Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Palavras chave: Política; Administração; Estado do Brasil; século XVII; Fontes; Documentos
Históricos; Projeto Resgate.
Introdução:
1
Aluna da graduação do curso de História da Universidade Federal de Viçosa (DHI-UFV). Bolsista do CNPq no
projeto “Governação e carreiras no Estado do Brasil: os governadores gerais (1684-1702)”, integrante do Núcleo
de Estudo e Pesquisa “Impérios Ibéricos no Antigo Regime: política, sociedade e cultura”.
2
Aluno da graduação do curso de História da Universidade Federal de Viçosa (DHI-UFV). Bolsista da
FAPEMIG no projeto “Governação e carreiras no Estado do Brasil na segunda metade do século XVII: os
governadores gerais”, integrante do Núcleo de Estudo e Pesquisa “Impérios Ibéricos no Antigo Regime: política,
sociedade e cultura”.
cartas régias, cartas patentes e cartas particulares (trocadas entre membros de um lado e outro
do Atlântico que não necessariamente possuem modelo como as anteriores).
Selecionamos parte da documentação presente nos Documentos históricos 3, sobretudo
a documentação referente às correspondências dos governadores gerais, remetidas para
autoridades no Estado do Brasil e no Reino. Trataremos, portanto, de caracterizar essas
fontes, partindo da definição apresentada por D. Raphael Bluteau. Carta para este é um
“Papel, escrito a pessoa ausente.” (BLUTEAU, v.VII, s/d, p. 166) Sendo o principal veículo
de transmissão de informações no período estudado, Fernado Bouza acredita que entre os
séculos XVI e XVII “la presencia de las cartas, no importa si aisladas o transformadas em
correspondência regular, alcanzó tales dimensiones sociales, políticas y econômicas que sería
posible considerar a la alta Edad Moderna como uma cultura epistolar.” (BOUZA, 2005, p.
11.) Desde já salientamos que as fontes referidas permitem identificar e caracterizar os
4
poderes e funções presentes nas diversas jurisdições da América portuguesa, bem como as
relações entre as mesmas.
Ressaltamos que ao tratar dessas questões é preciso ter em mente a forma pela qual
essa sociedade pensa a representação do poder, sobre isso António Manuel Hespanha e
Angela Barreto Xavier afirmam que
O Poder era, por natureza, repartido; e, numa sociedade bem governada, esta
partilha natural deveria traduzir-se na autonomia político-jurídica
(iurisdictio) dos corpos sociais, embora esta autonomia não devesse destruir
a sua articulação natural (cohaerentia, ordo, dispositio naturae) – entre a
cabeça e a mão deve existir o ombro e o braço, entre o soberano e os oficiais
executivos devem existir instâncias intermédias. (XAVIER, HESPANHA,
1998, p. 114-115)
ao principio ‘de dar a cada hum o que he seu’, quer no repartir do prêmio e
do castigo (justiça distributiva), quer no cumprimento dos contratos (justiça
comutativa). (...) Premiar e punir eram dois atributos essenciais do domínio,
da capacidade para governar súbditos, ao lado do poder para ordenar,
proibir, autorizar e decidir. (OLIVAL, 2001, p.20.)
10
Em um artigo escrito por Edval de Souza Barros , percebemos que a documentação
do projeto apresenta uma grande riqueza de análise, pois esse analisa as relações entre as
diversas jurisdições presentes tanto no reino como na América portuguesa, notadamente as
relações entre o Conselho Ultramarino, entre as câmaras, os governadores e a Companhia
Geral de Comércio do Brasil.
A documentação digitalizada presente tanto nos Avulsos como no Códice Luiza da
Fonseca, fundos documentais do Projeto Resgate, nos viabilizam o acesso as ações das
diversas jurisdições do império Ultramarino Português, tais como as correspondências dos
governadores gerais, as consultas do conselho ultramarino, pedidos de particulares e
manifestações das câmaras ultramarinas, entre outros tantos tipos.
Alguns dos tipos mais comuns de fontes encontradas no Projeto Resgate são: cartas,
cartas patentes, cartas régias, alvarás, regimentos, consultas, petições, provisões, decretos,
avisos, ofícios entre outros.
Entendemos que o império português buscou meios de organizar a administração de
suas conquistas e para tanto se valia das correspondências com instrumento de transmissão de
ordens. Nesse sentido concordamos com Marília Nogueira Santos quanto está diz que
Tomando as cartas patentes como exemplo, percebemos que estas têm algumas
regularidades no tocante a forma, sendo que o conteúdo é bem diverso. Estas destinam se a
conceder títulos e a nomear patentes militares. Segundo Bluteau: “Patente: O papel em que o
Superior declara, que da licença ao seu súbdito para passar de huma casa, ou Convento a
outro, ou para exercitar algum officio” (BLUTEAU, v. VI, s/d, p.316). Através destas
percebemos a trajetória do remunerado: os cargos que este exerceu; o motivo da remuneração
e a especificação da remuneração.
As cartas patentes ganham dimensão quando confrontados com os regimentos. Estes
especificam os poderes do ofício, especificam as jurisdições e indicam maneiras de se
proceder. Segundo Bluteau “Regimento. Certo, modo de proceder, instituído por aquelles, que
tem authoridade para esta instituiçaõ (...) Fazer um regimento para este, ou aquelle effeyto”
(BLUTEAU, v. VII, s/d, p. 199.) Podemos observar a estrutura básica de um regimento, em
alguns dos itens do Regimento do g.ov. do Brazil:
Da Patente que com esta remetto ficará Vossa Mercê entendendo os motivos
que tive para lh’a mandar passar, e fiar de seu valor, e disposição o soccorro
que de Pernambuco mando ir á sua ordem o qual consta de 200 infantes
escolhidos com quatro Capitães 400 Indios com o seu Capitão-mor Camarão,
e cem soldados pretos com o seu Governador. (...) por contribuição do Povo
que assim lh’o ordeno: e ao Governador João da Cunha Sottomaior envie a
Vossa Mercê com a dita gente todas as armas e munições necessarias. Vossa
Mercê dirija a entrada e guerra que ha de fazer aos Barbaros como entender
que possa ser mais offensiva degollando-os, e seguindo-os até os extinguir,
de maneira que fique exemplo deste castigo a todas as mais nações que
confederadas com elles não temiam as armas de Sua Magestade que
considero victoriosas. (...)Vossa Mercê deve fazer em não consentir que
deixem de degollar os Barbaros grandes só por os captivarem, o que
principalmente farão aos pequenos, e ás mulheres de quem não pode haver
perigo, que ou fujam ou se levantem. (DH-BN. Correspondência dos
governadores geraes. 1671 – 1692.Volume X da série VIII. p.275-276.)
Considerações finais:
1
O seguinte artigo apresenta resultados parciais dos projetos: “Governação e carreiras no Estado do
Brasil na segunda metade do século XVII: os governadores gerais” financiado pelo Edital Universal da
FAPEMIG e “Governação e carreiras no Estado do Brasil: os governadores gerais (1684-1702)”
financiado pelo CNPq.
2
Projeto aprovado em 1995 pelo Ministério da Cultura, visando disponibilizar os documentos
manuscritos sobre a história colonial do Brasil do século XVI ao XIX, presentes em arquivos europeus
e norte-americanos.
3
Inicialmente a coleção foi editada pelo Arquivo Nacional (AN), em 1928. A partir de seu terceiro
volume passou a ser organizada pela Biblioteca Nacional (BN). Dos 110 volumes existentes na
coleção indicamos que as nossas considerações são referentes aos volumes III, IV, V, VI, VII, VIII,
IX, X, XI, XII, XIII, XIX, XX, XXI, XXII, XXIII, XXIV, XXV, XXVI, XXVII, XXVIII, XXIX,
XXX, XXXI, XXXII, XXXIII, XXXIV, XXXIX, LVI, LVII, LVIII, LIX, LXVI, LXVII, LXVIII,
LXXVIII, LXXIX, LXXX, LXXXIII, LXXXIV, LXXXVII, LXXXVIII, LXXXIX, XC, XCII e
XCIII.
4
Esse termo esta presente na documentação, portanto inferimos a importância da apreensão de seu
significado, buscando aproximar de seu sentido no século XVII, assim Bluteau indica que “Jurisdiçam,
ou jurisdição. He hum poder que o publico concede, & que o bom governo introduzio para a decisaõ
das causas. (...) Geralmente se faltando, jurisdição he a authoridade de officio de justiça, ou de outra
dignidade.” BLUTEAU, v. IV., s/d, p. 230-231.
5
Cf:COSENTINO, Francisco Carlos C. Governadores Gerais do Estado do Brasil Séculos (XVI-
XVII): Ofício, regimentos, governação e trajetórias. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte:
Fapemig. 2009. P. 271. – José Subtil classificará da mesma forma porém com outros nome: “É certo
que desde o século XVI, se podem identificar grandes zonas de actuação dos agentes da coroa
nomeadamente a <<justiça>>, a <<fazenda>> e a <<milícia>>.” SUBTIL, José. Os Poderes do
Centro. In: HESPANHA, António Manuel (coord.). História de Portugal. Vol. 4. Lisboa: Editorial
Estampa, 1998, p.141.
6
“Regalia: Geralmente fallando, he hum sinal exterior, demonstrativo da autoridade, & Magestade
Real. As Regalias essenciaes são fazer leys, investir Magistrados, eleger Ministros dignos, &
beneméritos, biter moeda, por tributos, & a seus tempos publicar guerra, & fazer pazes.” BLUTEAU,
v. VII. , s/d, p .193.
7
Segundo Bluteau: “na sua genuína significação quer dizer paga do mercenário, ou galardão &
recompensa, que se dá ao merecimento de alguém, (...) Mas na língua portuguesa não se costuma nesta
significação de salário, prêmio ou remuneração, se não de graça, ou benefício, como os que Deos faz
às suas creaturas, ou os senhores aos seos criados.” BLUTEAU, v. V, s/d, p. 430-431.
8
Encontramos um exemplo de trajetória pelo Ultramar no trabalho de Virgínia Rau em: RAU,
Virgínia. Estudos sobre a História Econômica e Social do Antigo Regime. Lisboa: Editorial Presença,
1984.
9
Nos cargos e jurisdições presentes na administração portuguesa, segundo a proposição de Nuno
Gonçalo Monteiro e Mafalda Soares da Cunha. “O reconhecimento da existência de uma
hierarquização dos territórios constitutivos do império português fica ainda patente em outros
indicadores como o dos ordenados ou nos referentes à remuneração de serviços estabelecida pela
monarquia.” MONTEIRO, CUNHA. 2005, p. 206.
10
Cf:BARROS, Edval de Souza. “Um triangulo de quatro lados: o Conselho Ultramarino e as relações
entre câmaras, governadores e a Companhia Geral do Comércio do Brasil” In: ALMEIDA, Carla
Maria Carvalho; OLIVEIRA, Mônica Ribeiro de. (Orgs.) Nomes e números: alternativas
metodológicas para a história econômica e social. Editora UFJF, 2006.