parlamento, conduz à mitigação desse Poder, aumentando cada vez mais a
descrença da população em relação aos seus representantes eleitos. Este contexto abre espaços
para a autuação legítima do Poder Judiciário, que passa a suprir as demandas e apelos da
sociedade, garantindo-lhes o mínimo existencial e o mínimo social. Significa assegurar e
tutelar a integridade física e psíquica das pessoas, ao que a jurisprudência do STF e STJ
denominou de direito à vida, garantindo um mínimo de dignidade, igualdade, liberdade,
saúde, educação há muito relegadas pelo Poder Público60.

O crescente aumento e a complexidade nas demandas decorre do próprio processo de


transformação e desenvolvimento das atividades humanas, outras vezes resultado da exclusão
social gerada pelo sistema econômico vigente, que tensionam os Poderes do Estado a
assegurar os níveis de dignidade e cidadania que beira a barbaria, buscando reduzir os
conflitos e a desobediência civil.

Vale realçar a lição de Canotilho (2006, p. 481) de que os direitos de liberdades, em


geral, não custam muito dinheiro, ao passo que os direitos sociais pressupõem grandes gastos
financeiros por parte do Estado61. Para o autor, os direitos sociais só existem quando e
enquanto existir dinheiro nos cofres públicos, ao que a doutrina denomina de “reserva do
possível”’62. Reduzir, entretanto, a questão ao “possível” equivale a reduzi-la a critérios de

60
[…] argumenta-se que o Poder Judiciário, o qual estaria vocacionado a concretizar a justiça do caso concreto
(microjustiça), muitas vezes não teria condições de, ao examinar determinada pretensão à prestação de um
direito social, analisar as consequências globais da destinação de recursos públicos em benefício da parte com
invariável prejuízo para o todo.
Por outro lado, defensores da atuação do Poder Judiciário na concretização dos direitos sociais, em especial do
direito à saúde, argumentam que tais direitos são indispensáveis para a realização da dignidade da pessoa
humana. Assim, ao menos o 'mínimo existencial' de cada um dos direitos, exigência lógica do princípio da
dignidade da pessoa humana, não poderia deixar de ser objeto de apreciação judicial. (2012, p. )
61
Quais são, no fundo, os argumentos para reduzir os direitos sociais a uma garantia constitucional platónica?
Em primeiro lugar, os custos dos direitos sociais. Os direitos de liberdade não custam, em geral, muito dinheiro,
podendo ser garantidos a todos os cidadãos sem se sobrecarregarem os cofres públicos. Os direitos sociais, pelo
contrário, pressupõem grandes disponibilidades financeiras por parte do Estado. Por isso, rapidamente se aderiu
à construção dogmática da reserva do possível (Vorbehalt des Möglichen) para traduzir a ideia de que os direitos
sociais só existem quando e enquanto existir dinheiro nos cofres públicos. Um direito social sob 'reserva dos
cofres cheios' equivale, na prática, a nenhuma vinculação jurídica. Para atenuar esta desoladora conclusão
adianta-se, por vezes, que a única vinculação razoável e possível do Estado em sede de direitos sociais se
reconduz à garantia do mínimo social. Segundo alguns autores, porém, esta garantia do mínimo social resulta já
do dever indeclinável dos poderes públicos de garantir a dignidade da pessoa humana e não de qualquer
densificação jurídico-constitucional de direitos sociais. Grifo do original.
62
Reserva do Possível - consiste em critério hermenêutico oriundo de decisão da Corte Constitucional alemã que
afirmou, quanto aos direitos prestacionais, em que se pode exigir a prestação de determinado serviço público,
como educação, saúde e outros, que o atendimento à prestação de tais direitos 'estão sujeitos à reserva do
possível no sentido daquilo que o indivíduo, de forma racional, pode esperar da sociedade' e das respectivas
86

realocações orçamentárias, o que implica desconsiderar direitos e garantias fundamentais em


sua conjuntura estruturante da sociedade(GOMES, 2014, p.34).

Por outro ângulo de visão, há muito se discute o controle político do Poder


Judiciário, todavia, como assevera Streck (2013, p. 754), o Direito necessita de um Poder
Judiciário capaz de exercer suas atividades com autonomia e independência. Isto significa
exercer suas funções institucionais sem qualquer interferência política. Parece óbvio, mas tais
conquistas democráticas são fruto da luta do povo brasileiro, construídas a duras penas,
portanto merecem ser permanentemente propagadas.

No atual contexto político brasileiro, vê-se uma incontestável crise interna nos
poderes do Estado, que passaram a ser, permanentemente, investigados pela Polícia Federal a
pedido do Ministério Público por crimes de corrupção, desvio do Erário, enriquecimento
ilícito, formação de quadrilha, ao que o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal
denominou de “crime no atacado, não mais no varejo"63. Tais questões abalam não somente a
credibilidade no Governo, e nos políticos, mas também a economia nacional, a imagem do
Estado brasileiro para investidores estrangeiros - o chamado risco Brasil64, bem como a
governabilidade do País65.

condições históricas.
63
O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), em entrevista ao Jornal Estado de São Paulo,
datada de 03/08/2015 comentou: o escândalo de corrupção investigado na Lava Jato "envolve o crime no
atacado, não mais no varejo". Na avaliação do ministro, a Lava Jato mostra que o mensalão não pode ser mais
considerado o maior escândalo de corrupção do país. Marco Aurélio participou do julgamento da ação penal 470,
conhecido como o processo do mensalão." Quando eu tomei posse, em 2006, no TSE, eu fiz um discurso que foi
considerado muito ácido. Mas, foi um discurso leve. Eu falei que era o maior escândalo da República
[mensalão]. Hoje, nós temos aí esse, que envolve o crime no atacado, não mais no varejo", disse. Para Marco
Aurélio, as prisões efetuadas durante todas as fases da operação mostram que as instituições que participam da
investigação, como a Polícia Federal, o Ministério Publico e o Poder Judiciário, estão funcionando no país. "A
quadra ao meu ver é alvissareira, porque não se esconde mais essas mazelas. Elas afloram a partir, inclusive, do
que foi veiculado pela imprensa, há descoberta de fatos e, ante esses fatos, se têm os inquéritos e as ações penais.
Vamos buscar novos rumos, melhores dias para o Brasil", declarou o ministro. (transcrição literal da entrevista
realizada pelo Jornalista André Richter, do Jornal Folha de São Paulo, de 03/08/2015).
64
Emerging Markets Bond Index Plus (EMBI+) - expressa utilizada para medir o grau de perigo que um país
representa para o investidor estrangeiro. Tal “risco” é calculado por agências de classificação de risco e bancos
de investimentos internacionais.
65
Apesar de todos os desmandos no Estado, há muito perdulário e repleto de desigualdades, possui instituições
solidas que não sofreram com os sucessivos escândalos envolvendo políticos brasileiros e alguns poucos
empresários que se utilizam de meios ilícitos (corruptores) que levam o Ministro Teori Zavascki, do Supremo
Tribunal Federal, a autorizar o indiciamento de quarenta e sete políticos com foro privilegiado, além dos quase
cem indiciados sem o privilegio, computadas as dezessete fases da operação lava jato.
87

O País coleciona escândalos66 e desmandos no Estado, além de ser, há muitas


décadas, reconhecidamente, um Estado perdulário, com profundas desigualdades, mas que
possui instituições sólidas não afetadas pelos sucessivos escândalos envolvendo políticos e
alguns poucos empresários brasileiros, ao que uma corrente de cientistas políticos
encabeçados por Oliveira Vianna (1987) vê como uma das possíveis causas da corrupção, à
ausência de um sentimento de pertença e de interesse coletivo.

Neste panorama e ante as constantes investidas do Poder Político na tentativa de


controlar os atos normativos do Judiciário, somente fortalecem este poder - notório sua
predominância na atual conjuntura história -, bem como a relevância deste no fortalecimento
da democracia brasileira. Como adverte Streck (2013, p. 751), entretanto, torna-se cada vez
mais necessário atentar para o fato de que “o excessivo apego a essa autonomia pode acabar
repercutindo em uma falta de accountability, transformando o Poder Judiciário em um Poder
acima da lei”, a que torna patente e imperativa a necessidade da independência e harmonia
dos poderes na preservação das instituições fundantes do Estado brasileiro e dos direitos e
garantias fundamentais ínsitos ao constitucionalismo e a Hermenêutica constitucional vigente.

66
Escândalo da Mandioca (1979 e 1981); Escândalo da Proconsult (1982); Caso Chiarelli (1988); Caso Jorgina
de Freitas; Caso Edmundo Pinto (1992); Caso Nilo Coelho; Caso Eliseu Resende; Caso Queiroz Galvão; Caso
Ney Maranhão; CPI do Detran (em Santa Catarina); Dossiê da Pasta Rosa (1995); Escândalo dos Anões do
Orçamento; Caso Rubens Ricupero (também conhecido como "Escândalo da Parabólica"); Escândalo do
Sivam; Escândalo do Banestado; Escândalo da Encol; Escândalo da Mesbla; Dossiê Cayman (ou Escândalo do
Dossiê Cayman ou Escândalo do Dossiê Caribe); CPI do Banestado; Banco Nacional de Minas Gerais; Banco
Noroeste; Banco Econômico; Bancos Marka e Fonte Cindam; Escândalo da SUDAM e da SUDENE; Caso
Luís Estêvão; Caso Toninho do PT; Caso Celso Daniel; Operação Anaconda; Escândalo do Propinoduto;
Escândalo dos Bingos (ou Caso Waldomiro Diniz); Caso Kroll; Escândalo dos Correios (Também conhecido
como Caso Maurício Marinho); Escândalo do IRB; Escândalo do Mensalão; Mensalão mineiro; Escândalo do
Banco Santos; Escândalo dos Fundos de Pensão; Escândalo do Mensalinho; Caso Escândalo da Quebra do Sigilo
Bancário do Caseiro Francenildo); Escândalo das Sanguessugas (Inicialmente conhecida como Operação
Sanguessuga e Escândalo das Ambulâncias); Operação Confraria; Operação Dominó; Operação Saúva;
Escândalo do Dossiê; Escândalo da Renascer em Cristo; Operação Hurricane (também conhecida Operação
Furacão); Operação Navalha; Operação Moeda Verde; Caso Renan Calheiros ou Renangate; Caso Joaquim
Roriz (ou Operação Aquarela); Escândalo dos cartões corporativos; Caso Bancoop; Esquema de desvio de
verbas no BNDES; Máfia das CNH's; Caso Álvaro Lins, no Rio de Janeiro; Operação Satiagraha ou Caso
Daniel Dantas; Escândalo das passagens aéreas; Escândalo dos atos secretos; Caso Gamecorp; Escândalo dos
Correios; CPI das ONGs; Operação Faktor; Caso Erenice Guerra; Operação Tsunami; Esquema do Plano Safra
Legal; Operação Esopo ou Escândalo do Ministério do Trabalho; Caso Siemens (e Caso Alstom); Operação
Maet (Judiciário corrompido no TJ-TO); Caso Ana Cristina Aquino (Escândalo do PDT); Operação Lava Jato;
Operação Zelotes (CARF) (VEJA, 2015).
88

3 ANTECEDENTES HISTÓRICOS E ASPECTOS GERAIS DO


ORÇAMENTO

Os capítulos anteriores trataram da contextualização e da problematização, da


temática, cujo intuito foi deslindar com clareza os aspectos históricos, filosóficos, jurídicos e
políticos do Estado, bem como da relação entre seus poderes e como atuam de modo relevante
nas finanças públicas, e, em especial, nas questões orçamentárias. Contemporaneamente, o
orçamento era considerado peça financeira, de viés autorizativo e contábil, mas, conforme
ressaltado anteriormente, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a sua judicialização e seus
efeitos nas relações políticas e sociais.

Neste capítulo, tenciona-se a transversalidade do Direito Financeiro, sua autonomia


científica e doutrinária, bem como os liames entre a democracia e o orçamento público, com
tendência crescente de efetivação das finalidades sociais. Para tanto, este segmento examina a
historiografia do orçamento público, com origem nas experiências inglesa, francesa,
estadunidense e brasileira, com origem nos modelos adotados no País até a Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988, o orçamento e suas peculiaridades, até a edição da
Emenda Constitucional nº 86, de 17 de março de 2015, cujo texto tramitou por 15 anos no
Congresso Nacional.

Antes mesmo de tratar da questão orçamentária propriamente dita, torna-se


imperativo compreender a dinâmica do Direito Financeiro, como conjunto de normas
infraconstitucionais que regulam a atividade financeira do Estado, disciplinando os
mecanismos pelos quais o Poder Público capta recursos, ou aufere receitas para a satisfação
das necessidades públicas e para cumprir os fins do Estado67. É evidente que o Direito
Financeiro não é, por si, suficiente para existir, portanto, umbilicalmente é vinculado aos
demais ramos do Direito, como assevera Torres (2009).

67
Os fins do Estado vão desde as necessidades públicas básicas inseridas na ordem jurídico-constitucional,
mediante a prestação de serviços públicos, a intervenção no domínio econômico, o exercício regulador do poder
de polícia e o fomento às atividades de interesse público/social (BALEEIRO, 2010, p. 3-8).
89

Outrossim, em seu aspecto central, o Direito Financeiro está vinculado ao Direito


Constitucional, de onde provém toda sua estrutura, e indispensável à compreensão da matéria
orçamentária. Em sua abrangência68, o Direito Financeiro engloba a normatização de receitas,
despesas e orçamento público, o controle realizado pelos tribunais de contas, a dívida pública
e a responsabilidade fiscal. Isto se traduz na gestão dos recursos públicos e a responsabilidade
na realização desta gestão, bem como o seu endividamento, como é o caso da Lei nº
4.329/1964, recepcionada com o status de Lei complementar pela Constituição de 1988,
assim como a Lei de Responsabilidade Fiscal.

O núcleo central do Direito Financeiro consiste na transferência de parcelas do


patrimônio dos particulares/sociedade em favor do Estado, com a máxima transparência na
sua aplicação pelo Poder Público. Assim o Estado considera ingressos públicos tudo o que
arrecadada; entretanto a doutrina adota uma classificação das principais fontes de receitas
públicas: ordinárias e extraordinárias; fiscais e extrafiscais; ordinárias e derivadas;
orçamentárias ou não orçamentárias; efetivas e não efetivas. Como visto, todavia, o objetivo
do Direito Financeiro não se resume às receitas, mas a toda atividade financeira estatal, cujo
encadeamento jurídico se inicia com as normas gerais (art. 24, I) e normas concretas (art. 48,
II) da Constituição de 1988.

Nesta correlação entre legalidade e atividade financeira, busca-se conhecer as fontes


formais do Direito Financeiro, iniciando pelo capítulo das finanças públicas (art. 163 a 169)
da Constituição Federal. Na ordem infraconstitucional, tem-se a Lei de Responsabilidade
Fiscal - Lei Complementar nº 101/2000; Lei Geral do Orçamento e Finanças Pública - Lei nº
4.329/1964; os tratados internacionais (MERCOSUL de estabilidade tarifária); as resoluções
do Senado Federal; as leis delegadas, ressalvados os casos previstos no art. 68, § 1º, III, da
CF/88, que em conjunto legitimam a atividade financeira estatal.

Outrossim, os aspectos econômicos, políticos e sociais cotejados pelo Direito


Financeiro se manifestam materialmente pelo orçamento público, compreendido
genericamente como a intervenção na economia. O Estado se utiliza do orçamento como meio
para realização daquelas necessidades, e exprime as seguintes funções clássicas: primeiro,

68
O Direito Financeiro, em nossa percepção, pode ser definido como o ramo didaticamente autônomo do
Direito, formado pelo conjunto harmônico das proposições jurídico-normativas que disciplinam as relações
jurídicas decorrentes do desempenho da atividade financeira do Estado, exceto o que se refira à obtenção de
receitas que correspondam ao conceito de tributos. Tal definição destaca que a autonomia do Direito Financeiro,
como de qualquer outro ramo do Direito, é exclusivamente didática, pois, embora destacado para efeito de
estudo, relaciona-se com os demais ramos jurídicos (RAMOS FILHO, 2012, p. 66) (Grifo original).
90

com a alocação de recursos (receitas, despesas, gastos e desembolsos) a Administração


Pública organiza suas políticas de governo, dividindo a arrecadação entre as diversas rubricas,
como educação, saúde, segurança etc.

Assim, com a distribuição de recursos, o Governo busca a realização de uma justiça


fiscal (em tese) arrecadando dos mais abastados, ao mesmo tempo em que transfere e aloca
estes recursos para os mais necessitados; por derradeiro, existe a estabilização do mercado
pelo Governo, que por meio da adoção de medidas intervencionistas controla as políticas
monetárias, de câmbio, fiscais e de preços (GIACOMONI, 2012, p. 23-27).

Cabe aqui ressaltar o fato de que da função alocativa das rubricas, do orçamento
público, depreendem-se três tipos de planejamento: primeiro, é o modelo socialista que
estabelece um plano de reforma objetivando o interesse coletivo e o máximo bem-estar em
detrimento dos interesses individuais; segundo, é o modelo intervencionista cepalino69
adotado pelo Consenso de Washington dos anos de 1970 e 1980 para a promoção do
desenvolvimento socioeconômico dos países periféricos; terceiro, é o modelo indicativo
capitalista, que visa à eficácia econômica com a redução das incertezas em lugar do
intervencionismo econômico. O Brasil adotou um sistema misto de modelagem orçamentária
com a integração indicativo-cepalina70, que buscou conciliar a eficácia do modelo indicativo e
o intervencionismo no desenvolvimento socioeconômico (BRESSER-PEREIRA, 2009, 261-
280).

Ainda no âmbito das considerações gerais sobre o orçamento público, este pode ser
compreendido sob três perspectivas: a dimensão jurídica que consiste no caráter e força de lei,
decorrente do processo legislativo para sua realização Outrossim, tal perspectiva ganhou
maior amplitude após o julgamento no STF da ADI nº 4.048, em 17/04/2008, que admite o
controle de constitucionalidade em matéria de lei orçamentária; a dimensão política – por seus
antecedentes históricos o orçamento era considerado, apenas, como um mecanismo de
controle político do Poder Executivo pelo Parlamento.

69
Cepalino - modelo estruturante de intervencionismo para o desenvolvimento dos países periféricos da América
latina e Caribe, cuja origem é a sigla CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, criado em
1948 vinculado à ONU Organização das Nações Unidas (BRESSER-PEREIRA, 2009, p. 291)
70
Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei,
as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo
para o setor privado. § 1º A lei estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacional
equilibrado, o qual incorporará e compatibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento, da
Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988).
91

Hoje, o orçamento é tido como um programa de Governo, democraticamente


submetido à previa apreciação pelo Poder Legislativo, dentre outros motivos, em virtude da
pluralidade de agentes e segmentos sociais com interesses conflitantes, na realização daquelas
políticas; a dimensão econômica do orçamento, por sua vez, consiste no instrumento pelo qual
se extraem recursos da sociedade para utilizá-los nos diversos setores da economia, por meio
de fomentos e políticas públicas, objetivando o desenvolvimento humano, econômico e do
mercado, como destaca Farias “[...] no âmbito do Estado neoliberal é a economia que
efetivamente calibra, baliza e pauta tanto a agenda quanto as decisões políticas e
jurídicas”(2004, p. 177-179).

A questão orçamentária é corriqueiramente confundida com questões meramente


técnicas, formais, de conteúdo contábil-legal, não sendo, contudo, associada a uma das
instituições democráticas das mais relevantes no Estado.

O Ente estatal torna-se responsável pela ordenação de suas políticas públicas, bem como
do processo econômico, capaz de delimitar tais políticas - muitas das vezes promessas de
palanques que se tornam realidade - e que necessitam de certos direcionamentos, e o
orçamento é este instrumento de direcionamento da política (LDO) delimitação e dotação
(LOA) e de planejamento (PPA).

3.1 Historiografia do orçamento público

Cabe aqui ressaltar um aspecto de enorme valia para a compreensão do processo de


desenvolvimento do orçamento ao longo da história.. Diz respeito à tributação, como fonte de
captação de recursos para o Governo, isto é, em cada etapa do desenvolvimento humano,
havia sempre uma autoridade dominante perdulária, cobrando excessivos tributos da
sociedade, o que estimulou a participação social na criação de tributos pelo Governo. Um
exemplo remoto foi na Península Ibérica, do século XI ao XII, com o surgimento de um
movimento para que os impostos fossem solenemente reconhecidos, votados e aprovados
pelos delegados dos contribuintes.

Tais medidas iam de encontro ao absolutismo monárquico, mas que atribuíram ao


imposto o caráter de prestação pública, nos casos de necessidade extrema do reino –
geralmente em casos de guerra, como ressalta Baleeiro (2010, p.524). Frise-se que “no ano de
1091, o Rei Afonso VI da Espanha assinou o primeiro documento relacionado às finanças
92

publicas, cujo teor notificava a cobrança de um tributo extraordinário e fazia alusão à


necessidade de consentimento daqueles que iriam pagá-lo” (ASSIS, 2012, p. 182).

3.1.1 A experiência inglesa

Outra referência, no entanto, reporta aos limites para a arrecadação tributária e para
os respectivos gastos públicos Estes remontam à Magna Carta inglesa de João sem Terra, de
1215, a qual trazia em seu art. 12 a máxima: “nenhum tributo ou auxilio será instituído no
Reino, senão pelo seu consenso comum, [...]”. O artigo atribuiu competência ao Parlamento
para a realização de um controle representativo, que desencadeou reações por parte do
monarca inglês estimulado pelo absolutismo.

Assim considerado por muitos tratadistas como uma espécie de embrião do


orçamento público, como enfatizado por Giacomoni (2012, p.31-32), a monarquia inglesa
recebe outro golpe, quando o Parlamento fez publicar a Petition of Rights, de 1626, em razão
do descumprimento do art. 12, da Carta Magna de João sem Terra, pelo rei Carlos I.

A Petition of Rights continha restrições à tributação sem o consenso do Parlamento e


estabelecia limites ao rei. Em retaliação, o rei dissolveu o Parlamento e governou sozinho por
11 anos, e, em 1649, Carlos I foi decapitado e instaurada a República inglesa, que vigorou até
1653. Nos anos seguintes, intensificam-se os conflitos entre católicos e protestantes, e, em
1660, o Parlamento convida Carlos II para restaurar a Monarquia inglesa. A restauração
significou uma nova mobilização e, em 1688, ocorreu a deposição de James II, com a
Revolução Gloriosa.

Neste contexto, Bercovici (2008, p. 106-107) esclarece que a convenção convocada


em 1689 declarou vago o trono inglês. Antes de preenchê-lo, entretanto, “[...] os comuns
buscaram estabelecer uma garantia contra futuros abusos e elaboraram [...]” e aprovaram a
Bill of Rights, que amplia a abrangência do art. 12 da Magna Carta de 1215 e estabelece a
separação entre as finanças do reino (Estado) e as finanças da coroa inglesa. Esta separação
representou um avanço significativo na organização das finanças públicas inglesas, tendo sido
proclamado rei, pela convocação, William de Orange, que assinou a Bill of Rights,
fortalecendo o Parlamento, estabelecendo a separação dos poderes e o sistema de freios e
contrapesos (checks and balances).
93

Em 1802 foi criado o fundo consolidado que possibilitou a contabilidade dos


recursos públicos, com publicação anual detalhando as finanças, mas foi em 1822 que foi
estabelecida obrigatoriedade de uma exposição, pelo chanceler do Erário, que fixava as
receitas e as despesas de cada exercício perante o Parlamento. Este ainda não poderia,
entretanto, ser considerado orçamento formal, que somente durante o século XIX se
aperfeiçoou ao ponto de ser considerado referencial em matéria de finanças públicas. Segundo
Giacomoni (2012, p.33), o orçamento inglês se tornou importante em dois aspectos: “por
delinear a natureza técnica e jurídica desse instrumento e, segundo, por difundir a instituição
orçamentária para outros países”.

3.1.2 A experiência francesa

Na Europa continental, a criação do orçamento remonta à Revolução de 1789, na


França, e a adoção da necessidade de consentimento popular para instituir e cobrar impostos
Assim sendo, o sistema legal-orçamentário francês se instrumentalizou com base em
princípios até hoje aceitos como: o “princípio da anualidade” do orçamento; da votação e
aprovação antes do inicio de cada exercício, ou a sua precedência; de que o orçamento deve
colocar todas as receitas e despesas, ou o “princípio da universalidade”; a não vinculação da
receita de impostos a despesas específicas, ou o “princípio da não afetação da receita de
impostos”.

No período napoleônico, nem o aparato principiológico, tampouco o controle


legislativo na criação de impostos, foram respeitados. Somente com a “Restauração”, a
Assembleia passou a atuar em questões orçamentárias. Neste processo de desenvolvimento,
em 1815, a França decreta a lei financeira anual sem, contudo, estabelecer qualquer controle
das dotações, e somente, em 1831, o Parlamento passou a exercer o controle mais complexo
sobre o orçamento anual. Cabe ressaltar que, neste período, Montesquieu, Rousseau, David
Hume, dentre, outros consideravam sempre fundamental o direito de o Estado disciplinar os
ingressos e gastos públicos, submetendo-os ao controle representativo (LIMA, 2002, p.47).

3.1.3 A experiência estadunidense

Nas Américas, durante o período colonial, as metrópoles europeias legislavam para si


e para as colônias, criando mais impostos, ensejando mais insatisfação nos colonos até que se
94

iniciaram os movimentos de independência, rompendo com jugo e dominação. A maturidade


política justificou a formação dos Estados Nacionais, mesmo na Europa, resultado da luta
contra o absolutismo e busca pela implantação de um ideal de liberdade – próprio do
pensamento liberalista dos séculos XVII e XVIII.

No Novo Mundo, as colônias inglesas se insurgiram contra a cobrança dos crescentes


impostos instituídos pela Coroa, até sua independência. O segundo congresso continental
levou a conhecimento de todos a Declaração de Independência Americana, proclamando o
direito de autodeterminação e a criação de uma união cooperativa entre as 13 colônias: as
colônias do norte ou Nova Inglaterra71, as colônias centrais72 e as colônias do sul73
(BALEEIRO, 2010, p. 525-527)

Em 1802, no mesmo ano em que o Parlamento inglês criou o fundo consolidado, a


Câmara dos Representantes estadunidense instituiu uma comissão interna permanente
denominada “Comissão de Meios e Recursos”, que exercia uma função de planejamento e
consolidação dos programas setoriais, o que possibilitava uma visão das finanças do Estado.

Em 1865, o Poder Executivo passou a submeter as necessidades públicas do ano


seguinte ao Congresso, como um precursor do orçamento público anual nos Estados Unidos
da América. Vinte anos mais tarde, em 1885, aquela comissão fora substituída por oito
comissões na Câmara dos Representantes e oito no Senado ianque, que passaram a emitir
pareceres sobre as autorizações de gastos, elevando o acompanhamento das contas do
Governo.

Em razão da quantidade de interesses divergentes entre o Executivo e as 16


comissões existentes no Congresso Nacional dos EUA, teve inicio uma fase de
desorganização nas finanças públicas, com a crescente aplicação dos superávits de forma
irresponsável e sem qualquer controle, nem do Governo, nem do Congresso. Somente em
1910, o Presidente da República criou a “Comissão de Economia e Eficiência” para realizar
estudo sobre o funcionamento da administração federal, objetivando sua modernização.

71
As colônias do norte ou Nova Inglaterra - Província de New Hampishire, Província da Baía de Massachusetts,
Colônia de Rhode Island, Colônia de Connecticut.
72
As colônias centrais - Província de Nova Iorque, Província de Nova Jérsei, Província de Pensilvânia, Colônias
de Delaware.
73
As colônias do sul - Província de Maryland, Colônia de Domínio da Virgínia, Província da Carolina do Norte,
Província da Carolina do Sul, Província da Geórgia
95

Dois anos mais tarde, o Presidente encaminhou para o Congresso um relatório (a que
ele denominou de um plano e um programa administrativo de trabalho claramente expresso)
que se aproximava a um orçamento. O maior avanço, contudo, ocorreu após a publicação da
Budget and Accounting Act (Lei do Orçamento e Contabilidade), de 1921, que implantou a
Contabilidade Pública e o Orçamento Anual nos Estados Unidos da America, fonte de
inspiração para os demais países da América Latina.

Nos anos de 1950, após a publicação da Lei de Processo Orçamentário e da


Contabilidade, houve aproximação ainda maior entre planejamento e orçamento. Esta técnica
ficou conhecida pelo rótulo PPBS - Planning, Programming and Budgeting System (Sistema
de Planejamento, Programação e Orçamento) complementada com a GPRA - Government
Performance and Results Act (Lei de Desempenho e Resultados do Governo), de 1993, a qual
estabelecia os requisitos para a elaboração do orçamento público dos Estados Unidos, que
passou a ser utilizado pelos governos estaduais (GIACOMONI, 2012, p. 35-40). Este modelo
orçamentário, também, foi amplamente difundido e copiado pelas três Américas.

3.1.4 A experiência brasileira

Os conflitos ocorridos no Brasil durante o período colonial, destacando os


movimentos emancipacionistas74 e os movimentos nativistas75 expressaram, em grande parte,
o descontentamento em razão da cobrança de tributos provenientes da Coroa portuguesa, em
especial a “derrama”76, cuja meta ensejou revolta nas colônias produtoras de ouro, mas as
finanças públicas começaram a ser organizadas com a chegada da família real ao Rio de
Janeiro, pois com a abertura dos portos houve necessidade de ampliar e disciplinar a cobrança
dos tributos aduaneiros. Assim, em 1808, foram criados o Erário (o equivalente ao Tesouro
Nacional instituído na Constituição Imperial) e o regime de contabilidade.

74
Os movimentos emancipacionistas - Inconfidência Mineira em 1789, Conjuração Carioca em 1794,
Conjuração Baiana em 1798, Conspiração dos Suaçunas em 1801 e Revolução Pernambucana em 1817.
75
Os movimentos nativistas - Aclamação de Amador Bueno em 1641, Revolta da Cachaça de 1660-1661,
Conjuração de "Nosso Pai" em 1666, Revolta de Beckman em 1684, Guerra dos Emboabas de 1708-1709,
Revolta do Sal de 1710, Guerra dos Mascates de 1710-1711, Motins do Maneta em 1711 e Revolta de Filipe dos
Santos em 1720.
76
Durante o ciclo do ouro no Brasil, a Coroa portuguesa cobrava o Quinto, que era um tributo, com a retenção
de 20% do ouro levado às Casas de Fundição, que pertenciam Coroa, e a Derrama, foi um novo tributo instituído
pelo Rei de Portugal para atingir as metas estabelecidas para o Brasil.
96

Destarte, para compreender o orçamento público no Brasil torna-se vital a conhecer a


formação do pensamento político e social, bem como a constituição das instituições
brasileiras que revelam muito sobre a sociedade, suas tensões internas, a administração
pública e seus governantes. A primeira referência em matéria de orçamento irrompe com a
Constituição do Império, (1824), que estabeleceu no art. 17277 a atribuição do Ministro de
Estado da Fazenda, que deveria apresentar anualmente, na Câmara dos Deputados, o
orçamento na forma de um balanço geral da receita e despesa do Tesouro Nacional do ano
anterior, e, igualmente, o orçamento geral de todas as despesas do ano seguinte
(CARVALHO, 1999, p. 204-247).

Ademais, a Carta outorgada em 1824 distribuiu competências aos poderes do


império, tanto em matéria de arrecadação tributária quanto orçamentária, delegando ao Poder
Executivo a competência para a elaboração de propostas orçamentárias, à Assembleia Geral78
para votação e aprovação de lei orçamentária, e à Câmara dos Deputados79 a iniciativa
privativa sobre impostos.

Cabe destacar o fato de que, historicamente, a primeira norma infraconstitucional em


matéria orçamentária foi a Lei de 14/12/1827 que não chegou a produzir efeitos, em razão das
dificuldades na sua implementação – a que Baleeiro (2010, p.40) faz referência tais como: as
dificuldades de comunicação entre as províncias e o conflito com normas produzidas pela
Coroa portuguesa, que foram os principais fatores de frustração da primeira lei Orçamentária
no País. Portanto, a primeira norma orçamentária, com aplicação e eficácia no País, foi o
decreto legislativo de 15/12/1830 que orçou receitas e fixou despesas das antigas províncias
para vigorar no exercício de 1º/07/1831 a 30/06/1832.

Na sessão na Câmara dos Deputados, em 1833, Pereira de Vasconcelos já discursava


sobre o exame da conduta da Administração Pública durante o Império. E, em 1834, quando
das discussões sobre o Ato Adicional à Constituição de 1824, buscou-se a difícil tarefa de

77
Art. 172. O Ministro de Estado da Fazenda, havendo recebido dos outros Ministros os orçamentos relativos ás
despezas das suas Repartições, apresentará na Camara dos Deputados annualmente, logo que esta estiver
reunida, um Balanço geral da receita e despeza do Thesouro Nacional do anno antecedente, e igualmente o
orçamento geral de todas as despezas publicas do anno futuro, e da importancia de todas as contribuições, e
rendas publicas. Grifo nosso.
78
Art. 37. Tambem principiarão na Câmara dos Deputados. I. O Exame da administração passada, e reforma dos
abusos nella introduzidos. A discussão das propostas, feitas polo Poder Executivo. [...]
79
Art. 36. É privativa da Câmara dos Deputados a Iniciativa. I. Sobre Impostos. [...]
97

obter dos membros da administração imperial uma prestação de contas de atos e recursos do
Império (CARVALHO, 1999, p. 204-247).

Em 1826, José Ignácio Borges e o Visconde de Barbacena encaminharam à Câmara


dos Deputados um projeto de criação de um órgão de controle das contas públicas, baseado no
sistema francês - onde a fiscalização se limitava a impedir que despesas fossem ordenadas ou
pagas, além daquelas efetivamente previstas no orçamento. O mesmo ocorreu, em 1838, com
o projeto de autoria do Marquês de Abrantes (BARBOSA, 1949).

Na Câmara dos Deputados, Pereira de Vasconcelos já discursava, na sessão em 1833,


sobre o exame da conduta da Administração Pública durante o Império, e em 1834, na mesma
casa, por ocasião das discussões sobre o Ato Adicional à Constituição de 1824 (que criou as
assembleias legislativas provinciais em substituição ás comissões gerais provinciais e ampliou
seus poderes) a difícil tarefa de obter dos membros da administração imperial uma prestação
de contas de atos e recursos do Império (CARVALHO, 1999, p. 204-247).

Com a publicação do Ato Adicional, instituiu-se a Regência Uma. Foi delegada


maior autonomia às províncias, alterando a Constituição de 1824, com a Lei nº 16, de 12 de
agosto de 1834, a qual emendou a Constituição Imperial, regulamentando o funcionamento
das assembleias legislativas provinciais, estabelecendo, dentre outras regras, suas
competências.

Em 1837, Pereira de Vasconcelos examinando o orçamento do Ministério da Justiça,


considerou os princípios do então Ministro como “errôneos, antifinanceiros e
anticonstituicionais”. O Deputado trata do orçamento da justiça alegando que o “[...] nobre
ministro apelou para as contas que o governo tem dado, mas tais contas só serviram para que
o corpo legislativo averiguasse se os recursos haviam sido aplicados conforme decretada, e
não para verificação sua necessidade, adequação e si tais despesas eram úteis ao país”
(CARVALHO, 1999, p. 228). Pereira de Vasconcelos, todavia, não era o único a debater na
Câmara e no Senado a questão das finanças públicas e do orçamento.

Em 1845, o Ministro do Império, Manuel Alves Branco, encaminhou o projeto (que


Rui Barbosa considerou como sendo arrojado) de criação de um Tribunal de Contas que
terminou engavetado, e 12 anos depois, em 1857, Pimenta Bueno defendeu a necessidade de
criação desta corte, assim entendido “um gabinete que participasse e dispusesse de
mecanismos para verificação das contas públicas no Império”.
98

Em 1861, José de Alencar, tratando do modelo de prestação de contas praticado pela


Comissão de Contas da Câmara dos Deputados, para quem estaria ultrapassado e em desuso,
portanto, estava convencido da necessidade de um instrumento mais eficaz consoante
afirmara na tribuna do Parlamento a relevância da criação de um Tribunal de Contas “[...]
composto de membros vitalícios bem remunerados, incompatíveis com quaisquer cargos de
nomeação do Poder Executivo, responsável perante o Supremo Tribunal de Justiça, quando
esta Câmara decrete a sua acusação, é um complemento necessário ao Governo Parlamentar”
(BARBOSA, 2001, p. 140). Silveira Martins, em seu relatório à frente do Ministério da
Fazenda, de 1878, perfilha o mesmo pensamento, assim como o Visconde de Ouro Preto, em
1879, e o ministro João Alfredo em 1889 (BARBOSA, 2001, p. 59)

O marco decisivo foi a contribuição de Ruy Barbosa na criação do Tribunal de


Contas, assim como membro participante da redação da Constituição de 1891. Dotado de
vasta cultura – com proficiência em cinco idiomas estrangeiros -, conhecedor dos fatos do seu
tempo, bem como a vasta experiência com a coisa pública Ruy Barbosa empreendeu uma
pesquisa na legislação orçamentária de pelo menos 14 Estados Nacionais, que correspondiam
à quase totalidade dos sistemas de governo estabelecidos do final do século XIX (CONPEDI
UFSC, 2014, p.343-359).

Barbosa apresentou o resultado de sua pesquisa na Exposição de Motivos ao Decreto


nº 966-A, datada de 15 de janeiro de 1891, ocasião em que destacou “não menos de quatorze
Constituições, onde se consigna o princípio do Tribunal de Contas”, apontou dois tipos
capitais distintos: o modelo francês e o modelo Italiano. No texto, Barbosa (1949, p. 368)
destaca os países que adotaram o modelo francês de Tribunal de Contas: “além da França, [...]
a Suécia, a Espanha, a Grécia, a Sérvia, a Romênia e a Turquia”, e os que adotaram o modelo
italiano, “além da Itália, domina a Holanda, a Bélgica, Portugal (...), o Chile (...), e o Japão”.
No primeiro “o sistema de fiscalização se limita a impedir que as despesas sejam ordenadas,
ou pagas, além das faculdades do orçamento”, enquanto no segundo “a ação dessa
magistratura vai muito mais longe: antecipa-se ao abuso, atalhando em sua origem os atos do
poder executivo, suscetíveis de gerar despesas ilegais”(BARBOSA, 1949, p. 369).

Para Barbosa, somente, o segundo modelo satisfaria cabalmente os fins da


instituição, visto que não se limitava a julgar a administração, denunciava os excessos,
colheria e apontaria as exorbitâncias ou as prevaricações, a fim de punir os responsáveis.
Além do mais, estaria circunscrita a estes limites a função de tutelar os recursos públicos,
verificando sua utilidade ou inutilidade e possíveis omissões.
99

Após extensas reflexões sobre o melhor modelo de Tribunal de Contas para o Estado
brasileiro, Barbosa (1949, p. 387) encerra sua Exposição de Motivos com um exemplo de
moralidade administrativa e de nacionalismo80. Todos estes dados colhidos por Barbosa são
elementos imprescindíveis e de inestimável valor para a consecução de um tipo ideal de
Tribunal de Contas para o Brasil. E conclui: “Faço votos, para que os executores deste
pensamento se mostrem dignos desta missão salvadora”.

Com a Proclamação da República, em 1889, impõe-se a necessidade de,


constitucionalmente, estabelecer no País a Forma de Estado, de Governo, o Sistema de
Governo e o Regime Político para o Estado brasileiro, e, em dezembro do mesmo ano, o
Governo Provisório nomeou uma comissão81 para elaborar um projeto de Constituição
inspirado nas constituições dos Estados Unidos e da Argentina, confiadas a Rui Barbosa a
revisão e a redação final do projeto de Constituição de iniciativa no Governo Provisório
(BARBOSA, 1946).

Em 15 de setembro de 1890, realizaram-se as eleições por todo o País para eleger o


Congresso Constituinte, que se reuniu em 15 de novembro do mesmo ano, votada e aprovada
em 24 de fevereiro de 1891. Inspirada no modelo liberal dos Estados Unidos da América, a
Constituição adotou a república federativa, presidencialista, representativa, por meio do voto
direto; uma federação formada por estados, dotados de grande autonomia, com a separação
dos poderes em Executivo (presidente eleito diretamente), Legislativo (bicameral) e Judiciário
(a cargo do Supremo Tribunal Federal), com a separação oficial entre o Estado e a Igreja
(COTIAS E SILVA, 1999).

Assim, o Tribunal de Contas foi constitucionalmente instituído pelo artigo 89 da


Constituição Federal Republicana, que estabelecia um Tribunal de Contas para liquidar as
contas de receita e despesa, verificar a sua legalidade, antes de serem prestadas ao Congresso,
e cujos membros seriam nomeados pelo Presidente da República com aprovação do Senado,

80
Entre nós há, na atual organização do Thesouro, elementos, que se poderão e deverão destacar para o serviço
da nova instituição, reduzindo assim o desembolso, a que ela nos obrigará. Qualquer que o dispêndio seja,
porém, há de representar sempre uma economia enorme, incomensurável para o contribuinte; contanto que a
escolha do pessoal inaugurador não sofra a invasão do nepotismo; que ela fique absolutamente entregue à
responsabilidade de um ministro consciencioso, inflexível, imbuído no sentimento da importância desta criação;
que aos seus primeiros passos presida a direção de chefes escolhidos com a maior severidade, capazes de impor-
se ao país pelo valor nacional dos seus nomes e de fundar a primeira tradição do Tribunal sobre arestos de
inexpugnável solidez. (BARBOSA, 1949, p. 386).
81
Integrantes da comissão - Joaquim Saldanha Marinho, signatário do Manifesto Republicano de 1870, que foi
escolhido presidente da Comissão; os republicanos Américo Brasiliense, Francisco Rangel Pestana e os juristas
Antônio Luís dos Santos Werneck e José Antônio Pedreira de Magalhães Castro.
100

que somente perderiam os seus lugares por sentença (BRASIL, 1891). O Tribunal de Contas,
porém, foi regulamentado no ano seguinte pelo Decreto nº 1.166, de 17 de dezembro de 1892.

Da mesma forma, o orçamento público foi consagrado no art. 3482, da Constituição


republicana de 1891, representando um avanço na distribuição da competência em matéria
orçamentária, por delegação privativa do Congresso Nacional de orçar, fixar, anualmente, as
receitas e despesas, assim como tomar as contas relativas a cada exercício apresentadas pelo
Executivo. A Câmara dos Deputados assumiu a dianteira naquelas delegações ao Congresso.

A iniciativa do orçamento permaneceu inalterada. O Ministério da Fazenda orientava


a Comissão Parlamentar de Finanças na elaboração da lei/orçamento e nas antigas províncias
que passaram à condição de Estados federados regidos por constituições próprias que
dispunham sobre suas contas autonomamente. Esta característica federalista republicana da
virada do século XIX para o século XX inovou com a mesma autonomia conquistada pelos
Estados, então estendida aos municípios.

Outrossim, acompanhando o desenvolvimento da questão orçamentária em 1922,


oito meses depois de ter sido instituída a Budget and Accounting Act, pelos Estados Unidos da
América, o Congresso Nacional brasileiro aprovou o Decreto nº 4.536, de 28/01/1922,
regulamentado pelo Decreto nº 15.783, de 08/11/1922, que juntos compunham o Código de
Contabilidade da União. Dentre os avanços, se destacam: primeiro, a proposta do Executivo -
de forma centralizada e harmônica - para o Legislativo deveria ser encaminhada na forma de
Projeto de Lei; segundo, a fixação da data (31 de maio de cada ano) para o Poder Executivo
elaborar a proposta orçamentária (receitas e despesas) a fim de servir como base para a
elaboração da Lei Orçamentária do ano seguinte.

Neste cotejo, a Emenda Constitucional nº 3, de 26/09/1926, introduziu na


Constituição alguns termos adotados pelo Código de Contabilidade da União, aperfeiçoando a
redação constitucional, incluindo o princípio da anualidade e a exceção pela prorrogação do
orçamento do exercício anterior caso o novo não esteja em vigor até 15 de janeiro. Outras
inclusões da EC nº 3/1926: as leis de orçamento não podem conter disposições estranhas à
previsão da receita e à despesa fixada para os serviços anteriormente criados. Não se incluíam

82
Art.34 - Compete privativamente ao Congresso Nacional: §1º - orçar, annualmente, a Receita e fixar,
annualmente, a Despeza e tomar as contas de ambas, relativas a cada exercício financeiro, prorogado o
orçamento anterior, quando até 15 de janeiro não estiver o novo em vigor;(Incluído pela Emenda Constitucional
de 3 de setembro de 1926) [...]..(Redação pela Emenda Constitucional de 3 de setembro de 1926).
101

nessa proibição: a autorização para abertura de créditos suplementares e para operações de


crédito como antecipação da receita; a determinação do destino a dar ao saldo do exercício ou
do modo de cobrir o déficit, assim como a expressa vedação ao Congresso conceder créditos
ilimitados ao Executivo.

Ademais, fatores econômicos (a crise econômica mundial provocada pelo crash da


bolsa de Nova York, em 1929) e sociais (avanço dos ideais socialistas em oposição ao
desenvolvimento do modelo capitalista de sociedade) em adição aos episódios políticos que
marcaram a passagem dos anos 1920 para 1930 no Brasil, com o fim da “política café com
leite”, isto é, o rompimento político entre São Paulo e Minas Gerais, que culminou com o
Golpe de Estado de 1930 e o fim da Velha República no Brasil, bem assim a posse de Getúlio
Vargas à frente do Governo Provisório, além do fortalecimento do Poder Executivo (IPEA,
2010, 333-349).

O golpe promoveu profundas transformações com a reestruturação e reorganização


de toda a estrutura burocrática do Estado, bem como rompeu com a ordem jurídica da
República Velha. O ideal progressista inaugurado pela Constituição promulgada em 1934
denotava uma filosofia política socioeconômica, em contradição ao modelo liberal vigente.
Preponderava uma matriz de direitos sociais, inovando com a inserção de títulos correlatos no
Texto Constitucional.

Em matéria orçamentária, a iniciativa da lei de orçamento retorna ao Poder


Executivo, entretanto uma co-participação do Executivo e do Legislativo na elaboração
orçamentária conforme art. 39 da Constituição de 1934, ao estabelecer a competência
privativamente ao Poder Legislativo, com a necessidade de sanção presidencial, votar
anualmente o orçamento da receita e da despesa [...].

A Constituição outorgada no Estado Novo, em 1937, idealizada e redigida pelo


ministro da Justiça, Francisco Campos, de influência fascista e ditatorial, inspirada na
Constituição polonesa de 193583, instituiu um orçamento eminentemente administrativo,
típico dos regimes autoritários baseado na concentração do Poder no Executivo, como se
verifica no art. 67 daquela Carta Política: “Haverá junto à Presidência da República,
organizado por decreto do Presidente, um Departamento Administrativo com as seguintes
atribuições: [...] organizar anualmente [...] a proposta orçamentária [...]".

83
Pelo que a Carta brasileira de 1937 restou denominada “Constituição Polaca”.
102

O Departamento Administrativo citado recebia instruções diretas do Presidente da


84
República, e uma vez elaborada a proposta com a recomendação da Presidência da
República era encaminhada para apreciação na Câmara dos Deputados. Somente com fim da
II Grande Guerra Mundial passaram a ser rechaçados os ideais fascista e nacional-socialista
pelos aliados, encerrando-se o Estado Novo com a deposição de Vargas pelos militares.

Assumiu a Presidência da República o Ministro-presidente do Supremo Tribunal


Federal, José Linhares, dando inicio ao processo de democratização do País e a convocação
da Câmara dos Deputados para elaborar uma Constituição. Em 1946, foi promulgada a
Constituição democrática pós-guerra, em 18 de setembro.

Esta Constituição reforçou a ideia de um orçamento gerencial objetivando


estabelecer um equilíbrio entre as funções estatais, que em termos orçamentários prescreveu,
tal como se concebe hoje, a unidade orçamentária constatada pela leitura do art. 73 da
Constituição de 1946, ao definir um orçamento uno, “incorporando-se à receita,
obrigatoriamente, todas as rendas e suprimentos de fundos, e incluindo-se discriminadamente
na despesa as dotações necessárias ao custeio de todos os serviços públicos.”

Outrossim, durante a vigência da Constituição paradigmática de 1946, foi publicada


a Lei do Orçamento e das Finanças Publicas no Brasil - Lei nº 4.320/1964, em vigor até hoje.
Esta permanece inalterada e considerada atual conforme Machado e Reis (2003, p.11)85.
Giacomoni (2-12, p.44) destaca o fato de que, apesar de uma por vezes se apresente com
misto com a participação do Poder Executivo e Legislativo,

A historiografia orçamentária brasileira evidencia uma série de avanços e, não raro,


retrocessos, quase que alternadamente. Com efeito, em 1963, iniciou-se a formação de grupos
de trabalho encarregados da elaboração de uma reforma administrativa no Brasil, baseada na
meritocracia e inspirada na obra Rise of the Meritocracy, de Michael Young (1958).

84
Antecedente histórico relevante o Presidente da República, José Linhares, editou a Lei Constitucional nº 13, de
12 de novembro de 1945 delegando poderes constituintes aos membros da Câmara dos Deputados.
84
O orçamento, entretanto, evoluiu para aliar-se ao planejamento, surgindo o orçamento-programa como
especialização, devendo, na prática, operar como elo entre os sistemas de planejamento e de finanças. Com isto
torna-se possível a operacionalização dos planos, porque para a criação do que se concebe hoje por Ministério do
Planejamento.
85
O orçamento, entretanto, evoluiu para aliar-se ao planejamento, surgindo o orçamento-programa como
especialização devendo, na prática, operar como elo entre os sistemas de planejamento e de finanças. Com isto
torna-se possível a operacionalização dos planos, porque os monetariza, isto é, coloca-os em função dos recursos
financeiros disponíveis, permitindo que o planejador tenha os pés no chão, em face das disponibilidades dos
recursos financeiros. [...].
103

Conquanto a relevância orçamentária, o regime autoritário de 1964 reestabeceu o


centralismo político, reduziu a autonomia municipal e a intensificou a intervencionismo
estatal no setor produtivo, transversalmente, pela expansão da administração indireta
institucionalizada pelo Decreto-lei nº 200/6786, um divisor de águas em matéria orçamentária
no País (GIACOMONI, 2012).

Com o golpe militar de 1964 e outorga da Constituição de 1967, retiraram-se


prerrogativas do Poder Legislativo, com imediata repercussão no orçamento público.
Constata-se na leitura do §1°, do art. 67, a retirada de poder, ao Legislativo, de deliberar sobre
emendas de que decorressem aumento de despesa ou que visassem a modificar o seu
montante, natureza e objetivo.

Com o endurecimento da política de segurança nacional, entretanto, introduzida pela


Emenda Constitucional n° 1, de 17 de outubro de 1969, outorgada por uma junta militar, que
promoveu profundas alterações na Carta de 196787, fortalecendo as restrições ao controle
parlamentar orçamentário, surge uma contradição, pois foi a Constituição de 1967, com
redação da Emenda Constitucional n° 1/1969, que melhor definiu o controle externo das
contas públicas, com semelhanças à atual. Assim, o Tribunal de Contas da União teria seus
membros nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pelo Senado Federal,
dentre os brasileiros maiores de 35 anos com notório saber em Economia, Finanças e
Administração Pública88.

Nos anos 1980, após a crise mundial do petróleo, com o aumento do endividamento
público nacional, associado à crise fiscal, e o inicio da redemocratização cujo efeito foi a
busca pela redução e eficiência da máquina administrativa do Estado, surgem as pressões
políticas e populares para a abertura democrática, que resultou no movimento das “Diretas Já”
e na eleição de Tancredo Neves para a Presidência da República bem assim a eleição do

86
Cabe ressaltar que o Decreto lei n°200/1967 resultou de estudos elaborados, porém não utilizados pelo
Governo de João Goulart, que havia encomendado os estudos. O planejamento torna-se princípio dominante. A
Secretaria de Planejamento (SEPLAN) adquire status de agência central, controlando os sistemas de
planejamento, contábil e de auditoria interna. O DL representou marco histórico na tentativa de superação da
rigidez burocrática, haja vista que efetivou uma descentralização funcional no intuito de maior dinamismo
operacional.
87
Para alguns constitucionalistas a EC n° 1/1969 revogou da Constituição de 1967.
88
Comparativamente à disciplina traçada pela Lei Magna vigente, nota-se que esta tornou mais rígidos os
critérios de escolha dos Ministros do Tribunal de Contas da União, além de haver alterado a forma de
composição da corte, atribuindo ao Congresso Nacional a indicação de parte de seus membros.
104

Congresso Constituinte de 1987/1988. O Legislativo reassume, então, suas prerrogativas


institucionais.

Como assevera Gomes (2014), naquele momento, “[...] inova-se no tocante à


exigência de elaboração de planejamento tático com o fim de limitar as variáveis envolvidas
no processo orçamentário, reduzir a incerteza e instrumentalizar a programação.” Outrossim,
o programa de redemocratização do País, de redução dos instrumentos intervencionistas no
domínio econômico pelo Estado, e consequentemente o programa de privatizações e redução
da máquina administrativa são exemplos de plano de ação com profundas repercussões na
economia89:,

A Constituição Federal de 1988 recepcionou boa parte dos textos legais


infraconstitucionais existentes à época, como o Decreto-lei nº 200/1967, que hoje representa
as regras e os princípios da Lei de Responsabilidade Fiscal; e também a Lei nº 4.320/1964,
recepcionada pela CF/1988 com o status de lei complementar, preservando a função
institucional do orçamento, ao relevar a política econômico-financeira, assim como o
programa de governo.

Vê-se que a história do orçamento se confunde com a história política, econômica, ou


a historia do próprio homem, desde a organização do Governo. Vale ressaltar que o
paradigma programático brasileiro é referenciado internacionalmente pela ONU (GOMES,
2014, p. 39).

Destarte, o constituinte reservou um capítulo sobre as finanças públicas,


evidenciando o outro lado do Estado Democrático de Direito o Estado Fiscal, ao que vale
destacar o posicionamento do ministro Gilmar Mendes (2012, p. 1491): “não haver Estado
Social sem que haja também Estado fiscal, são como duas faces da mesma moeda”.

Assim é competência do Estado, por intermédio da atividade financeira (atividade-


meio), a gerência dos recursos financeiros para garantir as necessidades públicas, sejam elas
sociais ou meritórias (atividade-fim). O Estado realiza os gastos de manutenção com a

89
Ressalta Ferreira (2003, p.96): 3.10. O planejamento é, assim, um processo, a atividade de aplicação de um
sistema racional de escolhas entre um conjunto de alternativas reais de investimentos e de outras possibilidades
para o desenvolvimento, baseado na consideração dos custos e benefícios econômicos e sociais. 3.11.O plano é o
documento que retrata o planejamento estratégico do Governo. Deve conter os objetivos gerais a serem
atingidos; identificar as fontes dos recursos; e estabelecer as políticas para o uso desses recursos. Assim, se o
planejamento é o processo; a planificação é o resultado; e o plano, o documento que o formaliza. 3.11.1. O
orçamento é um plano, um instrumento de ação administrativa, caracterizando-se como plano de ação
governamental expresso em termos físicos e financeiros.
105

máquina administrativa (historicamente perdulária); promove os recursos para a efetivação


dos direitos e garantias fundamentais, declarados e assegurados na Constituição, pondo em
prática as políticas públicas e investe em infra-estrutura.

Com efeito, a tributação é indiscutivelmente a maior fonte de recursos e financiamento


das contas públicas, e encerra minimamente um comportamento atípico do ser humano, capaz
de ceder parte do seu patrimônio, da sua propriedade, em favor do Estado, como uma
prestação compulsória, que decorre de duas realidades distintas: a descrição hipotética,
genérica e abstrata de um fato e a verificação, in concretu, deste fato, na satisfação do
interesse do ‘Poder de Príncipe do Estado’.

O legislador constituinte, todavia, originariamente, preservou e assegurou a livre


iniciativa, a propriedade privada, a livre concorrência e a ordem econômica, reservando ao
Estado o ‘Poder’ “normativo e regulador da atividade econômica”, capaz de promover
“desenvolvimento nacional equilibrado”. Para Grau (2012, p.279 a 322) “a ordem econômica
na Constituição de 1988 define opção por um sistema econômico, o sistema capitalista”.
Portanto, a ordem econômica na Constituição é substituída por uma ordem intervencionista, e
o faz mediante a ordem econômica, as políticas econômicas e o orçamento.

Ademais, a Constituição de 1988 prevê três regras básicas para o sistema orçamentário
brasileiro, valendo ressaltar serem todas de iniciativa privativa do Poder Executivo: a Lei do
Plano Plurianual (PPA), a Lei das Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei dos Orçamentos
Anuais (LOA), que cotejam e compatibilizam os programas de duração continuados, com os
planos e diretrizes das políticas públicas, com as previsões orçamentárias a cada ano - é mister
distinguir o orçamento da lei orçamentária, constituída de três orçamentos distintos: o
orçamento fiscal da União (§ 5º, art. 165), o orçamento de investimentos e o orçamento da
seguridade social. Cabe ressaltar sobre os quatro aspectos fundamentais do orçamento:
jurídicos, políticos, econômicos e técnico-burocráticos.

Outrossim, o orçamento é uma das instituições constitucionais brasileira que remete à


aprovação pelo Poder Legislativo do projeto elaborado privativamente pelo Poder Executivo.
Este expressa um programa político, já estabelecido em lei, uma vez que a LOA só poderá ser
aprovada se compatível com o PPA, observadas as metas e objetivos da LDO. A cada século,
os orçamentos cotejavam um aspecto político importante que norteava certos processos,
minimamente que fossem, portanto, “quanto mais um regime se afasta do ideal do Estado de
Direito, tanto menos o Parlamento decide do conteúdo do orçamento público, da tributação e
106

das despesas”(BALEEIRO, 2010, p. 530). Por tais razões, o orçamento surgiu da necessidade
de fiscalização das finanças e como solução para refrear e reprimir as “tendências perdulárias”
dos governantes em face dos interesses da sociedade em geral.

O controle político dos orçamentos remonta aos abusos do absolutismo dos séculos
XVII e XVIII, às hostilidades ao Terceiro Estado e, atualmente, na maioria dos Estados
democráticos, os parlamentos fazem os controles e o planejamento orçamentário
politicamente, segundo interesse da maioria destes Parlamentos, muito embora os governos
não se deixem resignar.

De efeito, o orçamento, como instrumento econômico, privilegia varias modalidades,


seja por incentivos, estímulos, subsídios e fomentos, como uma forma de (art. 5º, II e III)
“garantir o desenvolvimento nacional”, “erradicar a pobreza e a marginalidade e reduzir as
desigualdades sociais e regionais” (arts. 174, § 1º; 178, § único; 182 e §§; 187; 188; e 204, II,
da CF/88). O programa de redemocratização do País, de redução dos instrumentos
intervencionistas no domínio econômico pelo Estado e, consequentemente, o programa de
privatizações e redução da máquina administrativa são exemplos de plano de ação com
profundas repercussões na economia90.

Como visto anteriormente, o orçamento não é um instituto constitucional isolado, pois


envolve aspectos jurídicos, econômicos e políticos, em especial de políticas públicas,
entretanto necessita cercar-se de dirigismos para a realização dos fundamentos e objetivos da
República Federativa do Brasil, portanto, como norma programática, carrega consigo as
marcas do Estado Liberal, do Estado Intervencionista, de quando foi a Lei nº 4.320/196491.

Apesar do caráter burocrático e administrativo do orçamento, a Constituição de 1988


estimulou o desenvolvimento e o aperfeiçoamento do planejamento92 no processo
orçamentário, possibilitando a visualização do orçamento como um meio de planejamento e

90
Para Baleeiro (2010, p. 522) este aspecto do orçamento envolve: (...) o estabelecimento das regras práticas
para a realização dos fins do orçamento, com clareza de objetivos, metodologicamente respaldado em lei,
demonstrando toda a racionalidade entre receitas e despesas, bem como os processos estatísticos para cálculo tão
aproximado quanto possível de uma e de outros, apresentação gráfica e contábil do documento orçamentário etc.\
91
Mendes (2012, p. 1491-1492) ressalta que: As finanças públicas, (...) além de sua função instrumental, são um
saber ético: forçam a levar em conta, de modo público, os sacrifícios que nós, como comunidade, decidimos
fazer a explicar do que pretendemos abrir mão em favor de objetivos mais importantes.
92
Antes mesmo da promulgação da Constituição Federal de 1988 antevia Grau (1978, p.46-47): (...) É certo que,
implicando o processo de planejamento a tomada de decisão política, deve ser objeto de controle democráticos e
a participação mais ativa da comunidade na sua elaboração - via Poder Legislativo - e execução não pode ser
negada como objetivo a ser perseguido.
107

controle das ações governamentais, tornando obrigatórios o PPA e a LDO que passaram a
nortear a elaboração das LOA’s.

Bercovici (2008) evidencia as dificuldades decorrentes da falta de planejamento


eficiente e consciente na promoção do desenvolvimento. Assim, no Brasil, a participação
popular no planejamento aufere evidência ainda que modesta, mas o orçamento participativo
objetiva ouvir diretamente a sociedade durante a elaboração do projeto de lei orçamentária,
quando suas reivindicações podem ser acolhidas e incluídas no projeto de lei orçamentária.

Assim, no orçamento anual, receitas e despesas aparecem discriminadas por órgãos


(Ministério, Secretaria, Casa Parlamentar ou Tribunal responsável), ação, ou seja, se o recurso
será usado para a assistência à criança, publicidade e propaganda ou outra ação específica, e
subfunção, diretamente relacionada à ação (ASSIS, 2012, p.199).

Neste sentido, dispõe o art. 48, da LRF/2000, que assegura o “incentivo à participação
popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discussão
dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos”. Ademais, esta participação popular
na elaboração orçamentária possibilita maior transparência e visibilidade dos interesses
políticos em discussão, imprescindíveis à nova ordem democrática. O enunciado do art. 3º,
dos objetivos da República, somente poderá ser atingido pela vontade popular legitimada na
Constituição Federal, e participação ativa da sociedade nos rumos do País.

3.2 As modelagens orçamentárias no Brasil

Os fatores que mais influenciaram o fortalecimento da modelagem orçamentária,


como se conhece no século XXI, foram o pensamento econômico contemporâneo e a
concepção do orçamento-programa93, que remonta ao desenvolvimento do capitalismo pós-
Segunda Guerra. Em virtude da difusão do modelo econômico keynesiano atrelado às

93
Em documento de 1959, a ONU conceituava Orçamento-programa como: um sistema em que se presta
particular atenção às coisas que um governo realiza mais do que às coisas que adquire. As coisas que um
governo adquire, tais como serviços pessoas, provisões, equipamentos, meios de transporte etc. não são,
naturalmente, senão meios que emprega para o cumprimento de suas funções. As coisas que um governo realiza
em cumprimento de suas funções podem ser estradas, escolas, terras distribuídas, casos tramitados e resolvidos,
permissões expedidas, estudos elaborados ou qualquer das inúmeras coisas que podem ser apontadas. O que não
fica claro nos sistemas orçamentários é esta relação entre coisas que o governo adquire e coisas que realiza
(GIACOMONI, 2012, p.162).
108

dificuldades e escassez de recursos financeiros para a reconstituição dos Estados destruídos


pela Guerra, cresce a pressão por maior eficiência na gestão dos recursos públicos.

Outra importante influencia foi a divulgação da sistematização da modelagem


programática pela ONU nos anos 1950. Muito embora não estivesse especificamente
direcionada a questões orçamentárias, serviu de fonte de inspiração para que os governos
buscassem compreendê-la e adaptá-la à nova realidade social e à nova organização da
Administração Pública.

À medida que o orçamento vai perdendo o caráter autoritário de mera alocação de


recursos, vê-se que os governantes necessitam da participação democrática, seja pela atuação
direta do povo, da sociedade organizada ou de seus representantes no Parlamento, ou pela
atuação de todos estes agentes, na busca de soluções técnicas e políticas para realização da
justiça social.

De seu turno, Torres (2009, p.387) destaca a imperatividade última, na virada do


século e do milênio, e a relevância da supremacia dos direitos humanos e busca da justiça
material, bem como seu conteúdo ético e jurídico que passam a orientar, via orçamento, a vida
financeira do Estado, e também o ordenamento jurídico interno. Ademais, envolve a impulsão
e a responsabilidade dos governantes na realização dos fins da Administração Pública em
favor dos administrados.

Oliveira (2013, p. 406), tratando das controvérsias sobre a natureza jurídica do


orçamento, constata, ora com caráter de lei em sentido formal, ora em sentido material, ou
ainda designado como lei de meios, neste caso um instrumento de arrecadação, até mesmo
porque não diz respeito aos objetivos maiores do Estado. Sabe-se, porém, que se trata
94
formalmente de lei , submetida ao mesmo processo legislativo, mas nem por isso deixa de
ser uma lei diferente.

Esta vincula a administração financeira do Estado, com a continuidade e prazo para


aprovação, cujos efeitos são produzidos para determinado período, e cuja responsabilidade
recai sobre o chefe do Poder Executivo em caso de descumprimento. Outros ainda consideram
o orçamento uma lei, em sentido material, em relação às receitas, e em sentido formal, em

94
Arnaldo Vasconcelos (2006, p.140-145) diz-se que a norma é geral, porque seu preceito se dirige
indiscriminadamente a todos. Especificando melhor: a todos, segundo a igualdade de situações. [...] a caracteriza
da abstratividade aspira-se assegurar a certeza do Direito, único valor que o Positivismo jurídico soube
distinguir.
109

relação às despesas, em virtude da necessidade de previsibilidade do ato administrativo. Não


95
obstante essas considerações, o Supremo Tribunal Federal ,em reiterados julgados, entendeu
tratar-se de lei em sentido formal, podendo ser objeto de controle abstrato de
96
constitucionalidade das leis orçamentárias .

Ao longo do século XX, o orçamento passou de mero documento de cunho


orçamentário ou um documento de mera ficção, “para tornar-se um poderoso instrumento de
intervenção na sociedade, planejando a economia, dando-lhe o rumo que sua ideologia
determinar”. Isto é, vai perdendo seu caráter eminentemente fiscal, como simples abastecedor
dos cofres públicos, para assumir um caráter extrafiscal, habilitado a estabelecer
comportamento, pressionar condutas e determinar soluções. Assim a economia passa a ser
interpretada à luz da política (OLIVEIRA, 2013, p.404-405).

Outrossim, os partidos políticos buscam o poder para realizar e por em prática seus
programas de governo, entretanto, a realização do programa requer novas despesas ou
aumento de despesas. Nesta realidade, o Governo Federal tem desviado recursos de
investimentos para a realização de programas sociais como o “Fome Zero”, “Bolsa Família” e
o “Plano de Aceleração do Crescimento” (PAC). O remanejamento de recursos se incorpora

95
O art. 202 da Constituição de Estado do Rio Grande do Sul. Lei estadual 9.723. Manutenção e
desenvolvimento do ensino público. Aplicação mínima de 35% (trinta e cinco por cento) da receita resultante de
impostos. Destinação de 10% (dez por cento) desses recursos à manutenção e conservação das escolas públicas
estaduais. Vício formal. Matéria orçamentária. Iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo. Afronta ao
disposto nos arts. 165, III, e 167, IV, da CF. Preliminar de inviabilidade do controle de constitucionalidade
abstrato. Alegação de que os atos impugnados seriam dotados de efeito concreto, em razão da possibilidade de
determinação de seus destinatários. Preliminar rejeitada. Esta Corte fixou que ‘a determinabilidade dos
destinatários da norma não se confunde com a sua individualização, que, esta sim, poderia convertê-lo em ato de
efeitos concretos, embora plúrimos’ (ADI 2.137-MC, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 12.5.2000).
A lei estadual impugnada consubstancia lei-norma. Possui generalidade e abstração suficientes. Seus
destinatários são determináveis, e não determinados, sendo possível a análise desse texto normativo pela via da
ação direta. Conhecimento da ação direta. A lei não contém, necessariamente, uma norma; a norma não é
necessariamente emanada mediante uma lei; assim temos três combinações possíveis: a lei-norma, a lei não
norma e a norma não lei. Às normas que não são lei correspondem leis-medida (Massnahmegesetze), que
configuram ato administrativo apenas completável por agente da Administração, portando em si mesmas o
resultado específico ao qual se dirigem. São leis apenas em sentido formal, não o sendo, contudo, em sentido
material. Os textos normativos de que se cuida não poderiam dispor sobre matéria orçamentária. Vício formal
configurado – art. 165, III, da CF – iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo das leis que disponham
sobre matéria orçamentária. Precedentes. A determinação de aplicação de parte dos recursos destinados à
educação na ‘manutenção e conservação das escolas públicas estaduais’ vinculou a receita de impostos a uma
despesa específica – afronta ao disposto no art. 167, IV, da CF/1988 (ADI 820, Rel. Min. Eros Grau, julgamento
em 15-3-2007, Plenário, DJE de 29-2-2008, grifo original).
96
No julgamento da Medida Cautelar na ADI 4.048-DF, julgada em 17/04/2008, ficou assentado que: “O STF
deve exercer sua função precípua de fiscalização da constitucionalidade as leis e dos atos normativos quando
houver um tema ou uma controvérsia constitucional suscitada em abstrato, independentemente do caráter geral
ou específico, concreto ou abstrato de seu objeto. Possibilidade de submissão das normas orçamentárias ao
controle abstrato de constitucionalidade“.
110

no projeto de lei orçamentária do ano seguinte, revelando as prioridades e políticas públicas


da Administração, segundo o critério da priorização dos interesses mais relevantes.

Em seu desenvolvimento, o orçamento tradicional, cuja função precípua era o


controle político das contas do Poder Executivo, evoluiu para o orçamento moderno,
objetivando a estruturação da Administração Pública, a intervenção na sociedade, planejando
a economia e integrando-os em um orçamento-programa. Neste sentido, o orçamento passou a
representar não somente uma lei do tipo periódica (editada a cada exercício financeiro)
contemplando expectativas de receitas, fixação de despesas, como também passou a
programar a vida econômica e financeira do Estado, vinculativa do comportamento dos
administradores/governantes.

Vale destacar o fato de que, nesta fase de transição, o orçamento público recebeu
97
influências das técnicas de gerenciamento (contabilidade gerencial), ao descrever com
clareza elementos: um núcleo estratégico normativo e de políticas públicas, um específico da
atividade estatal, indispensável à manutenção do Estado; um atípico que privilegia a prestação
de serviços; e outro atípico de produção e bens e serviços para o mercado. Com suporte nesta
visão de orçamento gerencial, foi possível evidenciar a necessidade de minimizar custos e
maximizar eficiência na prestação de serviços públicos.

3.2.1 Princípios orçamentários previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal

O modelo jurídico tradicional fora concebido para a interpretação e a aplicação de


regras, no entanto, modernamente, tem-se um primado de um sistema jurídico ideal,
consubstanciado na distribuição equilibrada de regras e princípios, que desfrutam igualmente
do mesmo status de norma jurídica. A doutrina é conscienciosa quando a ausência de níveis

97
Na Administração Pública são os seguintes os sistemas de contabilidade, cada um com a sua própria finalidade
Contabilidade orçamentária - que tem por finalidade acompanhar e demonstrar a execução do orçamento da
receita e da despesa, inclusive as alterações que porventura o orçamento sofrer por injunções da própria
execução; - Contabilidade financeira - que tem por finalidade acompanhar e demonstrar o fluxo de caixa, no
período financeiro, resultante da execução do orçamento, bem como dos recebimentos e pagamentos extra-
orçamentários; - Contabilidade patrimonial - que tem por finalidade acompanhar e demonstrar a situação
patrimonial da entidade pública, demonstrar os resultados financeiros e patrimoniais obtidos durante o período
financeiro; e Contabilidade de custos - que tem por finalidade apurar, analisar e demonstrar os custos dos
serviços ou produtos oferecidos pela instituição pública. (LUNELLI, 2015).
111

hierárquicos entre regras e princípio, ambos dotados de eficácia jurídica98. A diferença está no
papel que desempenha no sistema.

Enquanto as regras são normas de conduta ou descritivas de conduta, os princípios


são de conteúdo axiomático, valores a serem perseguidos. Assim, as regras se estruturam
como normas de condutas e os princípios como estados ideais e comportam a realização por
várias condutas (BARROSO, 2015, p.355-357). Igualmente, pode-se, ainda, identificar com
clareza a diferença desde a colisão de princípios e conflitos de regras, cuja solução no
primeiro caso é ponderação e sopesamento, enquanto no segundo é a subsunção, que implica
a nulidade ou exclusão dos efeitos jurídicos de uma das normas. Já na colisão de princípios,
haverá a prevalência de um sobre o outro, no caso concreto, sem perda de eficácia da norma
preterida (ALEXY, 2011, p. 91-103).

Em matéria orçamentária, a doutrina costuma apontar cinco princípios básicos que


norteiam o orçamento público: universalidade, anualidade, exclusividade, unidade e não
afetação, previstos no art. 165 e 167 da Constituição Federal. O princípio da universalidade
significa que todas as receitas e despesas necessitam ter previsão legal. Como expresso
anteriormente, as receitas são presumíveis, enquanto as despesas são previstas e estabelecidas
em lei, entretanto tal diferenciação não modifica o conteúdo, a estrutura e a aplicação do
princípio, especialmente com a Constituição de 1988, pois tudo deve estar previsto em lei.

O princípio da anualidade estabelece a necessidade de uma lei orçamentária anual,


cuja atualização deve ser para cada exercício financeiro e fiscal. O princípio da exclusividade,
textualmente explicitado no § 8º, do art. 165, da CF, que dispõe: a “lei orçamentária anual não
conterá dispositivos estranhos à previsão de receitas e à fixação de despesas, não se incluindo
na proibição a autorização para abertura de créditos suplementares e contratação de operações
de crédito, ainda que por antecipação de receita, nos termos da lei’.

Neste diapasão, vale ressaltar que o §7º, do art. 5º, da Lei de Responsabilidade
Fiscal, vetada pela Presidência da República sob a justificativa de que o §2º, do art. 35, do
Ato das Disposições Transitórias determina que, até a entrada em vigor da lei complementar a
que se refere o art. 165 99, § 9º, I e II, da Constituição Federal, “o projeto de lei orçamentária

98
Eficácia jurídica das regras e princípio consiste na pretensão, que ambas possuem de atuar na realizada, ligada
a ideia de utilidade e de justiça. (VASCONCELOS, 2006, p. 241).
99
Art. 165 - Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:
(...)
112

da União seja encaminhada até quatro meses antes do encerramento do exercício financeiro”.
Vê-se que o texto da LRF/2001 não difere do disposto no artigo da ADCT, que previa o prazo
“até o dia 31 de agosto”.

O principio da unidade, como se observa da leitura do § 5º, do art. 165, da CF,


prescreve que a peça orçamentária deve ser única, contendo todos os gastos e receitas. Este
contemplará o orçamento fiscal, o orçamento de investimento das empresas em que a União,
direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social e o orçamento da seguridade
social.

Por fim, o princípio da não afetação conforme inciso IV, do art. 167 da CF, com
redação dada pela Emenda Constitucional nº 42/2003, que dispõe ser vedada a vinculação de
receitas de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvada a repartição do produto da
arrecadação dos impostos a que se referem os artigos 158 e 159, a destinação de recursos para
as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para
realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente,
pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por
antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo.

3.2.2 Consensos e divergências doutrinárias a respeito do Orçamento Público

Em matéria orçamentária, existem alguns temas controvertidos e que demandam,


sempre que possível, uma análise, dentre os quais se encontram o denominado balanço
(regime) de competência e o balanço (regime) de caixa. No primeiro, são apresentadas todas
as receitas e despesas contraídas e que não necessariamente foram realizadas, enquanto,
segundo as contas de receitas e despesas, gastos e desembolsos são apresentados à medida que
efetivamente realizados. Este último sistema não deixa resíduos de um exercício para o outro,
enquanto o primeiro permite que se identifiquem os passivos a realizar, como os restos a
pagar, as dívidas com fornecedores, empreiteiros de obras públicas e precatórios que passam
de um exercício financeiro para outro.

§ 9º Cabe à lei complementar: I - dispor sobre o exercício financeiro, a vigência, os prazos, a elaboração e a
organização do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e da lei orçamentária anual; II - estabelecer
normas de gestão financeira e patrimonial da administração direta e indireta, bem como condições para a
instituição e funcionamento de fundos.
113

A questão resulta da impossibilidade de adoção de um ou outro sistema ou regime,


havendo necessidade de a Administração Pública utilizar os dois regimes, pois o Tribunal de
Contas deverá confrontá-los durante os procedimentos de auditoria para determinar os restos a
pagar. Para o Departamento do Tesouro Nacional; “restos a pagar são as despesas
empenhadas, mas não pagas até o dia 31 de dezembro, distinguindo-se as processadas das não
100
processadas .”

Outro ponto polêmico é a alteração da lei em matéria orçamentária no curso de sua


vigência. Se a lei orçamentária é uma lei em sentido formal com todas as características de
qualquer outra lei, poderá ser objeto de alteração a qualquer tempo, que se traduz em “alterar
o orçamento durante o exercício financeiro”. Em relação à lei orçamentária, porém, isso é
totalmente possível, mas não se pode afirmá-lo em relação à Lei de orçamento. Tal suposição
é insustentável, até mesmo pela impossibilidade material de sua realização.

Tanto a lei do Plano Plurianual (PPA), quanto o a lei de Diretrizes Orçamentárias


(LDO), por sua natureza de realização, como norma de políticas desenvolvimentistas, requer
estar aberta ao contínuo aperfeiçoamento, portanto sujeitas a alterações do decorrer de sua
vigência, até mesmo porque: “O fim não é a lei em si mesma ou a lei não é um fim em si
mesmo”. (OLIVEIRA, 2013, p. 462). Isto não acontece com a Lei de Orçamento Anual
(LOA), à margem de qualquer forma de remanejamento, diferentemente das demais leis,
somente poderá ter seu conteúdo material modificado por créditos adicionais, com previsão
constitucional (art. 167, V, da CF/88).

Cabe, ainda, questionar se a lei orçamentária poderia ser objeto de iniciativa popular,
independentemente da participação democrática do Parlamento na sua aprovação. O Texto
Constitucional de 1988 prevê tratar-se de competência privativa e exclusiva do chefe do Poder
101
Executivo a iniciativa de em matéria orçamentária do poder; ou seja, o projeto de lei do
Plano Plurianual, da lei de Diretrizes Orçamentárias e de lei Orçamentária Anual é de
iniciativa privativa do Presidente da República, enquanto são da competência dos demais

100
Enquanto as processadas são as despesas inscritas em restos a pagar, liquidadas e não pagas, as não
processados são as despesas empenhados e não liquidados. Assim a apuração é feita identificando os restos a
pagar das despesas liquidadas e não pagas (processadas) e os restos a pagar das despesas empenhadas e não
liquidadas (não processadas) Indicadores: total dos restos a pagar processados e total dos restos a pagar não
processados, que necessitam ser discriminados por cada Poder. BRASIL. Sítio do Tesouro Nacional.
101
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
(...)
XXIII - enviar ao Congresso Nacional o plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias e as
propostas de orçamento previstas nesta Constituição;
114

poderes do Estado seus respectivos orçamentos. Destarte, a doutrina dominante entende não
ser possível o plebiscito, referendo ou iniciativa popular; do contrário, como ficará a
administração dos recursos caso a lei seja rejeitada?

No que diz respeito às modalidades de orçamento público, cabe destacar o


‘orçamento participativo’, o ‘base zero’, o ‘funcional’ e o ‘de resultado’, para ao final fazer
uma comparação entre o orçamento atual e o de resultado. O primeiro se refere à participação
na vida política, que se tornou indispensável não apenas para a proteção dos interesses
individuais, mas também para a criação de um corpo de pessoas informadas, comprometidas e
em decurso de desenvolvimento.

Portanto, o envolvimento político se torna essencial para a mais elevada e


harmoniosa expansão das capacidades individuais (SARTORI, 1994). Neste sentido, o livre
desenvolvimento de todos só pode ser atingido com o livre desenvolvimento de cada um e,
em última instância, na igualdade política e econômica.

Somente a igualdade é capaz de assegurar as condições para a realização do potencial


de todas as pessoas, de modo que cada um possa dar de acordo com sua capacidade e receber
o que necessita. Isto se dá com a integração progressiva do Estado e da Sociedade. Assim, a
ideia de uma ‘teoria da maioria’ é uma forma efetiva e desejável de proteger as pessoas de
governos arbitrários, imprescindível à manutenção da liberdade, bem como à preservação da
vida política, ao lado da vida econômica.

Ou seja, é uma questão de liberdade e iniciativa individual, pois “o governo da


maioria, para funcionar justa e sabiamente, deve está circunscrito pelo governo da
lei”(SARTORI, 1994). De efeito, observa-se a democracia legal no Estado constitucional,
norteada pela tradição política anglo-saxônica, com a criação de uma sociedade que
valorizava: a separação dos poderes do Estado, submetida ao império e governo da lei, da
mínima intervenção estatal na sociedade civil e na vida privada, mas de livre mercado.

Como se pode constatar, este ideal de autodesenvolvimento e igualdade só pode ser


conquistado em uma “sociedade participativa, uma sociedade que gere um sentido de eficácia
política, e que nutra uma preocupação por problemas coletivos e contribua para a formação de
um corpo de cidadãos conhecedores e capazes de ter um interesse contínuo pelo processo
governamental”, ou seja, com a participação direta dos cidadãos na regulamentação de
instituições da sociedade, bem como “minimizando o poder burocrático que não tem que
prestar contas a ninguém”(SARTORI, 1994).
115

Como ensina Bobbio (2005, p.38), a participação democrática deve ser


compreendida como forma de governo fundada na autonomia das pessoas, ao mesmo tempo
em que são legisladores e cumpridores da legislação por eles mesma criada, portanto a
democracia contemporânea deve ser compreendida como Constituição política baseada nos
princípios eleitos pela vontade de todos, que transformam suas ações em legislação universal.

Para o Autor italiano, as elites no poder não eliminam a diferença entre regimes
democráticos e regimes autoritários, destarte “a diferença entre uma aristocracia e uma
democracia não está na diferença entre os poucos (indivíduos) e os muitos (indivíduos),” mas
sim, todos os cidadãos, visto que a democracia moderna repousa em uma concepção
individualista da sociedade”(2000, p.377-380)102. Não se pode, entretanto, deixar de destacar
o papel da hegemonia no processo de transformação democrática de Lênin103.

Comentando as posições de Lenine e Gramsci104, Gruppi ressalta que “sem essa


unidade de teoria e ação, a hegemonia é impossível, porque ela só se dá com a plena
consciência teórica e cultural da própria ação (...)” e infere que a hegemonia deve ser
compreendida “não apenas como direção política, mas também como direção moral, cultural,
ideológica”(1978, p.11).

Sabe-se, contudo, que a democracia não é capaz de derrotar por completo o poder
das oligarquias dominantes, sendo ainda menos habilitada a preencher todos os espaços
deixados pelo exercício do poder que delibera e toma as decisões vinculatórias para todo um
grupo de cidadãos. Trata-se de saber quais as pessoas autorizadas a constituir suas vontades
em legislação universal na sociedade contemporânea, na medida em que o princípio
isonômico é meramente formal, que torna imperativo conhecer e compreender, não apenas;

102
Segundo Bobbio no Estado democrático: [...] indivíduo e Estado não estão mais armados um contra o outro,
mas se identificam na mesma vontade geral, é a vontade de todos que comanda cada um. Na luta entre
liberalismo e socialismo, deflagrada no século XIX e presente ainda hoje, a democracia sempre representou a
salvação do Estado liberal que não quer se transformar no seu oposto e do Estado socialista que não quer cair na
anarquia. Algumas vezes foi invocada como corretivo de um e de outro. Como tal, também representou o ponto
de acordo das tendências opostas. E hoje representa sem duvida o ponto de chegada da nossa situação (2000, p.
123).
103
Lênin: Segundo o ponto de vista proletário, a hegemonia pertence a quem se bate com maior energia, a quem
se aproveita de toda ocasião para golpear o inimigo; pertence aquele a cujas palavras correspondem os fatos e
que portanto, é o líder ideológico da democracia, criticando-lhe qualquer inconsistência (2010, p, 68).
104
Para Gramsci, existem passagens em que a sociedade civil é considerada um momento do Estado como
depreende: [...] podem ser fixados, por enquanto, dois grandes planos superestruturais: o que pode ser chamado
de sociedade civil, que seja, o conjunto de organismos habitualmente dito privados e a da sociedade política ou
Estado. E eles correspondem, à função de hegemonia que o grupo dominante exerce em toda a sociedade e a do
domínio direto ou de comando, que se expressa no Estado e no governo jurídico (BOBBIO, 1999, p. 55).
116

“quantos e quem são os votantes”, ainda que todos os membros da sociedade sejam os
votantes (pelo sufrágio universal), mas, ainda, é necessário que se saiba quem são os
autorizados a transformar as suas vontades em legislação universal e tomar as decisões; e em
que constitui a “sociedade política”(BOBBIO, 2000, 40-63).

Outra controvérsia é o orçamento base zero em oposição ao baseline. O orçamento


(planejamento) em base zero significa dizer que cada unidade deva zerar a receita em relação
às despesas programadas. Não é uma questão jurídica, mas, de natureza gerencial, portanto,
econômica, no que não se pretende aprofundar.

Esta técnica, o Zero base Budgeting, foi introduzida nos Estados Unidos da América
durante o Governo de Jimmy Carter, e estabelecia que as despesas deveriam ser avaliadas, a
cada ano, como se nunca tivessem existido, isto é, deveriam ser zeradas todas as despesas no
inicio de cada exercício, mesmo quando estas fossem continuadas. É exatamente o oposto ao
que se entende por orçamento baseline, o qual permite uma abordagem incremental,
justificando as variações de um ano para o outro. Este tipo de orçamento traz uma série de
dificuldades, como, por exemplo, requer que o orçamento seja, permanentemente, avaliado e
revisado

No Brasil, este modelo é inviável em razão das escolhas feitas pelos constituintes de
1987/1988 ao estabelecerem no art. 84, XXIII 105 o plano plurianual de governo e as diretrizes
a serem seguidas na elaboração dos orçamentos anuais, ou seja, a lei orçamentária que
contempla o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual
necessitam ser vistas e analisadas em conjunto e não cada um separadamente (OLIVEIRA,
2013, p. 465).

O modelo conhecido como Program budgeting, performance budget ou PPBS


(Planning Programning Budgeting System) ou, ainda, como orçamentos funcionais, significa
fazer uma previsão ou um planejamento global e não com a especificação dos gastos públicos.
Mais uma vez de natureza contábil-econômica e não jurídica, mas que requer um breve olhar.

105
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
(...)
XXIII - enviar ao Congresso Nacional o plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias e as
propostas de orçamento previstas nesta Constituição.
117

O orçamento funcional foi criado pelo Pentágono para frear as despesas em certos
setores do Governo, portanto, atua como um controle a mais dos gastos governamentais.
Assim a atividade administrativa do Estado é tratada, individualmente, programa a programa,
buscando otimizar as despesas públicas. Evidentemente, este tipo de orçamento consiste em
mera técnica de aplicação do orçamento, em que o planejamento de longo prazo deve ser
realizado segundo critérios de análise do custo/benefício dos gastos e desembolsos. Este
modelo se mostrou não factível no longo prazo e por este motivo foi abandonado, entretanto
continua sendo amplamente estudado.

O último tipo de orçamento aqui examinado será o output budget, ou orçamento de


resultado, isto é, o resultado transversal ao gasto (output) que surgiu nos Estados Unidos com
a denominação de Government Performance and Results Act of 1993, orçamento de resultado
ou orçamento de desempenho. Neste modelo, a atenção é deslocada do controle para os
resultados, isto é, para os índices e indicadores obtidos com suporte no orçamento. O interesse
é de fato o desempenho, cujo foco é o resultado.

Este requer um elevado grau de flexibilização na utilização dos recursos, visando a


atingir certos resultados (GIACOMONI, 2012, p.187-202). É um “sistema de planejamento
orçamentário e avaliação que enfatiza o relacionamento entre o orçamento monetário e o
resultado esperado” que envolve: a compatibilização entre o orçamento-programa atual e o de
resultado; o plano plurianual requer uma análise de desempenho e sua implementação no
atual sistema; a alteração das estruturas da modelagem atual para uma de desempenho e
resultado; análises e conjecturas sobre o orçamento de programa, envolvendo a sua
flexibilidade e os dispêndios; e um sistema de sanções compatível (OLIVEIRA, 2013, p. 464-
471).

No Quadro 1, evidenciam-se as diferenças entre a modelagem tradicional e o


orçamento-programa. No orçamento tradicional, o processo orçamentário está dissociado dos
processos de planejamento e programação, a alocação de recursos visa à aquisição de meios,
as decisões orçamentárias são tomadas tendo em vista as necessidades das unidades
organizacionais.
118

Quadro 1 – Orçamento tradicional x orçamento-programa.


Orçamento tradicional Orçamento-programa
1. O processo orçamentário é dissociado dos 1. O orçamento é o elo de ligação entre o
processos de planejamento e programação planejamento e as funções executivas da
organização
2. A alocação de recursos visa à aquisição de meios 2. A alocação de recursos visa à consecução de
objetivos e metas
3. As decisões orçamentárias são tomadas tendo em 3. As decisões orçamentárias são tomadas com base
vista as necessidades das unidades em avaliações e análises técnicas das alternativas
organizacionais possíveis
4. Na elaboração do orçamento são consideradas as 4. Na elaboração do orçamento são considerados
necessidades financeiras das unidades todos os custos dos programas, inclusive os que
organizacionais extrapolam o exercício
5. A estrutura do orçamento dá ênfase aos aspectos 5. A estrutura do orçamento está voltada p/ os
contábeis da gestão aspectos administrativos e de planejamento
6. Principais critérios classificatórios: unidades 6. Principal critério de classificação: funcional
administrativas e elementos programático
7. Inexistem sistemas de acompanhamento e 7. Utilização sistemática de indicadores e padrões de
medição do trabalho, assim como dos resultados medição do trabalho e dos resultados
8. O controle visa avaliar a honestidade dos agentes 8. O controle visa avaliar a eficiência, a eficácia e a
governamentais e a legalidade no cumprimento efetividade das ações governamentais
do orçamento
Fonte: Giacomoni (2012, p.167)

Na elaboração, são consideradas as necessidades financeiras das unidades


organizacionais e sua estrutura enfatiza aos aspectos contábeis da gestão, e cujos principais
critérios classificatórios são as unidades administrativas e os elementos, portanto, inexistem
sistemas de acompanhamento e medição das realizações, nem dos resultados. Por fim, o
controle no orçamento tradicional, visa a avaliar a honestidade dos agentes governamentais e
a legalidade no cumprimento do orçamento.

Do outro lado, vê-se no orçamento-programa um liame entre o planejamento e as


funções executivas da organização, alocação de recursos visa à consecução de objetivos e
metas e que as decisões orçamentárias são tomadas com base em avaliações e análises
técnicas das alternativas possíveis.

No processo de elaboração do orçamento-programa, são considerados todos os custos


dos programas, inclusive aqueles que extrapolam o exercício e sua estrutura, estão voltados
para os aspectos administrativos e de planejamento, cujo principal critério de classificação é o
funcional programático.
119

Quadro 2 – Características principais dos níveis de mensuração


Custo/benefício
Função Determinar as vantagens sociais e econômicas nível decisório:
alto nível político
Produtividade
Determinar o produto fornecido (ou a ser fornecido) ao público
Programa Nível decisório: alto nível administrativo
NIVEIS DE Unidade de medida: expressão do produto ou meta; unidade de
MESURACAO resultado
Eficiência
Determinar o esforço desenvolvido para obtenção do resultado
Atividade ou final
Projeto Nível decisório: nível médio administrativo ou de execução
Unidade de medida: expressão do esforço realizado; unidade de
volume de trabalho
Fonte: Machado Jr. (2003. p. 121).

Diferentemente do modelo tradicional, o orçamento-programa promove a utilização


sistemática de indicadores e padrões de medição do trabalho e dos resultados e no nível de
controle, objetiva a permanente avaliação da eficiência, da eficácia e da efetividade das ações
governamentais.

No próximo capítulo o trabalho abordará o ponto central da pesquisa: a recém-


editada Emenda constitucional nº 86/2015, que dispõe sobre o orçamento impositivo e a
questão da abertura de créditos extraordinários no sistema presidencialista de coalizão.

Os projetos de leis orçamentárias são encaminhados ao Poder Legislativo que


deliberará sobre o “plano plurianual, às diretrizes orçamentárias, ao orçamento anual e aos
créditos adicionais serão apreciados pelas duas Casas do Congresso Nacional, na forma do
regimento comum” (Caput do art. 166 da CF/88). Este deverá examinar e emitir pareceres
sobre os projetos, cabendo à comissão mista, composta por membros das duas Casas, receber
e apreciar as emendas parlamentares. Após a verificação da compatibilidade das emendas com
o PPA, a LDO e a LOA, as emendas serão alocadas respeitas as disposições do § 3º do art.
166, da CF/88.

O artigo foi acrescido pela Emenda Constitucional nº 86/2015, que estabeleceu a


obrigatoriedade a execução orçamentária e financeira das emendas aprovadas, em montante
correspondente a 1,2% (um inteiro e dois décimos por cento) da receita corrente líquida
realizada no exercício anterior. Esta temática será abordada com clareza no capítulo seguinte.
120

4 UMA ANÁLISE DO ORÇAMENTO E DOS CRÉDITOS


ADICIONAIS NO MODELO PRESIDENCIALISTA
BRASILEIRO

No capítulo anterior, tratou-se do orçamento público em seus aspectos históricos,


desde os mais remotos postulados das finanças públicas até a moderna ordem constitucional
orçamentária, bem como foram discutidos seu formalismo e sua autonomia. Outrossim, foram
mostrados os princípios que norteiam a matéria orçamentária com amparo no Texto
Constitucional, para, em seguida, expor os três primeiros objetivos delimitados na introdução
deste trabalho.

Assim, inicia-se o último capítulo, com o objetivo de investigar o controle realizado


na modelagem orçamentária atual (orçamento-programa) para em seguida investigar o
orçamento impositivo, os créditos extraordinários e especiais, que visam a suprir os gastos
proporcionados pela previsão de receitas insuficiente, em razão de eventos imprevisíveis. Para
tanto, serão utilizados a política de coalizão e sua afetação na ordem burocrática brasileira,
com atenção especial às questões político-partidárias e de governabilidade, com amparo em
uma modelagem orçamentária impositiva.

Como visto, o Direito orçamentário insurge com abordagens que suscitam, sempre
que possível, uma visão multidisciplinar da política, sociedade, economia, finanças públicas,
dimensões jurídicas e instituições que compõem o Estado. O orçamento é uma das instituições
que permite evidenciar o estádio em que se encontram as outras instituições, como: o
federalismo, a democracia, o equilíbrio entre os Poderes (funções) do Estado, a realização dos
fundamentos e objetivos constitucionais da República.

Mormente as normas internas do Congresso Nacional impõem limitações à atuação


do Poder Legislativo sobre o orçamento, limitando a quantidade de emendas coletivas,
restrições temáticas, permitindo-lhes alterações contingenciais, correções de erros e possíveis
omissões. Destarte, há necessidade de fortalecer a ideia de cidadania fiscal, tanto na
arrecadação como nos gastos públicos, pois a participação popular se restringe a audiências
121

públicas, propostas isoladas encaminhadas ao Poder Legislativo, que se torna refém do


excessivo Poder concentrado nas mãos do Executivo.

O Direito orçamentário insurge com abordagens que suscitam, sempre que possível,
um olhar multidisciplinar da política, da sociedade, da economia, das finanças públicas, das
dimensões jurídicas, e das instituições que compõem o Estado. É capaz de identificar a
realização dos direitos e garantias fundamentais, a sujeição e o cumprimento dos direitos
individuais e sociais, assim como aspectos bem específicos relacionados ao endividamento
público, a planificação das políticas públicas do governo, dentre tantas outras, mas somente
mediante o controle da sociedade.

Não obstante o constitucionalismo brasileiro consagre a separação dos poderes, todas


elas denotam uma relevante participação do Poder Executivo no processo legislativo, em
distintos graus e intensidades. Percebe-se a participação ativa do Poder Executivo em todas as
etapas do processo legislativo, seja pela atuação direta do chefe de Estado, ou indireta pela
Vice-Presidência, ministro de Estado, ou até mesmo por lideranças políticas.

Esta participação também se dá por via da propositura de leis encaminhadas ao


Parlamento, ou ainda na etapa de promulgação de lei. Cabe destacar o ‘Poder’ que o
Executivo possui na agenda do Poder Legislativo. Nas palavras de Almeida Filho (2014 p.49-
57), “[...] o Poder Executivo catalisa a decomposição das competências do Poder Legislativo
[...] tornando-o um mero apêndice”, na contramão do ideal de fortalecimento do parlamento,
representantes eleitos pela vontade do povo – detentores singulares do poder originário.

Com efeito, o orçamento é antes de tudo uma peça política, utilizada pelos
administradores para decidir o destino dos recursos públicos. Assim sendo, há muito não se
pensa o orçamento como peça contábil ou de mera técnica106, mas como instrumento de
previsão de políticas públicas e de escolhas feitas pelo governante. São, no fundo, escolhas
políticas. Baleeiro (2010, p. 531) considera “essencialmente um ato político, [...] o orçamento
como um instrumento pelo qual o Poder Legislativo prevê e autoriza ao Poder Executivo a
realização dos interesses programáticos [...]”.

106
Para Assis (2012, p. 200), a programação orçamentária ganha mais forca como instrumento delineador do
orçamento público, capaz de permitir que o orçamento não seja uma peça meramente técnica ou contábil, mas
sim um instrumento efetivo de escolhas de políticas públicas que servirão, inclusive, para estruturar o modelo de
Estado que se pretende ter.
122

O autor, todavia, não admite a natureza, de lei em sentido formal, do orçamento, mas
sim como ato-regra ou ato-subjetivo (2012, p.556). Assim, ele admite o seu caráter jurídico e
político. No todo ou em parte Baleeiro se refere à Constituição de 1967 e não à de 1988, a
despeito das atualizações e notas de Machado Segundo. A questão expressa, no entanto, di
respeito ao caráter político do orçamento, em sentido lato, objetivando a realização dos fins a
que se presta a Administração pública. Igualmente, é imperativo estabelecer os objetivos e
propósitos a serem seguidos pelos governantes no uso dos recursos orçamentários.

Neste sentido, o ideal seria partir de claras escolhas políticas, coerentes e bem
fundamentadas, que possibilitassem a interação de esforços do Poder público, com os grupos
e agentes sociais, comprometidos com a formulação de um orçamento verdadeiramente
voltado aos interesses da sociedade; também, reconhecendo, no entanto, a necessidade de
assegurar os interesses da Administração pública (ASSIS, 2012, p.202).

Cabe frisar a data da publicação da lei que aprovou os valores de receitas e despesas
para o ano calendário de 2015, ocorrida no dia 22/04/2015, portanto, findo o primeiro
trimestre do ano fiscal, quando em princípio já se poderia ter conhecimento dos resultados
daquele trimestre. Tal inobservância de prazos acarreta transtornos não somente aos Poderes
(Executivo e Legislativo) envolvidos, mas também à sociedade em geral, pois enseja
instabilidade política e econômica.

Vale ressaltar que fornecedores deixam de receber seus créditos com a União,
projetos são paralisados, consequentemente, elevando os custos para a retomada das obras,
assim como servidores públicos deixam de receber seus salários. Em virtude do atraso na
elaboração e encaminhamento do PLOA ao Congresso Nacional, em janeiro de 2015, foi
necessário editar o Decreto nº 8.389/2015 para dispor sobre a execução orçamentária dos
órgãos, fundo e entidades do Poder Executivo até a publicação da Lei Orçamentária de 2015;
embora, em setembro de 2014, a Associação Nacional dos Agentes de Segurança do Poder
Judiciário da União – AGEPOLJUS, já houvesse demandado contra a Presidente da República
e o Congresso Nacional na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, “em
decorrência de omissão inconstitucional verificada no processo legislativo do PL 13/2014 –
CN, que tratava do Projeto de Lei Orçamentária Anual para 2015”107.

107
Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão. Lei Orçamentária Anual de 2015. Supressão, pelo Poder
Executivo, das propostas do Poder Judiciário e do Ministério Público da União. providências processuais. adoção
do rito do art. 12 da lei n. 9.868/1999. providências processuais. Rel.Min. Cármen Lúci. Brasília, 16 de
123

Ademais, o Pretório Excelso tem admitido a declaração de inconstitucionalidade,


quando não forem, expressamente, citados na petição exordial a ADIn por omissão, em
virtude da dependência e conexão que existe entre eles. “Trata-se de declaração de
inconstitucionalidade por arrastamento ou por atração”(DANTAS, 2012, p.239-240).

4.1 Execução e cumprimento das metas no orçamento-programa brasileiro

Feitas essas considerações, são indicados alguns relatórios dos Projetos de Lei
Orçamentária Anual PLOA (2014 e 2015), que evidenciam o grau de complexidade e
aprimoramento das informações disponíveis para, apesar de nunca ser fácil, facilitar a
compreensão da metodologia adotada na elaboração dos orçamentos no País. O acúmulo
continuado de informações possibilita o controle permanente e imediato dos dados estimados
(metas), sua realização (resultados obtidos) que possibilita os ajustes das políticas e finanças
do Estado.

Cabe destacar o fato de que tanto o Poder Executivo quanto o Legislativo dispõem de
órgãos permanentes de acompanhamento dos orçamentos públicos da União. Somente em
caráter elucidativo, o Tribunal de Contas da União108, de acordo com o plano de controle
externo, realizou 136 sessões em 2014109, entre sessões ordinárias e extraordinárias110, de
julgamento, de tomadas de contas, em grau de reclamações e recursos, dentre outras.

setembro de 2014.
108
Regimento Interno do Tribunal de Contas da União – Resolução - TCU nº 246, de 30/11/2011.
109
Sessão realizada no dia 05/06/2014 - Tribunal de Contas da União (TCU) analisou a previsão de receitas do
Projeto da Lei Orçamentária da União para 2014. O objetivo do trabalho – que subsidia à Comissão Mista de
Orçamento do Congresso Nacional (CMO) – foi verificar a adesão dos demonstrativos constitucionais e legais,
em especial da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A proposta de lei para o exercício de 2014 contempla
receitas de R$ 2.467,59 bilhões, sendo R$ 2.361,98 bilhões destinados aos orçamentos fiscal e da seguridade
social e R$ 105,61 bilhões para o orçamento de investimento das estatais. A auditoria do tribunal verificou
que a previsão total das receitas de capital para 2014 chegou a aproximadamente R$ 974 bilhões. Este valor é
5,76% superior à previsão de 2013. Em relação ao montante das operações de créditos internas e a amortização
de empréstimos em contrato, o levantamento identificou aumento de 15,2% e 33,2%, respectivamente. O
relatório apontou, ainda, reduções de 37,8% nas operações de créditos externas de 57,3% no resultado do
Banco Central (BC) e 61,9% em outras receitas de capital. No que diz respeito aos benefícios financeiros,
creditícios e tributários, incluindo os previdenciários, constatou-se que o projeto para 2014 aferiu um valor de R$
323,17 bilhões, o que representa R$ 75,05 bilhões a mais do que o previsto no projeto do ano anterior. Nas
receitas de capital que estão sendo estimadas a menor, verificou-se que a variação negativa prevista nas demais
receitas de capital é impactada, especialmente, pela reestimativa ocorrida na avaliação bimestral do resultado do
BC, que passou para R$ 96,7 bilhões, mais de 250% acima do inicialmente previsto em 2013. Em suas
conclusões acerca da metodologia empregada nas estimativas das receitas primárias, especialmente, em relação
ao montante das demais receitas primárias, a unidade técnica constatou, a partir do exame do inciso XXV das
124

Os dados evidenciados nos subitens a seguir foram obtidos diretamente do Portal


institucional do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão, objetivando, não uma análise precisa dos dados, mas sim estabelecer
uma relação de necessidade ou não de se adotar uma nova modelagem orçamentária no Brasil,
que justificasse a edição da Emenda Constitucional nº 86/2015.

O sistema de coleta dos dados buscou direcionar as informações para responder a


problematização expressa na introdução deste relatório dissertativo. As tabelas a seguir, na
sua maioria, são imagens com a identificação da fonte primária dos dados e não do Portal de
onde foram obtidas.

4.1.1 Componentes do PLOA, por orçamento

São inúmeros os componentes do Projeto da LOA, entretanto é possível destacar três


componentes básicos: a expectativa de receitas, a fixação das despesas e o refinamento da
dívida pública (que busca minimizar os riscos orçamentários e suavizar a instabilidade,
promovendo um efeito ou sensação de controle e bem estar na sociedade) e seus reflexos nas
receitas e despesas orçadas.

O refinamento da dívida a que se refere está apoiado em teorias econômicas que


identificam um efeito distorcível nas receitas e despesas, pelo simples fato de se tratar de
Poder Público, dentre outros como: o risco inflacionário; o risco de câmbio real; a correlação
entre gastos e inflação; a correlação entre produto e inflação; e a correlação câmbio real e
gastos111. A intenção, contudo, é demonstrar de que forma estes valores de receitas e despesas
e seus refinamentos podem ser utilizados na elaboração dos orçamentos anuais.

Informações Complementares que as disposições do art. 12 da LRF não foram atendidas na sua completude. Isso
quando analisada a projeção da receita para os dois anos seguintes ao da previsão.
110
Secções disponíveis no Pontal do TCU e com previsão legal nos Arts. 92 à 133, do RI do TCU.
111
Risco inflacionário: fossem as despesas não financeiras e receitas reais do governo constantes, defender-se-ia
a plena indexação da dívida, de forma a isolar o “ruído” gerado pelo nível de preços às contas do governo. Tal
componente sugere, então, títulos com rendimentos reais não correlacionados com a inflação (a elasticidade da
dívida indexada é zero com respeito à inflação). · Risco de câmbio real: uma desvalorização cambial acima da
inflação aumenta o serviço real da dívida pública. Para amortecer os "ruídos" gerados pela variação do câmbio
real, seria preferível reduzir a dívida indexada ao câmbio à medida em que sua volatilidade aumenta (diminuindo
a elasticidade da dívida com respeito ao câmbio). Um corolário deste raciocínio é a redução da parcela da dívida
em dólar sob um regime de câmbio flutuante, imunizando o orçamento governamental de maiores variabilidades
cambiais. · Correlação entre gastos e inflação: se a correlação entre gastos reais do governo e inflação é
positiva, um maior nível de despesas do governo tenderia a ser acompanhado por uma maior inflação. Assim,
para amenizar a variabilidade total das despesas, seria recomendável que a autoridade fiscal aumentasse a
125

Inicialmente, o trabalho contém uma tabela da meta dos principais componentes do


112
PLOA , obtida diretamente do Projeto de LOA encaminhado pelo Ministério do
Planejamento, Orçamento e Gestão em conjunto com o Ministério da Fazenda. A Tabela 01
destaca os valores de Receitas e Despesas projetadas para o Orçamento Fiscal, Orçamento da
Seguridade Social e Orçamento de Investimentos do ano de 2015. Os valores de expectativas
de receitas são previstos para apropriação em 12 meses, o que acarreta variações como as
destacadas no parágrafo anterior, que justificam as diferenças de valores entre o PLOA e a
LOA.

Tabela 01 – Principais Componentes do PLOA de 2015 Em bilhões de Reais


PLOA (Líquido de
Descrição PLOA 2015 Refinamento da Dívida refinamentos)
Receitas Despesas Receitas Despesas Receitas Despesas
Orçamento fiscal e da seguridade social 2.863,4 2.863,4 868,6 868,6 1.994,8 1.994,8
Orçamento fiscal 2.168,5 2.079,0 868,6 868,6 1.299,9 1.210,4
Orçamento da seguridade social 694,8 784,4 0,0 0,0 694,8 784,4
(+) Orçamento de investimento em estatais 105,7 105,7 0,0 0,0 105,7 105,7
Total aprovado 2.969,1 2.969,1 868,6 868,6 2.100,5 2.100,5
Fonte: Disponível no Sítio http://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=158770&tp=

Vê-se que os valores de receitas e despesas estão distribuídos nos três orçamentos
que compõem a lei orçamentária: o Orçamento Fiscal, o da Seguridade Social e o de
Investimentos em Estatais. Mediante o refinamento da dívida, é retirada boa parte das
distorções para chegar às receitas e despesas líquidas, que correspondem ao valor mais
aproximado do importe disponível para a efetiva realização. Outrossim, os valores não são os
recepcionados pelo Anexo IV da LOA aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pela

emissão de ativos nominais, cujos encargos reais diminuem com o aumento da inflação. A estrutura de choques
da economia pode, então, sugerir um papel importante para a dívida nominal (vide em especial Bohn [1988]). ·
Correlação entre produto e inflação: se o produto tende a diminuir quando a inflação aumenta, é preferível que
as despesas totais do governo não aumentem simultaneamente, permitindo que a carga tributária necessária para
financiar os gastos permaneça relativamente constante. Títulos nominais, cujo valor real decresce com a inflação,
tenderiam, sob tais condições, a estabilizar a razão entre gastos totais e produto atenuando a variação da carga
tributária em face a variações no produto. · Correlação câmbio real e gastos: se os gastos do governo são
positivamente correlacionados com a moeda estrangeira, é recomendável a diminuição da dívida em moeda
estrangeira e aumento da dívida nominal, de forma a imunizar o orçamento de variações imprevistas no câmbio.
Texto para Discussão nº 411. Uma nota sobre A Composição Ótima da Dívida Pública – Reflexões para O caso
brasileiro- Departamento de Economia PUC - Rio. Disponível em: http://www.econ.puc-rio.br/pdf/td411.pdf
112
Informativo Conjunto PLOA 2015 Principais aspectos característicos do Projeto de Lei Orçamentária para
2015 (PL nº 13/2014-CN, encaminhado por intermédio da Mensagem nº 251/2014)
126

Presidência da República, convertida na Lei nº 13.115, de 20/04/2015, publicada no DOU de


22/04/2015.

Observe-se que os valores aprovados na LOA113 diferem do PLOA em razão das


alterações realizadas no projeto original, ou seja, a meta original era uma expectativa de
receita na ordem de R$ 2.863,4 trilhões de reais, enquanto a aprovada foi de R$ 2.876,6
trilhões de reais, uma diferença de R$ 13,2 bilhões de reais, que se aproxima aos valores das
emendas parlamentares114, aprovadas pelo Congresso e sancionadas pela Presidência da
República.

Tabela 02 – Principais Componentes da LOA/2015 Em bilhões de Reais


LOA (Líquido de
Descrição LOA 2015 Refinamento da Dívida refinamentos)
Receitas Despesas Receitas Despesas Receitas Despesas
Orçamento fiscal e da seguridade social 2.876,6 2.876,6 904,5 904,5 1.972,1 1.972,1
Orçamento fiscal 2.183,2 2.079,5 904,5 904,5 1.278,7 1.175,0
Orçamento da seguridade social 693,3 797,0 693,3 797,0
(+) Orçamento de investimento em estatais 105,8 105,7 105,8 105,8
Total aprovado 2.982,5 2.982,5 904,5 904,5 2.077,9 2.077,9
Fonte: Disponível no Sítio http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13115.htm

A administração ainda necessita efetuar o repasse115 dos impostos para os demais


entes da Federação, antes de iniciar a alocação de receitas e despesas no orçamento.
Identificadas as receitas e despesas liquidas, começa a ordenação dos novos valores líquidos,
correspondentes aos recursos disponíveis para a União. Assim, somente após os refinamentos
e repasses, é que a União conhece os reais montantes do orçamento.

A propósito, a modelagem orçamentária adotada no Brasil (orçamento-programa)


pressupõe um planejamento de médio/longo prazo de todas as atividades governamentais,
previsto no Plano Plurianual e na Lei de Diretrizes Orçamentária, que orientam a elaboração
do projeto de LOA, mas que não são as referências para determinar os valores de receitas e
despesas líquidas disponíveis. Ou seja, os valores das tabelas acima não são obtidos pela
analise das despesas, gastos e desembolsos exigidos para o exercício financeiro; do contrário,
a expectativa de receitas deveria ser suficiente para a satisfação de todos os interesses da

113
Casa Civil da Presidência da República - Lei nº 13.115/2015
114
Anexo I, quadros de Emendas Parlamentares aprovadas em 2014 e 2015.
115
Previstas nos artigos 157 a 162, da Constituição Federal,
127

sociedade e da Administração Pública, assim como não seriam recursos escassos.

Deste modo, o passo inicial para a elaboração é estabelecer uma previsão de receitas
com suporte nos inúmeros fatores econômicos, políticos, sociais, em contexto
macroeconômico e globalizando, que afetam a arrecadação de tributos e das demais receitas
da União. Encerrada esta fase, definida a previsão de recursos, inicia-se o periodo de escolha
de distribuição das receitas, priorizando os gastos com a Administração e com os programas e
políticas públicas de cada governante, que dependem sempre de contextos flexíveis a cada
ano.

Nesta mesma linha, na determinação de onde serão aplicados os recursos, a


Administração necessita priorizar os fundamentos e objetivos do Estado brasileiro, assim
como assegurar minimamente os direitos fundamentais individuais e sociais previstos na
Constituição brasileira. E é exatamente neste aspecto que o orçamento-programa difere dos
demais, em especial, do orçamento tradicional, conforme destacado no Quadro 1 que
diferencia as características básicas do orçamento tradicional e do orçamento-programa, no
item 3.2.2 da dissertação.

Dentre as principais diferenças, destacam-se: a alocação de recursos objetiva a


consecução das metas programadas. As tomadas de decisões orçamentárias são,
metodologicamente, avaliadas e analisadas, com a adoção de técnicas para determinar as
possíveis opções, bem como a utilização sistemática de indicadores e padrões de medição do
trabalho e dos resultados. Igualmente, o controle e o acompanhamento visam a avaliar a
eficiência, a eficácia e a efetividade das ações governamentais a cada período.

4.1 2 Análise dos planos e metas do Governo Federal

Outro aspecto que cabe destaque na modelagem orçamentária adotada no País é o


grau de flexibilidade de mudanças nas metas projetadas, sem perder o objetivo da lei
orçamentária. De um lado, trabalhar com a possibilidade de flexibilização permite a correção
de eventuais equívocos na propositura das metas, e corrigi-las ante a realidade
contextualizada, principalmente em relação a previsões de índices econômicos, que dependem
de um complexo número de variáveis. Segundo Giacomoni (2012, p. 27), “esta flexibilidade
embutida no sistema fiscal é responsável por reações automáticas que, em algumas
circunstancias, auxiliam o alcance das metas visadas pela política do setor publico [...]”.
128

Deste modo, o Governo Federal reduziu as metas traçadas na LDO para o


crescimento real do PIB do País para 2015. Ainda durante a fase a discussão do PLOA, a
meta116 era de 3% e foi reduzida para 0,80%, conforme a Tabela 03. É o que se verifica da
leitura do Parecer nº 45, de 2014 – CN, com base nos dados do Relatório Focus do Banco
Central brasileiro.

Tabela 03 – Projeção do crescimento real do PIB em 2015


PLDO 2015
Parâmetro Diferença
Original Substitutivo
Crescimento do real
3,00 0,80 -2,20
do PIB em (%)
Fonte: Disponível no Sítio: http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/orcamentobrasil.htm

Mais uma vez, apenas três meses após a aprovação117 da LOA de 2015, os ministros
Joaquim Levy, da Fazenda, e Nelson Barbosa, do Planejamento, Orçamento e Gestão,
divulgaram a revisão, para baixo, das metas de superávit primário de receitas e despesas
orçadas para 2015, sob a alegação de retração econômica com reflexos na arrecadação dos
tributos, que levou a aumentar o contingenciamento das despesas fixadas para 2015.

Tabela 04 – Revisão da Meta de Superávit Primário na LDO/2015


Em milhões de Reais
Descrição Previsão Revisão Redução
Superávit primário 55,2 5,8 49,4
Superávit primário não financeiro 66,3 8,7 57,6
Total aprovado 121,5 14,5 107
Fonte: Disponível no Sítio http://www.planejamento.gov.br/assuntos/orcamento/
noticias/governo-informa-revisao-da-meta-de-superavit-primario

Visível é a flexibilidade que há nas revisões de metas em matéria orçamentária, pois,


no primeiro momento, procedeu à revisão da projeção de crescimento, e, no dia 22 de julho de
2015, os mesmos ministros divulgaram uma nova revisão no orçamento. Desta vez, foi na
meta de superávit primário de R$ 121,5 milhões de reais para 14,5 milhões de reais, o que
representa uma redução de 107,0 milhões de reais, conforme Tabela 4.

116
Parecer nº 45, de 2014 - CN (Projeto de Lei n° 3, de 2014 – CN) Sítio do Senado Federal
117
Aprovada a LOA de 2015 em 22/04/2015.
129

Esta revisão promoveu um corte na LOA de 2015 na ordem de 8,6 bilhões de reais de
despesas e o mesmo valor em expectativas de receitas. Os cortes foram expressos no
Relatório118 de Avaliação do Cumprimento das Metas Fiscais publicado em julho de 2015,
que evidencia as revisões de receitas fiscais e extrafiscais, assim como de despesas em
distintos órgãos da Administração pública federal.

Como expresso anteriormente, todavia, o orçamento é elaborado com base nos dados
do orçamento do exercício financeiro anterior, com alterações em um número limitado de
rubricas e variáveis econômicas. O ideal seria a adoção de um sistema orçamentário que
admitisse não só o acompanhamento, mas também que possibilitasse contínuas revisões não
somente das metas traçadas, mas também do orçamento, e que resultasse em uma algum tipo
de satisfação social.

Tabela 05 – Cortes na LOA/2015 Em milhões de Reais.


Cortes por Poderes e MPU Variações
Poder Executivo 8.474,5
Poder Legislativo 16,3
Poder Judiciário 77,9
Defensoria Pública da União 2,2
Ministério Público da União 28,9
Conselho Nacional de Ministério Público 0,2
Total 8.600,0
Fonte: Disponível no Sítio http://www.planejamento.gov.br/assuntos/
orcamento/noticias/governo-informa-revisao-da-meta-de-superavit-primario.

O corte acima representa uma redução de R$ 8,6 bilhões de reais nas despesas.
Somente no Poder Executivo, onde ocorreu o maior corte, a redução foi de 8,4 bilhões de
reais, com repercussão imediata e de curto prazo no pagamento das dívidas públicas e nos
planos sociais e de desenvolvimento regional no Governo Federal, conforme planilhas
descritivas dos cortes apontados no Relatório de Avaliação do Cumprimento das Metas
Fiscais. Os outros 125,5 milhões de reais estão distribuídos nos demais poderes e Ministério
Público da União, conforme Tabela 05.

118
Relatório Disponível no Sítio: http://www.orcamentofederal.gov.br/informacoes-orcamentarias/arquivo-
relatorios-de-avaliacao-fiscal-e-cumprimento-de-metas/2015.pdf
130

Como anteriormente exposto, a elaboração das normas orçamentárias deve atender à


Constituição Federal e à Lei Federal nº 4.320/64, sob pena de violação de preceito
constitucional. Assim, a maleabilidade á pouco mencionada, não se aplica a aumentos de
despesas e criação de alocações, ressalvadas as aberturas de créditos adicionais para atender a
situações excepcionais. A regra é que a LOA deva ser cumprida dentro dos parâmetros
estabelecidos no PPA e na LDO, bem como observando com rigor os valores votados e
aprovados pelo Congresso Nacional.

Cabe salientar que o Poder Legislativo tem a função atípica de fiscalizar e controlar
os atos do Executivo119 e, em matéria de finanças, o faz por meio do orçamento anual. Para
que haja segurança jurídica é mister que tais normas sejam alteradas em caráter de exceção,
assim como somente tais alterações devem ser motivadas. Além da segurança, a regra de
rigidez atua com função estabilizadora da economia. Para Giacomoni (2012, p.27), as
mudanças no orçamento, tanto na receita como na despesa, podem ser adicionadas pela
política de estabilização.

A despeito da disposição de mudanças orçamentárias em razão da necessidade de


estabilidade, não está descaracterizada a disposição constitucional, traduzida pelo princípio da
prevalência - relevante instrumento quando se trata de matéria orçamentária pública. Este
implica a máxima disciplinada no art. 35, § 2º do ADCT, segundo o qual a aprovação
orçamentária deve ocorrer antes do inicio do exercício financeiro. Portanto, a abertura de
créditos adicional deverá ser observada como exceção e não como regra, do que decorre a
necessidade de “aprovação pelo Poder Legislativo por maioria absoluta” (Art. 167, III,
CF/88).

4.1.3 Abertura de créditos adicionais ao orçamento anual

Falar em orçamento é antes de tudo falar de recursos escassos. O sistema de


desembolsos de recursos públicos requer previsões claras e está disciplinado no Decreto lei n°
200/67, que “assegura a liberação automática e oportuna dos recursos necessários à execução
dos programas anuais de trabalho” na esfera da Administração publica federal. Na liberação

119
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
(...)
X - fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os
da administração indireta.
131

de recursos, há um fluxo continuo de controle em quatro fases gerais: solicitação, análise de


verificação dos recursos, autorização e liberação.

Deste modo, as liberações são feitas em favor da unidade detentora do crédito


orçamentário autorizado, e a unidade cedente repassará os recursos financeiros aos demais
órgãos, ao que se denomina, em finanças públicas, de “descentralidade de crédito’. Tem-se,
assim, um controle efetivo do Erário, cujo objetivo é reduzir os desperdícios e a má utilização
dos recursos públicos (vide Quadros constante do Anexo I).

Quaisquer que sejam, no entanto, a retificação e a alteração da lei orçamentária


durante execução, é requerida a adoção de procedimentos especiais, dentre os quais se
destacam três: a autorização de créditos suplementares obtida na própria lei orçamentária, a
abertura de créditos extraordinários por meio de medidas provisórias e alterações nas novas
categorias classificatórias como modalidade de aplicação, fontes de recursos, como
apresentado por Giacomoni (2012). Ademais, falar em abertura de créditos ao orçamento é
destacar os princípios que norteiam as finanças públicas. Tanto a Constituição, quanto a Lei
nº 4.320/64 evidenciam a questão central do controle externo: a arrecadação e aplicação dos
recursos públicos e a necessidade de observância das regras financeiras estabelecidas no
orçamento. (GIACOMONI, 2012, p. 333-337).

4.1 3.1 Abertura de créditos suplementares

Tal permissão está disposta no art. 165, § 8º da Constituição federal120 “a lei


orçamentária poderá trazer autorização para a abertura de créditos suplementares”, por atos
editados no âmbito de cada Poder, respeitadas as previsões orçamentárias e demonstrada a
necessidade.

No Brasil, esta autorização para a abertura dos créditos suplementares121 é de


competência exclusiva do Poder Legislativo, que poderá conceder autorização genérica,
evitando provimentos legislativos desnecessários a cada situação concreta.

120
Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:
(...)
§ 8º A lei orçamentária anual não conterá dispositivo estranho à previsão da receita e à fixação da despesa, não
se incluindo na proibição a autorização para abertura de créditos suplementares e contratação de operações
de crédito, ainda que por antecipação de receita, nos termos da lei. (Grifou-se)
121
Art. 167. São vedados:
132

Esta disposição está amparada em duas motivações básicas. A primeira decorre de


imprevisibilidade orçamentária. São desembolsos cuja realização antecede à própria LOA,
como nos casos de projetos previstos no PPA não ajustados para o exercício financeiro. A
segunda decorre de vinculações legais entre receitas e despesas, e se opera quase que
automaticamente, como no caso de superávit primário, quando a receita no exercício excede a
expectativa de receita, possibilitando a inclusão de gastos já alocados, mas deficientes de
recursos para seu desembolso.

Esta modalidade de crédito adicional é adotada pelo Direito orçamentário nacional,


diferentemente do modelo inglês e estadunidense, onde o crédito adicional requer sempre a
autorização legislativa individual, ou seja, uma autorização para cada necessidade específica.
Como destaca Giacomoni (2012, p. 334), todavia, “a concessão de autorização genérica para a
abertura de crédito suplementar tem sido tradicional nos orçamentos federais, especialmente
nos últimos quatro anos122, quando o mecanismo vem sendo empregado de forma ampla e
variada”.

4.1.3.1 Abertura de créditos extraordinários

Esta modalidade de crédito já existe desde a Constituição de 1934, como única


modalidade de alteração ou retificação do orçamento público. O constituinte de 1987/1988
ampliou para as três modalidades descritas no subitem 4.1.2. Outrossim, a atual redação
acrescida pela Emenda constitucional nº 32/2001 ampliou as situações em que podem ser
utilizadas, bem como estabeleceu a Medida Provisória como instrumento normativo para a
abertura desta modalidade de crédito pela Presidência da República.

(...)
V - a abertura de crédito suplementar ou especial sem prévia autorização legislativa e sem indicação dos recursos
correspondentes;
VI - a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra
ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa;
(...)
§ 2º Os créditos especiais e extraordinários terão vigência no exercício financeiro em que forem autorizados,
salvo se o ato de autorização for promulgado nos últimos quatro meses daquele exercício, caso em que, reabertos
nos limites de seus saldos, serão incorporados ao orçamento do exercício financeiro subsequente.
A abertura de crédito extraordinário somente será admitida para atender a despesas imprevisíveis e urgentes,
como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública, observado o disposto no art. 62.
122
Giacomoni possivelmente estaria se referindo ao último mandato de Presidente Lula, pois esta edição é datada
de 2012. Ademais corresponde ao período de maior apoio do Governo federal pelo Congresso Nacional.
133

Deste modo, observa-se que houve ampliação excessiva, para muitos, das
possibilidades de abertura dos créditos adicionais, que justifica a colocação de Giacomoni ao
assinalar que houve aumento na utilização dos créditos nos “últimos quatro anos, [...]
empregado de forma ampla e variada”, que beira a banalização do orçamento público. A
abertura de crédito para aumentar despesas não previstas no orçamento está prevista no art.
35, da Constituição de 1934, somente em “caso de guerra, comoção interna e calamidade
pública”.

Rocha (2009), em pesquisa na UnB, problematizou os principais motivos para a


utilização tão frequente do crédito extraordinário. Apontou nos resultados coletados do
Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAFI) e de entrevistas realizadas no
Congresso Nacional, “que para 70,59% dos entrevistados os créditos abertos não obedeceram
aos pressupostos da imprevisibilidade e da urgência [...]”, e complementa: “percepção
confirmada pela análise dos créditos extraordinários abertos nos últimos 14 anos” que não
obedeceram aos pressupostos há pouco mencionados.

Ao dispor sobre a abertura de crédito extraordinário por meio de medida provisória


(texto acrescido pela EC nº 32/2001), acarreta instabilidade jurídica, pois esta poderia receber
emendas em sentido contrário ao pretendido, ou até mesmo ser rejeitada pelo Congresso
Nacional. A utilização de medidas provisórias, em geral, produz desconforto, especialmente
em matéria orçamentária. À luz da Hermenêutica Constitucional, o fundamento para o
legislador derivado, possivelmente, tenha sido o caráter da urgência da ação governamental,
deixando de lado a regra da prévia autorização para realizar de aumento de despesas na lei
orçamentária. Neste sentido, o STF decidiu na ADI nº 4.049-MC, Rel. min. Ayres Brito.
julgamento em 5/11/2008, plenário, DJE 8/5/2009, que a utilização de medida provisória para
abertura de crédito somente deveria ser tentada para atender a despesas imprescindíveis e
também relevantes, concomitantemente.

No entendimento do STF, tais créditos não são simples despesas de custeio ou


investimentos “[...] que evidentemente não se caracterizam pela imprevisibilidade e urgência
viola o§ 3º do art. 167 da CF. Violação que alcança o inciso V do mesmo artigo na medida em
que o ato normativo adversado vem categorizar como de natureza extraordinária crédito que
em verdade, não passa de especial, ou suplementar”.
134

Cabe aqui destacar o fato de que não foram feitas considerações sobre a última
modalidade de adicional de crédito, isto é, que trata das alterações nas novas categorias
classificatórias, podendo se desviar do objeto da pesquisa e cujas anotações decorrem da
própria LDO.

4.2 O orçamento supostamente impositivo

A ideia de orçamento impositivo remonta ao authoritative budget dos Estados


Unidos da América, onde o orçamento é uma lei que cria deveres e obrigações para o Poder
Executivo sob pena de responsabilidade política e criminal, que não difere em muito do
preceito disto no art. 85, VI da Constituição brasileira de 1988123. A diferença entre o
destaque estadunidense e o brasileiro não é de natureza jurídica, mas sim política.

A Constituição dos Estados Unidos dispõe na seção 6, do artigo I, que “[...] nenhuma
pessoa ocupando cargo no Governo dos Estados Unidos poderá ser membro de qualquer das
Câmaras enquanto permanecer no cargo”. A inversão do texto revela com clareza a questão:
os membros das Câmaras (Congresso), enquanto permanecerem nos cargos, não poderão
ocupar cargos no Governo. Esta é a diferença entre o modelo ianque e o brasileiro.

O Brasil importou não somente o sistema presidencialista e o modelo federalista de


Estado, mas também alguns desvios, como o sistema de lobbying124 dos EEUU, nos diversos
órgãos do Estado, e o sistema de emendas parlamentares, pejorativamente conhecido pork
barrel125 ,comum entre os congressistas126. A questão central do orçamento impositivo

123
Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição
Federal e, especialmente, contra:
(...)
VI - a lei orçamentária.
124
Lobbying – atividade de pressão de um grupo organizado (de interesse, de propaganda etc.) sobre políticos e
poderes públicos, que visa exercer sobre estes qualquer influência ao seu alcance, mas sem buscar o controle
formal do governo; campanha, lobismo. Disponível em: http://bemfalar.com/significado/lobby.html. Acesso em
22/05/2015.
125
Pork Barrel – Appropriations of public funds by Congress (or other legislative assemblies) for projects that do
not serve the interests of any large portion of the country's citizenry but are nevertheless vigorously promoted by
a small group of legislators because they will pump outside taxpayers' money and resources into the local
districts these legislators represent. Successful promotion of such pork-barrel legislation (often through skillful
logrolling) is very likely to get the legislator re-elected by his constituents. Classic examples of such pork-barrel
legislation include Federal appropriations bills for dams, river and harbor improvements, bridge and highway
construction, and job-training centers, as well as legislation designed to prevent closure of obsolete or unneeded
military installations, prisons, VA hospitals and the like. Disponível em: https://www.auburn.edu/~johnspm
/gloss/pork-barrel-legislation
135

consiste na vinculação, à lei, na realização dos valores fixados no orçamento a título de


despesas, gastos e desembolsos, que representa dizer que se retira do Poder Executivo a
possibilidade de contingenciamento dos gastos, priorizando uns em detrimento de outros, o
timming das liberações.

Neste sentido, o orçamento impositivo mostra-se como possível solução para uma
antiga demanda do Parlamento nacional, de pôr fim à subserviência do Poder Legislativo ao
Executivo, que, em tese, encerraria os contínuos embates entre estes Poderes. Não é essa,
porém, a leitura que se faz da Emenda Constitucional nº 86, de 17 de março de 2015, como se
verá nos itens a seguir.

4.2.1 Conteúdo específico extraído da Emenda Constitucional

Partindo da leitura do texto da Emenda constitucional nº 86/2015 é possível


apreender tratar-se de uma emenda com apenas cinco artigos, que modifica parcialmente os
artigos 165, 166 e 198 da Constituição Federal de 1988. O art. 1º altera o III, do § 9º, do art.
165; o altera o § 9º do art. 166127; inclui os §§10, 11, 12, 13, 14 incisos I, II, III e IV, §§ 15,
16, 17 e 18 do art. 166; altera o I do § 2º, e o I do § 3º do art. 198, e revoga o inciso IV do art.
198.

No art. 2º, o legislador estabeleceu os percentuais da receita corrente líquida e prazos


para aplicação de cada alíquota: no primeiro exercício subsequente ao da promulgação da
Emenda Constitucional - 13,2%; no segundo - 13,7%; no terceiro - 14,1%; no quarto - 14,5%
e quinto exercício 15% da receita corrente líquida. O artigo 3º da Emenda Constitucional
dispõe sobre “as despesas com ações e serviços públicos de saúde custeados com a parcela da
União oriunda da participação no resultado ou da compensação financeira pela exploração de
petróleo e gás natural, de que trata o § 1º do art. 20 da Constituição Federal, serão computadas
para fins de cumprimento do disposto no inciso I do § 2º do art. 198, da CF”.

126
Conceitos apresentados por Eduardo Mendonça. Disponível em: http://jota.info/constituicao-e-sociedade-o-
falso-orcamento-impositivo. Acesso em: 25/05/2015.
127
Art. 166. Os projetos de lei relativos ao plano plurianual, às diretrizes orçamentárias, ao orçamento anual e
aos créditos adicionais serão apreciados pelas duas Casas do Congresso Nacional, na forma do regimento
comum.
(...)
§ 9º As emendas individuais ao projeto de lei orçamentária serão aprovadas no limite de 1,2% (um inteiro e
dois décimos por cento) da receita corrente líquida prevista no projeto encaminhado pelo Poder Executivo,
sendo que a metade deste percentual será destinada a ações e serviços públicos de saúde.
136

A emenda em destaque dispõe, no artigo 4º, sobre a cláusula de vigência,


determinando que: “Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação e
produzirá efeitos a partir da execução orçamentária do exercício de 2014”. O último artigo da
Emenda revogou os incisos IV do § 3º do art. 198128, que dispunha originalmente sobre as
“ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e
constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: (...) § 3º Lei
complementar, que será reavaliada pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá: (...) IV - as
normas de cálculo do montante a ser aplicado pela União”.

Em linhas gerais, a Emenda Constitucional se limitou a fixar o percentual de 1,2% da


receita corrente liquida para as ementas individuais ao PLOA encaminhado pelo Poder
Executivo, bem como reservou e destinou 50% do percentual acima para a ação e serviços
públicos de saúde. Ademais, cabe observar que o dispositivo autorizativo de ementas
individuais e coletivas ao orçamento da União já possuía previsão constitucional, na
modalidade autorizativa, que facultava o Poder Executivo, segundo critérios de
discricionariedade e de prioridades, para liberar ou não os recursos, e em que condições
deverão ser liberados, sem necessidade de motivação. Portanto, a Emenda incrementou um
limitado número de alterações que não modificam a modelagem de orçamento-programa para
orçamento impositivo.

4.2.2 Ângulos de observação do Orçamento Impositivo

Hoje, vigoram pelo menos três versões de orçamento impositivo: uma extrema (de
cunho democrático), em que as propostas submetidas e aprovadas pelo parlamento deverão
ser obrigatoriamente obedecidas pelo Poder Executivo. A segunda é semiflexível que
determina (vincula) a obrigatoriedade a certos elementos do orçamento, deixando uma
margem que poderá ou não ser implementada pelo Poder Executivo. A última privilegia uma
visão menos rígida, ou ainda mais flexível do que a anterior, que permitiria que o Poder

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem
um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
(...)
§ 3º Lei complementar, que será reavaliada pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá: (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 29, de 2000)
(...)
IV - as normas de cálculo do montante a ser aplicado pela União.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de
2000).
137

Executivo deixasse de implementar determinadas despesas, sempre que houvesse


superveniência de fatos não previstos na lei orçamentária. Nesta modelagem, não se trata de
discricionariedade ou contingências, mas deixar de fazer em razão dos fatos supervenientes
mediante autorização dos representantes do povo.

A Ementa Constitucional não foi bem recebida na comunidade acadêmica e divide


opiniões. Damos destaque a Giacomoni (2011), Dallari (2011), Abraham (2013), Oliveira
(2013), Ommati (2014), Menezes e Pederiva (2014), Mendonça (2015) e outros, divididos
quanto à impositividade orçamentária como opção para a realidade brasileira. Há um
consenso, todavia, entre os dois grupos, que consiste na continuidade da modelagem
orçamento-programa no Brasil e não um modelo verdadeiramente impositivo.

De um lado, há quem afirme se tratar de um aperfeiçoamento nos mecanismos o


orçamento autorizativo, que poderá torná-lo mais eficiente e eficaz, habilitado a reduzir os
conflitos e a tradicional concepção de subserviência do Poder Legislativo ao Executivo.
Mesmo sem consenso, contudo, asseveram que uma nova modelagem orçamentária
(impositiva) exigiria mudanças mais profundas, que ultrapassariam as fronteiras da
redistribuição das responsabilidades e no maior envolvimento do Parlamento nas mudanças
sociais e culturais da sociedade brasileira.

Do outro lado estão os que afirmam tratar-se de mais uma importação do sistema
orçamentário dos EEUU, que não se aplica à realidade política e econômica nacional. Para
este grupo, em que se destacam Abraham, Dallari e Oliveira, para quem o Brasil já adota uma
modelagem Orçamento Impositivo129, antes mesmo da EC nº 86/2015. Em oposição aos que
vêem o orçamento impositivo como mecanismo de aperfeiçoamento do modelo vigente,
colocam-se os demais, que depositam no presidencialismo coalizão e segurança das
instituições políticas do País. Igualmente, advertem para o fato de que a tensão entre os
Poderes do Estado é benéfica, desde que dentro de certos padrões, e deverá continuar
existindo, sob pena de desintegração do sistema tripartite dos poderes.

Menezes e Pederiva (2014) assinalam que os defensores da impositividade do


orçamento se utilizam da experiência estadunidense. O processo orçamentário brasileiro
difere em muito do daquele País, principalmente em razão das diferenças no regime político e
na formação das instituições de cada Estado. Vê-se, então, que o orçamento impositivo é uma

129
Art. 165 § 8º Constituição Federal de 1988.
138

exceção e não a regra, como destaca Lima (2003), especialmente no caso brasileiro, onde
muitas mudanças necessitariam ser feitas130, que representam obstáculos a serem removidos;
até mesmo porque o orçamento no Brasil representa um importante instrumento para a
governabilidade e que hoje a maioria dos recursos orçamentários possui vinculação
obrigatória no seu cumprimento. Neste sentido, há quem defenda a ideia de que a Lei de
Responsabilidade Fiscal introduziu o modelo impositivo de orçamento no Brasil.

A LRF estabeleceu padrões e limites para a fixação de gastos e despesas, tendo como
base as expectativas de receitas de cada exercício financeiro. Tem-se como exemplo as
transferências para os entes da Federação - estados, Distrito Federal e municípios; as
transferências relativas à Lei Kandir; as relativas à Lei Orgânica da Assistência Social; os
subsídios e subvenções com o Sistema Único de Saúde, os benefícios da previdência social
são todas despesas de cumprimento obrigatório, que, para Lima (2003, p.7), abrangem quase
90% das despesas totais.

Outras despesas obrigatórias são as com: custeio dos ministros de Estado e com
obras em andamento, cujas interrupções acarretariam em grandes prejuízos ao Erário. A
vinculação de recursos arrecadados foi bem assimilada, após uma fase polêmica nos anos que
se seguiram à promulgação da Constituição, e representou um avanço nas normas de Direito
financeiro no Brasil. Ademais, a LRF regulamentada pela Lei nº 10.028/2000 instituiu a
criminalização dos atos do gestor público, consolidando princípios e regras, já existentes, para
a Administração Pública. A lei introduziu um capítulo especial no Código Penal, dos “crimes
contra as finanças públicas” (art. 359-A a 359-H).

Abraham (2013, p.222) menciona que “[...] a doutrina mais moderna e a


jurisprudência brasileira recente vem caminhando no sentido de reconhecer ao orçamento
público o seu conteúdo material e conferir a forca impositiva que lhe é inerente no Estado
Democrático de Direito”. Na mesma direção, consoante Dallari (2011, p.327), “[...] de nada
vale assegurar a participação popular no momento de elaboração do orçamento se, no decorrer
do exercício financeiro, o Poder Executivo não tiver o dever de executar o que foi planejado
[...]”.

130
Edilberto Carlos Pontes Lima (2003) enfatiza as mudanças, em especial, no sistema partidário e eleitoral,
capaz de assegurar a governabilidade, com a maioria do Congresso Nacional.
139

Para Menezes e Pederiva (2014, p.19), “[...] o orçamento impositivo não resolverá
aos problemas orçamentários brasileiros. O capital político empregado nessa discussão seria
bem mais utilizado no aperfeiçoamento dos mecanismos institucionais existentes ou já
previstos [...]”.

Lima (2003) ressalta que algumas sociedades adotantes do orçamento impositivo


“[...] são sociedades que atribuem grande valor a uma maior participação dos diferentes
representantes do povo no processo orçamentário. Outras, talvez com problemas mais
urgentes [...] preferem menos democracia a perderem velocidade nas decisões”. Deve ser este
o caso brasileiro, com problemas urgentes a serem solucionados que necessitam da atenção do
corpo político. Ademais, o regime presidencialista no Brasil enfrenta sucessivas crises, em
especial, de governabilidade, chegando a índices baixíssimos de aprovação nas pesquisas
oficiais do próprio Governo. O presidencialismo encontrou na coalizão política (na barganha)
uma solução para reduzir os conflitos e aumentar a governabilidade no País. Resta ao Poder
Executivo, todavia, requer a credibilidade e a confiança, devendo mostrar à sociedade mais
controle e rigidez com as finanças do Estado.

Como aponta Batista (2015), a solução encontrada pelos políticos brasileiros foi a
adoção da coalizão política, em que todos são beneficiados com arranjos políticos. A coalizão
representa bem a realidade do abrandamento das tensões entre Poder Legislativo e o
Executivo no Brasil, e será examina nos itens a seguir. É mister fazer uma análise abordando
os aspectos econômicos, políticos e jurídicos da Emenda Constitucional nº 86/2015, para
esclarecer alguns pontos ainda obscuros sobre a modelagem vigente e a pequena alteração a
que chamam de orçamento impositivo, a saber.

4.2.2.1 Aspectos econômicos

O modelo orçamentário brasileiro definido nos artigos 165 a 169 da Constituição de


1988 não prescreve textualmente a obrigatoriedade de cumprimento do orçamento, muito
embora uma expressiva parcela do orçamento possua elevado grau de vinculação e
destinação, como nos casos da saúde, educação, gastos com pessoal, limites estabelecidos no
plano constitucional. Com efeito, a Lei de Responsabilidade Fiscal representou um marco de
moralidade e transparência para a Administração pública na gestão das finanças do Estado.
140

A Emenda em destaque instituiu uma programação de prazos e percentuais para ser


utilizada pelo Poder Executivo no processo de elaboração do PLOA, bem como a fixação do
percentual da receita corrente líquida para as emendas individuais131 para parlamentares. Vale
aqui ressaltar os efeitos econômicos desta ilha132 que se criou com a impositividade destas
emendas parlamentares ao orçamento da União.

A Resolução nº 1/2006 do Congresso Nacional, estabelece: “cada parlamentar poderá


apresentar até 25 (vinte e cinco) emendas133 ao projeto, cabendo ao Parecer Preliminar fixar o
valor total do conjunto das emendas a serem apresentadas, por mandato parlamentar [...]”. A
ordem jurídica interna vigente até a publicação da Emenda Constitucional permitia que o
chefe do Poder Executivo se utilizasse da contingencialidade para liberar ou não os valores,
podendo impor limites para as despesas autorizadas pelo Congresso Nacional.

Durante a apreciação do PLOA de 2014, foram encaminhadas 7.776 emendas


134
individuais e 612 emendas coletivas, juntamente com 237 emendas, que, conjuntamente,
alteram o projeto original encaminhado pelo Poder Executivo. O valor total das emendas
individuais e coletivas representa 8,7 bilhões de reais, o equivalente a 14,68 milhões de reais
para cada parlamentar no Congresso Nacional. Os parlamentares deverão aplicar 7,34 milhões
de reais em projetos na área de saúde. Nesses 7,34 milhões de reais, estão incluídas as
despesas de custeio, tais como aluguel, água e luz, excluídos os gastos com pagamento de

131
Emendas individuais são recursos do orçamento público da União recebido por parte de cada parlamentar
para utilizar em programas e projetos em suas bases distritais Uma espécie de promoção pessoal feita pelo
parlamentar com seus eleitores que lhe assegure uma reeleição. Semelhante ao que ocorre na pork-barrel
legislation.
132
Ilha em sentido metafórico.
133
Art. 49. Cada parlamentar poderá apresentar até 25 (vinte e cinco) emendas ao projeto, cabendo ao Parecer
Preliminar fixar o valor total do conjunto das emendas a serem apresentadas, por mandato parlamentar, nos
termos do art. 52, II, i.
Art. 50. As emendas individuais: I - que destinarem recursos a entidades de direito público, deverão observar a
programação passível de ser objeto de emendas, definida pelo Parecer Preliminar; II - que destinarem recursos a
entidades privadas, deverão observar a programação passível de ser objeto de emendas, definida no Parecer
Preliminar e, cumulativamente: a) atender às disposições contidas na lei de diretrizes orçamentárias; b) estipular
as metas que a entidade beneficiária deverá cumprir, demonstrando a sua compatibilidade com o valor da
emenda; c) identificar a entidade beneficiada, seu endereço e o nome dos responsáveis pela direção; III -
deverão, no caso de projetos, resultar, em seu conjunto, em dotação suficiente para conclusão da obra ou da
etapa do cronograma de execução a que se refere. Parágrafo único. O Parecer Preliminar especificará os
elementos que deverão constar da justificativa das emendas individuais.
134
Pelo relatório preliminar da LOA, aprovado na madrugada de 21 de novembro, cada parlamentar teve R$
14,68 milhões para apresentar em emendas individuais ao Orçamento de 2014, sendo R$ 7,34 milhões
necessariamente para saúde, incluídas despesas de custeio, como pagamento de água e luz, e excluídos o
pagamento de pessoal e os encargos sociais, como o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). O total
destinado a apresentação de emendas individuais, de acordo com o relatório preliminar da LOA, ficou em R$
8,72 bilhões. Disponível no Sítio da Câmara: http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/459319.html.
141

pessoal e encargos sociais.

Já no orçamento para 2015, os 513 deputados e 81 senadores da República


propuseram ementas individuais135 e coletivas no montante de 9,7 bilhões de reais, o que
representa 1,2% da receita corrente líquida. Cada congressista receberá o valor de 16,32
milhões de reais para usar em seus estados de origem, entretanto 50% deste valor (8,58
milhões de reais) deverão aplicar em projetos na área de saúde. Ademais o Congresso
Nacional criou reserva de recursos na ordem de 30,9 bilhões de reais, cujos destinos serão
definidos por deputados e senadores no ano financeiro de 2015.

Vê-se que o objeto central da controvertida Emenda Constitucional se resume a uma


imposição ao Poder Executivo para o cumprimento das emendas parlamentares individuais e
coletivas, sem que o Executivo possa adotar qualquer medida de contingência na aplicação
destes recursos. Assim, as emendas configuram uma contribuição pecuniária institucional do
Congresso Nacional para a sociedade, de olho na reeleição. Em se tratando de recursos
escassos e de demandas as mais variadas, os milhões de reais que cabem a cada parlamentar,
isoladamente, são insuficientes para alavancar projetos de relevância, entretanto os bilhões de
reais (equivalentes a 1,2% da RCL) destinados a emendas individuais fazem falta na saúde, na
educação, na segurança pública. Assim, poderia se afirmar que o contingenciamento é
primordial para a governabilidade.

Não se cogitou, entretanto, em estabelecer que as possíveis revisões de metas,


superávit primário e receitas teriam repercussão nas ementas individuais para o Congresso
Nacional. Vale atentar para o fato que, até o mês de julho de 2015, o Governo federal já havia
feito três revisões nas metas e reduzido a dois terços das receitas, com o rebaixamento das
metas de superávit primário, como visto. Até onde a pesquisa examinou136, não há
dispositivos legais para a revisão de rebaixamento da dotação das emendas individuais nos
casos em que a receita liquida seja rebaixada. Como, porém, as despesas são revisadas com
base na revisão das receitas, pode ser que estejam incluídas as ementas parlamentares.

135
Os 594 deputados e senadores que compõem o Congresso Nacional terão direito a apresentar R$ 9,7 bilhões
em emendas individuais ao orçamento de 2015. Cada parlamentar poderá apresentar até R$ 16,32 milhões em
emendas, sendo que metade deste valor (R$ 8,15 milhões) terá que ir obrigatoriamente para ações e serviços de
saúde. No Orçamento de 2014, os congressistas apresentaram R$ 8,6 bilhões em emendas, geralmente destinadas
para investimentos em suas bases eleitorais. http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/479163.html
136
O exame das Leis nº 4.320/64 e LC nº 101/2000
142

Segundo Mendonça, o valor de “cada emenda é insuficiente para estruturar políticas


públicas abrangentes, e nem é essa a ideia. Os parlamentares utilizam estes milhões para fazer
política em suas bases eleitorais”. O autor ressalta, mais adiante, que o “Congresso mostra-se
ofendido com a retenção das emendas orçamentárias individuais, ao mesmo tempo em que
encara com naturalidade o contingenciamento de todo o resto”.

Em recente pesquisa, Batista (2015) identificou uma “conexão ministerial na


alocação do orçamento” público da União, destacando que a única participação direta dos
parlamentares na alocação dos recursos das emendas individuais para o seu eleitorado se
restringe ao momento da elaboração e aprovação das emendas parlamentares. A autora
constatou que as emendas reduzem, principalmente, os recursos de investimos das unidades
orçamentárias (os ministérios). Assim, cada ministro (parlamentares que fazem parte do
Governo) que participa da coalizão política representa um aliado para aqueles parlamentares.
Enxergou que as emendas estariam vinculadas às liberações de recursos orçamentários de
cada ministério.

4.2.2.2 Aspectos sociais

O constituinte de 1987/1988, desde a escolha do texto do Preâmbulo da Constituição


Cidadã, tratou de evidenciar os fundamentos e objetivos do Estado brasileiro. Desde aquele
momento, estavam grafados os valores e objetivos mais relevantes do povo brasileiro. A
vontade do povo na fundação de um Estado Democrático de Direito iniciou uma fase de
profundas transformações no modo de ver e sentir o Estado.

Este foi o marco histórico, jurídico e político que fundou a ordem jurídica e
estabeleceu as regras para a reestruturação das instituições (tradicionalmente instituições
autoritárias) do Estado brasileiro, assentado no principio democrático de direito. Partindo
desse encadeamento, leva a uma compreensão do sentido e axioma que se pretende para a
sociedade.

Na reflexão de Bonavides (2004, p. 301-302), as inovações foram inúmeras, “apesar


da ausência de educação política da sociedade brasileira [...]. “Nenhum povo, porém, sobre a
face da terra congrega hoje pressupostos tão favoráveis ao estabelecimento de uma sólida e
próspera ordem democrática quanto o povo brasileiro”. É um solo fértil para a formação de
uma nova sociedade baseada na meritocracia e não mais no patriarcal modelo de Estado.
143

Na questão orçamentária (como instituição democrática), são perceptíveis as


profundas mudanças no paradigma, na conquista e satisfação dos anseios da sociedade, por
meio da realização de políticas públicas voltadas para a erradicação da pobreza e
marginalidade, redução das desigualdades, e na busca pela promoção de melhoria na condição
de vida digna do povo.

Hodiernamente, a função primordial do orçamento é encontrar, dentro da escassez de


recursos, soluções para a realização destes fundamentos e objetivos assumidos pelo Estado,
em prol da sociedade. Na contramão, se postam os que encontraram no orçamento impositivo
uma honrosa solução para se perpetuarem no Poder às custas do patrimônio do povo, fazendo
política com o Erário, impondo ao Administrador do Estado brasileiro a obrigação de executar
o mandamento constitucional, introduzido pela Emenda Constitucional em debate.

Assim, são destinados aos parlamentares aqueles recursos que poderiam ser
utilizados pelo Poder Executivo para a realização daquelas finalidades escolhidas pelo
legislador constituinte, preteridas em prol das emendas parlamentares, que só beneficiam,
politicamente, os próprios congressistas, que visam à perpetuação no poder, por meio da
política de pork barrel.

Outrossim, os efeitos da implementação da EC, além de aumentarem o montante das


despesas legalmente obrigatórias, apontam negativamente para agravar a imagem do corpo
político brasileiro. É a percepção negativa que se cria com suporte na conscientização da
maneira como os recursos arrecadados pelo Poder Público estão sendo desviado para uma
minoria. É o que Mendonça denominou de “patrimonialismo institucional”, com a indução de
um novo modelo de clientelismo. Cabe ressaltar que o orçamento não é uma opção
democrática de tratar as finanças estatais, como muitos defendem.

4.2.2.3 Aspectos jurídicos

Sobre o aspecto jurídico do orçamento impositivo, é importante relembrar as lições


de Miguel Reale (2014, p.354), quando adverte para o fato de que “A vontade do Estado não é
a vontade individual de casa um e seus membros [...] feito em proveito de uma parte da
sociedade [...]”. O Poder pertence à instituição do Estado. Melhor seria observar mais a fundo
e ver que na realidade o que se reconhece como Poder do Estado “é sua forca institucional” e
144

não o poder em si. A identidade política no Estado deriva, inevitavelmente, do povo e deve
estar a serviço deste mesmo povo.

Ao longo dos últimos 30 anos, o Supremo Tribunal Federal promoveu mudanças na


interpretação da natureza do orçamento, que deixou de ser tratado como peça contábil
indispensável ao Direito financeiro para figurar como norma em sentido formal, com efeitos
político-administrativos certos. Permanecia inalterado, no entanto, o entendimento de
descabimento do controle de concentrado de constitucionalidade (na ADI nº 1.640). Somente
em 2008 a Corte passou a admitir o cabimento de recente decisão da ação direta em matéria
orçamentária. O precedente firmado na ADI nº 4.048-MC passou a ser adotado pelo STF para
outras demandas de natureza orçamentária. Posteriormente, o STF decidiu, na ADI nº 4.049-
MC, que a utilização de medida provisória para abertura de crédito somente deveria ser
tentada para atender a despesas imprescindíveis e também relevantes concomitantemente.

Em recente decisão, o ministro Luiz Lux137, do STF, emitiu parecer na ADI nº 4.663
sobre as normas orçamentárias

“[...] a denominada força vinculante mínima, a ensejar a imposição de um dever


prima facie de acatamento, ressalvada a motivação administrativa que justifique o
descumprimento com amparo no postulado da razoabilidade, sejam elas emanadas
da proposta do Poder Executivo ou fruto de emenda apresentada pelo Poder
Legislativo, de rocas modo que a atribuição de regime formal privilegiado
exclusivamente às normas oriundas de emendas parlamentares viola a harmonia
entre os poderes políticos (CF, art. 2º)”.
Pelo que se pode observar em breve, possivelmente, a Corte tenha que examinar a
constitucionalidade da Emenda nº 86/2015, pelo flagrante descompasso em relação à
realidade brasileira, como ocorreu nos Estados Unidos. Lá o Congresso travou uma
verdadeira batalha contra o Executivo, para ter reconhecida a primazia legislativa em matéria
orçamentária. Este ambiente de tensão entre os poderes costuma ser resolvido por meios
políticos, principalmente intermediado por acordos políticos e troca de interesses, como no
presidencialismo brasileiro.

4.3 Presidencialismo de coalizão no Brasil

Como visto no capítulo 2 desta dissertação, o Brasil irrompeu o século XX com uma

137
STF ADIn 4.663/RO, Rel. Min. Luiz Fux. Sítio do STF. Disponível em: http://stf.jusbrasil.com.br/
jurisprudencia/25342061/referendo-na-medida-cautelar-na-acao-direta-de-inconstitucionalidade-adi-4663-df-
stf/inteiro-teor-159437241.
145

Constituição republicana, presidencialista, proclamando avanços e o desenvolvimento, em um


projeto de estruturação do Estado brasileiro recém-saído do modelo imperial. Nas ordens
jurídicas constitucionais que se seguiram, restou preservado o regime presidencialista, com
exceção, durante um curto espaço de tempo, quando assumiu o Conselho de Ministros
(parlamentarismo de 1961/1962) e durante o regime militar (1964-1984). Assim, pode-se
afirmar que o presidencialismo é uma tradição no constitucionalismo brasileiro.

As relações entre os poderes estatais brasileiros, em especial, entre o Executivo e o


Legislativo, passaram por momentos difíceis, como nos períodos em que houve o fechamento
do Congresso Nacional, na fase de suspensão de suas atividades e nos governos que
restringiram as competências privativas do Legislativo. Em todas estas fases, o poder estivera
concentrado no Poder Executivo, ora em virtude dos movimentos fascistas, ora em razão da
insegurança das instituições e ainda sob a alegação da segurança nacional. Feitas estas
considerações preliminares, iniciar-se-á o estudo sobre o presidencialismo de coalizão no
Brasil.

O mecanismo de coligação partidária é, antes de tudo, desejável na composição de


uma casa legislativa. Tal estrutura é adotada no regime parlamentarista, uma vez que o chefe
de Governo é um membro do parlamento, portanto, lida com seus pares, diferentemente do
chefe de Estado (monarca ou presidente) que atua na sua representação, distante dos negócios
do parlamento. Naquele caso, o que está em questão é o apoio político para aprovação de um
projeto de lei, de uma política a ser implementada que requer uma maioria no parlamento para
aprovação. Neste caso, a moeda de troca poderá ser a promessa de retribuição em situação
idêntica. Como seria possível, todavia, no regime presidencialista? E qual é a moeda de troca
entre o chefe de Governo e os membros do Poder Legislativo?

Vale observar que, mesmo antes do golpe militar de 1964, as relações do chefe do
Poder Executivo com o parlamento eram baseadas em alianças formadas com apoio em
acordos entre partidos políticos, durante as campanhas eleitorais. Por certo, o objetivo sempre
foi o poder, isto é, formar a maior bancada, com o maior número de aliados políticos. Qual
seria, porém, a contrapartida por este apoio para obtenção do poder?

Nos anos de 1960, nos Estados Unidos, William Riker publicou sua teoria política
denominada The theory of political coalitions ou “a Teoria de Coalizão Política”. Nela Riker
exprime os argumentos baseados na barganha política para a formação do governo, que não
significa a formação de uma maioria absoluta no Legislativo como no regime parlamentarista,
146

mas apenas o número de cadeiras necessárias para governar. Como esclarece Mariana Batista
(2015), “o foco está na formação do Governo com base na barganha entre atores racionais
maximizando a sua participação na distribuição do prêmio”.

Para a autora, o prêmio é o Governo, subdividido em subunidades – os ministérios –


distribuídas entre os vencedores. Em certa medida, há um elemento comum entre estes
agentes, o poder, que não assegura a formação de um governo. Para que as coalizões
compartilhem o Governo, é indispensável uma identidade ideológica capaz de promover
futuras políticas públicas que satisfaçam a todos os que formaram a coalizão. Assim, com o
ingresso de parlamentares da coalizão no Governo, assumindo importantes cargos nos
ministérios, e órgãos influentes na sua condução.

No Brasil o maior representante do governo de coalizão foi o sociólogo e cientista


político Sérgio Abranches (DADOS, 1988), que ficou conhecido como o criador da expressão
“presidencialismo de coalizão no País”. Observando o comportamento dos políticos
brasileiros no período do pós Segunda Guerra, escreveu uma historiografia do
presidencialismo brasileiro, revelando a formação de "grandes coalizões no Brasil, entre 1946
e 1964”. Percebeu as especificidades do modelo presidencialista brasileiro, confrontando a
coalizão no regime parlamentarista em alguns Estados na Europa.

O autor percebeu uma semelhança entre eles, entretanto, esta semelhança não poderia
ser descrita por se tratar de regimes de governo diferentes. Nos regimes parlamentaristas, o
“resultado imediato do enfraquecimento da aliança é a dissolução do gabinete e a tentativa de
recomposição de uma coalizão de governo, enquanto que no caso do presidencialismo de
gabinete demite-se o ministro preservando a autoridade do presidente”. O regime
presidencialista de “coalizão é o próprio presidente quem deverá demitir o ministro e buscar a
recuperação de sua base de apoio” (ABRANCHES, 1988).

O autor aponta para a abordagem sobre as distorções do presidencialismo feita por


Bonavides (2004d, p. 271-272)138 e para a difícil tarefa de negociar uma coligação no Brasil.

138
Uma das mais graves distorções do presidencialismo concentra-se ao redor de elementos que agravam
habitualmente a crise do sistema, quais sejam: a ausência de confiança na competência dos quadros dirigentes,
com grave dano às bases da legalidade governativa; a elevação do grau de influência do estamento burocrático
que, em vez de ser um braço da administração, se transmuda na cabeça de todo o sistema de governo com o
poder que o presidencialismo outorga neste País aos tecnocratas; o declínio da função parlamentar, que se mede
estatisticamente pela perda da participação do Congresso na feitura das leis; o dilúvio normativo de decretos-leis
e atos ministeriais que não raro arrebatam a competência constitucional do Poder Legislativo; o exercício de
prerrogativas da soberania nacional, sem audiência do Congresso, pelos ministérios da área econômica, quando
147

Destaca ser uma dificuldade histórica, que encontrou no final do túnel o Presidencialismo de
Coalizão.

Abranches (2014), em recente artigo científico, publicou que o presidencialismo de


coalizão permite que um presidente com um percentual de aceitação popular “acima de 55%
sequer precisa de habilidade ou emprenho para negociar a adesão da coalizão a seu projeto de
governo ou neutralizar as tentativas da oposição de abrir dissidências na coalizão”.

Para o autor, “é um ciclo de gestão da coalizão facilitada pelo ambiente e pelo alto
poder de atuação do presidente”. Mostra que não são raras as coalizões que controlam mais de
70% da Câmara dos Deputados e mais de 51% do Senado Federal. Neste contexto, as forças
concentradas em torno e centradas no Presidente, Abranches apresenta o Quadro 3, abaixo.

Quadro 3 – Fase Centrípeta

Fonte: Abranches (2014) Disponível no Sítio: http://www.ecopolitica.com.br/2014/03/11os-ciclos-do-


presidencialismo-de-coalizao/

Abranches chama atenção para o fato de que essas composições são realizadas a cada
situação contingencial, pois “as coalizões são formadas por partidos de serviço [...] que

decidem sobre matéria econômica e financeira de caráter internacional, produzindo um ônus que compromete
toda uma geração; o desprestígio da lei e da Constituição como regras jurídicas abstratas de fixação de direitos e
deveres dos cidadãos; o excesso de decisionismo causuítico refletidos numa torrente de atos e medidas
executivas, eivadas de contradições, recuos, inconstitucionalidades e surpresas, caracterizando a indecisão e a
perplexidade; enfim, o divórcio entre o Estado e a Nação, o governo e a sociedade, o poder e a opinião: um fosso
que o presidencialismo tem alargado pela insuficiência de seus instrumentos participativos e pela privação do
diálogo ou de formas mais eficazes de comunicação da autoridade com o povo, este grande ausente do processo
político, este soberano tão sub-representado na modalidade presidencial de governo (BONAVIDES, p. 271-272).
148

buscam maximizar benefícios parlamentares para suas clientelas ou para si próprios”.


Utilizando as palavras do autor: “Elas se baseiam no “toma-lá-da-cá”, troca de cargos ou
verbas por votos, que fica visivelmente ameaçada com a mudança da liderança, gerando a
crise de governança, como pode ser constatado no Quadro 4.

Quadro 4 – Fase Centrífuga

Fonte: Abranches (2014) Disponível no Sítio: http://www.ecopolitica.com.br/2014/03/11/os-ciclos-do-


presidencialismo-de-coalizao/

Para Figueiredo e Limongi (2008), a ideia do apoio legislativo em troca de liberação


de verbas orçamentárias, referindo-se à entrega das emendas individuais, representa um
elevado custo no redirecionamento de recursos. Isto compromete o andamento da própria
agenda do Poder Executivo, que passa a ser constituída coletivamente (a que ela denomina
ruído parlamentar), que se justifica em razão dos contrabenefícios. Destarte, “a distribuição de
pastas ministeriais pelos partidos para a formação de um governo de coalizão envolve
concessões políticas por parte do presidente”(2008, p.154).

Neste sentido, há uma contrapartida pelos ganhos obtidos, assim como quando um
partido passa a integrar o Governo, o parlamento assume, extensivamente, a responsabilidade
na direção das políticas públicas, e a participação nas escolhas financeiras do Estado, mesmo
que indiretamente, via ministros de governo.

E quanto maior o número de ministérios no Governo, maior é o tamanho das


coalizões formadas, que atingiu seu índice mais elevado no segundo Governo do Presidente
149

Luiz Inácio Lula da Silva, com nove partidos políticos139 na base aliada, distribuídos entre os
24 ministérios. Isto pode ser compreendido com a visualização da Tabela 06, que evidencia o
número de ministérios nos governos dos presidentes de José Sarney até Dilma Rousseff.

Tabela 06 – Número de Ministérios por Governo


Ministérios Número
José Sarney 25
Fernando Collor de Melo 17
Itamar Franco 19
Fernando Henrique Cardoso 24
Fernando Henrique Cardoso 26
Luiz Inácio Lula da Silva 24
Luiz Inácio Lula da Silva 24
Dilma Rousseff 25 + 9140
Dilma Rousseff 26 + 9141
Fonte: Elaboração própria, com dados obtidos no Sítio do http://www2.planalto.gov.br/presidencia/ministros

Considera-se, no caso, que o Poder Executivo, contadas as coalizões, é composto por


vários partidos, que estão à frente de 26 ministérios e 9 secretarias de governo, diretamente
ligadas à Presidência da República, ficando mais fácil analisar as conexões entre o Governo e
o parlamento. Em primeiro lugar, é importante compreender como funciona a política de
nomeação de cargos para as funções mais elevadas ou escalão do Estado brasileiro.

Segundo a Lei nº 11.526/2007, a estrutura burocrática da União é formada por dois


níveis de cargos142 considerados como o primeiro escalão do Governo: os de natureza especial
(NES) e os de direção e assessoramento superior (DAS). Os cargos NES são aqueles de livre
nomeação e exoneração pelo chefe do Poder Executivo, dentre os quais os ministros de
Estado, a Chefia de Gabinete da Presidência da República, a Direção do Banco Central e a
Chefia da Procuradoria Geral da União. Já os cargos da DAS são dirigidos a quatro grupos de
ocupantes; servidores civis da União, servidores remanejados de outros órgãos da
Administração Pública federal, servidores aposentados e não servidores. Os cargos de nível 1
a 4 são nomeados e exonerados pelos ministros de Estado e os dos níveis 1 e 2 são

139
Dados disponíveis no Sítio da Presidência da República Disponível em: http://blog.planalto.gov.br/assunto/
base-aliada/.
140
25 Ministérios e nove Secretarias ligadas à Presidência da República.
141
26 Ministérios e nove Secretarias ligadas à Presidência da República.
142
Os cargos estão previstos na Lei nº 11.526, de 4 /11/2011, que fixa a remuneração dos cargos e funções
comissionadas da Administração Direta e Indireta da União.
150

considerados cargos de confiança da Presidência, que são nomeados e exonerados pelo


Presidente da República.

No modelo presidencialista brasileiro, o chefe do Poder Executivo é responsabilizado


pela condução do Governo, podendo ou não delegar aos ministros determinadas áreas
políticas, independentemente da pasta que ocupa. Neste sentido, parece ser apropriado afirmar
que o Presidente divide o Governo com seus ministros, em um sistema de coalizão partidária,
buscando assegurar a governabilidade do País. Este mecanismo não pode ser confundido com
governo ministerial próprio do regime parlamentarista, assim como a governabilidade é
própria do regime parlamentarista. Basta observar a substituição integral do Governo quando
um primeiro ministro perde a maioria do parlamento.

Igualmente, já parece apropriado afirmar que, no regime presidencialista brasileiro,


cada ministro é responsável pela realização das políticas de sua pasta, conduzindo o programa
do Governo com elevado grau de liberdade para decidir, não somente as questões
administrativas e burocráticas do cargo, mas, também, com relação às finanças e orçamento
da subunidade. Cada ministro assume a responsabilidade política, necessitando esclarecer,
prestar contas e, eventualmente, se retratando publicamente, em face às críticas da sociedade e
da mídia. Trata-se de um bônus e um ônus - a liberdade e a responsabilidade – úteis e
importantes para proteger a imagem do Presidente contra os desgastes políticos com o
parlamento e a sociedade.

Como visto anteriormente, a partidarização ministerial permite uma aproximação


entre o Governo e o Parlamento, e, consequentemente, o fortalecimento da imagem do
presidente entre os parlamentares. Cada ministro, dentro de seu partido, representa um elo da
coalizão pontual (caso a caso) que, cotejados, formam uma grande coalizão assegurando a
governabilidade. Quando há uma desavença entre o Poder Executivo e o Congresso Nacional,
que não consegue ser solucionado pelos ministros articuladores em geral, ocorre a
substituição imediata do ministro de Estado.

O novo ministro assume a dianteira das negociações, tendo o apoio dos


parlamentares de sua base aliada na conciliação dos interesses controversos. Vale atentar para
o fato de que a troca de ministro acarreta a substituição de todo um conjunto de cargos de
DAS, portanto um remanejamento de pequenos, porém significativos, agentes políticos que
modificam a configuração dos articuladores políticos de menor nível hierárquico, com se
constata nos Quadros 03 e 04 formulados por Abranches (2014).
151

Considerando esta situação, vê-se, no entanto, que o presidencialismo de coalizão


política envolve mais do que um pequeno grupo de agentes e articuladores, que juntos
representam o “governo” orbitando em torno da Presidência, que se destaca como o líder
coordenador deste imenso e complexo organismo - o Poder. Isto leva à seguinte reflexão: se o
ônus é grande, o bônus não pode ser menor.

Por certo a reflexão remete ao jogo de barganhas, troca de cargos e/ou verbas, como
indicado por Abranches (2014). O prêmio, entretanto, não pode ser somente o Governo e o
Poder como expressado por Batista (2015). Sob essa perspectiva, é notório outro viés da
função ministerial – a repartição dos recursos orçamentários destinados à sua subunidade
executiva, complementada pela repartição dos cargos, e o Poder em si.

Assim, o sistema de coalizão multipartidária adotado no Brasil representa uma


permanente troca de interesses entre os diversos agentes políticos envolvidos. Na esfera
orçamentária, é possível observar a liberação de recursos para execução das emendas
parlamentares (individuais e coletivas), em momentos de crise política, ou quando o Poder
Executivo encaminha mensagens e projetos de interesse de um ministério especial ou do
Governo, desde que contrários (direta ou indiretamente) aos interesses dos parlamentares.

Antes da aprovação da EC nº 86/201, a liberação dos valores alocados para as


emendas parlamentares dependia de contingências e discricionariedade do Governo -
incluindo-se aqui os ministros de Estado. É necessário atentar para o fato de que cada
subunidade possui uma cota143 mensal de recursos liberados automaticamente, obedecendo
aos critérios da necessidade (abstrata, que é representada pelo gasto histórico de cada
subunidade) e do valor da dotação orçamentária para cada ministério.

Neste sentido, as liberações extraordinárias de recursos do Erário, muito embora


alocadas, representam o desvio de valores de investimentos (únicos não obrigatórios) dos
diversos ministérios para o parlamento, aliviando as tensões entre os poderes, porém
comprometendo a continuidade de relevantes projetos já em andamento. Este, talvez, seja o
motivo pelo qual o Brasil possui tantas obras iniciadas e paralisadas por falta de dinheiro,
apesar de haverem sido obedecidas as fases da programação dos desembolsos.

143
Cota é o montante de recursos financeiros que, em cada período, a Secretaria do Tesouro Nacional (STN)
coloca à disposição dos Órgãos Setoriais de Programação Financeira (OSPF).
152

Observadas, então, as alocações no orçamento do exercício e na conta restos a pagar,


ingressa a fase financeira da execução orçamentária, cujos valores podem ser provisionados144
ou destacados145 para ao final serem liberados com o repasse ou sub-repasse da despesa,
respectivamente.

Sabendo que a LRF veda os repasses e sub-repasses sem que estejam destinados
desde a fase de solicitação pelo ministro de Estado, este necessita remanejar as solicitações
encaminhadas à STN para as emendas, pelo critério de contingenciamento, o que é justificado
perante o Tesouro Nacional, sem violação aos princípios gerais do orçamento.

Neste momento da pesquisa, já se pode asseverar que, para a liquidação das


emendas, é imperativa uma autorização presidencial, suprida pelo ministro de Estado, que
participa do governo de coalizão. Este Poder-ministerial decorre em contrapartida e em razão
do elevado grau de responsabilização a que estão sujeitos os ministérios.

Por outro ângulo de visão, é possível assinalar que, dentre os efeitos da política de
coalizão, está o compromisso do Governo em promover as demandas do Poder Legislativo,
representando um dever político assumido com os parlamentares, mesmo que estes tenham
sido assumidos pelo corpo ministerial e não pelo Presidente da República.

Esta consideração leva a outra. O aspecto central da Emenda Constitucional pode ser
resumido às emendas parlamentares, isto é, a um falso orçamento impositivo, que obriga o
Poder Executivo a executar emendas parlamentares até o limite de 1,2% da receita corrente
liquida em cada exercício financeiro. A norma constitucional impositiva retira-lhe a
discricionariedade e rompe o pacto de cooperação política, haja vista que seu principal
elemento de barganha deixa de existir.

Retirou-lhe o aspecto de barganha política, transformando-a em obrigação,


vinculando à receita orçamentária. O grito de independência pode representar uma violação
não somente ao presidencialismo de coalizão, como também, em seu aspecto constitucional,
pois constitui prerrogativa do Executivo a administração do Estado, e neste já compreendido o
aspecto financeiro da Administração Pública do Estado.

144
Descentralização interna ou provisão – entre uma unidade orçamentária (UO) e uma unidade da gestão (UG)
do mesmo ministério ou órgão.
145
Descentralização externa ou destaque – ocorre cessão de um crédito orçamentário entre UO, ou entre UG de
ministérios ou órgãos distintos.
153

Neste sentido, é o parecer do ministro do STF, Luiz Fux, tratando das emendas
parlamentares: ressalta a força vinculante que se pretendeu dar às emendas, que esbarra na
motivação administrativa, [...] respaldada pelo postulado da razoabilidade “a atribuição de
regime formal privilegiado exclusivamente às normas oriundas de emendas parlamentares
viola a harmonia entre os poderes político” - citação feita no item 4.2.2.3.

Encerradas as análises e considerações, iniciam-se as conclusões.


154

CONCLUSÃO

Este trabalho desenvolveu uma análise do orçamento público da União, no Estado


Democrático, após a edição da Emenda Constitucional nº 86, de 17 de março de 2015,
supostamente, um modelo impositivo de orçamento, que suscitou aprofundar e compreender
os aspectos que motivaram o legislador a aprovar o Projeto de Emenda Constitucional, após
15 anos tramitando no Congresso Nacional.

O que se pensou, todavia, tratar de uma mudança significativa na modelagem


orçamentária do Brasil, que minorasse as hipertrofias e assimetrias entre o Poder Executivo e
o Legislativo, a Emenda não solucionou, pois, ao contrário, ampliou a tensão entre os poderes,
envolvendo o Poder Judiciário.

Na pesquisa foram utilizados referenciais históricos, filosóficos e políticos para


ordenar o pensamento e as ideias no tempo, com suporte em recursos metodológicos e
hermenêuticos escolhidos, que nortearam todas as etapas da pesquisa, preservando o foco na
problematização e nos objetivos específicos propostos, como:

a) compreender o contexto histórico e o pensamento filosófico ao longo do processo


de formação do Estado e as forças que irromperam os séculos XVI e XVII, acelerados pelo
pensamento hegemônico de liberdade no século XVIII;

b) explorar os diversos aspectos do Estado Democrático de Direito à luz do controle


de convencionalidade, pouco conhecido, em especial, na sua aplicação, e a precedência dessas
normas internacionais de Direitos Humanos dentro dos modernos sistemas normativos que
cotejam as normas de Direito Nacional e Internacional;

c) examinar as mudanças de paradigma ocorridas no pensamento filosófico da


separação dos poderes do Estado, evidenciando os diversos estádios da separação tripartite no
Direito comparado;
155

d) depreender de que forma as instituições democráticas se desenvolveram do Estado


constitucional brasileiro, destacando a maneira individualista de ver, agir e pensar da
sociedade nacional, nessa consolidação da democracia;

e) explorar e aquilatar a complexa relação entre a Democracia Representativa, suas


instituições e o papel que desempenham numa sociedade paradoxalmente desigual, e os fins a
que se propõe o Estado contemporâneo;

f) relacionar as competências e funções dos Poderes no Estado brasileiro, com o


orçamento público no Brasil, objetivando compreender os reflexos destas relações na abertura
dos créditos adicionais e nas emendas parlamentares;

g) historiar o processo de consolidação do Direito financeiro e do Orçamento público


no Direito comparado e, em seguida explorar a experiência orçamentária no Brasil, com seus
reflexos na sociedade; e

h) detalhar as relações entre o modelo presidencialista de coalizão adotado no País e


os modelos orçamentários, destacando o orçamento impositivo recém-editado no texto da
Emenda Constitucional nº 86/2015.

Após a apreciação dos objetivos específicos que nortearam a pesquisa, e, à guisa de


um corte indispensável, foi possível comprovar, que as escolhas de cunho metodológico
atenderam as expectativas para o trabalho. Com efeito, tratou-se de uma pesquisa de tipo
bibliográfica, partindo do referencial teórico, constituído de textos legais, doutrinas e
jurisprudências, especialmente em livros, artigos científicos, teses e dissertações cotejadas
para responder à problematizacao proposta. A abordagem da dissertação foi qualitativa,
alinhada com a subjetividade da temática o Estado Democrático e Orçamento Público,
mantendo o foco nas mudanças aprovadas no Orçamento Público da União e o modelo
presidencialista de coalizão política. No último capítulo, a pesquisa discute a legalidade das
emendas parlamentares ao orçamento, a violação ao principio da separação dos poderes e a
coalizão política.

Findo o exame dos aspectos históricos, filosóficos e políticos dos capítulos iniciais,
conclui-se, à luz do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, e com baliza na Hermenêutica
Constitucional, não fazer sentido inferir que o homem é elemento constitutivo do Estado, mas
que este só se justifica se a serviço da efetivação dos direitos fundamentais, da mesma forma
que a soberania estatal não é imanente do Estado, mas advém da vontade geral - a soberania
do povo.
156

Com a edição da EC nº 45/2004, que introduziu o § 3º, ao art. 5º da Constituição de


1988, admitindo que tratados internacionais de direitos humanos, ratificados e aprovados pelo
Legislativo com quorum de emenda constitucional possuíssem status de norma constitucional,
mais longe foi a Corte Constitucional, ao reconhecer a supralegalidade das normas
internacionais de Direitos Humanos, ratificadas pelo Estado brasileiro, antes da publicação da
Emenda.

Não há de se pensar em Estados nacionais, mas sim, em Estados parceiros, Estados-


parte, numa visão globalizada e universal de direitos. Doravante, o jurista necessitará
interpretar as normas domésticas, com o refinamento da nova Hermenêutica Constitucional,
vista como bloco de constitucionalidade, devendo submeter a norma interna ao controle de
convencionalidade antes de aplicá-la. Por certo, é um novo desafio para o intérprete do
Direito no Brasil.

Na busca pelo aperfeiçoamento das instituições nacionais, se insere o debate sobre a


tripartição das funções estatais, ante as crises de moralidade e credibilidade que afetam toda a
sociedade brasileira. As relações políticas entre os poderes do Estado suscitam ser estudadas e
revisitadas, sempre que possível, para assegurar o avanço rumo à efetivação dos fundamentos
e objetivos do Estado brasileiro. As crises de representatividade, de legitimação, associadas à
crise de governabilidade, ensejam insegurança jurídica, e recrudesce a situação de
instabilidade econômica, ressuscitando uma guerra já vencida, no passado, contra a inflação.

Durante a pesquisa, foi possível identificar algumas peculiaridades no Orçamento


Público da União, que sugerem a modelagem orçamento-programa, com a participação ativa
da sociedade, na proposição e escolha dentre as diversas políticas públicas, como sendo o
modelo mais apropriado à realidade brasileira. A participação popular no processo de
elaboração do orçamento público potencializa a elevação do nível de educação política do
povo e, consequentemente, de cidadania.

Apesar da crescente estabilidade das instituições nacionais, mudanças bruscas no


modelo orçamentário repercutiriam no arcabouço burocrático e administrativo do País, com o
consequente agravamento das crises aventadas. Uma mudança assim exigiria profundas
alterações na Constituição, bem assim em toda a normatização infraconstitucional
orçamentária.

Bastaria o aperfeiçoamento na modelagem adotada pela Constituição de 1988, para


retirar do papel a tão aguardada Reforma tributária (de simplificação de tributos e do
157

complexo sistema normativo tributário), capaz de alavancar a consciência cidadã, do direito a


uma tributação justa, como direito fundamental.

Constatou-se, também, que a abertura exacerbada de créditos adicionais ao


orçamento da União atenta contra preceitos jurídicos do Supremo Tribunal Federal, que trata
as referidas despesas como regime de exceção constitucional; logo se percebe a indesejável
violação ao mandamento constitucional fundante do Estado, a independência e harmonia entre
os poderes.

Neste ímpeto, o orçamento impositivo retira os poderes de contingenciamento do


Chefe do Poder Executivo, passando da discricionariedade para obrigatoriedade na execução
das despesas orçamentárias aprovadas pelo Poder Legislativo. O nexo apontado na dissertação
é de que a modelagem impositiva de orçamento enfraqueceria o Executivo à frente da
administração do Estado e na condução das finanças públicas, sem contrapartida para a
sociedade.

A simples execução das despesas aprovadas não solucionaria a mitigação do Poder


Legislativo, tampouco a subserviência ao Poder Executivo. A crise no parlamento brasileiro é
de natureza política, que representa uma fuga da legitimação dos representantes pelos seus
representados. Dessarte, a assimetria erigida não é resolvida com a impositividade
orçamentária.

Muito pelo contrário, o texto da EC nº 86/2015 evidencia um retrocesso na


efetivação dos recursos financeiros, escassos, do Estado brasileiro. A Emenda aprovada impõe
ao Poder Executivo efetivar integralmente, em cada exercício financeiro, as emendas
parlamentares (individuais e coletivas) aprovadas pelo Congresso Nacional, e autorizadas na
Lei Orçamentária Anual para o ano fiscal.

Esta foi a motivação do legislador, identificada na pesquisa, assim como não há


qualquer avanço democrático nesta medida. No Direito financeiro, o sentido literal de
orçamento impositivo (um sistema rígido ou semirrígido de orçamento) é a efetivação da
vontade popular encastoada nas peças orçamentárias. Corresponde a uma vontade
democrática.

Historicamente, constatou-se que a modelagem impositiva de orçamento é mais


utilizada nos regimes parlamentaristas, que possuem um elevado espírito democrático,
compatível com os modelos encontrados nos países nórdicos. Isto significa dizer que a
impositividade requer Estados dotados de instituições democráticas participativas, pois é o
158

povo quem determina, onde, quando e como serão gastos os recursos públicos, retirando uma
boa parcela da discricionariedade do Poder Executivo na condução da res publica.

Pode-se, outrossim, constatar que não é possível organizar o Estado, sua burocracia e
instituições em volta de uma modelagem orçamentária; mas sim, o orçamento, como sendo
uma instituição, deve acompanhar o processo cultural, acompanhando o desenvolvimento da
sociedade e do Estado. Isto seria inverter o fluxo natural do Estado em função do orçamento
público.

Faz parte destes pressupostos para a adoção de uma modelagem impositiva de


orçamento o fortalecimento: das facções políticas, a participação popular nas questões de
Estado, redução das desigualdades entre as regiões, redução da marginalização, elevação da
escolaridade e a qualidade do ensino, erradicação do analfabetismo, promoção de saúde
pública de qualidade. Isto equivale dizer que o Estado deveria assegurar a efetivação de todo
o rol de direitos e garantias fundamentais constitucionais, antes de se pensar em
impositividade.

É possível que, num futuro próximo, o STF precise intervir, decidindo pela
constitucionalidade ou não na emenda à Constituição. É até mesmo plausível que a Corte
reitere o parecer o Min. Luiz Fux na ADI nº 4.663, de que, a priori, as emendas individuais
devam ser acatadas pelo Chefe do Poder Executivo, “ressalvada a motivação administrativa
que justifique o descumprimento [...]”. E que as “[...] emenda apresentada pelo Poder
Legislativo, de rocas modo que a atribuição de regime formal privilegiado exclusivamente às
normas oriundas de emendas parlamentares viola a harmonia entre os poderes políticos (art.
2º da CF/88)”.

Esta é a posição, também, a que chegou a pesquisa, de que, além da violação ao


equilíbrio entre os poderes, a impositividade das emendas individuais aprovadas pelo Poder
Legislativo, imposta ao Poder Executivo, retira-lhe um elemento essencial à
discricionariedade na administração do Estado, cabendo ao parlamento a fiscalização dos atos
do Executivo, contudo, sem interferir na gestão da coisa pública.

No mesmo sentido, esta medida impositiva afeta diretamente a formação de


coligações partidárias e a política de coalizão, cuja máxima é “somar forças para governar”.
Uma vez editada a EC, o Poder Executivo perdeu não somente Poder, como também uma
grande parcela da capacidade de barganha por alianças políticas - própria do modelo de
presidencialismo brasileiro de coalizão.
159

Cotejadas as ideias centrais da pesquisa, chegou-se à conclusão de que chegou de: só


se justifica a existência do Estado a serviço do povo, que se fortalece como povo, à medida
que lhe são asseguradas a universalidade de direitos fundamentais e a participação política,
única habilidade a conferir cidadania; com procedência neste ideal democrático, o orçamento
se revela um relevante instrumento para a participação ativa da sociedade; o orçamento-
programa continua sendo o mais adequado à realidade brasileira e que o suposto orçamento
impositivo é, de fato, uma restrição imposta ao Chefe do Poder Executivo no
contingenciamento de gastos; a EC representa uma violação à harmonia dos poderes políticos.

Conclui-se que o Poder Executivo necessita reaver o debate dialético e a capacidade


de negociação própria das boas práticas políticas, estreitando as relações com o Poder
Legislativo – imprescindível ao jogo democrático. Por fim, recomendam-se novos estudos,
outras críticas e debates sobre o orçamento público na realidade democrática brasileira, bem
como o aprofundamento da crise no presidencialismo e no sistema de coalizão que se
encaminha a um sistema presidencialista ministerial de cooptação.
160

REFERÊNCIAS

ABRANCHES, Sérgio H. H de. Presidencialismo de Coalizão: O Dilema Institucional


Brasileiro. In: TAVARES, José Antonio G. O sistema partidário na consolidação da
democracia brasileira. Brasília: Instituto Teotônio Vilela, 2003.
______.. Os ciclos do presidencialismo de coalisão. Disponível em:
http://www.ecopolitica.com.br/2014/03/11/os-ciclos-do-presidencialismo-de-coalizao/. Acesso
em: 19/04/2015.
______. A crise política no presidencialismo que deveria ser de coalizão. Publicado em
12/03/2015. Disponível em: http://www.matheusleitao.com.br/7499-crise-politica-no-
presidencialismo-que-deveria-ser-de-coalizao-por-sergio-abranches.html Acesso em: 19/04/2015
ABRUCIO, Fernando Luiz; LOUREIRO, Maria Rita. Finanças públicas, democracia e
accountability. In: ARVATE, Paulo; BIDERMAN, Ciro (org.). Economia do setor público
no Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 75-102.
ALBUQUERQUE, J.A.Guilhon. Montesquieu: sociedade e poder. In: WELFFORT, Francisco C.
(Org.). Os clássicos da política 1. 14.ed. São Paulo: Ática, 2011.
ALEXY, Robert. A existência dos direitos humanos. In: Níveis de efetivação dos direitos
fundamentais civis e sociais: um diálogo Brasil e Alemanha. ALEXY, Robert. [et al] (orgs.) -
Joaçaba: Unoesc, 2013.
______. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2011.
ALMEIDA FILHO, Marcos Lacerda. A Participação do poder executivo no processo
legislativo: o caso brasileiro. São Paulo: LTr. 2014.
ALVES, Walmir. Controle de convencionalidade das normas internas em face dos tratados e
convenções internacionais sobre direitos humanos equivalentes às emendas constitucionais.
In. MARINONI, Luiz Guilherme; MAZZUOLI, Valério de Oliveira. (coord.). Controle de
convencionalidade: um panorama latino-americano: Brasil, Argentina, Chile, México, Peru,
Uruguai. 1.ed. Brasília: Gazeta Jurídica, 2013.
ANDRADE, Paes; BONAVIDES, Paulo. História constitucional do Brasil. Brasília: OAB,
1989.
ARAÚJO, Luiz Alberto David. Controle concentrado da constitucionalidade e segurança
jurídica no sistema brasileiro. In: MAUÉS, Antonio G. Moreira; SCAFF, Fernando Facury;
BRITO FILHO, José Claudio Monteiro de (coord.). Direitos fundamentais & relações
sociais no mundo contemporâneo. - Curitiba: Juruá, 2008.
ARAÚJO, Vinícius de Carvalho. A conceituação de governabilidade e governança, da sua
relação entre si e com o conjunto da reforma do Estado e do seu aparelho. In: Escola
Nacional de Administração Pública (ENAP) Brasillia: ENAP, 2002. Disponível em
http://repositorio.enap.gov.br/handle/1/661. Acesso em 13/04/2015
ARGENTINA. Constituição da República Argentina. Disponível em: http://www.
161

senado.gov.ar/deInteres. Acesso em 22/11/214.


ASSIS, Luiz Gustavo Bambini de. Processo legislativo e orçamento público: função do
parlamento. São Paulo: Saraiva, 2012.
ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos.
14.ed. São Paulo: Malheiros, 2013.
______. Constituição, democracia e supremacia judicial: direito e política no Brasil
contemporâneo. In: Pensar: Revista de Ciências jurídicas. v. 18, n.3 (set./dez. 2013).
Fortaleza: Universidade de Fortaleza, 2013, p. 864-939.
BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. 17.ed. São Paulo: Forense,
2010.
BARBOSA, Ruchester Marreiros. O controle de convencionalidade pelo delegado de polícia
diante da CADH. Disponível em: http://ruchesterbarbosa.jusbrasil.com.br/ artigos/121944198/o-
controle-de-convencionalidade-pelo-delegado-de-policia-diante-da-cadh. Acesso em: 24/11/2014.
BARCELLOS, Ana Paula de. Neoconstitucionalismo, direitos fundamentais e controle das
políticas públicas. In: SARMENTO, Daniel; GALDINO, Flávio. (orgs.) Direitos fundamentais:
estudo em homenagem ao professor Ricardo Lobo Torres. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p.31-60.
BARRETO, Tobias. A questão do poder moderador e outros ensaios brasileiros. Petrópolis:
Vozes, 1977.
BARROS, Renata Furtado de, SOARES, Mário Lúcio Quintão. O controle de
convencionalidade das leis e a constitucionalização do direito internacional. In: BARROS,
Renata Furtado de; LARA, Paula Maria Tecles (org.). Justiça e democracia: as novas
perspectivas da hermenêutica constitucional. v.II. - Carolina do Norte-USA: Lulu Publishing,
2013.
BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos
fundamentais e a construção do novo modelo. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
______. Constituição, democracia e supremacia judicial: direito e política no Brasil
contemporâneo. In: Pensar: Revista de Ciências jurídicas. Fortaleza, v. 18, n.3, p. 864-939,
Universidade de Fortaleza, set./dez. 2013.
______. Constituição e tratados internacionais: alguns aspectos da relação entre direito
internacional e direito interno. In. MARINONI, Luiz Guilherme; MAZZUOLI Valério de
Oliveira. (coord.). Controle de convencionalidade: um panorama latino-americano: Brasil,
Argentina, Chile, México, Peru, Uruguai. Brasília: Gazeta Jurídica, 2013.
______. Judicializacao , ativismo judicial e legitimidade democrática . In: SILVA, Christine
Oliveira Peter da; CARNEIRO, Gustavo Ferraz Sales. (Coord) Controle de
constitucionalidade e direitos fundamentais: estudo em homenagem ao professor Gilmar
Mendes Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010ª.
BARZOTTO, Luiz Fernando. Os direitos humanos como direito subjetivo - da dogmática
jurídica à ética. In: Ingo Wolfgang Sarlet (org.). Jurisdição e direitos fundamentais: anuário
2004/2005. Escola Superior da Magistratura do Rio Grande do Sul - AJURIS. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2006. v.I, t.I.
BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 3.ed. São Paulo: Lejus,
2002.
BEZERRA, Ricardo Alfredo Ribeiro. Orçamento de resultados. Incentivos para
162

implementação do orçamento de resultados no Brasil. Disponível em: <www.ceag.unb.br/


modulo/biblioteca_academica/force-download.php>. Acesso em: 20 jul. 2011.
BÍBLIA. Português. Bíblia sagrada. Rio de Janeiro: Encyclopaedia Britannica, Ecumênica,
1980.
BINENBOJM, Gustavo. Uma teoria do direito administrativo: direitos fundamentais,
democracia e constitucionalismo. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2008a.
______. Temas de direito administrativo e constitucional - artigos e pareceres. - Rio de
Janeiro: Renovar, 2008b.
Paz e Terra, 2009.
______. Estado, governo, sociedade; por uma teoria geral da política. trad. Marco Aurélio
Nogueira. 14.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007.
BITTENCOURT, Fernando Moutinho Ramalho. Relações Executivo-Legislativo no
presidencialismo de coalizão: um quadro de referência para estudos de orçamento e controle.
Textos para Discussão nº 112 - Abril/2012. Disponível em: http://www12.senado.gov.br/
publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/textos-para-discussao/td-112-relacoes-
executivo-legislativo-no-presidencialismo-de-coalizao-um-quadro-de-referencia-para-
estudos-de-orcamento-e-controle. Acesso em 18/04/2015.
BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 10.ed. Brasília: EdUNB, 1999.
______. Direito e Estado no pensamento de Emanuel Kant. 3.ed. São Paulo: Mandarim,
2000.
______. Teoria da norma jurídica. 2.ed. Bauru: EDIPRO, 2003a.
______. O filósofo e a política: antropologia. Rio de Janeiro: Contraponto, 2003b.
______. A era do direito. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
______. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone, 2006.
______. Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Barueri: Monole, 2008.
______. O futuro da democracia. 11.ed. São Paulo: Paz e Terra, 2009.
______. Estado, governo, sociedade; por uma teoria geral da política. 14.ed. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 2007.
BODIN, Jean. Os seis livros da república. São Paulo: Ícone, 2011.
BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 8.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992.
______. A Constituição aberta: temas políticos e constitucionais da atualidade, com ênfase no
federalismo das regiões. 3.ed. São Paulo: Malheiros, 2004a.
______. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2004b.
______. Do país constitucional ao país neoconstitucional: a derrubada da Constituição e a
recolonização pelo golpe de Estado institucional. 3.ed. São Paulo: Malheiros, 2004c.
______. Teoria do Estado. 5.ed. São Paulo: Malheiros, 2004d.
______. Do Estado liberal ao Estado social. 8.ed.São Paulo: Malheiros, 2007.
BONIFÁCIO, Artur Cortez. O direito constitucional internacional e a proteção dos
direitos fundamentais. São Paulo: Método, 2008.
163

BORSANI, Hugo. Relações entre política e economia: teoria da escolha pública. In:
ARVATE, Paulo; BIDERMAN, Ciro (org.). Economia do setor público no Brasil. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2004. p. 103-125.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição República Federativa do Brasil. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 17 ago.2011.
_______. Constituição Política do Império do Brazil de 25 de março de 1824. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20/01/2015.
_______. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 24 de fevereiro de
1891. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20/01/2015.
_______. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 16 de julho de
1934. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20/01/2015.
_______. Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 10 de novembro de 1937.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20/01/2015.
_______. Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 18 de setembro de 1946.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20/01/2015.
_______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20/01/2015.
_______. Lei 4.320, de 17 de março de 1964. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ACP/acp-43-69.htm>. Acesso em: 20/01/2015.
_______. Ato Complementar n. 43, de 29 de janeiro de 1969. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ACP/acp-43-69.htm>. Acesso em: 20/01/2015.
______. Constituição da República Federativa do Brasil. Até a Emenda Constitucional nº
83, de 05/08/2014. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil
_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em 21/11/2014b.
______. Revista trimestral de jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. v.224.
abr./jun. 2013 - Brasília: STF, 2013. (p. 284-317).
______. Manual de combate ao trabalho em condições análogas às de escravo. Brasília:
MTE, 2011.
______. Legislação de direito internacional - Constituição Federal. (org.). Aziz Tuffi
Saliba. 5.ed. - São Paulo: Riddel, 2010. - (Coleção de leis Rideel).
______. Revista trimestral de jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. v.207. n.2.
jan./mar. 2009 - Brasília: STF, 2009. (p. 461-912).
______. Revista trimestral de jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. v.186. n.1.
jan./mar. 2003 - Brasília: STF, 2003. (p. 1-360).
______. Ministério da Fazenda - Tesouro Nacional. Disponível em:
https://www.tesouro.fazenda.gov.br/tesouro-direto-perguntas-frequentes. Acesso em:
12/04/2015.
______.Ministério da Fazenda - MF; Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Lei nº
13.115, de 20 de abril de 2015. Estima a receita e fixa a despesa da união para o exercício
financeiro de 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2015/Lei/L13115.htm. Acesso em 12/04/2015.
______. Parecer nº 45, de 2014 – CN. Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e
164

Fiscalização, sobre o Projeto de Lei nº 3, de 2014 - CN. Disponível em:


http://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=158770&tp=1 Acesso em:
12/04/2015.
BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Construindo o Estado republicano: democracia e
reforma da gestão pública. Rio de Janeiro: FGV, 2009)
BURKE, Edmund. Reflexões sobre a Revolução na França. Bauru: EDIPRO, 2014.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7.ed.
São Paulo: Almedina, 2006.
______. Constituição da República Portuguesa: anotada. 6.ed. v.1. - Coimbra: Coimbra,
2007.
______. Dogmática de direitos fundamentais e direito privado. In: Ingo Wolfgang Sarlet.
(coord.). Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2003.
CAPELLETTI, Mauro. Juízes irresponsáveis. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1989.
______. Juízes legisladores? Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1999.
CARVALHO, Cristiano. Teoria do sistema jurídico - direito, economia e tributação. São Paulo:
Quartier Latin, 2005.
CASTEL, Robert. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. 9.ed. Petrópolis:
Vozes, 2010.
CASTRO, Matheus Felipe de; MEZZAROBA, Orides. História ideológica e econômica das
Constituições brasileiras. Belo Horizonte: Arraes, 2015.
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil. 14.ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2011.
______. A construção da ordem: a elite política imperial. Teatro de sombras: a política
imperial. 8.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013.
CICERO, Marcus Tullius. Da república. Coleção “Os Pensadores”, v. 5. São Paulo: Abril, 1985.
______. Las leyes. Trad. Álvaro D’Ors. Madrid: Instituto de Estudos Políticos, 1970
CLÈVE, Clèmerson Merlin. Atividade legislativa do Poder Executivo. 3.ed. São Paulo:
Revista do Tribunais, 2011.
CONSTANT, Benjamin. Escritos políticos. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
CORDEIRO NETO, Holmes, AMORIM, Rosendo Freitas de. O ideal de Ruy Barbosa na
criação do tribunal de contas no BRASIL, In: CONPEDI UFSC - Revista de Direito e
Administração Pública do XXIII Encontro Nacional Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-
Graduação em Direito. 2014, p. 343-359.
______; GOMES, Ana Paula de Oliveira. Direito fundamental social à saúde, reserva do
possível e mínimo existencial. In: CORREIA, Mary Lúcia Andrade; BORDONI, Jovina
d`Avila; SANTOS, Jahyra Helena P. dos. Direitos fundamentais coletivos, difusos, sociais e
humanos. Curitiba: CRV, 2015, p. 211-224.
COSSIO, Carlos. La plenitud del ordenamiento jurídico. 2.ed. Buenos Aires: Los Andes;
2005.
COSTA, José Augusto Fontouro; ANDRADE, José Maria Arruda de; MATSUO, Alexandra
165

Mery Hansen. (orgs). Direito: teoria e experiência - estudos em homenagem a Eros Roberto
Grau. v.I. São Paulo: Malheiros, 2013.
COSTA, José Augusto Fontouro; ANDRADE, José Maria Arruda de; MATSUO, Alexandra
Mery Hansen. (orgs). Direito: teoria e experiência - estudos em homenagem a Eros Roberto
Grau. v.II. São Paulo: Malheiros, 2013.
COSTA, Fernando Nogueira da. Capitalismo de estado neocorporativista. Campinas:
UNICAMP, 2012. (Textos para Discussão no Instituto de Economia – UNICAMP – Julho de
2012.
CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Controle judicial das omissões do poder publico: em busca
de uma dogmática constitucional transformadora à luz do direito fundamental à efetivação da
constituição. São Paulo: Saraiva, 2004.
DAMOUS, Wadih; DINO, Flávio. Medida provisória no Brasil: origem, evolução e novo
regime constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
DANTAS, Paulo Roberto de Figueiredo. Direito processual constitucional. 3.ed. São Paulo:
Atlas, 2012.
DEL VECCHIO, Giorgio. História da filosofia do Direito. Coimbra: Almedina,1979.
DIAS, Eduardo Rocha. Os limites às restrições de direitos fundamentais na Constituição
brasileira de 1988. In: LIMA, Martônio M. Barreto. (org.). Democracia, direito e política:
estudos internacionais em homenagem a Friedrich Müller. Florianópolis: Conceito Editorial,
2006.
DWORKIN, Ronald, O império do direito. 3.ed. São Paulo: Marins, 2014.
______. Levando o direito a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
______. O direito da liberdade: a leitura moral da Constituição Norte-Americana. São Paulo:
Martins Fontes, 2006.
______. Uma questão de princípio. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
ESPAÑA. El Diccionario de la lengua Espanõla. De la Real Academia Española. Disponível
em: http://buscon.rae.es/drael/. Acesso em: 16/11/2014.
ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. Constitutin of the United States. Disponível em:
www.archives.gov/exhibits/charters /constitution.html. Acesso em 23/06/2015.
FACCHINI NETO, Eugênio. Reflexões histórico-evolutivas sobre a constitucionalização do
direito privado. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Constituição, direitos fundamentais e
direito privado. - Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.
FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patrimônio político brasileiro. 3.ed.
São Paulo: Globo, 2001.
FARIA, José Eduardo. O direito na economia globalizada. São Paulo: Malheiros 2004.
FERREIRA, Gabriela Nunes. O rio da prata e a consolidação do Estado imperial. São Paulo:
Hucitec, 2006.
FUNDAÇÃO CASA RUI BARBOSA. Obras completas v.10, t.III. - Rio de janeiro: Casa Rui
Barbosa, 1947.
FUKUYAMA, Francis. Construção do Estado: governo e organização no século XXI. Rio
de Janeiro: Rocco, 2005.
166

GERVASONI, Tássia Aparecida; LEAL, Mônica Clarissa Hennig. Ativismo judicial? O


“antes” e o “depois” da constituição de 1988 na jurisprudência do supremo tribunal federal:
um estudo a partir da noção de vinculação dos particulares aos direitos fundamentais In:
Pensar: Revista de Ciências jurídicas. v. 18, n.3 (set./dez. 2013). Fortaleza: Universidade de
Fortaleza, 2013, p. 953-970.
GIACOMONI, James. Orçamento público. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2005.
GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Globalização, neoliberalismo e o direito no Brasil. -
Londrina: Ed. Humanidades, 2004.
GOMES, Ana Paula de Oliveira. A problemática das omissões constitucionais
orçamentárias no ordenamento jurídico brasileiro, 2014, 109 p. Dissertação (Mestrado em
Direito Constitucional) Programa de Pós graduação em Direito Constitucional, Universidade
de Fortaleza, Fortaleza.
______. Democracia, qualificação dos interlocutores e orçamento participativo. Revista do
Instituto do Direito Brasileiro (RIDB). Lisboa: Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa,
n. 11, p. 6687-6708, 2012. Disponível no sítio: <http://www.idb-fdul.com/>. Acesso em: 27 fev.
2015.
GOMES, Luiz Flávio. Estado constitucional de direito e a nova pirâmide jurídica. - São
Paulo: Premier Máxima, 2008.
______. O controle de convencionalidade: Valeiro Mazzuoli “versus” STF. . Disponível em:
http://www.Ifg.com.br. Acesso em: 20/10/2014.
______. O controle de convencionalidade: STF revolucionou nossa pirâmide jurídica.
Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12241. Acesso em: 21/10/2014.
GOMES, Rinaldo Jefferson da Silva. "Orçamento público: a experiência do orçamento
participativo no município de Cabedelo 2001-2002."Sebrae Biblioteca On Line (2004).
Acesso em: 2 maio 2015
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988: interpretação e crítica.
15.ed. São Paulo: Malheiros, 2012a.
______. O direito posto e o direito pressuposto. 8.ed. São Paulo: Malheiros, 2012b.
GRINOVER, Ada Pelegrini; WATANABE, Kazuo. (coord.). O controle jurisdicional de
políticas públicas. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
HAMILTON, Alexander; MADISON, James; JAY, John. O federalista: pensamento político.
Brasília: EdUNB, 1984.
HART, H.L.A. O conceito de direito. São Paulo: WMF, 2009.
HEGEL, G.W.F. Princípios da filosofia do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris
Editor, 1991.
______. Elementos de direito constitucional da República Federal da Alemanha. Porto
Alegre: Fabris, 1998.
HITTERS, Juan Carlos. El control de convencionalidad y el cumprimeinto de las sentencias
de la corte interamericana - supervisión supranacional - cláusula federal. In. MARINONI,
Luiz Guilherme; MAZZUOLI, Valério de Oliveira. (coord.). Controle de
convencionalidade: um panorama latino-americano: Brasil, Argentina, Chile, México, Peru,
Uruguai. Brasília: Gazeta Jurídica, 2013.
167

HOBBES, Thomas. Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil. São
Paulo: Martin Claret, 2004. (Coleção a obra-prima de cada autor - texto integral).
HOLANDA, Sergio Buarque. Raízes do Brasil. 26.ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
IGLÉSIAS, Francisco. Trajetória política do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras,
2006.
ISAIAS, Cristiano Becker. O legado jurisdicional da modalidade estatal liberal em pleno
paradigma instituído pelo Estado Democrático de Direito. In: Pensar: Revista de Ciências
jurídicas. v.14, n.1 (jan./jun. 2009). Fortaleza: Universidade de Fortaleza, 2009.
JELLINEK, George. Teoria general del Estado. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica,
2000.
KANAYAMA, Rodrigo. Orçamento público brasileiro, democracia e accountability. In:
Clèmerson Merlin Clève. (Org.). Direito Constitucional Brasileiro. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2014, v. 3, p. 139-160.
KANT, Emmanuel. Crítica da razão pura. São Paulo: Martin Claret, 2004. (Coleção a obra-
prima de cada autor. Texto integral).
______. Fundamentação da metafísica dos costumes e outros escritos. São Paulo: Martin
Claret, 2005. (Coleção a obra-prima de cada autor. Texto integral).
______. Crítica da razão prática. São Paulo: Martin Claret, 2006. (Coleção a obra-prima de
cada autor. Texto integral).
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
______. Jurisdição constitucional. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
KEYNES, John Maynard. O fim do laissez-faire. In: SZMRECSÁNYI, Tamas; FRENANDES,
Florestan. (org.) John Maynard Keynes – economia. São Paulo: Ática, 1978. (Coleção Grandes
Cientistas Sociais 6 )
LASSALLE, Ferdinand. O que é uma Constituição? 3.ed. Campinas: Russelli, 2011.
LENIN, Vladimir Ilitch, O Imperialismo: fase superior do capitalismo. trad. Leila Prado. 3.ed.
São Paulo: Centauro, 2010.
LIMA, Abili Lázaro Castro de, Globalização econômica, política e direito: análise das
mazellas causadas no plano político-jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2002.
LIMA, Edilberto Carlos Pontes. Algumas observações sobre o orçamento impositivo no
Brasil. In: Revista de planejamento e políticas públicas. n.26. jan./dez. 2003.
http://www.en.ipea.gov.br/ppp/index.php/PPP/article/viewFile/56/66. Acesso em: 14/05/2015
LIMA, Martônio Mont’Alverne Barreto. [et al] Política e jurisdição constitucional.
Florianópolis: Conceito, 2012.
______; SOUZA NETO, Cláudio Pereira; MORAES FILHO, José Filomeno de; BERCOVICI,
Gilberto. Teoria da Constituição: estudo sobre o lugar da política no direito constitucional. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2003.
______; ALBUQUERQUE, Paulo Antonio de Menezes. Democracia, direito e política: estudos
internacionais em homenagem a Friedrich Müller (orgs.). Florianópolis: Conceito, 2006.
LIMONGI, Fernando; FIGUEIREDO, Argelina. Bases institucionais do presidencialismo de
coalizão. In: Lua Nova: Revista de Cultura e Política, São Paulo, 1998, n.44, p. 97-106.
168

Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-


64451998000200003. Acesso em: 20/05/2015.
LOCKE, John. Dois tratados sobre o governo. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
LOEWENSTEIN, Karl. Teoria de La Constitución. Madrid: Ariel, 1986.
LUNELLI, Reinaldo Luiz. Sistemas contábeis da contabilidade aplicada ao setor público.
Disponível em: http://www.portaldecontabilidade.com.br/tematicas/sistemas-contabeis-
contabilidade-publica.htm. Acesso em: 14/05/2015.
MAC-GREGOR, Eduardo Ferrer. Interpretación conforme y control difuso de
convencionalidade l nuevo paradigma para el juez mexicano. In: MARINONI, Luiz
Guilherme; MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Controle de convencionalidade: um panorama
latino-americano: Brasil, Argentina, Chile, México, Peru, Uruguai. Brasília: Gazeta Jurídica,
2013.
MACHADO, Edinilson Donisete. Ativismo judicial: limites institucionais democráticos e
constitucionais. São Paulo: Letras Jurídicas, 2011.
MACHADO JR., J. Teixeira; REIS, Heraldo da Costa. A lei 4320 comentada e a lei de
responsabilidade fiscal. 31.ed. Rio de Janeiro: IBAM, 2003.
MAINWARING, Scott; SHUGART, Matthew S. Presidentialism and democracy in Latin
América. Cambridge: Cambridge Studies, 1997.
MANCUSO, Wagner Pralon. O lobby da indústria no Congresso Nacional: empresariado e
política no Brasil. São Paulo: Humanitas/Edusp, 2007.
MAQUIAVEL. Nicolau. O príncipe. Comentários Napoleão Bonaparte. 12.ed. São Paulo:
Hemus, 1996. (Coleção Ciências Sociais e Filosofia).
MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. - São Paulo: Revista dos Tribunais,
2010.
______. Controle de convencionalidade (na perspectiva do direito brasileiro. In: MARINONI,
Luiz Guilherme; MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Controle de convencionalidade: um
panorama latino-americano: Brasil, Argentina, Chile, México, Peru, Uruguai. Brasília: Gazeta
Jurídica, 2013.
MARRAFON, Marco Aurélio. Os intérpretes e a tradução da Constituição: duplicidade do lagos
e bricolage na construção do sentido normativo. In: FRAGALE FILHO, Roberto; LOBÃO,
Ronaldo Joaquim da Silveira; COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. (Orgs.). Constituição &
ativismo judicial: Limites e possibilidades da norma constitucional e da decisão judicial. Rio de
Janeiro: Renovar, 2011, p. 315-334.
MARX, K. e ENGELS, F. Manifesto do partido comunista. São Paulo: Lafonte, 2012.
MAUÉS, Antonio Gomes Moreira. Poder e democracia: o pluralismo político na
Constituição federal de 1988. Porto Alegre: Síntese, 1999.
______. Supralegalidade dos tratados internacionais de direitos humanos e interpretação
constitucional. In: LOPES, Ana Maria; MAUÉS, Antônio Moreira (org.). A eficiência
nacional e internacional dos direitos humanos. Rio de Janeiro: LumenJurís, 2013.
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Rumo às novas relações entre o direito internacional
dos direitos humanos e o direito interno: da exclusão à coexistência, da intransigência ao
diálogo das fontes. Tese de Doutorado em Direito. - Porto Alegre: Universidade do Rio
Grande do Sul/Faculdade de Direito, 2008, p 201-241.
169

______. O controle de convencionalidade das leis. 3.ed. São Paulo: RT, 2013a.
______. Teoria geral do controle de convencionalidade no direito brasileiro. In: Marinoni, Luiz
Guilherme; MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Controle de convencionalidade: um panorama
latino-americano: Brasil, Argentina, Chile, México, Peru, Uruguai. Brasília: Gazeta Jurídica,
2013b.
MEDAUAR, Odete. Controle jurisdicional da administração publica. 2.ed. - São Paulo:
Dialética, 2004.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3.ed.
São Paulo: Malheiros, 2002.
______. Curso de direito administrativo. 30.ed. São Paulo: Malheiros, 2013.
MENEZES, Joyceane Bezerra de. Teoria do direito em debate: estudo em homenagem ao
professor Arnaldo Vasconcelos. Florianópolis: Conceito, 2014.
MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição Constitucional. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
______. Estado de direito e jurisdição constitucional 2012-2010. São Paulo: Saraiva, 2011.
______. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 7.ed. São Paulo:
Saraiva, 2012.
______. A supralegalidade dos tratados internacionais de direitos humanos e a prisão civil do
depositário infiel no Brasil. In: MARINONI, Luiz Guilherme; MAZZUOLI, Valério de Oliveira
Controle de convencionalidade: um panorama latino-americano: Brasil, Argentina, Chile,
México, Peru, Uruguai. Brasília: Gazeta Jurídica, 2013.
MENEGUELLO, Raquel. Sistema político, dinâmico partidário e a lógica de coalizão. In:
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Estado, instituições e democracia: democracia.
Brasília: IPEA, 2010. (Série Eixos Estratégicos de Desenvolvimento Brasileiro;
Fortalecimento do Estado, das Instituições e da Democracia; volume 2, livro 9)
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. t.v. 4.ed. Coimbra: Coimbra, 2010.
MOISÉS, José Álvaro. O desenvolvimento do congresso nacional no presidencialismo de
coalizão (1995-2006). In: MOISÉS, José Álvaro (org.). O papel do congresso nacional no
presidencialismo de coalizão. Rio de Janeiro: Konrad-Adenauer-Stifrung, 2011).
MONTESQUIEU, Charles de Secondat. Do espírito das leis. São Paulo: Martin Claret, 2010.
(Coleção a obra-prima de cada autor).
MORAES, Filomeno. São Paulo em Perspectiva. vol.15, n.4 (out./dez.2011) - São Paulo, 2001.
______. A separação dos poderes no Brasil pós-88: princípios constitucionais e práxis políticas.
In: SOUZA NETO, Cláudio Pereira, BERCOVICI, Gilberto; MORAES FILHO, José Filomeno
de; LIMA, Martonio Mont’Alverene Barreto. Teoria da constituição: estudos sobre o lugar da
política no direito constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003.
______. Contrapontos: democracia, república e Constituição no Brasil. Fortaleza: UFC, 2010.
______ (Coord.). Teoria do poder. Belo Horizonte: Arraes, 2013.
MORAIS, José Luis Bolzan de. Crise do Estado e democracia: onde está o povo? In: LIMA,
Martônio Mont’ Alverne Barreto, ALBUQUERQUE, Paulo Antônio de Menezes (orgs.).
Democracia, direito e política: estudos internacionais em homenagem a Friedrich Müller.
Florianópolis: Conceito, 2006.
MÜLLER, Friedrich. Quem é o povo? A questão fundamental da democracia. 3.ed. São Paulo:
170

Max Limonad, 2003.


______. Métodos de trabalho do direito constitucional. 3.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.
OLIVEIRA, Regis Fernandes. Curso de direito financeiro. 5.ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2013.
OLIVEIRA, Ricardo Victalino de. Federalismo assimétrico brasileiro. Belo Horizonte:
Arraes, 2012.
OLIVEIRA NETO, Francisco José Rodrigues. A estrita legalidade como limitador democrático
da atividade jurisdicional. In: Pensar: Revista de Ciências jurídicas. v. 16, n.2 (jul./dez.
2011). Fortaleza: Universidade de Fortaleza, 2011, p. 527-561.
PASCOAL, Valdecir. Direito financeiro e controle externo. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus,
2004.
PESSOA, Robertônio Santos. Constitucionalismo, estado e direito administrativo no Brasil. In:
Pensar: Revista de Ciências jurídicas. v.14, n.1 (jan./jun. 2009). Fortaleza: Universidade de
Fortaleza, 2009.
PEREIRA, Marcela Harumi Takahashi. Cumprimento da sentença da Corte Interamericana
de Direitos Humanos no âmbito interno. Dissertação de mestrado apresentada na Universidade
Nacional de Brasília - UnB. Resumo. Disponível em: http://www.âmbito-
juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_ id=6491. Acesso em:
21/11/2014.
PIÇARRA, Nuno. Separação dos poderes como doutrina e princípio constitucional - um
contributo para o estudo das suas origens e evolução. Coimbra: Coimbra, 1989.
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e direito constitucional internacional. 14.ed. - São
Paulo: Max Limonad, 2013.
PISCITELLI, Roberto Bocaccio. Orçamento autorizativo x orçamento impositivo. 2006.
Disponível em: Acesso em: 07 jun. 2014.
______. Orçamento Impositivo: viabilidade, conveniência e oportunidade. 2007. Disponível
em: http://bd.camara.gov.br/bd/handle/bdcamara/1549. Acesso em 11 jun. 2014.
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967 com a
Emenda n. 1 de 1969. 2.ed. t.I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1969.
______. Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda n. 1 de 1969. 2.ed. t.II. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1970a.
______. Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda n. 1 de 1969. 2.ed. t.III. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1970b.
POOPER, Karl R. Conjecturas e refutações: o desenvolvimento do conhecimento científico.
Lisboa: Almedina, 2003
QUEIROZ, Rholden Botelho. Democracia, direitos sociais e controle de políticas públicas pelos
tribunais de contas. Revista Controle. Fortaleza: Tribunal de Contas do Estado do Ceará, v. 7, p.
63-83, abr.2009.
RAMOS FILHO, Carlos Alberto de Moraes. Curso de direito financeiro. São Paulo: Saraiva,
2012.
REZENDE, Fernando. O orçamento público e o público. Revista Controle, volume XI, n.1,
p.11-17, 2013.
171

______. Finanças públicas. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2001.


REALE, Miguel. Teoria do direito e do Estado. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2000.
REVERBEL, Carlos Eduardo Dieder. Ativismo judicial e Estado de Direito. In: AMARAL
JUNIOR, José Levi Mello do (coord.). Estado de Direito e ativismo judicial. São Paulo:
Quartier Latin, 2010.
REZEK, José Francisco. Direito internacional público. 15.ed. - São Paulo: Saraiva, 2014.
ROCHA, Antônio Sérgio Carvalho. As partes e o todo: Congresso Nacional, executivo e o
problema do orçamento no Brasil. Perspectivas. São Paulo, v. 34, p. 55-78, jul./dez. 2008.
Disponível em: http://seer.fclar.unesp.br/perspectivas/article/viewFile/2234/1841. Acesso em
23 mai. 2014.
ROCHA, Diones Gomes da. Política e processo orçamentário no Brasil: uma avaliação
sobre a utilização dos créditos extraordinários (1995 a 2008). 2009. 157 f., il. Dissertação
(Mestrado em Ciências Contábeis)-Programa Multiinstitucional e Inter-Regional de Pós-
Graduação em Ciências Contábeis, Universidade de Brasília/UFPB/UFRN, Brasília, 2009.
ROCHA, Francisco Sérgio Silva. Orçamento e Planejamento: a relação de necessidade entre
as normas do sistema orçamentário. In: CONTI, José Maurício; SCAFF, Fernando Facuri
(coords.). Orçamentos públicos e direito financeiro. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2011.
ROCHA, José de Albuquerque. Estudos sobre o Poder Judiciário. São Paulo: Malheiros,
1995.
______. O estado moderno e o constitucionalismo. São Paulo: Bushatsky, 1976.
ROBERTS, Kenneth M. Changins course in Latin América. Cambridge: Cambridge Studies,
2015.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discursos sobre a origem e os fundamentos da desigualdade
entre os homens. São Paulo: Martin Claret, 2007. (Coleção a obra-prima de cada autor - texto
integral).
______. O contrato social. São Paulo: Martin Claret, 2012. (Coleção a obra-prima de cada autor
- texto integral).
SAGÜÉS, Néstor Pedro. El control de convencionalidad en Argentina. In: Marinoni, Luiz
Guilherme; MAZZUOLI, Valério de Oliveira Controle de convencionalidade: um panorama
latino-americano: Brasil, Argentina, Chile, México, Peru, Uruguai. 1.ed. Brasília: Gazeta
Jurídica, 2013.
SALDANHA, Nelson. Temas de história e política. Recife: EdUFP, 1969.
______. O Estado moderno e o constitucionalismo. São Paulo: José Bushatsky, 1976.
______. Formação da teoria constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 1982.
______. O Estado moderno e a separação de poderes. São Paulo: Saraiva, 1987.
SAMPAIO, Nelson de Sousa. O processo legislativo. 2.ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1996.
SANCHES, Osvaldo Maldonado. Novo dicionário de orçamento e áreas afins. Brasília:
OMS, 2013.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6.ed. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2006.
172

______. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de


1988: uma análise na perspectiva da jurisdição do Supremo Tribunal Federal. In: George
Salomão Leite (org.) [et al]. Direitos, deveres e garantias fundamentais. - Salvador:
JusPODIVM, 2011.
______. Notas sobre as relações entre a Constituição federal de 1988 e os tratados
internacionais de direitos humanos na perspectiva do assim chamado controle de
convencionalidade. In: MARINONi, Luiz Guilherme; MAZZUOLI, Valério de Oliveira.
Controle de convencionalidade: um panorama latino-americano: Brasil, Argentina, Chile,
México, Peru, Uruguai. Brasília: Gazeta Jurídica, 2013.
SARTORI, Giovanni. A teoria da democracia revisada: o debate contemporâneo. v. 1. São
Paulo: Ática, 1994.
______. A teoria da democracia revisada: as questões clássicas. v.2. São Paulo: Ática, 1994.
SENNA, José Júlio. Os parceiros do rei: herança cultural e desenvolvimento econômico no
Brasil. 2.ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 1995.
SHMITT, Carl. O guardião da Constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.
______. Legalidade y legitimidad. Madri: Struhart, 1994.
SILVA, Christine Oliveira Peter da e CARNEIRO, Gustavo Ferraz Sales (org.). Controle de
constitucionalidade e direitos fundamentais. Estudo em homenagem ao professor Gilmar
Mendes. - Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 241-254.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 22.ed. São Paulo: Malheiros,
2002.
SOARES, Marly Carvalho. Sociedade civil & sociedade política em Hegel. 2.ed. Fortaleza:
EdUECE, 2009.
STRECK, Lenio. Verdade e consenso: constituição, hermenêutica e teorias discursivas. 4.ed.
São Paulo: Saraiva, 2011.
______. TASSINATI, Clarissa. LIMA, Danilo Pereira. A relação direito e política: uma análise
da atuação do judiciário na história brasileira. In: Pensar: Revista de Ciências jurídicas. v.
18, n.3 (set./dez. 2013). Fortaleza: Universidade de Fortaleza, 2013, p. 737-758.
______. Hermenêutica jurídica e(m) crise: um exploração hermenêutica da construção do
Direito. 11.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2014.
SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo ordenador. São Paulo: Malheiros, 1997.
______. Teoria dos direitos fundamentais. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2009.
______. Direito administrativo para céticos. 2.ed. São Paulo: Malheiros, 2014.
TOCQUEVILLE, Alexis de. Da democracia na América. 3. ed. Belo Horizonte: Itatiaia. São
Paulo: Edusp, 1987.
TORRES. Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional, financeiro e tributário:
constituição financeira, sistema tributário e estado v.1, 1.ed. São Paulo: Renovar, 2009.
______.A propósito da teoria dos direitos fundamentais. In: Antonio G. Moreira Maués,
Fernando Facury Scaff e José Claudio Monteiro de Brito Filho. (coord.). Direitos
fundamentais & relações sociais no mundo contemporâneo. - Curitiba: Juruá, 2008.
______. Teoria dos direitos fundamentais. 2.ed. - Rio de Janeiro: Renovar, 2009.
173

UNGER, Roberto Mangabeira. O direito e o futuro da democracia. São Paulo: Bomtempo,


2004.
VALENTIM, Daniela Rodrigues e MANDELLI JÚNIOR, Roberto Mendes. Comentários à
Convenção América de Direitos Humanos. In: Centro de estudos da procuradoria geral do
Estado de São Paulo. Grupo de trabalho de direitos humanos. São Paulo: CEPG, 1998.
VASCONCELOS, Arnaldo. A força do direito. uma visão pluridimensional da coação
jurídica. São Paulo: Dialética, 2003.
______. Teoria da norma jurídica. 6.ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
______. Teoria pura do direito: repasse crítico de seus principais fundamentos. 2.ed. Rio de
Janeiro: GZ Editora, 2010.
VIANA, Francisco José de Oliveira. Instituições políticas brasileiras. v.I. São Paulo: Edusp,
2014a.
VIANA, Francisco José de Oliveira. Instituições políticas brasileiras. v.II. São Paulo: Edusp,
2014b.
______. Introdução à história social da economia pré-capitalista no Brasil. Rio de Janeiro:
José Olympio, 1958.
VIDIGAL, Geraldo de Camargo. Teoria geral do direito econômico. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1977.
VILANOVA, Lourival. As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo. Recife: Max
Limonad, 1997.
WEBER, Max. Ensaios de sociologia. 5.ed. Rio de Janeiro: LTC, 2002.
______. Ensaios sobre a teoria das ciências sociais. 2.ed. São Paulo: Centauro, 2003.
WEFFORT, Francisco. (org.). Os clássicos da Política 1. 14.ed. São Paulo: Ática, 2011.
______. Os clássicos da Política 2. 11.ed. São Paulo: Ática, 2006b.
WOLKMER, Antonio Carlos. Pluralismo jurídico: fundamentos de uma cultura no Direito. -
São Paulo: Alfa Omega, 1994. (Biblioteca Alfa Omega de Cultura Universal, série 2 - volume
52).
ZANCANER, Gabriela. As competências do Poder Legislativo e as comissões parlamentares.
São Paulo: Malheiros, 2009.
ZILLES, Urbano. Teoria do conhecimento e teoria da ciência. São Paulo: Paulus, 2005.
174

ANEXO I

Quadro 5 - Créditos adicionais autorizados no ano de 2014 na União


2014 - Leis Ordinárias
Nº da Lei Ementa
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor da Justiça Federal
13.079, de 30.12.2014
e da Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República,
Publicada no DOU de
crédito especial no valor de R$ 145.620.436,00, para os fins que
31.12.2014
especifica. Mensagem de Veto
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor dos Ministérios da
13.078, de 30.12.2014
Justiça e da Defesa, crédito suplementar no valor R$
Publicada no DOU de
489.256.916,00, para reforço de dotações constantes da Lei
31.12.2014
Orçamentária vigente.
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério da
13.077, de 30.12.2014
Agricultura, Pecuária e Abastecimento, crédito suplementar no
Publicada no DOU de
valor de R$ 310.186.453,00, para reforço de dotações constantes
31.12.2014
da Lei Orçamentária vigente.
Abre aos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União,
13.076, de 30.12.2014
em favor dos Ministérios da Educação, da Saúde e da Cultura,
Publicada no DOU de
crédito suplementar no valor de R$ 9.996.000,00, para os fins
31.12.2014
que especifica.
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor da Câmara dos
13.075, de 30.12.2014 Deputados, de diversos órgãos dos Poderes Judiciário e
Publicada no DOU de Executivo e do Ministério Público da União, crédito suplementar
31.12.2014 no valor de R$ 102.463.137,00, para reforço de dotações
constantes da Lei Orçamentária vigente.
13.074, de 30.12.2014 Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério dos
Publicada no DOU de Transportes, crédito especial no valor de R$ 10.706.000,00, para
31.12.2014 os fins que especifica.
13.073, de 30.12.2014 Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor das Justiças
Publicada no DOU de Federal, Eleitoral e do Trabalho, crédito especial no valor de R$
31.12.2014 14.641.923,00, para os fins que especifica.
13.072, de 30.12.2014 Abre aos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União,
Publicada no DOU de em favor de diversos órgãos do Poder Executivo, crédito especial
31.12.2014 no valor de R$ 15.898.000,00, para os fins que especifica.
175

Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor das Justiças


13.071, de 30.12.2014
Federal, Eleitoral e do Trabalho e do Ministério Público da
Publicada no DOU de
União, crédito suplementar no valor de R$ 41.455.831,00, para
31.12.2014
reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor das Justiças
13.070, de 30.12.2014
Federal, Eleitoral e do Trabalho e do Ministério Público da
Publicada no DOU de
União, crédito especial no valor de R$ 18.557.902,00 para os fins
31.12.2014
que especifica.
13.069, de 30.12.2014 Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério dos
Publicada no DOU de Transportes, crédito especial no valor de R$ 58.537.082,00, para
31.12.2014 os fins que especifica.
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor da Secretaria de
13.068, de 30.12.2014
Portos da Presidência da República, crédito suplementar no valor
Publicada no DOU de
de R$ 333.250.000,00, para reforço de dotações constantes da
31.12.2014
Lei Orçamentária vigente.
13.066, de 30.12.2014 Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério das
Publicada no DOU de Cidades, crédito suplementar no valor de R$ 113.800.000,00,
31.12.2014 para reforço de dotação constante da Lei Orçamentária vigente.
13.062, de 30.12.2014 Abre ao Orçamento da Seguridade Social da União, em favor do
Publicada no DOU de Ministério da Previdência Social, crédito especial no valor de R$
31.12.2014 248.265.342,00, para o fim que especifica.
13.012, de 16.7.2014 Abre crédito extraordinário, em favor do Ministério da Defesa e
Publicada no DOU de de Operações Oficiais de Crédito, no valor de R$
17.7.2014 5.100.000.000,00, para os fins que especifica.
12.969, de 7.5.2014 Abre crédito extraordinário, em favor de diversos órgãos do
Publicada no DOU de Poder Executivo, no valor de R$ 1.978.600.000,00, para os fins
8.5.2014 que especifica.
Abre crédito extraordinário, em favor de Operações Oficiais de
12.956, de 27.2.2014
Crédito, no valor de R$ 2.531.486.253,00 (dois bilhões,
Publicada no DOU de
quinhentos e trinta e um milhões, quatrocentos e oitenta e seis
28.2.2014
mil, duzentos e cinquenta e três reais) para o fim que especifica.
Fonte: Sítio da Presidência da República
176

Quadro 6 - Créditos adicionais autorizados no ano de 2015 na União


Nº da Lei Ementa
29 de janeiro de 2015 - Decreto de 28.01.2015 - Reabre, em favor dos Ministérios da
Edição extra Defesa e da Integração Nacional, crédito extraordinário no valor
de R$560.000.000,00, aberto pela Medida Provisória no 666, de
30 de dezembro de 2014.
5 de janeiro de 2015 Medida Provisória nº 667, de 2.1.2015 - Abre crédito
extraordinário, em favor dos órgãos e empresas estatais,
constantes do Projeto de Lei Orçamentária de 2015, no valor de
R$ 74.014.218.398,00, para os fins que especifica.
27 de fevereiro de 2015 Decreto de 26.2.2015 - Reabre, em favor de empresas estatais,
créditos extraordinários no valor de R$ 294.907.723,00, abertos
pela Medida Provisória nº 666, de 30 de dezembro de 2014.
13 de fevereiro de 2015 Decreto de 12.2.2015 - Reabre, em favor de diversos órgãos do
Poder Executivo, de Encargos Financeiros da União, de
Transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios e de
Operações Oficiais de Crédito, créditos extraordinário e especiais,
no valor de R$1.790.657.691,00, abertos pela Medida Provisória e
pelas Leis que especifica.
23 de abril de 2015 Decreto de 22.4.2015 - Abre ao Orçamento Fiscal da União, em
favor da Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República,
crédito suplementar no valor de R$ 643.673.295,00, para reforço
de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.
10 de abril de 2015 Decreto de 9.4.2015 - Altera, parcialmente, no que concerne ao
Ministério da Integração Nacional, no valor de R$ 77.665.397,00,
o grupo de natureza de despesa de crédito extraordinário aberto e
reaberto pelos atos que especifica.
27 de maio de 2015 Decreto de 26.5.2015 - Abre aos Orçamentos Fiscal e da
Seguridade Social da União, em favor de diversos órgãos do
Poder Executivo e de Transferências a Estados, Distrito Federal e
Municípios, crédito suplementar no valor de R$ 7.280.424.558,00,
para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.
20 de maio de 2015 Medida Provisória nº 674, de 19.3.2015 - Abre crédito
extraordinário, em favor dos Ministérios do Desenvolvimento
Agrário, da Defesa e da Integração Nacional, no valor de R$
904.756.882,00, para os fins que especifica.
14 de maio de 2015 Decreto de 13.5.2015 - Abre ao Orçamento da Seguridade Social
da União, em favor do Ministério do Planejamento, Orçamento e
Gestão, crédito especial no valor de R$ 531.489,00, para o fim
que especifica.
177

31 de julho de 2015 Medida Provisória nº 686, de 30.7.2015 - Abre crédito


extraordinário, em favor do Ministério da Educação, de Encargos
Financeiros da União e de Operações Oficiais de Crédito, no valor
de R$ 9.820.639.868,00, para os fins que especifica, e dá outras
providências.
28 de julho de 2015 Decreto de 27.7.2015 - Abre ao Orçamento Fiscal da União, em
favor de diversos órgãos do Poder Executivo, crédito suplementar
no valor de R$ 29.922.832,00, para reforço de dotações constantes
da Lei Orçamentária vigente.
Decreto de 27.7.2015 - Abre ao Orçamento Fiscal da União, em
favor de diversos órgãos do Poder Executivo, de Encargos
Financeiros da União e de Refinanciamento da Dívida Pública
Mobiliária Federal, crédito suplementar no valor de R$
36.759.382.520,00, para reforço de dotações constantes da Lei
Orçamentária vigente.
Decreto de 27.7.2015 - Abre aos Orçamentos Fiscal e da
Seguridade Social da União, em favor dos Ministérios da
Educação, da Previdência Social, do Trabalho e Emprego e da
Cultura, crédito suplementar no valor de R$ 1.701.389.028,00,
para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.
Decreto de 27.7.2015 - Abre aos Orçamentos Fiscal e da
Seguridade Social da União, em favor de diversos órgãos dos
Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo, da Defensoria
Pública da União, do Ministério Público da União e de
Transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios, crédito
suplementar no valor de R$ 1.629.519.495,00, para reforço de
dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.
8 de julho de 2015 Decreto de 7.7.2015 - Abre ao Orçamento da Seguridade Social
da União, em favor do Ministério da Saúde, crédito suplementar
no valor de R$ 1.972.972.155,00, para reforço de dotações
constantes da Lei Orçamentária vigente.
Decreto de 7.7.2015 - Abre ao Orçamento Fiscal da União, em
favor de Operações Oficiais de Crédito, crédito suplementar no
valor de R$ 38.252.352,00, para reforço de dotações constantes da
Lei Orçamentária vigente.
Decreto de 7.7.2015 - Abre ao Orçamento Fiscal da União, em
favor de Transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios,
crédito suplementar no valor de R$ 934.179.320,00, para reforço
de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.
Fonte: Sítio da Presidência da República

Você também pode gostar